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Lucila Vilela

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Lucila Vilela

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Quando abro a cada manhã a janela do meu quarto

É como se abrisse o mesmo livro

Numa página nova…

Mario Quintana

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PERFORMERS

Bailarina da cozinha: Bia VilelaBailarina do quarto: Diana GilardenghiMúsico da cozinha: Diogo de HaroAtriz e Cantora da lavanderia: Barbara BiscaroAtor do jardim: Robison SolettiTelefone: Euza Vilela

Website: www.casalucilavilela.com.br

Agradecimento Especial: Luis Gustavo Meneghim, Ilca Soares e Carlos Franzoi

Agradecimentos: Cecília Vilela, Ernani Vilela, Euza Vilela, André Vilela, Aline Essen, Regina Essen, Nelson Essen, Cláudio Trindade, Antonieta Acosta, Luiza Meneghim, Luiz Roberto Soletti, Rosvita Soletti, Alceu Bett, Andréia de Oliveira, Ildo Francisco Golfetto, Sabrina Brehsan, Gustavo Fonseca, Sansara Buriti, Carol Grilo, Ivan Jerônimo, Rafael Zunino, Claudio Gadotti, João Mario Monje Filho, Eduardo Jorge, Josimar Ferreira, Nadja Lamas, Daniele Zacarão, Eduardo Baumann, Rubens e Neiva, Toca do Vinil, Jean Carlos Martins, Brechó das Antiguidades, Rancho das Pizzas, Pousada Schulz, Maureen Bartz Szymczak, Loreena, Cainã, Moara e todos da equipe.

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PROJETO CASAJOINVILLE 2014

EQUIPE

Artista Visual / Concepção Geral: Lucila VilelaProdução Geral: Crica GadottiCoordenador de montagem: Robison SolettiAssistente de montagem: Carlos VelazquezPlanta baixa e concepção de luz: Marcelo SchroederParceria técnica nos vídeo-objetos: Giorgio FilomenoProjeto Gráfico: Zé Antonio LacerdaFotografia: Cristiano PrimFilmagem e vídeos: Alan LangdonAssistente de filmagem: Yasser Socarrás GonzálezCâmera Super 8: José Manuel SappinoAssessoria de imprensa: Néri Pedroso e Paloma Brum (assistente de comunicação) Figurinista da performance do jardim: Ivi CarvalhoAssistente de produção executiva: Leo RomãoFaxineira: Ivonete MarcianoPedreiro: Hilário BerriEletricista: Luiz Roberto SolettiDona da casa: Ilca Soares

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Quarto 2

Copa & Cozinha

Banheiro 1

Escritório

Banheiro 2

Lavanderia

Jardim

Quarto 1

Sala

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Numa noite de outubro, as portas se abrem e a chave não tem segredo. Quem visita sabe: tem coisa que não se sabe bem. A casa está arrumada, habitada por sons e aromas. A in-timidade se encontra em cada canto, em ges-tos que desorganizam os afazeres. O traba-lho de casa é quase sempre intenso e imper-ceptível, faz e desfaz em frações de segundo, cabe lá um sopro de silêncio e dança.

Para que uma casa funcione há muito a ser feito. Com essa não foi diferente. Trazer a casa ao campo da arte - ou o inverso - re-quer muito labor, processo amplo, coletivo e contínuo, cujos vestígios escondem-se por detrás dos buracos de fechadura.

CASA tem uma espinha dorsal, um esque-leto comum em sua concepção, no entan-to, o que a envolve é diferente em cada lu-gar. Mudar de endereço a transforma em outra. O deslocamento interfere na monta-gem estabelecendo uma experiência singu-lar. Assim, toda CASA é única.

Este catálogo apresenta o registro da segun-da versão do Projeto CASA, de Lucila Vilela, realizado na cidade de Joinville, Santa Catari-na, em 2014. Sua primeira versão foi realizada em Florianópolis, em 2010, e ambas edições foram premiadas na categoria Artes Visuais do Edital Elisabete Anderle de Estímulo à Cul-tura, da Fundação Catarinense de Cultura.

Para entrar, vire a página.

Entrando na casa

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Sala

TAPETE RODRIGO DE HARO: feito por Cecília Vilela. É uma reprodução de uma pintura de Rodri-go de Haro encontrada em um recorte de jornal.

TELEFONE: o telefone toca e a Tia Euza, de São Paulo, conversa com quem atender.

TELEVISÃO: a televisão dos anos 70 passa ima-gens distorcidas.

VINIL: os discos da Toca do Vinil podem ser toca-dos na vitrola em qualquer momento.

JOGO: peças do Jogo do Engenheiro são dispos-tas na mesa de centro.

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A CASA está aberta, em pleno funciona-mento. As pessoas entram, circulam, bisbi-lhotam, estranham, habitam. A experiência do visitante não passa somente pelo olhar – Ele senta, levanta, ouve, sente o cheiro da comida, fuma um cigarro, fala, lê um livro, dança um bolero. E também é olhado, seja pelos performers, seja pelos outros visitan-tes. O exercício da CASA é um exercício que envolve tempo, porque ela se faz, desfaz e refaz ao longo de sua duração - uma hora você encontra um cômodo intacto, desabi-tado; dali a algum tempo, ele pode estar ir-reconhecível, caótico e pulsando com a pre-sença de alguém que parecia estar escondi-do em algum canto ainda não visitado.

A profusão de coisas provoca um mecanis-mo interessante na vivência do espectador: incita um olhar desavisado, propondo um jogo entre reconhecer o que seria banal/cotidiano – uma peça de roupa, um armá-rio, uma pia – e o que seria preparado para

estar ali – um vídeo, um objeto de arte, um desenho. O que não se sabe é que tudo foi preparado para estar ali. O jogo da distin-ção entre o ‘cotidiano’ e o ‘normal’ em con-traposição ao ‘objeto de arte’ é o ponto de partida no qual se funda o trabalho de Lu-cila Vilela. Sem definir um comportamento para seu ‘espectador’, as coisas que habi-tam a CASA deixam dúvida: se as paredes da instituição, museu ou galeria, autorizam o objeto a ser visto como obra de arte, a CASA de Lucila embaralha tudo. Não tem só paredes, mas tem geladeira, tem jardim, tem sofá, tem gente, esse é o jogo que con-funde o espectador, criando casas escondi-das dentro da CASA, uma obra em cama-das para os diversos olhares que a visitam.

Pista n#1 – das apropriaçõesCadeau, de Man Ray e S/ Título, de Flávio de Carvalho

Uma das minhas tarefas na CASA foi ma-nipular o objeto Cadeau, de Man Ray, em minha lavanderia. Eu geralmente cantaro-lo minhas músicas e passo meus papéis com os ferros que tenho à mão, mas nes-se caso foi bastante difícil: os pregos do

A CASA escondidaPistas para um olhar desavisadopor Barbara Biscaro

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objeto impediam o alisamento à que se presta um ferro normal, destruindo o pa-pel cada vez que eu encostava uma super-fície na outra. Ao tentar usar o objeto, seu resultado fugia da simples contemplação para a desestabilização dos meus outros materiais cotidianos da CASA – esse fer-ro me deu trabalho! Ele foi feito em 1921 durante a primeira exposição individual de Man Ray em Paris1 . Mas, durante a mostra, dizem, o objeto desapareceu. O Cadeau entrou pra história como uma das obras mais emblemáticas do dadaísmo. E em 1974, Man Ray autorizou a tiragem de 5.000 cópias, todas numeradas e assina-das. A peça usada na CASA faz parte dessa série de múltiplos que Lucila comprou es-pecialmente para a edição de 2014.

Duas particularidades inserem o Cadeau na CASA: a primeira é que o objeto desafia a lógica do cotidiano, subvertendo seu ‘uso’. Um objeto útil, passa a ser inútil ao seu propósito original, mas, com o gesto de um artista, ganha valor no mundo da arte.

1 RAY, Man. Self Portrait. Peguin Books: Londres, 2012.

Na CASA os objetos perdem a lógica da sua utilidade, abrindo outras possibilida-des de uso: uma cama para dançar, uma máquina de lavar para assistir, a louça para fazer música – o destino dos objetos passa pela subversão de seu propósito, ativando o imaginário do cotidiano, porém sem a pretensão de adquirir valor no mundo ins-titucional da arte. A segunda particularida-de, é que muitos dos visitantes que pas-saram pela minha lavanderia não tinham a mínima idéia do valor ou da história do objeto. Alinhado com vários outros ferros antigos e novos, o objeto caro e avalizado pela assinatura de Man Ray, era (e não era) apenas mais um objeto, um tanto peculiar, é claro – como apontaria uma visitante que pensou ser um objeto de tortura. A obra de arte ‘original’, escondida dentro da CASA, não viraria o centro das atenções, porque não estava exposta com esse propósito. Estava escondida, camuflada, capaz de suscitar um pequeno sorriso em algum visitante que talvez suspeitasse do objeto, duvidando de sua autenticidade (afinal o que estaria a ‘arte’ fazendo no meio das bugigangas?).

Na parede de azulejos meio envelhecidos e lascados da cozinha, também encontra-vam-se alguns objetos: um velho estojo de aquarelas encontrado da casa, o armário cheio de quinquilharias e ao lado de tudo, como se fosse um daqueles quadros que reproduzem fotos de legumes e frutas ou o Menino Jesus da casa da infância, estava a obra S/ Título (1962), pintada por Flávio de Carvalho, um dos grandes nomes do mo-dernismo brasileiro. O quadro, empresta-do do acervo pessoal de um colecionador, passou muitas vezes despercebido; um visitante de costas quase se apoiava nele enquanto comia um pote de gelatina ofe-recido por Bia, a performer da cozinha. O quadro, pendurado em uma parede qual-quer da casa, entrou em um campo de in-visibilidade – bagunçando a hierarquia dos objetos do mundo da arte. Novamente a apropriação feita por Lucila deixa pistas, meias palavras para bons entendedores.

Pista n#2 – das cópias

Desde a edição anterior da CASA, Lucila trabalha com a ideia de cópia. Seja repro-duzindo quadros famosos na geladeira,

nas tapeçarias bordadas por Cecília Vilela (sua mãe), nos vídeo objetos que reprodu-zem obras de outros artistas, ela ‘copia’ in-discriminadamente – e com isso coloca em xeque o ato de copiar como procedimento em arte. No caso da geladeira da CASA de 2014, a obra escolhida foi Menino de Bicicle-ta com Abacaxi (1953), da pintora Djanira. Adaptada ao tamanho da geladeira, Lucila copiou até mesmo a assinatura: jogos de falsificação doméstica, em que as obras de arte migram para os eletrodomésticos, para os tapetes. Desta vez, a tapeçaria da sala reproduzia um quadro de Rodrigo de Haro. O aparente propósito decorativo se confunde com a referência. Novamente aqui as escolhas são minuciosamente dis-postas na CASA, dando uma falsa ideia de ‘despojamento’ – uma espécie de ‘arquite-tura de interiores’ provocativa, pensada de forma a inserir pistas que possam desesta-bilizar o olhar do visitante.

Todas essas pistas levam a uma mesma ação: reposicionar o modo de olhar e se relacionar com a obra de arte. A interdisci-plinaridade é latente (já que a CASA é artes visuais, dança, música, performance, arqui-

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objeto impediam o alisamento à que se presta um ferro normal, destruindo o pa-pel cada vez que eu encostava uma super-fície na outra. Ao tentar usar o objeto, seu resultado fugia da simples contemplação para a desestabilização dos meus outros materiais cotidianos da CASA – esse fer-ro me deu trabalho! Ele foi feito em 1921 durante a primeira exposição individual de Man Ray em Paris1 . Mas, durante a mostra, dizem, o objeto desapareceu. O Cadeau entrou pra história como uma das obras mais emblemáticas do dadaísmo. E em 1974, Man Ray autorizou a tiragem de 5.000 cópias, todas numeradas e assina-das. A peça usada na CASA faz parte dessa série de múltiplos que Lucila comprou es-pecialmente para a edição de 2014.

Duas particularidades inserem o Cadeau na CASA: a primeira é que o objeto desafia a lógica do cotidiano, subvertendo seu ‘uso’. Um objeto útil, passa a ser inútil ao seu propósito original, mas, com o gesto de um artista, ganha valor no mundo da arte.

1 RAY, Man. Self Portrait. Peguin Books: Londres, 2012.

Na CASA os objetos perdem a lógica da sua utilidade, abrindo outras possibilida-des de uso: uma cama para dançar, uma máquina de lavar para assistir, a louça para fazer música – o destino dos objetos passa pela subversão de seu propósito, ativando o imaginário do cotidiano, porém sem a pretensão de adquirir valor no mundo ins-titucional da arte. A segunda particularida-de, é que muitos dos visitantes que pas-saram pela minha lavanderia não tinham a mínima idéia do valor ou da história do objeto. Alinhado com vários outros ferros antigos e novos, o objeto caro e avalizado pela assinatura de Man Ray, era (e não era) apenas mais um objeto, um tanto peculiar, é claro – como apontaria uma visitante que pensou ser um objeto de tortura. A obra de arte ‘original’, escondida dentro da CASA, não viraria o centro das atenções, porque não estava exposta com esse propósito. Estava escondida, camuflada, capaz de suscitar um pequeno sorriso em algum visitante que talvez suspeitasse do objeto, duvidando de sua autenticidade (afinal o que estaria a ‘arte’ fazendo no meio das bugigangas?).

Na parede de azulejos meio envelhecidos e lascados da cozinha, também encontra-vam-se alguns objetos: um velho estojo de aquarelas encontrado da casa, o armário cheio de quinquilharias e ao lado de tudo, como se fosse um daqueles quadros que reproduzem fotos de legumes e frutas ou o Menino Jesus da casa da infância, estava a obra S/ Título (1962), pintada por Flávio de Carvalho, um dos grandes nomes do mo-dernismo brasileiro. O quadro, empresta-do do acervo pessoal de um colecionador, passou muitas vezes despercebido; um visitante de costas quase se apoiava nele enquanto comia um pote de gelatina ofe-recido por Bia, a performer da cozinha. O quadro, pendurado em uma parede qual-quer da casa, entrou em um campo de in-visibilidade – bagunçando a hierarquia dos objetos do mundo da arte. Novamente a apropriação feita por Lucila deixa pistas, meias palavras para bons entendedores.

Pista n#2 – das cópias

Desde a edição anterior da CASA, Lucila trabalha com a ideia de cópia. Seja repro-duzindo quadros famosos na geladeira,

nas tapeçarias bordadas por Cecília Vilela (sua mãe), nos vídeo objetos que reprodu-zem obras de outros artistas, ela ‘copia’ in-discriminadamente – e com isso coloca em xeque o ato de copiar como procedimento em arte. No caso da geladeira da CASA de 2014, a obra escolhida foi Menino de Bicicle-ta com Abacaxi (1953), da pintora Djanira. Adaptada ao tamanho da geladeira, Lucila copiou até mesmo a assinatura: jogos de falsificação doméstica, em que as obras de arte migram para os eletrodomésticos, para os tapetes. Desta vez, a tapeçaria da sala reproduzia um quadro de Rodrigo de Haro. O aparente propósito decorativo se confunde com a referência. Novamente aqui as escolhas são minuciosamente dis-postas na CASA, dando uma falsa ideia de ‘despojamento’ – uma espécie de ‘arquite-tura de interiores’ provocativa, pensada de forma a inserir pistas que possam desesta-bilizar o olhar do visitante.

Todas essas pistas levam a uma mesma ação: reposicionar o modo de olhar e se relacionar com a obra de arte. A interdisci-plinaridade é latente (já que a CASA é artes visuais, dança, música, performance, arqui-

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tetura), abrindo um espaço de liberdade para todos os artistas envolvidos na ação. Um espaço de fluxo, de convivência, povo-ado de micro acontecimentos que podem ser testemunhados por muitos, apenas por uma pessoa desavisada ou até mes-mo por absolutamente ninguém. A poética da CASA está no olhar de quem vê – afinal não é um espaço autoritário. Cada visitante constrói sua própria experiência de casa, segue as pistas deixadas, encontra outras dispostas pelo caminho. A ‘arte’ produzida é fugidia, impermanente. Quando a CASA acaba, seus objetos, seus habitantes, tudo some. A falta de vestígios é o grande trun-fo da obra: não é possível revisitar, recons-tituir a experiência. A CASA fica impressa na volatilidade dos corpos que a visitaram, que a vivenciaram – e, como um bom crime de romance policial, deixa poucas provas materiais de sua existência.

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Lavanderia

MÁQUINA DE LAVAR: no visor da máquina de lavar, um vídeo aparece registrando o funcio-namento de uma máquina que foi pintada com reproduções de Fernand Léger por Lucila Vilela, em 1998 (O Baile, 1942; Os Nadadores II, 1941-42; Os Acrobatas de Cinza, 1942-44).

FERROS DE PASSAR: uma série de ferros de várias épocas compõem o cenário da lavanderia, entre eles o ferro Cadeau, de Man Ray.

Man RayCadeau, 1921Ferro de passar com pregos16,5 x 10 x 9,5 cmTiragem de 5.000 em 1974,por Luciano AnselminoExemplar: 4128/5000Coleção Particular

PERFORMANCE: Barbara Biscaro, atriz e cantora. Improvisação a partir da ação de passar e estender papéis.

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Esa casa en realidad no era una casa, o era una casa fantasma

César Aira, La abeja

Na carta entregue pela malabarista, a casa estava vazia. Ele a leu em uma ponte sobre um rio. Que águas seriam aquelas? As águas que confirmavam seu percurso perpendicular a cada dia que por ali passava e que agora lhe entregava àquelas linhas como uma correnteza leve, mas que transporta carregamentos de carvão e turistas em êxtase do mesmo modo que esconde bicicletas submersas. Uma casa estava vazia, outra. Os objetos que se deixa-vam percorrer pelo ciclo diário da luz, acolhiam a poeira e a ausência de cor-po como um movimento vegetal finito, pela ausência de água.

Peça para a casa os passos ausentes dos dias distantes. O barulho dos passos dos moradores antigos. A invenção genealógi-ca dos vizinhos. Peça ainda um pouco de sal para a ferida da infância, o mesmo de

quinze anos, extraído do mar que se repete em ondas. Fale para ela da sujeira do seu corpo, dos seus dias sem banho, despido e sentado sobre o piso de madeira enquan-to calculava a ordem dos dias na estrada. Operações aritméticas simples, embora fundamentais que se resumiam em soma e subtração. Peça o sorriso do casal feliz que se mudará logo em breve e que se prolonga e se desfaz em excitação sexual, em sono. Fale dos domingos sem asfalto, com chuva e lama. Escute o ritmo dos rios no encana-mento. Nos assovios dos estrangeiros que escondem distraidamente sua língua para que você exponha a sua ou outra qualquer de empréstimo para mediar uma pergunta. Diga o quanto você está inibido e que você sente pelo gato que ainda não existe, mas argumente que a fotossíntese acontece e, enquanto isso, um vulto claro e perdido cruza a sala. Você viu? A casa entenderá sua abstinência, seu jejum, seu cansaço e até mesmo seus gestos mais abatidos, ainda quando tudo se desfizer por alguma onda telepática ou por um dia de faxina. Os dias têm uma ordem própria. A casa pede a cada instante que você respeite a realida-de. Você, fará isso por ela, você? Perdido

Peça para a casa (2013)por Eduardo Jorge

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em uma soma de papéis e em elogios, você fará? Saiba que ela sabe que você caminha lento, que você está mais velho e que con-templa outras vidas como quem escolhe qual delas pode substituir pela sua enquan-to você estiver ausente. De repente, você pensa em cantar até que lembra quem são os seus vizinhos, mas dessa vez o pensar foi mais lento, e você já está cantando, ain-da na cama.

Ele entrou na casa vazia de olhos fe-chados, com duas testemunhas. A su-jeira tinha uma carga de afeto. As ma-las entraram em confronto com a casa quando ele lembrou de uma diretora de teatro, que aceitou viver com algumas restrições dos aeroportos. Uma vida que não ultrapassasse sessenta e qua-tro quilos de bagagem. Pode uma casa adotar essa regra? As malas ficaram na sala enquanto seu corpo recebia o calor daqueles objetos há tantos dias expos-tos ao turno do sol na sala. O trânsito da cidade ainda perdurava em som. As outras presenças eram fantasmas livres e encadernados, estes sempre insones.

Peça para a casa o barulho dos automóveis dentro de garrafas de vidro, escrito com tinta transparente lembrança. Aproveite e peça que ela mostre os músculos que ela esconde de você por dentro da parede. A casa não está mais oca, ela respira, as pa-redes vibram e oscilam. Do mesmo modo que os olhos, fora do corpo, voam no ritmo de insetos noturnos para buscar as imagens do dia que ainda restam na sala, no banhei-ro e na cozinha. Um objeto esquecido que tem um brilho próprio, embora tenha fica-do imperceptível pela pressa. A água que ficou em conta-gotas. Uma parte quente da cafeteira, da panela que entrou em contato com a pele, essas imagens retornam com outro tempo no voo noturno dos olhos, es-ses insetos. Elas voltam com uma nova es-cala, ora maior, ora menor, mas nunca com o mesmo tamanho. Peça para a casa nada, entre e saia como se ela não existisse em sua unidade. A casa se sonha um labirin-to mesmo que exista em dezessete metros quadrados, mesmo que seja galpão, mes-mo que não seja casa. A casa é um espaço cênico que também é espectadora. Uma vez que tudo está escuro, a casa é o olho. Ela ob-serva e escuta o mínimo movimento, lê os

sonhos pelo contato da planta dos pés com o piso. No escuro, a casa roda lentamente. Peça para a casa ficar imóvel, pelo menos enquanto você estiver fragilmente exposto na hora do sono. A casa te vela. Peça para a casa parar enquanto você estiver imóvel. O acordo pode até ser: quando seus olhos se abrirem em corpo, a casa pode voltar a girar e volta a condição de movimento que expulsa tantas pessoas diariamente dela para que tragam logo mais à noite ou, na alvorada, corpos cansados.

Um galpão, os volumes em movimen-to, lhe fez pensar no animal-sofá, nas letras em busca de açúcar e nas cadei-ras sem peso, flutuantes, sem nádegas. Caberia um grito no galpão, em um corpo nu que dança sozinho enquanto, do outro lado do vidro, os carros pas-sam prosaicos, no ritmo da repetição diária dos rostos, no depósito mensal do salário e em tudo que pode ser sin-tetizado em saldo e sorriso. Em sim de banco e na oscilação de humor nas ca-sas de câmbio. Levar para passear, as crianças, os cachorros, as próprias per-

nas e um domingo desses o qual você me perguntou: quem é você. Você se lembra?

Peça para a casa uma voz que amorteça as dores de cabeça e que você saia do limbo que ela lhe prepara como conforto, que também é armadilha. Você sabe, a arma-dilha começa com a promessa de ganhos. Facilidades e felicidades, como se ditas ao mesmo tempo, essas palavras tivessem o mesmo eixo que faz o corpo seguir em direção ao contato com as paredes, às su-perfícies dos azulejos e todos os seus sé-culos de colonização. Quando a casa muda de assunto pela cor de uma parede ou pelo ruído do vento que entra, lembre-se do san-gue que corre sob os azulejos, do rio que corre na parede, da terra e dos fósseis que sustentam esse edifício apenas para que os movimentos do seu corpo acione outros movimentos, trazendo para um dia ordiná-rio a impossibilidade do brilho do sol ser neutro, do dia ser belo porque o sol queima sua energia gratuitamente. Seu corpo está protegido pela casa e talvez você cante que sair de casa, desde 1972, é arriscado. Mas

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em uma soma de papéis e em elogios, você fará? Saiba que ela sabe que você caminha lento, que você está mais velho e que con-templa outras vidas como quem escolhe qual delas pode substituir pela sua enquan-to você estiver ausente. De repente, você pensa em cantar até que lembra quem são os seus vizinhos, mas dessa vez o pensar foi mais lento, e você já está cantando, ain-da na cama.

Ele entrou na casa vazia de olhos fe-chados, com duas testemunhas. A su-jeira tinha uma carga de afeto. As ma-las entraram em confronto com a casa quando ele lembrou de uma diretora de teatro, que aceitou viver com algumas restrições dos aeroportos. Uma vida que não ultrapassasse sessenta e qua-tro quilos de bagagem. Pode uma casa adotar essa regra? As malas ficaram na sala enquanto seu corpo recebia o calor daqueles objetos há tantos dias expos-tos ao turno do sol na sala. O trânsito da cidade ainda perdurava em som. As outras presenças eram fantasmas livres e encadernados, estes sempre insones.

Peça para a casa o barulho dos automóveis dentro de garrafas de vidro, escrito com tinta transparente lembrança. Aproveite e peça que ela mostre os músculos que ela esconde de você por dentro da parede. A casa não está mais oca, ela respira, as pa-redes vibram e oscilam. Do mesmo modo que os olhos, fora do corpo, voam no ritmo de insetos noturnos para buscar as imagens do dia que ainda restam na sala, no banhei-ro e na cozinha. Um objeto esquecido que tem um brilho próprio, embora tenha fica-do imperceptível pela pressa. A água que ficou em conta-gotas. Uma parte quente da cafeteira, da panela que entrou em contato com a pele, essas imagens retornam com outro tempo no voo noturno dos olhos, es-ses insetos. Elas voltam com uma nova es-cala, ora maior, ora menor, mas nunca com o mesmo tamanho. Peça para a casa nada, entre e saia como se ela não existisse em sua unidade. A casa se sonha um labirin-to mesmo que exista em dezessete metros quadrados, mesmo que seja galpão, mes-mo que não seja casa. A casa é um espaço cênico que também é espectadora. Uma vez que tudo está escuro, a casa é o olho. Ela ob-serva e escuta o mínimo movimento, lê os

sonhos pelo contato da planta dos pés com o piso. No escuro, a casa roda lentamente. Peça para a casa ficar imóvel, pelo menos enquanto você estiver fragilmente exposto na hora do sono. A casa te vela. Peça para a casa parar enquanto você estiver imóvel. O acordo pode até ser: quando seus olhos se abrirem em corpo, a casa pode voltar a girar e volta a condição de movimento que expulsa tantas pessoas diariamente dela para que tragam logo mais à noite ou, na alvorada, corpos cansados.

Um galpão, os volumes em movimen-to, lhe fez pensar no animal-sofá, nas letras em busca de açúcar e nas cadei-ras sem peso, flutuantes, sem nádegas. Caberia um grito no galpão, em um corpo nu que dança sozinho enquanto, do outro lado do vidro, os carros pas-sam prosaicos, no ritmo da repetição diária dos rostos, no depósito mensal do salário e em tudo que pode ser sin-tetizado em saldo e sorriso. Em sim de banco e na oscilação de humor nas ca-sas de câmbio. Levar para passear, as crianças, os cachorros, as próprias per-

nas e um domingo desses o qual você me perguntou: quem é você. Você se lembra?

Peça para a casa uma voz que amorteça as dores de cabeça e que você saia do limbo que ela lhe prepara como conforto, que também é armadilha. Você sabe, a arma-dilha começa com a promessa de ganhos. Facilidades e felicidades, como se ditas ao mesmo tempo, essas palavras tivessem o mesmo eixo que faz o corpo seguir em direção ao contato com as paredes, às su-perfícies dos azulejos e todos os seus sé-culos de colonização. Quando a casa muda de assunto pela cor de uma parede ou pelo ruído do vento que entra, lembre-se do san-gue que corre sob os azulejos, do rio que corre na parede, da terra e dos fósseis que sustentam esse edifício apenas para que os movimentos do seu corpo acione outros movimentos, trazendo para um dia ordiná-rio a impossibilidade do brilho do sol ser neutro, do dia ser belo porque o sol queima sua energia gratuitamente. Seu corpo está protegido pela casa e talvez você cante que sair de casa, desde 1972, é arriscado. Mas

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também é arriscado desde 1984 ou 1993. Também o foi em 1927, quando o documen-to legal era uma voz que tinha suas falhas. Essa voz está no ar. Ela ainda existe, mesmo sem o corpo que a emitiu. Imite essa voz. Desautorize-se a sair, um, dois ou três dias. Faça da casa caverna. Lembre-se do animal que você quer ser e o animal que não. Eles te observam e a casa, antes mesmo de você nascer porque não se trata de algo pesso-al. Você não está em jogo. Depois de imitar outra voz, de fazer outros gestos, de entrar no limbo ao invés de sair, você está fora do campo de conforto da casa sem sair de casa, sem devolvê-la diariamente o corpo cansa-do. Sem valer-se dela como um espaço de preparação para o espaço exterior, porque ela agora é o espaço exterior. Como um ani-mal incompleto, despido de cativeiro, uma pergunta na hora errada. A casa te fez isso, tirou o tempo objetivo porque ela precisava reparar algumas dores de cabeça.

O café da manhã estava pronto. Soube disso quando ouviu a ponta dos dedos tocando no microfone, para saber se ele funcionava. Estava em um galpão,

deitado em uma cama de casal que, diante de si, tinha um microfone em um pedestal. Depois que o barulho dos dedos que batia na superfície microfo-nada emitiu ecos no espaço, uma voz feminina disse, o café está servido e acrescentou: senhor. O senhor vai que-rê-lo na cama, como de costume?

Peça para a casa que todos os defeitos do corpo fiquem entre a memória dos cômo-dos e a distância das nuvens, cintilando. Em cada período de formação o corpo tem um limite com as palavras, uma aspere-za e uma rugosidade com aquilo que ele exprime e com o que ele deixa cair e que-bra, partindo um objeto acidentalmente de modo desigual. Peça para a casa deixar cair apenas o necessário. O necessário para aquelas noites, antes com entalhes e orna-mentos, que permitam camuflar o corpo no escuro enquanto ele prepara a fuga. Como o corpo agora é mínimo, a casa se torna mí-nima. Peça para a casa o silêncio da ponta dos pés. A fome da ordem da madrugada. Os rastros do convidado estrangeiro. Peça pés sujos. Peça que a poeira fique e que o

asseio venha em algum futuro próximo, na distração de um rio, o mesmo que tem a pulsação do encanamento. Das águas re-voltas em uma banheira. Das noites que chegam em outros fusos enquanto você se movimenta sonolento, jejuando em pleno dia. Peça para a casa um exército sonâmbu-lo, paredes com mensagens cifradas, algum diário de bordo prestes a ser escrito. Esse diário é selvagem e doméstico, é o mun-do exterior na sua acepção mais íntima. É aquele momento da troca de olhares entre o viajante e o habitante até que o morador pensa em voz alta quem viaja aqui sou eu. Ele é a casa com pernas. Ele cheira à alve-naria e ao alho. Ele tem o tônus do trabalho e da desilusão tardia. Ele exibe o que tem em pupilas, de modo que o balconista dei-xa seu mundo objetivo e o balcão, tocando seu ombro e, em outro idioma, quer saber se está tudo bem com ele. E ele, com a casa vazia em uma mão e um sanduíche na ou-tra emite um sim universal com a cabeça. Enquanto isso, a poeira cai com parte da alvenaria e cabelos brancos. O branco dos olhos emite dentes de alhos. Peça para a casa que os defeitos do corpo sejam desco-bertos tarde demais.

Você conta e repete uma alegre história de perda. Ela não tem uma explicação que traga uma satisfação imediata, mas até justifica o comportamento de alguns dos que estão presentes, dos que ainda não substituíram seus objetos de afeto por outros. Dos que ainda dizem brinquedo. Quanto a você, quando você fala de algo doloroso, você ri. Di-gamos que isso talvez possa ser um riso nervoso ou uma forma de deixar claro que essa dor tem um ponto de vista ló-gico e econômico. Enfim, você e suas explicações

Peça para a casa janelas riscadas e rasu-radas, listras e texturas cujos relevos pro-duzam uma massa acidentada. Peça, peça, musgos, veludos por onde passar as mãos, por os joelhos, encostar os cotovelos. Ras-tros de luz hão de vir e partir, raio estendido por horas, contornando cada objeto e parte do corpo. Luz exterior anatômica, suores. O abandono no corpo, no chão os limites to-cados pelos movimentos dos dedos. Come-çando pelo dedo, algum zelo a algo perdido, um zero de início, partida atrás de partida,

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também é arriscado desde 1984 ou 1993. Também o foi em 1927, quando o documen-to legal era uma voz que tinha suas falhas. Essa voz está no ar. Ela ainda existe, mesmo sem o corpo que a emitiu. Imite essa voz. Desautorize-se a sair, um, dois ou três dias. Faça da casa caverna. Lembre-se do animal que você quer ser e o animal que não. Eles te observam e a casa, antes mesmo de você nascer porque não se trata de algo pesso-al. Você não está em jogo. Depois de imitar outra voz, de fazer outros gestos, de entrar no limbo ao invés de sair, você está fora do campo de conforto da casa sem sair de casa, sem devolvê-la diariamente o corpo cansa-do. Sem valer-se dela como um espaço de preparação para o espaço exterior, porque ela agora é o espaço exterior. Como um ani-mal incompleto, despido de cativeiro, uma pergunta na hora errada. A casa te fez isso, tirou o tempo objetivo porque ela precisava reparar algumas dores de cabeça.

O café da manhã estava pronto. Soube disso quando ouviu a ponta dos dedos tocando no microfone, para saber se ele funcionava. Estava em um galpão,

deitado em uma cama de casal que, diante de si, tinha um microfone em um pedestal. Depois que o barulho dos dedos que batia na superfície microfo-nada emitiu ecos no espaço, uma voz feminina disse, o café está servido e acrescentou: senhor. O senhor vai que-rê-lo na cama, como de costume?

Peça para a casa que todos os defeitos do corpo fiquem entre a memória dos cômo-dos e a distância das nuvens, cintilando. Em cada período de formação o corpo tem um limite com as palavras, uma aspere-za e uma rugosidade com aquilo que ele exprime e com o que ele deixa cair e que-bra, partindo um objeto acidentalmente de modo desigual. Peça para a casa deixar cair apenas o necessário. O necessário para aquelas noites, antes com entalhes e orna-mentos, que permitam camuflar o corpo no escuro enquanto ele prepara a fuga. Como o corpo agora é mínimo, a casa se torna mí-nima. Peça para a casa o silêncio da ponta dos pés. A fome da ordem da madrugada. Os rastros do convidado estrangeiro. Peça pés sujos. Peça que a poeira fique e que o

asseio venha em algum futuro próximo, na distração de um rio, o mesmo que tem a pulsação do encanamento. Das águas re-voltas em uma banheira. Das noites que chegam em outros fusos enquanto você se movimenta sonolento, jejuando em pleno dia. Peça para a casa um exército sonâmbu-lo, paredes com mensagens cifradas, algum diário de bordo prestes a ser escrito. Esse diário é selvagem e doméstico, é o mun-do exterior na sua acepção mais íntima. É aquele momento da troca de olhares entre o viajante e o habitante até que o morador pensa em voz alta quem viaja aqui sou eu. Ele é a casa com pernas. Ele cheira à alve-naria e ao alho. Ele tem o tônus do trabalho e da desilusão tardia. Ele exibe o que tem em pupilas, de modo que o balconista dei-xa seu mundo objetivo e o balcão, tocando seu ombro e, em outro idioma, quer saber se está tudo bem com ele. E ele, com a casa vazia em uma mão e um sanduíche na ou-tra emite um sim universal com a cabeça. Enquanto isso, a poeira cai com parte da alvenaria e cabelos brancos. O branco dos olhos emite dentes de alhos. Peça para a casa que os defeitos do corpo sejam desco-bertos tarde demais.

Você conta e repete uma alegre história de perda. Ela não tem uma explicação que traga uma satisfação imediata, mas até justifica o comportamento de alguns dos que estão presentes, dos que ainda não substituíram seus objetos de afeto por outros. Dos que ainda dizem brinquedo. Quanto a você, quando você fala de algo doloroso, você ri. Di-gamos que isso talvez possa ser um riso nervoso ou uma forma de deixar claro que essa dor tem um ponto de vista ló-gico e econômico. Enfim, você e suas explicações

Peça para a casa janelas riscadas e rasu-radas, listras e texturas cujos relevos pro-duzam uma massa acidentada. Peça, peça, musgos, veludos por onde passar as mãos, por os joelhos, encostar os cotovelos. Ras-tros de luz hão de vir e partir, raio estendido por horas, contornando cada objeto e parte do corpo. Luz exterior anatômica, suores. O abandono no corpo, no chão os limites to-cados pelos movimentos dos dedos. Come-çando pelo dedo, algum zelo a algo perdido, um zero de início, partida atrás de partida,

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por furos onde o acúmulo se vai. O corpo se esvai, seu cansaço agora é outro porque ele existe enquanto repetição. A cor que se repete e aí vermelho, vermelho, vermelho fazem o vermelho. Peça para a casa as fa-lhas de cores, fale com elas. Explique repe-tidas vezes que a repetição não é a mesma coisa, ela cria manobras de fuga, e, a partir de determinados pontos, corpos exaustos de repetir imprecisões acrescentam gestos estrangeiros ao impulso que emitiu o ges-to original e perdido. Peça para a casa um pouco da repetição dos corpos cansados, o movimento lento, de velocidade gasta. O corpo do decepcionado que desperta e abre uma torneira. A perna do tombo, des-locada da outra. O corpo que se recolhe buscando uma recuperação, que se dobra sobre si, circular, e que, tocado por algum acontecimento exterior, reage, vegetal, e muda a posição no espaço. Assim, todo o espaço exterior na casa muda de odor. A massa acidentada da parede muda, ela ga-nha a inconstância de certas cidades com a meteorologia. A casa escorre em chuveiro aberto, ela escorre em torneiras, águas de permanência selvagem.

As malas, no segundo mês, não foram desfeitas. No seu sonho, uma senhora abria uma após a outra e retirava as roupas e os objetos para guardá-los. Acontece que eles não saiam da mala. O que saia era o fantasma de cada coi-sas. Assim, ela guardou as almas das coisas nas gavetas, nos compartimen-tos do armário, debaixo da pia, dentro do banheiro e ainda na cômoda e no guarda-roupa. A senhora olhou para o seu sonho e corrigiu seu rosto como uma jovem vaidosa diante de um es-pelho portátil. Visivelmente ela estava mais magra, pois seu vestido estava duas vezes mais frouxo.

Peça para a casa palavras soltas, frases me-teorológicas. E a distância entre seu corpo em jejum e um relâmpago. A casa é um cla-rão. Fios irregulares, soltos para a travessia iniciada nos ouvidos, nas dobras das ore-lhas, na viscosidade da língua, nas linhas das mãos, dos pés. Até que o chão torna-se áspero e eis o piche, a lama e, por fim, o asfalto na sala, as paredes derivando para

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muros. O teto descasca antes que você diga céu e a boca permanece uma caixa oca e aberta. Relâmpagos se organizam em veias e artérias. Ele reproduz os estados de tra-vessia na casa: o grito no galpão vazio e o corpo solto em docas abandonadas, solto no limite de um barco cujas amarras se ba-tem em uma coluna de concreto. Um dia inteiro em jejum e a casa se rende ao con-formismo da limpeza. Por outro lado, em algumas horas o inverso do raio faz com que o sol retome o dia, expandindo-o em voz, a partir do que ele poderia dizer com palavras soltas, sílabas, pedaços, metades: vogais e raios. Ele queria ser chuva sem se ater ao trabalho de se nomear, trocar seu peso por litros na abstinência de corpo. Criar de tal modo um estado úmido para quando tudo desabar, a flora mínima sur-ja com tudo aquilo que é capaz de oxidar e atrair descargas elétricas atmosféricas. O corpo em estado de barco, flutuante, mó-vel ao limite das águas. Entregue a nada menos que fenômenos do tempo, chuvas, tempestades, estados permanentes de tro-cas de estados físicos, tudo o que a casa escondia agora está nos buracos, na parede rachada, nas frestas, mostrando, inclusive,

as casas da infância, as mudanças contínu-as e os pés que andam e que caminham a casa, recolhendo sua poeira, justo uma me-mória, quer dizer, atmosfera, uma medida que esses pés trazem outros, os pés de ou-tras casas.

Quando acordou, um ele-criança e um ele-animal brincavam na sala. O ele-criança brincava com um de seus olhos. Ela jogava ao roedor que o pe-gava ao redor com seus modos de cão e levava de volta, devolvendo-o para incitar um novo começo. O ele-criança ria quando tentava colocar seu olho, mas que, infelizmente, caía. Era aí que o objeto era chutado até que o roedor alcançava-o com as patas dianteiras e, com uma sequência de golpes de foci-nho, empurrava-o de volta, pelo menos ao alcance das mãos da criança, que ria. Com certeza ele teve algumas ver-tigens, mas com uma das mãos tapou a cava do olho esquerdo e, fechando o outro, voltou a dormir. As malas ainda suspensas pela corda.

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Peça para a casa a atividade da cópia, mu-danças no sigilo das sílabas, desarticuladas e sibilinas. A casa que antes estava locali-zada na memória dos pés, passa por uma agudeza da mão que toma os pés como co-meços. A cópia é uma forma de escrever as desistências e os desejos, a ordem da fome e do trabalho que dá ao corpo não a noção clássica de escultura, mas uma caminhada moto-contínuo, firme e fina, que atraves-sa o espaço da parede pela mão canhota, cujas curvas levam o que cai daquela cons-trução firme, vertebral e insone. A ativida-de da cópia, nesse sentido, se assemelha ao cansaço. A da economia invisível do ar, aquela em pulmões e no cálculo impossí-vel e inoportuno das sístoles-diástoles de corpos tão distintos. A diferença da cópia está antes das sílabas, nessa forma de ba-ter, no fluxo do sangue, na entrega do corpo a outras sístoles-diástoles. Mesmo a cópia desajeitada da casa é uma mudança, pois talvez você saia do abrigo justo nos dias de frio e de chuva com a casa copiada sem euforia de invenção. O gesto da cópia, a re-petição errada e distraída às voltas de um disco em movimento na vitrola. Que voz ocupará os espaços vazios da casa copiada?

Suas sílabas seguirão nas intempéries de palavras incompreensíveis até apagarem a casa copiada que voltará ao seu estado de mancha. A casa copiada, estado de desapa-recimento, uma habitação que desaparece em cadernos, papéis, palavras e espírito. A casa copiada volta a tal estado verbal, uma casa falada. Durante certo tempo, ela abrigará corpos sonoros: o que era mancha vira partitura de ruídos cada vez menores até que a casa passa à mudez. As linhas, enfim, voltam a ficar brancas e a casa vazia. A atividade da cópia foi um convite para a espiral, pois a casa copiada é um modo de fuga silenciosa da casa. A cópia segue na ponta dos pés, pisando em ovos.

O mundo tornou-se interior quando sair de casa toca de tal modo na tua intimi-dade que o sol ameaça seus olhos e sua pele, os olhares ao redor contêm certo pavor e uma pergunta silenciosa acres-cida de “mas”: o que fazes aqui? Vagar, ser fantasma apenas pela presença dos dentes, em sorriso. Tudo o que poderia ser dito estava impresso em algum lu-gar, mudo, abria gavetas, o mundo lhe

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entrava sentença a sentença e, nesse ritmo, até os mapas desapareciam.

Peça para a casa a ventura dos ovos, seus desfechos em ausência de metáforas. Ape-nas ovos em mãos de malabarista, outro modo funâmbulo de buscar o movimento em sua pausa. Peça para casa o segredo do ovo, o ovo enquanto ovo, redundante e frá-gil. Por dentro de todo o concreto, vigas, cascas e superfícies a casa é uma fina pelí-cula de cálcio, ossificada no limite da exis-tência e da possibilidade de ser despedaça-da. A casa casca começa a quebrar diante das mínimas manifestações de uma vida episódica, ela existe enquanto repetição, ela precisa ser repetida no rosto molhado, na toalete, no rosto indeciso se é noite, por uma fadiga que independe dos raios sola-res. Ela precisa do mesmo espirro, do des-gaste dos sapatos e da estimação. A casa precisa da sua presença em calendário, fe-romônios, ciclo menstrual, dores de cabeça e gritos de alegria. Ela precisa de surpresas, precisa de uma quantidade incomensurável de ácaros e de meios dias. Peça para a casa que ela se esconda. Em partitura, em pre-

sença estrangeira, em cada visita, nos con-vidados fantasmas. Ela precisa que os ob-jetos circulem em uma órbita que implica em eventos que envolvem tombos, sangue ou sorte. Peça para a casa, ovos espalha-dos pelo chão e pés cujo trajeto ignora-os intactos, mantendo-os no estado solar da vida, na potência que também se assume desistência. A casa precisa dos corpos que desistem diariamente. Dos corpos que se aventuram na repetição. Ela precisa desse começo para afirmar-se endereço.

Agora era ela, a malabarista. Três ovos suspensos no ar, a carta. Quatro, a mala. Cinco, a caminhada em direção a. Ovos e olhos, os dentes eram apenas uma frase frugal e estrangeira. A gola da camiseta previsível tal a pausa das mãos, branca. Os ovos agora mantém a proeza de um movimento ausente de malabarista.

Peça para a casa os princípios dos portos, das rodoviárias, dos aeroportos e das es-tações no sentido de que são ambíguos:

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quem está partindo, quem está voltando. Existem princípios móveis da casa. A casa está lá, sob a pele, inclusive, na sua superfí-cie. Existe, assim, o momento da espera, da esperança de se apropriar de vidas alheias, de reter um desejo antes não desejado. Um navio, um ônibus, um avião, um trem são portas abertas para uma exposição ficcional a outras vidas. O acesso à transparência, os rostos absorvidos por horários, telefonemas e quem está do outro lado, provavelmente no espaço físico da casa. Peça para casa o movimento da espera, mínimo gesto digno e discreto de um butô, onde anda onde dan-ça, não sabe, mas quando o dia nasce com um quarto de tempo a menos do que deve-ria, isso ainda é matéria da espera, feito o sono ou dormir em lugares inapropriados, da casa, inclusive. Peça para casa que as contrações musculares da espera desapare-çam quando o chá for sorvido, quando uma espécie de nuvem alaranjada se espalhar dentro da água quente, o mesmo aconteça com as dores: o mesmo se nessa água vier uma nuvem espessa e escura antes sob a perífrase do café na xícara até que os grãos, agora pó, cumpram o papel metabólico de despertar o corpo que espera. A casa, nes-

se intervalo, é lugar de passagem que ab-sorve as nuvens pretas e alaranjadas, um laboratório de criação de micro-paisagens e eventos. Um evento mundano nasce den-tro da casa, no globo branco do olho, na edificação dos dentes, no raspar das unhas e na brancura dos cabelos, na desistência do outro, no barco que desiste o destino em naufrágio, no voo que desaparece no ar, no ônibus em direção oposta, nos pés que andam pela casa, pois acontece por vezes do corpo coincidir o mapa desaparecido na sentença onde não se sabe se o corpo parte ou volta para casa. Em carne viva, a casa treme, ela está a caminho.

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Copa & Cozinha

GELADEIRA DJANIRA: na geladeira, uma reprodução de uma pintura da artista Djanira foi feita por Lucila Vilela.

DjaniraMenino de Bicicleta com Abacaxi, 1953guache s/ papel13 x 9 cm

FOGÃO: dentro do forno, um vídeo passa ima-gens da artista folheando um livro de receitas, quando encontra uma imagem, copia com tinta à óleo em uma panela e esquenta até que a figura se desfaça.

PERFORMANCE: Bia Vilela, bailarina. Improvisação com os elementos culinários enquanto prepara um jantar.

QUADRO: o quadro pendurado na parede é do artista Flávio de Carvalho.

Flávio de Carvalho S/ título, 1962guache e nanquim s/ papel 34 x 26 cmColeção Particular

PERFORMANCE: Diogo de Haro, músico.Improvisação musical com a louça e outros utensílios domésticos.

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Receita da Bia ITajine mit Mandeln und Backpflaumen

500 g Rindfleisch (Schulter) in ca. 4cm große Würfel geschnitten2 Zwiebel(n) (Gemüsezwiebeln), fein gehackt2 EL Öl (Olivenöl)1 TL Salz½ TL Pfeffer, frisch gemahlener schwarzer1 TL Zimt, gemahlen¼ TL Ingwer, gemahlen5 EL Butterschmalz500 g Backpflaume(n)4 EL Zucker½ Zitrone(n), die Schale½ Stange/n Zimt Zum Verzieren:250 g Mandel(n), abgezogene, in Butter geröstet Minze, frische oder Brunnenkresse½ TL Safranpulver

Zubereitung

Zwiebeln, Olivenöl, Salz, schwarzen Pfeffer und Gewürze gut verrühren und die Fleischwürfel sorgfältig mit der Mischung einreiben.Das so vorbereitete Fleisch in eine Tajine oder einen großen Schmortopf geben, Butterschmalz zufügen und so viel Wasser angießen, dass das Fleisch gerade bedeckt ist. Zugedeckt bei mittlerer Hitze 45-60 Minuten kochen, bis das Fleisch weich ist.In der Zwischenzeit die Pflaumen mit kochen-dem Wasser übergießen, 20 Min. einweichen und dann abtropfen lassen. 2 Schöpflöffel von der Rindfleischbrühe aus dem Schmortopf in einen kleinen Topf geben und das Fett abschöp-fen. Die Hälfte des Zuckers, Zitronenschale und Zimtstange zugeben. In diesem Sud die Pflaumen ca. 20 Minuten kochen, bis sie weich und gequollen sind.Den restlichen Zucker zu dem Fleisch in den Schmortopf geben und verrühren.Das Rindfleisch auf einer vorgewärmten Servierplatte mit den Pflaumen und ihrem Sud anreichten. Die Fleischsauce bei starker Hitze auf die Hälfte reduzieren und über das Fleisch geben. Mit den gerösteten Mandeln bestreuen und mit frischer Minze oder Brunnenkresse verzieren. Sofort servieren. Dazu Fladenbrot.P.S. Die genaue Zubereitungszeit weiß ich jetzt nicht, aber schon etwas aufwendig

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Receita da Bia II

Frita uns frango, umas cebolas e uns alho... Mistura 1 pote de amendocrem 1 vidro de leite de côco e umas 4 colheres de molho de soja. Joga uns gengibre e uns cheiro verde... Pronto

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Eu moro na casa. Eu a atravesso.Eu habito tanto por fora como no seu interior.

Às vezes eu a escuto respirar.Bernard Collet

Uma casa parece constituir uma espécie de preocupação primeira do homem de organi-zar o espaço de abrigo. Lucila Vilela, ao habi-tar e agir com seus performers sobre um es-paço doméstico, cotidiano e afetivo de uma casa, constrói uma espécie de arquitetura po-ética da subjetividade e da experiência. Esse processo parece acionar e revelar lugares do cotidiano de forma não cotidiana, mas não por isso menos inerente à sua integridade, ou seja, ao que esse lugar em si já contém o que ele é: uma casa. Seu interesse que tem por primazia a sensação, parece querer alcançar certa singularidade dentro do espaço. Para Michel de Certeau o espaço é um lugar prati-

cado1 , cuja relação do percurso do pedestre com os lugares acarreta uma mudança, onde o lugar se transforma em espaço, um lugar que possuímos intimamente. E é no cotidia-no que este tipo de espaço vai criar sentido, através do uso diário, da presença constante e insistente dos performers ali circulando, repousando e voltando a circular, como em rituais dessacralizados e repetitivos.

Lucila Vilela e seus performers, constroem a relação com o lugar tanto através da ação nos espaços da casa como da experiência de um cotidiano: o cozinhar, o lavar, o cantar, o dançar. Há uma necessidade de vivência de uma situação doméstica inserida na casa em questão, como uma forma de inserir a obra na casa e a casa na obra. Walter Benjamin salienta que o indivíduo só conhece um lu-gar uma vez que o tenha experimentado em suas diversas dimensões possíveis: para pos-suir um lugar é preciso se aproximar dele pelos quatro pontos cardeais e, inclusive, é preciso sair dele a partir desses pontos. De outro modo, este pode inesperadamente cruzar seu caminho, três

1 CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. Artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.

A casa: uma construção sensível do espaçopor Josimar Ferreira

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Eu moro na casa. Eu a atravesso.Eu habito tanto por fora como no seu interior.

Às vezes eu a escuto respirar.Bernard Collet

Uma casa parece constituir uma espécie de preocupação primeira do homem de organi-zar o espaço de abrigo. Lucila Vilela, ao habi-tar e agir com seus performers sobre um es-paço doméstico, cotidiano e afetivo de uma casa, constrói uma espécie de arquitetura po-ética da subjetividade e da experiência. Esse processo parece acionar e revelar lugares do cotidiano de forma não cotidiana, mas não por isso menos inerente à sua integridade, ou seja, ao que esse lugar em si já contém o que ele é: uma casa. Seu interesse que tem por primazia a sensação, parece querer alcançar certa singularidade dentro do espaço. Para Michel de Certeau o espaço é um lugar prati-

cado1 , cuja relação do percurso do pedestre com os lugares acarreta uma mudança, onde o lugar se transforma em espaço, um lugar que possuímos intimamente. E é no cotidia-no que este tipo de espaço vai criar sentido, através do uso diário, da presença constante e insistente dos performers ali circulando, repousando e voltando a circular, como em rituais dessacralizados e repetitivos.

Lucila Vilela e seus performers, constroem a relação com o lugar tanto através da ação nos espaços da casa como da experiência de um cotidiano: o cozinhar, o lavar, o cantar, o dançar. Há uma necessidade de vivência de uma situação doméstica inserida na casa em questão, como uma forma de inserir a obra na casa e a casa na obra. Walter Benjamin salienta que o indivíduo só conhece um lu-gar uma vez que o tenha experimentado em suas diversas dimensões possíveis: para pos-suir um lugar é preciso se aproximar dele pelos quatro pontos cardeais e, inclusive, é preciso sair dele a partir desses pontos. De outro modo, este pode inesperadamente cruzar seu caminho, três

1 CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. Artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.

A casa: uma construção sensível do espaçopor Josimar Ferreira

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ou quatro vezes antes que você se prepare para topar com ele2.

Michel Foucault salienta que estamos na época do simultâneo, onde, em um único espaço real vários tempos são acumulados e o disperso é colocado lado a lado sob o lastro da heterotopia, da inquietude, da agi-tação, e do desconcerto3 . Esse espaço onde as coisas se aproximam é um espaço hete-rogêneo, marcado por posicionamentos irre-dutíveis entre si, por relações de vizinhança que permitem constantes rearranjos. Lucila Vilela, ao situar o trabalho e as ações no âm-bito espaço-casa, se interessa não pela pu-reza do estado em que a obra é produzida, mas o quanto estão sujeitas a contaminação pela interação dos visitantes, ainda que es-tejam fatalmente condenadas a configurar uma ficção.

2 BENJAMIN, Walter apud. BUCK-MORSS, Susan. Dialética do Olhar em Walter Benjamin e o Projeto das Passagens. Belo Horizonte/Chapecó: UFMG/Grifos, 2002.

3 FOUCAULT, Michel. Outros espaços. in: Estética: literatura e pintura, música e cinema. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.

Os performers situam-se numa espécie de parênteses, de dentros do dentro, efêmeros por natureza, trabalham nesse âmbito do espaço privado, do dentro, preservam essa caracte-rística da intimidade na casa, que continua com seu caráter de casa, com sua integridade preservada. O diálogo acontece todo o tempo com o espaço construído. Os gestos perfor-máticos vão surgindo de acordo com a expe-riência dentro da casa, e às possibilidades de movimento, de ocupar os espaços com o cor-po, com a voz, com o silêncio.

De todos os cômodos, um deles não é habi-tado por nenhum performer: um quarto que se aproxima ao quarto de um escritor. Um quarto com uma antiga máquina de escrever; um computador com um video que mostra a imagem das mãos escrevendo continuamen-te; um tabuleiro de xadrez com outro video na parte interna; um velho espelho, logo na entra-da; e livros antigos em um canto. Um quarto que de certa forma poderia existir nas ficções de escritores como Jorge Luis Borges, Bioy Casares, Julio Cortazar, Lewis Carrol, Virginia Woolf, entre outros. Pois alguns escritores, quando narram espaços, tem como referên-cia suas próprias casas, já que especialmente

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o processo de criação de escritores se dá em espaços internos, em casas, em quartos.

A construção poética dos espaços, tanto pela artista e quanto pelos performers, ocorre como uma possibilidade de configuração de um cotidiano, ativada pelas características mais peculiares de cada ambiente. A produ-ção das ações se origina como parte de toda a experiência, como extensão de uma ação que passa, ela mesma, a fazer parte da casa. Esse processo de construção torna visível lu-gares normalmente inacessíveis, privados e interiores, que muitas vezes não se mostram a olhares externos a não ser através do tra-balho ali realizado. O desejo dos performers, no entanto, parece que não é o de transgres-são, de superação do espaço, mas ao contrá-rio, de fazer parte, de mimetizar-se à perso-nalidade da casa em seu universo íntimo de sutilezas e variações, com suas qualidades e idiossincrasias. A casa se transforma em um espaço ficcional, tornando-se pública, expos-ta. Então, já não é mais ela mesma: é uma construção sensível.

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Quarto 1

PERFORMANCE: Diana Gilardenghi, bailarina.Improvisação com os objetos do quarto.

CÔMODA: uma televisão é inserida dentro de uma cômoda. No vídeo, gavetas abrem e fecham com os quatro elementos: água, ar, terra e fogo.

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Banheiro 2

ESPELHO (Escova de dentes): vídeo do músico Diogo de Haro escovando os dentes sem a escova, reproduzindo os sons da escovação com a boca.

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Banheiro 1

ESPELHO: no centro do espelho do banheiro aparece um vídeo com uma série de mulheres passando batom.

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Escritório

TABULEIRO DE XADREZ: em algumas casas do tabuleiro aparece um vídeo de dois jogadores jogando sem peças nas dunas de Florianópolis.

COMPUTADOR: na tela, um vídeo exibe as mãos de um escritor digitando um texto.

MÁQUINA DE ESCREVER: uma máquina de escrever portátil, Remington Noiseless Portable, de 1930, posta ao lado do computador, faz alusão à primeira idéia de laptop.

LIVROS ENCONTRADOS: alguns livros en-contrados na casa são expostos no escritório: contabilidade da Mayerle Boonekamp Ltda. de 1937 a 1943; Die Blauen und die Gelben, de 1870 e Cadillac, fotografias de Stephen Salmieri, de 1985.

DOAÇÃO: recebemos uma doação dos vizinhos Rubens e Neiva, a coleção de livros Gênios da Pin-tura, editada pela Abril Cultural, em 1967. Os livros foram incorporados à biblioteca do escritório.

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47Entrevista com

Lucila Vilela*

De que modo surgiu e como define o projeto Casa?

O projeto Casa surgiu em 2001, logo que terminei a graduação em Artes Plásticas na UDESC. Durante o curso, realizei vários vídeo-objetos que tratavam do tema do co-tidiano e quando terminei, todos já estavam na minha cabeça dentro de uma casa junto com as performances. O projeto ficou muito tempo na gaveta porque na época ainda não tinha essa política de editais e eu, evidente-mente, não tinha recursos para fazer. Quan-do saiu o primeiro edital Elisabete Anderle, quase dez anos depois, um amigo produtor me incentivou a inscrever e, com a obtenção do prêmio, foi possível realizar em Florianó-polis (em 2010). Definir o projeto Casa é di-fícil, mas acho que uma das questões fortes é a mistura de linguagens. Trabalhar com ar-tes visuais junto com profissionais da dança, do teatro e da música faz com que o projeto transite nesse limiar entre cênicas e visuais. O tempo de visitação por conta disso fica também nesse trânsito, um tempo específi-co, próprio do projeto. A Casa fica aberta du-rante quatro horas e o visitante é livre para circular e ficar na casa o tempo que quiser,

dentro dos dias e horários estabelecidos, as performances e os vídeos não tem uma dura-ção com início, meio e fim, são contínuos e cabe ao público decidir o tempo de visitação. Daí a dificuldade de definir, se é uma exposi-ção, um evento, uma mostra, uma peça? Não importa, a Casa acontece.

Quais são, no seu entendimento, os maiores desafios da arte contemporânea?

Trabalhar com arte é um desafio, em todas as épocas.

Por que Joinville foi a cidade escolhida? O que foi considerado nesta escolha?

Queríamos também outra cidade de Santa Catarina. Joinville é culturalmente bem mo-vimentada e destaca-se como um dos prin-cipais pólos culturais do Estado, através de iniciativas em diferentes áreas, principalmen-te nas artes visuais, dança e teatro, o que liga diretamente com a Casa, que justamente tra-balha a conexão entre essas linguagens. Não tive dúvidas com relação à escolha da segun-da cidade a receber o projeto.

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Quais são os maiores anseios com relação ao projeto na cidade?

Não sei se seriam anseios. Uma motivação em relação à realização do projeto em Joinvil-le foi justamente a arquitetura das casas. Há muitas casas e cada uma mais charmosa que a outra, o que a torna a cidade especial. Tra-zer o projeto Casa para onde muitas pessoas ainda vivem em casas e mantém o cuidado de habitar esse espaço, cria um diálogo rico porque estabelece pontos em comum. A casa viva está em constante movimento. Acredito que o espaço físico exerce influência no es-paço mental e o trato com o lar indica mui-tos aspectos da vida privada. Joinville ainda valoriza a importância das casas, portanto o lugar adequado para abrigar o projeto.

Quais os critérios adotados na escolha dos artistas participantes, os performers? Por que não incluir nenhum artista da cidade?

A maioria dos performers é do projeto origi-nal, concebido em 2001, pessoas e trabalhos que conheço e acompanho há muito tempo. Eu cheguei a pensar em convidar artistas da cidade, por um lado a possibilidade de inter-

câmbio sempre tem um resultado positivo, mas por outro, após a realização do Casa em Florianópolis, percebi que funcionamos como uma família, e a relação de intimidade entrou em questão. Nessa segunda edição, mudei alguns performers, mas foi uma es-colha bastante precisa. Acho que manter os mesmos performers na Casa cria confiança e afina o trabalho.

Como vê a cena artística de Joinville, quais são as suas referências neste campo e cidade?

Vejo Joinville muito ativa culturalmente. Acompanho o movimento em todas as áre-as, como por exemplo as atividades reali-zadas pelo Instituto Schwanke, Museu de Arte de Joinville, Cidadela Cultural, Casa da Cultura, Associação Joinvillense de Teatro, Ballet Bolshoi e Festival de Dança de Join-ville, entre outras inciativas de artistas que conheço. Sempre tive contato com os artis-tas joinvilenses ligados ao campo das artes visuais e da performance, desde os tempos da universidade e admiro o seu profissiona-lismo. Joinville está num nível artístico e de produção cultural relevantes e me interessa bastante essa troca.

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Você ao contrário de muitos artistas transita neste projeto em oposição aos vínculos ins-titucionais. No tabuleiro do circuito artístico qual o papel do museu? Poderia falar um pouco sobre isso, pontue diferenças entre Casa e museus? Por que, afinal, o desejo de descontaminação?

Acredito em iniciativas independentes. En-trar no jogo do circuito nunca foi minha his-tória. Minha primeira exposição, uma das poucas, foi dentro de uma lavanderia porque queria expor o vídeo-objeto “máquina de la-var” e achei que uma lavanderia seria muito mais pertinente que um museu. O museu já tem uma cara de arte, carrega uma histó-ria, tem um peso institucional. Na Casa eu não procuro um espaço para abrigar minhas obras, muito menos para legitimar, eu penso na casa como obra, em sua totalidade, com tudo o que tem dentro, vivo e pulsante. A ar-quitetura é importante, o estilo da casa, os cômodos, as janelas, o telhado, os móveis que incorporo, as pessoas, tudo faz parte. Qual é o público esperado na visitação de Casa?

Todos!

O que deixou mais feliz na realização de Casa em Florianópolis?

Conseguir realizar o projeto já foi muito grati-ficante. A harmonia e conexão entre a equipe foi fundamental para o resultado. O que me deixou mais surpresa foi a reação do público, que eu não tinha previsto e sigo sem poder prever. Isso provocou situações inesperadas que só acrescentaram no projeto. O mesmo aconteceu com as performances porque ape-sar de terem uma condução, uma certa estru-tura, elas trabalham com a improvisação. A casa é a mesma todos os dias, mas também não é porque acontecem coisas diferentes e imprevisíveis. Assim como em casa mesmo, os gestos se repetem, mas com variações. A diferença dentro dessa repetição, mantém o projeto vivo.

*Publicada em 1.11.2014 Diário Catarinense, Caderno Cultura, págs. 2 e 3 (entrevista conce-dida à jornalista Néri Pedroso).

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Quarto 2

FECHADURA: através da fechadura da porta, pode-se ver um vídeo de animação erótica, realizado pelo artista Roberto Freitas.

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Quarto 2

FECHADURA: através da fechadura da porta, pode-se ver um vídeo de animação erótica, realizado pelo artista Roberto Freitas.

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Jardim

PERFORMANCE: Robison Soletti, ator circense. Improvisação com pernas de pau. Personagem livre que sai do jardim e perambula pela cidade. Figura híbrida entre pássaro e fantasma, inspirada nas atuações de Loïe Fuller, bailarina do início do século XX.

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55Biografias

Barbara Biscaro

Atriz e cantora. Performer da Lavanderia da CASA. Dra. em Artes Cênicas pela Universidade do Estado de Santa Catarina.

Josimar Ferreira

Pesquisador, mestrando no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Universidade do Estado de Santa Catarina, na linha de

pesquisa em Teoria e História da Arte.

Eduardo Jorge

Escritor, publicou San Pedro (2004), Espaçaria (lumme editor, 2007), Caderno do estudante de luz (lumme editor, 2008) e Pa, pum (com

Lucila Vilela, em 2012).

Néri PedrosoJornalista.

*

Lucila Vilela

Artista visual e pesquisadora. Realizou o Projeto CASA, de Artes Visuais e Performances, vencedor do prêmio “Edital Elisabete Anderle de estímulo à cultura”, em Florianópolis/SC (2010) e em Joinville (2014). Doutoranda em Artes Visuais pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Univer-sidade do Estado de Santa Catarina. Membro da equipe editorial da Revista Digital InterArtive: Contemporary Art and Thought (www.interartive.org).

Reside e trabalha em Florianópolis-SC.

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