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LISSANDRO LEITE I Encontro da MPB: o despertar de Curitiba como palco da MPB CURITIBA 2006

Lissandro Leite · Gostaria de agradecer em primeiro lugar a todo departamento de História da UFPR, em especial pela compreensão do ... o Auditório Bento Munhoz da Rocha Netto

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LISSANDRO LEITE

I Encontro da MPB: o despertar de Curitiba como palco da MPB

CURITIBA 2006

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LISSANDRO LEITE

I Encontro da MPB: o despertar de Curitiba como palco da MPB Monografia apresentada à disciplina Estágio Supervisionado em Pesquisa Histórica como requisito parcial à conclusão do Curso de História, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná. Orientador: Prof. Dr. José Roberto Braga Portella

CURITIBA 2006

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Dedicado à toda minha família que deu apoio na conclusão deste trabalho

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer em primeiro lugar a todo departamento de História da UFPR,

em especial pela compreensão do professor orientador José Roberto Braga Portella e ao

professor coordenador, Magnus Pereira, que acompanharam minha trajetória.

Agradecer também o apoio e incentivo de toda minha família, em especial a minha

mãe Ana Maria Ribeiro, meus irmãos Luciano, Luiz, Leandro e Janaina, o carinho e

atenção dado pela minha maior companheira, Flávia Fonseca, aos grandes amigos como

Diosmar, Lúcia, Daniel, Marcio, Marcel, Rodrigo e aqueles que de algum modo

contribuíram para que este trabalho fosse finalizado.

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Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir

A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir Por me deixar respirar, por me deixar existir

Deus lhe pague Pelo prazer de chorar e pelo "estamos aí" Pela pida no bar e o futebol pra aplaudir

Um crime pra comentar e um samba pra distrair Deus lhe pague

Por essa praia, essa saia, pelas mulheres daqui O amor malfeito depressa, fazer a barba e partir Pelo domingo que é lindo, novela, missa e gibi

Deus lhe pague Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir Pela fumaça, desgraça, que a gente tem que tossir

Pelos andaimes, pingentes, que a gente tem que cair Deus lhe pague

Por mais um dia, agonia, pra suportar e assistir Pelo rangido dos dentes, pela cidade a zunir

E pelo grito demente que nos ajuda a fugir Deus lhe pague

Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir E pelas moscar-bicheiras a nos beijar e cobrir

E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir Deus lhe pague

Deus lhe pague – Chico Buarque v

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SUMÁRIO RESUMO.......................................................................................................................... vii

ABSTRACT...................................................................................................................... viii

1 INTRODUÇÃO............................................................................................................. 1

2 CAPÍTULO I................................................................................................................. 5

3 CAPÍTULO II................................................................................................................ 14

4 CAPÍTULO III -............................................................................................................ 19

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................ 26

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................. 28

ANEXOS.......................................................................................................................... 30

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RESUMO

A partir das informações obtidas através de jornais locais, da década de 1970, o trabalho monográfico desenvolvido apresentou uma discussão acerca do contexto em que foi realizada a inauguração do principal auditório do Teatro Guaíra. Concebido como um complexo com três auditórios, o Teatro Guaíra começou a ser construído no início dos anos 50. Entretanto, o Auditório Bento Munhoz da Rocha Netto apenas seria aberto ao público em dezembro de 1974. Período em que reformas urbanas e culturais introduzidas em Curitiba, inseriu a cidade no modelo de modernidade vigente durante o Regime. Mediante isso, lançou-se um olhar peculiar sobre o I Encontro da MPB ocorrido em fevereiro de 1975. Momento este em que o espaço social, cultural e comercial da MPB começava a se rearticular, marcado principalmente pelo retorno de compositores exilados. Voltado para um publico consumidor de produtos culturais ligados a oposição do regime militar, neste caso a MPB. O evento contou com grandes expoentes da musica brasileira como Milton Nascimento, Jorge Bem, Família Caymmi e Chico Buarque. A discussão que pretendemos conduzir neste trabalho tem como propósito analisar o destaque dado pela imprensa paranaense sobre tal encontro entre artistas de destaque da época, em um contexto de institucionalização da MPB situado, sobretudo durante a fase mais autoritária do Regime Militar. Palavras-chave: Espaço Cultural, Curitiba, MPB.

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ABSTRACT Untill some local newspaper facts from the 70’s this article discuss the context of main stage Teatro Guaria’s oppening. Belong as a big structure with three halls, the theatre building started at the 50’s. However the main hall would be openning to the public only in 1974. In this period, some cultural and urbans reforms happening in Curitiba, introduces the city on the modern model in vigour on Brazil’s dictatorship. From this we stare at the I Encontro da MPB happened in 1975’s February. At this time the social, comercial and the cultural space of MPB was be restored, standard essencial by the regress of the exiled composers. Turned to a consumer public of cultural products joining the resistance of the militar dictatorship, in this case the MPB. In this spetacles figures great names of brazilian music, like Jorge Ben, Milton Nascimento and Chico Buarque. The discuss propose in this article analysis the local press eminence about this shows, in a context of establishment of the MPB, above the most authoritarian stage of militar dictatorship. Key-Words: Cultural place; Curitiba; MPB.

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Introdução

Desde minha juventude, me tornei assíduo freqüentador de espetáculos, quando

acessíveis, ocorridos nos auditórios do Teatro Guaíra, fossem concertos de orquestra,

shows de música popular, artes cênicas ou balé e tornou-se passagem obrigatória em

meu itinerário para as aulas do ensino superior, logo após ingressar na Universidade

Federal do Paraná.

Paralelamente, me envolvi também com a música, e aquele espaço cultural

tornou-se referência na minha busca pelo conhecimento das artes musicais, aumentando

ainda mais minha curiosidade quando tive o conhecimento que aquele era considerado e

talvez ainda seja o maior auditório da América Latina, com capacidade para cerca de

2.200 lugares no seu maior auditório. Até aqui eu era apenas mais um espectador dentre

muitos que ali passaram, mas comecei a indagar... por que o maior teatro da América

latina não estava em alguma das maiores cidades deste continente?

Mais intrigante ficou quando pesquisei, num primeiro momento, dados sobre sua

inauguração e descobri que aquela obra de engenharia fazia parte de um projeto

ambicioso da gestão de Bento Munhoz da Rocha Netto, governador do Paraná no início

da década de 50, e que perdurou por 20 anos para ser concluída e somente em 1974

houvera a abertura do grande auditório ao público, batizado com o nome do governador

que o idealizara, em um período em que a cidade tinha menos do que 400 mil

habitantes. Assim, o auditório denominado também como Guairão, foi inaugurado com

“Paraná: terra de todas as gentes”, peça teatral da qual tentava reunir as mais variadas

características na busca de uma identidade da região do nosso estado.

Ainda nas comemorações de abertura, veio à tona o evento que me chamou a

atenção: o “I Encontro da MPB”. Com a presença de alguns dos mais ilustres

compositores e intérpretes da MPB, Curitiba despontava como roteiro do circuito

cultural nacional, contribuindo também para aumentar a audiência e a fatia do mercado

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que a MPB já se consolidava, aproximando cada vez mais tal público no consumo de

tais obras.

***

No primeiro capítulo apresentamos o contexto político-cultural brasileiro dos

anos 1960-1970 e as mudanças ocorridas na capital paranaense, transformando Curitiba,

considerada uma cidade pacata e pouco urbanizada para os padrões da época, na sede do

maior teatro da América Latina, inserindo Curitiba no modelo de modernidade que

vigorava durante o Regime Militar, proporcionada pelo “milagre econômico”.

A vitória do movimento político-militar de 1964 abriu uma nova etapa da

História Republicana do Brasil. Nos início dos anos 70, o governo brasileiro estava no

auge do seu regime de ditadura militar, respaldado pelo Ato Institucional N. º5 como ato

legal promulgado em fins de 1968, aprofundando assim o caráter repressivo do regime

em vigor na época, havendo então uma profunda e abrupta cisão na produção e nas

experiências musicais tidas ao longo da década de 60, interferindo assim de maneira

drástica e concludente no consumo e na produção artística nacional, especialmente a

musical. Primeiro, iremos fazer uma breve retrospectiva sobre essa evolução cultural

musical nos anos 60 e o engajamento dessa arte entre outras, nesse período.

No Paraná, este período foi marcado por intensas mudanças, principalmente em

Curitiba. Entretanto, essas mudanças ocorrem desde meados dos anos 50, buscando

firmar Curitiba como centro administrativo do Estado. Neste sentido, a principal obra é

a construção do centro Cívico, que se coloca como um marco das potencialidades

locais, da ação modernizadora do governo, que investe sobre construção de um lugar de

poder.1 Entre essas obras, além do Centro Cívico podemos citar também a construção da

Biblioteca Pública, Praça do Centenário e Monumento do Centenário, Colégio

1 MAGALHÃES, Marion Brephol de. Paraná: política e governo. Curitiba : SEED, 2001.p.64

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Tiradentes, avenidas de acesso ao Centro Cívico, o monumental Colégio Estadual do

Paraná e o teatro Guaíra, nosso objeto de pesquisa.

Para tal pesquisa, analisamos a MPB dos anos 1970, seus principais nomes e sua

relação com o Regime Militar. Buscamos observar também como se deu a consolidação

da MPB, sigla que sintetizou a busca de novas tendências musicais que expressassem o

Brasil como projeto de nação e de uma cultura política influenciada pela ideologia

nacional-popular além de um ciclo de desenvolvimento industrial impulsionado a partir

dos anos 1950.

Neste sentido o principal papel da institucionalização da MPB foi o de

consolidar o deslocamento do lugar social da canção, esboçado desde a Bossa Nova.

Este estatuto de canção que dele emergiu não significou uma busca de identidade e

coerência estética. As composições de MPB seguiram sendo objetos híbridos,

portadores de elementos estéticos de natureza diversa, tanto em sua estrutura poética,

como na estrutura musical.

Em sua fase de consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode

nos apresentar marcas ambíguas, durante a qual segmentos sociais, sobretudo da classe-

média, Ou seja, herdeiros de uma ideologia nacionalista integradora no campo político,

entretanto abertos a uma nova cultura de consumo no campo sócio econômico, nos

fornecendo tendências de gostos e estilo que ajudaram a definir o sentido da MPB2.

A consolidação da MPB como instituição se deu a partir da estreita ligação com

a reorganização da indústria cultural, a qual agiu como fator estruturante de grande

importância no processo, não apenas como um elemento externo ao campo musical que

cooptou e deturpou a cultura musical brasileira, mas como fator primário e limitante de

um processo de audiência, adesão e consumo dos vários trabalhos fonográficos que se

enquadrava em tal segmento.

Mais que mero reflexo das estruturas sociais, a MPB foi um pólo fundamental da

configuração do imaginário sócio-político da classe média progressista submetida ao

controle do Regime Militar. Também porque, considerável parcela dos compositores e

cantores mais destacados da MPB era procedente dos segmentos médios da sociedade.

2 NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.

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Por fim, tentamos apresentar as principais características dos festivais que

marcaram o período. O objetivo geral do capítulo é distinguir o I Encontro da MPB dos

demais festivais e analisar sua repercussão na imprensa paranaense.

A opção por este evento não é arbitrária. Dá-se porque o Encontro em questão

foi um dos primeiros espetáculos do gênero no recém inaugurado teatro. Um outro

aspecto que não pode deixar de ser enfatizado é que paralelamente ao I Encontro da

MP, foi realizado o I Encontro dos Pesquisadores da MPB, debates que contou com

Sérgio Cabral, Paulo Tapajós, Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo Albin,

Hermínio Bello de Carvalho, J. L. Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de Souza.

O que nos chamou a atenção foi o tratamento da imprensa paranaense dado ao I

Encontro da MPB a respeito dos músicos e compositores brasileiros e suas relações com

o publico. Crônicas que enfocam os acontecimentos do cotidiano, mantendo assim uma

relação íntima com o tempo vivido.Em função disso, foram analisadas reportagens de

periódicos como Gazeta do Povo, Diário do Paraná, Estado do Paraná, sendo que nos

focamos principalmente nas informações publicadas no Diário do Paraná.

A escolha por essas fontes se deve ao fato dos jornais ser umas das principais

fontes de informação histórica. Preocupando-nos com a identificação das matrizes das

idéias, buscando compreender os pressupostos projetos políticos em um contexto e

veiculados nos jornais. 3 Ao refletir, de certa forma, o clima de época, isto é, inclusos no

contexto da década de 1970, tais reportagens nos permite assim ter acesso às formas

pelas quais as pessoas representavam as relações e as tensões que experimentavam

dentro do universo cultural musical.

Dessa maneira, procuraremos localizar o período em que o I Encontro da MPB

foi realizado. A partir desta localização buscaremos entender como a imprensa

paranaense constrói suas posições a respeito dos compositores que foram atração do

festival. Buscando analisar a imagem desses compositores e do próprio Encontro no

então recém inaugurado teatro.

3 CAPELATO, Maria Helena Rolim. A imprensa na história do Brasil. São Paulo : Contexto/EDUSP, 2ª edição, 1994. p. 24

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Capítulo I

Reconhecido como uma manifestação cultural que apresenta ao mundo os

nossos dilemas e veículo de nossas utopias sociais, a musica popular brasileira ocupa

um lugar privilegiado na história sócio-cultural. Protagonista de um processo de

identificação construído por diferentes agentes sociais em interação, a MPB é um

espaço de mediações, fusões, encontros de diversas etnias, classes e regiões que formam

o grande mosaico da sociedade brasileira.

A vitória do movimento político-militar de 1964 abriu uma nova etapa da

História Republicana do Brasil, fica claro que se trata de uma nova ordem, da

institucionalização de um novo tipo de poder. A ditadura estabelecida no Brasil após

1964 se distingue das demais ditaduras existentes na América Latina pelo fato de ser

exercida pelos militares em conjunto. Sendo presidente o representante da facção

naquele momento mais forte dentro das Forças Armadas.

O regime militar brasileiro concentrou-se em vigiar e controlar o espaço público,

regido por uma lógica de desmobilização política da sociedade. Nos início dos anos 70,

o governo brasileiro estava no auge do seu regime de ditadura militar, respaldado pelo

Ato Institucional n. º 5 como ato legal promulgado em fins de 1968, aprofundando

assim o caráter repressivo do regime em vigor na época, gerando então uma profunda e

abrupta cisão na produção e nas experiências musicais tidas ao longo da década de 60.

Ou seja, a MPB começa a ser alvo de perseguições, a censura não só proibia a

veiculação de peças e músicas, mas também procurava interferir no processo de criação

dessas obras. Chamando os compositores para explicarem suas composições, os

censores sugeriam mudanças nas letras, sob pena de as músicas não serem aprovadas.

Interferindo assim de maneira drástica e concludente no consumo e na produção

artística nacional, especialmente a musical.

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Nesse período, o controle da circulação das canções e da realização de

apresentações com compositores e intérpretes de tendências esquerdistas, marcou a

atuação dos órgãos de censura e repressão. O campo musical destacava-se como alvo da

vigilância, sobretudo os artistas e eventos ligados a MPB, que segundo Marcos

Napolitano desde meados dos anos 60, passou a significar música crítica de esquerda4.

Tal “arte de espetáculo” nos mostra uma relativa hegemonia cultural voltada

para as correntes ditas como esquerda. Após o advento da bossa nova, a partir da

segunda metade dos anos 50, e principalmente na década seguinte, se consolida uma

nova maneira de pensar e viver tal sistema musical popular. Neste sentido, há também

uma mudança do consumo desta “arte de espetáculo”, articulando os personagens autor-

obra-público-crítica.

Há uma nova relação entre música e literatura, e assim como no cinema, foi um

dos pontos marcadamente favoráveis para a renovação dessas artes, especialmente da

música engajada nos anos 60. Há nesse período uma transformação estrutural na

linguagem, uma nova estrutura de recepção, um novo público basicamente formado

pelas esferas universitárias, ligadas às tendências vigentes de uma cultura nacional

popular de esquerda.

Com os instrumentos que se aproximavam cada vez mais do púbico, como

cinema, a televisão e o rádio também faziam seu papel para alçar a popularidade. E

nesse caso estariam sendo instrumentos essenciais para a popularização da “arte

engajada”, e a inserção cada vez maior na indústria cultural nacional e no mercado de

consumo. Com um novo contexto, e um clima de intenso debate político-ideológico

(repressão e censura a partir de 1964) o mercado fonográfico, atraía cada vez mais,

novos artistas, dando novas possibilidades de divulgação, muitas vezes com suas

“ambigüidades”.

A partir da segunda metade da década de 60, a música popular viria a

desenvolver relações diferenciadas aos seus públicos específicos, revelando-nos que a

relação estrutural entre artista, obra e público passa a ser diferenciada para cada uma das

expressões artísticas, fosse cinema, teatro ou música popular. Os anos importantes para

o desenvolvimento dessa reorganização do público com a arte engajada são os que

compreendem entre 1966 e 1968. Nesse período, diferentemente do teatro e do cinema,

4 NAPOLITANO, Marcos. Seguindo a canção: engajamento político e indústria cultural na MPB (1959-1969) São Paulo : Annablume : Fapesp, 2001.

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na música popular houve um problemático e extraordinário processo de abertura ao

público. Porém não devemos afirmar que houvesse um público homogêneo, segundo

todos eram particularmente jovens intelectuais e de esquerda, o que torna necessário

uma maior investigação sobre a real carência das pesquisas referentes ao assunto5.

Falamos em “abertura” do público em relação à qualificação do processo de

consumo da música popular, pois dentro dessa área artística a partir de 1965, com o

lançamento do programa televisivo da TV Record, O fino da bossa. Apresentado por

Jair Rodrigues e Elis Regina, a partir deste programa, houvera uma potencialização na

utilização das canções engajadas, em uma dinâmica associada do mercado fonográfico e

televisivo, estabelecendo e reafirmando uma forte vocação na audiência de massa que a

música popular já demonstrava antes mesmo do advento da bossa nova. Neste sentido,

salientamos a importância da televisão como elemento da cultura industrial

determinante no cenário musical brasileiro. O Grande sucesso de O fino da bossa abriu

espaço para novos programas de televisão que de certa forma seguiram o mesmo

formato musical.

Os programas musicais ganharam um novo molde ao longo da década de 60 e se

transformaram em “festivais”, festivais da música popular brasileira. E assim se realizou

a I Festa da Música Popular Brasileira, nos moldes do festival italiano de San Remo. A I

Festa da Música Popular Brasileira não chegou a ser um “festival” e sua repercussão foi

mínima. Não havia nenhum nome famoso entre os autores das músicas finalistas e,

apesar do prometido, a TV não transmitiu o evento, somente às rádios.

O I Festival Nacional da Música Popular Brasileira da TV Excelsior foi lançado

no início de 1965. Com três eliminatórias, a grande final seria no dia seis de abril, com

transmissão da TV Excelsior Rio. Nesse primeiro festival venceu a música “Arrastão”

(Edu Lobo / Vinícius de Morais), cantada por Elis Regina. “Arrastão” passou a ser um

divisor de águas, provocando o surgimento de uma música popular moderna. A grande

novidade, o que conquistaria o júri e a platéia do festival, seria a interpretação

contagiante de Elis. Ao interpretar “Arrastão”, Elis mostrou ao Brasil como uma cantora

podia carregar uma canção e levá-la aonde nem mesmo os autores imaginavam. Elis

praticamente cunhou uma expressão que passou a ser incorporada à linguagem dos

5 NAPOLITANO, Marcos. Seguindo a canção: engajamento político e indústria cultural na MPB (1959-1969) São Paulo : Annablume/Fapesp, 2001. p. 3.

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festivais: “defender uma canção”. Ao conquistar o público, Elis estava investida de

autoridade para dar aval aos novos cantores e compositores que surgiriam no Brasil a

partir de então.

“Arrastão” deu um novo rumo para a música popular brasileira (mais tarde

chamada MPB) e foi o ponto de partida da música de televisão, num formato que não

existia antes. Apesar de a audiência não ter sido espetacular, a partir do I Festival da

Excelsior, a música brasileira pela TV não seria mais a mesma. Os programas em que

um grande cantor ou cantora se apresentava, durante meia hora num cenário chegavam

ao fim. No novo modelo, havia um surpreendente elemento novo: o público.

Ao longo da década de 1960, a problemática com o público se colocava em dois

diferentes pontos: num primeiro instante, era necessário a consolidação e aproximação

do público com os artistas, partilhando os espaços sociais em comum, fosse em eventos

estudantis ou em campi universitários, juntamente com valores ideológico e políticos,

enfim um conjunto de costumes e hábitos, juntamente com valores que revigorassem as

manifestações artísticas e seu sentido político.

Outro ponto importante foi a ampliação e o desenvolvimento do circuito do

público, estendendo o espaço por onde a arte engajada se circulava e era consumida.

Pois fora dos circuitos de mercado, a ampliação para o consumo das massas era bastante

problemática, pois de certo modo as entidades estudantis eram eficazes apenas nos

limites dos seus próprios meios sócio-culturais.

Tais idéias orientaram tanto a prática política quanto a produção cultural e

artística de setores intelectuais de esquerda com forte inserção no meio universitário. A

música popular traduziu, esse ideário. Essa tendência da música popular, que ocorria em

conjunto com outras manifestações artísticas da época, expressava não apenas a

politização que atingia amplos setores da vida social brasileira, mas também uma certa

articulação entre as esferas da cultura e da política associada, até certo ponto, ao caráter

ainda incipiente da indústria cultural no país.

A maior dificuldade era consolidar um circuito de mercado quer fosse

profissional e ao simultaneamente de massa, sem cair nas fórmulas e armações da

indústria cultural, tida como alienada e escapista. Neste sentido utilizamos o conceito de

Indústria Cultural exposto por Adorno e Horkheimer, a sua profundidade pode ser

identificada justamente naquilo que possui de mais ambíguo, pois se ambos os termos –

indústria e cultura – são interdependentes, contudo não se realizam completamente. De

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acordo com Adorno, a Indústria Cultural se assemelha a uma indústria quando destaca a

estandardização de determinado objeto, a MPB em nosso caso, por exemplo – e quando

diz respeito à racionalização das técnicas de distribuição.

Mas a indústria cultural não deve ser definida como uma estrutura produtiva

dissociada de contextos histórico-sociais concretos, sob risco de cairmos em

generalizações mitificadoras. Não se pretende, com isso, negar o conceito formulado

pelos pensadores da Escola de Frankfurt que implica o reconhecimento de estruturas de

produção cultural impregnadas de uma racionalidade técnica inerente às instituições de

caráter empresarial/capitalista, que levam à integração vertical dos consumidores e à

padronização tanto do produto como do gosto do público; um conceito que ainda

permite a análise crítica dos processos culturais contemporâneos, principalmente do

caráter ideológico dos bens simbólicos produzidos industrialmente e convertidos em

mercadorias6. O que se propõe é compreender a indústria cultural não como uma

estrutura fechada, mas como um processo de produção e consumo de bens culturais

cujos efeitos devem ser analisados como movimentos impregnados de contradições e

conflitos.

Portanto era preciso atuar no meio social diretamente ligado ao do artista,

resumidamente, ao meio estudantil e ao meio social mais amplo, massificado, para o

povo. Ou seja, a arte engajada pretendia construir uma vanguarda, lideranças,

reformadores e revolucionários, conforme uma leitura de esquerda, e por outro lado era

necessária e relevante a ampliação de tais esferas, da arte engajada, como um

instrumento de conscientização política das massas.

Observa-se um paradigma, cujo a educação política, sentimental e estética, por

um lado, de uma elite (o jovem estudante universitário e de esquerda) e por outro lado

das massas, eram duas faces da mesma moeda, com perspectivas diferenciadas.

Portanto, na música popular a relação entre o artista e o público era mais problemática,

quando a comparamos em relação às artes como cinema ou teatro, pois estava ancorada

num sistema de comunicação, distribuição e produção do consumo das canções, que

abarcavam o artista.

Neste sentido, o surgimento do movimento Tropicália contrapõe-se com a MPB

nacionalista, que era aclamada principalmente pelo gosto médio e assinalada pelos

6 ZAN, José Roberto. Música popular brasileira, indústria cultural e identidade. In: EccoS Revista Científica, UNINOVE, São Paulo: (n. 1, v. 3): 105-122

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ideais nacionais populares, mas com uma relação diferenciada e menos direta do que no

teatro e no cinema. O Tropicalismo caracterizou-se pela carnavalização, pela festa, pela

alegoria do Brasil, pela crítica da musicalidade brasileira, pela crítica social, compondo

um ritual de devoração de valores. Do movimento tropicalista, participaram Gilberto

Gil, Caetano Veloso, Capinam, Torquato Neto, Gal Costa, os Mutantes, Tom Zé,

Rogério Duprat, Júlio Medaglia, entre outros. Os tropicalistas Gil e Caetano chegaram a

apresentar o programa Divino, Maravilhoso, na TV Tupi de São Paulo. Com a prisão e

o conseqüente exílio de Gil e Caetano, o movimento tropicalista naufragou.

Diferente das canções latino-americanas, mais engajadas aos movimentos

folclóricos e indígenas, no Brasil a música popular brasileira tomou o caminho

enveredado pela Bossa Nova cosmopolita, que explodiu em 1959 no mercado

fonográfico juntamente quando o rock n’ roll entrava também no mercado brasileiro.

Mas a preocupação maior da indústria ligada às produções da Bossa Nova era atingir

um determinado público, basicamente formado por uma juventude urbana, de classe

alta, predominantemente universitária. Comprovado um relativo sucesso com tal grupo

quando os shows inaugurais, ocorridos em campi universitários, determinante na

incorporação de tal estética bossanovística pelas camadas de intelectuais,

principalmente do movimento estudantil.

A princípio, a estética da bossa nova, com suas complexidades, o intimismo, e a

ideologia superficial falando de amor sorriso e flor, foram duramente condenados pelos

jovens do movimento estudantil. Mas por outro lado, era uma renovação musical no

cenário brasileiro e, além disso, um movimento que incorporava o samba juntamente

com as influencias jazzísticas, e não poderia ser desprezado contra as alternativas

“imperialistas” do rock e do jazz.

Como tudo que existe na sociedade, a música brasileira também é uma das

várias formas para a dramatização de problemas importantes, principalmente em um

período de turbulências políticas e ideológicas. Assim a música, ouvida e teorizada no

Brasil seria um modo específico pelo qual a sociedade fala, revela-se, deixando-se

descobrir.

Neste sentido, a discussão sobre uma bibliografia para a história da música

popular brasileira ganha importância, por se considerar que de certa forma, o tema é

obscuro no meio historiográfico. De qualquer modo, é importante registrar a existência

de algumas obras recentes sobre o estudo da música e cultura brasileira.

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Como se pode notar na produção História & Música (2002)7, Marcos

Napolitano, nos proporciona uma análise das diversas vertentes musicais e culturais

que constituíram ma música popular brasileira, em suas diversas formas, gêneros e

estilos. Devemos mencionar também, com Cultura brasileira 8, em que Napolitano

procura mapear os vários caminhos pelos quais se pensou e se viveu a vida cultural no

Brasil entre os anos 1950 e 1980. Enfatizando as varias expressões artísticas que

surgiram nesse período e os dilemas nacionais que o debate cultural e estético

traduziram e equacionaram.

Entretanto, devemos salientar que neste período os grandes centros de consumo

e produção da musica popular eram basicamente Rio de Janeiro e São Paulo. Como

enfatiza Eduardo Rocha Virmond, em texto publicado pela Gazeta do Povo em 76, “os

grandes espetáculos passavam por cima de Curitiba, a cinco mil metros de altura, entre

Rio e Buenos Aires, porque aqui não havia lugar”9. Em termos geográficos, a MPB

situa-se no eixo Rio-São Paulo, pólo de urbanização e modernização do país. A MPB se

consolidava como um movimento musical urbano com um público em sua maioria de

classe-média e universitário.

***

No Paraná, este período foi marcado por intensas mudanças, principalmente em

Curitiba. Entretanto, essas mudanças ocorrem desde o final dos anos 50, buscando

firmar Curitiba como centro administrativo do Estado. Neste sentido, a principal obra é

a construção do centro Cívico, que se coloca como um marco das potencialidades

locais, da ação modernizadora do governo, que investe sobre construção de um lugar de

poder.

7 NAPOLITANO, Marcos. História & música : história cultural da música popular. Belo Horizonte : Autêntica, 2002.. 8 NAPOLITANO, Marcos. Cultura brasileira: utopia e massificação (1950 - 1980). São Paulo : Contexto, 2004.. 9 GAZETA DO POVO. O Teatro Guaíra e seus autores. Curitiba, 11 de abril de 1976.

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12

Segundo Marion Brephol Magalhães “esse empreendimento é composto por uma

série de obras capazes e dizer por si só da existência de um governo, de um centro que

administra as demais regiões”10.

Entre essas obras, além do Centro Cívico podemos citar também a construção

da Biblioteca Pública, Praça do Centenário e Monumento do Centenário, Colégio

Tiradentes, avenidas de acesso ao Centro Cívico e o teatro Guaíra, nosso objeto de

pesquisa.

Período em que reformas urbanas e culturais introduzidas em Curitiba inseriram

a cidade no modelo de modernidade vigente durante o Regime Militar. Momento

decisivo em relação ao processo de planejamento da cidade data dos anos 70 os

principais projetos na área de transportes coletivos, embelezamento, restauração e

preservação dos sítios históricos, padronização da paisagem urbana, implantação de

áreas de lazer (como parques e bosques), recebendo à cidade a denominação de modelo

de urbanismo.

Entre os autores que compartilham do objetivo de analisar as bases sociais e

políticas de apoio ao projeto de reforma urbana desenvolvido em Curitiba,

acrescentamos Dennison de Oliveira. Em Curitiba e o mito da cidade modelo (2000)11,

o autor examina o papel desempenhado por um determinado contexto institucional na

conformação de uma certa tradição de planejamento urbano que serviu de alicerce para

um projeto político bem sucedido. A reflexão sobre os diversos contextos institucionais

nos quais, o urbanismo moderno se desenvolve, permite uma interpretação sobre o

caráter diferenciado da experiência curitibana face ao resto do país.

Concebido como um complexo com três auditórios, o Teatro Guaíra começou a

ser construído em 1952. O "Auditório Salvador de Ferrante", de médio tamanho,

conhecido como “Guairinha”, foi inaugurado em dezembro de 1954, com a presença do

então Presidente da República Café Filho. A primeira peça apresentada no auditório foi

"Vivendo em Pecado", de Terence Rattigan, da companhia Dulcina, em fevereiro de

1955.

Entretanto, as obras do grande auditório seguiram lentamente durante dezesseis

anos. Em de abril de 1970, quando a inauguração estava próxima, um incêndio causou

graves danos ao prédio, que precisou de mais quatro anos para ficar pronto. A principal

10 MAGALHÃES, Marion Brephol de. Paraná: política e governo. Curitiba : SEED, 2001. p. 63. 11 OLIVEIRA, Dennison de. Curitiba e o mito da cidade modelo. Curitiba : Ed. Da UFPR, 2000.

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sala do teatro, o “Auditório Bento Munhoz da Rocha Netto” apenas seria aberto ao

público, com a peça de estréia "Paraná, Terra de Todas as Gentes", de Adherbal Fortes e

Paulo Vítola, em dezembro de 1974.

No ano seguinte, alguns meses após a inauguração do teatro, foi realizado o I

Encontro da MPB, momento este especial em que o espaço social, cultural e comercial

da MPB começava a se rearticular, marcado principalmente pelo retorno de

compositores exilados. Voltado para um publico consumidor de produtos culturais

ligados à oposição do regime militar, neste caso a MPB. Este evento contou com

grandes expoentes da musica brasileira como Milton Nascimento, Jorge Ben, Maria

Bethânia e Chico Buarque.

Um outro aspecto que não pode deixar de ser enfatizado é que paralelamente ao

I Encontro da MP, foi realizado o I Encontro dos Pesquisadores da MPB, debates que

contou com Sérgio Cabral, Paulo Tapajós, Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo

Albin, Hermínio Bello de Carvalho, J. L. Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de

Souza. Conforme publicado no Diário do Paraná: “terá início amanha, às 17 hrs no

auditório Salvador de Ferrante, o I Encontro de Pesquisadores da MPB, que reunirá

todos aqueles que se preocupam com o estudo, a coleta de dados e documentos visando

a preservação da memória musical brasileira.”12

12

DIÁRIO DO PARANÁ. MPB tem “encontro no Paraná”. Curitiba 27 de fevereiro de 1975. p. 3.

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14

Capítulo II

Podemos demarcar dois processos diferentes dentro da história da MPB, sua

criação e sua institucionalização. 13 Trata-se da música popular urbana de classe média

surgida após a segunda geração da Bossa Nova. Não é um gênero como samba,

modinha, lundu, bolero, choro ou música erudita, que são estilos definidos ouvidos

predominantemente por classes sociais distintas.

A MPB começou com um perfil marcadamente nacionalista, mas foi mudando e

incorporando elementos de procedências várias. Na cultura musical brasileira não existe

muita resistência, por parte dos músicos, em misturar gêneros musicais. Por isso

existem diversos correntes musicais e gêneros híbridos, e outros mais que, ainda que

não possam ser consideradas novas linguagens, também não se encaixam nas definições

mais comuns de seus respectivos gêneros, difrenciando-se.

Importante salientar que a Bossa Nova não é um marco zero da cultura musical

brasileira, porém traz consigo uma rica bagagem. Entretanto é a Bossa Nova que agrega

esses elementos, através de João Gilberto, criando um novo gênero a partir de elementos

já existentes. Ao mesmo tempo em que se criava um produto nacional, a Bossa Nova

era criticada por estar matando a legitima musica popular feita pelo povo brasileiro, com

seus maneirismos regionais. As principais críticas feitas à Bossa Nova eram devidas a

elementos como sua elitização, ao seu olhar para a Zona Sul carioca, sua temática

sentimental, impressionista e nada popular, além de sua influencia americana que lhe

rendia críticas de imperialistas.

Passado período inicial da Bossa Nova, os primeiros anos da década de 60

começaram a trazer novidades em termos musicais. Não se tratava, no entanto, da

criação de estilos que a suplantassem, e sim, mais propriamente, da utilização de novos

temas a partir de derivações do ritmo e da harmonia bossa-novista. A estética da Bossa

Nova, com seu aspecto solar (com “garotas de Ipanema”, “barquinhos”, “flor” e

“amor”) harmonizava-se com o otimismo que marcou o governo JK e sua utopia

13NAPOLITANO, Marcos A música popular brasileira (MPB) dos anos 70: resistência política e consumo cultural.

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desenvolvimentista dos anos 50, representada simbolicamente pela construção de

Brasília, a “capital do futuro”. Já os anos 60 assistiram ao autoritarismo e aos terrores

impostos pelo golpe de Estado de 1964, que instituiu o regime militar no país.

Assim, os primeiros anos da década de 60 são marcados pela busca de uma

canção popular participante, em termos políticos e sociais. Surgem os compositores

engajados. Rejeitavam-se, na proposta bossa-novista, as perspectivas estéticas mais

formalistas, por resultarem numa arte consumida por minorias privilegiadas, optando -

se por uma estética clara e acessível às massas. As canções da Bossa Nova se

adequavam a ambientes intimistas; criava-se e ouvia-se Bossa Nova nos apartamentos

da Zona Sul carioca.

Já as tendências que se desenvolveram no início dos anos 60 envolviam um

público maior, de feitio universitário, politizado. A música popular deslocou-se, então,

para os teatros lotados por estudantes ávidos por mensagens políticas através da música.

Essa mudança na recepção musical passou a exigir um canto mais projetado, diferente

do estilo cool de João Gilberto. Assim, a estética bossa-novista passa a conviver com a

recuperação do excesso. Cria-se, assim, um tipo de musicalidade que concilia o discurso

nacionalista com os aspectos cosmopolitas da base musical da Bossa Nova.

Compositores e intérpretes ligados à Bossa Nova como Carlos Lyra, Sérgio Ricardo,

Nara Leão, Geraldo Vandré, Paulo Sérgio Valle e Marcos Valle optaram por um

repertório marcado pelo engajamento, voltado principalmente para um público

universitário. O lirismo da Bossa Nova cedia espaço para o estilo épico das canções de

protesto.

O relativo sucesso da bossa nova entre o público jovem, comprovado pelo êxito

dos shows inaugurais do movimento, ocorreu em campi universitários, e foi decisivo

para a incorporação dessa estética musical pelos intelectuais, como a base para uma

canção engajada nacionalista. Portanto, era precisamente o problema do público a ser

atingido que se colocava.

Buscamos observar também a institucionalização da MPB. Expressão que

sintetiza a busca de uma nova canção, como ilustramos anteriormente, que expressasse

o Brasil como projeto de nação idealizada por uma cultura política influenciada pela

ideologia nacional-popular e pelo ciclo de desenvolvimento industrial impulsionado a

partir dos anos 1950.

A MPB aqui, teve o papel de deslocar e redefinir o lugar social da canção

brasileira, iniciado com a Bossa Nova.

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Este estatuto de canção que dele emergiu não significou uma busca de

identidade e coerência estética. As composições de MPB seguiram sendo objetos de

diferentes fusões musicais, portadores de elementos estéticos de natureza diversa, tanto

em sua tanto poética como musicalmente falando.

A instituição MPB incorporou uma pluralidade de escutas e gêneros musicais

que, ora na forma de tendências musicais, ora como estilos pessoais, passaram a ser

classificados como MPB, processo para o qual a crítica especializada e as preferências

do público foram fundamentais. Mesmo após o Tropicalismo, elementos musicais

diversos, de certa forma concorrente num primeiro momento com a MPB, passaram a

ser incorporados sem maiores dificuldades.

A mudança do lugar social e do conceito de Música Popular Brasileira, que

mesmo se incorporando a indústria, ampliou os materiais e as técnicas musicais

interpretativas, além de consolidar a canção como veículo fundamental de projetos

culturais e ideológicos mais ambiciosos, dentro de uma perspectiva de engajamento

típico de uma cultura política nacional-popular.

O investimento na idéia de MPB como o centro de confluência de questões

políticas e culturais se revigora a partir de 1964 com o golpe militar. Em sua fase de

consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode nos apresentar marcas

ambíguas, durante a qual segmentos sociais, sobretudo da classe-média. Ou seja,

herdeiros de uma ideologia nacionalista integradora no campo político, porém abertos a

uma nova cultura de consumo no campo sócio econômico, nos fornecendo uma

tendência de gosto que contribuíram para definir o sentido da MPB14.

Com o novo estatuto de música popular vigente no Brasil, desde o final da

década de 60, a MPB passou a significar uma música socialmente valorizada, sinônimo

de “bom gosto”, mesmo com vendas menores que as músicas consideradas de “baixa

qualidade” pela crítica musical. Do ponto de vista do público este estatuto tem servido

como diferencial de gosto e status social, sempre alvo de questionamentos e

autocríticas.

Aqui novamente observamos que a MPB como instituição e sua consolidação,

foi resultado também da estreita ligação com o mercado da indústria fonográfica, do

qual foi alicerce e impulsionador no processo, não apenas como um fator alheio ao

campo musical, mas aliado também as estruturas de mídia e comunicação, como jornais

14 NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.

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e principalmente o rádio e tv, este último elemento essencial que conquistou e cooptou o

público de encontro a cultura musical brasileira. Foi a chamada Música Popular

Brasileira que sintetizou a tradição da grande música da “era do rádio”, nos anos 30,

com a renovação proposta pela Bossa Nova, no início dos anos 60. A “abertura” do

público original de música popular, de raiz nacionalista e engajada, se deu via mercado,

com todas as contradições que este processo acarretou na assimilação da experiência do

ouvinte.

Mas, curiosamente, o sucesso e a consolidação da MPB como música engajada

deveu-se muito mais às restrições da censura que propriamente a sua capacidade de

mobilização popular. Mas é interessante notar como a censura e a repressão imposta à

MPB despertaram ainda mais o interesse e atenção dos brasileiros para a situação

política do país. Deste modo, nas palavras de Napolitano, a censura influenciou,

decisivamente, o sucesso da MPB.

“Se a MPB sofria com o cerceamento do seu espaço de realização social, a repressão que se abateu sobre seus artistas ajudou a consolidá-la como espaço de resistência cultural e política (...). Paradoxalmente, o fechamento completo do espaço público para os atores da oposição civil, consolidou os espaços galvanizados pela arte, como formas alternativas de participação, nos quais a música era um elemento de troca de mensagens e afirmação de valores, onde a palavra, mesmo sob forte coerção, conseguia circular.”15

Ou seja, o efeito de cerceamento da liberdade criativa dos compositores, que

ousavam colocar em suas músicas referências ao contexto sócio-político do país, era

muito mais eficaz. Quando uma música era censurada, os olhos do público se voltavam

para ela e para o artista.

Diante do fechamento, do cerceamento da liberdade, o brasileiro viu-se

obrigado a trabalhar criativamente para criticar e tentar modificar a estrutura política

15 NAPOLITANO, Marcos. A música popular brasileira (MPB) dos anos 70: resistência política e consumo cultural.

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vigente, Neste sentido, a cultura tornara-se um espaço para onde haviam migrado as

poucas formas de resistência, até pelas lacunas deixadas pelos censores.”16

Os festivais transmitidos pela incipiente televisão foram também decisivos para

produzir essa aura de resistência e contestação, adquirindo mais e mais admiradores e

sendo um instrumento mais eficiente de conscientização das massas do que o cinema ou

o teatro.

Importante destacar o papel desempenhado pela TV e rádios da época, a TV se

transformou, nesses anos, num importante meio de divulgação de música popular. Além

de inúmeros programas musicais de grande sucesso como O Fino da Bossa, Bossaudade

e Jovem Guarda da TV-Record, iniciou-se, a partir de 1965, o ciclo dos festivais de

MPB em vários canais de televisão. Esses certames funcionaram, durante alguns anos,

como vitrines de divulgação de música popular.

A relação com esse novo meio levou os artistas a desenvolverem novas

habilidades interpretativas. Enquanto na época do rádio os artistas valorizavam

principalmente o desempenho vocal, com a TV tornava-se necessária a preocupação

com a performance gestual ou cênico-expressivo. Na segunda metade da década, os

conflitos se intensificaram no campo da música popular. Artistas e público ligados à

MPB criticavam a Jovem Guarda não só pelo seu não comprometimento com questões

políticas mas por identificá-la como elemento do imperialismo cultural norte-americano.

Em contrapartida, os artistas do iê-iê-iê diziam-se mais identificados com o povo

brasileiro uma vez que apresentavam maiores índices de vendagem de discos e de

audiência através dos meios.

Mais que mero reflexo das estruturas sociais, a MPB foi um pólo fundamental da

configuração do imaginário sócio-político da classe média progressista submetida ao

controle do Regime Militar. Também porque, considerável parcela dos compositores e

cantores mais destacados da MPB era procedente dos segmentos médios da sociedade.

Além disso, a MPB, refletia a consolidação da cultura de massa no Brasil, associada à

intensa urbanização, à formação de uma sociedade de consumo, à expansão da indústria

cultural e à inserção do país no processo de mundialização da cultura.

16 VILLARINO, Ramon Casas. A MPB em movimento: música, festivais e censura.

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19

Capítulo III

O jornal impresso é uma das principais fontes de informação histórica,

merecedor, portanto, de consideração. Ao discutir o problema da credibilidade das

fontes consideramos o periódico como um documento suspeito esse objeto é construído

e reconstruído tendo em vista as necessidades e perspectivas do presente a vida

cotidiana nela registrada em seus múltiplos aspectos permite compreender determinado

momento histórico.

Os jornais oferecem vasto material para o estudo da vida cotidiana, costumes e

práticas sociais, todos os aspectos do dia-a-dia estão registrados em sua páginas.

Crônicas que enfocam os acontecimentos do cotidiano, mantendo assim uma relação

íntima com o tempo vivido.

A escolha por essas fontes se deve ao fato dos jornais ser umas das principais

fontes de informação histórica. Preocupando-nos com a identificação das matrizes das

idéias, buscando compreender os pressupostos projetos políticos em um contexto e

veiculados nos jornais. 17 Ao refletir, de certa forma, o clima de época, isto é, inclusos

no contexto da década de 1970, tais reportagens nos permite assim ter acesso às formas

pelas quais as pessoas representavam as relações e as tensões que experimentavam

dentro do universo cultural musical.

O que nos chamou a atenção foi o tratamento da imprensa paranaense dado ao I

Encontro da MPB a respeito dos músicos e compositores brasileiros e suas relações com

o público. Em função disso, foram analisadas reportagens de periódicos como Gazeta do

Povo, Diário do Paraná, Estado do Paraná, sendo que nos focamos principalmente nas

informações publicadas no Diário do Paraná. Deste modo, buscaremos entender como o

Diário do Paraná repercutiu o I Encontro da MPB em suas páginas.

A escolha por essas fontes, se deve pelo fato dos jornais serem umas das

principais fontes de informação histórica. Preocupando-nos com a identificação das

17 CAPELATO, Maria Helena Rolim. A imprensa na história do Brasil. São Paulo : Contexto/EDUSP, 2ª edição, 1994. p. 24

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matrizes das idéias, buscando compreender os pressupostos projetos políticos

veiculados nos jornais.18 Ao refletir, de certa forma, o clima de época, isto é, inclusos no

contexto da década de 1970, essas reportagens nos permite assim ter acesso às formas

pelas quais as pessoas representavam as relações e as tensões que experimentavam

dentro do universo cultural musical.

Novos compositores e intérpretes invadem o cenário musical, com o surgimento

da MPB, esses artistas queriam cantar a realidade brasileira, as angústias políticas, as

transformações sociais, sem romantismo. Pretendiam criar e redefinir o modo de fazer

música, de forma polêmica, provocadora e engajada. Os festivais transmitidos pela

incipiente televisão brasileira foram também decisivos para produzir essa aura de

resistência e contestação.

Embora com outro formato, o conceito de “festival de música popular” ou de

“festival de canção”, que se estabeleceu no final dos anos 60, já existia no Brasil, eram

os concursos de músicas carnavalescas promovidos com sucesso no Rio de Janeiro

desde a década de 30. Nesses concursos de músicas de carnaval, os principais

ingredientes que fariam parte dos festivais, mais de 30 anos depois, já estavam

presentes, tais como a rivalidade, a intensa participação do público e as estratégias para

vencer o concurso.

Importante ressaltar que tais festivais de música, ocorrem entre 1965 e 1972,

sendo esvaziado devido à censura e perseguições aos principais nomes da MPB. Ainda

que a própria censura tivesse destaque no processo de consolidação da MPB. De acordo

com Zuza Homem de Mello as músicas do último festival da TV Record, realizado em

1969, foram consideradas sem criatividade, e a platéia se mostrou indiferente e

desanimada19.

***

18 CAPELATO, Maria Helena Rolim. A imprensa na história do Brasil. São Paulo : Contexto/EDUSP, 2ª edição, 1994. p. 24 19 MELLO, Zuza Homem de. A era dos Festivais. Rio de Janeiro : Editora 34, 2003.

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Ocorrido em fevereiro de 1975, I Encontro da MPB foi centrado para um

publico consumidor de produtos culturais ligados à oposição do regime militar. Este

evento não deve ser caracterizado como um ‘festival’, tal como os ocorridos até 1972,

essencialmente por acontecer tardiamente, após esse período, e por não haver

premiações nem jurados. Embora durante a mesma semana e no mesmo local também

existisse espaço para a discussão sobre a MPB, como se percebe no texto publicado no

Diário do Paraná, que apresenta a programação dos espetáculos.

Fique atento para a programação da semana. Segundo o teatro guaíra, Chico Buarque deve fazer dois shows se confirmado o cancelamento de Toquinho. Quanto a Vinícius está garantido, assim como Elizeth Cardoso, Maria Bethânia, Quarteto em Cy, Jorge Bem, Milton Nascimento e outros do 1º time. (...) Paralelamente no dia 28, aos espetáculos será iniciada a parte de debates sobre nossa música. Para isso estarão nomes importantes como Sérgio Cabral, Paulo Tapajós, Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo Albin, Hermínio Bello de Carvalho, J. L. Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de Souza entre outros. 20

Ainda sobre o I Encontro dos Pesquisadores da MPB, de maneira exagerada

também foi publicado,

Terá início amanha, (...) no auditório Salvador de Ferrante, o I Encontro de Pesquisadores da MPB, que reunirá todos aqueles que se preocupam com o estudo, a coleta de dados e documentos visando a preservação da memória musical brasileira. Representantes de estados da Guanabara, São Paulo, Rio Grande do Sul, Ceará, Santa Catarina e Paraná. Para Sale Wolokita, diretor da Fundação Teatro Guaíra, esta será a primeira vez se reúnem pesquisadores e críticos que trabalham isoladamente com o propósito de discutir os mais variados aspectos de nossa música e contribuir com dados e conclusões para o fortalecimento deste importante setor da cultura nacional.21

A abertura do encontro contou com a presença do Secretário de Educação e Cultura Cândido Martins e vários nomes ligados as atividades culturais de nossa capital, além, é claro, de todos os pesquisadores, críticos, e estudiosos que vieram engrandecer o acontecimento previsto apenas como uma reunião informal de interessados.22

20 Diário do Paraná. Música a boa semana. Curitiba, 9 de fevereiro de 1975. p. 3. 21 Diário do Paraná. MPB tem “encontro no Paraná”. Curitiba, 27 de fevereiro de 1975. p. 6. 22 Diário do Paraná. Sérgio Cabral fala sobre MPB. Curitiba, 1º de março de 1975. p.5.

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Nunca antes no Brasil a música popular teve um encontro de tal porte, neste final de semana, no auditório Salvador Ferrante, no FTG. Sede do encontro, abriga praticamente toda memória musical brasileira hoje existente.23

O destaque dado ao I Encontro dos Pesquisadores da MPB, aparece também nas

entusiasmadas linhas de Aramis Millarch no jornal Estado do Paraná.

Estes são apenas dois exemplos de um dos múltiplos aspectos que estão fazendo desta promoção da Fundação Teatro Guaíra o que, o jornalista Marco Aurélio Borba, da "Manchete", afirmou ontem pela manhã: "O mais importante acontecimento cultural em favor de nossa música". O encontro de quase 30 pesquisadores de sete Estados, incluindo nomes do mais alto gabarito, com livros publicados, discos produzidos, coordenação de grandes projetos, etc, está tendo resultados além do esperado, com sessões objetivas e na qual estão sendo formuladas propostas inteligentes e concretas, em favor da criação do Instituto Nacional da Música.24

Percebemos deste modo, que a MPB mesmo em seu processo de

institucionalização e consolidação de público sempre foi tema de debates, embora com

resultados pouco divulgados. Um dos pontos apresentados pelas reportagens do período,

refere à participação e envolvimento do público curitibano nos espetáculos do recém

inaugurado teatro. Público este que se revela animado frente às apresentações, mesmo

com o desconforto causado pela falta de infra-estrutura do local.

O encontro de MPB que a fundação Teatro Guaíra está promovendo acaba por terra conceitos profundamente enraigados, entre nós. Um deles: o de que o público de Curitiba é frio, de lentas reações diante das manifestações artísticas. O que se tem visto é justamente o contrário, a despeito da incomoda atmosfera que a falta de refrigeração propicia ao auditório Bento Munhoz da Rocha Netto. É uma autentica sauna, e que só deixará de sê-lo dentro de 2 anos, quando finalmente estará chegando a requintada aparelhagem encomendada. (...) como se vê agora, o problema não é de formação étnica

23 Diário do Paraná. Um encontro original. Curitiba, 1º de março de 1975. p.5. 24 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. Quando os pesquisadores se encontram. Curitiba, 9 de março de 1975. em <http://www.tabloidedigital.com.br/artigo12175.html> acessado em 26/08/06.

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23

que se pretendia creditar como causa da nossa pseudo apatia. O problema é na verdade, exclusivamente de boa ou má qualidade de espetáculos (...).25

Observamos que a participação e presença do público nos primeiros anos do

Teatro Guaíra, é analisada principalmente em função da qualidade dos espetáculos.

Como um dos idealizadores do I Encontro da MPB, Aramis Millarch também aborda a

questão do público, porém com a intenção de promover as atrações, incentivando a

população à compra antecipada de ingressos.

Também mais uma atração para o I Encontro da MPB: o Tamba Trio(...). A propósito: os ingressos para o superfestival da MPB já estão a venda. E esgotando-se rapidamente.26

Hoje à noite, no auditório Salvador de Ferrante, os 2.300 lugares do auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, no encerramento do I Encontro do MPB, serão insuficientes para a multidão que desejar aplaudir o MPB-4 e Chico Buarque.27

A mesma questão sobre antecipação dos ingressos é apresentada pelo Diário da Paraná da seguinte forma, salientando também a existência de cambistas.

Quem deixou para comprar ingressos hoje para ver Maria Bethânia vai se dar mal. Em princípio vai ter que ficar pelos corredores do grande teatro, isto se conseguir entrar. Ontem antes do meio dia, a lotação de 2300 lugares já havia esgotada. (...) que fazer, o mesmo certamente vai acontecer com os shows de Chico Buarque, amanhã e domingo. Enfim, o Guairão está ficando pequeno (...).28

Hoje é dia de Chico Buarque que também é Holanda, e que tem na sua vida uma Ana de Amsterdã. Chico hoje vai cantar somente músicas suas. Os ingressos começaram a ser

25 Diário do Paraná. MPB, reparos e calor. Curitiba, 26 de fevereiro de 1975. p. 6. 26 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. [sem título]. Curitiba, 21 de fevereiro de 1975 em <http://www.millarch.org/lernum.asp?id=9584&pesquisa=festival> acessado em 26/08/06. 27 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. O cantor Chico com sinal verde e um álbum excelente do MPB-4. Curitiba 2 de março de 1975. em <http://www.millarch.org/lernum.asp?id=12157&pesquisa=festival> acessado em 26/08/06. 28 Diário do Paraná. Maria Bethânia com o Guairâo lotado. Curitiba, 28 de fevereiro de 1975. p. 3.

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vendidos ontem, o que significa que hoje restarão poucos. É claro, não faltará ingressos no câmbio negro.29

Deste modo, podemos perceber que, a mudança do lugar social e do conceito de

MPB, que mesmo se incorporando a indústria, ampliou os materiais e as técnicas

musicais interpretativas, além de consolidar a canção como veículo fundamental de

projetos culturais e ideológicos mais ambiciosos, dentro de uma perspectiva de

engajamento típico de uma cultura política nacional-popular.

O investimento na idéia de MPB como o centro de confluência de questões

políticas e culturais se revigora a partir de 1964 com o golpe militar. Em sua fase de

consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode nos apresentar marcas

ambíguas, durante a qual segmentos sociais e formação de público, sobretudo da classe-

média. Ou seja, herdeiros de uma ideologia nacionalista integradora no campo político,

porém abertos a uma nova cultura de consumo no campo sócio econômico, nos

fornecendo uma tendência de gosto que contribuíram para definir o sentido da MPB30.

Da mesma forma, devemos ressaltar o papel desempenhado pelas censura e suas

restrições da censura, no processo de institucionalização da MPB e sua capacidade de

mobilização de um público consumidor de produtos culturais ligados a oposição do

Regime Militar . Também é importante notar como a censura e a repressão imposta à

MPB despertaram ainda mais o interesse e atenção dos brasileiros para a situação

política do país, que segundo Marcos Napolitano, censura influenciou, decisivamente, o

sucesso da MPB. Napolitano, aponta também que a possibilidade de compreender o

público universitário, engajado, segmento jovem da classe média mais abastada, fosse o

público de MPB, principalmente em seu período mais repressivo entre 1969 e 1944.

No final de 1974, como sempre acontece, as gravadoras reservaram algumas boas edições de musica brasileira, com nomes de enfrentar o ex-maior (ufa!) fenômeno de vendas -a majestade (sem trono) Roberto Carlos, da CBS, cujos recordes de vendagem já começam a ser superado por gente de melhor nível, como Martinho da Vila . Ao lado das estrelas maiores da melhor MPB. Chico Buarque, MPB-4, e Gilberto Gil, da Phonogram, Antônio Carlos & Jocafi, da RCA Victor, Marcos Valle da Odeon etc.,

29 Diário do Paraná. [ ]. Curitiba, 1º de março de 1975. p. 3. 30 NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.

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houve também algumas surpresas altamente animadoras: a vigorosa estreia de Eliana Pittman na RCA Victor no melhor álbum de sua carreira, a presença de Miriam Batucada com um bom elepe na Chantecler, um novo elepe no conjunto Demônios da Garoa, um punhado de importantes discos de Marcus Pereira, e muita coisa mais em favor da melhor musica popular - a nossa. Assim, vamos colocar as fonografias em dia, com registros do que de bom apareceu nos últimos meses.31

Temos certeza que após o espetáculo de hoje a noite, com Chico Buarque e o MPB-4, amanhã, as lojas de discos da cidade venderão mais algumas centenas de exemplares dos elepes "Sinal Fechado" e "Palhaços & Reis". Com toda razão, quem ainda não se decidiu, após ouvi-los aos vivos não deixara de querer ter as gravações mais recentes destes artistas que hoje ganharão vários minutos de aplausos no auditório Bento Munhoz da Rocha Neto.32

Notamos que a MPB como instituição e sua consolidação, foi resultado também

da estreita ligação com o mercado da indústria fonográfica, aliado às estruturas de mídia

e comunicação, como jornais e principalmente o rádio e TV. Neste sentido, a relevância

dada ao I Encontro da MPB se apresenta principalmente na possibilidade de criação de

um público consumidor de MPB em Curitiba no anos 70.

Como podemos observar, o I Encontro da MPB destacado pela imprensa

paranaense, funciona como uma história mítica, mais simbólica que argumentativa

dentro do processo de institucionalização da MPB. Que vai sendo atualizada,

adequando-se às demandas de construção de identidade ou ao engajamento.

31 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. O cantor Chico com sinal verde e um álbum excelente do MPB-4. Curitiba 2 de março de 1975. em <http://www.millarch.org/lernum.asp?id=12157&pesquisa=festival> acessado em 26/08/06. 32 Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em Estado do Paraná. O cantor Chico com sinal verde e um álbum excelente do MPB-4. Curitiba 2 de março de 1975. em <http://www.millarch.org/lernum.asp?id=12157&pesquisa=festival> acessado em 26/08/06.

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Considerações finais

Em suma, seria difícil, hoje, imaginarmos o Brasil sem a MPB, da mesma forma

que é difícil estabelecer uma única razão para a enorme projeção conquistada por

gênero musical. A discussão levantada em torno das reportagens sobre a inauguração do

Teatro Guaíra e o I Encontro da MPB mostrou-se instigante na medida em que

tematizou um fenômenos com grande visibilidade na sociedade paranaense e que se

encontra pouco analisado, as festividades de inauguração do principal teatro do Paraná.

O que nos chamou a atenção foi o tratamento da imprensa paranaense dado ao I

Encontro da MPB a respeito dos músicos e compositores brasileiros e suas relações com

o público. Ocorrido em fevereiro de 1975, I Encontro da MPB foi centrado para um

publico consumidor de produtos culturais ligados à oposição do regime militar. Este

evento não deve ser caracterizado como um ‘festival’, tal como os ocorridos até 1972,

essencialmente por acontecer tardiamente, após esse período, e por não haver

premiações nem jurados. Embora durante a mesma semana e no mesmo local também

existisse espaço para a discussão sobre a MPB, pois no mesmo período foi realizado o I

Encontro dos Pesquisadores da MPB. Percebemos deste modo, que a MPB mesmo em

seu processo de institucionalização e consolidação de público sempre foi tema de

debates, embora com resultados pouco divulgados.

Deste modo, podemos perceber que, a mudança do lugar social e do conceito de

MPB, que mesmo se incorporando a indústria, ampliou os materiais e as técnicas

musicais interpretativas, além de consolidar a canção como veículo fundamental de

projetos culturais e ideológicos mais ambiciosos. O investimento na conceito de MPB

como o centro de questões políticas e culturais se revigora a partir de 1964 com o golpe

militar. Em sua fase de consolidação ao longo da década de 70, a instituição MPB, pode

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nos apresentar marcas ambíguas, durante a qual segmentos sociais e formação de

público, sobretudo da classe-média se ajudaram a definir o sentido da MPB33.

Cabe também ressaltar a importância de como a censura e a repressão imposta à

MPB despertaram ainda mais o interesse e atenção dos brasileiros para a situação

política do país, que segundo Marcos Napolitano, censura influenciou, decisivamente, o

sucesso da MPB, que aponta também que a possibilidade de compreender o público

universitário, engajado, segmento jovem da classe média mais abastada, fosse o público

de MPB, principalmente em seu período mais repressivo

Notamos que a MPB como instituição e sua consolidação, foi resultado também

da estreita ligação com o mercado da indústria fonográfica, aliado às estruturas de mídia

e comunicação, como jornais e principalmente o rádio e TV. Neste sentido, a relevância

dada ao I Encontro da MPB se apresenta principalmente na possibilidade de criação de

um público consumidor de MPB em Curitiba no anos 70.

Como enfatizado anteriormente, este texto tentou abordar alguns pontos no

contexto de inauguração do principal auditório do Teatro Guaíra. Através das imagens

criadas pela imprensa paranaense, com muitas generalizações e louvores aos

compositores, contribuindo para a formação de um consumidor de produtos culturais

ligados à oposição do regime militar. Finalmente, esperamos que com este trabalho

estejamos contribuindo para o debate sobre este aspecto cultural tão importante que é a

MPB.

33 NAPOLITANO, Marcos. A musica popular brasileira(MPB) dos anos 70. In: Actas del IV Congresso Latinoamericano de la Associación para el Estúdio de la Música Popular. 2000. p. 3.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CAPELATO, Maria Helena Rolim. A imprensa na história do Brasil. São Paulo :

Contexto/EDUSP, 2ª edição, 1994.

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Cia das Letras, 1990.

MAGALHÃES, Marion Brephol de. Paraná: política e governo. Curitiba : SEED,

2001.

MELLO, Zuza Homem de. A era dos Festivais. Rio de Janeiro : Editora 34, 2003.

NAPOLITANO, Marcos. Seguindo a canção: engajamento político e indústria cultural

na MPB (1959-1969) São Paulo : Annablume : Fapesp, 2001.

____________________. A música popular brasileira (MPB) dos anos 70: resistência

política e consumo cultural. In: www.puc.cl/iaspm/mexico/articulos/napolitano.pdf

____________________. A arte engajada e seus públicos (1955/1968). In: Estudos

Históricos, nº 28. Rio de Janeiro, 2001.

____________________. História & música : história cultural da música popular. Belo

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____________________. Cultura brasileira: utopia e massificação (1950 - 1980). São

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OLIVEIRA, Dennison de. Curitiba e o mito da cidade modelo. Curitiba : Ed. Da

UFPR, 2000.

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ORTIZ, Renato. A moderna tradição brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1998.

HISTÓRIA: Questões & debates. Curitiba, PR : Ed. da UFPR, n. 36,2002.

TINHORÃO, José Ramos de. Pequena História da musica popular : da modinha a

canção de protesto. Petrópolis : Editora Vozes, 1974.

ZAN, José Roberto. Música popular brasileira, indústria cultural e identidade. In: EccoS

Revista Científica, UNINOVE, São Paulo: (n. 1, v. 3)Junho 2001. p.105-122.

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ANEXOS

Diário do Paraná. Música a boa semana. Curitiba, 9 de fevereiro de 1975. p. 3.

Música a boa semana

Para o público de música popular, a semana começa com toda a familia Caymmi

no auditório Bento Munhoz da rocha Netto, às 21hrs de hoje (...) e continuando amanhã,

no mesmo auditório um dos melhores espetáculos brasileiros do momento: “Brasileiro:

profissão esperança”, com Clara Nunes e Paulo Gracindo, com texto de Paulo Fontes e

direção de sua mulher Bibi Ferreira.

enfim, a semana vai continuar com um espetáculo por dia, dentro do I Encontro

de MPB, que só podia ter o jornalista Aramis Millarch como o cérebro de tudo.

Fique atento para a programação da semana. Segundo o teatro guaíra, Chico

Buarque deve fazer 2 shows se confirmado o cancelamento de Toquinho. Quanto a

Vinícius está garantido, assim como elizeth Cardoso, Maria Bethânia, Quarteto em Cy,

Jorge Bem, Milton Nascimento e outros do 1º time.

Tudo isso dentro da programação de inauguração do auditório Bento Munhoz da

rocha Netto com 2300 lugares.

Paralelamente no dia 28, aos espetáculos será iniciada a parte de debates sobre

nossa música. Para isso estarão nomes importantes como Sérgio Cabral, Paulo Tapajós,

Lúcio Rangel, Paixão Cortes, Ricardo Cravo Albin, Hermínio Bello de Carvalho, J. L.

Frezzeti, Hermínio Borba Filho, Tárik de Souza entre outros.

***

Diário do Paraná. .... Curitiba, 25 de fevereiro de 1975. p. 6.

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(...) no domingo, a família Caymmi ali ter marcante concerto. Hoje, 3ª feira, quem ali se

apresenta é Jorge Ben e Conjunto.

“Lembrando Elizeth” elizeth Cardoso , que amanha estará no auditório Bento

Munhoz da Rocha Netto, no Teatro Guaíra, dando prosseguimento ao Encontro dos

melhores da MPB, foi uma das cantoras que em 1965, na noite de encerramento da

promoção “Pinheiro de prata”, esteve naquele mesmo palco(??). só que há 10 anos era

improvisado, funcionando precariamente. Elizeth em 65, foi premiada com o “Pinheiro

de Prata”, promoção da Fundepar em favor da MPB, infelizmente abandonada por falta

de estrutura organizacional.

***

Diário do Paraná. MPB, reparos e calor. Curitiba, 26 de fevereiro de 1975. p. 6.

“MPB, reparos e calor”

O encontro de MPB que a fundação Teatro Guaíra está promovendo acaba por

terra conceitos profundamente enraigados, entre nós. Um deles: o de que o público de

Curitiba é frio, de lentas reações diante das manifestações artísticas. O que se tem visto

é justamente o contrário, a despeito da incomoda atmosfera que a falta de refrigeração

propicia ao auditório Bento Munhoz da Rocha Netto. É uma autentica sauna, e que só

deixará de sê-lo dentro de 2 anos, quando finalmente estará chegando a requintada

aparelhagem encomendada. (...) como se vê agora, o problema não é de formação étnica

que se pretendia creditar como causa da nossa pseudo apatia. O problema é na verdade,

exclusivamente de boa ou má qualidade de espetáculos (...) relatório de 74, o Guaíra

promoveu em 12 meses 344 espetáculos.

***

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32

Diário do Paraná. MPB tem “encontro no Paraná”. Curitiba, 27 de fevereiro de 1975. p.

6.

MPB tem “encontro no Paraná”

Terá início amanha, às 17 hrs no auditório Salvador de Ferrante, o I Encontro de

Pesquisadores da MPB, que reunirá todos aqueles que se preocupam com o estudo, a

coleta de dados e documentos visando a preservação da memória musical brasileira.

Representantes de estados da Guanabara, São Paulo, Rio Grande do Sul, Ceará, Santa

Catarina e Paraná. Para Sale Wolokita, diretor da Fundação Teatro Guaíra, esta será a

primeira vez se reúnem pesquisadores e críticos que trabalham isoladamente com o

propósito de discutir os mais variados aspectos de nossa música e contribuir com dados

e conclusões para o fortalecimento deste importante setor da cultura nacional. Aramis

Millarch menciona (...) o oportunismo da iniciativa lembrando que o MEC está

propenso a criar o Instituto Nacional de Música, que ficaria com o encargo de levar

avante todas as proposições levantadas no decorrer do debate. Roselys Roderjan,

estudiosa da MPB (...) comentou acerca das dificuldades de se fazer um panorama

completo da música brasileira de hoje pelo fato de se encontrar “em um verdadeiro

período de transição onde a música regional e urbana está tomando novos rumos e

despertando para o acervo folclórico”. Ela crê que este encontro dará subsídios

suficientes para uma perfeita e completa avaliação do estágio atual da música brasileira

e abrirá novos horizontes para sua pesquisa.

“Milton Nascimento hoje” Milton que está na cidade desde a última 6ª feira, é

dessas pessoas que não gostam de falar. É como uma esfinge que só revela seu segredo

através da música. Seu silencio implica apenas em simplicidade, embora ele faça do

calar uma forma contida de manifestação de sua arte que o Guairão vai ver hoje.

Mas voltemos no tempo, 1972, quando Milton apenas surgia começou a

trabalhar com Lô Borges “meu irmão por adoção e meu afilhado batizado com cerveja

no boteco belo horizontino, numa cerimônia celebrada por Fernando Brant”. O trio

chegou o formar o “clube da esquina”. Durou pouco, Lô como Milton cresceu e cada

um tomou rumo próprio. O “Som Imaginário” entrava na jogada de Milton. Logo veio

“Sentinela” (...) travessia marcou Milton definitivamente junto ao grande público, mas

hoje promete boas surpresas.

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Amanhã é o dia de Maria Bethânia que apresentará a SCENA MUDA,

acompanhada pelo conjunto Terra Trio. Esse espetáculo será as 21hrs no grande

auditório.

***

Diário do Paraná. Maria Bethânia com o Guairâo lotado. Curitiba, 28 de fevereiro de

1975. p. 3.

Maria Bethânia com o Guairao lotado.

Quem deixou para comprar ingressos hoje para ver Maria Bethânia vai se dar

mal. Em princípio vai ter que ficar pelos corredores do grande teatro, isto se conseguir

entrar. Ontem antes do meio dia, a lotação de 2300 lugares já havia esgotada. (...) que

fazer, o mesmo certamente vai acontecer com os shows de Chico Buarque, amanhã e

domingo. Enfim, o Guairão está ficando pequeno para a vibração de Sale Wolokita.

***

Diário do Paraná. Bethânia é um sucesso no Guairão. Curitiba, 1º de março de 1975.p.1.

Bethânia é um sucesso no Guairão

Maria Bethânia, uma das mais expressivas da musica popular brasileira,

acompanhada pelo Terra Trio, apresentou-se ontem no Guairão com o espetáculo Cena

Muda para uma platéia que superlotou todas as suas dependências. Já na véspera, em

menos de duas horas, os ingressos foram vendidos. Por outro lado, no auditório

Salvador Ferrante, do FTG, Sérgio Cabral, jornalista de O Pasquim, autor de escolas de

samba, quando, quem, como, onde, porque?” Proferiu ontem a palestra de abertura do I

Encontro de Pesquisadores de MPB. Ao todo são trinta os pesquisadores presentes ao

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acontecimento, que para a crítica nacional, são os preservadores da memória musical

brasileira.

***

Diário do Paraná. [ ]. Curitiba, 1º de março de 1975. p. 3.

Hoje é dia de Chico Buarque que também é Holanda, e que tem na sua vida uma

Ana de Amsterdã. Chico hoje vai cantar somente músicas suas. Os ingressos

começaram a ser vendidos ontem, o que significa que hoje restarão poucos. É claro, não

faltará ingressos no câmbio negro. Para o show de Bethânia teve gente que pagou 700

cruzeiros.

***

Diário do Paraná. Sérgio Cabral fala sobre MPB. Curitiba, 1º de março de 1975. p.5.

Sérgio Cabral fala sobre MPB

Começou ontem o I Encontro de Pesquisadores de MPB com a palestra “A

pesquisa na MPB” por Sérgio Cabral, jornalista de O Pasquim, autor de “escolas de

samba, quando, quem, como, onde, porque?”.

A abertura do encontro contou com a presença do Secretário de Educação e

Cultura Cândido Martins e vários nomes ligados as atividades culturais de nossa capital,

além, é claro, de todos os pesquisadores, críticos, e estudiosos que vieram engrandecer o

acontecimento previsto apenas como uma reunião informal de interessados.

***

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35

Diário do Paraná. Um encontro original. Curitiba, 1º de março de 1975. p.5.

Um encontro original

Nunca antes no Brasil a música popular teve um encontro de tal porte, neste final

de semana, no auditório Salvador Ferrante, no FTG. Sede do encontro, abriga

praticamente toda memória musical brasileira hoje existente.

***

Diário do Paraná. Curitiba Capital da Música Popular. Curitba, 2 de março de 1975. p.8.

Curitiba Capital da Música Popular

Dois programas paralelos, a apresentação dos melhores da MPB, iniciada dia 23

de fevereiro e que encerra hoje, e o I Encontro de Pesquisadores de MPB, trazem

especial destaque para Curitiba. É a possibilidade, pela primeira vez, de se levar uma

série de espetáculos, com nomes famosos como Elizeth Cardoso, Chico Buarque, Maria

Bethânia e outros, superlotando o Guairão, e a transformação de Curitiba num marco

histórico da MPB. Em seu seio pela primeira vez reuniram-se pesquisadores e maiores

conhecedores da nossa música, que até então vinham trabalhando isoladamente.

***

Diário do Paraná. Pesquisador: MPB em Debate. Curitiba, 2 de março de 1975. p.8

Pesquisador: MPB em Debate

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Sem seguir a risca a programação previamente elaborada, os pesquisadores da

MPB tiveram em sua sessão de instalação da sexta feira um contato sem maiores

formalidades, num clima agradável que mais parecia um bate papo de amigos num bar.

Enquanto chegavam retardatários e todos comentavam a ausência de importantes

nomes da crítica, pesquisa e documentação da nossa música como Ricardo Cravo Albin,

Tarik de Souza e outros, na abertura do encontro, Aramis Milarch, o idealizador da

promoção se desdobrava, corria de um lado para o outro para atender todas as

necessidades dos participantes, receber e representar cada um deles e garantir o bom

andamento dos debates.

***

Diário do Paraná. Pioneirismo. Curitiba, 2 de março de 1975. p.8.

Pioneirismo

Com um desenvolvimento natural, foram sendo levantados temas de alto relevo

acerca tanto da pesquisa como dos problemas que afetam a MPB de hoje. E foi o grande

número de divergências e de diferentes acervos de informações que patentearam o valor

deste encontro que é, segundo Sérgio Cabral, “a complementação de uma engrenagem

onde nenhum dos nossos pesquisadores conhece tudo o que existe sobre nossa música”.

Esta é a primeira vez que tantos conhecedores e estudiosos se encontram para um

debate, e o fato de quase todos não se conhecerem mostra o anonimato segundo o qual

vinham realizando seus trabalhos.

Após rápidas palavras do Secretário de Educação e Cultura do Paraná, Cândido

Martins de Oliveira, Paulo Tapajós, produtor dos programas de MPB do projeto

Minerva, seu início aos debates fazendo comentários sobre a importância desse primeiro

encontro e definindo a posição do pesquisador brasileiro.

“Este nosso contato tem relevância histórica com relação à MPB, a insuficiência

de documentação existente poderá ser sanada em parte aqui trazendo frutos para a

história da nossa música popular”. Este encontro serve como uma quebra de silêncio, o

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fim do egoísmo que vinha imperando entre os pesquisadores que são assim como

colecionadores de selos que procuram dados, os encontram e guardam sem mostrar para

ninguém.

Desde cedo, demonstrou-se a preocupação de encarar aspectos concretos da

pesquisa e dos problemas de nossa musica com o intuito de se preparar um documento a

ser enviado ao Ministério da Educação e Cultura. Assim, Sérgio Cabral, que na mesa,

juntamente de Paulo Tapajós, Paixão Cortes, Lúcio Rangel e Miguel Ângelo de

Azevedo, presidiu o debate, tratou de definir uma organização de trabalho do qual

deveria englobar os aspectos mais presentes a serem discutidos.

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