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MÃE O maior poema do mundo 04 DE MAIO DE 2014

Mãe

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Coletânea de poemas de autores lusófonos para celebrar o Dia da Mãe

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Page 1: Mãe

MÃE O maior poema do mundo

04 DE MAIO DE 2014

Page 2: Mãe

MÃE O maior poema do mundo

Para todos os leitores e filhos que amam as suas mães, as bibliotecas

escolares do Agrupamento de Escolas nº3 de Elvas elaboraram esta

pequena coletânea de poemas de autores lusófonos que têm em comum

um dos temas mais caros à humanidade: a Mãe, a maternidade.

É a nossa forma de celebrar o Dia da Mãe, um singelo presente para as

nossas comunidades de leitores.

Agradecemos à professora Elisabete Fiel a disponibilização da belíssima

ilustração da capa.

Desejamos a todos, mães, pais e filhos, um maravilhoso Dia da Mãe.

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Para Sempre

Por que Deus permite

que as mães vão-se embora?

Mãe não tem limite,

é tempo sem hora,

luz que não apaga

quando sopra o vento

e chuva desaba,

veludo escondido

na pele enrugada,

água pura, ar puro,

puro pensamento.

Morrer acontece

com o que é breve e passa

sem deixar vestígio.

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Mãe, na sua graça,

é eternidade.

Por que Deus se lembra

- mistério profundo -

de tirá-la um dia?

Fosse eu Rei do Mundo,

baixava uma lei:

Mãe não morre nunca,

mãe ficará sempre

junto de seu filho

e ele, velho embora,

será pequenino

feito grão de milho.

Carlos Drummond de Andrade

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À minha querida Mãe

Eis-me aqui em Portugal

Nas terras onde nasci.

Por muito que goste delas

Ainda gosto mais de ti.

Fernando Pessoa

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Poema à Mãe

No mais fundo de ti

Eu sei que te traí, mãe.

Tudo porque já não sou

O menino adormecido

No fundo dos teus olhos.

Tudo porque ignoras

Que há leitos onde o frio não se demora

E noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo

São duras, mãe,

E o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas

Que apertava junto ao coração

No retrato da moldura.

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Se soubesses como ainda amo as rosas,

Talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;

Esqueceste que as minhas pernas cresceram,

Que todo o meu corpo cresceu,

E até o meu coração

Ficou enorme, mãe!

Olha - queres ouvir-me? -

Às vezes ainda sou o menino

Que adormeceu nos teus olhos;

Ainda aperto contra o coração

Rosas tão brancas

Como as que tens na moldura;

Ainda oiço a tua voz:

Era uma vez uma princesa

No meio do laranjal...

Mas - tu sabes - a noite é enorme,

E todo o meu corpo cresceu.

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Eu saí da moldura,

Dei às aves os meus olhos a beber.

Não me esqueci de nada, mãe.

Guardo a tua voz dentro de mim.

E deixo as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.

Eugénio de Andrade

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Só por isso, Mãe

Mesmo que a noite esteja escura,

Ou por isso,

Quero acender a minha estrela.

Mesmo que o mar esteja morto,

Ou por isso,

Quero enfunar a minha vela.

Mesmo que a vida esteja nua,

Ou por isso,

Quero vestir-lhe o meu poema.

Só porque tu existes,

Vale a pena!

Lopes Morgado

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Mãe:

Que desgraça na vida aconteceu,

Que ficaste insensível e gelada?

Que todo o teu perfil se endureceu

Numa linha severa e desenhada?

Como as estátuas, que são gente nossa

Cansada de palavras e ternura,

Assim tu me pareces no teu leito.

Presença cinzelada em pedra dura,

Que não tem coração dentro do peito.

Chamo aos gritos por ti — não me respondes.

Beijo-te as mãos e o rosto — sinto frio.

Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes

Por detrás do terror deste vazio.

Mãe:

Abre os olhos ao menos, diz que sim!

Diz que me vês ainda, que me queres.

Que és a eterna mulher entre as mulheres.

Que nem a morte te afastou de mim!

Miguel Torga

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Palavras para a Minha Mãe

mãe, tenho pena. esperei sempre que entendesses

as palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz.

sei hoje que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente.

pelas palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste

tanto e eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te

desculpa, mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente.

às vezes, quero dizer-te tantas coisas que não consigo,

a fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia

mais bonita que tenho, gosto de quando estás feliz.

lê isto: mãe, amo-te.

eu sei e tu sabes que poderei sempre fingir que não

escrevi estas palavras, sim, mãe, hei-de fingir que

não escrevi estas palavras, e tu hás-de fingir que não

as leste, somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes.

José Luís Peixot0

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Quando Eu For Pequeno

Quando eu for pequeno, mãe,

quero ouvir de novo a tua voz

na campânula de som dos meus dias

inquietos, apressados, fustigados pelo medo.

Subirás comigo as ruas íngremes

com a certeza dócil de que só o empedrado

e o cansaço da subida

me entregarão ao sossego do sono.

Quando eu for pequeno, mãe,

os teus olhos voltarão a ver

nem que seja o fio do destino

desenhado por uma estrela cadente

no cetim azul das tardes

sobre a baía dos veleiros imaginados.

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Quando eu for pequeno, mãe,

nenhum de nós falará da morte,

a não ser para confirmarmos

que ela só vem quando a chamamos

e que os animais fazem um círculo

para sabermos de antemão que vai chegar.

Quando eu for pequeno, mãe,

trarei as papoilas e os búzios

para a tua mesa de tricotar encontros,

e então ficaremos debaixo de um alpendre

a ouvir uma banda a tocar

enquanto o pai ao longe nos acena,

lenço branco na mão com as iniciais bordadas,

anunciando que vai voltar porque eu sou pequeno

e a orfandade até nos olhos deixa marcas.

José Jorge Letria

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Tenho Saudades do Calor ó Mãe

Tenho saudades do calor ó mãe que me penteias

Ó mãe que me cortas o cabelo — o meu cabelo

Adorna-te muito mais do que os anéis

Dá-me um pouco do teu corpo como herança

Uma porção do teu corpo glorioso — não o que já tenho —

O que em ti já contempla o que os santos vêem nos céus

Dá-me o pão do céu porque morro

Faminto, morro à míngua do alto

Tenho saudades dos caminhos quando me deixas

Em casa. Padeço tanto

Penso tanto

Canto tão alto quando calculo os corpos celestes

Ó infinita ó infinita mãe

Daniel Faria

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Carta à Minha Filha

Lembras-te de dizer que a vida era uma fila?

Eras pequena e o cabelo mais claro,

mas os olhos iguais. Na metáfora dada

pela infância, perguntavas do espanto

da morte e do nascer, e de quem se seguia

e porque se seguia, ou da total ausência

de razão nessa cadeia em sonho de novelo.

Hoje, nesta noite tão quente rompendo-se

de junho, o teu cabelo claro mais escuro,

queria contar-te que a vida é também isso:

uma fila no espaço, uma fila no tempo

e que o teu tempo ao meu se seguirá.

Num estilo que gostava, esse de um homem

que um dia lembrou Goya numa carta a seus

filhos, queria dizer-te que a vida é também

isto: uma espingarda às vezes carregada

(como dizia uma mulher sozinha, mas grande

de jardim). Mostrar-te leite-creme, deixar-te

testamentos, falar-te de tigelas - é sempre

olhar-te amor. Mas é também desordenar-te à

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vida, entrincheirar-te, e a mim, em fila descontínua

de mentiras, em carinho de verso.

E o que queria dizer-te é dos nexos da vida,

de quem a habita para além do ar.

E que o respeito inteiro e infinito

não precisa de vir depois do amor.

Nem antes. Que as filas só são úteis

como formas de olhar, maneiras de ordenar

o nosso espanto, mas que é possível pontos

paralelos, espelhos e não janelas.

E que tudo está bem e é bom: fila ou

novelo, duas cabeças tais num corpo só,

ou um dragão sem fogo, ou unicórnio

ameaçando chamas muito vivas.

Como o cabelo claro que tinhas nessa altura

se transformou castanho, ainda claro,

e a metáfora feita pela infância

se revelou tão boa no poema. Se revela

tão útil para falar da vida, essa que,

sem tigelas, intactas ou partidas, continua

a ser boa, mesmo que em dissonância de novelo.

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Não sei que te dirão num futuro mais perto,

se quem assim habita os espaços das vidas

tem olhos de gigante ou chifres monstruosos.

Porque te amo, queria-te um antídoto

igual a elixir, que te fizesse grande

de repente, voando, como fada, sobre a fila.

Mas por te amar, não posso fazer isso,

e nesta noite quente a rasgar junho,

quero dizer-te da fila e do novelo

e das formas de amar todas diversas,

mas feitas de pequenos sons de espanto,

se o justo e o humano aí se abraçam.

A vida, minha filha, pode ser

de metáfora outra: uma língua de fogo;

uma camisa branca da cor do pesadelo.

Mas também esse bolbo que me deste,

e que agora floriu, passado um ano.

Porque houve terra, alguma água leve,

e uma varanda a libertar-lhe os passos.

Ana Luísa Amaral

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Mãezinha

A terra de meu pai era pequena

e os transportes difíceis.

Não havia comboios, nem automóveis, nem aviões, nem mísseis.

Corria branda a noite e a vida era serena.

Segundo informação, concreta e exacta,

dos boletins oficiais,

viviam lá na terra, a essa data,

3023 mulheres, das quais

43 por cento eram de tenra idade,

chamando tenra idade

à que vai desde o berço até à puberdade.

28 por cento das restantes

eram senhoras, daquelas senhoras que só havia dantes.

Umas, viúvas, que nunca mais (Oh nunca mais!) tinham sequer sorrido

desde o dia da morte do extremoso marido;

outras, senhoras casadas, mães de filhos...

(De resto, as senhoras casadas,

pelas suas próprias condições,

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não têm que ser consideradas

nestas considerações.)

Das outras, 10 por cento,

eram meninas casadoiras, seriíssimas, discretas,

mas que, por temperamento,

ou por outras razões mais ou menos secretas,

não se inclinavam para o casamento.

Além destas meninas

havia, salvo erro, 32,

que à meiga luz das horas vespertinas

se punham a bordar por detrás das cortinas

espreitando, de revés, quem passava nas ruas.

Dessas havia 9 que moravam

em prédios baixos como então havia,

um aqui, outro além, mas que todos ficavam

no troço habitual que meu pai percorria,

tranquilamente, no maior sossego,

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às horas em que entrava e saía do emprego.

Dessas 9 excelentes raparigas

Uma fugiu com o criado da lavoura;

5 morreram novas, de bexigas;

outra, que veio a ser grande senhora,

teve as suas fraquezas mas casou-se

e foi condessa por real mercê;

outra suicidou-se

não se sabe porquê.

A que sobeja

Chamava-se Rosinha.

Foi essa a que meu pai levou à igreja.

Foi a minha mãezinha.

António Gedeão

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Incubadora

Era tão pequena a mão que

nem o seu dedo mendinho

conseguia agarrar. Pesava

quinhentos gramas e respirava

sem ajuda do ventilador

O coração da sua mãe quase

que não batia com receio de

que ele sufocasse sob o peso

do seu amor

Jorge de Sousa Braga

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FICHA TÉCNICA:

- Pesquisa, seleção e compilação dos poemas:

Bibliotecas Escolares do Agrupamento de Escolas nº3 de Elvas

Biblioteca Escolar da Escola Secundária D. Sancho II, Elvas

Biblioteca Escolar da Escola Básica de Vila Boim

Grafismo: modelo do Word 2013

Ilustração da capa: prof. Elisabete Fiel

Fontes de pesquisa dos poemas e fotos dos escritores:

http://www.online24.pt/poemas-para-o-dia-da-mae/

http://www.citador.pt/poemas/t/mae

ANO LETIVO DE 2013/2014