Manicomios, Prisoes e Conventos_Ervig Goffman

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  • 7/31/2019 Manicomios, Prisoes e Conventos_Ervig Goffman

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    GOFFMAN, Erving. Manicmios, Prises e Conventos.6 edio. So Paulo: Editora Perspectiva, 2001.

    Neste livro o autor analisa as Instituies Totais, que, segundo o mesmo, caracterizam-se porlocais de residncia ou trabalho, onde um grande nmero de indivduos em semelhante

    condio, vivem enclausurados sob uma administrao formal. O carter total de sua clausura simbolizado por uma barreira com relao ao mundo externo, a qual torna-se explcita porbarreiras fsicas de altos muros, paredes, portes e cadeados. As instituies totais destinam-se a atender pessoas consideradas incapazes de cuidar de si mesmas ou que representem

    alguma ameaa comunidade.

    Todas as atividades cotidianas dos indivduos que ali se encontram, como dormir, recrear,circular e trabalhar, so realizados no mesmo local, de forma conjunta, sob um regime deatividades e horrios predefinidos e regidos por um sistema de regras formais explcito por

    uma grupo de funcionrios que representam a autoridade vigilante. Essa estrutura se organiza

    dentro de um plano racional nico que busca atender os objetivos oficiais da instituio.

    O autor analisa as Instituies Totais dentro de um prisma dividido entre dois mundos

    antagnicos:

    Nas instituies totais, existe uma diviso bsica e ntre um grande grupo controlado, que podemos

    denominar o grupo dos internados, e uma pequena equipe de superviso. pq.18

    Desenvolvem se a, duas categorias de grupo que diferem entre si tanto social quantoculturalmente: internados e equipe dirigente, embora estejam oficialmente em contato, esto

    separados pela distncia que existe entre seus papis. (pg.20)

    O autor explica que a instituio total, embora possa ter fins como moradia e trabalho, atua

    nos indivduo sob condies diferentes daquelas que a sociedade incorpora. Mesmo que hajatrabalho e incentivo para o mesmo, ele se desenvolve num conjunto de significnciasdiferentes das do mundo externo. A estrutura bsica de pagamentos substitudo por um

    sistema de recompensas e prmios, e o trabalho imposto sob ameaa de castigos e punies.O autor compara que enquanto no mundo exterior o indivduo busca alcanar a dignidade pelotrabalho, no mundo fechado da instituio o indivduo est sujeito desmoralizao pelo

    trabalho. Salienta-se tambm que por mais que a vida se desenvolva em grupo, a convivncia

    entre os indivduos muito longe est de corresponder a uma familia.

    A instituio total um hbrido social, parcialmente comunidade residencial, parcialmente organizao

    formal. (...) Em nossa sociedade, so estufas para mudar pessoas; cada um um experimento natural

    sobre o que se pode fazer ao eu. pg.22

    O autor nos apresenta em captulo o mundo do internado.

    A barreira que as instituies totais colocam entre o internado e o mundo externo assi nala a primeira

    mutilao do eu. Pg24

    A chegada ao mundo do internato caracteriza-se por um rompimento fsico do indivduo com

    famlia e sociedade. Este afastamento do ambiente civil, impossibilita ao indivduo o contatocom uma srie de experincias que confirmam a ele uma concepo de si prprio.

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    As instituies totais padronizam um processo que o autor chama de mortificao do sujeito, a

    qual responsvel pela perda de identidade, da viso que o internado tem de si e das outraspessoas a sua volta. H, segundo ele, um despojamento de papis, assegurada pela rupturainicial profunda com a vida do sujeito no mundo exterior. O enclausuramento leva a total

    perda de contado, essa seria sua morte civil.

    os processos de admisso talvez pudessem ser denominados arrumao ou programao, pois, ao

    ser enquadrado o novato admite ser conformado e codificado num objeto que pode ser colocado na

    mquina administrativa do estabelecimento modelado suavemente pelas operaes de rotina pg.25

    No instante da admisso de um novo internado, lhe imposta a condio de cooperao eobedincia e a partir da sucede-se uma sequencia de perdas muito ntimas: nome, bensmateriais, roupas, muitas vezes os cabelos, em fim, todo um conjunto de identidade que ointernado ainda possua, ao qual atribua sua imagem ao se apresentar perante os outros. O

    autor chama esse processo de deformao pessoal, quando ocorre uma desfigurao do eu.

    Uma vez privado de seus bens e de sua prpria aparncia, a instituio providencia ao recminternado, algumas substituies padronizadas, distribudas uniformemente entre todos queali se encontram.

    A vida do recm internado tem uma rotina de humilhaes frequentes que se referem a umaexposio total de si mesmo quanto a sua histria e quanto ao seu presente, alm deexposies nudez, violncia, e as relaes sociais impostas dentro do novo ambiente. Adignidade se perde completamente quando o indivduo torna-se parte do fluxo do programa

    de atividades, s quais ele obrigado a obedecer.

    Numa instituio total, a vida constantemente penetrada e colocada a merc de sanses. Osmenores segmentos de atividades de uma pessoa esto sujeitos a regulamentos e

    julgamentos. Esse controle social torna impossvel desenvolver qualquer autonomia pois o

    internado perde o poder de deciso pessoal, perde sua liberdade de ao.

    As instituies justificam esse conjunto de aes que autor chamou de mortificaes, como

    uma forma de controlar um grande nmero de internados num espao restrito com poucogasto de recursos (pg 48), mas essa atitude pode ser vista como a forma pela qual a instituio

    prepara os novatos para comear a viver de acordo com as regras da casa.

    As instituies exploram um sistema de privilgios em troca de obedincia, que, segundo o

    autor, possibilitam a construo de um mundo em torno de atividades secundrias que nadatem a ver com qualquer tratamento. Para o no cumprimento desse sistema existemconsequncias que se estabelecem dentro de um outro sistema, o de castigos. Nesse seenquadram aumento de pena, violncia fsica, humilhao. Ambos os sistemas se ligam a um

    sistema de trabalho interno que serve simplesmente para a manuteno da instituio.Sistema este no qual a moeda muitas vezes o prprio espao. Castigo ou privilgios podemser efetuados atravs de posicionamento e localizao. Melhores lugares aos obedientes,

    piores lugares a quem no se adapta as regras.

    Por mais duras que sejam as condies de vida no interior das instituies totais, o autor

    considera que a mais penosa sensao para o internado angustia do tempo. Tempo que lhefoi tirado, roubado. O sentimento de tempo morto por toda a vida que se deixou alm dos

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    muros, de todo o contato social, pode ser a maior pena e a maior tortura para o condenado a

    viver, ou a no viver, numa instituio total. Exilio da vida.

    Todavia, a angustia do tempo no acaba prestes a alta do paciente da instituio. Existe

    tambm uma angstia da liberao. Uma vez internado o individuo adquire um baixo status

    social de doente mental que lhe imprime uma condio permanente. Sua sada da instituiopoderia significar o fim do pesadelo, da trajetria de alienao e violncia, mas, ao deparar-secom o mundo alm dos muros, o indivduo arrasta consigo sua histria atravs do estigma de

    doente mental.

    Depois de ter se adaptado ao mundo do enclausuramento, a desaculturao um fatorimportante na trajetria do internado, que culmina com a impossibilidade de acompanhar ou

    adquirir os hbitos exigidos na sociedade mais ampla.

    (...)pode -se descobrir que a liberao significa passar do topo de um pequeno mundo para o ponto mais

    baixo de mundo grande. Pg68-69

    O mundo da equipe dirigente

    (...) muitas instituies totais parecem funcionar como depsitos de internados, mas (...) usualmente se

    apresentam (...) como organizaes racionais, conscientemente planeadas como mquinas eficientes

    para atingir determinadas finalidades oficialmente confessadas e aprovadas. (...) um frequente objetivo

    oficial a reforma dos internados na direo de algum padro ideal.pg.69 -70

    O contexto bsico da equipe dirigente de uma instituio total a contradio entre o que a

    instituio diz e o que realmente faz.

    O mundo de trabalho da equipe dirigente se refere apenas a pessoas, os internados. Elas setornam o seu objeto de trabalho, e, como material de trabalho, as pessoas podem adquirircaractersticas de objetos, especialmente nas instituies totais, onde o acompanhamentodado a elas tratado dentro de um sistema burocrtico de atividades, expresso na notas deregistros. No fim do de trabalho elas so livres para sair da instituio e ter seu status social erelaes no mundo externo.