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2019 revista, atualizada e ampliada 8 a edição Manual de Direito Financeiro Harrison Leite

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2019

revista, atualizada e ampliada

8 a edição

Manual de

Direito Financeiro

Harrison Leite

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CAPÍTULO 1

A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO E O DIREITO FINANCEIRO

Sumário • 1. Atividade Financeira do Estado – 2. Direito Financeiro: 2.1. Autonomia do Direito Financeiro; 2.2. Fontes do direito financeiro: 2.2.1. Fontes Formais; 2.2.2. Fontes Materiais – Ciência das Finanças – 3. Premissas do Direito Financei-ro: 3.1. Limitação de Recursos; 3.2. Escolhas Trágicas – 4. Competência Legislativa: 4.1. Competência dos Municípios em matéria de direito financeiro – 5. Direito Financeiro e o Federalismo Assimétrico – 6. Quadro Sinóptico – 7. Informativos Recentes: 7.1. STF – 8. Questões de Concursos Públicos.

1. ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO

O estudo do direito financeiro perpassa pela análise do fenômeno financeiro, tomado esse no sentido de observar gradativamente a razão da obtenção de ingresso de recursos nos cofres públicos. A necessidade de arrecadação maior ou menor oscila com o “tamanho”1 do Estado, a justificar maior ou menor tributação.

E, como o custo da atuação do Estado deve ser suportado pela sociedade, que, nos regimes democráticos, determina o nível de sua presença e da participação que deseja, a ela compete, por seus representantes, impor as linhas fundamentais dos gastos oficiais que pretende suportar, para que o Estado, meio e não fim, preencha suas finalidades essenciais de serviço ao povo, por intermédio do governo2.

O fenômeno financeiro, nessa linha, consiste na análise da finalidade principal do Estado, que é a realização do bem comum, e a consequente necessidade de desenvolver diversas atividades, chamadas de atividades estatais, para que esse bem geral seja alcançado. Desse modo, o Estado não visa à proteção das necessidades individuais do homem, mas, sim, à satisfação das necessidades públicas.

É que, se por um lado, o homem consegue satisfazer suas necessidades individuais pelo seu próprio esforço, como se dá com a alimentação, vestuário etc., por outro, as necessidades coletivas privadas podem ser satisfeitas pelo esforço coordenado da sociedade e por grupos regulamentados, como ocorrem com as associações de classes e os grupos profissionais es-pecificados. As necessidades coletivas públicas, por sua vez, só o Estado poderá atendê-las, de modo que tomou para si a responsabilidade para a sua satisfação, como estradas, usinas hidrelétricas, segurança e justiça.

1. “Tamanho” no sentido de número de atribuições assumidas pelo Estado, que só poderão ser satisfeitas com a arrecadação de recursos públicos.

2. MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil, 6º volume, Tomo II. Celso Bastos e Ives Gandra Martins. 2. ed., São Paulo: Saraiva, 2001. p. 207.

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Sobre o tema, afirma Edvaldo Brito3:As necessidades humanas são essas carências e desejos que o homem tem, por ser animado, porque ele também raciocina, porque ele também tem inteligência, acima do instinto. Por-tanto, como essas carências são variadas, impõe-se a sua classificação nas seguintes espécies: necessidades individuais; necessidades comuns; necessidades coletivas, incluindo-se, nessas últimas, a chamada necessidade pública, na qual há um componente importante, qual seja, o da avocação, feita pelo Estado, para que ele as satisfaça, não só por causa da natureza delas, como, também, pela natureza dele. A segurança pública é desse tipo, somente ele pode atuar nesse campo.

Deixando-se de lado o critério das classificações, o certo é que necessidades coletivas públicas são aquelas que devem ser satisfeitas pelo poder público, através da prestação de serviços públicos, delegáveis ou não a particulares, sem perderem, contudo, a natureza de essencialidade. Como afirma Aliomar Baleeiro, necessidade pública “é toda aquela de interesse geral, satisfeita pelo processo do serviço público. É a intervenção do Estado para provê-la, segundo aquele regime jurídico, que lhe dá o colorido inconfundível”4. Para Regis Fernandes de Oliveira, a definição de necessidade pública perpassa, sobretudo, por uma decisão política, pois “o Estado é quem vai dizer, para usar verbo vicário, no texto constitucional e nas leis posteriores, quais as necessidades que vai encampar como públicas”.5 E completa:

Evidente está que, para aqueles que perfilham filosofia de que existem necessidades intrínsecas do ser humano, o Estado não pode deixar de atender a alguns interesses básicos. Todavia, pondere-se que entre o ser e o dever ser há bastante distância. Entre o que deve o Estado atender, seja por definição jusnaturalista, seja por posição positivista, e aquilo que dentro da realidade pode ele resolver, ficam os imponderáveis econômico, político e social6.

A par das funções nitidamente estatais, o Estado poderá exercer outras, até mesmo de ordem econômica, que não afetam a sua existência, e, mais do que isso, poderão lhe render receitas para cobrir os custos com a prestação dos serviços públicos.

É que cada vez mais estes custos se tornam crescentes, mormente em Estados intervencio-nistas e protetivos, em que aumentam as necessidades públicas com o aumento da atuação do Estado na assistência social, previdência e seguridade, tal como se dá com o Estado brasileiro. Sendo assim, mais do que justificável a ação estatal de obtenção de receita pública para prestar os serviços públicos que atenderão essas necessidades coletivas públicas.

A satisfação dessas necessidades, inegavelmente, implica gastos públicos, que devem ser meticulosamente analisados e geridos através de um orçamento público. Se, porventura, a receita arrecadada não for suficiente para custear os gastos, o Estado poderá obter emprés-timos públicos, também chamados de créditos públicos, com o fim de atingir o equilíbrio entre receitas e despesas.

O conjunto que envolve esses quatro fenômenos, quais sejam, receitas públicas, despesas públicas, orçamento público e crédito público chama-se atividade financeira do Estado.

3. BRITO, Edvaldo. Tratado de Direito Tributário. Vol. 01/Ives Gandra da Silva Martins, Carlos Valder do Nascimento e Rogério Gandra da Silva Martins (coordenadores). A Atividade Financeira do Estado. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 109.

4. BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 04.5. OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Curso de direito financeiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 68.6. OLIVEIRA, 2010, loc. cit.

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Cap. 1 • A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO E O DIREITO FINANCEIRO 39

Essa atividade financeira coincide com a própria atividade essencial do Estado, que é a promoção do bem comum, alcançada com a busca e a aplicação dos recursos financeiros com o intuito de atender às necessidades públicas. As necessidades coletivas públicas, doravante chamadas de ‘necessidades públicas’, cumpre lembrar, não se confundem com as necessida-des coletivas privadas, doravante chamadas de ‘necessidades coletivas’. Estas são apenas o somatório das necessidades individuais percebidos a cargo de um grupo específico, regidas pelo princípio da autonomia da vontade. As necessidades públicas são comumente satisfeitas pelo processo do serviço público, ou, como afirma Aliomar Baleeiro, “A necessidade torna-se pública por uma decisão dos órgãos políticos”7.

Assim, as necessidades públicas são as que o Estado deve satisfazer em virtude da exis-tência de uma norma jurídica. Decorrem, portanto, de um dever legal, estando sob a égide do direito público. Como derivam da lei, estão adstritas ao campo da legalidade, de modo que a Administração Pública não desfruta de liberdade para satisfazê-las ou não.

Quando a Constituição Federal estabelece as competências dos entes federativos, imbuin-do-os do dever de cuidar de determinado assunto, cria uma obrigação de fazer algo. Gera, consequentemente, necessidade de cumprimento do dever, portanto, necessidade pública.

Essas necessidades são satisfeitas através da prestação de serviços públicos pelo Estado, objetivando o atendimento das que surgem como decorrência da vida social.

Quando o Estado atua na busca dos seus objetivos fundamentais, expressos no art. 3º da Constituição Federal, ele nada mais faz do que atender as necessidades públicas através do exercício de uma atividade que lhe é substantiva e essencial.

Nesse sentido, sumariza José Souto Maior Borges8:A atividade financeira consiste, em síntese, na criação, obtenção, gestão e dispêndio do di-nheiro público para a execução de serviços afetos ao Estado. É considerada por alguns como o exercício de uma função meramente instrumental, ou de natureza adjetiva (atividade-meio), distinta das atividades substantivas do Estado, que visam diretamente a satisfação de certas necessidades sociais, tais como educação, saúde, construção de obras públicas, estradas etc. (atividades-fins).

Enfim, percebe-se que a atividade financeira do Estado é um instrumento para a realiza-ção do próprio fim estatal, pois lhe fornece os meios para a obtenção de recursos financeiros, a forma de geri-los e aplicá-los, munindo o Estado com os instrumentos necessários à sua atuação na sociedade.

2. DIREITO FINANCEIRO

O direito financeiro consiste no ramo do direito público que estuda as finanças do Estado em sua estreita relação com a sua atividade financeira. Ou seja, é o conjunto de regras e princípios que estuda a atividade financeira do Estado, compreendida esta como receita, despesa, orçamento e crédito públicos.

7. BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 04.8. BORGES, José Souto Maior. Introdução ao Direito Financeiro. São Paulo: Max Limonad, 1998. p. 38.

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Tem estreita relação com a ciência das finanças. Esta consiste na atividade pré-normativa, que alcança os âmbitos econômico, social, político ou estatístico, servindo-lhe de norte no sentido de estabelecer as regras que regerão a atividade financeira do Estado. Ou seja, o desenvolvimento das normas do direito financeiro está estribado também na ciência das finanças, que oferece o caráter informativo, teórico e especulativo daquela.

Assim, enquanto a ciência das finanças se preocupa com o estudo da atividade fi-nanceira do Estado em seu sentido teórico e especulativo, o direito financeiro estuda seu aspecto jurídico. Logo, quando da elaboração do orçamento público, por exemplo, a ciência das finanças oferece importante auxílio ao ente político, fornecendo-lhe dados e os meios para que o legislador escolha a decisão política acertada.

Dado o crescimento dos estudos em torno do direito financeiro, e pela estreita ligação existente entre as despesas públicas e o seu controle, passou a ser objeto do direito financeiro também todo o estudo envolvendo o controle desses gastos. Nessa linha, o direito financeiro engloba os mecanismos de fiscalização financeira e orçamentária, nos termos dos arts. 70-75 da CF/88, envolvendo aí os Tribunais de Contas, o controle externo e o sistema de controle interno de cada Poder.

Portanto, para além do seu campo comum de atuação, podemos dizer que o direito finan-ceiro também se ocupa dos temas envolvendo o controle da atividade financeira do Estado.

EXEMPLO DE QUESTÃO SOBRE O TEMA

(Juiz Federal Substituto 2ª região – UnB/CESPE – 2009) Com relação às normas de finanças públicas previstas na CF e ao direito financeiro, assinale a opção correta.a) O direito financeiro cuida do crédito público e da dívida pública.b) Cabe à lei complementar instituir o plano plurianual.c) À lei ordinária cabe dispor acerca do exercício financeiro da lei orçamentária anual.d) A despesa, a receita, o orçamento e o crédito públicos são objeto de estudo do direito financeiro.e) A compatibilização das funções das instituições oficiais de crédito da União, resguardadas as características e as

condições operacionais plenas daquelas voltadas ao desenvolvimento regional, não é matéria de norma geral a ser reservada à lei complementar.

Resposta: Alternativa D

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Cap. 1 • A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO E O DIREITO FINANCEIRO 87

Tudo dentro de rigoroso controle que priorize a justa distribuição das receitas entre os entes federativos, no ponto ideal, suficiente para cobrir todas as responsabilidades que lhes foram repassadas. Do contrário, a assimetria federativa tenderá a ser compensada com “guerras fiscais” que sempre se reinventarão.

6. QUADRO SINÓPTICO

CAPÍTULO 1 – A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO E O DIREITO FINANCEIRO

ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO

INSTITUTO CONTEÚDO ITEM

Conceito É o conjunto que envolve quatro fenômenos, quais sejam, receitas públicas, despesas públicas, orçamento público e crédito público. 1.

DIREITO FINANCEIRO

ConceitoO direito financeiro consiste no ramo do direito que estuda as finanças do Estado em sua estreita relação com a sua atividade financeira, ou seja, é o conjunto de normas que estuda a atividade financeira do Estado.

2.

AutonomiaÉ comum que, numa visão precipitada, o direito financeiro seja confundido com o Direito Tributário, mas, de fato, o direito financeiro possui um sistema próprio de normas, regido por princípios específicos, bem como um capítulo individual na Constituição Federal.

2.1

FONTES 2.2

Fontes formais Constituição Federal (Arts. 162 a 165). A

FontesPrincipais

Leis Complementares B

Lei Complementar 101/00 – Lei de Responsabilidade Fiscal B.1

Lei 4.320/64 B.2

Leis Ordinárias (PPA, LDO, LOA etc.). C

Leis Delegadas. D

Medida Provisória. ATENÇÃO: A CF veda a edição de medidas provisórias sobre matéria relativa a “planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º”, que permite a sua admissão para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública.

E

Fontes Secundárias

Decretos Não há diferenças quanto ao tratamento dos decretos em matéria orçamentária. A

Resoluções Deliberações de uma das Casas do Congresso ou do próprio Con-gresso, fora do processo de elaboração de leis. B

Atos Normativos Em termos de atos normativos em matéria financeira, sobrelevam em importância as resoluções dos Tribunais de Contas. C

Decisões Adminis-trativas

Apesar de o Brasil adotar o sistema de jurisdição única, as deci-sões dos Tribunais de Contas, que, frise-se, não exercem função jurisdicional, têm muita importância na interpretação e aplicação das leis orçamentárias.

D

Decisões Judiciais Assim como em todo o direito, as decisões judiciais, no contexto atual, constituem inegável fonte de direito financeiro. E

Fontes Materiais

Ciência das Finan-ças

Atividade pré-normativa, que auxilia o direito financeiro com dados da economia, dos indicadores sociais, dentre outros, vinculando o direito financeiro à realidade econômica do país.

2.2.2

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MANUAL DE DIREITO FINANCEIRO – Harrison Leite88

CAPÍTULO 1 – A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO E O DIREITO FINANCEIRO

ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO

INSTITUTO CONTEÚDO ITEM

Premissas do Direito Financeiro

Limitação de recursos

Tendo em vista a fixação, no orçamento, das despesas e a previsão de receitas, tem--se sempre a ideia de limitação financeira para atender todas as demandas existentes. Daí que os recursos sempre serão limitados para a proteção dos direitos sociais que demandam sua alocação.

3.1

Escolhas trágicas

Dada a limitação de recursos, os Poderes Executivo e Legislativo, ao fazerem as esco-lhas da sua alocação, fatalmente, adiam ou descartam a proteção de alguns direitos. A escassez dos recursos leva a escolhas no sentido de que sempre o interesse de alguém será preterido.

3.2

Competência Legislativa

Embora seja tema alusivo ao direito constitucional, não é demais saber que o direito financeiro, ao lado do direito tributário, está dentro da competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal, conforme dicção do art. 24, I, da CF.

4

ATENÇÃO:

O Distrito Federal possui as mesmas competências dos Estados em matéria de competência concorrente.

A Lei de Responsabilidade Fiscal (LC n.º 101/00) não revogou e sequer conflitou com a Lei n.º 4.320/64, visto que as duas leis têm alcances distintos.

Competência dos

Municípios em matéria de direito financeiro

O Município, numa interpretação literal, não possui competência concorrente em matéria de direito financeiro. Apenas numa interpretação sistemática permite-se concluir sua competência na matéria, desde que haja espaço para suplementar a legislação federal ou a estadual.

4.1

Direito Financeiro e o Federalismo Assimétrico

Competência dos

Municípios em matéria de direito financeiro

A federação inicialmente idealizada, com o pretendido equilíbrio e necessária autonomia entre os entes federativos, acaba por não se realizar em virtude da cambaleante coo-peração existente entre União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios. Após quase 30 anos da Constituição Federal, percebe-se que a União acaba por concentrar mais de 60% dos recursos arrecadados, ao passo que Estados ficam com 25% e Municípios com 15%. Essa distribuição de recursos, em desproporção a distribuição de atribuições, gera um federalismo assimétrico, em que recai na sua maior parte sobre os Municípios o munus de atender às demandas existentes, sem recursos para tal fim. É urgente uma reforma constitucional com vistas à sonhada simetria.

5

7. INFORMATIVOS SELECIONADOS

7.1. STFEntes públicos e acessibilidade

É dever do Estado-membro remover toda e qualquer barreira física, bem como proceder a reformas e adaptações necessárias, de modo a permitir o acesso de pessoas com restrição locomotora à escola públi-ca. Com base nessa orientação, a 1ª Turma deu provimento a recurso extraordinário em que discutido: a) se o ato de se determinar à Administração Pública a realização de obras significaria olvidar o princípio da separação dos Poderes, porquanto se trataria de ato discricionário; b) se necessário o exame de disponibili-dade orçamentária do ente estatal. Consignou-se que a Constituição (artigos 227, § 2º, e 244), a Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência, a Lei 7.853/1989; e as Leis paulistas 5.500/1986 e 9.086/1995 asseguram o direito das pessoas com deficiência ao acesso a prédios públicos. Frisou-se o dever de a Administração adotar providências que viabilizassem essa acessibilidade. Pontuou-se presente

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Cap. 1 • A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO E O DIREITO FINANCEIRO 89

o controle jurisdicional de políticas públicas. Asseverou-se a existência de todos os requisitos a viabilizar a incursão judicial nesse campo, a saber: a natureza constitucional da política pública reclamada; a existência de correlação entre ela e os direitos fundamentais; a prova de que haveria omissão ou prestação deficiente pela Administração Pública, inexistindo justificativa razoável para esse comportamento. Destacou-se a pro-mulgação, por meio do Decreto 6.949/2009, da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, incorporado ao cenário normativo brasileiro segundo o procedimen-to previsto no § 3º do art. 5º da Constituição. Ressalvou-se o disposto no artigo 9º do mencionado decreto [“1. A fim de possibilitar às pessoas com deficiência viver de forma independente e participar plenamente de todos os aspectos da vida, os Estados Partes tomarão as medidas apropriadas para assegurar às pessoas com deficiência o acesso, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, ao meio físico, ao trans-porte, à informação e comunicação, inclusive aos sistemas e tecnologias da informação e comunicação, bem como a outros serviços e instalações abertos ao público ou de uso público, tanto na zona urbana como na rural. Essas medidas, que incluirão a identificação e a eliminação de obstáculos e barreiras à acessibilidade, serão aplicadas, entre outros, a: a) Edifícios, rodovias, meios de transporte e outras instalações internas e externas, inclusive escolas, residências, instalações médicas e local de trabalho”. Sublinhou-se que, ao reme-ter à lei a disciplina da matéria, a Constituição não obstaculizou a atuação do Poder Judiciário, em especial quando em debate a dignidade da pessoa humana e a busca de uma sociedade justa e solidária (CF, artigos 1º, III, e 3º, I). Reputou-se que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais teriam aplicação imediata, sem que fossem excluídos outros direitos decorrentes do regime e dos princípios por ela adota-dos ou dos tratados internacionais de que a República Federativa do Brasil fosse parte (CF, art. 5º, §§ 1º e 2º). Assinalou-se que o acesso ao Judiciário para reclamar contra lesão ou ameaça de lesão a direito seria cláusula pétrea. Observou-se que a acessibilidade, quando se tratasse de escola pública, seria primordial ao pleno desenvolvimento da pessoa (CF, art. 205). Lembrou-se que o art. 206, I, da CF asseguraria, ainda, a “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”. Registrou-se que barreiras arquitetônicas que impedissem a locomoção de pessoas acarretariam inobservância à regra constitucional, a colocar cida-dãos em desvantagem no tocante à coletividade. Concluiu-se que a imposição quanto à acessibilidade aos prédios públicos seria reforçada pelo direito à cidadania, ao qual teriam jus as pessoas com deficiência. Rel. Min. Marco Aurélio, 29.10.2013. RE-440028. (Informativo 726)

Medida Provisória e Abertura de Crédito Extraordinário

Em conclusão, o Tribunal, por maioria, deferiu cautelar pleiteada em ação direta proposta pelo Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB para suspender a vigência da Medida Provisória 405/2007, estendendo a decisão a sua lei de conversão (Lei 11.658/2008), que abre crédito extraordinário, em favor da Justiça Eleitoral e de diversos órgãos do Poder Executivo — v. Informativos 502 e 505. Entendeu-se haver um patente desvir-tuamento dos parâmetros constitucionais que permitiriam a edição de medidas provisórias para a abertura de créditos extraordinários. Salientou-se, inicialmente, que a abertura de crédito extraordinário por meio de medida provisória não seria vedada, em princípio, pela Constituição Federal (art. 62, § 1º, I, d). Afirmou-se, entretanto, que a Constituição, além dos requisitos de relevância e urgência (art. 62), imporia que a abertura do crédito extraordinário fosse feita apenas para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, sendo exem-plos dessa imprevisibilidade e urgência as despesas decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública (CF, art. 167, § 3º). Considerou-se que, pela leitura da exposição de motivos da Medida Provisória 405/2007, os créditos abertos seriam destinados a prover despesas correntes que não estariam qualificadas pela imprevisibilidade ou pela urgência. Asseverou-se que, não obstante fosse possível identificar situações específicas caracterizadas pela relevância dos temas, como créditos destinados à redução dos riscos de in-trodução da gripe aviária, às operações de policiamento nas rodovias federais e de investigação, repressão e combate ao crime organizado e para evitar a invasão de terras indígenas, fatos que necessitariam, impreteri-velmente, de recursos suficientes para evitar o desencadeamento de uma situação de crise, seriam aportes financeiros destinados à adoção de mecanismo de prevenção em relação a situações de risco previsíveis, ou seja, situações de crise ainda não configurada. Vencidos os Ministros Menezes Direito, Ricardo Lewandowski, Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Ellen Gracie que indeferiam a cautelar. O relator reformulou a parte disposi-tiva do seu voto, tendo em conta a publicação da lei de conversão da medida provisória impugnada em data posterior ao início do julgamento. Salientando não ter havido alteração substancial no texto original da medi-da provisória em exame, reiterou a orientação da Corte no sentido de que a lei de conversão não convalida os vícios existentes na medida provisória. ADI 4048 MC/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 14.5.2008.

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MANUAL DE DIREITO FINANCEIRO – Harrison Leite90

8. QUESTÕES DE CONCURSOS PÚBLICOS

01. (Procurador do MP junto ao TSE – SC/ 2010 – Direito Financeiro e Direito Econômico/FEPESe) A Constituição Federal de 1988 consagrou a autonomia do Direito Financeiro e do Direito Econômico. Em se tratando de legislar sobre matéria de Direito Financeiro e Direito Econômico, é correto afirmar que:I. No Direito Financeiro, a competência é concorrente entre a União, Estados e Distrito Federal.II. No Direito Econômico, a competência é privativa da União.III. No Direito Financeiro, a competência da União é de estabelecer normas gerais.IV. No Direito Econômico, não se exclui a competência suplementar dos Estados.Pode se afirmar que estão corretos os itens:a) ( ) I e II, apenas.b) ( ) I, III, e IV, apenas.c) ( ) II e III, apenas.d) ( ) II e IV, apenas.e) ( ) II, III e IV, apenas.

02. (Procurador do MP junto ao TSE – SC/ 2010 – Direito Financeiro e Direito Econômico/FEPESe) De acordo com o art. 163 e 164 da CRFB/88, sobre as normas gerais de Finanças Públicas é correto afir-mar que:a) ( ) A fiscalização das instituições financeiras será estabelecida por norma do Banco Central.b) ( ) A Lei Complementar disporá sobre finanças públicas.c) ( ) Como forma de regular a atividade econômica estatal, o Banco Central poderá conceder em-

préstimos ao Tesouro Nacional.d) ( ) Cabe ao Ministério da Fazenda editar normas sobre emissão e resgate de títulos da dívida pú-

blica.e) ( ) Nenhuma das respostas anteriores.

03. (PGM/São José do Rio Preto/Procurador/2008) Assinale a alternativa correta no que diz respeito à Lei n.º 4.320/64.a) Estatui normas gerais de direito financeiro.b) Estatui normas específicas para elaboração e controle dos orçamentos, exclusivamente, das pessoas

jurídicas da administração direta.c) Estatui normas específicas para elaboração e controle de orçamentos das pessoas jurídicas da admi-

nistração direta e indireta.d) Determina o tributo como receita patrimonial.e) Determina o tributo como receita originária.

04. (TCE/AL/Auditor/2008) De acordo com a Constituição Federal, dispor sobre o exercício financeiro cabe àa) emenda constitucional.b) lei complementar.c) lei ordinária.d) resolução do Senado.e) medida provisória.

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MANUAL DE DIREITO FINANCEIRO – Harrison Leite92

08. (Cespe – Auditor de Contas Públicas – TCE-PE/2017) Com referência ao direito financeiro, julgue o item seguinte.Os estados-membros e o Distrito Federal estão impedidos de editar normas gerais acerca da elaboração dos seus orçamentos, porque a CF atribui tal competência legislativa à União.

GABARITO

Questão Resposta Fundamentação legal e jurisprudencial

Onde encontro no livro? Observação eventual

1 B Art. 24, I e §§ da CF Item 3 II está errado porque a competência é concorrente entre União, Estados e DF.

2 B Art. 163, I da CF Item 2.2.1 É necessário saber todas as compe-tências da LC

3 A Art. 1º da Lei 4.320/64 Item 2.2.1 -B –

4 B Art. 165, § 9º, I da CF Item 2.2.1-B –

5 A Art. 2º da LRF Item 2.2.1 – B –

6 D – Item 2.2.1 – B A assertiva “c” está respondida no Capítulo 2, Item 7.1.1

7 A Art. 1º, §§ 2º e 3º, da LRF Item 2.2.1 – B –

8 Errado Art. 24 da CF Item 4 –