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As redes sociais profissionalizaram a imbecilidade. Fofoqueiros e invejosos se acham doutores e a maledicência ganhou ares de debate profundo. (Tati Bernardi) Marília, terça-feira, 15 de janeiro de 2019 E-mail: [email protected] Um dos idealizadores da realidade virtual, que ajudou na expansão da internet, pioneiro do Vale do Silício cita 10 motivos para fazer isso LIVRO/TECNOLOGIA É hora de dar um tempo nas redes sociais? Editora Intrínseca, 192 páginas Jaron Lanier, autor de "Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais", é cientista, músico e escritor, mais conhecido por seu trabalho em realidade virtual e sua defesa do humanismo e da economia sustentável num contexto digital A comparação das redes sociais com o potencial viciante do cigarro e outras drogas E o quanto podem fazer mal à saude tem ganhado espaço Segundo Jaron Lanier é mais difícil de se livrar de vícios comportamentais como o uso constante de redes sociais "porque, para ocorrer alguma mudança, você claramente precisa confrontar o seu próprio comportamento" Hoje as redes sociais são praticamente um segundo documento de identidade: não participar de determinada plataforma muitas vezes é sinônimo de total isolamento. Mas você já pensou como seria se deletasse os seus perfis na rede e levasse uma vida diferente? Jaron Lanier, considerado o pai da realidade virtual e uma das maiores referências (e críticos) do Vale do Silício, não tem conta em nenhuma rede social e deixa bem claro por quê: “Evito as redes so- ciais pela mesma razão que evito as drogas. Segundo ele, as bases da internet foram fundamentadas em um mo- delo de negócio regido pelas propagandas. Os anúncios, nossos velhos conhecidos das mídias tradicionais, ganharam uma nova dimensão à medida que a internet se desenvolvia. O que antes era apenas a exposição de um produto agora é uma engrenagem intrincada de algoritmos que modificam o comportamento de milhões de pessoas dia- riamente. E o pior: sem que ninguém perceba. Essa dinâmica nas redes traz inúmeros efeitos degra- dantes: as redes acabam com o livre-arbítrio, estimulam emoções negativas, distor- cem a percepção da verdade, precarizam profissões... A lista não tem fim, mas Lanier esquematizou boa parte dela em dez argumentos podero- sos e convincentes para que você largue as redes sociais. É uma tarefa complicada, e o autor sabe disso. Ele acre- dita, no entanto, que essa é a única forma para que um dia tenhamos redes sociais verdadeiramente dignas e aproveitemos o potencial maravilhoso do que a internet nos proporciona. Bombardeio "Dez argumentos para você deletar agora suas re- des sociais" tem como foco o bombardeio constante das redes sociais nas nossas vidas e como isso está mudando a nossa cabeça - para pior, na visão do autor Jaron Lanier. O cientista da computação de 58 anos é um dos idealiza- dores da realidade virtual e trabalhou no aperfeiçoamento das redes da internet no final dos anos 1990, entre outras credenciais que o tornam uma lenda no Vale do Silício. O norte-americano é visto frequentemente com suas tranças rastafári na TV para falar sobre presente, futuro e tecnologia. Em um momento delicado para o Facebook - 2018 foi o pior ano para a imagem da rede após uma série de escândalos de vazamento ou entrega deliberada de dados privados dos usuários, críticas a ações consideradas tímidas contra a disseminação das fake news e até a revelação de planos da empresa de inves- tigar seus críticos - o livro de Jaron Lanier ganhou recente- mente uma edição brasileira pela Editora Intrínseca. Nas cerca de 150 páginas do livro, o autor explora os efeitos sobre a saúde mental de quem olha as notificações várias vezes ao dia. Por exem- plo, é saudável checar ansiosa- mente quantos corações você ganhou com aquela selfie ou se aquele textão seu teve um número decente de likes? Faz bem esse jogo de avaliar o seu sucesso pessoal pela métrica do seu perfil no Face, Twitter ou Instagran? Um vício? A comparação das redes sociais com o potencial vi- ciante do cigarro e o quanto podem fazer mal à saude tem ganhado espaço, e o escritor concorda com ela, até certo ponto. "era permitido fumar em locais fechados e agora não é mais. De fato, muitas pessoas estão vivas por causa dessa diferença de percepção sobre os males do cigarro entre as épocas", afirmou, em entrevis- ta a imprensa brasileira. "De um ponto de vista técnico, o uso constante de redes sociais tem mais a ver com o vício em jogos, apostas. Ambos são vícios comportamentais e é mais difícil de se livrar deles porque, para ocorrer alguma mudança, você claramente precisa confrontar o seu pró- prio comportamento." Lanier também ressalta como um ajuste aqui e outro ali nos algoritmos podem al- terar o humor de uma pessoa. "Pesquisas do próprio Face- book mostram que determi- nar quais posts aparecem na timeline tem o poder de jogar o ânimo dos usuários para bai- xo - e sem eles perceberem que isso está acontecendo. É con- senso na ciência que você não consegue estar inteiramente a par do que essas ferramentas fazem para os seus processos mentais". O problema é que é cumu- lativo, diz o autor. "Se você ficasse triste uma vez ou outra não seria tão ruim. Mas isso acontece constantemente e, gradualmente, isso se torna o que dá cor ao seu mundo. Com o passar do tempo há um efeito que se nota. Mas muitas pessoas não estão percebendo agora o que está acontecendo com elas". O processo Lanier explica que a gan- gorra emocional (uma hora posts que te deixam feliz, outra hora, com raiva) é uma forma de aumentar o "engaja- mento" (ou vício) do usuário nas redes sociais. Outro elemento no proces- so é a elevação dos níveis de dopamina, um neurotransmis- sor ligado ao prazer, por causa de likes e interações. E aí entra a aleatoriedade: dá para fazer uma ideia, mas não se sabe exatamente quando você vai receber os likes de recompen- sa (o famoso "biscoito", como a internet brasileira refraseou) e em que quantidade. Seu cerébro, no entanto, tenta encontrar um padrão de fun- cionamento desse processo. É aí que o escritor afirma que você está tentando se ajustar a uma ilusão. E tudo isso, descreve o cientista da computação, está a serviço de tentar descobrir em qual estado emocional o usuário tende a clicar nos anúncios nas redes. E, quem sabe, comprar. Lanier adota um tom be m informal de "conversa" no livro, lembrando diversas vezes que não quer dar lições de moral e é somente o leitor quem pode mudar a própria vida. "Eu aponto argumentos para deletar seus perfis nas redes sociais, mas eu na ver- dade não digo que você deve fazer isso. Só você pode saber o que é o melhor para sua vida. Eu não estou fingindo saber isso. Não sou pai nem juiz de ninguém", escreve. "Mas eu acho que é preci- so experimentar passar um tempo fora das redes sociais para descobrir se isso faz uma diferença na sua vida. Pesqui- sas dizem que pessoas que apagam seus perfis se tornam mais felizes, mais produtivas, saudáveis e menos solitárias." Atualmente Lanier traba- lha numa área de pesquisa da Microsoft que passa por física, matemática, economia e, claro, realidade virtual. Mas, afinal, não é suspeito alguém da Microsoft disparando con- tra outros gigantes do Vale do Silício, que são de alguma forma rivais? "Quando eu atuo como um escritor diante do público eu não estou representando a Microsoft. Aliás, eu tenho uma carta deles que me per- mite criticar a empresa se considero apropriado." Lanier, obviamente, não tem perfil no Facebook, Twitter e Instagram ou outros. E como alguém que não está no dia a dia vivendo as redes sociais pode ter uma real dimensão de seus efeitos? "Eu conheço a maioria das pessoas que estão nes- sas empresas, desde quando elas estavam começando. Sou parte desse mundo. Fiz parte de tudo isso no começo (se referindo ao Vale do Silício), então falo por ter uma expe- riência direta. Imagine alguém que trabalhou com apostas ou num cassino. Ela conhece todos os truques para deixar as pessoas viciadas e, de re- pente, começa a achar tudo isso terrível e resolve escrever um livro. É o relato de alguém que conhece o funcionamento de dentro." 10 dicas para uso mais saudável das redes sociais COMPORTAMENTO Ano Novo, sensação de recomeço... que tal fazer um uso mais saudável das redes sociais? Especialistas explicam que passos simples, como desativar notificações sonoras, monitorar as horas de uso ou mesmo "agendar" os momentos em que vai che- car as atualizações podem ajudar. Confira 10 ótimas dicas: 1) Desativar alertas sonoros É um passo simples que pode reduzir a ansiedade e a vontade de checar toda hora as redes. Esta é foi a primeira dica de uma campanha no Reino Unido que convidou pessoas que quisessem ir além a passar 1 mês inteiro sem olhar as redes. Também é possível desativar a notifi- cação na tela, para não ver a mensagem piscar. Retirar alertas e notifica- ções, visuais e sonoras, é uma das dicas do médico Cris- tiano Nabuco, coordenador do Grupo Dependência em Tecnologia do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo, para conseguir estabelecer padrões mais saudáveis de uso das redes sociais. Isso barra a interrupção que essas notificações nos causam, desviando nossa atenção com barulhos. "Na hora de fazer uma pausa ou tomar um café, aí então deve-se olhar as redes so- ciais. Com isso, o usuário se sobrepõe, determinando os períodos em que é afetado pela informação e tomando o controle no acesso." 2) Monitorar o tempo de uso Você poderá se surpreen- der ao se dar conta de quanto tempo gasta em cada rede. Recentemente, o Facebook e o Instagram passaram a oferecer monitoramento do tempo de uso, informando ao usuário quando ele atingiu um certo limite de horas que ele mesmo determina. Alguns smartphones tam- bém fazem isso, relatando o tempo de uso do aparelho naquele dia e quais atividades (ou aplicativos) dominaram esse montante. “Isso faz uma fragmentação e as pessoas começam a perceber que, em certas condições, elas usam a tecnologia como se fosse um plano B, uma anestesia para algumas emoções”, afirma Nabuco. 3) Hora da checagem Em vez de pegar o smar- tphone toda hora que recebe uma notificação, é melhor determinar os intervalos de checagem, a cada meia hora ou uma hora, por exemplo, sugerem os psicólogos Mark Griffiths e Daria Kuss, da Universidade de Nottingham Trent, no Reino Unido, que se especializaram no estudo do impacto da tecnologia e das redes sociais no compor- tamento. Quando bate aquela von- tade de abrir uma notificação, a sugestão do médico coorde- nador do Grupo Dependência em Tecnologia do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo é aguardar 10 minu- tos. Depois, mais 10 minutos. Isso dá um atraso no tempo de consumo e ajuda o usuário a se questionar sobre a neces- sidade do acesso. Ele explica que com o passar do tempo, dar esse tempo de atraso entre as conexões permite melhorar o auto-questionamento sobre o consumo das redes sociais. 4) Dormir sem o celular Já é possível desativar notificações durante a noite ou quando se está dirigindo. Mas, se a vontade de dar uma olhadinha nas redes é inevitá- vel enquanto você ainda não pegou no sono, melhor se separar do celular e deixá-lo em outro cômodo. Você já ia dizer que não é possível dormir sem o celular de lado por causa do alarme, certo? Se ter o aparelho do lado da cama é uma tentação para você, melhor usar outro tipo de despertador. O mesmo vale para quem usa o celular como relógio. 5) Perceba padrões É preciso tentar entender o que está por trás dos acessos e perceber qual é o gatilho situacional do consumo de redes sociais. Segundo o dr. Cristiano Nabuco, o uso in- tenso de tecnologia e redes sociais se assemelha a vícios de comportamento, como compras compulsivas ou jogo patológico. Para não se entregar a exageros, é preciso compreender quando e em que momento mais sentimos necessidade de acessar as re- des sociais: pode ser durante um jantar em família ou mes- mo logo depois de acordar. O médico afirma que o cór- tex pré-frontal, parte do cére- bro responsável por controle e freio comportamental, ainda não está totalmente formado em crianças e adolescentes. Por isso é preciso dar o exem- plo para eles nas horas em que é preciso deixar o celular, e as redes sociais, de lado. 6) Hora do intervalo O psicólogo Mark Griffiths reconhece que é realmente difícil ficar um tempo maior sem checar as redes e sugere começar com pequenos pas- sos, como numa reeducação alimentar. "Prove a você mesmo que é capaz de ficar 15 minutos sem checar as redes", escreveu. "Aos poucos, vá aumentando esse período. Também é válido escolher períodos em que não se pe- gar o telefone, por exemplo, durante as refeições, num encontro ou determinado tempo antes de dormir. "Mas aí não leve seu smartphone à mesa", exemplifica. 7) Atividades sem telefone De acordo com o dr. Nabu- co, ter consciência sobre o uso excessivo das redes sociais e entender seus danos já é um bom primeiro passo. Procure fazer algum programa onde não seja possível usar o smar- tphone: uma prática esportiva, por exemplo. Ou ir a lugares sem wi-fi ou onde o celular é mal visto, como aulas de ioga ou meditação, cinema, etc. 8) Fechado para "balanço" Avise os amigos ou con- tatos frequentes de que você ficará um período "offline". Você também pode colocar essa notificação junto ao seu status, por exemplo. Alguns aplicativos podem ser deletados, a fim de criar um smartphone livre de distra- ções. Em casos mais extremos, pode-se cogitar até a troca do smartphone por um aparelho comum, que só faz chamadas. 9) Selecione perfis e infor- mações Quanto mais gente você segue, mais tempo passará vendo as atualizações do seu feed. "Deixe grupos dos quais você nunca participa", exemplifica Paul Levy, autor de "Digital inferno". “Boa parte do que recebe- mos no WhatsApp ou nas re- des sociais é ruído: são piadas, fofocas, correntes. É preciso se questionar, após receber, se a informação recebida foi útil ou tem aplicação naquele momento”, afirma Nabuco. Segundo ele, colocando em perspectiva é possível perce- ber que muito do conteúdo que recebemos está apenas roubando nossa atenção. “Essa interrupção de uma linha de raciocínio, alterando estados de reflexão mais profunda para as mais superficiais, causa estresse no cérebro, causando a perda da capacida- de de aprofundamento com o passar do tempo”, diz. 10) Use o tempo livre Para muita gente, as redes sociais são um entretenimen- to. Substitua o tempo em que ficará fora delas por outras ati- vidades que sejam prazerosas também, como ler, encontrar amigos, retomar um "hobby" antigo, aprender um novo, etc. Fotos:Divulgação Divulgação

Marília, terça-feira, 15 de janeiro de 2019 E-mail: jmcad2 ... · documento de identidade: não participar de determinada plataforma muitas vezes é ... um livro. É o relato de

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As redes sociais profissionalizaram a imbecilidade. Fofoqueiros e invejosos se acham doutores e a maledicência ganhou ares de debate profundo. (Tati Bernardi)

Marília, terça-feira, 15 de janeiro de 2019 E-mail: [email protected]

Um dos idealizadores da realidade virtual, que ajudou na expansão da internet, pioneiro do Vale do Silício cita 10 motivos para fazer isso

LIVRO/TECNOLOGIA

É hora de dar um tempo nas redes sociais?

Editora Intrínseca, 192 páginas

Jaron Lanier, autor de "Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais", é cientista, músico e escritor, mais conhecido por seu trabalho em realidade virtual e sua defesa

do humanismo e da economia sustentável num contexto digital

A comparação das redes sociais com o potencial viciante do cigarro e outras drogas E o quanto podem fazer mal à saude tem ganhado espaço

Segundo Jaron Lanier é mais difícil de se livrar de vícios comportamentais como o uso constante de redes sociais "porque, para ocorrer alguma mudança, você claramente

precisa confrontar o seu próprio comportamento"

Hoje as redes sociais são praticamente um segundo documento de identidade: não participar de determinada plataforma muitas vezes é sinônimo de total isolamento. Mas você já pensou como seria se deletasse os seus perfis na rede e levasse uma vida diferente?

Jaron Lanier, considerado o pai da realidade virtual e uma das maiores referências (e críticos) do Vale do Silício, não tem conta em nenhuma rede social e deixa bem claro por quê: “Evito as redes so-ciais pela mesma razão que evito as drogas. Segundo ele, as bases da internet foram fundamentadas em um mo-delo de negócio regido pelas propagandas. Os anúncios, nossos velhos conhecidos das mídias tradicionais, ganharam uma nova dimensão à medida que a internet se desenvolvia.

O que antes era apenas a exposição de um produto agora é uma engrenagem intrincada de algoritmos que modificam o comportamento de milhões de pessoas dia-riamente. E o pior: sem que ninguém perceba.

Essa dinâmica nas redes traz inúmeros efeitos degra-dantes: as redes acabam com o livre-arbítrio, estimulam emoções negativas, distor-cem a percepção da verdade, precarizam profissões... A lista não tem fim, mas Lanier esquematizou boa parte dela em dez argumentos podero-sos e convincentes para que você largue as redes sociais.

É uma tarefa complicada,

e o autor sabe disso. Ele acre-dita, no entanto, que essa é a única forma para que um dia tenhamos redes sociais verdadeiramente dignas e aproveitemos o potencial maravilhoso do que a internet nos proporciona.

Bombardeio"Dez argumentos para

você deletar agora suas re-des sociais" tem como foco o bombardeio constante das redes sociais nas nossas vidas e como isso está mudando a nossa cabeça - para pior, na visão do autor Jaron Lanier.

O cientista da computação de 58 anos é um dos idealiza-dores da realidade virtual e trabalhou no aperfeiçoamento das redes da internet no final dos anos 1990, entre outras credenciais que o tornam uma lenda no Vale do Silício. O norte-americano é visto frequentemente com suas tranças rastafári na TV para falar sobre presente, futuro e tecnologia.

Em um momento delicado para o Facebook - 2018 foi o pior ano para a imagem da rede após uma série de escândalos de vazamento ou entrega deliberada de dados privados dos usuários, críticas a ações consideradas tímidas contra a disseminação das fake news e até a revelação de planos da empresa de inves-tigar seus críticos - o livro de Jaron Lanier ganhou recente-mente uma edição brasileira pela Editora Intrínseca.

Nas cerca de 150 páginas do livro, o autor explora os efeitos sobre a saúde mental

de quem olha as notificações várias vezes ao dia. Por exem-plo, é saudável checar ansiosa-mente quantos corações você ganhou com aquela selfie ou se aquele textão seu teve um número decente de likes? Faz bem esse jogo de avaliar o seu sucesso pessoal pela métrica do seu perfil no Face, Twitter ou Instagran?

Um vício?A comparação das redes

sociais com o potencial vi-ciante do cigarro e o quanto podem fazer mal à saude tem ganhado espaço, e o escritor concorda com ela, até certo ponto. "era permitido fumar em

locais fechados e agora não é mais. De fato, muitas pessoas estão vivas por causa dessa diferença de percepção sobre os males do cigarro entre as épocas", afirmou, em entrevis-ta a imprensa brasileira. "De um ponto de vista técnico, o uso constante de redes sociais tem mais a ver com o vício em jogos, apostas. Ambos são vícios comportamentais e é mais difícil de se livrar deles porque, para ocorrer alguma mudança, você claramente precisa confrontar o seu pró-prio comportamento."

Lanier também ressalta como um ajuste aqui e outro ali nos algoritmos podem al-terar o humor de uma pessoa. "Pesquisas do próprio Face-book mostram que determi-nar quais posts aparecem na timeline tem o poder de jogar o ânimo dos usuários para bai-xo - e sem eles perceberem que isso está acontecendo. É con-senso na ciência que você não consegue estar inteiramente a par do que essas ferramentas fazem para os seus processos mentais".

O problema é que é cumu-lativo, diz o autor. "Se você ficasse triste uma vez ou outra não seria tão ruim. Mas isso acontece constantemente e, gradualmente, isso se torna o que dá cor ao seu mundo. Com o passar do tempo há um efeito que se nota. Mas muitas pessoas não estão percebendo agora o que está acontecendo com elas".

O processoLanier explica que a gan-

gorra emocional (uma hora posts que te deixam feliz, outra hora, com raiva) é uma forma de aumentar o "engaja-mento" (ou vício) do usuário nas redes sociais.

Outro elemento no proces-so é a elevação dos níveis de dopamina, um neurotransmis-sor ligado ao prazer, por causa de likes e interações. E aí entra a aleatoriedade: dá para fazer uma ideia, mas não se sabe exatamente quando você vai receber os likes de recompen-sa (o famoso "biscoito", como a internet brasileira refraseou) e em que quantidade. Seu cerébro, no entanto, tenta encontrar um padrão de fun-cionamento desse processo. É aí que o escritor afirma que você está tentando se ajustar a uma ilusão.

E tudo isso, descreve o cientista da computação, está a serviço de tentar descobrir em qual estado emocional o usuário tende a clicar nos anúncios nas redes. E, quem sabe, comprar.

Lanier adota um tom be m informal de "conversa" no livro, lembrando diversas vezes que não quer dar lições de moral e é somente o leitor quem pode mudar a própria vida. "Eu aponto argumentos para deletar seus perfis nas redes sociais, mas eu na ver-dade não digo que você deve fazer isso. Só você pode saber o que é o melhor para sua vida. Eu não estou fingindo saber isso. Não sou pai nem juiz de ninguém", escreve.

"Mas eu acho que é preci-

so experimentar passar um tempo fora das redes sociais para descobrir se isso faz uma diferença na sua vida. Pesqui-sas dizem que pessoas que apagam seus perfis se tornam mais felizes, mais produtivas, saudáveis e menos solitárias."

Atualmente Lanier traba-lha numa área de pesquisa da Microsoft que passa por física, matemática, economia e, claro, realidade virtual. Mas, afinal, não é suspeito alguém da Microsoft disparando con-tra outros gigantes do Vale do Silício, que são de alguma forma rivais?

"Quando eu atuo como um escritor diante do público eu não estou representando a Microsoft. Aliás, eu tenho uma carta deles que me per-mite criticar a empresa se considero apropriado." Lanier, obviamente, não tem perfil no Facebook, Twitter e Instagram ou outros. E como alguém que não está no dia a dia vivendo as redes sociais pode ter uma real dimensão de seus efeitos?

"Eu conheço a maioria das pessoas que estão nes-sas empresas, desde quando elas estavam começando. Sou parte desse mundo. Fiz parte de tudo isso no começo (se referindo ao Vale do Silício), então falo por ter uma expe-riência direta. Imagine alguém que trabalhou com apostas ou num cassino. Ela conhece todos os truques para deixar as pessoas viciadas e, de re-pente, começa a achar tudo isso terrível e resolve escrever um livro. É o relato de alguém que conhece o funcionamento de dentro."

10 dicas para uso mais saudável das redes sociaisCOMPORTAMENTO

Ano Novo, sensação de recomeço... que tal fazer um uso mais saudável das redes sociais? Especialistas explicam que passos simples, como desativar notificações sonoras, monitorar as horas de uso ou mesmo "agendar" os momentos em que vai che-car as atualizações podem ajudar. Confira 10 ótimas dicas:

1) Desativar alertas sonoros

É um passo simples que pode reduzir a ansiedade e a vontade de checar toda hora as redes. Esta é foi a primeira dica de uma campanha no Reino Unido que convidou pessoas que quisessem ir além a passar 1 mês inteiro sem olhar as redes. Também é possível desativar a notifi-cação na tela, para não ver a mensagem piscar.

Retirar alertas e notifica-ções, visuais e sonoras, é uma das dicas do médico Cris-tiano Nabuco, coordenador do Grupo Dependência em Tecnologia do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo, para conseguir estabelecer padrões mais saudáveis de uso das redes sociais.

Isso barra a interrupção que essas notificações nos causam, desviando nossa atenção com barulhos. "Na hora de fazer uma pausa ou tomar um café, aí então deve-se olhar as redes so-ciais. Com isso, o usuário se sobrepõe, determinando os períodos em que é afetado pela informação e tomando o controle no acesso."

2) Monitorar o tempo de uso

Você poderá se surpreen-der ao se dar conta de quanto tempo gasta em cada rede. Recentemente, o Facebook e o Instagram passaram a oferecer monitoramento do tempo de uso, informando ao usuário quando ele atingiu um certo limite de horas que ele mesmo determina.

Alguns smartphones tam-bém fazem isso, relatando o tempo de uso do aparelho naquele dia e quais atividades (ou aplicativos) dominaram esse montante. “Isso faz uma fragmentação e as pessoas começam a perceber que, em certas condições, elas usam a tecnologia como se fosse um plano B, uma anestesia para algumas emoções”, afirma Nabuco.

3) Hora da checagemEm vez de pegar o smar-

tphone toda hora que recebe uma notificação, é melhor determinar os intervalos de checagem, a cada meia hora ou uma hora, por exemplo, sugerem os psicólogos Mark Griffiths e Daria Kuss, da Universidade de Nottingham Trent, no Reino Unido, que se especializaram no estudo do impacto da tecnologia e das redes sociais no compor-tamento.

Quando bate aquela von-tade de abrir uma notificação, a sugestão do médico coorde-nador do Grupo Dependência em Tecnologia do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo é aguardar 10 minu-tos. Depois, mais 10 minutos. Isso dá um atraso no tempo

de consumo e ajuda o usuário a se questionar sobre a neces-sidade do acesso. Ele explica que com o passar do tempo, dar esse tempo de atraso entre as conexões permite melhorar o auto-questionamento sobre o consumo das redes sociais.

4) Dormir sem o celularJá é possível desativar

notificações durante a noite ou quando se está dirigindo. Mas, se a vontade de dar uma olhadinha nas redes é inevitá-vel enquanto você ainda não pegou no sono, melhor se separar do celular e deixá-lo em outro cômodo.

Você já ia dizer que não é possível dormir sem o celular de lado por causa do alarme, certo? Se ter o aparelho do lado da cama é uma tentação para você, melhor usar outro tipo de despertador. O mesmo vale para quem usa o celular como relógio.

5) Perceba padrõesÉ preciso tentar entender o

que está por trás dos acessos e perceber qual é o gatilho situacional do consumo de redes sociais. Segundo o dr. Cristiano Nabuco, o uso in-tenso de tecnologia e redes sociais se assemelha a vícios de comportamento, como compras compulsivas ou jogo patológico. Para não se entregar a exageros, é preciso compreender quando e em que momento mais sentimos necessidade de acessar as re-des sociais: pode ser durante um jantar em família ou mes-mo logo depois de acordar.

O médico afirma que o cór-tex pré-frontal, parte do cére-bro responsável por controle

e freio comportamental, ainda não está totalmente formado em crianças e adolescentes. Por isso é preciso dar o exem-plo para eles nas horas em que é preciso deixar o celular, e as redes sociais, de lado.

6) Hora do intervaloO psicólogo Mark Griffiths

reconhece que é realmente difícil ficar um tempo maior sem checar as redes e sugere começar com pequenos pas-sos, como numa reeducação alimentar. "Prove a você mesmo que é capaz de ficar 15 minutos sem checar as redes", escreveu. "Aos poucos, vá aumentando esse período. Também é válido escolher períodos em que não se pe-gar o telefone, por exemplo, durante as refeições, num encontro ou determinado tempo antes de dormir. "Mas aí não leve seu smartphone à mesa", exemplifica.7) Atividades sem telefone

De acordo com o dr. Nabu-co, ter consciência sobre o uso excessivo das redes sociais e entender seus danos já é um bom primeiro passo. Procure fazer algum programa onde não seja possível usar o smar-tphone: uma prática esportiva, por exemplo. Ou ir a lugares sem wi-fi ou onde o celular é mal visto, como aulas de ioga ou meditação, cinema, etc.8) Fechado para "balanço"

Avise os amigos ou con-tatos frequentes de que você ficará um período "offline". Você também pode colocar essa notificação junto ao seu status, por exemplo.

Alguns aplicativos podem ser deletados, a fim de criar

um smartphone livre de distra-ções. Em casos mais extremos, pode-se cogitar até a troca do smartphone por um aparelho comum, que só faz chamadas.9) Selecione perfis e infor-

maçõesQuanto mais gente você

segue, mais tempo passará vendo as atualizações do seu feed. "Deixe grupos dos quais você nunca participa", exemplifica Paul Levy, autor de "Digital inferno".

“Boa parte do que recebe-mos no WhatsApp ou nas re-des sociais é ruído: são piadas, fofocas, correntes. É preciso se questionar, após receber, se a informação recebida foi útil ou tem aplicação naquele momento”, afirma Nabuco.

Segundo ele, colocando em perspectiva é possível perce-ber que muito do conteúdo que recebemos está apenas roubando nossa atenção. “Essa interrupção de uma linha de raciocínio, alterando estados de reflexão mais profunda para as mais superficiais, causa estresse no cérebro, causando a perda da capacida-de de aprofundamento com o passar do tempo”, diz.

10) Use o tempo livrePara muita gente, as redes

sociais são um entretenimen-to. Substitua o tempo em que ficará fora delas por outras ati-vidades que sejam prazerosas também, como ler, encontrar amigos, retomar um "hobby" antigo, aprender um novo, etc.

Fotos:Divulgação

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