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MARIANA LIMA SOUSA CANAMARY
JORNALISMO: TRAJETÓRIA,
CRISES E O FENÔMENO DO METRO
Universidade Metodista de São Paulo
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
São Bernardo do Campo - SP, 2010
MARIANA LIMA SOUSA CANAMARY
JORNALISMO: TRAJETÓRIA,
CRISES E O FENÔMENO DO METRO
Dissertação apresentada em cumprimento parcial às
exigências do Programa de Pós-Graduação em
Comunicação Social, da UMESP-Universidade Metodista
de São Paulo, para obtenção do grau de Mestre.
Orientador: Prof.Dr. José Salvador Faro
Universidade Metodista de São Paulo
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
São Bernardo do Campo - SP, 2010
FOLHA DE APROVAÇÃO
A dissertação de mestrado sob o título “Jornalismo: trajetória, crises e o fenômeno do Metro”,
elaborada por Mariana Lima Sousa Canamary foi apresentada e aprovada em 19 de abril de
2010, perante banca examinadora composta por José Salvador Faro (Presidente/UMESP),
Daniel dos Santos Galindo (Titular/UMESP) e José Luiz Aidar Prado (Titular/PUC-SP).
__________________________________________
Prof. Dr. José Salvador Faro
Orientador e Presidente da Banca Examinadora
__________________________________________
Prof. Dr. Sebastião Carlos de Morais Squirra
Coordenador do Programa de Pós-Graduação
Programa: Pós-Graduação em Comunicação
Área de Concentração: Processos Comunicacionais
Linha de Pesquisa: Processos Comunicacionais Midiáticos
Dedico este trabalho à minha família, em especial ao meu
marido Ivo Canamary - fonte de amor, companheirismo,
determinação e otimismo – e à minha filha Luiza – luz das
nossas vidas.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus,
“por guiar-me mansamente em águas tranquilas” (Salmo 23)
e pela presença em minha vida.
Ao Ivo, companheiro exemplar, pelo amor dedicado,
pela força para que eu concluísse esse trabalho e pelas noites em claro
digitando parte do texto e ajudando nos cuidados da Luiza,
nossa filha com apenas poucos meses de vida. Ivo, obrigada por você existir.
Agradeço à Luiza que ensinou-me a ser mãe, dando-me força
para trilhar meu caminho enchendo meu coração de amor e alegria.
Ao professor Faro pelos valiosos e fundamentais ensinamentos.
Ao corpo docente da Metodista pela troca de conhecimentos e a toda a equipe de funcionários
do Pós-Com pela atenção e carinho dispensados.
RESUMO
CANAMARY, Mariana Lima Sousa. Jornalismo: trajetória, crises e o fenômeno do Metro.
2010. 140f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) – Universidade Metodista de São
Paulo, São Bernardo do Campo, 2010.
Esta pesquisa tem o propósito de analisar a dupla crise do jornalismo – financeira e
paradigmática - que têm refletido no processo de mutação jornalística observada em alguns
veículos da atualidade, como é o caso do jornal gratuito Metro, nosso objeto de estudo. O que
se buscou foi entender como as características dos tempos atuais, tais como superficialidade
das notícias, a velocidade, a instantaneidade, a forte presença da publicidade e o apelo direto o
consumo, estão presentes no jornalismo impresso atual. Em um primeiro momento realizou-se
revisão bibliográfica sobre a trajetória do jornalismo, história e crise enfrentada nas últimas
décadas. A seguir, fez-se uma pesquisa exploratória sobre o Metro, objeto estudado, avaliando
a presença de características que o fazem um veículo da atualidade, reflexo da mutação
jornalística. A análise revelou a existência de uma crise conceitual agravada pela crise
econômica e marcada pelas leis do capital.
Palavras-chave: Jornalismo, Jornalismo Gratuito, Pós-Modernidade, Publicidade.
ABSTRACT
CANAMARY, Mariana Lima Sousa. Journalistic: trajectory, crisis and the phenomenon
of Metro. 2010. 140f. Dissertation (Master in Social Communication) - Methodist University
of São Paulo, São Bernardo do Campo, 2010.
The purpose of this research was to analyze a double crisis in Journalism – both financial and
paradigmatic – which has reflected on the process of journalistic mutation observed in some
current vehicles, such as the free newspaper Metro, our object of study. We have sought to
understand how current characteristics such as news superficiality, speed, instantaneousness,
the remarkable presence of publicity and the straightforward appeal to consumption are
present in current printed journalism. First, a literature review on Journalism path, history and
crisis faced over the last decades has been done. Next, an exploratory research on Metro, the
studied object, has been carried out in order to evaluate the presence of characteristics which
make it a current vehicle, reflecting a journalistic mutation. The review has showed the
existence of a conceptual crisis, aggravated by the economic disruption and marked by the
crisis in capital laws.
Key words: Journalism, Free Journalism, Post-Modernity, Publicity.
RESUMEN
CANAMARY, Mariana Lima Sousa. Periodismo: trayectoria, crisis y el fenómeno del
Metro. 2010. 140f. Dissertación (Maestría en Comunicación Social) – Universidad Metodista
de Sao Paulo, Sao Bernardo do Campo, 2010.
Esta investigación objetiva analizar la dupla crisis del periodismo – financiera y
paradigmática – que anda refletando en el proceso de mutación periodística observada en
algunos vehículos de la actualidad, como es el caso del periódico gratuito Metro, nuestro
objeto de estudio. Lo que se buscó fue la comprensión de cómo las características de los
tiempos actuales, tales como superficialidad de las noticias, la velocidad, la instantaneidad, la
fuerte presencia de la publicidad y el apelo directo al consumo, están presentes en el
periodismo impreso actual. En un primero momento, se realizó revisión bibliográfica sobra la
trayectoria del periodismo, historia y crisis enfrentada en las últimas décadas. En seguida, se
hizo una investigación exploratoria sobre el Metro, objeto estudiado, evaluando la presencia
de características que lo hacen un vehículo de la actualidad, reflejo de la mutación
periodística. El análisis reveló la existencia de una crisis conceptual agravada por la crisis
económica y marcada por las leyes del capital.
Palabras-clave: Periodismo, Periodismo Gratuito, Pos-Modernidad, Publicidad.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Capa da edição de 09 de novembro do jornal Metro p.115
Figura 2 Capa da edição de 10 de novembro do jornal Metro p.116
Figura 3 Capa da edição de 11 de novembro do jornal Metro p.117
Figura 4 Capa falsa da edição de 12 de novembro do jornal Metro p.118
Figura 5 Capa da edição de 12 de novembro do jornal Metro p.119
Figura 6 Capa da edição de 13 de novembro do jornal Metro p.120
Figura 7 Editoria Economia p.126
Figura 8 Editoria Em foco p.127
Figura 9 www.metropoint.com em todas as páginas p.127
Figura 10 Logomarca do Metro p.128
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ___________________________________________________________ 12
1.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ____________________________________________ 18
1.2 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO _________________________________________________ 20
CAPÍTULO I - RETROSPECTIVA HISTÓRICA DO JORNALISMO SOB UM OLHAR
ECONÔMICO: DO PRIMEIRO JORNAL À ERA ELETRÔNICA __________________ 22
1.1 O COMEÇO _________________________________________________________________ 22
1.2 A FASE POLÍTICO LITERÁRIA ___________________________________________________ 23
1.3 A PRODUÇÃO DE JORNAIS EM MASSA ___________________________________________ 24
1.4 A ERA ELETRÔNICA __________________________________________________________ 25
CAPÍTULO II – O NOVO FAZER JORNALÍSTICO _____________________________ 27
1 O JORNALISMO NA ERA DAS NOVAS TECNOLOGIAS _________________________________ 27
2 A CRISE DOS NOVOS TEMPOS ___________________________________________________ 29
3 PÓS-MODERNIDADE: UM QUADRO DO INÍCIO DO SÉCULO XXI ________________________ 30
3.1 A Modernidade líquida de Bauman _____________________________________________________ 33
3.2 O mal-estar da Pós-Modernidade ______________________________________________________ 36
4 O JORNALISMO NA ERA DAS NOVAS TECNOLOGIAS _________________________________ 37
4.1 O tempo real _______________________________________________________________________ 40
5 A FRAGMENTAÇÃO NA ATUALIDADE _____________________________________________ 43
CAPÍTULO III- A CRISE DO JORNALISMO CONTEMPORÂNEO E A ERA DA
PUBLICIDADE ___________________________________________________________ 47
1. A CRISE CONCEITUAL __________________________________________________________ 47
1.1 A rotina jornalística _________________________________________________________________ 48
2 ALTOS E BAIXOS: DA EUFORIA À CRISE FINANCEIRA DOS IMPRESSOS ___________________ 50
2.1 Redução de publicidade ______________________________________________________________ 51
3 REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES: AUDIÊNCIA E PUBLICIDADE ______________________ 53
3.1 Estratégias para fugir da crise financeira ________________________________________________ 54
4. MURDOCH: OTIMISMO DIANTE DA CRISE _________________________________________ 56
5. DUPLA CRISE: CAMPO FÉRTIL PARA O SURGIMENTO DE NOVOS JORNAIS? ______________ 57
6. JORNALISMO OU PUBLICIDADE? EIS A QUESTÃO. ___________________________________ 59
6.1 20% de publicidade e 80% de conteúdo jornalístico. Será? _________________________________ 62
7. DO JORNAL POPULAR AO JORNAL GRATUITO: FORMAS DE NARRAR ___________________ 64
8 JORNALISMO E PUBLICIDADE: DOIS LADOS DA MESMA MOEDA _______________________ 65
9 A SOCIEDADE DE CONSUMO ____________________________________________________ 66
10 O MERCADO DA PUBLICIDADE _________________________________________________ 68
CAPÍTULO IV – OS GRATUITOS ___________________________________________ 71
1. O MUNDO DOS JORNAIS GRATUITOS ____________________________________________ 71
2. METRO: HISTÓRIA E PERSPECTIVAS ______________________________________________ 75
2.1 O Metro no mundo __________________________________________________________________ 76
3. O GRUPO BANDEIRANTES ______________________________________________________ 77
3.1 O Grupo __________________________________________________________________________ 77
3.2 História ___________________________________________________________________________ 78
4 O METRO NO BRASIL __________________________________________________________ 78
4.1 A missão __________________________________________________________________________ 79
4.2 O Jornal __________________________________________________________________________ 81
CAPÍTULO V – METRO: O JORNAL DA NOVA ERA ___________________________ 83
1.1 ANÁLISE ___________________________________________________________________ 85
1.2 Categorias de Análise _______________________________________________________________ 86
1.2.1 Notícias superficiais (descontextualizadas) _____________________________________________ 86
1.2.2 Notícia apresentada com caráter de publicidade _________________________________________ 93
1.2.3 Apelo direto ao consumo ___________________________________________________________ 99
1.2.4 Discurso gráfico _________________________________________________________________ 108
1.2.4.1 Cores_________________________________________________________________________ 112
1.2.4.2 Fotos _________________________________________________________________________ 114
1.2.4.3 Anúncios publicitários ___________________________________________________________ 121
1.2.5 Linguagem da internet/palavras em inglês/interface virtual------------------------- 124
1.2.5.1 Elementos da internet____________________________________________________________ 127
CONSIDERAÇÕES FINAIS ________________________________________________________________ 130
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ___________________________________________________ 136
12
INTRODUÇÃO
Cidade de São Paulo, manhã de quarta-feira. A publicitária Juliana Silveira caminha
apressada rumo ao metrô, estação Paraíso. De olho no relógio ela corre para não chegar
atrasada à agência onde trabalha. Logo nas escadas da estação Juliana é abordada por uma
jovem moça em traje chamativo – uniforme verde limão – distribuindo jornais gratuitamente a
todos que chegam ou saem da estação de metrô. Juliana recebe um exemplar do jornal, e
durante o trajeto para o trabalho, vai lendo as principais notícias do dia.
Nesse mesmo horário – por volta das 8 da manhã – em vários pontos da cidade,
principalmente nos cruzamentos de ruas e avenidas, semáforos e pontos de ônibus, vários
jovens, entre moças e rapazes também em trajes chamativos, distribuem esses jornais aos
motoristas, motoboys, taxistas e transeuntes. Ouve-se buzinas e gritos. Todos querem receber
gratuitamente um exemplar desse jornal, não só para se inteirar com o que está acontecendo
no Brasil e no mundo, mas também para garantir o passatempo nos longos congestionamentos
de São Paulo. Em poucos minutos os 150 mil exemplares do jornal já foram distribuídos.
Esse jornal ao qual nos referimos nos dois parágrafos acima constitui um novo
fenômeno da mídia impressa mundial. É o jornal gratuito, feito para ser lido em poucos
minutos, geralmente no trajeto de casa ao trabalho ou vice-versa. Uma de suas principais
características é a referência ao tempo, a velocidade e ao movimento – suas colunas e
editorias recebem nomes como o mundo em 1 minuto ou notícias em 10 segundos. Entre os
pioneiros destaca-se o Metro Londrino, que circula desde 1995 em Londres e o 20 minutos,
que circula em Paris, França, desde 2002.
Na Europa e nos EUA os jornais gratuitos são um sucesso. Existem vários, tanto em
versões matutinas como vespertinas. Aqui no Brasil eles ainda constituem um fenômeno
recente1. O pioneiro com esse perfil foi o Destak, que circula em Lisboa-Portugal com o
mesmo nome. O Destak chegou a São Paulo em julho de 2006 e hoje também já é distribuído
no Rio de Janeiro. Em maio de 2007 chegou à cidade de São Paulo o Metro, distribuído em 24
países e que tem como slogan o maior jornal do mundo.
Tanto o Destak como o Metro têm como características principais o formato berliner
(menor que o standard e maior que o tablóide), 16 páginas, boa diagramação, textos curtos no
estilo drops, muitos infográficos, grandes anunciantes e uma linguagem que se assemelha à
1 Os jornais gratuitos aos quais nos referimos como um fenômeno recente no Brasil são os títulos com perfil
urbano, bem diagramados, que trazem resumos com as principais notícias do dia.
13
on-line: o layout se parece à tela de um computador. Esses jornais têm como alvo um público
jovem, ávido por informação rápida, gratuita, que não têm hábito de ler jornal e se informa
pela internet.
Esta pesquisa buscou entender e desvendar o fenômeno dos jornais gratuitos em meio
à crise dos jornais impressos que existe há algumas décadas e que tem se agravado com a
crise econômica mundial. Dessa forma, o objetivo foi relacionar o surgimento dos jornais
gratuitos a uma dupla crise: momento de mutação do jornalismo (quebra dos seus paradigmas,
fim das grandes narrativas, pós-modernidade) e a crise empresarial/econômica dos grandes
jornais impressos no mundo todo (alto custo da redação, aumento do preço do papel de jornal,
perda de leitores, influência da internet e queda das receitas publicitárias). Resgatamos ainda
parte da trajetória do jornalismo em suas principais fases. Discutimos ao longo do trabalho o
atual momento em que vive o jornal impresso marcado principalmente pela perda de leitores e
de verbas publicitárias e pelo forte crescimento da internet.
Dessa forma, o presente trabalho está dividido em duas partes: na primeira, Parte I,
fizemos uma reflexão teórica em torno das transformações pelas quais o jornalismo passa no
momento atual. Já na segunda parte, Parte II, realizamos um estudo do nosso objeto de
estudo, o jornal gratuito Metro, mundialmente conhecido, distribuído de segunda à sexta na
cidade de São Paulo. Avaliamos, entre outros aspectos, a informação circulando, o
cumprimento dos princípios clássicos do jornalismo, os temas trabalhados, as formas de
abordagem, a presença da publicidade.
Quanto aos números dos gratuitos no mundo, em matéria intitulada Jornais Gratuitos,
publicada no site do Clube de Criação de São Paulo (CCSP), em outubro de 2008, o
especialista em jornais gratuitos, Piett Bakker, da Universidade de Amsterdã, afirma que
existem hoje 230 jornais gratuitos em 50 países, com uma circulação diária total de 43
milhões. Somente a Europa apresenta 63% da circulação mundial desses jornais, com 120
títulos em 32 países, representando 23% da circulação de jornais da Europa. Os dados
impressionam, o que nos leva a crer que esta é uma nova tendência da mídia impressa
mundial. Alguns dos mais respeitados diários do mundo têm investido na criação de versões
reduzidas, geralmente em formato tablóide e que são distribuídos em locais de grande
circulação - como estações de trem e metrô - sem custos para os leitores.
O primeiro a investir maciçamente na publicação desse tipo de diário foi o grupo de
comunicação sueco Kinnevik, que edita o Metro, nosso objeto de estudo. Hoje, o Metro
Internacional tem 59 edições em 83 cidades pelo mundo, entre elas Nova Iorque, Hong Kong,
São Petersburgo e há quase três anos, também em São Paulo.
14
Nos Estados Unidos, o grupo New Times Media comprou a companhia que edita o
prestigiado The Village Voice, com o objetivo de criar uma rede de 17 jornais gratuitos
semanais espalhados por todo o país.
No Brasil os jornais gratuitos no formato diário ainda estão em fase inicial. O que
existe, em sua grande maioria, são edições semanais ou mesmo mensais que valorizam a
cobertura de variedades - como o Jornal da Comunidade, em Brasília. Em São Paulo, há
alguns anos, existem gratuitos exercendo a função de um guia de compras, como o Shopping
News, muitos com o perfil de bairro e outros com conteúdos religiosos, produzidos e editados
por algumas igrejas e distribuídos nos faróis. O mais antigo jornal gratuito que circula em
São Paulo é o MetroNews, há três décadas produzido em Guarulhos e distribuído nas estações
de trem, metrô e pontos de ônibus da capital paulista. Até bem pouco tempo (antes da chegada
do Destak e do Metro aqui no Brasil) o MetroNews possuía um layout denso, sem muitos
atrativos, poucas fotos, textos longos e muitas páginas destinadas aos classificados. Agora ele
vem sofrendo algumas mudanças; está mais leve, com mais fotos e um novo design.
Com o perfil urbano, circulam na cidade de São Paulo há pouco mais de dois anos os
jornais Destak e Metro, facilmente encontrados nos pontos de ônibus, estações de metrô e
cruzamentos das principais ruas e avenidas. O Destak pertence a um grupo português; o
Metro, no Brasil, é do Grupo Bandeirantes de Comunicação, que já atua nas áreas de TV e
Rádio. Cada um possui uma tiragem diária de 150 mil exemplares que se esgotam
rapidamente nos pontos de distribuição. Os dois jornais são gratuitos (custo zero para o leitor
e bancados 100% pela publicidade) e trazem nas suas 16 páginas um resumo das principais
notícias do dia em suas editorias de economia, em foco, esportes, mundo, lazer e diversão.
Sem dúvida é a informação circulando. Mas nesse momento atual de forte influência
da internet como grande meio de circulação de notícias, do jornalismo em mutação e tendo
que se reinventar, de recessão econômica mundial agravando a crise dos impressos e alto
preço do papel de jornal, esses jornais gratuitos vêm responder a quê? O que está por trás
desses jornais? Como são produzidos seus conteúdos e o que esconde esse fenômeno marcado
pela cultura do minuto, da velocidade? Qual o papel da publicidade nesse processo todo?
Foram esses questionamentos instigantes que nos levaram a querer desvendar esse fenômeno,
entendendo as peças que formam esse novo produto cultural da mídia impressa brasileira.
Ao analisarmos esse momento atual da mídia impressa mundial, onde grandes jornais
bem consolidados e tradicionais optam por lançar jornaizinhos em versões reduzidas, que têm
um custo bem menor às empresas de comunicação, poderíamos crer que todo esse processo
pode ser reflexo da crise empresarial/financeira que vem se instalando nos grandes jornais há
15
alguns anos. Existem pesquisas que apontam uma forte queda nas receitas, aumento do custo
de papel, do suporte redacional, diminuição do número de assinaturas e vendas nas bancas.
Philip Meyer (2007) acredita que os jornais impressos pararam de crescer não só porque o
público se cansou deles e prefere os novos substitutos eletrônicos.
Os jornais já tinham um limite natural de crescimento, imposto pela estrutura
de custos variáveis altos. A nova competição [internet] está livre dessa
restrição, e o resultado é uma grande flexibilidade financeira. Com a chegada
do novo século, ela era um gigante adormecido pronto para assumir mais e
mais funções tradicionais do jornal. Então porque alguém investiria hoje
num jornal? (MEYER, 2007, p. 221).
Mas o surgimento dos jornais gratuitos pode sim estar relacionado a uma mudança de
comportamento por parte do público, principalmente dos jovens, que são da chamada geração
internet. Esse público tem uma dinâmica própria, não tem tempo a perder, não têm hábito de
ler jornal e se informa quase que completamente pela rede mundial de computadores, onde
tem acesso a um conteúdo variado, gratuito e disponível 24h do dia. É o tempo real cada vez
mais presente e indispensável.
(...) a velocidade acaba se transformando num fetiche: a valorização da
urgência na transmissão de informações cria um fluxo contínuo que tem
como efeito principal “alimentar o sistema”, de modo que se consome,
sobretudo, velocidade, e não notícias. Trata-se de demonstrar que a máquina
comunica e não que ela informa. O que levou o escritor Luís Fernando
Veríssimo a um precioso comentário sobre a irracionalidade contemporânea:
„Vivemos num tempo maluco em que informação é tão rápida que exige
explicação instantânea e tão superficial que qualquer explicação serve‟.
(MORETZSOHN, 2007, p.239)
E se os grandes jornais ao lançarem versões reduzidas, marcadas pela velocidade,
estiverem visando suprir a queda das receitas e também obter lucros, eles acabam reiterando
esse novo modelo de jornal, mais compacto, de conteúdo esvaziado e instantâneo. Isso pode
descumprir a premissa iluminista do jornalismo que não é só informar os cidadãos, mas
também formá-los, contribuindo assim para que o leitor possa ter uma visão mais crítica do
mundo em que vive. Para isso, os meios jornalísticos deveriam oferecer ao leitor elementos de
reflexão, mais contextualizados, para que o mesmo possa tirar suas próprias conclusões a
respeito da notícia.
Em se tratando dos jornais gratuitos, de tamanho reduzido, com seus textos
curtíssimos, feitos para serem lidos em poucos minutos, fica difícil oferecer ao leitor
elementos críticos mais aprofundados. Isso se deve a vários fatores, dentre os quais
16
poderíamos destacar aqui o próprio tamanho do jornal (formato berliner, poucas páginas) e
pelo importante espaço reservado à publicidade. Publicidade essa que exerce grande
importância nesses veículos, já que por serem gratuitos, dependem em sua maioria de verba
dos anunciantes para se manterem.
Isso nos levou à hipótese – comprovada ao longo da pesquisa - de que o que está por
trás desse fenômeno chamado jornal gratuito são, em primeiro lugar, os interesses mercantis,
a publicidade e a conquista de grandes anunciantes e que viria responder a essa crise
econômica instalada nos grandes jornais; e em segundo lugar vem o compromisso jornalístico
com o leitor.
Há quem acredite que esses modelos gratuitos representam o último suspiro dos
jornais impressos pagos tradicionais. É o caso do jornalista Ricardo Anderáos, primeiro editor
do Metro no Brasil. Durante palestra no Café Intercom, ele afirmou que muito em breve os
jornais impressos tradicionais não terão mais espaço.
Há pesquisas que mostram a queda vertiginosa tanto no número de anúncios
como de venda nas bancas dos jornais tradicionais. Ninguém vai querer
pagar por um calhamaço de notícias requentadas de ontem se tem notícias
disponíveis na internet, em tempo real, gratuitas e disponíveis 24h. Se os
jornais impressos quiserem continuar existindo terão de ser gratuitos e em
formato mais leve. (informação verbal)2
Portanto, dentro dessa linha de pensamento, o fenômeno gratuito surge com a
proposta de captar, conquistar esse público jovem, da geração internet, que não tem hábito de
ler jornal e que não quer pagar pela informação, já que tem acesso ao mais variado conteúdo
gratuito disponível na rede mundial de computadores.
Ao longo do trabalho, um estudo exploratório do jornal Metro – textos, fotos, formas
de abordagem, design, anúncios – nos permitiu conhecer a real dimensão do jornalismo
gratuito, um fenômeno mundial, mas que ainda é recente no Brasil.
No que concerne aos objetivos - partindo da concepção de que o surgimento do jornal
gratuito é em parte resultado de uma dupla crise – crise conceitual do jornalismo e,
principalmente, crise econômica/empresarial dos jornais impressos – esta pesquisa tem como
objetivo:
2 Informação fornecida por Ricardo Anderáos, durante o Café Intercom realizado no dia 08 outubro de 2008.
17
a) Geral
a.1) analisar o momento de mutação do jornalismo que tem que se reinventar para
continuar existindo, acompanhando a mudança de comportamento do público em
tempos pós-modernos, onde reina a velocidade e o imediatismo;
a.2) Discutir a crise financeira que os grandes jornais impressos estão vivendo,
resgatando a trajetória da história do jornalismo e avaliando o atual momento de
recessão econômica mundial, de perda dos recursos publicitários, queda de venda nas
bancas de revistas e o grande crescimento da internet como importante veículo de
comunicação.
b) Específicos
b.1) Desvendar o fenômeno do jornal gratuito Metro na cidade de São Paulo,
caracterizando-o e analisando-o criticamente sob os aspectos da informação
circulando, do jornalismo, da publicidade, da superficialidade das notícias, do apelo
direto ao consumo e influencia da internet no seu conteúdo.
Justifica-se a escolha do tema de pesquisa por uma série de motivos. Há em vários
países estudos que reúnem dicas e reflexões colhidas junto a profissionais de todo o mundo
sobre a crise econômica instaurada em alguns dos mais conceituados jornais impressos e essa
forte tendência do surgimento de suas versões reduzidas, seus novos formatos, os chamados
gratuitos. Afinal, jornal não é um produto qualquer. Ele é consumido por sua capacidade de
informar, formar opinião, construir cidadania e tudo o mais que está relacionado ao desejo das
pessoas de saber o que está acontecendo no mundo em que vivem e se posicionarem nele.
No Brasil, como o fenômeno dos gratuitos é recente, ainda não existem aqui estudos
aprofundados que busquem entendê-lo sob vários aspectos, entre eles, sob a ótica da
informação circulando, do jornalismo, da publicidade e do hábito de leitura nos jovens que
esses veículos acreditam criar.
Esse trabalho é relevante na medida em que trará contribuições para o avanço da área
de conhecimento desse novo produto cultural da mídia brasileira, ao mesmo tempo em que
mostrará nos rumos do jornalismo gratuito no Brasil uma tendência mundial, marcada pela
velocidade e pelo tempo. A pesquisa fornecerá um estudo sobre o surgimento desses jornais
que pode estar relacionado a uma dupla crise do jornalismo: conceitual e financeira.
18
1.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os paradigmas teórico-metodológicos norteadores desta pesquisa giram em torno da
discussão sobre a dupla crise do jornalismo – conceitual e empresarial dos jornais impressos –
que estariam contribuindo para o surgimento dos produtos culturais da nova era marcada,
cada vez mais, pela velocidade, imediatismo e superficialidade. Abordaremos ainda o papel
do jornalismo segundo sua premissa iluminista, que defende sua função na formação do
cidadão saindo do senso comum ao senso crítico.
O problema desta pesquisa se enquadra em uma situação indutiva, cuja observação
envolve tema e objetos que, possivelmente, permitem uma generalização sobre o tema
estudado. Sobre o método indutivo, Gil (2007) afirma que nessas situações parte-se da
observação ou fenômenos, cujas causas se desejam conhecer; em seguida, procura-se
compará-los com a finalidade de descobrir as relações existentes entre eles. “Por fim,
procede-se à generalização, com base na relação verificada entre os fatos ou fenômenos”. (pp.
28-29).
No que concerne ao nível da pesquisa, destaca-se a realização de um estudo
exploratório, com a utilização de algumas técnicas utilizadas em estudos de caso, como
levantamento bibliográfico e documental, entrevista qualitativa e análise de conteúdo.
Gil (2007) afirma que em pesquisas exploratórias o tema escolhido é bastante
genérico. Dessa forma, é preciso trabalhar com a perspectiva de esclarecimento ou
delimitação, sendo necessária a realização de revisão de literatura, discussão com
especialistas, entre outros procedimentos. O autor afirma também que os estudos
exploratórios buscam proporcionar uma visão geral, do tipo aproximativo, de determinado
fato. “Este tipo de pesquisa é realizado especialmente quando o tema escolhido é pouco
explorado” (p.43).
Nesta fase exploratória, fez-se um levantamento de edições do veículo selecionado,
Jornal Metro, e verificou-se como as mudanças do jornalismo da nova era se manifestavam
nesse meio. Procurou-se selecionar uma semana corrida, de segunda a sexta, dias em que o
jornal circula. Consideramos ser suficiente a amostragem citada por observarmos – nesses
quase três anos do Metro no Brasil – uma homogeneização do jornal sem nenhuma mudança
e/ou variação dos padrões que seja relevante.
Tem-se aqui a proposta de apresentar algumas características dos tempos atuais, tais
como notícias superficiais, caráter publicitário das informações jornalísticas, apelo direto ao
consumo, presença de infográficos, entre outras. Assim, configura-se uma temática genérica
19
que justifica a realização dessa pesquisa exploratória, permitindo ainda o uso de diferentes
técnicas incorporadas. Uma delas é a realização de levantamento bibliográfico detalhado,
parte inerente a toda pesquisa de cunho científico.
A revisão da literatura disponível, embora escassa, principalmente quando se trata de
referências brasileiras, é norteadora para a construção de ideias e conceitos que envolvem a
temática.
A realização de entrevista em profundidade ou qualitativa é outra etapa importante da
pesquisa. Segundo Duarte (In: DUARTE, 2006, p.66), esse tipo de pesquisa se caracteriza
como: “modelo de entrevista que tem origem em uma matriz, um roteiro de questões-guia que
dão cobertura ao interesse a pesquisa”.
Como se pretende explorar o tema e, consequentemente, descrevê-lo, acredita-se que a
técnica de entrevista em profundidade permite a aproximação com a situação em que se busca
uma resposta.
A entrevista em profundidade é um recurso metodológico que busca, com
base em teorias e pressupostos definidos pelo investigador, recolher
respostas a partir da experiência subjetiva de uma fonte, selecionada por
deter informações que se deseja conhecer (DUARTE In: DUARTE, 2006,
p.62).
Ruótolo (1996) explica que a entrevista qualitativa configura-se como uma forma
fidedigna de aproximação com o público-alvo. Selecionou-se um profissional que respondesse
em nome do veículo de forma geral; assim, as entrevistas seriam realizadas com os seguintes
profissionais:
1. Editora- geral: Noelly Russo
2. Editora executiva: Célia Almudena
Infelizmente não foi possível sua realização. Tentamos, por várias vezes, um contato
com as editoras citadas acima. Foi explicado a elas o tipo de entrevista que seria realizada,
objetivos e ainda que seriam destinadas à complementação de um trabalho acadêmico. Ambas
alegaram, por telefone, que o Metro não fornece informações sobre sua produção, estratégias,
metas, objetivos, dinâmica.
Com esse percalço no meio do caminho, utilizei apenas uma entrevista com o ex-
editor geral do Metro, jornalista Ricardo Anderáos. A referida entrevista foi concedida
durante uma palestra proferida por ele no evento chamado Café Intercom, na livraria Saraiva
20
do Shopping Ibirapuera em outubro de 2008. Atualmente o ex-editor assina a coluna
Conexão, publicada às quintas-feiras no Metro.
Apesar das entrevistas com a editora-geral Noelly Russo e com a editora executiva
Célia Almudena não se realizarem, a pesquisa seguiu sem maiores problemas.
Continuando na explicitação dos procedimentos metodológicos, segundo Yin (2005),
as técnicas aplicadas ao estudo de caso permitem a descrição de uma situação no contexto em
que ela ocorre, utilizando múltiplas fontes de evidências. “Você usaria o método de estudo de
caso quando deliberadamente quisesse lidar com condições contextuais, acreditando que elas
poderiam ser altamente pertinentes ao seu fenômeno de estudo” (p.32).
No caso desta pesquisa, as condições contextuais que envolvem a mutação vivida pelo
jornalismo, bem como a quebra dos seus paradigmas e crise econômica da imprensa são
relevantes no desenvolvimento e descrição do estudo. Acredita-se que o contexto em que a
sociedade está inserida, principalmente nesta era da informação, contribui para a existência do
jornalismo que acompanha o novo ritmo; um ritmo cada vez mais frenético, veloz e fugaz.
Com relação à amostra, as edições selecionadas foram do mês de novembro de 2009.
A amostragem incluiu cinco edições do Metro, como foi dito anteriormente, assim formando
uma semana corrida.
1.2 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO
A dissertação encontra-se divida em duas partes e cinco capítulos: na primeira parte,
consta a reflexão teórica. O capítulo I inclui um resgate da trajetória do jornalismo sob um
olhar econômico. Foi mostrado como o jornalismo evoluiu chegando à fase da era eletrônica.
No capítulo II, abordamos o novo fazer jornalístico, o jornalismo da era das novas
tecnologias, bem como uma discussão sobre a pós-modernidade de acordo com os estudos de
Zygmunt Baumam.
Ainda na primeira parte da pesquisa, no capítulo III, apresenta-se a crise do jornalismo
e a era da publicidade, marcada pelas leis do capital. E por fim, levanta-se a discussão sobre o
mercado da publicidade e a sociedade de consumo.
Na segunda parte fez-se um estudo do Metro, bem como se abordou seu histórico, sua
situação no mundo, suas metas e perspectivas.
No capítulo V, o último desta pesquisa, são apresentados os resultados da análise do
conteúdo do Metro. Neste capítulo, as categorias de análise foram apresentadas e explicitadas.
21
Elas foram criadas com o objetivo de identificar no Metro algumas importantes marcas da
nova era que o caracterizem com um veículo dos tempos atuais.
22
CAPÍTULO I - RETROSPECTIVA HISTÓRICA DO JORNALISMO SOB
UM OLHAR ECONÔMICO: DO PRIMEIRO JORNAL À ERA
ELETRÔNICA
1.1 O COMEÇO
Não podemos fazer uma retrospectiva da história da mídia sem relacioná-la ao
desenvolvimento da economia, das leis de mercado e da circulação econômica. O jornal surge
com a necessidade do comércio em fazer circular informações sobre exportações,
importações, circulação de mercadorias, enfim, para agilizar as relações comerciais.
A impressão do primeiro jornal ocorre pouco mais de um século após o aparecimento
dos tipos móveis. Contudo, ele iria atender com exclusividade alguns núcleos do poder
político e financeiro da época mercantilista, interessados em fechar o círculo informativo
sobre os fatos da vida econômica e política. O jornal surgiu e teve sua lógica associada à
expansão da burguesia como classe e não como iniciativa da classe dominante, a nobreza
feudal.
(...) o trânsito de notícias desenvolve-se não somente no contexto de
necessidades do trânsito de mercadorias; as próprias notícias transformam-se
em mercadorias. A elaboração noticiosa comercial está sujeita, assim, às
mesmas leis de mercado, a cujo surgimento ela deve sua própria existência
(HABERMAS, apud MARCONDES FILHO, 1989, p.58)
Inicialmente, porém, as formas de imprensa burguesa eram ainda artesanais, oriundas
do sistema de correspondência privada e dotadas de técnicas elementares de produção de
jornais. A imprensa aqui consistia numa atividade modesta, com um interesse puramente
comercial, não visava tanto o lucro.
Portanto, a chamada primeira fase do jornalismo é marcada pela ruptura com a forma
segregada de armazenar informação. Antes a informação pertencia aos privilegiados,
sacerdotes e catedráticos. Com a imprensa, a informação é aberta, disseminada com fins
puramente comerciais.
A disseminação do conhecimento operada pelos jornalistas é bem mercantil. Não se
colocam pressupostos morais ou éticos. Tudo é vendável e passível de ser absorvido pelo
público. Isso se deve ao fato de que o surgimento da imprensa burguesa atendeu interesses
estritamente econômicos e só pôde expandir-se por ter sido vista por essa classe como um
excelente meio de informação e comunicação dos negócios. Naquela época, o que fosse
23
veiculado só interessaria na medida em que ajudasse a aumentar as vendas e os lucros dos
comerciantes.
1.2 A FASE POLÍTICO LITERÁRIA
A passagem da imprensa artesanal, das vendas de notícias para a segunda fase,
político-literária, marca a revolução empreendida no final do século XVIII. É nessa fase que
surge a redação como setor específico do jornal; época dos jornais eruditos, das revistas
moralistas, época em que escritores e políticos escrevem em suas páginas.
No jornalismo literário os fins econômicos das empresas vão para o segundo
plano. Os jornais são escritos com fins pedagógicos e políticos. É também
característica dessa fase a imprensa partidária, na qual os próprios jornalistas
eram políticos e o jornal, o seu porta-voz. A razão de sobrevivência dessas
empresas totalmente deficitárias em termos econômicos deve-se à sua função
no cenário das discussões políticas daquele século. Essa imprensa insere-se
nos meios políticos europeus, nos cafés e salões burgueses e fornece material
à burguesia para as suas discussões e seu entretenimento. É, portanto, um
veículo interno da classe, no sentido de ser porta-voz dos setores e grupos
políticos e econômicos da sociedade que se debatem por melhores postos no
aparelho de Estado e na sociedade civil. Pouco tem a ver com a grande
imprensa de massa do século XX. Serve ainda para satisfazer
exclusivamente esses grupos de interesse (MARCONDES FILHO, 1989,
p.61).
Nos jornais literários e políticos as funções de diretor e editor separam-se nitidamente
e com isso a redação ganha autonomia. Os jornais são veículos de grande alcance,
instrumentos puramente políticos de modo que o lucro jamais se impõe as intenções políticas
dos redatores.
O século XIX foi amplamente marcado por conflitos sociais e pela afirmação política
da burguesia no poder. Destaque para o movimento cartista, que surgiu nos fins do século
XVIII contra as oligarquias e pela recuperação dos pequenos produtores e propunha a
substituição do modo de produção capitalista por estruturas cooperativas de divisão do
trabalho. As formas de estruturação social sob as rédeas do capitalismo, em que imperavam a
concorrência, o rendimento, a individualização do trabalho operário, são estranhas ao
trabalhador que se originava de relações bem distintas no campo. Com a queda do movimento
cartista aparecem sindicatos, cooperativas e demais organizações, representando o início do
socialismo do século XIX.
24
1.3 A PRODUÇÃO DE JORNAIS EM MASSA
É na chamada terceira fase que se dá a maior revolução da história do jornalismo. A
inovação tecnológica transformará radicalmente os rumos e o caráter da imprensa política do
século XVIII e XIX. Acompanhando a expansão industrial acelerada do início do século, a
produção de bens em massa e consequente dilatação do mercado, a ampliação da exploração
colonial e a afirmação política e econômica da nova classe dominante a imprensa começa a se
transformar. Já é hora de se estender a conquista tecnológica para a produção de jornais em
massa.
O ponto de partida marcante desse desenvolvimento foi a introdução,
animadamente festejada, da prensa rápida (em novembro de 1814 pelo
Times londrino), descoberta por Friedrich Konig, que reduziu sensivelmente
o tempo entre a ocorrência de um fato e sua divulgação em um grande
território. (...) O que o jornal não transmitiu aos seus leitores foi o fato de
que uma máquina tão impressionante não poderia ser utilizada sem um gasto
financeiro considerável, e que os custos mal poderiam ser cobertos com o
produto da venda, (JAENICK, apud MARCONDES FILHO, 1989, p.63).
A transformação tecnológica irá exigir da empresa jornalística a capacidade financeira
de autossustentação com pesados pagamentos periódicos, irá transformar uma atividade
praticamente livre de pensar e de fazer política que precisará vender e se autofinanciar. A fase
em que o jornal não visava o lucro, marcado pelas intenções político-ideológicas dos seus
redatores ficava pra trás, cedendo espaço às exigências do capital.
Com isso, o jornalista, redator, perde sua autonomia dentro do jornal que passa a ser
controlada pelo proprietário do jornal. Como consequência, o jornalismo vai deixando de ser
livre manifestação de ideias, pensamentos e posições políticas para se curvar diante da
ditadura do capital.
É a partir da segunda metade do século XIX que a imprensa começa a definir-se como
um negócio para o comércio de anúncios. O jornal burguês agora avança com toda a sua força
para se transformar em veículo de massa, produzindo mercadorias, desenvolvendo melhores
técnicas de aprimoramento do produto e conquistando o público leitor.
O aparecimento dessas novas técnicas dá margem ao surgimento da imprensa de
massa, decorrência das novas facilidades de produção em grandes quantidades, voltada
também para entreter as massas urbanas sensibilizadas e deslocadas com a brusca mudança de
vida, do campo para as cidades.
25
A notícia, como mercadoria, vai recebendo mais investimento para melhorar a sua
aparência de valor de uso; surgem as manchetes, os destaques, as reportagens, trabalha-se e
investe-se muito mais na capa, no logotipo, nas chamadas de primeira página.
A gradual implantação da imprensa de negócios, terceira fase da história do
jornalismo, iniciava-se, assim, após 1830, especialmente na Inglaterra, na
França e nos Estados Unidos. A sua dominação plena dá-se a partir de 1875.
A grande mudança que se opera nesse tipo de imprensa é a inversão de
importância e de preocupação quanto ao caráter de mercadoria do jornal. O
seu valor de troca, a venda dos espaços publicitários para assegurar a
sustentação e a sobrevivência econômica, passa a ser prioritário em relação
ao valor de uso, a parte puramente redacional-noticiosa dos jornais. A
tendência é de fazer do jornal um amontoado de comunicações publicitárias
permeado de notícias (MARCONDES FILHO, 1989, p.67).
A introdução dos novos aparelhos de impressão exigia maior investimento de capital,
um aumento do risco comercial e a submissão da política ao ponto de vista empresarial.
Dentro da própria estrutura redacional alteram-se as relações entre editor e redator. O redator
perde a sua autonomia e o tratamento e elaboração de notícias sobrepõe-se à linha editorial.
O surgimento dos grandes conglomerados jornalísticos ocorre no finalzinho do século
XIX, acompanhando o processo geral de concentração econômica. Além da função e da
centralização administrativa e financeira ocorre a sincronização com as agências noticiosas;
pequenos jornais unem-se também aos complexos jornalísticos, significando o enorme poder
da imprensa como forte conglomerado econômico, político e ideológico.
1.4 A ERA ELETRÔNICA
É na segunda metade do século XX, mas precisamente de 1970 prá cá, que o
jornalismo entra em sua quarta fase: a era eletrônica, que faz parte de toda uma revolução
tecnológica dos meios de comunicação que atinge o sistema de rádio, de televisão, de
telefonia em geral e as demais formas de comunicação a distância.
E é essa fase da era eletrônica, marcada pela internet, principalmente de 1995 até os
dias atuais, que passaremos a discutir neste trabalho. Abordaremos a crise dos paradigmas que
o jornalismo vive hoje, associada à crise econômica dos impressos. Com o surgimento da
televisão o jornalismo impresso, para continuar existindo, teve que se diferençar: passou a
produzir notícias mais aprofundadas, contextualizadas, em oposição às notícias televisivas,
curtas e superficiais. E hoje, em tempos de capitalismo desorganizado, de crise financeira
mundial, de mundos on-line e virtuais, com notícias variadas e gratuitas 24 horas na rede
26
mundial de computadores, o jornalismo impresso terá de continuar se reinventando para
continuar existindo.
27
CAPÍTULO II – O NOVO FAZER JORNALÍSTICO
1 O JORNALISMO NA ERA DAS NOVAS TECNOLOGIAS
Philip Meyer (2007) acredita que para salvar as tradições e a prestação de serviço do
jornalismo impresso sustentado principalmente pela publicidade, seja necessário olhar além
dos jornais. “Temos de olhar para o mundo ponto.com ou algum híbrido” (p.222). Esse
modelo híbrido ao qual Meyer (2007) sugere como forma dos jornais impressos cumprirem
sua função na prestação de serviços e de quebra escapar da crise financeira poderiam ser os
jornais gratuitos?
Na era do virtual, do tempo real e da interconexão mundial através da rede mundial de
computadores, quem poderia apostar no sucesso de jornais impressos, em formatos reduzidos,
design compacto, textos curtos e instantâneos distribuídos gratuitamente nas estações de
metrô, pontos de ônibus e semáforos? Essa é uma tendência mundial e também uma realidade
no Brasil com a chegada dos jornais gratuitos Destak e Metro. O surgimento desse tipo de
jornal pode estar relacionado a uma dupla crise: uma crise conceitual do Jornalismo e uma
crise empresarial dos jornais impressos.
Meyer (2007) acredita que para enfrentar o atual momento, os jornais impressos têm
que aprender a lidar com a competição das novas formas de mídia, o que exigiria uma nova
maneira de pensar. E, segundo ele, um sinal dessa nova maneira de pensar é a sacada das
empresas da grande imprensa para publicações especializadas. Produtos com periodicidade
menores que diária, direcionada às minorias étnicas ou aos jovens, vem sendo uma das
grandes preocupações dos veículos impressos. Mala direta, distribuição gratuita e produtos
web direcionados para públicos específicos foram implementados ou estudados.
O produto on-line atende à utilidade, é uma forma de ter acesso rápido a
informação útil para a vida dos leitores. O uso mais impressionante de todos
esses sites, mesmo nos mercados menores e mais locais, é a criação de uma
rede de leitores. E, é claro, nessa rede de leitores há um número
desproporcional de jovens, que são a fonte do tradicional declínio de longo
prazo dos leitores do jornal tradicional. Quem quiser preservar a função de
responsabilidade social da imprensa melhorando sua qualidade tem de parar
de se queixar e começar a olhar o produto integrado, não só sua porção
fabricada com papel e tinta (MEYER, 2007, pp. 232 e 233).
De fato, há mudanças importantes ocorrendo na produção da notícia que exigem maior
agilidade e novas habilidades dos jornalistas. Novos meios, novos contextos de produção,
28
novas linguagens estão alterando acentuadamente o fazer jornalístico. Como resultado desse
desenvolvimento tecnológico, as notícias estão se tornando um produto superabundante,
barato e instantâneo. Reduz-se cada vez mais a interferência do jornalista, e as pessoas estão
se acostumando a ver o acontecimento no momento de sua ocorrência, sem a necessidade de
intermediações, sem necessidade de palavras. Como afirmou o professor e jornalista Luiz
Gonzaga Motta (2009) em um artigo publicado na home page da Universidade de Brasília
O espetáculo do 11 de setembro em Nova York, transmitido ao vivo para
todo o mundo, foi um marco nessa experiência de visualidade e
instantaneidade na transmissão de eventos: muito imediatismo, profusão de
imagens, poucas palavras, profunda perplexidade e incompreensão.
(MOTTA, 2009).
Os novos produtores assimilaram a cultura profissional anterior e os novos meios,
como a internet, utilizaram estruturas comerciais e industriais já existentes, fazendo convergir
processos de produção cultural ainda mais centralizados e com uma rentabilidade financeira
maior. A maioria das empresas que operam o jornalismo on-line são as mesmas que operavam
outras formas de jornalismo anteriormente. Com o advento do jornalismo on-line, foi
sacramentada a retórica da objetividade, da síntese e do imediato com sua linguagem
telegráfica, a publicação de textos curtos, resumidos, poucas reportagens.
E em meio ao mundo on-line, o jornalismo impresso vem se adaptando. Mas também
não fez nenhuma ruptura radical nas maneiras de produzir a notícia. Fez sim uma readaptação
de suas rotinas e linguagens para fazer frente às exigências da instantaneidade, da visualidade,
da imagem. Os jornais mudaram o layout, tornaram-se mais leves, mais coloridos e mais
didáticos com muitos infográficos, um recurso de design que lhes assegurou adesão às novas
exigências do público leitor, ávido por informações rápidas, bonitas e superficialmente
instrutivas. Tudo rápido, ligeiro, superficial, sem aprofundamento, bem ao encontro do ritmo
de vida corrido, pós-moderno.
Da mesma forma, o telejornalismo e o radiojornalismo também vêm se adaptando ao
contexto do virtual. As transmissões estão mais diretas, em tempo real, houve um ajuste às
novas circunstâncias industriais da produção cultural. Está tudo mais rápido, desconexo e
fragmentado. As grandes estórias, as grandes reportagens estão em declínio em detrimento do
breve, do rápido, do prático. O que parece interessar agora é transmitir o maior número de
informações em menos tempo possível.
29
2 A CRISE DOS NOVOS TEMPOS
A crise econômica/empresarial dos veículos impressos – sentida sensivelmente pelo
jornalismo - está sendo agravada pela recente recessão financeira internacional. Recessão esta
que está arrastando consigo boa parte da credibilidade e do poder dos grupos midiáticos,
particularmente da imprensa escrita, em função da estreita aliança entre mídia e poder
econômico.
Ignácio Ramonet3, em artigo publicado em outubro passado, questiona:
O que é que agrava tão letalmente a velha decadência da imprensa escrita
quotidiana? Um fator conjuntural: a crise econômica global que provoca a
redução da publicidade e a restrição do crédito. E que, no momento mais
inoportuno, se veio somar aos males estruturais do setor: a mercantilização
da informação, o apego à publicidade, a perda de credibilidade, a queda de
subscritores, a competência da imprensa gratuita, o envelhecimento dos
leitores... Dezenas de diários estão em queda. Nos Estados Unidos já
fecharam pelo menos cento e vinte. E o tsunami golpeia agora a Europa.
(RAMONET, 2009)
O tratamento dado pela mídia à crise não teria sido mais do que o reflexo de seu
próprio desespero, pois toda crise capitalista tende a se refletir como uma crise nos meios de
comunicação. Particularmente em relação à América Latina, como destacou Ignácio
Ramonet4, onde o contexto político não é mais o mesmo, o que tem influído no tratamento
dispensado à mídia hegemônica e fortalecido as mídias livres, ou alternativas.
Para Pascual Serrano5, a mídia é um dos responsáveis pela recente crise internacional
porque faz parte da estrutura financeira do modo de produção capitalista.
A sociedade civil organizada sempre defendeu meios de controle sobre a
economia, mas teria sido solenemente ignorada pela mídia tradicional, que
estranhamente não ofereceu explicações satisfatórias diante da crise, muito
embora seus especialistas tenham estado sempre de prontidão quando o caso
era legitimar a economia capitalista. (SERRANO, 2009)
3 Artigo disponível em http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_
id=16175&boletim_id=599&componente_id=10070. Acessado em 18 de novembro de 2009, às 20h12. 4 Ignácio Ramonet, do Le Monde Diplomatique, durante palestra em Belém-Pará, no Colégio de Aplicação da
Universidade Federal do Pará (UFPA), no primeiro Fórum Mundial de Mídia Livre (FMML), em janeiro de
2009. O evento integra as atividades do Fórum Social Mundial 2009. Informação retirada do site www.
cartamaior.com.br, em 12 de março às 15h. 5 Pascual Serrano, do site Rebelion, durante palestra em janeiro de 2009, em Belém-Pará, no Primeiro Fórum
Mundial de Mídia Livre. Trecho retirado do site www.cartamaior.com.br em 12 de março, às 15h16.
30
A estratégia escolhida pela mídia diante da crise, afirma Serrano, foi a de vitimização,
como se não existisse responsável algum pela bancarrota capitalista, mas somente vítimas.
Após avaliar a atual crise econômica dos jornais impressos no mundo, Ramonet6
afirma que
Para cortar despesas, muitas publicações estão reduzindo o número de
páginas; o Washington Post fechou o seu prestigiado suplemento literário
Bookworld; o Christian Science Monitor decidiu suprimir a sua edição em
papel e existir só na Internet; o Financial Times propõe semanas de três dias
aos seus redatores e reduziu drasticamente o número de trabalhadores. As
demissões são em massa. Desde janeiro de 2008 foram suprimidos 21.000
empregos nos jornais norte-americanos. Na Espanha, "entre junho de 2008 e
abril de 2009, 2.221 jornalistas perderam o seu posto de trabalho". (...) A
imprensa diária escrita encontra-se à beira do precipício e procura
desesperadamente fórmulas para sobreviver. Alguns analistas consideram
obsoleto esse modo de informação. Michael Wolf, da Newser, prevê que
80% dos diários norte-americanos desaparecerão. (RAMONET, 2009)
3 PÓS-MODERNIDADE: UM QUADRO DO INÍCIO DO SÉCULO XXI
E “tudo o que é sólido se desfaz no ar”. Essa expressão foi usada no Manifesto
Comunista de 1848 por Marx e Engels com o objetivo de caracterizar o caráter revolucionário
das transformações operadas pela modernidade e pelo capitalismo nos mais diferentes setores
da vida social. “Marx estava plenamente consciente de que, ao mesmo tempo que a solidez
antiga, pré-capitalista, se desfazia no ar, uma outra solidez se instalava, instantaneamente
rígida e resistente, a lei de ferro das relações de produção capitalista” (SANTOS, Boaventura
de Sousa, 2003, pp. 23-24). Essa expressão de Marx e Engels se aplica muito bem hoje, nessa
fase do capitalismo desorganizado, nessa nova era, marcada pela velocidade, imediatismo e
superficialidade. Para discutir essa questão recorremos a alguns autores que contribuiram de
alguma maneira para entedermos esse momento atual.
Como vamos discutir o jornalismo na nova era, não poderia deixar de mencionar ou
ignorar o termo pós-moderno, bastante controverso e utilizado para definir tudo o que é
diferente, novo e/ou foge aos padrões. Quem nunca ouviu frases do tipo “ela é uma garota
pós-moderna, usa piercing e tem tatuagens”, ou “essa arquitetura é pós-moderna, veja o
design arrojado”. Não queremos aqui aprofundar-nos em pós-modernidade, apenas levantar
6 Artigo disponível em http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm? materia_id=
16175&boletim_id=599&componente_id=10070. Acessado em 18 de novembro de 2009 às 20h17
31
alguns aspectos sobre o termo com o intuito de esclarecer esse momento atual para então
entrarmos na discussão da crise conceitual do jornalismo hoje.
O termo pós-moderno se tornou corrente, embora haja muitas controvérsias quanto ao
seu significado e pertinência. Tais controvérsias possivelmente resultem da dificuldade de se
examinarem processos em curso com suficiente distanciamento e, principalmente, de se
perceber com clareza os limites ou os sinais de ruptura entre tradicional, moderno e pós-
moderno
Em A cultura da mídia, Douglas Kellner chama atenção para o fato do termo pós-
moderno vir sendo utilizado de maneira indiscriminada e confusa e que acabou virando um
chavão popular: tudo que é diferente, reacionário, foge dos padrões é pós-moderno.
Com efeito, a designação “pós-moderno” talvez seja uma das que foram
usadas de modo mais indiscriminado e confuso no léxico da teoria crítica
contemporânea. Os termos “moderno” e “pós-moderno” são usados para
abarcar uma espantosa diversidade de produtos culturais, fenômenos sociais
e discursos teóricos, e o conceito de pós-modernidade exige constante
exame, aclaramento e crítica. (...)De um ponto de vista negativo, o termo
frequentemente é um significante vazio a indicar que se está evitando uma
teorização mais concreta necessária. Tal uso vazio do discurso é sinal de
teoria preguiçosa, de fuga ao pensamento e à análise difíceis e de
substituição da análise teórica por um chavão popular ( KELLNER, 2001,
p.64, 65 e 69).
Mas, por outro lado, toda essa discussão em torno do termo é sinal de que algo é novo
e precisa ser estudado. Rotulamos de pós-moderno algo que está nos incomodando, ao
surgimento de fenômenos novos e intrigantes que não conseguimos apreender adequadamente
ou na sua plenitude.
É no campo da cultura que a discussão contemporênea sobre o pós-moderno ganha
força. De uma maneira mais geral, o termo corresponde a uma nova configuração da cultura e
é usado para substituir os dogmas da modernidade, propondo novos valores, mais abrangentes
e acompanhando a revolução de várias áreas do conhecimento, como a comunicação, ciência,
tecnologia, entre outras. Tudo isso, claro, acompanhando o desenvolvimento do capitalismo e
industrialização avançada.
(...) o discurso contemporâneo sobre o pós-moderno surgiu nos campos da
cultura, e a febre pós-moderna da atualidade também começou nesse
domínio. Nos anos 1960, apareceu uma “nova sensibilidade” que se definia
contra a abstração e o elitismo da arte moderrnista e das formas modernas de
crítica literária. Essa nova sensibilidade propugnava as práticas culturais
emergentes que se caracterizavam por, entre outras coisas, desfazer a
32
distinção entre arte nobre e não nobre, ao incorporarem nas formas estéticas
uma vasta gama de símbolos e imagens da cultura da mídia e ao porem em
cheque as barreiras convencionais entre artista e espectador. Essas novas
formas estéticas – como as pinturas de Andy Warhol ou os romances de John
Barth e Thomas Pynchon – acabaram sendo conhecidas como exemplos de
pós-modernismo, como parte das novas configurações culturais que
rejeitavam as características do modernismo clássico (KELLNER, 2001, p.
70)
E o processo de uma cultura global, em escala mundial, que marcaria para sempre o
século XX estava se desenvolvendo. A Pós-Modernidade, que é o aspecto cultural dessa nova
sociedade, inscreve-se neste contexto como conjunto de valores que norteiam a produção
cultural que estaria por vir. Entre estes, a multiplicidade, a fragmentação, a
desreferencialização, o desenraizamento e a inclusão de todas as culturas como mercados
consumidores. Nesse novo modelo de mundo, que privilegia a informação, a comunicação
passa a exercer papel fundamental na difusão de valores e ideias pós-modernos.
Na batalha por capital cultural, sem dúvida, a mídia exerce papel fundamental ao fazer
uso, ou mesmo se apropriar do conceito pós-moderno.
(...) os jornalistas, os empresários culturais e os teóricos inventam e
divulgam discursos como o do pós-moderno para aumentar o capital cultural,
distinguir-se, fazer propaganda de determinados produtos ou práticas como
coisas que estão na crista da onda, e difundir novos significados e ideias. O
discurso em torno do pós-moderno, em especial, atrai sobretudo jovens à
cata de prestígio ou pessoas que queiram distinguir-se como vanguarda,
embora também tenha atraído muita gente interessada em ressuscitar a
carreira ou a libido exangue com o discurso novo e sensual (MIKE
FEATHERSTONE apud KELLNER, 2001, p. 72)
E nesse bojo da pós-modernidade, ao disseminar uma enorme gama de novos valores,
novos padrões de cultura, ao criar papéis e disponibilizar materiais sociais e simbólicos, a
mídia acaba por criar uma ansiedade no indíviduo contemporâneo, tamanha diversidade de
materiais despejado por ela diariamente. E isso acaba por gerar uma crise de identidade, pois
nunca estamos certos de que fizemos a escolha certa e mais, de que seremos reconhecidos por
nossos pares, por nossa tribo.
Nas sociedades tradicionais, pré-modernas, o indivíduo pertencia a um grupo e ali
ficava por toda a vida, possuía uma única identidade fixa, estável. Na modernidade, a
identidade já ganha uma mobilidade, uma certa instabilidade. O indíviduo já passa a ter mais
consciência de si e passa a refletir sobre seu papel no grupo, suas possibilidades de mudança e
acaba por distanciar-se da tradição. Ele tem a consciência de que sua identidade pode ser
construída e mudada sempre que preciso ao longo da vida.
33
Hoje, o que podemos observar é que, em meio a tantos mateirais disponíveis, a todo
esse excesso de informação, o indíviduo acaba por ficar meio perdido, desenraizado, a medida
que o ritmo, as dimensões e a complexidade das sociedades aumentam, a identidade vai se
tornando cada vez mais frágil e instável. Alguns teóricos como Baudrillard, acreditam que o
sujeito autoconstruído e autônomo está se fragmentando e desaparecendo na sociedade
racionalizada, burocrática e consumista dominada pela mídia.
Afirma-se, pois, que na cultura pós-moderna o sujeito se desintegrou num
fluxo de euforia intensa, fragmentada e desconexa, e que o eu pós-moderno
descentrado já não sente ansiedade (a histeria torna-se a típica doença
psíquica pós-moderna e já não possui a profundidade, a substancialidade e a
coerência que eram os ideais e às vezes a realização do eu-moderno
(BAUDRILLARD; JAMERSON apud KELLNER, 2001, p. 298)
3.1 A Modernidade líquida de Bauman
O sociólogo polonês Zygmunt Bauman, depois de trabalhar bem o termo Pós-
Modernidade, prefere usar a expressão "modernidade líquida" , se referindo à realidade
confusa, desconexa que vivemos hoje. No seu livro Modernidade Líquida, Bauman propõe
uma nova visão sobre a modernidade, voltada à fluidez das relações, ao individualismo
pregando o dinamismo. Inicia seu estudo discutindo a ideia de liquidez e fluidez. Por se tratar
de um conceito voltado à mudança de formas para acomodação nos mais diversos encaixes, é
inevitável a analogia à nossa atual e imediatista sociedade pois, “assim, para eles, o que conta
é o tempo, mais do que o espaço que lhes toca ocupar; espaço que, afinal, preenchem apenas
„por um momento‟ [grifo do autor]” (BAUMAN, 2001, p. 8).
Para Bauman (2001), os tempos modernos encontraram sólidos pré-modernos em
estado avançado de desintegração; e um dos motivos mais fortes por trás da urgência de
derretê-los era o desejo de, por uma vez, “descobrir ou inventar sólidos de solidez duradoura,
solidez em que de pudesse confiar e que tornaria o mundo previsível e, portanto,
administrável” (p.10).
Bauman acredita que a pós-modernidade é o resultado de se soltar o freio: da
desregulamentação, da liberalização, da flexibilização, da fluidez crescente, do descontrole
dos mercados financeiro, imobiliário e de trabalho.
E segue, afirmando que o derretimento dos sólidos, traço permanente da modernidade,
adquiriu, portanto, um novo sentido e, mais que tudo, foi redirecionado a um novo alvo; e dos
34
principais efeitos desse redirecionamento foi a dissolução das forças que poderiam ter
mantido a questão da ordem e do sistema na agenda política.
Os sólidos que estão para ser lançados e que estão derretendo neste
momento, o momento da modernidade fluida, são os elos que entrelaçam as
escolhas individuais em projetos e ações coletivas – os padrões de
comunicação e coordenação das entre as políticas de vida conduzidas
individualmente, de um lado, e as ações políticas de coletividades humanas,
de outro. (BAUMAN, 2001, p.12)
Na visão de Bauman, o tempo adquire história uma vez que a velocidade do
movimento através do espaço (diferentemente espaço eminente inflexível, que não pode ser
esticado e que não encolhe) se torna uma questão do engenho, da imaginação e da capacidade
humanas. Ao falar de velocidade em tempos de pós-modernidade o autor afirma que
(...) a própria de ideia de velocidade (e mas ainda a de aceleração), quando
se refere à relação entre tempo e espaço, supõe sua variabilidade, e
dificilmente teria qualquer significado e se não fosse aquela uma relação
verdadeiramente variável, se fosse um atributo da realidade inumana e pré-
humana e não uma questão de inventividade e resolução humanas, e se não
fosse para muito alem da estreita gama de variações a que as ferramentas
naturais da mobilidade – as pernas humanas ou equinas – costumavam
confinar movimentos dos corpos pré-modernos. Quando a distancia
percorrida numa unidade de tempo passou a depender da tecnologia, de
meios artificiais de transporte, todos os limites à velocidade do movimento,
existentes ou herdados, poderiam, em principio ser transgredidos. Apenas o
céu era agora o limite, e a modernidade era um esforço contínuo, rápido e
irrefreável para alcançá-lo. (BAUMAN, 2001, p. 16)
Ao se referir ao tempo na pós-modernidade, Bauman afirma que graças a sua
flexibilidade e expansividade recentemente adquiridas, o tempo moderno se tornou, antes e
acima de tudo, a arma na conquista do espaço. Na moderna luta entre tempo e espaço, afirma
o autor,
(...) o espaço era o lado sólido e impassível, pesado e inerte, capaz apenas de
uma guerra defensiva, de trincheiras – um obstáculos aos avanços do tempo.
O tempo era o lado dinâmico e ativo na batalha, o lado sempre na ofensiva: a
força invasora conquistadora e colonizadora. A velocidade do movimento e
o acesso a meios rápidos de mobilidade chegaram nos tempos modernos à
posição de principal ferramenta do poder e da dominação (BAUMAN, 2001,
p. 16)
Na visão de Zygmunt Bauman (2001), o que leva a tantos a falar do fim da historia, da
pós-modernidade, da segunda modernidade e da sobre-modernidade, ou articular a intuição de
uma mudança radical no arranjo do convívio humana e nas condições sociais sob as quais a
35
política-vida é hoje levada, é o fato de que o longo esforço para acelerar a velocidade do
movimento chegou ao seu limite natural. Para o autor, o poder pode se mover com a
velocidade do sinal eletrônico, e assim, o tempo requerido para o movimento de seus
ingredientes essenciais se reduziu a instantaneidade.
Instantaneidade essa que, para Bauman, aparentemente se refere a um movimento
muito rápido e a um tempo muito curto, mas de fato denota a ausência do tempo como fator
do evento e, por isso mesmo, como elemento no cálculo do valor. “O tempo não é mais o
desvio na busca, e assim não mais confere valor ao espaço. A quase-instantaneidade do tempo
do software anuncia a desvalorização do espaço” (BAUMAN, 2001, p. 136).
Para o sociólogo polonês, o tempo instantâneo e sem substancia do mundo do software
é também um tempo sem consequências. Instantaneidade significa realização imediata, no ato
– mas também exaustão e desaparecimento do interesse.
A distancia em tempo que separa o começo do fim esta diminuindo ou
mesmo desaparecendo, as duas noções, que outrora eram usadas para marcar
a passagem do tempo e, portanto, para calcular o seu valor perdido,
perderam muito do seu significado – que, como todos os significados,
derivava de sua rígida oposição. Há apenas momentos – pontos sem
dimensões. Mas, será ainda um tal tempo – tempo com a morfologia de um
agregado de momentos – o tempo como conhecemos A expressão momento
de tempo parece, pelo menos em certos aspectos vitais, um oximoro. Teria o
tempo cometido suicídio. Não teria sido o espaço apenas a primeira baixa na
corrida do tempo para a autoaniquilação. (BAUMAN, 2001, pp. 137-138)
A instantaneidade, ainda de acordo com Bauman, faz com que cada momento pareça
ter capacidade infinita; e a capacidade infinita significa que não há limites ao que pode ser
extraído de qualquer momento – ou mais breve e fugaz que seja.
O longo prazo, ainda que continue a ser mencionado, por hábito, é uma
concha vazia sem significado; se o infinito, como o tempo, é instantâneo,
para ser usado no ato e descartado imediatamente, então mais tempo
adiciona pouco ao que o momento já ofereceu. O curto prazo substituiu o
longo prazo e fez da instantaneidade seu ideal último. (BAUMAN, 2001, p.
145)
O sociólogo segue seu raciocínio dizendo que “Agora é a palavra-chave da estratégia
de vida, ao que quer que essa estratégia se aplique e independente do que mais possa sugerir”,
(2001, p. 187).
Para ele, nos tempos atuais há um enfraquecimento e decomposição dos laços
humanos, das comunidades e das parcerias. Compromisso do tipo “até que a morte os separe”
36
se transformam em contratos do tipo “enquanto durar a satisfação”, temporais e transitórios
por definição, por projeto e por impacto pragmático – e assim passíveis de ruptura unilateral,
sempre que um dos parceiros perceba melhores oportunidades e maior valor fora da parceria
do que em tentar salvá-la a qualquer - incalculável – custo.
3.2 O mal-estar da Pós-Modernidade
Na obra “O mal-estar da pós-modernidade” o sociólogo Zygmunt Bauman também
levanta alguns pontos interessantes característicos dos tempos pós-modernos. Para ele, o
mundo construído de objetos duráveis foi substituído pelo de produtos disponíveis projetados
para a imediata obsolescência. “No mundo como esse, as identidades podem ser adotadas e
descartadas como uma troca de roupa.” (1998, p. 112).
O autor afirma ainda que no jogo da vida dos homens e mulheres pós-modernos, as
regras do jogo não param de mudar no curso da disputa e que uma das características mais
marcantes dos tempos atuais é
Não se prender a um lugar, por mais agradável que a escala presente possa
aparecer. Não se ligar a vida a uma vocação apenas. Não jurar coerência ou
lealdade a nada ou a ninguém. Não controlar o futuro, mas se recusar a
empenhá-lo: tomar cuidado para que as consequências do jogo não
sobrevivam ao próprio jogo e para renunciar à responsabilidade pelo que
produzam tais consequências. Proibir o passado de se relacionar com o
presente. Em suma, cortar o presente nas duas extremidades, separar o
presente da história (BAUMAN, 1998, p. 113)
Consequentemente, na visão do sociólogo, já não há “para frente” ou “para trás”; o
que conta é exatamente a habilidade de se mover e não ficar parado. O eixo da estratégia de
vida pós-moderna não é fazer a identidade deter-se, mas evitar que se fixe.
Segundo Zygmunt Bauman, a liberdade de escolha é na sociedade pós-moderna o mais
essencial entre os fatores de estratificação. “Quanto mais liberdade de escolha se tem mais
alta a posição alcançada na hierarquia social pós-moderna” (BAUMAN, 1998, p. 118).
Na obra em questão Bauman explica que o vanguardismo pós-moderno consiste não
exatamente em desafiar e em debilitar a forma existente e reconhecidamente transitória de
consenso, mas em solapar a própria possibilidade de qualquer acordo futuro, universal e,
desse modo, sufocante. E afirma:
A jovem ambição da filosofia moderna, de conquistar e seduzir mentes não
filosóficas com a própria racionalidade e extinguir completamente o tosco e
37
caprichoso senso comum deu lugar à triste e sensata reflexão a cerca da
surdez da mente comum, ou da consciência corrente, à voz da razão
filosófica universal e sua solida resistência a reforma. (BAUMAN, 1998)
4 O JORNALISMO NA ERA DAS NOVAS TECNOLOGIAS
O jornalismo, bem como os novos produtos culturais da mídia, parecem estar
acompanhando esse momento de intensa fragmentação, instabilidade e desenraizamento.
Seguindo o sucesso da internet, do instantâneo, do tempo real - sucesso principalmente entre o
público jovem - surgem jornais impressos que têm explorado ao máximo estas características
dos tempos pós-modernos onde o tempo é precioso e ninguém pode desperdiçá-lo. Dessa
forma, esses novos produtos que a mídia lança vêm carregados de traços contemporâneos,
como praticidade, rapidez e um não aprofundamento do conteúdo. Os textos pós-modernos
não necessitam de profundidade, são planos, superficiais, estão flutuando, sem substância e
significado, sem nexo com o passado.
Um exemplo desse novo produto cultural midiático, em parte resultado da crise
conceitual que o jornalismo vem experimentando, é o jornal impresso gratuito, feito para ser
lido em poucos minutos. Febre na Europa e nos Estados Unidos há quase uma década, no
Brasil constitui um fenômeno recente. Seu layout lembra muito uma home page; suas
chamadas de capa, parecem links; sem dúvida, um convite ao click. São diagramados no
formato berliner, fácil manuseio e distribuído gratuitamente nas estações de metrô, trem e
cruzamentos das principais ruas e avenidas de grandes cidades, como é o caso de São Paulo e
Rio de Janeiro.
Toda essa praticidade e rapidez em informar, importantes características dos novos
produtos culturais da mídia contemporânea, escondem um grande perigo: o de cairem num
jogo infinito de notícias supérfluas e sem significado. Podem se transformar num deserto e
unidimensional plano de notícias superficiais, sem referente, sem significado. Todo esse fluxo
e velocidade na veiculação de notícias aparentes podem provocar no leitor uma carência de
contextualizações, de elementos que permitam que o mesmo construa sua identidade e que
venha a ter um posicionamento mais crítico do mundo em que vive. Afinal, a mídia exerce
papel fundamental na reestruturação da identidade contemporânea e na conformação de
pensamentos e comportamentos, na medida em que oferece modelos de identificação no
mundo contemporâneo.
Á medida que tudo que é veiculado passa a ser vago, superficial demais, o indivíduo
pós-moderno sobreviverá em meio a esse paradoxo: por um lado, tem muita informação
38
circulando, há inclusive um excesso; por outro, nada tem consistência, é tudo descartável,
volátil demais. Onde e como esse indivíduo encontrará suporte para formar sua identidade e
se firmar como sujeito numa sociedade midiática onde reina a aparência e a superficialidade?
Onde o mais importante não é o ser, mas o parecer ser? Centremos nossa observação agora no
campo do jornalismo. Obrigado a lidar com a informação objetiva, o jornalismo quase sempre
se limita a ela.
(...) é falso dizer que o jornalismo deixa de contextualizar a informação,
como quem focaliza a árvore e perde a dimensão da floresta: a
contextualização está ali, alienada, reiterando o senso comum a partir das
interpretações prontas. Pensar contra os fatos significa preservar a relação do
jornalismo com o imediato, imprimindo-lhe o duplo movimento de abranger
a floresta a partir das árvores para revelá-las em sua conexão singular com o
universo a que elas pertencem. Noutras palavras, partir do fenômeno para
conectá-lo ao processo (MORETSZHON, 2007, p.288).
Parece que os processos atuais de produção de notícias afastaram-se definitivamente
da forma clássica de se fazer jornal. Antigamente o jornalismo era um tipo de ação política
visando alterar o quadro de forças sociais a partir do debate de ideologias e visões de mundo.
O jornalismo dos dias atuais não traz tanto o conflito, a discussão, o choque de ideias.
Diante da diluição, do enfraquecimento dos conteúdos no plano social, o jornalismo vem
investindo na indústria imaginária de notícias. Criam-se fatos, estimulam-se polêmicas,
constrói-se o conflito. Um exemplo recente foi o caso da menina Isabela, que mobilizou a
imprensa brasileira por quase dois meses. Revistas e jornais impressos, televisões, rádios e
internet não falavam em outra coisa; repetiram até a exaustão os detalhes do crime, como a
madrasta teria asfixiado a menina e pai jogado a garota pela janela do sexto andar do
apartamento onde a família morava, na cidade de São Paulo. É claro que essa foi uma história
trágica, não há o que discutir; mas daí, a mídia bombardear a população diariamente com os
detalhes desse crime, explorando ao máximo cada acontecimento, de olho na audiência, é
inadmissível. Quantas crianças morrem no país todos os dias vítimas de agressões familiares,
de pai, mãe, ou tio? O caso da menina Isabela é um exemplo clássico de como a mídia tem
deixado de ser meio de transmissão de fatos e torna-se ela mesma produtora de mundos.
Daí o jornalismo ter-se tornado uma prática monótona para os antigos
leitores, amantes do jornal engajado; mas uma atividade atraente para as
novas gerações vindas de um mundo depurado dos antigos vícios do
pensamento e ação social. Para estes, o jornal é o melhor espaço para a
publicidade de sua utopia individual, para ocupar o lugar de difusão e
prestígio ocupado outrora pelas ciências e teorias clássicas, tornando o jornal
um meio de “formação” por excelência, (MARCONDES FILHO, 1993,
p.65).
39
O que parece interessar mais a mídia no momento são os grandes acontecimentos, as
grandes catástrofes, o instantâneo, a velocidade, a audiência, o fim da relação em termos de
passado, presente e futuro. A prática do jornalismo neste século XXI tem sido marcada por
traços que diferem do contexto em que se fazia jornalismo em década passadas. Vivemos hoje
a revolução da comunicação e já não se pode mais se falar de comunicação sem mencionar
imediatamente a revolução em escala planetária da internet.
Ciro Marcondes Filho (1993), no livro Jornalismo fin de siècle sugere três aspectos
que ele considera fundamentais e que configuram a situação das sociedades permeadas por
estes sofisticados equipamentos de comunicação. São eles: “o processo universal de
desencanto”; “a crise dos metarrelatos” e “a pós-história”. Segundo o autor, o primeiro
aspecto é resultado de um conceito exposto por Max Weber, numa radical crítica ao
iluminismo e aos seus desdobramentos, especialmente em relação à técnica. Weber foi o
primeiro a chamar atenção para fato de que a razão, em seu limite, pode conduzir à irrazão e a
racionalidade pode conduzir o homem à própria escravização.
O segundo aspecto da nova era sugerido por Ciro Marcondes Filho (1993) é a crise
dos metarrelatos, o que para ele significa que todos os grandes discursos filosóficos,
ideológicos ou religiosos, que orientavam as razões e as práticas políticas, praticamente
desaparecem diante da preponderância da técnica. Estas visões de mundo que justificavam e
davam sentido às práticas políticas, à maneira de agir, ao fazer jornalístico dos homens e a sua
forma de atuação política. O autor afirma ainda que o fim das metanarrativas tem algo a ver
com a própria crise da narrativa. Filosofias, universos políticos, sistemas de pensamento
sempre se construíram na forma de relato. Havia uma moral implícita na narrativa, uma
transmissão de mundos. Havia o prestígio da vivência e da experiência deste saber: o que se
passava repercutia para a formação de novas consciências. “O que a era das novas tecnologias
provoca é a aposentadoria do velho saber, do saber narrar e do prazer de ouvir” (1993, p. 78).
O autor acrescenta ainda, numa crítica radical, que o fim dos metarrelatos é a instauração de
uma situação em que a racionalidade funcional das máquinas e seu uso programático são o
único que interessa. As coisas só existem para aquele fim imediato, descomprometido com
um antes e um depois. Emergem formas de fragmentação, pulverização, agregação aleatória
sem centro comum.
O terceiro aspecto apresentado por Marcondes Filho (1993) como símbolo da nova era
é o fenômeno apontado por Arnold Gehlen como Pós-história, ou seja, o ato de hoje vivermos
num momento em que já não se pode mais utilizar o conceito histórico, criado e desenvolvido
a partir do século XIX. Para o autor, demole-se o conceito de história, ao deixar de ter sentido
40
esta trajetória ascendente do agir social baseado no mito. Entraram em crise também os
conceitos de progresso e evolução e, em seu lugar, viabilizou-se como mais plausível a
existência de altos e baixos no imprevisível desdobrar-se da humanidade, convivendo a
barbárie sempre ao lado do progresso material.
Dentro do conceito de fim do significado da história, Ciro Filho chama atenção para
dois fatores que ele considera de fundamental importância: a crise da hermenêutica e o
alastramento de amplos sistemas de comunicação. “A hermenêutica entra em crise quando já
não se tem mais confiança nas interpretações. Essa prática que buscava encontrar o latente por
detrás do manifesto, o conteúdo escondido pela aparência, a verdade envolvida pelo manto
manipulador foi igualmente levada na enxurrada antiiluminista” (1993, p.89). O autor esquece
de citar a Semiótica, a ciência dos signos, que acredita na existência de uma essência
escondida pela aparência enganadora dos fatos.
Quanto à expansão dos meios de comunicação, contribuindo para multiplicar ao
infinito as versões sobre os fatos, as explicações decretam, de acordo com o autor, igualmente
o fim da unidirecionalidade histórica. Com eles e as milhares de pulverizadas versões, o
mundo enche-se de mil histórias, mil interpretações, conflitantes, contraditórias, díspares,
desconexas e não-lineares. “São todas ficções, tentativas vãs de explicar o caminhar sem
destino da civilização” (1993, p. 90). E como desdobramento do ruir da autoridade de um
saber histórico, há também o desaparecimento das sequências cronológicas de presente,
passado e futuro como algo dotado de sentido e de valor em si. A era da técnica é marcada por
um investimento pleno e total somente na presentificação. Concordo com o autor quando ele
diz que os meios de comunicação tornam tudo presentificado e a única experiência que parece
válida é exatamente a do aqui e agora. Está tudo muito desconexo, solto. Há um esvaziamento
da informação que, em sua grande maioria, é repassada como se não tivesse nenhuma
conexão com o passado e que não fosse influir diretamente no futuro.
4.1 O tempo real
A era da internet introduz critérios, formas e um arranjar de mundo bem diferente de
tempos atrás. Entre os componentes do mundo contemporâneo, convém destacar aqueles que
mais se sobressaem e que têm mais a ver com a transformação de nossa vida. A vida das
sociedades neste século XXI é marcada por um ritmo veloz nas relações sociais. As máquinas
funcionam com rapidez, giram freneticamente a produção, o consumo, a informação. O
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compasso da vida torna-se mais ligeiro; as tecnologias fornecem muito mais possibilidades de
ação, de trabalho, de formas de lazer e outras tantas atividades a um só tempo.
Essa multiplicação do que se pode fazer exige, de alguma maneira, que os homens se
dêem conta de todas essas possibilidades e em um tempo relativamente curto. Já que se tem
acesso a um número infinitamente grande de atividades e práticas e que equipamentos
tecnológicos que tornam tudo isso possível e viável, resta, pois, conseguir condensar essa
imensa oferta num tempo que cronologicamente era o mesmo, com a mesma marcação do
começo deste século e do século passado, mas que permite hoje muito mais ações. O resultado
é uma compressão do tempo. Tudo se torna radicalmente comprimido e isso exige que as
pessoas atuem mais rapidamente. Como consequência, tudo hoje se torna muito volátil,
descartável. Há uma troca rápida de várias coisas, desde objetos até relacionamentos sociais,
passando por empregos, atividades das mais diversas, viagens, posse de bens móveis e
imóveis. O resultado é também um tipo de experiência de vida marcada pela flutuação acima
dessas mesmas coisas, pelo viver caracterizado pelo estado de constante pulsação e
movimentação.
Outro campo que se alterou nessa nova era, ou nessa pós-modernidade, é o do saber e
do conhecimento, que tornou-se um saber voltado a fins práticos; um saber restrito e
particularizado, que se aplica às necessidades pontuais e específicas de uma sociedade
fragmentada, difusa e indeterminada.
O saber singular, dissociado dos metarrelatos, passa a legitimar-se apenas pelos
resultados lógicos, operacionais e funcionais, desaparecendo um tipo de ciência de caráter
universalizante que o sustentava. Isso vem na mesma direção de toda a crise do saber teórico e
da base intelectual que antes alicerçavam ciências, inclusive as físicas, biológicas e
matemáticas e, mais ainda, naturalmente, as humanísticas.
As ciências perderam status com a afirmação da dúvida teórica nas
explicações desenvolvidas neste século – relativização e implosão de
conceitos fixos e homogêneos, ascensão de explicações baseadas no
indeterminado, no imprevisível, no indefinível – e com todos esses
componentes de um novo saber que vai desde o universo sideral até a
engenharia genética e que está mais acoplado a uma nova realidade social
em que estas antigas e indiscutíveis verdades cederam terreno a explicações
validadas só de forma consensual, de melhor alcance e que envolvem o fator
aleatório e obscuro em seus mecanismos lógicos (MARCONDES FILHO,
1993, p. 95).
Entendemos que jornalismo é uma forma de conhecimento crítico que tem como
preocupação interpretar a realidade social. É resultado de uma atividade profissional de
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mediação, vinculada a uma organização que se dedica basicamente a interpretar a realidade
social e mediar os acontecimentos cotidianos com o público.
O fato é que, hoje, diante das novas tecnologias, temos novos desafios sobre os modos
de fazer jornalismo. Se as fronteiras entre o campo jornalístico e outras formas de expressão e
comunicação se estreitam, isso exige uma reflexão crítica e profunda sobre o jornalismo
contemporâneo, que assume um novo caráter numa sociedade que se torna, cada vez mais,
permeada por sofisticados sistemas de comunicação e tecnologias de informação. Hoje, em
tempos de internet, observa-se um novo fazer jornalístico, com destaque para a temporalidade,
o texto, a imagem, a prática jornalística, enfim, todo o processo de captação e produção da
notícia. Ou seja, o jornalismo deixa para trás antigos critérios, métodos e formas de se fazer
notícias e parte para um outro tipo de produção, mais coerente com este novo momento.
As redes telemáticas das últimas décadas do século XX inauguraram um
novo horizonte para a instantaneidade nas comunicações, pois, além de uma
comunicação instantânea, romperam com a linearidade de sequências ou
percursos na leitura e permitiram, com isso, criar uma interação continuada e
sincronizada (simultaneidade) entre uma multiplicidade de atores
fisicamente separados. Estes quatro aspectos conjugados (instantaneidade,
não-linearidade, simultaneidade e multiplicidade) colocam a experiência
social do tempo nas sociedades contemporâneas em uma dimensão
qualitativamente nova (o que leva a autores como Castells a denominá-la até
de “tempo intemporal” ). O termo “tempo real” surge não somente para
afirmar que ações e interações podem se realizar sem dispêndio de tempo,
mas para marcar que esta não é apenas uma conquista tecnológica, mas um
redefinidor de práticas sociais (FRANCISCATO, 2007, p. 48).
O século XX teve uma fascinação pela velocidade e aceleração e o final deste século
produziu um salto na estrutura tecnológica das sociedades em outra ordem, particularmente no
que se refere à transmissão de conteúdos: tanto as ondas eletromagnéticas quanto as redes
telemáticas ofereceram condições para tornar a experiência social da instantaneidade algo
comum, corriqueiro, introjetado na vivência cotidiana e institucional.
A noção de tempo real tem sido aplicada na mídia, de forma mais comum, para se
referir a dinâmica de produção de conteúdos em fluxo contínuo, particularmente no
movimento de alimentação constante de notícias e sua fragmentação pela programação diária,
tanto em rádio, televisão ou internet.
Para Marcondes Filho (1993), em termo de elaboração redatorial do que deve ser uma
matéria jornalística, trabalha-se na imprensa sob o ritmo da compressão. Deve-se suprimir
notícias longas e as matérias não devem ter muitos parágrafos. Assim elas devem pulverizar-
se em pequenos drops informativos que são fornecidos a conta-gotas nas páginas do jornal. E
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o autor continua afirmando que mesmo nas notícias mais longas, de meia página ou de página
inteira, apesar de darem a impressão de se tratar de um tratamento mais denso e mais amplo
do assunto são na verdade uma série de blocos que se simplesmente se agregam e que
constituem uma diversidade dentro dessa mesma matéria jornalística.
A sensação no final da leitura é de uma matéria que aspirou informar, mas
que manteve-se no plano das pinceladas gerais, de tal forma que o leitor,
sedento de notícias e conhecimento, o continuará sendo após essa leitura
(MARCONDES FILHO, 1993, p.97).
5 A FRAGMENTAÇÃO NA ATUALIDADE
A fragmentação está, cada vez mais, presente no texto jornalístico dessa nova era. Para
acompanhar a produção de notícias em tempo real, do qual falamos acima, o jornalista tem
que produzir seu texto sob um ritmo de atualização contínua, multiplicando a sua produção e
levando-o a fragmentar a notícia em diversos blocos.
Carlos Franciscato (2007, p. 47) acredita que a fragmentação do texto para dar fluxo a
uma produção contínua é uma estratégia que pode reforçar uma ideia de efemeridade do
conteúdo noticioso, já que cada pequeno corte no desenvolver do evento, ao ser relatado,
poderia desatualizar o anterior. Esta leitura repetida de um mesmo evento, apenas com a
inclusão de alguns fragmentos novos e diferenciados, poderia ser um dos causadores desta
sensação de desatualização iminente das notícias – ou uma afirmação de uma característica
maior de efemeridade ou volatilidade das notícias no ambiente midiático contemporâneo.
No que se refere ao tratamento estilístico do texto, observa-se uma redução vocabular,
com uma simplificação da linguagem jornalística, cada vez mais funcional e coloquial. O
jornalista não precisa mais ter um conhecimento apurado da língua, e sim, da tecnologia, pois
agora é o computador o encarregado de fazer as correções do texto. Sem falar da presença,
cada vez maior, de palavras inseridas no texto impresso típicas da linguagem on-line, tais
como: deletar, plugar, navegar, conectar.
Outra questão que cabe aqui ser levada em conta nos dias atuais é a supressão do
espaço físico das próprias redações dos jornais. O jornalista contemporâneo não precisa mais
ir à redação participar de reuniões de pauta ou para escrever suas matérias; ele faz seu texto
em casa e envia do seu computador ao jornal. Cada vez mais as pessoas de um modo geral,
não apenas os jornalistas trabalham de casa conectados ao mundo via internet; há uma
supressão dos contatos físicos pessoais, das trocas olho no olho, levando a um isolamento, a
44
uma individualização e uma consequente exacerbação do eu, típicos dos tempos
contemporâneos ou pós-modernos.
Com o surgimento da televisão, seu recurso de imagens que fala mais que textos, e
depois com a internet, com seus links, muitas imagens, textos fáceis de serem lidos e
absorvidos nas telas do computador, a imprensa teve de se adaptar com essa forte
concorrência. Para isso, o jornal impresso vem utilizando recursos imagéticos dos mais
variados para atrair a atenção do leitor. Diagramação ágil, rápida, ligeira da página tenta de
alguma forma, resgatar a atenção do leitor, viciado em decodificar muito mais imagens
visuais que verbais. E isso acaba viciando ainda mais, o já viciado público, que não tem mais
paciência, e muitas vezes falta-lhe mesmo competência para ler textos longos ou que
envolvam certa abstração.
E o jornal impresso, ao investir em muitas fotografias, cores e textos curtinhos, com
um layout que mais parece a tela de um computador, deixa de priorizar o conteúdo do texto e
supervalorizar a imagem, produzindo um esvaziamento, um rompimento do contrato de
leitura que antes constituía numa das principais características do texto jornalístico.
Para Ciro Marcondes (1993), a diagramação contemporânea no jornalismo,
introduzindo um componente dinâmico na leitura, dá à imprensa este caráter ligeiro e pulsante
da atualidade. Nas épocas precedentes, a imprensa mantinha um padrão visual e redacional,
uma austeridade enquanto veículo que, de forma nenhuma, assemelhava-se à imprensa que se
faz hoje.
Ao contrário, neste jogo com os componentes de uma página, em que tudo se
muda, tudo é provisório, tudo pode ser rapidamente transformável e
transformado, aquilo que marcava os antigos jornais de outras épocas, como
sendo seu traço distintivo – ou seja, o que identificava e separava o jornal
impresso dos outros meios de comunicação – já não se aplica mais à
atualidade (1993, p. 103).
Acreditamos que, o que tem acontecido nesse contexto das novas tecnologias, é uma
quebra de hierarquia da leitura como líder em credibilidade. Antes, um livro tinha toda uma
credibilidade, uma confiabilidade, o que estava ali publicado era coisa séria; hoje, nem tanto.
Com a revolução da rede mundial de computadores, encontramos textos, revistas, livros tudo
on-line. Claro que tem muito conteúdo pouco confiável; mas há muita coisa de qualidade, de
credibilidade. Outro fator importante é a leitura na tela do computador. Quem nunca ouviu a
seguinte frase: “gosto de ler no papel, pegando, tateando. Não consigo ler na tela do
computador; é desconfortável, dói a vista”. Quem diz isso, provavelmente não aprendeu a ler
no computador, mas teve de se adaptar a ele. Já para a geração internet, que desde muito cedo
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tem contato com a rede e com a máquina, ler na tela já é um hábito, já faz parte do seu dia-a-
dia. E esses jovens, na sua grande maioria, mal sabe manusear um texto impresso. Lê tudo no
computador, baixa os textos e livros pela internet.
Voltando aos jornais da atualidade, o que se observa muitas vezes é que há um
reducionismo dos grandes temas e assuntos mais aprofundados, enraizados, não-
fragmentados. E o que ocupa muitas vezes as páginas dos jornais é uma série de subprodutos
do jornalismo em que o banal, o supérfluo, o vazio, o fragmentado ocupam o espaço de “uma
suposta densidade desaparecida das páginas dos jornais” (MARCONDES FILHO, 1993,
p.107).
As redações dos jornais adotam, coerentemente com a alta velocidade de circulação de
informação em todo o sistema, profissionais em perfeita harmonia com a máquina, que a
domine e o mais importante, que trabalhe à velocidade do próprio sistema. Em outras
palavras, o bom jornalista hoje é aquele capaz de trabalhar contra o tempo, o mais rápido
possível produzindo textos mais fáceis para serem editados em blocos. E nesse novo modelo o
que parece importar mais é a eficiência em detrimento da qualidade redacional.
Por outro lado, a alta rotatividade dos jovens ingressantes na carreira jornalística nas
grandes empresas faz com que, permaneçam na redação somente aqueles que dão conta das
demandas de trabalho e que sejam adaptáveis a todas as exigências momentâneas da produção
de jornal. Como consequência desse novo modelo, o especialista em uma determinada área ou
tema específico está, cada vez mais, em extinção. Em seu lugar surgem os bons redatores,
habilidosos com as novas tecnologias, que atendem às exigências do tempo, e mais adaptáveis
a qualquer editoria.
É uma espécie de máquina trituradora de todas as indiossincrasias, tornando
os textos uma massa pastosa mais ou menos igual, tenham eles sido escritos
por quem quer que seja. É natural que nesse novo tipo de ralação de trabalho
nas empresas de jornal destaquem-se exatamente aqueles jovens jornalistas
que estejam identificados com esse novo padrão de qualidade. São os tipos
chamados de yuppie, profissionais que não têm nenhuma vinculação radical
ou expressiva com princípios e que descartam preocupações de natureza
ética ou moral. São funcionários facilmente adaptáveis a qualquer tipo de
ordens ou exigências jornalísticas da empresa. (...) Esses tipos, uma espécie
de novo homem da era tecnológica, é o homem das diversas máscaras, que
alterna-as de forma sequenciada, sem que haja subsistência de personalidade
por trás de qualquer uma delas (MARCONDES FILHO, 1993, p. 110).
E é por estar inserido no cotidiano e por legitimar-se socialmente através do ideal
iluminista de esclarecimento que o jornalismo se singulariza entre as demais atividades. Ao
46
fim de um longo percurso de avaliação e confrontação de linhas teóricas, analisando a dupla
crise que o jornalismo vive hoje – crise conceitual e crise econômica dos impressos - esta
pesquisa também pretende mostrar se os jornais gratuitos não só relatam fatos, como também
convidam seus leitores à reflexão, e ainda fornecem elementos para a formação de um novo
senso comum.
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CAPÍTULO III- A CRISE DO JORNALISMO CONTEMPORÂNEO E A
ERA DA PUBLICIDADE
1. A CRISE CONCEITUAL
A informação jornalística nasceu no bojo do processo de desenvolvimento das
relações mercantis, surgindo então o jornalismo como uma forma social de percepção e
apropriação da realidade.
Portanto, cada indivíduo, em alguma medida, precisa aproximar-se dessa
realidade através de uma relação tanto mediata como imediata. Sabemos que
o “imediato” que ele percebe pelos meios de comunicação não é, realmente,
algo dado imediatamente, mas uma realidade elaborada sistematicamente em
função de certas técnicas e segundo um ponto de vista ideológico. Trata-se,
portanto, do resultado do processo de apreensão e elaboração feito por
intermediários. Mas sabemos, do mesmo modo, que o “o imediato” que ele
vê com seus próprios olhos – quer dizer, que ele percebe com diretamente
pelos sentidos, - a rigor, tampouco é uma realidade sem mediações (GENRO
FILHO, 1996, p.10).
Desde o surgimento dos primeiros periódicos regulares, a atividade jornalística, a
despeito das suas profundas transformações técnicas e de natureza, continua a postular e a
propagar o seu compromisso ou com a verdade ou com o relato correto e preciso dos
acontecimentos.
A origem da associação entre o jornalismo e a veracidade encontra explicações distintas
conforme as perspectivas teóricas empregadas na sua análise. O vínculo entre o jornalismo e a
verdade tem resistido ao tempo, da mesma forma em que o elo entre o jornalismo e a
experiência cotidiana. Assim, têm permanecido comuns às concepções de que os jornalistas
são profissionais de meios de difusão coletiva, “(...) que participam da reunião, do
processamento, da revisão e do comentário das noticias e/ou entretenimento” (KUNCZIK,
2001, p.16). As notícias e os entretenimentos, por sua vez, se reportam às ocorrências do
cotidiano, vivenciadas em âmbito publico/coletivo ou privado/individual, desde que a
divulgação destas ocorrências sejam do interesse de uma determinada audiência.
Acreditamos e pretendemos demonstrar no decorrer desta pesquisa, que o jornalismo
vive uma crise funcional que ameaça a permanência desses vínculos que atravessaram
séculos. É uma crise que vem sendo anunciada há algum tempo, mediante as configurações
48
que o mercado lhe impôs ao longo do século XX, e que atingiu a culminância nos tempos
atuais face à consolidação da internet e a mudança comportamental do público em tempos
atuais.
Nesta perspectiva, o jornalismo teria hoje pouco a ver com sua natureza, com os
valores que lhe deram origem, aterrados à ideia da difusão veraz de uma dada realidade por
um determinado grupo social. As formas de comunicação da sociedade moderna tomaram o
lugar da narrativa clássica, dos metarrelatos e subverteram seu papel enquanto espaço de troca
de experiências cotidianas e de reflexão.
O jornalismo nasce também sob a necessidade da troca de informações precisas e
concretas, relativas ao mundo dos negócios. Mas a atividade viria passar por profundas e
sucessivas transformações de ordem técnica, organizacional e política, alterando as próprias
noções sobre o que seriam os acontecimentos noticiáveis, bem como os limites desta precisão.
É importante resgatar que entre os séculos XV e XVIII o jornalismo tinha como função
básica difundir informações indispensáveis ao florescimento das atividades comerciais e
econômicas. Novos conflitos foram vividos nos séculos seguintes, sob o impacto dos grandes
embates ideológicos, entre eles a dicotomia ainda presente entre a função de crítica e de
mobilização exercidas por um tipo de jornalismo definido como intelectual, e referenciado em
um determinado projeto de sociedade, e sua função ou motivação econômica de atender a
interesses imediatos do consumidor.
Hoje o que temos observado é que a atividade jornalística parece se adequar à mudança
comportamental dos novos tempos. Estamos na era do tempo real, da velocidade, da
fragmentação. E para acompanhar esse ritmo frenético o jornalismo vem deixando de lado
alguns dos seus pressupostos clássicos como o iluminista, de não só informar, mas formar, ou
seja, de oferecer elementos de reflexão ao público leitor para que ele possa ter um senso
crítico diante do mundo em que vive.
O jornalismo, portanto, terá de melhor se qualificar para fazer frente às exigências e
acompanhar o ritmo da história que é cada vez mais acelerado.
1.1 A rotina jornalística
Aqui reside um dos problemas centrais da crise conceitual que o jornalismo vem
enfrentando: o da naturalização das rotinas de produção, enxergar o mundo tal qual é,
“conformando uma determinada maneira de se fazer jornalismo que aparece como evidente e,
mais que isso, como a única possível” (MORETZSOHN, 2007, p. 238).
49
Assim, da mesma forma que em qualquer atividade profissional, o jornalismo tem o
seu cotidiano, a sua rotina, no qual é preciso internalizar determinados procedimentos, do
contrário o jornal não sai. No entanto, é na própria estrutura desse cotidiano que se poderá
buscar os elementos para a crítica da naturalização das rotinas, sobretudo pela promessa de
esclarecimento e verdade que define a atividade jornalística. “Trata-se do processo de
suspensão da cotidianidade, vital para que essa promessa se cumpra” (MORETZSOHN, 2007,
p. 238). Considerando que seu objeto são os fatos imediatos do cotidiano, seria possível
afirmar a particularidade do jornalismo como atividade marcada por um cotidiano exercício
de suspensão, no qual o jornalista precisa empregar toda a sua força para realizar sua tarefa.
Aqui se encontra o primeiro problema, pois o jornalista teria, no postulado
iluminista que o orienta, a própria origem do seu dilema: lidar com a
imediaticidade dos fatos com um distanciamento capaz de conferir-lhes
sentido, lidar com a vida cotidiana com a perspectiva de fornecer-lhe
elementos de crítica. Será viável, considerando as condições de produção,
especialmente agora, na era do tempo real? (MORETZSOHN, 2007, p. 238 e
239).
Uma retrospectiva histórica permitirá perceber que, desde que se configurou como
atividade industrial, o jornalismo vive sob uma permanente tensão: de um lado, a verdade, a
informação verdadeira, objetiva, confiável; do outro, a velocidade, a pressa em dar a notícia
em primeira mão e chegar antes da concorrência. E na lógica do capitalismo desorganizado,
da concorrência, o que acaba prevalecendo é a velocidade, a valorização da urgência na
transmissão de informações, alimentando o sistema de modo que se consome sobretudo
velocidade, e não notícias. O jornalismo praticado nas grandes corporações de mídia submete-
se a essa lógica, refletindo nas rotinas profissionais, afetadas pela própria reconfiguração do
mercado de trabalho no setor.
Nessa conjuntura, em que jornais e televisão acabam transformando-se em
parques temáticos, portanto, numa espécie de disneilândia do mundo
noticioso, não há diferença essencial entre assessor de imprensa – um
“logotécnico” ou um jornalista a serviço de uma organização empresarial, de
uma instituição pública ou de uma personalidade qualquer – e uma outra
qualificação quem se defina como “essencialmente jornalística”. São como
cara e coroa, faces externa e interna de uma mesma moeda (MUNIZ SODRÉ
apud MORETZSOHN, 2007, p. 240).
E com toda essa pressa, essa velocidade na transmissão de informações, as redações
enquanto espaço de reflexão vão desaparecendo e dando lugar apenas a ação, ao fazer. Como
consequência surge uma forma de pensar automatizado, perfeitamente adequado às rotinas de
50
produção. As notícias são apuradas de forma rápida, tudo é simplificado para alcançar mais
rapidamente um público cada vez maior, aumentando com isso a audiência e claro, os lucros.
2 ALTOS E BAIXOS: DA EUFORIA À CRISE FINANCEIRA DOS IMPRESSOS
Com a implantação do Plano Real, em 1994, e a consequente estabilização da moeda
com cotação igual ao dólar americano, na proporção de um para um, os grandes empresários
da mídia no Brasil viram na internet e na associação ao capital estrangeiro o caminho para a
modernização e ingresso com mais competitividade na etapa global do capitalismo.
A mesma euforia que levou à hipervalorização das empresas de alta
tecnologia no mercado norte-americano atingiu os empresários brasileiros do
setor das comunicações com as perspectivas de crescimento da economia, da
sua desregulamentação e abertura ao capital internacional, e de integração
tecnológica. A privatização das telecomunicações, pré-requisito para a
convergência, representava a possibilidade de expansão dos negócios
(FONSECA, 2008, p. 199).
Animados com o crescimento econômico e com a estabilidade da moeda, as empresas
brasileiras de mídia, sem capital próprio, contraíram empréstimos em dólar com o objetivo de
diversificar os negócios e de aumentar a capacidade de produção. Esse otimismo atingiu o
mercado da mídia impressa. O cenário era de câmbio estável, crédito estrangeiro farto,
crescimento do mercado publicitário e aumento na circulação de jornais e revistas.
A circulação média de jornais saíra de 4,3 milhões em 1990 para 6,6 milhões
de exemplares em 1995, o que correspondia a 53,5% de aumento em apenas
cinco anos. Depois de uma pequena redução em 1996, quando caiu para 6,5
milhões, a circulação continuou crescendo, até atingir o pico de 7,9 milhões
de exemplares/dia em 2000. Contribuiu para esse crescimento o lançamento
de novos jornais e revistas, particularmente os títulos populares (FONSECA,
2008, p.199).
No início de 1999 uma mudança no regime cambial (aumento do dólar americano) foi
fundamental para desencadear uma crise nas grandes empresas de mídia brasileira,
provocando aumento da dívida e agravando a situação financeira dos conglomerados
nacionais. Segundo Fonseca (2008), no Grupo Folha de São Paulo a dívida era da ordem de
R$ 290 milhões e se referia a investimentos para lançar os jornais Agora e Valor Econômico,
o provedor UOL e para instalar o parque gráfico Plural; no grupo O Estado de São Paulo, de
R$ 384 milhões, grande parte atribuída aos investimentos em telefonia. O Grupo Estado
51
renegociou sua dívida no final de 2003, numa complexa operação, que implicou inclusive o
afastamento de membros da família Mesquita de cargos executivos da empresa.
O fato é que com crises financeiras recorrentes, agravadas com a recente recessão
econômica mundial, as empresas do setor de jornais impressos têm encontrado dificuldades
para se manter. O modelo de negócios dos jornais diários impressos é baseado na receita com
vendas - assinaturas e banca- e com publicidade - anúncios e classificados-. Em média, a
publicidade gera em torno de 85% da receita de um jornal no Brasil, sendo os 15% restantes
correspondentes às assinaturas e vendas em bancas (RIBEIRO, 2001).
Hoje a crise financeira dos jornais impressos pode ser caracterizada por três principais
fatores que atuam concomitantemente e que afetam o modelo de negócios dos jornais
(SANT‟ANNA, 2008): redução de penetração dos jornais na sociedade (queda de circulação e
do número de leitores); queda de participação dos jornais no total do dispêndio publicitário;
crescimento da internet como um meio de comunicação concorrente ao jornal impresso.
A queda de penetração dos jornais, um dos principais fatores da crise do jornalismo
impresso, é percebida há algum tempo por estudiosos de vários países que atentam para a
redução das vendas. Sant‟anna (2008) acredita que, em média, os jornais estão sofrendo uma
redução de circulação de 2% a 4% ao ano em todo o mundo.
No Brasil, a análise da circulação de exemplares no país mostra uma redução de cerca
de 11% no número absoluto diário, que passou de 3,5 milhões de exemplares por dia, em
1995, para 3,09 milhões de exemplares por dia, em 2005 (SANT‟ANNA, 2008). Ainda de
acordo com o autor, após um aumento da circulação observado em 1998 e 2000, o número de
exemplares diários volta cair e, nos últimos cinco anos, entre 2000 a 2005, a redução para
cada mil habitantes foi mais acentuada e atinge 32%.
Apesar da queda significativa da circulação, e consequentemente, das vendas de
exemplares, é preciso lembrar que, pelo modelo de negócios dos jornais impressos, a principal
fonte de receita dos jornais continua sendo a publicidade. Existe uma relação direta entre
queda de circulação e redução de publicidade, já que o mercado anunciante tende a procurar
os veículos que, cada vez mais, atingem um número maior de pessoas.
2.1 Redução de publicidade
A redução na participação do jornal impresso no total de dispêndios publicitários
também é um fenômeno que pode ser percebido mundialmente e no Brasil, onde o segmento
impresso tem sofrido uma gradativa redução na participação nas receitas dos meios de
52
comunicação com publicidade (MídiaDados, 2006). O relatório mostra que a participação dos
principais meios de comunicação no total de gastos publicitários, como o rádio e as revistas,
manteve-se relativamente estável ao longo do período analisado. Os jornais impressos
sofreram uma redução significativa de participação na receita publicitária, passando de 28%,
em 1995, para 16%, em 2005. Essa queda esteve associada ao crescimento da participação da
TV aberta, de cerca de 5%, e de outras mídias, de cerca de 8%, quando se comparam os anos
de 1995 e 2005.
No entanto, aqui no Brasil, a publicidade dos jornais não migrou para a internet -
mídia tida como concorrente ao segmento impresso. A fatia de participação da internet nos
dispêndios de publicidade no Brasil é pequena e só aparece a partir de 2004, com 1,7% do
total investido em publicidade nos anos de 2004 e 2005. No ano seguinte, 2006, a participação
da internet no dispêndio publicitário chega a 2%, de acordo com uma reportagem veiculada
no jornal O Estado de São Paulo (SANT‟ANNA, 2008). O jornal O Estado de São Paulo
sofreu uma redução do número de anunciantes de aproximadamente 10% em cinco anos,
passando de 3.611, em 2000, para 3.262, em 2005. Os dados, no entanto, não são conclusivos
para afirmar a perda de mercado anunciante, já que valor da publicidade e a receita gerada
pelo mercado anunciante dos jornais não foram disponibilizados pelo Grupo Estado.
A partir dos dados, parece que o jornalismo impresso está perdendo espaço justamente
nos seus dois pilares de sustentação: a receita por vendas (e assinaturas), pois se observa uma
queda de penetração, e a receita por anunciantes, pois a participação do segmento impresso no
volume total dos dispêndios publicitários também está se reduzindo.
Os dados indicam que não só menos pessoas estão lendo jornais, como
também o fazem por menos tempo – tanto no Brasil como em muitos países
desenvolvidos. A queda de circulação, do número de leitores e do tempo de
leitura dos jornais coincide com o período de acirramento da concorrência de
outros meios de informação, como a internet, as TVs por assinatura, as
emissoras de rádio noticiosas e até mesmo as revistas semanais informativas.
Todos esses meios disputam com os jornais não só a atenção da audiência,
mas também as verbas publicitárias – ambos, recursos finitos. O faturamento
bruto somado de todos os jornais brasileiros caiu entre 2000 e 2003. De 2003
para 2004, ele aumentou, mas aumentou menos do que para as emissoras de
TV, os sites na internet e as emissoras de rádio. Só as revistas tiveram
desempenho pior que os jornais (SANT‟ANNA, 2008, p. 18).
As dificuldades financeiras enfrentadas pelas empresas que editam os grandes jornais
têm ocasionado cortes de investimentos, demissões nas redações, diminuições de gastos com
53
viagens e outras despesas vinculadas à realização de reportagens, além de adiar projetos de
lançamentos de novos produtos, cadernos e suplementos.
Segundo Sant‟anna (2008), a diminuição do investimento na qualidade dos jornais se
deu quando os leitores demonstravam nas pesquisas qualitativas realizadas pelos próprios
jornais, insatisfação com os seus produtos. Atraídos pelas informações em tempo real na
internet e no rádio, pelos programas noticiosos e documentários nas TVs a cabo, pela
sofisticação dos produtos gráficos e dos textos nas revistas semanais, e com um tempo
dedicado à leitura diária cada vez menor, os leitores têm demonstrado interesse decrescente
pelos jornais tradicionais.
Para as novas gerações, que experimentam na infância os recursos do videogame, do
computador e da própria internet, o jornal impresso pode revelar-se um meio sem graça e
desinteressante. E para audiências que demandam a informação em tempo real, o jornal pode
parecer desatualizado.
3 REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES: AUDIÊNCIA E PUBLICIDADE
O crescimento da internet também pode ser considerado um fator de crise do
jornalismo impresso. A rede mundial de computadores pode não ter criado a crise do
jornalismo impresso, mas acelerou uma crise já existente e que pode se intensificar, já que a
mídia eletrônica, apesar de ainda não ter se configurado como um meio de comunicação capaz
de atrair montantes significativos de publicidade, tem potencial de se tornar alvo do mercado
publicitário, pois oferece vantagens ao anunciante, como novas formas de anúncios
(interativos, por exemplo) e a facilidade do receptor encontrar a propaganda/ informação
quando desejar.
Com o desenvolvimento da tecnologia, o aumento da capacidade da rede e a formação
de competências - principalmente os profissionais que surgiram com a internet, como os
webdesigners - a publicidade na internet ganha nova dimensão e possibilidades.
No Brasil, a audiência da internet tem aumentado (MídiaDados, 2006), ainda que seja
desigualmente distribuída entre regiões. Considerando que os anunciantes costumam seguir o
caminho dos consumidores, é possível estabelecer uma relação direta entre audiência
(penetração) e publicidade. Quando a audiência dos jornais cai, a quantidade de anúncios
também tende a cair, relação já abordada anteriormente. E, se a internet continuar atraindo
cada vez mais usuários, é possível esperar uma movimentação da receita publicitária para a
mídia online.
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A internet não se configura como um novo paradigma tecnológico, para o qual a mídia
impressa irá migrar, mas trata-se de uma nova plataforma eletrônica a ser explorada também
pelas empresas de comunicação impressa. Tanto na esfera do negócio quanto na do
jornalismo, as tecnologias digitais de difusão da informação abrem novas possibilidades para
os jornais, seja no sentido da sua convergência para outros meios, seja na incorporação dessas
ferramentas para a confecção e comercialização do produto jornal, isoladamente.
Como afirma Moraes (2002), não se trata da extinção do jornalismo impresso ou de
sua marginalização no sentido de assumir papel irrelevante na formação de opinião: “As
sociedades valem-se de distintas tecnologias ao mesmo tempo. Uma forma de comunicação
existente ou emergente não subsiste sem a outra; a tendência é a convergência de processos e
práticas” (Moraes, 2002, p.113).
3.1 Estratégias para fugir da crise financeira
O surgimento da internet como uma nova mídia no Brasil, na década de 1990, foi
concomitante com um bom momento para as empresas de comunicação, na esteira do bom
desempenho da economia nos primeiros anos após o Plano Real. Nesse período, há uma
espécie de reaquecimento da indústria cultural estagnada há anos, como o cinema nacional, e
a entrada de novos meios de comunicação no país, como a TV por assinatura, no início da
década de 1990.
Nesse contexto, as empresas de comunicação impressa passam a definir estratégias
visando aumentar a penetração dos jornais e o dispêndio em publicidade e, paralelamente,
explorar a plataforma eletrônica com a expectativa de crescimento do número de sites e de
internautas.
Segundo Caparelli e Lima (2004), para aumentar a circulação dos jornais, uma das
principais estratégias adotadas foi os chamados anabolizantes - fascículos que acompanham
periodicamente o jornal, como enciclopédias e livros. A estratégia trouxe, em curto prazo,
resultados satisfatórios para jornais como a Folha de São Paulo, que observou um crescimento
de 50% nas vendas em banca em 1995 por causa dos anabolizantes. Mas não foi sustentável;
não houve aumento do bolo publicitário e as pessoas atraídas pelas promoções não se
tornaram leitores depois.
Ainda de acordo com os autores, a partir de 1998, os grupos jornalísticos passaram a
apostar no investimento nos jornais populares como uma nova estratégia para sustentação do
jornalismo impresso, visando aumentar a circulação total de veículos e, consequentemente,
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atrair anúncios, estratégia que pode ser observada, no mesmo período, nos Estados Unidos e
na Europa. Os empresários de comunicação da época acreditavam no aumento do poder de
compra do brasileiro de segmentos sociais de menor renda, possibilitada pelos resultados do
Plano Real, e na atração de novos anunciantes aos grupos de comunicação.
Ainda em 1998, os dispêndios publicitários nos meios de comunicação começaram a
cair e os grupos de comunicação impressa do segmento de jornal passaram a se concentrar no
objetivo de atrair anunciantes e alguns jornais chegavam a oferecer descontos no valor
anúncio e vantagens, como inserção dos anúncios aos domingos - dia de maior tiragem dos
jornais diários (MídiaDados, 2002, p.262).
Mas as estratégias pontuais dos grupos de comunicação na segunda metade da década
de 1990 e início da década de 2000 não foram suficientes para segurar os mercados
publicitários e leitor no segmento de jornalismo impresso. Paralelamente, a internet veio criar,
com vantagens, substitutos aos serviços de utilidade pública prestados antigamente pelos
jornais impressos diários, como a publicação de informações sobre dados econômicos; clima e
temperatura; condição diária de estradas; programações culturais regionais; resultados de
exames, concursos públicos e loterias; entre outras informações.
A interatividade na internet possibilita uma troca sem precedentes entre as redações e
os leitores, que podem contribuir com pautas, informações e feedback sobre o produto do
trabalho jornalístico. Igualmente, no campo comercial, os anunciantes passam,
potencialmente, a ter, por meio dessa interatividade, uma gama espetacular de informações
sobre o seu público-alvo, e também feedback sobre suas campanhas publicitárias, permitindo
uma contínua atualização de suas estratégias, de acordo com as reações desse público.
Do ponto de vista dos custos, a eventual migração do suporte de papel para
a internet retiraria um enorme fardo dos ombros das empresas de
comunicação. Os gastos com impressão e distribuição dos jornais
correspondem, em média, a um terço dos seus custos. A outra ponta, a da
receita, é obviamente uma incógnita. Os meios de informação da internet
ainda estão aprendendo a ganhar dinheiro com suas operações, assim como o
mercado publicitário ainda está experimentando com esses novos meios,
embora a cada ano a internet atraia mais e mais recursos da mídia”
(SANT‟ANNA, 2008, p. 24).
A utilização, na internet, do conteúdo produzido pelas redações dos jornais impressos
já é uma realidade, e as empresas devem readequar-se a ela, na sua busca de um reequilíbrio
entre despesas e receitas.
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4. MURDOCH: OTIMISMO DIANTE DA CRISE
Em meio à crise dos impressos – acelerada com a crise econômica global-, a declínio
na circulação, queda no volume de anúncios e cortes de postos de trabalho nos principais
jornais dos EUA e da Europa, uma voz se ergue contra as previsões catastróficas que veem o
jornal com os dias contados: a do magnata das comunicações Rupert Murdoch, acionista
majoritário e executivo-chefe da News Corporation, um dos maiores conglomerados de mídia
do mundo.
Em uma matéria publicada em dezembro de 2008, o jornal Folha de São Paulo
destacou o tom otimista de Murdoch numa palestra proferida pelo mesmo para uma série da
rádio australiana ABC, chamada „Uma Era Dourada para a Liberdade‟, onde o empresário
disse enxergar a nova era tecnológica como uma oportunidade, e não uma ameaça, para os
jornais tradicionais.
“É verdade que nas próximas décadas as versões impressas de alguns jornais vão
perder circulação. Mas, se os jornais derem aos leitores informações confiáveis, veremos
ganhos na circulação”, apostou Murdoch.
Segundo a Folha, para o empresário, os leitores atuais querem a mesma coisa que os
leitores do passado: uma fonte na qual podem confiar. “Foi sempre esse o papel dos grandes
jornais no passado. E esse papel fará os jornais serem grandes no futuro”.
Esse otimismo do empresário destoa do cenário nebuloso que enfrenta hoje a mídia
impressa nos países desenvolvidos. De acordo com a Folha, a circulação dos jornais nos EUA
sofre uma queda acelerada - entre abril e setembro de 2008, recuou 4,6% em relação aos seis
meses anteriores.
Além de perderem circulação, os jornais assistem à fuga dos anunciantes. Em 2007, a
receita publicitária das versões impressas dos jornais americanos recuou 9,4%. A queda da
circulação e a perda de anunciantes acarretam corte de pessoal para tentar equilibrar os custos
- o que acaba tornando mais difícil para os jornais manter a qualidade do produto.
Tudo isso já vinha ocorrendo antes mesmo do acirramento, nos últimos meses, da crise
econômica global. Com ele, a situação tende a se deteriorar, e a primeira demonstração disso
foi o pedido de concordata feito pelo grupo Tribune, que edita dois dos maiores jornais dos
EUA, o Chicago Tribune e o Los Angeles Times.
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Murdoch vem sendo menos afetado pela crise. O seu Wall Street Journal tem a
segunda maior tiragem nos EUA, e, ao contrário dos concorrentes, não sofreu queda na
circulação nos últimos meses. O Times de Londres, cujas vendas vinham caindo, inverteu o
sentido com o abandono de seu formato tradicional e a opção por um tamanho menor. O
jornal está mais compacto, com layout bem leve, vendido a um preço menor e parece que tem
agradado os seus 26 milhões de leitores. Será esse o caminho de todos os grandes jornais
impressos? Reduzidos em tamanho e conteúdo, custando bem menos ao leitor ou mesmo
distribuídos gratuitamente?
5. DUPLA CRISE: CAMPO FÉRTIL PARA O SURGIMENTO DE NOVOS
JORNAIS?
Muito tem se falado que o jornalismo está em crise, que precisa ser reinventado
adequando-se à mudança comportamental do público, que o profissional jornalista está
ficando sem função, já que a chamada comunicação cidadã está em voga e, portanto, qualquer
indivíduo, sem necessariamente ter diploma de jornalista pode relatar um fato, descrevê-lo e
publicá-lo em vários suportes, em especial na internet. Junta-se a isso a crise financeira vivida
pelos jornais impressos há algum tempo e que vem sendo agravada pela crise econômica
mundial que começou nos países desenvolvidos mas hoje já é sentida com força total também
aqui no Brasil. Além disso, podemos citar ainda a sociedade atual, que vem sofrendo
constantes mutações; uma sociedade marcada pela efemeridade, pela rapidez, pela fluidez,
sem tempo a perder, que se informa principalmente pela internet – portanto não tem interesse
pelas grandes narrativas ou grandes relatos, e sim, por notícias curtas, resumidas estilo drops.
Acreditamos ser este o campo fértil para o surgimento de novos produtos midiáticos
de grande aceitação – diga-se de passagem – que nessa pesquisa chamo de jornais gratuitos ou
jornais “cor-de-rosa”. Sua origem lembra remotamente os jornais populares, principalmente
se comparado a acessibilidade por parte do grande público e também pela fácil leitura. Mas os
gratuitos têm perfil próprio, bem urbano, e trazem consigo marcas da atualidade como a
velocidade e o imediatismo. Diferente dos populares. Apesar de serem gratuitos7 – essa
também é uma das suas principais características – têm como público alvo os jovens (até 35
7 Sobre a gratuidade Ramonet (2005, pp. 247- 248) diz que “a informação, essencialmente, tende a ser cada dia
mais gratuita. As grandes firmas midiáticas presenteiam informação. Se pensarmos sobre a informação que
consumimos, veremos que recebemos a maior parte dela gratuitamente, ou aparentemente gratuitamente. (....)
Porquê? Porque quem paga a informação na realidade é a publicidade. (...) Hoje uma empresa midiática vende
consumidores a seus anunciantes”.
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anos) pertencentes às classes A e B. São estruturados com poucas páginas, textos simples,
tamanho reduzido, tudo programado para ser absorvido em poucos minutos. Por serem
gratuitos, são bancados pela publicidade, possuem grandes anunciantes e já estão dividindo a
fatia do mercado publicitário com os veículos da mídia tradicional.
E é seguindo uma tendência verificada em vários países do primeiro mundo, que
temos observado, nos últimos anos, na cidade de São Paulo, o surgimento desse tipo de jornal.
Eles têm formato berliner, no máximo 16 páginas, distribuídos de segunda a sexta, nas
estações de metrô, trem, pontos de ônibus, colégios, faculdades, porta de shoppings e nos
semáforos localizados nos cruzamentos das principais ruas e avenidas da cidade. Como
exemplo, os jornais Destak e o Metro, que começaram a circular em março de 2006 e em
maio de 2007, respectivamente.
Esses jornais, com design compacto, textos curtos, bem coloridos, são feitos para
serem lidos em torno de 20 minutos, geralmente no trajeto de uma estação a outra de metrô,
ou no percurso de casa ao trabalho ou vice-versa.
Nesse tipo de veículo, são abordados, de forma quase sempre superficial (para que a
leitura seja a mais fácil e rápida possível), temas como política, mundo, economia, esportes,
cultura e lazer. A velocidade na transmissão da informação, o imediatismo são os pontos-
chave desse tipo de produto da mídia.
O fato é que o jornal gratuito, ou essa nova forma de se fazer jornalismo, pode ser
considerado reflexo de toda essa transformação da civilização desde o surgimento da
informatização. O processo digital, de tempo real, de comunicações online estabeleceu novos
parâmetros sociais. Agora temos que revitalizar alguns valores do jornalismo que estão sendo
soterrados com toda essa inquietude da nova era. Tais valores como o trabalho atento,
cuidadoso, criterioso, priorizando o conteúdo, e questões éticas estão sendo esquecidos com
toda essa pressa dos dias de hoje. Observa-se uma compressão do texto jornalístico clássico e
mesmo a sua substituição por textos curtos, reducionistas e minimalistas.“A comunicação antes
servia para transmitir mensagens, o importante era o relato. Hoje em dia, divulgar tornou-se o objetivo
em si e o conteúdo só tem, no final das contas, um interesse secundário” (AUBENAS;BENASAYAG
apud MARCONDES FILHO, 2000, p.38).
E essa substituição do texto jornalístico clássico por notícias curtas no estilo drops é
bem operada pelos jornais gratuitos. Esses veículos privilegiam a notícia curta, com no
máximo três parágrafos, e o processo da produção de notícias dá mais espaço aos drops
informativos e com muitas imagens.
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Pode-se dizer que os gratuitos pegaram carona nessa onda on-line, do tempo real, da
pressa, onde ninguém tem tempo a perder com grandes relatos e o visual exerce grande
influência. Será que essa tem sido a receita de sucesso desse novo produto da mídia? Não
podemos esquecer que esses jornais são gratuitos, o leitor não paga nada por eles. Isso
também é um fator que conta muito para explicar a grande aceitação desse novo modelo.
Afinal de contas, quem não quer receber logo pela manhã, nos pontos de ônibus, de metrô, ou
nos semáforos um jornal com as principais notícias do dia e ainda sem pagar nada por isso?
Quem paga essa conta é a publicidade, as grandes empresas anunciantes que bancam
esse luxo gratuito. O que elas ganham em troca? Consumidores, passivos, diga-se de
passagem. Pois devemos lembrar que os leitores recebem esses jornais em momento de total
passividade, geralmente no trajeto de casa ao trabalho, quase sempre presos nos
congestionamentos das grandes cidades onde essa mídia é distribuída, como é o caso da
cidade de São Paulo.
E essa forte presença/dependência desses jornais em relação à publicidade tem
suscitado algumas discussões sobre a verdadeira natureza/intenção dos jornais gratuitos.
Seriam esses veículos panfletos publicitários mascarados de jornais (portanto visando a cima
de tudo o lucro) ou seriam mesmo jornais como qualquer outro que precisam da publicidade
para sobreviver, mas que o verdadeiro objetivo é informar o leitor, fazendo a notícia circular?
Discutiremos mais sobre isso no próximo tópico.
6. JORNALISMO OU PUBLICIDADE? EIS A QUESTÃO.
À medida que a imprensa se desenvolveu, balizada segundo os padrões do modelo
capitalista, foi ficando cada vez mais nítida a presença da publicidade no meio jornalístico
representando os interesses privados de um ou mesmo de vários grupos. Habermas define
muito bem esse momento no seu texto “Mudança de função política na esfera pública”, onde
ele diz “à medida que a esfera pública é, porém, tomada pela publicidade comercial, pessoas
privadas passam imediatamente a atuar enquanto proprietários privados sobre pessoas
privadas enquanto público” (HABERMAS, 1984).
A presença de anúncios comerciais no jornalismo vem desde os primórdios. Na fase
artesanal do jornal já havia a presença de anúncios de serviços e vendas de produtos. Mas hoje
o que se observa é que a publicidade está cada vez mais forte e presente nos mais variados
meios de comunicação. Publicidade essa que tem seu desenvolvimento atrelado ao
60
desenvolvimento do capitalismo como modo de produção e, claro, do desenvolvimento dos
meios de comunicação.
A inundação da esfera pública por publicações jornalístico-publicitárias não
se explica a partir da liberalização das trocas de mercado, embora a
propaganda comercial ao velho estilo tenha surgido mais ou menos à mesma
época. Os esforços incomparavelmente maiores de um marketing conduzido
cientificamente só se tornaram necessários à proporção das restrições
oligopólicas do mercado. Na grande empresa industrial acaba ocorrendo um
conflito entre o ponto ótimo técnico e o financeiro, o que reforça a tendência
para a assim chamada concorrência monopolista. (...) Publicidade comercial
é um fenômeno que só aparece com o capitalismo avançado; ela só alcança
um volume digno de menção com o processo de concentração do capitalismo
industrial na segunda metade do século XIX. (HABERMAS, 1984, pp. 221,
- 223).
Até o final do século XVIII, no início da sua história, a imprensa era organizada como
empresa artesanal, voltada para a divulgação de notícias referentes ao pequeno comércio
local. Já no início do século XIX, ela deixa sua fase artesanal e torna-se, digamos, mais
profissional no que se refere aos negócios.
O estabelecimento do estado burguês de direito e a legalização de uma esfera
pública, na Inglaterra, na França e nos Estados Unidos, fizeram com que a
imprensa começasse a abandonar suas características “politizadoras” para se
voltar, cada vez mais, para os negócios. Os jornais passaram a publicar
anúncios, que, com o tempo, tornaram-se a parte mais importante de suas
receitas (ARBEX, 2001, p.58).
O desenvolvimento das novas técnicas de comunicação possibilitou um novo fazer
jornalístico, caracterizado por novas formas de produzir e tornar públicas notícias,
possibilitando o surgimento das primeiras grandes empresas da imprensa.
(...) os pequenos jornais locais tornavam-se dependentes dos jornais urbanos
das circunvizinhanças e passam a ser incorporados a estes como redações
municipais ou redações afiliadas. Quanto mais rapidamente um jornal era
impresso, e quanto maior o seu alcance, maior a sua importância para os
interesses econômicos privados que o sustentavam, assim como o seu papel
de “pórtico de entrada” para dar visibilidade social às empresas anunciantes
(ARBEX, 2001, p.58).
Dessa forma, quanto mais a mídia investia em tecnologia, se modernizava, mais
tornava-se dependente das empresas anunciantes.
61
(...) a imprensa, que até então fora instituição de pessoas privadas enquanto
público, se torna instituição de determinados membros do público enquanto
pessoas privadas . (...) O jornal assume um caráter de empreendimento que
produz espaço para anúncios como uma mercadoria que se torna vendável
através da parte reservada à redação. (...) A história dos grandes jornais na
segunda metade do século XIX demonstra que a própria imprensa se torna
manipulável à medida que ela se comercializa (HABERMAS, 1984, pp. 216
- 217).
As novas tecnologias na transmissão de notícias, especialmente na década de 1980,
proporcionaram o crescimento das comunicações em escala global, com a multiplicação do
número de emissoras, satélites e recepção de imagens. E o grande volume de capital
empregado na aquisição e desenvolvimento dessas tecnologias levou ao surgimento dos
grandes conglomerados de comunicação.
(...) os maiores órgãos de imprensa são empresas enormes que integram
conglomerados ainda maiores. São estreitamente integrados com o nexo
Estado-privado que domina a vida econômica e política. Como outras
empresas, vendem um produto a um mercado. Seu mercado é composto por
outras empresas (anunciantes). O “produto” que vendem é a audiência; no
caso da mídia de elite, que estabelece a agenda para as outras, são audiências
privilegiadas. (...) O esquema geral consiste em incentivar o debate, mas
dentro de um quadro estreito de pressupostos que constituem uma espécie de
doutrina oficial (Noam Chomsky apud ARBEX 2001, pp. 59 - 60).
E a luta travada entre interesses privados, que através dos meios de comunicação,
assume uma aparência pública, passa a ser regulada pelas regras do mercado.
(...) na medida em que elas passam a se comercializar e a se concentrar no
aspecto econômico, técnico e organizatório, elas se cristalizam nos últimos
cem anos, em complexos com grande poder social, de tal modo que
exatamente a sua permanência em mãos privadas é que ameaçou por várias
vezes as funções críticas do jornalismo. (HABERMAS, 1984, p. 220 -
221).
O que observamos hoje em dia é uma invasão da publicidade nos jornais e esses, cada
vez mais dependentes do capital trazido pela mesma, acabam submetendo-se as exigências e
regras ditadas pelo mercado, colocando em risco a visão e o papel críticos do jornalismo. E, se
no início, a publicidade tinha como meta única e exclusivamente a venda de produtos, hoje,
além disso, ela estabelece principalmente modelos a serem seguidos, padrões,
comportamentos e reforça valores ideológicos.
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Sem dúvida, trata-se de uma situação bem mais complexa, onde é empregada uma
avançada tecnologia junto ao público, que é preparado, dia após dia, para novos padrões
culturais estabelecidos pela mídia.
E para acompanhar a constante evolução dos meios de comunicação, nessa chamada
era da informação, em meio à crise econômica mundial o jornalismo impresso contemporâneo
vem passando por inúmeras modificações, adaptando-se as novas condições, aos novos
contextos e novos estilos de vida. E nessa pressa, nesse corre-corre, nessa realidade onde
tempo é dinheiro, e a velocidade dita as regras na transmissão de notícias, nesse mundo
dominado pela web, o jornal impresso também vem ficando com a cara dos novos tempos. É
nesse contexto que surgem os jornais impressos gratuitos.
Estes veículos se aproximam da modalidade denominada pelo brasileiro
Juarez Bahia, ainda em 1990, de jornal dirigido. Tal como os jornais de
bairro, que existem desde o século XIX, com periodicidade semanal (em
geral aos domingos) e de distribuição gratuita, o jornal dirigido, também
grátis, não tem delimitação geográfica, ou seja, não cobre nem comunidades
nem questões específicas, como problemas de iluminação pública e falta de
postos de saúde ou de escolas. Têm âmbito mais amplo. Outra diferença está
na publicidade. Enquanto o jornal de bairro atrai pequenos e médios
comerciantes, o dirigido, como a grande imprensa, tenta seduzir grandes
anunciantes (GOMES; TARGINO, 2008, p. 76).
Por sua vez, tal como o dirigido, é distribuído gratuitamente, graças à publicidade
como citamos no tópico anterior. De antemão já sabemos que a publicidade é muito
importante para este jornal, afinal, ela o banca.
Porém, nem tudo são flores. Os responsáveis por esses jornais gratuitos não podem
esquecer que apesar de dependerem da publicidade, de grandes anunciantes, esses veículos
são antes de tudo jornais (pelos menos estão assim registrados), e que têm um compromisso
com o público leitor.
6.1 20% de publicidade e 80% de conteúdo jornalístico. Será?
No dia 26 de outubro de 2007 foi publicada uma matéria no site “Meio é a mensagem”
bem interessante intitulada “Prefeitura de SP pretende limitar jornais gratuitos”. A matéria
tratava de um artigo incluído em uma lei que diz que para serem distribuídos nas ruas,
veículos deverão ter, no mínimo, 80% de conteúdo jornalístico. A matéria informava ainda
que os jornais gratuitos distribuídos na cidade de São Paulo poderão ter seus espaços
publicitários limitados em até 20% em relação ao seu conteúdo. A restrição foi incluída na lei
63
nº 14.517, promulgada pelo prefeito Gilberto Kassab e publicada no dia 17 de outubro de
2007, no Diário Oficial do Município. A medida foi incluída na norma que institui o
Programa Municipal de Parcerias Público-Privadas, cujo artigo 26 aborda a proibição de
folhetos, panfletos e qualquer outro material impresso que contenha publicidade de serem
distribuídos em vias públicas. No inciso II deste artigo está estipulado: "Excetua-se da
vedação estabelecida no 'caput' deste artigo a distribuição gratuita de jornais e publicações
contendo, no mínimo, 80% de matéria jornalística, nos termos a serem definidos em
regulamentação própria". De acordo com a assessoria da Prefeitura, a intenção da
administração municipal é 'disciplinar a atividade' e que esse trecho da lei ainda precisa ser
regulamentado. O texto trazia ainda a informação de que os jornais de distribuição gratuita
Destak e Metro foram procurados para comentar o caso mas ambos afirmaram “que não têm
nada a declarar no momento”.
E a partir dessa questão, fica aberta a pergunta: afinal, esses jornais têm 80% de
conteúdo jornalístico e 20% de publicidade ou será que é justamente o contrário, 80% de
publicidade e 20% de conteúdo jornalístico? Ou será que tudo isso não passam de questões
levantadas por jornais pagos, da mídia tradicional, que estão incomodados com a concorrência
dos títulos gratuitos?
Pois, ao que parece, pelos menos na realidade de São Paulo, é que os jornais da mídia
tradicional vêem os gratuitos como ameaça capaz de reduzir seus anunciantes e, com isso,
diminuir os recursos advindos da Publicidade que são extremamente importantes às finanças
de qualquer veículo de comunicação na atualidade, principalmente em momento de crise. Pelo
fato do modelo de jornal gratuito ser recente no Brasil, jornais consagrados da mídia
tradicional, tais como Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo, parecem não ver ainda
uma relação direta entre os veículos gratuitos e a diminuição do número de assinantes ou de
venda nas bancas. Pode ser que com o advento da mídia gratuita isso venha a acontecer.
Será triste se constatarmos que a disputa entre veículos tradicionais pagos e os jornais
gratuitos, não seja motivada por disponibilizar ao cidadão informação de cunho crítico, que
possibilite ao leitor uma visão crítica do mundo em que vive; mas sim, pelo fator comercial,
visando obter mais lucros e amenizar a crise financeira/empresarial vivida por grande parte
dos impressos.
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7. DO JORNAL POPULAR AO JORNAL GRATUITO: FORMAS DE NARRAR
Vivemos uma época de múltiplas formas de linguagens ligadas às novas conjunturas
das sociedades que, como os meios de comunicação, também estão em constante mutação.
Por essa perspectiva, novas narrativas e novos discursos estão sempre se construindo e se
reconfigurando.
Em meio às novas práticas culturais, tecnológicas, econômicas e sociais da nova era, o
fazer jornalístico vem procurando se adequar a essas novas narrativas, adaptando sua
linguagem, criando outros produtos e formatos. Falamos de uma dupla crise que o jornalismo
vem enfrentando: a crise conceitual/paradigmática e a crise financeira empresarial dos jornais
impressos. Nesta perspectiva, o jornalismo vem se reinventando, ficando com a cara dos
novos tempos.
Observa-se que os jornais impressos vêm se reformulando, criando uma modalidade
com elementos gráficos e textuais que proporcionam uma leitura mais rápida, ágil, com
conteúdo compacto e instantâneo. Alguns jornais populares também vêm ganhando essa nova
roupagem e atendendo essa mudança comportamental de um público ávido por informação
rápida e de preferência gratuita. Também tem outro lado: versões reduzidas e com muitos
anúncios também custam menos às empresas jornalísticas. É nesse contexto que surgem os
jornais gratuitos, uma tentativa do jornalismo impresso se reinventar, interagir mais com seus
leitores e ainda fugir da crise financeira no meio impresso agravada ainda mais pela recessão
econômica mundial.
Para entender a dinâmica do jornal gratuito, essa nova forma de narrar, esse novo fazer
jornalístico dos novos tempos é preciso também entender como se processa a comunicação
nesse tempo do imediato, do volátil, do furtivo e entender a lógica da notícia, e o que ela
representa.
A internet, com sua velocidade e seu padrão de conteúdos perecíveis, é a base desses
novos modelos de informar, cuja velocidade, o instante, o tempo real são as características
mais marcantes.
(...) A informação se acelerou até alcançar o limite absoluto de aceleração. A
que velocidade circula a informação hoje? Á velocidade da luz, ou seja, 300
mil quilômetros por segundo. Passamos de um mundo do jornalismo para
um mundo do imediatismo, do instantaneísmo, não há tempo para estudar a
informação. A informação é feita cada vez mais de impressões, de sensações
(MORAES, 2005, p.247).
65
Dessa maneira, a forma de narrar do jornalismo gratuito constitui-se principalmente de
linguagens vindas do mundo on-line, seus textos curtos, suas chamadas, seu layout. Ao se
deparar com a capa de um título gratuito o leitor tem a sensação de estar diante da tela de um
computador. Seus pequenos textos, em cores vivas, são um convite ao click. Mas o modelo
gratuito também interage com o que se encontra nos diversos meios, sejam eles impressos,
on-line ou televisivos.
Partindo do princípio de que as notícias são como narrativas ou histórias marcadas
pela cultura da sociedade em que estão inseridas, podemos concluir que as notícias e a forma
veloz com que são veiculadas nesse novo produto da mídia impressa são o reflexo dos novos
tempos, ou seja, refletem os anseios de uma sociedade que tem pressa, fragmentada e
imediatista.
8 JORNALISMO E PUBLICIDADE: DOIS LADOS DA MESMA MOEDA
Ao longo do século XX os estudos e as pesquisas indicam que a crescente influência e
a grande conquista do espaço da publicidade sobre o jornalismo podem estabelecer a
transformação radical da linguagem jornalística deste início de século, solidificando de uma
vez por todas o que Marshall (2003) chama de jornalismo cor-de-rosa.
O processo de mutação jornalística iniciado ainda na modernidade reúne em uma
mesma estrutura, antes em lados opostos, as principais linguagens da mídia de massa. Hoje o
jornalismo e a publicidade representam duas faces da mesma moeda. A lógica publicitária
penetra e materializa-se no espaço do jornalismo a partir da nova era mediante diversas
estratégias.
Um dos objetivos agora é esconder a natureza persuasiva da publicidade, ou seja, fazer
com que ela pareça notícia jornalística e não anúncio.
É um exercício de inocula o interesse privado no espaço publico da imprensa
e investi de legitimidade o gene clandestino da lógica publicitária. Pode-se
identificar tal jornalismo como um jornalismo transgênico, pois cruza os
cromossomos da informação aos cromossomos da publicidade e reforma a
roupagem das informações, notícias, colunas, notas, manchetes, pautas, dos
olhos, das linhas de apoio, dos editoriais, das suítes, das retrancas, etc,
alterando na essência a retórica do jornalismo. Mexe e altera, inclusive, a
linha editorial dos veículos e afeta a mentalidade dos produtores da
informação. (MARSHALL, 2003, p. 120)
66
Informação e publicidade passam enfim a se fundir em um mesmo produto midiático.
Surge então uma notícia híbrida, transgênica que põe um fim no muro que dividia o campo do
jornalismo e da publicidade. Como resultado surge um produto híbrido voltado
essencialmente ao mercado. O Metro, objeto de estudo deste trabalho, pode ser um bom
exemplo desse processo de mutação.
9 A SOCIEDADE DE CONSUMO
A publicidade comercial assumiu um papel central no mundo capitalista a partir da
segunda metade do século XX. Ela passou a modelar as relações sociais, políticas e
econômicas e transformou para sempre o universo da sociedade, da comunicação e da cultura.
Hoje, podemos afirmar que a publicidade transformou-se em um dos pilares da sociedade
capitalista de massa.
Cada vez mais os empresários, políticos, artistas, governos e governantes têm
recorrido às estratégias de marketing dos publicitários. Todos antes de qualquer importante
decisão recorrem aos ensinamentos, sabedoria e experiência desses profissionais que hoje são
importantes guias da vida atual.
Hoje a publicidade está em toda parte, em todos os lugares e presente no dia-a-dia de
cada um de nós. Muitas vezes nem percebemos, mas somos bombardeados a cada minuto por
um apelo sedutor da linguagem publicitária, que, financiada por poderosos grupos
empresariais,
(....) cobre atualmente cada esquina de rua, as praças históricas, os jardins
públicos, os pontos de ônibus, o metrô, os aeroportos, as estações de trem, os
jornais, os cafés, as farmácias, as tabacarias, os isqueiros, os cartões
magnéticos de telefone. Interrompe os filmes na televisão, invade o rádio, as
revistas, as praias, os esportes, as roupas, acha-se impressa até nas solas dos
sapatos, ocupa todo o universo, todo o planeta. (TOSCANI, 1996, p. 22)
O fato é que, na sociedade do consumo, é quase impossível hoje que uma pessoa faça
algo, ou simplesmente viva, sem dar de cara com os apelos encantadores da maior arte da
sedução: a publicidade. “A galáxia de signos, ícones, logomarcas, arquétipos, bottons,
designs, jingles, layouts, logotipos, spots, teasers, displays, folders, tié-in, vinhetas, slogans,
praticamente reveste o universo midiático como uma segunda pele” (MARSHALL, 2003,
p.94).
Nos dias atuais, quem mora em qualquer grande cidade – não precisa nem ser tão
grande assim - com certeza, vive em meio a um verdadeiro bombardeio cultural, com
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mensagens de todas as formas e conteúdos procurando persuadir e convencer os cidadãos e,
mesmo sem querer, dificilmente, alguém consegue viver alheio a esse tiroteio de tentações.
(...) a publicidade tornou-se assim a seiva da sociedade, por onde passam,
giram e confluem todos os movimentos sociais. Trata-se não somente do
universo físico presente no dia-a-dia de cada pessoa, mas também na imensa
estrutura invisível e imaterial que se acomoda na mente de consumidores de
maneira inconsciente. Cria-se, dessa forma, uma atmosfera publicitária que
orbita dentro e fora dos indivíduos e influencia as mentalidades e o próprio
devir da sociedade. (MARSHALL, 2003, p. 95)
Como forma de convencer indivíduos a comprar mercadorias, a publicidade
acompanha naturalmente toda a história da humanidade. Existem registros que mostram que
desde a era medieval o homem já tinha o dom para comercializar a vida em sociedade. Mas
foi no século XX que a publicidade começou a trilhar a sua trajetória imperialista e passou,
progressivamente, a guiar o imaginário coletivo. Cada novo empreendimento capitalista, cada
novo produto industrializado, cada nova tecnologia ajudou a fortalecer e firmar a publicidade
no seio da sociedade.
A publicidade vem se transformando hoje na arte universal da persuasão, empregada
para tornar mais dinâmico e prático um mercado de bens materiais e simbólicos e, sobretudo,
sustentar a hegemonia da classe dominante e perpetuar o sistema capitalista como modo de
produção.
É por isso que não podemos falar em publicidade sem falar no sistema capitalista, pois
os dois cresceram e se desenvolveram juntos no século XX. A aceleração do processo de
expansão e da publicidade está intimamente ligada à conquista de cada novo mercado, à
aceleração do capitalismo e das relações econômicas na vida em sociedade durante o século
XX.
A dimensão alcançada pela hegemonia da publicidade e pelos publicitários
sobre a sociedade capitalista pode indicar, no alvorecer do terceiro milênio, o
nascimento de uma verdadeira civilização publicitária, eletrificada por um
universo de imagens, símbolos, mitos e slogans. Esta “publisfera” torna-se,
além da engrenagem e da lógica de funcionalidade do sistema, o próprio
oxigênio da nova civilização. A sagração desse modelo de civilização deve-
se, em parte, à emergência da sociedade da imagem, com o advento dos
meios de comunicação eletrônicos a partir do início do século xx e à alforria
incondicional do livre mercado, pelo processo totalizante do chamado
neoliberalismo. Tais fatos contribuíram, no limiar do terceiro milênio, para a
constituição da sociedade do consumo. (MARSHALL, 2003, p. 98)
O desenvolvimento industrial, comercial, tecnológico e de serviços, experimentado,
sobretudo, pelo mundo ocidental a partir do século XVIII, graças a Revolução Industrial,
68
cimentou os alicerces para a constituição de uma sociedade voltada para o consumo de bens
materiais ou simbólicos no século XX. Com a produção e a oferta generalizadas de produtos
eletrodomésticos, maquinarias, alimentos descartáveis, automóveis, têxteis, telefones,
aparelhos portáteis, computadores etc., além do progressivo aumento do capital circulante a
sociedade passa então a viver segundo os moldes do consumo.
Segundo Jean Baudrillard (1997, p. 63), a era contemporânea caracteriza-se como uma
fase marcada totalmente pelo simulacro, que rompe os limites da farsa e falsificação. Para ele,
“a humanidade estaria mergulhada em uma grande e turva névoa de imagens. As coisas
passam a valer pela sua representação e não mais pela sua significação e o marketing
teatraliza os significados e isso é o que basta na lógica do novo cidadão consumidor”.
10 O MERCADO DA PUBLICIDADE
Com certeza a publicidade foi determinante para o conceito de mercado empregado
hoje em escala global. Para Ignácio Ramonet (1998, p.66), “as leis do mercado tomam hoje o
lugar das leis da mecânica (que rege a vida dos astros, do cosmos e da natureza), ou da
historia, como explicação geral do movimento das sociedades”. Em outras palavras, Ramonet
diz que hoje tudo acabara sendo regulado segundo os critérios de “Sua majestade, O
Mercado”.
A publicidade e a propaganda, na visão de Ciro Marcondes Filho, “tomam posse” do
corpo e da mente do homem pós-moderno. Este vira, sem consciência um mero suporte para
apelos publicitários objetivos ou subliminares.
(...) A insignificância do homem torna-se hoje ainda mais flagrante a mero
suporte de discursos publicitários e de consumo. Nunca tanto como agora
seres humanos tornaram-se espaços publicitariamente controláveis, mídias
como dizem os publicitários. A miséria a tal nulificação da espécie que os
signos, as marcas de nomes da indústria, os logotipos passam a ocupar o
lugar de importância principal, reduzindo pessoas ao status de seus
carregadores. (MARCONDES FILHO, 1993, p. 52)
O autor afirma ainda que o macrodiscurso da publicidade torna-se o verbo uníssono,
construtor e racionalizador de linguagem, culturas e consciências, que tudo universaliza, tudo
aspira e tudo liquidifica. E a publicidade vira então um único elo de igualdade entre todas as
diferenças.
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Alem disso, é importante destacar que, nos primórdios da imprensa jornalística, não
havia ainda uma distinção clara sobre os limites do que era publicidade e do que era
jornalismo, vigorando assim certa ambiguidade.
Segundo Jürgen Habermas (1984, p. 223) esse quadro de quase onipresença da
publicidade foi um processo lento e desafiador e durante várias décadas do século XVIII,
inclusive já no século XIX, “existia, nas mais distintas casas comerciais, uma repulsa
inclusive contra simples anúncios comerciais. Os reclames eram considerados indecentes”.
Foi no século XX que as propagandas pagas avançaram rapidamente sobre os veículos
de comunicação e passaram a ocupar um espaço bem maior nas páginas dos jornais e das
revistas. Hoje é quase impossível imaginar um jornal ou mesmo qualquer outro veículo da
mídia sem publicidade. O financiamento dos custos empresariais de produção de notícias e/ou
de entretenimento, por intermédio de verbas dos anunciantes, já faz parte da dinâmica e da
lógica da sociedade midiática do século XX.
E ao contrário do que muita gente pensa, a publicidade nem sempre é vista como uma
coisa negativa nas páginas dos jornais e revistas. Há muitas pessoas que compram jornais,
revistas, assistem televisão, ouvem rádio e gostam tanto das noticias quanto dos anúncios.
Outras, ao ter acesso aos produtos midiáticos, querem primeiramente é consumir as
publicidades.
Mas a questão central na relação entre a publicidade e a imprensa diz respeito a
relação econômica que se estabelece quando esses dois campos se unem. Partindo do
princípio de que a publicidade é quem financia os jornais, a imprensa periódica precisa ser
contextualizada como uma extensão da publicidade. Consequentemente os jornais só existem
porque tem a publicidade, as verbas dos anunciantes. Dessa forma, o jornalismo para
sobreviver tem de seguir os princípios e direcionamentos ditados pelo mercado, ou seja, os
anunciantes.
Os produtos jornalísticos contemporâneos devem estar adequados para satisfazer aos
gostos e às opiniões do poder econômico e também dos leitores. Dessa forma, o jornal da
atualidade surge como um produto antes de tudo comercial. “Por isso, os jornais
contemporâneos são tão perfumados, lipoaspirados, maquiados, embelezados. Eles são
produtos que precisam estar adaptados para o consumo” (MARSHALL,2003, p.111).
Diz-se que os jornais são vendidos duas vezes: primeiro para a publicidade e só depois
para o leitor. Partindo desse principio, é necessário então admitir que as empresas anunciantes
são forças econômicas decisivas na determinação da natureza, da qualidade e do conteúdo do
produto jornalístico.
70
E um dos primeiros sintomas que denunciam a expansão da lógica publicitária nos
jornais foi a crescente conquista do espaço que os anúncios passaram a ocupar a partir do
século XX. Uma evolução ascendente que nunca parou de crescer, devido à própria
descoberta da publicidade como principal fonte financiadora do universo jornalístico.
A publicidade saiu de uma discreta participação nos primórdios da imprensa
financiada pelos anunciantes, até conquistar hoje espaço igual ou maior que o ocupado pelo
jornalismo. Muitas vezes constata-se que os anúncios chegam a ocupar espaço maior que o
dedicado às noticias dos jornais.
Foi essa constatação que levou o pesquisador Leandro Marshall a afirmar que
O comportamento crescentemente expansionista da lógica do capitalismo e
do livre mercado, encarnado na publicidade, tem atuado em nossa época
como rolo compressor sobre o mundo simbólico. Apologia do lucro e
mercadorização do conhecimento e da informação, transformada em deuses
da era pós-moderna, contaminam o universo da cultura. A ética do capital
assedia, seduz, constrange, coage os territórios dos signos, estabelecendo
uma dinâmica de homogeneização e submissão. (...) Nessa perspectiva, a
publicidade não aceita mais apenas fazer vizinhança com o jornalismo,
portadora do interesses do capital, a publicidade pressiona o jornalismo a
operar na mesma lógica. A publicidade acossa o jornalismo, submete-o às
mesmas regras e valores do capital, obrigando-o a relativizar seu
compromisso com a verdade e interesse publico. (...) Num primeiro
momento, o jornal vira mercadoria, que submete seu valor de uso ao valor de
troca. No segundo momento, a noticia vira mercadoria, que fala que a
audiência quer ouvir. E no momento final, a própria informação vira
mercadoria, flexibilizando o conceito de verdade e carregando os objetivos
vitaminados do mercado. (MARSHALL, 2003, p. 115)
71
CAPÍTULO IV – OS GRATUITOS
1. O MUNDO DOS JORNAIS GRATUITOS
Como resultado dos estudos e pesquisas que apontam novos rumos e mostram o
jornalismo em mutação, numa luta contínua para sobreviver ao lado das novas mídias que
conquistam o grande público, o jornalismo contemporâneo, mundial e brasileiro, vivencia um
momento de variadas opções. Um webjornalismo, presente em sites, portais, blogs, fotoblogs
e marcado pela hipertextualidade, interatividade, convergência de mídias e personalização,
convive com grandes impérios jornalísticos. É o caso das Organizações Globo, no Brasil, cujo
alcance se constata pela presença da Rede Globo nos 27 estados brasileiros; do Grupo
Bandeirantes de Comunicação, entre outros. Paralelamente, Europa, EUA e mesmo o Brasil
investem em jornais impressos gratuitos, cujo alvo inclui um público mais jovem, de médio
poder econômico e cujo conteúdo, às vezes, é extraído do material veiculado por outros meios
de comunicação do mesmo grupo empresarial ou das agências de notícias. O Grupo
Bandeirantes, por exemplo, está editando no Brasil, o jornal Metro, gratuito, com circulação
na cidade de São Paulo e recentemente (desde outubro de 2009) na região do ABC (Estado de
São Paulo); em dezembro passado foram lançados ainda o Metro Santos (SP) e o Metro Rio
(RJ). O referido jornal existe em 17 países e possui mais de 20 milhões de leitores.
É o Metro que circula na cidade de São Paulo que analisaremos nesse segundo
momento desta pesquisa. Ele é distribuído gratuitamente, graças à publicidade. Ele também
extrapola a área geográfica do bairro e a especificidade temática, ao contrário do jornalismo
especializado, que aprofunda os temas, para maior aproximação com o leitor/especialista. No
jornal gratuito, a segmentação se dá a partir das características do leitor e dos possíveis
anunciantes e não da temática abordada, o que não dispensa os editores de conhecer as
demandas do público-alvo, para adequar o conteúdo, em termos de linguagem, recursos
gráficos, tópicos de maior interesse etc.
Os jornais gratuitos são publicações com diagramação leve e colorida que priorizam as
notícias locais, mesmo após romperem as fronteiras de bairros definidos. Os textos são
curtíssimos, a fim de serem lidos com rapidez, durante o deslocamento casa/trabalho ou vice-
versa. Às vezes, a própria titulação já faz referência ao tempo de trajeto ou ao meio de
transporte. É o caso do Metro, do jornal francês 20 Minutos e do jornal carioca Meia Hora.
72
O Metro no Brasil, criado há três anos, e presente em mais de 80 cidades pelo mundo
possui formato berliner (meio-termo entre o tamanho convencional (standard, 38 x 58 cm) e o
tablóide (jornal standard dobrado ao meio). O standard parece ultrapassado diante da
dificuldade de manuseio, embora muitos jornais persistam com este formato, principalmente
os da mídia tradicional.
Para Alberto Dines (1986, p. 101), o tablóide é conciso em demasia. Portanto,
apropriado só para títulos semanais ou provinciais, vez que nos jornais de grande porte, um
número maior de “(...)páginas de pequenas dimensões, oferece um ritmo intermitente à
leitura, distribuição irregular de material, além de outros desconfortos”. O berliner parece
opção mais fácil de manusear e de carregar, além de mais sedutora para os leitores, sobretudo
os jovens, acostumados ao variado mundo da internet. Por outro lado, representa estratégia de
sobrevivência empresarial, por ser mais atraente para os anunciantes, propiciando condições
para concretização do mundo encantado ou publicitário dos jornais gratuitos. A própria
redução de tamanho propicia custo mais baixo, gerando a possibilidade de outros títulos
adotarem o berliner.
No entanto, o formato berliner também possui pontos negativos. Dines, em relação às
discussões acerca da crise mundial do papel, alerta para os perigos da compactação feita à
foice.
(...) Os jornais são submetidos à mutilação de suas páginas, de seus
cadernos, de seus atrativos e até de suas equipes, quando uma atitude
inovadora pressupõe inventiva e imaginação. (...) O seu instrumento é o buril
do escultor, de onde se origina o verbo burilar, aprimorar. O jornal compacto
não é um jornal apertado, mas aperfeiçoado sob novas concepções.
(DINES, 1986, p. 99)
Isto corresponde a afirmar que reduzir os corpos das letras e os títulos, ou suprimir ou
apertar fotos nem sempre é a solução. Esta deve consistir em encontrar o formato ideal para o
público-leitor, sem prejuízo do conteúdo e das condições favoráveis à leitura.
O Metro é um legítimo representante do jornalismo gratuito em todos os países que
circula. Ele não se destina apenas aos segmentos populacionais formado por jovens, e, sim, a
toda uma população que utiliza o sistema de transporte público, e também aqueles que ficam
presos nos congestionamentos das grandes cidades dentro dos seus automóveis. Ele está por
toda parte, sempre à disposição do cidadão leitor. Apresenta novo modelo de diário,
idealizado, de acordo com palavras do seu próprio site, para uma “(...) população urbana em
contínuo movimento e interessada no que ocorre no mundo”.
73
Porém, a inovação não pode se restringir à distribuição, e sim, enfocar um novo fazer
jornalístico. A distinção mais expressiva entre as duas categorias – jornais pagos e jornais
gratuitos – deve ir além da incidência maior da publicidade, para contemplar e privilegiar o
lado mais humano dos acontecimentos, extrapolando notícias supérfluas e sem consistência. O
destaque deve ser para o conteúdo, estilo e linguagem mais próximos dos leitores jovens, que
não têm muito espaço na imprensa convencional. Em termos organizacionais e
administrativos, embora o conceito original de indústria cultural no que tem de mais negativo,
qual seja, a conversão da cultura em mercadoria e a subordinação da consciência à
racionalização capitalista, excluísse empresas de comunicação, o uso que fazemos dos mass
media os transformou em instrumentos dessa indústria.
A máquina da indústria cultural, ao preferir a eficácia dos seus produtos,
determina o consumo e exclui tudo o que é novo, tudo o que se configura
como risco inútil. É a proliferação de poderosos grupos de comunicação que
conferem, cada vez mais, poder às tecnologias de (re) produção e difusão
dos bens culturais, encaixando-as na estratégia de utilizar a capacidade de
produção de bens e serviços de acordo com o princípio do consumo estético
massificado. (WOLF, 1995, p.76)
O Metro faz parte do Metro International S.A., poderoso grupo midiático com atuação
em 17 países: Canadá, EUA, México, China, Coréia do Sul, Dinamarca, Finlândia, França,
Grécia, Holanda, Hungria, Irlanda, Itália, Polônia, Portugal, República Checa, Rússia, Suécia
e Croácia. No Brasil, o jornal Metro é uma joint venture do Grupo Bandeirantes de
Comunicação e da Metro Internacional. É editado e distribuído por SP Publimetro S/A, com
uma tiragem diária de 150 mil exemplares (exceto às sextas que circula com 300 mil
exemplares), de segunda à sexta na cidade de São Paulo. Excepcionalmente circula uma
edição extra, geralmente em datas comemorativas, como no Dias das Mães, por exemplo.
O Metro, jornal analisado nessa pesquisa, possui versão on-line, graças ao avanço e às
modalidades do webjornalismo (RÊGO, 2007), recorre ao formato berliner, confirmando as
vantagens destacadas por Soares (2006), resumidas no refrão: “encolher para crescer”. Uma
das principais características do Metro está no layout, nas fotografias coloridas, no destaque
dado ao fotojornalismo, na publicidade desde a primeira página - há por toda parte -, na
linguagem oriunda da web e no destaque dado à editoria Diversão.
Por outro lado, o jornalismo precisa dar voz ao grande público, dentro da
premissa Vox populi, vox Dei (A voz do povo é a voz de Deus), o exercício
de isegoria no diário Metro corresponde a ações de interatividade variadas,
tanto nas edições em papel como on-line. Inclui divulgação de cartas, de
74
correios eletrônicos, atendimento a telefonemas, eventuais artigos assinados
e outros recursos, incluindo enquetes sobre temas variados e polêmicos,
como imigração, automedicação, legalização das drogas, casamento entre
pessoas do mesmo sexo, violência urbana e / ou doméstica etc. (TARGINO,
v.31, n.1, pp.51-78, jan./jun. 2008)
O Metro está em 19 idiomas. No expediente do dia 06 de novembro de 2008, se
apresenta como “(...) periódico global de maior alcance mundial em termos de leitores. Mais
de 20 milhões de pessoas leem o diário em algumas das suas 69 edições (...)”. São dados
animadores para os que preveem o fim do jornal impresso, além da prática cada vez mais
estimulada para que o leitor, ao descer do trem ou metrô, deixar o jornal em cima do assento
para quem vem, o que estimula ainda mais a leitura dos jornais. Se cada exemplar é lido, em
média, por três pessoas, e o jornal é sempre direcionado para leitores específicos,
(...) é possível que tais leitores tenham encontrado (...) algo muito seu e muito
próprio. Quanto mais massificadas forem a sociedade e a informação, mais o
ser humano procurará formas “exclusivas” de informação e os meios
eletrônicos, pela própria natureza da recepção, são coletivos. O jornal
consegue atender a cada leitor que o manuseia e, na medida em que o
satisfaz, torna-se sua propriedade. (DINES, 1986, p.77)
A Associação Mundial de Jornais percebe os suplementos editoriais como guetos e
defende títulos “generalistas”, capazes de atrair o público-leitor. Segundo Soares (2006), essa
entidade lançou, em 2006, cartilha elaborada pela consultoria de mídia Innovation, contendo
50 estratégias que aconselham os editores a mudar a estratégia de marketing para incentivar o
consumo desde cedo, assimilando-o como costume. Não é preciso encará-los como “(...)
segmento a ser explorado na forma de suplementos editoriais. Isto criaria guetos na
publicação e acabaria marginalizando o público-alvo. O desafio é explicar ao jovem como os
fatos noticiados podem influenciar sua vida”. (SOARES, 2006, p. 92).
Por outro lado, a aceitação do diário Metro contraria a visível tendência da mídia à
fragmentação: cada vez mais, editorias, cadernos e suplementos, com periodicidade definida
ou não, tratam de itens específicos, como automóveis, informática, turismo, adolescentes e
outros segmentos temáticos.
No entanto, a circulação expressiva do Metro pode se justificar por razões bem
particulares, com destaque para a facilidade de acesso e a gratuidade. A fuga contra o tempo
de permanência dentro dos trens e/ou metrôs, quase sempre longo, além dos grandes
congestionamentos, também podem agir como fatores intervenientes.
75
Além de tudo isto, o apego aos impressos pode ser indício da resistência de indivíduos
e até jornalistas diante das perspectivas futuristas do jornalismo, à semelhança do jornalista
brasileiro, com atuação no mercado paulista, José Nêumanne Pinto. Indagado sobre os rumos
do jornalismo, em nível mundial, confessa seu espanto ante a permanência da imprensa
escrita, afirmando que consiste em “milagre diário”. E diz:
(...) sempre me pergunto o que diabos faz uma pessoa (ler) um jornal
impresso (...) quando (...) já sabia de tudo (...) vendo os telejornais no dia
anterior [ou] (...) ouvindo os noticiários de rádio pela manhã”. Em sua
opinião, trata-se de charme: (...) ou de um vício desgraçado, esse de ficar
folheando as páginas de jornal na busca de notícias já conhecidas. Com toda
a sinceridade de alguém que já foi crítico de televisão e fez comentários
diários de política para um telejornal, além de ganhar a vida como
comentarista de rádio, mas sempre se considerou um guttenberguiano, eu
desconfio que ler jornal é hábito em franco desuso pelas novas gerações. E
poderá ser um hábito em extinção logo, logo. (...) a leitura de jornais é só
uma questão de hábito, de vício até. Daqui a pouco, se tornará uma
excentricidade. Depois, pode simplesmente ser eliminada da rotina (PINTO,
2007 apud TARGINO, Graça. v.31, n.1, p.51-78, jan./jun. 2008 )
2. METRO: HISTÓRIA E PERSPECTIVAS
Nesse segundo momento faremos um estudo aprofundado do jornal Metro, objeto de
estudo do nosso trabalho, destacando alguns dos seus principais aspectos os quais
consideramos de maior importância à nossa pesquisa. São aspectos relacionados às
transformações observadas no jornalismo hoje, tais como, novo paradigma, notícias curtas,
mais superficiais, desenraizadas, a forte presença da publicidade, entre outros.
Escolhemos o Metro por acreditarmos tratar-se jornal impresso que melhor representa
os demais veículos impressos gratuitos existentes no mundo. Ele existe há catorze anos, em
17 países e possui mais de 20 milhões de leitores.
Ao longo dessa segunda parte da pesquisa descreveremos o Metro, sua situação no
mundo, no Brasil, os grupos aos qual pertence, suas metas, público-alvo, perspectivas e
características.
Para análise escolhemos uma semana corrida, de 09 a 13 de novembro de 2009
(segunda à sexta-feira). Entendemos que uma semana é suficiente para nosso estudo, já que
existe uma homogeneização nos padrões editoriais do jornal e, consequentemente, não existe
muita mudança de uma edição a outra, exceto quando ocorre uma catástrofe ou fato muito
excêntrico que foge aos padrões da normalidade.
76
Primeiramente, contaremos um pouco da história do Metro para em seguida
analisarmos os aspectos que o caracterizam como um jornal que vai ao encontro do estilo
contemporâneo. Estilo esse que se caracteriza por uma superficialidade, fragmentação,
volatilidade, instantaneidade, velocidade, apelo direto ao consumo, entre outras
características.
A época do lançamento do Metro no Brasil, na cidade de São Paulo, João Carlos Saad,
presidente do Grupo Bandeirantes de Comunicação – grupo proprietário do jornal no Brasil –
declarou: “Estamos felizes, animados, confiantes que seja um bom veículo, que sirva a muita
gente que não tem tempo, hábito, acesso ou dinheiro para se informar; e acho que se ele for
útil, vai dar certo”. E essa tem sido uma das metas do jornal: atingir um público-alvo jovem,
ávido por informação rápida, gratuita, ou seja, um leitor que procura um resumo das
principais notícias do Brasil e do mundo. Um leitor que não dispõe de tempo para textos mais
aprofundados, reportagens longas; leitor esse que se informa pela internet, de forma gratuita e
que não quer pagar pela informação diária.
2.1 O Metro no mundo
O primeiro jornal gratuito que se tem notícia é o Contra Costa Times, lançado na
Califórnia (EUA) em 19478. Em 1995, Estocolmo, na Suécia, foi lançado o primeiro Metro,
expandindo-se rapidamente nos anos seguintes para vários outros países. Pertencente ao grupo
sueco Kinnevik9, o que fez com que esse jornal caísse no gosto do público foi, entre outros
fatores, o fato dele possuir um novo padrão de qualidade gráfica até então desconhecida nos
jornais gratuitos e encontrado apenas em jornais pagos. Inovador na forma e no conteúdo, o
Metro utilizou ferramentas de design gráfico para proporcionar uma leitura rápida, quase
instantânea e muito atraente aos olhos e tato do leitor – muitos infográficos, muitas cores,
fácil manuseio, formato berliner.
Outro fator que diferenciou o Metro dos demais jornais gratuitos foi a distribuição, que
acontece nos cruzamentos das principais ruas e avenidas de grandes cidades além de estações
de trem e metrô.
8 Informação obtida no endereço wwwmetropoint.com, dia 10 de outubro, às 14h.
9 O site do jornal informa que a principal acionista da Metro International é o grupo sueco Investment AB
Kinnevik. O Grupo criado em 1936 opera empresas próprias e gerencia um portfólio de investimentos de longo
prazo em companhias de capital aberto, como Tele2 AB (Telefonia Fixa), Modern Times Group MTG AB
(Televisão), Millicom International Cellular S.A. (Telefonia Móvel), Transcom WorldWide S.A. (Serviços de
Marketing), Invik & Co. AB (Seguros, Fundos), e a Metro International S.A
77
De acordo com o site do jornal, a concretização do sonho da conquista mundial veio
em 1997, com o lançamento da primeira edição internacional em Praga, na República Tcheca.
Daí em diante, a cada ano, o jornal conquistou mais e mais cidades em diversos países
europeus.
Em 2000 o Metro ultrapassou os limites da Europa, e além de Grécia e Itália ganhou
edições no Chile, EUA e Canadá. Em 2002 chegou à Ásia com as edições em Hong Kong e
Seul. Somente em 2005 foram lançadas 19 novas edições. Em 2006 surgiram outras sete
edições do jornal. No ano de 2007 já ganharam as ruas edições do Metro nas cidades de
Calgary e Edmonton, ambas no Canadá. Atualmente com 84 edições diárias em 20 idiomas, o
Metro está presente nos continentes Europeu, Asiático e Americano ( Norte e Sul ) atingindo
mais de 20 milhões de leitores por dia.
Em 07 de maio de 2007 o Metro passou a circular no Brasil, na cidade de São Paulo,
chamando atenção dos transeuntes por suas cores chamativas, tamanho compacto, layout
colorido, e além de tudo, gratuito. Atualmente, no Brasil, o jornal circula na cidade de São
Paulo e recentemente, em outubro passado, o jornal passou a circular na região do ABC, com
o nome de Metro ABC. Em dezembro de 2009 foram lançadas mais duas versões do jornal: o
Metro Santos (SP) e o Metro Rio (RJ).
3. O GRUPO BANDEIRANTES
3.1 O Grupo
Fundado em 1937, o Grupo Bandeirantes de Comunicação, proprietário do Metro no
Brasil, vem adquirindo, criando novas marcas e consolidando-se como uma empresa de
comunicação multimídia. “Todo esse crescimento foi suportado única e exclusivamente por
empresas e pelo mercado anunciante, que acreditam na diversidade de opinião e apostam no
crescimento de um grupo comprometido com os interesses do país”, afirma João Carlos Saad,
presidente do Grupo.
Hoje o Grupo Bandeirantes possui hoje duas redes de televisão aberta; três canais de
televisão por assinatura; seis redes de rádios, um jornal de classificados; uma distribuidora de
sinal e conteúdo a cabo; um selo musical e o Metro, o jornal diário que existe em 17 países.
78
3.2 História
A trajetória da Band começou no final dos anos 60, como resultado do projeto de
expansão de João Jorge Saad na área das comunicações. Antes de fundar a televisão, o
empresário já possuía a Rádio Bandeirantes, que havia adquirido em 1948 e transformado
numa das principais emissoras do Brasil. A TV Bandeirantes de São Paulo (canal 13) entrou
no ar no dia 13 de maio de 1967. Teria como base jornalismo, esporte e entretenimento, como
filmes, programas de auditório e musicais.
3.2.1 A chegada das cores
Em 1972, a 12ª Festa da Uva, em Caxias do Sul, se tornou um marco na história da
televisão brasileira10
. Depois de quase dois anos de preparativos, no dia 19 de fevereiro, o
evento gaúcho foi o primeiro teste oficial da transmissão em cores, via Embratel, para todo o
país . A Bandeirantes participou do pool de emissoras e além da festa, na estréia das cores no
Brasil, exibiu o longa-metragem “O Cardeal”, de Otto Preminger. A Band passou a produzir e
transmitir uma programação em cores, como anunciava o slogan: “TV Bandeirantes, a
imagem colorida de São Paulo”.
A Band começou a investir mais no segmento esportivo a partir de 1983, com a estréia
do “Show do Esporte”. A transmissão de competições aos domingos contribui para consagrar
a emissora durante muitos anos como o “Canal do Esporte”.
4 O METRO NO BRASIL
Circula em São Paulo, desde o dia 7 de maio de 2007, o Metro, edição brasileira do
“maior jornal internacional do mundo”, slogan do Metro que é resultado de uma aliança
estratégica do Grupo Bandeirantes de Comunicação com a Metro Internacional, empresa do
grupo sueco Investment AB Kinnevik, criado em 1936 e que atua em diversas áreas da
comunicação como Telecom, canais de televisão e telefonia móvel. A Metro Internacional é
responsável pela edição do jornal em 21 países da Europa, Américas e da Ásia totalizando
mais de 22 milhões de leitores diários em todo o mundo.
10
Informação obtida no site da emissora, www.grupobandeirantes.com.br. Acessado em 10 de novembro de
2009, às 18h30.
79
O lançamento do primeiro jornal diário do Grupo Bandeirantes, formado por duas
redes de TV aberta, três canais por assinatura, cinco redes de rádio, TV a cabo, e o jornal de
classificados Primeiramão, aconteceu no ano em que o Grupo completou 70 anos. “De olho
no “mundo plano” e sem barreiras, resultado da globalização e avanços tecnológicos, a
chegada do jornal internacional reforça a atuação multimídia do Grupo Bandeirantes”,
afirmou o jornalista Ricardo Anderáos, diretor editorial do jornal à época do lançamento.
Segundo João Carlos Saad, presidente do Grupo Bandeirantes, a fórmula do jornal – formato
berliner e gratuito - segue uma tendência mundial e encontra semelhanças no modelo
consagrado pela internet: “O Metro oferece informação rápida, de qualidade, ilustrada e
dirigida a um público jovem, gratuitamente”, afirmou.
Com tiragem de 150 mil exemplares diários – exceto às sextas-feiras que o jornal
circula com 300 mil exemplares -, o Metro chegou a São Paulo distribuído de segunda a
sexta-feira em mais de 300 pontos vitais da cidade. É fácil o leitor reconhecer os promotores
do jornal; jovens - moças e rapazes - devidamente identificados com seus uniformes verde-
limão. “Os promotores estarão sempre nos mesmos locais, queremos que o público se habitue
a começar o dia com o Metro na mão”, ressaltou Ricardo Anderáos, ex-editor da publicação e
atual editor de tecnologia11
. Segundo ele, o jornal tem diagramação diferenciada e pode ser
lido rapidamente, num tempo médio estimado de 17 minutos. “O perfil do leitor do Metro é o
de uma pessoa dinâmica, urbana, que está em trânsito, se dirigindo ao trabalho, faculdade ou
academia e que precisa ganhar tempo”, explicou.
4.1 A missão
“No cotidiano cada vez mais acelerado das grandes cidades, quem tem tempo de ler um
jornalão tradicional? E para nós, que vivemos conectados em rede, qual o sentido de pagar
para receber informação?”, interroga o jornalista Ricardo Anderáos, ex-editor do Metro. E
acrescenta
A melhor resposta a essas perguntas foi dada em 1995 por uma empresa
sueca que criou a primeira edição do Metro. Um jornal para ser lido
rapidamente, com alta qualidade gráfica e jornalística e que, de quebra, era
entregue gratuitamente, logo de manhã, na rede de transportes de Estocolmo
(informação verbal).
11
O depoimento foi obtido durante entrevista concedida no Café Intercom, evento realizado na Livraria Saraiva
do Shopping Ibirapuera, em outubro de 2008.
80
Então seria essa a missão do Metro: informar de maneira rápida, breve, com notas
curtas por que na nova era ninguém tem mais tempo para ler os jornais da chamada mídia
tradicional? Oferecer notícias 100% gratuitas já que ninguém quer mais pagar por informação
já que a internet disponibiliza notícias gratuitas 24h?
De acordo com o site do Metro12
, “o jornal consiste na fórmula perfeita para um
público jovem e qualificado, que não tem o hábito de ler diariamente os jornais tradicionais.
Os mesmos jovens que começaram a se ligar na tripla revolução que sacudiu os anos 90 com a
popularização da tv a cabo, da telefonia celular e da internet”.
Em pouco tempo do seu surgimento o Metro começou a se espalhar pela Europa e
depois pelo resto do mundo. A sua expansão coincidiu exatamente com o momento em que os
jornais tradicionais mergulhavam na pior crise de sua história, enquanto o tablóide gratuito
remava contra a corrente, transformando-se num dos mais revolucionários fenômenos de
mídia deste início do século XXI.
Como toda boa ideia, a receita do Metro é simples. Começa com um bem
elaborado resumo das principais notícias locais, nacionais, internacionais. A
esses assuntos que também recheiam os noticiários da televisão, rádio,
jornais e internet, os editores do Metro adicionam histórias de interesse
direto de seus leitores, que não aparecem na mídia tradicional. (informação
verbal),
Com 500 jornalistas espalhados por 21 países, o Metro oferece uma grande rede de
correspondentes nas principais cidades do mundo. Anderáos acrescenta ainda que
(...) mais do que notícias, os jornalistas do Metro trazem informações únicas.
Enquanto o Metro Milão vai nos manter em dia do o mundo da moda, por
exemplo, o Metro Helsinki vai antecipar as próximas tendências da telefonia
celular. Mas apesar de pensar globalmente, o Metro age aqui e agora. Ele é
um jornal local, um veículo da cidadania. Sua missão aqui em São Paulo
como no resto do mundo, é ajudar cada um de nós a viver melhor em nossas
cidades. (informação verbal).
12
Informação obtida no site do Metro, www.metropoint.com, acessado em 13 de maio de 2008, às 14h.
81
4.2 O Jornal
Ao analisarmos o Metro, primeiramente percebemos tratar-se de um veículo de fácil
manuseio – formato berliner –, layout leve, jovem, forte presença da publicidade, com muitas
cores (as chamadas de capa trazem cores nos tons azul turquesa, pink, laranja e verde). Possui
16 páginas (exceto às quintas e sextas-feiras com 30 páginas recheadas de muitos anúncios),
muitos infográficos e fotografias. Suas notas e textos são curtos, no estilo drops, para que seja
lido rapidamente, ou em poucos minutos, no trajeto de casa ao trabalho ou vice-versa.
Sempre em todas as edições analisadas aparece logo ao lado do logotipo do jornal, na
parte bem superior da primeira página, uma chamada em destaque para editoria Diversão,
deixando claro logo qual conteúdo e público-alvo priorizado pelo jornal: o jovem. Divide-se
em cinco editorias fixas, que são: Em foco, Mundo, Economia, Esporte e Diversão, sendo que
esta última – por tratar-se da principal editoria do jornal – ocupa seis páginas.
Na capa sempre uma manchete com a matéria principal e uma média de cinco
fotografias de boa qualidade. Em meio a tantas cores e fotos, as chamadas das editorias
aparecem bem curtinhas, em sua maioria, representadas apenas por uma frase. Apesar de o
jornal priorizar os assuntos relacionados à diversão, lazer e cultura, a matéria principal é
sempre sobre um assunto que esteja sendo discutido e/ou bastante repercutido no momento.
Essa matéria principal sempre vem na página 02, editoria Em foco.
Na editoria Em foco (cor azul) são trabalhados os assuntos que estão sendo discutidos
no momento pela grande mídia; essa editoria contempla assuntos de política, polícia, cidades,
nacional, etc.
A editoria Mundo (cor azul em tom mais escuro) aparece logo em seguida. Ocupa
geralmente uma ou duas páginas e traz um resuminho das principais notícias do mundo
fornecidas pelos jornais da rede Metro Internacional, presente em vários países.
Em seguida aparece a editoria de Economia (cor verde-limão) que ocupa uma página
sendo que, na semana analisada, metade desta página era ocupada pela publicidade.
Depois aparece a editoria de Esportes (cor laranja) que também ocupa apenas uma
página. As notícias aparecem bem compactas para que a publicidade, ou seja, os anúncios
sejam bem acomodados.
Por último a editoria Diversão (cor rosa pink) que ocupa diariamente, de cinco a seis
páginas. Nela são abordados assuntos relacionados a estrelas internacionais, filmes, dicas
culturais, roteiro de cinema, shows, festas, homenagens, destaques da TV, horóscopo, palavra
cruzada, tempo, cartas dos leitores, erramos, o expediente do jornal e, claro, a publicidade.
82
O Metro possui colunas fixas, de acordo com os dias da semana. Na segunda-feira é
publicada a coluna Viagem, editada por Maurício Xavier. Nela aparecem dicas de viagens,
com sugestão de saídas, roteiro turístico, o que comprar, o que comer, entre outros.
Já na terça-feira circula a coluna Casa, assinada por Cínthia Rodrigues. Publicada na
página 7, metade é ocupada por anúncio publicitário.
Toda quarta-feira é publicada na página 12 a coluna Motor, assinada por Maurício
Xavier. Ela ocupa apenas metade da página; a outra metade é ocupada por publicidade.
Na quinta-feira o Metro circula com a coluna Conexão, escrita pelo jornalista Ricardo
Anderáos, ex-editor-geral do Metro, trazendo as novidades da área das novas tecnologias. A
coluna fica na página10 e ocupa apenas metade dela, já que a outra metade vem com um
anúncio. Na quinta o jornal circula com 30 páginas (segunda, terça e quarta ele tem 16
páginas) e uma capa falsa. A tiragem é de 150 mil exemplares.
Sexta-feira, último dia da semana que o Metro circula, ele também tem 30 páginas e
uma capa falsa. Sexta é o único dia que o jornal tem uma tiragem de 300 mil exemplares.
Na sexta também tem o Caderno Metro +, editado por Cínthia Rodrigues. O Caderno
possui seis páginas e traz dicas de moda, comportamento, gastronomia e cultura.
Apesar de o Metro ser o único jornal impresso do Grupo Bandeirantes (o outro veículo
impresso da Band é o jornal de classificados Primeira Mão) ele não vem recheado de anúncios
institucionais como poderíamos imaginar; apenas na quinta e sexta-feira encontramos
anúncios referentes ao Grupo13
.
13
Na quinta-feira, 12 de novembro, foi publicado um anúncio da Rádio Bandeirantes (meia página) e do próprio
Metro (página inteira). Na sexta, um anúncio de página inteira do programa “No Pulo do Gato”, da Rádio
Bandeirantes e uma matéria do programa “Zero Bala”, exibido na TV Bandeirantes e apresentado por Daniela
Cicarelli e Otávio Mesquita.
83
CAPÍTULO V – METRO: O JORNAL DA NOVA ERA
Após a pesquisa exploratória com intuito de observar os elementos de mutação
jornalística que fazem do jornal Metro um veículo da atualidade, realizou-se uma análise de
conteúdo nesse meio impresso em edições do mês de novembro, ano de 2009. Nesta fase da
pesquisa, procurou-se identificar no Metro algumas características dos tempos atuais, tais
como superficialidade, desenraizamento, forte presença da publicidade, influência da internet
e apelo direto ao consumo que refletem as mudanças dos paradigmas do jornalismo na nova
era.
As cinco categorias de análise criadas no presente trabalho foram baseadas nas
reflexões teóricas apresentadas na primeira parte da pesquisa sobre a trajetória do jornalismo,
suas crises e quebra dos paradigmas neste século XXI.
O estudo exploratório do Metro tem como objetivo desvendar esse novo produto
cultural da mídia atual e ao mesmo tempo descobrir o que está por trás desse fenômeno. Seria
o Metro um jornal prioritariamente com fins publicitários cujo objetivo é atrair mais e mais
anunciantes? Em segundo lugar vem a preocupação em informar/formar o leitor cumprindo
sua função social enquanto jornal?
Por ocupar o centro dos fenômenos sociais, econômicos e tecnológicos que marcam a
humanidade os meios de comunicação também são alvo desse processo de transformações.
Nas últimas décadas percebe-se que o jornalismo vem, cada vez mais, curvando-se ao
sistema, flexionando junto seus conceitos, valores, padrões e posicionamentos. “O campo
jornalístico está permanentemente sujeito a provados veredictos do mercado, através da
sanção, direta, da clientela ou, indireta, do índice de audiência” (Pierre Bourdieu, 1997,
p.106).
Os princípios da nova ordem econômica provocam mudanças nas relações dentro das
redações dos jornais, na interação do profissional com a sociedade, das escolas de jornalismo,
na elaboração das notícias e no cotidiano do fazer jornalístico. Em consequência, a lógica do
mercado parece estar provocando uma transformação generalizada dos padrões éticos e
culturais do universo da informação.
Ciro Marcondes Filho (1989) acredita que o jornalismo, em geral, é obrigado a atuar
junto com grandes forças econômicas e sociais, o que faz com que uma empresa jornalística
raramente fale sozinha. Para ele, o “jornalismo é ao mesmo tempo a voz de outros
84
conglomerados econômicos ou grupos políticos que querem dar às suas opiniões subjetivas e
particularistas o foro de objetividade” (Marcondes Filho, 1989, p. 11).
Estudos e levantamentos revelam os traços de uma crise tanto conjuntural quanto
estrutural, piorada pela diminuição da credibilidade da opinião pública perante o conjunto dos
jornais. O desgaste dos padrões, conceitos e valores do jornalismo, decorrente da hegemonia
do mercado, tem sido verificada sistematicamente por pesquisadores do universo da
comunicação.
Ismar de Oliveira Soares (1996) chama o jornal moderno de jornal sem palavras, já
que prioriza cor, as letras garrafais e a foto hiperdimensionada, em detrimento do conteúdo da
informação. Howard Kurtz (1993 apud Marshall, 2003) denomina essa nova linguagem de
“jornalismo cor-de-rosa”, por estar estrategicamente preparado para não desagradar a
ninguém, seja leitor, usuário, consumidor, cliente, dono, anunciante etc.
Esse modelo de jornalismo, desencadeado essencialmente pelo diário norte-americano
USA Today, nos anos 1980, introduziu o hábito das páginas super coloridas, os infográficos,
layouts e designers mais arrojados, aumento da cobertura de esportes, notícias de
comportamento, de moda e da previsão do tempo.
Um exemplo desse tipo de jornal que prioriza o entretenimento é o Metro, que existe
em 17 países, inclusive no Brasil, cujas páginas são recheadas de fotos, infográficos, muita
cor e pouco texto. O que mais se ver em suas 16 páginas, em formato berliner, são anúncios
publicitários dos mais variados tipos: vão desde propagandas de xampu às empresas que
oferecem crédito financeiro pessoal. “O Metro é, na verdade, um resumo das principais
notícias que ocorrem no Brasil e no mundo”, declarou o jornalista Ricardo Anderaos, à época
editor do Metro. A cobertura das notícias mais sérias, que exige maior investigação e maior
profundidade, foi trocada por notícias de entretenimento, que têm maior efeito sobre a
audiência e custam bem menos à empresa.
Com tudo isso, um novo paradigma começa a nascer no universo do jornalismo. A
lógica do capital e do livre mercado flexibilizam o conceito e o processo de newsmaking e a
informação transforma-se muitas vezes em um campo de negociação, submetida às regras e às
determinações do marketing empresarial.
Diante desse cenário, ouvem-se muitos comentários de que o jornalismo atual perdeu
completamente o vigor existente nas veias dos jornalistas e nas páginas dos jornais até
meados do século XX. O jornalismo engajado, idealista, revolucionário, palco de lutas
ideológicas e debates sociais, latente nos séculos XVII, XVIII e XIX, teria dado lugar hoje a
um jornalismo amorfo, insípido e vazio.
85
O jornalista da atualidade pode ser comparado a uma máquina de produção de
informação, um operário com demandas estipuladas e prazos de entrega a cumprir. Hoje as
redações dos jornais obrigam o jornalista a ser uma pessoa capaz de se adaptar a variadas
necessidades e situações.
De forma geral, o jornalista da era pós-moderna anula o senso crítico e a
capacidade de reflexão e permite-se o ato de submeter o lead e a pirâmide
invertida à lógica do mercado. Por isso, o jornalista passa, consciente ou
inconsciente, a se defender e a defender seu emprego, seu salário, sua
sobrevivência. Ele se rende à invisível censura do mercado e estabelece a
própria autocensura. Nesse contexto, o jornalista pós-moderno vira refém de
uma lógica avessa ao interesse da informação, mas simpática aos interesses
da empresa e do mercado. (MARCONDES FILHO, 1993, p.44)
Nesse universo de transformações, a profissão jornalística acaba se revelando como
uma atividade em profunda crise de identidade. O jornalismo da atualidade, na medida em
que se alimenta pela lógica do mercado, do marketing e da publicidade secundariza a missão
de informar e, assim, deixa de cumprir o seu papel social.
Sobre a situação atual dos novos jornalistas Ignácio Ramonet14
acrescenta que com a
ascensão da mídia cidadã onde cada cidadão pode gerar conteúdo e colocar na rede e mesmo
ter acesso diretamente aos acontecimentos, o jornalista, que sempre exerceu a função de
“intermediário” está sem função.
Teoricamente, até agora, o jornalismo pode ser explicado da seguinte
maneira. Jornalismo teve um arranjo triangular: o evento, o intermediário e o
público. O evento foi transmitido através de um intermediário, ou seja, o
jornalista que vazou-lo, analisa-lo, e fez o impacto contextual sobre o
cidadão. Essa era a relação de todos nós sabíamos. Agora, o triângulo
tornou-se um eixo. É o evento e, em seguida o cidadão. No meio do caminho
e um espelho, mas apenas um copo. Através da câmara de televisão, a
câmara ou a história, toda a mídia (imprensa, rádio, televisão) estão a tentar
contactar directamente os cidadãos com o evento.(RAMONET, 2009)
1.1 ANÁLISE
A técnica análise de conteúdo aplicada nesta pesquisa contou com a amostragem por
semana corrida. Foi escolhida a segunda semana do mês de novembro. Como o jornal circula
de segunda a sexta, foram analisadas as edições dos dias 9, 10, 11, 12 e 13 de novembro.
14
Artigo publicado no site da revista espanhola La Factoria. Disponível em
http://www.lafactoriaweb.com/articulos/ramonet.htm#%22. Acesso em 17 de novembro de 2009, às 22h17.
86
Consideramos ser suficiente a amostragem citada no parágrafo anterior, por
observarmos – nesses quase três anos do Metro no Brasil – uma homogeneização do Jornal
sem nenhuma mudança e/ou variação dos padrões que seja relevante.
1.2 Categorias de Análise
1.Notícias superficiais (descontextualizadas)
2. Notícia apresentada com caráter de publicidade
3. Apelo direto ao consumo
4. Discurso gráfico
5. Linguagem da internet/palavras em inglês/interface virtual
1.2.1 Notícias superficiais (descontextualizadas)
Ciro Marcondes Filho (2000), no livro “Comunicação e jornalismo: a saga dos cães
perdidos”, compara o jornalista com um cão, que na modernidade era selvagem, voraz, corria
para obter o furo e investigava com seu faro apurado. O repórter era atento as pistas que o
levassem a uma descoberta nova. E desta maneira, viviam de uma forma mais independente
por meio do seu instinto apurado de cão farejador. Os jornalistas viviam soltos, buscavam a
notícia e aprofundavam o conteúdo; toda notícia tinha começo, meio e fim e possuía um
histórico. Ou seja, nada era apresentado de forma solta, desconectada como se não existisse
um antes, um passado e como se não tivesse nenhuma relação com os demais acontecimentos
do mundo.
Para o autor, a nova era domesticou os jornalistas, que agora são cães domesticados,
que tem donos e são treinados a obedecer e atender aos interesses dos donos das empresas de
comunicação e da lógica comercial. Como consequência o faro jornalístico foi perdido e a
identidade entrou em crise. Não se pode mais definir quem são os repórteres que atuam nesse
quadro em que perdura o paradigma emergente. As identidades estão fragilizadas. Marcondes
Filho mistura jornalismo e ficção para relatar
87
a procura dos cães perdidos, esse importante grupo humano que nos últimos
duzentos anos provocou verdadeiras revoluções na maneira de ver, sentir e
vivenciar o mundo, mas que, diante do desafio de forças extraordinárias (...),
acabou por desintegrar-se de forma misteriosa, pois se trata de uma
desintegração in praesentia, quer dizer, desintegra-se permanecendo. Os cães
perdidos são, enfim, os jornalistas pós-modernos." (MARCONDES FILHO,
2000, pp.7-8)
O autor procura alertar para a submissão atual dos jornalistas aos processos técnicos,
por meio da informatização, bem como a outras características sintomáticas da pós-
modernidade, como a alta velocidade do fluxo das informações e a dependência ao discurso
das fontes - em detrimento da prática investigativa e do tratamento mais cuidadoso (e ético,
principalmente) à notícia que seriam próprios do jornalismo anterior ao advento dos
computadores e da internet no cotidiano das redações. Para ele, o que existe hoje é uma
presentificação das notícias e uma superficialidade. As informações são apresentadas de
maneira solta, superficial e sem a preocupação de contextualizar o leitor com os demais
acontecimentos, para que ele possa então conhecer e/ou entender o fato, e, consequentemente,
tirar suas próprias conclusões e trabalhar o seu senso crítico.
Concordo com o autor quando ele diz que os jornais da nova era primam pelas notícias
presentificadas, ou seja, pelas notícias do hoje, como se não tivessem nenhuma relação com o
ontem e que também não fossem influenciar no amanhã. Essa é uma característica marcante
dos tempos atuais. Observa-se que as informações são apresentadas como se existissem
apenas em si e para si; como se não tivessem nenhuma relação com o passado. Tudo é
colocado de forma solta, desenraizada. Percebe-se uma superficialidade, um não
aprofundamento. É como se você bebesse um copo de água e ainda continuasse com sede; no
caso do jornal, você termina de ler e ainda continua com sede de informação.
O processo de transformação dos paradigmas na era pós-moderna provoca,
consequentemente, uma transformação também do conceito de informação, que deixa de
significar a representação simbólica dos acontecimentos para se apresentar como um produto
que associa publicidade, entretenimento, persuasão e consumo. Dentro desse contexto a
informação vira um meio de transporte para várias e subjetivas intenções, deixando muitas
vezes de cumprir sua missão precípua de informar.
E se a informação vira uma mercadoria, ela perde o seu valor primeiro de
função social, de informar os cidadãos. Passa então a se sujeitar às leis do
mercado, da oferta e da demanda, em vez de estar sujeita a outras regras,
cívicas e éticas, de modo especial que deveriam, estas sim, ser as suas.
(RAMONET, 1999, p.60).
88
Observamos muitas vezes que a notícia presente nos noticiários de TV, rádio, jornal
ou internet, apresenta-se muito superficial, ou seja, a informação não possui as causas e os
porquês. Pois, na medida em que, a informação vira mercadoria ela não tem o objetivo de
despertar o cidadão, mobilizá-lo e não distribui os elementos necessários para a cristalização
de uma opinião crítica e contestadora.
Dentro dessa linha de pensamento a informação hoje passa por um processo de
mutação. Pressionado pelo mercado, pela produção industrial de notícias, pela competição,
pela sobrevivência no emprego, o jornalista acaba sendo tentado muitas vezes a manipular
dados e informações. Além disso, as notícias são encurtadas para ocuparem o menor espaço
possível e dar lugar à publicidade, que nos jornais gratuitos, é quem custeia toda a publicação.
Ciro Marcondes afirma que, diante das transformações da sociedade,
o jornalismo, para sobreviver, apela para a indústria imaginária de notícias.
Criam-se fatos, forjam-se notícias, estimulam-se polêmicas fictícias,
constrói-se o conflito em laboratório. O estúdio de TV, a cabine de rádio, a
redação do jornal, deixam de ser meios de transmissão de fatos e tornam-se
eles mesmos os produtores de mundos.(MARCONDES FILHO, 1993, p. 63)
Os meios de comunicação, mediante seus critérios de noticiabilidade ou políticos,
medeiam e filtram os acontecimentos de acordo com as suas intenções, ideologias ou seus
interesses. Os fatos do cotidiano são escolhidos em uma seleção subjetiva e trabalhados a
favor do sentido preferencial dado pelo meio. Ao final, os dados acabam passando por uma
codificação sempre dirigida, o que conduz o consumidor a uma interpretação paralela. O
discurso da objetividade, da imparcialidade e da neutralidade informativa está hoje muitas vezes
relegado apenas ao discurso mercadológico das empresas.
Em artigo publicado no site da revista espanhola La Factoria, Ignácio Ramonet
constata que a informação não prioriza mais seus valores cívicos ou éticos e que é “antes de
tudo uma mercadoria e como tal, está submetida somente às leis de mercado, da oferta e da
procura e não a outras leis como, por exemplo, aos critérios cívicos ou éticos”.15
Nosso objetivo ao criar a categoria notícias superficiais e aplicá-la ao Metro é
justamente identificar se esse jornal trabalha com esse tipo de notícias – muito curtas e
esvaziadas de conteúdo – ou se há nesse veículo uma preocupação em fornecer ao cidadão-
15
Disponível em http://www.lafactoriaweb.com/articulos/ramonet.htm#%22. Acessado em 17 de novembro de
2009 às 21h57.
89
leitor-consumidor informações mais aprofundadas possibilitando ao mesmo uma visão mais
crítica do mundo em que vive.
Na segunda-feira, 09 de novembro, primeiro dia de análise, ao aplicarmos nossa
primeira categoria, que é sobre a presença de notícias superficiais – muitas vezes incompletas
- importantes características dos veículos da atualidade, encontramos logo na página 04, na
editoria Em foco a notícia intitulada: “Avião da TAM retorna a NY depois de falha
mecânica”. Segue na íntegra:
Avião da TAM retorna a NY depois de falha mecânica
A aeronave levava 196 passageiros para São Paulo e retornou
ao aeroporto JFK 20 minutos após a decolagem.
Esse tipo de informação também pode ser chamada de notícia-índice: você ler e
procura outros meios para inteirar-se sobre o assunto. O jornalista Ricardo Anderáos16
,
primeiro editor do Metro Brasil, declarou que “o Metro funciona como um índice e faz
diariamente um resumo das principais notícias do dia; quem quiser notícias mais
aprofundadas, terá de buscar em outros meios, como a internet”.
Diante desse quadro, fica difícil o leitor inteirar-se completamente do assunto. Ficou
faltando informações do tipo: qual o número do vôo, será que foi mesmo falha mecânica,
quem garantiu isso, quem foi ouvido, a versão da TAM, que aeroporto é esse denominado de
JKF.
Esse tipo de notícia não permite ao leitor formar sua opinião a respeito do assunto, por
não possuir informação suficiente. A notícia está incompleta. Muitas perguntas ficam soltas, o
lead jornalístico não está presente na notícia (aprendemos logo no início da faculdade que o
texto jornalístico tem de informar de forma clara, começando pelo lead com as cinco
perguntinhas básicas: quem, diz o quê, para quem, em que canal, com que efeito).
Além de estar incompleta, a notícia com o suposto problema no avião da TAM está
desconectada, solta, não possui um histórico. Quem escreveu não teve o cuidado de checar a
informação, de fazer um breve histórico sobre os acidentes que já envolveram a companhia
aérea, de saber quais possíveis falhas possam ter ocorrido, enfim, não procurou situar o
possível acidente e nem citou as consequências futuras. Já o leitor recebeu uma informação
incompleta, que pouco explicou, podendo gerar até dúvida.
16
Declaração feita pelo jornalista Ricardo Anderáos durante palestra no Café Intercom, na livraria Saraiva,em
08/10/2008.
90
Terça-feira, 10 de novembro de 2009, também na página 04, editoria Em foco uma
notícia chamou atenção. Segue na íntegra:
“Alunos terão de indenizar professora ofendida no Orkut”
A Justiça condenou três alunos a pagar R$ 10 mil para a professora que dava aula em uma
escola da zona leste.
Quem escreveu essa notícia parte do princípio de que o leitor tem por obrigação saber
do assunto, ou seja, o leitor já tem que ter conhecimento do que está sendo divulgado. Afinal,
não dá para saber quem é a professora que dava aula em uma escola da zona leste.
Seguindo as premissas do jornalismo, o leitor tem de ser esclarecido sobre o assunto.
Que tipo de ofensa, quando ocorreu o fato, podem recorrer, são menores ou não, que tipo de
Justiça condenou os acusados.
Sem dúvida é uma notícia muito superficial, plana. Ao ler essa informação percebe-se
a pressa com que a mesma foi redigida. Não há um cuidado em oferecer ao leitor um
conteúdo mais aprofundado que permita ao mesmo tirar suas próprias conclusões.
Para o leitor enquanto cidadão a informação citada acima em nada acrescenta em
termos de conhecimento, esclarecimento. Ela não cumpriu o seu papel social, já que uma nota
publicada desta maneira não é de interesse público.
O Metro ao publicar notas como a do crime do Orkut não está contribuindo, por
exemplo, para que outras professoras agredidas por alunos no Orkut corram atrás dos seus
direitos; ou que alunos que têm o hábito de agredir seus professores na rede mundial de
computadores pense duas vezes antes de fazê-lo, pois podem ser condenados pela justiça, e
assim por diante.
Não estamos dizendo que uma notícia mais aprofundada vai salvar o mundo; até
porque não é esse o seu propósito. Ou ainda, que o jornal tem essa função de colocar atrás das
grades jovens estudantes que agridem professores no Orkut. Longe disso. Mas entendemos
que o Metro enquanto jornal está descumprindo a função social do jornalismo enquanto bem
público. Oferecer informações mais completas e menos vazias de conteúdo é o mínimo que
um jornal pode oferecer ao leitor crédulo nas informações diárias de cada dia.
Encontramos na quarta-feira, 11 de novembro de 2009, terceiro dia de análise, uma
notícia que chamou muito atenção. Foi a seguinte:
91
“Santa Casa inaugura 2ª unidade de hospital particular”
Em janeiro de 2010, com novo prédio, o hospital Santa Isabel irá duplicar o número o
número de leitos para 240.
Como discutimos a cima, o Jornalismo tem uma função social de informar o cidadão,
fornecendo dados que ele possa guiar sua vida, viver em sociedade, se posicionar no mundo
em que vive. Uma notícia como a apresentada no parágrafo anterior, deixa muito a desejar;
essa devia ser uma notícia muito mais completa e esclarecedora, afinal, está falando da
inauguração de um hospital que, com certeza, é de interesse do cidadão.
Na notícia tinha que vir explicitado se é a Santa Casa da cidade de São Paulo, afinal,
existem outras Santas Casas espalhadas não só pelo Estado de São Paulo, como no resto do
Brasil.
Devia esclarecer ainda onde ficará instalado esse novo hospital, se atende algum tipo
de convênio, de quem é a iniciativa, qual a especialidade, como chegar lá. Estamos falando de
saúde, um assunto de grande interesse de todo e qualquer cidadão de qualquer lugar do
mundo, especialmente do Brasil, com tanta gente que ainda sofre nas filas dos hospitais. A
referida notícia não informou e, consequentemente o Metro, enquanto veículo jornalístico,
não cumpriu sua missão.
Quinta-feira, 12 de novembro de 2009 a nota “Marcola é julgado por morte de juiz”
não contribui para a formação da consciência crítica do leitor, por apresentar-se bastante
superficial. Segue na íntegra:
Julgamento de Marcola, apontado como um dos líderes do PCC, começou na tarde de
ontem. Ele não foi ao tribunal.
O leitor, ao se deparar com essa notícia pode indagar-se sobre quem é Marcola, qual
juiz ele matou ou mandar matar; em que ano esse episódio aconteceu; o que é PCC e ainda
porque ele não foi ao tribunal. São informações que deveriam vir contempladas na notícia, por
serem importantes na compreensão e embasamento da mesma. Trata-se então de uma nota
incompleta e que, da forma como foi veiculada, deixou o leitor carente de informação.
Essa falta de esclarecimentos acaba comprometendo o produto final, no caso a notícia.
Se o leitor se informar diariamente apenas pelo Metro, não estará bem informado, pelo menos,
sobre o assunto acima citado. Ele terá de buscar outros meios que o aprofundem sobre o
assunto.
92
Notícias com esse perfil – desconexas, soltas, incompletas – foram observadas no
Metro durante toda a semana estudada, e acabam revelando o processo de mutação que o
jornalismo vem experimentando hoje, esquecendo muitas vezes dos seus postulados clássicos
para supervalorizar o tempo, o veloz, o instantâneo e superficial.
O que também preocupa – ainda sobre a nota em questão - é o fato dela aparecer solta,
sem raiz. Deveria existir um histórico sobre o episódio envolvendo o Marcola, qual crime
cometeu, qual acusação, quando ocorreu, onde o processo corre, porque não foi ao tribunal.
Ao publicar notas superficiais como a do Marcola o Metro não contribui para o
conhecimento mais aprofundado e mais crítico dos seus leitores.
Na sexta-feira, 13 de novembro, encontramos a seguinte nota publicada aqui na
íntegra:
“Marido traìdo não será indenizado, decide STJ
Os ministros decidiram que o amante não tem responsabilidade sobre a traição da mulher”
Na era da pressa, onde o que vale é o tempo (muito precioso e ninguém pode
desperdiçá-lo), o veloz, o instantâneo, as notícias também seguem esse ritmo e acabam por
não cumprirem sua função primeira de esclarecer o cidadão. A nota explicitada acima não está
clara; ela é apresentada de forma confusa, solta e não contribui ao esclarecimento do leitor,
que continuará sem saber do assunto. Não está claro, por exemplo, se será o marido, a mulher
ou o amante que será indenizado; quem são os culpados, o que decidiu o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) e quando essa ação foi julgada.
Então essa nota vem a calhar com a categoria que criamos que trata justamente da
presença de notícias soltas, superficiais e pouco esclarecedoras que se fazem presentes no
Metro, um veículos dos tempos atuais.
Observamos que notícias rasas, planas compõem praticamente todo o Metro, não
apenas nas editorias Em foco e Mundo que tratam de assuntos como cidade, política e
economia. Na editoria Diversão, que recebe mais atenção por parte do jornal (devido o
público-alvo ser jovem), existem sempre muitas notas soltas, ou seja, notas que deixam a
desejar no quesito informação completa.
Na edição do dia 09 de novembro de 2009 foi publicada na página 10, a seguinte nota:
Oscar Niemeyer é condecorado na Espanha
93
O governo espanhol concedeu na última sexta-feira a “Ordem das Artes e das Letras
de Espanha” ao aqruiteto [o erro de digitação foi do jornal] brasileiro, que tem 101 anos.
A nota poderia ser mais completa explicando, por exemplo, porque o arquiteto
brasileiro foi condecorado na Espanha, que obras fez por lá, etc. Poderia ainda ter mencionado
quem recebe esse tipo de Ordem do governo espanhol. E, apesar do Oscar Niemeyer ser um
dos maiores nomes da arquitetura brasileira, foi quem projetou Brasília, isso poderia ter sido
mencionado.
Com mais um parágrafo a nota ficaria bem mais completa e esclarecedora. Mas a
pressa, a velocidade da nova era não permitem. Talvez para quem redige, a nota a cima deva
estar completa. Mas para quem lê, dificilmente estará.
Infelizmente notas vagas e superficiais como as apresentadas aqui têm sido bastante
comuns na atualidade. É o jornalismo em mutação, transgênico que vem abandonando a sua
premissa iluminista que o originou, que dizia que o jornalismo tem a função de não só
informar, mas de formar, ou seja, tem de fornecer elementos que contribuam para a formação
do senso crítico dos cidadãos.
Só assim, exercendo sua função social enquanto bem público é que o jornalismo irá
contribuir para uma sociedade mais justa, composta por indivíduos com senso crítico e cientes
dos seus direitos e deveres.
1.2.2 Notícia apresentada com caráter de publicidade
Uma das características bastante comuns para a venda ou promoção de um produto é a
composição do texto de uma notícia com enfoque publicitário, ou seja, a informação é
apresentada com a adjetivação e a qualificação típicas de anúncios comerciais promocionais,
recursos utilizados para motivar o leitor ao ato do consumo. Embora formatada dentro das
técnicas elementares do jornalismo, a notícia carrega a intenção implícita e explícita da
promoção mercantil.
Na verdade o conceito clássico de jornal está sendo transformado, constituindo um
novo paradigma na produção e na transmissão de informações. Por pressões do mercado, cada
vez mais o jornal passa a transmitir abertamente os interesses que cercam a informação e seus
atores. Toda a informação está quase sempre condicionada pelo sistema econômico e cultural
94
que a produz, o que faz com que o jornal seja no mundo ocidental, naturalmente, um reflexo
do modo de produção capitalista.
Marshall (2003) acredita que a contaminação e a deterioração do conceito clássico de
jornal dizem respeito, sobretudo, “à promiscuidade existente entre informação e propaganda,
em que as notícias dos jornais perdem sua missão precípua de reportar e passam a carregar os
interesses de propagandear produtos, ideias ou personagens, numa radical inversão de
valores”, (MARSHAL, 2003, p.41). O autor afirma ainda que essa informação publicidade se
irradia e contamina os jornais impressos, telejornais, radiojornais e net-jornais. “Não mais
satisfeitas em ocupar os espaços próprios para a linguagem publicitária, as propagandas
chegam a “pular o muro” e invadir o território da informação, provocando uma forma mestiça
de comunicação”, (MARSHAL, 2003, p.41).
Dentro dessa linha de pensamento, a mídia tem então desempenhado, principalmente,
as funções de consumo e entretenimento, relegando ao segundo plano as tarefas essenciais da
informação, cultura, educação e conscientização. Os jornais vêm se transformando num
grande shopping de mercadorias, em que a diversão, o espetáculo e a emoção funcionam
como estratégias de audiência, vencendo a concorrência com outros meios.
Para Ciro Marcondes Filho (1989), a notícia se apresenta para o receptor como forma
quebrada de realidade, como pedaço do real,
de onde se abstrai somente o fato especifico que originou, e como disposição
múltipla e diversificada no jornal, na televisão, no rádio, no cinema, atua no
receptor participando de um jogo psíquico, em que num momento ela
desencadeia processos de preocupação e, noutro, de alívio e descontração.
Não as notícias isoladamente, via de regra, mas o conjunto delas, o noticiário
como um todo, ou mesmo a programação noticiosa, jogam com esse duplo
caráter ideológico da notícia. Trata-se da dialética da atemorização e da
tranquilização, que compõe o fato noticioso. (MARCONDES FILHO, 1989,
p.14).
Ainda na visão de Marcondes Filho (1989) tal ótica do jornalismo contemporâneo
decorre naturalmente da própria deterioração da condição humana na sociedade do final do
século XX, que instituiu um ambiente de anormalidade, em que até mesmo a normalidade
pode ser encarada com estranheza. “O dito fracasso da razão e a impotência da ciência e da
tecnologia para resolver a equação das desigualdades e das injustiças criaram um regime de
irrealidade”, (MARCONDES FILHO, 1989, p.16).
Na segunda-feira, 09 de novembro de 2009, na editoria Diversão do Metro
encontramos publicada essa notícia com enfoque publicitário:
95
Cinemark tem hoje filmes nacionais a R$ 2
A rede cinemark de cinemas promove hoje a décima edição do
“Projeta Brasil”, evento anual em que, ao longo de um dia,
praticamente todas as salas de cinema do grupo apresentam apenas
filmes nacionais a preços reduzidos.
Serão exibidos filmes como “Se eu fosse você 2”, “Besouro”, Alô, alô
Terezinha”, “Divã”, e “A mulher invisìvel”, com ingressos saindo a
apenas R$ 2.
Um dos destaques desta edição é o documentário “Mamonas pra
sempre”, de Cláudio Kahns, que ainda não entrou em cartaz, mas que
terá sessões de pré-estréia. Mais detalhes no site
www.cinemark.com.br.
Apesar de possuir o lead, característica da informação jornalística, a notícia traz
elementos implícitos e explícitos da publicidade. Presta um serviço ao leitor ao informar os
filmes nacionais ao preço de R$ 2 reais e estimular o hábito do cinema que contribui para a
formação cultural do cidadão. Ao mesmo tempo, atende diretamente aos interesses da
Cinemark, uma rede particular de cinema. Cita muito superficialmente o Projeta Brasil, mas
não esclarece sobre o que trata e nem em que consiste.
Para ter um enfoque mais jornalístico a matéria teria de fornecer mais elementos
esclarecedores, tais como, divulgar o dia que o evento ocorre, quais as outras redes de cinema
que participam do Projeta Brasil, o calendário com os locais e datas dos filmes que serão
exibidos. Sem falar na linguagem, que teria de ser menos de convencimento para ser mais de
esclarecimento. Um exemplo é o título: “Cinemark exibe hoje filmes nacionais a R$ 2”. Não
precisava falar na Cinemark logo no título; poderia ser assim: Projeta Brasil exibe hoje filmes
nacionais a preços reduzidos. Dentro do texto viria então as demais informações sobre a
Cinemark bem como os preços para assistir aos filmes. Se houvesse mais espaço e mesmo
tempo para aprofundar a matéria, o jornalista poderia acrescentar ao texto uma sinopse dos
filmes, por exemplo. Mas como o tempo é curto e o espaço mais ainda, segue então o
endereço do site para maiores informações.
Ao analisarmos o Metro na terça-feira, dia 10 de novembro, em busca de notícias
jornalísticas mas que tem predomínio da linguagem publicitária, encontramos na página 11,
editoria Diversão, a seguinte notícia:
“Coleção Aplauso tem 38 novos livros”
Já conhecida por lançar biografias de grandes nomes das artes
brasileiras, sobretudo do teatro, a “Coleção Aplauso”, editada pela
Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, acaba de colocar à venda
38 novos títulos, entre biografias, roteiros de filmes e coletâneas de
96
peças. Entre as biografias, destaques para a de Fernanda
Montenegro (que completou 80 anos no mês passado), a do músico
Rogério Duprat, a do diretor e ator Amácio Mazzaropi e a dos atores
Tônia Carrero, Stênio Garcia, Mauro Mendonça e Débora Duarte.
Entre os roteiros, destaques para os de “O Bandido da Luz vermelha”
(Rogério Sganzerla, 1968) e “Leila Diniz” (Luiz Carlos Lacerda,
1987).
Por toda a nota percebe-se o caráter publicitário, ou seja, o tom de venda do produto,
no caso, os 38 livros da Coleção Aplauso. Bem no começo já chama atenção a frase:
“....Conhecida por lançar biografias de grandes nomes....acaba de colocar a venda 38 novos
títulos....”. A nota não apenas informa, mas estimula o leitor a adquirir um livro da Coleção.
A referida nota parece uma publicidade paga, disfarçada de notícia, sem identificação
de informe publicitário. Desprezando os manuais de jornalismo e a soberania da redação, a
empresa jornalística vende o corpo da notícia e, em seu lugar, coloca uma publicidade
disfarçada, sem identificação de que esta é um informe publicitário.
o anúncio deixa de estar ao lado ou intercalado no texto jornalístico e passa a
estar dentro dele, constituindo os dois uma só unidade textual. É o
desaparecimento do velho suporte misto e a emergência do suporte único,
alargado da imprensa à radio e à TV. O anúncio, enquanto entidade
autônoma, desaparece, o mesmo acontecendo com a notícia e a reportagem.
(CORREIA, 1997, p. 120)
Mas não podemos aqui afirmar que a notícia sobre a Coleção Aplausos trata-se de um
anúncio publicitário disfarçado de notícia; apenas estamos chamando atenção para esta prática
que tem se tornado cada vez mais comum.
Na edição de quarta-feira, 11 de novembro, editoria Motor, página 12, encontramos a
seguinte matéria:
“Citroën lançará novo elétrico C-Zero em 2010”
Não é novidade que o segmento de veículos elétricos vem gerando
investimentos e disputas entre os fabricantes franceses. E o mais
recente exemplo é o anúncio do novo modelo movido a eletricidade da
Citroën, o C-Zero. Ele é mais um fruto da parceria entre o grupo PSA
Peugeot Citroën e a Mitsubishi Motors Corporation, anunciada em
setembro – o modelo anterior é o iOn, da Peugeot. Tanto o C-Zero,
quanto o íon são baseados no elétrico i-MiEV, da Mitsubishi. Nos
últimos dias, a Renault anunciou a produção dos protótipos elétricos
Zoe, Kangoo e Twizy. Previsto para ser lançado no último trimestre
de 2010, o C-Zero terá motor capaz de gerar potência de 47
kW(equivalente a 64 cavalos). O torque máximo alcançado é de 18,3
kgfm entre 0 (zero) a 2000 rpm. O motor é alimentado por baterias do
97
tipo íon-lítio de 330 V alocadas no centro do veículo e formadas por
88 células de 50 Ah (energia embarcada de 16kWh). As baterias
levam seis horas para carregar quando ligadas a uma tomada de 220
V, o que confere autonomia de 130 quilômetros. Na recarga rápida,
as baterias podem chegar a 80% em meia hora. Como não utiliza
combustível, o painel de instrumentos mostra o nível da carga da
bateria. Além de não emitir poluentes, o modelo elétrico da Citroën é
silencioso. Ao dar partida, um bip avisa ao condutor que o veículo
está ligado.
A matéria fala de um carro que a Citroen está lançando, movido a eletricidade. A
linguagem do texto é bem publicitária, enfatizando, por exemplo, que as baterias que fazem o
carro funcionar levam apenas 6 horas para serem totalmente carregadas. Fala ainda que “ele
não emite nenhum tipo de poluente” e que é “silencioso”. O condutor só sabe se o carro está
funcionando porque, “ao dar a partida, um bip avisa que o veículo está ligado”.
Este caráter publicitário das notícias pode ser caracterizado como um processo que
contribui para a quebra dos paradigmas do jornalismo. Não apenas pela notícia apresentada
acima; mas pela grande ênfase dada à publicidade em quase todos os textos do Metro. E que
além dos textos jornalístico-publicitários existe os anúncios de fato, que são muitos, afinal,
eles bancam o Metro, já que o jornal é gratuito.
E dentro dessa lógica, a notícia perde o seu compromisso com a sociedade, com o
interesse público e passa a defender o interesse privado.
a notícia deixa de apresentar informação e passa a oferecer persuasão. No
fim, esvai-se a força do jornalismo como espaço de interesse público, já que
este passa a ser loteado e mercantilizado. Tal estratégia acaba consagrando a
mentalidade empresarial pós-moderna em derrubar o muro que separa as
parte redatorial e publicitária e tornar os jornais um produto total de
marketing. (MARSHALL, 2003, P. 122)
Ao analisarmos a edição do dia 12 de novembro de 2009, quinta-feira, encontramos a
editoria Conexão que circula sempre nesse mesmo dia da semana. Ela traz as novidades do
mundo das novas tecnologias. Ocupando meia página, chamou atenção a matéria intitulada:
“Notebooks devem superar os desktops”. Segue na íntegra:
A venda de notebooks no país deve ultrapassar a de computadores de
mesa em 2010.
A previsão foi de um executivo da Samsung no lançamento dos
primeiros computadores portáteis da empresa no país. Neste ano,
devem ser vendidos cerca de 11 milhões de PCs no Brasil no total,
98
sendo 6,3 mi lhões de computadores de mesa e 4,7 milhões de
portáteis.
Quem pretende comprar um PC portátil neste Natal deve ficar atento
a duas novidades do setor: a chegada do Windows 7, novo sistema
operacional da Microsoft, e a multiplicação de ofertas dos netbooks,
máquinas mais simples, pequenas e leves (não confundir com
notebook, denominação genérica de PCs portáteis).
Quem só precisa de um computador para criar textos, planilhas,
navegar na internet e armazenar fotos e músicas pode encontrar boas
opções de netbooks com Windows XP, a partir de R$ 1,2 mil. Já quem
quer um computador mais sofisticado, seja para editar vídeos, jogar
videogames ou assistir a filmes de alta definição, deve procurar
equipamentos com o Windows 7 e fugir daqueles que ainda vêm com o
Vista, sistema que deixa os computadores muito lentos.
Outra boa opção neste segmento são os Macintosh que rodam o
sistema da Apple.
Na matéria, escrita pelo jornalista e editor da secção, Ricardo Anderáos, existem
várias dicas que visam orientar o leitor na hora de comprar um computador portátil. No
decorrer do texto o jornalista discorre sobre alguns modelos, os mais vendidos e faz uma
propaganda implícita e explícita de um modelo Windows 7, apresentado com muitas
vantagens.
Por toda a matéria percebe-se a intenção de venda do novo modelo de notebook. E
logo mais na página 17 aparece um anúncio da Itautec Shop, apresentando os mesmos
modelos de computador sugerido pelo jornalista na matéria publicada na página 10.
A perfeita sintonia ente os setores comercial e jornalístico das empresas de
comunicação de massa provoca muitas vezes uma espécie de casamento ente notícias e
anúncios publicitários. No processo de negociação, a empresa vende o espaço publicitário
para a apresentação de um anúncio e oferece como bônus a divulgação da mesma mensagem
da publicidade, ou de outro tema relativo ao cliente, em espaço editorial contíguo. Em outras
palavras, o anunciante ganha uma ou até mais notícias como brinde no fechamento de uma
operação comercial.
Já faz parte da retórica comercial de muitas empresas jornalísticas oferecer a
produção de uma notícia como plus em uma negociação. Caracteriza-se
assim, de forma clara, a subjugação do departamento jornalístico aos
interesses dos setores comerciais da imprensa. A notícia torna-se um mero
apêndice de uma negociação comercial, perdendo seu sentido como produto
do interesse público. (MARSHALL, 2003, p.127)
Não podemos afirmar que a matéria sobre a venda de computadores publicada na
coluna Conexão seja resultado de uma barganha comercial da empresa anunciante de
99
computadores, no caso a Itautec Shop; pode ser que seja apenas uma coincidência. Mas é
importante atentar para esta prática de casamento entre notícia e publicidade que vem se
tornando uma prática comum na nova era.
Sexta-feira, dia 13 de novembro de 2009, ao analisarmos o Metro encontramos a
seguinte matéria, que se assemelha a um anúncio pago de divulgação de uma festa em São
Paulo. Intitulada “SP tem maratona eletrônica – Em sua 13ª edição, o festival XXXperience é
ecologicamente correto”, a matéria, escrita pelo jornalista Bruno Ghetti, traz todas as
novidades da noite ecologicamente correta. Logo no início do texto, Bruno define o festival
como sendo “o principal evento de música eletrônica brasileiro”. No meio da matéria, o autor
diz que a festa será “ecologicamente correta, pois todo o festival terá sua emissão de carbono
neutralizada”. No fim o jornalista indica onde os ingressos são adquiridos. Fica clara, ao
longo do texto, a predominância da linguagem publicitária e o leitor é intimado a comparecer
ao festival. Segue na íntegra:
Completando 13 anos em 2009 e com o status de principal evento de
música eletrônica brasileiro, o festival XXXperience promete levar os
apreciadores do gênero à loucura, com uma maratona musical que
começa amanhã, na fazenda Maeda, próximo à cidade de Itu (a
100km de São Paulo). Serão quatro palcos distintos, com nomes tão
curiosos quanto promissores, como Castelo dos Sonhos, Portal das
Luzes, Jardim das Energias e Bolha Mágica. O line up inclui sets de
nomes badalados do cenário eletrônico, como Adam Freeland, Ellen
Allien, Database, Booka Shade, Gui Boratto, Mau Mau e Renato
Cohen.
Ecologicamente correto(todo o festival terá sua emissão de carbono
neutralizada), o evento deve contar com 30 mil pessoas. Ingressos
podem ser adquiridos em lojas Chilli Beans e na internet. Mais
informações podem ser obtidas no site www.mun
doxxxperience.com.br
1.2.3 Apelo direto ao consumo
O homem da atualidade é o retrato da sociedade e dos valores morais e sociais de onde
ele vive. Hoje, o cidadão é, antes de tudo, um consumidor, que raciocina e se comporta de
acordo com os padrões capitalistas de sua época. A mídia de massa reflete da mesma forma
essa realidade. A sociedade de consumo transportou para dentro dos jornais e influenciou os
jornalistas a ideologia do consumismo.
As páginas de muitas das publicações impressas do mundo são reflexo direto da
mentalidade consumista da era pós-moderna. A mídia de massa impressa trata, portanto, de
100
acompanhar a ideologia da época e, sempre de olho nos índices de audiência ou de vendagem,
oferece aos leitores o que eles desejam.
Dessa forma o Metro tem elegido como linha editorial um apelo direto ao consumo,
retratando em suas páginas peças de vestuário, objetos do lar, novos lançamentos, tendências
da moda, opções de presentes, estilos de decoração, padrões de comportamento, inovações
tecnológicas, produtos inéditos, sugestões de lazer, indicações turísticas, modelos de
arquitetura e design, etc. Muitas vezes, inclusive, com preços, endereços de lojas ou de
fornecedores e indicações ou orientações anexas.
Tais informações buscam objetivamente induzir ao consumo e ferem os princípios do
jornalismo que, na nova era, é bem diferente do modo clássico de fazer jornal. Em crise de
identidade, ele perde as suas referências e torna-se um misto de linguagem, ideologia,
consumo, marketing e publicidade. As mutações do mundo atual, associadas às mutações do
campo da cultura e do campo da comunicação, contribuem para esvaziar o papel do
jornalismo, pelo menos em seu conceito clássico, e empurrá-lo para um novo paradigma.
Esse novo paradigma concilia o imperativo audiovisual, novas tecnologias,
globalização, livre mercado, sociedade de consumo, cultura kitsch, explosão
e poluição informativa, estetização, marketização, liberalismo e crise da
razão. O consumidor do jornal pós-moderno já é, sem dúvida, fruto da soma
desses fatores, combinados, associados e cruzados (MARSHALL, 2003, p.
44)
José Martinez Albertos prevê o fim dos jornais e o fim da própria linguagem
jornalística, já que esta, para ele, não será compatível com a mentalidade pós-moderna. “Dito
de outra forma, em termos macluhanisnos, a etapa eletrônica suporá o predomínio completo e
excludente de uma sensibilidade determinada em que não terão cabimento os restos
arqueológicos vinculados à etapa alfabética” (ALBERTOS, 1997, p.37).
O fim da verticalidade da comunicação desencadeado pelo advento das tecnologias
eletrônicas estabelece interatividade, virtualidade e globalidade, provoca intrinsecamente uma
transformação radical da natureza dos processos culturais baseados nas letras.
A era eletrônica conduz, senão para a hegemonia, pelo menos para um predomínio da
imagem, do audiovisual sobre o alfabeto, do signo sobre o código. Ela desorganiza e
reorganiza a mentalidade, a cultura e a produção de sentido na sociedade. O jornalismo perde
automaticamente suas características e peculiaridades constituídas pela era letrada e conduz a
uma reforma de paradigma.
101
José Martinez Albertos (1997) alerta inclusive que juntamente com o perigo da
extinção do jornalismo existe a ameaça à transformação da natureza da profissão jornalística.
Em lugar de jornalista, a sociedade da era eletrônica demandará provedores
de informação. O futuro da informação, como já está ocorrendo em países
pioneiros no campo da tecnologia, como os Estados Unidos, está cada vez
mais em mãos de provedores de dados, cuja função social não é
precisamente produzir notícias. A matéria-prima laboral dos provedores de
informação não é a notícia, senão o marcador de datas, o quadro estatístico.
(ALBERTOS, 1997, p.50).17
Na nova era percebe-se uma reforma nos processos de produção, transmissão e
armazenamento de dados e informações na sociedade. Dessa forma, as novas tecnologias
abrem a possibilidade de uma comunicação horizontal, descentralizada, interativa, on-line,
gratuita e virtual. A informática organiza uma dinâmica totalmente nova no conceito de fazer.
Dentro dessa linha de pensamento acredita-se que o modelo de jornalismo clássico não
sobreviverá às fortes mudanças da transição do século XX para o século XXI já que não
focaliza mais o bem-estar e o interesse público, mas sim, do consumo.
E nossa terceira categoria de análise busca identificar no Metro textos que ratificam a
ideia do consumo tão comum nos veículos atuais marcados pela forte presença da
publicidade. Esses textos costumam ir muito além do ofício de informar; eles procuram
influenciar os leitores mediante a sedução com conceitos e abstrações induzindo-os a praticar
o consumo.
Na segunda-feira, dia 09 de novembro, encontramos o seguinte texto com o título:
“A cosmopolita e chique Bangcoc”
Associada a mercados superlotados, cidade tem templos imperdíveis e
é opção para boas compras
Mercados de rua entupidos 24 horas por dia e bares com decoração
em neon cheios de
dançarinas –mesmo se você nunca esteve em Bangcoc, deve ter
ouvido falar desta exótica reputação. Mochileiros continuam fluindo
sem parar, mas trata-se também de uma cidade cosmopolita, excitante
e estilosa para ser desfrutada com pouco dinheiro.
Mas a história de Bangcoc é recente. Em 6 de maio de 1782, um dia
considerado auspicioso por astrônomos reais, o rei Phraya Chakri
começou a construção de seu novo palácio em Baang Mákàwk. Ele
chamou sua nova capital de “Grande Cidade dos Anjos, o Repositório
de Joias Divinas, a Grande Terra Inconquistável, o Grande e
17
Tradução nossa.
102
Proeminente Rei- nado, a Real e Prazeirosa Ci-dade cheia de Nove
Joias Nobres, a Mais Real Residência e Grande Palácio, o Divino
Abrigo e Local Vivo dos Espìritos Reencarnados”. Era muito para os
mercadores locais, que abreviaram o nome original para Bangcoc –
apesar de os tailandeses ainda a chamarem de Cidade dos Anjos. O
palácio do rei Chakri está hoje aberto ao público. A en-trada custa
cerca de R$ 25, mas você pode passar um dia inteiro conhecendo o
local. Templos, por outro lado, são muitos e de graça. Para conhecer
a cidade, pule em um barco – o bilhete para um dia custa
aproximadamente R$ 6, com paradas na maioria das principais
atrações. Bangcoc também é para compras. No fim de semana, vá ao
mercado Chatuchak, onde se vende desde opalas a sementes de ópio.
Não deixe de ir também ao Sky Bar. É caro, mas a vista vale.
Este é um texto que desde o título -“A cosmopolita e chique Bangcoc”- já estimula um
padrão comportamental com o adjetivo “chique” referindo-se a Bangcoc. No subtítulo -
“Associada a mercados superlotados, cidade tem templos imperdíveis e é opção para boas
compras” – fica ainda mais claro o estímulo ao consumo, ao associar a cidade a mercados
superlotados e sugerir que a mesma é uma opção para compras.
A matéria cria ainda uma imagem até fútil de Bangcoc, caracterizada como uma
cidade exótica, noturna, aventureira e porque não, promíscua. Isso pode ser comprovado com
palavras presentes no texto tais como “exótica reputação”, “ bares com decoração em neon
cheios de Dançarinas” , “ Mochileiros continuam fluindo sem parar”,” excitante” e “
estilosa”.
Por outro lado, quem redigiu o texto tentou talvez amenizar um pouco o caráter
ostensivo de estímulo ao consumo, ao contar resumidamente a história do nome Bangcoc e
citar os muitos templos que a cidade possui.
Mas ao final da matéria a ideia que é passada ao leitor-consumidor é que comprar é o
que tem de melhor para se fazer em Bangcoc.
Esse é um texto que representa bem o apelo direto ao consumo presente nas notícias
da atualidade. A nossa terceira categoria de análise é justamente encontrar elementos nas
matérias publicadas no jornal Metro que incentivem o leitor a seguir um padrão de consumo,
a exercer determinados hábitos, fazer determinadas escolhas.
Nota-se no Metro, cada vez mais, a presença de textos jornalísticos que mais parecem
anúncios publicitários, e que, o arremate final é um roteirinho sugerindo lugares, bares, o que
comprar.
A matéria sobre Bangcoc é um exemplo desse tipo de texto jornalístico na era da
publicidade. Ela termina com as seguintes sugestões:
103
Onde ficar: O HQ Hostel(www.hqhostel.com) custa aproximadamente
10 euros (cerca de R$ 25) por noite, e inclui internet de graça. Onde
sai:. O mercado noturno de Suan Lum no Parque Lumpini reúne
comida barata, compras exóticas e música de graça. Onde comprar:
Tente o Chatuchak para encontrar barganhas – ou objetos místicos
típicos da Tailândia. Onde comer: Você não precisa ir a nenhum
restaurante. Experimente a comida vendida na rua. Tente o mercado
MBK perto do Estádio Nacional. Onde beber: Bangcoc conta com
vários bares localizados em lugares altos e com ótimas vistas. O Sky
Bar fica no 64º andar da State Tower.
Na terça-feira, dia 10 de novembro, a matéria “Vista a parede com estampas”,
publicada na editoria Casa, página 07 chamou atenção por conta do caráter explícito de
estímulo ao consumo. O texto sugere a volta do papel de parede, “sucesso na década de 80”.
Depois de apresentar as vantagens do acessório, é sugerido o nome da loja Wallcovering, com
depoimento inclusive do gerente. O jornal sugere que o que há de mais moderno no momento
no mundo da decoração é o papel de parede; em seguida, depois de tentar convencer o leitor,
aparece no texto a loja que vende os citados papéis.
Segue o texto na íntegra:
Vista a parede com estampas
Depois de cair em desuso na década de 80, o papel de parede volta
renovado
Quem assistiu ao seriado americano “Dallas” sabe que na década de
70, a última
moda em matéria de decoração era revestir os ambientes com papel
de parede. O quarto de Pamela e Bobby Ewing, por exemplo, era
totalmente amarelo. A onda das páginas “estampadas” foi caindo em
desuso com os anos, com a chegada de paredes coloridas com tinta, o
minimalismo dos sofás e móveis brancos até que, agora, no ano 2000,
a ordem é ser livre, misturar estampas e vestir a casa para que ela
fique aconchegante. Os novos papéis de parede têm vantagens que os
antigos não tem, como por exemplo, não amarelam, não rasgam e
apresentam fácil manutenção. Outra tendência que acompanha a
chegada do novo revestimento é que não é preciso usar o material em
todas as paredes de um ambiente. “Colocar o papel em apenas uma
das paredes da sala, em meia-parede e até simulando um quadro tem
um efeito surpreendente e levanta o astral”, diz Antônio Ferreira
Júnior, arquiteto que usa o papel de parede na casa de seus clientes.
Para quem está interessado em adotar o papel de parede, é preciso
lembrar que além da compra do rolo, é preciso calcular no orçamento
o custo da aplicação. É sempre recomendável usar os serviços de um
profissional. Para Rodrigo Schimitd, gerente da loja Wallcovering,
um rolo de 50 cm por 10 cm pode sair por R$ 300, o que daria cobrir
104
uma área de 4 m2 a 5 m2. “Papel de parede é igual a moda. A cada
seis meses, recebemos coleções da Europa”, diz Schimitd.
Sem dúvida, o texto estimula o leitor-consumidor a adquirir um modelo para as
paredes da sua casa; ou seja, induz à compra, a um comportamento, indicando, inclusive, o
local para aquisição do produto.
No decorrer do texto são apresentadas as vantagens do papel de parede de hoje em
relação aos da década de 1980. Os de hoje, “não amarelam, não rasgam e apresentam fácil
manutenção”
Ao final, o jornalista alerta o leitor que “é sempre recomendável usar os serviços de
um profissional” e logo em seguida vem o nome da loja que trabalha com papel parede. A
matéria vem ainda acompanhada de uma foto cuja legenda é “papel de parede de zebra da
Wallcovering”.
Se a matéria apresentada acima tivesse um caráter menos publicitário, ou seja, menos
venda do produto, e mais jornalístico, ela teria de informar sobre a nova tendência do ramo da
decoração, citando algumas vantagens e desvantagens sem precisar informar necessariamente
a loja cujo papel é vendido.
Na mesma editoria Casa, tem ainda o texto intitulado:
“Grafitagem nos tapetes para crianças”. Da mesma forma que o exemplo anterior, o texto
estimula de forma ainda mais explícita, um apelo direto ao consumo. Sugere que “a
fabricante de tapetes By Kamy promove no sábado, 14, uma oficina gratuita de grafitagem
para crianças na porta de sua loja”. O texto elogia a iniciativa da referida loja e termina
informando o endereço da mesma, bem como o telefone. Segue a nota:
Grafitagem nos tapetes para crianças
A fabricante de tapetes By Kamy promove no sábado, 14, uma oficina
gratuita de grafitagem para crianças na porta de sua loja. Peças que
seriam descartadas irão se transformar em matéria-prima para a
arte. “Queremos que os pais também desenhem com as crianças, pois
o respeito é ensinado por eles próprios. Eles precisam estar atentos a
isso”, acredita Francesca Alzati, arquiteta e diretora de produtos da
By Kamy. A loja fica na al. Gabriel Monteiro da Silva, 1.147, tel.:
(11) 3081-1266.
Notas como as apresentadas acima recheiam os veículos da atualidade, não só
impressos, como também audiovisuais e internet. Mas acho que não poderia ser diferente, ou
seja, os meios não podem dissociar-se totalmente das notícias mercadológicas e publicarem
apenas informações jornalísticas de interesse público sem fins comerciais. No caso do Metro,
105
nosso objeto de estudo, as empresas anunciantes são fundamentais para a sua existência, pois
elas custeiam 100% das suas despesas.
Estamos na era da publicidade, na era do consumo. Consumo este que mudou de
significado com o passar dos anos. Antes consumir significava apropriação e uso de produtos
materiais, próprio das sociedades capitalistas industriais. Consumir significava gastar,
destruir, esgotar, extinguir, enfraquecer. O conceito dava sentido a um estado de
transformação no processo econômico e social do capitalismo.
Hoje, entretanto, o significado da palavra consumo foi ampliado: consumir significa
possuir, apropriar, ostentar, diferenciar, revelar.
A pós-modernidade pluralizou as formas e linguagens do consumo e passou
a empreender uma ação de mutação global. Derivado da mentalidade
capitalista da modernidade, consumir transformou-se na celebração totêmica
do livre mercado na pós-modernidade. O consumo transcende atualmente o
processo de transformação do capital e as condições do valor de uso e do
valor de troca. Estetizados, a economia, o mercado, a mercadoria e o
consumo viram metáforas. (...) Um objeto carrega em si símbolos, ícones,
fetiches, ideologias, fantasias, sensações, status, alegria, luxo, conforto. E
imanente ao objeto hoje a sua qualidade com um bem de sentido social. Não
e mais individuo, em sua esfera de identidade e personalidade, que
conferem significação ao produto. O objeto de consumo na sociedade, o
significante, já vem recoberto por um conjunto de atributos conferidos, não
pelo produto, mas pela sociedade em sua lógica de representações.
(ROCHA, 1995, p.32)
O mundo das mercadorias e seus princípios de organização, distribuição e consumação
constituem uma questão fundamental para se entender o mundo atual. E é claro que a mídia, o
espelho da sociedade, passou a refletir essa realidade do consumo com noticias que mais
parecem mercadorias.
Na quarta-feira, editoria Diversão, o Metro publicou a nota: “DJ David Guetta toca
hoje à noite no Pachá”. Segue na integra:
Quinto melhor DJ do mundo de acordo com a renomada revista “DJ
Mag”, o francês David Guetta toca hoje à noite no clube Pacha, em
noite de lançamento do seu novo álbum, “One Love”. Também se
apresentarão os DJs Rodrigo Ferrari e Rafael Yapudjian, residentes
da casa, além de Adriano Pagani, Diego Accioly e Gui Boratto.
No Pacha (r. Mergenthaler, 891, Vila Leopoldina, tel. 2189-3700). De
R$ 60 a R$ 120.
Aqui, alguns pontos chamam atenção, tipo sugestão de um estilo, de um
comportamento. Nesse momento percebe-se que o jornal se destina primeiramente ao público
106
mais jovem. Outro ponto que deve ser destacado é o fato do texto começar dizendo que o
referido DJ é o “quinto melhor do mundo de acordo com a renomada revista “DJ Mag”. A
matéria termina indicando o endereço da casa onde acontecerá o show, bem como telefone e
preço do ingresso que não é acessível às classes populares: custam de R$ 60 a R$ 120, o que
mostra que o jornal além de ser voltado ao público mais jovem - que curte as famosas pick-
up- é também destinado a quem possui maior poder aquisitivo, ou seja, as classes mais baixas
não representam o alvo principal do Metro.
Hoje o leitor-consumidor encontra-se submerso num imenso mundo de mercadorias
expostas em feiras, shopping centers e nos veículos de comunicação que são verdadeiros
mundos de sonhos constantemente renovados. Os indivíduos obtêm então, via mídia, um
leque amplo de sensações e experiências ao mergulhar no mundo de mercadorias. No entanto,
nem sempre vão consumi-las ou possuí-las diretamente, mas satisfazem-se em tê-las
disponíveis através das noticias que consomem através dos meios de comunicação.
Também na editoria Diversão, edição do dia 12 de novembro, o Metro circulou com a
nota: “Novas festas agitam noites de quinta-feira”. Segue abaixo:
Estreiam hoje duas novas opções de festas para a já badalada noite
de quinta-feira paulistana: a Danceteria, na Hot Hot, e a Tombo!, na
Astronete. A Danceteria, que inaugura a Hot Hot (r. Santo Antônio,
570, tel. 2985-8685), ocorrerá sob comando dos DJs Ricardo
Gonzalez e Márcio Vermelho e pretende apresentar as novidades da
dance music. Já a primeira Tombo!, na Astronete (r. Matias Aires,
183-B, tel. 3151-4568),terá na pick up o estilista Marcelo Sommer
(foto), João Fabra, Lais Pattak e Marcelo Elídio, tocando rock,
electro, pop, 80‟s e 90‟s.
No texto fica bem explícito o apelo direto ao consumo, ao definirem a noite paulistana
como badalada, agitada, apresentando, inclusive, as danceterias, com sua programação,
horário, atrações e endereços. Um estímulo claro às noitadas, ao agito. E para o leitor –
baladeiro sentir-se in, por dentro das novidades, na crista da onda, ele deve participar dessas
festas que acontecem na noite de quinta-feira na cidade de São Paulo.
Mais uma vez o texto apresentado como jornalístico, mas o que prevalece mesmo é a
propaganda, a promoção de eventos, o anúncio do produto. Sem dúvida um apelo ao
consumo.
A cultura estética estrutura as empresas jornalísticas em uniades de produção
e procesamento capitalista, submetida a ultalogica do mercado, da audiência
e do lucro, e potencialiadas para metaproducao, o metaprocessamento e a
metadistribuicao dos signos da publicidade. Nessa nova lógica, os produtos
da industria midiática indicam serem produzidos e vendidos com base nas
107
máximas do marketing ultrapos-moderno que por sua vez industrializa e
vende sabonetes, vassouras e guarda-chuvas, mas, mais do que isso, que
condiciona a supra-engrenagem da sociedade do consumo pelo marketing da
estética que industrializa e comercializa os gostos, os valores, os sentidos e
as consciências dos próprios consumidores. (MARSHALL, 2003, pp.16-17)
O caderno Metro +, que circula às sextas-feiras, vem recheado de dicas de compras.
Vão desde acessórios como pulseiras e relógios, até utilidades para casa, como jogo de cama
casal. Os produtos são oferecidos na página que assemelha-se a uma vitrine de um grande
shopping; eles já vêm com preços e os endereços, telefones e/ou sites das lojas.
E dentro do que contextualizamos, o Metro se enquadra bem na nossa terceira
categoria que busca identificar notícias jornalísticas mas que são, na verdade, um incentivo ao
consumo revelando assim a mutação que o jornalismo está vivendo, com a quebra dos seus
antigos paradigmas.
Este jornalismo perde o rumo e a identidade quando desmoronam os
alicerces da modernidade e fica desorientado quando o progresso do homem
começou a perder terreno diante da sedução mediática irracional e mágica
(TV) e da hegemonia das técnicas no fim do século. (MARCONDES
FILHO, 2000, p. 09)
Hoje podemos perceber com clareza a presença cada vez mais comum do capital nos
meios de comunicação, tanto impressos como audiovisuais e internet. E esse capital se faz
presente seja através de anúncios publicitários (em espaço próprio reservado à publicidade),
seja dentro das notícias – de forma implícita ou mesmo explícita.
O resultado da pressão do mercado e da competição exacerbada entre jornais tem sido
muitas vezes o rompimento do contrato entre a imprensa e o público, em que a verdade fica
relegada à posição não mais de princípio (o jornalismo tem como um dos seus princípios
divulgar sempre a verdade).
Agora o que parece interessar mais à imprensa é a verdade do marketing. Ou seja,
repórteres e editores muitas vezes rendem-se às regras do mercado e passam a divulgar
informações, digamos, mais lucrativas; informações essas que vão atrair leitores e
anunciantes. Enquanto isso, a verdade passa para o segundo plano e torna-se irrelevante no
processo de produção da informação.
Há muito tempo que a informação ultrapassou a barreira da verdade para
evoluir no hiperespaço do nem verdadeiro nem falso, pois aí tudo repousa
sobre a credibilidade instantânea. Ou, antes, a informação é mais verdadeira
que o verdadeiro pode ser verdadeira em tempo real – por isso é
fundamentalmente incerta. Ou, ainda, para retomar teoria recente de
Mandelbrot, podemos dizer que, tanto no espaço da informação ou no espaço
histórico quanto no espaço fractal, as coisas não têm mais uma , duas ou três
108
dimensões: flutuam numa dimensão intermediária. Logo, nada mais de
critérios de verdade ou de objetividade, mas uma escala de verossimilhança.
Lançada a informação, enquanto não for desmentida, será verossímel. E,
salvo acidente favorável, nunca sofrerá desmentido em tempo real; restará,
portanto, credível. Mesmo desmentida não será nunca mais falsa, porque foi
credível. Contrariamente à verdade, a credibilidade não tem limites, não se
refuta, pois é virtual. (BAUDRILLARD, 1997, p.60)
Os jornalistas vivenciando o dia-a-dia das redações dos veículos, ditados muitas vezes
pelas regras do departamento comercial e de marketing, acabam cometendo infrações em
nome da competição e da sobrevivência. Consequentemente, a seleção, produção e edição da
notícia ficam condicionados às regras do mercado.
O que é verdadeiro e o que é falso? Se a imprensa, a rádio ou a televisão
dizem que alguma coisa é verdadeira, isto se impõe como verdade...mesmo
que seja falso. O receptor não possui outros critérios de avaliação, pois,
como não tem experiência concreta do acontecimento, só pode orientar-se
confrontando os diferentes meios de comunicação uns com os outros. E se
todos dizem a mesma coisa, é obrigado a admitir que é a versão correta dos
fatos, a notícia “verdade oficial”. (RAMONET, 1999, p.59)
1.2.4 Discurso gráfico
O Metro é bem colorido, utiliza muitas fotos, textos curtos e muitas imagens. Seu
discurso gráfico contempla um layout enxuto, diagramação leve. Os anúncios são colocados
em espaços que se encaixam perfeitamente entre as notícias. Os recursos infográficos parecem
ganhar mais atenção que as notícias, tudo para ser absorvido rapidamente e atrair a atenção do
leitor. Sem falar nos enormes e variados anúncios publicitários que já ocupam muitos dos
pequenos espaços do jornal em formato berliner. O resultado é um jornal com mais imagens
que notícias.
Ciro Marcondes Filho (2000) destaca que todos os meios de comunicação, inclusive os
meios impressos, estariam utilizando os paradigmas próprios dos telejornais: a substituição da
verdade pela emoção, o expurgo da reflexão, o modelo esportivo de noticiário, a lógica da
velocidade, a popularização e a preferência do ao vivo.
Tais seriam os elementos desse gênero de programa televisivo que o tornam
fonte de fascínio e distração para os telespectadores e que não contribuem
para a produção de conhecimento, em que se entra em um processo de mero
reconhecimento das imagens. Além da TV, o vertiginoso impacto dos
computadores e da internet nas últimas décadas supervalorizaram a imagem
tornando-a padrão do mundo pós-moderno. É a imagem que vem ditando as
109
regras da existência: "o grande sistema 'socializador', a grande máquina
social dotadora de existência é a tela" (MARCONDES FILHO.1994, p.78).
A imprensa é, principalmente, o reflexo da sociedade contemporânea; é como se a
sociedade se olhasse no espelho. E as mutações sociais nessa primeira década do século XXI,
com o apogeu do livre mercado, instauram uma lógica de crise generalizada. A imprensa
perde sua identidade, seu papel e sua linguagem, e disputa sua sobrevivência numa sociedade
instável, marcada prioritariamente pelo universo audiovisual, pela ética da publicidade e pelos
interesses econômicos do modelo capitalista. Estamos na era da imagem.
A imprensa vive um paradoxo de ser um elemento chave do processo industrial
capitalista e ter de desempenhar sua missão de apresentar a verdade e defender o interesse
público. Embora se associe imprensa com verdade, constata-se que a imprensa hoje é principalmente
consumo, publicidade e empresa privada. E apesar de o jornalismo pregar que notícia deva ser uma
linguagem objetiva, vê-se que o jornal representa a versão dos interesses privados e do mercado. Os
jornais contemporâneos são submetidos à lógica do mercado, da audiência e do lucro, que passam a
ser produzidos e vendidos dentro da mesma lógica que vende qualquer outro produto.
Para Ciro Marcondes Filho (1989), a estratégia mercadológica aperfeiçoa o próprio
sistema de dominação, na medida em que domestica, submete as aspirações populares aos
seus modelos predeterminados de satisfação e consumo. “Essa prática contribui para a
despolitização do público e, com isso, dirige-se contra os interesses de emancipação e
autodeterminação do cidadão” (p. 36).
Inseridos nessa sociedade do consumo, os jornais da atualidade acabam
essencialmente impregnados por informações insossas que levam à neutralidade, a apatia e não
contribuem para a formação da consciência crítica do leitor-cidadão. A crítica e a as reportagens que
promovem a reflexão e a consciência têm dado lugar a amenidades com maior potencial de mercado;
com maior potencial de atrair a audiência e, claro, aumentar os lucros.
Outro fator decisivo para a imprensa hoje é a imagem. A concorrência entre o mundo
impresso e o audiovisual (que seduz os jovens e conquista a maior parte da publicidade) leva
a imprensa em geral a adotar a linguagem audiovisual. O jornal impresso da atualidade possui
muitas imagens, buscando com isso atrair e estimular a atenção dos leitores. Parece que
quanto mais o jornal for colorido e cheio de imagem, maior a eficácia do produto. Assim, as
notícias viram fragmentos, entremeados de fotos, infográficos, tabelas, olhos, ilustrações.
Muitos títulos da imprensa escrita continuam, por mimetismo televisual,
adotando características próprias da mídia catódica: maquete da “primeira
página do jornal” concebida como uma tela, extensão dos artigos reduzida,
personalização excessiva de alguns jornalistas, prioridade do local sobre o
110
internacional, excesso de títulos chocantes, prática sistemática do
esquecimento e da amnésia em relação às informações que já passaram, já
saíram da atualidade, etc. (RAMONET, 1999, p. 137).
Na nova era alguns jornais recheiam suas páginas com cores chamativas, muitas fotos,
ilustrações, infográficos, textos curtos em letras grandes, muitas notas, planejamento gráfico
arrojado. Outras empresas chegam a lançar jornais populares a preços extremamente baixos e
acessíveis à população, ou mesmo 100% gratuito, criando um vínculo de fidelidade graças ao
suporte financeiro dado exclusivamente pela publicidade e pelas estratégias de promoção.
O resultado de todas essas estratégias de marketing tem sido jornais cada vez mais
atraentes, mas com pouco conteúdo e com pouco compromisso com a informação e com o
interesse público.
Cientes da importância da sedução visual para atrair leitores, anunciantes e se
sobressair em meio à dura concorrência com outros meios (a internet é uma forte
concorrente), os jornais impressos investem um capital expressivo para obter tecnologia de
ponta, impressão em cores, rapidez na distribuição (gratuita como é o caso do Metro),
vantagens comparativas, paginação atraente, preços acessíveis ou mesmo a gratuidade,
agilidade.
Com a arte da palavra, coexiste no jornalismo impresso a arte gráfica. O
jornal é, antes de tudo, alguma coisa que se vê: do todo se parte para os
grandes títulos e para as ilustrações. Importantíssima a paginação. Desce-se,
depois, ao texto. Tal como num quadro: em primeiro lugar, o que
impressiona num quadro é a composição; depois o ritmo consequente; a
seguir, os elementos predominantes e as partes; finalmente, como soma da
percepção, o assunto. (KELLY, 1972, p. 22)
Os veículos de comunicação de massa eletrônicos tiveram um grande impulso a partir
da Segunda Guerra Mundial, forçando a comunicação impressa a rever sua estrutura
comportamental na veiculação de suas mensagens. Com essa nova ordem, o jornalismo
impresso diário precisou se adequar e alterar as regras do jogo. Esta permanente necessidade
de estar envolvido pela preocupação de sobrevivência fez com que a imprensa buscasse novos
caminhos.
Para o jornalista Alberto Dines, com o surgimento da televisão prognosticou-se a
morte do jornal diário. Contudo, ele esclarece: “O jornal tem características que a TV jamais
poderá superar: pode ser lido, relido e o seu conteúdo pode ser institucionalizado”. E ainda
acrescenta: “O jornal aproximou-se do veículo mais próximo, no caso a revista. A TV obrigou
o jornal diário a tornar-se seletivo” (DINES, 1986, pp. 69-70). A ordem era mudar para
competir e sair em busca de uma convivência pacífica com os chamados meios eletrônicos.
111
É no design da página e no grafismo18
que a diagramação assume papel de destaque. O
uso da atualizada tecnologia que abriu espaço para a explosão de cores nas páginas dos jornais
diários é o fator básico dessas mudanças e que deu sustentação ao novo jornalismo industrial
dos nossos dias.
O layout da página impressa é o processo primário que impulsiona essa
dinâmica. Carregado de intencionalidade e de códigos e léxicos específicos,
tem por finalidade básica cativar o leitor. É na etapa do design da página que
os recursos técnicos das Artes Gráficas e do marketing publicitário são
utilizados para seduzir o leitor. É a força do grafismo e sua carga de
intencionalidade traduzida em poder de sedução que vai determinar as regras
básicas que constroem o jornal diário. Nessa ponte é que o objeto concretiza
seu discurso formal. Códigos, símbolos e signos específicos formam a
síntese da página impressa. (SILVA, 2007, p.42)
No jornalismo impresso diário uma dessas determinantes técnicas é o planejamento
visual gráfico de uma página. Nele, a diagramação assume papel importante. É nessa etapa do
processo de edição que se concentra todo o segredo da linguagem e do discurso gráfico. Seus
elementos visuais e seu layout são os instrumentos de linguagem que determinarão o aspecto
morfológico das mensagens.
Uma página de jornal, revista, livro, ou de qualquer outro meio de
comunicação impressa é o resultado de um trabalho que envolve intenções e
ações dirigidas, ou seja, um processo de interação dinâmica entre o emissor e
o receptor. Esse processo corresponde à reunião de todos os elementos
técnicos dominantes e secundários, isto é, pela tipologia, ilustrações,
legendas, espaços em branco, o próprio texto escrito, organizados
hierarquicamente e utilizados pela linguagem gráfica planejada, que
direciona os caminhos que envolvem a leitura. (SILVA, 2007, p.53)
E não é por acaso que o Metro investe no seu discurso gráfico. Com um layout leve –
muitas imagens e pouco texto- o Metro acaba sendo um convite aos olhos do leitor. Percebe-
se o cuidado e esmero da equipe de diagramação do jornal no perfeito encaixe entre as poucas
notícias e os muitos anúncios publicitários. O cuidado deve ser principalmente em fazer com
que o jornal não pareça um panfleto publicitário e sim, um meio de comunicação jornalístico.
O resultado final é um jornal, com muitas publicidades, mas todas muito bem
dispostas de maneira que o Metro tem cara de jornal e não de um panfleto recheado de
anúncios. Um convite aos olhos, especialmente do leitor ocioso preso nos trens, ônibus e
metrô ou nos infinitos congestionamentos de São Paulo. “Como passa-tempo, ele tem
funcionado bem”, declarou Alice Nogueira, 18 anos, estudante e leitora do Metro. “
18
Grafismo – Modo de escrever as palavras de determinada lingual. No jargão jornalístico, são todos os
elementos utilizados na composição de uma peça impressa: títulos, textos, imagens, espaços em branco, cor, etc.
112
Com esse novo modelo e apresentação gráfica e fragmentação de conteúdos, o Metro
integra-se perfeitamente com as principais tendências do jornalismo contemporâneo,
estruturado no conceito de diagramação leve, que tem por objetivo acelerar, facilitar e criar
novos padrões de conforto para a leitura.
Diante das múltiplas possibilidades de escolha que se apresentam ao leitor sobre o que
deve ou não ser lido, criou-se com esse modelo diferenciado de paginação uma estratégia e
um ordenamento de leitura acelerada, provocada pela fragmentação dos textos e estimulada
pelo design sedutor que conduz os olhos do leitor para uma eleição individualizada do assunto
preferido. As capas do Metro, estruturadas em muitas cores e grafismo impresso atuam como
sugestivos e sedutores controles remotos ao alcance das mãos do publico leitor. “É um tempo
alterado de leitura em que o fator velocidade entra em perfeita sintonia com a técnica.”
(SILVA, 2007, p. 110.)
E para aplicar a quarta categoria de análise desta pesquisa, que consiste em analisar o
discurso gráfico do Metro, criamos as seguintes sub-categorias aplicadas aqui apenas à capa
do referido jornal. São elas: cores utilizadas, quantidade de fotos e quantidade de anúncios
publicitários. Acreditamos ser essa categoria de suma importância, afinal o grafismo e layout
são as importantes marcas do Metro.
1.2.5 Cores
Ao manusearmos o Jornal, percebemos imediatamente o arco-íris da capa, ou seja, as
multicores. Cada editoria vem destacada com uma cor forte, como verde-cana, azul turquesa,
rosa Pink e laranja. O nome do jornal vem bem destacado em um tom verde bandeira. Só a
cor vermelha que não tem expressividade no Jornal, já que o principal concorrente, jornal
Destak (também é gratuito e tem o mesmo perfil), é quase que completamente vermelho.
Durante a semana analisada, de 09 a 13 de novembro, o Jornal circulou com capas
exibindo as cores que já são de praxe: o verde-bandeira da logomarca; o rosa Pink da editoria
de Diversão; o laranja da editoria de esportes; o azul turquesa da Em foco; o azul escuro da
Mundo e o verde-limão da editoria de Economia.
Modesto Farina, estudioso da teoria das cores, explica que dentro do processo da
comunicação visual, o homem diante da cor recebe uma influencia tríplice: a de impressionar,
a de exercer e a de construir.
113
Quando a cor e vista, impressiona a retina. Quando e sentida, expressa,
provoca uma emoção. E é construtiva, pois tem um significado próprio, tem
valor de símbolo e capacidade, portanto, de construir uma linguagem que
comunique uma ideia.....na realidade, a cor é uma linguagem individual. O
homem reage a ela subordinado às suas condições físicas e às influencias
culturais. (FARINA, 1982, p. 27)
A concorrência com outros veículos impressos tais como revistas, e, principalmente,
com o advento da televisão em cores, a mídia impressa diária mudou comportamentos e
estabeleceu novos valores e padrões visuais, inclusive o uso da cor.
Os diagramadores de jornais precisaram se adaptar a essa nova realidade com o uso da
policromia no seu dia-a-dia de trabalho. O domínio técnico para essa atividade é fundamental
para que a produção gráfica se processe de modo harmônico no seu resultado final, que é a
página impressa.
Modesto Farina nos adverte que os costumes sociais são fatores que intervêm na
escolha das cores, e que derivando de hábitos estabelecidos durante longo espaço de tempo,
fixam-se atitudes psicológicas que orientam inconscientemente inclinações individuais. Para
ele, “a cor é uma realidade sensorial à qual não podemos fugir. Os vários processos de que se
ocupa o fenômeno do cromatismo alem de atuarem sobre a emotividade humana, produzem
uma sensação de movimento, uma dinâmica envolvente e compulsiva”. (FARINA, 1982,
p.101)
No Metro, a construção da primeira página bem colorida visa primeiramente
identificar o jornal com o seu publico consumidor. Percebe-se que os diagramadores
responsáveis pelo layout do jornal ao misturarem cores chamativas querem passar essa ideia
do movimento, do veloz, do atual, do instantâneo. Querem com isso cativar o jovem, seu
público-alvo.
Portanto, a difusão e o uso da cor, não apenas no Metro, mas pelos veículos de
comunicação de massa impressos de um modo geral, não se limitam apenas ao valor
decorativo, nem, meramente estético. Não deve ser encarada apenas como um recurso, mas,
acima de tudo, como um procedimento de linguagem e de expressão.
É no moderno design e na atualização tecnológica que o jornalismo impresso
diário parte em busca de novos caminhos, segmentando assuntos específicos
em cadernos e favorecendo o trabalho do marketing publicitário, num
procedimento semelhante ao conquistado pelas revistas e pela própria
televisão. A sedução visual é o suporte para esse novo tipo de marketing
jornalístico, garantindo a sustentação econômica das corporações
jornalísticas, quando provoca novos estímulos de leitura. (SILVA, 2007, p.
74)
114
Atraído por esse jogo sedutor, o leitor é envolvido pela página impressa sem perceber que se
inseriu em um complexo mercadológico. Essa é a força do discurso gráfico enquanto linguagem. É
quando um meio se transforma em mensagem.
1.2.6 Fotos
No jornalismo impresso, a fotografia é empregada como um recurso de narrativa
jornalística. Segundo Canavilhas (1999), “a imagem colhida no local do acontecimento (...) a
verdade da imagem recolhida no local empresta à notícia uma veracidade e objectividade
maior do que a simples descrição do acontecimento” (CANAVILHAS, 1999, p.45).
A imagem jornalística deve prescindir de uma legenda ou um texto escrito cuja
função é contextualizadora. É regra no fotojornalismo, indiferentemente do suporte, que a
imagem produzida seja legível e compreensível. No caso da imagem informativa, é evidente
que esta desperta curiosidade e incerteza e, por isso, o espectador/leitor recorre ao comentário
verbal.
Toda a representação da imagem informativa se constrói em torno de um
discurso retórico com as suas próprias regras de funcionamento (mostrar a
causa a partir do efeito, mostrar a parte pelo todo, produzir redundância em
detrimento da quantidade de informação semântica) (VILCHES, 1985, p.
175)
No Metro a fotografia é um recurso bastante utilizado. Desde a capa se veem muitas
imagens. Por ser um jornal lido geralmente em movimento, ou seja, durante o trajeto do leitor
de casa ao trabalho ou vice-versa, dentro dos trens, ônibus, metrô ou nos carros presos nos
intermináveis congestionamentos, a imagem acaba sendo mais atraente aos olhos do
apressado leitor. De acordo com o ex-editor do Metro, Ricardo Anderaos (informação
verbal)19
esse é um dos motivos do jornal investir muito em imagem. “Nosso leitor está em
movimento, está circulando e não tem tempo a perder com textos longos e poucas fotos. Por
isso trabalhamos com textos escritos enxutos e priorizamos as fotos. Nosso layout (Metro) se
assemelha ao layout da web”.
Na edição se segunda-feira, dia 09 de novembro (ver figura 1), o Metro circulou ainda
mais colorido; além das cores habituais, destaque para uma fotografia super colorida de uma
coleção de livros em homenagem aos 20 anos da queda do muro de Berlim. Na parte bem
19
Ricardo Anderaos deu esse depoimento durante palestra sobre “ títulos gratuitos” no café Intercom da livraria
Saraiva.
115
superior da página, de um lado do nome do jornal, uma foto da atriz Luana Piovani e do outro
uma da cantora Madonna. Ainda na capa uma foto do jogo entre São Paulo e Palmeiras,
ocorrido no domingo anterior e uma outra foto, da dupla Xitãozinho e Xororó.
Ao todo são cinco fotografias intercalando as mini-chamadas das editorias: Em foco,
Diversão, Esportes e Economia. Não teve chamada da editoria Mundo. No centro da página, a
chamada da matéria principal do jornal, intitulada “65% dos tabagistas começaram a fumar
antes dos 15 anos”.
116
Figura 1
Na terça-feira, dia 10 de novembro, o leitor recebia o jornal e ganhava uma flanela de
limpeza da “Scott”, de brinde.
A capa veio bem colorida (ver figura 2), com textos curtos e uma grande foto de uma
manifestação em frente à Universidade Uniban, era um protesto contra a expulsão da aluna
Geise Arruda, envolvida em um escândalo nacional por ter sido agredida por usar um vestido
curto e bem justo ao corpo.
117
Figura 2
Nessa edição o Metro circulou com cinco fotografias na capa, sendo uma bem no alto
da página da atriz Ashlee Simpson, ao lado da logomarca do nome Metro. Uma foto da
cantora Madonna. As duas fotos citadas foram chamadas da editoria Diversão. Uma foto do
presidente Lula (chamada da editoria Em foco); uma grande foto ocupando todo o centro da
página, do protesto da Uniban (matéria principal). No canto inferior uma foto de Mikhail
Kalashnikov, inventor do “fuzil AK-47”. Esta última foto é uma chamada da editoria Mundo.
Na quarta-feira, dia 11 de novembro (ver figura 3), o Metro trouxe uma foto de página
inteira de uma pane elétrica que atingiu vários estados brasileiros e também alguns países da
América Latina, gerada por um problema na usina de Itaipu. Bem no alto da capa, ladeando o
118
logotipo do jornal, uma foto da cantora Barbra Streisand e outra da atriz Calista Flockhart.
Ambas chamadas da editoria Diversão. Tem ainda uma chamada da editoria Mundo com foto
de um jovem que ganhou 8 milhões de dólares no pôquer. No canto inferior da página há
ainda uma foto da cantora Madonna, chamada da editoria Diversão, e uma outra chamada da
editoria Em foco com uma foto de um automóvel num pátio de uma montadora. Ao todo são
seis fotografias.
Figura 3
Na quinta-feira, dia 12 de novembro (ver figura 4 e 5), o jornal circulou com 30
páginas e uma capa-falsa com um anúncio da loja de departamentos “Ponto Frio”. No alto da
primeira página, destaque para uma grande foto do apagão causado por uma pane elétrica na
119
Usina de Itaipu. Tem ainda uma foto da atriz Juliana Paes, chamada da editoria Diversão;
uma foto ocupando todo o centro inferior, do jogo do Sport e Palmeiras, chamada da editoria
de Esportes e uma outra foto da editoria Diversão com a legenda: “ Bonecos dos Os gêmeos
invadem o Anhangabau”.
Figura 4
120
Figura 5
Sexta-feira, dia 13 de novembro (ver figura 6), última edição analisada, o Metro
circulou com 30 páginas, uma capa falsa da montadora de veículos “Ford”. Na quinta e sexta-
feira, quando jornal sai com 30 páginas, ele vem muito mais colorido e imagético. Isso se
deve à grande quantidade de anúncios, nos mais variados estilos.
Nessa edição, o jornal trouxe na capa cinco fotografias, sendo assim distribuídas: duas
bem no alto, ao lado do nome Metro, uma da cantora Madonna e e outra da também cantora
Ana Carolina, chamada da editoria Diversão. Outra foto, chamada do caderno Metro +, com a
legenda “Veja como usar minissaia sem criar polemica”. A foto principal, que ocupa todo o
centro da página, é de um confronto entre policiais e camelôs na Rua 25 de Março. Na parte
121
bem inferior, uma foto do filme “A era do gelo 3”. Também uma chamada da editoria
Diversão.
Figura 6
1.2.7 Anúncios publicitários
A introdução de anúncios publicitários nas páginas dos jornais a partir do século XIX
transforma radicalmente o cenário da imprensa e inaugura a terceira era na história da
imprensa: a fase da publicidade. O início da comercialização de espaços para anunciantes
permitiu que as empresas reduzissem custos de produção e diminuíssem sensivelmente os
122
preços dos exemplares. “Esse barateamento do jornal e o aumento proporcional do número de
leitores levaram finalmente os jornais às massas, desencadeando uma nova etapa da grande
revolução social burguesa iniciada pela Renascença e impulsionada decisivamente pela
Revolução Industrial” (MARSHALL, 2003, p. 83).
O novo significado assumido pela publicidade na sua relação com a imprensa deve ser
compreendido também no quadro da evolução econômica, social, cultural e
das mentalidades que acompanha o nascimento e o desenvolvimento da
revolução industrial. Assiste-se então ao aparecimento da produção em série
e ao aumento dos produtos no mercado. (CORREIA, 1997, p.108)
Com a introdução da publicidade em suas páginas, o jornal nunca mais seria o mesmo.
A publicidade veio mudar para sempre o processo de comercialização e afetou todo o
processo jornalístico. A imprensa da nova era é marcada pela influência do modelo de
financiamento publicitário, seja em suas rotinas de produção, circulação e de organização,
seja em suas múltiplas técnicas de fazer jornalístico. O “muro” que antes separava a redação
do departamento comercial ruiu. Hoje os dois departamentos caminham lado a lado e o
resultado disso é um jornal jornalístico-publicitário: nem só jornalismo, nem só publicidade.
O Metro parece ser um exemplo desse tipo de produto.
Ao longo dos anos, o jornalismo cada vez mais passou a ficar dependente da receita
publicitária. O casamento entre jornal e anúncio é tão perfeito que hoje é quase impossível
encontrar um jornal que não sobreviva quase que 100% dos anúncios publicitários.
O Metro, objeto de estudo dessa pesquisa, pelo fato de ser gratuito (não possui venda
em banca e nem assinantes) é totalmente dependente da publicidade. Ou seja, sem anúncios,
ele não circula. E por constatarmos a importância que a publicidade exerce nesse veículo que
achamos que uma breve análise do jornal para avaliarmos a presença dos anunciantes seria
bastante pertinente.
Sendo assim, analisamos a capa do Jornal Metro entre os dias 09 e 13 de novembro,
buscando com isso, quantificar esses anúncios e analisando o lugar que eles ocupam na
primeira página.
Na segunda-feira, dia 09 de novembro, o jornal não publicou nenhum anúncio de capa.
Já na terça feira, 10 de novembro, o Metro trouxe na primeira página um anúncio da linha de
limpeza “Scott”. Ao receber o jornal, o leitor ganhava uma flanela da “Scott”.
Na quarta-feira, 11 de novembro, o Metro, a exemplo da edição de segunda-feira, não
trouxe nenhuma publicidade na capa.
123
Já na quinta-feira, dia 12 de novembro, o jornal circulou com uma capa falsa da rede
de eletrodomésticos “Ponto Frio”. Nesse dia o jornal teve 30 páginas (de segunda à quarta ele
tem apenas 16 páginas) e uma enorme quantidade de anúncios. Mas na primeira página não
houve anúncio.
Na sexta-feira, dia 13 de novembro, o Metro também circulou sem nenhum anúncio na
capa. Teve a capa-falsa, a exemplo da quinta-feira, só que agora da montadora de veículos
“Ford”. Com 30 páginas, o Metro da sexta-feira tem uma tiragem de 300 mil exemplares –
nos demais dias são 150 mil.
Portanto, surge aqui um hiato: se por um lado, o Metro é um produto jornalístico-
publicitário, recheado de notícias superficiais, com linguagem publicitária e que fazem um
apelo direto ao consumo – como vimos acima -, por outro lado ele não costuma exibir
anúncios logo na primeira página (apenas na terça-feira, com o anúncio da “Scott” bem no
alto da página). Exceto as capas falsas observadas nas edições de quinta e sexta-feira.
E por depender totalmente da publicidade para existir esperávamos uma maior
quantidade de anúncios, ou seja, uma primeira página com mais publicidade, afinal, é ela que
custeia todo o jornal.
1.2.5 Linguagem da internet/palavras em inglês/interface virtual
Em tempos atuais, ao observarmos os diários impressos e os noticiários eletrônicos
encontramos estruturas visuais bastante semelhantes. Isso ocorre porque o padrão gráfico
disseminado a partir do uso cada vez mais frequente e indispensável dos computadores, tem
sido apropriado pelos designers gráficos da atualidade, com o objetivo de facilitar a leitura e
atrair o consumidor da informação impressa.
Os meios de geração, reprodução e apresentação dos signos visuais mudaram
radicalmente num intervalo de tempo relativamente pequeno, causando
importantes transformações no modo de execução de um projeto gráfico.
(SOARES, 2002, p. 82)
E nossa quinta e última categoria de análise visa identificar no Metro esses traços e/ou
características que se aproximam do virtual. Por ser um jornal da nova era, com a cara dos
novos tempos - design arrojado, bem urbano, dinâmico, colorido, notícias curtas, feito para
um público jovem, que se informa pela internet – o Metro carrega consigo importantes
elementos (facilmente identificáveis) da interface virtual.
124
Não é exagero afirmar que as páginas do Metro possuem um apelo visual muito
próximo daquele oferecido ao usuário de internet. São elementos como caixas coloridas, fotos
de grandes proporções (já discutimos na categoria “Discurso gráfico” apresentada
anteriormente), retrancas destacadas por sinais e símbolos que já caíram no domínio daqueles
que passam grande parte do dia diante de um computador.
Na forma como são construídas, essas interfaces gráficas do jornal Metro são uma
representação visual do sistema hipertextual e multimídia. Algumas matérias hoje utilizam
recursos com infográficos, boxes com conteúdo extra e marcas de leitura que remetem a
arquivos sonoros e audiovisuais disponíveis no próprio site do jornal.
No que toca ao desenvolvimento de interfaces jornalísticas, com o
surgimento de novas plataformas para usos da internet a tendência é que
tenhamos uma diversificação da forma de acesso à informação jornalística
em disseminação hipermidiatica. (SOARES, 2002, p. 87)
Além desses recursos materiais que estão explícitos no layout do Metro como também
em outros impressos, Teixeira (2002) chama atenção para os conceitos de usabilidade e
convergência, comuns no ambiente virtual da noticia e que estão sendo levados para a
formatação dos projetos gráficos dos jornais da mídia impressa. “Usabilidade gira em torno da
eficiência interativa. Leva em consideração o conhecimento adquirido pelo usuário para que
ele possa lidar com as ferramentas da interface”. (TEIXEIRA, 2005, p.04)
É a simplificação dos usos e dos elementos visuais disponíveis, ou seja, uma
formatação consciente do conteúdo, a fim de facilitar o acesso à leitura.
A interface procura mediar a comunicação por através de estruturas visuais
comuns e intuitivas, visto que são representações materiais de atividades
realizadas pelo ser humano; enquanto que a usabilidade pretende tornar o
mais simples, ágil e compreensível esse contato do individuo com a maquina
e , no caso em questão, com os impressos. (REIS, 2007, p.12)
Uma análise mais criteriosa do Metro nos permite perceber que suas interfaces
reproduzem ou apreendem aspectos e conceitos do meio digital, tanto na escolha dos traços
geométricos, quanto na disposição dos elementos visuais, como fotos, ilustrações e tipografia.
Cada ícone gráfico possui uma função de leitura, pensada dentro de um leque de opções das
formas mais populares e compartilhadas na comunicação cotidiana, que nos dias atuais é cada
vez mais mediada por computadores.
125
O Metro tem um visual arrojado, dinâmico, logomarca e tipografia com um traço
semelhante às fontes tradicionalmente usadas em monitores de equipamentos eletrônicos.
Constatamos ainda que muitas expressões utilizadas no ambiente virtual – expressões
estas que em sua grande maioria provêm da Língua Inglesa – têm sido vistas com frequência
em veículos impressos.
O Metro, por exemplo, por ser um jornal internacional – circula em 17 países e em
vários idiomas – faz uso de muitas palavras em inglês sem preocupar-se em traduzi-las. Em
sua grande maioria são palavras comuns na rede mundial de computadores.
E por ser um jornal voltado ao público jovem, que se informa basicamente pela
internet, que não tem tempo ou hábito de ler os jornais impressos da chamada mídia
tradicional, o Metro tem uma linguagem acessível a esse público.
Essa linguagem é composta por muitas palavras utilizadas na internet, tais como,
deletar, web, you tube, orkut, google, home page, sem falar nas palavras em inglês que não
são traduzidas para o português. Parte-se do princípio que o leitor tem conhecimento da língua
inglesa.
E com esse perfil, utilizando palavras comuns na rede mundial de computadores, o
Metro atrai anunciantes que visam alcançar também o público-jovem. Um exemplo observado
nos dias em que analisamos o jornal foi a presença, durante toda a semana, de um anúncio da
“D-link”, uma empresa de internet rápida. Com o slogan “Coloque movimento em sua vida” o
anúncio traz a foto de um jovem dando um salto em movimento. O anúncio possui muitas
palavras em inglês, que também não foram traduzidas, tais como as que compõem a frase:
“Building Networks for people”.
Ao analisarmos o jornal, edição de segunda-feira, dia 09 de novembro, em busca de
elementos virtuais comuns em suas páginas, encontramos a seguinte nota, editoria Diversão.
Segue na íntegra:
“No Doubt vai processar produtora de „Band Hero‟
A banda liderada por Gwen Stefani diz que não sabia que seus avatares poderiam ser
utilizados em músicas de outros artistas do jogo e vai entrar
com um processo contra a empresa Activision”.
A nota acima não é esclarecedora. O leitor fica sem saber o que seria No Doubt. Pode
ser uma banda de música. Na nota também não fica claro o que é Band Hero. Pode ser um
126
seriado de TV, um filme, um clipe. Avatares também não é explicado na nota. Só um leitor
conhecedor do assunto compreenderá.
Esse tipo de notícia permeada de dialetos web, na língua inglesa e sem tradução, é
bastante comum no Metro. Durante toda a semana analisada encontramos notícias com essas
características do tipo superficiais, planas e apressadas e ainda permeadas de elementos
virtuais.
Só um leitor que tem domínio da língua inglesa e que também já sabe do que trata o
assunto da notícia vai sentir-se bem informado. Na terça-feira, a seguinte nota chamou
atenção:
“Nova canção de Lady Gaga já está na web
A canção “Dance In The Dark”, novo single da cantora Lady Gaga, já pode ser ouvida em
alguns sites musicais na internet (...)”
Aqui novamente a presença da linguagem da rede mundial de computadores. A
palavra single deveria ter sido traduzida, já que o jornal se destina a um público diversificado
de leitores.
Na edição de quarta-feira encontramos uma matéria na editoria de Economia, página
10, intitulada: “McLaren faz recall de carrinhos de bebê após amputações nos EUA”. Sabe-
se que recall é uma palavra bastante usada e conhecida de nós brasileiros. Mas existem
pessoas que lêem o Metro e não sabem o que significa. No texto em nenhum momento a
palavra é traduzida, ou mesmo é mencionado que os carrinhos serão trocados ou coisa
parecida. Por se tratar de um assunto importante (o título da matéria fala em amputação) as
informações deviam ser mais claras, inclusive com a tradução da palavra recall.
Na quinta-feira foi publicada a seguinte nota:
“Google Maps já permite peregrinação por Santiago de Compostela
Serviço Street View se estendeu a várias atrações da Espanha, como
Alhambra, catedral de Toledo, aqueduto de Segóvia, mesquita de Córdoba”.
Aqui observa-se muitas palavras sem tradução, o que faz com que a nota torne-se
incompreensível para muitos leitores do Metro. Google Maps, Serviço Street View deveriam
ter sido traduzidas. Novamente quem escreveu não teve a preocupação de oferecer uma
informação clara, concisa e capaz de ser compreendida por um amplo e variado público-leitor.
127
Talvez se essa nota estivesse publicada em um veículo on-line fosse mais clara; mas em um
suporte impresso fica um tanto quanto inadequada.
Em uma matéria publicada na sexta-feira, dia 13, editoria Diversão, página 22,
encontramos alguns sinais da forte presença da linguagem on-line no Metro. Lá pelo meio do
texto o autor diz que (...) “O line up inclui sets de nomes badalados do cenário eletrônico
(...)”.
Essa nota é para quem conhece o cenário eletrônico ou navega muito na rede mundial
de computadores. Mais uma vez o texto não permite ao leitor um entendimento mais
aprofundado do conteúdo.
1.2.5.1 Elementos da internet
No que se refere aos elementos do layout semelhantes aos utilizados na rede mundial
de computadores, identificamos no Metro – e achamos importante destacá-los aqui – alguns
aspectos visuais gráficos que fazem das suas páginas um convite ao clique. São eles: barra
verde-limão para identificar a editoria Economia e boxes também em tom de verde para
anunciar matérias. Destaque para os títulos das duas notas bem no alto da página também na
cor verde-limão ( ver figura 7).
Figura 7
128
As caixas coloridas com pequenos inter-títulos em letras minúsculas e arredondadas
são muito semelhantes aos links dos webjornais, para transmitirem ao leitor a sensação de que
ele está “acessando” aquela notícia quando se dirigir às páginas indicadas.
Assim como ocorre na página de Economia, nas demais editorias - Em foco, Mundo,
Esportes e Diversão – na parte bem superior, veem notinhas – às vezes apenas uma –
localizadas „dentro” da barra, bem ao lado do nome que identifica a editoria (ver figura 8).
Figura 8
Em todas as páginas do Metro, sem exceção, vem impressa a informação:
www.metropoint.com (ver figura 9). Este é um exemplo claro que mostra que o referido
periódico impresso estabelece um diálogo direto com a sua versão on-line, que deveria
funcionar como espaço de complementação da informação publicada no papel. Mas não é o
que acontece. No site tem exatamente as mesmas informações da versão impressa. O
www.metropoint.com é para estimular o leitor a acessar outras versões do Metro de vários
países onde ele circula.
Figura 9
A própria logomarca do Metro já é uma referência à interconexão mundial, ao mundo,
ao global e, ao virtual (ver figura 10). O “o” do nome Metro é representado por uma figura em
forma de “mundo‟, de uma “teia”. passando a ideia de um jornal global, interligado com o
mundo. Afinal ele é realmente um jornal internacional que existe em 17 países e em vários
idiomas.
129
Figura 10
“mais detalhes no www. cinemark.com.br”. Consideramos a frase ao lado como a
materialização do hipertexto no papel.
A frase acima está bem no finalzinho da matéria intitulada “cinemark tem hoje filmes
nacionais a R$ 2”, edição de segunda-feira, dia 09 de novembro de 2009, editoria “Diversão”,
página 10.
Essa prática de indicar o site para complementar as informações fornecidas nas
matérias é bastante comum no Metro. Essa indicação do site é colocada de uma forma que
lembra o hipertexto20
e o leitor tem a imediata e repentina sensação de estar diante da tela de
um computador.
Enfim, todos esses ícones facilitam a navegação do leitor pelas páginas do Metro,
funcionando “como o cérebro humano no ato de pensar, em que diversas “janelas” mentais
são abertas durante a leitura e associações das mais diversas são realizadas. É a externalização
dos elementos cognitivos para dentro da tela do computador (REIS, 2007, p. 22)
20
O hipertexto consiste em arranjar o material noticioso em um formato multilinear, com a inserção de links nas
palavras-chaves do texto, que remetam a outros textos, vídeos, ou fotos, ou áudios. Segundo Luciana
Mielniczuck (2002, p. 11), “a narrativa no hipertexto é apresentada como um texto pulverizado”.
130
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Há três anos quando decidimos estudar os jornais gratuitos, em especial o Metro,
procuramos um termo que melhor definisse esse tipo de jornal; porque simplesmente chamá-
lo de gratuito não o define completamente. Não se trata de um gratuito como os que
costumamos ver por aí; mas um gratuito com perfil urbano, design atraente, diagramação
arrojada, textos curtinhos, muitas fotos, feitos para serem lidos no trajeto de metro, ônibus ou
dentro dos automóveis nos longos congestionamentos das grandes cidades como é o caso de
São Paulo, etc.
Então comecei a chamá-lo de “jornal de minuto”, uma referência ao tempo, a
velocidade e a instantaneidade presente nesse tipo de veículo, lembrando em muito a internet.
Mas não consegui sustentar esse termo, ou seja, não achei nenhuma pesquisa, nenhum autor
e/ou obra que desse suporte ao termo “jornal de minuto”. Foi aí que comecei a chamá-lo
simplesmente de “jornal gratuito”. Até que conheci o livro “O jornalismo na era da
publicidade”, do jornalista Leandro Marshall. Lá ele faz referência ao termo “cor-de-rosa”,
utilizado na obra de Howard Kurtz (1993) “Media Circus: the trouble with America´s
newspaper”. Marshall (2003) explica que o termo “cor-de-rosa” é uma expressão que, “além
de caracterizar o caráter de neutralidade dos jornais contemporâneos, faz um contraponto ao
chamado “jornalismo amarelo”, surgido no século XIX, quer ocupava e ainda ocupa muitas
das páginas de publicações periódicas com notícias sensacionalistas” (p.58).
E não é apenas o Metro que se encaixa bem no rótulo de cor-de-rosa; outros veículos,
tanto do rádio, imprensa, TV ou internet podem ser classificados de cor-de-rosa. E o que
difere o Metro e os jornais populares ou da imprensa amarela, é justamente o estilo das
notícias abordadas. É claro que existem várias outras diferenças; mas os assuntos trabalhados
por cada tipo de veículo é o principal ponto de diferença. No Metro o mundo é cor-de-rosa,
priorizam-se notícias boas, cult, comportamento, estilo de vida, etc. Enquanto que nos jornais
amarelos o mundo é muito mais cruel: crimes, estórias espalhafatosas, apelativas.
Dessa forma, acredita-se que o gênero cor-de-rosa, caracterizado pela sintetização de
uma espécie de produto jornalístico-publicitário, é decorrência das mutações no campo da
informação e da comunicação e está presente – como falamos acima - na mídia de massa
impressa e eletrônica e aparece em espaços noticiosos de todo o mundo.
131
Ao lado dos gêneros informativo, opinativo e interpretativo, o gênero cor-de-
rosa apresenta variações, embora sofra permanentemente mutações que
alteram sua forma e conteúdo. De modo geral, as suas diversas
manifestações estão diluídas nas estruturas léxicas, gramaticais, discursivas,
éticas e estéticas no universo jornalístico e formatam um produto pós-
moderno singular, muito distante dos paradigmas clássicos da imprensa”
(MARSHALL, 2003, p. 121)
O Metro, por ter suas páginas recheadas de muita publicidade – para ser gratuito sem
nenhum custo ao leitor ele é bancado 100% pelos anunciantes – é frequentemente acusado de
ser, sobretudo, um produto publicitário antes que um veículo eminentemente jornalístico.
Mais que isso, ao valorizar e dar amplitude a questões do universo da publicidade, o
Metro, bem como os jornais que seguem o seu estilo, acaba disseminando entre seus leitores
uma ética de valorização da publicidade, distorcendo completamente sua função primeira
como veículo de informação jornalística.
As facilidades amparadas pela legislação para que se abra uma empresa jornalística e a
falta de órgãos que fiscalizem o compromisso dos veículos com o interesse público e com os
princípios do jornalismo permitem que existam hoje no mundo inteiro jornais apenas com o
fim publicitário.
Esses jornais já são sucesso na Europa e EUA e estão chegando com força total no
Brasil. Eles desempenham o papel para o qual foram criados, ou seja, são extensões dos
interesses do poder econômico, que retratam as noticias que mais facilitam e potencializam
seu interesses.
Como os leitores, em sua maioria, desconhecem o processo do newsmaking
jornalístico, acabam atribuindo credibilidade e legitimidade às informações desses veículos
segmentados. O que prevalece é o senso comum; não existe um senso crítico capaz de filtrar e
identificar as notícias veiculadas apenas para promover e convencer.
Essas publicações no estilo do Metro muitas vezes disputam em condições de
igualdade com jornais ditos “legítimos”, ou da mídia tradicional, roubando importantes fatias
de leitores e distorcendo a compreensão da sociedade civil sobre o que é jornalismo e qual seu
papel.
Essa categoria de jornais transgênicos publica, em muitos casos “noticias”,
pretensamente jornalísticas, apenas como contingências do negocio, afinal
de contas, por essa mentalidade o jornal por mais publicitário que seja tende
parecer jornalístico para conseguir chegar ate ao consumidor que existe em
cada leitor. (...) Existe, inclusive, um segmento de jornais feitos tão-somente
com publicidades, que, pela flexibilidade e relatividade pós-modernas,
cumprem a disfunção de informar publicidades (MARSHALL, 2003, p. 137)
132
O Metro, como bom exemplo de jornal da nova era, incorpora suas marcas: textos
curtos, manchetes garrafais, infográficos, retrancas, drops, tabelas, fotos grandes e
chamativas, quadros explicativos, variedade de cores e recursos visuais múltiplos. Tudo para
atrair e fixar a atenção dos leitores.
O principal objetivo desse estilo visual é potencializar o jornal como produto de
mercado e estabelecer uma estratégia de marketing diante da concorrência das empresas que
disputam o mesmo negócio e o mesmo nicho. A meta dos designers é provocar,
principalmente, impacto visual, destacando o jornal entre os demais e atraindo anunciantes e
leitores.
Os jornais da atualidade incorporaram de uma vez por todas a ideologia publicitário-
mercadológica, resultante do processo de mutação dos paradigmas do jornalismo. O estilo
jornalístico do Metro incorpora em “gênero, número e grau” a linguagem e o discurso da
racionalidade econômica da sociedade.
Na sociedade contemporânea, a informação, a noticia, o jornal e a imprensa
em geral são estetizados, marketizados e mercadorizados. A realidade do
lugar à estética da realidade. O esforço da objetividade do lugar à estética da
subjetividade. A apresentação torna-se uma representação protética e
artificial. As mutações, enfim, são generalizadas e subvertem as lógicas da
comunicação e da informação. O ultramercado, mediante sua ideologia
publicitária – mercadológica - liberal, altera o DNA da realidade, em sua
essência e em sua aparência, e produz uma estética pós-moderna, transgênica
e cor-de-rosa, que domestica os espaços, os corpos, os sentidos e as
tangencias, bem como sintetiza uma forma de “Renascimento Imagético”
(MARSHALL, 2003, p. 145)
Segundo Belarmino Costa, a estetização da mercadoria notícia transcende a própria
exposição do conteúdo em si, já que
(...) uma manchete no jornal, as infografias e utilização de fotos, a
computação gráfica que permite simulações na TV, o recorte, a montagem e
a exposição de imagens, que se agregam „a matéria-prima informação, são
condições para expor „a venda e a circulação da mercadoria noticia (2000, p.
153).
Ao analisarmos o jornal Metro concluímos que ele pode sim ser resultado do processo
de mutação dos paradigmas do jornalismo no século XX, que está inscrito dentro da moldura
cultural das mutações dos paradigmas da era da modernidade.
O jornalismo assumiu um papel-chave na sociedade moderna e tornou-se o código
universal que contribuiu para viabilizar a profunda transformação social, econômica e política
133
provocada pela irrupção dos paradigmas da modernidade, que reformou radicalmente a
dinâmica social.
Portanto, hoje, quando os paradigmas da modernidade começam a entrar em crise a
partir do século XX dando inicio a um processo de mutação social, o jornalismo também entra
em mutação e/ou em crise.
O jornalismo é, sem duvida, uma das instituições básicas do mundo
moderno, surgido desta mentalidade hierárquica, sequencial e cronológica,
típica da etapa alfabética ou livresca, fase importante e chave histórica da
humanidade. O discurso jornalístico é uma modalidade de discurso moderno.
A pergunta que viemos arrastando é a seguinte? Uma vez substituída a
tecnologia do alfabeto e da imprensa pela tecnologia eletrônica, poderá
subsistir esta instituição chamada jornalismo ou ela terá que submeter-se a
uma reforma radical de suas essências: (ALBERTOS, 1997, p.37)
O jornalismo representa assim, nessa perspectiva da transição da modernidade para a
pós-modernidade, um dos pilares que caracterizam a sociedade contemporânea, marcada pela
razão técnica e instrumental, pelo tempo, velocidade e instantaneidade.
E na sociedade atual, a hegemonia e o poder da publicidade são consequências do
estado de liberdade proporcionado pela pós-modernidade. Os princípios da globalização, da
desregulamentação, da liberdade total, do capital e das leis de mercado que regem os dias
atuais permitem à publicidade uma certa supremacia diante de outras linguagens, em especial,
à jornalística. Dessa forma, a publicidade transforma-se numa importante ferramenta que
serve, entre outros fins, para libertar, seduzir, convencer, conduzir e persuadir.
Diariamente, durante quase às 24h do dia, o cidadão comum é bombardeado pelos
apelos publicitários. Tanto no trabalho como em casa o indivíduo sempre está sendo seduzido,
convencido a adquirir algum produto, a agir de determinada maneira, conhecer determinado
lugar e/ou pensar de modo diferente. Sendo assim, na atualidade, a publicidade acaba se
desenvolvendo e tornando-se um dos principais sustentáculos da lógica capitalista da nova
era.
Com tudo isso, a publicidade faz parte então da ética ditada pelo mercado nos tempos
atuais, da pós-modernidade. Já o jornalismo, dentro dessa ótica, faz parte da ética da liberdade
da modernidade. E nesse novo jornalismo, a linguagem que domina, é, sem dúvida, a da
persuasão publicitária.
E dentro dessa lógica, jornais “cor-de-rosa” veiculam notícias “cor-de-rosa”. Pelo
menos é o que se observa no Metro, objeto de estudo desta pesquisa e exemplo desse tipo de
veículo. Trata-se de uma notícia light, bem fait divers, neutra, que não cria problemas para a
134
redação e para o departamento publicitário. São noticias que não estimulam o leitor a pensar,
a trabalhar o seu senso crítico, refletir sobre o mundo e se posicionar nele. Tudo fica
exatamente como está e o mundo é mostrado diariamente como se fosse “cor-de-rosa” e nada
precise ser mudado ou questionado.
Observa-se um viés de neutralidade da informação; a realidade social, ou seja, as
coisas como realmente são, aparecem mascaradas, distorcidas ou mesmo empurradas para
debaixo do tapete. Além de superficiais e pouco empolgantes, essas notícias são curtíssimas,
velozes, quase instantâneas. Afinal, os leitores atuais, crias da internet, não têm tempo para o
aprofundamento, para os grandes relatos, grandes histórias e conexões com o passado. Tudo é
muito desconexo, passageiro, simplificado. É o fim da denúncia, da critica, da reportagem
investigativa, do questionamento.
As notícias dos jornais “cor-de-rosa” são, cada vez mais, publicitárias. Elas são
imprensadas pelos anúncios que se amontoam pelas páginas desses jornais ocupando os
principais espaços e chegando, inclusive, a determinar o tipo de informação que deva ser
veiculada, já que a barreira que separava o jornalismo da publicidade caiu dando origem a
uma mutação da linguagem jornalística.
A lógica da globalização e do livre mercado vem obrigando as empresas jornalísticas a
flexibilizar o conceito e o processo de produção da notícia. Tudo tem de ir ao encontro dos
interesses do capital. Com isso, um novo paradigma começa a nascer no campo do jornalismo.
Em tempos da nova era, a sociedade tem assistido a supremacia da linguagem
publicitária. Ela domina os campos da cultura, da economia, da política e da comunicação. O
jornalismo se sente então acuado diante de tamanha pressão do mercado e passa a seguir os
seus preceitos e mandamentos desvirtuando-se da sua missão original de servir antes de tudo
ao interesse público, de informar o cidadão e fornecer elementos de reflexão.
O jornalismo se vê diante de um novo paradigma; pautado principalmente pela estética
da mercadoria, guiado pelas leis do capital ele vai, cada vez mais, se distanciando dos
principais valores e das preocupações éticas que o originaram e o consolidaram como um bem
público a serviço do interesse social.
E essa estética da mercadoria, ou seja, esse domínio da publicidade sobre o jornalismo
tem provocado uma série de consequências diretas ou indiretas sobre a linguagem jornalística,
desencadeando importantes mudanças nos campos da comunicação e da informação.
Para Marshall (2003) os jornais cor-de-rosa da pós-modernidade oferecem a notícia e a
mercadoria na mesma embalagem.
135
Nessa metaindustrialização de metacultura, intrinsecamente estética,
simulada, surreal, plural, difusa, o jornalismo e os novos jornais acabam
sintetizando uma espécie de linguagem mercantilizada e mercadorizada, que
associa contemporaneamente informação e comercio na mesma
embalagem.A publicidade obriga o jornalismo a se submeter „as suas
imposições, em um processo que faz parte da própria hegemonização
civilizacional da estética da mercadoria, e assume um poder central e
progressivamente vertical sobre a sociedade e sobre o campo da cultura e da
comunicação.A publicidade pós-moderna representa hoje, em essência, a
encarnação da lógica e do processo econômico capitalista. Os
financiamentos de empresas e de corporações a mídia, via publicidade,
incorporam-se à dinâmica do mercado midiático e, nisso, criou-se uma
mutua dependência, parte de uma ampla cultura econômica. (MARSHALL,
2003, p. 164)
Como consequência do cenário de transformações dos novos tempos, os efeitos mais
genéricos das mutações dos paradigmas do jornalismo contemporâneo apontam para a
emergência de um novo gênero jornalístico guiado pelas leis de mercado e de olho no futuro,
se quiser continuar existindo.
Mas mesmo com a constatação de toda a força da publicidade observada nos meios de
comunicação de um modo geral, se pudéssemos sugerir alguma coisa aos jornais impressos,
em especial aos gratuitos, diríamos que eles podem sim caminhar para um jornal em formato
agradável, mas com maior rigor editorial, dentro dos preceitos universais do jornalismo e sem
esse escancaramento total da força dos anunciantes. Aqui, é possível argumentar que certo
“relaxamento” de forma e de conteúdo constitui característica dos jornais gratuitos, cuja
segmentação se dá a partir das demandas do público-leitor e não dos conteúdos. Porém, isto é
lamentável. Textos telegráficos, compatíveis com esse tipo de diário, não são ou não deveriam
ser sinônimos de textos descuidados, sem nexo. Ao contrário. As matérias devem ser
veiculadas de forma breve, clara, precisa, completa, sem erros e da maneira mais
compreensível possível, indo além das informações frias e “objetivas” dos jornalistas e dos
anunciantes.
136
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