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LEiitlfi-FÂTIMfi Órgão Oficial da Diocese
Ano IV • N. il 11 • Maio-Agosto 1996
DIRECTOR AMÉRICO FERREIRA
CHEFE DE REDACÇÃO CARLOS CABECINHAS
ADMINISTRADOR HENRIQUE DIAS DA SILVA
CONSELHO DE REDACÇÃO BELMIRA DE SOUSA
JORGE GUARDA LUCIANO CRISTINO
MANUEL MELQUÍADES SAUL GOMES
PERIODICIDADE QUADRIMESTRAL
PROPRIEDADE E EDIÇÃO DIOCESE DE LEIRIA-FÁTIMA
REDACÇÃO E ADMINISTRAÇÃO SEMINÁRIO DIOCESANO DE LEIRlA 2410 LEIRIA • TELEF. (044) 32760
ASSINATURA ANUAL -1400$00
A Caminho da Assembleia Sinodal.................. 83
Caminhada Sinodal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 7
Comunicação sobre a Caminhada Sinodal, na
Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo ..... 90
O Padre em colaboração e convívio com os leigos 93
Dizer Deus Hoje!?................................................ 99
Actos Episcopais . . .. . . . .. . . . . .. .. .. . . . .. . . .. . .. . . . .. .. .. . .. .. . 107
Comunicado do Conselho Presbiteral................. 1 1 1
Vida Eclesial . . .. .. . .. . .. . . . .. . . . .. . . . .. .. . . . .. . . . .. .. .. .. .. . .. . 1 1 3
Padre Manuel Luís Maço.................................. 1 1 6
O que anda a fazer S. Gregório?!.................. ..... 1 1 7
Recordando o Tenente Capelão António Lourenço 141
Dois testemunhos da Religião Popular na Alta
Estremadura .............................................. 146
A CAMINHO DA ASSEMBLEIA SINODAL Caros diocesanos:
A fim de prepararmos a primeira sessão da Assembleia Sinodal, escrevo-vos esta carta com algumas normas para a sua constituição.
L Na caminhada sinodal da Diocese, demos alguns passos significativos. O mais recente foi o trabalho de centenas de grupos, que analisaram a situação da nossa Diocese. Descobriram problemas de marginalidade, de falta de fé, de insuficiente participação na vida comunitária, de fraca presença e acção dos cristãos na sociedade. Escutaram a Palavra de Deus e apontaram propostas para a renovação. É digno de apreço todo este trabalho!
2. Começámos já a preparar a Assembleia Sinodal, que é representativa de comunidades, serviços, movimentos e instituições da Diocese. Reúne-se para reflectir sobre a situação da nossa Igreja, apontando opções prioritárias para a sua renovação.
3. O momento mais solene da caminhada sinodal é a reunião da Assembleia. O seu bom resultado requer adequada preparação. Para cada sessão será elaborado um instrumento de trabalho que tenha em conta os resultados da reflexão dos grupos e adiante algumas propostas para o debate.
4. Em conformidade com o Cânone 463 do Código de Direito Canónico, a Assembleia Sinodal da nossa Diocese terá a seguinte composição:
· - O Vigário-Geral e o Vigário Judicial - Os membros do C.1bido da Catedral e do Conselho
Presbiteral
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A CAMINHO DA ASSEMBLEIA SINODAL -------------
- Os membros do Conselho Pastoral Diocesano - O Reitor do Seminário Diocesano e o Reitor do San-
tuário de Fátima -Um representante da Escola de Formação Teológica
de Leigos - Os Vigários da Vara - Duas representantes dos institutos religiosos femini-
nos e dois dos masculinos presentes na Diocese, a eleger pelas direcções regionais da FNIRF e da CNIR, respectivamente, e uma dos institutos seculares, a eleger pelos mesmos. Os representantes religiosos poderão ser os que já fazem parte do Conselho Presbiteral
-Um representante de cada serviço e movimento diocesano indicado na lista anexa
-Um membro leigo da cada Conselho Pastoral Paroquial ou, se este não existir, um a eleger de entre os colaboradores na pastoral paroquial ou os animadores dos grupos sinodais
-Um delegado dos seminaristas maiores - Os membros das Comissões do Sínodo Serão convidados observadores, sem direito a voto.
5. Para definir a estrutura e o funcionamento da Assembleia Sinodal será elaborado um regulamento. Peço à Comissão Central que oportunamente me apresente uma proposta nesse sentido.
6. A Assembleia Sinodal há-de criar as condições para que o Senhor Ressuscitado se manifeste nela com a força do Seu Espírito, segundo a Palavra do próprio Jesus, que diz: "Onde dois ou três estão reunidos em Meu nome, aí estou Eu no meio deles" (Mt. 18,20). Todos os fiéis participantes hão-de poder reconhecer e exclamar, como na Liturgia: "Ele está no meio de nós!".
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------------- A CAMINHO DA ASSEMBLEIA SINODAL
7. Anuncio a toda a Diocese que a primeira sessão da Assembleia Sinodal terá lugar na Aula Magna do Seminário Diocesano, nos dias 15, 16 e 17 de Novembro de 1996.
Os membros e demais participantes na Assembleia serão convocados ou convidados oportunamente, a fim de poderem preparar a reflexão sobre o documento de trabalho, no qual serão apresentadas a problemática e as propostas a discutir.
8. Convido toda a Diocese a rezar pelo bom fruto da Assembleia.
De modo especial, exorto todas as comunidades da Diocese - paróquias, institutos religiosos e outras - a promoverem uma vigília de oração, na noite de 5 de Junho, véspera da Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo. A Comissão Sinodal de Liturgia vai apresentar um guião para esta iniciativa, que visa unir toda a Diocese em oração pelo Sínodo.
Guiem-nos Santo Agostinho e Nossa Senhora da Fátima, nossos padroeiros.
Para todos invoco a bênção de Deus.
Leiria, 13 de Maio de 1996
t Serafim de Sousa Ferreira e Silva Bispo de Leiria-Fátima
Anexo - I
Serviços e Movimentos diocesanos que deverão designar um delegado à Assembleia Sinodal:
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A CAMINHO DA ASSEMBLEIA SINODAL -------------
Serviços
(Secretariados e Comissões)
- Secretariado Diocesano da Educação Cristã da Infân-cia e Adolescência
- Secretariado Diocesano da Pastoral Juvenil - Secretariado Diocesano da Pastoral Vocacional - Secretariado Diocesano do Ensino da Igreja nas Escolas - Secretariado Diocesano da Pastoral Familiar - Comissão Diocesana da Pastoral da Saúde - Comissão Diocesana das Comunicações Sociais - Comissão Diocesana das Migrações e Turismo - Cáritas Diocesana
Associações, Movimentos e obras eclesiais
- Acção Católica Independente - Acção Católica Rural - Associação Católica Internacional ao Serviço da Ju-
ventude Feminina - Centro de Preparação para o Matrimónio - Conferência de S. Vicente de Paulo - Corpo Nacional de Escutas - Cursos de Cristandade - Equipas de Nossa Senhora - Movimento Católico de Estudantes - Movimento da Mensagem de Fátima -·Movimento de Educadores Católicos - Movimento Esperança e Vida - Oficinas de Oração e Vida - Renovamento Carismático Católico - Legião de Maria - Liga Eucarística
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CAMINHADA SINODAL
Na sessão plenária do Conselho Pastoral Diocesano, no dia 3 de Fevereiro, foi analisada a caminhada sinodal e preparada a Peregrinação Diocesana a Fátima, como reflexo desta caminhada.
No dia 9 de Março, o plenário das Comissões Sinodais analisou os resultados do inquérito realizado, concluindo na necessidade de um estudo teológico-pastoral desses resultados. Após alguma reflexão sobre a Assembleia Sinodal, decidiu-se adiar a sua realização para Novembro de 1996, uma vez que, embora tivessem já começado a chegar conclusões dos trabalhos de grupos, não se conseguiria trabalhar e estudar a sua totalidade até à data anteriormente prevista. Concluiu-se, também, que o Sínodo ainda não tinha chegado de forma completa a muitas pessoas.
Um momento alto da caminhada sinodal ocorreu com a Peregrinação Diocesana a Fátima que teve como lema: "Com Maria escuta Deus- acolhe os irmãos". No sábado houve uma concentração de cerca de mil jovens, que, de vários lados, chegaram ao Santuário durante o dia. À noite houve uma encenação dos cinco temas do guião de jovens "Vem Ver!", um concerto pelo grupo de mensagem "Golgotha" e trabalhos por grupos sobre os referidos temas, bem como a preparação da Via-Sacra, que decorreu durante a noite.
No domingo de manhã, depois da Via-Sacra por vigararias, todos juntos celebraram a 15ª estação, junto à Cruz Alta. Nesse local se iniciou a Eucaristia, que foi celebrada em caminhada. Bispo, padres e fiéis escutaram a Palavra de Deus a caminho do Altar, e, numa sensibilização sinodal, foram preparados pelos jovens vários momentos especiais, como a celebração do perdão e o Pai-Nosso. Segundo os responsáveis e participantes em geral, foi uma celebração muito rica de conteúdos e símbolos, muito positiva como vivência de Igreja em Sínodo.
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CAMINHADA SINODAL -----------------
A partir de 7 de Maio realizou-se um ciclo de conferências, promovido pela Comissão Sinodal de Jovens, sobre os cinco temas do Guião "Vem Ver!", com a intervenção de cinco oradores das diversas áreas abordadas pelo guião: Emília Nadai, Álvaro André, João Francisco, Bento Domingues e Carvalho Rodrigues. No fim de Maio decorreu também um encontro de oração "Shemá", incorporada neste ciclo de conferências.
Numa carta datada de 13 de Maio, o Sr. Bispo D. Serafim anunciou a marcação da 1ll sessão da Assembleia Sinodal para os dias 15, 16 e 17 de Novembro de 1996, e a sua composição, propondo igualmente a realização de uma vigília de oração pelo bom fruto desta Assembleia, a realizar em todas as comunidades da Diocese, a 5 de Junho, véspera do Corpo de Deus.
Assim, em muitas comunidades, efectuou-se a referida vigília, com base num guião preparado pela Comissão de Liturgia, havendo outras que a celebraram em diferentes datas e ocasiões.
Na festa do Corpo de Deus, foi lida uma mensagem do Coordenador-Geral do Sínodo, em que este apresentou um resumo da caminhada feita até então, da qual se destaca o número das respostas dos trabalhos de grupos que já chegou à Comissão Central: 1150.
Em várias vigararias foi realizada uma "festa-mensagem", organizada pela Comissão Central, e com a colaboração do grupo de música de mensagem da Diocese, "Golgotha", sob o tema "Vem Ver!", com o objectivo principal de levar a todas as comunidades cristãs o sentido de festa e de alegria presente nos trabalhos sinodais. Esta festa-mensagem foi já realizada a 21 de Abril em Porto de Mós, a 5 de Maio em Ourém, a 18 de Maio na Vieira, a 28 de Junho em S. Mamede, a 7 de Julho em Pataias e a 13 de Julho no adro das Sé, em Leiria. Está também prevista a sua realização em mais algumas vigararias em Setembro e Outubro.
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CAMINHADA SINODAL
Entretanto, uma equipa constituída por membros das Comissões Teológico-pastoral e Central encontra-se a trabalhar na análise das conclusões dos trabalhos de grupos, no sentido de elaborar o Instrumento de Trabalho para a Assembleia Sinodal. Também os Delegados da referida Assembleia estão a ser eleitos e contactados e, até fins de Julho, teremos já a lista completa dos seus membros.
• A Revista "Lumen", no número de Março/Abril, incluiu, nas suas páginas, um dossier sobre Sínodos Diocesanos - Experiências e Desafios". Neste dossier, além de reflexões de carácter histórico e teológico-pastorais, foram recolhidos testemunhos sobre os Sínodos Diocesanos das dioceses de Aveiro, Braga, Coimbra e Leiria-Fátima. Sobre a nossa Diocese, escreveu o P. Jorge Guarda, Coordenador Geral do Sínodo, um artigo intitulado "Sínodo de Leiria-Fátima - Unidos no caminho da esperança", em que apresenta a temática e dinâmica desta caminhada e faz o ponto da situação.
• Foi publicada, no passado dia 28 de Março, a Exortação Apostólica Pós-Sinodal ''Vita Consecrata", do Papa João Paulo II, sobre a vida consagrada e a sua missão na Igreja e no mundo. A primeira parte deste documento debruça-se sobre a natureza da vida consagrada. Na segunda parte são abordadas diversas questões relacionadas com a solidariedade, a fraternidade e a unidade. A terceira parte desta exortação apostólica abre o horizonte sobre as necessidades da humanidade.
• O Conselho Pontifício para a Família publicou, no passado dia 27 de Maio, um documento intitulado: "Preparação para o Sacramento do Matrimónio". Composto por três capítulos, o documento salienta, numa primeira parte, a importância da preparação do Matrimónio cristão, numa segunda, as diversas fases dessa preparação, e na última, a celebração do matrimónio em si mesma.
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COMUNICAÇÃO SOBRE A CAMINHADA SINODAL,
NA SOLENIDADE DO CORPO E SANGUE DE CRISTO
L Há pouco mais de um ano, como diocese, iniciámos a nossa caminhada sinodal, "unidos no caminho da Esperança". Através da mensagem-consulta, a cada um de nós foi dada a palavra para que comunicasse a sua opinião, os seus desejos e esperanças e sugestões para a renovação. Os resultados são já do conhecimento público e constituem para todos nós um estímulo e uma ajuda a participarmos na conversão e nas mudanças das pessoas, comunidades e estruturas.
2. Entretanto, com os guiões de reflexão, reuniram-se centenas de grupos. Já chegaram ao Secretariado do Sínodo 1150 impressos com o resultado do trabalho de grupos de 54 paróquias e também de movimentos e serviços diocesanos. Falta ainda a comunicação de 19 paróquias e de alguns grupos. Esperamos que o façam em breve. Houve paróquias e pelo menos um movimento que fizeram uma assembleia onde se comunicaram e discutiram propostas de renovação e dinamização da própria comunidade. Agora vão tentar concretizar as ideias aprovadas.
Em algumas vigararias realizaram-se festas/mensagem. Desejamos que o mesmo aconteça em toda a diocese, pois o Sínodo significa também alegria, entusiasmo, festa.
A renovação faz-se em cada grupo, paróquia, vigararia, movimento . . . , com as iniciativas e o contributo de todos, até envolver toda a diocese.
3. Os jovens têm sido dos mais entusiastas na nossa caminhada comum. Muitos deles constituíram grupos:Houve vigararias que fizeram encontros ou caminhadas juvenis. Quase mil jovens participaram no encontro por ocasião da Pe-
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---------- COMUNICAÇÃO SOBRE A CAMINHADA SINODAL
regrinação Diocesana a Fátima. As conferências que estão a levar a cabo em diferentes zonas da Diocese permitem outras abordagens dos temas de reflexão do guião jovem. Queremos reconhecer aos jovens um lugar próprio, caminhar com eles e acolhê-los. As novas gerações trazem dinamismos e exigências que não podemos ignorar nem deixar de aproveitar.
4. O Sínodo não é feito só de realizações visíveis. Ele é antes de tudo um espírito de abertura, criatividade, renovação, que deve entrar no ritmo normal e na vida das comunidades, movimentos e serviços eclesiais. As iniciativas exteriores têm os seus momentos próprios para exprimir e alimentar o esforço de mudança que há-de ser generalizado e constante. Ontem à noite, com as Vigílias de Oração, tivemos um momento muito significativo desta caminhada: virám<rnos para o Senhor, pois é d'Ele que esperamos a ajuda, a luz e a sabedoria. O Sínodo há-de ser sobretudo um acontecimento do Espír:ito.
A docilidade é fundamental, já que o Espírito guia-nos até onde não suspeitamos e inspira-nos soluções que nem sequer imaginamos.
Esta caminhada exige grande confiança em Jesus Cristo. Ele, que é o Senhor da Igreja, cuida dela e garante-nos que "aquele que acredita n'Ele fará também as obras que Ele faz; e fará obras maiores do que estas". Não podemos, por isso, desanimar nem ficar à espera que sejam os outros a fazerem a mudança. Esta deve acontecer em cada um de nós e com o empenhamento de todos.
5. Valeu a pena o percurso feito até agora? A experiência de quem se empenhou na caminhada diz
-nos que sim. Muitos experimentaram a Igreja como comunhão de irmãos no amor de Cristo. É certo que há muito a fazer, há inércias a vencer, cepticismos a transformar em confiança, resistências a superar e muitas outras dificuldades. Mas há tam-
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COMUNICAÇÃO SOBRE A CAMINHADA SINODAL ----------
bém energias que começam a despertar, projectos que já se vão desenhando, sonhos que se acalentam.
Duvida se valeu a pena quem não chegou a começar e nem deu qualquer passo. Para quem não acredita nesta caminhada, qualquer obstáculo ou dificuldade será uma confirmação do próprio imobilismo. Não podemos deixar-nos paralisar pelo medo nem pelo comodismo. Não deixemos que sejam os outros a fazer o que nos compete a nós. Temos confiança. Acreditamos que o convite e a força nos vem de Deus. Vamos continuar.
6. Qual o passo seguinte? A eleição das pessoas - padres, religiosos e leigos - que
participam na Assembleia Sinodal, em representação de todas as paróquias, movimentos e serviços.
A Assembleia, como já foi anunciado, reúne-se em Novembro. Deverá debater e aprovar algumas propostas para dinamizar e renovar a vida e acção da Diocese.
Entretanto, a partir do contributo da consulta e do trabalhos dos grupos vamos preparar o instrumento de trabalho para a primeira sessão da Assembleia Sinodal.
Esperamos igualmente que cada paróquia, serviço e movimento, ao preparar o próximo ano pastoral, tenha em conta a dinâmica sinodal e promova a sua própria renovação.
7. Deus olha com bondade esta diocese e cada um dos seus membros e comunidades. Reconheçemos nos trabalhos sinodais um apelo de Deus e confiamos no poder do Seu Espírito, que age em todos nós. Ele faz mais, muito mais, do que podemos pedir ou imaginar para a mudança. Ponhamos mãos à obra. Há um horizonte de esperança à nossa frente.
Leiria, 6 de Junho de 1996.
O Coordenador-Geral do Sínodo P. Jorge Manuel Faria Guarda
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O PADRE EM COLABORAÇÃO E CONVÍVIO COM OS LEIGOS
Os dois textos que agora publicamos foram apresentados num painel sobre o tema ((O Presbítero- Homem de Comunhão", inserido no Curso de Formação Permanente do Clero de Leiria-Fátima, que se realizou em Fátima, de 2 a 5 de Outubro de 1995. Quatro das comunicações deste painel foram já publicadas no número anterior.
Este tema obrigou-me a cair em mim, pensar no mistério da Igreja, na sua realidade visível que é ao mesmo tempo uma realidade espiritual, portadora da vida divina; pensar no mistério da pessoa humana; no meu lugar e papel dentro desta Igreja como membro e sacerdote; na distribuição das competências dentro da Igreja e no mundo doente em que ela es�á inserida; no padre, farol e sinal de esperança.
O padre na colaboração e convívio com os leigos!?
Fundamentalmente, a Igreja está organizada em três grandes corpos:
- a hierarquia, que vai desde o Papa até ao Diácono; - os leigos; - e os religiosos.
a) Pensando na competência da hierarquia, relembrei especialmente o texto de Puebla e do Sínodo dos Bispos de 1971, sobre a justiça no mundo, onde se diz: cabe à hierarquia: an.unciar (a palavra transformadora da sociedade -Puebla -518) e denunciar: a justiça e as situações de injustiça; promover e defender a dignidade e os direitos humanos; solidarizar-se com os leigos e estimulá-los na sua criatividade; interpretar em cada nação as aspirações dos seus povos, especialmente os anseios daqueles que a sociedade tende a marginalizar (Puebla 522).
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O PADRE EM COLABORAÇÃO E CONVÍVIO COM OS LEIGOS
A hierarquia não possui competência técnica: não sabe dizer como fazer; mas possui competência ética: à luz do Evangelho, pode dizer se é justo ou injusto, se favorece a participação ou a exclui.
b) Do mesmo modo, pensei na competência dos leigos e reli a Lumen Gentium n2 3 1 e 33. A acção dos leigos não deve ser compreendida como prolongamento da acção da hierarquia. Eles possuem o seu lugar próprio dentro da Igreja, como leigos, e devem agir neste sentido, a título próprio. O leigo não é um homem secular. É um membro da Igreja no mundo secular. Possui um mandato directo de Jesus Cristo (L.G. 33). O seu campo de acção é o mundo.
Aqui surgiram-me várias interrogações: - Como hão-de os leigos tomar consciência da sua con
sagração e missão por força do Baptismo e da obra do Espírito Santo?
- Como alimentar a sua incorporação em Cristo, mediante a unção do Espírito?
- Como hão de sentir vida, força, apoio para a acção? - Como hão de viver de Deus e tornarem-se comunida-
des desta vida? - E nós, ministros ordenados, como tomar consciência
de não ser tudo na Igreja para que nos encontremos uns com os outros na comunhão articulada na qual cada um é chamado a dar o seu próprio contributo original e insubstituível?
Sentindo-me Igreja, interrogo-me sobre a figura que ando a fazer como padre:
- na minha função de consagração especial e na unção baptismal;
- se sou capaz de me identificar e assumir, ora como membro comum do Povo de Deus, ora como pessoa que age "in persona Christi".
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O PADRE EM COLABORAÇÃO E CONVÍVIO COM OS LEIGOS
Isto é um desafio ameaçado por vários riscos. Dupla identidade que tanto pode levar à rispidez como
a perplexidades inadequadas, na liturgia, missão, gestão da paróquia e das obras da Igreja. Ao binómio hierarquia - laicado dou lugar ao binómio comunidade - carismas e ministérios?
Como padre, sou servo de todos (e não de uma Igreja de elites), a começar pelos mais pobres, pelos excluídos da Igreja, sem de maneira alguma prescindir dos movimentos, porque sem estes, não tenho fermentos, não atinjo os ambientes, não posso fazer obras. Eu preciso deles e eles precisam de mim.
Sou pastor. Mas para ser, fazer e dizer como pastor, terei de viver no interior as ânsias de Jesus, que estava com e falava às multidões.
Mas também tinha os seus grupos de trabalho que orientava e doutrinava e que ouvia: "Quem dizem os homens que é o Filho do Homem?"
Que movimentos tenho na minha paróquia e qual a minha disponibilidade? Como os preparo? os responsabilizo? os animo?
Como Ele, terei que tentar conhecer as ovelhas e dar a vida por elas. Pensar nas suas pastagens, no mundo em que vivem. Ouvi-las, escutá-las.
Pensar numa sociedade polarizada no sucesso, no dinheiro, no fácil, na luta pelo poder, no singrar na vida, uma sociedade individualista, consumista, pouco sensível ("salve-se quem puder"), sem capacidade para o serviço; pouca formação religiosa e, salvo algumas excepções, muita ignorância. Ciumentos entre eles, pouco comprometidos, anti-clericais, de pé atrás, "manientos", volúveis.
Cada pessoa é um mundo! Como aproximar o meu mundo, do mundo de cada um
deles?
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O PADRE EM COLABORAÇÃO E CONVÍVIO COM OS LEIGOS
Como superar distâncias e distâncias de idades? Como criar ambiente para que uns comuniquem aos ou
tros as próprias riquezas? Mais uma vez me interrogo acerca da competência hu
mana, da competência científica, da fé esclarecida e vivida, da sensibilidade e docilidade ao dom do Espírito de Deus. Do dom do Espírito que torna presente o Ressuscitado no tempo dos homens, enriquecendo o Povo de Deus com carismas e ministérios, conduzindo a Sua Igreja à meta prometida.
Confesso: vejo-me longe, desactualizado, frio, frouxo. Mas o Senhor apanhou-me, sou pastor, sou servo, o meu agir é de Cristo, sou membro comum do Povo de Deus.
Não posso cruzar os braços. Na colaboração e convívio com os leigos será estar pre
sente e participar nas suas festas? Como conviver e ser festivo neste tempo difícil, trágico? Para responder a este tempo é necessário, antes de tudo,
que haja padres que sejam um farol e um sinal de esperança. Falo no plural, mas continuo a pensar, a dizer para mim.
Vivendo nós num tempo trágico, tempo de guerras, sofrimento humano, de intolerância, destruição, tragédias, perante tal tempo, são necessários padres:
12- Que sejam luz do mundo, como nos fala o Evangelho. Esta luz do mundo é hoje um farol de esperança. Nós não assentamos em fundamentos meramente humanos, mas no mistério da fé, em fundamentos divinos e eternos (relembro o que já disse: competência humana, científica; fé esclarecida e vivida, docilidade ao Espírito . . . ).
22- Vivemos num tempo dominado pela dimensão materialista, pelo hedonismo consumista. Como resposta, tere-
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O PADRE EM COLABORAÇÃO E CONVÍVIO COM OS LEIGOS
mos de ser padres com uma dimensão espiritual; padres que se cruzam com Ele a sério; padres que rezam para alimentar a sua vida espiritual e que o fazem em nome e pelo Povo de Deus; padres mediadores, que estabelecem uma ponte permanente entre o divino e o humano, entre Deus e o Homem, como o foi o próprio Jesus.
3�- Vivemos num tempo de discórdia, nesta Europa dilacerada por guerras, por fundamentalismos de natureza religiosa. Tempos de ruptura de toda a ordem, que atingem a própria instituição familiar: o divórcio, a separação, ruptura de geração de pais com filhos. Tempos de muitas palavras e pouca escuta. Pessoas bem falantes, mas não dialogantes. Temos que ter padres de diálogo e comunicação. Padres que sejam intérpretes do Carisma do Espírito, líderes e mobilizadores de homens e de almas pela palavra, agentes da Nova Evangelização.
4�- Num tempo de múltiplas servidões: servidão do dinheiro, do prazer, da posse; escravatura do "stress", do sucesso, da produção moderna, dos jovens empurrados para a vertigem do sucesso humano; de servidões dos poderes corruptos: poder político, económico, financeiro, a servidão do poder. Padres capazes de denunciar corajosamente a injustiça, onde quer que ela esteja, capazes de optar preferencialmente pelo fraco, pelo oprimido, pelo pobre. Quantas possibilidades nos têm dado as leituras bíblicas dos últimos Domingos!
5�- Estamos num tempo de interrogações. O homem moderno anda desnorteado, procurando um sentido para a vida, que dificilmente encontra. O fim das ideologias e das utopias trouxe um acréscimo de inJ_arrogações. As seitas, vendedores ambulantes de sonhos, são expressão dessa interrogação em
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O PADRE EM COLABORAÇÃO E CONVÍVIO COM OS LEIGOS
que vive mergulhado o homem moderno. Temos de ter padres que estejam seguros da sua própria identidade e que sejam fontes de resposta. Exemplo de coerência, imagem do ser humano feliz e realizado no seu ministério.
Vivência. Uma criança operada várias vezes à bexiga, continua pior que antes. A mãe foi apenas uma vez à IURD e deixou de lá ir. A resposta a esta situação encontra-se na Bíblia - Lc.ll, 24-26: "Quando o Espírito imundo sai dum homem, vagueia por sítios áridos em busca de repouso, e não o encontrando, diz: Voltarei para minha casa de onde saí. Ao chegar, encontra-a varrida e arrumada. Vai então e toma consigo outros sete espíritos piores do que ele; e, entrando, instalam-se ali. E o estado final daquele homem torna-se pior do que o primeiro". Esta é a passagem base da IURD para que as pessoas voltem outra e outra vez e sempre.
O padre não é para si, mas para os outros. Por isso, ele tem de estar permanentemente perto dos homens, perto da cidade dos homens, mergulhado nos seus dramas. O bom pastor é aquele que reúne o rebanho pela palavra, pela fé e pelo testemunho.
Será que queremos manter os mesmos comportamentos? A sociedade está em mudança. Vivemos tempos novos, podemos alterar os comportamentos. Se sou fumador, posso deixar de o ser. Apesar da carga da educação que tivemos, dos ambientes que tivemos ou criámos, cada um tem a sua arte, o seu jeito e sobretudo a força de vontade e a graça do chamamento àquilo a que o Senhor o consagrou. Sopramos a cinza, avivamos as brasas e incendiamo-las com o fogo do Espírito.
Que o Senhor nos ajude a sermos servos, pastores, condutores e membros do Povo de Deus a fim de transformar a Igreja em autêntico Sacramento de Fé e Salvação.
P. Alcides Rocha dos Santos Neves
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DIZER DEUS HOJE!?
O PADRE NO DIÁLOGO COM OS OUTROS HOMENS E MULHERES
1 - A questão de Deus
1. A nominação de Deus
A um jornalista que lhe perguntou se acreditava em Deus, Einstein terá respondido: "primeiro explique-me o que entende pela palavra 'Deus' e dir-lhe-ei se creio nele!"
2. A contestação de Deus
"Esta contestação foi reforçada pela percepção de que esse Deus omnipotente estava inteiramente de acordo com um certo estado de coisas na sociedade. De facto, percebeu-se a função que exercia esse Deus como garantia de uma ordem estabelecida, intensamente conservador, tanto no mundo como na Igreja."
"Não faltam exemplos do papel desempenhado por essa imagem de Deus na conservação da ordem das coisas, no qual as noções de ordem e de hierarquia são privilegiadas, ao mesmo tempo que as disparidades sociais se encontram inteiramente ocultas ou justificadas".
"A contestação da função social exercida por esta imagem de Deus acaba por tornar impossível crer em tal Deus. Se há um Deus, se Deus é Deus, ele só pode ser diferente: um Deus gratuito, do qual não nos podemos servir, dizíamos nós. É preciso acrescentar: um Deus não apreensível pelo pensamento, um Deus não manipulável pelo homem, um Deus que não seja garantia da dominação e da opressão do homem pelo homem, mas um Deus l:vre para homens livres que constroem a história".
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DIZER DEUS HOJE!? -------------------
" São estas algumas das reivindicações da nominação de Deus na nossa cultura. Não podemos evitá-las: elas são pontos de partida obrigatórios da questão de Deus, hoje". (1)
3. A função purificadora do Ateísmo
" O ateísmo moderno exerceu uma função purificadora na teologia. O que já não sustentámos por Deus? O que já não concedemos por Deus? O que já não dissemos e fizemos em nome de Deus? Quantas vezes refizemos Deus à nossa imagem! Para o futuro, semelhante idolatria é-nos proibida. A contribuição positiva do ateísmo moderno reside na purificação enérgica . . . na rejeição de qualquer idolatria. O filósofo cristão Jean Lacroix escreve: 'se tenho tanto reconhecimento para com os meus amigos ateus é porque me ensinaram a não banalizar . . . É esse o seu efeito positivo de purificação e aprofundamento da fé". (2)
4. A intuição do Divino
Não darei o Teu Nome (3)
I
Não darei o Teu nome à minha sede De possuir os céus azuis sem fim. Nem à vertigem súbita em que morro Quando o verito da noite me atravessa.
1. Cfr Dominique Morin, Para falar de Deus, Ed. Loyola, 1993, São Paulo, pág. 32.
2. Cfr. Idem, pág. 33.
3. Sophia de Mello Breyner Andresen, Antologia, Porto 1985.
1 00 __ __ __ ________________ _____ _____ ____ __ __ __ _
------------------- DIZER DEUS HOJE!?
Não darei o Teu nome à limpidez De certas horas puras que perdi. Nem às imagens de oiro que imagino, Nem a nenhuma coisa que sonhei.
Pois tudo isso é só a minha vida. Exalação da terra, flor da terra, Fruto pesado, leite e sabor.
Mesmo no azul extremo da distância, Lá onde as cores todas se dissolvem, O que me chama é só a minha vida.
II
Tu não nasceste nunca das paisagens, Nenhuma coisa traz o Teu sinal, É Dionysios quem passa nas estradas E Apolo que floresce nas manhãs.
Não estás no sabor nem na vertigem Que as presenças bebidas nos deixaram, Não Te tocam os olhos nem as almas, Pois não Te vemos nem Te imaginamos . .
E a verdade dos cânticos é breve Como a dos roseirais: exalação Do nosso ser e não sinal de Ti.
III
A presença dos céus não é a Tua, Embora o vento venha não sei de onde. Os oceanos não dizem que os criaste, Nem deixas o Teu rasto nos caminhos.
Só o olhar daqueles que escolheste Nos dá o Teu sinal entre os fantasmas.
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DIZER DEUS HOJE!? -------------------
Vens, e não sonho mais, Quebra-se a onda no penedo austero. E o mar recua, sem haver sinais De que te quero.
Não sei amar, ou amo o que me foge. Já com Deus foi assim, na juventude: Dei-lhe a paixão que pude Enquanto o namorava na distância: Depois, ou medo, ou ânsia De maior perfeição, Vi-o junto de mim e fiquei mudo. Neguei-lhe o coração, E então perdi-o, como perco tudo.
2 -A Igreja em questão
O que está em causa, não é tanto a relação mais ou menos difícil entre a Igreja e o Mundo, é antes, a relação complexa entre Deus e o Homem, onde a Igreja perdeu espaço e para muitos deixou de contar como mediação.
Neste momento a Igreja vive permanentemente confrontada com um processo que lhe está a ser movido, quer externa quer internamente.
Ad extra:
* As críticas são severas e exigentes. Acusa-se a Igreja de não ser suficientemente espiritual e de não se empe-
4. Miguel Torga, Antologia poética, Coimbra 1981, 175.
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nhar na busca de Deus. No limite, alguns afirmam ser a Igreja um obstáculo para a procura de Deus. Outros julgam preferível arriscarem-se sozinhos na busca do Absoluto.
* Todavia, importa saber que Deus se procura e se este ainda será o Deus de Jesus Cristo. É importante saber discernir: aquela postura, por um lado, expressa a rejeição da Igreja - enquanto instituição - e por outro, lança-lhe um enorme desafio: como ajudar os nossos contemporâneos, a fazer uma experiência espiritual profundamente comprometida com a realidade?
O Vaticano II, na Constituição Gaudium et Spes, fez-se eco deste mal estar, reconhecendo que "na génese do ateísmo os crentes podem ter tido parte não diminuta, na medida em que, pela negligência na educação da sua fé, ou por apresentações erradas da doutrina, ou ainda pelas deficiências da sua vida religiosa, moral e social, se pode dizer que taparam o autêntico rosto de Deus mais do que o revelaram"(G.S., 19,2)
Ad intra:
* Estas críticas consideram a Igreja desumana, incapaz da compreender verdadeiramente o mundo actual na sua complexidade e incertezas.
*Acusam a Igreja de uma falta da confiança no homem, de ter medo do mundo real, de não aceitar a sua autonomia, de anunciar um Deus alienante, não um Deus de Amor.
* Se estas afirmações podem pecar por excesso, o certo é que são católicos a referi-lo e a salientar o facto de que, em muitas ocasiões a palavra da Igreja não inspira confiança, nem é entendida como palavra de esperança.
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DIZER DEUS HOJE!? -------------------
Também o Cardeal Daneels, no Sínodo Extraordinário sobre o Concílio Vaticano II, afirmava: " temos alguma responsabilidade na acusação que os j ovens nos fazem ao dizer que a Igreja é uma simples instituição - e explica - talvez tenhamos perdido demasiado tempo a falar de renovamento das estruturas externas da Igreja e menos de Deus e de Jesus Cristo" (D.C. 5/1/86, p. 37).
O que aconteceu é que tantas vezes se deram respostas a perguntas que as pessoas não fizeram ou não estavam interessadas e as grandes questões que as preocupavam, foram sendo ignoradas.
Parece-nos pois que a Igreja deve deixar de falar tanto de e em si, para falar mais de Deus ao homem e do homem a Deus, procurando abrir aquele ao mistério total da sua existência.
Contudo, devemos ser justos connosco mesmos. Hoje a Igreja está diferente e a evoluir positivamente ao encontro do homem.
3 -A questão do Homem
Vive-se uma crise antropológica profunda. Assiste-se ao declínio das ideologias do progresso. Percebe-se a crise da razão técnica. Emerge o sujeito incerto, sem confiança na sua liberdade e sem esperança no futuro!
1. De como aqui chegámos ...
"Descartes escreveu o Discurso do Método. ( . . . ) Quiseram as gerações que o leram ao longo de mais de trezentos anos ver nele uma nova trindade: a da Ciência, a da Tecnologia e a da Razão. Nessa novíssima trindade, a Ciência era eterna como o Pai, a Tecnologia ia salvar-nos como o Filho e a Razão iluminar-nos como o Espírito Santo.
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Durante estes três séculos e meio, batalhámos para inventar um substituto para Deus e, sempre que o fazíamos, invocávamos o Discurso do Método. E tanto lutámos que hoje cá estão os substitutos técnicos de Deus: o poder e o dinheiro.
Com eles construímos um mundo de terror de tal maneira medonho que as nossas mulheres têm medo de ter filhos porque não sabem avaliar qual o seu futuro, e nós, homens, não queremos ser pais. Não existe, para qualquer espécie, maior medo do que este.
Mas também não admira. A crença absoluta na nova trindade trouxe de volta as três ameaças sistemáticas ao bem estar da humanidade: a fome, a guerra e duas pestes, droga e sida. E sempre que estes três Cavaleiros do Apocalipse cavalgam sobre o Planeta, nele se instala a desavença, a descrença, a pobreza e o fim da esperança.
E, no entanto, o homem que escreveu o Discurso do Método começava as suas aulas assim: "Ontem, um Anjo disse-me . . . " Ora, os Anjos iniciam, sempre, as suas mensagens com: " Não tenhais medo . . . " É que eles sabem que há o Primeiro Cavaleiro do Apocalipse, que parte sempre para as novas vitórias da Renascença". (5)
2. Os sinais da crise
A "razão" está a descobrir-se mutilada da sua dimensão essencial; ela começa a perguntar pelos fins e não só pelos meios: que responsabilidade para com as futuras gerações na gestão dos recursos naturais? que desenvolvimento económico, dado o aumento constante do desemprego? que estilo de sociedade estamos a criar? . . .
5 . F. Carvalho Rodrigues - Luís Ramos, Ontem, um Anjo disse-me, Pub. Europa-América, Mem Martins, 95, Págs. 13-14.
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DIZER DEUS HOJE!? -------------------
A "ciência" começa a descobrir que não pode resolver todos os problemas. Mais, a ciência positivista percebe que lhe escapam as mais altas dimensões da vida: o amor, a criação artística e a fé.
A "razão técnica", para quem tudo o que é tecnicamente possível é desejável e necessário, começa a descobrir que há limites éticos.
No final deste século, o homem não está seguro de si, nem do seu futuro, faltando-lhe até, confiança na sua própria liberdade. O homem dos nossos dias, percorre os caminhos da vida solitariamente e vive profundamente a experiência da orfandade.
4 - Sugestões
Perante o homem inquieto, devemos escutar antes de julgar, acolher antes de criticar, compreender antes de falar.
Perante a incerteza do homem, a Igreja deve ajudá-lo a não perder a confiança na sua própria liberdade e nas suas capacidades de bem e de verdade, não obstante todos os medos.
Havemos de desenvolver as fontes da nossa fé, sobretudo através da teologia trinitária.
Havemos de lutar por comunidades onde se possam oferecer uma experiências vivas de família de Deus, abertas à voz de Cristo para que se renovem na fé, no amor e na esperança.
Havemos de nos comprometer apaixonadamente, como Jesus, com a vida (esperanças e alegrias, angústias e tristezas) dos homens e mulheres de hoje, participando assim na solicitude amorosa de Deus por todos os Seus filhos e nossos irmãos.
P. Manuel Armindo Pereira Janeiro
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ACTOS EPISCOPAIS VIGÁRIOS DA VARA
Tendo presente os cc. 553 - 555 do Código de Direito Canónico, achamos por bem nomear os seguintes Vigários da Vara por um mandato de três anos:
- Vigararia da Batalha
Padre José Ferreira Gonçalves
- Vigararia de Caxarias
Padre Luís Henriques Francisco
- Vigararia de Colmeias
Cónego Manuel Simões Bento
- Vigararia de Fátima
Padre António Ramos
- Vigararia de Leiria
Padre Dr. Manuel dos Santos José
- Vigararia da Marinha Grande
Padre Júlio Domingues Vieira
- Vigararia dos Milagres
Padre Joaquim Duarte Pedrosa
- Vigararia de Monte Real
Padre Joaquim de Jesus João
- Vigararia de Ourém
Padre José Luís de Jesus Ferreira
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ACTOS EPISCOPAIS
- Vigararia de Porto de Mós
Padre Manuel Pedrosa Melquíades
Leiria, 19 de Março de 1996, Solenidade de São José
t D. SERAFIM DE SOUSA FERREIRA E SILVA Bispo de Leiria-Fátima
CONSELHO PRESBITERAL
Tendo terminado o mandato do anterior Conselho Presbiteral, e observando as normas estatutárias, achamos por bem
·nomear o novo Conselho Presbiteral, que fica assim
constituído:
Membros natos:
- Vigário Geral
Monsenhor Cónego Henrique Fernandes da Fonseca
- Chanceler da Cúria Diocesana
Cónego José de Oliveira Rosa
- Vigário Judicial
Padre Dr. Filipe Luciano de Oliveira Vieira
- Reitor do Seminário Diocesano
Cónego Doutor Américo Ferreira
Membros eleitos:
- Cabido da Sé Cónego António das Neves Gameiro
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Último quinquénio
Padre Luís Morouço Almeida Ferreira
- Equipa do Seminário
Cónego Dr. Carlos da Silva
- Santuário de Fátima
Padre Dr. Artur Ribeiro de Oliveira
ACTOS EPISCOPAIS
- Professores de Educação Moral e Religiosa Católica
Padre José Marques dos Reis
- Secretariados e Comissões
Padre Dr. António Paulo da Costa Madureira
- Espiritualidade e Apostolado
Padre Fernando Pereira Ferreira
- Padres Religiosos (Leiria)
Padre Frei José Pinto Pereira da Costa
- Padres Religiosos (Fátima)
Padre José Carlos Navais Lima
- Vigararia da Batalha
Padre Virgílio do Rocio Francisco
- Vigararia de Caxarias
Padre Manuel Ferreira
- Vigararia de Colmeias
Padre Raul Rodrigues Carnide
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ACTOS EPISCOPAIS
- Vigararia de Fátima
Padre António Ramos
- Vigararia de Leiria
Padre Manuel Armindo Pereira Janeiro
- Vigararia da Marinha Grande
Padre Sérgio Feliciano de Sousa Henriques
- Vigararia dos Milagres
Padre Joaquim Duarte Pedrosa
- Vigararia de Monte Real
Padre Isidro da Piedade Alberto
- Vigararia de Ourém
Padre António da Piedade Bento
- Vigararia de Porto de Mós
Padre Davide Vieira Gonçalves
Membros designados:
Cónego Manuel da Silva Gaspar Padre Doutor Anacleto Cordeiro Gonçalves de Oliveira Padre Dr. Luís Inácio João Monsenhor Cónego Dr. Luciano Gomes Paulo Guerra
O mandato deste novo Conselho Presbiteral é válido por três anos.
Leiria, 19 de Março de 1996, Solenidade de São José
t D. SERAFIM DE SOUSA FERREIRA E SILVA
Bispo de Leiria-Fatima
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COMUNICADO DO CONSELHO PRESBITERAL
Terminada a fase de constituição e por convocação do seu Bispo e Presidente, D. Serafim de Sousa Ferreira e Silva, o Conselho Presbiteral da Diocese de Leiria-Fátima iniciou, a 7 de Maio de 1996, o novo mandato que terá a duração de três anos, de acordo com o artigo 22 dos Estatutos.
L Conforme previsto na agenda, foi feita a eleição do Secretário. Foi eleito o P. Anacleto Cordeiro Gonçalves de Oliveira, que, por sua vez, escolheu, para integrar o Secretariado Permanente do Conselho, os P. Virgílio do Rocio Francisco e Manuel Armindo Pereira Janeiro.
Foram ainda eleitos para a Comissão Responsável pela Aplicação do Estatuto Económico do Clero os P. António da Piedade Bento, pároco em zona urbana, Davide Vieira Gonçalves, pároco em zona rural, e Artur Ribeiro de Oliveira, sacerdote do clero não-paroquial.
2. Dos ternas propostos para serem tratados em próximas reuniões, destacam-se: O Seminário Diocesano e a sua relação com a pastoral das vocações e a pastoral juvenil da Diocese; os meios de comunicação social em geral e em particular na Igreja Diocesana. Para estes ternas foi decidido pedir a colaboração, respectivamente, da equipa formadora do Seminário Diocesano e da Comissão Diocesana das Comunicações Sociais.
3. Foram ainda prestadas algumas informações sobre actividades do Secretariado Diocesano da Pastoral das Vocações. Presentemente, está a dar particular atenção à formação de animadores vocacionais, que na nossa Diocese são já cerca de 450, e a procurar urna colaboração mais estreita com o Secretariado Diocesano da Pastoral Juvenil.
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COMUNICADO DO CONSELHO PRESBITERAL ------------
A propósito dum ciclo de conferências, a realizar nas diferentes vigararias da Diocese, sobre temas que integram o guião sinodal para os jovens, reflectiu-se sobre o relacionamento da Igreja com os jovens: um relacionamento em que a Igreja não comprometa a sua unidade e identidade, mas que seja, ao mesmo tempo e tanto quanto possível, de abertura, sobretudo na fase actual do Sínodo Diocesano.
A próxima reunião ficou marcada para o dia 10 de Dezembro do presente ano.
Leiria, 11 de Maio de 1996
Em nome do Secretariado do Conselho: P. Anacleto de Oliveira
• O Papa João Paulo II estabeleceu que, a partir de agora, se acrescente à ladainha de Nossa Senhora a invocação: Rainha das Famílias, Rogai por nós. Tal invocação deve rezar-se entre as invocações Rainha do Santíssimo Rosário e Rainha da Paz. Esta alteração foi anunciada na alocução do Angelus do dia 31 de Dezembro de 1995, Festa da Sagrada Família.
• O Pólo de Leiria da Universidade Católica abriu uma nova Licenciatura: Licenciatura em Comunicação Social e Cultural. Este Curso tem por objectivos formar profissionais qualificados na área das comunicações sociais e culturais, dotados de sentido humanista e rigor deontológico.
• Segundo dados fornecidos pelo Secretariado Nacional da Educação Cristã, a percentagem de alunos inscritos em Educação Moral e Religiosa Católica, na Diocese de Leiria-Fátima, durante o ano lectivo de 1994 /95, foi a seguinte:
5!! Ano - 88,3% 9º Ano - 35,4% 6º Ano - 78,8% 10º Ano - 24,2% 7º Ano - 62,4% 11º Ano - 11,0% Bº Ano - 50,0% 12º Ano - 2,3% Total - 52,8%
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VIDA ECLESIAL
CÁRITAS PROMOVE FORMAÇÃO DE GRUPOS SÓCIO-CARITATIVOS
A Cáritas Diocesana está empenhada na criação e dinamização de grupos sócio-caritativos nas paróquias da Diocese e no aprofundamento da relação entre estes grupos e a própria Cáritas Diocesana. Nesta acção aquele organismo diocesano tem em particular atenção o desejo de cada comunidade e a abertura do respectivo pároco. As primeiras acções neste sentido foram realizadas nas Pedreiras, orientando-se para as paróquias de Pedreiras, Calvaria, Juncal e Aljubarrota. Mais recentemente, no mês de Março, foi a vez das paróquias de Ortigosa e Souto da Carpalhosa. Nesta última acção, a Cáritas Diocesana esteve presente, na pessoa do seu presidente, Ambrósio Santos, e do seu assistente, P. Albino Carreira, sendo a reflexão orientada pelo Dr. Carlos Neves, da Cáritas de Coimbra. A reflexão orientou-se, primeiramente, para o lugar da acção sócio-caritativa numa pastoral integral e para a função dos grupos paroquiais nessa pastoral. Num segundo momento, a temática centrou-se, em questões mais concretas: a dinâmica desses grupos sócio-caritativos, a função do animador, a importância do estudo do meio, as relações com outras entidades, etc. Estas iniciativas visam o revigoramento da acção sócio-caritativa na Diocese.
VII FESTIVAL DA CANÇÃO JOVEM DE MENSAGEM
No dia 3 1 de Março de 1996, realizou-se o VII Festival da Canção Jovem de M...!nsagem, no Teatro José Lúcio da Silva. Organizado pelo Secretariado Diocesano da Pastoral
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VIDA ECLESIAL -------------------
Juvenil, este Festival inseriu-se na celebração do Dia Mundial da Juventude. A celebração deste dia começou no dia 30, com um concerto de Canto Gregoriano, e continuou no dia 31 com a solene celebração da Eucaristia e, durante a tarde, com o Festival. O público encheu completamente o Teatro José Lúcio da Silva. Coube ao tenor Nino Rodrigues a abertura do Festival. Logo a seguir foi o desfile das nove canções concorrentes. O júri deu a vitória à canção nº 4, intitulada "Segredo", da autoria de Filipe Gomes, que ganhou também os prémios de melhor letra e melhor interpretação. A parte final deste Festival foi animada pela Orquestra Juvenil de Valado de Frades.
CAES E MCE DESINSTALAM ESTUDANTES
O Centro de Apoio ao Ensino Superior (CAES) e o Movimento Católico de Estudantes (MCE) promoveram, durante o mês de Março, um ciclo de conversas com o Bispo da Diocese, D. Serafim de Sousa Ferreira e Silva. Esta. iniciativa pretendia motivar o debate sobre algumas questões que mais afectam os estudantes, oferecendo-lhes oportunidades para dizerem o que pensam e serem escutados e, simultaneamente, ouvirem aquele que tem ao seu cuidado esta pequena porção do Povo de Deus, que é a Diocese de Leiria-Fátima. As "conversas" decorreram no Salão da Sé.
No mês de Abril, dias 26 a 28, o CAES juntou 22 estudantes do ensino superior de Leiria, para uma peregrinação a Santiago de Compostela. Seguindo os "caminhos de Santiago", os estudantes reflectiram sobre os caminhos da vida, com os seus vários momentos e etapas, e os seus próprios caminhos. O grande desafio foi "partir" e ir ao "encontro" de si mesmo e dos outros.
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ESCOLA TEOLÓGICA DE LEIGOS PROMOVE JORNADA
No dia 15 de Junho, a Escola de Formação Teológica de Leigos promoveu a realização de uma Jornada de encerramento do ano lectivo de 1995/96, no Seminário Diocesano. Do programa destacava-se uma reflexão sobre "comunicação e diálogo na Liturgia" e um sarau musical, com a participação de alunos e professores do Curso de Formação Musical Litúrgica, ministrado, pela primeira vez, este ano. A reflexão sobre a "comunicação e diálogo na Liturgia", seguida de um momento de diálogo, foi orientada pelo P. Dr. Pedro Lourenço Ferreira, membro do Secretariado Nacional de Liturgia, que, durante este ano, leccionou nesta Escola. O sarau musical, a que assistiu mais de uma centena de pessoas, foi animado pelos cerca de 30 alunos que, durante este ano lectivo, frequentaram o Curso de Formação Musical Litúrgica. Recorde-se que este Curso esteve aberto a todas as pessoas que quiseram iniciar ou aprofundar a sua formação musical, em ordem à tarefa de cantores, animadores de canto, salmistas e organistas nas celebrações litúrgicas das paróquias ou outras comunidades cristãs. Depois deste primeiro ano de leccionação, a Escola pretende continuar com este Curso, pois "corresponde a uma necessidade manifesta e urgente das comunidades paroquiais. O desejo de renovação litúrgica é uma constante dos grupos sinodais, e a consciência de missão dos leigos deve ser estímulo também na celebração da fé".
A Escola de Formação Social Ruml de Leiria festejou, no dia 29 de Junho, os seus 40 anos de existência. Embora só tenha sido reconhecida oficialmente em 1958, foi fundada em 1956 por Mons. José Galamba de Oliveira. Do programa das comemorações constavam a celebração da Missa, com a bênção e distribuição de diplomas a finalistas, o almoço de confraternização e uma sessão cultural e recreativa.
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PADRE MANUEL LUÍS MAÇO
Faleceu no dia 13 de Junho, no Hospital de Santo André, de Leiria, o P. Manuel Luís Maço.
O P. Manuel Luís Maço nasceu no Outeiro da Vinha (Ranha de S. João), freguesia de Vermoil, no dia 26 de Dezembro de 1929. Foram seus pais Manuel António Maço e Conceição das Neves. Ingressou no Seminário Diocesano de Leiria em 14 de Outubro de 1942 e aí concluiu os estudos em 1953. Foi ordenado presbítero em Julho desse mesmo ano, por D. José Alves Correia da Silva, na basílica do Santuário de Fátima.
Um mês depois da ordenação, foi nomeado pároco de Carvide. Recebeu a nomeação para pároco do Juncal no dia 29 de Dezembro de 1969, desempenhando também, ao longo de todo o ano de 1978, o múnus de pároco interino de Cós. Em 6 de Janeiro de 1979 foi nomeado pároco da Azoia, acumulando, desde 24 de Maio de 1987, com a paroquialidade da Barosa. Simultaneamente, ficou com a responsabilidade de administrar as propriedades rústicas do Seminário Diocesano.
Em Setembro de 1990 deixa os cargos anteriores, para assumir a paroquialidade dos Milagres e, com a criação da paróquia da Bidoeira, também esta última.
No final do mês de Setembro de 1995, retirou-se da paróquia dos Milagres, por motivos de saúde, e foi viver para a Casa Diocesana do Clero, em Fátima.
O QUE ANDA A FAZER S. GREGÓRIO?!
ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE O PAPEL DA IGREJA DIOCESANA
.DE LEIRIA-FÁTIMA
NA CRIAÇÃO DE REFERÊNCIAS MUSICAIS
O presente texto consiste numa reflexão sobre alguns dos aspectos da música e do canto nas missas da Diocese de Leiria-Fátima, e seu contributo para a definição de práticas que se constituem como referências musicais na cultura de toda a região. As ideias que aqui se apresentam não são o resultado de nenhum estudo ou investigação em particular, que de resto urge empreender, mas tão somente fruto de uma observação vivencial das nossas celebrações litúrgicas. Algumas das relações que se equacionam poderão não ser necessariamente as mais fecundas e relevantes, e muitas das ideias propostas podem vir a evidenciar-se completamente infundadas com o necessário estudo aprofundado que importa fazer sobre cada uma das matérias em causa.
Os sons do berço
Todas as mensagens acústicas são de uma importância determinante para a vida da pessoa humana. O espaço sonoro que permanentemente nos envolve está carregado de significados, quer para as tarefas simples do nosso quotidiano, quer para a nossa própria sobrevivência. É desde muito cedo que o sistema auditivo começa a captar e processar todos os sons que o rodeiam, começando pelo bater do coração da mãe ainda no seu ventre, pulsação essa que por isso se torna na sua primeira referência rítmica.
Se nos primeiros meses de vida construímos as nossas referências sonoras pessoais (identificando os diferentes
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O QUE ANDA A FAZER S. GREGÓRIO?!
tipos de voz dos nossos familiares em função da sua disposição, memorizando os "ruídos" normais de casa e do espaço que nos envolve, imitando e repetindo os primeiros sons que nos são dirigidos, etc.) aprendemos rapidamente nos primeiros anos a associar sons e a entender estruturas sonoras, estas, já não só individuais, mas parte integrante de toda a comunidade que habitamos.
Tenhamos agora em conta uma só dessas estruturas, a MELODIA, não só por ser uma das mais importantes, mas também por ser aquela que, no contexto do presente assunto, mais nos interessa (por melodia entende-se aqui uma sequência de sons com diferentes alturas). São melodias as estruturas musicais que mais reproduzimos enquanto crianças, e que maioritariamente continuamos a utilizar ao longo da nossa vida. Contudo, o gosto por reproduzir melodias com a voz, o gosto por cantar, não é comum a todas as pessoas. O que poderá estar na origem do desenvolvimento deste gosto? Será um gosto ou uma aptidão? Porque razão, ou razões, aqueles que gostam de cantar, ou até aqueles que não cantando gostam de ouvir, preferem determinadas melodias em desfavor de outras?
Embora extremamente complexas e ainda não definitivas, as respostas a estas perguntas dividem-se em dois tipos de abordagem: aqueles autores (particularmente nos primeiros anos do nosso século) que acreditam na relação entre o gosto por determinados aspectos melódicos em termos das propriedades fisicas dos intervalos musicais (1), a que pode-
1. MEYER, M, Elements of a Psychological Theory of Melody, Psych. Rev.,7:241, 1900. HORNBOSTEL, Erich M. von e ABRAHAM, Otto, "Studies on the tonsystem and music of the japanese", in Hornbostel Opera Omnia, Klaus Wachsmann, et ai. eds. e tras. (The Hague: Martinus Nijhofl), pp. 1-83, 1903. LIPPS, T, Psychologische Studien, Durrsche Buchhandlung, Leipzig, 1905.
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O QUE ANDA A FAZER S. GREGÓRIO?!
mos chamar uma abordagem psico-fisica, e aqueles que atribuem condicionalismos de ordem cultural aos fenómenos do gosto por determinado tipo de intervalos e melodias (2). Os estudos mais recentes feitos no domínio da teoria da aprendizagem musical parecem contudo reforçar esta segunda abordagem (3), tornando especialmente significativas as práticas culturais onde a música intervém.
Nada do que atrás foi dito seria muito relevante para a presente reflexão, se a missa dominical não fosse actualmente frequentada na Diocese de Leiria-Fátima por 56,1% da população (cerca de 145.860 pessoas) (4). Isto quer dizer que, todas as semanas, distribuída pelas 373 missas dominicais, mais de metade da população da nossa diocese participa numa celebração de uma hora, ao longo da qual a música ocupa um lugar de grande destaque.
A regularidade na frequência à missa, e a grande quantidade e diversidade de repertório nela interpretado, faz com que exista um corpo de, pelo menos, 100 melodias, que permanecem vivas em todas estas pessoas, e que por elas são fácil e imediatamente identificadas. Estamos pois perante um largo património musical colectivo muito específico, permanentemente posto em prática. Mais importante é o facto de as crianças começarem a assistir à missa desde muito novas. Quando ainda não lhes foram ensinadas na escola as primeiras canções, quando ainda não conhecem as lengalen-
2. LUNDIN, R.W.,An Objective Psychology o(Music, 21 ed., The Ronald Press Company, Nova Iorque, 1967.
3. GORDON, Edwin, Learning Sequences in Music, Chicago, GIA Publications, 1993. GORDON, Edwin, The Nature Description, Measurement and Evaluation of Music Aptitude, Mainz, Schott, 1986
4. Valores provisórios obtidos pelo inquérito realizado pela Comissão Central do Sínodo Diocesano.
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gas infantis, estão já expostas a géneros e formas musicais tão complexas como as que acontecem na celebração da liturgia eucarística. É certo que em casa estão igualmente rodeadas por espaços acústicos diversos, particularmente a rádio e a televisão, porém, com significados muito diferentes deste "espectáculo ao vivo" que também é a missa, no qual todos participam activamente.
Porém, o papel da música e do canto nas celebrações da Igreja ultrapassa em muito a sua dimensão litúrgica. Não bastasse essa sua importância celebrativa, só por si a merecer a maior das atenções, tem ainda uma função pedagógica e cultural de enorme relevo. Por isso acresce a responsabilidade da Igreja na composição, preparação e interpretação da sua música. Não se pense que as consequências do nível musical praticado nas nossas igrejas se fazem sentir somente em celebrações mais ou menos dignas, pois têm resultados culturalmente muito mais amplos.
O canto litúrgico é um dos principais meios de Formação Musical das pessoas da nossa diocese. Esta formação dá-se não só com a tomada de consciência, pelo contacto directo, de estruturas melódicas e princípios interpretativos, mas também pelo facto de todo este processo ser simultâneo ao acto de cantar. O canto ainda é, na nossa cultura, a forma mais imediata e completa de fazer formação musical. Para muitos, os momentos cantados nas missas de Domingo vieram substituir, ou permanentemente relembrar, a disciplina existente no antigo sistema educativo denominada Canto Coral. Ainda que por vezes limitativa, a prática de cantar em conjunto consiste num meio privilegiadamente potencial para fazer e ensinar música. Longe vão os tempos em que abundavam as oportunidades para se cantar em grupo. A maior parte das actividades rurais que a isso se proporcionavam, como a apanha da azeitona, as vindimas, as escamisadas, as romarias e as festas tradicionais, quase desapareceram por
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O QUE ANDA A FAZER S. GREGÓRIO?!
completo do nosso meio. Os "parabéns" nas festas de aniversário e o "Hino Nacional" em cerimónias desportivas são dos raros momentos onde ainda se canta em grupo. Parecendo contrariar esta tendência, as missas dominicais continuam a proporcionar regularmente o canto colectivo entre um conjunto muitíssimo diversificado de pessoas. Af não importam as condições sociais nem as idades. Melhor ou pior, todos dominam uma enorme diversidade e complexidade de repertório, que, dentro de determinadas regras, interpretam sem qualquer motivo de inibição.
A Missa: Alguns momentos históricos na sua música
Na história da "Música Ocidental Erudita" a palavra Missa pode designar a cerimónia litúrgica ou, mais frequentemente, um género musical. Enquanto género musical, a missa é o conjunto das rúbricas do ordinário originalmente cantadas em Concentus, ou seja, com música própria para todo o texto: "Kyrie", "Gloria", "Sanctus", "Credo", "Agnus Dei", e por vezes "Ite Missa est". Datam do séc. XIV as primeiras missas como género musical, sendo a célebre "Messe de Notre Dame" de Guillaume Machaut, o primeiro conjunto conhecido das rubricas do ordinário tratadas polifonicamente, escritas por um só compositor com uma aparente unidade estilística, e por isso, considerada a primeira de todas as missas (5). Até aí para se cantar uma missa, além do Canto Gregoriano, a prática corrente era a de escolher de di�
ferentes fontes cada uma das rúbricas necessárias. Então, os compositores escreviam "Kyries" ou "Glorias", mas não pensavam na missa como uma sequência musical coerente e
5. REESE, Gustave, Music in the Middle Ages, Nova Iorque, Norton, 1940, pp. 356.
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O QUE ANDA A FAZER S. GREGÓRIO?!
inalterável de cada um desses momentos, ao contrário do que passou a verificar-se depois do sec. XIV. Estamos no início da época nobre da polifonia vocal religiosa. Os compositores dos séculos XV, XVI e XVII, particularmente dos dois primeiros, foram os que mais missas escreveram. Porém, com o decorrer dos séculos XVIII e XIX, a Igreja - as suas instituições de ensino, os seus compositores e intérpretes - deixa de liderar a criação musical erudita ocidental. A Corte e a Burguesia tomaram o seu lugar. Assiste-se então a um afastamento da missa enquanto género musical da celebração litúrgica que lhe deu origem.
Na actualidade vivemos muito mais próximos das práticas anteriores ao séc. XIV. Entenda-se: não existem missas compostas como um todo, simplesmente existem livros de cânticos "avulso", de onde se escolhem com mais ou menos critérios as rúbricas do próprio e do ordinário, sendo o resultado final um todo sem aparente relação musical entre si. Também não são as rúbricas do ordinário que mais preocupam os coros paroquiais, mas sim as do próprio: "Entrada", "Salmo", "Aleluia", "Ofertório" e "Comunhão", para além dos cânticos de "Acção de Graças" e "Final". Facilmente se verifica porquê: a preocupação não reside em aspectos puramente musicais, mas sim na adequação dos textos dos cânticos às respectivas leituras do dia. Hoje, na generalidade da Igreja Católica e particularmente na Igreja Portuguesa, já não se compõem "Missas" nem mesmo música sacra, escrevem-se cânticos para determinados momentos ou para determinadas celebrações.
A Diversidade de Estilos
Nos finais dos anos 70 e inícios da década de 80, um pouco por todo o país, os cânticos da missa acusam uma grande
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influência da música profana (embora em determinados momentos da história a música religiosa seja menos permeável a influxos das práticas musicais profanas, é permanente esta influência mútua). Este fenómeno deveu-se em grande parte á Revolução do 25 de Abril de 1974. O país passou a ter acesso e a manifestar interesse por uma maior quantidade e diversidade de géneros musicais, e, neste contexto, tem particular significado a procura de uma música tradicional portuguesa por parte de grupos de revificação e divulgação de práticas musicais consideradas em vias de extinção. Simultaneamente, assistimos no nosso país a uma "liberalização" da prática musical nas missas, com um lugar muito mais participativo das camadas jovens nos grupos corais, entretanto também mais motivados para a sua responsabilidade litúrgica. Esta liberalização, mais evidente em dioceses como Aveiro e Setúbal, também se dá na então Diocese de Leiria com o uso frequente de instrumentos característicos da música profana (como as guitarras eléctricas e as baterias) bem como com a inclusão de linguagens consideradas pela Igreja como não litúrgicas (um pouco o que havia acontecido nos anos 60 por toda a Europa). É uma época onde é frequente não se distinguir cântico litúrgico (música e texto escritos especificamente para um momento da Santa Missa ou do Ofício Divino) de canção religiosa (música em qualquer estilo sobre um texto de temática religiosa, escritos normalmente para encontro.s de convívio e frequentemente disponíveis no mercado discográfico). Em toda a nossa diocese as canções do Pe. Zezinho (o conhecido autor brasileiro de músicas e textos para jovens) divulgadas em disco e cassete, e pelo cancioneiro Canta Amigo Canta (6), são frequentemen-
6. Padre JOSÉ AUGUSTO (coleccionador), Canta Amigo Canta, 3ª ed., Missionários Combonianos ed., Coimbra, 1975.
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te utilizadas nas missas de então. Da mesma forma encontramos a utilização de espirituais negros, melodias de canções populares norte americanas, muitas vezes com novos textos que nada têm a ver com os originais. Algumas destas adaptações ainda hoje se cantam em paróquias da nossa diocese.
Com o abrandar dessa grande dinamização das chamadas músicas popular e tradicional, na 2ª metade da década de 80, os cânticos das celebrações na Diocese de Leiria-Fátima voltam a aproximar-se daquilo que é reconhecido pela Igreja Diocesana como um estilo mais litúrgico, ainda que seja extremamente complexo definir este estilo sem um estudo aprofundado do tema (1). Adiante daremos algumas referências mais específicas sobre esta classificação.
Também não podemos desprezar os "cantos tradicionais" que algumas paróquias ainda cantam em tempos litúrgicos específicos. Seja no Advento e Natal, ou Semana Santa, cada comunidade guarda ainda lugar para determinados can-
7. Introdução à colectânea de Cânticos mais utilizada na Diocese: . . . É por de· mais evidente que nem todos os cânticos, mesmo de mensagem cristã, se ajustam a este conjunto de funções pr6prias do canto litúrgico. É que estas têm implicações ao nível da melodia e do texto. Há por aí, em uso nas cele· brações eucarísticas, muitos cânticos que não se coadunam minimamente com o espírito que as deve animar. A "Assembleia Viva" tem como finali· dade retomar o que de melhor se publicou entre n6s, ao n[vel do canto li· túrgico, quer num passado recente quer num passado um pouco mais remoto, contribuindo para a dignificação das nossas celebrações litúrgicas e para expurgar delas os cânticos que não se ajustam às características acima indicadas. Pretende ainda criar unidade ao nível da letra. (Alguns cân· ticos aparecidos originalmente noutras línguas, são cantados entre n6s em várias versões, dando origens a situações de confusão e mal estar, quando cantados em encontros com elementos de várias comunidades, usando versões diferentes). SECRETARIADO DIOCESANO DA CATEQUESE, As· sembleia Viva, Seminário de Leiria, s.d.
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tos, mantidos na tradição oral por algumas pessoas, e para os quais não se encontram músicas nos livros conhecidos e utilizados pelos grupos corais. De entre estes destacam-se alguns "cantos para as almas", comumente ouvidos nas missas de "Sábado de Aleluia". Temos também como exemplo do encontro entre as tradições oral e escrita, a festa de Nossa Senhora do Fetal na freguesia do Reguengo, na qual se cantam ladaínhas em forma responsorial entre a banda filarmónica que faz a festa e algumas mulheres da terra que mantêm esta tradição. As filarmónicas que aí se deslocam vão passando entre si as partes instrumentais e vocais necessárias, sem saberem muito bem a sua origem, enquanto algumas mulheres da terra lideram as respostas que toda a assembleia dá aos filarmónicos. As ladaínhas cantadas no Reguengo Fetal parecem ser uma adaptação de uma possível ária de ópera, não tendo qualquer relação com os tons salmódicos gregorianos normalmente utilizados, nem com uma possível adaptação de música popular.
Contudo, para além dos diferentes estilos musicais dos cânticos que temos vindo a abordar, sejam eles popular, tradicional, adaptação, litúrgico, etc., outros momentos musicais substancialmente diversos existem na missa. Falamos do ordinário que recorre ao Canto Gregoriano. ((A Igreja reconhece como canto próprio da liturgia romana o canto gregoriano . . . " (8). É frequente, de maneira particular nos dias festivos, mas não só, que o celebrante cante algumas rúbricas com as fórmulas do canto gregoriano, e que imediatamente têm resposta de toda a assembleia. Aquele que é ainda hoje o canto oficial da Igreja, mesmo não sendo utilizado na totalidade da missa, continua activo nas nossas celebrações.
8. Concílio Ecuménico VATICANO II, SC 116.
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A enorme riqueza e o cuidado da criação musical na Igreja de séculos passados podem suscitar interessantes estudos de ordem musicológica, mas, como podemos observar, a missa deste fim de século não deixa de nos oferecer um complexo e muito diverso conjunto de elementos musicais, que igualmente apelam por uma análise cuidada. Numa análise musical da Missa dos nossos dias deve ainda ter-se em conta que apesar da nossa diocese apresentar alguma uniformidade celebrativa, é constituída por comunidades muito distantes geográfica e culturalmente, e, por isso, as missas e o canto em cada uma das paróquias assumem características muito diferentes.
Outras Dimensões Musicais da Missa
Antes de mais a noção de tempo, ou de tempos. Devemos começar por considerar um "tempo longo" - a duração de toda a missa, e diversos "tempos curtos" correspondendo a cada uma das rúbricas que a constituem. As nossas missas dominicais têm uma duração muito regular, aproximadamente de uma hora. Aprendemos por isso a sentir este tempo longo como o normal, ainda que nas missas semanais e em determinados momentos festivos possa ser, respectivamente, menor ou maior. Existem depois, dentro deste, tempos curtos, o maior dos quais é normalmente o da homilia. No decorrer do tempo longo alternam muitas "texturas sonoras", e dizemos texturas sonoras porque a análise musical da celebração da missa vai muito para além do canto. Temos a voz do celebrante falada a solo (homilia, etc.), a voz do celebrante cantada a solo (momentos diversos), as vozes da assembleia faladas a solo (leituras, oração dos fiéis), a voz da assembleia cantada a solo (salmo, aleluia), o coro a solo Clº refrão e versículos da generalidade dos cânticos) e em conjun-
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to com a assembleia. Esta ainda recita em conjunto e responde recitando e/ou cantando ao celebrante, e todas as rúbricas cantadas podem ou não ser acompanhadas por órgão ou outros instrumentos. Existe finalmente a música instrumental pura, com órgão solo ou a acompanhar instrumentos.
Todas estas texturas sonoras alternam entre si, conferindo no seu encadeamento um equilíbrio próprio ao tempo longo da celebração. Em cada comunidade existem igualmente andamentos específicos para cada tempo curto, seja um tempo cantado ou recitado. É comum encontrarem-se em diferentes paróquias interpretações do mesmo cântico com andamentos substancialmente distintos, e também todas as comunidades conhecem o incómodo de ter um celebrante novo que altere, ainda que ligeiramente, o andamento da recitação do Credo ou do Pai Nosso.
Por tudo isto, a celebração da missa tem um equilíbrio formal e uma pulsação muito próprios que a história apurou ao longo dos séculos. Só nos damos conta desse equilíbrio quando algum dos tempos é alterado. O andamento dos textos recitados é sempre regular em cada comunidade, ainda que admita ligeiras alterações. Como exemplo, a recitação e interpretação do Credo pode variar numa assembleia, em função da maior ou menor brevidade da homilia que o antecede, bem como pelo conteúdo e carácter da mesma.
Abordando ainda e só os momentos recitados, sejam mais curtos, como as breves respostas ao celebrante pela assembleia, ou mais longos como o Glória ou o Credo, note-se que o andamento e o ritmo destes momentos são criados e interpretados colectivamente. Um novo celebrante pode tentar condicionar e alterar o andamento de recitação de uma comunidade, mas quando tal acontece assistimos a um enorme desequilíbrio na assembleia, com a sobreposição daqueles que mesmo perturbados procuram seguir o celebrante, e os outros que não conseguem ou simplesmente não o querem
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fazer. Em cada comunidade existe ainda um conjunto maior ou menor de pessoas que normalmente lidera a assembleia iniciando as recitações, marcando com isso o andamento de recitação, mas nunca o fazendo fora da média ponderada de todas as pessoas. Este andamento não só é aferido na recitação dos textos da missa, como também em outras celebrações comunitárias, assumindo aqui particular destaque as récitas do terço comuns em todas as nossas comunidades.
Um outro aspecto igualmente importante nas rúbricas cantadas da missa é a sua relação com os tempos litúrgicos. A Música em si não se constitui como especificidade do tempo litúrgico, isto é: aparentemente, os cânticos parecem estabelecer relação com a liturgia só através do seu texto literário, estando o texto musical desvinculado deste processo. Contudo, o grande corpo de melodias utilizadas distribui-se por um ciclo anual. Havendo algumas melodias que permanecem activas ao longo de todo o calendário, existe, porém, uma grande percentagem que só se canta em determinado período do ano. Existem por isso edições de colectâneas de cânticos específicas para os principais tempos litúrgicos: o Advento e Natal, a Quaresma e a Semana Santa. Este facto contribui para que se associem, de forma mais ou menos consciente, determinados cânticos às estações do ano em que são cantados. Quando o desconhecimento do cântico apropriado ou determinada cerimónia obrigam a recorrer a um outro cântico, específico de um tempo litúrgico diferente, invoca-se de forma mais ou menos consciente não só o ambiente litúrgico a que originalmente pertence, como também muitos aspectos do quotidiano em que se verifica esse mesmo tempo litúrgico, como a temperatura, as chuvas, as colheitas, as programações televisivas, etc.
Assim, para além do tempo longo (a duração normal da missa, uma hora) e dos diversos tempos curtos, podemos ainda considerar a existência de mais um tempo, corresponden-
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do a um ano, o tempo muito longo. Este tempo muito longo é, no que respeita à forma, a maior unidade de análise, relacionando-se de maneira mais ou menos evidente com cada um dos outros tempos, sendo a sua percepção alterada ao longo da idade. Uma criança que assiste à missa de todos os Domingos rapidamente se apercebe que há determinados textos e cerimónias que se repetem ano após ano. Igualmente verifica que para cada um desses momentos existem cânticos diferentes. No entanto, só ao fim de alguns anos litúrgicos percebe que nunca se canta o Aleluia na Quaresma e Semana Santa. Passa então a sentir esse ciclo como a estrutura mãe de toda a música litúrgica. Como numa espiral, os cânticos sucedem-se e renovam-se ao longo dos anos, mas caminham de Advento em Advento, de Páscoa em Páscoa, sempre num ciclo interpretativo muito preciso e pontoado pelos tempos litúrgicos mais importantes.
O Cónego Carlos Silva e o Santuário de Fátima
Na nossa diocese a música litúrgica é marcada por duas forças polarizadoras complementares, que traçam os seus principais critérios de criação e interpretação: Carlos Silva e o Santuário de Fátima.
É essencialmente enquanto compositor que o cónego Carlos Silva marca não só a música litúrgica da diocese bem como a de todo o país. Apesar de não ser um compositor excepcionalmente activo, as suas obras ocupam um lugar de grande destaque no livro de cânticos actualmente mais utilizado pelos coros paroquiais de L�iria-Fátima, Assembleia Viva. (Note-se que pertence a este livro a numeração dos cânticos para a missa de cada Domingo semanalmente divulgados e aconselhados r.alos órgãos diocesanos de comunicação social). De um universo de 394 melodias, o autor
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mais representado é o Padre Manuel Luís - 25,1% (9), seguido de Carlos Silva - 2 1,3%, adaptações de autores estrangeiros - 9,3%, Cón. Ferreira dos Santos e C. Gabarain com o mesmo valor - 3,0%, e distribuindo-se a restante percentagem por mais de 30 autores (1°).
Compositor %
Manuel Luís 25,1%
Carlos Silva 2 1,3%
Adaptações de autores estrangeiros 9,3%
Ferreira dos Santos 3,0%
C. Gabarain 3,0%
Outros 38,3%
Distribuição percentual dos principais compositores representados no livro de cânticos "Assembleia Viva"
Muitos dos cânticos de Carlos Silva, porque cantados regularmente (alguns há mais de 20 anos) em praticamente todas as paróquias da diocese, entraram já na categoria daqueles cânticos litúrgicos que qualquer assembleia, mesmo
9. Este valor deve-se essencialmente ao facto de todos os salmos pertencentes aos 3 anos litúrgicos, anos A, B, e C, estarem musicados pelo Pe. Manuel Luís.
10. Estas percentagens têm por base um único livro de cânticos, pelo que, na prática, estes valores não são regulares ao longo de todo o ano, e poderão não coincidir em todas as paróquias.
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sem o auxílio de um livro, canta de cor versículo após versículo. São os cânticos processionais, particularmente os de "comunhão" e "entrada", que mais parecem motivar o compositor. A temática mais frequente parece ser a "mariana", o que não deixa de ter uma relação com a proximidade do Santuário de Fátima. A sua escrita caracteriza-se pela ênfase na frase, sem muito lugar para versões ou mom')ntos polifónicos, que, quando existem, não são muito elaborados. A ausência de polifonia na obra de Carlos Silva deve-se em parte ao facto de este compositor não ter tido uma formação musical em instituições que se enraízam na polifonia europeia erudita ou na música coral-sinfónica, como aconteceu por exemplo com uma outra figura da música litúrgica nacional, o Con. Ferreira dos Santos, do Porto. Contudo, é bom referir que Carlos Silva escreve exclusivamente para coros paroquiais, cuja preparação e nível técnico impossibilitam a prática de repertório que vá muito além de uma melodia com um ou outro momento a 2 ou 3 vozes. Talvez por isso, Carlos Silva soube apurar uma fluência melódica muitíssimo equilibrada, que se baseia essencialmente no sistema tonal, ainda que, com muitos momentos híbridos de modalidade e· tonalidade. Escreve exclusivamente para voz. Melodias simples, construídas sobre graus conjuntos, sem grandes contrastes; ritmo condicionado pela palavra, com utilização frequente de compassos mistos (2/4 - 3/4); raros momentos contrapontísticos, quase sempre em cánon. São estas algumas das características gerais da escrita de Carlos Silva, e, por inerência, são também estas que constituem a principal referência de música litúrgica na Diocese.
Como responsável musical e :'llaestro titular do coro da Sé Catedral (lugar que ocupa há duas décadas) dirigindo e ensaiando a assembleia nas principais cerimónias realizadas em Leiria e no Santuüio de Fátima, Carlos Silva também estabeleceu ao longo destes anos os principais critérios
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interpretativos da música litúrgica, naturalmente adoptados pelos responsáveis dos coros paroquiais. Com um gosto particular pela voz e pelo acto de cantar, é a dimensão puramente vocal que mais procura. Privilegia o repertório que menos referências tenha com uma escrita instrumental, com frases longas e linhas melódicas em que se exploram de forma especial as curvas ascendentes. O órgão na celebração litúrgica nunca tem um lugar de solista, sendo sempre entendido como um suporte e apoio da voz.
A influência de Carlos Silva verifica-se ainda no lugar que ocupa como principal responsável pelo ensino de música no Seminário Diocesano, e pelas funções que desempenha nas celebrações litúrgicas da reciclagem do clero. Deste modo, todos os jovens sacerdotes da diocese que tenham estudado no nosso Seminário acusam, inevitavelmente, as ideias estilísticas e interpretativas do professor Carlos Silva. Mesmo que diferentes influências existam num ou noutro pároco, numa ou noutra paróquia, está salvaguardada uma unidade estilística facilmente verificável na mais remota capela da diocese.
Deve também notar-se que o estilo na escrita de Carlos Silva está muito próximo do de Manuel Luís, e, por isso, sendo dois dos principais autores nacionais, verifica-se a definição e entendimento de um determinado estilo de música litúrgica, distinto do utilizado por outros compositores também importantes na actualidade, essencialmente pela ausência de pensamento harmónico e orquestral. Ficam por estudar as razões que estão na base da formação destes estilos, e o porquê do lugar ocupado por Carlos Silva.
Num outro nível de análise, o Santuário de Fátima é o grande ponto de referência para a música litúrgica de toda a nossa diocese. Aí se realizam algumas das maiores celebrações não só de Portugal como do mundo. Aí convergem e
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se confrontam as práticas musicais de todas as dioceses do país. Quem dirige a assembleia em todas as grandes celebrações é Carlos Silva. Os elementos que constituem o coro nos dias festivos principais são recrutados entre os seminaristas e coralistas de Leiria-Fátima. O director do coro é um padre da diocese, e o repertório escolhido (para além do específico das cerimónias da Cova da Iria) não difere do praticado em cada uma das suas paróquias. A grande diferença reside na dimensão da assembleia.
Quem assiste à missa de uma grande peregrinação em Fátima é envolvido por uma "projecção sinfónica" dos cânticos simples que conhece da sua paróquia. É essa projecção que legitima a grandiosidade que se espera do canto divino. O actual canto litúrgico é simples na sua concepção, praticado por coros tecnicamente mal preparados, dirigido por pessoas sem a necessária formação musical e litúrgica, acompanhado por organistas diletantes, mas quando transposto para um grande espaço, quando partilhado por assembleias de duzentas ou trezentas mil pessoas, adquire uma nova dimensão, projecta-se para além de uma análise puramente musical.
O enorme recinto em que acontecem as grandes celebrações na Cova da Iria é também a razão de algumas das mais interessantes particularidades do nosso canto. O sistema de amplificação do som e o eco provocado pelas superfícies laterais, implicam que a palavra e a voz sejam emitidos em tempos muito lentos, sob pena de não serem percebidos. O resultado é um "arrastar" no andamento dos cânticos, que depois é importado para as pequenas assembleias paroquiais, onde tal não tem nenhuma justificação acústica, mas que naturalmente passa a constituir uma das principais características interpretativas do cântico litúrgico da nossa diocese.
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A missa das grandes celebrações no Santuário de Fátima, dada a sua grandiosidade, a sua projecção cultural, social e política, constitui-se como a principal de todas as referências para a generalidade das nossas práticas celebrativas. Na paróquia, o que podia ser entendido como um capricho do pároco ou uma teimosia da hierarquia da Igreja, como cantar gregoriano em latim, torna-se normal na Cova da Iria. Justifica-o a presença fisicamente muito próxima de múltiplas línguas e povos. Aliás, alguns dos principais momentos onde autenticamente se unem todos os presentes na celebração acontecem quando toda a assembleia canta. É por isso grande a responsabilidade musical que o Santuário de Fátima tem não só para com a nossa diocese, bem como para com todo o mundo católico. Não cabendo na presente reflexão a prática musical no Santuário de Fátima, que em si urgentemente justifica um estudo muitíssimo cuidado, deve sublinhar-se a influência que tem em todas as celebrações diocesanas.
Porquê São Gregório?
Chamamos ao canto oficial da Igreja Romana de "Gregoriano", não porque a grande figura do Papa Gregório I (590--604) tenha muito que ver com esse canto. Note-se que haviam passado 3 séculos sobre a sua morte quando começou a chamar-se gregoriano ao canto litúrgico (11). Mas existem razões muito válidas para que tal aconteça. Havia então que legitimar a prática de um só canto em toda a europa medieval ainda litúrgica e musicalmente espartilhada, e nada melhor que invocar a figura de um dos primeiros grandes
11. HOPPIN, Richard H., Medieval Music, Nova Iorque, Norton, 1978, pp. 42.
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responsáveis da unificação dos diferentes ritos em uso nos séculos iniciais da Igreja Cristã. A figura de Gregório I logo aparece a escrever a música que o Espírito Santo em forma de pomba directamente lhe dita ao ouvido, e por isso o canto litúrgico passa a ser considerado como sendo da sua autoria e recebe o seu nome. É hoje claro que nenhum dos actos de São Gregório tem directamente que ver com a música "per se", o que o motivava era exclusivamente a construção de um rito único em todo o mundo cristão. Neste sentido, um dos seus maiores contributos para a música litúrgica foi o de compilar o Antifonário Romano.
Também por vezes se refere que São Gregório é o responsável pela criação do coro da capela papal, a "Schola Cantorum". Contudo, sabemos que esta escola de cantores já existia há pelo menos 100 anos. O mesmo não se verificava noutras igrejas, onde o canto era executado por padres e diáconos que tinham de fazer as suas formações vocal e musical a expensas próprias. Por entender que esta situação não era justa, e consciente da importância da música e do canto para a vida litúrgica da Igreja, o Papa Gregório I não só mandou que em todos os seminários romanos se ensinasse canto e se criassem coros, como passou a subsidiar orfanatos com os mesmos objectivos. Este sim foi o principal contributo de São Gregório para a música da Igreja Romana (referira-se de passagem que um dos momentos mais altos da polifonia religiosa em Portugal, os séculos XVI e XVII na Escola da Sé de Évora, é ainda consequência desta decisão do Papa Gregório I).
É muito o tempo que nos afasta desta atitude tomada pelo chefe da Igreja Romana de então, mas voltamos, em certa medida, a partilhar as mesmas necessidades. Em Portugal, e particularmente na diocese de Leiria-Fátima, o nível musical praticado nas celebrações litúrgicas está muito abai-
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xo dos níveis das restantes componentes celebrativas. O diagnóstico é de tal forma grave que não se compadece com soluções pontuais. Sublinhe-se o facto de, para além da recém criada Escola Superior de Música Sacra do Porto, não existir no nosso país uma única escola de música litúrgica (apesar do esforço do Instituto Gregoriano de Lisboa em manter a prática do canto gregoriano em Portugal). Os coros paroquiais não têm qualquer preparação técnica. Não existe formação para coralistas e cantores solistas. Apesar da muita dedicação, os animadores musicais ou não têm formação musical, ou não têm formação litúrgica, ou, na maioria dos casos, faltam-lhe ambas as formações. Não existem organistas, e as poucas pessoas que, permanentemente solicitadas, se desdobram a acompanhar as missas das nossas paróquias, tiveram ou têm uma aprendizagem que nada tem a ver com os requisitos qualitativos e estilísticos da celebração litúrgica. O repertório não é renovado. Os sacerdotes não têm uma verdadeira formação musical. Não se fomenta a composição de novos cânticos. Não se exploram os poucos meios musicais existentes. Etc., etc,. etc.
As soluções não poderão ser muito diferentes das implementadas por São Gregório, e confirmadas pelo Concílio Ecuménico VATICANO II. (( .. . Dê-se grande importância nos Seminários, . . . bem como noutros institutos e escolas católicas, à formação e prática musical. Para o conseguir, procure-se preparar também e com muito cuidado os professores que terão a missão de ensinar a música sacra. Recomenda-se a fundação, segundo as circunstâncias, de Institutos Superiores de Música Sacra. Os compositores e os cantores, principalmente as crianças, devem receber também uma verdadeira educação litúrgica" (SC 115). «Guarde-se e desenvolva-se com diligência o património da música sacra. Promovam-se com empenho, sobretudo nas igrejas catedrais, as ((Scholae cantorum" . . . (SC 114). ((Promova-se muito o can-
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to popular religioso . . . " (SC 118). ((Tenha-se em grande apreço na Igreja latina o órgão de tubos . . . podendo utilizar-se no culto divino outros instrumentos . . . " (SC 120). ((Os compositores possuídos do espírito cristão compreendam que são chamados a cultivar a música sacra e a aumentar-lhe o património . . . " (SC 121).
Só uma intervenção a nível estrutural pode contribuir para que a música litúrgica não continue a perder vertiginosamente qualidade, e a ser cada vez mais a parente pobre das celebrações. (( . . . A tradição musical da Igreja é um tesouro de inestimável valor, que excede todas as outras expressões de arte, sobretudo porque o canto sagrado, intimamente unido com o texto, constitui parte necessária ou integrante da Liturgia solene . . . A Igreja aprova e aceita no culto divino todas as formas autênticas de arte, desde que dotadas das qualidades requeridas . . . " (SC 112). A nossa Diocese não pode eternamente adiar o sério investimento que tem de fazer nos diferentes domínios da sua prática musical.
Começando por seguir as determinações do Concílio Ecuménico VATICANO II, é necessário pensar num Curso Superior de Música Sacra em Leiria, que não pode existir sem escolas de música de nível secundário, que o antecedam com cursos já vocacionados para as práticas musicais litúrgicas. São necessários directores de coro com uma formação litúrgica e musical que só um curso específico pode criar. Têm de ser formados coralistas e salmistas que se constituam em "Scholae Cantorum". Os coros paroquiais deverão estar aptos a regularmente cantar nas missas dominicais o repertório mais comum, mas também a manter vivo o "tesouro de inestimável valor" que é a polifonia vocal religiosa, realizando concertos e participando em cerimónias paralitúrgicas onde esse repertório se possa integrar. Igualmente
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devem poder cantar gregoriano, pois (( ... terá este ... na acção litúrgica, em igualdade de circunstâncias, o primeiro lugar" (SC 116). É urgente a formação de organistas. Se a Igreja entender que não tem possibilidade de instituir e apoiar escolas próprias, por ventura a opção mais eficaz e de maiores consequências no futuro, deve pelo menos diligenciar para que nas escolas de ensino oficial de música existam, à semelhança dos principais países europeus, cursos e variantes de música sacra com direito a diploma.
" ... Estimem-se as tradições musicais próprias . . . " (SC 119) da nossa região. O grande número de filarmónicas em todo o distrito de Leiria proporciona um conjunto muito diversificado de instrumentos de sopro que deverão poder voltar a enriquecer a música litúrgica, à semelhança do que já aconteceu nos séculos XVI e XVII em toda a Península Ibérica. Elaborem-se versões dos cânticos actualmente em uso para diferentes combinações de instrumentos existentes nas filarmónicas, com 2 ou 3 níveis de dificuldade. Estimule-se a colaboração dos jovens filarmónicos com os coros paroquiais.
A actual caminhada sinodal da diocese deverá também servir para sensibilizar as paróquias e os párocos do papel e significado da música e do canto nas suas celebrações. Este processo de renovação não pode ficar pelo diagnóstico e análise da realidade existente, mas deve sugerir propostas concretas, disponibilizar projectos e meios, incentivar e apoiar as paróquias e os animadores mais interessados.
Estamos agora empenhados na aquisição de um órgão para a nossa igreja catedral. Sem dúvida que é importante ter um instrumento (( ... cujo som é capaz de dar às cerimónias do culto um éxplendor extraordinário e elevar poderosamente o espírito para Deus" (SC 120). Quem o vai tocar? Importa constatar que existem muitos órgãos de tubos em
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Portugal, e que a esse nível o património organológico da Igreja não é pobre. O que também se verifica é um alto estado de degradação desse património, pela razão simples de ter deixado de haver quem os tocasse. Para manter um órgão em bom estado de conservação tem que se tocar nele regularmente explorando todas as suas potencialidades, o que normalmente não acontece com a harmonização dos cânticos das missas dominicais (0 grande órgão da Basílica do Santuário de Fátima e até o órgão do Seminário Diocesano são exemplos de instrumentos degradados essencialmente por não terem sido tocados). Se a Diocese não fizer um investimento na formação de organistas proporcional ao que vai fazer na aquisição do instrumento, quando quisermos ouvir o nosso órgão teremos que chamar organistas de outras dioceses, e não teremos órgão por muitos anos. Ter um bom órgão depende exclusivamente de questões técnicas e financeiras, o que não basta para ter bons músicos. O que pensa vir a investir a diocese para a formação de organistas e de cantores? Quem vai harmonizar os cânticos e cantar os salmos nas grandes celebrações diocesanas e nas peregrinações do Santuário de Fátima, estas transmitidas televisivamente para milhões de pessoas em todo o mundo? De onde poderão emergir mais compositores como Carlos Silva? Quem vai substituir o incansável Cónego José de Oliveira Rosa nos lugares de organista e carrilhonista da cidade? Quem está a escrever cânticos novos? Que lugar tem a música na nossa catequese infantil? Quem melhor poderá salvaguardar e manter viva a polifonia religiosa portuguesa? Quais as missas que deverão ser referência para os animadores musicais de todas as 73 paróquias? Quem vai ensaiar e dirigir os coros das nossas 373 missas dominicais? O que anda a fazer São Gregório?
Paulo Lameiro
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Post scriptum
A Igreja Diocesana não só é uma das principais formadoras das nossas consciências musicais, pela prática das suas celebrações, como é ainda a entidade que através das festas religiosas mais música fomenta e produz. Repare-se que a festa religiosa é o principal mercado de actividade e base de sustento para os organismos musicalmente mais significativos da região: as "Filarmónicas", os "Ranchos Folclóricos" e os "Conjuntos de Baile". A nossa festa religiosa vive em torno destas 3 instituições musicais, cada uma com a sua linguagem, lugar e público mais ou menos bem definidos. É certo que os "artistas convidados" começaram a tirar o lugar que há alguns anos pertencia aos conjuntos, que por sua vez haviam substituído as filarmónicas no horário nobre da noite, mas ainda hoje, festa que não tem banda, rancho e conjunto, não é festa para a maioria da população.
Nas zonas do país onde perderam algum significado as festas religiosas parece verificar-se um menor número destes 3 tipos de agrupamentos, que também por isso passam a adquirir características muito distintas. Note-se que em todo o Concelho de Leiria, no ano de 1995, enquanto os subsídios dados pela Câmara Municipal aos seus 23 ranchos folclóricos e 10 bandas filarmónicas somam 9.950.000$00, estes mesmos agrupamentos terão recebido pela sua participação em festas religiosas um valor muito aproximado dos 30.000.000$00. É portanto a festa religiosa que verdadeiramente permite a continuidade destas formações.
P. L.
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RECORDANDO O TENENTE CAPELÃO ANTÓNIO LOURENÇO
Fui há dias, com minha mulher e três ilustres sacerdotes, os senhores cónegos Rosa, Perdigão e Américo, reitor do Seminário de Leiria, visitar uma Exposição Antoniana, presente ao público no Museu Municipal de Santiago de Cacém.
Dia maravilhoso de sol, realçando as belezas do Alentejo ainda verde, viagem serena, música gravada e uma conversa amena de interesse sempre crescente.
Às tantas fala-se de MACAU. Eu tinha recebido, havia pouco tempo, a revista portuguesa aí publicada e, como já estou em idade de recordações, veio, naturalmente, a evocação de dois Homens, que muito admirei e estimei: o Padre António Lourenço e o comandante da Marinha Mercante Filipe Freire.
Já lá vão 47 anos ( 1949), quando por esta altura, recém admitido como médico do Quadro Permanente do Exército, sou mobilizado para Macau, como expedicionário. Os tempos eram dificeis e as perspectivas, quanto ao futuro, bastante sombrias. Basta recordar ter sido a época em que as tropas comunistas tomaram toda a China, expulsando os nacionalistas para a Formosa, etc., etc . .
Ao dirigir-me, então, em Leiria, à Secretaria Notarial, para passar uma procuração a minha mulher, vejo um tenente do Exército, fardado, com as insígnias de capelão. Era o P. Lourenço. Apresentei-me. Soube que seria meu companheiro de viagem e iniciamos logo uma conversa franca e aberta.
Disse-me ser pároco na Maceira, já ter estado mobilizado em Timor, no tempo da 2ª. Guerra Mundial e estar oferecido para Macau.
- Oferecido ? perguntei-lhe. - Sim, respondeu. Sabe. Recebi dos meus superiores a
pergunta, se desejava oferecer-me, já que tinha uma experiên-
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RECORDANDO O TEN. CAP. ANTÓNIO LOURENÇO
cia positiva de contacto com as tropas, etc. e tal (não estava criada na altura a Capelania Militar nem se sonhava com Bispo Castrense), e disse que sim. Depois acrescentou: faz-me muita diferença abandonar a paróquia nesta ocasião. Meti-me em obras e despesas que, em boa verdade, me obrigariam a não aceitar o convite. Mas, se não aceitar, pode a nomeação recair noutro colega, a quem faça mais transtorno que a mim. E, então, ofereci-me.
Fiquei atónito, extasiado de admiração por aquela alma grande, que se referiu ao assunto, natural e simplesmente, como se nada fosse.
Conquistou-me imediatamente. Fiquei logo seu incondicional admirador e amigo. Daí para a frente conversamos bastante, embora ele não fosse pessoa muito extrovertida e de palavra fluente.
Embarcamos a 15 de Julho, no velho Nyassa, que na sua última viagem, era comandado por Filipe Freire.
Seguiam na expedição três capelães militares: um capitão (chefe) e dois tenentes. O capitão, elemento destacado da Companhia de Jesus, era um intelectual, homem de gabinete e estudos profundos; outro era a antítese do chefe (foi mandado para a Metrópole na primeira oportunidade); o terceiro, o P. Lourenço, a harmonia perfeita, era a ligação entre os extremos.
AB conversas a bordo, nos primeiros dias, versavam sobre os porões carregados de munições e explosivos, o perigo de incêndio, as minas sobradas da Guerra que ainda flutuavam nos mares, já que falar de saudades da família era tabu, impróprio dos militares que se prezavam . . .
Uma noite, com luar e calmaria, em pleno Mediterrâneo, o bom do capelão e eu, encostados à amurada e voltados para o mar, conversávamos, conversávamos . . .
Às tantas, digo-lhe assim: - Sabes uma coisa, oh prior? Pôe-te a pau. Às tantas es
ta porcaria vai toda para o charco e tu que tens estudos e sa-
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RECORDANDO O TEN. CAP. ANTÓNIO LOURENÇO
ber, se não chegas lá "Acima" com a escrita em dia e a alma lavadinha, vais parar ao caldeirão. Para mim, que sou um ignorantão, há outra tolerância.
Resposta imediata: as tuas imagens são grosseiras, mas, no fundo, a verdade é essa.
Na manhã seguinte, quando se sentou à mesa para tomar o pequeno almoço, inclinou a cabeça e caíu. Estava morto.
Éramos cinco médicos e tínhamos à mão todos os recursos da época, que aplicámos, mas foram baldados os esforços de o chamar à vida.
A morte, essa certeza que temos na vida, é sempre encarada com inconformismo e angústia. Mas, no alto mar, é pior, incomparavelmente pior.
Dia seguinte. Cerimónia fúnebre terrível. O corpo "encaixotado" numas
tábuas aparelhadas pelo carpinteiro de bordo. Param os motores e o barco imobiliza-se. Ouve-se o silêncio do mar. Cerimónias religiosas desprovidas de qualquer grandiosidade. 'lbque a sentido. Silêncio.
Leitura do artigo da Ordem que abate o militar ao efecti-vo. Último aspergir da água benta . . . e é lançado ao mar.
Homens com lágrimas nos olhos. Corações que não cabem no peito. Os motores iniciam o trabalhar, o navio estremece e con
tinua a sua rota.
Dois anos foram passados. Nada de muito grave acontecera e regressamos a Lisboa
no navicr-motor Timor, sob o comando de Filipe Freire, que havia prometido trazer-nos de regresso ao lar. E cumpriu. Era um homem extraordinário.
A memória humana é falível. A recordação do companheiro perdido desvanecera-se.
Nalguns, a maioria, desaparecera mesmo.
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RECORDANDO O TEN. CAP. ANTÓNIO LOURENÇO
Mas, o marinheiro, não. E, quando novamente no Mediterrâneo, passamos no pon
to onde o corpo do Tenente Capelão havia sido lançado, o navio parou, um ramo de flores foi oferecido ao mar e celebrada uma missa. Que nobreza de sentimentos !
A. Moreira de Figueiredo
* * *
Natural de Alburitel, ao tempo freguesia de Seiça, António Lourenço nasceu no dia 3 de Setembro de 1915. Matriculou-se no Semi
nário de Leiria, em Outubro de 1927. Foi ordenado presbítero em 7 de Agosto de 1938. Seguidamente é nomeado prefeito e professor do
Seminário, acumulando estas funções com as de director diocesano
dos Cruzados de Fátima e redactor de "A Voz do Domingo".
Em Outubro de 1939 torna conta da paróquia de São João de Por
to de Mós e de Alcaria. Em princípios de Maio de 1941 segue para Ca
bo Verde, a acompanhar as tropas expedicionárias, corno capelão
militar. Daqui, na mesma missão, parte para Moçambique e Timor
donde regressa com a saúde muito abalada.
Em circuntâncias particularmente difíceis, corno refere na sua
bela evocação o Dr. António Moreira de Figueiredo, prestigiado mé
dico e presidente da Assembleia Geral do Orfeão de Leiria, em 1949 parte para Macau, na sua última missão de serviço, a acompanhar
um contingente de tropas portuguesas. Antes, porém, fora pároco de
Maceira, onde prodigalizou benéfica acção pastoral, sobretudo junto
da classe operária da Empresa de Cimentos, em cuja área montou, a
expensas suas, urna tipografia.
Era irmão dos padres Joaquim Lourenço e Inácio Lourenço.
Joaquim Lourenço nasceu em Alburitel a 8 de Dezembro de
1905, o mais velho de cinco irmãos, filho de Domingos Lourenço, o fer
reiro de Alburitel.
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RECORDANDO O TEN. CAP. ANTÓNIO LOURENÇO
Entrou para o Seminário em Outubro de 1919, com o seu conterrâneo Benevenuto, futuro pároco do Juncal, indo habitat o edifício junto à Fonte Freire. Foi um dos pimeiros alunos do Seminário, após a restauração da Diocese. Ordenado sacerdote em 30 de Março de 1929, é nomeado pároco da Mendiga. Em Agosto de 1932, encontra-se no Seminário das Missões, em Tomar, como director espiritual e professor. Contagiado pelo ideal missionário, em Outubro desse mesmo ano, segue para a diocese de Cochim, Índia, onde permanece até 1944.
Criada a paróquia de Alburitel em 1946, é nomeado seu primeiro pároco. No ano seguinte vai para Roma, onde, na Universidade Gregoriana se licencia em Direito Canónico. Em 1949 é professor do Seminário.
Quem não recorda as suas aulas "revolucionárias" de Direito Canónico e Teologia Moral?! A anos de distância, já se podia considerar precursor da nova "alma" do Vaticano II. Nobre, fidalgo, serviçal, amigo, soube conquistar a simpatia de quantos com ele privaram.
Em 1957 é nomeado reitor interino do Santuário de Fátima, cargo que abandona em 1959, por motivos de saúde. Capelão do mosteiro da Faniqueira, Batalha, em 24 de Janeiro de 1963 é acometido de doença súbita que o vitima nesse mesmo dia.
Inácio Lourenço nasceu em 10 de Maio de 1909. Após a instrução primária, ingressa no Seminário das Missões, em Tomar. Cursa Filosofia e Teologia no Seminário de Bengalor, Índia. Recebe o presbiterado em Goa, a 3 de Abril de 1937. Desenvolve intensa actividade missionária no Padroado Português do Oriente, particularmente em Meliapor e Madrasta. Teria estado em Singapura, em 1949, para, a bordo do Niassa, abraçar o irmão António que ali vinha, ao que julgava, a caminho de Macau . . . mas ele havia ficado sepultado, dias antes, nas águas mediterrânicas.
Alquebrado de forças físicas que não de ânimo pastoral, regressou à Metrópole em 1960. Em Outubro desse ano, aceita paroquiar Maiorga, Alcobaça. E desde 13 de Julho de 1963, no cemitério de Alburitel, dorme o sono dê.. paz, ao lado do seu irmão, padre Joaquim.
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DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR NA ALTA ESTREMADURA
Quaresma
Em mais de trinta anos de incursões pelos campos da etnografia da Alta Estremadura, sobretudo da paróquia da Batalha, tentei recolher elementos que me elucidassem sobre as práticas populares religiosas, práticas por vezes um tanto à margem das institucionais como versões que, embora mantendo fidelidade à Igreja, se adaptavam e eram expressão da maneira de ser das populações locais, revelando frequentemente seculares aspectos distintivos.
Por motivos que nunca cheguei a apurar, mas a que talvez não tivesse sido estranha a influência da Ordem Dominicana, a viver durante quatro séculos e meio no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, a Quaresma foi sempre muito sentida e celebrada pelos batalhenses, dando-me ideia de que era a manifestação religiosa popular, por excelência, desta paróquia.
Durante a quadra, nos campos, no regresso do trabalho e na caminhada das aldeias e lugares até ao Mosteiro ou à Igreja Matriz e de volta a essa, grupos de naturais da paróquia entoavam vários cânticos adequados a este período doloroso de quarenta dias, que decorre entre a Quarta-Feira de Cinzas e o Domingo de Páscoa.
O povo que cantara alegremente o resto do ano, quantas vezes com chiste e brejeirice, tornava-se agora solene e cada verso, alusivo à Paixão do Senhor, era entoado de forma dolorida como se a alma e a voz populares sustentassem e sofressem as chagas de Cristo.
"As Cinco Chagas", "As Doze Excelências", "Os Versos da Paixão", "O Filho Pródigo", "O Peditório das Almas" ou
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----------- DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR
"Almas Santas" e "Bom Jesus do Calvário" são alguns dos Cânticos que ressoavam - é o termo - pelos vales e outeiros desta freguesia da Exaltação da Santa Cruz. De dia uns tantos e , à noite, quebrando de forma impressionante o silêncio das aldeias e da vila, todos eles, e quantos não se teriam perdido, já, neste século de uniformização e de extinção de culturas?!
Registei-os na maior parte, com a ajuda de conterrâneos também empenhados na salvaguarda dos nossos valores distintivos, mas neste apontamento dou apenas fé daquele que considerei o mais expressivo e, não obstante não ser único no tema, e até em diversas quadras, no nosso Pais, também dos mais originais.
Trata-se do BOM JESUS DO CALVÁRIO.
Entoado por dois grupos mistos, um cantando uma quadra e o outro repetindo-a, o que levava o seu tempo (talvez mais de uma hora), era cântico essencialmente da caminhada entre o Mosteiro e o adro da aldeia, onde já noite alta se terminava. E era pecado, começado, não se terminar.
I
Jesus que estais no Calvário, Tendo-la cruz d'oliveira Sendo o mais lindo cravo Que nasceu entre a roseira.
II
Vosso nome é tão lindo, Vosso nome tão lindo é, É por isso <.,. ue se nomeia Senhor a Jesus de Nazaré.
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DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR -----------
III
Vossos divinos cabelos, Mais finos que o fino ouro, Dai-me licença, Senhor, Que entre no Vosso Tesouro.
IV
Vossa sagrada Cabeça, Toda coroada de espinhos, Por amor dos meus pecados Passou Deus tantos martírios.
v
A Vossa divina Testa, Mais alva que a neve pura, Por amor dos meus pecados Passou Deus tanta tortura.
VI
Os Vossos Divinos Olhos, Inclinados para o chão, Por amor dos meus pecados Passou Deus tanta paixão.
VII
As Vossas divinas Barbas, Arrancadas aos puxões, Por amor dos meus pecados Passou Deus tantas paixões.
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VIII
A Vossa divina Face, Cheia de escarros nojentos, Por amor dos meus pecados Passou Deus tantos tormentos.
IX
Os Vossos divinos Lábios, Mais roxos que os roxos lírios, Por amor dos meus pecados Passou Deus tantos martírios.
X
A Vossa divina Boca, Vinagre e fel amargoso, Perdoai os meus pecados Meu Jesus todo poderoso.
XI
Vosso divino Pescoço, Enleado com um cordão, Por amor dos meus pecados Passou Deus tanto paixão.
XII
Os Vossos divinos Ombros Encostados a um madeiro, Perdoai os meus pecados Ó meu Jesus Verdadeiro.
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DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR -----------
XIII
Os Vossos divinos Braços Estão abertos, liberais, Ai de mim! Não tenho nada, Vós, Senhor, tudo me dais.
XIV
As Vossas divinas Mãos, Estão pregadas numa Cruz, Perdoai os meus pecados, Perdoai-me, ó Bom Jesus!
XV
O Vosso divino Peito Foi aberto com uma lança, Entrai minha alma por Ele, Senhor, dai-me confiança!
XVI
Vossa divina Cintura, Enleada com uma corda, Perdoai os meus pecados, Bom Jesus, Misericórdia!
XVII
Vossos divinos Joelhos, Todos ensanguentados De joelhar por terra Até ao Monte do Calvário.
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----------- DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR
XVIII
Os Vossos divinos Pés, Mais claros que a neve pura, De passar rios de sangue Pelas ruas d'amargura.
XIX
Pelas ruas d'amargura, Pelas ruas da tristura, Onde não há Sol nem Lua, Nem claridade nenhuma.
XX
Ó que ditosa Mulher Foi aquela do Calvário, Que limpou as Cinco Chagas Do Senhor, Santo Sudário.
XXI
Tates, tates, Madalena! Não me trates de limpar, Estas são as Cinco Chagas Que por mim hão-de passar.
XXII
Com toda a veneração S. João baptizou a Cristo E Cristo a São João. Ambos foram baptizados Lá no rio do Jordão.
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DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR -----------
XXIII
Ouvi um ai no Calvário, Ai, Jesus, o que será? Estão a crucificar Cristo, Filho da Virgem Maria.
XXIV
Ouvi um ai no Calvário, Ninguém me diz o que é, Estão a crucificar Cristo, A Jesus de Nazaré.
XXV
Ouvi um ai no Calvário, Ai, Jesus, o que será? Estão a crucificar Cristo, São ais que o Senhor dá.
XXVI
Estas tantas pretensões A Vós, Senhor, as entrego, Quando deste mundo for Que me tenha o céu aberto.
XXVII
Que me tenha o Céu aberto, Ó meu Deus e meu Jesus, Que me tenha o céu aberto Para sempre, amen Jesus.
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----------- DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR
XXVIII
Está acabado, está acabado, Senhor bendito, louvado, Está acabado, acabou-se, Senhor bendito, louvou-se.
XXIX
Está acabado, está acabado, Ó meu Deus e meu Jesus, Está acabado, está acabado, Para sempre, amen Jesus!
A encamisada
Rigorosamente encamisada (que nada tem a ver com as descamisadas do milho) quer dizer: mascarada.
Mas vamos saber o que o povo da aldeia da Rebolaria, lugar de saborosas tradições e que quase toca a vila da Batalha tão perto está da sede do concelho e de freguesia, entende por esta encamisada.
Na noite de sexta-feira que antecedia o Domingo consagrado à festa de Santo António, orago da sua capela, o taumaturgo tão querido do nosso povo e cujo oitavo centenário do nascimento ocorre este ano e por isso irá ter celebração renovada na citada aldeia, normalmente o mais próximo de 13 de Junho, a população local iluminava a povoação e os lugares anexos (Arneiro-Crasto, Forneiros e Casal do Alho) com centenas ou milhares de conchas de caracóis, transformados em minúsculas lucernas, em que se colocavam azeite e uma torcida e se dispunham, em imaginativos desenhos,
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DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR -----------
nas paredes e telhados, onde se grudavam com massa, e nos muros e janelas.
No adro da capela, desde os anos cinquenta uma nova capela, que a antiga, seiscentista, foi lamentavelmente demolida, donde se disfruta uma vista admirável do vale do Lena, da vila e das serras de Aire e Candeeiros, descortinando-se ainda o castelo de Porto de Mós, formava-se então um cortejo composto por dois moços, dos seus 11 ou 12 anos, vestidos de anjo e montando burros brancos, com alguns acompanhantes mais pequenos envergando o hábito franciscano, um rancho de tocadores de instrumentos de cordas, de flautas e de gaitas-de-foles, a partir dos fins do século passado substituídos por filarmónica, e por toda uma multidão que empunhava archotes.
Do cimo dos seus burricos, os anjos, logo à saída do adro e depois em pontos certos do percurso (de dois ou três quilómetros), num costume tipicamente estremenho, deitavam as loas a Santo António, cada um por sua vez e passando, duma mão para a outra, um lenço branco com barra azul.
Além dos lumes dos caracóis, púcaros de pez e velas alumiavam cada caminho e cada congosta, cada atalho e cada recanto da aldeia e lugares anexos.
Esquecida durante cinquenta anos, esta formosa manifestação, simultaneamente popular e religiosa, um grupo de naturais da aldeia, com o apoio do seu centro recreativo, retomou a partir de 1982 e, embora irregularmente, tem-na mantido até hoje. Assim este ano, como não podia deixar de ser, faz-se gala em repeti-la, tentando dar-se-lhe todo o brilho doutros tempos.
As quadras que reproduzo, peça rica do nosso cancioneiro, são da versão de 1933, da última vez, antes do seu restauro, que o povo deitou as loas. Por isso se diz nos versos que Santo António "há setecentos e dois anos I este mundo deixou".
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I
Com cânticos de alegria, Ditoso povo exaltai! Em honra de Santo António Nossos versos escutai.
II
Eis o glorioso Santo Bendito, Bendito por excelência, O exemplo das virtudes, Modelo da penitência.
III
E hoje, ilustre povo, Nesta santa freguesia, Em que se venera Santo António Na capela da Rebolaria.
IV
É hoje que aqui vimos Cumprir a nossa missão, António, Santo glorioso, Da portuguesa Nação.
v
António, Santo glorioso, Que ao mundo deu brazão, Três milagres portentosos, Fonte da maior consolação.
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DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR -----------
VI
Resplandeça o astro brilhante Na celeste região, Resplandeça só neste povo A mais santa devoção.
VII
É António Santo Português Que no mundo deu brado, Fez milagres sem limites, Foi por Deus abençoado.
VIII
Foi em Agosto, dia quinze, Dia de tão alto portento, Mil cento e noventa e cinco, O seu ditoso nascimento.
IX
O seu nome era Fernando Cheio de graça e doçura, Nascido de Teresa Taveira, De Lisboa feliz ventura.
X
Filho de Martim Bulhões, Mordomo da Casa Real, Com os mais altos destinos Na ditosa capital.
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----------- DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR
XI
Ilustre no uso da razão, Fernando o nome mudou, Ficando a ser António Que Deus sempre abençoou.
XII
Crescendo a passo no estudo Com a religiosa tenção, Para ensinar aos pecadores O caminho da Salvação.
XIII
Estudioso excelentemente, Bem mostrou os seus afectos, Para combater heresias Até pregou nos desertos.
XIV
Fazia abrandar tempestades Com a bênção do Senhor, Acudia aos infelizes Com carinho e amor.
XV
Chamou os peixes à obediência, Fez milagres de feliz sorte, Veio de Pádua a Lisboa Livrar seu pai da morte.
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DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR -----------
XVI
Na Itália em missão Em Pádua se achava, Um anjo lhe dá notícia Que seu pai se condenava.
XVII
Rezadas três Avé-Marias, Como António do púlpito pediu, Para livrar seu pai da forca De Pádua a Lisboa se dirigiu.
XVIII
O morto se levantou, O infeliz assassinado Com voz maviosa e triste Diz que Martim não é culpado.
XIX
Adeus queridos pai e mãe, Até ao Dia do Juízo Onde se dão estreitas contas No Purgatório ou no Paraíso.
XX
E vós, povo devoto, Que pisais a terra dura, Tenhais sempre crença, Lembrai-vos da sepultura.
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----------- DOIS TESTEMUNHOS DA RELIGIÃO POPULAR
XXI
Ainda hoje em Lisboa, Na capelinha de S. José, Se venera a sua imagem, Com a mais viva fé.
XXII
Há setecentos e dois anos Que este mundo deixou, Da idade de trinta e cinco anos Sua alma a Deus entregou.
XXIII
Fervorosos Lhe pedimos Nossos rogos de piedade Para nós e para todos Para toda a eternidade.
XXIV
Bendito seja António Que tantos milagres fez, Bendito seja para sempre O Santo Herói Português.
José Travaços Santos
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LEIRIA-FATIMA, publicação quadri
mestral, que arquiva decretos e pro
visões, divulga critérios e normas de
acção pastoral e recorda etapas Importantes da vida da Diocese.
Depósito Legal Ng 64587/93
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