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Livro Engenharia Natural.
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INTRODUO ENGENHARIA NATURAL
Joo Paulo Fernandes(Universidade de vora (ICAAM), APENA)
Aldo Renato Mendes de Freitas(Eng. Biofsico)
Volume II
NDICE
INTRODUO 5
ENGENHARIA NATURAL: 7
Uma engenharia para construir sustentabilidade 7
Intervir conservando 9
Adaptao micro realidade 11
A ENGENHARIA NATURAL UMA ENGENHARIA DOS SISTEMAS VIVOS 12
As plantas e a vegetao como material de construo 19
Obteno e seleco das espcies vegetais a utilizar 27
Principais tipos de tcnicas de Engenharia Natural 29
GUAS INTERIORES 33
As linhas de gua 35
A interveno nos sistemas ribeirinhos 37
MEIOS TERRESTRES 43
Taludes e encostas 44
Recuperao de reas degradadas 48
Espaos florestais 52
Preveno de incndios florestais 53
Recuperao de reas ardidas 54
Intervenes de curto prazo em reas ardidas: controlo da eroso e regula-o hidrolgica
56
Conservao da Natureza 58
MANUTENO E ACOMPANHAMENTO 63
BIBLIOGRAFIA 63
ANEXO 1 - Descrio das tipologias de intervenes de Engenharia Natural de utilizao mais frequente
67
1. SEMENTEIRA 69
2. HIDROSSEMENTEIRA 70
3. ESTACARIA VIVA 71
4. FASCINA VIVA 73
5. ENTRANADOS VIVOS 75
6. ESTEIRA DE RAMAGEM 77
7. LEITO DE VEGETAO 79
8. MUROS DE SUPORTE VIVO 81
9. GABIES VIVOS 84
10. TERRA REFORADA 86
11. GRADE VIVA 88
12. GEOTEXTEIS E GEOMALHAS VIVAS 90
13. BIOROLOS 92
14. BARRAGEM DE CORRECO TORRENCIAL 93
15. SOLEIRAS 94
16. ENROCAMENTO VIVO 95
17. DEFLECTORES (ESPORES) VIVOS 96
18. BARREIRAS DE CONTENO DE SOLO 98
Custos associados implementao e manuteno de medidas de EN 99
ANEXO 2 - As Principais plantas que dispomos em Portugal para a Engenharia Natural (Carlos Souto Cruz)
103
5Nascentes para a Vida
INTRODUO
"A Engenharia Natural pode ser definida como um ramo da engenharia que tem como objecto o territrio, que procura optimizar os processos construtivos numa perspectiva simultnea de funcionalidade estrutural e ecolgica. Tem, portanto, como objectivo primrio que as suas intervenes preencham plena-mente os objectivos que se lhes colocaram do ponto de vista das exigncias de uso e se insiram simultaneamente o mais harmoniosamente possvel no espao sistemas naturais, utilizando para tal, os seus prprios sistemas e processos funcionais."
Os seres humanos, tm como principal, seno nica, vantagem adaptativa a sua ca-pacidade de reconhecerem o seu ambiente e de, atravs do seu imaginrio intervirem nele de modo a potenciar as funes que os beneficiam e a contrariar aquelas que os prejudicam.
Ao longo dos milnios esta capacidade de gerir o ambiente tomou muitas formas, desde a domesticao de plantas e animais, a irrigao, a construo de abrigos at s pro-fundssimas alteraes que hoje observamos na Terra.
Esta gesto foi, contudo, sempre condicionada pela quantidade de trabalho e energia disponvel. Essa limitao determinou que a maior parte dessas intervenes se carac-terizasse mais pela orientao das funes e processos naturais, mais do que pela sua substituio por sistemas exteriores artificiais. A vantagem desta forma de interveno era a de que, ao trabalhar com os Sistemas Naturais e no contra eles, se obtinham re-sultados idnticos com muito menores custos de manuteno e com crescente eficcia.
A crescente disponibilidade de energia e de tecnologias determinou uma alterao a esta prtica, tendendo para que a produo de bens e servios e utilizao dos recursos naturais fosse crescentemente menos eficiente e mais penalizadora para os sistemas naturais, originando uma situao em nos arriscamos a comprometer os mesmos e a sua capacidade de suportarem as nossas sociedades.
O desafio que se coloca hoje s sociedades humanas e s cincias e tecnologias o de desenvolver sistemas de uso e valorizao dos recursos naturais e humanos que garan-tam a resoluo dessas crescentes tenses de modo a garantir as condies para que se garanta o progresso das condies de sade e bem-estar da humanidade dentro do respeito da capacidade do meio de o suportar.
neste contexto que importa desenvolver instrumentos de gesto dos Sistemas Ecolgi-cos em que se assumem os mesmos como objecto de criao quer no sentido da con-struo de habitats mais eficazes e funcionais para as actividades humanas, quer para a restaurao, recuperao ou substituio de ecossistemas perturbados ou compro-
6metidos por essas actividades humanas. A Engenharia Natural procura responder a es-tas necessidades.
Este pequeno livro procura, neste quadro ilustrar os principais domnios e formas de interveno da Engenharia Natural no quadro da sua contribuio para uma melhor compatibilizao entre as necessidades de uso das sociedades humanas e a capacidade dos sistemas naturais para as preencherem.
7Nascentes para a Vida
ENGENHARIA NATURAL:
UMA ENGENHARIA PARA CONSTRUIR SUSTENTABILIDADE
Sob a designao de Engenharia Natural compreende-se um conjunto de abordagens tcnicas gesto dos sistemas ecolgicos que vo desde as disciplinas de caracterizao e avaliao dos sistemas biofsicos e de uso (englobando domnios como a cartografia temtica, a fitossociologia, a geobotnica, a modelao ecolgica, a geomorfologia e a cartografia geolgica e geotcnica, a ecologia da paisagem, o ordenamento do territrio, a sociologia e a economia, quando aplicados ao conhecimento e gesto dos sistemas naturais e dos seus sistemas de uso) at e mais especificamente, s diferentes disciplinas de construo e gesto dos sistemas ecolgicos (englobando reas como a dos sistemas construtivos utilizando sistemas e materiais vivos e tcnicas e materiais complementares, as tcnicas de gesto de habitats, de silvicultura e engenharia florestal at aos sistemas de preveno de riscos naturais como a eroso, o fogo ou as movimentaes de massas de terra (aluimentos, escorregamentos, etc.)).
Todos estes domnios constituem reas tcnicas autnomas com um carcter e domnios de actuao bem definidos e concretizados. Contudo, cada vez mais se verifica a utilidade de abordagens tcnicas interdisciplinares que agreguem tcnicas e metodologias de diferente natureza cuja aplicao complementar permite no s potenciar sinergias e gerar importantes economias (caso das tcnicas combinadas de engenharia natural onde a combinao de materiais inertes com plantas permite instalar sistemas crescentemente mais eficientes, de menor intruso construtiva e com menores custos de manuteno do que os sistemas meramente inertes ou meramente baseados na utilizao de plantaes e de adequao s funes e condies naturais de estabilidade dos materiais envolvidos), como desenvolver sistemas de uso com um carcter muito mais prximo do natural (logo com valores biolgicos muito superiores) do que aqueles conseguidos pela aplicao de tcnicas no combinadas.
Ao mesmo tempo, as presses exercidas sobre o territrio na sequncia das profundas modificaes dos sistemas de uso e das tipologias de povoamento ocorridas nos ltimos decnios determinam que vastas reas do territrio passaram de sistemas de gesto relativamente intensivos para um estado de abandono generalizado que determina uma ruptura dos sistemas de uso e processos locais, claramente ilustrada na generalizao dos grandes fogos, no aumento das reas sujeitas a processos de desertificao fsica por processos erosivos subsequentes a processos de abandono dos usos tradicionais, e na perturbao generalizada dos ciclos hdricos, de materiais e sedimentos determinando uma crescente incidncia de factores de risco ambiental e de ruptura dos recursos disponveis, processos acentuados pelo quadro de alterao climtica global que atravessamos.
8Todas estas situaes determinam a necessidade de abordagens multidisciplinares gesto do territrio e dos ecossistemas, abordagens que tm de assumir um carcter tcnico de crescente solidez e interdisciplinaridade.
pois, neste quadro que se pode, e deve, falar de Engenharia Natural, como um espao conceptual de congregao de conhecimentos, tcnicas e metodologias de caracterizao e gesto do territrio e dos ecossistemas.
A sua prtica milenar fundando-se nos esforos que as comunidades humanas foram desenvolvendo de encontrar tcnicas e formas de gesto dos sistemas naturais de modo a compatibiliz-los com as suas necessidades de uso. Desenvolveram-se assim tcnicas de gesto do coberto vegetal, dos sistemas hidrolgicos e sistemas construtivos que procuraram, com os materiais e a energia disponveis, garantir a segurana das actividades humanas no quadro dos processos naturais locais.
Adicionalmente, a vegetao como material de construo, associada a sistemas construtivos usando materiais inertes foi usada em circunstncias muito diversas desde a guerra (vejam-se as inmeras referncias existentes na Guerra das Glias de Jlio Csar) at segurana e reconstruo fluvial, reconstruo de zonas erodidas ou recuperao de reas degradadas.
A noo de Engenharia Natural (ou pelo menos de Engenharia Biolgica) enquanto disciplina tcnica existe desde pelo menos os finais dos anos 30 quando A. v.Kruedner props o termo "Ingenieurbiologie" para denominar o conjunto de tcnicas e mtodos de engenharia, baseados no apenas na considerao dos aspectos tcnicos mas tambm na observncia das regras biolgicas e na utilizao de funes e materiais vivos.
A vasta experincia que entretanto foi adquirida no desenvolvimento e aplicao destas tcnicas e mtodos de construo, permitiu no s consolidar o mbito e a capacidade de interveno construtiva da Engenharia Biolgica (nomeadamente atravs de uma constante inovao e experimentao tecnolgica), como conduziu mesmo a um alargamento do seu mbito original de interveno.
Assim, e referindo um documento de trabalho elaborado pela Gesellschaft fr Ingenieurbiologie, pode-se entender por Engenharia Biolgica a aprendizagem e conhecimento das possibilidades de utilizao das plantas superiores na construo e do seu comportamento quando associadas a estruturas construtivas". Esta definio encerra um mbito vasto para a utilizao da Engenharia Biolgica nomeadamente:
Avaliao do valor indicador de espcies particulares, para a caracterizao biotecnolgica de um local.
Aplicao dos materiais e sistemas construtivos mais adequados a cada local.
Uso de desenvolvimentos tcnicos e de inovaes em maquinaria, na aplicao construtiva da vegetao.
9Nascentes para a Vida
Adequao das medidas de cuidado e manuteno aos objectivos construtivos.
Avaliao cientfica dos resultados alcanados com as tecnologias empregues.
Mas a perspectiva da Engenharia Natural procura ser ainda mais vasta do que o atrs referido para a Engenharia Biolgica. Com efeito, da experincia da aplicao desta, cresceu, com cada vez maior intensidade, a conscincia de que, mais do que a simples utilizao da vegetao como elemento e sistema construtivo, havia que avanar para uma engenharia global dos sistemas ecolgicos. Esta engenharia, tomada no sentido de conceber e realizar com arte, com engenho, tem como objecto de interveno o espao, considerado como um todo sistmico e tem como perspectiva de trabalho a conscincia e a capacidade de percepo da complexidade funcional deste. Neste mbito, pretende-se articular de uma forma construtiva os usos com as aptides naturais do espao para os sustentar.
INTERVIR CONSERVANDO
A Engenharia Natural pretende pois, constituir mais um instrumento de interveno do Homem na Natureza. Contudo, diferencia-se de certo modo das outras formas mais clssicas de engenharia ao colocar, como princpio condutor fundamental dessa sua interveno, a imposio de respeito pela dinmica funcional e sistmica da Natureza.
Ela procura pois potenciar os usos humanos do territrio com um recurso mnimo alterao deste, garantindo a inexistncia de perdas na sua funcionalidade e valor e procurando incorporar novos valores e funes. Ao intervir nele, parte sempre da exigncia da minimizao do grau de artificial idade a introduzir (o que no impede, claro, que reconhea a necessidade de recorrer a sistemas artificiais mais "duros" sempre que as exigncias de uso e as condies naturais o impuserem).
A Engenharia Natural no recusa deste modo partida, qualquer sistema ou tecnologia, no elabora escalas de importncia entre a Natureza e o Homem pelo contrario pretende contribuir de forma activa para a humanizao do espao e para a melhoria da Qualidade de Vida dos Homens, salvaguardando contudo, a preservao da funcionalidade natural, ou seja, da naturalidade do espao, procurando articular-se com as restantes disciplinas (da Arquitectura Engenharia Civil e ao Urbanismo), potencializando sempre atravs das solues encontradas, a natureza do espao em vez de a desvalorizar.
Com efeito, para a Engenharia Natural no existe a dicotomia Homem ou Natureza, mas antes a conscincia de que o Homem um elemento integrante da Natureza. Por esta razo conservar a Natureza deixa de ser uma tarefa aparentemente contra o Homem, ou pelo menos contra o seu progresso material passando antes a ser um elemento prprio a actividade humana de todos os dias.
A defesa da existncia de uma tal dicotomia tem trazido de longe mais prejuzos do que vantagens prtica da Conservao da Natureza prejuzos materializados em duas reas principais:
10
As grandes intervenes humanizantes foram, em grande medida, por falta de enquadramento por parte das disciplinas tcnicas ligadas conservao da Natureza, bem mais destrutivos e desestabilizadores do que poderiam ter sido.
A actividade da conservao da Natureza foi considerada como restrita preservao de santurios limitados, donde se retiraria ou onde se condicionaria a actividade humana, deixando pois de estar presente de forma activa na quase totalidade do espao humanizado.
de certo modo na recusa destas noes que a Engenharia Natural se procura orientar para aquilo que poderemos denominar como uma conservao activa. Esta nova orientao deriva de dois princpios fundamentais: o homem e as suas sociedades so partes integrantes da Natureza e todos os espaos so intrinsecamente naturais.
Consciente destes princpios, a Engenharia Natural prope-se como tarefas base a integrao harmnica das actividades humanas no tecido sistmico natural, consciente que est, que o comprometimento daquele acarretara a curto ou mdio prazo a no sobrevivncia das primeiras; a valorizao dos processos e elementos naturais nos espaos humanizados e a recuperao e revalorizao dos espaos degradados.
Pretende pois a Engenharia Natural contribuir para a gerao de um espao natural harmoniosamente humanizado onde em vez de actuar e intervir contra ou em detrimento da Natureza, se utiliza esta e se moldam os seus potenciais s necessidades humanas.
Como instrumento fundamental de trabalho, a Engenharia Natural necessita de realizar um reconhecimento extremamente profundo e detalhado das caractersticas e modo de funcionamento dos espaos, assim como das potencialidades, no s de cada elemento biolgico e inerte como tambm dos biossistemas complexos correspondentes ou que se podero instalar em cada lugar.
Pretende-se pois acabar com a dicotomia espao natural/espao humanizado, criando antes uma outra escala de espaos sucessivamente mais alterados, mas onde as caractersticas e processos naturais se encontrem potencializados ao mximo:
Espao natural
Espao prximo do natural
Espao condicionadamente natural
Espao condicionadamente afastado do natural
Espao afastado do natural
Espao artificial
Isto pode at passar pela criao de raiz de espaos naturais (ou prximo do natural) ou ainda pela considerao e preservao do que de rico e diversificado existe na Natureza
11Nascentes para a Vida
que ocupa os espaos profundamente artificiais ou mesmo ainda pela considerao de que o espao humanizado tambm contem valores naturais e culturais que o colocam igualmente como digno e exigente de proteco.
ADAPTAO MICRO REALIDADE
A prossecuo dos objectivos atrs referidos s possvel no caso de haver uma correspondncia muito estreita entre cada lugar e o tipo de usos ou de intervenes nele realizadas.
Com efeito, cada lugar por mais alterado que esteja mantm sempre um conjunto de caractersticas bsicas, derivadas dos diferentes factores do espao (clima, geologia, solo, morfologia, regime hdrico, etc.), que determinam no s o seu potencial e a sua aptido para os diferentes usos como tambm a sua susceptibilidade a esses mesmos usos.
partindo desse conhecimento que a Engenharia Natural se constri a partir de duas linhas condutoras:
Caracterizao detalhada de cada ponto do espao em termos quer do seu modo e dinmica de funcionamento quer das suas potencialidades e propriedades.
Adaptao precisa do tipo e caractersticas de cada interveno a cada lugar do espao.
Gerar-se- assim uma reciprocidade estreita entre cada lugar e cada actuao, reciprocidade essa, que, por exprimir uma correspondncia entre o modo de funcionamento desse lugar e as exigncias a ele colocadas pelo uso nele implantado ou a implantar, vai permitir que este possa ocorrer sem a gerao de conflitos e mesmo com a valorizao global do espao.
Com efeito, ao introduzir novos usos e factores no espao, est-se a aumentar essa diversidade (desde que, como referi, se respeite a anteriormente existente e as caractersticas topolgicas e funcionais do lugar), j que se adicionam novas determinantes.
Consciente deste facto, e da importncia da diversidade, procura a Engenharia Natural promover que, humanizao do espao v corresponder no fim um mosaico equilibrado e funcional, onde os usos e exigncias das sociedades humanas se articulem com a funcionalidade do espao natural, potencializando-a e valorizando-se a ambas, de acordo com os objectivos da conservao da Natureza, integrando-se para tal numa malha equilibrada de continuum ecolgico.
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A ENGENHARIA NATURAL UMA ENGENHARIA DOS SISTEMAS VIVOS
De acordo com Hugo Schiechtl (2007):
Engenharia Natural um sub-domnio da Engenharia Civil que prossegue objectivos tcnicos, ecolgicos, criativos, construtivos e econmico atravs sobretudo da utilizao de materiais construtivos vivos, ou seja, sementes, plantas, partes de plantas e associaes vegetais. Estes objectivos so atingidos atravs mtodos de construo prximos do natural, utilizando as diferentes vantagens que a utilizao de plantas vivas garante.
A Engenharia Natural utilizada por vezes como substituto, mas principalmente como complemento til e necessrio das tcnicas clssicas da Engenharia Civil. A sua rea de aplicao corresponde a todos os domnios construtivos quer em trabalhos de terra quer em domnios fluviais e costeiros, com predominncia particular na proteco de margens e taludes e encostas, assim como no controle da eroso.
J a Federao Europeia de Engenharia Natural (EFIB) (2007) prope a seguinte definio:
Por Engenharia Natural entende-se uma disciplina da Engenharia orientada pela Biologia cujo domnio de interveno so as intervenes geotcnicas e de mecnica de solos, de engenharia fluvial e hidrulica, de engenharia florestal assim como todas as intervenes construtivas ao nvel da compatibilizao dos sistemas naturais com as presses de uso.
Os objectos de projecto e construo so a estabilizao de taludes e escarpas, margens, diques, aterros, assim como outros espaos de uso e a sua proteco contra a eroso.
No processo de projecto e execuo so utilizados conhecimentos e competncias das disciplinas de construo, assim como conhecimentos da biologia e da ecologia da paisagem de forma a instalar e garantir o adequado desenvolvimento de um coberto adequado de espcies autctones que garanta as exigncias construtivas requeridas.
As intervenes de Engenharia Natural garantem no s a proteco contra a eroso como igualmente aces reguladoras no regime hidrolgico, no microclima, na estrutura e qualidade biolgica e ecolgica, assim como na qualidade visual das zonas de interveno.
Ambas estas definies focalizam-se num domnio essencialmente construtivo, sendo os seus domnios de aplicao principais a construo e manuteno de infra-estruturas quer nos domnios da engenharia hidrulica como da engenharia de solos, usando preferencialmente sistemas, tcnicas e materiais naturais (ou o mais prximo possvel do natural):
Consolidao de taludes e encostas;
13Nascentes para a Vida
Consolidao e valorizao ecolgica de margens de linhas de gua;
Proteco contra desastres naturais como a eroso e as cheias;
Criao de ecossistemas de compensao ou de substituio;
Recuperao ecolgica de reas degradadas como minas, pedreiras, aterros sanitrios, etc.
A vantagem da utilizao destas tcnicas e metodologia prende-se com as funes e efeitos que originam:
Funes tcnicas:
Proteco da superfcie do solo da eroso pelo solo, precipitao, gelo e gua corrente;
Proteco contra a queda de rochas;
Eliminao ou amortecimento de foras mecnicas destrutivas;
Reduo da velocidade do fluxo ao longo das margens;
Aumento da coeso superficial e profunda do solo e sua estabilizao
Drenagem;
Proteco do vento;
Promoo da deposio de neve, areia e outros sedimentos;
Aumento da rugosidade do solo e preveno de avalanches;
Funes ecolgicas, em particular aquelas omissas ou muito parcialmente preenchidas pelas intervenes clssicas de engenharia civil.
Funes ecolgicas
Melhoria do regime hdrico por melhoria da intercepo, infiltrao e capacidade de reteno hdrica, assim como consumo pela vegetao;
Drenagem do solo;
Proteco do vento
Proteco da poluio atmosfrica;
Promoo das condies mecnicas do solo atravs das razes;
Sombreamento e controle de infestantes;
Balano da temperatura da camada do ar junto ao solo e do solo;
Melhoria das condies nutricionais e, decorrentemente, da fertilidade do solo ou de substratos incultos;
14
Equilbrio dos depsitos de neve;
Proteco contra o rudo;
Aumento da produtividade das culturas adjacentes.
Funes estticas
Enquadramento de feridas abertas na paisagem por catstrofes naturais ou intervenes humanas (explorao de recursos minerais, trabalhos de construo, aterros de inertes, escombreiras, aterros sanitrios);
Integrao de estruturas na paisagem;
Ocultao de estruturas ofensivas;
Enriquecimento da paisagem atravs da criao de novos elementos, estruturas, formas e cores da vegetao.
Efeitos econmicos
Apesar de estas intervenes poderem no ser sempre mais baratas em termos da construo quando comparadas com sistemas clssicos da engenharia tradicional, quando se tem em conta o seu tempo de vida til, incluindo os custos de manuteno, demonstram-se, normalmente mais econmicos. As suas principais vantagens so:
Menores custos de construo comparativamente com materiais e tcnicas mais duros;
Menores custos de manuteno e recuperao;
Criao de reas verdes teis e formaes vegetais em terras anteriormente ermas ou marginais.
Como resultado das intervenes de Engenharia Natural obtm-se sistemas vivos que continuaro a desenvolver-se e a manter o seu equilbrio dinmico atravs dos processos de sucesso natural, ou seja, auto-controle dinmico, sem inputs artificiais de energia. Se forem utilizados os materiais construtivos vivos e inertes e os sistemas construtivos adequados, atingir-se- uma elevada capacidade de resistncia a tenses externas, sem esforos muito elevados e dispendiosos de manuteno.
A conscincia da diversidade cada vez maior das escalas de interveno (desde a regional com a gesto e controle dos processos hidrolgicos (Fig. 1) e a recuperao de reas ardidas at local com as intervenes de correco de situaes de perturbao e degradao) permite avanar com uma definio mais ampla:
"A Engenharia Natural pode ser definida como um ramo da engenharia que tem como objecto o territrio, que procura optimizar os processos construtivos numa perspectiva simultnea de funcionalidade estrutural e ecolgica, procurando que a obra preencha
15Nascentes para a Vida
plenamente os objectivos que se lhe colocaram do ponto de vista das exigncias de uso e se insira simultaneamente o mais harmoniosamente possvel no espao natural, utilizando para tal, os prprios sistemas e processos funcionais deste"
pois, este quadro, que se pode considerar que o objecto da Engenharia Natural bastante mais lato, no se referindo apenas ao desenvolvimento de sistemas construtivos utilizando materiais vivos, mas principalmente ao territrio visto na globalidade dos seus processos e determinantes, sendo o seu objectivo a articulao entre os usos humanos e as aptides naturais relativamente a esses usos e sendo os seus instrumentos a gesto dos processos e sistemas naturais, alm de todos os instrumentos e mtodos das engenharias clssicas e biolgica.
Sementeiras e plantaesMulching
Mantas orgnicas...
Sementeiras e plantaesPlantaes lineares (entranados vivos, faixas de vegetao. fascinas vivas, etc.)
Degraus vivos de consolidaao de encostasDrenos vivos
Muros e grades de vegetaoSoleiras Vvvas
Espores, "pentes e escovas" vivosRecuperao de ravinas
...
Sementeiras e plantaesMulching
Mantas orgnicasPlantaes lineares (entranados vivos, faixas de vegetao. fascinas vivas, etc.)
Degraus vivos de consolidaao de encostasDrenos vivos
Recuperao de ravinas...
Plantaoes (estacas vivas, esteiras vivas, faixas fascinas vivas, etc.)
Muros vivosDrenos vivos
Espores, "pentes e escovas" vivos...
Controle e regulao da intercepo
e infiltraao
Controle e regulaoda
evapotranspiraoControle e regulao da
velocidade doescoamento superficialPreveno e correco
da eroso
Controle e regulao da velocidade do
escoamento fluvialPreveno e correco
da eroso
Promoo da reteno superficial
e infiltrao
Precipitao Evapotranspirao
ExcedenteEsc. superficial
Esc. fluvial
Esc. subterrneo
Infiltrao
Fig. 1. Intervenes de Engenharia Natural para a gesto dos sistemas hidrolgicos
16
Na prtica, isto corresponde a acrescentar aos domnios de interveno anteriormente referidos, a promoo dos objectivos de Conservao da Natureza e da Gesto Sustentvel dos recursos atravs da criao e desenvolvimento estruturas biolgicas orientadas, integradas numa rede local e global de conservao da natureza, tendo sempre em considerao as necessidades dos indivduos e das comunidades e os objectivos das sociedades humanas numa perspectiva sustentvel, i.e.:
Desenvolvimento de sistemas que promovam o valor ecolgico de cada lugar;
Enquadramento ecolgico de todos os projectos e obras;
Desenvolvimento de metodologias de caracterizao e avaliao ecolgica e sua integrao nos processos de planeamento e gesto do territrio.
Examinemos alguns domnios de actividade com particular relevncia no momento actual:
1. reas costeiras e dunares Ao mesmo tempo em que a Engenharia Natural chamada a consolidar ou recuperar espaos costeiros degradados por presses ou tipologias inadequadas de uso (caso dos cordes dunares adjacentes a praias ou zonas de salgados degradados pela poluio ou pisoteio ou outras impactes de uso) confrontamo-nos com a necessidade, por um lado, de abordagens de proteco costeira relativamente a uma agressividade erosiva marinha acentuada pelas novas condies decorrentes das alteraes globais em curso e por outro, de desenvolver mecanismo de gesto, por exemplo, dos balanos de transporte slido (eroso, transporte e sedimentao) entre as zonas terrestres e litorais, domnio em que as abordagens da Engenharia Natural so solicitadas a escalas de abordagem e interveno completamente distintas das tradicionais.
2.Zonashmidasefluviais Estes so alguns dos habitats e sistemas naturais mais perturbados e sujeitos a maiores presses de uso, situao que tem conduzido a intervenes e modificaes que tm comprometido dramaticamente o seu carcter e que colocam desafios particularmente importantes Engenharia Natural. As intervenes necessrias impem toda uma escala de naturalidade, desde as situaes em que o espao efectivo de interveno muito reduzido at s situaes em que se poder falar em absoluto de renaturalizao e de restaurao. Simultaneamente, estes sistemas so a expresso mais visvel dos muito mais vastos e complexos sistemas hidrolgicos onde fenmenos como cheias e secas so regulados e, decorrentemente, ampliados ou minorados. Dado que o coberto vegetal e o uso do solo constituem reguladores crticos destes sistemas e processos hidrolgicos, no actual contexto de alteraes globais que tendero a acentuar essas situaes extremas, que a gesto dessas variveis ir assumir uma importncia cada vez mais crtica e, de novo, colocar um novo universo e escala de trabalho Engenharia Natural.
3. Baciashidrogrficas Estes so, fora de dvida os domnios mais abrangentes e integrativos da rea de actuao da Engenharia Natural. Com efeito, neste enorme
17Nascentes para a Vida
mbito territorial que a regulao, preveno e correco dos processos erosivos, a regulao do escoamento hdrico, dos processos de infiltrao e de evapotranspirao, da promoo dos processos de formao de solo, de preveno, consolidao e reteno dos processos de vertente, em particular dos aluimentos, avalanches e derrocadas, para j no falar na valorizao dos processos ecolgicos, constituem reas prioritrias de interveno da Engenharia Natural em complemento de todas as restantes disciplinas de gesto e ordenamento do territrio. A ttulo de exemplo, a regularizao dos processos de escoamento, assim como dos riscos a ele associados, tem de comear ao nvel da bacia, onde os balanos de intercepo, infiltrao, evapotranspirao, escoamento superficial e sub-superficial, eroso ou sedimentao so regulados quer pelo coberto vegetal, quer pela morfologia, quer pelo solo e geologia, sendo todas estas variveis objectos de gesto e de interveno recorrendo a tcnicas e abordagens de Engenharia Natural. Da mesma forma, a correco de situaes de eroso e ravinamento, invertendo o processo erosivo e criando as condies para a reposio de perfis morfolgicos de equilbrio e o restabelecimento de um coberto vegetal adequado so tambm reas onde a Engenharia Natural tem, de h muito provas dadas e um enorme potencial de desenvolvimento.
4.Zonasflorestaisemarginaisdestrudaspelofogo - no domnio crescentemente preocupante dos incndios florestais, em termos quer das medidas de primeira interveno no sentido de prevenir a eroso e reter o solo exposto, quer nas medidas complementares aos processos de reflorestao e de apoio ao desenvolvimento de um coberto natural espontneo, existem igualmente amplos domnios de aplicao das abordagens e solues tcnicas da Engenharia Natural. A destruio do coberto vegetal e, inclusive, do hmus do solo pelos fogos florestais determina um risco erosivo muito elevado que tem de ser combatido quer com medidas preventivas, quer com medidas correctivas de emergncia. A Engenharia Natural atravs de uma panplia de tcnicas de controlo do escoamento e de interveno rpida em encostas pode constituir uma especialidade de grande importncia nos processos de preveno e combate a estes processos de degradao do territrio.
5. Infra-estruturas A segurana do uso de infra-estruturas constituiu sempre uma das reas por excelncia de aplicao das tcnicas de Engenharia Natural, particularmente no que se refere aos diferentes domnios de segurana de taludes e aterros, preveno da eroso e de aluimentos ou movimentaes de massa de natureza vria como avalanches. A estes domnios tradicionais acrescentam-se presentemente com importncia crescente a garantia de funes ecolgicas (reduo da fragmentao e promoo da biodiversidade) e estticas, alm da reduo de impactes de funcionamento como so por exemplo os associados poluio sonora, emisses de gases e partculas ou aos escoamentos contaminados (contnuos ou acidentais).
6. Zonas urbanas Se bem que no constituindo espaos tradicionalmente associados aplicao das tcnicas de Engenharia Natural, estas no deixam, contudo, de
18
constituir solues construtivas do maior interesse nos domnios quer da Arquitectura Paisagista, quer da segurana e enquadramento de espaos e infra-estruturas (tambm existem escarpas e vertentes instveis em zonas urbanas, assim como a minorao dos impactes sonoros e poluentes das vias de comunicao rodovirias e ferrovirias assume uma importncia e desafios tcnicos ainda mais prementes e complexos. Por outro lado, a gesto e valorizao das linhas de gua em espao urbano maximizando o seu valor e funcionalidade ecolgica dentro das exigncias hidrulicas estritas da susceptibilidade dos usos marginais, constitui um domnio onde a Engenharia Natural tem desenvolvido no s inmeras intervenes como desenvolvido trabalhos de investigao e desenvolvimento experimental que permitem tipologias de interveno com garantias de segurana hidrulica muito mais significativas. Por fim importa referir toda a enorme diversidade de estruturas de activao biolgica em espao urbano onde muitas das abordagens tcnicas e metodolgicas da Engenharia Natural tm-se comprovado da maior eficcia.
7. Actividade extractiva e espaos degradados Este um domnio onde muitos dos equvocos que afectam a Engenharia Natural se manifestam de modo claro, ao predominarem conceitos como recuperao paisagstica em detrimento de reconstruo e requalificao ecolgica e funcional, reintegrando os espaos em causa na oferta ambiental do modo global e no apenas ocultando a actividade que nele ocorreu, com todos os problemas de viabilidade futura da interveno. Por outro lado, esta componente de recuperao e de reintegrao da funcionalidade ambiental desses espaos tem de ser integrada na prpria actividade e deixar de constituir um seu apndice desarticulado comprometendo a prpria viabilidade da sua execuo.
8. Conservao da Natureza e da Biodiversidade Sendo, por definio a Engenharia Natural um engenharia cujos objectos e instrumentos de trabalho so, prioritariamente as plantas e as comunidades vegetais, obvia a sua contribuio para todos os domnios de actividade de conservao da natureza e da biodiversidade, sejam em termos da preveno de impactes externos, seja de recuperao e restauro de zonas perturbadas ou degradadas, seja da prpria recriao de habitats ou a criao de habitats de substituio ou compensao. Igualmente importante o facto de as abordagens tcnicas da Engenharia Natural permitem a gesto de reas de elevado valor ecolgico dentro de condies de perturbao sem deixar que tal comprometa os valores existentes.
Este enunciado sinttico e obviamente incompleto evidencia o imenso universo de trabalho que se coloca perante a Engenharia Natural, para alm do contexto especfico de sub-domnio da Engenharia Civil da referida definio de Schiechtl, j que a este domnio de interveno temos de acrescentar as interfaces existentes com os domnios da gesto de habitats, da engenharia da conservao, do ordenamento e desenvolvimento do territrio.
19Nascentes para a Vida
Em termos prticos, a Engenharia Natural pretende fazer convergir todo um vasto conjunto de conhecimentos e competncias numa prtica inovadora (Fig. 2), em que a relao com a Natureza e os Sistemas Naturais no seja uma relao de oposio mas sim de cooperao orientada no comum benefcio, garantindo o desenvolvimento humano na preservao e promoo das funes naturais.
Em suma, a Engenharia Natural constitui no essencial uma abordagem que procura construir territrio sustentvel, seja ele territrio urbano, agrcola, de recreio, degradado (caso das zonas de extraco de inertes), associado a infra-estruturas ou vocacionado para a conservao da natureza e da biodiversidade.
AS PLANTAS E A VEGETAO COMO MATERIAL DE CONSTRUO
A vegetao exerce no solo uma funo estabilizadora extremamente intensa e multifacetada. Essa funo manifesta-se, quer ao nvel da proteco contra a aco dos agentes externos (precipitao, vento, temperatura, etc.), quer internos (instabilidade, encharcamento, falta de coeso, etc.).
EngenhariaNatural
Planeamento e gesto ambiental
Ciclosbiogeoqumicos Populaes
Comunidades Ecossistemas
Gesto derecursos naturais AIA/AAE
Monitorizao Ecotoxicologia
Sistemas de apoio deciso
Anlisemulticritrio
Economia Direito ambiental
Ordenamento do territrio
Climatologia Hidrologia e hidrau-lica
Pedologia Geomorfologia
Geologia deengenharia
Geografia fsica
Fitossociologia
Materiais e tcnicas de construo
Sistemas construtivos com materias vivos
Caracterizao eavaliao ambiental
Engenharia deEcossistemas
SIG
Ecologia da Paisagem Avaliao Ecolgica
Fig. 2. Engenharia Natural como rea de convergncia tcnica e cientfica
20
Simultaneamente, a vegetao apresenta no s a vantagem de assegurar a proteco e a estabilizao do terreno em causa, com tambm, dadas as suas caractersticas de sistemas vivos, a vantagem de, se devidamente cuidada, se desenvolver de um modo equilibrado com os factores de desequilbrio, adaptando-se dentro de certos limites, variao destes.
A utilizao de plantas e da vegetao como material de construo apresenta vantagens mas tambm limitaes que convm ter sempre presentes (Tab. 1). As vantagens e desvantagens acima descritas, derivam das seguintes caractersticas bsicas da funo da vegetao na estabilizao dos terrenos:
Funes de Cobertura - Atravs das suas partes areas (troncos, ramos e folhas), as plantas asseguram uma cobertura mais ou menos densa da superfcie onde esto instaladas. Especialmente no caso das herbceas, que asseguram essa cobertura de um modo bastante rpido e eficiente, obtm-se um sistema de amortecimento do impacto directo da chuva, do vento e mesmo do escoamento superficial, diminuindo desta forma a erosividade de tais agentes. Tambm as espcies arbreas e arbustivas desde que em formaes suficientemente densas, asseguram a mesma funo, acrescentada de uma intensa aco de intercepo (reteno da gua da chuva nos troncos e copas, possibilitando a sua posterior evaporao e a consequente diminuio do caudal de escoamento superficial ou de infiltrao).
Funes de armao e de ancoraqem do solo - Atravs das suas razes, a vegetao exerce um conjunto de aces fsicas que tm como resultado final aumentar a estabilidade mecnica do solo, aumentando a sua coeso, e consequentemente, possibilitando a existncia de taludes de ngulo superior ao ngulo de talude natural desse material. Estas funes so realizadas essencialmente de dois modos:
as ramificaes das razes penetrando o solo vo constituir uma malha, cuja densidade varivel em funo das espcies vegetais utilizadas, a qual enquadrar no s as partculas do solo, como tambm as penetrar funcionando ento como mais um factor de agregao.
as grandes razes mergulhantes, destinadas a ancorar a planta ao solo, penetraro este em profundidade, o que proporcionara, pelo menos nos dois metros superficiais, que qualquer plano de descontinuidade paralelo superfcie e que seja propiciador de escorregamentos seja atravessado pelas razes, aumentando a rugosidade do plano de escorregamento ancorando o horizonte superior no inferior e diminuindo, consequentemente, a tendncia para o escorregamento segundo esse plano.
Funes de estruturao - Alm das aces fsicas de armao e de ancoragem, que asseguram essencialmente um papel de sustentao, as aces qumicas e biolgicas proporcionadas pela vegetao, ou dela derivadas, contribuem, igualmente e de uma forma decisiva, para o aumento da estabilidade do solo. Tais funes so realizadas, quer por intermdio dos produtos qumicos segregados pelas razes das plantas que
21Nascentes para a Vida
favorecem a formao de agregados de partculas do solo, quer pela formao de compostos hmicos a partir da decomposio de folhas e outros materiais orgnicos compostos esses que agem da mesma forma como agregantes do solo.
Funes de coeso e drenagem - As plantas devido s suas necessidades prprias de gua, contribuem tambm, eficazmente, para a diminuio do teor em agua do solo, dado esta ser absorvida e depois transpirada. Esta diminuio do teor em humidade do solo tem como consequncia um aumento da coeso do solo e poder, em determinadas circunstncias, diminuir o risco da sua fluidificao. Por outro lado, a tenso capilar associada absoro de gua pelas razes, gera uma coeso aparente que aumenta a estabilidade do solo. de referir que, em contrapartida, a vegetao tambm apresenta alguma aco propiciadora da infiltrao o que em certa medida, pode constituir um factor de aumento da instabilidade. Os efeitos desestabilizantes deste processo no anulam contudo, os efeitos estabilizantes atrs descritos.
Funes de activao biolgica - Estas funes, embora no estejam directamente associadas com o aumento da estabilidade do solo, proporcionam tambm indirectamente uma melhoria da agregao deste, que contribui decisivamente, para o aumento da estabilidade global do local.
Com base no conhecimento destas funes e no desenvolvimento de tcnicas construtivas prprias que anulem ou diminuam as desvantagens anteriormente apontadas e potenciem as vantagens tm sido implementados sistemas construtivos utilizando essencialmente a vegetao como material construtivo e que tm revelado a maior eficincia. Estes sistemas constituem combinaes dos seguintes tipos bsicos de construes:
Construes combinadas de apoio suporte e consolidao, para desvio e anulao de aces mecnicas, para escoramento do terreno e consolidao de materiais instveis. so constitudas normalmente por combinaes entre obras inertes (beto, pedra, alvenaria, madeira, geotexteis, etc.) e plantaes. Permitem, pela aplicao de sistemas combinados, diminuir a dimenso das obras inertes.
Construes de drenagem biotcnica, em que so utilizadas essencialmente plantas com elevada capacidade de evapotranspirao e sistemas de construo e plantao adequados para assegurarem uma drenagem activa de toda a massa do solo.
Construes de estabilizao, para desvio e anulao de aces mecnicas, consolidao e agregao do solo em profundidade. Consistem em sistemas particulares de plantao de lenhosas (em linhas ou em banquetas por exemplo), de modo a assegurar uma armao profunda do terreno e a desviar e conduzir as ac6es mecnicas que possam criar situaes de instabilidade.
Construes em cobertura, para assegurar uma rpida e eficiente proteco da superfcie do solo, uma melhoria dos balanos trmicos e hdricos, o sombreamento e a activao biolgica do solo. conseguida quer por sementeira ou plantao
22
de herbceas, quer por tcnicas especiais de instalao de lenhosas arbustivas ou mesmo arbreas.
Construes complementares, para conduo e acelerao da sucesso natural da vegetao permitindo obter o mais rpida e eficazmente possvel, o coberto vegetal pretendido.
Tab. 1. Vantagens e desvantagens comparativas das plantas e dos materiais inertes como materiais de construo
Utilizao da vegetao como material de construo
Utilizao de materiais inertes como material de construo
vantagens desvantagens vantagens desvantagens
(i) No afectada por processos de degra-
dao, proporcionando, pelo contrrio uma
estabilizao crescente e possuindo, cumulati-
vamente, uma capaci-dade regenerativa intrnseca.
(ii) Preenche a sua funo protectora de modo elstico, absorvendo
os elementos e aces "agressivas", diminuin-do ou anulando a sua
intensidade.
(iii) biolgica e ecologi-camente funcional.
(iv) Possibilita e conduz a uma valorizao
esttica e paisagstica, com o enquadramento
da construo no espao natural.
(i) No preenche em todas as situaes,
as exigncias de consolidao e
segurana requeridas.
(ii) Exige uma aplicao adaptada e dependente das caractersticas do
sitio, no sendo tambm passvel de utilizao
construtiva em qualquer altura do ano.
(iii) S atinge a sua eficincia tcnica plena aps um certo intervalo
de tempo.
(i) Podero ser mais estveis.
(ii) So mais independentes das
caractersticas do sitio e de aplicao menos
limitada temporalmente.
(iii) Ficam funcionais a curto prazo.
(i) Tendem a perder a sua eficincia devido corroso e degradao
e no possuem capacidade de auto-
regenerao.
(ii) Funcionam, relativamente aos agentes agressivos
como estruturas construtivas rgidas
e no, ou pouco deformveis.
(iii) No preenchem qualquer funo
biolgica.
(iv) Constituem, normalmente,
elementos estranhos na paisagem.
As plantas apresentam, como j referido, um vasto leque de propriedades (Tab. 2) que devero ser tidas em considerao no processo de seleco no s das espcies, como particularmente da combinao de espcies a instalar num determinado local e para um determinado fim.
23Nascentes para a Vida
Tab. 2. Caractersticas da vegetao condicionantes dos diversos efeitos (Adaptado de Mendona e Cardoso, 1998 e de EFIB, 2008)
Efeitos
Caractersticas condicionantes da vegetao
% d
e co
bert
ura
supe
rfici
al
Alt
ura
Peso
Form
a e
com
prim
ento
da
folh
agem
e
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Den
sida
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Rob
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Flex
ibili
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amos
Pro
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idad
e da
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Den
sida
de d
as r
aze
s
Res
ist
ncia
das
ra
zes
Cicl
o de
cre
scim
ento
anu
al
No regime e processos hdricos
Proteco contra a precipitao intensa
X X X
Proteco contra a eroso hdrica
X X
Arraste superficial X X X X X X
Abrandamento e desvio de fluxos hdricos
X X X X
Reteno de detritos em enxurradas
X
Infiltrao X X X X
Evaporao X X
Reteno da gua do solo X X
No fluxo do ar (vento)
Partculas em suspen-so
X X X
Desvio de fluxo X X X X
Arraste superficial X X X X X
Proteco contra o rudo X X X X
Na pro-teco dos solos
Proteco contra a eroso elica
X X X X X X X
Proteco contra a queda de pedras
X X X X
Envolvncia das partcu-las do solo pelas razes
X X
Encaixe e ancoragem dos horizontes do solo
X X X
Preveno da lavagem de partculas finas atravs de uma aco filtrante
X X
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Nas pro-priedades dos solos
Agregao bioqumica das partculas do solo
X X
Aumento do volume de poros
X X X
Melhoria das condies de vida dos micro organismos
X X X
Formao de hmus X X X
Na gua subter-rnea
Evapotranspirao X X X X
Teor em gua do solo X X
Drenagem interna X X
Nas car-actersticas do macio
Eroso X X X X X
Transporte X X X
Isolamento X X X
Filtro X X X X
Resistncia prpria X X X X X X X
Mecnicos
Sobrecarga X
Rede superficial X X X
Reforo das razes X X X X
Ancoragem X X X
Contraforte X X
Cunha de razes X X X X X
Aco expansiva devido espessura das razes
X X X
Compactao X X X
Na qualidade ambiental
Remoo de substncias eutrofizantes
X X
Filtrao e acumulao de poeiras
X X X
Absoro de rudo X X X X X
Influncia (moderadora) sobre o microclima
X X X X
Importa, contudo, saber seleccionar e combinar as diferentes espcies que garantem as funes tcnicas desejadas. Por exemplo, considerando as funes tcnicas de cobertura (para proteco contra a eroso) e de consolidao radicular, temos de distinguir as diferentes espcies em funo do tipo de aparelho superficial e radicular que desenvolvem de modo a garantir que as diferentes funes pretendidas so preenchidas. Observando por exemplo a fig. 3 possvel verificar que as diferentes espcies herbceas ilustradas se distinguem claramente em termos das referidas caractersticas. Verificamos a
25Nascentes para a Vida
ocorrncia de espcies com um enraizamento superficial denso (coincidindo muitas vezes com um desenvolvimento da parte area igualmente densa que pode proporcionar um boa cobertura do solo) e espcies com um desenvolvimento radicular profundo (muito ou pouco ramificado), proporcionando funes de ancoragem distintas da simples agregao da superfcie do solo.
Procurando sistematizar estes factores de seleco das espcies e tipologias de plantas a utilizar, a tabela 3 apresenta, de forma simplificada, para os principais tipos de vegetao as vantagens e desvantagens tcnicas a ter em considerao nesse processo.
Fig. 3. Exemplos de aparelhos superficial e radicular de diferentes espcies herbceas e arbustivas e de como s a combinao de diferentes espcies garantir uma densa armao e cobertura su-perficial e uma ancoragem profunda e resistente (cortesia Prof. Eva Hacker)
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Tab. 3. Adequao dos tipos de plantas para diferentes funes e aplicaes de engenharia (Gray et al. 1996)
Tipo de vegetao Vantagens Desvantagens
Gramneas
Versteis e baratas, elevado espectro de
tolerncia, estabelecimento rpido, elevada
densidade de cobertura
Enraizamento superficial, necessitam
de manuteno regular
Canios e juncosEstabelecem-se bem em margens de rios e
lagos, crescimento rpido
Plantao manual dispendiosa,
obteno difcil
HerbceasEnraizamento profundo, atractivas em
relvados
Sementes dispendiosas, s vezes
difceis de estabelecer, muitas
espcies morrem no Inverno
LeguminosasEstabelecimento barato, fixam azoto,
combinam bem com gramneasNo so tolerantes a locais difceis
Arbustos
Robustos e razoavelmente baratos, muitas
espcies podem ser semeadas, cobertura
do solo muito significativa, enraizamento
profundo, reduzida necessidade de
manuteno, muitas espcies sempre-
verdes
Estabelecimento mais dispendioso e
por vezes mais difcil
rvores em geral
Enraizamento muito significativo,
algumas podem ser semeadas, nenhuma
manuteno quando bem estabelecidas
Estabelecimento prolongado,
crescimento lento, dispendiosas
Choupos e salgueiros
Enrazam facilmente de estaca,
versteis, muitas tcnicas de plantao,
estabelecimento rpido
Necessitam de manuteno de
modo a seleccionar a forma de
estabelecimento correctivo, no
crescem de semente
Os objectivos do coberto vegetal a estabelecer ultrapassam, como atrs referido, o simples estabelecimento de um qualquer tipo de coberto vegetal, mas referem-se criao das condies que garantam um nmero muito diversificado de funes tcnicas e ecolgicas. Importa, contudo, nunca deixar de ter presente que a vegetao se encontra limitada na sua eficincia e aplicabilidade pelos limites que lhe so colocados pelos factores de tenso ambiental relativamente s suas caractersticas ecolgicas especficas.
A estas condicionantes e limitaes h ainda que acrescentar as limitaes tcnicas intrnsecas (por ex. profundidade de enraizamento limitando a profundidade eficaz de estabilizao, capacidade de enraizamento em determinados substratos, ou potenciao de riscos de instabilizao aumento de cargas, dinmicas induzidas por ex. pelo vento, etc.).
Por esse motivo, ocorrem um numeroso conjunto de situaes em que a vegetao, por si s est impossibilitada de preencher todos os objectivos tcnicos que se coloquem a uma obra, imponde-se ento o recurso a sistemas construtivos complementares que complementem as funes que a vegetao no consegue, isoladamente, preencher.
27Nascentes para a Vida
OBTENO E SELECO DAS ESPCIES VEGETAIS A UTILIZAR
O primeiro problema que se coloca quando consideramos o processo de instalao da vegetao num determinado espao o da seleco das espcies a utilizar. Como enquadramento incontornvel desta seleco temos, naturalmente, as sries de vegetao correspondentes localizao biogeogrfica do espao em causa e ao ectopo especfico a criar. O elenco especfico das associaes vegetais correspondentes a essa srie, em especial aos seus estgios iniciais, deve constituir a orientao bsica para a seleco das espcies a utilizar.
Dentro desse elenco de espcies, e tendo as propriedades especficas de cada uma, os critrios de seleco so mltiplos, de entre os quais se destacam:
1. Carcter pioneiro (estratgia ecolgica)
2. Tipologia de propagao vegetativa e de instalao (semente, elemento vegetativo, planta enraizada, etc.) (Tab. 4)
3. Disponibilidade de material para propagao (facilidade de obteno e de estabelecimento em viveiro ou no terreno)
4. Velocidade de estabelecimento e desenvolvimento
5. Funcionalidade tcnica (cobertura, tipologias de enraizamento, influncia nos balanos de nutrientes, absoro e reteno de contaminantes como metais pesados, etc.)
6. Facilidade de manuteno
Por fim, h ainda que considerar que, para alm das espcies em si, tem que se garantir a sua adaptao genotpica e fenotpica s condies locais
No entanto, em situaes particularmente extremas, onde nas diferentes associaes naturais, no seja possvel seleccionar espcies que preencham as necessidades tcnicas exigidas pela interveno de recuperao em causa, pode recorrer-se ao uso de espcies pioneiras estranhas s associaes autctones que ajudem ao rpido estabelecimento das comunidades-alvo, espcie que naturalmente, ou no quadro dos necessrios trabalhos de manuteno da obra, devero ser retiradas quando j no sejam necessrias (ou possam mesmo estar a ter um efeito contraproducente, competindo com a vegetao natural cuja instalao propiciaram).
Um dos problemas associados ao estabelecimento ou restabelecimento da vegetao em zonas alteradas ou degradadas tem a ver com o facto de os substratos apresentarem deficincias fsico-qumicas e biolgicas que condicionam as suas propriedades estruturais, nomeadamente em termos das foras de coeso e erodibilidade.
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Tab. 4. Materiais de construo vivos susceptveis de utilizao em obras de Engenharia Natural e respectivas formas de instalao e propagao (adaptado de EFIB, 2008)
Cani
os
e ju
ncos
Gra
mn
eas
e H
erb
ceas
Legu
min
osas
Suba
rbus
tiva
s
Arb
usto
s
rv
ores
Caules capazes de enraizarem adventiciamente X X X X X X
Partes de lenhosas capazes de enraizarem
Estacas X X
Hastes assentes no solo X X
Ramos assentes no solo X
Rizomas X X X X
Propgulos radiculares X
Estacas radiculares X X
Sementes X X X X
Inflorescnciasefrutos X X X X
Fenos e palhas X X X X
Plantas X X X X X X
Rebento de lenhosa X X
Semente germinada X X
Estacas enraizadas X X
Plantas de viveiro com raiz nua X X
Plantas em contentores X X X X X X
Plantas em torro X X X X X X
Torres X X X X X X
Mantas orgnicas vegetadas X X X X
Placas de relva X X
Rolos enrelvados X X
Solo com sementes ou placas do horizonte vegetado X X X
Torres ou Placas de Vegetao X X X X X X
29Nascentes para a Vida
Por esse motivo, pode tornar-se necessrio o recurso quer adio de materiais que melhorem as qualidades desses substratos no que toca ao estabelecimento da vegetao, quer no que se refere sua estabilidade estrutural, quer ainda no que se refere sua erodibilidade (caso de agregantes, solo orgnico ou corretores qumicos), quer ainda todas as substncias, materiais e organismos que garantam as condies biolgicas mnimas necessrias ao estabelecimento da vegetao (caso das micorrizas) (Tab. 5).
Tab. 5. Exemplos de materiais de construo e coadjuvantes que contribuem para a estabilidade dos substratos (adaptado de EFIB, 2008)
Materiais naturais inertes Materiais naturais transformados Materiais sintticos
Blocos de pedra Telas de Juta, coco, palhas sisal, etc. Hidrogel
Cascalho L de madeira Agregantes sintticos
Areo Fertilizantes e estrumes Emulses betuminosas
Areia Alginatos
Argila Celulose
Turfa Micorrizas
Solo orgnico Beto
Palha Metal (redes, arame, etc.)
Feno
PRINCIPAIS TIPOS DE TCNICAS DE ENGENHARIA NATURAL
As metodologias de estabelecimento da vegetao so extremamente variadas classificando-se em trs grandes grupos:
Tcnicas de estabelecimento da vegetao (Tab. 6, Fig 4)
Tcnicas de cobertura. So tcnicas destinadas a evitar a eroso superficial.
Tcnicas de estabilizao. Estas tcnicas permitem estabilizar o terreno at 2m de profundidade baseiam-se na disposio de plantas lenhosas obtidas por reproduo vegetativa colocada em filas horizontais. As plantas tm que ter a capacidade de emitir razes adventcias de modo o originar um entranado que permita a armao e estabilizao do terreno.
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Tab. 6. Exemplos de tcnicas de instalao da vegetao (adaptado de EFIB, 2008)
Tcnica Cobertura Estabilizao
Sementeira a lano X
Sementeira hidrulica X
Sementeira de cobertura (com mantas) X
Sementeira de feno X
Mulch seco de cobertura X
Estacas X
Pentes vivos e paliadas X
Plantao de ramos enraizados X
Cobertura de ramos X X
Fascinas X
Entranados X
Leitos de ramagens X
Plantao de rizomas X
Plantao de lenhosas X
Leitos de plantas enraizadas X
Plantao de torres X
Estacas de razes X
Cobertura com rolos e placas de relva X
Cobertura com horizonte vegetal X
Plantao de Placas com vegetao X
Tcnicas combinadas (Tab. 7, Fig 5) Estas tcnicas, ao contrrio das anteriores conjugam a utilizao de elementos vegetais com materiais inertes como: madeira, ao galvanizado, pedra, beto. Nestas tcnicas, os materiais inertes actuam como estabilizadores at que as plantas, atravs das suas razes, sejam capazes de realizar esta funo.
Tcnicas complementares. Junto com as tcnicas construtivas propriamente ditas, devem-se utilizar outras tcnicas que completam e complementam as anteriores mas que no cumprem um objectivo de estabilizao ou de proteco contra a eroso. o caso da plantao de espcies lenhosas com o objectivo de acelerar o desenvolvimento da sucesso e do coberto vegetal, a criao de barreiras sonoras, as drenagens, etc.
31Nascentes para a Vida
Tab. 7. Exemplos de tcnicas de construo que, combinadas com os sistemas construtivos vivos asseguram estruturas combinadas de maior eficcia (adaptado de EFIB, 2008)
Tcnica Cobertura Estabilizao
Enrocamento X
Colches de gabio X
Muros de pedra seca X X
Cobertura com agregante do solo X
Cobertura com mantas X
Cobertura com mulch X
Estacas e ancoragem X
Redes X
Gabies X
Terra armada com geotexteis X X
Muro tipo Cribwall de madeira X
Grade de madeira X X
Estacaria X
Fascinas X
Mantas orgnicas X
Fig. 4. Exemplos de tcnicas de instalao da vegetao
32
A combinao de uma ou mais tcnicas permite a maximizao dos objectivos tcnicos (estabilizao, cobertura) com objectivos de natureza esttica, de conservao da natureza ou de segurana ambiental (proteco contra o rudo, filtrao de poluentes atmosfricos, etc.).
A seleco das tcnicas mais adequadas para deve, portanto, obedecer a critrios claros como os que se procuram sintetizar nas matrizes de deciso constantes das tabelas 9 (para intervenes em meios hdricos) e 12 (para obras de preveno da eroso e de estabilizao de taludes e encostas), sendo que a adequao destas tcnicas para a resoluo de problemas de estabilidade de taludes e encostas est ilustrada na Tab. 8.
Fig. 5. Exemplos de tcnicas combinadas
33Nascentes para a Vida
Tab. 8. Adequao das tcnicas de Engenharia natural resoluo de problemas de estabilidade de taludes e encostas (Rauch, H.P. 2009 (com. pessoal)
Factor determinante Mecanismos Propriedade Processo Funes de estabilizao necessrias
Fun
o d
e pr
otec
o
supe
rfici
al
Fun
o d
e ar
ma
o
< 0,
2 m
Fun
o d
e ar
ma
o
< 2
m
Fun
o d
e dr
enag
em b
iol
gica
Fun
o d
e dr
enag
em t
cni
ca
Influncia predominante da gravidade
Despenhamentorocha no
consolidadaDesmoronamento
de rochas 2 1 1
Escorregamento
material no consolidado, rotacional
Deslizamento rotacional
3 3 3 3
material no consolidado, translacional
Deslizamento translacional
2 3 3 3 3
Influncia predominante da gua do solo, do gelo e da neve
Fluxo
rpido
Fluxo de soloFluxo de lama
1 1 2 3
1 1 2 3
Fluxo de calhaus 1 1 2 3
Rastejamento lento
Rastejamento de terra
2 2 3
Rastejamento de solo
2 2 3
Influncia predominante da chuva e de escoamentos concentrados de precipitao
PerdaFormao
de ravinas e barrancos
3 1 1 2 2
Influncia predominante da chuva e de escoamentos ocasionais de precipitao
Perda Eroso superficial 3 2 2
Combinao
Combinao e sobreposio de diversos processos
GUAS INTERIORES
Normalmente quando falamos de guas Interiores temos no pensamento linhas de gua permanentes ou efmeras, em lagos, charcos, albufeiras nascentes, pauis, turfeiras ou mesmo lagunas costeiras e esturios.
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Em ltima anlise, quando falamos em guas Interiores estamos a considerar toda a componente terrestre do ciclo hidrolgico, seja na sua componente atmosfrica, superficial e subterrnea. Este aspecto no pode ser visto apenas como uma mera curiosidade e uma nota introdutria no seu estudo.
Com efeito, os diferentes tipos de guas Interiores so intrinsecamente dependentes do modo de manifestao local desse ciclo hidrolgico:
O regime pluvial e o balano hdrico determinam, em grande medida, o regime fluvial, funcionando, ao mesmo tempo, a componente geolgica, pedolgica e de coberto vegetal ou ds usos antrpicos como os reguladores desse regime. Esta regulao feita atravs do controle e desvio dos diferentes componentes dos fluxos hdricos atravs dos diferentes subsistemas.
A morfologia do terreno determina no apenas a energia dos escoamentos, como tambm a maior ou menor probabilidade de ocorrncia de espaos de reteno superficial ou sub-superficial e a origem de formas particulares de guas Interiores como so os lagos, as charcas, os pauis ou as turfeiras. Da mesma forma determina primariamente a dominncia relativa dos processos de eroso e transporte relativamente aos processos de deposio, condicionando, desta forma a natureza dos substratos dos diferentes sistemas hdricos.
A natureza geolgica do terreno, alm da j referida aco reguladora dos fluxos hidrolgicos tem, conjuntamente com o regime pluvial, um papel crtico na determinao no s do quimismo das guas (aqui tambm em articulao com o regime de escoamento (a morfologia), j que a sua natureza qumica e a sua alterabilidade, associada agressividade das chuvas e dos escoamentos que vo determinar quais e quantos so as substncias qumicas e os materiais que afluem aos sistemas hidrolgicos e neles vo fluir.
Por outro lado o coberto vegetal, assim como os usos antrpicos da bacia hidrogrfica e terrenos adjacentes vo tambm agir, no s como reguladores dos fluxos hidrolgicos, como tambm como reguladores da natureza qumica dos sistemas hidrolgicos atravs da libertao ou absoro de substncias e compostos qumicos presentes nos fluxos hidrolgicos (precipitao, escoamento superficial ou sub-superficial) ou pela libertao voluntria (caso dos sistemas antrpicos de substncias de variadssima natureza directamente nos corpos de gua ou nos sistemas a eles afluentes.
Finalmente (e os ltimos tambm podem e so muitas vezes os primeiros), temos todo o biota dos diferentes tipos de guas Interiores e dos ectones especficos a ele associados que, integrando todas estas influncias no funcionam como mera consequncia determinstica desses processos dinmicos, mas apresentam uma individualidade e dinmica especfica que conferem natureza autnoma a cada sistema local de per si.
35Nascentes para a Vida
Temos ainda que os ecossistemas de guas interiores so muito mais que os corpos de gua individualizveis e incluem todos os ecossistemas que, de uma forma ou de outra so afectados e determinados pelos sistemas hidrolgicos. Destes ecossistemas permitam-me realar as vrzeas e todas as plancies de inundao e leitos de cheia, normal e inadequadamente tratados como ecossistemas terrestres, quando a sua ligao aos ecossistemas hidrolgicos no conjuntural mas sim estrutural.
AS LINHAS DE GUA
" Linhas de gua so corpos de gua estendendo-se por trajectos longos, com uma corrente varivel e em parte turbulenta (impedindo portanto na maior parte dos casos uma estratificao trmica da gua), com margens variadas e uma relao gua-Terra bastante intensa. A sequncia natural da vegetao inclui pelo menos a vegetao aqutica e a vegetao herbcea e lenhosa da margem (zona de madeira branca) e em caso ideal, toda a Vrzea. (...) Ao longo do trajecto da corrente as caractersticas fsicas e biolgicas (os bitopos) sofrem alteraes significativas especialmente em termos do volume de gua, do regime de escoamento, da corrente, da eroso e sedimentao de substratos, da temperatura etc. Apesar do zonamento no sentido de jusante da corrente, a sua velocidade, devido a obstculos no leito como rochas ou grupos de vegetao, apresenta, por vezes, mesmo em trechos bastante limitados, variaes extremamente considerveis, podendo em remansos ou atrs de pedras gerar-se zonas de guas paradas. Em geral a velocidade diminui do meio do corpo de gua para o fundo e margem devido maior resistncia a encontrada." Blab, J., 1986
Uma linha de gua corresponde no essencial a uma estrutura de drenagem hidrulica de uma vasta rea de concentrao (a Bacia Hidrogrfica). Por essa razo o seu carcter e funcionalidade dependem directa e indissoluvelmente das caractersticas da Bacia Hidrogrfica por ela drenada e obviamente dos processos climticos e hidrogeolgicos nela ocorrentes, assim como, de uma forma determinante das caractersticas do uso do solo na superfcie da Bacia.
Focalizemo-nos agora nesses ecossistemas particulares de interface entre os sistemas hdricos propriamente ditos e os sistemas terrestres, porque me parece que eles ilustram perfeitamente o que atrs disse.
Os ecossistemas ribeirinhos constituem ecossistemas particulares, dado que a sua articulao a linhas e planos de gua lhes confere caractersticas de ectone com as consequentes trocas intensas de substncias e materiais de acordo com gradientes de humidade, luminosidade e de natureza do substrato. Por outro lado, no caso das linhas de gua, o carcter varivel do seu caudal e energia de escoamento ao longo do seu traado determina, igualmente, gradientes dinmicos geradores de intensas variaes na natureza intrnseca desses.
Estas duas razes fundamentam a afirmao que os ecossistemas ribeirinhos preenchem funes charneira no espao, em termos locais, articulando ecossistemas de natureza
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totalmente diversa e funcionando como planos dinmicos de intercmbio ecolgico assim como, em termos regionais, articulando espaos de diferente natureza, quer em termos do carcter varivel do corpo de gua, quer da ecologia dos terrenos atravessados ao longo do seu trajecto.
Da mesma forma, os gradientes longitudinais assumem tambm padres muito variveis, articulando domnios distintos dentro do mesmo troo (atravs, por ex. do diferente carcter dos afluentes), ou chegando mesmo a, aparentemente, perder a individualidade na paisagem, sem perder o seu carcter de eixo de concentrao e transporte (caso de muitos cursos intermitentes no domnio mediterrnico.
Estes ecossistemas, ao assumirem um papel charneira na paisagem, asseguram um conjunto de aces da maior importncia, independentemente da natureza mais ou menos antropizada dessa paisagem. Com efeito, ao constiturem ectones diversificados entre os meios hdricos e os ecossistemas terrestres envolventes, assumem funes de complementaridade ecolgica com esses espaos, j que constituem zonas de refgio e reproduo, zonas de alimentao e dessedentao, ao determinarem habitats hmidos ou msicos em domnios xricos, ao assegurarem, pela simples presena de gua e pela maior produtividade que a associao desta e de substratos de acumulao originam, nveis de sustentao bastante distintos do que os que ocorreriam, caso no existissem como estruturas estveis e diversificadas.
Com efeito, as linhas e outros corpos de gua, longe de constiturem simples estruturas hidrulicas, como infelizmente muitas vezes so consideradas, so capazes de, apenas devido sua complexa natureza e dinmica ecolgica, assegurar sustentavelmente a disponibilidade em recursos hdricos, a estabilidade dos terrenos adjacentes, a proteco contra cheias e secas, a disponibilidade em recursos pisccolas, cinegticos e florsticos, que constituem as suas principais funes de uso para os sistemas econmicos.
Estas funes, independentemente do seu valor econmico assumem ainda um valor ecolgico crucial, j que, pelo seu carcter linear e abrangente da totalidade do territrio, os ecossistemas ribeirinhos preenchem uma funo de conectividade, que mais nenhuma estrutura ecolgica est em condies de realizar. No constituindo eixos universais de interligao entre ecossistemas, constituem, contudo, redes interligando espaos diversificados e elementos potenciadores duma diferenciao da estrutura e capacidade de sustentao ecolgica do espao, ao potenciarem a existncia de manchas de recursos e perturbao de natureza muito diversa, ao assegurarem para inmeras espcies, vias de intercmbio gentico capazes de assegurar metapopulaes viveis, ao potenciarem ou ao associarem-se a condies ecolgicas locais particulares, potenciadoras de formaes e potenciais originais.
Estas funes e estes potenciais no se associam, contudo, a uma estrutura ecolgica estvel e mantida como tal. Grande parte do potencial anteriormente referido decorre
37Nascentes para a Vida
da intensa dinmica associada a estes ecossistemas e que se espelha na diferenciao registada nos substratos aluvionares (decorrente de diferentes regimes passados de correntes e de cheias e indutora de distintas condies ecolgicas na matriz aluvionar) ou na diferenciao permanente das estruturas de vrzea, em funo do regime de cheias ou de secas, induzindo perturbaes localizadas, responsveis pela permanente criao do focos locais de diversidade estrutural e especfica.
Por estes motivos, a articulao destes ecossistemas com os espaos de uso, sendo mutuamente benfica em algumas situaes, historicamente fonte de conflitos pela incompatibilidade entre a necessidade de variao desses ecossistemas e a necessidade de estabilidade dos sistemas de produo econmica. Contudo, as tentativas de simplificao e de controle dessa necessidade de variao tm redundado, regularmente, em perdas a mdio ou logo prazo, por gerao de perturbaes de grande magnitude (por exemplo, cheias, eroso, sedimentao, secas, eutrofizao) anteriormente amortecidas pela variabilidade localizada e pela ocorrncia de micro-perturbaes dentro do sistema estvel.
A necessidade de conciliar estes dois sistemas, assegurando que os ecossistemas ribeirinhos preencham todas as suas funes duma forma compatvel com a necessidade de os sistemas econmicos usufrurem plenamente dos recursos e potencial produtivos desses sistemas, levanta problemas complexos de gesto que no so conciliveis com vises parcelares (dominantemente hidrulicas ou conservacionistas) e que implicam uma abordagem to criativa quanto diversificados so esses ecossistemas.
A INTERVENO NOS SISTEMAS RIBEIRINHOS
Dois princpios tm de reger a gesto destes espaos:
(i) Princpio da interveno mnima - a estabilidade dos sistemas tanto maior quanto mais prximo do natural so as suas componentes e funes e quanto mais diversificados so os sistemas integrantes e os seus reguladores.
(ii) Princpio da rea mnima - qualquer sistema exige uma rea mnima para poder evoluir de uma forma equilibrada, gerando e amortecendo as perturbaes associadas variabilidade intrnseca das funes e processos naturais.
Estes dois princpios tomados com a necessria maleabilidade decorrente da enorme diversidade de exigncias de uso colocadas relativamente a estes sistemas, permitem orientar a gesto das linhas de gua e restantes ecossistemas ribeirinhos de uma forma muito mais equilibrada do que tem at agora sido geralmente conduzida.
Assim, a primeira regra de gesto a de que se impe uma perspectiva integrada de gesto do conjunto da bacia, j que as afluncias e o seu regime decorrem directamente da natureza do uso de toda a bacia.
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A segunda regra a de que quanto mais prximos do natural forem os sistemas construtivos empregues, maior ser a viabilidade e longevidade do sistema ou da estrutura construda.
A terceira regra a da adequao das intensidades de uso natureza e condicionantes do territrio. Assim, por ex. as vrzeas no podem ser consideradas como espaos de vocao mltipla sem restries, mas tm de ser considerados e geridos como espaos de elevada capacidade de uso, condicionada e potenciada pela sua natureza de espaos de acumulao, inundveis e de fretico superficial, exigindo, portanto zonamento do uso em funo da frequncia dos riscos de inundao.
A quarta regra a da rede ecolgica. Os ecossistemas ribeirinhos ao constiturem uma rede que percorre duma forma extremamente diversificada o territrio da bacia hidrogrfica, tem de ser preservado na capacidade de manter essas funes articuladas, num quadro de preservao da diversidade dos restantes ecossistemas terrestres.
Os princpios a que devem obedecer as intervenes nas linhas e planos de agua so os seguintes:
O comprimento natural da linha de gua no deve ser alterado.
Na construo de leitos em declive deve-se observar a manuteno das condies para os peixes e assegurar a maximizao da capacidade de arejamento natural.
O aquecimento do corpo de gua devido destruio das sombras ou ao alargamento do perfil de evitar.
Deve-se manter sempre um nvel mnimo de escoamento.
A variedade dos bitopos deve ser preservada ou aumentada.
A rugosidade do leito no deve ser diminuda.
A segurana do perfil deve ser assegurada atravs do recurso a materiais vivos.
Quando da utilizao de pedras e outros materiais inertes na segurana das margens, no deve ser alterado o carcter da linha de gua.
Em casos de alterao positivas da intensidade da corrente deve-se diminuir a sua velocidade atravs do aumento da rugosidade do perfil.
Para cumprir estes princpios h que obedecer s seguintes linhas orientadoras para a renaturalizao de linhas e planos de gua (Pflug, 1986).
O ecossistema vale/linha de gua deve ser considerado como uma unidade incluindo a Linha de gua e a Vrzea por ela determinada, em estreita ligao com a Bacia Hidrogrfica que a alimenta e determina.
39Nascentes para a Vida
Os rios e ribeiras que, por via de intervenes vrias, se encontram desequilibrados e no funcionais) devem ser recuperados atravs, nomeadamente de:
permisso de cheias controladas,
reconstruo de zonas hmidas e de encharcamento tpicas,
recuperao de meandros destrudos por obras de linearizao,
reposio de nveis freticos mais elevados nas vrzeas (diminuio da intensidade de enxugo),
manuteno dos existentes e construo de novos espaos de reteno hdrica,
recuperao e reconstruo de habitats diversificados para a fauna e flora,
limitao da rea agrcola,
reconstruo de parte da mata ripcola,
recuperao do corpo de gua,
desvio de guas residuais.
As margens devem ser libertadas de usos agrcolas, urbanos, industriais ou de recreio com carcter intensivo.
Proteco das matas ripcolas ainda existentes, no s pelo seu elevado valor ecolgico, mas igualmente como espaos de reteno, infiltrao e armazenamento de gua.
As margens das linhas de gua devem, no essencial, serem cobertas e consolidadas com a vegetao ripcola correspondente s condies ecolgicas nelas prevalecentes, devendo para tal, serem edificadas as medidas construtivas de apoio adequadas e necessrias, assim como reservada a rea indispensvel ao seu desenvolvimento equilibrado dentro das exigncias prprias de cada linha de gua. A vegetao deve:
diminuir a energia da corrente,
consolidar e armar o terreno atravs de um correcto e adequado desenvolvimento radicular,
sombrear o corpo de gua, assegurando por via destas funes uma temperatura reduzida deste e garantir um fraco ou nulo desenvolvimento da vegetao infestante,
garantir uma diminuio do risco de eroso ou ruptura das margens, propiciando simultaneamente um nvel adequado de sedimentao,
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deve, simultaneamente, exigir um mnimo de cuidados de manuteno, devendo-se procurar combinaes especificas tais, que maximizem os objectivos hidrulicos, minimizando simultaneamente o risco de ocorrncias que possam gerar necessidades de correco.
A linha de gua deve dispor de espao para meandrar (sempre que tal corresponder s suas caractersticas morfolgicas), devendo as formaes aluvionares e os meandros existentes, serem protegidos e includos na zona consolidada e valorizada pela mata ripcola.
Devem-se evitar declives uniformes das margens, devendo estes adaptar-se forma do terreno, s caractersticas do substrato pedolgico e s condies de escoamento.
Deve-se propiciar a ocorrncia de numerosos e variados micro-bitopos, atravs de uma diversificao dos substratos do fundo e margens e da existncia e promoo de obstculos e variaes bruscas do perfil do leito
Devem-se promover sistemas de que resultem aumentos da capacidade biodegradativa da linha de gua (zonas de canio, sombreamento (aumentando o O.D. devido ao decorrente abaixamento da temperatura da gua), aumento da rugosidade e criao de obstculos como degraus e quedas de gua de modo a propiciar uma mais intensa reoxigenao natural).
Estas linhas orientadoras tero necessariamente de serem balanceadas caso a caso conforme as condies existentes e os condicionalismos decorrentes de usos j instalados ou de exigncias particulares de rentabilizao. Contudo, o seu carcter dever no essencial ser respeitado, procurando-se uma maximizao progressiva do seu grau de cumprimento.
Os materiais construtivos inertes s devem ser utilizados quando os materiais vivos no preencham a sua funo de regenerao e proteco. Certos trabalhos, ligados por ex. construo de fundos s podem ser realizados recorrendo-se a materiais inertes.
Apenas se devem utilizar materiais que no alterem o quimismo natural da linha de gua e lhe correspondam morfolgica e topologicamente. Sempre que se utilizem materiais construtivos inertes deve-se procurar articula-los com sistemas construtivos vivos, no s de modo a valoriza-los ecologicamente, como a diminuir a necessidade e intensidade do seu uso.
A vegetao preenche funes especficas determinantes para a segurana das margens e a integrao da linha de gua na paisagem, funcionando em grande medida simultaneamente como promotoras de uma comunidade ecolgica diversificada.
Os diversos tipos de vegetao preenchem funes distintas:
rvores e arbustos da margem - so as espcies lenhosas associadas s linhas de gua. Crescem na linha mdia de inundao ou acima desta e esto diferentemente
41Nascentes para a Vida
adaptadas a suportar diferentes intensidades e durao de inundao anual. Cumprem uma srie de funes especificas como proteger com o seu raizame a margem da eroso e de outros danos, sombrear a corrente evitando o desenvolvimento de processos eutrficos e de infestantes e ainda um excessivo aquecimento do corpo de gua oferecendo ainda um espao para o estabelecimento de um ecossistema estvel.
Juncos e canios - tm como principais funes as de enraizar a zona de variao do nvel da gua, evitando at um determinado ponto, a eroso nessa zona, as de sombrear parte da linha de gua e as de oferecer um meio de instalao a inmeras espcies vegetais e animais.
Outros elementos (sub-bosque e herbceas) - cumprem funes de consolidao das margens, de proteco a curto prazo e permitem um melhor desenvolvimento da sucesso.
A vegetao vai preencher igualmente funes de construo da paisagem, assegurando uma imagem marcada e marcante da linha de gua na paisagem. Deve estabelecer relaes estruturais e funcionais com as restantes comunidades envolventes integrando-se na estrutura de continuum natural da regio.
Importa contudo referir que a vegetao, conforme a sua natureza, apresenta caractersticas hidrulicas distintas que importa salvaguardar, j que permitem preencher diferentes objectivos tcnicos.
Em relao interveno propriamente dita, devem-se evitar, como referido, alteraes do perfil da linha de gua, assim como do seu comprimento, sempre que estas conduzam ao aumento da velocidade da corrente e consequentemente, a um maior risco de eroso e necessidade de uma maior consolidao das margens. Soleiras e obstculos que alterem o regime de escoamento podem ser de grande utilidade no processo de reoxigenao, ao mesmo tempo que, criando ligeiras represas, mantm o nvel da gua dentro de um limite mnimo e geram diferentes bitopos no corpo de gua.
O perfil transversal dever apresentar uma elevada flexibilidade e diversidade e corresponder a uma estrutura cujas funes de consolidao e aces sobre o escoamento se coadunem com a tipologia de uso do leito de cheia a qual, contudo, deve ser objecto de um ordenamento cuidado tendo em considerao as limitaes prprias do regime natural de inundao a que esto sujeitas. Em caso algum de aceitar a desvirtuao global do carcter da linha de gua e do seu leito de cheia por usos abusivos.
A interveno deve pois ter em conta esta grande complexidade estrutural e funcional e procurar no s preserv-las, como promover o seu carcter natural ou prximo do natural.
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Por outro lado, crtico ter em considerao que a gesto das linhas de gua deve ser feita pensando que alm dos 2% de dias de cheia existem 98% de dias de caudais normais ou mesmo de estiagem, com imposio do recurso a estruturas cada vez mais pesadas de armazenamento e distribuio.
Este tipo de situaes implica um cuidado particular com a proteco das margens fluviais no sentido da preveno dos fenmenos erosivos, funo que s pode ser eficazmente assegurada por uma pujante e adequadamente gerida mata ripcola e a adequada gesto dos leitos de cheia e das suas margens de invernia. Desta forma, a existncia de corredores ripcolas densamente enraizados mas medianamente permeveis ao escoamento no leito principal da linha de gua e de corredores arbreos densos e bem enraizados na orla dos leitos de cheia assume-se como fundamental para a preveno dos principais riscos de eroso ravinar.
A galeria ripcola funciona hidraulicamente como um retardador do caudal de cheia e como um fixador dos solos da margem, sendo as funes da galeria do leio de cheia essencialmente as mesmas associadas ou no a compartimentaes longitudinais de retardamento justificveis pela energia das enxurradas.
Obviamente que, qualquer destas infra-estruturas so absolutamente incompatveis com usos do leito de cheia que no possam suportar, sem danos irreversveis perodos curtos (at uma semana) de submerso, o que exclui, em absoluto construes de qualquer natureza. Implica igualmente, que vegetao como a silva e outras trepadeiras devam ser cuidadosamente geridas e limpas durante a manuteno da galeria ripcola para assegurar a sua maleabilidade e permeabilidade relativa e evitar, em absoluto, a potenciao de situaes de represamento de detritos transportados com os decorrentes riscos de ondas de cheia anormais aps a sua sbita ruptura.
A florestao das encostas e a eventual introduo de medidas de correco torrencial em cabeceiras mais ameaadas um terceiro tipo de interveno que permitir, no s a reduo do efeito catastrfico local e a jusante das cheias, como aumentar a reteno superficial e sub-superficial, potenciar a infiltrao e reduzir a eroso.
Concretizando, pode-se afirmar que a construo natural de linhas de gua, se bem que utilizando todos os materiais e tecnologias disponveis, concentra contudo os seus esforos, na construo de sistemas biotecnolgicos, organizados de tal modo, que preencham as exigncias tecnolgicas (proteco contra a eroso, consolidao e reconstruo de margens, regularizao fluvial, reteno e amortecimento de cheias, etc.) e ecolgicas (reactivao biolgica), no s da melhor forma possvel, como no mais curto espao de tempo, como ainda com uma eficincia sempre crescente.
A Tab.9 enuncia quais as tcnicas mais adequadas aos diferentes tipos de problemas e meios ocorrentes nos sistemas hdricos.
43Nascentes para a Vida
Tab. 9. Matriz de deciso para a seleco de tcnicas de interveno em meios hdricos (adaptado de Florineth, 2007 e Hacker, 2009)
Classif. Tcnica construtiva
Funo e eficciaVelocidade da
corrente
Resistncia tenso de
arraste
Med
idas
est
rutu
rais
Med
idas
de
segu
ran
a
Tcn
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Relvado X X X X
Placas de Relva X X X X X X X X X
Entranados X X X X X X X
Fascinas X X X X X X X X
Esteira de ramos X X X X X X X X
Degraus vivos de consolidao de taludes da
margemX X X X X X X X
Degraus vivos de consolidao da base da
margemX X X X X X
Fascinas X X X X X X X X
Parede de Fascinas X X X X X X X X
Fascinas sobre faixas de vegetao X X X X X X
Muro armado de geotextil com faixas de vegetao
X X X X X X X X
Muro de madeira Cribwall simples X X X X X X X
Muro de madeira Cribwall duplo X X X X X X X
Gabio X X X X
Rede X X X X X X
Deflector / Esporo X X X X X
Feixes de ramos X X X X
Entranado de ramos mortos X X X X
Fascinas no talude da margem X X X X X
Geotextil cobrindo a margem em talude X X X X X X
Geotextil com estacaria viva X X X X X X X
rvores para proteco de margens X X X X X
Tocos enraizados X X X X X
Estacas de salgueiro em enrocamento X X X X X X X X X
Estacas de salgueiro em no talude da margem X X X X X
Plantas lenhosas enraizadas X X X X X
MEIOS TERRESTRES
Os meios terrestres colocam desafios muito diversificados em termos da sua gesto e da promoo dos seus valores e funes naturais. Estes desafios assumem essencialmente duas formas:
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Preveno e correco da degradao do solo e da instabilidade das encostas e taludes.
Preservao e recuperao da funcionalidade natural, garantindo a maior segurana e eficcia dos usos do territrio, sejam eles humanos ou naturais.
TALUDES E ENCOSTAS
Os problemas associados a estes meios especficos prendem-se essencialmente com dois tipos de processos (Fig. 6): Eroso superficial e Movimentos de Massa (escorregamentos e aluimentos).
Fig. 6. Factores de degradao de taludes e encostas e efeito protector e correctivo da vegetao (Coppin e Richards, 1990)
Degradao de taludes e encostas
Erososuperficial
Movimentos de massa
Arranque e transporte de partculas individuais
Movimentos de grandes