Livro_ Financiamento das Corporações perspectivas do desenvolvimento brasileiro

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  • perspectivas do

    desenvolvimento

    brasileiro

    Marcos Antonio Macedo Cintra

    Edison Benedito da Silva Filho

    Autores

    Organizadores

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    Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional

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    Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional

    Claudio Avanian Jacob

    Edison Benedito da Silva Filho

    Juliana de Paula Filleti

    Jlio Srgio Gomes de Almeida

    Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie

    Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia

    Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia FINANCIAMENTO DAS CORPORAES

    Luis Fernando Novais

    Marcos Antonio Macedo Cintra

    Maria Cristina Penido de Freitas

    Roberto Alexandre Zanchetta Borghi

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    J 788578 111656

    ISBN 857811165-6

    Misso do Ipea

    Produzir, articular e disseminar conhecimento para

    aperfeioar as polticas pblicas e contribuir para o

    planejamento do desenvolvimento brasileiro.

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    Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia Internacional Srie Economia

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  • perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    Marcos Antonio Macedo CintraEdison Benedito da Silva Filho

    Organizadores

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  • Governo Federal

    Secretaria de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica Ministro interino Marcelo Crtes Neri

    Fundao pbl ica v inculada Secretar ia de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica, o Ipea fornece suporte tcnico e institucional s aes governamentais possibilitando a formulao de inmeras polticas pblicas e programas de desenvolvimento brasi leiro e disponibi l iza, para a sociedade, pesquisas e estudos realizados por seus tcnicos.

    PresidenteMarcelo Crtes Neri

    Diretor de Desenvolvimento InstitucionalLuiz Cezar Loureiro de Azeredo

    Diretor de Estudos e Relaes Econmicas ePolticas InternacionaisRenato Coelho Baumann das Neves

    Diretor de Estudos e Polticas do Estado, dasInstituies e da DemocraciaDaniel Ricardo de Castro Cerqueira

    Diretor de Estudos e PolticasMacroeconmicasCludio Hamilton Matos dos Santos

    Diretor de Estudos e Polticas Regionais,Urbanas e AmbientaisRogrio Boueri Miranda

    Diretora de Estudos e Polticas Setoriaisde Inovao, Regulao e InfraestruturaFernanda De Negri

    Diretor de Estudos e Polticas SociaisRafael Guerreiro Osorio

    Chefe de GabineteSergei Suarez Dillon Soares

    Assessor-chefe de Imprensa e ComunicaoJoo Cludio Garcia Rodrigues Lima

    Ouvidoria: http://www.ipea.gov.br/ouvidoriaURL: http://www.ipea.gov.br

  • perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    Marcos Antonio Macedo CintraEdison Benedito da Silva Filho

    Organizadores

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    Braslia, 2013

  • Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada ipea 2013

    As opinies emitidas nesta publicao so de exclusiva e inteira responsabilidade dos autores, no exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada ou da Secretaria de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica.

    permitida a reproduo deste texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte. Reprodues para fins comerciais so proibidas.

    Financiamento das corporaes : perspectivas do desenvolvimentobrasileiro / Organizadores: Marcos Antnio Macedo Cintra, EdisonBenedito da Silva Filho. Braslia : Ipea, 2013.234 p. : grfs., tabs.

    Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7811-165-6

    1. Financiamento de Empresas. 2. Empresas Privadas. 3. AdministraoFinanceira. 4. Brasil. I. Cintra, Marcos Antnio Macedo. II. Silva Filho,Edison Benedito da . III. Ttulo : Perspectivas do desenvolvimento brasileiro. IV. Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada.

    CDD 658.15

  • SUMRIO

    APRESENTAO ........................................................................................7

    INTRODUO ............................................................................................9

    CAPTULO 1PADRES DE FINANCIAMENTO DAS EMPRESAS: A EXPERINCIA BRASILEIRA ...........................................................................15Jlio Srgio Gomes de AlmeidaMarcos Antonio Macedo CintraClaudio Avanian JacobLuis Fernando NovaisJuliana de Paula Filleti

    CAPTULO 2PADRO DE FINANCIAMENTO DAS CORPORAES AUTOMOBILSTICAS ....69Roberto Alexandre Zanchetta Borghi

    CAPTULO 3FINANCIAMENTO DE LONGO PRAZO NO BRASIL: AVANOS E DESAFIOS .............................................................................153Maria Cristina Penido de Freitas

    CAPTULO 4FINANCIAMENTO E EXPOSIO CAMBIAL DAS FIRMAS BRASILEIRAS APS A CRISE DE 2008: CONDICIONANTES E IMPACTOS SISTMICOS ......193Edison Benedito da Silva Filho

    NOTAS BIOGRFICAS ...........................................................................233

  • APRESENTAO

    Este livro representa mais um esforo do Ipea em sua misso de contribuir para a reflexo sobre os caminhos do desenvolvimento, em geral, e a natureza deste desenvolvimento no Brasil, em particular. A temtica do financiamento das corporaes, aqui abordada sob diversas perspectivas, constitui um eixo necessrio no debate acerca dos rumos de mais longo prazo do pas, na busca pelo progresso econmico e social.

    indispensvel para o sucesso de nossa economia de mercado, em espe-cial aps os recentes desdobramentos da crise econmica internacional, pensar sobre o padro de financiamento das empresas tanto de grupos brasileiros como de grandes players internacionais com atuao no pas e a institucio-nalidade que permeia e condiciona suas decises de investimento. Trata-se de um aspecto essencial para a elaborao de diretrizes de polticas pblicas cujos objetivos sejam promover a gerao de emprego e de renda e, por conseguinte, o desenvolvimento nacional.

    O desafio de assegurar a retomada do crescimento econmico brasileiro de modo sustentado, com expanso consistente da capacidade produtiva e do progresso tcnico, diante da importncia crescente do papel desempenhado pelos pases em desenvolvimento na dinmica econmica global, torna ainda mais relevante a questo do padro de financiamento dos investimentos das corporaes. Esta obra, portanto, se insere em um contexto bastante oportuno, que exige uma compreenso mais aprofundada das inter-relaes e da necessria articulao entre empresas (nacionais e estrangeiras), sistemas financeiros (domstico e inter-nacional) e Estados nacionais.

    Os ensaios que compem o livro so resultantes de projetos de pesquisa mais amplos, conduzidos e financiados por diferentes instituies brasileiras.

    O Ipea teve o privilgio de realizar a organizao desta coletnea, com-partilhando da experincia destes centros de pesquisa, e, consequentemente, contribuindo para a difuso do conhecimento sobre um tema to relevante. Registram-se agradecimentos especiais aos autores e s instituies que viabilizaram as pesquisas, a saber, a Fundao de Economia de Campinas (FECAMP), o Centro de Estudos de Conjuntura e Poltica Econmica do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (CECON/IE/UNICAMP), o Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ), o Banco

  • 8 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES), a Fundao para o Desenvolvimento Administrativo do Estado de So Paulo (FUNDAP), o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), e a Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo (FAPESP).

    Apresenta-se ao leitor um conjunto de textos que compem um rico mosaico a partir das distintas dimenses envolvidas na problemtica do financiamento de longo prazo do investimento produtivo. Reitera-se, assim, o compromisso do Ipea em avanar nas discusses econmicas atuais, lanando luzes para o desen-volvimento futuro do pas.

    Marcelo Crtes NeriPresidente do Ipea

  • INTRODUO

    O alastramento global da crise econmica que eclodiu nos Estados Unidos da Amrica no segundo semestre de 2008, por meio da contrao do crdito e dos fluxos de comrcio internacional, motivou a adoo de diversas medidas de poltica econmica anticclica por parte dos Estados nacionais, buscando evitar uma deteriorao ainda maior dos nveis domsticos de renda e emprego. Os efeitos destas medidas tm sido limitados no mundo desenvolvido, onde a fragilizao econmica foi agravada por impasses institucionais relacionados capacidade de endividamento dos governos centrais, sobretudo na zona do euro. Nos pases em desenvolvimento, contudo, observou-se uma rpida re-tomada da trajetria pretrita de dinamismo do mercado interno, reforando a percepo de que tais economias poderiam constituir novas fontes para o dinamismo da demanda mundial, principalmente diante dos desdobramentos da crise nos pases avanados.

    Durante a maior parte dos anos 2000 as economias em desenvolvimento apresentaram um forte ritmo de crescimento, constituindo-se em importantes ncleos de expanso das atividades produtivas globais, tanto para as empresas domsticas quanto para as transnacionais instaladas nestes pases. No Brasil, o dinamismo do mercado interno foi acompanhado ainda por um vigoroso processo de incluso social, que permitiu a intensificao do consumo e do investimento a partir de 2004.

    Um elemento fundamental de impulso a essa dinmica no verificada no Brasil por mais de duas dcadas consistiu na expanso dos canais de financia-mento disponveis s empresas instaladas no pas. Em especial, a acumulao de uma ampla reserva de recursos prprios por parte das empresas, o papel crucial desempenhado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES) no financiamento de longo prazo e o crescente acesso aos mercados financeiros internacionais foram condicionantes decisivos para a concretizao dos planos recentes de ampliao e criao de capacidade produtiva. Disso resulta que, dentro de uma perspectiva de desenvolvimento futuro com um horizonte temporal de mais longo prazo, torna-se indispensvel compreender os padres de financiamento das empresas, a fim de delinear polticas pblicas para enfrentar os limites da estrutura produtiva presente, e, sobretudo, aperfeioar as instituies e os instrumentos de apoio ao financiamento de longo prazo existentes no pas.

    Este livro possui como objetivo central explicitar diversas facetas atinentes temtica do financiamento ao setor produtivo que contribuam para a reflexo e o aprimoramento das polticas pblicas voltadas rea. Isto no se restringe,

  • 10 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    no entanto, anlise do padro de financiamento adotado apenas pelas empresas brasileiras. Entende-se que, em um cenrio de crescente interligao entre as eco-nomias e forte mobilidade de capitais, constituio de redes globais de produo com estratgias corporativas e interao matriz-filial em mbito mundial, alm de importante participao das finanas na dinmica das empresas tanto sob a forma de aplicao como de captao de recursos , deve-se conceder tambm ateno especial aos padres de financiamento das empresas transnacionais. Isto se exprime, nesta obra, mediante um estudo especfico sobre o financiamento das corporaes da indstria automobilstica global, devido ao grau de internaciona-lizao destas firmas e relevncia do setor na economia domstica. Com isto, evidentemente, no se pretende esgotar a discusso sobre o padro de financia-mento das empresas estrangeiras, mas dela depreender elementos adicionais que possibilitem uma viso mais acurada acerca da problemtica do financiamento produtivo global e seus impactos para as estratgias nacionais de desenvolvimento.

    Logo, sob distintos enfoques, os ensaios aqui reunidos derivados de pesquisas mais amplas conduzidas pelos autores procuram abordar aspectos necessrios ao entendimento da dinmica de financiamento das empresas, com nfase na dcada de 2000. Destaca-se na obra a combinao entre as formas de financiamento (recursos internos e externos empresa, como ttulos, aes e emprstimos bancrios) e a institucionalidade vigente (o desenvolvimento dos mercados de capitais e de crdito com iniciativa privada e pblica). Os seguintes temas so abordados: o padro de financiamento das empresas brasileiras de capital aberto no ciclo de crescimento pr-crise; o financiamento das corporaes automobilsticas e suas estruturas financeiras nos anos 2000, considerando elemen-tos concernentes produo, ao investimento e comercializao; as medidas de poltica pblica visando compor um quadro institucional de financiamento de longo prazo no pas direcionado ao fomento do processo de crescimento; e as estratgias de exposio cambial das empresas nacionais e seus reflexos sobre o sistema financeiro do pas. Pretende-se que o conjunto de reflexes possveis que se desdobram destas anlises contribua para o debate acerca das perspectivas de desenvolvimento do Brasil para as prximas dcadas.

    No primeiro captulo, de autoria de Jlio Srgio Gomes de Almeida, Marcos Antonio Macedo Cintra, Claudio Avanian Jacob, Luis Fernando Novais e Juliana de Paula Filleti, discutem-se, inicialmente, distintas abordagens tericas sobre o padro de financiamento das empresas. Este debate inclui um panorama sobre modelos de estrutura de capital desencadeados pelo teorema de Modigliani e Miller, a tipologia de quadros institucionais elaborada por Zysman e a viso a res-peito do financiamento do investimento em uma economia monetria, associada ao pensamento de Keynes, Kalecki e Minsky. A partir deste referencial terico, analisa-se o padro de financiamento das empresas brasileiras de capital aberto no

  • 11Introduo

    ciclo de crescimento entre 2004 e 2007, bem como se apontam algumas especi-ficidades observadas em 2008 decorrentes dos efeitos da crise internacional no ltimo trimestre deste ano.

    Apresentam-se, ademais, os resultados de entrevistas realizadas com grandes empresas instaladas no pas em 2009, a fim de captar as formas de financiamento de seus projetos de investimento e, consequentemente, comparar os mecanismos de obteno de recursos utilizados em anos precedentes com os instrumentos planejados para financiar futuros investimentos em capital fixo. Constata-se que, embora o autofinanciamento e a obteno de recursos do BNDES ainda constituam os principais canais de financiamento das corporaes brasileiras, h indcios de consolidao de uma estrutura de financiamento no Brasil mais baseada em crdito. Contudo, ainda se verifica a existncia de srias lacunas no financiamento bancrio privado de longo prazo, bem como entraves ao desenvolvimento do mercado de capitais no pas.

    No segundo captulo, escrito por Roberto Alexandre Zanchetta Borghi, examina-se o padro de financiamento das corporaes do setor automobi-lstico, retratando caractersticas de suas estruturas financeiras na dcada de 2000 a partir das informaes contidas em seus relatrios financeiros anuais em mbito global. Detalham-se aspectos referentes produo, ao investi-mento incluindo inovao e comercializao. Isto remete ao processo de reestruturao produtiva ocorrido na indstria, com a formao de redes globais de produo e a maior participao dos fornecedores nas linhas de montagem, e s transformaes verificadas na rbita financeira no sentido de conferir maior mobilidade ao capital.

    O trabalho aponta para uma presena marcante das finanas na estrutura dos grupos analisados, ainda que de maneira distinta entre as corporaes asiti-cas, europeias e americanas. Ademais, reitera-se a importncia dos recursos pr-prios das corporaes para financiamento de suas atividades, alm da emisso de ttulos e da tomada de emprstimos. Sublinha-se tambm a atuao dos bancos das montadoras na dinmica de financiamento e no desempenho das compa-nhias, assim como o papel central exercido pelo crdito no funcionamento da ca-deia automobilstica. Tais concluses levantam questes adicionais para a discus-so mais ampla de perspectivas do desenvolvimento, tais como: a importncia da disponibilidade de crdito para as dinmicas setoriais e de toda a economia; o direcionamento de investimentos para mercados em expanso e suas polticas de atrao, incluindo alternativas de financiamento; e os efeitos da intensificao dos fluxos comerciais (exportao e importao de bens finais e intermedirios) e financeiros (emprstimos matriz-filial, remessas de lucros e dividendos etc.) intracorporaes sobre a dinmica produtiva e as contas externas do pas.

  • 12 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    No terceiro captulo, Maria Cristina Penido de Freitas discute a problem-tica das fontes de financiamento de longo prazo no Brasil. Mais especificamente, analisa-se o pacote de estmulo do governo federal, lanado ao final de 2010, para o desenvolvimento de um mercado domstico privado de financiamento de longo prazo, diante da elevada dependncia da economia brasileira em relao aos recursos pblicos para a promoo do funding necessrio expanso dos investimentos produtivos e em infraestruturas. Examinam-se, nesse sentido, as principais medidas implementadas e seus efeitos sobre o mercado de ttulos privados de renda fixa e o crdito bancrio corporativo.

    Enfatizam-se os avanos empreendidos na formatao de um arcabouo ins-titucional mais favorvel canalizao dos fundos financeiros acumulados no pas como fontes de financiamento privado de longo prazo. Contudo, para o fortaleci-mento de um sistema privado de crdito de longo prazo, argumenta-se ainda em favor de mudanas no regime macroeconmico que viabilizem uma reduo da taxa bsica de juros, da separao entre a poltica monetria e a gesto da dvida pblica, da tributao dos ativos financeiros em funo dos prazos e da ampliao do prazo mnimo de aplicao dos depsitos a prazo e das cadernetas de poupan-a. Por fim, reitera-se a importncia da preservao das instituies pblicas de fomento com a reconhecida atuao do BNDES e dos mecanismos de crdito direcionado, enquanto instrumentos para assegurar o financiamento da atividade econmica e da infraestrutura e, portanto, viabilizar uma trajetria sustentada de desenvolvimento socioeconmico no pas.

    Finalmente, no quarto captulo, de autoria de Edison Benedito da Silva Filho, retoma-se a questo do financiamento das corporaes brasileiras com foco em sua exposio a riscos em moeda estrangeira, sob a gide dos recentes movimentos de financeirizao das atividades produtivas e liberalizao dos fluxos internacionais de capitais. Analisando a trajetria da exposio cambial do setor privado a partir da crise de 2008, quando grandes companhias nacionais colapsa-ram diante do agravamento da crise internacional, o autor descreve os mecanismos que permitiram a transmisso da instabilidade nos mercados financeiros para o setor produtivo do pas, notadamente por meio dos derivativos cambiais.

    O artigo apresenta uma srie de indicadores de exposio cambial das grandes corporaes brasileiras a partir de 2008, que apontam uma retomada expressiva do uso de derivativos cambiais por parte do setor produtivo no perodo recente, num contexto de volatilidade dos mercados de cmbio e commodities e incerteza em relao recuperao das economias centrais. Salienta-se ento a importncia da regulao governamental sobre os mercados financeiros como instrumento de estabilizao de choques externos, bem como de coordenao efetiva das instituies bancrias e industriais visando prevenir a ecloso de crises sistmicas no sistema financeiro nacional.

  • 13Introduo

    Em suma, este livro congrega diferentes abordagens sobre tpicos relacio-nados temtica do financiamento das empresas, da inovao tecnolgica e da infraestrutura produtiva. Revisitam-se antigas questes e introduzem-se novos elementos para a anlise de um objeto que merece permanente reflexo, e que se torna ainda mais relevante para o Brasil diante do processo de profunda reestru-turao produtiva que ocorre em mbito mundial por meio das cadeias globais de valor. Assim, apontam-se novos caminhos e desafios para as polticas pblicas voltadas ao desenvolvimento de longo prazo do pas.

    Marcos Antonio Macedo CintraEdison Benedito da Silva Filho

    Organizadores

  • CAPTULO 1

    PADRES DE FINANCIAMENTO DAS EMPRESAS: A EXPERINCIA BRASILEIRA*1

    Jlio Srgio Gomes de Almeida**2

    Marcos Antonio Macedo Cintra***3

    Claudio Avanian Jacob****4

    Luis Fernando Novais*****5

    Juliana de Paula Filleti******6

    1 INTRODUO

    No ciclo de crescimento da economia brasileira ocorrido entre 2003 e 2007, os investimentos realizados pelas corporaes nacionais concentraram-se fundamen-talmente na adequao e otimizao das unidades produtivas existentes. Progra-mas de internacionalizao e de implantao de novas plantas industriais para a ampliao de capacidade produtiva frente da expanso da demanda chegariam s agendas das grandes empresas brasileiras somente a partir de 2007. Ao longo deste perodo, intensificaram-se ainda os investimentos em participaes ou aquisio de outras empresas, em um processo que coincidiu com uma maior internaciona-lizao dos grupos nacionais. Neste processo, as grandes empresas brasileiras tam-bm mantiveram em crescimento as aplicaes financeiras e os ativos circulantes. Isto indica que uma parcela da capacidade crescente de gerao de lucros e liquidez das corporaes, alm de reduzir seu nvel de endividamento, tambm serviu ao aumento de aplicaes financeiras e ao giro de negcios, que se elevaram em fun-o da maior expanso da produo e das vendas. Reservas financeiras e capital de giro, alm de investimentos, portanto, foram as modalidades de aplicao em

    * Este captulo uma verso resumida da pesquisa mais ampla realizada pelos autores, Padres de financiamento das empresas no financeiras no Brasil, no mbito do projeto de pesquisa Estudos sobre as perspectivas da indstria financeira brasileira e o papel dos bancos pblicos. Campinas: Fundao Economia de Campinas (FECAMP)/Centro de Estudos de Conjuntura e Poltica Econmica (CECON)/Instituto de Economia/Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e Rio de Janeiro: Instituto de Economia/Universidade Federal do Rio de Janeiro/Banco Nacional de Desen-volvimento Econmico e Social (BNDES), novembro/2009. Disponvel em .** Professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).*** Tcnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Polticas Macroeconmica (Dimac) do Ipea.**** Economista, doutor em economia pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/UNICAMP).***** Coordenador do Grupo de Economia da Fundao do Desenvolvimento Administrativo (FUNDAP), do estado de So Paulo.****** Professora do curso de economia das Faculdades de Campinas (FACAMP).

  • 16 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    ativos que mais ganharam importncia entre as grandes empresas no ltimo ciclo de crescimento econmico do pas.

    A anlise do ciclo recente de investimentos faz emergir uma srie de ques-tes acerca da disponibilidade e das estratgias de captao de recursos pelas firmas nacionais. Como as empresas lograram ampliar sua capacidade de mo-bilizao de recursos para alm dos lucros retidos:1 por meio do mercado de ca-pitais ou pela via da contratao de novos financiamentos internos ou externos? Qual o papel desempenhado pelos bancos pblicos? Enfim, qual o atual padro de financiamento do investimento da grande empresa brasileira?

    Este trabalho procura discutir a estrutura de capital das companhias a partir de diferentes perspectivas tericas e de estudos empricos sobre as especificidades dos padres de financiamento das empresas em economias desenvolvidas, em de-senvolvimento e em transio. O texto est organizado em mais quatro sees, aps esta breve introduo. Na segunda seo, so apresentadas as teorias de es-trutura de capital e do financiamento do investimento, resumidas em duas subse-es. Primeiramente, realiza-se um panorama dos diferentes modelos de estrutura de capital derivados do teorema de Modigliani e Miller (1958). Apresentam-se ainda os diversos padres de financiamento dos investimentos corporativos ela-borados por Zysman (1983), bem como um estudo sobre o tema divulgado pela Conferncia das Naes Unidas sobre Comrcio e Desenvolvimento (UNCTAD, 2008b). A seguir, discute-se o arcabouo terico do financiamento do investi-mento em uma economia monetria, cuja origem est associada ao pensamento de Keynes (1930; 1936), Kalecki (1954) e Minsky (1975; 1986). Na terceira seo, analisa-se o padro de financiamento das empresas brasileiras de capital aberto no ciclo recente, assim como as perspectivas de financiamento dos investi-mentos programados, por meio de informaes coletadas em entrevistas realiza-das em 2009. Finalmente, na quarta seo, delineiam-se algumas consideraes sobre o padro de financiamento das corporaes brasileiras.

    2 ESTRUTURA DE CAPITAL DAS EMPRESAS: TEORIAS DO INVESTIMENTO

    2.1 Estrutura de capital e padres institucionais

    Modigliani e Miller (1958), a partir de hipteses bastante restritivas concor-rncia perfeita, plena informao e ausncia de custos de transao (inclusive oriundos da incidncia de impostos) , defenderam a perfeita substitutibilidade entre diferentes fontes, internas e externas, de financiamento do investimento

    1. Maiores margens de lucro estabelecidas pelas firmas para gerar recursos internamente.

  • 17Padres de Financiamento das Empresas: a experincia brasileira

    das firmas.2 Nestas condies, os autores sustentaram que as estruturas financei-ras seriam irrelevantes para o investimento das corporaes e, portanto, para o crescimento das empresas e da economia, pois no teriam efeitos sobre o valor das firmas nem sobre o custo e a disponibilidade de capital. Segundo os autores, the market value of any firm is independent of its capital structure (Modigliani e Miller, 1958, p. 268).

    Em condies ideais de mercado perfect capital market (Modigliani e Miller, 1958, p. 267) todo projeto de investimento vivel, ou seja, com retorno positivo, tambm o seria do ponto de vista financeiro. O teorema de Modigliani e Miller (1958) sugeriu, ento, que o crescimento da firma e suas decises de inves-timento seriam ditados estritamente por variveis reais, tais como a demanda, a produtividade, o progresso tcnico e os preos relativos dos fatores produtivos.3 O financiamento na forma de crdito bancrio, bnus, aes, fluxos de caixa ou lucros retidos constituiria uma varivel passiva, que facilitaria a realizao do investimento, mas no o condicionaria. Ou, nas palavras dos autores: the core problems of corporate finance the problem of the optimal capital structure for a firm is no problem at all (Modigliani e Miller, 1958, p. 291).

    Posteriormente, as hipteses mais irrealistas do modelo de Modigliani e Miller foram paulatinamente relaxadas e mesmo contestadas por outros pes-quisadores do prprio arcabouo neoclssico.4 Segundo Stiglitz (1988, p. 121, traduo nossa): irnico que um artigo que supostamente estabeleceu que no havia necessidade de prestar qualquer ateno estrutura financeira que a estrutura financeira era irrelevante tenha atrado a ateno dos economis-tas para as finanas.5 Diante de mercados imperfeitos, com assimetria de informaes, seleo adversa, risco moral (moral hazard), custos de agencia-mento e de transao, possibilidade de falncia e de tomada hostil do controle acionrio das firmas (takeover), a disponibilidade de um sistema de financia-mento adequado ao investimento passou a ser considerada um fator relevante para a anlise econmica, uma vez que afetaria tanto as decises das empresas como a taxa de crescimento da economia. O nvel global de investimento em uma determinada economia no poderia mais ser tomado como uma varivel

    2. Modigliani e Miller (1958, p. 296, traduo nossa): A nossa abordagem tem sido esttica, anlise de equilbrio parcial. Ela supe, entre outras coisas, uma concorrncia atomizada nos mercados de capital e uma maior facilidade de acesso a estes mercados que apenas um grupo relativamente pequeno (porm importante) das empresas sequer chegou perto de possuir. (Our approach has been that of static, partial equilibrium analysis. It has assumed among other things a state of atomistic competition in the capital markets and an ease of access to those markets which only a relatively small (though important) group of firms even come close to possessing.)3. O teorema permitiu o desenvolvimento da teoria neoclssica do investimento, sem referncias a fatores financeiros, estabelecida, entre outros, por Hall e Jorgenson (1967).4. Os prprios autores apresentaram uma verso alternativa da teoria, relaxando algumas hipteses relativas cobran-a de impostos (Modigliani e Miller, 1963).5. it is ironic that a paper which purportedly established that one need not pay any attention to financial structure that financial structure was irrelevant should have focused economists attention on finance.

  • 18 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    independente do padro de financiamento adotado pelas empresas (Stiglitz, 1973; Stiglitz e Weiss, 1981). Como salientam Fazzari, Hubbard e Petersen (1988, p. 142, traduo nossa):

    Modelos de empresas representativas convencionais em que a estrutura financeira irrelevante para a deciso de investimento podem aplicar-se muito bem a compa-nhias maduras com perspectivas bem conhecidas. Para outras empresas, no entanto, fatores financeiros importam, no sentido de que o capital externo no um substi-tuto perfeito para os fundos internos, particularmente no curto prazo.6

    A relevncia da dimenso financeira abriu uma ampla discusso sobre qual seria a estrutura tima de capital para as empresas e os fatores que a condi-cionariam. Surgiu um extenso conjunto de estudos tericos e empricos, com firmas individuais e agregadas, sobre as estruturas de capitais das corporaes. No objetivo deste trabalho efetuar uma resenha exaustiva destes diferentes estudos, que essencialmente procuram discutir os diversos modelos e aplic-los, utilizando-se de bases de dados de pases desenvolvidos e em desenvolvimento.7 Apresenta-se a seguir uma brevssima sntese das principais teorias e modelos aplicados pela literatura sobre o tema.

    Segundo a pecking order theory of finance, haveria uma ordem de preferncia entre trs fontes aes, dvida ou lucros retidos para o financiamento da ex-panso. As corporaes prefeririam sempre utilizar recursos prprios (lucros re-tidos, depreciao do capital fixo) aos capitais de terceiros e, quando estes se tor-nam necessrios, recorreriam primeiro ao endividamento e depois emisso de aes (Myers, 1984).8 No static trade-off model ou target model, as empresas pro-curariam sempre uma estrutura de capital tima, que minimizasse seus cus-tos e riscos. Quanto maiores as vantagens de custo associadas ao patamar corren-te das taxas de juros e dos impostos, maior a tendncia ao uso de endividamento; o inverso ocorreria quanto maior fosse o risco de falncia. O resultado seria uma relao endividamento/emisso tima para a firma (Bradley, Jarrell e Kim, 1984). Por fim, pela estratgia do market timing, ou janela de oportunidades, os gestores

    6. Conventional representative firm models in which financial structure is irrelevant to the investment decision may well apply to mature companies with well-known prospects. For others firms, however, financial factors appear to matter in the sense that external capital is not a perfect substitute for internal funds, particularly in the short run.7. Ver, por exemplo, Harris e Raviv (1991), que oferecem uma classificao das principais contribuies: modelos baseados em custos de agncia, em que uma determinada estrutura de financiamento pode contribuir para reduzir os conflitos de interesse entre gerentes e acionistas; modelos baseados em informao assimtrica, em que uma determinada opo de financiamento revela informaes privadas ao mercado; modelos em que a natureza do produto (durvel ou no durvel) ou da competio (oligoplios versus concorrncia perfeita) em determinado mercado desencadeia implicaes sobre o padro de financiamento; e modelos baseados no controle (control models), em que a disputa pelo controle da firma por meio de operaes de takeovers ou entre credores e acionistas define a estrutura de capital. Ver tambm Zonenschain (1998), Rodrigues Jnior e Melo (1999), Moreira e Puga (2000), Basso, Mendes e Kayo (2004) e Santanna (2008 e 2009), entre outros que realizam estudos sobre a estrutura financeira das corporaes brasileiras.8. O conjunto das corporaes americanas, por exemplo, recorreriam, sobretudo, a lucros retidos para financiar inves-timentos em capital fixo.

  • 19Padres de Financiamento das Empresas: a experincia brasileira

    das empresas acompanhariam tanto o mercado de dvidas como o de aes, utili-zando o meio de financiamento mais conveniente a cada momento. Se as condies estiverem propcias, buscariam captar os recursos para financiar uma oportunidade de investimento. Por sua vez, se os mercados no estiverem favorveis, os recursos no seriam tomados e a deciso de investir seria adiada (Baker e Wurgler, 2002).

    A partir de modelos institucionais e histricos distintos, Zysman (1983) elaborou uma tipologia dos modelos de sistema financeiro predominantes em diferentes pases, os quais favoreceriam determinadas estruturas de capital para as empresas e condicionariam processos distintos de ajustamento e reestrutura-o do setor produtivo. Para o autor, haveria trs tipos de sistemas financeiros: i) baseados em mercados de capitais; ii) baseados nos mercados de crdito, porm rigorosamente controlados pelos governos; e iii) baseados nos mercados de crdi-to, mas dominados pelas instituies financeiras.

    No primeiro modelo, o sistema baseado em mercados de capitais (capital market-based financial system), os recursos seriam alocados por intermdio dos preos, formados em mercados competitivos. As principais fontes de financia-mento de longo prazo indstria seriam os bnus e aes emitidos diretamen-te pelo agente tomador; haveria uma tendncia especializao dos bancos em operaes de emprstimos de curto prazo e das demais instituies financeiras em emisses de securities (bnus e aes). Estados Unidos e Inglaterra seriam os representantes tpicos de sistemas financeiros baseados nos mercados de capitais.

    Nesse sistema, a principal funo dos emprstimos bancrios atender a propsitos de curto prazo. Em cada um dos diversos mercados os preos so fixados em condies razoavelmente competitivas, situao que implica uma variedade de instrumentos de capital, de mercados monetrios e uma grande quantidade de instituies financeiras especializadas. (...) Nesse sistema, o banco central se ocupa principalmente com o controle dos agregados monetrios, seja a quantidade da oferta monetria, seja o nvel da taxa de juros. Somente de forma secundria influencia a alocao de recursos entre aplicaes alternativas. (...) O banco central pode agir como emprestador de ltima instncia, porm apenas de forma muito limitada. Quando intervm num capital market-based system, isso ocorre por meio de operaes de compra e venda, criando as condies de mercado desejadas; (...). Esse modelo coloca os bancos, as empresas e o Esta-do em esferas distintas, fora das quais arriscam e se encontram como parceiros de negcios autnomos (Zysman, 1983, p. 70, grifo no original, traduo nossa).

    O segundo modelo seria baseado no crdito (credit-based financial system), com os preos cruciais fixados pelo Estado. Os emprstimos de longo prazo estreitariam as relaes entre os bancos, as instituies financeiras e as corporaes. Em situao de dificuldade de determinada empresa, os credores tenderiam a reagir, aumentando o grau de controle, de modo a monitor-la mais de perto. Frana, Itlia e Japo seriam os representantes dos sistemas financeiros baseados no crdito, sob controle do Estado.

  • 20 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    O mercado de capitais (aes e de bnus) no facilmente acessvel aos tomadores privados, embora seja frequentemente utilizado pelo governo para levantar recursos para seus projetos. Dada a debilidade dos mercados de capitais, as empresas preci-sam recorrer a instituies de crdito, tanto especializadas como bancos universais, para obter os fundos de que necessitam. De fato, os bancos universais podem atuar como meios relevantes de acesso ao mercado de capitais, terminando como proprie-trios ou detentores de grande parte do capital votante de empresas importantes. Porm, como o crdito est no cerne das finanas corporativas, crucial a capaci-dade de o sistema bancrio ampliar os emprstimos para as empresas. O governo apoia os emprstimos bancrios e facilita a criao de moeda (Government chooses to underpin bank lending and to facilitate money creation). Por fim, o governo determi-na os preos em mercados importantes para estruturar as prioridades na economia. () Para resumir o segundo modelo, o crdito ampliado pelas instituies torna-se o piv principal do sistema de financiamento das empresas, sendo o governo atrado para apoiar o sistema e fazer as escolhas administrativas sobre alocao. O papel do governo aparentemente compensar a fragilidade existente no sistema financeiro privado (Zysman, 1983, p. 71-72, traduo nossa).

    O terceiro modelo seria tambm baseado em crdito (credit-based financial system), porm com os preos fixados pelas instituies financeiras com grande poder de mercado, pouco dependentes da assistncia estatal. Alemanha e Sucia seriam os representantes tpicos desse sistema.

    Os mercados, no as aes administrativas (do governo), determinam os preos, mas o movimento dos preos nos mercados reflete essa concentrao de poder financei-ro. () Nesse modelo, o Estado busca objetivos agregados em vez de alocativos, fazendo-o por meio de transaes de mercado em vez de tcnicas administrativas. Consequentemente, as instituies financeiras exercem influncia sobre as questes das empresas por meio de seu poder de mercado nos emprstimos e seu domnio no acesso aos mercados de securities (bnus e aes). O governo no possui o aparelho para ditar escolhas alocativas s instituies financeiras e, portanto, no possui instru-mentos independentes no sistema financeiro para exercer influncia sobre as companhias. Os bancos, porm, podem atuar como aliados e de forma negociada na implemen-tao das polticas pblicas (Zysman, 1983, p. 72, grifo no original, traduo nossa).

    Para Zysman (1983, p. 72), o segundo e o terceiro modelo seriam solues desenvolvidas por pases de processo de industrializao atrasada (late development), enquanto o primeiro estaria relacionado aos pases de industrializao originria (earlier industrial transformation). Isto porque os modelos baseados em crdito seriam mais favorveis interferncia do Estado, que pode utilizar-se do sistema financeiro como instrumento de poltica industrial e econmica.9 Uma das vanta-gens dos sistemas baseados em mercado seria a possibilidade de o investimento ser

    9. Sobre a importncia do financiamento bancrio para o desenvolvimento econmico e social, ver, por exemplo, Singh (1993). Mayer (1990), a partir de uma anlise das diversas teorias sobre os determinantes da estrutura de capital das firmas, tambm sugere uma superioridade do financiamento bancrio sobre as outras fontes de financiamento.

  • 21Padres de Financiamento das Empresas: a experincia brasileira

    realizado sem que o investidor tenha de reter o ttulo ou a ao por todo o perodo do investimento. A liquidez resultante, por um lado, amplia a oferta de capital para novos investimentos; por outro, contudo, diminui o horizonte do investimento, podendo dificultar a realizao de projetos com retorno de mais longo prazo e gerar maior volatilidade do capital, com prejuzo s inverses em inovaes tecnolgicas e infraestrutura.10 Nas economias em que h um mercado secundrio desenvolvido e dinmico, este contribui para definir o preo que norteia a emisso primria, pos-sibilitando a alocao dos recursos. Entretanto, se o Estado precisar atuar de forma direta em algum momento, encontrar as instituies financeiras como potenciais rivais e avessas interferncia.

    Essa taxionomia permite que se identifiquem padres nacionais de finan-ciamento e de organizao do capital, que refletem no apenas as estruturas dos mercados de capital e de crdito e as interpenetraes com o Estado, mas tambm as relaes entre empresas e instituies financeiras. Por um lado, as caractersti-cas institucionais e as relaes entre bancos e empresas do Japo, da Alemanha, da Frana e da Itlia tenderiam a ampliar os fluxos de informao entre credo-res e devedores, possibilitando um elevado grau de endividamento das corpora-es. Estes constituiriam os pases de alta alavancagem (high-leverage countries). Por outro lado, as empresas americanas, bem como as inglesas e as canadenses, caracterizar-se-iam por uma maior margem de autofinanciamento, o que permite carac-terizar estes pases como de baixa alavancagem (low-leverage countries).11

    O cerne desta discusso, em grande parte inconclusa, est nas vantagens e desvantagens do mercado de capitais em relao ao crdito bancrio como principal fonte de financiamento externo das empresas e suas implicaes sobre o crescimento econmico. A literatura mais recente tem procurado enfatizar que a questo crucial no a estrutura de financiamento do pas em si se bancria ou se predomina o mercado de capitais , mas sim o quo diversificados so os servios financeiros disponveis (Moreira e Puga, 2000, p. 11; Levine, 2001). Relatrio do Banco de Compensaes Internacionais (BIS, 2009, p. 13) aponta para a mesma direo: in a modern financial system, bank-based finance and market-based finance should be viewed as complementary rather than as rivals or substitutes.

    10. Lazonick (2007 e 2008) argumenta que a discusso dominante sobre as finanas corporativas carece de uma teoria para a firma inovadora. Observa que o perodo recente de prosperidade industrial nos Estados Unidos foi caracterizado por: i) integrao organizacional dos gerentes, que propiciou incentivos para as pessoas aplicarem suas habilidades e esforos a fim de gerar produtos de alta qualidade e baixo custo em comparao com os disponveis; e ii) existncia de um conjunto de relaes que garantiam a alocao de fundos para sustentar o processo de inovao cumulativo at que este pudesse gerar retornos financeiros. Quando estes dois elementos se combinam, so estabelecidas as con-dies sociais para o empreendimento inovador. Para uma discusso sobre o financiamento da inovao tecnolgica, ver tambm Kregel e Burlamaqui (2006).11. Aglietta (2004) enfatiza que nos pases com predomnio dos mercados de capitais tende a prevalecer o autofinan-ciamento. Para uma avaliao crtica da governana corporativa (corporate governance), entendida como um conjunto de regras e padres de comportamento que induzem as companhias a maximizar o valor dos acionistas (shareholder value), caracterstica dos sistemas baseados em mercados de capitais, ver Fracalanza, Raimundo e Miranda (2009).

  • 22 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    Por sua vez, documento da UNCTAD atualiza essa discusso, ressaltando que: dadas as dificuldades de os investidores potenciais obterem acesso ao sistema bancrio e ao mercado de capitais, no surpreende que os lucros retidos sejam a principal fonte de financiamento do investimento em todas as regies (UNCTAD, 2008b, p. 119, traduo nossa). De acordo com evidncias empricas provenientes de estruturas de financiamento mdias de mais de 32 mil empresas de cem pases desenvolvidos, em desenvolvimento e economias em transio entre 2002 e 2006:

    as empresas em mbito mundial financiam cerca de dois teros de seus investimen-tos com lucros retidos e uma frao de 16% a 23%, dependendo do tamanho da empresa, com emprstimos bancrios. O financiamento acionrio relativamente pouco importante, representando apenas cerca de 3% do financiamento do investi-mento uma participao menor que o apoio financeiro das famlias e dos amigos (UNCTAD, 2008b, p. 119, traduo nossa).12

    Na verdade, o padro de financiamento das corporaes varia substancial-mente em termos de tamanho das empresas e regies em que atuam (tabela 1). O predomnio dos lucros retidos permanece abaixo da mdia para as empresas dos pases desenvolvidos e de economias emergentes excluindo-se as economias em transio da Amrica Latina e Caribe e da sia. O financiamento banc-rio prevalece entre as grandes empresas, particularmente na frica, enquanto as pequenas utilizam mais os lucros retidos e recursos provenientes de famlias e amigos. As aes adquirem maior importncia na sia e nas economias emergen-tes da Europa Central e do Leste. Para as firmas da Amrica Latina e Caribe, o crdito comercial (trade credit accounts) assume uma proporo relativa maior no financiamento total. As operaes de leasing, includas na categoria outros, so relativamente importantes para as empresas dos pases desenvolvidos e das econo-mias emergentes na Europa Central e do Leste. No conjunto, as novas empresas tendem a financiar seus investimentos por meio do crdito bancrio em menor proporo que as empresas mais antigas; recorrem mais aos recursos das famlias e amigos, bem como s aes (ltima linha da tabela 1).

    Dados de alguns pases salientam as diferenas nas fontes de financiamento do investimento fixo (tabela 2). A estrutura de capital das empresas chinesas em 2003, por exemplo, diferia significativamente da de outros pases, uma vez que os lucros retidos assumiam uma participao muito baixa nas fontes de financiamento do investimento, enquanto a categoria outros desempenhava um papel relevante (44,5% na mdia total). Para as empresas estatais, esta classificao inclui recursos provenientes dos governos locais, bem como diversos outros canais, inclusive o mer-cado de capitais, e pode incluir tambm lucros retidos mal classificados. De acordo

    12. Firms worldwide finance about two thirds of their investments from retained earnings and another 16 to 23 per cent, depending on the size of the firm, from bank loans. Equity financing is of relatively little importance, accounting for only about 3 per cent of investment financing a share that is even smaller than financial support from family and friends.

  • 23Padres de Financiamento das Empresas: a experincia brasileira

    com os resultados de pesquisa anterior, realizada com dados de 1999, as empresas chinesas financiavam 60% dos seus investimentos fixos com lucros retidos, patamar semelhante ao dos outros pases (tabela 2).13 Empresas chinesas tambm fazem uso relativamente extensivo do mercado acionrio. Isto reflete, em grande parte, o pro-cesso de privatizao, parcial ou total, das empresas estatais, dado que o nmero de corporaes domsticas ampliando seu capital por meio da emisso de novas aes ainda relativamente pequeno (UNCTAD, 2008b, p. 119).

    TABELA 1Fontes de financiamento do investimento, grupos de pases selecionados (2002-2006)

    Pases Firmas

    Fundos internos e lucros retidos

    (%)

    Bancos comerciais

    domsticos e estrangeiros

    (%)

    Fundos estatais e de investimento

    (%)

    Crdito comercial

    (%)

    Aes (%)

    Famlia e amigos

    (%)

    Outros (%)

    Todos os pases

    Todas as firmas 100 32.809 65,5 16,1 1,3 3,2 3,0 3,8 7,1

    Pequenas 100 12.388 69,0 12,4 1,1 3,0 3,4 4,7 6,4

    Mdias 100 11.235 63,1 17,9 1,5 3,4 3,4 3,1 7,7

    Grandes 100 9.036 59,7 22,9 2,5 3,4 2,9 1,5 7,1

    Pases desenvolvidos

    Todas as firmas 5 2.592 59,3 20,0 0,6 3,0 3,8 1,2 12,0

    Pequenas 5 1.618 63,2 18,1 0,3 2,7 3,2 1,7 10,9

    Mdias 5 575 53,4 22,8 0,8 3,0 5,0 0,4 14,5

    Grandes 5 399 50,0 25,5 1,5 3,4 5,0 0,5 14,2

    Economias emergentes da Europa

    Todas as firmas 8 2.334 59,6 13,9 1,1 2,4 7,4 2,5 13,1

    Pequenas 8 1.290 62,8 10,1 0,2 2,8 7,5 4,2 12,3

    Mdias 8 621 55,3 18,3 1,4 2,4 8,2 0,4 14,0

    Grandes 8 423 57,8 18,0 3,0 1,4 6,5 0,1 13,2

    Amrica Latina e Caribe

    Todas as firmas 20 7.845 60,6 20,2 1,5 6,8 1,2 2,7 7,0

    Pequenas 20 2.622 62,2 18,6 1,1 6,4 0,8 3,2 7,8

    Mdias 20 3.265 58,9 21,2 1,1 7,6 1,6 2,8 6,9

    Grandes 20 1.938 58,8 24,4 2,8 6,3 1,1 1,3 5,3

    frica

    Todas as firmas 31 6.100 73,8 12,7 1,3 2,1 0,8 3,7 5,6

    Pequenas 31 2.642 77,8 8,9 1,1 2,4 0,8 4,3 4,8

    Mdias 31 2.059 69,9 16,1 2,0 1,9 1,0 2,5 6,6

    Grandes 31 1.372 63,4 24,3 2,0 2,3 1,1 0,8 6,1

    13. Essa perspectiva corroborada por Miguel (2009): o aumento da poupana ocorrido na China se deu em grande medida no setor corporativo, a partir dos lucros retidos das empresas, que cresceram de 2% do PIB [produto interno bruto] em 2002 para 10% do PIB em 2008. Ver tambm Chen (2004).

    (Continua)

  • 24 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    Pases Firmas

    Fundos internos e lucros retidos

    (%)

    Bancos comerciais

    domsticos e estrangeiros

    (%)

    Fundos estatais e de investimento

    (%)

    Crdito comercial

    (%)

    Aes (%)

    Famlia e amigos

    (%)

    Outros (%)

    sia: Sul, Sudeste e Leste

    Todas as firmas 17 9.309 49,3 21,0 1,6 2,8 8,9 7,2 9,3

    Pequenas 17 2.055 53,4 14,4 2,1 2,5 11,4 8,3 7,8

    Mdias 17 3.223 50,2 19,2 1,4 2,8 9,3 7,4 9,7

    Grandes 17 3.928 46,4 25,9 2,8 3,1 8,0 5,0 8,8

    Economias em transio da Europa

    Todas as firmas 12 3.008 72,5 14,5 1,0 2,3 1,9 3,2 4,6

    Pequenas 12 1.448 77,0 10,4 0,4 1,7 2,0 5,0 3,5

    Mdias 12 915 69,8 16,5 1,0 2,5 2,3 2,5 5,4

    Grandes 12 645 65,7 20,6 2,3 4,1 1,2 0,3 5,8

    Economias em transio da sia Central

    Todas as firmas 7 1.621 81,4 10,1 1,9 1,3 0,2 2,9 2,2

    Pequenas 7 713 84,6 7,7 1,0 0,4 0,0 4,5 1,8

    Mdias 7 577 79,6 11,1 2,0 2,3 0,4 2,5 2,0

    Grandes 7 331 77,8 14,0 3,1 1,2 0,1 1,0 2,8

    Memo: firm- based averages

    Todas as firmas 32.809 58,9 19,5 1,3 3,7 4,7 3,6 8,2

    Pequenas 12.388 67,7 12,5 0,7 3,5 4,2 4,9 6,4

    Mdias 11.235 56,8 20,6 1,4 4,3 4,8 3,4 8,7

    Grandes 9.036 49,6 27,5 2,1 3,3 5,4 2,1 10,0

    Novas firmas 1.070 63,9 13,8 1,7 2,7 6,0 6,1 5,8

    Fonte: UNCTAD, a partir da base de dados do Banco Mundial, Enterprise Survey. Disponvel em: .Obs.: 1. Foram consideradas novas firmas aquelas com dois anos ou menos; pequenas, com menos de vinte empregados;

    mdias, com de vinte a 99 empregados; e grandes, com mais de 99 empregados.2. Economias emergentes da Europa correspondem a Repblica Tcheca, Estnia, Hungria, Letnia, Litunia, Polnia,

    Eslovquia e Eslovnia.

    (Continuao)

  • 25Padres de Financiamento das Empresas: a experincia brasileira

    TABELA 2Fontes de financiamento do investimento pases selecionados (1999-2006)

    Empresas

    Fundos internos e lucros retidos

    (%)

    Bancos comerciais

    domsticos e estrangeiros

    (%)

    Fundos estatais e de investimento

    (%)

    Crdito comercial

    (%)

    Aes (%)

    Famlia e amigos

    (%)

    Outros (%)

    Brasil (2003)

    Todas as firmas 1.351 56,3 14,3 8,5 8,7 4,3 1,2 6,7

    Pequenas 226 58,0 10,8 5,7 13,0 3,5 2,2 6,7

    Mdias 736 58,6 14,8 6,4 8,2 3,8 1,4 6,9

    Grandes 384 51,2 15,0 14,1 7,4 5,7 0,3 6,2

    China (2003)

    Todas as firmas 1.342 15,2 20,4 0,5 1,0 12,4 5,9 44,5

    Pequenas 169 13,7 8,6 0,9 0,0 16,7 11,0 49,0

    Mdias 478 14,6 15,2 0,6 1,1 12,4 8,6 47,5

    Grandes 686 16,2 26,8 0,4 1,2 11,4 2,7 41,1

    China (1999)

    Todas as firmas 94 59,6 9,7 6,4 2,9 2,8 6,2 12,5

    Pequenas 42 64,9 6,8 5,0 1,0 0,3 9,0 13,0

    Mdias 27 61,6 8,0 10,1 3,9 3,9 3,9 8,6

    Grandes 25 48,4 16,3 4,6 5,0 5,6 4,1 15,9

    China (2003)

    Estatais 263 11,5 25,3 1,0 0,0 4,7 1,2 56,3

    Privadas (domsticas)

    831 15,9 18,4 0,3 1,1 14,1 8,7 41,6

    Egito (2004)

    Todas as firmas 716 86,1 6,9 0,2 0,8 3,8 0,9 1,3

    Pequenas 287 90,1 3,9 0,0 1,2 2,2 1,4 1,2

    Mdias 275 87,0 6,6 0,4 0,8 3,3 0,7 1,3

    Grandes 154 77,4 13,1 0,3 0,0 7,6 0,3 1,2

    ndia (2005)

    Todas as firmas 1.476 52,0 32,2 0,0 4,5 1,1 6,9 3,3

    Pequenas 612 51,2 25,9 0,0 6,4 1,1 10,9 4,6

    Mdias 497 54,5 33,2 0,0 4,1 0,8 4,6 2,7

    Grandes 284 51,4 41,6 0,0 2,0 1,8 2,1 1,2

    Rssia (2005)

    Todas as firmas 431 85,0 6,5 1,2 2,4 0,2 1,1 3,6

    Pequenas 183 90,9 3,5 0,0 1,5 0,0 1,5 2,6

    Mdias 132 82,2 7,3 1,5 3,6 0,0 1,6 3,9

    Grandes 116 78,8 10,3 2,8 2,6 0,7 0,1 4,7

    Fonte: UNCTAD, a partir das bases de dados do Banco Mundial, Enterprise Survey, disponvel em: ; e Banco Mundial, World Business Environment Survey, disponvel em: .

    Obs.: 1. Foram consideradas pequenas firmas aquelas com menos de vinte empregados; mdias, com de vinte a 99 empregados; e grandes, com mais de 99 empregados.

    2. Para dados sobre a China de 1999, as pequenas firmas correspondem quelas com menos de cinquenta empregados; as mdias, quelas com de cinquenta a quinhentos empregados; e as grandes, quelas com mais de quinhentos empregados.

  • 26 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    A principal fonte de financiamento do investimento das empresas no Egito e na Rssia consiste nos lucros retidos, enquanto na ndia destacam-se os bancos.14 No Bra-sil, mecanismos especiais de financiamento do desenvolvimento desempenham papel relevante,15 com destaque para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES), principal instituio financeira de desenvolvimento do pas, que sobreviveu onda de reduo da presena do Estado na atividade bancria na dcada de 1990. Projetos em infraestrutura e de expanso da indstria de transformao pre-dominam entre os desembolsos desta instituio (UNCTAD, 2008b, p. 121-122).16

    Em resumo, o padro de financiamento do investimento produtivo em todos os pases tende a privilegiar as fontes internas em relao s externas, e, em menor proporo, o financiamento acionrio. Mas, neste padro geral, h diferenas substantivas entre os pases e entre as empresas. O crdito bancrio tende a ter maior expresso nas grandes corporaes, enquanto as pequenas e novas firmas recorrem mais aos lucros retidos, bem como a recursos provenientes de famlias e amigos s vezes, por mecanismos informais , dadas as dificuldades de acesso s fontes externas de financiamento para seus investimentos.17

    2.2 Financiamento do investimento em uma economia monetria

    Outro arcabouo terico sobre o financiamento do investimento tem origem as-sociada ao pensamento de Keynes, Kalecki e Minsky. Neste paradigma, a acumu-lao de capital financiada principalmente pelos lucros retidos das corporaes, mas o sistema financeiro desempenha um papel crucial na mobilizao dos re-cursos necessrios para a expanso dos investimentos. Isto porque as instituies financeiras, particularmente os bancos comerciais, de investimento e de desenvol-vimento, no so intermedirios passivos, que apenas facilitam as transaes entre os agentes no financeiros (famlias, empresas etc.). So atores dinmicos que

    14. Para uma discusso sobre o sistema financeiro chins, ver Cintra (2009a). Para um panorama do sistema financeiro indiano, ver Cintra (2007).15. Para diversas avaliaes sobre o sistema de financiamento brasileiro, ver Tavares (1972 e 1983), Silva (1981), Calabi et al. (1981), Almeida (1987, 1994), Cruz (1994), Crocco e Santos (2006), Torres Filho (2006, 2008, 2009), Freitas (2007), Cintra (2009b), e Oliveira (2009).16. Conforme a UNCTAD (2008b, p. 103, traduo nossa): Em geral, a despeito da elevada participao do governo na reestruturao do sistema bancrio e do maior papel dos bancos estrangeiros na maioria dos pases que libera-lizaram e desregulamentaram seus setores financeiros, as condies de financiamento mantiveram-se desfavorveis para as corporaes e para o financiamento dos investimentos. O acesso ao crdito continuou segmentado, e o custo do financiamento, elevado, embora fosse esperado que as reformas financeiras introduzissem maior concorrncia e reduo no custo do crdito. (In general, despite heavy government involvement in the restructuring of the banking system and the greater role of foreign banks in most countries that liberalized and deregulated their financial sector, financing conditions have remained unfavourable for corporate and investment finance. Access to credit continues to be segmented and financing costs high, even though financial reforms were expected to introduce more competition and reduce the cost of credit.) Para um panorama do financiamento estrangeiro das corporaes dos pases em desenvolvimento, ver The World Bank (2007). Para as multinacionais, ver UNCTAD (2008a).17. A pesquisa de Roberto Alexandre Zanchetta Borghi, neste volume, detalha o padro de financiamento das corpo-raes automobilsticas, em mbito global.

  • 27Padres de Financiamento das Empresas: a experincia brasileira

    distribuem recursos (poder de compra) entre os diferentes agentes econmicos e setores com diversos propsitos (consumo, investimento) em consonncia com seus objetivos de valorizao e acumulao de capital.18

    2.2.1. O circuito keynesiano finance-investimento-funding

    Para Keynes (1930), em uma economia monetria dotada de um moderno sistema de crdito, a demanda de moeda consiste, fundamentalmente, em uma demanda de depsitos bancrios. Nessas condies, a trajetria da economia depende da intera-o entre: i) a esfera real, da evoluo dos rendimentos dos fatores de produo; e ii) a esfera monetria, da compatibilidade entre a disposio de os bancos criarem crdito (e, portanto, depsitos) e as avaliaes do pblico baixista ou altista quanto ao movimento futuro dos preos das dvidas e dos ativos financeiros. A de-manda do pblico distribui-se entre dois tipos de depsitos: i) os depsitos vista, que servem para financiar o gasto das empresas com a gerao do produto e o dis-pndio da renda pelas famlias; e ii) os depsitos a prazo, que se destinam a manter reservas lquidas, na expectativa de mudana nos preos dos estoques de riqueza.19

    Nessa economia, as decises dos capitalistas so tomadas a partir de expecta-tivas a respeito da evoluo de dois conjuntos de preos: i) os preos da produo corrente vis--vis os dos ativos de capital; e ii) as variaes esperadas nos preos das dvidas contradas para sustentar a posse daqueles ativos. O primeiro sistema de preos expressa o conceito de eficcia marginal do capital; o segundo relaciona o preo das dvidas e demais compromissos com a disposio dos detentores de ri-queza lquida de comprar aqueles ttulos que representam direitos contra a rique-za produtiva. So as expectativas sobre a evoluo destes dois conjuntos de preos que determinam as decises quanto forma de posse da riqueza dos agentes que controlam os meios de produo e o crdito e, portanto, a demanda efetiva.20

    Assim, a dinmica econmica resultar, por um lado, da expectativa dos empresrios a respeito dos fluxos de rendimentos provveis decorrentes das suas decises de colocar em operao a capacidade produtiva existente, tanto no setor de bens de consumo como no de bens de capital. No entanto, estas decises de gasto esto subordinadas s expectativas dos possuidores de riqueza lquida ou

    18. Para uma sntese deste paradigma, ver Prates et al. (2009).19. Keynes (1930, p. 191): essa funo dual dos bancos (recebimento de depsitos vista e a prazo) a chave para muitas dificuldades na moderna teoria da moeda e do crdito e fonte de srias confuses. De um lado, os depsitos vista nos bancos comerciais proveriam de moeda seus depositantes e, por meio do sistema de reservas fracionadas, de recursos adicionais os tomadores de emprstimos. Os bancos criariam, ento, moeda, operando como uma cmara de compensao e transferindo ordens de pagamentos entre os clientes. Neste caso, os emprstimos criariam de-psitos. De outro lado, os depsitos a prazo atuariam meramente como intermedirios nos emprstimos de capital. Receberiam depsitos a prazo do pblico e os empregariam em investimentos financeiros ou na produo. Aqui, seriam os depsitos que possibilitariam os emprstimos. Ver Chick (1986; 1994).20. Conforme Keynes (1936, p. 121): a curva da eficincia marginal do capital comanda as condies em que se de-mandam fundos disponveis para novos investimentos, enquanto a taxa de juros rege os termos em que esses fundos so correntemente oferecidos.

  • 28 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    seja, do sistema bancrio em ltima instncia de criar liquidez incorporando novos ttulos de dvida sua carteira de ativos (Belluzzo e Almeida, 2002, p. 40).21

    A capacidade de o sistema bancrio expandir o crdito e, por conseguinte, criar novos depsitos (moeda escritural, que serve como meio de pagamento) de-pende, em uma economia fechada, da demanda do pblico e do comportamento das reservas em moeda estatal mantidas junto ao Banco Central. A taxa de redes-conto e as operaes de mercado aberto, manejadas pelo Banco Central, so a pedra angular deste sistema de pagamentos e de provimento de liquidez. Estes instru-mentos refletem a capacidade das autoridades monetrias de, alterando o volume e o custo de obteno das reservas bancrias, ampliar ou contrair as condies de monetizao das dvidas e ativos financeiros existentes e tambm dos novos fluxos de crditos emitidos para financiar os gastos na economia. Porm, o xito ou malo-gro das operaes do Banco Central esto condicionados s alteraes no estado de expectativas dos possuidores de riqueza. Keynes (1936) encontrou uma definio mais precisa para este fenmeno na teoria da preferncia pela liquidez da taxa de juros. As taxas de juros representam o prmio para que as pessoas se desfaam da moeda em suas formas mais lquidas. A taxa de juros, portanto, uma medida do grau de incerteza e da preferncia pela liquidez. Conforme Keynes (1937c, p. 173):

    em parte por motivos razoveis e em parte por razes instintivas, nosso desejo de manter o dinheiro como reserva de valor constitui um barmetro do grau de nossa desconfiana de nossos clculos e convenes quanto ao futuro. Embora este sen-timento em relao ao dinheiro tambm seja convencional e instintivo, ele atua, por assim dizer, num nvel mais profundo de nossa motivao. Ele se enraza nos momentos em que se enfraquecem as mais elevadas e mais precrias convenes. A posse de dinheiro real tranquiliza nossa inquietao; e o prmio que exigimos para nos separarmos dele a medida do grau de nossa inquietao.

    Enfim, a existncia de um sistema de bancos comerciais emissores de moe-da escritural intermediando os fluxos de financiamento libera os investidores no apenas de qualquer necessidade prvia de poupana, mas tambm da riqueza acu-mulada no passado e de sua distribuio. Os bancos financiam o investimento por meio de um fundo rotativo o fundo finance e, se isto for insuficiente, pela mul-tiplicao de seus depsitos vista. O investimento , ento, financiado no mer-cado monetrio, independentemente da captao antecipada de capital-moeda, e sem comprometer a autossustentao do processo de acumulao.

    21. Quando o investimento decidido, a economia como um todo se torna menos lquida. Isto se d independente-mente da fonte de financiamento. Se a origem dos recursos so os fundos prprios da acumulao interna das empre-sas aplicados vista ou a prazo em depsitos bancrios, o banco forado a ceder liquidez. Se a fonte so recursos mantidos em caixa pelas empresas, so estas que cedem a si prprias a liquidez. Se a fonte um emprstimo, o banco cede liquidez em troca de um ativo, uma dvida da empresa. Se os recursos provm de uma emisso de bnus ou de aes, os investidores aceitam ceder liquidez em troca de um ttulo, de propriedade ou de dvida. Assim, no momento em que se concretiza a deciso de investir, h uma demanda de liquidez, o que pode desencadear uma elevao da taxa de juros, dependendo da disposio dos possuidores de riqueza entre eles, destacadamente, os bancos de se tornarem menos lquidos (Belluzzo e Almeida, 2002, p. 47-48).

  • 29Padres de Financiamento das Empresas: a experincia brasileira

    Conforme Keynes (1937b, p. 168):

    o finance constitui, essencialmente, um fundo rotativo. No emprega poupana. , para a comunidade como um todo, apenas uma transao contbil. Logo que usado, no sentido de ser gasto, a falta de liquidez automaticamente compensada e a disposio de iliquidez temporria est de novo pronta a ser usada mais uma vez. (...) Em sua maior parte, o fluxo de novos recursos requeridos pelo investimento ex ante corrente suprido pelo financiamento liberado pelo investimento ex post corrente.

    Desse modo, o finance constitui-se de linhas de crdito ou avanos banc-rios que permitem antecipar recursos futuros (receita futura) com o propsito de financiar o investimento. Portanto, antecede o investimento e no tem nenhuma relao com a poupana prvia ou ex ante, mas com a criao de crdito. Como sugerido, demanda por liquidez o mesmo que demanda por emprstimos ban-crios. Mas o motivo finance no se confunde com os outros motivos de demanda de liquidez (transao, precauo e especulao).

    A demanda finance de liquidez delimitada pelo fato de que os fundos avanados pelo sistema bancrio so repostos to logo as decises de gasto so concretizadas. Neste momento, a iliquidez momentnea superada, em termos macroeconmicos, no a partir da formao de uma poupana da renda gerada, mas da corrente de gastos monetrios que o investimento desencadeia ao ordenar a produo dos bens que formaro o novo capital produtivo. Este fluxo monet-rio reaparece no sistema bancrio sob a forma de novos depsitos. O processo que recompe o fundo rotativo e repe a liquidez momentaneamente contrada o de produo e de gerao da renda. A recomposio estabelecida no mbito macro-econmico, no sentido de que os fundos avanados pelos bancos a eles retornam. Isto no significa que os devedores originais tenham liquidado suas dvidas, o que s pode ser efetuado pelas empresas a partir da apropriao da renda gerada sob a forma de lucro.22 Os prazos de pagamentos vo depender de muitos fatores, sendo possvel imaginar que ocorram em um nico perodo de produo, como na for-mao de capital circulante ou capital lquido (Belluzzo e Almeida, 2002, p. 51).

    22. Segundo a UNCTAD (2008b, p. 91, traduo nossa): O crdito criado ex nihilo quando um banco comercial con-cede a uma empresa um emprstimo que pode ser financiado por uma operao com o Banco Central por meio do redesconto ou do mercado aberto , o que implica um aumento da oferta monetria. A empresa expande a capacidade produtiva de bens e de servios, utilizando-se do crdito adicional, amplia a renda agregada e cria a contrapartida na economia real do aumento da oferta monetria. A entrada de maior fluxo de caixa na empresa permite que o emprstimo seja pago. O aumento nos lucros corporativos e na poupana das famlias resultantes destas atividades adicionais no lado real da economia leva a um equilbrio ex post dos investimentos e das poupanas agregados. (Credit is created ex nihilo when a commercial bank extends to a firm a loan that can be financed by borrowing from the central bank via the discount window or open market operations, which implies an increase in the money supply. The nominal value of the firms expansion of productive capacity and production of additional goods and services, for which the additional credit was used, increases aggregate income and creates the real economy counterpart to an increase in the money supply. The firms larger cash inflow allows the loan to be paid back. The increase in corporate profits and household savings resulting from these additional activities on the real side of the economy lead to an ex post balancing of aggregate investments and savings.)Enfim, a determinao lgica ocorre da criao de crdito para financiar o investimento, que, se bem-sucedido, gera a poupana (lucros) que ser usada para o pagamento do emprstimo.

  • 30 Financiamento das Corporaes: perspectivas do desenvolvimento brasileiro

    Segundo Belluzzo e Almeida (2002, p. 49):

    reproduzindo-se a mesma demanda de finance, esta encontrar o fundo anterior-mente avanado pelos bancos j reconstitudo, de forma que o motivo finance passa a ser neutro em seu possvel efeito sobre a taxa de juros. Isto decorre, em outras palavras, de ser um fundo rotativo o avano bancrio para suprir a demanda de liquidez pelo motivo finance. Evidentemente, alterando-se a deciso de formar novo capital real ou ainda a deciso bancria de emprestar, recoloca-se o problema de liquidez/iliquidez do sistema. So os casos, por exemplo, de um aumento dos inves-timentos em capital fixo, como em um boom de investimento; ou de uma deciso empresarial de formar capital de giro ou capital lquido na expectativa de elevao da produo e das vendas.

    Nesses casos, o fundo finance deveria ser ampliado; caso contrrio, recolocar-se-ia o problema da liquidez, com o aumento provvel da taxa de juros, concorrendo para neutralizar os desejos de elevao dos investimentos e da produo. A relutncia de os bancos criarem crdito novo ou uma deliberada poltica do Banco Central poderiam ser os responsveis pela alta nos juros.

    O fundamental, do ponto de vista keynesiano, que as decises de gasto sejam avalizadas pelo sistema bancrio. O administrador da moeda e dos fundos financeiros da sociedade avana poder de compra, at ento inexistente, a partir da avaliao dos riscos de crdito, sancionando a aposta empresarial na aquisio de novos ativos (capital real). Por sua vez, a execuo do gasto sanciona a aposta bancria.23 Em cada momento, h um conjunto de empresas que est realizando o gasto de investimento e j exerceu a demanda de finance. Este conjunto de empre-sas est realizando um dficit financiado pelos bancos. Simultaneamente, outro conjunto de empresas est colhendo os resultados de suas decises anteriores de investimento, isto , realizando um supervit. Este supervit permite s corpo-raes saldar as dvidas do crdito obtido para o financiamento dos ativos que formaram no passado, e acumular fundos que irrigam o sistema bancrio como intermedirio financeiro para mobilizar recursos. Portanto, o prosseguimento do processo de aumento do investimento e do endividamento permite servir a dvida no presente para que a dvida passada possa ser honrada. Nesse sentido, o investimento gera um rastro de dvidas (Belluzzo e Almeida, 2002, p. 67).

    Nada garante, no entanto, que o empresrio conseguir automaticamente con-verter suas obrigaes de curto prazo em dvidas de longo prazo. H um risco neste

    23. De acordo com Plihon (2004, p. 43, traduo nossa): a criao e a circulao monetria esto diretamente ligadas ao funcionamento da economia: so endgenas economia. H, em particular, uma ligao direta entre a oferta de moeda dos bancos e as necessidades de financiamento do setor produtivo (as empresas). A criao monetria de-terminada pelo nvel de atividade econmica. Nos seus emprstimos, os bancos permitem que as empresas antecipem suas receitas. Eles, portanto, partilham os riscos incorridos pelas empresas, que esto ligados incerteza sobre o futuro. Os bancos e a criao monetria tm, assim, um papel ativo no desenvolvimento da atividade econmica: a moeda no neutra. Dessa forma, o sistema de crdito acelera a acumulao produtiva, mas tambm cria as condies para a expanso autnoma do capital fictcio, matriz dos episdios especulativos e das crises de crdito.

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    processo, e o empresrio toma suas decises a partir de suas expectativas de rentabi-lidade, ou seja, o finance possui um componente especulativo. Noutras palavras, na questo da compatibilidade entre prazos e taxas h sempre um risco que faz parte do clculo especulativo intrnseco a qualquer deciso de investimento capitalista.24

    No obstante, visando reduzir o grau desse risco, simultaneamente mate-rializao das fontes de crdito de curto prazo, as empresas iniciam negociaes junto aos bancos de investimento e a outras instituies do mercado de capitais para mobilizar fundos de longo prazo necessrios consolidao financeira do investimento processo de funding. A consolidao do investimento constitui-se, ento, de lanamentos de dvida de longo prazo e/ou de direitos de propriedade no mercado financeiro e de capitais. As dvidas podem ser mantidas pelas prprias unidades de dispndio, mediante a acumulao interna de lucros ou pelas cartei-ras dos intermedirios financeiros. Nesse caso, uma parcela dos ativos financeiros de longo prazo mantida pelas unidades poupadoras adota a forma indireta de depsitos a prazo, cotas de fundos privados de penso e aposentadoria, aplices de seguro, fundos de aes nos bancos, fundos mtuos de investimento, debn-tures e/ou aes em posse dos bancos etc.

    Dessa forma, fraes do capital utilizado no processo de consolidao do investimento provm da canalizao de poupana real, isto , renda acumulada, cujo poder de compra foi retardado no tempo. Porm, no basta a existncia de um determinado volume de poupana. preciso que esta poupana financeira seja efetivamente canalizada para atender as necessidades do funding. A despeito do papel desempenhado pelo sistema financeiro no funcionamento contnuo dos mercados de ttulos de longo prazo, Baer (1993, p. 37) salienta que:

    a atuao dos agentes financeiros (...) de natureza residual, sendo que o grosso do carregamento dos ativos financeiros deve ser de poupadores. Ou seja, a capacidade de funding precisa estar presente e o papel dos bancos estar disposto a cobrir pos-sveis necessidades da circulao financeira nos mercados de ttulos.

    Em suma, o financiamento do investimento requer que a economia dispo-nha de instituies e mecanismos que acomodem as mudanas patrimoniais pro-venientes das decises de acumulao de capital produtivo. O problema decisivo est na adequao das fontes de financiamento s caractersticas do novo capital produtivo. Estas caractersticas so diversas, em termos de risco, retorno esperado e prazo de maturao, o que exige uma diversidade correspondente de formas de financiamento finance e funding , seja por meio do sistema bancrio, seja mediante o mercado de capitais.

    24. Keynes (1963, p. 13, grifo nosso): o mundo empresarial, como um todo, deve estar sempre em posio de ganhar com uma alta ou perder com uma baixa de preos. Goste ou no, a tcnica de produo sob regime de contrato em dinheiro fora o mundo empresarial a assumir sempre uma grande posio especulativa.

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    2.2.2 As estruturas financeiras minskyanas: ativos e passivos

    A anlise de Minsky est centrada nos agentes capitalistas, sobretudo empresas e bancos, e nas decises referentes valorizao dos ativos. Destas decises nascem os fluxos de aquisio de novos ativos, de manuteno dos estoques de riqueza e de seu financiamento. Nas palavras de Minsky (1986, p. 184): a decision to acquire capital assets is, basically, a decision to put out liabilities. Minsky (1975; 1986) desenvolve, ento, uma concepo inteiramente financeira do corporate finance. A dimenso financeira condiciona a valorizao da riqueza e as ava-liaes patrimoniais de duas formas: primeiro, no setor financeiro so formadas as projees que guiam a antecipao dos rendimentos futuros dos ativos pro-dutivos; segundo, a formao de posies ativas pressupe seu financiamento, tornando decisivas as condies definidas pelo sistema bancrio e pelo mercado de capitais quanto a prazos, juros, acesso ao crdito e a recursos para novas emis-ses de aes e dvida. Segundo Minsky (1986, p. 193): only a formulation of the investment process that accepts the existence of capitalist financial institutions is capable of explaining the observed instability of investment.

    Em cada momento, configura-se uma estrutura de ativos resultante das deci-ses passadas qual esto se agregando os resultados das decises presentes quan-to posse de ativos de capital e forma de financi-los. De acordo com Minsky (1986, p. 172): a company investing has to have a plan for financing the production of investment. A decision to invest to acquire capital assets is always a decision about a liability structure. Estes ativos estabelecem direitos renda futura. Tal promessa se realizar ou no dependendo do comportamento do investimento, em mbito macroeconmico, e das condies particulares a cada ativo produtivo (custos, de-manda, margem de lucro etc.), mas nada est garantido a priori. Contudo, a posse destes ativos foi obtida mediante contratos de diversas naturezas (prazos, condies e riscos), que no apenas exigem pagamentos certos e fixos, mas tambm podem incluir pagamentos variveis de acordo com os resultados da operao corrente dos ativos (Belluzzo e Almeida, 2002, p. 69).25 Enfim, para Minsky (1975; 1986),

    25. Minsky (1986, p. 185, traduo nossa, grifo nosso): Considerando-se que a estrutura do balano patrimonial reflete a combinao de fundos internos (lucros brutos retidos) e de fundos externos (dvidas e aes emitidas) efetiva-mente utilizados, a deciso de investir baseia-se em fluxos esperados de fundos internos e externos. Mas os fluxos de fundos internos por unidade investida dependem do desempenho da economia durante o perodo compreendido entre a deciso de investir e a finalizao do investimento. Assim, existe um elemento de incerteza na deciso de investir que independe de o investimento ser executado segundo as recomendaes tcnicas e se o mercado para o produto do investimento ser forte. Este elemento de incerteza est centrado na combinao de financiamento interno e externo que ser necessria; e esta combinao depende da extenso em que o financiamento dos bens de investimento ser proveniente dos fluxos de lucro. (Whereas the structure of balance sheets reflects the mix of internal funds (gross retained earning) and the external funds (bond or equity issues) actually used, the investment decision is based upon expected flows of internal and external funds. But the flows of internal funds to investing units depend upon the performance of the economy during the period between the decision to invest and the completion of the investment. Thus, there is an element of uncertainty in the decision to invest that has nothing to do with whether the investment will perform as the technologists indicated and whether the market for the product of the investment will be strong. This element of uncertainty centers on the mix of internal and external financing that will be needed; and this mix depends upon the extent to which finance for the investment goods will be forthcoming from profit flows.)

  • 33Padres de Financiamento das Empresas: a experincia brasileira

    praticamente impossvel que a firma coordene seus fluxos de recebimento e paga-mento de forma a assegurar que as sadas nunca excedam as entradas de recursos. Nessa perspectiva, o acesso ao crdito crucial, seja para garantir os pagamentos relativos produo corrente, seja para viabilizar a realizao dos investimentos que expandem a capacidade produtiva instalada.

    A partir desta perspectiva, Minsky (1975; 1986) constri uma teoria da de-terminao do investimento como uma teoria de deciso de portflio baseada na comparao entre o preo de oferta, Pi, e o preo de demanda dos bens de capital, Pk, incorporando a estes os custos do financiamento.26 Isto porque, como suge-rido, a deciso de adquirir ativos de capital traz consigo, necessria e simultanea-mente, uma deciso a respeito de como financiar esta aquisio. Genericamente, do ponto de vista da empresa, as possveis fontes de financiamento so: i) os re-cursos lquidos (moeda e quase moedas) disponveis em seu portflio, excedentes s necessidades das transaes correntes; ii) os recursos internos, ou seja, o fluxo de lucros brutos (descontado o pagamento de dividendos e impostos) gerados pelos investimentos anteriores; e iii) os recursos externos firma, obtidos junto aos bancos ou outros intermedirios financeiros, bem como por meio da emisso de aes, debntures ou outros ttulos negociveis nos mercados de capitais.27

    Os preos de oferta e de demanda dos bens de capital so determinados de forma a refletirem a necessidade de financiamento externo do investimento. Por isso incorporam, a partir de certo momento, os riscos do credor e do devedor, respectivamente. O risco do devedor implica uma queda no preo de demanda dos bens de capital, quando aumentam a parcela do investimento financiada ex-ternamente e o grau de imobilizao do portflio das firmas em ativos instrumen-tais de capital. O risco do credor, que eleva o preo de oferta dos bens de capital, tem sua expresso objetiva no custo e nos prazos dos contratos de financiamento.

    26. Minsky (1986, p. 175, traduo nossa): Uma caracterstica bsica de uma economia capitalista, ento, a exis-tncia de dois conjuntos de preos: um conjunto de produo corrente, um conjunto de ativos de capital. Os preos da produo corrente e dos ativos de capital dependem de diferentes variveis e so determinados em mercados distintos. Os preos, no entanto, esto conectados, a produo de investimento parte da produo corrente. (A basic characteristic of a capitalist economy, then, is the existence of two sets of prices: one set for current output, the other set for capital assets. The prices of current output and of capital assets depend upon different variables and are determined in different markets. The prices however are linked, for investment output is part of current output.)O preo de oferta dos bens de capital, Pi, formado com base em fatores objetivos: a taxa de salrios, a taxa de juros, a produtividade e o markup aplicado sobre os custos. Por sua vez, o preo de demanda dos bens de capital, Pk, igual ao valor presente do retorno esperado dos ativos de capital (Deos, 1997).27. Conforme Minsky (1986, p. 183, traduo nossa): uma demanda efetiva por investimento tem financiamento. Existem trs fontes de financiamento: dinheiro e ativos financeiros lquidos, fundos internos (lucros brutos aps impos-tos e dividendos) e fundos externos. Os fundos externos provm de emprstimos ou de emisses de aes. Quando emprestados, levam a compromissos de pagamentos. Os compromissos de pagamentos determinam os fluxos de caixa mnimos necessrios para satisfazer as obrigaes legais por unidade de financiamento. (an effective demand for investment takes financing. There are three sources of such finance: cash and financial assets on hand, internal funds (gross profits after taxes and dividends), and external funds. External funds are either borrowed or acquired by issuing equities. When borrowed, their acquisition leads to payment commitments. The payments commitments determine the minimum cash flows required to satisfy the legal obligations of the unit doing the financing.)

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    medida que aumenta o grau de endividamento da empresa que investe, o risco do credor se expressa pelo aumento no custo do financiamento e pela reduo dos prazos. O investimento dever ser realizado sempre que Pk for superior ou, no limite, igual a Pi; isto , sempre que o valor presente do retorno esperado dos ativos de capital for maior, ou igual, ao seu preo de oferta. Nas palavras de Minsky (1986, p. 191-192, traduo nossa, grifo nosso):

    se dvidas, bnus ou emprstimos contrados de bancos ou de mercados de curto prazo so utilizados, ento, os compromissos de pagamentos futuros aumentam, enquanto diminui a margem de segurana sobre a gesto e sobre o capital pr-prio. Em todos os casos recorrendo a ativos financeiros, emisso de novas aes ordinrias ou emprstimos o risco do devedor ir aumentar (). No entanto, o risco do credor transmite um impulso ascendente para as condies de oferta de bens de capital independentemente das condies tecnolgicas e de fornecimento. Este impulso crescente toma uma forma concreta nas condies de financiamento estabelecidas pelos banqueiros. Nos contratos de emprstimos e de dvidas (bnus), o risco do credor se expressa em taxas de juros mais elevadas, menores prazos, e em acordos e aditamentos. () O investimento ser realizado at o ponto em que a curva de oferta de bens de investimento, que incorpora o risco do credor, cruza-se com a curva de demanda de bens de investimentos, que reflete o risco do devedor.28

    Cabe salientar que os riscos do credor e do devedor se manifestam plena-mente a partir do momento em que o investimento deixa de ser financiado por recursos internos, ou seja, pelos fluxos de lucros brutos gerados pelos investimen-tos anteriores (Deos, 1997). Pressupe-se, portanto, que uma parcela dos inves-timentos autofinanciada (lucros retidos, fluxos lquidos). Mas o investimento tambm gera, simultaneamente, uma posio passiva. Segundo Minsky (1986, p. 187): investment therefore is a financial phenomenon. Minsky (1975; 1986) prope, ento, uma tipologia para classificar as unidades econmicas a partir das estruturas financeiras relao entre ativo e passivo e, por conseguinte, do grau de fragilidade (riscos financeiros envolvidos). O grau de fragilidade financeira de uma unidade econmica determinado pela sua capacidade de, para uma dada quase renda esperada da utilizao do ativo de capital, fazer frente aos seus com-promissos financeiros, tanto nos montantes como nos prazos.