Linguística aplicada

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    Revista ISSN 2179-5037

    Revista UNIABEU Belford Roxo V.4 Nmero 6 Jan. Abr. 2011

    Reflexes sobre o ensino das modalidades escrita e oral: uma via de mo dupla?

    Bruno Cesar Vieira Maria

    Pg- UNIGRANRIO

    RESUMO: Este presente trabalho tem como objetivo bsico discorrer sobre algumas das caractersticas que subjazem modalidade oral e escrita, e os fatores que interferem em sua produo, tendo como principal foco de interesse o ensino da oralidade em lngua estrangeira (LE). Fundamentado em uma breve pesquisa bibliogrfica, ora de autores especialistas no ensino de LE, ora de outros que tratam especificamente da aprendizagem de lngua materna (LM), este artigo parte de um processo contnuo de reflexo e investigao acerca do ensino da linguagem falada e das contingncias universais constituintes da sua formulao.

    Palavras-chave: educao; ensino; oralidade;

    Reflections on the teaching of written and spoken language: a double-line way?

    ABSTRACT: This paper aims at discussing some of the intrinsic characteristics of the spoken and written language and the factors that influence their production. Nevertheless, the articles main focus is the teaching of speaking in a foreign language (English). Based both on authors who are specialists in foreign language teaching (FLT) and on Brazilian specialists in the teaching of Portuguese (as a mother tongue), this paper is part of a continuous investigative piece of research on the teaching of speaking and its peculiarities.

    Key words: education; teaching; speaking

    INTRODUO

    Aps a leitura de duas obras que tratam quase que exclusivamente de assuntos relacionados ao processo de leitura e interpretao de textos e aos processos de escrita (KOCH & ELIAS, 2010a, 2010b), indaguei-me sobre o porqu da no existncia de outra obra dedicada produo oral. A partir desta inquietao comecei a pesquisar sobre o tema em questo. Observa-se que o ensino da expresso oral e de seus gneros pouco

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    explorado nas escolas justamente por esta habilidade estar associada a uma maneira mais informal de comunicao (RAMOS, 2002; SANTOMAURO, 2010). Ramos (2002) e Koch e Elias (2010b) reconhecem que profissionais da rea de ensino deveriam ter conscincia das especificidades da linguagem falada e as da escrita para que possam refutar a distino meramente dicotmica, e at certo ponto preconceituosa, estabelecida por muito tempo na literatura. Percebe-se que, at hoje, a escrita desfruta de certo prestgio. Em funo disso, segundo McCarthy (2005), professores tendem a se basear em regras adjacentes modalidade escrita para o ensino da oralidade e, por conseguinte, acabam negligenciando as singularidades da lngua falada. Koch e Elias (2010b) nos chamam a ateno para o fato de que podemos encontrar textos escritos que apresentam traos da oralidade e, por outro lado, alguns gneros de textos orais que so compostos por estruturas lingusticas caractersticas de um texto formal escrito. Goulart (2010) escreve que, embora ambas as modalidades compartilhem o mesmo sistema lxico-gramatical, delimitar fronteiras entre as duas formas de expresso torna-se uma tarefa difcil. A autora lana mo de dois gneros textuais para explicitar a sua premissa: um bilhete e uma conferncia. Um bilhete, por exemplo, pode ser bastante informal apesar de ser escrito. Uma conferncia, por outro lado, um texto oralizado bastante formal (GOULART, 2010, p.65). Em outras palavras, no devemos pensar as duas modalidades como duas formas distintas de expresso constitudas de regras prprias inalterveis, mas pertencentes a um mesmo contnuo de possibilidades de comunicao onde, s vezes, tanto a fala como a escrita compartilham as mesmas caractersticas de produo. Corroborando a idia das duas habilidades como partes integrantes de um mesmo contnuo tipolgico, Ramos (2002, p.8), diz que a correlao entre fala e escrita um continuum e que princpios mais abstratos orientam a performance do indivduo em ambas as modalidades.

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    2. ALGUMAS PALAVRAS SOBRE O ENSINO DA ORALIDADE EM LE.

    O estudo e o ensino de lnguas no ocidente so predominantemente baseados na modalidade escrita. A prpria etimologia da palavra gramtica, de origem grega, demonstra esse vis: gramma, letra, algo escrito (BIBER et al, 2010, p.1038). Ainda, como afirma Bygate (2001), existem trs motivos bsicos para a priorizao da escrita em detrimento da oralidade:

    1. Forte influncia do mtodo de traduo e gramtica, um dos primeiros mtodos utilizados para o ensino de lnguas (1840-1940). Como prtica de ensino, textos escritos, a principal fonte de insumo nas aulas, eram traduzidos e interpretados. No havia o interesse em se comunicar oralmente na lngua alvo, ou seja, na lngua aprendida.

    2. Falta de recursos tecnolgicos. Somente em meados dos anos 70, o gravador, por exemplo, passou a ser uma tecnologia barata e, portanto, acessvel a pesquisadores que buscavam maneiras de estudar a lngua falada. O advento desse aparelho viabilizou estudos realizados tanto no que tange s singularidades da fala do nativo da lngua alvo como aos processos de aquisio da proficincia oral por parte de seus aprendizes (MCCARTHY, 1997, p.7 apud BYGATE, 2001). Porm, como nos aponta Bygate (2001), devido dificuldade de se pesquisar e estudar a lngua falada, por muitos anos, professores, metodologistas, linguistas e linguistas aplicados continuaram a optar por textos escritos como principais fontes de pesquisa acerca do uso do sistema lngustico.

    3. O terceiro motivo diz respeito ao enfoque dado expresso oral nos mtodos que sucederam o mtodo de traduo e gramtica. Dentre vrios mtodos, o mtodo audiolingual (1950- hoje) seria um dos mais populares (RICHARDS & RODGERS, 2001). Embora o mtodo tivesse como premissa que o aprendiz devesse, primeiramente, entrar em contato com a lngua falada antes que com sua forma escrita, a oralidade ainda era entendida apenas como fonte de insumo para o processo de aprendizagem de um idioma. A prtica da habilidade oral em sala de aula era vista como parte integrante de um processo metodolgico que visava formulao de frases gramaticalmente corretas e ao desenvolvimento da pronncia perfeita, a mais prxima possvel do falante nativo. Atividades de conversao, por outro lado, eram realizadas somente no final de uma sequncia de um plano de aula.

    Podemos perceber que, a despeito dos avanos nos mbitos metodolgicos e tecnolgicos no sculo XX, o ensino da oralidade ainda no apresentava propsitos exclusivamente comunicativos. Somente a partir de meados dos anos 70,

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    com o advento da abordagem comunicativa, parece surgir uma crescente preocupao com a competncia comunicativa do aprendiz nessa modalidade no s no ensino de LE, mas tambm no de lngua materna. Santomauro (2010), por exemplo, salienta a importncia de ensinar gneros orais na escola com os seguintes propsitos: (a) expor nossos alunos a uma gama de textos orais e (b) instrumentaliz-los com as habilidades e tcnicas necessrias para a reproduo desses em situaes reais de comunicao. Alm disso, a mesma autora critica como o ensino da lngua oral vem sendo realizado nas escolas. Em suas palavras:

    Embora o ensino da lngua oral esteja previsto nos Parmetros Curriculares Nacionais (PCN) h mais de uma dcada, essa prtica est longe de ser prioridade. Ela confundida com atividades de leitura em voz alta e conversas informais, que no preparam para os contextos de comunicao.

    (SANTOMAURO, 2010, p. 43)

    Nota-se, por meio da leitura do excerto acima, que h uma equivocada associao da expresso oral com uma maneira mais coloquial de se comunicar, o que nos leva a presumir que para alguns professores a escrita seja a materializao do uso formal, ou seja, o mais adequado da lngua. Seguindo esta lgica, talvez os mesmos professores acreditem que para falar bem seus alunos devam seguir as regras de construo de um texto escrito. Contudo, como afirma Thornbury (2009), a gramtica da lngua falada possui suas prprias convenes que, por sua vez, so to complexas quanto s da escrita. Essa viso preconceituosa do uso da lngua falada aparenta indicar que os pressupostos terico-metodolgicos predominantes no ensino da oralidade possam estar fundamentados em uma concepo de linguagem como um sistema de regras oriundas da modalidade escrita. Regras e convenes que supostamente precisam ser internalizadas para que eventualmente o aprendiz possa se comunicar oralmente. Porm, significativa a quantidade de estudos que privilegiam a modalidade

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    oral e suas peculiaridades (SOARES, 1996; RAMOS, 2002; BYGATE, 2010; UNDERHILL, 2002; THORNBURY, 2009, entre outros.). Alguns visam a promover uma prtica de ensino crtica na qual o conhecimento lingustico prvio do aluno, naturalmente expresso oralmente, seja respeitado e tido como ponto de partida para o ensino das estruturas formais (gramtica e vocabulrio) do idioma em questo (SOARES, 1996; RAMOS, 2002, por exemplo). Outros abordam as estratgias e conhecimentos necessrios, os quais o professor deve construir junto com seus alunos, preferencialmente na sala de aula, no intuito de prepar-los para se comunicarem em diversos gneros orais na sociedade (BYGATE, 2010; UNDERHILL, 2002; THORNBURY, 2009). No contexto de ensino de lngua estrangeira, Bygate (2006) e Thornbury (2009) constataram que um dos problemas bsicos o de preparar o aluno para usar o idioma apropriadamente em contextos reais de interao oral. Ambos entendem que o conhecimento sobre os aspectos formais do sistema lingustico seja de vital importncia; todavia, segundo os autores, a nossa prtica diria ainda tem negligenciado o ensino de estratgias fundamentais de comunicao, como por exemplo: confirmar uma informao, reformular um enunciado mal estruturado e, solicitar e manter o turno em uma conversa. Em suma, a viso de ensino e aprendizagem de lnguas, que preconiza que para nos comunicarmos devemos internalizar a priori um conjunto de regras arbitrrias e abstratas baseadas na modalidade escrita, acabou por contribuir para uma viso meramente dicotmica entre escrita e fala.

    3. VISO DICOTMICA ENTRE FALA E ESCRITA

    Faz-se aqui pertinente mencionar que para alguns autores a escrita est intrinsecamente ligada habilidade de leitura e que a fala no pode estar dissociada da compreenso auditiva (HOLDEN, 2009; CONSOLO et al., 2007). Portanto, quando abordado o tema da oralidade, muitas vezes, questes a respeito da habilidade auditiva sero levantadas, principalmente em contextos de uso da lngua em que, para dar continuidade dinmica interacional, preciso que os

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    interlocutores entendam mutuamente o que est sendo dito (BYGATE, 2010). Tendo feito essa breve observao relevante ao tema deste artigo, retomo a viso dicotmica entre fala e escrita que, para Ramos (2002), parece perdurar em nossas salas de aula. O quadro abaixo, retirado e adaptado das obras das autoras Koch e Elias (2010a) e Koch (2003), apresenta alguns dos traos caractersticos da linguagem falada e da escrita mais comumente apontados:

    Fala

    1. no-planejada 2. fragmentada 3. incompleta 4. pouco elaborada 5. predominncia de frases curtas, simples ou coordenadas 6. contextualizada

    Escrita

    1. planejada 2. no-fragmentada 3. completa 4. elaborada 5. predominncia de frases complexas, com subordinao abundante 6. descontextualizada

    Quadro 1: Viso dicotmica entre fala e escrita

    Podemos perceber, com base na leitura do quadro, que palavras como: no-planejada, fragmentada, pouco elaborada podem induzir o leitor a acreditar que o processo de produo da fala no seja to complexo quanto o da escrita. Koch e Elias (2010b, p. 16) explicam que:

    [...] Tais caractersticas foram sempre estabelecidas tendo por parmetro o ideal da escrita (isto , costumava-se olhar a lngua falada atravs das lentes de uma gramtica projetada para escrita), o que levou a uma viso preconceituosa da fala (descontnua, pouco organizada, rudimentar, sem qualquer planejamento), que chegou a ser comparada linguagem rstica das sociedades primitivas ou das crianas em fase de aquisio de linguagem.

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    importante ressaltar que essas caractersticas resultam das condies nas quais a fala e a escrita so produzidas (BYGATE, 2010; THORNBURY, 2009). O texto falado muitas vezes construdo durante o ato comunicativo, ao contrrio do que acontece com a escrita. Para um texto escrito, por exemplo, o produtor dispe de mais tempo para planejar e organizar o seu discurso (KOCH & ELIAS, 2010b; KOCH, 2003; BYGATE, 2010). Devido s condies da produo oral, o texto nessa modalidade tende a ser menos denso, ou seja, com frases menos complexas. Nota-se, portanto, a predominncia de oraes coordenadas. No mais, em uma interao face a face, um dos principais objetivos dos interlocutores o de comunicar suas idias de uma maneira clara e objetiva e, como o texto falado apresenta-se em fazendo (KOCH & ELIAS, 2010b, p.17), os seus produtores, dependendo do fluir da interao, tm que reformular frases, repetir mais de uma vez a mesma mensagem e se autocorrigirem visando o sucesso da comunicao. Tudo isso, segundo Koch e Elias (2010b) no deve ser visto como defeitos, j que esses recursos esto imbudos de funes cognitivo-interacionais com fins pragmticos.

    4. CONTINGNCIAS DA PRODUO DA FALA E ESCRITA

    Conforme dito anteriormente, o produtor de um texto escrito dispe de tempo o suficiente para planejar e organizar suas idias no papel, enquanto que, em uma interao oral face a face, os interlocutores constroem o texto durante o ato comunicativo. Bygate (2010) elenca dois fatores determinantes nos processos de produo da escrita e da fala que interferem diretamente no modo como usamos a lngua: tempo e reciprocidade1. Para o autor, o tempo disponvel para a produo do texto escrito ou o falado, assim como a necessidade do entendimento recproco da mensagem construda por seus interlocutores, iro determinar quais recursos lingusticos e/ou paralingusticos sero utilizados. 1 Traduo nossa.

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    4.1 Condies de produo da fala

    Na construo do texto falado, o tempo e a preocupao que os interlocutores tm de se entenderem demandam algumas estratgias que possivelmente asseguraro o sucesso do evento comunicativo. Segundo Bygate (2010), o falante lanar mo de quatro estratgias:

    1. O uso de estruturas lingusticas menos complexas. 2. O uso de frases incompletas (ou elipse). 3. O uso de frases pr-fabricadas (ou linguagem formulaica). 4. O uso de recursos para ganhar tempo.

    No que concerne ao uso de estruturas lingusticas menos complexas, Bygate (2006) observa que dessa forma o falante consegue improvisar mais facilmente, pois informaes novas podem ser acrescidas a um mesmo enunciado sem a necessidade de estruturar novas frases subordinadas a ideias previamente mencionadas ao longo do texto. Aquele que fala geralmente objetiva ser o mais claro e direto possvel e faz uso tanto do contexto interacional como do conhecimento prvio dos participantes para facilitar a mensagem que deseja transmitir, principalmente quando o tempo de interao curto. Para ganhar tempo, o falante utiliza um recurso, o qual Bygate (2010) denomina elipse2. Ao invs de estruturar frases completas, o uso de partes ou fragmentos como: Quem?, Como?, O mais alto., Por que eu?, O verde!, bastante comum. O autor enfatiza que em uma conversa, por exemplo, nem sempre frases completas so proferidas, ou at mesmo, desejveis. Segundo Goldman-Eisler (1968, p.31 apud TEIXEIRA DA SILVA, 2008) um discurso espontneo se constitui numa atividade altamente fragmentada e descontnua. O autor enfatiza que falamos em blocos de no mximo seis palavras. Paradoxalmente, por muitas vezes, durante atividades que visam produo oral, observa-se que enunciados completos e bem estruturados so exigidos dos alunos alegando-se que dessa maneira estaro desenvolvendo sua competncia 2 Traduo minha.

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    comunicativa. Outro recurso bastante usado na modalidade oral so as frases e expresses prontas ou pr-fabricadas, chamadas por alguns autores de linguagem formulaica (LEWIS,1997; BYAGTE, 2010; LINDSTRONBERG & BOERS, 2008, TEIXEIRA DA SILVA, 2008). Essas frmulas so geralmente aprendidas em blocos, isto , o conhecimento do significado de cada unidade constituinte de uma frase ou expresso desnecessrio. Alguns exemplos so: Prazer em conhec-lo(a)., com grande prazer que..., Voc pode me informar ..., Em casa de ferreiro o espeto de pau. Segundo esses autores, um vasto repertrio de frases e expresses prontas ou pr-fabricadas da lngua alvo pode contribuir para o desenvolvimento da fluncia do aprendiz, pois lanando mo deste recurso, o falante pode se concentrar em outros aspectos da lngua. Ou seja, ao invs de perder tempo estruturando enunciados, os interlocutores precisam apenas se preocupar com o tempo, tom e ritmo das frases (TEIXEIRA DA SILVA, 2008). Finalmente, para facilitar a comunicao face a face e ganhar tempo para organizar suas ideias, interlocutores frequentemente usam estratgias como: (a) repetir o que foi dito pela pessoa com quem se comunicam ou (b) hesitar em responder de imediato preenchendo o tempo de resposta com o que Bygate (2006) intitula de preenchedores3: ..., Enfim..., Sabe?, Mas... . Koch e Elias (2010b) consideram esses recursos mecanismos organizadores do texto falado e, desse modo, desempenham funes didticas, argumentativas, enfticas etc. importantes. No entanto, esses mesmos mecanismos no apresentam a mesma relevncia para o texto escrito.

    4.2 Condies de produo da escrita

    Na escrita os dois fatores supracitados (tempo e reciprocidade), que influenciam diretamente no modo como o texto produzido, implicaro no uso de outras estratgias por parte do escritor. O produtor de um texto escrito, por exemplo,

    3 Traduo nossa.

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    usufrui de mais tempo para planejar e organizar suas ideias. Koch e Elias (2010b, p.13) salientam que:

    [...] no caso do texto escrito, ao contrrio do que acontece com o texto falado, contexto de produo e contexto de recepo, de maneira geral, no coincidem nem em termos de tempo, nem de espao, j que escritor e leitor normalmente no se encontram copresentes. Por isso, o produtor do texto tem mais tempo para o planejamento, a execuo mais cuidadosa do texto e a reviso, a copidescagem, sempre que for o caso.

    Uma outra vantagem que depois de escrito o texto conter informaes que estaro permanentemente disponveis para releitura, podendo, desse modo, o leitor confirmar ou elaborar as ideias nele discutidas. Ao contrrio, na fala, enunciados precisam ser repetidos com maior frequncia, pois os interlocutores sabem que a memria no consegue armazenar todo o contedo de uma conversa (BYGATE, 2010). Essa repetio constante de frases ou palavras-chave no comumente utilizada no texto escrito, com exceo do uso deste recurso com propsitos estilsticos e/ou pragmtico-discursivos (KOCH & ELIAS, 2010a; KOCH & ELIAS 2010b; KOCH, 2003). No que concerne a reciprocidade, aquele que escreve deve antecipar possveis problemas de naturezas diversas que possam interferir no entendimento de seu texto. Em uma conversa, por exemplo, esse processo, que alguns autores denominam de negociao de significados4 (LEWIS,1997; THORNBURRY, 2009), desencadeado durante a interao e de acordo com as respostas verbais ou no-verbais dos interlocutores (BYGATE, 2010). Ainda, de acordo com Koch e Elias (2010a, 2010b), nossos conhecimentos prvios acerca do sistema lingustico, de mundo e dos elementos constitutivos de um determinado gnero textual so imprescindveis na eficincia e eficcia da comunicao. Os fatos aqui abordados brevemente, relacionados s contingncias tanto da produo oral como s da escrita, so uma pequena amostra de uma gama de fatores subjacentes s nossas prticas comunicativas. No entanto, devido a limitaes de espao e natureza deste trabalho, optou-se por adotar uma 4 Traduo nossa.

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    abordagem simples e didtica que induzisse o leitor, interessado no tema, a se aprofundar no assunto tendo como referncia algumas das obras citadas neste artigo.

    CONSIDERAES FINAIS

    Percebemos que as duas modalidades de expresso lingustica, a falada e a escrita, apresentam caractersticas prprias e que fatores como tempo e reciprocidade influenciam diretamente nos seus modos de produo. Portanto, faz-se oportuno reiterar que a fala no apenas uma forma mais coloquial de se expressar. A comunicao oral, diferentemente da escrita, implica no uso de estratgias comunicativas e de uma gramtica distinta que, por vezes, no so abordadas e/ou praticadas na sala de aula (tanto na de LM como de LE). Parte disso aparenta estar atribudo nossa concepo de linguagem. Surgem aqui, pois, alguns questionamentos que podem nos ajudar a refletir sobre o modo como ensinamos e praticamos a oralidade:

    1. A fluncia oral pode ser equacionada com o uso de frases completas e relativamente complexas? 2. Ainda nos baseamos no sistema de escrita, e no seu uso padro-culto, para ensinar oralidade? 3. H muito ensinamos a nossos alunos estratgias de produo de textos escritos, mas o que sabemos sobre estratgias de produo de textos orais com propsitos comunicativos?

    Koch e Elias (2010b, p.10) ressaltam que somos estrategistas da comunicao quando estamos engajados no processo de criao de sentido para o texto (oral ou escrito). Todavia, para sabermos usar e ensinar essas estratgias de uma maneira consciente e eficaz preciso conhecer muito bem o nosso objeto de estudo. Logo, de fundamental importncia que o professor tenha acesso a obras que tratam o tema da oralidade e estabelea uma relao dialgica entre a teoria e a

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    sua prtica de ensino, sendo aquela passvel de questionamentos por parte de quem a aplica. Afinal, o professor quem melhor conhece suas condies de trabalho.

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