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Literatura Portuguesa: Poética

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Do Barroco ao Arcadismo

Material Teórico

Responsável pelo Conteúdo:Prof. Dr. Manoel Francisco Guaranha

Revisão Textual:Profa. Ms. Silvia Augusta Albert

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• O Período Barroco

• O Barroco Português

• O Arcadismo e o Neoclassicismo

Atenção

Para um bom aproveitamento do curso, leia o material teórico atentamente antes de realizar as atividades. É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma.

· Nesta unidade, estudaremos o período da literatura portuguesa que vai de 1580 a 1825, que inclui o Barroco (1580 – 1756) e o Arcadismo (1756 – 1825). Trata-se de um período extenso e que corresponde à transição para o mundo contemporâneo, marcado não mais pelo Absolutismo, mas pelo domínio da burguesia.

Do Barroco ao Arcadismo

• O Arcadismo em Portugal

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Unidade: Do Barroco ao Arcadismo

Contextualização

A morte de Camões, em 1580, e a passagem da coroa portuguesa para a Espanha, no mesmo ano, são acontecimentos emblemáticos que irão marcar o período de decadência cultural do século XVII. Em decorrência disso, surge o desejo de restauração da autonomia, que ocorrerá em 1640.

No resto da Europa, vivia-se um clima de embate entre a Reforma Protestante e a Contrarreforma Católica, conflito ideológico que se refletiu na arte barroca. Na Península Ibérica, mais fortemente dominada pela Igreja, a linguagem do Barroco teve grande penetração.

No que diz respeito ao Iluminismo, que marca o século XVIII, os efeitos desse momento de valorização da cultura laica demoraram um pouco a aparecer em Portugal, mas mesmo assim se fizeram sentir num século em que os valores culturais já antecipavam a contemporaneidade por meio da valorização da razão e da experiência humanas.

São esses dois momentos que iremos estudar nesta unidade, o Barroco e o Arcadismo, destacando os textos poéticos dos principais nomes portugueses dessas correntes estéticas que precedem o Romantismo. Aliás, é no Pré-Romantismo que vamos terminar a unidade, destacando a figura emblemática de Bocage, que serve de elo entre os séculos XVIII e XIX.

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O Período Barroco

Denomina-se Barroco o estilo da maioria das obras artísticas da pintura, da música, da escultura, da arquitetura e da literatura produzidas entre o final do século XVI até a metade do século XVIII. No Brasil, tivemos manifestações do Barroco até o século XIX, nas Minas Gerais. Um exemplo disso foi o escultor Aleijadinho, que viveu em Ouro Preto, entre 1730 e 1814.

ExploreSaiba mais sobre Aleijadinho visitando o site do Itaú Cultural:

h t tp : / /www. i t aucu l tu ra l .o rg .b r /ap l i cex te r nas /enc i c loped ia_ i c / index .cfm?fuseaction=artistas_biografia&cd_verbete=62&cd_item=1&cd_idioma=28555

Essa fase do Barroco foi marcada pela retomada de alguns elementos da concepção medieval de mundo, que ficaram um pouco esquecidas pelo racionalismo e pelo antropocentrismo do período renascentista.

O Barroco é uma espécie de linguagem artística que expressa os conflitos do homem dessa época. Esses conflitos, em grande parte, foram decorrentes da Reforma Protestante. Em 1517, Martinho Lutero prega 95 teses na porta da igreja do Castelo de Wittenberg posicionando-se contra a prática da Igreja Católica de vender indulgências, ou seja, o perdão dos pecados. Desse modo, Lutero pregava que o homem poderia chegar a Deus e obter o perdão por meio da moral, da fé, não por pagamentos. Além disso, também no século XVI, o teólogo francês João Calvino prega que a prosperidade era um dom de Deus em reconhecimento pelo trabalho e que, portanto, não era pecado enriquecer, como sustentava a Igreja Católica. Pela primeira vez, em séculos, o Catolicismo via suas bases, até então sólidas, serem abaladas.

Em resposta, o papa Paulo III convocou o Concílio da cidade italiana de Trento, realizado entre 1545 e 1563. Essa era uma reunião de lideranças católicas para tratar das questões de fé, costumes e disciplina escolástica. Esse evento lançou as bases da Contrarreforma, ou seja, do movimento de reação da Igreja Católica contra a Reforma Protestante.

Escolástica: doutrina e filosofia cristãs da Idade Média, que procuraram combinar a razão platônica e aristotélica com a fé e a revelação dos Evangelhos. Teve seu auge com Santo Tomás de Aquino (1225-1274).

Entre as ações do Concílio de Trento estavam a reorganização da Inquisição, que surgira no século XII, e a criação do Index Librorum Prohibitorum, uma lista de livros proibidos aos católicos.

Esse movimento teve resultado duradouro, sobretudo na Itália, na Península Ibérica e nas colônias portuguesas e espanholas. Uma das formas de expressar os valores da Igreja era criar uma arte cujo estilo transmitisse ao homem o poder de Deus, a fragilidade e a efemeridade

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Unidade: Do Barroco ao Arcadismo

humanas. Ocorre que, nesse período, o homem europeu já conhecia o mundo, não era mais aquele indivíduo tão supersticioso da Idade Média e queria buscar riquezas e viver aventuras. Desse conflito entre a religião que o chamava para Deus, para o Teocentrismo medieval, e os apelos mundanos do Antropocentrismo renascentista surge o estilo conflituoso denominado Barroco, cujos temas expressam a oposição entre os valores espirituais versus os valores burgueses, os apelos do espírito versus os apelos da carne, a virtude versus o prazer, enfim os polos opostos que separam o Céu da Terra.

Essa arte se contrapunha ao ideal clássico por causa da assimetria, do caráter extravagante e da ênfase nos aspectos emocionais que não eram a marca da arte renascentista e, por isso, posteriormente, a partir da segunda metade do século XVIII, quando novamente o estilo clássico foi valorizado, essa arte foi chamada, de forma pejorativa, de barroca, pois esse era o nome que se dava a uma pérola de superfície irregular. Dizia-se, por isso, que era uma degeneração da arte renascentista.

ExploreVocê pode saber mais sobre o Barroco nos seguintes sites:

Arteguias: http://www.arteguias.com/barroco.htm

E-Dicionário de Termos Literários, Carlos Ceia: http://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&task=viewlink&link_id=134&Itemid=2

São características da arte barroca, entre outras:

» Linguagem rebuscada, cheia de antíteses e que expressava um raciocínio tortuoso: essa foi a forma de expressão encontrada para reproduzir o conflito do homem dessa época.

» Expressão de contrastes: claro e escuro; vida e morte; belo e feio; alma e corpo.

» Tema da instabilidade do mundo, da efemeridade da vida humana.

» Cultismo: uso intenso de palavras eruditas, metáforas, construções sintáticas invertidas, figuras de linguagem de contrastes como antítese, oximoro, jogo de palavras.

» Conceptismo: jogo de ideias, de conceitos que caracteriza um discurso agudo e engenhoso.

Diferenças entre Cultismo e Conceptismo

“No século XVII, esta diferenciação entre duas “escolas” não estava consagrada, apesar das polémicas em torno da obscuridade e do elitismo da poesia conceptista, e em torno do refinamento e da artificialidade da poesia cultista. Alguma crítica insistiu na oposição entre os

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dois movimentos, como o comprova o comentário de António Sérgio: “A primeira distinção é a de estremar o cultismo do conceptismo, outrora empregados como sinónimos. É o cultismo um artifício de forma, ao passo que o conceptismo o é de conteúdo. Aquele, em suma, promana do relevo dos elementos linguísticos, ou dos factores pictóricos e dos musicais; o conceptismo, pelo contrário, consiste na busca de relações fictícias, de aproximações artificiais entre seres e ideias — relações arbitrárias para o pensamento lógico (para a inteligência científica), mas não arbitrárias para o “agudo engenho”... Por outras palavras, poderíamos definir a tendência cultista: um abuso ou artifício da fantasia no campo psicológico da representação sensível, perceptivo; e a conceptista: um abuso ou requinte da fantasia nos domínios próprios do entendimento, do pensar formal.” (Ensaios, Tomo V, 2ª ed., Sá da Costa, Lisboa, 1955, p.120). Tornou-se, pois, um lugar comum na poética barroca contrapor o conceptismo ao cultismo (tomado como um refinamento daquele), porém aceita-se hoje que os dois movimentos estilísticos não são antitéticos. Não é correcto diferenciá-los também como um problema de pensamento (conceptismo) e um problema de expressão (cultismo). Ambos procuram um determinado aperfeiçoamento estético, apenas utilizando diferentes meios para esse fim.”

Fonte - Carlos Ceia: s.v. “Conceptismo/Cultismo”, E-Dicionário de Termos Literários (EDTL), coord. de Carlos Ceia, ISBN: 989-20-0088-9, <http://www.edtl.com.pt>, consultado em 24-10-2013.

O Barroco Português

Profundas mudanças marcaram a sociedade portuguesa a partir de 1578. D. Sebastião (1554-1578) empreende uma jornada ao Norte da África para reconquistar terrenos perdidos para os muçulmanos no Marrocos. Lá, perde a batalha na localidade de Alcácer Quibir e desaparece. Como não tinha herdeiros, a coroa portuguesa passa para Felipe II, da Espanha, herdeiro direto mais próximo. Na prática, Portugal ficou sob o domínio espanhol até 1640. O declínio econômico e cultural, que sucedeu à perda da independência, deu espaço para o saudosismo que se manifestou, entre outras formas, pelo Sebastianismo: como o corpo do rei não fora encontrado, acreditava-se que ele voltaria para salvar a pátria e resgatar a antiga glória perdida. O Sebastianismo foi produto do Messianismo intrínseco à cultura judaico-cristã.

Emblematicamente, a morte de Camões, em 1580, marcou o início oficial do Barroco português, cujo brilho foi menor que o da arte do século anterior.

A literatura barroca foi uma arte empenhada em fortalecer o Catolicismo e é possível que isto tenha influenciado o fato de a prosa ser mais cultivada nesse período, principalmente a oratória e a prosa doutrinária. Como expoente nessa área, tivemos Padre Antônio Vieira (1608-1697), grande orador e sermonista, cujos textos são exemplos bem acabados da arte da época. Contudo, vamos tratar nesta unidade da poesia barroca portuguesa e, embora em menor escala, há um número significativo de escritores nesse período que merecem atenção. Elegemos dois deles para mostrar como os textos materializam o discurso conflituoso do tempo: D Francisco Manuel de Melo, cujos textos revelam a crise espiritual do período, e Jerónimo Baía, com um texto que representa o lado mais mundano do tempo.

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Unidade: Do Barroco ao Arcadismo

O primeiro desses poetas é D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666), que também se destacou como prosador.

Quem foi Francisco Manuel de Melo?

D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666) nasceu em Lisboa, de família nobre, no dia 23 de Novembro de 1608. Começou muito novo a frequentar a corte, cursou Humanidades no Colégio de Santo Antão e dedicou-se ao estudo da Matemática, pois pensava seguir a carreira das armas. Militou na Marinha e, depois de um naufrágio que sofrera, estabeleceu-se na corte de Madri. Em 1639, comandou um regimento em Flandres e lutou contra os Holandeses. Em 1641, encontrando-se em Londres, aderiu à causa da independência em Portugal, regressando ao reino onde, depois de receber a comenda da Ordem de Cristo, foi acusado e preso por conivência no assassinato de Francisco Cardoso. Foi na prisão que escreveu as suas melhores obras. É considerado um dos mais importantes autores do Barroco em Portugal. Escreveu em português e castelhano.

Obras: Carta de Guia de Casados (comentário, Lisboa, 1651); Epanáforas de Vária História Portuguesa (história, Lisboa, 1660); Obras Morales (Roma, 1664); Cartas Familiares (Roma, 1664); Obras Métricas (poesia, França, 1665); Auto do Fidalgo Aprendiz (teatro, Lisboa, 1676); Apólogos Dialogais (Lisboa, 1721); D. Teodósio Duque de Bragança (tradução do castelhano de A. Casimiro, Livraria Civilização, Porto, 1944); As Segundas Três Musas (poesia, 1945 e 1966).

Informações extraídas do site Projeto Vercial, endereço:http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/dfmelo.htm, acessado em 24/10/2013.

Leia, a seguir, dois poemas de D. Francisco Manuel de Melo:

Apólogo da Morte

Vi eu um dia a Morte andar folgando

Por um campo de vivos, que a não viam.

Os velhos, sem saber o que faziam

A cada passo nela iam topando.

Na mocidade os moços confiando,

Ignorantes da morte, a não temiam.

Todos cegos, nenhuns se lhe desviam;

Ela a todos c’o dedo os vai contando.

Então, quis disparar, e os olhos cerra:

Tirou, e errou! Eu, vendo seus empregos

Tão sem ordem, bradei: Tem-te, homicida!

Voltou-se, e respondeu; Tal vai de guerra!

Se vós todos andais comigo cegos,

Que esperais que convosco ande advertida?

Antes de confissão.

Eu que faço? que sei? que vou buscando?

Conto, lugar, ou tempo, a esta fraqueza?

Tenho eu mais que acusar, por mais firmeza,

Toda a vida, sem mais como, nem quando.

Se cuidando, Senhor, falando, obrando,

Te ofenda minha ingrata natureza,

Nascer, viver, morrer, tudo é torpeza.

Donde vou? donde venho? donde ando?

Tudo é culpa, ó bom Deus! Não uma e uma

Descubro ante os teus olhos. Toda a vida

Se conte por delito, e por ofensa.

Mas que fora de nós, se esta, se alguma

Fora mais que uma gota, a ser medida

Co largo Mar de tua Graça imensa?

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Os dois sonetos tratam de temas religiosos. No primeiro caso, o soneto apropria-se de outro gênero, o apólogo, para ilustrar a existência humana. No segundo, temos um ato de contrição. A seu modo, ambos os textos expressam o conflito entre antropocentrismo e teocentrismo do período barroco, vamos analisá-los.

GlossárioApólogo: narrativa que apresenta uma lição moral e, geralmente, tem como personagens objetos ou entidades que agem e dialogam como seres humanos.

Ato de Contrição: No cristianismo, a prece que expressa o sentimento de culpa ou arrependimento por pecados cometidos ou por ofensa a Deus.

No “Apólogo da morte”, o sujeito poético apresenta-se como um ser privilegiado que vê o que todos os outros não percebem: a presença constante da morte. De imediato, estabelece a antítese entre ela e “um campo de vivos” e entre a sua capacidade de ver e a cegueira dos outros, tanto dos velhos quanto dos jovens. O velhos topam com a morte a cada instante, pois já estão mais próximos do fim e não sabem o que fazem, talvez pela senilidade. O caso dos jovens é até mais grave, pois são confiantes na mocidade e isso lhes dá destemor suficiente para não se importarem com tão perigosa presença.

Nos tercetos, revela-se o procedimento da morte: fecha os olhos para atirar “tão sem ordem”, ao acaso, nos vivos. O sujeito poético a admoesta, acusa-a de homicida ao que ela responde na chave de ouro do último terceto: é assim a guerra, por que eu teria preocupação com vocês se vocês não têm preocupação comigo?

Nas lições de moral que se podem extrair do apólogo temos a ideia de que devemos estar preparados, pois a morte nos acompanha sempre, não importando nossa idade. Trata-se de uma referência ao tema da transitoriedade da vida humana, da necessidade de o homem nunca se esquecer das coisas espirituais ou de não ser tão autoconfiante.

O discurso contrarreformista está claro no texto: o orgulho humano pode levar o indivíduo a se perder; não se deve passar pela existência sem se preocupar com a morte. Essa ideologia é quase uma reedição daquela que sustentava a sociedade medieval, a existência como um caminho para a morte.

O soneto “Antes de confissão”, por sua vez, refere-se a um sacramento da Igreja Católica. Sacramento significa um sinal ou um gesto divino instituído por Jesus Cristo, que permite a remissão de pecados perante um clérigo que atua em nome de Cristo, concedendo o perdão divino das faltas confessadas, por meio de uma penitência. Esse sacramento requer uma reflexão do crente sobre seus atos, que deve admitir sua fraqueza, seus erros para obter o perdão.

É exatamente essa reflexão que o sujeito poético faz nos dois quartetos e no primeiro terceto do texto, coloca-se como um ser torpe, ou seja, sórdido, sujo, só pelo fato de ter nascido: “Nascer, viver, morrer, tudo é torpeza”. Esse sentimento hiperbólico, exagerado de culpa tem como finalidade mostrar a distância que separa o humano do Divino e faz parte de um discurso que reitera o prestígio de Deus, seu poder, recolocando o homem no seu devido lugar.

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O último terceto, contudo, relativiza essa posição de inferioridade do homem. Inicia-se pela conjunção adversativa “mas” que marca a introdução de ideias contrárias às expressas anteriormente. No final das contas, toda essa culpa do ser humano, que o torna infinitamente pequeno diante da divindade, torna-se uma vantagem porque, por mais que ele peque, todos os seus pecados serão sempre uma gota no oceano que representa o Mar da Graça Divina.

Temos aqui um interessante jogo conceptista que transforma aquilo que seria a fraqueza humana na vantagem de não contaminar a Graça Divina. Ressaltamos nestas duas composições o caráter dramático, patético dos textos que despertam compaixão, piedade, tristeza e revelam a crise espiritual do período.

Convidamos você, caro aluno, a ler o excelente ensaio do Professor Fernando Alberto Torres Moreira, “A Problemática da morte nos sonetos de D. Francisco Manuel de Melo.

ExploreVocê pode encontrar em um dos endereços a seguir:

• http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/mobile/barroca/dfmelo.htm

• http://www.utad.pt/vPT/Area2/investigar/CEL/Research/CelCollections/Documents/CEL_Cultura_5.pdf

O texto parte da citação de Pierre Chaunu, que está em francês no ensaio, cuja tradução livre seria: ““(...) Especialmente o Barroco nasceu na Itália, após o Concílio de Trento. É o suficiente para dizer que é uma arte dramática. (...) Terminada a tola confiança nas possibilidades ilimitadas da natureza humana, a segunda metade do século XVI (...)o homem retorna a sua essência, à meditação sobre a sua condição.” E procura transpor essas observações para a análise dos sonetos de D. Francisco Manuel de Melo. Nas considerações finais, o autor nos mostra que “na poesia de D. Francisco Manuel de Melo estamos perante uma ideia da morte (fim de uma vida) para a qual o vivente deve precaver-se continuamente. O tempo, e a consciência dele, é breve; a vida é uma permanente provação num mundo ruim. Mas, autêntico acto de fé, para o Melodino o homem tem para si a absoluta certeza duma vida gloriosa no Além. Deste modo, a morte é uma recompensa, o passe de mágica para uma outra vida de gozo eterno.”.

A seguir, estudaremos um outro poeta português desse período: Jerónimo Baía

Jerónimo Baía, ou Vaía (1620/30-1688), nasceu em Coimbra, tendo professado no convento de São Martinho de Tibães (Braga), da Ordem Beneditina, a 4 de Maio de 1643. Frequentou a Universidade de Coimbra, foi nomeado cronista da ordem e mais tarde pregador na corte do rei D. Afonso VI. Com a deposição do rei, terá sido obrigado a regressar ao convento. Celebrizou-se como poeta lírico, e sobretudo burlesco, o que lhe valeu o cognome de «Poeta Folgazão». Além das composições poéticas que vêm publicadas na Fénix Renascida, escreveu as obras Lampadário de Cristal e Tardes de Verão, esta última em prosa e que narra os principais acontecimentos históricos do seu tempo. É considerado um dos autores mais significativos da literatura barroca em Portugal.

Dados biográficos extraídos do site Projeto Vercial:http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/baia.htm, acessado em 25/10/2013

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Vamos começar pela leitura de um poema dele? Leia com atenção!

Madrigal a uma crueldade formosa

A minha bela ingrata

Cabelo de ouro tem, fronte de prata,

De bronze o coração, de aço o peito; São os olhos reluzentes (Por quem choro e suspiro, Desfeito em cinza, em lágrimas desfeito), Celestial safiro; Os beiços são rubins, perlas os dentes; A lustrosa garganta De mármore polido; A mão de jaspe, de alabastro a planta. Que muito, pois, Cupido, Que tenha tal rigor tanta lindeza, As feições milagrosas, Para igualar desdéns a formosuras, De preciosos metais, pedras preciosas, E de duros metais, de pedras duras?

O Madrigal, destinado a uma “crueldade formosa”, já encerra no título um paradoxo: como pode algo cruel ser formoso? O primeiro verso, em certo sentido, explica ou justifica esse título, a mulher é bela e ingrata ao mesmo tempo.

A partir daí, há um retrato de mulher bem parecido com aquele que você viu em Camões. Podemos dizer que ela (a mulher) é essencialmente mineralizada: ouro, prata, bronze e aço, materiais valiosos, frios e duros. Na descrição do rosto, acentua-se a preciosidade: safiras, rubis, pérolas; na garganta, a solenidade do mármore; nas mãos a dureza do jaspe; nos pés a brancura do alabastro.

No final, contudo, toda essa beleza que reúne “tanta lindeza” nas “feições milagrosas” é proporcional à capacidade que a mulher tem de desdenhar do sujeito, ou seja, de “igualar desdéns e formosuras”. Dos metais preciosos de que a mulher retira a beleza, ela retira, igualmente, a dureza.

Perceba que neste poema temos um bom exemplo de Cultismo, expresso por meio do quadro rebuscado com que o sujeito pinta a mulher e nas construções sintáticas em que faz o cruzamento, o quiasmo, entre preciosidade de beleza:

De preciosos metais, pedras preciosas,E de duros metais, de pedras duras?

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Vimos, com esses dois poetas, a característica do Barroco presente na produção literária em versos, dessa época em Portugal. Como dissemos, anteriormente, a produção maior do Barroco português se deu em prosa,mas isso não minimiza a importância e a qualidade literária desses dois poetas que apresentamos a vocês.

O Arcadismo e o Neoclassicismo

O século XVIII é denominado de “séculos das luzes”, pois nele convergiram as descobertas da física Newtoniana, a psicologia de John Locke, o racionalismo, o espírito enciclopédico e a investigação científica. Nesse século foi empregada a energia a vapor, elemento fundamental da Revolução Industrial.

Isaac Newton (1643-1727): Cientista inglês, físico e matemático, astrônomo, alquimista, filósofo natural e teólogo. Descreveu a lei da gravitação universal e as três leis de Newton, que fundamentaram a mecânica clássica: o princípio da inércia, um corpo em repouso tende a permanecer em repouso, e um corpo em movimento tende a permanecer em movimento; o princípio de que a força é sempre diretamente proporcional ao produto da aceleração de um corpo pela sua massa; e o princípio da ação e reação, as forças atuam sempre em pares, para toda força de ação, existe uma força de reação. Foi o primeiro a demonstrar que os movimentos de objetos, tanto na Terra como em outros corpos celestes, são governados pelo mesmo conjunto de leis naturais. Suas leis foram centradas na revolução científica, no avanço do heliocentrismo e na difundida noção de que a investigação racional pode revelar o funcionamento mais intrínseco da natureza.

John Locke (1632-1704): Filósofo, acadêmico e pesquisador, médico inglês, foi o criador do pensamento liberal, cuja obra é marcada pela oposição ao autoritarismo nos planos individual, político e religioso. Acreditava no uso da razão para se chegar à verdade e determinar a legitimidade das instituições sociais. Em sua obra “Dois Tratados sobre o Governo”, contestou a doutrina do direito divino dos reis e do absolutismo real. Foram importantes as contribuições dele para o mundo moderno: a ideia de que o direito à propriedade se consegue pelo trabalho daquele que se dedica a ela, a base de uma sociedade sem a interferência governamental, um dos princípios básicos do capitalismo liberal; a convicção de que todo conhecimento humano pode ser obtido por meio da percepção sensorial ao longo da vida, o que confere grande crença no poder da educação. Desse modo, foi também o precursor do pensamento iluminista nas questões políticas.

O homem dessa época acredita que pode modificar o mundo pela técnica e crê no poder da ciência para modificar as condições da humanidade. A ciência e o racionalismo conferem o rótulo de século das luzes a esse momento histórico; a razão ilumina e ilustra os homens e os conduz ao progresso. Iluminismo e ilustração caracterizam as manifestações culturais desse tempo.

Nesse momento, surgiram Voltaire e Rousseau, e ocorreu a transferência de liderança da aristocracia para a burguesia, cujo marco foi a Revolução Francesa, em 1789.

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François Marie Arouet, Voltaire (1694 -1778): escritor e filósofo iluminista francês, cujas marcas são a perspicácia e a espirituosidade. Defendeu as liberdades civis, inclusive liberdade religiosa e livre comércio e suas ideias influenciaram pensadores importantes tanto da Revolução Francesa quanto da Americana. Usou suas obras para criticar a Igreja Católica, as instituições francesas do seu tempo, os reis absolutistas e os privilégios do clero e da nobreza.

Jean-Jacques Rousseau (1712 -1778): filósofo, teórico político e escritor iluminista suíço. É considerado um precursor do romantismo. Sua filosofia tem como essência a crença de que o Homem é bom naturalmente, embora esteja sempre sob o jugo da vida em sociedade, a qual o predispõe à depravação. Para ele, o homem e o cidadão são condições paradoxais na natureza humana, pois é o reflexo das incoerências que se instauram na relação do ser humano com o grupo social, que inevitavelmente o corrompe. Por esta razão, o filósofo idealiza o homem em estado selvagem, pois primitivamente ele é generoso. Um dos equívocos cometidos pela sociedade é a prática da desigualdade, seja a individual, seja a provocada pelo próprio contexto social. Nesta categoria, ele engloba desde a presença negativa dos ciúmes no relacionamento afetivo, até a instauração da propriedade privada como base da vida econômica. Para ele, a desigualdade social deve ser eliminada, pois priva o Homem do exercício da liberdade, substituindo esta prática pela devoção aos aspectos exteriores e às normas de etiqueta.

Esse clima racionalista influi na arte. Embora persista a arte barroca, o chamado barroquismo, surge o Neoclassicismo, um movimento de restauração do espírito renascentista e das regras rígidas de Aristóteles e Horácio, enfim, a imitação dos clássicos gregos e latinos.

O estilo normativo do período foi codificado em manuais de arte poética, entre eles o Art Poétique, de Nicolas Boileau. Para ele, a virtude mais importante de um artista era a razão. A arte deverá divertir e ensinar e deverá ser a expressão da máxima: “o verdadeiro é o natural, o natural é o racional”. A razão devia ser livre da pressão da Fé e a natureza devia ser minuciosamente observada. Nesse período, contudo, a estrutura social ainda era aristocrática e a tendência geral da arte neoclássica seria decorrente da imposição de um gosto oficial.

Vamos apresentar, a seguir, o conceito de Arcádia e alguns aspectos das obras do período, que depois veremos nos poemas.

a) Arcádia: agremiação de intelectuais surgida em Roma, em 1690. A rainha Cristina da Suécia abdicou do trono e do luteranismo e converteu-se ao Catolicismo. Depois disso, mudou-se para a Itália e passou a reunir, em seu palácio, estudiosos para ler e discutir trabalhos literários e científicos. Após sua morte, em 1689, os participantes das reuniões continuaram o grupo. Inspirados pelos valores clássicos, os membros denominavam-se pastores, adotavam pseudônimos gregos e latinos e as reuniões eram feitas em parques ou jardins. O próprio nome da agremiação veio da cultura clássica e estendeu-se ao nome do período: Arcadismo.

GlossárioArcádia: uma província da Grécia antiga; nome de uma região mítica em que reina a felicidade, a simplicidade e a paz, em um ambiente idílico habitado por uma população de pastores que vivem em comunhão com a natureza: o espaço do bom selvagem.

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b) Alguns elementos da arte do período, adaptados de Proença Filho (1972, p. 167-168):

I. Reação contra o mau gosto do Barroco e do Barroquismo;

II. Retorno ao equilíbrio e à simplicidade dos modelos greco-romanos;

III. Culto da teoria aristotélica da arte como imitação da natureza;

IV. Predomínio da razão e da autoridade literária;

V. Imposição de uma disciplina literária nacional;

VI. Preocupação com uma finalidade moral da literatura;

VII. Crença de que a beleza, a pureza e a espiritualidade residem na natureza; a verdadeira poesia deve ser simples, exprimir-se com naturalidade, sendo, pastoril, bucolicamente ingênua e inocente;

VIII. Poesia é a maneira de imprimir verdade na imaginação;

IX. O poeta pinta situações e não emoções;

X. Condenação da rima;

XI. Embelezamento da feiura da realidade;

XII. Simplicidade, mas nobreza da linguagem;

XIII. Linguagem que usa chavões, os topoi ou lugares-comuns;

XIV. Caráter didático e doutrinário.

ExploreVocê pode saber mais sobre o Arcadismo nos seguintes sites:

E-Dicionário de Termos Literários, Carlos Ceia: http://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&task=viewlink&link_id=134&Itemid=2

O Árcade deseja comunicar-se com a sociedade, ser compreendido e sua arte assume um caráter doutrinário. Em parte por isso, ele usa os topoi ou os lugares-comuns. Entre eles estão:

• Locus amoenus: Lugar aprazível, “Expressão latina que designa a paisagem ideal, sempre presente na poesia amorosa em geral e, com maior incidência, na poesia bucólica. Desde a Antiguidade Clássica que o termo locus amoenus nos remete para a descrição da Natureza e para um conjunto de elementos específicos: o campo fresco e verdejante, com um vasto arvoredo e flores coloridas, cujo doce odor se espalha com a brisa”.

Fonte: Susana Alves: s.v. “ Locus amoenus “, E-Dicionário de Termos Literários (EDTL), coord. de Carlos Ceia, ISBN: 989-20-0088-9, <http://www.edtl.com.pt>, consultado em 27-10-2013.

• Fugere urbem: Fugir da cidade, o enaltecimento da vida no campo. Esta máxima parece um pouco deslocada do tempo. Justamente no momento em que as cidades começavam a se desenvolver, a literatura prega a volta ao campo.

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• Carpe diem: Colha o dia, aproveite o momento. “O termo está em Latim e foi escrito pelo poeta latino Horácio (65 a.C.-8 a.C.), no Livro I de “Odes”, em que aconselha a sua amiga Leucone na frase: ‘...carpe diem, quam minimum credula postero’ Uma tradução possível para a frase seria “...colha o dia de hoje e confie o mínimo possível no amanhã”..

Fonte: Sem autor: s.v. “Carpe diem “, E-Dicionário de Termos Literários (EDTL), coord. de Carlos Ceia, ISBN: 989-20-0088-9, <http://www.edtl.com.pt>, consultado em 27-10-2013.

• Inutilia Truncat: Cortar o que é inútil, eliminar os excessos, justamente para se contrapor à arte barroca considerada, então, de mau gosto.

• Aurea mediocritas: É um ideal de Mediania Sensata, é uma designação latina das Odes de Horácio e que expressa a ideia de que só é feliz aquele que se contenta com pouco ou com aquilo que tem.

Horácio: Quinto Horácio Flaco, 65 a.C. - 8 a.C. Foi um dos maiores poetas líricos e satíricos, além de filósofo da Roma Antiga. Escreveu A Arte poética, e ficou conhecido por ser um dos maiores poetas da Roma Antiga. Seus poemas revelam a influência da filosofia epicurista, que pregava a fuga da dor, em Roma. Embora não tenha produzido textos filosóficos, alguns temas epicuristas destacam-se em sua obra, como a importância em se aproveitar o presente (carpe diem) pelo reconhecimento da brevidade da vida e a busca pela tranquilidade (fugere urbem).

Virgílio: Públio Virgílio Marão (70 a.C. - 19 a.C.). Foi um poeta romano clássico, autor de três grandes obras da literatura latina, as Éclogas (ou Bucólicas), as Geórgicas, e a epopeia Eneida. Sua influência no século XVIII está, justamente, na ideia da valorização da vida no campo.

O Arcadismo em Portugal

No século XVIII, Portugal estava enriquecido pela exploração do ouro nas Minas Gerais e, ao mesmo tempo, houve uma diminuição da influência jesuítica e de parte da aristocracia na sociedade. Esse momento é marcado pela administração do Marquês de Pombal (1750 – 1777), que foi nomeado pelo monarca José I. Pombal implantou em Portugal o despotismo esclarecido, uma política de difusão das novas ideias iluministas e de progresso, mas com base na submissão do Estado ao rei. Essa ligação entre a burguesia e a nobreza possibilitou a instalação de reformas cujos objetivos eram o esvaziamento do poder à Igreja Católica e a centralização da economia: a expulsão dos jesuítas do Brasil, em 1759, por exemplo, e a consequente laicização da educação atenderam ao primeiro objetivo; já a intensificação do controle sobre as colônias, atenderam ao segundo.

Os ideais do Marquês de Pombal eram mais afinados com o racionalismo dos franceses, italianos e ingleses e por isso houve o combate à arte barroca no período. Os intelectuais portugueses que defendiam as ideias do século reuniram-se em torno da Arcádia Lusitana,

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fundada em 1756, agremiação inspirada na Arcádia romana, e procuraram produzir uma literatura mais racional, bem como resgatar a cultura clássica greco-latina. Nas obras que produziram, percebe-se a preocupação formal. São nomes desse período Antônio Dinis da Cruz e Silva (1731-1799), Pedro Antônio Correia Garção (1724-1772) e Domingos Reis Quita (1728-1770). Além deles, deve-se considerar as produções teóricas de Francisco José Freire (1731-1792), conhecido como Cândido Lusitano e Luís Antônio Verney (1713-1792). Este último publicou em 1746 uma espécie de tratado sobre a pedagogia em forma de cartas em que defendia ideias progressistas a respeito de educação. Essa obra serviu como base para as reformas educacionais introduzidas pelo Marquês de Pombal, entre elas a oficialização do estudo da língua portuguesa tanto em Portugal como no Brasil.

A principal figura literária do período foi o escritor Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765-1805). Assim como Camões, Bocage teve uma vida de aventuras. Ficou órfão de mãe aos dez anos e, aos dezoito, alistou-se na Marinha de Guerra. Em 1786, viajou para as Índias com escalas no Rio de Janeiro e durante o período em que esteve no Oriente, foi promovido a tenente do Exército. Incompatibilizou-se, contudo, com o exército e deserdou retornando a Portugal. Já na pátria, em 1790, ingressou na Nova Lusitana com pseudônimo de Elmano Sadino e passou a levar uma vida desregrada. Talvez esse desregramento tenha como causa o fato de a mulher por quem era apaixonado, Gertrudes, ter se casado com seu irmão mais velho. Essa mulher aparece nos poemas de Bocage como Gertrúria. Por seu espírito agitado, Bocage acabou sendo preso por causa de suas ideias anticlericais, da cadeia passou pela a Inquisição e depois foi internado em um hospício. Sua vida transformou-se. Tornou-se mais tranquilo e passa a exercer atividades de tradução para ajudar uma irmã que estava em necessidade. Antes de morrer, doente, em 1805, regenerou-se e arrependeu-se de seus escritos.

A trajetória de Bocage é bastante reveladora do contexto em que viveu. Há momentos em sua obra em que as ideias são inspiradas nos valores do Arcadismo, mas há momentos em que sua obra é bastante confessional, emotiva, o que o aproxima do Romantismo, movimento que irá marcar o século XIX.

Segundo Gomes, a obra de Bocage reflete a dualidade do século XVIII, em que há a “coexistência polêmica entre o Arcadismo agonizante e o Romantismo incipiente” (1997, p. 9).

Vamos ver alguns textos do autor que revelam a ideologia do período e outros que mostram como ele se afasta dessa ideologia.

Leia os poemas a seguir com atenção!!

Já se afastou de nós o Inverno agreste

Envolto nos seus húmidos vapores;

A fértil Primavera, a mãe das flores

O prado ameno de boninas veste:

Varrendo os ares o subtil nordeste

Os torna azuis: as aves de mil cores

Adejam entre Zéfiros, e Amores,

E toma o fresco Tejo a cor celeste;

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Vem, ó Marília, vem lograr comigo

Destes alegres campos a beleza,

Destas copadas árvores o abrigo:

Deixa louvar da corte a vã grandeza:

Quanto me agrada mais estar contigo

Notando as perfeições da Natureza!

Nos primeiros versos, vamos encontrar o locus amoenus. O sujeito descreve a natureza idealizada, bela. Evoca a primavera e pinta a imagem dos ventos (Zéfiros) que refrescam e tornam mais amena ainda a paisagem vestida de boninas, ou seja, de flores do campo. Tudo tem uma forma tão harmoniosa que até elementos opostos, o céu e a terra, fundem-se quando o poeta diz que o rio Tejo reflete o azul do céu: “E toma o fresco Tejo a cor celeste”.

O homem natural integra-se nesse cenário e chama sua amada, Marília, cujo nome de pastora também cumpre os ritos do Arcadismo, para usufruir dessa natureza paradisíaca. Temos, aqui, o bucolismo, a valorização da vida no campo e também o idílio, o amor em meio à Natureza.

No último terceto, há o tema do fugere urbem quando o poeta pede à amada que se esqueça da “vã grandeza da corte”. Se a vida de cidade é vã, o amor em meio às perfeições da Natureza é aprazível e o amor vivido ali, provavelmente, será um sentimento sem paixões fortes, tão tranquilo e harmônico como o espaço em que se desenrola. Neste sentido, podemos pensar no topos da aurea mediocritas, ou seja, o sentimento de equilíbrio e serenidade, de aceitação do que se tem. Também é possível perceber, no poema, a ideia do carpe diem, já que o sujeito chama sua amada para aproveitar o momento com ele.

No entanto, o poeta que vive um conflito que, no dizer de Álvaro Cardoso Gomes, é

o cerne da poesia bocageana: confissão dolorosa de uma vida que, presa às convenções, busca libertar-se projetando o “eu” para fora de si: tal conflito se manifesta, esteticamente, na revisão dos valores básicos da atitude poética: ou o autor lança mão da tradição clássica que o precede, aceitando uma concepção absolutista no mundo, ou atribui um papel todo especial ao “eu”. Significa, desta perspectiva, adotar uma forma rígida [o soneto] para um conteúdo revolucionário. (1998, p. 10)

A respeito desse conflito, vejamos o soneto a seguir:

Se é doce no recente, ameno Estio

Ver toucar-se a manhã de etéreas flores,

E, lambendo as areias e os verdores,

Mole e queixoso deslizar-se o rio;

Se é doce no inocente desafio

Ouvirem-se os voláteis amadores,

Seus versos modulando e seus ardores

Dentre os aromas de pomar sombrio;

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Se é doce mares, céus ver anilados

Pela quadra gentil, de Amor querida,

Que esperta os corações, floreia os prados,

Mais doce é ver-te de meus ais vencida,

Dar-me em teus brandos olhos desmaiados.

Morte, morte de amor, melhor que a vida.

No texto, paralelamente ao locus amoenus do Estio (verão ameno), à imagem das flores enfeitando a mulher e ao retrato da natureza idílica em meio aos pastores, o poeta evoca o amor sensual, o amor físico da mulher vencida nos braços do poeta, com os olhos desmaidos: “ver-te de meus ais vencida”. Percebemos que há uma ambiguidade, um disfarce dos impulsos sensuais, sob as fórmulas árcades de expressão. Processo idêntico pode ser visto no soneto a seguir:

Marília, nos teu olhos buliçososos Amores gentis seu facho acendem,A teus lábios voando, os ares fendemTerníssimos desejos sequiosos.

Teus cabelos subtis e luminososMil vistas cegam, mil vontades prendem,E em arte aos de Minerva se não rendemTeus alvos, curtos dedos melindrosos.

Reside em teus dedos a candura,Mora a firmeza no teu peito amante,a Razão com teus risos se mistura;

És dos céus o composto mais brilhante:Deram-se as mãos Virtude e FormosuraPara criar tua alma e teu semblante.

A mulher é idealizada e nomeada como pastora, como determinam as convenções do período. O retrato que se faz dela é decoroso, ou seja, tem início no rosto e não se refere às outras partes do corpo, terminando nos dedos. Também os tercetos reforçam a inocência da mulher, a candura, bem como a racionalidade dela, cuja firmeza mora no peito amante e cujo riso confunde-se com a Razão.

Não obstante, todo esse caráter convencional que culmina no consórcio entre Virtude e Formosura, no início do poema, algumas seleções lexicais revelam uma tensão sensual que se esconde sob as regras de representação: os olhos buliçosos (inquietos) em que se acendem

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os fachos (tochas) dos Amores e os lábios que acolhem os desejos que são, paradoxalmente, terníssimos (afetuosíssimos) e sequiosos (que apresentam sofreguidão, desejo, sede).

Há uma face de Bocage, porém, que se afasta dos valores árcades e se aproxima do Romantismo, a fase literária seguinte, que irá se contrapor ao racionalismo clássico, que irá conceber a literatura como expressão dos sentimentos do indivíduo e não com reprodução de modelos clássicos. Nesse sentido, é produtiva a leitura do soneto “Incultas paixões da mocidade”, espécie de prólogo de sua primeira obra, Rimas, de 1791.

Incultas produções da mocidadeExponho a vossos olhos, ó leitores.Vede-as com mágoa, vede-as com piedade,Que elas buscam piedade e não louvores.

Ponderai da Fortuna a variedade Nos meus suspiros, lágrimas e amores; Notai dos males seus a imensidade, A curta duração dos seus favores.

E se entre versos mil de sentimento Encontrardes alguns, cuja aparência Indique festival contentamento,

Crede, ó mortais, que foram com violência Escritos pela mão do Fingimento, Cantados pela voz da Dependência.

Neste texto, espécie de prefácio do iniciante Bocage, temos o apego aos valores do Arcadismo, quando o poeta deprecia as paixões incultas, ou falsas, não fundadas na experiência que são apresentadas como dignas de piedade e não de louvores.

Além disso, o poeta pede que os leitores ponderem, ou seja, pensem que os males provocados pelos amores são imensos frente à curta duração dos seus favores, ou seja, dos benefícios que trazem.

Há, nos tercetos, uma evocação do problema do fingimento poético. O sujeito diz aos leitores que se houver algum verso aparentemente alegre, isso significa que eles foram produto do fingimento, ou seja, do artificialismo do período e da dependência, ou seja, da necessidade de adesão aos valores estéticos do tempo.

Nesse texto, ao mesmo tempo em que deprecia os versos que exprimem seus sentimentos, o poeta, em certo sentido, revela a consciência de que a expressão da aurea mediocritas, por exemplo, aquele topos que pregava a calma e a tranquilidade como frutos da razão, só pode ser expresso por meio do fingimento e, portanto, não é autêntico.

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Essa tendência de colocar em polos opostos razão e sentimento e de problematizar o emprego da razão como algo que poda a capacidade de expressão poética aparece em poemas de Bocage que se distanciam das características do Arcadismo. Veja o poema a seguir:

Sobre estas duras, cavernosas fragas, Que o marinho furor vai carcomendo, Me estão negras paixões n’alma fervendo Como fervem no pego as crespas vagas:

Razão feroz, o coração me indagas, De meus erros a sombra esclarecendo, E vás nele (ai de mim!) palpando e vendo De agudas ânsias venenosas chagas:

Cego aos meus males, surdo ao teu reclamo,Mil objetos de horror co’a idéia eu corro,Solto gemidos, lágrimas derramo:

Razão, de que me serve o teu socorro?Mandas-me não amar, eu ardo, eu amo;Dizes-me que sossegue, eu peno, eu morro.

Percebe-se, no soneto anterior, todo o drama do sujeito poético. Colocado sobre as fragas, pedras duras, e que têm cavernas em sua base, o poeta confessa que as paixões negras, ou seja, aqueles sentimentos mais vis o corroem assim como no pego, ou seja, no abismo, as ondas fervem. No primeiro quarteto, temos a projeção dos sentimentos do sujeito poético na Natureza e não a idealização do espaço. Em lugar do locus amoenus, temos o locus horrendus, ou seja, o lugar feio, desagradável que é projeção do estado de espírito do sujeito e que não comporta nenhum fingimento poético.

No segundo quarteto, o sujeito poético acusa a razão e sua ferocidade, quando ela esclarece a sombra dos erros do poeta e mostra-lhe as chagas, as feridas venenosas que ele contraiu por causa das ânsias agudas, dos desejos que teve. Neste ponto do poema, o sentimento de comiseração, de autopiedade do sujeito adquire um tom próximo daquele que será característico do Romantismo do século XIX. Esse sofrimento esparrama-se pelos tercetos e culmina na última estrofe, em que o poeta nega a razão e também se recusa a seguir os conselhos dela.

Vimos aqui uma pequena mostra da obra desse grande poeta português, Bocage.

Há muito mais sobre a obra deste grande poeta que foi lírico e satírico, lutou pela liberdade e contra o governo. Convidamos você a entrar neste universo fascinante de um dos grandes poetas da língua portuguesa:

Bocage na Biblioteca Nacional: http://purl.pt/1276/1/index.html, acessado em 31/10/2013

Centro de Estudos Bocageanos: http://www.cebocageanos.net/index.html, acessado em 31/10/2013.

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Nessa unidade, apresentamos dois períodos importantíssimos nos estudos da literatura portuguesa poética: O Barroco e o Arcadismo. Lembramos que precisamos fazer algumas escolhas e seleção do conteúdo. Orientamos que você prossiga em seus estudos, aprofundando seus conhecimentos. Para isso, utilize as referências bibliográficas, muitas delas disponíveis na internet. Lembre-se de desenvolver uma postura proativa frente à construção de seus conhecimentos!

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Material Complementar

O período que compreende o Barroco e o Arcadismo, em Portugal, é marcado por muitas mudanças no mundo e, consequentemente, nas artes.

Considerado em um primeiro momento a degeneração do Renascimento, estudos recentes consideram que a arte do período barroco é apenas uma forma diferente de expressão que mostra o mundo à sua maneira. Um grande estudo nesse sentido foi o texto de Heinrich Wölfflin que considera as diferenças individuais que levaram à mudança de estilo dos séculos XVI e XVII. Elas podem ser resumidas a partir de cinco pares de conceitos: a) evolução do linear ao pictórico; b) evolução do plano à profundidade; c) evolução da forma fechada à forma aberta; d) evolução da pluralidade para a unidade; e) clareza absoluta e relativa do objeto. Para compreender melhor essa tese, recomendamos a leitura do artigo de José D’Assunção Barros e a visita ao blog de Tarcízio Silva, que faz uma resenha da obra de Wöfflin

I – O texto: “Heinrich Wölfflin e sua Contribuição para a Teoria da Visibilidade Pura”, texto de José D’Assunção Barros1, disponível em:

http://www.ufsj.edu.br/portal2-repositorio/File/existenciaearte/Edicoes/6_Edicao/Heinrich_Wolfflin_e_sua_contribuicao_para_a_teoria_da_visibilidade_pura.pdf, Para ter acesso mais facilmente, copie e cole o endereço em azul na barra de endereços do seu navegador.

II – Blog Tarcízio Silva:

http://tarciziosilva.com.br/blog/conceitos-fundamentais-da-historia-da-arte-de-heinrich-wolfflin/, acessado em 31/10/2013. Para ter acesso mais facilmente, copie e cole o endereço em azul na barra de endereços do seu navegador.

Quanto à poesia Árcade em Portugal, nesta unidade, obviamente, não pudemos dar conta de todos os poetas do período. o Arcadismo possui grandes nomes e obras, embora seja mais pobre literariamente do que o período anterior, o Renascimento. Na Internet, você irá encontrar um bom material sobre Bocage para aprofundar seus estudos e também compreender melhor a dimensão Pré-Romântica desse autor. Recomendamos, especialmente, a visita à exposição sobre Bocage na Biblioteca Nacional de Portugal, cujo endereço é: http://purl.pt/1276/1/bocage.html, (aceso em 31/10/2013).

È muito importante que você explore os portais e aprofunde seus estudos.

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Referências

BOCAGE. Poemas escolhidos. Edição preparada por Álvaro Cardoso Gomes. São Paulo: Cultrix, 1997.

SILVEIRA, Francisco Maciel; MONGELLI, Lênia Márcia Medeiros; CUNHA, Maria Helena Ribeiro da. A Literatura portuguesa em perspectiva- Classicismo, Barroco, Arcadismo. São Paulo: Atlas, 1993.

MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa. 20ª ed. São Paulo: Cultrix, 1984.

Referências Bibliográficas (disponível para consulta)

Arteguias: http://www.arteguias.com/barroco.htm, acessado em 24/10/2013.

Bocage na Biblioteca Nacional: http://purl.pt/1276/1/index.html, acessado em 31/10/2013

Centro de Estudos Bocageanos: http://www.cebocageanos.net/index.html, acessado em 31/10/2013.

E-Dicionário de Termos Literários, Carlos Ceia: http://www.edtl.com.pt , acessado em 24/10/2013.http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/dfmelo.htm, acessado em 24/10/2013.

Itaú Cultural: http://www.itaucultural.org.br, acesso em 31/10/2013.

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Anotações

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