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CONCEITOS E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA MONADOLOGIA Caius Brandão Universidade Federal de Goiás [email protected] Resumo: Este trabalho apresenta a obra de Gottfried Wilhelm von Leibniz, Princípios da Filosofia ou a Monadologia através de uma breve exposição de alguns conceitos e princípios da metafísica leibniziana. Palavras-chave: Leibniz, filosofia, harmonia, mônada, razão suficiente, metafísica. Gottfried Wilhelm von Leibniz, filósofo e cientista alemão do século XVIII, é autor de uma obra que pretende se distanciar da escolástica, mesmo que bebendo da mesma fonte, a metafísica de Platão – As teorias sobre o mundo das Idéias e a reminiscência da alma, no Fédon, se coadunam harmoniosamente com um postulado axial da Monadologia: toda “mônada” é um espelho do Universo ou, em termos platônicos, a alma contém em si todas as Idéias. Este texto busca apresentar a obra Princípios da Filosofia ou a Monadologia (LEIBNIZ, 1714) através de uma breve exposição de alguns conceitos e princípios fundamentais da metafísica leibniziana.

Leibniz - Princípios Fundamentais da Monadologia

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Este trabalho apresenta a obra de Gottfried Wilhelm von Leibniz, Princípios da Filosofia ou a Monadologia através de uma breve exposição de alguns conceitos e princípios da metafísica leibniziana.

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CONCEITOS E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA MONADOLOGIA

Caius BrandãoUniversidade Federal de Goiá[email protected]

Resumo: Este trabalho apresenta a obra de Gottfried Wilhelm von Leibniz, Princípios da

Filosofia ou a Monadologia através de uma breve exposição de alguns conceitos e princípios da

metafísica leibniziana.

Palavras-chave: Leibniz, filosofia, harmonia, mônada, razão suficiente, metafísica.

Gottfried Wilhelm von Leibniz, filósofo e cientista alemão do século XVIII, é

autor de uma obra que pretende se distanciar da escolástica, mesmo que bebendo da

mesma fonte, a metafísica de Platão – As teorias sobre o mundo das Idéias e a

reminiscência da alma, no Fédon, se coadunam harmoniosamente com um postulado

axial da Monadologia: toda “mônada” é um espelho do Universo ou, em termos

platônicos, a alma contém em si todas as Idéias. Este texto busca apresentar a obra

Princípios da Filosofia ou a Monadologia (LEIBNIZ, 1714) através de uma breve

exposição de alguns conceitos e princípios fundamentais da metafísica leibniziana.

Ao comparar a mônada com a alma, Leibniz argumenta que experimentamos

estados inconscientes, como em desmaios e sonos profundos sem sonho, quando não há

“percepção distinta” e nem “memória”. Nestes estados, a alma não é muito diferente de

uma mônada, porque, na verdade, a alma que anima os animais nada mais é do que uma

mônada com memórias e percepções distintas. Mas, afinal, o que é uma mônada? É uma

substância simples, indivisível (portanto, sem extensão) e que não perece naturalmente.

Nada do que lhe é exterior, nem mesmo outra mônada pode influenciar seus

movimentos internos. Sem janelas por onde algo poderia lhe ser subtraído ou

acrescentado, a mônada é uma substância que contém em si todos os seus possíveis

acidentes. Ao se aglomerarem como átomos metafísicos, essas substâncias simples

formam o composto, ou seja, tudo aquilo que existe no universo corpóreo e material.

Sem nenhuma “contradição” intrínseca, atualizada por uma “razão suficiente” e guiada

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por uma “causa final”, a mônada é a força vital da realidade. Mesmo sem partes, já que

é indivisível, sua estrutura interna contem dois princípios de atividade: as percepções –

momentos transitórios quando o universal está representado no uno – e as apetições, ou

ainda, as afecções volitivas. Nota-se que ambos os elementos são inatos, logo, a

percepção e a apetição da Mônada existem independentemente de qualquer experiência.

Para Leibniz, cada mônada representa a vontade de Deus, que as criou com o propósito

de realizar o melhor dos mundos possíveis.

Vejamos agora alguns princípios basilares (todos eles inatos) para a

monadologia de Leibniz, com os quais a parte inicial do texto ficará mais clara.

O Princípio do Melhor – Deus, em sua onipotência, escolhe este mundo como

o melhor possível de todos os mundos. Isto se dá porque visa o melhor em toda

sua infinita bondade. Por ser um ser absolutamente perfeito e possuidor de uma

sabedoria sem limites, Deus age, moral e metafisicamente falando, da forma

mais perfeita possível. Este argumento aparece como axioma, já no início da

Monadologia. Leibniz relaciona o Princípio do Melhor com o Princípio da

Razão Suficiente, que abordaremos mais tarde.

O Princípio de Continuidade – Na natureza, nada dá saltos, tudo é produzido

em etapas. Quando as diferenças entre duas causas são permanentemente

diminuídas, também serão entre os seus efeitos. Todo movimento de mudança se

dá através de outros movimentos intermediários de mudança, o que revela a

infinitude das coisas. Em termos negativos, nenhum movimento pode ser gerado

por um estado de repouso absoluto. O mesmo acontece com as percepções

distintas, que derivam de outras percepções menos distintas. Sendo Deus a causa

primeira de todas as coisas, ele se encontra no ponto inicial das relações causais.

Do topo desta cadeia hierárquica, a mônada incriada gera o movimento perpétuo

e harmônico de tudo o que existe através das mônadas criadas. Assim, o

Princípio de Continuidade serve também para explicar a distinção entre tipos

diversos de mônadas, tendo como critério a capacidade de possuir idéias claras e

distintas.

Leibniz também trabalha com alguns princípios lógicos com nítidos

desdobramentos na realidade ontológica das mônadas, por exemplo:

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O Princípio da Noção de Predicado1 – Para Leibniz, em toda proposição

verdadeira e afirmativa, seja ela necessária ou contingente, universal ou

particular, a noção do predicado participa da noção do sujeito. Sob essa ótica,

quando tomada como sujeito, a mônada é uma substância que contém em si

mesma todos os acidentes possíveis. Na mônada, “o presente está prenhe do

futuro”, ou seja, tudo o que pode vir a acontecer a ela está contido em sua

própria substância. Metaforicamente, na substância da semente já reside a árvore

e tudo o que a ela pode acontecer.

O Princípio da Não-Contradição (Identidade) – De acordo com este princípio,

uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo, portanto,

consideramos falso aquilo que implica numa contradição, ao passo em que

damos como verdadeiro aquilo que é contraditório ao falso. Para que existam

verdades necessárias, tais como as leis da matemática, é necessário que as suas

contradições não sejam possíveis. Assim, Deus é uma realidade necessária e

não-contraditória, visto que ele existe e não poderia não existir.

O Princípio da Razão Suficiente – De acordo com Leibniz, a mônada encerra

em si certa perfeição e suficiência. O Princípio da Razão Suficiente alimenta a

fonte de movimentos internos das mônadas, tornando-as seres “autômatos” e

“incorpóreos”. Este princípio reza que para algo existir ou ser verdadeiro, é

necessário que exista uma razão suficiente, ou seja, uma causa que lhe dê

origem, mesmo que o conhecimento desta causa não esteja ao alcance do

homem. Em outras palavras, nada existe sem uma razão ou não existe efeito sem

uma causa.

A partir deste princípio, Leibniz conceitua dois tipos de verdades: as de razão e

as de fato. As verdades racionais são verdades lógicas e necessárias, como as da

matemática. Ao decompor tais verdades em idéias mais simples, pode-se encontrar sua

causa original. As verdades de fato, em contrapartida, são contingenciais, se dão no

mundo da experiência, logo, suas causas são fenomênicas. As verdades de fato revelam

aquilo que é, mas também o que poderia não ser, ou ser de outra forma.

1 Traduzido do inglês (Predicate-in-Notion Principle)

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O Princípio de Identidade dos Indiscerníveis – Leibniz argumenta não ser

verdade que duas substâncias possam se assemelhar completamente e ser

diferentes apenas em número, ou seja, se duas substância tem propriedades

completamente semelhantes, então elas são iguais. Em suma, este princípio nos

diz que dois objetos não podem ter exatamente as mesmas propriedades. Com

isso, Leibniz está questionando os fatores que serviriam à individuação

qualitativa de objetos teoricamente idênticos, já que, em sua opinião, algumas

propriedades, tais como as temporais e espaciais não estabelecem a diferença

entre os objetos, porque não são propriedades intrínsecas a ele. Leibniz aborda

esta questão com a seguinte conseqüência ontológica:

“É mesmo necessário que cada Mônada seja diferente de qualquer outra. Pois

nunca há, na natureza, dois seres que sejam perfeitamente idênticos e nos quais

não seja possível encontrar uma diferença interna, ou fundada em uma

denominação intrínseca.”

Outro conceito muito importante na Monadologia, o da “harmonia pré-

estabelecida”, nasce da crítica de Leibniz ao Dualismo de Descartes. Leibniz considera

insuficiente a explicação cartesiana sobre a interação entre mente e corpo. Quando se

toma a mente essencialmente como pensamento, o corpo nada mais é do que mera

extensão. Então, resta explicar como se dá a interação entre a substância simples e o

corpo extenso. Se estas são duas substâncias distintas, como queria Descartes, então

como elas chegam a se unir e obter uma denominação individual? A noção de que a

alma teria um papel de influência no corpo a partir da glândula pineal é rejeitada por

Leibniz, que propõe a teoria da harmonia pré-estabelecida como alternativa para

explicar o processo de individuação dos seres corpóreos.

Em Leibniz, a matéria, portanto, o corpo, nada mais é do que um aglomerado de

mônadas constituídas por diversos princípios inatos. Leibniz explica a interação entre a

substância simples e o corpo extenso com o argumento de que as criaturas de Deus

possuem tal perfeição que a sua própria constituição natural determina o funcionamento

de uma perfeita harmonia na formação e sustentação do composto. Cada mônada age de

acordo com a sua própria lei e seu próprio livre arbítrio, ao mesmo tempo, em perfeita

harmonia com as outras mônadas.

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É árdua a tarefa de concluir este pequeno texto quando ainda podemos nos

perguntar: ao submeter a realidade material tão irremediavelmente à realidade

metafísica, não estaria Leibniz afirmando que aquela realidade refletida pela mônada (o

Universo) e percebida por nós, não é se não imagem sem substância? Apesar de não

encontrar aqui nenhuma resposta, a questão em si reflete uma perspectiva sistêmica da

Monadologia, reveladora da noção de metafísica das substâncias simples que cimenta

todo o sistema filosófico leibniziano.

Referencial Bibliográfico:

LEIBNIZ, Gottfried Wilhelm. Princípios da Filosofia ou a Monadologia. Domínio Público.

http://www.filonet.pro.br/livros/ebooks/monadologia.pdf

Artigo: Teoria da verdade em Leibniz: Necessidade e Contingência, NOTO, Carolina. http://www.consciencia.org/leibnizcarol.shtml

Enciclopédia: Gottfried Wilhelm Leibniz - Stanford Encyclopedia of Philosophy (2007). http://plato.stanford.edu/entries/leibniz/#SomFunPriLei

Dicionário: MOTER, Ferrater. Gottfried Wilhelm Leibniz – Tomo III - Dicionário de

Filosofia. http://books.google.com.br/books?

id=aOsOq8UfSwIC&pg=PA1712&lpg=PA1712&dq=leibniz+