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LISSANDRO LEITE
I Encontro da MPB: o despertar de Curitiba como palco da MPB
CURITIBA 2006
LISSANDRO LEITE
I Encontro da MPB: o despertar de Curitiba como palco da MPB Monografia apresentada à disciplina Estágio Supervisionado em Pesquisa Histórica como requisito parcial à conclusão do Curso de História, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná. Orientador: Prof. Dr. José Roberto Braga Portella
CURITIBA 2006
Dedicado à toda minha família que deu apoio na conclusão deste trabalho
iii
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer em primeiro lugar a todo departamento de História da UFPR,
em especial pela compreensão do professor orientador José Roberto Braga Portella e ao
professor coordenador, Magnus Pereira, que acompanharam minha trajetória.
Agradecer também o apoio e incentivo de toda minha família, em especial a minha
mãe Ana Maria Ribeiro, meus irmãos Luciano, Luiz, Leandro e Janaina, o carinho e
atenção dado pela minha maior companheira, Flávia Fonseca, aos grandes amigos como
Diosmar, Lúcia, Daniel, Marcio, Marcel, Rodrigo e aqueles que de algum modo
contribuíram para que este trabalho fosse finalizado.
iv
Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague Pelo prazer de chorar e pelo "estamos aí" Pela pida no bar e o futebol pra aplaudir
Um crime pra comentar e um samba pra distrair Deus lhe pague
Por essa praia, essa saia, pelas mulheres daqui O amor malfeito depressa, fazer a barba e partir Pelo domingo que é lindo, novela, missa e gibi
Deus lhe pague Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir Pela fumaça, desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes, pingentes, que a gente tem que cair Deus lhe pague
Por mais um dia, agonia, pra suportar e assistir Pelo rangido dos dentes, pela cidade a zunir
E pelo grito demente que nos ajuda a fugir Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir E pelas moscar-bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir Deus lhe pague
Deus lhe pague – Chico Buarque v
SUMÁRIO RESUMO.......................................................................................................................... vii
ABSTRACT...................................................................................................................... viii
1 INTRODUÇÃO............................................................................................................. 1
2 CAPÍTULO I................................................................................................................. 5
3 CAPÍTULO II................................................................................................................ 14
4 CAPÍTULO III -............................................................................................................ 19
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................ 26
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................. 28
ANEXOS.......................................................................................................................... 30
vi
RESUMO
A partir das informações obtidas através de jornais locais, da década de 1970, o trabalho monográfico desenvolvido apresentou uma discussão acerca do contexto em que foi realizada a inauguração do principal auditório do Teatro Guaíra. Concebido como um complexo com três auditórios, o Teatro Guaíra começou a ser construído no início dos anos 50. Entretanto, o Auditório Bento Munhoz da Rocha Netto apenas seria aberto ao público em dezembro de 1974. Período em que reformas urbanas e culturais introduzidas em Curitiba, inseriu a cidade no modelo de modernidade vigente durante o Regime. Mediante isso, lançou-se um olhar peculiar sobre o I Encontro da MPB ocorrido em fevereiro de 1975. Momento este em que o espaço social, cultural e comercial da MPB começava a se rearticular, marcado principalmente pelo retorno de compositores exilados. Voltado para um publico consumidor de produtos culturais ligados a oposição do regime militar, neste caso a MPB. O evento contou com grandes expoentes da musica brasileira como Milton Nascimento, Jorge Bem, Família Caymmi e Chico Buarque. A discussão que pretendemos conduzir neste trabalho tem como propósito analisar o destaque dado pela imprensa paranaense sobre tal encontro entre artistas de destaque da época, em um contexto de institucionalização da MPB situado, sobretudo durante a fase mais autoritária do Regime Militar. Palavras-chave: Espaço Cultural, Curitiba, MPB.
vii
ABSTRACT Untill some local newspaper facts from the 70’s this article discuss the context of main stage Teatro Guaria’s oppening. Belong as a big structure with three halls, the theatre building started at the 50’s. However the main hall would be openning to the public only in 1974. In this period, some cultural and urbans reforms happening in Curitiba, introduces the city on the modern model in vigour on Brazil’s dictatorship. From this we stare at the I Encontro da MPB happened in 1975’s February. At this time the social, comercial and the cultural space of MPB was be restored, standard essencial by the regress of the exiled composers. Turned to a consumer public of cultural products joining the resistance of the militar dictatorship, in this case the MPB. In this spetacles figures great names of brazilian music, like Jorge Ben, Milton Nascimento and Chico Buarque. The discuss propose in this article analysis the local press eminence about this shows, in a context of establishment of the MPB, above the most authoritarian stage of militar dictatorship. Key-Words: Cultural place; Curitiba; MPB.
vii
Introdução
Desde minha juventude, me tornei assíduo freqüentador de espetáculos, quando
acessíveis, ocorridos nos auditórios do Teatro Guaíra, fossem concertos de orquestra,
shows de música popular, artes cênicas ou balé e tornou-se passagem obrigatória em
meu itinerário para as aulas do ensino superior, logo após ingressar na Universidade
Federal do Paraná.
Paralelamente, me envolvi também com a música, e aquele espaço cultural
tornou-se referência na minha busca pelo conhecimento das artes musicais, aumentando
ainda mais minha curiosidade quando tive o conhecimento que aquele era considerado e
talvez ainda seja o maior auditório da América Latina, com capacidade para cerca de
2.200 lugares no seu maior auditório. Até aqui eu era apenas mais um espectador dentre
muitos que ali passaram, mas comecei a indagar... por que o maior teatro da América
latina não estava em alguma das maiores cidades deste continente?
Mais intrigante ficou quando pesquisei, num primeiro momento, dados sobre sua
inauguração e descobri que aquela obra de engenharia fazia parte de um projeto
ambicioso da gestão de Bento Munhoz da Rocha Netto, governador do Paraná no início
da década de 50, e que perdurou por 20 anos para ser concluída e somente em 1974
houvera a abertura do grande auditório ao público, batizado com o nome do governador
que o idealizara, em um período em que a cidade tinha menos do que 400 mil
habitantes. Assim, o auditório denominado também como Guairão, foi inaugurado com
“Paraná: terra de todas as gentes”, peça teatral da qual tentava reunir as mais variadas
características na busca de uma identidade da região do nosso estado.
Ainda nas comemorações de abertura, veio à tona o evento que me chamou a
atenção: o “I Encontro da MPB”. Com a presença de alguns dos mais ilustres
compositores e intérpretes da MPB, Curitiba despontava como roteiro do circuito
cultural nacional, contribuindo também para aumentar a audiência e a fatia do mercado
2
que a MPB já se consolidava, aproximando cada vez mais tal público no consumo de
tais obras.
***
No primeiro capítulo apresentamos o contexto político-cultural brasileiro dos
anos 1960-1970 e as mudanças ocorridas na capital paranaense, transformando Curitiba,
considerada uma cidade pacata e pouco urbanizada para os padrões da época, na sede do
maior teatro da América Latina, inserindo Curitiba no modelo de modernidade que
vigorava durante o Regime Militar, proporcionada pelo “milagre econômico”.
A vitória do movimento político-militar de 1964 abriu uma nova etapa da
História Republicana do Brasil. Nos início dos anos 70, o governo brasileiro estava no
auge do seu regime de ditadura militar, respaldado pelo Ato Institucional N. º5 como ato
legal promulgado em fins de 1968, aprofundando assim o caráter repressivo do regime
em vigor na época, havendo então uma profunda e abrupta cisão na produção e nas
experiências musicais tidas ao longo da década de 60, interferindo assim de maneira
drástica e concludente no consumo e na produção artística nacional, especialmente a
musical. Primeiro, iremos fazer uma breve retrospectiva sobre essa evolução cultural
musical nos anos 60 e o engajamento dessa arte entre outras, nesse período.
No Paraná, este período foi marcado por intensas mudanças, principalmente em
Curitiba. Entretanto, essas mudanças ocorrem desde meados dos anos 50, buscando
firmar Curitiba como centro administrativo do Estado. Neste sentido, a principal obra é
a construção do centro Cívico, que se coloca como um marco das potencialidades
locais, da ação modernizadora do governo, que investe sobre construção de um lugar de
poder.1 Entre essas obras, além do Centro Cívico podemos citar também a construção da
Biblioteca Pública, Praça do Centenário e Monumento do Centenário, Colégio
1 MAGALHÃES, Marion Brephol de. Paraná: política e governo. Curitiba : SEED, 2001.p.64
3
Tiradentes, avenidas de acesso ao Centro Cívico, o monumental Colégio Estadual do
Paraná e o teatro Guaíra, nosso objeto de pesquisa.
Para tal pesquisa, analisamos a MPB dos anos 1970, seus principais nomes e sua
relação com o Regime Militar. Buscamos observar também como se deu a consolidação
da MPB, sigla que sintetizou a busca de novas tendências musicais que expressassem o
Brasil como projeto de nação e de uma cultura política influenciada pela ideologia
nacional-popular além de um ciclo de desenvolvimento industrial impulsionado a partir
dos anos 1950.
Neste sentido o principal papel da institucionalização da MPB foi o de
consolidar o deslocamento do lugar social da canção, esboçado desde a Bossa Nova.
Este estatuto de canção que dele emergiu não significou uma busca de identidade e
coerência estética. As composições de MPB seguiram sendo objetos híbridos,
portadores de elementos estéticos de natureza diversa, tanto em sua estrutura poética,
como na estrutura musical.
Em sua fase de consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode
nos apresentar marcas ambíguas, durante a qual segmentos sociais, sobretudo da classe-
média, Ou seja, herdeiros de uma ideologia nacionalista integradora no campo político,
entretanto abertos a uma nova cultura de consumo no campo sócio econômico, nos
fornecendo tendências de gostos e estilo que ajudaram a definir o sentido da MPB2.
A consolidação da MPB como instituição se deu a partir da estreita ligação com
a reorganização da indústria cultural, a qual agiu como fator estruturante de grande
importância no processo, não apenas como um elemento externo ao campo musical que
cooptou e deturpou a cultura musical brasileira, mas como fator primário e limitante de
um processo de audiência, adesão e consumo dos vários trabalhos fonográficos que se
enquadrava em tal segmento.
Mais que mero reflexo das estruturas sociais, a MPB foi um pólo fundamental da
configuração do imaginário sócio-político da classe média progressista submetida ao
controle do Regime Militar. Também porque, considerável parcela dos compositores e
cantores mais destacados da MPB era procedente dos segmentos médios da sociedade.
2 NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.
4
Por fim, tentamos apresentar as principais características dos festivais que
marcaram o período. O objetivo geral do capítulo é distinguir o I Encontro da MPB dos
demais festivais e analisar sua repercussão na imprensa paranaense.
A opção por este evento não é arbitrária. Dá-se porque o Encontro em questão
foi um dos primeiros espetáculos do gênero no recém inaugurado teatro. Um outro
aspecto que não pode deixar de ser enfatizado é que paralelamente ao I Encontro da
MP, foi realizado o I Encontro dos Pesquisadores da MPB, debates que contou com
Sérgio Cabral, Paulo Tapajós, Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo Albin,
Hermínio Bello de Carvalho, J. L. Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de Souza.
O que nos chamou a atenção foi o tratamento da imprensa paranaense dado ao I
Encontro da MPB a respeito dos músicos e compositores brasileiros e suas relações com
o publico. Crônicas que enfocam os acontecimentos do cotidiano, mantendo assim uma
relação íntima com o tempo vivido.Em função disso, foram analisadas reportagens de
periódicos como Gazeta do Povo, Diário do Paraná, Estado do Paraná, sendo que nos
focamos principalmente nas informações publicadas no Diário do Paraná.
A escolha por essas fontes se deve ao fato dos jornais ser umas das principais
fontes de informação histórica. Preocupando-nos com a identificação das matrizes das
idéias, buscando compreender os pressupostos projetos políticos em um contexto e
veiculados nos jornais. 3 Ao refletir, de certa forma, o clima de época, isto é, inclusos no
contexto da década de 1970, tais reportagens nos permite assim ter acesso às formas
pelas quais as pessoas representavam as relações e as tensões que experimentavam
dentro do universo cultural musical.
Dessa maneira, procuraremos localizar o período em que o I Encontro da MPB
foi realizado. A partir desta localização buscaremos entender como a imprensa
paranaense constrói suas posições a respeito dos compositores que foram atração do
festival. Buscando analisar a imagem desses compositores e do próprio Encontro no
então recém inaugurado teatro.
3 CAPELATO, Maria Helena Rolim. A imprensa na história do Brasil. São Paulo : Contexto/EDUSP, 2ª edição, 1994. p. 24
5
Capítulo I
Reconhecido como uma manifestação cultural que apresenta ao mundo os
nossos dilemas e veículo de nossas utopias sociais, a musica popular brasileira ocupa
um lugar privilegiado na história sócio-cultural. Protagonista de um processo de
identificação construído por diferentes agentes sociais em interação, a MPB é um
espaço de mediações, fusões, encontros de diversas etnias, classes e regiões que formam
o grande mosaico da sociedade brasileira.
A vitória do movimento político-militar de 1964 abriu uma nova etapa da
História Republicana do Brasil, fica claro que se trata de uma nova ordem, da
institucionalização de um novo tipo de poder. A ditadura estabelecida no Brasil após
1964 se distingue das demais ditaduras existentes na América Latina pelo fato de ser
exercida pelos militares em conjunto. Sendo presidente o representante da facção
naquele momento mais forte dentro das Forças Armadas.
O regime militar brasileiro concentrou-se em vigiar e controlar o espaço público,
regido por uma lógica de desmobilização política da sociedade. Nos início dos anos 70,
o governo brasileiro estava no auge do seu regime de ditadura militar, respaldado pelo
Ato Institucional n. º 5 como ato legal promulgado em fins de 1968, aprofundando
assim o caráter repressivo do regime em vigor na época, gerando então uma profunda e
abrupta cisão na produção e nas experiências musicais tidas ao longo da década de 60.
Ou seja, a MPB começa a ser alvo de perseguições, a censura não só proibia a
veiculação de peças e músicas, mas também procurava interferir no processo de criação
dessas obras. Chamando os compositores para explicarem suas composições, os
censores sugeriam mudanças nas letras, sob pena de as músicas não serem aprovadas.
Interferindo assim de maneira drástica e concludente no consumo e na produção
artística nacional, especialmente a musical.
6
Nesse período, o controle da circulação das canções e da realização de
apresentações com compositores e intérpretes de tendências esquerdistas, marcou a
atuação dos órgãos de censura e repressão. O campo musical destacava-se como alvo da
vigilância, sobretudo os artistas e eventos ligados a MPB, que segundo Marcos
Napolitano desde meados dos anos 60, passou a significar música crítica de esquerda4.
Tal “arte de espetáculo” nos mostra uma relativa hegemonia cultural voltada
para as correntes ditas como esquerda. Após o advento da bossa nova, a partir da
segunda metade dos anos 50, e principalmente na década seguinte, se consolida uma
nova maneira de pensar e viver tal sistema musical popular. Neste sentido, há também
uma mudança do consumo desta “arte de espetáculo”, articulando os personagens autor-
obra-público-crítica.
Há uma nova relação entre música e literatura, e assim como no cinema, foi um
dos pontos marcadamente favoráveis para a renovação dessas artes, especialmente da
música engajada nos anos 60. Há nesse período uma transformação estrutural na
linguagem, uma nova estrutura de recepção, um novo público basicamente formado
pelas esferas universitárias, ligadas às tendências vigentes de uma cultura nacional
popular de esquerda.
Com os instrumentos que se aproximavam cada vez mais do púbico, como
cinema, a televisão e o rádio também faziam seu papel para alçar a popularidade. E
nesse caso estariam sendo instrumentos essenciais para a popularização da “arte
engajada”, e a inserção cada vez maior na indústria cultural nacional e no mercado de
consumo. Com um novo contexto, e um clima de intenso debate político-ideológico
(repressão e censura a partir de 1964) o mercado fonográfico, atraía cada vez mais,
novos artistas, dando novas possibilidades de divulgação, muitas vezes com suas
“ambigüidades”.
A partir da segunda metade da década de 60, a música popular viria a
desenvolver relações diferenciadas aos seus públicos específicos, revelando-nos que a
relação estrutural entre artista, obra e público passa a ser diferenciada para cada uma das
expressões artísticas, fosse cinema, teatro ou música popular. Os anos importantes para
o desenvolvimento dessa reorganização do público com a arte engajada são os que
compreendem entre 1966 e 1968. Nesse período, diferentemente do teatro e do cinema,
4 NAPOLITANO, Marcos. Seguindo a canção: engajamento político e indústria cultural na MPB (1959-1969) São Paulo : Annablume : Fapesp, 2001.
7
na música popular houve um problemático e extraordinário processo de abertura ao
público. Porém não devemos afirmar que houvesse um público homogêneo, segundo
todos eram particularmente jovens intelectuais e de esquerda, o que torna necessário
uma maior investigação sobre a real carência das pesquisas referentes ao assunto5.
Falamos em “abertura” do público em relação à qualificação do processo de
consumo da música popular, pois dentro dessa área artística a partir de 1965, com o
lançamento do programa televisivo da TV Record, O fino da bossa. Apresentado por
Jair Rodrigues e Elis Regina, a partir deste programa, houvera uma potencialização na
utilização das canções engajadas, em uma dinâmica associada do mercado fonográfico e
televisivo, estabelecendo e reafirmando uma forte vocação na audiência de massa que a
música popular já demonstrava antes mesmo do advento da bossa nova. Neste sentido,
salientamos a importância da televisão como elemento da cultura industrial
determinante no cenário musical brasileiro. O Grande sucesso de O fino da bossa abriu
espaço para novos programas de televisão que de certa forma seguiram o mesmo
formato musical.
Os programas musicais ganharam um novo molde ao longo da década de 60 e se
transformaram em “festivais”, festivais da música popular brasileira. E assim se realizou
a I Festa da Música Popular Brasileira, nos moldes do festival italiano de San Remo. A I
Festa da Música Popular Brasileira não chegou a ser um “festival” e sua repercussão foi
mínima. Não havia nenhum nome famoso entre os autores das músicas finalistas e,
apesar do prometido, a TV não transmitiu o evento, somente às rádios.
O I Festival Nacional da Música Popular Brasileira da TV Excelsior foi lançado
no início de 1965. Com três eliminatórias, a grande final seria no dia seis de abril, com
transmissão da TV Excelsior Rio. Nesse primeiro festival venceu a música “Arrastão”
(Edu Lobo / Vinícius de Morais), cantada por Elis Regina. “Arrastão” passou a ser um
divisor de águas, provocando o surgimento de uma música popular moderna. A grande
novidade, o que conquistaria o júri e a platéia do festival, seria a interpretação
contagiante de Elis. Ao interpretar “Arrastão”, Elis mostrou ao Brasil como uma cantora
podia carregar uma canção e levá-la aonde nem mesmo os autores imaginavam. Elis
praticamente cunhou uma expressão que passou a ser incorporada à linguagem dos
5 NAPOLITANO, Marcos. Seguindo a canção: engajamento político e indústria cultural na MPB (1959-1969) São Paulo : Annablume/Fapesp, 2001. p. 3.
8
festivais: “defender uma canção”. Ao conquistar o público, Elis estava investida de
autoridade para dar aval aos novos cantores e compositores que surgiriam no Brasil a
partir de então.
“Arrastão” deu um novo rumo para a música popular brasileira (mais tarde
chamada MPB) e foi o ponto de partida da música de televisão, num formato que não
existia antes. Apesar de a audiência não ter sido espetacular, a partir do I Festival da
Excelsior, a música brasileira pela TV não seria mais a mesma. Os programas em que
um grande cantor ou cantora se apresentava, durante meia hora num cenário chegavam
ao fim. No novo modelo, havia um surpreendente elemento novo: o público.
Ao longo da década de 1960, a problemática com o público se colocava em dois
diferentes pontos: num primeiro instante, era necessário a consolidação e aproximação
do público com os artistas, partilhando os espaços sociais em comum, fosse em eventos
estudantis ou em campi universitários, juntamente com valores ideológico e políticos,
enfim um conjunto de costumes e hábitos, juntamente com valores que revigorassem as
manifestações artísticas e seu sentido político.
Outro ponto importante foi a ampliação e o desenvolvimento do circuito do
público, estendendo o espaço por onde a arte engajada se circulava e era consumida.
Pois fora dos circuitos de mercado, a ampliação para o consumo das massas era bastante
problemática, pois de certo modo as entidades estudantis eram eficazes apenas nos
limites dos seus próprios meios sócio-culturais.
Tais idéias orientaram tanto a prática política quanto a produção cultural e
artística de setores intelectuais de esquerda com forte inserção no meio universitário. A
música popular traduziu, esse ideário. Essa tendência da música popular, que ocorria em
conjunto com outras manifestações artísticas da época, expressava não apenas a
politização que atingia amplos setores da vida social brasileira, mas também uma certa
articulação entre as esferas da cultura e da política associada, até certo ponto, ao caráter
ainda incipiente da indústria cultural no país.
A maior dificuldade era consolidar um circuito de mercado quer fosse
profissional e ao simultaneamente de massa, sem cair nas fórmulas e armações da
indústria cultural, tida como alienada e escapista. Neste sentido utilizamos o conceito de
Indústria Cultural exposto por Adorno e Horkheimer, a sua profundidade pode ser
identificada justamente naquilo que possui de mais ambíguo, pois se ambos os termos –
indústria e cultura – são interdependentes, contudo não se realizam completamente. De
9
acordo com Adorno, a Indústria Cultural se assemelha a uma indústria quando destaca a
estandardização de determinado objeto, a MPB em nosso caso, por exemplo – e quando
diz respeito à racionalização das técnicas de distribuição.
Mas a indústria cultural não deve ser definida como uma estrutura produtiva
dissociada de contextos histórico-sociais concretos, sob risco de cairmos em
generalizações mitificadoras. Não se pretende, com isso, negar o conceito formulado
pelos pensadores da Escola de Frankfurt que implica o reconhecimento de estruturas de
produção cultural impregnadas de uma racionalidade técnica inerente às instituições de
caráter empresarial/capitalista, que levam à integração vertical dos consumidores e à
padronização tanto do produto como do gosto do público; um conceito que ainda
permite a análise crítica dos processos culturais contemporâneos, principalmente do
caráter ideológico dos bens simbólicos produzidos industrialmente e convertidos em
mercadorias6. O que se propõe é compreender a indústria cultural não como uma
estrutura fechada, mas como um processo de produção e consumo de bens culturais
cujos efeitos devem ser analisados como movimentos impregnados de contradições e
conflitos.
Portanto era preciso atuar no meio social diretamente ligado ao do artista,
resumidamente, ao meio estudantil e ao meio social mais amplo, massificado, para o
povo. Ou seja, a arte engajada pretendia construir uma vanguarda, lideranças,
reformadores e revolucionários, conforme uma leitura de esquerda, e por outro lado era
necessária e relevante a ampliação de tais esferas, da arte engajada, como um
instrumento de conscientização política das massas.
Observa-se um paradigma, cujo a educação política, sentimental e estética, por
um lado, de uma elite (o jovem estudante universitário e de esquerda) e por outro lado
das massas, eram duas faces da mesma moeda, com perspectivas diferenciadas.
Portanto, na música popular a relação entre o artista e o público era mais problemática,
quando a comparamos em relação às artes como cinema ou teatro, pois estava ancorada
num sistema de comunicação, distribuição e produção do consumo das canções, que
abarcavam o artista.
Neste sentido, o surgimento do movimento Tropicália contrapõe-se com a MPB
nacionalista, que era aclamada principalmente pelo gosto médio e assinalada pelos
6 ZAN, José Roberto. Música popular brasileira, indústria cultural e identidade. In: EccoS Revista Científica, UNINOVE, São Paulo: (n. 1, v. 3): 105-122
10
ideais nacionais populares, mas com uma relação diferenciada e menos direta do que no
teatro e no cinema. O Tropicalismo caracterizou-se pela carnavalização, pela festa, pela
alegoria do Brasil, pela crítica da musicalidade brasileira, pela crítica social, compondo
um ritual de devoração de valores. Do movimento tropicalista, participaram Gilberto
Gil, Caetano Veloso, Capinam, Torquato Neto, Gal Costa, os Mutantes, Tom Zé,
Rogério Duprat, Júlio Medaglia, entre outros. Os tropicalistas Gil e Caetano chegaram a
apresentar o programa Divino, Maravilhoso, na TV Tupi de São Paulo. Com a prisão e
o conseqüente exílio de Gil e Caetano, o movimento tropicalista naufragou.
Diferente das canções latino-americanas, mais engajadas aos movimentos
folclóricos e indígenas, no Brasil a música popular brasileira tomou o caminho
enveredado pela Bossa Nova cosmopolita, que explodiu em 1959 no mercado
fonográfico juntamente quando o rock n’ roll entrava também no mercado brasileiro.
Mas a preocupação maior da indústria ligada às produções da Bossa Nova era atingir
um determinado público, basicamente formado por uma juventude urbana, de classe
alta, predominantemente universitária. Comprovado um relativo sucesso com tal grupo
quando os shows inaugurais, ocorridos em campi universitários, determinante na
incorporação de tal estética bossanovística pelas camadas de intelectuais,
principalmente do movimento estudantil.
A princípio, a estética da bossa nova, com suas complexidades, o intimismo, e a
ideologia superficial falando de amor sorriso e flor, foram duramente condenados pelos
jovens do movimento estudantil. Mas por outro lado, era uma renovação musical no
cenário brasileiro e, além disso, um movimento que incorporava o samba juntamente
com as influencias jazzísticas, e não poderia ser desprezado contra as alternativas
“imperialistas” do rock e do jazz.
Como tudo que existe na sociedade, a música brasileira também é uma das
várias formas para a dramatização de problemas importantes, principalmente em um
período de turbulências políticas e ideológicas. Assim a música, ouvida e teorizada no
Brasil seria um modo específico pelo qual a sociedade fala, revela-se, deixando-se
descobrir.
Neste sentido, a discussão sobre uma bibliografia para a história da música
popular brasileira ganha importância, por se considerar que de certa forma, o tema é
obscuro no meio historiográfico. De qualquer modo, é importante registrar a existência
de algumas obras recentes sobre o estudo da música e cultura brasileira.
11
Como se pode notar na produção História & Música (2002)7, Marcos
Napolitano, nos proporciona uma análise das diversas vertentes musicais e culturais
que constituíram ma música popular brasileira, em suas diversas formas, gêneros e
estilos. Devemos mencionar também, com Cultura brasileira 8, em que Napolitano
procura mapear os vários caminhos pelos quais se pensou e se viveu a vida cultural no
Brasil entre os anos 1950 e 1980. Enfatizando as varias expressões artísticas que
surgiram nesse período e os dilemas nacionais que o debate cultural e estético
traduziram e equacionaram.
Entretanto, devemos salientar que neste período os grandes centros de consumo
e produção da musica popular eram basicamente Rio de Janeiro e São Paulo. Como
enfatiza Eduardo Rocha Virmond, em texto publicado pela Gazeta do Povo em 76, “os
grandes espetáculos passavam por cima de Curitiba, a cinco mil metros de altura, entre
Rio e Buenos Aires, porque aqui não havia lugar”9. Em termos geográficos, a MPB
situa-se no eixo Rio-São Paulo, pólo de urbanização e modernização do país. A MPB se
consolidava como um movimento musical urbano com um público em sua maioria de
classe-média e universitário.
***
No Paraná, este período foi marcado por intensas mudanças, principalmente em
Curitiba. Entretanto, essas mudanças ocorrem desde o final dos anos 50, buscando
firmar Curitiba como centro administrativo do Estado. Neste sentido, a principal obra é
a construção do centro Cívico, que se coloca como um marco das potencialidades
locais, da ação modernizadora do governo, que investe sobre construção de um lugar de
poder.
7 NAPOLITANO, Marcos. História & música : história cultural da música popular. Belo Horizonte : Autêntica, 2002.. 8 NAPOLITANO, Marcos. Cultura brasileira: utopia e massificação (1950 - 1980). São Paulo : Contexto, 2004.. 9 GAZETA DO POVO. O Teatro Guaíra e seus autores. Curitiba, 11 de abril de 1976.
12
Segundo Marion Brephol Magalhães “esse empreendimento é composto por uma
série de obras capazes e dizer por si só da existência de um governo, de um centro que
administra as demais regiões”10.
Entre essas obras, além do Centro Cívico podemos citar também a construção
da Biblioteca Pública, Praça do Centenário e Monumento do Centenário, Colégio
Tiradentes, avenidas de acesso ao Centro Cívico e o teatro Guaíra, nosso objeto de
pesquisa.
Período em que reformas urbanas e culturais introduzidas em Curitiba inseriram
a cidade no modelo de modernidade vigente durante o Regime Militar. Momento
decisivo em relação ao processo de planejamento da cidade data dos anos 70 os
principais projetos na área de transportes coletivos, embelezamento, restauração e
preservação dos sítios históricos, padronização da paisagem urbana, implantação de
áreas de lazer (como parques e bosques), recebendo à cidade a denominação de modelo
de urbanismo.
Entre os autores que compartilham do objetivo de analisar as bases sociais e
políticas de apoio ao projeto de reforma urbana desenvolvido em Curitiba,
acrescentamos Dennison de Oliveira. Em Curitiba e o mito da cidade modelo (2000)11,
o autor examina o papel desempenhado por um determinado contexto institucional na
conformação de uma certa tradição de planejamento urbano que serviu de alicerce para
um projeto político bem sucedido. A reflexão sobre os diversos contextos institucionais
nos quais, o urbanismo moderno se desenvolve, permite uma interpretação sobre o
caráter diferenciado da experiência curitibana face ao resto do país.
Concebido como um complexo com três auditórios, o Teatro Guaíra começou a
ser construído em 1952. O "Auditório Salvador de Ferrante", de médio tamanho,
conhecido como “Guairinha”, foi inaugurado em dezembro de 1954, com a presença do
então Presidente da República Café Filho. A primeira peça apresentada no auditório foi
"Vivendo em Pecado", de Terence Rattigan, da companhia Dulcina, em fevereiro de
1955.
Entretanto, as obras do grande auditório seguiram lentamente durante dezesseis
anos. Em de abril de 1970, quando a inauguração estava próxima, um incêndio causou
graves danos ao prédio, que precisou de mais quatro anos para ficar pronto. A principal
10 MAGALHÃES, Marion Brephol de. Paraná: política e governo. Curitiba : SEED, 2001. p. 63. 11 OLIVEIRA, Dennison de. Curitiba e o mito da cidade modelo. Curitiba : Ed. Da UFPR, 2000.
13
sala do teatro, o “Auditório Bento Munhoz da Rocha Netto” apenas seria aberto ao
público, com a peça de estréia "Paraná, Terra de Todas as Gentes", de Adherbal Fortes e
Paulo Vítola, em dezembro de 1974.
No ano seguinte, alguns meses após a inauguração do teatro, foi realizado o I
Encontro da MPB, momento este especial em que o espaço social, cultural e comercial
da MPB começava a se rearticular, marcado principalmente pelo retorno de
compositores exilados. Voltado para um publico consumidor de produtos culturais
ligados à oposição do regime militar, neste caso a MPB. Este evento contou com
grandes expoentes da musica brasileira como Milton Nascimento, Jorge Ben, Maria
Bethânia e Chico Buarque.
Um outro aspecto que não pode deixar de ser enfatizado é que paralelamente ao
I Encontro da MP, foi realizado o I Encontro dos Pesquisadores da MPB, debates que
contou com Sérgio Cabral, Paulo Tapajós, Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo
Albin, Hermínio Bello de Carvalho, J. L. Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de
Souza. Conforme publicado no Diário do Paraná: “terá início amanha, às 17 hrs no
auditório Salvador de Ferrante, o I Encontro de Pesquisadores da MPB, que reunirá
todos aqueles que se preocupam com o estudo, a coleta de dados e documentos visando
a preservação da memória musical brasileira.”12
12
DIÁRIO DO PARANÁ. MPB tem “encontro no Paraná”. Curitiba 27 de fevereiro de 1975. p. 3.
14
Capítulo II
Podemos demarcar dois processos diferentes dentro da história da MPB, sua
criação e sua institucionalização. 13 Trata-se da música popular urbana de classe média
surgida após a segunda geração da Bossa Nova. Não é um gênero como samba,
modinha, lundu, bolero, choro ou música erudita, que são estilos definidos ouvidos
predominantemente por classes sociais distintas.
A MPB começou com um perfil marcadamente nacionalista, mas foi mudando e
incorporando elementos de procedências várias. Na cultura musical brasileira não existe
muita resistência, por parte dos músicos, em misturar gêneros musicais. Por isso
existem diversos correntes musicais e gêneros híbridos, e outros mais que, ainda que
não possam ser consideradas novas linguagens, também não se encaixam nas definições
mais comuns de seus respectivos gêneros, difrenciando-se.
Importante salientar que a Bossa Nova não é um marco zero da cultura musical
brasileira, porém traz consigo uma rica bagagem. Entretanto é a Bossa Nova que agrega
esses elementos, através de João Gilberto, criando um novo gênero a partir de elementos
já existentes. Ao mesmo tempo em que se criava um produto nacional, a Bossa Nova
era criticada por estar matando a legitima musica popular feita pelo povo brasileiro, com
seus maneirismos regionais. As principais críticas feitas à Bossa Nova eram devidas a
elementos como sua elitização, ao seu olhar para a Zona Sul carioca, sua temática
sentimental, impressionista e nada popular, além de sua influencia americana que lhe
rendia críticas de imperialistas.
Passado período inicial da Bossa Nova, os primeiros anos da década de 60
começaram a trazer novidades em termos musicais. Não se tratava, no entanto, da
criação de estilos que a suplantassem, e sim, mais propriamente, da utilização de novos
temas a partir de derivações do ritmo e da harmonia bossa-novista. A estética da Bossa
Nova, com seu aspecto solar (com “garotas de Ipanema”, “barquinhos”, “flor” e
“amor”) harmonizava-se com o otimismo que marcou o governo JK e sua utopia
13NAPOLITANO, Marcos A música popular brasileira (MPB) dos anos 70: resistência política e consumo cultural.
15
desenvolvimentista dos anos 50, representada simbolicamente pela construção de
Brasília, a “capital do futuro”. Já os anos 60 assistiram ao autoritarismo e aos terrores
impostos pelo golpe de Estado de 1964, que instituiu o regime militar no país.
Assim, os primeiros anos da década de 60 são marcados pela busca de uma
canção popular participante, em termos políticos e sociais. Surgem os compositores
engajados. Rejeitavam-se, na proposta bossa-novista, as perspectivas estéticas mais
formalistas, por resultarem numa arte consumida por minorias privilegiadas, optando -
se por uma estética clara e acessível às massas. As canções da Bossa Nova se
adequavam a ambientes intimistas; criava-se e ouvia-se Bossa Nova nos apartamentos
da Zona Sul carioca.
Já as tendências que se desenvolveram no início dos anos 60 envolviam um
público maior, de feitio universitário, politizado. A música popular deslocou-se, então,
para os teatros lotados por estudantes ávidos por mensagens políticas através da música.
Essa mudança na recepção musical passou a exigir um canto mais projetado, diferente
do estilo cool de João Gilberto. Assim, a estética bossa-novista passa a conviver com a
recuperação do excesso. Cria-se, assim, um tipo de musicalidade que concilia o discurso
nacionalista com os aspectos cosmopolitas da base musical da Bossa Nova.
Compositores e intérpretes ligados à Bossa Nova como Carlos Lyra, Sérgio Ricardo,
Nara Leão, Geraldo Vandré, Paulo Sérgio Valle e Marcos Valle optaram por um
repertório marcado pelo engajamento, voltado principalmente para um público
universitário. O lirismo da Bossa Nova cedia espaço para o estilo épico das canções de
protesto.
O relativo sucesso da bossa nova entre o público jovem, comprovado pelo êxito
dos shows inaugurais do movimento, ocorreu em campi universitários, e foi decisivo
para a incorporação dessa estética musical pelos intelectuais, como a base para uma
canção engajada nacionalista. Portanto, era precisamente o problema do público a ser
atingido que se colocava.
Buscamos observar também a institucionalização da MPB. Expressão que
sintetiza a busca de uma nova canção, como ilustramos anteriormente, que expressasse
o Brasil como projeto de nação idealizada por uma cultura política influenciada pela
ideologia nacional-popular e pelo ciclo de desenvolvimento industrial impulsionado a
partir dos anos 1950.
A MPB aqui, teve o papel de deslocar e redefinir o lugar social da canção
brasileira, iniciado com a Bossa Nova.
16
Este estatuto de canção que dele emergiu não significou uma busca de
identidade e coerência estética. As composições de MPB seguiram sendo objetos de
diferentes fusões musicais, portadores de elementos estéticos de natureza diversa, tanto
em sua tanto poética como musicalmente falando.
A instituição MPB incorporou uma pluralidade de escutas e gêneros musicais
que, ora na forma de tendências musicais, ora como estilos pessoais, passaram a ser
classificados como MPB, processo para o qual a crítica especializada e as preferências
do público foram fundamentais. Mesmo após o Tropicalismo, elementos musicais
diversos, de certa forma concorrente num primeiro momento com a MPB, passaram a
ser incorporados sem maiores dificuldades.
A mudança do lugar social e do conceito de Música Popular Brasileira, que
mesmo se incorporando a indústria, ampliou os materiais e as técnicas musicais
interpretativas, além de consolidar a canção como veículo fundamental de projetos
culturais e ideológicos mais ambiciosos, dentro de uma perspectiva de engajamento
típico de uma cultura política nacional-popular.
O investimento na idéia de MPB como o centro de confluência de questões
políticas e culturais se revigora a partir de 1964 com o golpe militar. Em sua fase de
consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode nos apresentar marcas
ambíguas, durante a qual segmentos sociais, sobretudo da classe-média. Ou seja,
herdeiros de uma ideologia nacionalista integradora no campo político, porém abertos a
uma nova cultura de consumo no campo sócio econômico, nos fornecendo uma
tendência de gosto que contribuíram para definir o sentido da MPB14.
Com o novo estatuto de música popular vigente no Brasil, desde o final da
década de 60, a MPB passou a significar uma música socialmente valorizada, sinônimo
de “bom gosto”, mesmo com vendas menores que as músicas consideradas de “baixa
qualidade” pela crítica musical. Do ponto de vista do público este estatuto tem servido
como diferencial de gosto e status social, sempre alvo de questionamentos e
autocríticas.
Aqui novamente observamos que a MPB como instituição e sua consolidação,
foi resultado também da estreita ligação com o mercado da indústria fonográfica, do
qual foi alicerce e impulsionador no processo, não apenas como um fator alheio ao
campo musical, mas aliado também as estruturas de mídia e comunicação, como jornais
14 NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.
17
e principalmente o rádio e tv, este último elemento essencial que conquistou e cooptou o
público de encontro a cultura musical brasileira. Foi a chamada Música Popular
Brasileira que sintetizou a tradição da grande música da “era do rádio”, nos anos 30,
com a renovação proposta pela Bossa Nova, no início dos anos 60. A “abertura” do
público original de música popular, de raiz nacionalista e engajada, se deu via mercado,
com todas as contradições que este processo acarretou na assimilação da experiência do
ouvinte.
Mas, curiosamente, o sucesso e a consolidação da MPB como música engajada
deveu-se muito mais às restrições da censura que propriamente a sua capacidade de
mobilização popular. Mas é interessante notar como a censura e a repressão imposta à
MPB despertaram ainda mais o interesse e atenção dos brasileiros para a situação
política do país. Deste modo, nas palavras de Napolitano, a censura influenciou,
decisivamente, o sucesso da MPB.
“Se a MPB sofria com o cerceamento do seu espaço de realização social, a repressão que se abateu sobre seus artistas ajudou a consolidá-la como espaço de resistência cultural e política (...). Paradoxalmente, o fechamento completo do espaço público para os atores da oposição civil, consolidou os espaços galvanizados pela arte, como formas alternativas de participação, nos quais a música era um elemento de troca de mensagens e afirmação de valores, onde a palavra, mesmo sob forte coerção, conseguia circular.”15
Ou seja, o efeito de cerceamento da liberdade criativa dos compositores, que
ousavam colocar em suas músicas referências ao contexto sócio-político do país, era
muito mais eficaz. Quando uma música era censurada, os olhos do público se voltavam
para ela e para o artista.
Diante do fechamento, do cerceamento da liberdade, o brasileiro viu-se
obrigado a trabalhar criativamente para criticar e tentar modificar a estrutura política
15 NAPOLITANO, Marcos. A música popular brasileira (MPB) dos anos 70: resistência política e consumo cultural.
18
vigente, Neste sentido, a cultura tornara-se um espaço para onde haviam migrado as
poucas formas de resistência, até pelas lacunas deixadas pelos censores.”16
Os festivais transmitidos pela incipiente televisão foram também decisivos para
produzir essa aura de resistência e contestação, adquirindo mais e mais admiradores e
sendo um instrumento mais eficiente de conscientização das massas do que o cinema ou
o teatro.
Importante destacar o papel desempenhado pela TV e rádios da época, a TV se
transformou, nesses anos, num importante meio de divulgação de música popular. Além
de inúmeros programas musicais de grande sucesso como O Fino da Bossa, Bossaudade
e Jovem Guarda da TV-Record, iniciou-se, a partir de 1965, o ciclo dos festivais de
MPB em vários canais de televisão. Esses certames funcionaram, durante alguns anos,
como vitrines de divulgação de música popular.
A relação com esse novo meio levou os artistas a desenvolverem novas
habilidades interpretativas. Enquanto na época do rádio os artistas valorizavam
principalmente o desempenho vocal, com a TV tornava-se necessária a preocupação
com a performance gestual ou cênico-expressivo. Na segunda metade da década, os
conflitos se intensificaram no campo da música popular. Artistas e público ligados à
MPB criticavam a Jovem Guarda não só pelo seu não comprometimento com questões
políticas mas por identificá-la como elemento do imperialismo cultural norte-americano.
Em contrapartida, os artistas do iê-iê-iê diziam-se mais identificados com o povo
brasileiro uma vez que apresentavam maiores índices de vendagem de discos e de
audiência através dos meios.
Mais que mero reflexo das estruturas sociais, a MPB foi um pólo fundamental da
configuração do imaginário sócio-político da classe média progressista submetida ao
controle do Regime Militar. Também porque, considerável parcela dos compositores e
cantores mais destacados da MPB era procedente dos segmentos médios da sociedade.
Além disso, a MPB, refletia a consolidação da cultura de massa no Brasil, associada à
intensa urbanização, à formação de uma sociedade de consumo, à expansão da indústria
cultural e à inserção do país no processo de mundialização da cultura.
16 VILLARINO, Ramon Casas. A MPB em movimento: música, festivais e censura.
19
Capítulo III
O jornal impresso é uma das principais fontes de informação histórica,
merecedor, portanto, de consideração. Ao discutir o problema da credibilidade das
fontes consideramos o periódico como um documento suspeito esse objeto é construído
e reconstruído tendo em vista as necessidades e perspectivas do presente a vida
cotidiana nela registrada em seus múltiplos aspectos permite compreender determinado
momento histórico.
Os jornais oferecem vasto material para o estudo da vida cotidiana, costumes e
práticas sociais, todos os aspectos do dia-a-dia estão registrados em sua páginas.
Crônicas que enfocam os acontecimentos do cotidiano, mantendo assim uma relação
íntima com o tempo vivido.
A escolha por essas fontes se deve ao fato dos jornais ser umas das principais
fontes de informação histórica. Preocupando-nos com a identificação das matrizes das
idéias, buscando compreender os pressupostos projetos políticos em um contexto e
veiculados nos jornais. 17 Ao refletir, de certa forma, o clima de época, isto é, inclusos
no contexto da década de 1970, tais reportagens nos permite assim ter acesso às formas
pelas quais as pessoas representavam as relações e as tensões que experimentavam
dentro do universo cultural musical.
O que nos chamou a atenção foi o tratamento da imprensa paranaense dado ao I
Encontro da MPB a respeito dos músicos e compositores brasileiros e suas relações com
o público. Em função disso, foram analisadas reportagens de periódicos como Gazeta do
Povo, Diário do Paraná, Estado do Paraná, sendo que nos focamos principalmente nas
informações publicadas no Diário do Paraná. Deste modo, buscaremos entender como o
Diário do Paraná repercutiu o I Encontro da MPB em suas páginas.
A escolha por essas fontes, se deve pelo fato dos jornais serem umas das
principais fontes de informação histórica. Preocupando-nos com a identificação das
17 CAPELATO, Maria Helena Rolim. A imprensa na história do Brasil. São Paulo : Contexto/EDUSP, 2ª edição, 1994. p. 24
20
matrizes das idéias, buscando compreender os pressupostos projetos políticos
veiculados nos jornais.18 Ao refletir, de certa forma, o clima de época, isto é, inclusos no
contexto da década de 1970, essas reportagens nos permite assim ter acesso às formas
pelas quais as pessoas representavam as relações e as tensões que experimentavam
dentro do universo cultural musical.
Novos compositores e intérpretes invadem o cenário musical, com o surgimento
da MPB, esses artistas queriam cantar a realidade brasileira, as angústias políticas, as
transformações sociais, sem romantismo. Pretendiam criar e redefinir o modo de fazer
música, de forma polêmica, provocadora e engajada. Os festivais transmitidos pela
incipiente televisão brasileira foram também decisivos para produzir essa aura de
resistência e contestação.
Embora com outro formato, o conceito de “festival de música popular” ou de
“festival de canção”, que se estabeleceu no final dos anos 60, já existia no Brasil, eram
os concursos de músicas carnavalescas promovidos com sucesso no Rio de Janeiro
desde a década de 30. Nesses concursos de músicas de carnaval, os principais
ingredientes que fariam parte dos festivais, mais de 30 anos depois, já estavam
presentes, tais como a rivalidade, a intensa participação do público e as estratégias para
vencer o concurso.
Importante ressaltar que tais festivais de música, ocorrem entre 1965 e 1972,
sendo esvaziado devido à censura e perseguições aos principais nomes da MPB. Ainda
que a própria censura tivesse destaque no processo de consolidação da MPB. De acordo
com Zuza Homem de Mello as músicas do último festival da TV Record, realizado em
1969, foram consideradas sem criatividade, e a platéia se mostrou indiferente e
desanimada19.
***
18 CAPELATO, Maria Helena Rolim. A imprensa na história do Brasil. São Paulo : Contexto/EDUSP, 2ª edição, 1994. p. 24 19 MELLO, Zuza Homem de. A era dos Festivais. Rio de Janeiro : Editora 34, 2003.
21
Ocorrido em fevereiro de 1975, I Encontro da MPB foi centrado para um
publico consumidor de produtos culturais ligados à oposição do regime militar. Este
evento não deve ser caracterizado como um ‘festival’, tal como os ocorridos até 1972,
essencialmente por acontecer tardiamente, após esse período, e por não haver
premiações nem jurados. Embora durante a mesma semana e no mesmo local também
existisse espaço para a discussão sobre a MPB, como se percebe no texto publicado no
Diário do Paraná, que apresenta a programação dos espetáculos.
Fique atento para a programação da semana. Segundo o teatro guaíra, Chico Buarque deve fazer dois shows se confirmado o cancelamento de Toquinho. Quanto a Vinícius está garantido, assim como Elizeth Cardoso, Maria Bethânia, Quarteto em Cy, Jorge Bem, Milton Nascimento e outros do 1º time. (...) Paralelamente no dia 28, aos espetáculos será iniciada a parte de debates sobre nossa música. Para isso estarão nomes importantes como Sérgio Cabral, Paulo Tapajós, Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo Albin, Hermínio Bello de Carvalho, J. L. Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de Souza entre outros. 20
Ainda sobre o I Encontro dos Pesquisadores da MPB, de maneira exagerada
também foi publicado,
Terá início amanha, (...) no auditório Salvador de Ferrante, o I Encontro de Pesquisadores da MPB, que reunirá todos aqueles que se preocupam com o estudo, a coleta de dados e documentos visando a preservação da memória musical brasileira. Representantes de estados da Guanabara, São Paulo, Rio Grande do Sul, Ceará, Santa Catarina e Paraná. Para Sale Wolokita, diretor da Fundação Teatro Guaíra, esta será a primeira vez se reúnem pesquisadores e críticos que trabalham isoladamente com o propósito de discutir os mais variados aspectos de nossa música e contribuir com dados e conclusões para o fortalecimento deste importante setor da cultura nacional.21
A abertura do encontro contou com a presença do Secretário de Educação e Cultura Cândido Martins e vários nomes ligados as atividades culturais de nossa capital, além, é claro, de todos os pesquisadores, críticos, e estudiosos que vieram engrandecer o acontecimento previsto apenas como uma reunião informal de interessados.22
20 Diário do Paraná. Música a boa semana. Curitiba, 9 de fevereiro de 1975. p. 3. 21 Diário do Paraná. MPB tem “encontro no Paraná”. Curitiba, 27 de fevereiro de 1975. p. 6. 22 Diário do Paraná. Sérgio Cabral fala sobre MPB. Curitiba, 1º de março de 1975. p.5.
22
Nunca antes no Brasil a música popular teve um encontro de tal porte, neste final de semana, no auditório Salvador Ferrante, no FTG. Sede do encontro, abriga praticamente toda memória musical brasileira hoje existente.23
O destaque dado ao I Encontro dos Pesquisadores da MPB, aparece também nas
entusiasmadas linhas de Aramis Millarch no jornal Estado do Paraná.
Estes são apenas dois exemplos de um dos múltiplos aspectos que estão fazendo desta promoção da Fundação Teatro Guaíra o que, o jornalista Marco Aurélio Borba, da "Manchete", afirmou ontem pela manhã: "O mais importante acontecimento cultural em favor de nossa música". O encontro de quase 30 pesquisadores de sete Estados, incluindo nomes do mais alto gabarito, com livros publicados, discos produzidos, coordenação de grandes projetos, etc, está tendo resultados além do esperado, com sessões objetivas e na qual estão sendo formuladas propostas inteligentes e concretas, em favor da criação do Instituto Nacional da Música.24
Percebemos deste modo, que a MPB mesmo em seu processo de
institucionalização e consolidação de público sempre foi tema de debates, embora com
resultados pouco divulgados. Um dos pontos apresentados pelas reportagens do período,
refere à participação e envolvimento do público curitibano nos espetáculos do recém
inaugurado teatro. Público este que se revela animado frente às apresentações, mesmo
com o desconforto causado pela falta de infra-estrutura do local.
O encontro de MPB que a fundação Teatro Guaíra está promovendo acaba por terra conceitos profundamente enraigados, entre nós. Um deles: o de que o público de Curitiba é frio, de lentas reações diante das manifestações artísticas. O que se tem visto é justamente o contrário, a despeito da incomoda atmosfera que a falta de refrigeração propicia ao auditório Bento Munhoz da Rocha Netto. É uma autentica sauna, e que só deixará de sê-lo dentro de 2 anos, quando finalmente estará chegando a requintada aparelhagem encomendada. (...) como se vê agora, o problema não é de formação étnica
23 Diário do Paraná. Um encontro original. Curitiba, 1º de março de 1975. p.5. 24 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. Quando os pesquisadores se encontram. Curitiba, 9 de março de 1975. em <http://www.tabloidedigital.com.br/artigo12175.html> acessado em 26/08/06.
23
que se pretendia creditar como causa da nossa pseudo apatia. O problema é na verdade, exclusivamente de boa ou má qualidade de espetáculos (...).25
Observamos que a participação e presença do público nos primeiros anos do
Teatro Guaíra, é analisada principalmente em função da qualidade dos espetáculos.
Como um dos idealizadores do I Encontro da MPB, Aramis Millarch também aborda a
questão do público, porém com a intenção de promover as atrações, incentivando a
população à compra antecipada de ingressos.
Também mais uma atração para o I Encontro da MPB: o Tamba Trio(...). A propósito: os ingressos para o superfestival da MPB já estão a venda. E esgotando-se rapidamente.26
Hoje à noite, no auditório Salvador de Ferrante, os 2.300 lugares do auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, no encerramento do I Encontro do MPB, serão insuficientes para a multidão que desejar aplaudir o MPB-4 e Chico Buarque.27
A mesma questão sobre antecipação dos ingressos é apresentada pelo Diário da Paraná da seguinte forma, salientando também a existência de cambistas.
Quem deixou para comprar ingressos hoje para ver Maria Bethânia vai se dar mal. Em princípio vai ter que ficar pelos corredores do grande teatro, isto se conseguir entrar. Ontem antes do meio dia, a lotação de 2300 lugares já havia esgotada. (...) que fazer, o mesmo certamente vai acontecer com os shows de Chico Buarque, amanhã e domingo. Enfim, o Guairão está ficando pequeno (...).28
Hoje é dia de Chico Buarque que também é Holanda, e que tem na sua vida uma Ana de Amsterdã. Chico hoje vai cantar somente músicas suas. Os ingressos começaram a ser
25 Diário do Paraná. MPB, reparos e calor. Curitiba, 26 de fevereiro de 1975. p. 6. 26 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. [sem título]. Curitiba, 21 de fevereiro de 1975 em <http://www.millarch.org/lernum.asp?id=9584&pesquisa=festival> acessado em 26/08/06. 27 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. O cantor Chico com sinal verde e um álbum excelente do MPB-4. Curitiba 2 de março de 1975. em <http://www.millarch.org/lernum.asp?id=12157&pesquisa=festival> acessado em 26/08/06. 28 Diário do Paraná. Maria Bethânia com o Guairâo lotado. Curitiba, 28 de fevereiro de 1975. p. 3.
24
vendidos ontem, o que significa que hoje restarão poucos. É claro, não faltará ingressos no câmbio negro.29
Deste modo, podemos perceber que, a mudança do lugar social e do conceito de
MPB, que mesmo se incorporando a indústria, ampliou os materiais e as técnicas
musicais interpretativas, além de consolidar a canção como veículo fundamental de
projetos culturais e ideológicos mais ambiciosos, dentro de uma perspectiva de
engajamento típico de uma cultura política nacional-popular.
O investimento na idéia de MPB como o centro de confluência de questões
políticas e culturais se revigora a partir de 1964 com o golpe militar. Em sua fase de
consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode nos apresentar marcas
ambíguas, durante a qual segmentos sociais e formação de público, sobretudo da classe-
média. Ou seja, herdeiros de uma ideologia nacionalista integradora no campo político,
porém abertos a uma nova cultura de consumo no campo sócio econômico, nos
fornecendo uma tendência de gosto que contribuíram para definir o sentido da MPB30.
Da mesma forma, devemos ressaltar o papel desempenhado pelas censura e suas
restrições da censura, no processo de institucionalização da MPB e sua capacidade de
mobilização de um público consumidor de produtos culturais ligados a oposição do
Regime Militar . Também é importante notar como a censura e a repressão imposta à
MPB despertaram ainda mais o interesse e atenção dos brasileiros para a situação
política do país, que segundo Marcos Napolitano, censura influenciou, decisivamente, o
sucesso da MPB. Napolitano, aponta também que a possibilidade de compreender o
público universitário, engajado, segmento jovem da classe média mais abastada, fosse o
público de MPB, principalmente em seu período mais repressivo entre 1969 e 1944.
No final de 1974, como sempre acontece, as gravadoras reservaram algumas boas edições de musica brasileira, com nomes de enfrentar o ex-maior (ufa!) fenômeno de vendas -a majestade (sem trono) Roberto Carlos, da CBS, cujos recordes de vendagem já começam a ser superado por gente de melhor nível, como Martinho da Vila . Ao lado das estrelas maiores da melhor MPB. Chico Buarque, MPB-4, e Gilberto Gil, da Phonogram, Antônio Carlos & Jocafi, da RCA Victor, Marcos Valle da Odeon etc.,
29 Diário do Paraná. [ ]. Curitiba, 1º de março de 1975. p. 3. 30 NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.
25
houve também algumas surpresas altamente animadoras: a vigorosa estreia de Eliana Pittman na RCA Victor no melhor álbum de sua carreira, a presença de Miriam Batucada com um bom elepe na Chantecler, um novo elepe no conjunto Demônios da Garoa, um punhado de importantes discos de Marcus Pereira, e muita coisa mais em favor da melhor musica popular - a nossa. Assim, vamos colocar as fonografias em dia, com registros do que de bom apareceu nos últimos meses.31
Temos certeza que após o espetáculo de hoje a noite, com Chico Buarque e o MPB-4, amanhã, as lojas de discos da cidade venderão mais algumas centenas de exemplares dos elepes "Sinal Fechado" e "Palhaços & Reis". Com toda razão, quem ainda não se decidiu, após ouvi-los aos vivos não deixara de querer ter as gravações mais recentes destes artistas que hoje ganharão vários minutos de aplausos no auditório Bento Munhoz da Rocha Neto.32
Notamos que a MPB como instituição e sua consolidação, foi resultado também
da estreita ligação com o mercado da indústria fonográfica, aliado às estruturas de mídia
e comunicação, como jornais e principalmente o rádio e TV. Neste sentido, a relevância
dada ao I Encontro da MPB se apresenta principalmente na possibilidade de criação de
um público consumidor de MPB em Curitiba no anos 70.
Como podemos observar, o I Encontro da MPB destacado pela imprensa
paranaense, funciona como uma história mítica, mais simbólica que argumentativa
dentro do processo de institucionalização da MPB. Que vai sendo atualizada,
adequando-se às demandas de construção de identidade ou ao engajamento.
31 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. O cantor Chico com sinal verde e um álbum excelente do MPB-4. Curitiba 2 de março de 1975. em <http://www.millarch.org/lernum.asp?id=12157&pesquisa=festival> acessado em 26/08/06. 32 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. O cantor Chico com sinal verde e um álbum excelente do MPB-4. Curitiba 2 de março de 1975. em <http://www.millarch.org/lernum.asp?id=12157&pesquisa=festival> acessado em 26/08/06.
26
Considerações finais
Em suma, seria difícil, hoje, imaginarmos o Brasil sem a MPB, da mesma forma
que é difícil estabelecer uma única razão para a enorme projeção conquistada por
gênero musical. A discussão levantada em torno das reportagens sobre a inauguração do
Teatro Guaíra e o I Encontro da MPB mostrou-se instigante na medida em que
tematizou um fenômenos com grande visibilidade na sociedade paranaense e que se
encontra pouco analisado, as festividades de inauguração do principal teatro do Paraná.
O que nos chamou a atenção foi o tratamento da imprensa paranaense dado ao I
Encontro da MPB a respeito dos músicos e compositores brasileiros e suas relações com
o público. Ocorrido em fevereiro de 1975, I Encontro da MPB foi centrado para um
publico consumidor de produtos culturais ligados à oposição do regime militar. Este
evento não deve ser caracterizado como um ‘festival’, tal como os ocorridos até 1972,
essencialmente por acontecer tardiamente, após esse período, e por não haver
premiações nem jurados. Embora durante a mesma semana e no mesmo local também
existisse espaço para a discussão sobre a MPB, pois no mesmo período foi realizado o I
Encontro dos Pesquisadores da MPB. Percebemos deste modo, que a MPB mesmo em
seu processo de institucionalização e consolidação de público sempre foi tema de
debates, embora com resultados pouco divulgados.
Deste modo, podemos perceber que, a mudança do lugar social e do conceito de
MPB, que mesmo se incorporando a indústria, ampliou os materiais e as técnicas
musicais interpretativas, além de consolidar a canção como veículo fundamental de
projetos culturais e ideológicos mais ambiciosos. O investimento na conceito de MPB
como o centro de questões políticas e culturais se revigora a partir de 1964 com o golpe
militar. Em sua fase de consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode
27
nos apresentar marcas ambíguas, durante a qual segmentos sociais e formação de
público, sobretudo da classe-média se ajudaram a definir o sentido da MPB33.
Cabe também ressaltar a importância de como a censura e a repressão imposta à
MPB despertaram ainda mais o interesse e atenção dos brasileiros para a situação
política do país, que segundo Marcos Napolitano, censura influenciou, decisivamente, o
sucesso da MPB, que aponta também que a possibilidade de compreender o público
universitário, engajado, segmento jovem da classe média mais abastada, fosse o público
de MPB, principalmente em seu período mais repressivo
Notamos que a MPB como instituição e sua consolidação, foi resultado também
da estreita ligação com o mercado da indústria fonográfica, aliado às estruturas de mídia
e comunicação, como jornais e principalmente o rádio e TV. Neste sentido, a relevância
dada ao I Encontro da MPB se apresenta principalmente na possibilidade de criação de
um público consumidor de MPB em Curitiba no anos 70.
Como enfatizado anteriormente, este texto tentou abordar alguns pontos no
contexto de inauguração do principal auditório do Teatro Guaíra. Através das imagens
criadas pela imprensa paranaense, com muitas generalizações e louvores aos
compositores, contribuindo para a formação de um consumidor de produtos culturais
ligados à oposição do regime militar. Finalmente, esperamos que com este trabalho
estejamos contribuindo para o debate sobre este aspecto cultural tão importante que é a
MPB.
33 NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.
28
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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29
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HISTÓRIA: Questões & debates. Curitiba, PR : Ed. da UFPR, n. 36,2002.
TINHORÃO, José Ramos de. Pequena História da musica popular : da modinha a
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Revista Científica, UNINOVE, São Paulo: (n. 1, v. 3)Junho 2001. p.105-122.
30
ANEXOS
Diário do Paraná. Música a boa semana. Curitiba, 9 de fevereiro de 1975. p. 3.
Música a boa semana
Para o público de música popular, a semana começa com toda a familia Caymmi
no auditório Bento Munhoz da rocha Netto, às 21hrs de hoje (...) e continuando amanhã,
no mesmo auditório um dos melhores espetáculos brasileiros do momento: “Brasileiro:
profissão esperança”, com Clara Nunes e Paulo Gracindo, com texto de Paulo Fontes e
direção de sua mulher Bibi Ferreira.
enfim, a semana vai continuar com um espetáculo por dia, dentro do I Encontro
de MPB, que só podia ter o jornalista Aramis Millarch como o cérebro de tudo.
Fique atento para a programação da semana. Segundo o teatro guaíra, Chico
Buarque deve fazer 2 shows se confirmado o cancelamento de Toquinho. Quanto a
Vinícius está garantido, assim como elizeth Cardoso, Maria Bethânia, Quarteto em Cy,
Jorge Bem, Milton Nascimento e outros do 1º time.
Tudo isso dentro da programação de inauguração do auditório Bento Munhoz da
rocha Netto com 2300 lugares.
Paralelamente no dia 28, aos espetáculos será iniciada a parte de debates sobre
nossa música. Para isso estarão nomes importantes como Sérgio Cabral, Paulo Tapajós,
Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo Albin, Hermínio Bello de Carvalho, J. L.
Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de Souza entre outros.
***
Diário do Paraná. .... Curitiba, 25 de fevereiro de 1975. p. 6.
31
(...) no domingo, a família Caymmi ali ter marcante concerto. Hoje, 3ª feira, quem ali se
apresenta é Jorge Ben e Conjunto.
“Lembrando Elizeth” elizeth Cardoso , que amanha estará no auditório Bento
Munhoz da Rocha Netto, no Teatro Guaíra, dando prosseguimento ao Encontro dos
melhores da MPB, foi uma das cantoras que em 1965, na noite de encerramento da
promoção “Pinheiro de prata”, esteve naquele mesmo palco(??). só que há 10 anos era
improvisado, funcionando precariamente. Elizeth em 65, foi premiada com o “Pinheiro
de Prata”, promoção da Fundepar em favor da MPB, infelizmente abandonada por falta
de estrutura organizacional.
***
Diário do Paraná. MPB, reparos e calor. Curitiba, 26 de fevereiro de 1975. p. 6.
“MPB, reparos e calor”
O encontro de MPB que a fundação Teatro Guaíra está promovendo acaba por
terra conceitos profundamente enraigados, entre nós. Um deles: o de que o público de
Curitiba é frio, de lentas reações diante das manifestações artísticas. O que se tem visto
é justamente o contrário, a despeito da incomoda atmosfera que a falta de refrigeração
propicia ao auditório Bento Munhoz da Rocha Netto. É uma autentica sauna, e que só
deixará de sê-lo dentro de 2 anos, quando finalmente estará chegando a requintada
aparelhagem encomendada. (...) como se vê agora, o problema não é de formação étnica
que se pretendia creditar como causa da nossa pseudo apatia. O problema é na verdade,
exclusivamente de boa ou má qualidade de espetáculos (...) relatório de 74, o Guaíra
promoveu em 12 meses 344 espetáculos.
***
32
Diário do Paraná. MPB tem “encontro no Paraná”. Curitiba, 27 de fevereiro de 1975. p.
6.
MPB tem “encontro no Paraná”
Terá início amanha, às 17 hrs no auditório Salvador de Ferrante, o I Encontro de
Pesquisadores da MPB, que reunirá todos aqueles que se preocupam com o estudo, a
coleta de dados e documentos visando a preservação da memória musical brasileira.
Representantes de estados da Guanabara, São Paulo, Rio Grande do Sul, Ceará, Santa
Catarina e Paraná. Para Sale Wolokita, diretor da Fundação Teatro Guaíra, esta será a
primeira vez se reúnem pesquisadores e críticos que trabalham isoladamente com o
propósito de discutir os mais variados aspectos de nossa música e contribuir com dados
e conclusões para o fortalecimento deste importante setor da cultura nacional. Aramis
Millarch menciona (...) o oportunismo da iniciativa lembrando que o MEC está
propenso a criar o Instituto Nacional de Música, que ficaria com o encargo de levar
avante todas as proposições levantadas no decorrer do debate. Roselys Roderjan,
estudiosa da MPB (...) comentou acerca das dificuldades de se fazer um panorama
completo da música brasileira de hoje pelo fato de se encontrar “em um verdadeiro
período de transição onde a música regional e urbana está tomando novos rumos e
despertando para o acervo folclórico”. Ela crê que este encontro dará subsídios
suficientes para uma perfeita e completa avaliação do estágio atual da música brasileira
e abrirá novos horizontes para sua pesquisa.
“Milton Nascimento hoje” Milton que está na cidade desde a última 6ª feira, é
dessas pessoas que não gostam de falar. É como uma esfinge que só revela seu segredo
através da música. Seu silencio implica apenas em simplicidade, embora ele faça do
calar uma forma contida de manifestação de sua arte que o Guairão vai ver hoje.
Mas voltemos no tempo, 1972, quando Milton apenas surgia começou a
trabalhar com Lô Borges “meu irmão por adoção e meu afilhado batizado com cerveja
no boteco belo horizontino, numa cerimônia celebrada por Fernando Brant”. O trio
chegou o formar o “clube da esquina”. Durou pouco, Lô como Milton cresceu e cada
um tomou rumo próprio. O “Som Imaginário” entrava na jogada de Milton. Logo veio
“Sentinela” (...) travessia marcou Milton definitivamente junto ao grande público, mas
hoje promete boas surpresas.
33
Amanhã é o dia de Maria Bethânia que apresentará a SCENA MUDA,
acompanhada pelo conjunto Terra Trio. Esse espetáculo será as 21hrs no grande
auditório.
***
Diário do Paraná. Maria Bethânia com o Guairâo lotado. Curitiba, 28 de fevereiro de
1975. p. 3.
Maria Bethânia com o Guairao lotado.
Quem deixou para comprar ingressos hoje para ver Maria Bethânia vai se dar
mal. Em princípio vai ter que ficar pelos corredores do grande teatro, isto se conseguir
entrar. Ontem antes do meio dia, a lotação de 2300 lugares já havia esgotada. (...) que
fazer, o mesmo certamente vai acontecer com os shows de Chico Buarque, amanhã e
domingo. Enfim, o Guairão está ficando pequeno para a vibração de Sale Wolokita.
***
Diário do Paraná. Bethânia é um sucesso no Guairão. Curitiba, 1º de março de 1975.p.1.
Bethânia é um sucesso no Guairão
Maria Bethânia, uma das mais expressivas da musica popular brasileira,
acompanhada pelo Terra Trio, apresentou-se ontem no Guairão com o espetáculo Cena
Muda para uma platéia que superlotou todas as suas dependências. Já na véspera, em
menos de duas horas, os ingressos foram vendidos. Por outro lado, no auditório
Salvador Ferrante, do FTG, Sérgio Cabral, jornalista de O Pasquim, autor de escolas de
samba, quando, quem, como, onde, porque?” Proferiu ontem a palestra de abertura do I
Encontro de Pesquisadores de MPB. Ao todo são trinta os pesquisadores presentes ao
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acontecimento, que para a crítica nacional, são os preservadores da memória musical
brasileira.
***
Diário do Paraná. [ ]. Curitiba, 1º de março de 1975. p. 3.
Hoje é dia de Chico Buarque que também é Holanda, e que tem na sua vida uma
Ana de Amsterdã. Chico hoje vai cantar somente músicas suas. Os ingressos
começaram a ser vendidos ontem, o que significa que hoje restarão poucos. É claro, não
faltará ingressos no câmbio negro. Para o show de Bethânia teve gente que pagou 700
cruzeiros.
***
Diário do Paraná. Sérgio Cabral fala sobre MPB. Curitiba, 1º de março de 1975. p.5.
Sérgio Cabral fala sobre MPB
Começou ontem o I Encontro de Pesquisadores de MPB com a palestra “A
pesquisa na MPB” por Sérgio Cabral, jornalista de O Pasquim, autor de “escolas de
samba, quando, quem, como, onde, porque?”.
A abertura do encontro contou com a presença do Secretário de Educação e
Cultura Cândido Martins e vários nomes ligados as atividades culturais de nossa capital,
além, é claro, de todos os pesquisadores, críticos, e estudiosos que vieram engrandecer o
acontecimento previsto apenas como uma reunião informal de interessados.
***
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Diário do Paraná. Um encontro original. Curitiba, 1º de março de 1975. p.5.
Um encontro original
Nunca antes no Brasil a música popular teve um encontro de tal porte, neste final
de semana, no auditório Salvador Ferrante, no FTG. Sede do encontro, abriga
praticamente toda memória musical brasileira hoje existente.
***
Diário do Paraná. Curitiba Capital da Música Popular. Curitba, 2 de março de 1975. p.8.
Curitiba Capital da Música Popular
Dois programas paralelos, a apresentação dos melhores da MPB, iniciada dia 23
de fevereiro e que encerra hoje, e o I Encontro de Pesquisadores de MPB, trazem
especial destaque para Curitiba. É a possibilidade, pela primeira vez, de se levar uma
série de espetáculos, com nomes famosos como Elizeth Cardoso, Chico Buarque, Maria
Bethânia e outros, superlotando o Guairão, e a transformação de Curitiba num marco
histórico da MPB. Em seu seio pela primeira vez reuniram-se pesquisadores e maiores
conhecedores da nossa música, que até então vinham trabalhando isoladamente.
***
Diário do Paraná. Pesquisador: MPB em Debate. Curitiba, 2 de março de 1975. p.8
Pesquisador: MPB em Debate
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Sem seguir a risca a programação previamente elaborada, os pesquisadores da
MPB tiveram em sua sessão de instalação da sexta feira um contato sem maiores
formalidades, num clima agradável que mais parecia um bate papo de amigos num bar.
Enquanto chegavam retardatários e todos comentavam a ausência de importantes
nomes da crítica, pesquisa e documentação da nossa música como Ricardo Cravo Albin,
Tarik de Souza e outros, na abertura do encontro, Aramis Milarch, o idealizador da
promoção se desdobrava, corria de um lado para o outro para atender todas as
necessidades dos participantes, receber e representar cada um deles e garantir o bom
andamento dos debates.
***
Diário do Paraná. Pioneirismo. Curitiba, 2 de março de 1975. p.8.
Pioneirismo
Com um desenvolvimento natural, foram sendo levantados temas de alto relevo
acerca tanto da pesquisa como dos problemas que afetam a MPB de hoje. E foi o grande
número de divergências e de diferentes acervos de informações que patentearam o valor
deste encontro que é, segundo Sérgio Cabral, “a complementação de uma engrenagem
onde nenhum dos nossos pesquisadores conhece tudo o que existe sobre nossa música”.
Esta é a primeira vez que tantos conhecedores e estudiosos se encontram para um
debate, e o fato de quase todos não se conhecerem mostra o anonimato segundo o qual
vinham realizando seus trabalhos.
Após rápidas palavras do Secretário de Educação e Cultura do Paraná, Cândido
Martins de Oliveira, Paulo Tapajós, produtor dos programas de MPB do projeto
Minerva, seu início aos debates fazendo comentários sobre a importância desse primeiro
encontro e definindo a posição do pesquisador brasileiro.
“Este nosso contato tem relevância histórica com relação à MPB, a insuficiência
de documentação existente poderá ser sanada em parte aqui trazendo frutos para a
história da nossa música popular”. Este encontro serve como uma quebra de silêncio, o
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fim do egoísmo que vinha imperando entre os pesquisadores que são assim como
colecionadores de selos que procuram dados, os encontram e guardam sem mostrar para
ninguém.
Desde cedo, demonstrou-se a preocupação de encarar aspectos concretos da
pesquisa e dos problemas de nossa musica com o intuito de se preparar um documento a
ser enviado ao Ministério da Educação e Cultura. Assim, Sérgio Cabral, que na mesa,
juntamente de Paulo Tapajós, Paixão Cortes, Lúcio Rangel e Miguel Ângelo de
Azevedo, presidiu o debate, tratou de definir uma organização de trabalho do qual
deveria englobar os aspectos mais presentes a serem discutidos.
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