Livro História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no Brasil

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  • 8/7/2019 Livro Histria do Movimento Poltico das Pessoas com Deficincia no Brasil

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    Histria do Movimento Poltico das Pessoas com Deficincia no Brasil

    Presidente da Repblica

    Luiz Incio Lula da Silva

    Vice-Presidente da Repblica

    Jos Alencar

    Ministro de Estado Chefe da Secretaria de

    Direitos Humanos da Presidncia da Repblica

    Paulo Vannuchi

    Secretrio Executivo

    Rogrio Sottili

    Secretria Nacional de Promoo dos Direitos da Pessoa com Deficincia

    Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior

    Organizao dos Estados Ibero-americanos

    para a Educao, a Cincia e a Cultura OEI

    Secretrio-Geral da OEI

    lvaro Marchesi

    Diretora da OEI no Brasil

    Ivana de Siqueira

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    Presidncia da Repblica

    Secretaria de Direitos Humanos

    Secretaria Nacional de Promoo dos Direitos da Pessoa com Deficincia

    Coordenao-Geral de Informao e Comunicao sobre Deficincia

    SCS- B, Quadra 09, Lote C, Edifcio Parque Cidade Corporate, Torre A 8 andar

    Cep: 70.308-200 Braslia DF Brasil

    E-mail : [email protected]

    Site: http://www.direitoshumanos.gov.br

    Reproduo autorizada, desde que citada a fonte de referncia.

    Distribuio gratuita.

    Impresso no Brasil.Copyright @2010 by Secretaria de Direitos Humanos.

    Tiragem : 2.000 exemplares - acompanhados de cd-rom com o contedo em

    OpenDOC, PDF, TXT e MecDaisy - 1 Edio - 2010

    Tiragem: 50 exemplares em Braille

    Este livro faz parte do Projeto OEI/BRA 08/001 Fortalecimento da

    Organizao do Movimento Social das Pessoas com Deficincia no Brasil eDivulgao de suas Conquistas.

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    http://www.direitoshumanos.gov.br/http://www.direitoshumanos.gov.br/
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    Normalizao: Llia Novais de Oliveira (CRB - 1 n 1370)

    Referncia bibliogrfica :

    Lanna Jnior, Mrio Clber Martins (Comp.). Histria do Movimento Poltico

    das Pessoas com Deficincia no Brasil. - Braslia: Secretaria de Direitos

    Humanos. Secretaria Nacional de Promoo dos Direitos da Pessoa com

    Deficincia, 2010. 443p. : il. 28X24 cm.

    Ficha Catalogrfica :

    H673 Histria do Movimento Poltico das Pessoas com Deficincia no Brasil /compilado por Mrio Clber Martins Lanna Jnior. - Braslia: Secretaria de

    Direitos Humanos. Secretaria Nacional de Promoo dos Direitos da Pessoa com

    Deficincia, 2010.

    443p. : il. 28x24 cm.

    Este livro faz parte do Projeto OEI/BRA 08/001 Fortalecimento da

    Organizao do Movimento Social das Pessoas com Deficincia no Brasil eDivulgao de suas Conquistas

    ISBN

    1.Histria, movimento poltico, Brasil. 2. Pessoa com Deficincia, movimento

    poltico, Brasil. I. Titulo II. Brasil. Secretaria de Direitos Humanos, Secretaria

    Nacional de Promoo dos Direitos da Pessoa com Deficincia.

    CDD 362.402681

    CDU 329-056.26(81)

    DIREITO ACESSIBILIDADE

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    Caro leitor,

    Por favor, avise s pessoas cegas, com baixa viso, analfabetas ou por alguma

    razo impedidas de ler um livro impresso em tinta que esta obra est publicada

    em distintos formatos, conforme o Decreto n 5.296/2004 e a Conveno sobre os

    Direitos das Pessoas com Deficincia da Organizao das Naes Unidas (ONU),

    ratificada no Brasil com equivalncia de emenda constitucional pelo Decreto

    Legislativo n 186/2008 e Decreto n 6.949/2009:

    - OpenDOC, TXT e PDF no site www.direitoshumanos.gov.br, para que seja

    acessada por qualquer ledor de tela (sintetizadores de voz). O site da Secretaria

    de Direitos Humanos da Presidncia da Repblica (SDH/PR) est de acordo com

    os padres de acessibilidade.

    - CD em formatos OpenDOC, TXT, PDF e MECDAYSE encartado ao final deste livro

    (o software MECDaisy est disponvel no site www.intervox.nce.ufrj.br/mecdaisy

    para download).

    - Em Braille, quando solicitada pelo email [email protected] ou pelo telefone

    (61) 2025-3684.

    SUMRIO

    4

    http://www.direitoshumanos.gov.br/http://c/Users/Flavia%20Vital/AppData/Local/Microsoft/Windows/Temporary%20Internet%20Files/Content.IE5/Configura??es%20locais\Temporary%20Internet%20Files\OLKD0\www.intervox.nce.ufrj.br\mecdaisymailto:[email protected]://www.direitoshumanos.gov.br/http://c/Users/Flavia%20Vital/AppData/Local/Microsoft/Windows/Temporary%20Internet%20Files/Content.IE5/Configura??es%20locais\Temporary%20Internet%20Files\OLKD0\www.intervox.nce.ufrj.br\mecdaisymailto:[email protected]
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    APRESENTAO

    Primeira Parte

    INTRODUO

    Captulo 1

    AS PRIMEIRAS AES E ORGANIZAES VOLTADAS PARA AS PESSOAS COM

    DEFICINCIA

    Captulo 2

    O ASSOCIATIVISMO DAS PESSOAS COM DEFICINCIA

    Captulo 3

    O MOVIMENTO POLTICO DAS PESSOAS COM DEFICINCIA

    Captulo 4O MOVIMENTO DAS PESSOAS COM DEFICINCIA E A ASSEMBLEIA NACIONAL

    CONSTITUINTE

    Captulo 5

    A CORDE E O CONADE NA ORGANIZAO ADMINISTRATIVA DO ESTADO BRASILEIRO

    Captulo 6

    O SCULO XXI

    Segunda Parte

    GUIA DE LEITURA DAS ENTREVISTAS

    Entrevistados

    1. Adilson Ventura

    2. Ana Maria Morales Crespo (Lia Crespo)

    2. Antnio Campos de Abreu

    4. Cludia Sofia Indalcio Pereira

    5. Dbora Arajo Seabra de Moura

    6. Dorina de Gouva Nowill

    7. Elza Ambrsio

    8. Ethel Rosenfeld

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    9. Flvio Arns

    10. Jorge Mrcio Pereira de Andrade

    11. Karin Lilian Strobel

    12. Liane Martins Collares

    13. Llia Pinto Martins

    14. Lizair de Moraes Guarino

    15. Lcio Coelho David

    16. Manuel Augusto Oliveira de Aguiar

    17. Maria Aparecida Siqueira (Cidinha Siqueira)

    18. Maria de Lourdes Brenner Canziani

    19. Messias Tavares de Souza

    20. Raimundo Edson de Arajo Leito21. Regina Lcia Barata Pinheiro Souza

    22. Romeu Kazumi Sassaki

    23. Rosangela Berman Bieler

    24. Suely Harumi Sotow

    25. Teresa de Jesus Costa dAmaral

    HOMENAGENS IN MEMORIAMREFERNCIAS

    LISTA DE SIGLAS

    Apresentao

    Com o lanamento da publicao Histria do movimento poltico daspessoas com deficincia, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidncia daRepblica, em parceria com a Organizao dos Estados Ibero-americanos para aEducao, a Cincia e a Cultura (OEI), busca resgatar a trajetria histrica desse

    grupo em nosso pas. Esse registro indito contribuir para que as futurasgeraes se espelhem nesses exemplos de persistncia e perpetuem a caminhadapela promoo da cidadania de qualquer indivduo, sem distino de sexo,nacionalidade, cor de pele, faixa etria, classe social, opinio poltica, religioou orientao sexual. O livro conta a evoluo da luta pelos direitos das pessoascom deficincia, a partir da organizao das mobilizaes sociais na dcada de70 e elaborao de suas demandas, at conquistar o seu reconhecimento e

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    assimilao pelo Estado brasileiro com vistas a garantir direitos de 25 milhes depessoas.

    Ao colocar a coordenao da poltica para incluso da pessoa comdeficincia na pasta dos Diretos Humanos, o Governo do Presidente Lulareconhece que esta incluso , antes de mais nada, um direito conquistado poreste importante segmento da populao a partir de muita luta. Em 2009, a OEAreconheceu que poucos so os pases capazes de superar a ao meramentereabilitatria e assistencialista considerando ainda que alguns no apresentamnenhuma poltica pblica voltada para esse grupo. O Brasil foi enaltecido porcoordenar medidas administrativas, legislativas, judiciais e polticas pblicas,sendo considerado um dos pases mais inclusivos das Amricas.

    Tais avanos no seriam possveis sem a atuao engajada e militante dasociedade civil organizada, sempre vigilante em seu papel de cobrar do Estadobrasileiro sua responsabilidade na garantia dos Direitos Humanos das pessoas com

    deficincia. O trabalho de sensibilizar os poderes pblicos para as especificidadesdas questes ligadas a este pblico foi fundamental para os avanos conquistadosat aqui, apesar dos inmeros desafios que ainda precisam ser superados.

    Nos ultimos oito anos, importantes passos foram dados. A interaodemocrtica entre Estado e sociedade civil, com a realizao inovadora das 1 e2 Conferncias Nacionais dos Direitos das Pessoas com Deficincia, em 2006 e2008, assim como encontros nacionais de conselhos estaduais ligados ao tema,possibilitaram maior participao da sociedade civil na discusso sobre os rumosque o Brasil segue nesta rea. As principais decises adotadas nesses fruns deampla participao democrtica foram incorporadas integralmente ao 3

    Programa Nacional dos Direitos Humanos (PNDH3), lanado em dezembro de2009.

    O Brasil avana nesse marco civilizatrio em Direitos Humanos, com asociedade assegurando mais liberdade, igualdade e solidariedade. Liberdade quecomea com a eliminao das barreiras fsicas e de atitude, as barreiras dopreconceito e as que impedem a igualdade nas oportunidades de emprego.

    Ao unificar as aes do Poder Executivo voltadas para as pessoas comdeficincia, a Agenda Social do Governo Lula produziu resultados expressivos no

    que se refere s pessoas com deficincia. Os investimentos em educaoinclusiva foram multiplicados em 5 vezes, elevando de R$ 60 milhes para maisde R$ 300 milhes, entre 2002 e 2010, as aes de reabilitao receberamrecursos da ordem de R$ 2,5 bilhes nos ltimos oito anos e o Projeto MinhaCasa, Minha Vida construir 2 milhes de unidades respeitando o desenhouniversal da acessibilidade. importante destacar ainda avanos nos marcosinstitucional e regulatrio como o Decreto da Acessibilidade, a Lei de Libras, oDecreto do Co Guia e a elevao da Coordenadoria Nacional para Integrao da

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    Pessoa Portadora de Deficincia (Corde) ao status de Secretaria Nacional, 20anos depois de sua criao em 1989.

    O Brasil hoje uma referncia mundial na reparao de vitimas dahansenase que foram segregadas do convivio social no passado. E aprovou em

    2008 a Conveno da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia, pelaprimeira vez com fora de preceito constitucional, fato que balizar toda adiscusso em torno de um possvel estatuto dos direitos da pessoa comdeficincia. Soma-se a isso a oportunidade de receber a Copa do Mundo em 2014e as Olimpadas em 2016, desafios que exigiro novos avanos para a inclusodeste grupo, no s assegurando acessibilidade nas novas construes, mas com acriao de estruturas permanentes que ampliaro as chances dos esportesparaolimpicos.

    Em resumo, o Brasil no mais recuar na promoo e defesa dos DireitosHumanos das pessoas com deficincia. E contar sempre com um movimento

    social forte e engajado para impulsionar o Estado a aprofundar essas conquistas.Que esta luta siga adiante !

    Paulo VannuchiMinistro de Estado Chefe da

    Secretaria de Direitos Humanos daPresidncia da repblica (SDH/PR)

    J que se h de escrever, que, pelo menos,

    no se esmaguem com palavras as entrelinhas.

    Clarice Lispector

    Este livro busca, pela primeira vez, registrar a histria do movimento de lutapelos direitos das pessoas com deficincia no Pas, bem como trata de resgatar aspolticas pblicas do Estado brasileiro sobre o tema. Foi uma longa jornada. Tanto a domovimento quanto a da produo desta publicao. O movimento forjou-se no dia a dia,na luta contra a discriminao, na busca incansvel pela incluso, na disputa poltica.Reconstituir essa trajetria era o desafio. Para enfrent-lo, foi necessrio pesquisa emuito trabalho. O ponto de partida: ouvir os prprios protagonistas desta histria. Nadasobre ns sem ns! Como eram muitos, 25 pessoas que participaram diretamente de

    fatos decisivos para as conquistas da populao com deficincia foram escolhidas. Apartir de suas memrias, e tambm de documentos, foi possvel refazer o percurso. Emlivro e tambm em documentrio.

    Entre os protagonistas esto lideranas com deficincia fsica, intelectual,visual, auditiva ou mltipla e especialistas. Todos atuaram no movimento, seja nosurgimento ou na sua consolidao. Ao reviverem suas lembranas e tornarem pblicos

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    documentos, muitas vezes particulares, essas pessoas compartilham mais do queconhecimento, compartilham a histria que ajudaram a construir.

    Ao longo de seus depoimentos, a viso individual, quase sempre carregada deemoo, conduz a narrativa, mostrando os esforos e mesmo as contradies domovimento, os avanos, os retrocessos, a necessidade de subverter a ordem parasensibilizar a sociedade e os governantes. O que se percebe a busca incansvel pelatransformao da sociedade brasileira, para ultrapassar uma viso caritativa e encararos desafios de incluir as pessoas com deficincia como uma questo de DireitosHumanos. Iguais na diferena!

    Entrevistas, fotos, atas, convites, selos comemorativos, encartes, reportagens,tudo est devidamente registrado nas pginas seguintes. Desde o Brasil Imprio at osdias atuais, o livro resgata as primeiras aes e instituies voltadas para as pessoas comdeficincia: o Imperial Instituto dos Meninos Cegos (hoje Instituto Benjamin Constant), oImperial Instituto dos Surdos-Mudos (atual Instituto Nacional de Educao de Surdos), as

    Sociedades Pestalozzi, as Associaes de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apaes), almde centros de reabilitao, tais como a Associao Brasileira Beneficente de Reabilitao(ABBR) e a Associao de Assistncia Criana Deficiente (AACD).

    Das obras assistenciais do sculo XIX atualidade, o livro contextualizahistoricamente os avanos e a quebra de paradigmas na rea das pessoas comdeficincia. Esta publicao, tal qual o documentrio, foca-se a partir da aberturapoltica no final da dcada de 1970 e da organizao dos novos movimentos sociais noBrasil. Nessa perspectiva histrica, vai alm e mostra ainda os avanos nas polticaspblicas do Pas, especialmente nos ltimos oito anos, quando o Governo do presidenteLuiz Incio Lula da Silva instituiu a Agenda Social de Incluso das Pessoas com

    Deficincia, elevou o status do rgo gestor da Poltica Nacional de Incluso da Pessoacom Deficincia de Coordenadoria Nacional (Corde) Secretaria Nacional - e oCongresso ratificou a Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia da ONU,conferindo-lhe equivalncia de emenda constitucional.

    Esta histria no vem completa. Por se tratar de uma iniciativa pioneira, tanto noformato como na abrangncia, a pesquisa privilegiou os personagens mais antigos, querepresentam as diversas correntes de atuao, as diferentes regies do pas e os tipos dedeficincia. Sobram lacunas a serem preenchidas com as lembranas de tantas outraspessoas que igualmente viveram e tiverem participao fundamental nesse processo. Olivro presta homenagem in memoriam queles que dedicaram a vida luta pelos direitos

    das pessoas com deficincia, reconhecendo por meio deles os milhares de militantes, namaioria annimos, que tambm contriburam, e ainda contribuem, para os avanos naincluso das pessoas com deficincia.

    Esse livro e o filme documentrio so a primeira etapa do projetoFortalecimento da Organizao do Movimento Social das Pessoas com Deficincia noBrasil e a Divulgao de suas Conquistas. A sua realizao se deve cooperaointernacional entre a Organizao dos Estados Ibero-americanos para a Educao, a

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    Cincia e a Cultura (OEI) e Secretaria de Direitos Humanos da Presidncia daRepblica, por intermdio da Secretaria Nacional de Promoo dos Direitos da Pessoacom Deficincia.

    Ao resgatar e dar visibilidade aguerrida histria do movimento poltico daspessoas com deficincia no Brasil, o governo federal tambm cumpre com sua misso depromover os Direitos Humanos. E d exemplo ao oferecer, livro e documentrio, emformatos acessveis. Traduzido para o espanhol e o ingls, o filme facilita a divulgaoda histria brasileira para a comunidade internacional.

    A expectativa que tanto o livro como o documentrio possam servir como fontede pesquisa e inspirar novos trabalhos. Da mesma forma, espera-se que esse esforo emregistrar a histria colabore para a emancipao, a identidade e o futuro, ainda maisforte, do movimento das pessoas com deficincia no Brasil e no mundo.

    A Secretaria Nacional de Promoo dos Direitos da Pessoa com Deficinciaexpressa seus mais sinceros agradecimentos a todas as pessoas que contriburam paraque este livro existisse e, em particular, queles que emprestaram seu tempo, suamilitncia e sua vida para tornar essa histria real.

    Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior

    Secretria Nacional de Promoo dos Direitos da Pessoa com Deficincia

    O Brasil vive desde meados do sculo passado e incio do sculo XXI umclima de efervescncia em torno das lutas pela garantia dos direitos das pessoas

    com deficincia.

    Esse movimento impulsionado, sobretudo, pelo cenrio internacional, que apartir de 1948 com o advento da Declarao Universal dos Direitos Humanos,iniciou um amplo e profundo debate sobre os direitos iguais e inalienveis comofundamento da liberdade, da justia e da paz no mundo.

    As pessoas com deficincia foram por muitos anos tratadas com desprezo edesrespeito quanto aos seus direitos, o que as motivou a se organizarem em grupose promoverem um forte movimento de participao poltica no mbito do processo

    de redemocratizao do Brasil. Esse espao foi sendo construdo com muita luta,embates polticos, mas tambm, com conquistas importantes, embora, em muitosmomentos sob a omisso do governo e com total invisibilidade por parte dasociedade.

    A Constituio Federal brasileira foi um marco importante no avano e,tambm, um referencial de proteo por parte do Estado dos Direitos Humanosdessas pessoas. No perodo de debates da Constituinte, os grupos de pessoas com

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    Diretora da OEI no Brasil

    INTRODUO

    As pessoas com deficincia conquistaram espao e visibilidade na sociedadebrasileira nas ltimas dcadas. Na literatura acadmica, h estudos na rea dapsicologia, da educao e da sade que se configuram como tradicionais reas doconhecimento que se interessam pelo tema. Entretanto, esse grupo de pessoaspouco interesse despertou nos historiadores e se encontram margem dosestudos histricos e sociolgicos sobre os movimentos sociais no Brasil, apesar deserem atores que empreenderam, desde o final da dcada de 1970, e aindaempreendem intensa luta por cidadania e respeito aos Direitos Humanos.

    O objetivo deste livro analisar a histria dessas pessoas, com nfase no aspectopoltico, particularmente no contexto da abertura poltica no final da dcada de

    1970 e da organizao dos novos movimentos sociais no Brasil.A busca pelo reconhecimento de direitos por parte de grupos consideradosmarginalizados ou discriminados marcou a emergncia de um conjunto variado erico de atores sociais nas disputas polticas. Assim como as pessoas comdeficincia, os trabalhadores, as mulheres, os negros, os homossexuais, dentreoutros com organizaes prprias, reivindicavam espaos de participao edireitos. Eram protagonistas do processo de redemocratizao pelo qual passavaa sociedade brasileira. Ao promoverem a progressiva ampliao da participaopoltica no momento em que essa era ainda muito restrita, a atuao dessesgrupos deu novo significado democracia.

    A opresso contra as pessoas com deficincia tanto se manifestava em relao restrio de seus direitos civis quanto, especificamente, que era imposta pelatutela da famlia e de instituies. Havia pouco ou nenhum espao para que elasparticipassem das decises em assuntos que lhes diziam respeito. Emboradurante todo o sculo XX surgissem iniciativas voltadas para as pessoas comdeficincia, foi a partir do final da dcada de 1970 que o movimento das pessoascom deficincia surgiu, tendo em vista que, pela primeira vez, elas mesmasprotagonizaram suas lutas e buscaram ser agentes da prpria histria. O lemaNada sobre Ns sem Ns, expresso difundida internacionalmente, sintetizacom fidelidade a histria do movimento objeto da pesquisa que resultou nestelivro.

    Anteriormente dcada de 1970, as aes voltadas para as pessoas comdeficincia concentraram-se na educao e em obras caritativas eassistencialistas. Durante o sculo XIX, de forma pioneira na Amrica Latina, oEstado brasileiro criou duas escolas para pessoas com deficincia: o ImperialInstituto dos Meninos Cegos e o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos.Paralelamente s poucas aes do Estado, a sociedade civil organizou, durante osculo XX, as prprias iniciativas, tais como: as Sociedades Pestalozzi e as

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    Associaes e Pais e Amigos dos Excepcionais - APAE, voltadas para a assistnciadas pessoas com deficincia intelectual (atendimento educacional, mdico,psicolgico e de apoio famlia); e os centros de reabilitao, como a AssociaoBrasileira Beneficente de Reabilitao (ABBR) e a Associao de Assistncia Criana Defeituosa (AACD), dirigidos, primeiramente, s vtimas da epidemia de

    poliomielite. O movimento surgido no final da dcada de 1970 buscou areconfigurao de foras na arena pblica, na qual as pessoas com deficinciadespontavam como agentes polticos.

    H um movimento nico?

    possvel perceber, no movimento das pessoas com deficincia, unidade ediviso, consensos e dissensos, amor e dio. Parte desses conflitos so criadospelo fato de que novos movimentos sociais so, tambm, movimentos quebuscam criar uma identidade coletiva para determinado grupo, seja em oposioa outros segmentos, seja em oposio sociedade. Um dos objetivos dessaafirmao identitria dar visibilidade e alterar as relaes de fora no espao

    pblico e privado. O sentimento de pertencimento a um grupo elementodiscursivo importante para mobilizar qualquer luta poltica. Os movimentossociais so formados pela diversidade de identidades, porm, unificadas nasexperincias de coletividade vividas pelas pessoas. A unidade ameaada porfatores como a disputa pelo poder, pela legitimidade da representao e pelaagenda da luta poltica.

    Na histria do Movimento das Pessoas com Deficincia no Brasil essa tensoesteve presente nos primeiros debates nacionais organizados no incio da dcadade 1980, quando se agregaram grupos diversos formados por cegos, surdos,deficientes fsicos e hansenianos. Esses grupos, reunidos, elegeram como

    estratgia poltica privilegiada a criao de uma nica organizao derepresentao nacional a ser viabilizada por meio da Coalizo Pr-FederaoNacional de Entidades de Pessoas Deficientes.

    O impasse na efetivao dessa organizao nica surgiu do reconhecimento deque havia demandas especficas para cada tipo de deficincia, as quais aCoalizo se mostrou incapaz de reunir consentaneamente em uma nicaplataforma de reivindicaes. O amadurecimento do debate, bem como anecessidade de fortalecer cada grupo em suas especificidades, fez com que omovimento optasse por um novo arranjo poltico, no qual se privilegiou a criaode federaes nacionais por tipo de deficincia.

    Tal rearranjo, longe de provocar a ciso ou o enfraquecimento do movimento,possibilitou que os debates avanassem em seus aspectos conceituais, balizandonovas atitudes em relao s pessoas com deficincia. No se tratava apenas dedemandar, por exemplo, a rampa, a guia rebaixada ou o reconhecimento daLngua Brasileira de Sinais (Libras) como uma lngua oficial, mas, principalmente,de elaborar os conceitos que embasariam o discurso sobre esses direitos. Essaelaborao conceitual e os paradigmas que dela surgiram mantiveram e mantmo movimento unido na luta por direitos.

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    Termos da poca

    Os paradigmas em disputa

    possvel afirmar que o esforo do movimento nos ltimos trinta anos foi,principalmente, de refinar conceitos e mudar paradigmas, criando uma base

    slida para a construo de uma nova perspectiva sobre a deficincia. Asatitudes, suposies e percepes a respeito da deficincia passaram de ummodelo caritativo para um modelo social. No modelo caritativo, inaugurado como fortalecimento do cristianismo ao longo da Idade Mdia, a deficincia considerada um dficit e as pessoas com deficincia so dignas de pena porserem vtimas da prpria incapacidade.

    O Positivismo e a afirmao do saber mdico do final sculo XIX possibilitaram osurgimento de um modelo no qual as pessoas com deficincia passaram a sercompreendidas por terem problemas orgnicos que precisavam ser curadas. Nomodelo mdico, as pessoas com deficincia so pacientes eram tratadas

    como clientela cuja problemtica individual estava subentendida segundo acategoria de deficincia qual pertenciam. Fazia-se todo o esforo teraputicopara que melhorassem suas condies de modo a cumprir as exigncias dasociedade.

    O modelo social defendido pelo Movimento das Pessoas com Deficincia ogrande avano das ltimas dcadas. Nele, a interao entre a deficincia e omodo como a sociedade est organizada que condiciona a funcionalidade, asdificuldades, as limitaes e a excluso das pessoas. A sociedade cria barreirascom relao a atitudes (medo, desconhecimento, falta de expectativas, estigma,preconceito), ao meio ambiente (inacessibilidade fsica) e institucionais

    (discriminaes de carter legal) que impedem a plena participao das pessoas.O fundamental, em termos paradigmtico e estratgico, registrar que foideslocada a luta pelos direitos das pessoas com deficincia do campo daassistncia social para o campo dos Direitos Humanos. Essa mudana deconcepo da poltica do estado Brasileiro aconteceu nos ltimos trinta anos. Omovimento logrou xito ao situar suas demandas no campo dos Direitos Humanose inclu-las nos direitos de todos, sem distino.

    Palavras e significados

    Falar ultrapassa a simples exteriorizao de pensamentos ou a descrio de

    aspectos de dada realidade. Quem fala fala de algum lugar, parte de algumapremissa. As palavras usadas para nomear as pessoas com deficincia comportamuma viso valorativa que traduz as percepes da poca em que foram cunhadas.

    Para os novos movimentos sociais e suas polticas de identidade, as palavras soinstrumentos importantes de luta poltica. A busca por novas denominaesreflete a inteno de rompimento com as premissas de menos-valia que atento embasavam a viso sobre a deficincia. Termos genricos como

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    invlidos, incapazes, aleijados e defeituosos foram amplamenteutilizados e difundidos at meados do sculo XX, indicando a percepo dessaspessoas como um fardo social, intil e sem valor.

    Ao se organizarem como movimento social, as pessoas com deficincia buscaramnovas denominaes que pudessem romper com essa imagem negativa que asexclua. O primeiro passo nessa direo foi a expresso pessoas deficientes,que o movimento usou quando da sua organizao no final da dcada de 1970 eincio da dcada de 1980, por influncia do Ano Internacional das PessoasDeficientes (AIPD). A incluso do substantivo pessoa era uma forma de evitar acoisificao, se contrapondo inferiorizao e desvalorizao associada aostermos pejorativos usados at ento.

    Posteriormente, foi incorporada a expresso pessoas portadoras de deficincia,com o objetivo de identificar a deficincia como um detalhe da pessoa. Aexpresso foi adotada na Constituio Federal de 1988 e nas estaduais, bemcomo em todas as leis e polticas pertinentes ao campo das deficincias.

    Conselhos, coordenadorias e associaes passaram a inclu-la em seusdocumentos oficiais. Eufemismos foram adotados, tais como pessoas comnecessidades especiais e portadores de necessidades especiais. A crtica domovimento a esses eufemismos se deve ao fato de o adjetivo especial criaruma categoria que no combina com a luta por incluso e por equiparao dedireitos. Para o movimento, com a luta poltica no se busca ser especial, mas,sim, ser cidado. A condio de portador passou a ser questionada pelomovimento por transmitir a ideia de a deficincia ser algo que se porta e,portanto, no faz parte da pessoa. Alm disso, enfatiza a deficincia emdetrimento do ser humano.

    Pessoa com deficincia passou a ser a expresso adotada contemporaneamentepara designar esse grupo social. Em oposio expresso pessoa portadora,pessoa com deficincia demonstra que a deficincia faz parte do corpo e,principalmente, humaniza a denominao. Ser pessoa com deficincia , antesde tudo, ser pessoa humana. tambm uma tentativa de diminuir o estigmacausado pela deficincia. A expresso foi consagrada pela Conveno sobre osDireitos das Pessoas com Deficincia, da Organizao das Naes Unidas (ONU),em 2006.

    No raramente, o termo excepcional e a expresso deficiente fsico sousados, erroneamente, para designar todo o coletivo das pessoas com

    deficincia. Esses equvocos so mais comuns na grande mdia.Como recuperar essa histria e as memrias?

    O caminho seguido pela equipe de pesquisa para, pela primeira vez na histria domovimento poltico das pessoas com deficincia no Brasil, resgatar as memriasde alguns de seus militantes foi dificultado. Por se tratar de um trabalho pioneirono Pas, no foi uma tarefa fcil. Alm disso, o tema ainda ocupa pouco osacadmicos brasileiros. Por ser um movimento social que, normalmente, se

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    conforma por meios no institucionalizados, as evidncias materiais necessriasao historiador para construir uma representao sobre essa histria no seencontravam reunidas e sistematizadas em nenhum arquivo ou acervo especfico.

    As fontes histricas atas, jornais e boletins de organizaes, folhetos deconvocao de manifestaes, publicaes, filmes, fotografias estavamespalhadas por todo o Pas, muitas vezes em posse de personagens dessa histria,indivduos que participaram e ainda participam da luta pelos direitos das pessoascom deficincia. Por isso, alguns desses militantes constituram a principal fontepara a elaborao do contedo deste livro, tanto por possurem as evidnciashistricas quanto por carregarem na memria as vivncias do movimento. Ostestemunhos dessas lideranas foram as contribuies mais substantivas doresgate dessa histria.

    A metodologia da pesquisa visou construir um livro que abordasse tanto a anlisedocumental quanto as memrias da militncia poltica e da atuao profissionaldos que lutaram pelos direitos das pessoas com deficincia no Brasil. Como forma

    de resgate das memrias, recorreu-se histria oral, procedimento por meio doqual se busca construir fontes e documentos utilizando narrativas induzidas eestimuladas, testemunhos, verses e interpretaes sobre a histria em suasmltiplas dimenses: factuais, temporais, espaciais, conflituosas e consensuais.

    A entrevista transcrita e aprovada pelo depoente se torna um documentohistrico. Com base nessa metodologia, procedeu-se realizao de entrevistascom militantes histricos do Movimento das Pessoas com Deficincia, articulandoas vivncias individuais ao movimento social das pessoas com deficincia na lutapor seus direitos humanos.

    Embora as pesquisas no campo da histria possam recorrer metodologia dahistria oral, preciso afirmar que nenhuma histria oral. A oralidade umadas formas pelas quais se compartilham as experincias guardadas na memria. Ahistria, como uma rea do conhecimento, a representao do passadoproduzida pelos historiadores. A memria so as lembranas, explcitas ouveladas pelas emoes da experincia vivida. Essas lembranas, aps asistematizao metodolgica da histria oral, tornam-se subsdios para ohistoriador reconstruir a representao do passado. As memrias constantes nosdepoimentos, nesse sentido, devem ser vistas como sustentculo das identidadesconstrudas pelas pessoas com deficincia na conformao de seu movimento.

    Como ferramenta qualitativa de produo de fontes, a histria oral busca a visoparticular de processos coletivos. A historiografia atual aponta trs tipos deentrevistas de histria oral: as entrevistas temticas, as entrevistas de histriade vida e as entrevistas de trajetria de vida.

    As entrevistas realizadas para este livro tiveram carter temtico, com foco namilitncia ou atuao profissional em prol dos direitos humanos das pessoas comdeficincia no Brasil. No entanto, todas as entrevistas contaram com uma partede histria pessoal da vida dos entrevistados, mesmo que panormica, o que

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    possibilitou confrontar as experincias da vida pessoal com as vivncias noMovimento das Pessoas com Deficincia.

    Para preparar as entrevistas, fez-se o levantamento prvio sobre cada lideranaa ser entrevistada. As fontes utilizadas para sua elaborao foram bastantevariadas, incluindo biografias (ou autobiografias, quando disponveis), matriasjornalsticas, pginas pessoais e institucionais presentes na internet, imagens,textos e documentos produzidos pela prpria pessoa (inclusive registros de suasfalas em eventos e/ou outras ocasies) e outras. O objetivo com esselevantamento foi produzir um dossi bsico sobre a vida da pessoa a serentrevistada, abordando aspectos pessoais e profissionais relevantes para ocontexto do tema da pesquisa.

    Aps todo esse processo preparatrio, foram elaborados roteiros de entrevistaindividualmente pensados para contemplar as experincias vividas pelo(a)entrevistado(a), mas com um fio condutor definido pelos seguintes eixostemticos:

    organizaes e lideranas de pessoas com deficincia e a conformao deseu movimento poltico;

    Ano Internacional das Pessoas Deficientes (AIPD);

    contexto de realizao dos encontros nacionais do movimento, realizadosna dcada de 1980;

    processo de elaborao da Constituio de 1988 e fortalecimento domovimento em defesa dos direitos das pessoas com deficincia;

    expanso e especificidades regionais do movimento social das pessoas comdeficincia no territrio nacional e sua participao internacional;

    criao de uma estrutura de Estado voltada para as pessoas comdeficincia (coordenadorias e conselhos de direitos nacionais estaduais emunicipais);

    conquistas e desafios futuros.

    Alm disso, o roteiro guiou a entrevista sem paut-la, ou seja, buscou recuperara memria do(a) entrevistado(a) sem forj-la. A hierarquia de importncia doseventos foi dada pelo entrevistado, e no pelo roteiro. Prova disso que, combase em temas factuais, como os listados acima, foi possvel colher depoimentosricos em conceitos elaborados pelos entrevistados durante a militncia poltica.Esses depoimentos traduziram concepes polticas, vises de mundo, conflitos econsensos que s podem ser percebidos pela voz daqueles que viveram essahistria.

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    Os depoimentos da segunda parte do livro so verses editadas das entrevistas,sem prejuzo do contedo original. Ambas as verses (integral e editada) foramsubmetidas aprovao dos entrevistados.

    O plano da obra

    Este livro estruturado em duas partes. A primeira narra a luta empreendidapor essas pessoas para se tornarem agentes polticos e conquistar oreconhecimento da prpria cidadania. Buscou-se recuperar no texto, com baseem ampla pesquisa documental, os caminhos percorridos pelas pessoas comdeficincia no Brasil desde meados do sculo XIX at hoje. Maior nfase foiconferida ao perodo posterior a 1979, quando as pessoas com deficincia semobilizaram politicamente em favor de suas reivindicaes e se tornaramagentes transformadores de aspectos da sociedade brasileira.

    Na segunda parte, o objetivo foi resgatar as memrias de lideranas histricas,militantes e personalidades do movimento das pessoas com deficincia por meio

    da metodologia de histria oral.A primeira parte do livro est dividida em seis captulos. No captulo 1, AsPrimeiras Aes e Organizaes Voltadas para as Pessoas com Deficincia, soapresentadas as iniciativas pioneiras do Estado brasileiro direcionadas s pessoascom deficincia, ainda no Perodo Imperial, assim como as primeiras aesempreendidas pela sociedade civil na primeira metade do sculo XX. Aborda-se,de forma panormica, a histria dos institutos direcionados educao de cegose surdos criados no Rio de Janeiro pelo Imperador D. Pedro II, das sociedadesPestalozzi, da Associao de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) e dos centrosde reabilitao fsica. Unidas por um sentimento de solidariedade, surgido no

    interior dessas primeiras instituies de atendimento, as pessoas com deficinciacomearam a se associar.

    No captulo 2, O Associativismo das Pessoas com Deficincia, so expostas asmotivaes que levaram cegos, surdos e deficientes fsicos a constituir gruposlocais e informais, antes da dcada de 1970, no qual compartilhavamexperincias e prestavam apoio mtuo. Foi nesses grupos que o embrio domovimento poltico que surgiria encontrou terreno frtil para se desenvolver.

    No captulo 3, O Movimento Poltico das Pessoas com Deficincia, narra-se atrajetria desse movimento poltico que, como outros, se formaram no contextoda redemocratizao brasileira aps o regime da ditadura militar. Destacam-se,

    nesse captulo, as estratgias adotadas e os caminhos escolhidos pelo movimentopara se fortalecer politicamente, bem como a importncia do Ano Internacionaldas Pessoas Deficientes, institudo pela ONU em 1981, como catalisador dessaorganizao.

    A mobilizao da sociedade civil em torno da elaborao da Constituio de 1988marcou a consolidao do processo de abertura poltica. No seio desse amplo

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    debate, os diversos movimentos sociais brasileiros participaram ativamente paraincorporar nova Constituio suas principais demandas.

    No captulo 4, O Movimento das Pessoas com Deficincia e a Assembleia NacionalConstituinte, recupera-se a histria da participao desse movimento, emparticular, no processo constituinte, os consensos e dissensos, as vitrias ederrotas.

    As conquistas colhidas pelas pessoas com deficincia na dcada de 1980ganharam fora de tal maneira que, mais do que direitos reconhecidos,conseguiram se inserir na estrutura do Estado.

    No captulo 5, A CORDE1 e o CONADE2 na Estrutura Administrativa do EstadoBrasileiro, apresentada a trajetria dos principais rgos de representao dosanseios das pessoas com deficincia no Estado Brasileiro.

    O captulo 6, O Sculo XXI, encerra a primeira parte do livro recuperando a

    participao do movimento na elaborao da Conveno da ONU sobre os Direitosdas Pessoas com Deficincia, o primeiro tratado de Direitos Humanos do sculoXXI. Em seguida, discute-se o espao de participao poltica proporcionadopelas Conferncias Nacionais, assim como as perspectivas futuras do movimento.Por fim, apresenta-se a evoluo conceitual do movimento, nos ltimos trintaanos, que embasam o atual discurso da luta por direitos.

    Na segunda parte do livro, encontram-se os depoimentos de 25 pessoas queprotagonizaram os caminhos trilhados por esse movimento, cada uma em seutempo e lugar. As vozes dessas pessoas recontam a histria narrada na primeiraparte do livro, mas com toda a riqueza prpria das memrias, que compreendemsentimentos, conflitos e esperanas, elementos que os registros convencionaisjamais poderiam nos revelar. Os depoimentos so antecedidos por um Guia deLeituras, no qual os principais temas e embates so apontados aos leitores.

    No final uma homenagem in memoriam queles que dedicaram a vida lutapelos direitos das pessoas com deficincia, reconhecendo por meio deles osmilhares de militantes, conhecidos ou annimos, que tambm contriburam, eainda contribuem, para os avanos e conquistas.

    1 Coordenadoria Nacional para a Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia

    2 Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficincia

    Captulo 1

    AS PRIMEIRAS AES E ORGANIZAES VOLTADAS PARA AS PESSOAS COMDEFICINCIA

    Durante o perodo colonial, usavam-se prticas isoladas de excluso - apesar de oBrasil no possuir grandes instituies de internao para pessoas com

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    Os institutos no Imprio

    As questes relativas s pessoas cegas e surdas surgiram no cenrio poltico doImprio em 1835, durante o Perodo Regencial, quando o conselheiro CornlioFerreira Frana, deputado da Assembleia Geral Legislativa, props que cadaprovncia tivesse um professor de primeiras letras para surdos e cegos. Todavia, arecm-formada Nao Brasileira, independente de Portugal h apenas 13 anos,enfrentava um momento poltico conturbado e a proposta do conselheiro Franasequer foi discutida na Cmara dos Deputados. O tema s foi retomado nadcada de 1850.

    O Estado brasileiro foi pioneiro na Amrica Latina no atendimento s pessoas comdeficincia, ao criar, em 1854, o Imperial Instituto dos Meninos Cegos (atualInstituto Benjamin Constant - IBC), e, em 1856, o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos (hoje Instituto Nacional de Educao de Surdos - INES). Essas instituies,que funcionavam como internatos, inspiravam-se nos preceitos do iderioiluminista e tinham como objetivo central inserir seus alunos na sociedade

    brasileira, ao fornecer-lhes o ensino das letras, das cincias, da religio e dealguns ofcios manuais.

    Apesar do pioneirismo, ambos os institutos ofertaram um nmero restrito devagas durante todo o Perodo Imperial. O conceito dessas instituies se baseouna experincia europeia, mas diferentemente de seus pares estrangeiros,normalmente considerados entidades de caridade ou assistncia, tanto o ImperialInstituto dos Meninos Cegos quanto o Imperial Instituto dos Surdos-Mudosencontravam-se, na estrutura administrativa do Imprio, alocados na rea deinstruo pblica. Eram, portanto, classificados como instituies de ensino. Acegueira e a surdez foram, no Brasil do sculo XIX, as nicas deficincias

    reconhecidas pelo Estado como passveis de uma abordagem que visava superaras dificuldades que ambas as deficincias traziam, sobretudo na educao e notrabalho.

    Descrio da imagem:Fotografia 1.1: Vista da fachada do prdio do Instituto Benjamin Constant no Rio deJaneiro,de estilo neoclssico onde desde1854 funciona o instituto.

    O Imperial Instituto dos Meninos Cegos

    O Imperial Instituto dos Meninos Cegos foi criado pelo Imperador D. Pedro II, em

    1854, para instruir as crianas cegas do Imprio. A instituio foi instalada no Riode Janeiro e tinha como modelo o Instituto de Meninos Cegos de Paris, cujosmtodos de ensino eram considerados os mais avanados de seu tempo. Foi odiscurso eloqente do jovem cego e ex-aluno do Instituto de Paris Jos lvaresde Azevedo que convenceu o imperador a institu-lo, durante uma audinciaintermediada pelo mdico da corte, ao Dr. Jos Francisco Xavier Siga e peloBaro do Rio Bonito, o ento presidente da Provncia do Rio de Janeiro.

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    Em seu primeiro ano de funcionamento, o Imperial Instituto dos Meninos Cegosatendeu alunos de apenas duas provncias Rio de Janeiro e Cear. At o fim doregime monrquico, recebeu meninos e meninas de vrias outras provncias, taiscomo Alagoas, Bahia, Esprito Santo, Minas Gerais, Par, Piau, Rio Grande doSul, Santa Catarina e So Paulo. O ingresso dos alunos estava condicionado

    autorizao do ministro e secretrio de Estado dos Negcios do Imprio.Descrio das imagens:Fotografia 2.1: Da direita para a esquerda: Benjamim Constant e sua esposa.

    Fotografia 3.1: Vista de baixo para cima da fachada do Instituto BenjamimContant.

    Fotografia 4.1: Vista da fachada do prdio do Instituto Nacional de Educao deSurdos, INES no Rio de Janeiro de estilo neoclssico onde, desde 1915, funciona oInstituto.

    O Imperial Instituto dos Surdos-Mudos

    O Imperial Instituto dos Surdos-Mudos foi criado em 1856, por iniciativaparticular do francs E. Huet, professor surdo e ex-diretor do Instituto de Surdos-Mudos de Bourges. A criao do Instituto e suas primeiras atividades foramfinanciadas por donativos at 1857, quando a lei oramentria destinou-lherecursos pblicos e o transformou em instituio particular subvencionada (Lei n939, de 26 de setembro de 1857), posteriormente assumida pelo Estado. Huetdirigiu a instituio por aproximadamente cinco anos e, depois de sua retirada,em 1861, o Instituto entrou em processo de desvirtuamento de seus objetivos.

    O Instituto atendeu apenas trs pessoas surdas em 1856. Com o tempo, esseatendimento se expandiu. A princpio, eram alunos provenientes do Rio deJaneiro, sobretudo da capital do Imprio, onde o Instituto estava instalado;posteriormente, vieram alunos de outras provncias: Alagoas, Bahia, Cear, RioGrande do Sul, Rio Grande do Norte, So Paulo, Maranho, Minas Gerais, Paran,Pernambuco e Santa Catarina.

    A crise na instituio foi exposta em 1868, quando o chefe da Seo daSecretaria de Estado, Tobias Rabello Leite, realizou inspeo nas atividades econdies do Instituto. Em seu relatrio, apontou que o desvio seus propsitos

    originais, transformando-se em um verdadeiro asilo de surdos. Tobias Leitetornou-se diretor da Instituio at 1896 e deu-lhe o impulso definitivo comoreferncia na educao de surdos no Brasil.

    O currculo consistia no ensino elementar incorporado de algumas matrias dosecundrio. O ensino profissionalizante focava-se em tcnicas agrcolas, j que amaioria dos alunos era proveniente de famlias pobres do meio rurual. Em

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    meados da dcada de 1870, foram instaladas oficinas profissionalizantes deencadernao e sapataria.

    A Repblica e as primeiras iniciativas da sociedade civil

    Com a proclamao da Repblica, em 1889, os institutos tiveram a denominaoalterada. Imediatamente aps a queda do regime monrquico, o ImperialInstituto dos Meninos Cegos recebeu o nome de Instituto dos Meninos Cegos,alterado, em 1890, para Instituto Nacional dos Cegos e, em 1891, para InstitutoBenjamin Constant (IBC), homenagem ao seu diretor mais ilustre. Pelo mesmomotivo, o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos deixou de ostentar a alcunha deinstituio imperial, mantendo o nome de Instituto dos Surdos-Mudos, at 1957,quando passou a se chamar Instituto Nacional de Educao de Surdos (INES).

    A ao do Estado em relao s pessoas com deficincia mudou muito pouco como advento da Repblica. Os Institutos permaneceram como tmidas iniciativas

    mesmo com o surgimento de congneres em outras regies do Brasil , tantoporque atendiam parcela diminuta da populao de pessoas com deficincia emface da demanda nacional, quanto por se destinarem a apenas dois tipos dedeficincia: a cegueira e a surdez. Por exemplo, em 1926, foi fundado oInstituto So Rafael, em Belo Horizonte; em 1929, o Instituto de Cegos PadreChico, em So Paulo; em 1959, o Instituto Londrinense de Educao de Surdos(ILES) em Londrina, todos ainda em funcionamento.

    No contexto histrico de industrializao e urbanizao brasileiras, processoiniciado na dcada de 1920 e aprofundado nas dcadas de 1940 e 1950, surgiram,por iniciativa da sociedade civil, novas organizaes voltadas para as pessoas

    com deficincia. Essas novas organizaes se destinavam a outros tipos dedeficincia e com formas de trabalho diferenciadas, por no se restringirem educao e atuarem tambm na sade.

    Nesse perodo, os primeiros centros de reabilitao fsica surgiram motivadospelo surto de poliomielite. Com relao aos hansenianos, persistiu a prtica deisolamento em leprosrios, somente interrompida na dcada de 1980. Com opassar do tempo, os leprosrios tornaram-se verdadeiras cidades, praticamenteautossuficientes, com prefeitura prpria, comrcio, escola, igreja, delegacia ecemitrio.

    As principais iniciativas para atender a deficincia intelectual desse perodoforam dos movimentos pestalozziano e apaeano. At a metade do sculo XIX, adeficincia Intelectual era considerada uma forma de loucura e era tratada emhospcios. Durante a Repblica, iniciaram-se as investigaes sobre a etiologiada deficincia intelectual, sendo que os primeiros estudos realizados no Brasildatam do comeo do sculo XX.

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    A monografia sobre educao e tratamento mdico pedaggico dos idiotas, domdico Carlos Eiras de 1900, o primeiro trabalho cientfico sobre a deficinciaintelectual no Brasil. Aps a metade do sculo XX, dois trabalhos cientficosproduzidos por psiquiatras tornaram-se referncias: a tese Introduo ao estudoda deficincia mental (oligofrenias), de Clvis de Faria Alvim, publicada em

    1958, e o livro Deficincia mental, de Stanislau Krynski, publicado em 1969.A deficincia intelectual, poca denominada idiotia, passou a ser tratada naperspectiva educacional com tratamento diferenciado em relao aos hospciosdo sculo XIX. Ao longo do tempo, a pessoa com deficincia intelectual j foidenominada de oligofrnica, cretina, imbecil, idiota, dbil mental, mongolide,retardada, excepcional e deficiente mental. A expresso deficinciaintelectual significa que h um dficit no funcionamento do intelecto, mas noda mente. A expresso deficincia intelectual foi introduzida oficialmente em1995, pela ONU, e consagrada, em 2004, no texto da Declarao de MontrealSobre Deficincia Intelectual.

    Descrio das imagens:

    Fotografia 5.1: Senhora Helena Antipoff caminhando em uma estrada cercada porvegetao e segurando um ramalhete de flores.

    Movimento pestalozziano

    No Brasil, inspirado pelo pedagogo suo Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827),foi criado, em 1926, o Instituto Pestalozzi de Canoas, no Rio Grande do Sul. Ainfluncia do iderio de Pestalozzi, no entanto, ganhou impulso definitivo com

    Helena Antipoff, educadora e psicloga russa que, a convite do Governo doEstado de Minas Gerais, veio trabalhar na recm-criada Escola deAperfeioamento de Belo Horizonte. Sua atuao marcou consideravelmente ocampo da assistncia, da educao e da institucionalizao das pessoas comdeficincia intelectual no Brasil. Foi Helena Antipoff quem introduziu o termoexcepcional, no lugar das expresses deficincia mental e retardo mental,usadas na poca para designar as crianas com deficincia intelectual. Para ela,a origem da deficincia vinculava-se condio de excepcionalidadesocioeconmica ou orgnica.

    Helena Antipoff criou, em 1932, a Sociedade Pestalozzi de Belo Horizonte. Em

    1945, foi fundada a Sociedade Pestalozzi do Brasil; em 1948, a SociedadePestalozzi do Estado do Rio de Janeiro; e, em 1952, a Sociedade Pestalozzi deSo Paulo. At 1970, data da fundao da Federao Nacional das SociedadesPestalozzi (Fenasp), o movimento pestalozziano contava com oito organizaesem todo o Pas. A criao da federao, tambm por iniciativa de HelenaAntipoff, fomentou o surgimento de vrias sociedades Pestalozzi pelo Brasil.Atualmente, so cerca de 150 sociedades Pestalozzi filiadas Fenasp.

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    Descrio da Imagem:Fotografia 6.1: Casebre de estilo rococ onde foi fundada a Sede da SociedadePestalozzi em Niteri.

    Movimento apaeano

    A primeira Associao de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) foi fundada em1954, no Rio de Janeiro, por iniciativa da americana Beatrice Bemis, me de umacriana com deficincia intelectual. A reunio inaugural do Conselho Deliberativoda APAE do Rio de Janeiro ocorreu em maro de 1955, na sede da Sociedade dePestalozzi do Brasil. Em 1962, havia 16 APAEs no Brasil, 12 das quais se reuniramem So Paulo para a realizao do 1 Encontro Nacional de Dirigentes Apaeanos,sob a coordenao do mdico psiquiatra Dr. Stanislau Krynski. Participaram dessareunio as APAEs de Caxias do Sul, Curitiba, Jundia, Muria, Natal, Porto Alegre,So Leopoldo, So Paulo, Londrina, Rio de Janeiro, Recife e Volta Redonda.Durante a reunio decidiu-se pela criao da Federao Nacional das APAEs

    (Fenapaes).A Fenapaes foi oficialmente fundada em 10 de novembro de 1962. Funcionouinicialmente em So Paulo, no consultrio do Dr. Stanislau Krynski, at que umasede prpria foi instalada em Braslia. Atualmente, a Fenapaes rene 23federaes estaduais e mais de duas mil APAEs distribudas por todo o Pas. Essasorganizaes constituem uma rede de atendimento pessoa com deficincia deexpressiva capilaridade na sociedade, que presta servios de educao, sade eassistncia social. O atendimento voltado para as pessoas com deficinciaintelectual e mltipla.

    Descrio da Imagem:Fotografia 7.1: Vista da fachada do prdio com arquitetura neoclssica daprimeira sede da APAE no Rio de Janeiro.

    Os centros de reabilitao

    Em meados da dcada de 1950, estudantes de medicina e especialistastrouxeram da Europa e dos Estados Unidos os mtodos e paradigmas do modelode reabilitao do ps-guerra, cuja finalidade era proporcionar ao paciente oretorno vida em sociedade. Os grandes centros de reabilitao europeus enorte-americanos, que recebiam predominantemente vtimas da Segunda Grande

    Guerra, desenvolveram tcnicas e inspiraram o surgimento de organizaessimilares em todo o mundo. Isso ocorreu mesmo em pases como o Brasil, onde aprincipal causa da deficincia fsica no era a guerra. Nesse perodo, surgiram osprimeiros centros brasileiros de reabilitao para atenderem as pessoasacometidas pelo grande surto de poliomielite.

    A poliomielite foi observada no incio do sculo XX, no Rio de Janeiro (1907-1911)e em So Paulo (1918). Porm, surtos de considervel magnitude ocorreram na

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    dcada de 1930, em Porto Alegre (1935), Santos (1937), So Paulo e Rio deJaneiro (1939). A partir de 1950, foram descritos surtos em diversas cidades, comdestaque para o de 1953, a maior epidemia j registrada no Brasil, que atingiu ocoeficiente de 21,5 casos por 100 mil habitantes, no Rio de Janeiro.

    Um dos primeiros centros de reabilitao do Brasil foi a Associao BrasileiraBeneficente de Reabilitao (ABBR), fundada em 1954. Idealizada pelo arquitetoFernando Lemos, cujo filho possua sequelas de poliomielite, a ABBR contou como apoio financeiro de grandes empresrios provenientes dos setores decomunicao, bancrio, de aviao, de seguros, dentre outros. Entre essesempresrios, estava Percy Charles Murray, vtima de poliomielite e primeiropresidente da associao.

    A primeira ao da ABBR foi criar a escola de reabilitao para formarfisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, diante da carncia desses profissionaisno Brasil. Os cursos de graduao em Fisioterapia e Terapia Ocupacional da

    Escola da Reabilitao da ABBR tiveram incio em abril de 1956, de acordo comos moldes curriculares da Escola de Reabilitao da Columbia University. No anoseguinte, em setembro de 1957, o Centro de Reabilitao da ABBR foi inauguradopelo Presidente da Repblica, Juscelino Kubitscheck.

    Outras organizaes filantrpicas surgiram no contexto da epidemia depoliomielite, como a Associao de Assistncia Criana Defeituosa (AACD) deSo Paulo (hoje Associao de Assistncia Criana Deficiente), fundada em1950. 1 O Instituto Bahiano de Reabilitao (IBR) de Salvador, criado em 1956; ea Associao Fluminense de Reabilitao (AFR) de Niteri, fundada em 1958.Alguns hospitais tornaram-se centros de referncia na reabilitao de pessoas

    com sequelas de poliomielite, a exemplo do Hospital da Baleia e do HospitalArapiara, ambos em Belo Horizonte - MG.

    O perfil dos usurios dos centros de reabilitao modificou significativamente, noBrasil, a partir da dcada de 1960. A consolidao da urbanizao e daindustrializao da sociedade e o xito das campanhas nacionais de vacinaoprovocaram dois efeitos: diminuram os casos de sequelas por poliomielite eaumentaram os casos de deficincia associados a causas violentas,principalmente acidentes automobilsticos (carro e moto), de mergulho eferimentos ocasionados por armas de fogo.

    O surgimento da reabilitao fsica suscitou o modelo mdico da deficincia,concepo segundo a qual o problema era atribudo apenas ao indivduo. Nessesentido, as dificuldades que tinham origem na deficincia poderiam sersuperadas pela interveno dos especialistas (mdicos, fisioterapeutas,terapeutas ocupacionais, psiclogos, assistentes sociais e outros). No modelomdico, o saber est nos profissionais, que so os principais protagonistas dotratamento, cabendo aos pacientes cooperarem com as prescries que lhes soestabelecidas.

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    Embora esse modelo representasse avano no atendimento s pessoas comdeficincia, ele se baseia em uma perspectiva exclusivamente clinicopatolgicada deficincia. Ou seja, a deficincia vista como a causa primordial dadesigualdade e das desvantagens vivenciadas pelas pessoas. O modelo mdico

    ignora o papel das estruturas sociais na opresso e excluso das pessoas comdeficincia, bem como desconhece as articulaes entre deficincia e fatoressociais, polticos e econmicos.

    1 embora a AACD tenha sido fundada antes da ABBR, seu centro de reabilitaocomeou a atender o pblico somente em 1963.

    ***

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    Tanto os institutos do Imprio, voltados para a educao de cegos e surdos,quanto as organizaes surgidas na Repblica, direcionadas s pessoas comdeficincia intelectual e reabilitao, embora no tivessem nenhum cunhopoltico claramente definido, propiciaram, mesmo que para poucos, espaos deconvvio com seus pares e discusso de questes comuns. Nesse sentido,

    contriburam para forjar uma identidade das pessoas com deficincia. Foramprecursoras, naquele momento, da formulao do ser cego, surdo, deficienteintelectual e deficiente fsico no apenas na denominao, mas em suaidentificao como grupo social.

    Todas as iniciativas, desde o Imprio at a dcada de 1970, so parte de umahistria na qual as pessoas com deficincia ainda no tinham autonomia paradecidir o que fazer da prpria vida. Todavia, entre as pessoas com deficincia,esse foi um perodo de gestao da necessidade de organizao de movimentosafirmativos dispostos a lutar por seus direitos humanos e autonomia, dentre osquais se destaca a capacidade de decidirem sobre a prpria vida.

    Captulo 2

    O ASSOCIATIVISMO DAS PESSOAS COM DEFICINCIA

    A partir de meados do sculo XX, possvel observar o surgimento deorganizaes criadas e geridas pelas prprias pessoas com deficincia. Amotivao inicial a solidariedade entre pares nos seguintes grupos dedeficincia: cegos, surdos e deficientes fsicos que, mesmo antes da dcada de1970, j estavam reunidos em organizaes locais com abrangncia queraramente ultrapassava o bairro ou o municpio, em geral, sem sede prpria,estatuto ou qualquer outro elemento formal. Eram iniciativas que visavam aoauxlio mtuo e sobrevivncia, sem objetivo poltico prioritariamente definido.Essas organizaes, no entanto, constituram o embrio das iniciativas de cunhopoltico que surgiriam no Brasil, sobretudo durante a dcada de 1970.

    O movimento associativista dos cegos

    A criao do sistema Braille, em 1829, inaugurou a era moderna da histria daspessoas cegas, promovendo uma verdadeira revoluo no processo de ensino eaprendizagem dos cegos. A partir de ento, a institucionalizao da educao eda profissionalizao dos cegos ganhou impulso, e o Braille se configurou como a

    forma mais efetiva de escrita e leitura para pessoas cegas. No entanto, aprogressiva proliferao das instituies especializadas em educao de cegos emtodo o mundo, por si s, no lhes garantiu integrao na sociedade, acesso adireitos, nem fim do preconceito e do estigma associado cegueira.

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    A partir da dcada de 1950, no Brasil, observa-se um novo modelo de organizaodas pessoas com deficincia visual o modelo associativista. As primeirasassociaes de cegos surgiram no Rio de Janeiro, resultado de interesseseminentemente econmicos. Os associados eram, em geral, vendedoresambulantes, artesos especializados no fabrico de vassouras, empalhamento de

    cadeiras, recondicionamento de escoves de enceradeiras e correlatos. Aocontrrio dos asilos, hospitais e mesmo das escolas especializadas, fruto dacaridade e da filantropia ou de iniciativas governamentais, as novas associaesnasciam da vontade e da ao dos indivduos cegos que buscavam, noassociativismo, mecanismos para a organizao de suas lutas e melhoria de suaposio no espao social.

    Evidncias do associativismo dos cegos podem ser encontradas em temposremotos, mais precisamente no sculo XIX, em 1893, quando um grupo formadopor ex-alunos e professores do Instituto Benjamin Constant (IBC) criou o GrmioComemorativo Beneficente Dezessete de Setembro. Inspirado em associaessimilares encontradas na Europa, o Grmio visava comemorar a data de fundaodo Instituto, promover a educao do cego, apoiar ex-alunos em questes deempregabilidade e sensibilizar a sociedade em relao ao preconceito.

    Essas novas associaes so marcadas pela ambiguidade original porque estosituadas em uma cultura que legou aos cegos solues que apontavam ora para aexcluso, ora para prticas de caridade e filantropia. Por conseguinte, asassociaes reproduzem, em suas prticas e aes, um modo de agir que, aomesmo tempo em que refora o estigma e a discriminao, combatefrontalmente esses cdigos culturais.

    O modelo associativista dos cegos nasceu em um momento de transio de duas

    vises de mundo: do modelo mdico ao modelo social com base nos DireitosHumanos. Nessa poca de transio, houve aumento na impresso de livros emBraille, com a instalao da imprensa Braille na Fundao para o Livro do Cegono Brasil, criada em 1946 atualmente denominada Fundao Dorina Nowill paraCegos , para possibilitar a educao dos cegos e ampliar o acesso leitura. AFundao foi criada por iniciativa de algumas normalistas do colgio Caetano deCampos, em So Paulo. Entre as normalistas estavam Neith Moura e Dorina Nowillque, durante o curso normal, criaram um grupo experimental de educao decegos que desenvolvia metodologias de ensino e transcrevia manualmente livrospara o Braille. O trabalho de transcrio para o Braille transformou-se, apsalgum tempo, na Fundao para o Livro do Cego no Brasil.

    Na dcada de 1950, fato marcante foi o Conselho Nacional de Educao autorizarque estudantes cegos ingressassem nas faculdades de Filosofia.

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    Novas organizaes associativistas surgiram no incio da dcada de 1960, quandoas pessoas com deficincia visual fomentaram o debate contra a CampanhaNacional de Educao dos Cegos, e sobre o internamento de cegos eminstituies. Essa prtica era questionada, considerada fator de excluso e dereforo discriminao. O debate contribuiu para o crescimento do nmero de

    associaes criadas por pessoas com deficincia visual. Essas novas associaes sediferenciavam de suas precedentes, surgidas na dcada de 1950, pois defendiaminteresses amplos da pessoa com deficincia muito alm da questo econmica:lutavam por educao, profissionalizao, cultura e lazer.

    Ao lado do associativismo local, desenvolvia-se e consolidava-se o estatuto darepresentao nacional com o objetivo de organizar o movimento em todo oPas, estabelecer uma ponte de dilogo entre as entidades locais, o governo e asinstituies da sociedade civil, representar a coletividade cega brasileira e lutarem defesa de suas necessidades fundamentais.

    A primeira entidade nacional foi o Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos

    Cegos (CBEC), fundado no Rio de Janeiro, em 1954. O Conselho foi criado poriniciativa de Dorina Nowill e do diretor do IBC, Dr. Rogrio Vieira, que, aps sereunirem com representantes de outras organizaes, decidiram criar aentidade, que teve Dorina Nowill como primeira presidente. O Conselho erafiliado ao Conselho Mundial para o Bem-Estar dos Cegos.

    O Conselho Mundial para o Bem-estar dos Cegos transformou-se na Unio Mundialdos Cegos (World Blind Union), que atualmente a principal organizao decegos no mundo. A Unio Mundial dos Cegos foi criada em 1984, quando oConselho Mundial e a Federao Internacional dos Cegos se fundiram no novorgo.

    Descrio da Imagem:

    Impresso 1.2: Modelo de pgina impressa com o Alfabeto Braille.

    O movimento dos surdos: Lngua Brasileira de Sinais, cultura e identidadesurda

    Com a instalao das escolas para surdos, surgiu tambm a disputa sobre omelhor mtodo de educao de surdos: a Lngua Brasileira de Sinais, o oralismoou a mista. No final do sculo XIX, a Lngua de Sinais sofreu grande revs. Em1880, no Congresso Internacional de Professores de Surdos, em Milo, Itlia, o

    mtodo oral foi escolhido como o melhor para a educao dos surdos. A Lnguade Sinais foi proibida oficialmente em diversos pases, sob a alegao de quedestrua a habilidade de oralizao dos surdos. Tal proibio despertou o quealguns autores chamam de isolamento cultural do povo surdo, j que aproibio dessa lngua tem por consequncia a negao da cultura e daidentidade surdas. Seguindo a orientao do Congresso de Milo, o ImperialInstituto dos Surdos-Mudos tambm proibiu a Lngua de Sinais. Como

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    consequncia dessa proibio, observou-se o declnio do nmero de professoressurdos nas escolas para surdos e o aumento dos professores ouvintes.

    Essa proibio criou o que alguns estudiosos contemporneos chamam deouvintismo, que seria o conjunto de representaes dos ouvintes a partir do

    qual o surdo est obrigado a olhar-se e narrar-se como se fosse ouvinte.O termo uma analogia a colonialismo e colonialista. As prticas ouvintistas soum conjunto de estratgias e aes que podem ser tanto fsicas, visveis ao corpodo surdo como as prteses auditivas , quanto subjetivas, como as formas dedisciplinar o surdo; as normas, os costumes, jeitos e trejeitos ouvintes queimpem esses sujeitos ao ouvintismo, s prticas de normalizao que imprimemuma forma de ser surdo ouvintizado.Os alunos surdos eram proibidos de usar a Lngua de Sinais; assim, para impedir-lhes o uso, foram adotadas medidas extremas tais como: forar os alunos amanter os braos cruzados, amarrar as mos, comparar quem usava a lngua de

    sinais com macacos. Os cdigos no foram eliminados, mas conduzidos ao mundomarginal.

    Os movimentos dos surdos passaram, ento, a constituir-se como uma resistncias prticas ouvintistas. Esses movimentos se do em espaos como asassociaes, as cooperativas e os clubes territrios livres do controle ouvinte ,onde os surdos estabeleciam intercmbio cultural e lingustico e faziam uso daLngua de Sinais. Grande parte das associaes de surdos surgiu exatamente nosperodos de maior nfase oralidade e negao da diferena, envolvendo ofinal do sculo XIX at aproximadamente as dcadas de 1960 e 1970. Ou seja, umdos principais fatores de reunio das pessoas surdas era, e ainda , o uso e a

    defesa da Lngua de Sinais.No Brasil, h registros de que, no final da dcada de 1930, um grupo de surdosex-estudantes do Instituto Nacional de Educao de Surdos (INES) fundou aAssociao Brasileira de Surdos-Mudos no Rio de Janeiro. Uma segunda associaofoi fundada em maio de 1953 com a ajuda de uma professora de surdos, IveteVasconcelos. Alm disso, os ex-estudantes do INES voltavam para suas cidades deorigem e criavam associaes de surdos, tais como a Associao de Surdos-Mudosde So Paulo, fundada em maro de 1954, e a Associao de Surdos de BeloHorizonte, em 1956.

    A origem da organizao dos surdos brasileiros tambm tem fortes ligaes com oesporte, da ter sido fundada, em 1959, a Federao Desportiva de Surdos do Riode Janeiro, com o nome de Federao Carioca de Surdos-Mudos.

    A Federao Carioca de Surdos-Mudos era liderada por Sentil Delatorre ereconhecida pelo Conselho Nacional de Desportos e pela Confederao Brasileirade Futebol. Posteriormente, filiou-se ao Comit Internacional de Esportes dosSurdos. Com o crescimento da prtica desportiva de surdos, Sentil Delatorre

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    tomou a iniciativa de convocar uma assembleia geral que, em novembro de 1984,no auditrio do INES criou a Confederao Brasileira de Desporto para Surdos.O movimento internacional de surdos se articulou sob coordenao da FederaoMundial de Surdos (Word Federation of the Deaf WFD), criada em 1951 e comsede na Finlndia. Articulando-se com os organismos ligados s Naes Unidas, os

    lderes surdos procuraram, a partir da, interferir nas polticas e nasrecomendaes apresentadas aos governos dos seus pases. A WFD teve influnciadecisiva nas recomendaes da UNESCO, em 1984, no reconhecimento formal daLngua de Sinais como lngua natural das pessoas surdas, garantindo que crianassurdas tivessem acesso a ela o mais precocemente possvel.

    A cultura surda e a Lngua de Sinais ganharam importantes argumentos em suadefesa quando, em meados de 1960, o linguista Willian Stokoe publicou o livroLanguage Structure: an outline of the visual communication system of theamerican deaf (Estrutura de Linguagem: uma abordagem do sistema decomunicao visual do surdo americano), no qual afirma que a lngua de sinais

    americana tinha todas as caractersticas da lngua oral. Ao se conferir status delngua Lngua de Sinais, os surdos puderam reafirmar com mais fora eargumentao o seu pertencimento a uma comunidade lingustica que lhes provuma cultura e uma identidade prprias.

    No h como negar a complexidade que existe nas relaes entre cultura,linguagem e identidade; mas tambm no se pode negar que o fato de pertencera um mundo de experincia visual e no auditiva traz uma marca identitriasignificativa para essa parcela da populao, que reafirma sua diferena peranteo mundo ouvinte e, assim, legitima sua luta por direitos e pela sua existnciacomo cidados.

    Descrio da Imagem:Fotografia: 1.2: Alfabeto em LIBRAS (imagens das mos onde cada configuraorepresenta uma letra do alfabeto).

    Organizao dos deficientes fsicos

    Os deficientes fsicos tambm se associaram em entidades voltadas para asobrevivncia e a prtica do esporte adaptado. Essas organizaes, que notinham objetivos polticos definidos, foram os primeiros espaos em que as

    pessoas com deficincia fsica comearam a discutir os problemas comuns. Soexemplos dessas organizaes: a Associao Brasileira de Deficientes Fsicos(Abradef) e o Clube do Otimismo, ambos do Rio de Janeiro; o Clube dosParaplgicos de So Paulo; e a Fraternidade Crist de Doentes e Deficientes(FCDD), atualmente Fraternidade Crist de Pessoas com Deficincia do Brasil(FCD-BR), presente em vrias cidades do Brasil. Muitas dessas associaes foramcriadas com o intuito de viabilizar formas de obter recursos financeiros para asobrevivncia de seus filiados.

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    Nesse sentido, organizavam, por exemplo, translado para que os grupos dedeficientes fsicos fossem at locais de grande circulao de pessoas venderbalas, quitandas ou outras mercadorias de pequeno valor. possvel perceberum apelo caridade para que os consumidores comprassem as mercadorias.

    As associaes esportivas

    Outras formas de associao de deficientes fsicos comuns nesse perodo foram asorganizaes voltadas para a prtica de esporte. O desenvolvimento do esporteadaptado no mundo ocorreu, sobretudo, aps a Segunda Guerra Mundial. A partirde 1946, comearam a surgir, nos Estados Unidos e na Inglaterra, os primeirosmovimentos organizados de esporte para pessoas com deficincia. Na dcada de1950, o esporte adaptado se popularizou em todo o mundo.

    No Brasil, os primeiros clubes foram fundados em 1958: Clube dos Paraplgicosde So Paulo e Clube do Otimismo do Rio de Janeiro. Ambos os clubes foramfundados por atletas que ficaram com leso medular em certo momento da vidae que tiveram a oportunidade de se tratar nos Estados Unidos, onde conheceramo esporte adaptado. Em So Paulo, o fundador foi Srgio Del Grande e, no Rio deJaneiro, Robson Sampaio. Essas iniciativas tiveram como efeito secundrio oincio da percepo, pelas pessoas com deficincia, da necessidade de discutiremsua insero poltica na sociedade. As prprias dificuldades enfrentadas tantopara a prtica do esporte quanto no trabalho precrio, como a venda demercadorias de pequeno valor estimularam o incio de reivindicaes, sobretudono que se refere mobilidade. Com o passar do tempo, assumiram cunho cadavez mais poltico.

    Isso ensejou, no final da dcada de 1970, no contexto da redemocratizao doBrasil, o surgimento de organizaes de pessoas com deficincia, com carterclaramente definido e com o objetivo de conquistar espao na sociedade,direitos e autonomia para conduzirem a prpria vida.

    Captulo 3

    O movimento poltico das Pessoas com Deficincia

    O associativismo mencionado no captulo anterior foi uma etapa no caminho deorganizao das pessoas com deficincia, antes restritas caridade e a polticas deassistncia, em direo s conquistas no universo da poltica e da luta por seusdireitos. Esse processo de associaes criou o ambiente para a formalizao daconscincia que resultaria no movimento poltico das pessoas com deficincia nadcada de 1970. Nessa poca, surgiram as primeiras organizaes compostas edirigidas por pessoas com deficincia contrapondo-se s associaes que

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    prestavam servios a este pblico. Esta dicotomia, que mais adiante serabordada neste captulo, permanece como modelo at os dias atuais. As primeirasorganizaes associativistas de pessoas com deficincia no tinham sede prpria,estatuto ou qualquer outro elemento formal. Eram iniciativas que visavam oauxlio mtuo e no possuam objetivo poltico definido, mas criaram espaos de

    convivncia entre os pares, onde as dificuldades comuns poderiam serreconhecidas e debatidas. Essa aproximao desencadeou um processo da aopoltica em prol de seus direitos humanos. No final dos anos 1970, o movimentoganhou visibilidade, e, a partir da, as pessoas com deficincia tornaram-se ativosagentes polticos na busca por transformao da sociedade. O desejo de seremprotagonistas polticos motivou uma mobilizao nacional. Essa histria alimentou-seda conjuntura da poca: o regime militar, o processo de redemocratizao brasileirae a promulgao, pela ONU, em 1981, do Ano Internacional das Pessoas Deficientes(AIPD).

    A ditadura militar no Brasil teve incio em 1964 e terminou em 1985, com a

    eleio, ainda que indireta, de Tancredo Neves, o 1 presidente civil aps 21anos de autoritarismo. Durante os chamados anos de chumbo, o exerccio dacidadania foi limitada em todas as suas dimenses: direitos civis e polticos eramcerceados e os direitos sociais, embora existissem legalmente, no eramdesfrutados. Prevalecia a censura e a falta de liberdade.

    Com o processo de enfraquecimento e declnio do regime militar, , a partir demeados da dcada de 1970, iniciou-se um processo de abertura poltica lenta,gradual e segura. A redemocratizao desenrolou-se em contexto especialmentefrtil, em termos de demandas sociais, com uma participao poltica ampla. Esseperodo foi marcado pela ativa participao da sociedade civil, que resultou no

    fortalecimento dos sindicatos, na reorganizao de movimentos sociais e naemergncia das demandas populares em geral. Era o Brasil, novamente, rumo democracia.

    Os movimentos sociais, antes silenciados pelo autoritarismo, ressurgiram comoforas polticas. Vrios setores da sociedade gritaram com sede e com fome departicipao: negros, mulheres, ndios, trabalhadores, sem-teto, sem-terra e,tambm, as pessoas com deficincia.

    Esse processo se reflete na Constituio Federal promulgada em 1988. AAssembleia Nacional Constituinte (1987-1988), envolvida no esprito dos novos

    movimentos sociais, foi a mais democrtica da histria do Brasil, com canaisabertos e legtimos de participao popular.

    Os novos movimentos sociais, dentre os quais o movimento poltico das pessoascom deficincia, saram do anonimato e, na esteira da abertura poltica, uniramesforos, formaram novas organizaes, articularam-se nacionalmente, criaramestratgias de luta para reivindicar igualdade de oportunidades e garantias dedireitos.

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    Outro fator relevante foi a deciso da ONU de proclamar 1981 como o AnoInternacional das Pessoas Deficientes (AIPD), sob o tema Participao Plena eIgualdade. O advento do AIPD colocou as pessoas com deficincia no centro dasdiscusses, no mundo e tambm no Brasil.

    Tanto o AIPD quanto o processo de redemocratizao atuaram como catalisadoresdo movimento que, no primeiro momento, procurou construir e consolidar suaunidade. A criao da Coalizo Pr-Federao Nacional foi a materializao doesforo unificador, consubstanciado por trs encontros nacionais, realizados entre1980 e 1983, buscando elaborar uma agenda nica de reivindicaes e estratgiasde luta, bem como fundar a Federao Nacional de Entidades de PessoasDeficientes. O amadurecimento das discusses resultou em um rearranjo polticono qual a federao nica foi substituda por federaes nacionais por tipo dedeficincia.

    Descrio da Imagem:Impresso 1.3: Capa do relatrio do Ano Internacional das Pessoas Deficientes(1981).

    A Coalizo Pr-Federao Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes

    A Coalizo Pr-Federao Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes foi criadaem 1979, quando, pela primeira vez, organizaes de diferentes Estados e tiposde deficincia se reuniram para traar estratgias de luta por direitos. LiaCrespo, jornalista e militante paulista, destaca o momento poltico basilar domovimento das pessoas com deficincia na luta por cidadania:

    Sustento que o movimento comeou no final de 1979 e comeo de 1980, quandonovas organizaes e novos grupos informais foram criados com o objetivoexpresso de mudar a realidade existente, a partir da mobilizao econscientizao no apenas das prprias pessoas deficientes, mas, tambm, dasociedade como um todo. (Lia Crespo. Depoimento oral, 16 de fevereiro de2009)

    O eixo principal das novas formas de organizao e aes das pessoas comdeficincia, surgidas no final da dcada de 1970 e incio da dcada de 1980, erapoliticamente contrrio ao carter de caridade que marcou historicamente as aesvoltadas para esse pblico. Estava em jogo a necessidade, por muito temporeprimida, de as pessoas com deficincia serem protagonistas na conduo dasprprias vidas. Cndido Pinto de Melo, bioengenheiro e militante em So Paulo,expressou com clareza e propriedade o que eles desejavam naquele momento:tornarem-se agentes da prpria histria e poderem falar eles mesmos de seus

    problemas sem intermedirios, nem tutelas.

    Foram realizadas reunies entre entidades de alguns Estados, sobretudo no Riode Janeiro, em So Paulo e em Braslia, com o objetivo de estabelecer metas

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    nacionais para o movimento. Os contatos eram por telefone e, muitas vezes, porcartas, de maneira informal e pessoal. Na poca, os meios de comunicao eramrestritos e precrios. A estratgia de convocao dos novos colaboradores foi orelacionamento social, estabelecido por contatos pessoais entre os envolvidos.

    A primeira reunio aconteceu no Rio de Janeiro, em outubro de 1979. Nessaocasio, nasceu a ideia de uma organizao nacional que congregasse pessoascom diferentes tipos de deficincia, com o objetivo de garantirrepresentatividade de carter nacional. Para tanto, era necessrio envolver noprocesso o maior nmero possvel de organizaes e pessoas. A criao daCoalizo Pr-Federao Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes foi aestratgia escolhida.

    A Coalizo afirmava a necessidade de articulao nacional do movimento para oamadurecimento das suas demandas e, sobretudo, para aumentar o potencial dereivindicao. O objetivo era organizar uma federao nacional de entidades depessoas com deficincia que se ocupasse de articular o movimento

    nacionalmente. A Coalizo surgiu para encaminhar esses debates e articular asorganizaes de todo o pas. Sua primeira providncia foi promover a reunio dejunho de 1980, em Braslia, organizada por Bencio Tavares da Cunha Mello eJos Roberto Furquim, da Associao dos Deficientes Fsicos de Braslia (ADFB).

    Participaram dessa reunio os representantes de Braslia e de nove Estadosbrasileiros: Amazonas, Bahia, Mato Grosso do Sul, Paran, Pernambuco, Rio deJaneiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e So Paulo. Dois assuntos dominarama pauta: a formao da federao e os preparativos para o 1 Encontro Nacional,previsto para o ms de outubro, em Braslia. A ideia era preparar propostas quedeveriam ser submetidas ao plenrio durante o encontro. Nesse sentido, foi

    formada uma comisso para centralizar o encaminhamento das propostas,constituda por Bencio Tavares da Cunha Mello, de Braslia; Romeu KazumiSassaki, de So Paulo; Crsio Dantas Alves, da Bahia; e Paulo Roberto Guimares,do Rio de Janeiro.

    A Coalizo promoveu a ltima reunio preparatria para o 1 Encontro Nacionalde Entidades de Pessoas Deficientes nos dias 9 e 10 de agosto de 1980, em SoPaulo. Realizada no Departamento de Educao Fsica e Esporte da Secretaria deEsportes e Turismo do Estado de So Paulo, a reunio contou com a participaode delegados do Paran, So Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio deJaneiro, Pernambuco, Bahia, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal.

    Essas reunies foram o primeiro passo para a organizao nacional das pessoascom deficincia. Simultaneamente, ocorreram encontros e manifestaespblicas regionais, como o 2 Congresso Brasileiro de Reintegrao Social, emjulho de 1980, em So Paulo. Esse congresso contou com a participao daspessoas com deficincia e profissionais de reabilitao, que debateram eafirmaram a importncia da participao da pessoa com deficincia no

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    trabalho, educao, lazer e em todas as atividades da sociedade, mas sempaternalismos.

    O congresso, dentre outros aspectos, ensejou o ato pblico convocado pelaAssociao Brasileira de Deficientes Fsicos (Abradef), realizado em 21 de julho

    de 1980, na Praa da S, em So Paulo, para protestar contra a discriminao daspessoas com deficincia. Uma das organizaes participantes do ato, o Ncleo deIntegrao de Deficientes (NID), distribuiu uma carta aberta populao na qualexps uma das principais bandeiras do movimento, a busca pela igualdade:

    No reivindicamos privilgios, apenas meios para que possamos exercer osdireitos comuns a todos os seres humanos. Como pode uma pessoa deficienteexercer o seu direito de voto se ela impedida de faz-lo porque sua seo

    possui escadas? Como pode uma pessoa deficiente exercer o seu direito deutilizar o transporte coletivo se os degraus do nibus so altos demais?

    O tema era recorrente e alimentava o movimento poltico que vivia momentopositivo para despontar na histria. As pessoas com deficincia, munidas daexperincia de vida e conhecedoras de suas necessidades, comearam a agirpoliticamente contra a tutela e em busca de serem protagonistas. O que essaspessoas buscavam era se colocar frente das decises, sem que se interpusessemmediadores. nesse momento que se evidencia a necessidade de criao de umaidentidade prpria e positiva para esse grupo social.

    Descrio das Imagens:

    Impresso 2.3: Reproduo do informativo Pessoa Deficiente, editado pela coaliso.

    (Acervo Romeu Kazumi Sassaki).Fotografia 1.3: Cindo imagens de uma das primeiras reunies da coaliso, realizadano colgio Anchietanum em So Paulo, 5 de abril de 1980. (Acervo Romeu KazumiSassaki).

    Fotografia 2.3: Reunio da coaliso realizada no departamento de educao fsica eesporte da Secretaria de Esportes e turismo de So Paulo, entre 9 e 10 de agosto de1980. (Acervo Romeu Kazumi Sassaki).

    [Fotografia 3.3: Manifestao de Pessoas com Deficiencia na Praa da S, So Paulo,em 21 de julho de 1980. (Folha de So Paulo, 27 de julho de 1980).

    Fotografia 4.3: Platia do primeiro Encontro Nacional de Entidades de PessoasDeficientes. Braslia, 1980. (Acervo Antnio Campos de Abreu).

    Fotografia 5.3: Mesa Diretora do primeiro Encontro. Braslia, 1980. (Acervo AntnioCampos de Abreu).

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    Tabela 1.3 - 1 Encontro Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes

    ORGANIZAO UF Responsvel

    Fraternidade Crist de Doentes e Deficientes Fsicos (FCD) AL Laura G. Nogueira

    Associao dos Deficientes Fsicos do Amazonas (ADEFA) AM Manoel Maral de ArajoAssociao Baiana de Deficientes Fsicos (Abadef) BA Crsio A. D. Alves

    Associao dos Deficientes Motores do Cear (ADM) CE Joo A. Furtado

    Associao dos Deficientes Fsicos de Braslia (ADFB) DF Bencio Tavares Cunha

    Grupo Capixaba de Pessoas com Deficincia (GCPD) ES Daniel F. Matos

    Unio dos Paraplgicos de Belo Horizonte (Unipabe) MG Gilberto T. Silva

    Associao Mineira de Paraplgicos (AMP) MG Jurandir S. e Silva

    Associao dos Surdos de Minas Gerais (ASMG) MG Antnio Campos de Abreu

    Federao Brasileira dos Surdos (FBS) MG Padre Vicente BurnierAssociao dos Cegos de Uberlndia (ACU) MG Lzado O. Silva

    Associao dos Paraplgicos de Uberlndia (APARU) MG Arnaldo S. CarvalhoAssociao dos Deficientes Fsicos do Mato Grosso do Sul MS Paulo M. Metelloi

    Fraternidade Crist de Doentes e Deficientes Fsicos (FCD) PB Antnio M. Limeira

    Fraternidade Crist de Doentes e Deficientes Fsicos (FCD) PE Messias Tavares de Souza

    Associao dos Deficientes Motores de Pernambuco (ADM) PE Ednaldo F. Batista

    Centro de Recuperao Humana (CRH) PE Jeferson A. Tenrio

    Unio Auxiliadora de Cegos de Recife (UACR) PE Gilberto M. de Souza

    Instituto Paranaense dos Cegos (IPC) PR Almeri SiqueiraAssociao dos Deficientes Fsicos do Paran (ADFP) PR Roberto MadlenerAssociao dos Deficientes Fsicos do Estado do Rio de RJ Flvio Wolff

    Sociedade Amigos dos Deficientes Fsicos (SADEF) RJ Maruf ArideClube dos Amigos da Associao Brasileira Beneficente de RJ Jefferson Caputo

    Clube dos Paraplgicos do Rio de Janeiro (CPRJ) RJ Roberto S. Ramos

    Fraternidade Crist de Doentes e Deficientes Fsicos (FCD) RJ Nice Mello

    Sociedade dos Deficientes Visuais no Brasil (SODEVIBRA) RJ Benedito de Paula Silva

    Associao Riograndense de Paraplgicos e Amputados RS Carlos Burle CardosoOrganizao Nacional de Reabilitao e Assistncia ao RS Manoelito Florentino

    Sociedade Esportiva Louis Braille (SELB) RS Wenceslau A. Padilha

    Fraternidade Crist de Doentes e Deficientes Fsicos (FCD) RS Altair G. Fernandes

    Fraternidade Crist de Doentes e Deficientes Fsicos (FCD) SC Arnoldo C. RodriguesAssociao Brasileira dos Deficientes Fsicos e Sensoriais SC Aldo Linhares Sobrinho

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  • 8/7/2019 Livro Histria do Movimento Poltico das Pessoas com Deficincia no Brasil

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    Sociedade dos Deficientes de Bauru (SDB) SP Shiro Tokuno

    Associao de Integrao de Deficientes Fsicos (AIDE) SP Leila B. Jorge

    Associao Brasileira de Deficientes Fsicos (Abradef) SP David P. Bastos

    Ncleo de Integrao de Deficientes (NID) SP Ana Maria Morales Crespo

    Unio Nacional de Deficientes Fsicos (Unadef) SP Adir R. do AmaralFraternidade Crist de Doentes e Deficientes Fsicos (FCD) SP Maria de Lourdes Guarda

    Associao de Assistncia ao Deficiente Fsico (AADF) SP Fbio C. de Oliveira

    O 1 Encontro Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes aconteceu emBraslia, de 22 a 25 de outubro de 1980. O objetivo do encontro foi criardiretrizes para a organizao do movim