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Livro Memória Poronga

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Page 1: Livro Memória Poronga

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Page 2: Livro Memória Poronga

ME MÓR I A

P OR ONG A

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Page 3: Livro Memória Poronga

ME MÓR I A

P OR ONG A

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Page 4: Livro Memória Poronga

Fundação RobeRto MaRinho

PRESIDENTEJosé Roberto Marinho

SECRETÁRIO GERALHugo Barreto

SUPERINTENDENTE EXECUTIVONelson Savioli

GERENTE GERAL DE EDUCAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃOVilma Guimarães

COORDENADOR DO PROJETO PORONGARicardo Pontes

GOVERNADOR DO ESTADO DO ACRETião Viana

SECRETÁRIO DE ESTADO DE EDUCAÇÃO E ESPORTEDaniel Queiroz de Sant´Ana

COORDENADORA GERAL DO PROJETO PORONGAEmilly Ganum Areal Melo

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Page 5: Livro Memória Poronga

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Page 6: Livro Memória Poronga

Em 1981, quando os seringueiros eram invisíveis para as políticas públicas, Chico Mendes criou um projeto de alfabetização nos seringais do Acre. Uma poderosa arma de resistência do movimento. Tinha uma bela cartilha, feita pelo então CEDI (hoje Ação Educativa), que se chamava Poronga. O nome foi escolhido por um dos adultos nos primeiros encontros de alfabetização. Como a poronga, que é uma lamparina iluminando nosso caminho no escuro da floresta, “a cartilha também vai iluminar nossos caminhos na vida”, argumentou.

Em 1986, o Chico me convidou para coordenar o projeto, quando precisava trans-formar os núcleos de alfabetização em escolas para milhares de crianças. Fizemos novas porongas, dando conta das quatro primeiras séries do Ensino Fundamen-tal, em dois ciclos - alfabetização e pós-alfabetização, que foram aprovadas pelo Conselho Estadual de Educação. Em 1988, quando o Chico foi morto, tudo pare-cia ruir. Depois, aos poucos, fomos retomando o caminho, colocando as coisas no lugar. Jorge Viana foi eleito Prefeito de Rio Branco e eu me tornei seu Secretário de Educação. Depois de um trabalho de quatro anos, o povo quis o mesmo para o Acre. Quando o Jorge (que também foi presidente da ONG que coordenava o trabalho de educação nos seringais) foi eleito Governador do Acre, assumiu o forte propósito de levar as séries finais do Ensino Fundamental e o Ensino Médio para as comunidades isoladas mais distantes.

Era a fome com a vontade de comer. Resolvemos retomar o projeto do Chico e de-senhar uma proposta para toda a educação básica. Mas já não éramos uma ONG. Tínhamos pouquíssimo tempo. Éramos governo e precisávamos de ajuda. Foi assim que, no começo de 1999, nós dois chegamos àquele pequeno prédio colonial no Rio de Janeiro. Naquele dia de sol, as pessoas indo para a praia e nós vestidos como extraterrestres preparados para mais uma reunião. Agora na Fundação Roberto Marinho, onde poderíamos construir algo novo, com rapidez, qualidade e que fos-se realmente potente – para todos. Ao chegar, esperava tudo isso e um pouco de formalidade. Demos de cara com uma figura de voz rouca e um abraço tão forte e caloroso que pensei (e depois tive certeza) que era uma amizade daquelas que parecem sempre ter existido. Era Vilma Guimarães. Depois entraram no nosso rol de amigos o Hugo Barreto e o José Roberto Marinho.

Assim, nasceu o Projeto Poronga. Antes de entrar na floresta, corrigimos a distor-ção idade- ano em nossa rede urbana. A floresta é sagrada e não se pode entrar sem a permissão do tempo. Um dia, alguém disse que é preciso começar devagar. O mais importante não é a velocidade, mas a direção. Eu olho para trás e penso feliz: acertamos o rumo!

Binho MarquesSecretário de Educação do Estado do Acre (1999-2002) / Vice-Governador do Estado

do Acre (2003-2006) / Governador do Estado do Acre (2007-2011) / Secretário de Articulação com os Sistemas de Ensino do Ministério da Educação – SASE/MEC

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Page 7: Livro Memória Poronga

Iniciado em março de 2002, na gestão do então Secretário de Educação Binho Marques, o Projeto Poronga, dado o impacto nos indicadores educacionais do Acre, notadamente na distorção idade-ano, precisava se consolidar como política pública de educação no Estado.

Assim, a parceria com a Fundação Roberto Marinho, para a continuidade das ações do projeto se amplia. O trabalho iniciou-se com 23 escolas e, ao longo de 11 anos, passou a alcançar todas as escolas urbanas com maior concentração de distorção em Rio Branco e se estendeu para o interior do Estado, com atuação nos seis maiores municípios.

Nessa caminhada, observou-se o aperfeiçoamento do projeto, como uma constru-ção feita a várias mãos.

No trabalho com a realidade educacional do Acre, foi imperativa a criação de novos formatos e alternativas de trabalho, como forma de responder aos desafios que se impunham. Nessa esteira trabalhou-se a oferta do Projeto Poronga para o Ensino Médio e o Ensino Fundamental do 6º ao 9º ano, nas áreas rurais de difícil acesso.

E só foi possível porque contamos com pessoas dispostas a aprender com os erros e a encarar os obstáculos não como empecilhos, mas como desafios a serem superados.

O Projeto Poronga cresceu e transformou-se numa bela árvore que deu bons fru-tos. O resultado do trabalho se fez sentir não apenas na criação e consolidação de novas políticas de educação para enfrentar a distorção idade-ano e o abandono escolar, mas, sobretudo, na vida de milhares de adolescentes e jovens que se viam incapazes de aprender e prosseguir galgando novos patamares na escola e na vida.

Esse impacto não aparece nas estatísticas, no entanto, ficou sempre muito evi-dente no comportamento, nas falas dos estudantes, dos agentes educacionais e das famílias.

Tudo isso mostra que as mudanças em educação não podem ser avaliadas somente pelos números. Há algo intangível, que em certas situações diz muito mais sobre o impacto de políticas e ações.

É o caso do Projeto Poronga no Acre. Para conhecer o seu verdadeiro impacto é preciso ler o intangível e, certamente, belas histórias de vida serão encontradas, que nele tiveram seu marco inspirador.

Maria CorrêaSecretária de Educação do Estado do Acre (2003-2011)

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Page 8: Livro Memória Poronga

Programa de Aceleração de Aprendizagem para Correção da Distorção Idade/Série. Esse é o nome “oficial” para o programa que, carinhosamente, chamamos de Projeto Poronga, destinado à correção de fluxo nos ensinos Fundamental e Médio no Estado do Acre, que completou mais de uma década de existência.

O ensino regular, mesmo que universal, não comporta as especificidades econô-micas, geopolíticas e socioculturais da totalidade das regiões, estados, municípios e da população brasileira. Formatos alternativos de oferta da educação básica são necessários para atender a diferentes contextos. Proporcionar educação básica diferenciada, com currículo igualmente diferenciado, não significa abdicar da quali-dade. A decisão estratégica de criar o programa imbuiu-se dessa convicção. O Pro-jeto Poronga foi a forma que o Governo do Acre encontrou, junto a seus parceiros, para enfrentar o problema que se traduz em um dos indicadores mais perversos da educação básica brasileira.

Os indicadores de fluxo escolar do Acre mostram que, em 1999, na época das pri-meiras tratativas para o início do programa, a defasagem idade-ano no Ensino Fun-damental era de 55,42%. Hoje, no ano de 2013 (dados de 2012), a distorção atingiu a marca de 32,27%. A queda de 23 pontos percentuais demonstra o tamanho do esforço e do compromisso das equipes envolvidas com o projeto. O número signi-fica que mais de um terço dos estudantes em situação de distorção teve sua cida-dania educacional resgatada. A meta para os próximos dez anos é atingir números residuais para este indicador, além de universalizar o acesso no Ensino Médio, o que já foi atingido no Ensino Fundamental. O esforço terá de ser redobrado, pois à medida que se ampliam as matrículas e a cobertura no ensino regular, cresce, natu-ralmente, o indicador de distorção.

Poronga é o nome dado às lamparinas de cabeça, artefato que o seringueiro usa cotidianamente para iluminar o caminho, quando, ainda de madrugada, antes do raiar do dia, levanta-se para a lida diária de coleta do látex pelas estradas de seringa nos seringais afora.

O espírito do programa é esse: iluminar os caminhos daqueles que, por diversas situações de vida, tiveram que abandonar os estudos ou sofreram atraso signifi-cativo em seu fluxo regular. E, ao iluminar seus caminhos, permitir que cada um os trilhe da maneira que melhor lhes convier: com liberdade, autonomia e consciên-cia crítica, rumo à emancipação para o exercício da cidadania plena, na mais ampla concepção do termo.

Daniel Queiroz de Sant´AnaSecretário de Educação e Esporte do Estado do Acre

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Page 9: Livro Memória Poronga

O Projeto Poronga é fruto de um desejo comum de seus parceiros - enfrentar um dos maiores desafios da educação básica brasileira: a distorção idade/ano. Esta parceria vem apresentando excelentes resultados. O Poronga amadureceu e ganhou diferen-tes desenhos ao longo dos anos, mas um fio condutor sempre esteve presente em todas as suas ações: o trabalho com a Metodologia Telessala™.

Nas salas de aula nas quais se faz uso da Metodologia Telessala™, encontramos pes-soas portadoras de diferentes saberes, organizadas em círculo, dialogando, com a mediação de um educador motivado e preparado para utilizar variados meios pe-dagógicos. Por meio de uma prática cooperativa, educadores e educandos concre-tizam aquilo que Paulo Freire ensinou: ninguém educa ninguém; ninguém se educa sozinho; aprendemos todos em comunhão.

Dentro desse processo de aprendizagem, um instrumento muito importante da Metodologia Telessala™ é o Memorial, caderno onde professor e estudantes re-gistram as aprendizagens construídas e refletem sobre elas. Ao longo desses anos muitos memoriais foram elaborados pelos participantes do Poronga: memorial do estudante, do professor e os das salas de aula.

Seguindo este princípio, veio o desejo de registrarmos, em um livro, a memória do Projeto Poronga, tendo como ponto de vista algumas histórias de quem por esse projeto passou. Queríamos ouvir como o Poronga entrou em suas vidas e que sen-timentos e desdobramentos essa experiência despertou. Uma equipe percorreu algumas cidades do Acre para ouvir as vozes dessas pessoas. Essas lembranças delicadamente saíram da esfera oral e se transformaram em histórias aqui regis-tradas, guardadas e documentadas. As histórias narradas são frutos de uma escuta atenta: utilizando as palavras do “contador”, o narrador-observador as reconta nos dando detalhes do enredo e do seu cenário. Assim, somos transportados para os diferentes cantos e recantos do Acre, para dentro das salas de aula e para a vida desses personagens que constituem parte da história do Poronga.

Esperamos que você, um dos protagonistas da educação transformadora preconi-zada pelo Projeto Poronga, viva ou reviva as emoções dessa história – sua, deles, de todos nós.

Vilma GuimarãesGerente Geral de Educação e Implementação

Fundação Roberto Marinho

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FeijóTarauacá

Cruzeiro do Sul

Jordão

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Sum

ário

Célia Maria da Silva Rodrigues | Rio Branco . . . . . . . . 14Samoel de Lima Figueiredo | Rio Branco . . . . . . . . . . 24Vorrosa Batista Saraiva | Rio Branco . . . . . . . . . . . . 32Evinaldo Barbosa de Paulo | Rio Branco . . . . . . . . . . 40Divânia Maria de Freitas | Brasileia . . . . . . . . . . . . . 52Altevir Araújo Muniz | Rio Branco . . . . . . . . . . . . . . 60Francisca de Aragão | Tarauacá . . . . . . . . . . . . . . . . 66Maria Rosiane de Lima Fontenelle | Tarauacá . . . . . . 74Emilly Areal Ganum Melo | Rio Branco . . . . . . . . . . 82Mary Clicia da Costa Moraes | Cruzeiro do Sul . . . . 94Maria Gleiceane de Souza Jesus | Tarauacá . . . . . . 104Maria Inês Oliveira da Silva | Tarauacá . . . . . . . . . . 110Daqui de meu lugar, eu sou PorongaFrancisco Gregório Filho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117

Brasileiae Epitaciolândia

Rio Branco

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» TRAJETOS

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alegria | coragem | orgulho | sorriso

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RIO BRANCO

Aos olhos de algumas pessoas eu posso não ser muito, mas eu sou muita coisa! Eu sou professora!

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sim com uma boca tão cheia, saboreando cada síla-ba, que dá logo uma vontade na gente de sentar em uma carteira escolar e ser de novo criança só para aprender com ela. Célia contou sua história, falou de sua infância, de seus pais e irmãos e de todo o caminho que percorreu até ser professora do Po-ronga. Em nenhum momento o brilho da alegria abandonou seus olhos. Mesmo quando estava con-tando sua “dor mais doída”, a morte do pai, o que fez foi convidar a tristeza para partilhar com a alegria seu semblante. Apenas isso, porque Célia é mulher que inclui. Com isso nos foi fácil compreender a ex-tensão de suas palavras quando disse que em todos os anos de trabalho como professora nunca havia desistido de nenhum estudante. Mesmo aqueles desacreditados pelos outros e por eles mesmos. Todos contaram com seu apoio e com seu carinho.

Escola Elozira dos Santos Thomé, em Rio Branco.

Escola grande, com vida. Na quadra, logo na en-trada, crianças animadas jogando bola. Um jardim bem cuidado, destes com fl ores plantadas em la-tas. Célia vem ao nosso encontro com um sorri-so no rosto e nos cumprimenta. “E aí? Vamos lá gente?” Mostrou a escola, apresentou a diretora e colegas de trabalho que estavam por ali, abriu a porta de uma sala colorida e organizada – a sala de estudos - e completou: “podemos conversar aqui, o que acham?”.

O sorriso e o jeito ‘vamos colocar a mão na massa’ têm razão de ser. Célia veio e realizou. Não é à toa que estufa o peito e apruma a voz para dizer: “aos olhos de algumas pessoas eu posso não ser muito, mas eu sou muita coisa! Eu sou professora!”. Diz as-

chegamos à escola em que Célia trabalha.

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Quando foi convidada pelo diretor da escola em que trabalhava, lá nos idos de 2002, para parti-cipar de uma reunião sobre um novo projeto que trabalharia com a unidocência, a resposta dela foi um sonoro “eu vou!” Medo teve e não foi pouco. Disse que para ela, assim como para muitos ou-tros professores, a unidocência era um bicho-de--sete-cabeças. Como um único professor poderia ter condições de dar aula sobre matérias tão di-ferentes? O projeto ainda tinha mais um desafi o, que era trabalhar com uma metodologia inovado-ra, desconhecida, propondo que o conhecimento fosse construído coletivamente, por todos. Era tudo muito novo. Célia, então, reuniu sua coragem (afi nal, só precisa ter coragem quem tem medo) e topou o desafi o. Em pouco tempo, a Metodologia

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Telessala ™ e a unidocência, de temidos desconhe-cidos passaram para a condição de amigos de toda hora. Célia entendeu logo que a proximidade com os estudantes que a unidocência ajudava a cons-truir com eles, de fato, uma história que fazia dife-rença. Desde então, quando percebe que algo não vai bem com algum estudante, senta ao lado, dá a mão e aconselha. “Vamos lá, meu fi lho, agarre essa oportunidade. Você está tendo uma nova chance. Você precisa estudar se quer essa mudança de vida que almeja. O ser humano tem essa possibilidade de mudar, de sair de onde está e você pode fazer essa transformação na sua vida, na vida de seus pais que irão chegar à velhice. Nós podemos melhorar e também fazer com que outras pessoas melhorem. Eu quero que você vá, que você caminhe!”

Entrevista com a professora Célia Maria.

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Escola Elozira dos Santos Thomé, em Rio Branco.

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Page 19: Livro Memória Poronga

Célia talvez não se dê conta, mas com suas pala-vras de incentivo ela personifi ca a própria poron-ga, símbolo do projeto, ao tentar iluminar os cami-nhos de seus estudantes.

Filha de seringueiros, a segunda de seis fi lhos. Célia costumava acompanhar seus pais no trabalho no seringal, ajudava a colocar os potes e depois a reco-lhê-los com a seringa clara. Lembra-se de quando passavam pelos rios os regatões vendendo tecidos, biscoitos e quinquilharias em seus barcos-loja fl u-tuantes e seu pai fazia compras para elas e as irmãs. Morou no seringal até os nove anos, quando seus

pais se separaram. Os três fi lhos mais novos fi caram com a mãe e os três mais velhos, entre eles Célia, foram morar com o pai na zona rural de Brasileia, ci-dade na fronteira com a Bolívia. Era difícil para o pai, ex-seringueiro e analfabeto, encontrar emprego na cidade. Acabou conseguindo trabalhar como carre-gador de castanhas e depois passou a tomar conta de chácaras. Querendo uma vida melhor para os fi lhos, matriculou Célia e o irmão em uma escola na zona rural e, empenhado no apoio aos estudos, o pai acordava todos os dias às 3h da manhã e fazia pão de milho para eles comerem antes de saírem para per-correr a pé os 4 km que separavam a casa da escola.

a hiStória do acre

Gameleira às margens do Rio Acre, em Rio Branco. Declarada monumento histórico desde 1981.

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Aos 11 anos, Célia foi morar na casa de uma pro-fessora em Brasileia para poder estudar na cidade. Ela trabalhava de dia e estudava à noite. Um pouco mais velha, foi para Rio Branco continuar seus es-tudos no Colégio Acreano sem deixar o trabalho durante o dia. A rotina era cansativa, mas a lem-brança das falas do pai e da mãe: “vocês têm que estudar para melhorarem de vida” dava a Célia força para seguir em frente.

E Célia realmente seguiu. Hoje, dentro de sala de aula, trabalha com atividades complementares com muita propriedade. Diz com orgulho: “a história do Acre é minha vida. Eu conheço. O que está lá no livro eu vivi”. Apaixonada pela Metodologia Telessala™, sente-se feliz em vê-la conquistando cada vez mais espaço no ensino regular à medida que os professores vão trocando experiências de trabalho. A metodologia tem sido para Célia como a poronga que utilizava nos tempos de seringal: uma ferramenta indispensável no apoio à caminhada.

O sonho de Célia para o futuro.

Formatura de turmas de 2008 do Poronga, Rio Branco.

MEMÓRI A PORONGA

© Guanabaratejo

Atividades Complementares: São atividades desenvolvidas em grupo, com o objetivo de aplicar e ampliar os conceitos e conteúdos trabalhados na aula. Oportunizando também a ampliação de assuntos que estão em pauta no contexto local e/ou global, articulados às ocorrências cotidianas da comunidade escolar.

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assista na web ao vídeo da célia:http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1032

E, seguindo com sua “poronga”, Célia diz fi car com o coração apertado de emoção quando chega a época das formaturas. Ver seus companheiros de viagem - seus estudantes - desembarcarem da “es-tação Poronga” mais preparados do que quando chegaram para seguirem seus próprios caminhos. Depois de terem exercitado muitas vezes em sala de aula a autonomia, a apresentação e defesa de suas ideias, a socialização das conquistas e das di-fi culdades, a valorização do trabalho em equipe e da importância da acolhida saem, com certeza, mais fortes. E Célia fi ca feliz quando os estudantes voltam para visitá-la, para contarem de suas vidas, para agradecerem os aprendizados. No dia de nossa conversa duas ex-estudantes haviam passa-do na escola para darem um abraço e matarem a saudade da professora.

Por fi m, perguntamos a Célia se ela achava que existia algum segredo em seu trabalho. Ela não titubeou para responder: “o afeto, o segre-do de tudo é o afeto”.

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Escola Elozira dos Santos Thomé, em Rio Branco.

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Escola Elozira dos Santos Thomé, em Rio Branco.

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sério | obstinado | forte | confi ança no futuro

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O fato de adquirir conhecimento, de saber como determinada coisa funciona, é muito gratifi cante. A educação proporciona a visão do mundo, a liberdade de você poder pensar, poder escolher.

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Falar de Samoel e de sua história não é tarefa simples. Ao ouvi-lo narrando todo o empenho e determi-nação com os quais conduziu sua vida é difícil não pensar num conto épico. Mas resistimos à tendên-cia de resvalar para a ficção porque, ao mesmo tempo, sentimos que estamos diante de alguém muito real.

Com a voz calma, sem arroubos, e fisionomia sé-ria, Samoel fala de como foi sua vida na infância e na adolescência. Quando para um pouco para buscar na memória os acontecimentos que o marcaram mais profundamente, um movimento firme e lento de seu maxilar dá a perceber que dentro daquele moço de fala mansa existe al-guém muito determinado.

Samoel não teve esse nome a vida toda. Nasceu Samuel, no seringal São Luiz do Remanso. Ainda bebê de colo, seu pai o levou para viver com ele uma vida errante, longe da mãe e dos irmãos. Sem registro ou documentos e sem frequentar escola, Samoel seguiu o pai em uma existência sem qual-quer perspectiva. Um dia, aos 14 anos, morando na beira da estrada perto do município de Sena Madureira, em um barracão feito de refugo de madeira, Samoel despertou. Olhou para a estrada e resolveu realizar um sonho de menino: ir à es-cola. Foi sozinho e disse à diretora que queria es-tudar. Seu pedido foi atendido. A escola o acolheu mesmo sem os documentos. O pai havia sempre lhe dito que para estudar era preciso ter docu-mentos e que o governo estava enviando para a guerra quem se registrasse. Samoel, aterrorizado com a possibilidade de se ver longe da única pes-soa com a qual convivia, aceitava a impossibilidade de estudar. Mas chegou o dia do sonho se impor ao medo e ele foi assim mesmo. “Eu disse para mim mesmo: eu vou estudar!” Samoel dava assim seu primeiro grande passo rumo a um futuro ainda in-certo, mas que ele sentiu naquele despertar, que, certo ou incerto, era seu. Só seu. E então Samoel assumiu as rédeas de sua vida.

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Gersineide, uma professora da escola, resolveu ajudar aquele valente menino a dar outros impor-tantes passos. Ela cuidou que Samoel fosse, final-mente, registrado. Os pais dela também deram as mãos a Samoel e se tornaram seus padrinhos de batismo. Se foi por simples coincidência ou por graça do destino, não sabemos, mas o fato é que seu primeiro documento lhe trouxe um novo nome, saía de cena Samuel e nascia para o mundo Samoel Lima de Figueiredo. E ele parece ter ple-na consciência daquele marco de passagem: “até aquele momento eu sobrevivi, mas eu queria viver. E foi aí que começou a minha vida”.

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O novo Samoel, com o apoio da professora Gersi-neide, concluiu em dois anos o primeiro segmento do Fundamental. Aos 16 anos, senhor de seu des-tino, alçou um novo voo: com suas poucas peças de roupa em uma sacola pegou a estrada e foi para Rio Branco, a 145 km de distância.

Em Rio Branco, Samoel procurou por seu avô e tio paternos. Mas a vida de Samoel na capital foi, no início, muito difícil, a começar pela pouca intimida-de que tinha com seu avô. Nos primeiros dias, para se sustentar, retomou uma tarefa que já fazia no tempo em que perambulava com o pai: recolher la-tas para vender. Passou depois a limpar quintais até que consegue um emprego de remador de catraia. Samoel se diverte com a lembrança do que fez com o primeiro salário: comprou duas calças. Sua fisio-nomia séria cede lugar ao riso quando nos conta que uma era pequena demais e a outra muito gran-de. A inexperiência no assunto explica o equívoco.

Na capital

Nunca havia tido, até aquele momento, nenhuma roupa que houvesse sido feita ou comprada para ele. Foi por volta dessa época também que Samoel conheceu sua mãe, por acaso, andando pela cida-de. Ficou feliz por finalmente tê-la encontrado e, desde então, Samoel passou a ir ao seringal, onde moram sua mãe e a maioria de seus irmãos já cres-cidos, visitar a sua reencontrada família.

Com o sustento garantido pelo trabalho na ca-traia, a vida começou a se estabilizar e Samoel retomou sua vontade de estudar. Matriculou-se várias vezes no 6º ano, porém, a árdua labuta diá-ria e o fato de ele ainda não ter ideia do que a edu-cação realmente poderia lhe trazer de benefício o fizeram desistir seguidas vezes. Até que, em 2002, retornando à escola para tentar novamente cur-sar o 6º ano, foi apresentado ao Projeto Poronga e gostou da ideia de completar o segundo segmento do Ensino Fundamental em um ano.

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Samoel nos diz que sem o Poronga não teria conseguido terminar os estudos, pois era muito ansioso, tinha pressa de ver as coisas acontece-rem. “Pensar quatro anos no futuro para quem tem fome hoje!” A necessidade que Samoel tinha de saciar essa fome explica como ele conseguiu conciliar um ano intenso de estudos com o traba-lho. Sua rotina começava às 4h da manhã quan-do acordava para ir para a catraia, onde fi cava até às 6h da tarde. No barco, entre uma viagem e outra, estudava as matérias. Saía do trabalho direto para uma aula de uma hora em um cursi-nho de informática e de lá ia, literalmente, cor-rendo para a escola assistir às aulas. Samoel se emociona ao lembrar de seu professor de classe, Carlos Ramos (com quem tem contato até hoje). Disfarça as lágrimas que lhe marejam os olhos.

Fome de apreNder

Respira fundo e recupera sua voz fi rme e calma para falar de seu professor: “ele me mostrou, por meio da metodologia do projeto Poronga, e dele mesmo, a importância de estudar, me mostrou as possibilidades que estavam à minha frente que o estudo poderia me proporcionar”. Samoel diz ser também agradecido à Emilly, coordenadora geral do projeto, que sempre o incentivou muito a per-severar. Hoje, consegue avaliar sua relação com a educação de uma maneira clara e pertinente: “além da questão fi nanceira, de poder melhorar de vida, só o fato de adquirir conhecimento, de saber como determinada coisa funciona, é muito gratifi cante. A educação proporciona a visão do mundo, a liberdade de você poder pensar, poder escolher”. Diz ainda: “Eu estudo porque gosto. Eu gosto de estudar, gosto de aprender”.

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Escola Raimundo Gomes de Oliveira, em Rio Branco.

MEMÓRI A PORONGA

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assista na web ao vídeo do Samoel:http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1036

Gestão Pública. No ano de 2009, prestou um novo concurso para ser escriturário de um banco públi-co e passou em 3º lugar. Dentro da instituição, seu empenho foi reconhecido e, em pouco tempo, foi promovido para a função de Supervisor de Atendi-mento. Hoje já é Gerente de Relacionamento.

Que outros frutos o futuro reserva para Samoel ainda não sabemos, mas embarcamos junto com ele em sua confiança no porvir: “o que me deixa feliz é pensar no futuro. Saber que eu tenho uma esposa maravilhosa e que eu posso dar para mi-nha filha o que eu não tive. Saber que o futuro será bem melhor”.

Depois de concluir o Ensino Fundamental pelo Poronga, Samoel não parou mais de estudar. Com-pletou o Ensino Médio assistindo ao Telecurso com o apoio do Sistema de Recepção Controlada. Paralelamente, fez diversos cursos de informática. Fez faculdade e já tem duas pós-graduações na bagagem: uma em Administração e Marketing e outra com foco em Gestão Bancária. Sua trajetória profissional acompanhou seu crescimento em ter-mos de instrução. De remador de catraia passou a dar aulas em um curso de informática e a prestar serviços nessa área. Em 2007, se tornou diagrama-dor do Diário Oficial Online, após ter passado em um concurso estadual para o cargo de Técnico em

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Mirante sobre o Rio Acre, em Rio Branco.

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Dentro do Poronga eu consegui ser uma verdadeira profi ssional. É um projeto que realmente transforma, seja aluno, seja professor –ele faz com que você renasça. Aquele que entrou e passou pelo Poronga não sai da mesma forma. Ele sai totalmente transformado.

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Entrevista com Vorrosa.

MEMÓRI A PORONGA

Educação Lourenço Filho, escola onde dá aula. O dia estava quente e mesmo sendo fi nal de tarde o sol ainda brilhava forte no pátio interno da espa-çosa escola. Estávamos curiosos para conhecer a dona de um nome tão singular. Vorrosa é uma mulher de traços bonitos e fortes. Sorriso largo e franco, combinados a um certo ar sério e compe-netrado, revelam uma personalidade original.

Em 4 de agosto de 1973, nascia a menina Vorrosa no seringal Castelo, próximo a Sena Madureira. Ela conta que quem não lhe conhece, ao saber de seu nome, imagina uma velhinha vestida de rosa. E nós achamos graça porque a imagem, defi nitivamente, não corresponde à aparência vigorosa e ao sem-blante determinado da professora, formada e pós--graduada em Educação Física.

Fomos nos encontrar com Vorrosa no Instituto de

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Page 35: Livro Memória Poronga

a proFeSSora

Antes de ser professora do Poronga, Vorrosa já havia passado pela experiência de lecionar para a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Superior, mas conta que, apesar de ter gostado de todos os outros momentos, foi no projeto Poronga que se encontrou. “Dentro do Poronga eu consegui ser uma verdadeira profi s-sional. É um projeto que realmente transforma, seja aluno, seja professor – ele faz com que você renasça. Aquele que entrou e passou pelo Poron-ga não sai da mesma forma. Ele sai totalmente transformado.”

Vorrosa se refere ao Poronga como quem se re-fere a um amigo próximo e querido, como a um companheiro de jornada. “Por ele exigir tanto da gente, eu pude perceber que eu sou capaz de muitas coisas. Eu sei que hoje eu consigo enfren-tar qualquer coisa que vier porque ele me ensi-nou isso, me ajudou a crescer, a me valorizar. Ele me ajudou a ser uma pessoa que expõe o que de-seja, a buscar melhorias, a enfrentar difi culdades e obstáculos. O Poronga diz onde você precisa melhorar, onde está errando”.

Em seu passeio pelas lembranças de todos estes anos em que tem andado de mãos dadas ao Po-ronga, Vorrosa conta a história de sua primeira turma. Confessa que teve bastante medo porque era uma turma difícil, pela qual cinco professores já haviam passado. Com a ajuda da coordenadora e consciente de sua responsabilidade, começou seu trabalho assumindo como seus primeiros de-safi os: conhecer seus estudantes e estabelecer uma relação de parceria com os pais. Sabia que es-tes dois passos comporiam uma base fi rme para o desenvolvimento do trabalho e para o suporte de novos desafi os. Conta que a metodologia ajudou. “No Poronga, diferente do que acontece no regu-lar, onde o ensino é mais sistemático, nós temos nosso momento de lazer, de conversa, então a gente se conhece. Eu conheço muito meus alunos! Conheço seus pais. Tenho os pais e responsáveis como grandes parceiros deste trabalho. É comum eles me procurarem para dizer que seu fi lho, ou sua fi lha, está mudando, melhorando na escrita, na leitura, porque muitos chegam com uma defa-sagem de aprendizagem muito grande, desacredi-tados por eles mesmos.”

Escola Alcimar Nunes Leitão, em Rio Branco.

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troca de SabereS

Construída esta base de afeto e apoio, Vorrosa se empenhou em fazer com que os estudantes conseguissem desenvolver com autonomia os trabalhos das equipes – coordenação, síntese, ava-liação e socialização. Ela sabia que a inserção na Metodologia Telessala™ os faria perceber a pró-pria capacidade de realização e sentir segurança para darem passos maiores. E assim aconteceu. Vorrosa conta que “o trabalho de culminância des-ta turma foi um sucesso. Contagiou a escola inteira. A diretora pediu para que eu e a coordenadora do projeto apresentássemos o Poronga para toda a escola, queria que todos os professores utilizas-sem a metodologia e o trabalho com as equipes”. Desde então, o Instituto Lourenço Filho promove meios de os professores trocarem ideias e expe-riências e compartilharem boas práticas de tra-balho. Uma equação em que todos, sobretudo os estudantes, ganham.

Vorrosa se considera uma professora muito exigen-te. “Eu procuro trabalhar consciente da minha res-ponsabilidade. Quando começa uma turma eu peço a relação de telefone de todos. O aluno faltou duas vezes eu ligo para saber o que houve.” Fica satisfei-ta quando recebe visita de ex-alunos que estão no Ensino Médio ou na faculdade. “Ver que eles estão evoluindo me deixa feliz, significa que eu fiz alguma coisa para a vida deles.”

Feliz também se sentiu quando foi homenageada como melhor professora: “me senti lisonjeada. Foi uma surpresa, porque para mim todos os profes-sores do projeto são professores de excelência. O trabalho exige muita dedicação, você não trabalha só na escola, tem o planejamento, informações que têm que ser passadas semanalmente para a equipe do projeto. Para trabalhar para o Poronga é necessário que professor tenha vontade”.

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O processo pedagógico é apoiado por equipes denominadas socialização, síntese, coordenação e avaliação. Os estudantes desempenham funções com distintas atribuições, tornando-se corresponsáveis pelo processo de aprendizagem e pelo alcance de resultados e metas do grupo. Esse trabalho consolida os hábitos de respeito, de colaboração, de participação crítica e de compromisso com uma cidadania planetária.

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assista na web ao vídeo da Vorrosa:http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1038

Sobre as incertezas naturais que cobrem o futu-ro, Vorrosa traz consigo uma certeza. “Trabalho com gosto no Poronga – eu não sei como seria o amanhã se eu tivesse que sair do projeto. Eu não me vejo fora. É como se fosse já uma parte de mim. Eu sei que algum dia ele pode chegar ao fi m, porque ele tem uma fi nalidade que é ninguém precisar mais dele, mas eu levo o Poronga para onde quer que eu vá!”

Instituto de Educação Lourenço Filho, em Rio Branco.

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Vista do Rio Acre, em Rio Branco.

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Todo mundo dizia que iríamos trabalhar com aqueles que não queriam estudar, que não vão para a escola. E, de repente, quando fui para sala de aula foi uma das maiores experiências que eu já tive! Porque a gente tinha o aluno como um todo, conhecia o aluno, eles precisavam só de uma oportunidade.

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2 Fonte: http://www.portalideb.com.br/escola/1018-escola-theodolina-falcao-macedo/idebhttp://educacao.uol.com.br/noticias/2012/08/15/veja-quais-sao-as-melhores-escolas-publicas-do-acre-segundo-o-ideb-2011.htm

Área interna da Escola Theodolina Falcão Macedo, em Rio Branco.

Branco, fomos gentilmente recebidos pelo diretor Evinaldo e passeamos com ele pelas bem cuidadas instalações. Os trabalhos caprichados dos estu-dantes expostos em cartazes e faixas, as salas de aula cheias e animadas e um clima de respeito que dava para sentir no ar só confi rmavam o que já sa-bíamos de antemão: estávamos em uma das dez melhores escolas do Estado, segundo avaliação do IDEB 2011, publicada em 20122.

A conversa com Evinaldo seguiu leve e descon-traída. Ele sabe como a fi gura do diretor da es-cola é forte para a comunidade do bairro e conta

que, com frequência, os pais vêm até ele pergun-tar alguma informação que poderia ser forne-cida mais facilmente pela secretaria da escola. Evinaldo parece entender o que está por trás de atitudes como essa: o sentimento de segurança gerado por um bom gestor público na comunida-de escolar. Por isso, justifi ca os elogios ao seu tra-balho dizendo que procura fazer o que considera mais importante em sua função: estar presente. Em suas palavras, “quando o aluno tem uma difi -culdade, ele sabe que tem uma pessoa dentro da escola para ouvi-lo. Não posso fi car fechado den-tro de uma sala e as coisas acontecendo lá fora. Preciso fazer parte!”.

ao chegarmos à escola Theodolina Falcão, em Rio

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olhar para o outro

Evinaldo conta que as eventuais tristezas senti-das na época da infância e da juventude foram amortecidas pela união de sua família. Nascido em Sena Madureira, mudou-se com a família para Rio Branco aos cinco anos em busca de tra-tamento médico para o pai doente, que faleceu pouco tempo depois. Evinaldo ficou, junto com seus cinco irmãos e sua mãe, morando na casa da avó na capital. A lembrança mais forte desta épo-ca é a do empenho de sua mãe para que não fal-tasse dignidade à vida que levavam. E dignidade, para Dona Norminda, estava entrelaçada à edu-cação. Todos os dias, após a jornada de trabalho, ela própria sentava-se nos bancos escolares – fez isso por quatro anos e completou o primeiro seg-

mento do Ensino Fundamental. Evinaldo ia tarde da noite para a esquina da rua onde moravam es-perar por sua mãe. Tamanha força de vontade o marcou para sempre e também influenciou sua maneira de olhar para a educação.

Seguindo o exemplo de Dona Norminda, Evinal-do estudou com afinco e seriedade. O fato de ter que apagar as páginas iniciais do caderno, quan-do este chegava ao fim, para escrever por cima porque não tinha condição de comprar outro, não diminuía seu ânimo. Conciliava sua vida de estudante com pequenos trabalhos para ajudar nas despesas de casa. Vendia refresco na rua, la-vava carro, buscava água no caminhão pipa.

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Tudo isso parece ter provocado em Evinaldo um carinho especial pelo o que é público, um sen-timento de pertencimento a uma coletividade. Durante nossa conversa, ele usou muitas vezes a conjunção de palavras “o outro”. Esse era o ponto mais importante da vida para ele: “estar a serviço do outro”. Este sentimento foi forte o sufi ciente para transformar o menino tímido dos tempos de infância em diretor da escola Theodolina Falcão, função que exige, além de uma maestria nas ar-ticulações institucionais, um constante e atento olhar para o outro. Antes disso, no Ensino Médio, Evinaldo dava seus primeiros passos no trabalho em prol da educação e da cultura, ao entrar para o Movimento Estudantil e ser eleito presidente da Casa do Estudante.

Fragmentos da Escola Theodolina Falcão Macedo, em Rio Branco.

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Evinaldo era há dois anos vice-diretor da escola quando foi apresentado ao projeto Poronga em uma reunião na Secretaria de Educação, em 2002. “Não pensei duas vezes e embarquei no projeto.”

“No início, nós professores tínhamos uma an-gústia muito grande de achar que não daria cer-to. Pensava: sou professor de História, será que vou dar conta?”. Mas Evinaldo se surpreendeu. “Todo mundo dizia que iríamos trabalhar com aqueles que não queriam estudar, que não vão para a escola. E, de repente, quando fui para sala de aula foi uma das maiores experiências que eu já tive! Porque a gente tinha o aluno como um todo, conhecia o aluno, eles precisavam só de uma oportunidade.”

Hoje, como diretor, o ângulo de visão mudou, mas a percepção continua a mesma. Conta ele: “a turma do Poronga não me dá problema: quando você forma a turma, você pega alunos que esta-vam desmotivados, com índice grande de repe-tência, de repente se cria um falso senso comum de que aqueles são os piores alunos, mas quando você os coloca no Poronga e eles começam a es-tudar, a aprender, a se envolver com a metodo-logia tudo muda! Um bom professor pega essa turma com a metodologia e as ferramentas que ele tem na mão e dá um show. Ele faz daquela a melhor sala da escola”.

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Formatura de turmas de 2008 do Poronga, Rio Branco.

MEMÓRI A PORONGAFormatura de turmas de 2008 do Poronga, Rio Branco.

MEMÓRI A PORONGA

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assista na web ao vídeo do evinaldo:http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1040

Para Evinaldo, todas as pessoas que trabalham no Poronga, sobretudo os professores, têm duas ca-racterísticas em comum: a paixão pelo que fazem e a consciência do papel transformador que têm na vida dos estudantes.

Ele diz se sentir orgulhoso quando encontra com um ex-estudante do Poronga, já casado e pai de família, por reconhecer que, de alguma forma, contribuiu para seu crescimento como

pessoa. E sabe que isso, certamente, irá se re-fletir na maneira como ele educa seu filho. “Isso faz toda a diferença!”.

Ser roteirista, para poder escrever histórias sobre pessoas, era um sonho de infância de Evinaldo. Este sonho foi realizado, mas de uma forma um pouco diferente: ele agora ajuda as pessoas a escreverem suas próprias histórias reais de vida.

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Acervo Projeto Poronga.

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Cine Teatro Recreio, em Rio Branco.

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» TRAJETOS: Rio Branco / Epitaciolância e Brasileia.

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Fiquei completamente envolvida com a Metodologia. Vi que nela o estudante é realmente sujeito, que participa da aprendizagem.

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Na BR-317, Estrada do Pacífi co, entre Brasileia e Rio Branco.

mente a chamam. E Diva é, segundo ela, “uma acreana do pé rachado” com sangue português e indígena correndo no corpo, que ama o Acre mais do que a qualquer outro lugar.

Ainda muito jovem, percebeu que somente pelos estudos poderia vencer. Conquistou seu objetivo com afi nco e acabou sendo a primeira da família a ter curso superior. Formou-se em Geografi a e fez pós-graduação , mas, hoje, por causa do Poronga, diz que se sente mais pedagoga. Casou, teve fi lhos e já é avó de quatro netos. Uma avó divertida e alegre pelo que pudemos perceber em nossa con-versa. Defi ne-se como uma pessoa criteriosa que gosta muito do que faz. “Esse trabalho eu amo. Por conta do Poronga, sou outra pessoa; até mi-nha fi lha fala: mãe como a senhora está mudada!”, conta Diva com um sorriso de orelha a orelha.

divânia é Diva, como seus estudantes carinhosa-

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Page 55: Livro Memória Poronga

Diva, em 2002, participou da formação do Poron-ga e ficou muito curiosa para entender como fun-cionariam, na prática, todas aquelas propostas tão diferentes. Quando foi para sala de aula entendeu: “fiquei completamente envolvida com a Metodo-logia. Vi que nela o estudante é realmente sujeito, que participa da aprendizagem.” Diva afirma que o Poronga foi um divisor de águas em sua trajetória como professora, tanto que, quando foi convidada para assumir a função de supervisora em 2004, o coração doeu por ter que deixar a sala de aula. Mas logo se acalmou, pois percebeu que poderia multiplicar seus cuidados e ampliar seu carinho para atender 300 estudantes, porque uma vez professora sempre professora!

A diferença que Diva sentiu na mudança da fun-ção foi na extensão do seu apoio aos professores do projeto: “assim como acontece com o estudan-te, para que eu entenda a dificuldade do professor,

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preciso pegar seus olhos emprestados e me colo-car em seu lugar”. Para Diva, a essência do trabalho continua a mesma e pode ser sintetizada na palavra resgate. Diva sabe que pode tentar resgatar seus estudantes de uma vida com poucas perspectivas e conduzi-los para uma trajetória com mais oportuni-dades de crescimento. Com o tom divertido na voz, que faz parte de seu traço pessoal, conta que esse resgate por vezes se dá na acepção mais concreta da palavra, como quando ela vai buscá-los nas lan houses e nos lagos e açudes na época do verão: “ve-nha cá, menino! Venha para a escola!”. Diz que para desenvolver um bom trabalho com adolescentes é fundamental conhecê-los a fundo e sua estratégia é visitar suas casas, suas famílias: “vou a cada lugar que nunca imaginei existir, mas vou para entender por que o estudante não foi à aula, quem são seus pais, sua condição. Isso me ajuda a fazer muitos resgates. Esse entendimento me ajuda a olhar nos olhos de cada um deles e dizer: você é capaz”.

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Diva conta que fica muito feliz na época da for-matura, quando sente que os estudantes estão maduros, prontos para o Ensino Médio, mas não esconde que o coração fica apertado de sauda-de. Procura acompanhá-los, pedindo notícias aos professores do Ensino Médio e o retorno é sem-pre muito positivo: os estudantes do Poronga, além de chegarem com um bom nível de apren-dizagem, apresentam habilidades cognitivas bem desenvolvidas. São criativos, questionadores, sa-bem falar em público e têm iniciativa. E Diva se enche de orgulho!

“Não dizem que o nosso tesouro está onde está o nosso coração? Então, eu digo: o Poronga é o meu tesouro. Eu quero poder estar neste projeto en-quanto estiver viva!”

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Diva conta que fica muito feliz na época da for-matura, quando sente que os estudantes estão maduros, prontos para o Ensino Médio, mas não esconde que o coração fica apertado de sauda-de. Procura acompanhá-los, pedindo notícias aos professores do Ensino Médio e o retorno é sem-pre muito positivo: os estudantes do Poronga, além de chegarem com um bom nível de apren-dizagem, apresentam habilidades cognitivas bem desenvolvidas. São criativos, questionadores, sa-bem falar em público e têm iniciativa. E Diva se enche de orgulho!

“Não dizem que o nosso tesouro está onde está o nosso coração? Então, eu digo: o Poronga é o meu tesouro. Eu quero poder estar neste projeto en-quanto estiver viva!”

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Na BR-317, Estrada do Pacífi co, entre Brasileia e Rio Branco.

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Quando eu voltei a estudar, entendi que era um estilo diferente, que era algo novo, então, eu passei a encarar com mais interesse, com mais ânimo. Gostava dos momentos de refl exão que os professores propunham (...) era outro modelo de ensino e aquilo cativou meu coração.

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RIO BRANCO

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la de seu bairro. Quando entrou para o Poronga, 12 anos já haviam se passado sem estudar, com uma vida dedicada ao trabalho para sustentar a família formada precocemente. Seu primeiro filho nasceu quando ele tinha 16 anos e depois mais cinco filhos vieram. Logo no início da retomada, teve receio de não conseguir por estar em uma idade mais elevada. “Mas foi mui-to diferente, eu consegui! Quando eu voltei a estu-dar, entendi que era um estilo diferente, que era algo novo, então, eu passei a encarar com mais interesse, com mais ânimo. Gostava dos momentos de reflexão que os professores propunham (...) era outro modelo de ensino e aquilo cativou meu coração.”

mem de ação. Conseguir um tempo em sua agenda ocupada para conversarmos não foi tarefa das mais simples. Felizmente, encontramos uma brecha à noi-te, após seu expediente de trabalho e descobrimos que existia dentro daquele homem de corpo grande e forte, talhado pelo labor, um artesão das palavras.

“Para mim foi um novo tempo! Foi um salto na minha vida, na minha mente” – foi essa a resposta de Altevir à nossa pergunta sobre o que significou o Poronga para ele. Contou que conheceu o projeto em 2005, por meio de uma amiga que era funcionária da esco-

altevir, de 35 anos, é um trabalhador árduo, um ho-

Altevir agradece ao projeto a oportunidade de aprender a falar em público: “Como tinha que apresentar trabalhos, elaborar sínteses de te-mas, eu aprendi. Hoje, converso com meus fi-lhos sobre a importância de registrar o que se aprende. Digo a eles: “quando vocês acharem uma coisa interessante, escrevam os pontos que mais chamaram a atenção porque, desta manei-ra, nunca sairão da memória de vocês”. Conta também que a leitura de imagem o ajudou a se de-senvolver profissionalmente, pois já trabalhava na época com Comunicação Visual. Em casa, procurava exercitar “a alfabetização do olhar” com o que via na televisão: “eu olhava e narrava aquilo que eu assistia”. Além do ganho na vida profissional, Altevir sentiu também que a vida pessoal se nutriu das experiências do Poronga, “a vida passou a ser mais organizada”.

alFabetização do olhar

O texto imagético traz para a sala de aula um conjunto infinito de possibilidades de leitura. Por meio da “alfabetização do olhar”, o estudante é provocado a estabelecer uma relação entre os conceitos das disciplinas, as imagens apresentadas e o cotidiano; explorar a leitura do texto televisivo e outros textos; propiciar a observação, a reflexão e a expressão e estimular a formação do telespectador e do leitor crítico.

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assista na web ao vídeo do altevir:http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1044

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Décimo de 11 fi lhos e neto, por parte de mãe e pai, de imigrantes vindos em busca de trabalho no ciclo da borracha, Altevir diz que após a saída de casa do pai e a perda de um irmão, tornou-se, aos sete anos, um garoto deprimido e desatento, com muitas difi culdades na escola. “Eu era muito frágil para suportar aquilo. Era como se as perdas do meu pai e do meu irmão estivessem morando den-tro de mim constantemente.” Altevir saltou desta situação de fragilidade e de poucas perspectivas para outra de protagonismo e de ação. A formatu-ra no Poronga foi um marco em sua vida: “foi um momento ímpar! Como nunca houve, sabia? Ale-gria imensa, alegria intensa”.

Para aqueles que querem e precisam saltar para uma vida melhor e com mais signifi cado, Altevir tem algumas palavras a dizer: “nunca é tarde para sonhar, enquanto a gente é vivo ainda há esperan-ça para recomeçar!”

Primeira formatura do Poronga, em 2003, em Rio Branco..

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Vista panorâmica do Rio Acre, em Rio Branco.

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12 Sentimos o aumento efetivo da autoestima dos jovens. Eles se valorizaram; passaram a se colocar como cidadãos na estrutura social da escola e isso possibilitou uma aprendizagem mais afi rmativa e mais consciente. Acarretou uma mudança de valores. O estudante começou a ver a vida de outra forma, começou a colocar sentido na vida, a projetar perspectiva de futuro.

TARAUACÁ

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de Educação de Tarauacá. Seu caminho na edu-cação é longo: são 55 anos de trabalho. Ela fala de sua experiência com tanta energia que pare-ce ter disposição para caminhar mais 55 anos nessa estrada.

Vestida com esmero, batom clarinho nos lábios, óculos elegantes – quem a vê sentada em um sofá poderia facilmente confundi-la com uma pacata senhora. Mas basta que a vejamos conversando com seus colegas de trabalho no núcleo ou resol-vendo algum assunto pelo celular para que essa imagem caia rapidamente por terra. O vigor e a clarividência presentes em sua fala impressionam. “Falar em Educação é uma coisa que não tem fim, passamos o dia aqui falando.” E de nossa parte, passaríamos horas a fio ouvindo suas histórias. E haja histórias!

Filha de seringalista, Francisca nasceu há 70 anos no município de Jordão. Com oito anos foi para Tarauacá iniciar seus estudos primários e depois seguiu para Manaus. Lá ficou interna em um colé-gio de freiras onde fez a Escola Normal – que cor-respondia ao Ensino Médio na época. Mais tarde cursou Pedagogia em Rio Branco.

Francisca atualmente é coordenadora do Núcleo

MEMÓRI A PORONGA

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Diploma na mão e vontade de melhorar a situa-ção da cidade de sua infância, Francisca volta para Tarauacá. Seu desejo: “dar dias melhores aos jovens” - e para isso trabalhou duro. Saben-do que qualquer caminho que se direcionasse para um futuro melhor deveria, necessariamen-te, ser pavimentado com Educação, ela fundou escolas, implantou o Ensino Médio, foi professo-ra, foi diretora de escola. Por três vezes ocupou o cargo de Secretária Municipal de Educação e, atuando em sua função, foi a Rio Branco para conseguir um Curso Superior para a cidade. Conseguiu. Em 1989, Tarauacá ganha seu pri-meiro Curso Superior. Com um sorriso faceiro e orgulhoso no rosto Francisca diz: “Sou precur-sora da Educação aqui”.

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Formação de Supervisores, 2005, em Rio Branco.

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Acervo Projeto Poronga.

Material produzido na Formação de Supervisores de 2012

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um aliado

Em 2008, Francisca fez do Poronga seu aliado. Chamou os professores e gestores ao Núcleo de Educação e apresentou o projeto. A resistência foi grande, os professores não entendiam como aquela proposta poderia funcionar. Diziam: “como esse projeto vai conseguir em menos tempo o que nem sempre conseguimos em três anos?”. Francis-ca explicou a proposta, a metodologia e fez mais, acreditou, deu seu aval. E os professores, que con-fiavam naquela educadora, abraçaram a causa. “Ah, é assim? Então, vamos. Vamos despertar.” Foi preciso convocar também a confiança das famílias, “porque o aluno que está neste grau de defasagem nem as famílias mais acreditam”.

O voto de confiança dado pelas famílias e pro-fessores foi retribuído. No primeiro ano de pro-jeto, 360 estudantes participaram do Poronga, divididos em três escolas. Cinco anos depois, os dados falam por si: 1.354 estudantes passaram pelo Poronga e alguns destes já estão concluin-do o Ensino Superior em Rio Branco. Francisca avalia que a implantação do projeto melhorou de tal maneira a estrutura pedagógica das escolas que as colocou em posição de concorrerem ao Prêmio Gestão Escolar. “Uma já tirou o terceiro lugar!”, conta orgulhosa.

Francisca credita o sucesso do projeto a alguns fa-tores em particular: a formação continuada do professor e o minucioso processo de avaliação do estudante, que propicia um acompanhamento muito real da aprendizagem. Segundo Francisca, o encanto pelo ‘fazer pedagógico diferenciado’ do Poronga con-tagiou todos os envolvidos: equipes gestoras, pro-fissionais do núcleo, professores e supervisores e resultou em um “esforço conjunto que foi se incor-porando aos alunos”.

O verbo incorporar, usado por Francisca, traz o exato sentido da transformação que ocorreu nos jovens, ou melhor, que neles ‘tomou corpo’. Nas pa-lavras da educadora, “sentimos o aumento efetivo da autoestima. Eles se valorizaram; passaram a se colocar como cidadãos na estrutura social da esco-la e isso possibilitou uma aprendizagem mais afir-mativa e mais consciente. Acarretou uma mudança de valores. O estudante começou a ver a vida de outra forma, começou a colocar sentido na vida, a projetar perspectiva de futuro. Eles dizem que vão ser professor, médico, policial”.

Formação Continuada do Professor: É desenvolvida no início de cada módulo, com foco na construção de vínculos entre os educadores e na compreensão da estrutura e do funcionamento da proposta, de sua fundamentação teórico-metodológica, da importância da mediação pedagógica, do uso das mídias e da avaliação de aprendizagem no processo.

Na Metodologia Telessala™, a avaliação é diagnóstica e formativa. Ocorre durante todo o processo de aprendizagem e possibilita uma reflexão contínua sobre a prática do professor e a aprendizagem dos estudantes. Realizada por meio de diversas atividades e da observação e registro cuidadoso da construção de conhecimento do estudante e do grupo, considera também a prática de autoavaliação. O memorial é uma das formas mais eficazes de se promover a avaliação contínua da aprendizagem e do ensino.

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Por conta da idade, Francisca teve que dar entra-da em seu processo de aposentadoria compul-sória na Secretaria de Educação, porém nem se atreve a pensar como seria sua vida sem traba-lhar pela Educação. Pretende continuar exercen-do trabalho voluntário.

Francisca se diz uma apaixonada pelo o que faz. “Ontem mesmo” – nos conta ela -, “me ligou um jovem que eu encontrei uma vez em um bairro periférico muito pobre; ele estava estudando sentado em um pedaço de pau. A casa dele não tinha mesa, não tinha nada. Aquilo me chamou muita atenção. Um menino naquela situação de pobreza com dois livros na mão? Eu parei, con-versei com ele. Contou-me que estava fazendo o Ensino Médio com muita dificuldade, que a mãe havia ficado viúva e que ele a ajudava a criar os irmãos menores.” No dia seguinte a este encon-tro, Francisca foi à escola em que ele estudava, conversou com o diretor sobre a situação do me-nino e ofereceu seu apoio. Alguns anos depois o agradecimento veio naquele telefonema. Délcio, aquele mesmo que se equilibrava em um toco para estudar, contando que acabara de se formar em Física, em Rio Branco, e queria, com ela, divi-dir sua alegria!

Francisca convidou Délcio para trabalhar como professor de Ensino Médio em Tarauacá. Ela diz que quer ver esses jovens aos quais dedicou sua vida ocupando não só o lugar dela, mas todos os outros espaços sociais que quiserem. A essa ocu-pação ela dá o nome de futuro, o futuro que deseja.

Futuro Feito de coNtiNuidade

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assista na web ao vídeo da Francisca:http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1046

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12 Eu disse para mim mesma: é aqui que eu devo fi car! Eu quero isso para mim.

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Igreja São José, no Centro de Tarauacá.

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Problematização/Motivação:Trata-se de uma atividade que instiga o interesse pela aula, propiciando ao grupo um momento de refl exão sobre o conteúdo que será trabalhado. Permite, assim, diagnosticar o conhecimento prévio do grupo acerca do tema da aula.

menos. Tem ar de menina, seus olhos brilham com uma alegria juvenil. Quando fala não usa só a boca, usa o corpo inteiro.

Quando soube, no ano de 2008, que o Poronga se-ria implantado na cidade, Rosiane foi sem demora fa-lar com a diretora da escola na qual trabalhava como professora. A diretora relutou um pouco, “mas logo você, nossa professora de Matemática”. Rosiane insistiu: “eu quero conhecer!”. Contou que já no pri-meiro dia de formação se identifi cou com o projeto: “eu disse para mim mesma: é aqui que eu devo fi car! Eu quero isso para mim”. E assim aconteceu.

Rosiane nos conta que desde o início se entregou de corpo e alma ao projeto. Acordava cedinho para estudar, assistir às teleaulas e planejar as ativida-des, como as problematiZaçÕes, para seus estudan-tes, chamados carinhosamente por ela de “meus meninos”. Em sala de aula se empolgava com o tra-balho e, de volta, recebia mais empolgação. Seus meninos cresciam e suas conquistas prosperavam e, em uma franca relação de simbiose, ela também crescia e prosperava.

rosiane tem 33 anos, mas parece que tem muito

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Algum tempo depois de estar trabalhando como professora do projeto, Rosiane foi chamada para assumir a supervisão do Poronga em Tarauacá. Teria que expandir seus braços para abraçar, além da sua, outras salas de aula, outros estudantes e outros professores. Ela conta que o primeiro pen-samento que veio a sua cabeça ao ser convidada foi: “eu posso ajudar os outros professores!”. Algo bem longe dos sentimentos de medo e insegu-rança que normalmente afloram ao nos vermos diante de um desafio novo. Como é próprio de um espírito juvenil, Rosiane confiou mais em suas ha-bilidades e competências, mais em seu desejo de ajudar, do que temeu dificuldades que poderiam surgir no exercício da nova função. “Foi a primei-ra coisa que me veio, mas eu não tinha noção do que era o projeto como um todo – o administra-tivo, a questão pedagógica, a formação lá fora em Rio Branco – tudo...”, conta ela abrindo os braços como que para mostrar o tamanho da responsabi-lidade que sentiu.

Diante deste novo panorama, que reunia um le-que grande de atribuições, Rosiane, que na época estava grávida de sua segunda filha, nos conta que sabia que havia chegado a hora de fazer uma es-colha: “tocar o barco ou abandonar”. Ficou no bar-co. Aliás, fez mais do que ficar, se transformou em uma grande marinheira – daquelas que se incum-bem do plano de viagem, que apoiam e motivam a tripulação, que cuidam da embarcação. Uma marinheira ciente da importância que é, ao final de cada travessia, ancorar com segurança em um bom porto.

No dia a dia, essa navegação se traduz em muito trabalho: leitura de produções textuais, traba-lhos de reescritas de textos, estudo de conteú-dos e planejamentos com professores. Aos sábados, a supervisora e as professoras se reúnem para

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discutir sobre o trabalho desenvolvido durante a semana – o que deu certo, o que precisa melho-rar, o que está agradando aos estudantes - e, com base nesta avaliação, se preparam para a semana vindoura. Rosiane diz que ouviu muito no início: “Aprender alguma coisa em um ano, onde já se viu isso?”. A descrença se desfazia logo perante a evi-dência dos bons resultados e ela explica o porquê: “a metodologia faz com que realmente aconteça”. As conquistas dos estudantes ficam explícitas na grande diferença observada entre os primeiros registros e as produções feitas ao final do proje-to. Para Rosiane a forma como são trabalhados os conteúdos é fundamental para isso. “O con-texto em que os conteúdos são apresentados nos vídeos fazem com que a cognição do aluno tenha um avanço. Porque eles estão vendo que tem um significado, estão vendo onde eles vão poder usar aquele conhecimento, em que situações – e isso é que chama muito a atenção deles. E a reafirmação depois do vídeo, a leitura de imagem, de maneira criativa e lúdica: eles gostam muito. Então, isso tudo encanta.”

Exibição da Teleaula: Introduz os conteúdos da aula por meio de situações do cotidiano, dando uma abordagem objetiva e contextualizada aos conceitos. O emprego da dramaturgia, aliada a recursos como a animação e a reportagem, dá ao conteúdo um tratamento didático que enfatiza o papel da percepção e da emoção na construção do conhecimento.

Planejamento Coletivo: Momento em que os professores dialogam e refletem sobre suas práticas, sobre os resultados alcançados com a utilização dos programas de vídeo, dos materiais impressos e dos procedimentos didáticos que adotam. No Poronga, este planejamento é realizado semanalmente (aos sábados) e faz parte da rotina pedagógica de todos os professores.

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O sol do Poronga na vida de Maria Rosiane.

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assista na web ao vídeo da maria rosiane:

http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1048

Muitos ganharam com a decisão de Rosiane de ‘ficar no barco Poronga’: estudantes, famí-lias, professores, a cidade – e o próprio projeto como um todo. Porém, chama atenção o relato de Rosiane sobre sua própria transformação pessoal depois de entrar no projeto. “Antes eu era muito individualista, não via que por detrás as pessoas não são iguais, cada um tem as suas deficiências. O Poronga me ensinou a conversar, a entender o outro e não a entender só o meu lado. E o meu casamento, depois que eu entrei para o Poronga, ele se modificou da água para o vinho! É outra relação! É uma relação realmente harmoniosa, de respeito, de diálogo”, fala Rosia-ne abrindo os braços, e completa: “eu sempre falo nas formações de professores: os maridos apoiam o nosso trabalho! Eles se encantam tan-to pela dedicação que a mulher tem, que eles acabam se empolgando também”.

Rosiane diz que na casa dela todo mundo é “poron-gueiro” e que quando as pessoas dizem que ela é a cara do projeto não se espanta: “eu sou Poronga!”.

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Céu de Tarauacá.

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RIO BRANCO

Hoje nós prestamos assessoria para outros estados do Brasil. Então, a gente olha para trás e pensa: nós conseguimos! Um estado pobre, lá no Norte do Brasil, conseguiu fazer o dever de casa e ainda é convidado a compartilhar. É uma alegria poder dizer que revertemos esse indicador e que alcançamos nosso objetivo.

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Escola Alcimar Nunes Leitão, Rio Branco.

MEMÓRI A PORONGA

© Guanabaratejo

guesa, nordestina e turca, personifica o próprio retrato do Acre com todas as misturas que o tornaram um estado cheio de singularidades e personalidade.

Seu avô paterno veio de Portugal e se instalou na região de Sena Madureira. Lá era fazendeiro e foi um dos fundadores da cidade. Já o sangue nordes-tino que corre nas veias de Emilly, assim como em boa parte da população, é fruto da intensa migra-ção ocorrida no estado por conta do ciclo da bor-racha. Os seringais e suas borrachas também aju-dam a explicar a origem turca: os seringueiros, os seringalistas e as populações ribeirinhas morando, de uma maneira geral, isolados em locais de difícil acesso, eram abastecidos por toda sorte de provi-sões e mantimentos pelos chamados regatões - co-merciantes que descem os rios e regatos com um barco que é uma loja fl utuante. Por razões históri-cas e culturais, estes comerciantes eram, em geral, de origem árabe, turca ou libanesa.

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Emilly, fruto desta rica mistura, nasceu e morou em Sena Madureira até seus 14 anos, quando se mudou para a cidade de Rio Branco. Na capital, fez o Ensino Médio e depois o seu amor pela literatura a fez escolher a faculdade de Letras. Em 1998, en-trou para a rede pública como professora e conta que já nessa época ansiava por colocar em prática metodologias que não eram usualmente trabalha-das por professores especialistas em sala de aula. Ela se define: “Eu era uma professora que estava sedenta por conhecer novas formas de trabalhar e de pensar a educação”. Emilly não precisou espe-rar muito. “Em 2002, apareceu a oportunidade de nos inscrevermos para participar de um projeto ousado, avançado, arrojado, que estava chegando ao Acre para tratar dos alunos que estavam em distorção idade-ano. Era um projeto pensado para essa realidade, com uma metodologia fabulosa, dinâmica e eficaz e de pronto eu me candidatei a uma das turmas.”

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É uma alegria poder dizer que revertemos esse indicador e que alcançamos nosso objetivo.’’

Depois o encantamento inicial de Emilly só fez aumentar ao mesmo tempo em que iam caindo por terra todas as dúvidas e o projeto seguia em frente, quebrando paradigmas e transfor-mando a vida das pessoas. “Em um primeiro momento, houve certa resistência em se acei-tar a possibilidade de um professor unidocente no segundo segmento do Fundamental. Essa questão foi muito discutida, principalmente pela universidade (e também pelo sindicato e pelo Conselho Estadual de Educação), porque a visão que a universidade passava era a de que nós deveríamos ser especialistas de um con-teúdo e de que não poderíamos promover a construção de um conhecimento a partir desta provocação como mediadores de um processo. Este estigma que foi quebrado.”

Emilly conta que quando foi apresentada ao pro-jeto, na primeira formação, foi tomada por dois sentimentos: o encantamento e a dúvida. “Será que é possível? Será que sou capaz?” Resolveu verifi car na prática se a tal ‘proposta arrojada’ realmente poderia transformar a educação do Acre ou se, como diziam alguns grupos resisten-tes à ideia, era mesmo “um modismo que não iria durar mais de um ou dois anos”. Emilly apostou desde o início na primeira opção e não errou. Dez anos depois da implementação do projeto, o Estado não só é tido como exemplo por ter con-seguido reverter um quadro de fracasso escolar como também é convidado a compartilhar com outros estados da federação sua experiência e boas práticas. “Hoje nós prestamos assessoria para outros estados do Brasil. Então, a gente olha para trás e pensa: nós conseguimos! Um Estado pobre, lá no Norte do Brasil, conseguiu fazer o dever de casa e ainda é convidado a compartilhar.

Ponte Juscelino Kubitschek sobre o Rio Acre ao pôr do sol, em Rio Branco.

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1 O Asas da Florestania é um projeto de escolarização que oferece do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental para estudantes que concluí-ram o 5º ano e residem em áreas rurais de difícil acesso. Sua principal finalidade é garantir às populações rurais e ribeirinhas ensino de qualidade com metodologias de ensino adequadas às realidades locais.

a trajetória do poroNga

O Poronga nasceu em 2002 como uma experiên-cia somente na capital Rio Branco para o Ensino Fundamental. Em 2005, foi expandido para o En-sino Médio e também para as áreas rurais de difí-cil acesso dentro do Estado. Este último, por suas características peculiares, recebeu uma alcunha afetiva: Asas da Florestania1. No ano de 2008, o Poronga alcançou outros municípios do interior do Acre, como Tarauacá e Cruzeiro do Sul e nin-guém melhor para nos contar toda essa história do que Emilly. Não apenas porque ela fez e ainda faz parte dela, mas também porque exerceu dife-rentes funções dentro do projeto: esteve em sala de aula como professora do Ensino Fundamental, foi supervisora do mesmo segmento e hoje está como coordenadora geral. Emilly se diz privile-giada porque pôde contribuir com a prática de outros professores falando a partir de sua própria experiência em sala de aula. “Como professora co-nheci, por vivência direta, os desafios reais da sala de aula, quais são as dificuldades que o meu aluno enfrenta e quais as dificuldades que eu, como pro-fessora e mediadora deste processo de constru-ção de conhecimento me deparo.”

As situações reais do dia a dia com as quais se deparava a impulsionaram a estudar ainda mais para poder entender a própria prática e com isso contribuir, de fato, com o professor que estava orientando. “Eu costumo dizer que minha práti-ca enquanto gestora de educação nasceu com o projeto Poronga.”

Emilly avalia que a forma como ocorreu o proces-so de implementação do projeto contribuiu de for-ma significativa para seu êxito. Primeiro porque o Poronga não veio como algo impositivo, as escolas que tinham altos índices de distorção idade-ano foram apresentadas à proposta e as ideias foram amplamente discutidas pela comunidade escolar. Com isso, a adesão ao projeto se fundou no co-nhecimento, na confiança e no desejo de partici-par de um momento importante de transforma-ção da educação no Estado.

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O segundo motivo destacado por Emilly foi o trabalho de valorização da cultura do Acre, que segundo ela, antes do Poronga, estava “apagado, largado”. Nas palavras da educadora, “o projeto teve um papel muito importante. Ouviu pessoas que têm uma história importante dentro do Esta-do. As danças, os artistas locais, que representam e materializam a nossa cultura, a nossa arte, e que têm algo de muito peculiar. O Caderno de Cultura do Acre nasceu como fruto dessa escuta e da ob-servação das pessoas do local, da comunidade. Foi realizado um levantamento, um resgate cultural importante. Devolveu ao Estado uma identidade própria. Isso é interessante porque até então aqui quase nada se trabalhava sobre a nossa cultura. O Poronga entregou para cada aluno um caderno que foi trabalhado em sala de aula e eles se identi-ficaram; aquilo realmente os representa!

“A poronga é a síntese do que é a nossa história, desde a fundação, nossos avós, a história da imi-gração do povo nordestino no Acre, ou seja, é a nossa raiz. A própria alusão do instrumento po-ronga à metáfora que transmite, que é a luz (a oportunidade, o caminho). Tudo isso foi sempre cheio de muito significado.”

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As histórias do Poronga e de Emilly estão tão conectadas que ao se falar de uma necessaria-mente estará se falando da outra. A tal ponto que, no Acre, não é mais o sobrenome ‘Areal Melo’ que identifica a educadora. Para todos ela é a ‘Emilly do Poronga’.

Como hoje se dedica à coordenação geral do projeto Poronga no Estado do Acre, Emilly tem em suas mãos grandes responsabilidades. Ela, assim como todos os outros educadores que participaram e participam do projeto, se sente satisfeita e realizada com o êxito na reversão dos indicadores negativos no Ensino Fundamental que, em 2002, ultrapassava mais da metade das

hiStóriaS que Se miSturam

matrículas dos estudantes do segmento. Diz, com plena consciência do propósito do Poronga, “o sucesso do projeto é que ele acabe. Ele nasce para morrer, porque o indicador idade-ano é um indicador indesejado: isso representa o fracasso escolar. E, no Ensino Fundamental, nós chega-mos a um nível considerado aceitável se a gen-te for olhar para o Brasil como um todo”. Para Emilly a reversão deste indicador é importante pelo que representa: que a inclusão social está acontecendo e que por isso as histórias de vida agora são outras. Segundo ela, “o indicador é só um resultado final de toda a prática empreendi-da pelo professor, pelo supervisor e pela equipe pedagógica do programa”.

Escola Clínio Brandão, Rio Branco.

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MEMÓRI A PORONGA

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assista na web ao vídeo da emilly:http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1031

A troca permanente entre os professores do Po-ronga com os professores do ensino básico, dentro dos espaços escolares, contribuiu para o fortale-cimento de uma concepção renovada de aborda-gem educacional, dentro do ensino básico. Este já começa a tomar para si a responsabilidade de manter baixos os índices de distorção idade-ano abrindo espaço para Emilly assumir novos desa-fios. Isso porque a satisfação pelo resultado obtido não estancou seu desejo de realizar, de fazer o seu melhor pela Educação. Agora, ela arregaça ainda mais as mangas e dirige sua força de trabalho para o Poronga Ensino Médio. “Temos ainda 35% de alunos em situação de distorção neste segmento no Acre. Estamos fazendo um trabalho bem gran-de, um esforço bem expressivo para darmos con-ta agora também do Ensino Médio.” Emilly, com a experiência de quem já comprovou na prática que é possível acreditar sempre na capacidade de se fazer melhor, acrescentou mais um degrau ao em-penho. Ela quer que os estudantes vejam o Ensi-no Médio como o início da caminhada e não como ponto final. E deixa um recado para eles: “É impor-tante a gente entender que a educação tem que estar a serviço da vida e a metodologia do projeto nos permite vivenciar papéis e momentos onde isso acontece. É preciso viver em comunidade, é preciso compartilhar, é preciso avaliar, é preciso dividir. Levem para suas vidas essa experiência porque ela não morre aqui. Ela é só um início e ela caminha com vocês para sempre”.

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Calçadão da Gameleira, em Rio Branco.

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estudo | alegria | foco | autoridade

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13 O Poronga me ensinou a ser uma professora dinâmica, porque até então a gente era giz-lousa, falar,livro didático e ponto.

CRUZEIRODO SUL

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Escola Maria Lima de Souza , em Cruzeiro do Sul.

tal, sua mãe decidiu que ela iria terminar seus es-tudos em Cruzeiro do Sul. Mary fi cou triste por-que sabia que isso signifi cava fi car longe de seus amigos e de sua bola. “Minha mãe era uma mu-lher sábia, tão inteligente que não sei nem como descrever. Ela foi meu norte. Gostava muito de ler, a vida dela era ler.”

Em Cruzeiro, Mary fez Magistério pensando em voltar para Ipixuna, mas acabou fi cando por lá para fazer Pedagogia. Com 23 anos, um mês depois de terminar a faculdade, enfrentou seu primeiro desafi o profi ssional: dar aula em um mu-nicípio próximo que estava sofrendo com a falta de professores. “Era uma turma de 3º ano de Ma-gistério, de adultos. Fiquei com medo. Era jovem, inexperiente. Foi uma experiência sensacional, trabalhei um mês e aprendi muito com a turma.”

de vida e dez de profi ssão. Nasceu no Amazonas, na cidade de Ipixuna, onde, na época, as parteiras eram irmãs franciscanas. A irmã que fez o par-to era americana e pediu que o nome da menina fosse Maria, só que em inglês. A mãe, que já havia escolhido um nome, Clicia, resolveu juntar os dois: nascia Mary Clicia.

Mary conta que passou uma infância maravilhosa em Ipixuna junto com seus oito irmãos. Brincava muito, adorava jogar bola - qualquer modalidade: futebol, vôlei, basquete. “Quando eu estava no 9º ano, às vezes, matava aula para jogar no time de vôlei do qual fazia parte. Meu pai fi cou muito bra-vo quando descobriu e eu quase fui reprovada em Matemática, justamente a matéria que mais perdia.” Quando completou o Ensino Fundamen-

mary Clicia, ou Mary como é chamada, tem 32 anos

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de corpo iNteiro

Margens do Rio Juruá, em Cruzeiro do Sul.

Em 2006, Mary conheceu o Poronga pelo seu braço que atende ao interior do Estado, chamado Asas da Florestania. Conta ela: “o Poronga me en-sinou a ser uma professora dinâmica, porque até então a gente era giz-lousa, falar, livro didático e ponto. O Poronga veio e me apresentou uma pro-posta nova de cartazes, de leitura, de trabalhar com imagens, com TV, vídeo/DVD. Essa expe-riência com a metodologia mudou completamen-te minha visão do que era ser professora. Com-pletamente! Completamente! Eu, basicamente, esqueci o giz e o quadro. Aquela noção de que o professor é só chegar e falar, falar, falar, só teoria, blábláblá acabou!

A forma lÚdica de trabalhar com várias linguagens que o Poronga me mostrou fez ser o que sou hoje!”.

Depois de dois anos trabalhando no interior, Mary foi ser professora do Poronga em Cruzeiro do Sul. “Eu fi quei tão feliz! Abracei o Poronga com o meu corpo inteiro.” A diferença que ela sentiu em rela-ção ao trabalho feito pelo no interior foi a questão da distorção idade-ano. Lá a maior parte dos estu-dantes tem a idade correta para seu ano. Ela conta que se sentiu desafi ada a ser uma professora ain-da melhor para conseguir que estudantes, vindos de uma história de reprovação, baixa autoestima e indisciplina se sentissem motivados a aprender e continuar os estudos. Para isso, Mary não poupou esforços: estudou muito e se dedicou a entender seus estudantes, para dar a atenção que cada um deles precisava. Fez da metodologia sua aliada e observa que a organização dos estudantes em cír-culo em sala de aula, substituindo a maneira tradi-cional em que um fi ca de costas para o outro, tem um impacto grande na forma de se pensar a rela-ção ensino-aprendizagem. Segundo ela, “o profes-sor no meio do círculo não é a fi gura mais impor-tante, mas simplesmente um integrante do grupo, que está ali para ensinar e aprender com a turma”.

Socialização das Aprendizagens: É o momento onde são compartilhadas as aprendizagens construídas sobre a temática trabalhada. A produção coletiva é apresentada por meio de diferentes linguagens (plástica, cênica, musical, escrita, oral, entre outras) e o conteúdo pode ser complementado, enriquecido e ampliado, transferindo essa aprendizagem para o dia a dia dos estudantes.

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Mary destaca duas etapas da metodologia que a ajudaram muito: o memorial e o Trabalho das Equipes. O acompanhamento do Memorial de cada estudante lhe dava um retorno sobre o que cada um estava sentindo em relação às aulas, auxiliando no planejamento das aulas seguintes. E o mais importante, a leitura dos memoriais a conectava com a história de seu estudante. Já o Trabalho das Equipes quebra nos estudantes a postura individualista que frequentemente demonstram nos primeiros dias de aula. “Mos-tramos a eles que quando duas, três, quatro ca-beças estão juntas pensando, o trabalho sai me-lhor. Com a junção de ideias diferentes, ele fica mais rico.” Em sala de aula Mary e os estudantes criaram o projeto Momento da Notícia: cada dia, uma equipe teria que apresentar uma notícia atual – do mundo, do Brasil ou regional - para a turma. “Podíamos ver o progresso dos alunos que chegavam quietos, tímidos e pouco a pouco iam se soltando.”

Hoje, Mary é coordenadora pedagógica de Ensi-no Fundamental 1 da escola na qual foi professora do Poronga e diz que a metodologia continua viva dentro dela: “não tem como eu deixar de levá-la para a minha vida toda!”.

O Memorial possibilita o registro das aprendizagens construídas e, portanto, a refl exão sobre elas. Quando fruto de uma construção coletiva, o Memorial promove a refl exão do grupo sobre si próprio, reforçando habilidades de convivência e cooperação, ajudando cada um a se perceber não apenas como agente de sua própria aprendizagem, mas também da aprendizagem de todos.

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assista na web ao vídeo da mary clicia:

http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1050

Cicleata Poronga pelo Centenário da Revolução Acreana, em 4 de agosto de 2003.

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Igarapé Preto, em Cruzeiro do Sul

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» TRAJETOS: Cruzeiro do Sul / Tarauacá.

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13 Antes eu não pensava que estaria onde estou hoje, sem estudo a pessoa não é nada. O Poronga me ensinou a ser mais alegre e me fez entender que é possível se divertir ao mesmo tempo que se aprende.

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Maria Gleiceane durante a entrevista.

fl ores onde trabalha há dois anos. “Carteira as-sinada e tudo”, diz ela sem esconder a alegria. E foi neste ambiente colorido e suavemente perfu-mado que ela nos contou sobre o que signifi cou a experiência do Poronga para sua vida. “Antes eu não pensava que estaria onde estou hoje, sem es-tudo a pessoa não é nada. O Poronga me ensinou a ser mais alegre e me fez entender que é possí-vel se divertir ao mesmo tempo que se aprende.”

Gleiceane e seus outros três irmãos nasceram em Tarauacá, porém, como seu pai era agricultor, vi-veram muitos anos na zona rural. Como a escola onde estudava ia somente até o 6º Ano e ela que-ria continuar estudando, conta que “fi cava indo à aula como ouvinte, gostava de estar com meus amigos e também das aulas de Biologia”.

Fomos nos encontrar com Gleiceane na loja de

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Avaliação do Dia: Realizada no final de cada aula, promove uma escuta de forma ética e criativa, a partir de critérios estabelecidos em grupo. Indica necessidades de retrabalho relacionadas aos conteúdos construídos e ao comportamento do grupo de aprendizagem. Pode ser proposta e conduzida pela equipe de avaliação. Os encaminhamentos dos desafios propiciam a auto-condução, a corresponsabilidade e a autoavaliação de conteúdos específicos e atitudinais.

Atividades Integradoras:São vivências coletivas que fazem uso das diversas linguagens para iniciar o trabalho diário da sala de aula. Tais atividades conjugam o poético, o lúdico e o científico, alimentando os laços para uma convivência ética, saudável e cidadã.

Para não agravar a sua situação de defasagem idade-ano, Gleiceane se mudou para a cidade de Tarauacá para prosseguir seus estudos. Lá morou com sua irmã mais velha, que na época já era casada, e que lhe deu muito apoio nos estudos. Gleiceane, sempre com um sorriso no rosto, nos contou como foi seu primeiro dia de aula no projeto Poronga, no qual se matriculou logo que chegou: “a professora pediu que todos se apresentassem e fez uma di-nâmica integradora - aí eu já fui gostando! - depois assistimos à teleaula e no final a professora pediu que avaliássemos o dia”. Gleiceane nos disse também que no dia a dia do Poronga gostava bastante de participar da equipe de avaliação e da de socializa-ção. E, demonstrando que não perdeu o hábito de avaliar, dá a sua opinião sobre a metodologia que utilizaram. “Acho que o trabalho das equipes aju-dou muito na interação entre nós alunos e também para nos mostrar o quanto é importante respeitar o espaço dos outros”.

Outra aprendizagem que Gleiceane destaca é o desenvolvimento da capacidade de olhar para os problemas da cidade de uma forma diferente, mais consciente. “Aprendi a fazer boas redações, gosta-va de escrever sobre racismo, poluição. Certa vez, eu escrevi sobre a questão do lixo em Tarauacá, as pessoas estavam jogando muito lixo nas ruas, então a minha redação abordou a necessidade de conscientização das pessoas em relação a este pro-blema da cidade. A escola me ajudou a perceber problemas como este. A gente saia às ruas entre-vistando pessoas e isso era bom para termos no-ção do que estava acontecendo. Por exemplo, não saberíamos do problema da água na localidade do bairro da Praia se não tivéssemos ido lá pesquisar.”

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Escola Neutel Maia, em Rio Branco.

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assista na web ao vídeo da maria gleiceane:

http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1052

Gleiceane, agora com 23 anos, casada e mãe de Guilherme, de cinco anos, diz que o Poronga foi muito importante para ela: “hoje eu sou uma pes-soa mais madura. Hoje eu sou mulher que traba-lha, que tem família e que pretende ir mais além. Meu desejo é conseguir fazer faculdade de Biolo-gia e ser professora”.

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13 Eu gostava muito da maneira como os conteúdos eram passados para a gente, em uma linguagem bem jovem e no nosso contexto do dia a dia. Eu gostei muito da metodologia, dos trabalhos em grupo, da maneira de a gente debater o que tinha visto.

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Logo após o nascimento, Maria Inês voltou para o seringal onde viveu até os quatro anos, quando sua mãe decidiu se separar de seu pai e deixar o lu-gar junto com os filhos menores. Então, mais uma vez, porém em uma condição diferente da primei-ra, a menina pegou uma canoa para a cidade de Feijó, acompanhada de um irmão de dois anos e da mãe, grávida de três meses. Como não consegui-ram lugar para ficar em Feijó partiram (a pé!) para a próxima cidade, Tarauacá. Foram doze horas de caminhada. Em Tarauacá, depois de um tempo morando com um primo, conseguiram uma casa de um projeto de moradia da prefeitura. “Depois vieram todos os outros meus irmãos (são doze ao todo). A casa ficou cheia! A casa tinha só um cômo-do e mais uma área para a cozinha. Tinha só uma cama de casal onde dormíamos com a minha mãe – eram cinco na cama e o resto em redes. É a casa que moramos até hoje! Mas agora cada um tem sua cama, suas coisas.”

Maria Inês conta que sua infância foi muito boa e que, mesmo passando por dificuldades, ela e os ir-mãos aprenderam com a mãe a sempre agradece-rem o que tinham, pois sabiam que muitas pessoas passavam por dificuldades ainda maiores.

postura e voz de mulher madura.

Encontramo-nos com Maria Inês para uma con-versa no escritório de contabilidade no qual trabalha desde setembro de 2012. Antes deste trabalho foi estagiária por 1 ano e 7 meses em agência bancária de Tarauacá. Ganhou o estágio logo que ingressou no Ensino Médio como re-conhecimento pela sua dedicação aos estudos. Sentada em sua mesa de trabalho e munida de um vocabulário rico e de uma fala articulada, Ma-ria Inês nos contou o que a vida fez dela e o que ela fez da vida nestes 18 anos.

Os pais de Maria Inês moravam em um seringal de difícil acesso chamado Israel. Às vezes, eram necessários três dias para se chegar de canoa a Feijó, cidade mais próxima. Pois bem, prestes a dar à luz, sua mãe empreendeu a longa viagem, mas a menininha Maria Inês deu os ares de sua graça ao mundo na canoa mesmo, antes de che-gar à cidade. “Nasci em um lugar bem inusita-do!”, conta rindo e emenda: “em pleno sol quen-te, sem proteção, sem nada, porque era uma canoa pequena”.

maria Inês tem 18 anos. Rosto e sorriso de menina,

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No ano que chegou à escola para iniciar o 8º ano soube que sua mãe a matriculara em um projeto chamado Poronga. Ficou furiosa. “No primeiro momento, me revoltei. Disse: não quero. Mas aí soube que quem me daria aula seria a professora Rosiane, minha professora no 7º ano, então resol-vi ir ao primeiro dia... e gostei! Cheguei em casa e disse: “mãe é bem diferente do que eu pensava!”.

Maria Inês diz que gostava das teleaulas. “Elas prendiam a nossa atenção, porque nesta fase todo mundo gosta de televisão, tudo o que envol-ve mídia jovem gosta! Além disso, eu gostava mui-to também da maneira como os conteúdos eram passados para a gente, em uma linguagem bem jovem e no nosso contexto do dia a dia. Eu gostei muito da metodologia, dos trabalhos em grupo, da maneira de a gente debater o que tinha visto.”

Ela nos revela que, como estudante, mesmo antes do Poronga, sempre se esforçou muito. Em suas

o telecurSo

palavras: “me esforcei até para recompensar um pouco a minha mãe e ter um futuro melhor, com melhores condições de vida”. Diz, com uma cons-ciência clara do processo pedagógico, que a inten-ção dela ao estudar não era tirar boas notas e sim “adquirir novos conhecimentos, adquirir de verda-de os conhecimentos ali passados”. Ao entrar no Poronga, essa dedicação aos estudos só aumen-tou. Sentia-se ainda mais animada por fazer parte de algo novo, que não havia antes ali na cidade.

Se do Poronga Maria Inês nunca havia ouvido falar antes de entrar, o mesmo não acontecia com as te-leaulas do Telecurso, que ela acompanhava de ma-drugada pela televisão. “Muitas vezes minha mãe falava: menina vai dormir! E eu acordada em fren-te à televisão. No dia seguinte, na escola, quando o professor ia passar um assunto eu já estava com ele na ponta da língua”, conta, se divertindo como se houvesse feito uma traquinagem que lhe fi cou marcada na lembrança.

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MEMÓRI A PORONGA

Escola Raimundo Gomes de Oliveira, em Rio Branco.

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assista na web ao vídeo da maria inês:

http://www.telecurso35anos.org.br/?p=1054

Maria Inês pretende continuar seus estudos e pensa em cursar a faculdade de Contabilidade, pois tomou gosto pelo ofício no dia a dia do es-critório. Diz que adiou um pouco seu sonho de infância: ser engenheira química. “É minha vonta-de desde criança, nem sei o porquê, mas aqui no Acre não tem.”

Para aquelas pessoas que estão estudando ou pensam em começar a estudar, Maria Inês deixa uma mensagem: “eu queria dizer para não desis-tirem nunca, apesar de todas as dificuldades que irão passar, tenham calma. Eu aprendi uma vez que todo problema tem solução porque se não tem solução não é problema.”

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» TRAJETOS

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Reprodução artística de uma poronga.

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Eu conto porque creio nas palavras. Creio na sua amorosa substância. Creio que, como gestos – e é ela outra coisa mais ou menos do que um gesto? - a minha fala cria laços. Eu, que me dou quando confesso minha vida, uma fra-ção silenciada antes dela, enlaço o outro. Trago-o para mim. Não apenas eu nunca serei o mesmo, porque narrei a ele, mas ele também. Ele nunca será o mesmo (…). Agora somos.” (Brandão, 1998)

A memória é algo em movimento permanente; às vezes, está sujeita ao esquecimento, a interpretações diferentes, a múltiplos olhares sobre um mesmo fato. É ela que vai selecionando. Ela seleciona o que devemos lembrar, o que é importante para cada um de nós, o que é preciso guardar ou esquecer, impregnando, muitas vezes, com os nossos afetos, os acontecimentos marcantes da vida de cada um de nós.

Na minha infância no Acre, tive a sorte de ter avô e avó, contadores de história, e convi-ver com alguns vizinhos narradores de mitos, lendas, causos, histórias de assombração e alguns que eram verdadeiros cronistas dos acontecimentos do Estado. Muitas dessas pessoas eram seringueiros, extrativistas da floresta e dos rios, das bacias hidrográficas do Purus, de Juruá e do Alto Acre. São experiências de aprendizagens, tanto as formais como as vivenciadas em casa com a família como as observadas na comunidade. Um banquete de substância, de conteúdo, definidores de minha formação.

Exerço, hoje, a função de contador de histórias, um narrador, aquele que narra a dor, as dores humanas, que são de todos, homens e mulheres. Claro está que incluem os bons e maus sentimentos, as perdas e primordialmente as vitórias, as conquistas. Desenvolvo então um trabalho com a oralidade e as escrituras que chamamos de oratura. Portanto, considero-me um narrador e escritor, pesquisador e mediador de leitura. Leitura nes-se sentido amplo que traz a voz, o corpo, traz sensações, emoções e imagens sobre os contextos culturais que me formaram; minhas andanças, minhas circunstâncias, minhas observações e desejos.

Bom, caros leitores, são estas as minhas intenções e atuações no mundo. Talvez por isso tenha sido chamado aqui para me pôr na escuta das muitas vozes, mediar uma conversa entre textos, e aqui e ali, trazer também um dedo de prosa.

Então, conterrâneos amigos acreanos, aqui estou, pronto para ler vossas histórias fa-ladas e escritas e me fazer em cantos de alegrias e encantamento, pedindo licença a todos, consentimento mesmo, para adentrar nesse universo da vida do Poronga: luz para iluminar os varadouros e as águas do Acre.

daqui de meu lugar, eu Sou poroNgaFraNciSco gregório Filho

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Logo de início, me aproprio do depoimento da professora Maria Rosiane para anun-ciar também: eu sou Poronga! Sim, por-que em muitas madrugadas ligo a televisão e assisto aos programas do Telecurso. Revejo coisas que aprendi na escola, encontro novos assuntos. Ponho-me a imaginar quantas outras pessoas estão nesse mesmo exercício, se integram e interagem com os conhecimentos ali veiculados.

Sou Poronga também porque nas narrativas e nos depoimentos aqui deste caderno me identifico e encontro um tanto da minha própria história. Pedi então aos gestores do Poronga que me permitissem participar desta edição com palavras grávidas de emoção e sentidos de mundo, como bem pronunciava nosso mestre saudoso Paulo Freire.

Numa primeira leitura, e com um olhar mais distanciado, me saltou uma terceira mar-gem bem palpável e visível com as histórias aqui contadas. Uma terceira margem do rio ou dos rios do Acre para essas pessoas (educadores e educandos) que se ilumina com a luz da Poronga, no caso, com a iluminação do projeto – a escolarização.

Como na história de Samoel, catraieiro, que ajudando as pessoas a atravessarem o Rio Acre de uma margem a outra, encontrou outra margem: a escola – uma escola dife-rente que o acolheu com respeito e ofereceu as condições de explorar seu potencial e, como ele mesmo disse, “tinha pressa de ver as coisas acontecerem”. Sua narrativa, sua história, quase história de todos nós, habitantes do Estado, se embaralha com a da coordenadora Emilly, quando lhe agradece o estímulo para perseverar no estudo. A mestra coordenadora, por sua vez, vê sua trajetória de educadora se confundir com a própria história do projeto no Acre. Nele, foi professora e supervisora, vivenciando todas as suas etapas, o que lhe conferiu o título de “Emilly do Poronga”.

E é ainda a Emilly que fala da poronga como sinal da cultura local. Sinal de luz, de encon-tro do caminho. Aí penso que ela talvez esteja falando do conceito de florestania, que aos poucos testemunhei crescer no Acre, que foi tomando corpo e despertou as pessoas para uma nova forma de cidadania, uma cidadania que reconhece e valoriza os próprios sabe-res, a sua cultura e que confere a elas um sentimento de pertencer a algum lugar.

No relato do escritor Euclides da Cunha, que fez parte da comissão brasileira de re-conhecimento do Alto Purus, lá nos idos de 1905, já se avista esse reconhecimento que só aos poucos e muito mais recentemente temos feito de nós mesmos: “Os nossos olhos deslumbrados abrangiam, de um lance, três dos maiores vales da terra; e naquela dila-tação maravilhosa de horizontes, banhados no fulgor de uma tarde incomparável, o que eu principalmente distingui, irrompendo de três quadrantes e trancando-os inteiramente – ao Sul, ao Norte, ao Leste – foi a imagem arrebatadora de nossa pátria que nunca imaginei tão grande.” (trecho de entrevista ao Jornal do Commercio, Manaus, 29.10.1905)

Os depoimentos aqui presentes sejam de professores, supervisores ou de estudan-tes, são repletos do deslumbramento da descoberta do conhecimento, memórias

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afetivas desse momento. São informações sobre significativas experiências de vida e de vivência no projeto. Cada um, a seu modo, me permitiu formar um mosaico rico de muitas histórias, de boas memórias que se entrelaçam e acabam por contar uma mesma história por pontos de vista diferentes.

Como o da professora, a Mary, amazonense de Ipixuna, que, sobre sua vida pessoal diz a mãe foi “seu norte, uma mulher sábia, que gostava muito de ler, a vida dela era ler”; e completa, falando sobre sua experiência no projeto, afirmando “ele me fez ser o que sou hoje” e que a metodologia a fazia conectar-se com a história de seu estudante.

Ou ainda, da Divânia, supervisora do projeto em Epitaciolândia, que nos presenteia com uma afirmação de tirar o fôlego: “assim como acontece com o estudante, para que eu entenda as dificuldades dos professores, preciso pegar seus olhos emprestados e me colocar em seu lugar”.

E, então, o que dizer do depoimento da professora Célia: “aos olhos de algumas pessoas eu posso não ser muito, mas eu sou muita coisa! Eu sou professora!” Tem também a Fran-cisca e a Vorrosa que se orgulham do trabalho que fazem por seus estudantes.

E que mulheres são essas afinal, tão fortes que se movimentam tão seguras pelos ca-minhos da vida e do projeto? Mulheres que fazem de seus esforços para a escolariza-ção contundentes exemplos de luta por suas autonomias e conquistas para a qualida-de cidadã. Pontuam o exercício solidário, físico e intelectual para construir uma rede de fé no salto positivo de todos. Mulheres que não conhecem o termo “desistência” e bordam, com seus braços e corpos, ações de persistência; mulheres cujos olhos en-xergam caminhos que derrubam obstáculos com garra e força de vontade.

Essa renda, esse bordado, esse tecer que é desenhado mais explicitamente pelo olhar feminino, seja como professora, ou coordenadora e mesmo como estudante, irradia a energia necessária para que também os homens se espelhem e se dediquem com firmeza ao processo de superação de preconceitos e do senso comum. Instiga-os a lutarem por seus triunfos escolares como prêmio e valor a ser distribuído às famílias e outras pessoas que os acompanham.

São esses olhares aguçados para compreender o outro, os outros como diferentes, com seus saberes próprios, que possibilitam ao professor promover circunstâncias favoráveis de aprendizado a seus estudantes, a favor de que se tornem sujeitos pro-tagonistas de uma memória pessoal, social, política e cultural. E se resta dúvida sobre essa condição de escuta, vale a fala de Evinaldo, antigo estudante do Poronga e, hoje, diretor de escola: a função de diretor exige um constante e atento olhar para o outro.

Por intermédio das vozes dos estudantes, me é dado conhecer mais das intenções do projeto, mais que se lessem seus manuais. Falam de uma metodologia que instiga;

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de uma dramaturgia, uma brincadeira que parecem incentivar essa costura do saber ler para além das letras e das circunstâncias. Fala então a Maria Gleiceane sobre seu primeiro dia de aula: “aí já fui gostando!” Ou o Altevir, que retomou os estudos, já adul-to, e conta seu contato inicial com o projeto: “gostava dos momentos de reflexão que os professores propunham”.

Assim como a estudante Maria Inês, primeiro fiz o curso técnico de Contabilidade como uma passagem, um rito, para depois buscar oportunidade para estudar o cur-so do desejo, do sonho. Ela quer estudar engenharia química, mas como não existe essa possibilidade por agora, dedica-se a estudar contabilidade, ou seja, continua no livro borrão a fazer balanços aqui e acolá, e extrair do banco o saldo, após subtrair as despesas e chegar ao líquido – o lucro. Lucro de aprendizagem e de abertura para outros horizontes. Contabilidade que ajuda a contar o que falta e o que já foi ganho. Contabilidade que oferece a imagem do balanço da canoa nas águas dos rios e suas margens, a espreitar e nos lembrar que precisamos saltar para outras. Por meu lado, mais tarde fui fazer teatro!

De novo, peço o consentimento dos amigos leitores para trazer aqui o mestre edu-cador, professor Carlos Rodrigues Brandão, que nos ajuda a pensar a educação da diferença. Falando sobre sua vivência nos movimentos de educação popular no país, ele afirma que “em alguns lugares, algumas vozes começaram a pensar diferente. Elas re-tornavam à ideia antiga, tantas vezes silenciada, de que educar é fazer perguntas. De que ensinar é criar pessoas em que a inteligência venha a ser medida, mais pelas dúvidas mal formuladas, do que pelas certezas bem repetidas. De que aprender é construir um saber pessoal e solidário, através do diálogo entre iguais sociais culturalmente diferenciados.” (Brandão, 2001)

O que se quer é o prazer de reencontrar os estudos, a alegria de incluir nos afazeres essenciais de cada um, o ir ao encontro dos outros que ensinam e aprendem também. Um regresso que compreende uma etapa de tempo para processar e ordenar uma trajetória pelos varadouros de novos horizontes e mostrar a possibilidade de saída do novelo, de uma circularidade fechada para uma circularidade que aponta para novas opções, tendo como terreno o estudo, a leitura.

São o ler, o escrever e o fazer contas para melhor pensar e argumentar o mais precio-so entendimento de convivência. Acreanos associados nessa árdua tarefa de acredi-tar no fazer de todos para o comum crescimento de seus potenciais.

Acordar essa capacidade que é de todos e não só de alguns – de querer descobrir, descortinar novos mundos mesmo permanecendo no território de terra e águas. Corações e mentes abertos, potencializados para o foco de interesse – da supera-ção. Parecem dizer da vontade e do desejo de uma educação para o Acre que mostre caminho por onde se pode alcançar o desenvolvimento com harmonia de homens e

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reFerêNciaS

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Memória Sertão; cenários, cenas, pessoas e gestos nos sertões de João Guimarães Rosa e de Manuelzão. São Paulo: Editora Cone Sul; Ubera-ba: Editora da Universidade de Uberaba, 1998.

________. De Angicos a ausentes: 40 anos de educação popular. Porto Alegre: Mova, 2001.

Leitores a Caminho: formando Agentes de Leitura. Org. Eliana Yunes. Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio, 2011.

Francisco Gregório Filho é autor e contador de histórias. Atualmente, mora no Rio de Janeiro e desenvolve oficinas de Práticas Leitoras e as Narrativas com os Educadores Sociais e Promo-tores de Leitura. Exerceu, por três vezes, como titular- a pasta da cultura no Acre. É membro da Academia Acreana de Letras. Ainda é um brincador, confecciona pipas e as empina para que possam voar bem alto.

mulheres com a natureza. Que quer ajudar a vislumbrar um empreendedorismo com sustentabilidade no presente e, especialmente, no futuro, sempre num fazer com o outro, os outros que se somam e se distribuem.

No meu ofício de contador de histórias, creio que uma história sempre acorda outras, convidando para o diálogo, para o entendimento. Assim entendo, amigos leitores, que as muitas vozes aqui ouvidas de Evinaldo, da Vorrosa, da Mary, da Maria Rosiane e da Divânia; da Francisca, da Emilly, da Célia, do Altevir, da Maria Gleiceane, da Maria Inês e do Samoel, recontam e renovam a própria história do Projeto Poronga.

Em minha incompletude e como um narrador me comovo. Ouvindo as vozes de meus pares do Poronga e/ou lendo seus depoimentos e seus escritos, torno-me um ser encharcado com as águas dos rios do Acre. Torno-me também um catraieiro com os remos postos para a travessia, à procura de outras margens para continuar o movi-mento de mudanças, à procura – assim como as pipas nos espiam lá do alto – de novas escolhas, oportunidades para aportar-me e poder narrar aos outros as venturas das passagens. Aí nos encontramos – todos nós – com nossas memórias e as nossas nar-rativas: histórias acreanas. Histórias incompletas e humanas de mulheres e homens da Amazônia Brasileira. Sabedor que sou de que não se conta uma história de uma só maneira, uma só versão, ainda, não existe uma só história – uma única história – Elas são muitas. E promissoras.

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Fundação Roberto MarinhoMEMÓRIA PORONGA

Concepção e Supervisão PedagógicaVilma Guimarães

Coordenação PedagógicaCélia FariasFátima GabrielTereza Farias

Coordenação de ConteúdoHelena Jacobina

Organização de ConteúdoAnne RochaEric ParrotJacqueline BarbosaPaula Reis

Produção GráficaMonique LimaVinicius Araújo

EntrevistasFrancisco LimaLuciane LessaToinho Castro

Texto Luciane Lessa

FotografiaToinho Castro – Místico Solimões Design(exceto fotos com o selo “Memória Poronga”)

Revisão de textoEliane Sondermann

Projeto Gráfico e DiagramaçãoMístico Solimões Design

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