MARTINS e DIAS_GEOSUL2015_Entre peixes e humanos- o conflito pesca e conservação ambiental_Vfinal

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    MARTINS, Andreza et al. Entre peixes e humanos: o conflito pesca e ...

    Entre peixes e humanos: o conflito pesca e conservaoambiental no litoral sul do Brasil

    Andreza Martins*

    eila !hristina "ias**

    Ademir Antonio !azella***

    Resumo

    Em um cen#rio atual de mudan$as clim#ticas, so%repesca,es&otamento &eneralizado dos recursos pes'ueiros marinhosassociados ao aumento exponencial da demanda per capita mundial

    pelo consumo de peixes e deri(ados, a delimita$)o de espa$osmarinhos prote&idos continua a ser adotada, em escala &lo%al,como a principal ferramenta poltica territorial para sal(a&uarda

    dos am%ientes marinhos. +artindo da an#lise da rede de atoresassociados pesca em uma #rea marinha prote&ida no litoral sul do-rasil, demonstramos 'ue em%ora a cria$)o de espa$os prote&idossea fundamental para minimizar impactos humanos so%ream%ientes marinhos e oce/nicos, a iniciati(a isolada n)o limita a

    press)o antr0pica. Nesse sentido, e(idenciamos 'ue s)o asestrat1&ias dos atores localizados em distintas escalas espaciais deatua$)o poltica 'ue sustentam, de fato, a &era$)o de acordos e

    parcerias pass(eis de &erar melhorias para conser(a$)o marinha.Palavras-chave: Redes2 +esca2 !onflito am%iental2 3nidades de

    conser(a$)o.

    * "outoranda do +ro&rama de +0s45radua$)o Interdisciplinar em!i6ncias 7umanas 8 !9739S! ;andrezamartins

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    Between fish and humans: the conflict between fishing andenvironmental conservation on the southern coast of Brazil

    .bstract

    The esta%lishment of protected marine spaces continues to %eadopted on a &lo%al scale as the main political territorial tool for

    protectin& marine en(ironments in the current scenario of climatechan&e, o(erfishin& and the &eneralized depletion of marine fishin&resources associated to the exponential increase in &lo%al per capitademand for fish and deri(ati(es. -ased on an anal?sis of thenet@or of actors associated to fishin& in a protected marineen(ironment in Southern -razil, @e demonstrate that althou&h thecreation of protected spaces is essential for minimizin& humanimpacts on marine and ocean en(ironments, the isolated initiati(eis not limited to anthropomorphic pressure. In this sense, @eindicate that it is the strate&ies of actors located on distinct spatial

    scales of political actions that sustain the esta%lishment ofa&reements and partnerships that are capa%le of &eneratin&impro(ements for marine conser(ation./e0 1ords: Net@ors2 9ishin&2 En(ironmental conflict2 protected

    areas.

    Em anos recentes, os desafios impostos pela pro%lem#ticadas mudan$as clim#ticas t6m colocado os oceanos no centro dosde%ates polticos e acad6micos. A partir da pu%lica$)o da edi$)o deBCDC do famoso relat0rio do +ainel Inter&o(ernamental so%reMudan$as !lim#ticas ;I+!!, BCD=, hou(e o incremento da

    percep$)o pF%lica acerca da rela$)o direta entre altera$Gesoce/nicas e clim#ticas. H relat0rio concluiu, dentre outras coisas,'ue o excesso de emiss)o de !HBacumulado na atmosfera entre os

    anos de D>D e BCDC diminuiu a capacidade oce/nica de re&ular atemperatura do planeta. +ara al1m da 'uest)o clim#tica, os oceanos

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    s)o essenciais para as popula$Ges humanas em inFmeros outrosaspectos, a maioria deles menos conhecidos. Eles a%arcam KL doespa$o de (ida na Terra, fornecem ha%itats para cerca de JCL dosor&anismos, produzem CL do oxi&6nio atmosf1rico, fixam CLda produ$)o prim#ria &lo%al e transportam JCL do com1rciomundial ;T3RE O 5ATT3SH, BCDB=. A pesca industrialrepresenta outro importante foco de pertur%a$)o do e'uil%rio dosmares. Se&undo recente relat0rio da 9AH ;BCDB=, em BCDC, o setor

    pes'ueiro mundial produziu uma 'uantidade recorde de DBJmilhGes de toneladas de pescado para alimenta$)o humana, comuma m1dia de DJ,P &ha%itantesano. !om essa cifra, os produtosde peixes e deri(ados passaram a fi&urar entre os alimentos maiscomercializados no mundo, com o peixe assumindo o posto de

    principal produto do a&rone&0cio mundial do setor de carnes. Hmesmo relat0rio admite, entretanto, 'ue cerca de BL dos recursos

    pes'ueiros marinhos do planeta est)o totalmente explorados ou

    atin&iram o m#ximo admiss(el e outros BJL encontram4seso%repescados, es&otados ou em (ias de recupera$)o.H aumento do consumo mundial de pescado associado

    &lo%aliza$)o da economia pes'ueira tem afetado dois outros aspectosn)o menos importantes, a sa%er: D= a se&uran$a alimentar e2 B= a

    preser(a$)o sociocultural das popula$Ges 'ue dependem diretamentedo am%iente martimo para manuten$)o da sua 'ualidade de (ida. H

    primeiro aspecto faz men$)o tanto s &arantias de pro(is)o de

    protena animal para popula$Ges de %aixa renda, 'uanto s incertezasrelacionadas ao consumo de peixes contaminados por su%st/ncias'umicas preudiciais saFde humana. H se&undo, aos impactosdiretos do incremento da pesca industrial so%re o espa$o de (ida emeios de su%sist6ncia de popula$Ges dependentes dos recursos

    pes'ueiros. Nas tr6s Fltimas d1cadas, o nFmero de pessoas 'ue sededicam diretamente produ$)o prim#ria de pescado ;(ia captura ouculti(o= pro&rediu mais rapidamente 'ue o aumento da popula$)o e oempre&o na a&ricultura tradicional, fornecendo os meios parasu%sist6ncia de DBL da popula$)o mundial ;9AH, BCDB=. "entre os

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    principais mecanismos polticos destinados a limitar os impactos dapesca so%re os oceanos, destaca4se a cria$)o de espa$os marinhosprote&idos. Atualmente, apenas DL da superfcie oce/nica encontra4sele&almente res&uardada. No -rasil, at1 o incio de BCDC, apenas D,>Ldo territ0rio marinho esta(a oficialmente prote&ido. !ontudo, durantea DCa!onfer6ncia das +artes ;!H+= da !on(en$)o so%re "i(ersidade-iol0&ica ;!"-=, 'ue aconteceu em BCDC em Na&oia no Qap)o, foiapro(ado o +lano Estrat1&ico de -iodi(ersidade para o perodo BCDD4

    BCBC. Esse documento contempla (inte metas para a conser(a$)o da%iodi(ersidade no planeta 4 as Metas de Aichi para a -iodi(ersidade 4e pre(6 'ue at1 BCBC o planeta tenha DCL do total de sua superfciea'u#tica reco%erta por #reas marinhas prote&idas ;3I!N2 94-rasil2 I+, BCDD=.

    No plano te0rico, o campo de pes'uisas t1cnico4cientficasrelati(as pesca e &est)o dos recursos pes'ueiros no -rasil temsido considerado fra&mentado e incipiente. Tal de%ilidade reflete

    ne&ati(amente na formula$)o de polticas pF%licas e de planos de&est)o (oltados para o se&mento pes'ueiro ;"IE53ES, DJ2AS!HN!EHS et al., BCCP2 9IAR"I, BCC>=. +ara "ie&ues;DJ=, as polticas relacionadas &est)o pes'ueira no pas t6mfa(orecido o crescimento do se&mento industrial, criando um

    padr)o per(erso de es&otamento dos recursos e dos tra%alhadoresli&ados pesca.

    A incipi6ncia de an#lises te0ricas acerca da realidade emprica

    das popula$Ges humanas em espa$os prote&idos e so%re os impactossociais e am%ientais da poltica de cria$)o de 3nidades de!onser(a$)o ;3!s= marinhas moti(ou a ela%ora$)o deste arti&oD.

    D Este arti&o deri(a, em parte, da disserta$)o de mestrado defendida pelaprimeira autora, unto ao +ro&rama de +0s4&radua$)o em 5eo&rafia da39S!, e orientada pela se&unda autora e de +roeto de +es'uisa O"esen(ol(imento conduzido pelo terceiro autor na re&i)o de estudo so%re otema do financiamento da pesca artesanal. Hs autores manifestam especial

    a&radecimento professora Qulia Sil(ia 5ui(ant da 39S! pela leituracuidadosa e atenta e o%ser(a$Ges criteriosamente tecidas.

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    Nele analisamos as intera$Ges entre Estado, se&mento pes'ueiro enatureza, dentro de uma 3! marinhocosteira, discutindo osmecanismos e processos sociais 'ue dinamizam essas rela$Ges einfluenciam a or&aniza$)o de espa$os &eo&r#ficos calcados naconser(a$)o marinha. H primeiro o%eti(o consiste em demonstrar'ue, em%ora a poltica de cria$)o de espa$os marinhos prote&idossea uma estrat1&ia fundamental para a minimiza$)o dos impactos da

    pesca industrial so%re os oceanos, a iniciati(a n)o &arante por si s0 a

    limita$)o da press)o antr0pica so%re os recursos pes'ueiros. Asestrat1&ias dos atores localizados em distintas escalas espaciais deatua$)o poltica s)o o 'ue, de fato, sustentam acordos e parcerias

    pass(eis de &erar melhorias para conser(a$)o marinha. H se&undoo%eti(o %usca compreender 'uais s)o e como se esta%elecem osdiferentes tipos de intera$Ges sociais necess#rios para promo(er,concomitantemente, a conser(a$)o marinha aliada melhoria dascondi$Ges de (ida das popula$Ges locais residentes em espa$os

    prote&idos. +ara tanto, analisamos uma situa$)o contenciosa 8Uconflito da pescaV 8 relacionada cria$)o de uma 3! no litoralcentro4sul do estado de Santa !atarina, sul do -rasil, denominadaWrea de +rote$)o Am%iental da -aleia 9ranca ;A+A-9=. H conflitoen(ol(e a &est)o dos recursos naturais e do uso do espa$o pelosatores sociais, indi(iduais e coleti(os, or&anizados em mFltiplasescalas de atua$)o, desde as esferas &o(ernamentais nacionais esupranacionais at1 as locais. A metodolo&ia inte&ra tr6s

    procedimentos 'ualitati(os realizados entre BCC e BCDB ;an#lisedocumental, entre(istas e o%ser(a$)o participante=, 'ue seinterconectaram e complementaram nas di(ersas fases da pes'uisa.

    H arti&o est# or&anizado em 'uatro partes, al1m destaintrodu$)o. A primeira apresenta o referencial te0rico4metodol0&ico da pes'uisa. A se&unda contextualiza a A+A-9dentro do sistema %rasileiro de cria$)o de espa$os marinhos

    prote&idos. A terceira discute o conflito entre conser(a$)oam%iental e desen(ol(imento pes'ueiro na A+A-9 articulando4ocom o tema da &est)o territorial da pesca. No t0pico conclusi(o,

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    al1m de sintetizar os principais resultados, coloca4se em e(id6nciaa correla$)o entre a media$)o das rela$Ges conflituosas pelosatores estatais e o sucesso dos proetos polticos localizados.2erritrio, atores, conflitos e interfaces: o campoambiental em perspectiva

    "iferentes enfo'ues te0ricos t6m sido utilizados para apreender acomplexidade de processos, atores, espa$os e escalas de atua$)o da

    pro%lem#tica am%iental. No &eral, eles t6m ori&em em matrizesepist6micas di(ersas e podem (ariar desde a%orda&ens 'ue entendem anatureza e a sociedade como dois sistemas opostos e inconcili#(eis, at1

    perspecti(as 'ue conce%em essa rela$)o como parte de um &randesistema (i(o. A maioria das a%orda&ens, entretanto, parte do

    pressuposto de 'ue am%iente e sociedade s)o elementos distintos. Asdiferen$as de perspecti(a residem nos tipos de rela$Ges 'ue esta%elecementre si. Neste tra%alho entende4se 'ue os modelos te0ricos melhor

    adaptados para analisar a pro%lem#tica 'ue interconecta o tema daconser(a$)o dos am%ientes marinhos com a &est)o da ati(idadepes'ueira s)o a'ueles 'ue pressupGem a indissocia%ilidade analticaentre a dimens)o am%iental e social da realidade e, por esse moti(o,conferem import/ncia e'ui(alente a am%os.

    3m olhar incomum so%re as rela$Ges entre natureza e cultura1 oferecido pela Teoria do Ator4Rede ;TAR=, 'ue (em seconsolidando, dentro das ci6ncias humanas, como um dos modeloste0ricos 'ue melhor se adapta proposta de con&ruir a%orda&ensrealistas e construti(istas da pro%lem#tica am%iental;7ANNIN5AN, BCC=. Essa a%orda&em ino(a, dentre outrosaspectos, por uma particularidade te0rica: o pressuposto de 'ue n)o1 poss(el separar o social do natural, nem o sociol0&ico docientfico, haa (ista 'ue tanto o am%iente 'uanto a sociedade s)oconceitos forados pelo homem, ele mesmo um h%rido de naturezae cultura. Assim, tanto ci6ncias naturais 'uanto sociais est)oimplicadas em pro%lemas e'ui(alentes, correlatos e

    interdependentes e, portanto, sem diferen$a de o%eto. Nessa

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    a%orda&em n)o h# diferen$as essenciais 'ue ustifi'uem adicotomiza$)o do conhecimento em natural e social e a separa$)oentre natureza e cultura. H social 1 tido com um fenXmeno inst#(ele ef6mero formado a partir de rela$Ges entre atores 'ue n)o s)osociais em si. 7omens, demais animais, plantas, fun&os e o%etosinanimados formam a 'uase totalidade dos entes presentes no

    planeta e s)o as rela$Ges esta%elecidas entre eles 'ue descre(em osocial, 'ue d)o forma e conteFdo realidade (i(ida

    cotidianamente. Sendo assim, os esfor$os de an#lise centram4se nasredes de relaes formadas por e a partir dos atores sociais,tomadas como estruturas cha(e na or&aniza$)o e dinamiza$)o dosespa$os (i(idos ;ATH3R, BCCJa2 ATH3R, BCCJ%=.

    A inclus)o de formas n)o4humanas e a%stratas no rol depossi%ilidades de atores do mundo social traduz uma (is)o simtricadesse mundo. Isto 1, uma a%orda&em 'ue %usca romper com astradicionais dicotomias te0ricas, tais como naturezacultura,

    sueitoo%eto, o%eti(osu%eti(o etc. +ara atour ;BCCJa=, um dosprincipais formuladores da TAR, o social n)o est# pronto, 1simplesmente uma associa$)o moment/nea de atores 'ue,interconectados, conse&uem transformar al&o no mundo (i(ido. Aexemplo do social, n0s tam%1m somos hbridos2, um pouco humanosum pouco primatas, por (ezes sueito por (ezes o%eto, um poucocientistas um pouco polticos, precariamente instalados no interior dasinstitui$Ges cientficas, meio fil0sofos, meio en&enheiros.

    Hutro elemento da TAR 'ue merece ser su%linhado 1 a no$)ode rede. A despeito da polissemia em torno do conceito e para finsdeste arti&o, nos atemos apenas aos e'u(ocos conceituais suscitadosno /m%ito do de%ate 'ue en(ol(e o termo ator4rede. Assim 1 precisoesclarecer 'ue a no$)o de rede proposta por essa teoria n)o &uardarela$)o com a ideia de rede cunhada por !astells ;D= para

    B H conceito de h%rido de atour refere4se a uma forma de interpretar outraduzir o mundo por meio da no$)o de redes, 'ue Use conecta ao

    mesmo tempo natureza das coisas e ao contexto social, sem, contudo,reduzir4se nem a uma coisa nem a outraV ;ATH3R, BCCJ%, p.DD=.

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    descre(er uma no(a forma pri(ile&iada de or&aniza$)o da sociedade,mais interconectada e fluida, tendo a internet e a microeletrXnicacomo principais instrumentos respons#(eis por orientar as estrat1&iasde relacionamento coleti(o. A rede 1 nesta pes'uisa, so%retudo, umaferramenta metodol0&ica de an#lise empre&ada para interpretar omodo como os e(entos in(esti&ados se or&anizam e inter4relacionam.Ela n)o 1 o elo entre os atores e entre eles e os o%etos, 1 umaferramenta de estudo usada para descre(er o modo como a realidade

    se apresenta mediante a capacidade de cada ator fazer com 'ue outrosatores fa$am coisas inesperadas. Ela constitui uma forma relacional etridimensional de olhar para a realidade 'ue se 'uer in(esti&ar;ATH3R, BCCJa2 ATH3R, BCCJ%=.

    As no$Ges de rede e ator social tam%1m s)o real$adas nasa%orda&ens conhecidas como Persectiva !rientada ao "tor;+HA= e en#o$ue das inter#aces. +ara fins deste estudo, nosso foco

    recai so%re essa Fltima 'ue, entretanto, n)o pode e n)o de(e serdesconectada da perspecti(a orientada ao ator, haa (ista suaimportante contri%ui$)o ao campo de estudos das redes. A +HA 1uma perspecti(a antropol0&ica ori&inada a partir da Escola deManchester, em meados do s1culo YY. Ela sur&e como umcontraponto aos m1todos cl#ssicos da antropolo&ia %rit/nica,centrados no estudo de pe'uenas comunidades africanas a partirdas rela$Ges de parentesco, e introduz um m1todo etno&r#fico

    reno(ado para a an#lise dos pro%lemas da'uele perodo. "e acordocom on& ;BCC>=, em%ora a +HA tenha incorporado al&umas daspreocupa$Ges marxistas, austando o foco de an#lise para umenfo'ue menos indi(idualizado e mais preocupado em capturar astensGes sociais e demais intera$Ges entre o indi(duo e o am%iente,ela mant1m um olhar a(esso determina$Ges externas, tpicas daa%orda&em marxista. H autor explica 'ue, em especial no campo deestudos da sociolo&ia do desen(ol(imento, a +HA sur&e como umaalternati(a s perspecti(as estruturalistas %aseadas no conceito de

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    determina$)o externa. Nesse caminho, a +HA emer&e com uminteresse explcito nos atores sociais e na sua capacidade deoferecer respostas diferenciadas s situa$Ges permeadas porcircunst/ncias estruturais similares e em condi$Ges aparentementehomo&6neas. +ara os estudiosos dessa a%orda&em, os modelossociais di(ersos 'ue resultam dessas situa$Ges s)o, em parte,cria$)o coleti(a dos atores mesmos. Esses modelos s)o ori&inadosa partir das ne&ocia$Ges, intera$Ges e estrat1&ias indi(iduais e

    coleti(as 'ue tem lu&ar n)o somente nos atores 'ue atuamdiretamente nesses contextos, mas tam%1m nos atores sociaisUausentesV, isto 1, a'ueles 'ue influenciam essas realidades sem,contudo, estarem materialmente presentes.

    !om o prop0sito de contornar al&uns dos pro%lemas li&ados perspecti(a centrada no ator, em especial, a'ueles relacionados aoexcesso de centralidade imputado s pes'uisas das micro rela$Ges em

    pe'uena escala, o en#o$ue das inter#aces, tri%ut#rio da +HA, pretende

    complementar essa perspecti(a Ucali%randoV as lentes de an#lise paracentrarem4se no cruzamento entre diferentes mundos de (ida,paradi&mas culturais e proetos polticosP. H primeiro fundamentodesse enfo'ue est# li&ado ao tema da intera$)o e da hetero&eneidade.As an#lises influenciadas pela a%orda&em das interfaces n)o est)ofocadas nos indi(duos ou nas estrat1&ias de &rupo, mas sim nasli&a$Ges e redes de rela$Ges 'ue se desen(ol(em entre atores com

    H conceito de determina$)o externa constitui o fundamento de doismodelos estruturalistas 'ue, at1 recentemente, (inham ocupando ocentro da sociolo&ia do desen(ol(imento: a teoria da moderniza$)o e aeconomia poltica. Am%os os modelos partem da premissa de 'ue odesen(ol(imento e a troca social s)o o resultado de determina$Gesori&inadas em centros de poder externos mediante as inter(en$Ges doscorpos estatais ou internacionais ;HN5, BCC>=.

    P +or proeto poltico, adotamos a no$)o de "a&nino et al.;BCCK, p. J=,'ue consideram proetos polticos como os Uconuntos de cren$as,

    interesses, concep$Ges de mundo, representa$Ges do 'ue de(e ser a (idaem sociedade, 'ue orientam a a$)o poltica dos diferentes sueitosV.

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    diferentes modos de (ida, proetos polticos etc. As intera$Gescontinuadas entre esses atores tendem a dinamizar os sistemas sociaislocalmente e aca%am por desen(ol(er fronteiras sim%0licas eexpectati(as compartilhadas 'ue diferem os participantes da interfaceda'ueles de fora dela. Zuanto mais a interface se consolida maior 1seu potencial de irradia$)o para outras escalas mais amplas deatua$)o, assim como de pro(ocar a mudan$a social. Hutra

    particularidade essencial refere4se centralidade 'ue o enfo'ue

    confere aos conflitos. Nele, as interfaces s)o entendidas como l0cus dedi(er&6ncias, conflitos e ne&ocia$)o. Ainda 'ue pressuponham, emal&uma medida, certo &rau de interesse comum, as situa$Ges deinterface s)o compostas de intera$Ges entre atores com o%eti(os einteresses contradit0rios or&anizados so% rela$Ges desi&uais de poder ede acesso a recursos. ia de re&ra descre(em situa$Ges de ne&ocia$)o,onde os atores implicados de(em corresponder tanto s expectati(asda'ueles 'ue representam, 'uando s expectati(as da'ueles com

    'uem ne&ociam. +ortanto, tendem a a%ri&ar atores 'ue,fre'uentemente, ocupam posi$Ges intermedi#rias entre domniossociais ou n(eis hier#r'uicos distintos. Tais atores, dependendo de suacapacidade or&anizati(a, &rau de lideran$a, carisma e interesse pessoalou coleti(o podem, por (ezes, atuar como Uelos de li&a$)oV oumediadores entre um ou mais sistemas sociais implicados na interface;HN5, BCC>=.

    A no$)o de conflito aliada ao enfo'ue das interfaces temsido mo%ilizada, na +HA, como uma ferramenta de an#lise parae(idenciar a hetero&eneidade de interesses, (alores e modos de(ida 'ue re&em os processos sociais. +arte4se do pressuposto de'ue, em%ora os conflitos seam uma importante cha(e de an#lise

    para elucidar a di(ersidade e as formas de intera$)o presentes emdeterminado contexto de refer6ncia in(esti&ati(a, eles n)o d)oconta de a%arcar, sozinhos, a totalidade dos processos e estruturassociais en(ol(idos na (ida cotidiana. +or exemplo, en'uantoferramenta analtica, eles n)o s)o Fteis para compreender como se

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    or&anizam e perpetuam as rela$Ges de coopera$)o e alian$a entreatores e a&6ncias di(ersos, implicados ou n)o nos conflitos, e comoestas intera$Ges se intercalam e se articulam com os e(entos sociaiscrticos para produzir no(os patamares de intera$)o e or&aniza$)o.Al1m disso, a an#lise de conflitos n)o permite compreender por'uedeterminados acordos e resolu$Ges o%tidos a partir de ne&ocia$Gesem situa$Ges de conflito n)o s)o le(ados a ca%o entre as partes, ouainda n)o surtem os efeitos sociais deseados. Em outras pala(ras,

    ao tomar o conflito como ferramenta metodol0&ica exclusi(a dean#lise, o pes'uisador tende a desconsiderar, ou conferir poucori&or analtico, aos demais uni(ersos paralelos e interconectados'ue inte&ram a totalidade do mundo (i(ido ;HN5, BCC>=.

    [ importante su%linhar, contudo, 'ue o de%ate te0rico emtorno da cate&oria analtica UconflitoV tem polarizado

    pes'uisadores de distintas disciplinas do conhecimento em dois&randes modelos conceituais, 'ue conce%em de maneira oposta os

    efeitos dos conflitos so%re as sociedades contempor/neas. "e umlado, encontram4se a'ueles 'ue acreditam 'ue os conflitos s)oinerentes a 'ual'uer sistema social e 'ue funcionam, na (erdade,como propulsores de mudan$as. +ara esses autores n)o existe

    possi%ilidade de resolu$)o definiti(a de 'ual'uer conflito, sendo oconsenso, apenas uma contin&6ncia. H outro &rupo 1 composto porautores 'ue acreditam 'ue os conflitos s)o distFr%ios nos sistemase'uili%rados e 'ue, portanto, exi&em esfor$os para o

    desen(ol(imento de estrat1&ias no sentido de neutraliz#4los oumitilos. As an#lises e conse'uentes inter(en$Ges nesse modelole(am em considera$)o o &rau de des(io a partir de um estadoori&inal da sociedade considerado 0timo ;9ERREIRA, BCC=.

    "entro do primeiro &rupo, al&umas pes'uisas, em especial nocampo da sociolo&ia am%iental, &eo&rafia e ecolo&ia poltica,tra%alham com a su%cate&oria analtica con#litos ambientais comocha(e de an#lise para e(idenciar a mudan$a social. H enfo'ue dosconflitos tem oferecido um olhar alternati(o ao estudo das rela$Gesentre natureza e cultura em espa$os prote&idos, 'uestionando a

    Geosul, v.30, n.60, 2015 D>

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    supremacia e a autoridade da cate&oria Upopula$Ges tradicionaisV paradiscutir o papel das popula$Ges humanas na prote$)o dos recursos

    %iol0&icos. !omo resultado, refuta a ideia de 'ue as popula$Gestradicionais seam aliadas UnaturaisV da di(ersidade %iol0&ica e 'uesempre direcionam suas pr#ticas para a$Ges em sincronia com anatureza, su&erindo a amplia$)o do foco de an#lise para a inclus)o detodas as popula$Ges influenciadas, direta e indiretamente, pela cria$)ode espa$os naturais prote&idos. A no$)o de conflito tem sido ent)o

    apresentada como alternati(a para e(idenciar a hetero&eneidade deinteresses, (alores e mundos de (ida 'ue re&em os processos sociaisnesses espa$os ;MARTINS, BCDC2 BCDB=.

    Hutro conunto de estudos, pro(enientes da 5eo&rafia, temassociado teoria dos conflitos a no$)o de territ%rio. A despeito da

    polissemia em torno desse conceito, mo%ilizado por outrasdisciplinas do conhecimento, a exemplo da antropolo&ia, economia

    e ci6ncias polticas, o enfo'ue territorial assumido nesta pes'uisacentra4se na natureza poltica dos espa$os &eo&r#ficos, destacandoas rela$Ges desi&uais de poder e sua influ6ncia na or&aniza$)oespacial de determinados atores e institui$Ges. !onforme destacaSouza ;D=, as fre'uentes superposi$Ges e confusGes conceituaisentre as no$Ges de poder, domina$)o, (iol6ncia e autoritarismo s)orespons#(eis por tradicionais e'u(ocos analticos, 'ue t6mescamoteado as diferen$as estruturais entre os conceitos de

    UpoderV, UpolticaV e Uterrit0rioV, mais a%ran&entes 'ue as no$Gesde poder do Estado e territ0rio nacional.A perspecti(a de Souza ;D, p.=, 'ue define o territ0rio

    como sendo Uo campo das rela$Ges de poder espacialmentedelimitadas e operando, destarte, so%re um su%strato referencialV,amplia e flexi%iliza a compreens)o do territ0rio em dois aspectos, asa%er: periodicidade ;no tempo= e escala ;no espa$o=. No 'ue tan&ea periodicidade, os territ0rios podem ter tanto um car#ter

    permanente ;territ0rios nacionais, ind&enas ou de unidades deconser(a$)o=, passando por uma exist6ncia peri0dica eou cclica

    Geosul, v.30, n.60, 2015DJ

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    ;territ0rios de prostitui$)o, de (enda de dro&a, de &an&ues=, 'uantoum car#ter ef6mero ;territ0rios de &uerras n)o permanentes=. Hterrit0rio tam%1m assume propor$Ges di(ersas desde a escala microlocal como a casa ;territ0rio familiar= e a rua, at1 escalas mais&lo%alizadas ;3ni)o Europeia, Mercosul etc=. +ara al1m das(aria$Ges 'ue o territ0rio pode assumir no tempo e no espa$o,7aes%aert ;BCC= acrescenta as dimensGes materiais e sim%0licas;su%eti(as=, destacando o car#ter multidimensional do conceito.

    Na compreens)o desse autor, al1m de articular mFltiplaspossi%ilidades de exist6ncia no tempo e no espa$o, os territ0riospodem estar relacionados ao domnio econXmico ;territ0rios deempresas= ou natureza sim%0lica de aspectos culturais e sociais;territ0rios da cultura a$oriana, territ0rios ind&enas, cai$aras etc.=.

    !ompreender a distin$)o entre a no$)o de territ0rio adotada porautores como Souza e 7aes%aert e a'uelas 'ue tomam o conceito comoan#lo&o s no$Ges de Upoder estatalV e Uso%erania nacionalV 1

    determinante para des(elar a hetero&eneidade de interesses e proetosde (ida presentes dentro das sociedades e de seus mFltiplos territ0rios.H territ0rio 1 conce%ido, assim, a partir do encontro e desencontro demFltiplas rela$Ges de poder, desde o poder material das rela$GeseconXmicas e polticas at1 o poder sim%0lico das rela$Ges de car#tercultural ou social. H territ0rio, portanto, 1 tam%1m relacional. E 1 nesse

    ponto 'ue a no$)o de territ0rio se articula ao enfo'ue das interfaces e an#lise de conflitos para, conduzidos pela a%orda&em relati(ista e

    sim1trica da teoria do ator4rede, or&anizar o campo de atua$)ote0ricometodol0&ica desta in(esti&a$)o. H territ0rio nasce, assim,como a materializa$)o da pluralidade social 'ue, mediante disputas eem%ates contnuos, se apropria de uma malha espacial concreta.

    Nesse sentido, as 3!s podem ser entendidas com territ0riosam%ientais apropriados pelo poder estatal com o o%eti(o decontrolar o uso dos recursos naturais ali distri%udos e dedisciplinar o maneo do espa$o por meio do controle das ati(idadeshumanas 'ue s)o exercidas so%re ele. "a mesma forma, as 3!s s)otam%1m espa$os de apropria$)o material e sim%0lica. A

    Geosul, v.30, n.60, 2015 D

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    apropria$)o material ocorre 'uando as popula$Ges direta ouindiretamente afetadas pela presen$a da 3! se %eneficiam dela a

    partir de &anhos materiais, a exemplo de incremento no turismo,incenti(os fiscais etc. A apropria$)o sim%0lica ocorre atra(1s daidentifica$)o sociocultural e poltica com o lu&ar e pode semanifestar de inFmeras formas, desde as auto4identifica$Ges de

    popula$Ges tradicionais em 3!s 'ue n)o foram criadas com oprop0sito de prote&er recursos para a manuten$)o dessas

    popula$Ges, at1 empres#rios e administra$Ges municipais 'ue se%eneficiam da ima&em Upoliticamente corretaV da exist6ncia deuma 3! e passam a associar sua identidade a ela.

    !ontudo, para entender esses espa$os como territ0riosam%ientais 1 condi$)o sine $ua non partir de uma perspecti(arelacional. S0 assim ser# poss(el apreender as unidades deconser(a$)o em sua totalidade, ou sea, para al1m de um olhar

    parcial 'ue a(alia ou somente os aspectos relacionados (ari#(el

    am%iental, ou somente aspectos relacionados (ari#(eis culturais esocioeconXmicas. Na perspecti(a relacional, os territ0rios de 3!s&anham sentido a partir das mFltiplas rela$Ges de poder eintera$Ges produzidas entre os di(ersos atores ;humanos e n)o4humanos= 'ue se manifestam no terreno, entre eles o espa$o e osrecursos, (ariando no tempo e nas suas di(ersas escalas de

    Al&umas pes'uisas so%re mudan$as sociais e conflitos em unidades de

    conser(a$)o, produzidas pelo NFcleo de Estudos Am%ientais da3NI!AM+ constataram 'ue a institui$)o de uma 3! pode ser o Fnicoinstrumento poltico capaz de &arantir a perman6ncia ou a manuten$)o daati(idade de determinados &rupos sociais nessas #reas. As pes'uisassu&erem 'ue a associa$)o de um &rupo identidade UtradicionalV pode seruma a$)o estrat1&ica para rei(indica$)o de direitos polticos, li&ados a sua

    perman6ncia dentro dessas #reas, 'ue de outra forma, seriam ne&ados;9ERREIRA, BCCP=. Nesses casos, a apropria$)o sim%0lica do espa$o sed# mediante a identifica$)o relacionada identidade tradicional, mas com

    o o%eti(o de %ar&anha poltica para manuten$)o dos direitos %#sicos demoradia e uso do espa$o para fins de so%re(i(6ncia.

    Geosul, v.30, n.60, 2015BC

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    intera$)o e influ6ncia, assim como de acordo com os aspectossim%0licos, psicol0&icos e culturais 'ue os alimentam.

    . pol3tica ambiental brasileira e a 4esto territorial deespaos naturais: limites e desafios

    As a$Ges do campo am%iental no -rasil come$aram a &anhar

    desta'ue entre o final dos anos de DKC e incio de D>C, comoresultado de uma com%ina$)o de elementos conunturais externos einternos ao pas. At1 o final dos anos de DJC, a tXnica do mo(imentoam%ientalista %rasileiro e das polticas pF%licas relacionadas &est)oam%iental, em &eral, pauta(a4se por uma (is)o centrada nasuperioridade da natureza so%re a esp1cie humana. A cria$)o deespa$os naturais prote&idos, ou 3nidades de !onser(a$)o, # era umadas principais estrat1&ias da poltica am%iental %rasileira %aseada no

    modelo %io&eo&r#fico de Uilhas de di(ersidadeV. "ito de outra forma,as 3!s desse perodo eram criadas so% um re&ime de 3nidade de+rote$)o Inte&ral ;3+I=, onde n)o se admite a perman6ncia humana denenhuma natureza. At1 o final dos anos DJC, foram criadas setenta e'uatro 3!s com essas caractersticas ;HRAN"H, BCC=.

    !om a difus)o da no$)o de desen(ol(imento sustent#(el, apartir da RIH B, o de%ate so%re popula$Ges humanas e 3!s &anharele(o e processa4se uma mudan$a de foco nas polticas de cria$)ode espa$os prote&idos. A admiss)o de al&uns tipos de intera$Ges

    entre esses espa$os e a sociedade come$a a ser difundida. H -rasil,se&uindo a tend6ncia &lo%al, adota o modelo de 3!s de 3soSustent#(el ;33Ss= como principal estrat1&ia poltica para &est)oda %iodi(ersidade. H modelo de 33Ss tem por o%eti(oUcompati%ilizar a conser(a$)o da natureza com o uso sustent#(elde parcela de seus recursos naturaisV ;-RASI, BCCC=. Se&undoHrlando ;BCC=, entre o incio dos anos DC e o ano de BCCJforam criadas DD> 33Ss contra apenas 'uatorze 3+Is. Isso

    e(idencia claramente uma mudan$a de foco so%re as polticas de

    Geosul, v.30, n.60, 2015 BD

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    &est)o am%iental, 'ue a&ora passam a %uscar estrat1&iasconciliat0rias entre interesses sociais, econXmicos e am%ientais.

    Em recente a(alia$)o do Sistema Nacional de 3nidades de!onser(a$)o ;SN3!=, o Minist1rio do Meio Am%iente afirma 'uea cria$)o de espa$os naturais prote&idos continua sendo uma das

    principais estrat1&ias da poltica am%iental %rasileira. Se&undo oMMA ;BCDC=, essa orienta$)o tem por %ase o fato de 'ue adelimita$)o de #reas naturais prote&idas 1 a mais anti&a e efeti(a

    iniciati(a para a conser(a$)o da natureza em todo o mundo.

    O Sistema Nacional de Unidades de Conservao

    A implanta$)o do SN3! sinaliza a consolida$)o da polticanacional de &est)o territorial de espa$os naturais. Esse Sistema or&anizae inte&ra o aparato normati(o 'ue re&ia as unidades de conser(a$)o, at1ent)o, pul(erizado em distintos dispositi(os urdicos distri%udos emdiferentes esferas &o(ernamentais, e define crit1rios e diretrizes paracria$)o de no(as #reas. Ademais, esta%elece re&ras para o maneo das3!s nas diferentes escalas poltico4administrati(as, desde osmunicpios at1 a federa$)o, e as or&aniza em dois &randes &rupos: 3!sde +rote$)o Inte&ral, onde a interfer6ncia humana direta 1 proi%ida, e3!s de 3so Sustent#(el, 'ue admite a presen$a de popula$Ges humanasem seu interior. Esses dois &rupos se su%di(idem em doze cate&orias demaneo ;tipos diferentes de 3!s=, (ariando de acordo com o &rau de

    prote$)o am%iental a 'ue se prestam. H &rupo das 3!s de 3so

    Sustent#(el, do 'ual faz parte a 3! analisada neste arti&o, a%ran&e setedas doze cate&orias, sendo 'ue cada uma dessas cate&orias reflete umconunto de caractersticas sociais, econXmicas e am%ientais particularescom re&imes de prote$)o territorial distintos. No caso das Wreas de+rote$)o Am%iental ;A+As=, cate&oria a'ui analisada, o o%eti(oconsiderado pelo Estado para sua cria$)o consiste em ordenar o uso doterrit0rio com (istas a conser(ar recursos naturais especficos ;-RASI,BCCB=.

    Geosul, v.30, n.60, 2015BB

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    Apesar dos &anhos relati(os prote$)o da naturezaer see aofortalecimento do poder de &est)o e fiscaliza$)o do Estado, o SN3!trouxe consi&o o a&ra(amento de disputas territoriais e por recursosnessas #reas. Em espa$os historicamente utilizados pelo homem semmaiores preocupa$Ges com os aspectos am%ientais passam a (i&orar umconunto de re&ras e mecanismos de controle do uso desses espa$osmais restriti(os e, em muitos casos, a exemplo das 3+Is, %astantecoerciti(os, pois as popula$Ges residentes t6m de ser realocadas para

    fora dessas #reas. Hu sea, na medida em 'ue a poltica de cria$)o de3!s se estrutura, fortalece e expande, aprofundam4se as tensGes entreEstado e sociedade ci(il em torno da disputa por espa$o e recursos.

    Nesse sentido, o Estado, na fi&ura do 0r&)o am%iental respons#(el pela&est)o da 3!, interfere na din/mica social local como um no(o atorsocial 'ue, dependendo dos interesses, (alores e proetos de cada ator,

    pode representar um inimi&o ou aliado. [ dessa maneira 'ue oesta%elecimento de uma 3! modifica tam%1m o o&o de for$as e,

    conse'uentemente, as rela$Ges de poder nas di(ersas escalas de atua$)odos atores li&ados direta ou indiretamente a essas #reas."entre as doze cate&orias de maneo pre(istas no SN3!, as

    A+As s)o as mais perme#(eis s a$Ges humanas e, do ponto de (istale&al, as 'ue apresentam menor &rau de prote$)o am%iental e, portanto,de controle espacial. Nesse caso admite4se a presen$a de terras pF%licase pri(adas no interior da 3!, sem a necessidade de desapropria$)o.!om efeito, as A+As comportam desde certos n(eis de a&lomera$)o

    ur%ana e comercial at1 empreendimentos industriais de %aixo impactosocioam%iental, com a ressal(a de 'ue tais estruturas esteam de acordocom os o%eti(os de cria$)o da 3!. Mesmo 'ue seam admitidasdi(ersas pr#ticas econXmicas e recreati(as, ainda assim, o &rau derestri$)o do uso do espa$o imposto por essa cate&oria 1 suficientementecapaz de alterar a din/mica econXmica e socioam%iental local, 'uandocomparada a #reas n)o contempladas no SN3!. +or admitirem em seuinterior um amplo espectro de ati(idades humanas, essas #reas, em&eral, s)o l0cus de &rande (ariedade de tensGes e conflitos.

    Geosul, v.30, n.60, 2015 B

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    5 conflito entre desenvolvimento pes6ueiro e conservaoambiental na .P. da Baleia Franca

    !om aproximadamente DK.CCC ha, a A+A-9 a%ran&e #reasterrestres e a'u#ticas de no(e municpios costeiros da por$)o centro4suldo estado de Santa !atarina localizado no sul do -rasil ;9i&ura D=. Are&i)o, conhecida por suas %elssimas praias e sistemas lacustres,apresenta intensa ati(idade turstica. Suas %aas e enseadas constituem a

    mais importante #rea de concentra$)o reproduti(a de %aleias4francas dopas ;+AA\\H et al., BCC>=. No 'ue tan&e din/micasocioeconXmica, al1m de sofrer expressi(a press)o imo%ili#ria eturstica, de(ido ao potencial paisa&stico de suas praias, inte&ra umadas zonas com maior produti(idade pes'ueira do pas. A re&i)o 1historicamente po(oada por pe'uenas comunidades de pescadoresartesanais e ainda hoe preser(a uma 'uantidade expressi(a de famlias'ue so%re(i(em da extra$)o pes'ueira artesanal. A an#lise dos "ados do

    Re&istro 5eral da Ati(idade +es'ueira demonstra, por um lado, aexist6ncia de um contin&ente de tra%alhadores informais li&ados pescaartesanal B (ezes ;L= maior 'ue a'ueles associados indFstria

    pes'ueira e, por outro, uma expressi(a ati(idade de pesca industrial nare&i)o ilustrada pela lideran$a nacional da indFstria pes'ueiracatarinense na produ$)o de pescado processado ;M+A, BCDD=. !omoresultado tem4se uma situa$)o local de intensa competi$)o por recursos

    pes'ueiros e #reas de pesca especficas e localizadas.

    A natureza do conflito entre pesca artesanal e industrial:

    organizao social e gesto pblica

    Antes de caracterizarmos os atores associados ao campo dapesca na A+A-9, %em como os conflitos e tensGes especficosassociados pro%lem#tica, faz4se necess#rio tecer al&umas

    Geosul, v.30, n.60, 2015BP

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    considera$Ges so%re a situa$)o material da pesca artesanal e industrial K

    'ue, na re&i)o, assume import/ncia mpar por tr6s razGes principais.+rimeiro pela natureza locacional e &eo&r#fica da 3! en'uanto uma#rea de prote$)o constituda fundamentalmente por sociedadeslitor/neas cuo modo de or&aniza$)o econXmica e cultural 1constantemente permeado pelas rela$Ges com o mar e com a pesca.Se&undo pela centralidade da ati(idade pes'ueira de %ase tradicionalen'uanto elemento de sustenta$)o identit#ria, cultural e econXmica de

    parcela expressi(a das popula$Ges locais. Terceiro, conforme men$)oanterior, pela import/ncia do se&mento pes'ueiro industrial de Santa!atarina, lder nacional na produ$)o de pescados de ori&em extrati(a>.

    K A pesca industrial caracteriza4se em fun$)o do tipo de em%arca$)o;m1dio e &rande porte= e da rela$)o de tra%alho dos pescadores 'ue, aocontr#rio do se&mento artesanal, possuem (nculo empre&atcio com oarmador de pesca ;respons#(el pela em%arca$)o= ;SEA+, sd=.

    > Existem dois tipos de ati(idade pes'ueira: a extrati(a e a n)o extrati(a.Na pesca extrati(a os recursos s)o extrados diretamente dos esto'uesnaturais ;marinhos ou de #&ua doce=. Na ati(idade n)o extrati(a a

    produ$)o 1 o%tida por meio de culti(os, em cati(eiro, de or&anismos de

    ha%itat predominantemente a'u#tico, a exemplo de camarGes, peixes,r)s, ostras, mariscos, dentre outros.

    Geosul, v.30, n.60, 2015 B

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    Fi4ura : ocaliza$)o da Wrea de +rote$)o Am%iental da -aleia 9ranca3m primeiro ponto a ser su%linhado est# relacionado

    import/ncia da pesca artesanal para a composi$)o da identidadedas sociedades litor/neas da A+A-9. Sa%e4se 'ue a ati(idade

    pes'ueira foi um componente central na escolha dos espa$os edistri%ui$)o das famlias de colonizadores a$orianos 'ue mi&raram

    para o -rasil setentrional em meados do s1culo YIII. Aspe'uenas popula$Ges costeiras manti(eram4se essencialmente

    como pescadoras e a&ricultoras at1 os anos de DKC, 'uandocome$aram a intera&ir com turistas e no(os moradores oriundos deoutras partes do estado e do pas. Ainda hoe, os (alores, h#%itos ecostumes li&ados cultura a$oriana e pes'ueira est)o fortemente

    presentes na forma$)o territorial litor/nea do estado de Santa!atarina. H modo de (ida essencialmente orientado pelo mar,tendo a pesca e a a&ricultura como ati(idades 'ue nortea(am atemporalidade da (ida social e familiar, somados aos (alores e

    h#%itos culturais e reli&iosos herdados de +ortu&al, foraram as%ases para a forma$)o identit#ria dessas primeiras sociedadeslitor/neas e demarcaram definiti(amente sua UalteridadeV ] nosentido discutido por Souza ;D= ] frente s demais culturas'ue, mais tarde, (ieram a se esta%elecer no territ0rio. +ara esseautor, o territ0rio perce%ido en'uanto um campo de for$as e umateia ou rede de rela$Ges sociais 1 definido pelos limites de umaalteridade. Nesta pes'uisa, o conceito de territorialidade 1

    compreendido no sentido atri%udo por Sac ;BCDD, p.>K= comoU;...= a tentati(a, por indi(duo ou &rupo, de afetar, influenciar oucontrolar pessoas, fenXmenos e rela$Ges, ao delimitar e asse&urarseu controle so%re certa #rea &eo&r#fica&, o territ0rio. Assim, noslocais de concentra$)o das popula$Ges pes'ueiras presentes naA+A-9 podemos identificar claramente uma territorialidadeassociada pesca, na perspecti(a atri%uda por Sac. Hu sea, trata4se de uma espacialidade li&ada ati(idade pes'ueira 'ue semanifesta a partir das tentati(as, exitosas ou n)o, dos indi(duos e

    &rupos no sentido de influenciar outras pessoas, rela$Ges e

    Geosul, v.30, n.60, 2015 B>

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    fenXmenos para &arantir o controle so%re certa #rea &eo&r#fica. [ustamente essa territorialidade 'ue difere o &rupo social li&ado aomodo de (ida pes'ueiro da'ueles 'ue est)o fora do &rupo, aexemplo de turistas ocasionais eou moradores locais 'ue n)o t6minflu6ncia da cultura da pesca na sua forma$)o cultural e afeti(a.

    Em%ora as razes hist0ricas e culturais associadas ao mar e pesca industrial seam as mesmas da'uelas 'ue lastreiam a pescaartesanal, nota4se uma ntida diferencia$)o no modo como os

    indi(duos se en(ol(em com a ati(idade. +ode4se identificar doisfatores de diferencia$)o. H primeiro, de cunho territorial, refere4seao modo como os atores li&ados ao se&mento industrial serelacionam com o espa$o &eo&r#fico da pesca. +ara esses atores, as#reas de pesca est)o dissociadas da con(i(6ncia social e familiar.

    N)o h# uma correspond6ncia entre tra%alho e afeti(idade. Hs%arcos de pesca nada mais s)o do 'ue o local de tra%alho ou, nocaso dos armadores e demais empres#rios do setor, o meio de

    produ$)o. !om a perda dos la$os sim%0licos e afeti(os 'ue unem opescador industrial ao espa$o da pesca o 'ue fica 1 a identidade depescador, ou sea, o aspecto estrutural da ati(idade. H se&undofator de diferencia$)o est# associado ao modo como os atoreslidam com a disponi%ilidade de recursos. +ara um pescadorartesanal, os recursos pes'ueiros t6m seus ciclos %iol0&icos 'ue

    precisam ser respeitados para 'ue, nos anos se&uintes, as condi$Gesde pesca se perpetuem. Essa prerro&ati(a 1 mantida pela maioria

    deles. Mesmo 'ue, (ia de re&ra, os pescadores artesanais seamimpulsionados pela l0&ica de mercado ;'uanto maior a demandamaior ser# o esfor$o de pesca=, o modo como executam aati(idade, incluindo os tipos de petrechos, em%arca$Ges ediferentes modalidades, n)o &era si&nificati(os impactos so%re o(olume dos esto'ues pescados.

    Hutro ponto a ser destacado diz respeito ao potencialcomercial do se&mento pes'ueiro no estado de Santa !atarina. Hestado 1 considerado o maior polo %rasileiro de pesca, sendo ose&mento industrial respons#(el pela produ$)o de BCL do pescado

    Geosul, v.30, n.60, 2015BJ

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    MARTINS, Andreza et al. Entre peixes e humanos: o conflito pesca e ...

    nacional e cerca de JCL da produ$)o de pescado processadoconsumido internamente, &rande parte dele extrado do litoral daA+A-9 ;SE+ES!A, BCDC=. A intensa ati(idade industrial (emimpactando si&nificati(amente a (aria%ilidade e a%und/ncia dosesto'ues de fauna marinha, assim como o desen(ol(imento da

    pesca artesanal local.

    A disputa entre pesca artesanal e industrial na APA!

    A an#lise do campo de disputas mais &eral entre pescaartesanal e industrial na A+A-9 re(elou um campo socialmultifacetado e extremamente hetero&6neo composto por seisatores cha(e humanos e dois atores n)o4humanos ;nossos atores4rede=, a sa%er: D= atores humanos 8 se&mento pes'ueiro de %aseartesanal, outro de %ase industrial, Minist1rio do Meio Am%iente;MMA=, Instituto !hico Mendes de +rote$)o da -iodi(ersidade;I!M-io=, e'uipe administrati(a A+A-9 e Minist1rio da +esca eA'uicultura ;M+A=. !om maior ou menor &rau de influ6ncia, essesatores ora disputam, ora cooperam entre si de acordo com asitua$)o e os interesses em o&o2 B= atores n)o4humanos 8 %aleias e

    peixes. Se destacam pela ine(el influ6ncia na or&aniza$)oterritorial da A+A-9, %em como na confi&ura$)o e desdo%ramentodo conflito a'ui analisado.

    Em%ora a press)o da pesca industrial so%re a #rea marinhada 3! como um todo sea intensa e constante, o conflito com a

    pesca artesanal se materializa em al&umas zonas e so%re al&unstipos de recursos or&anizando4se, %asicamente, em torno de tr6smodalidades de pesca: i= pesca de arrasto2 ii= captura de isca (i(a

    para a pesca do atum e2 iii= pesca da tainha. !ada uma dessasmodalidades reproduz uma estrutura con#lituosaparticular dentrodo conflito maior entre pesca artesanal e industrial. Essasestruturas de con#litoss)o compostas por um conunto particularde intera$Ges entre os atores dos se&mentos pes'ueiros artesanal e

    industrial, 0r&)os &o(ernamentais respons#(eis pela &est)o da

    Geosul, v.30, n.60, 2015 B

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    pesca em escala local e nacional e demais atores representantes daspopula$Ges implicadas ;atores humanos= e entre esses e os atoresn)o4humanos. No 'ue tan&e as %aleias, seu efeito mais e(idente eimediato so%re o conflito da pesca materializa4se na forma dere&ras de uso do espa$o e recursos naturais 'ue, em Fltima an#lise,foram esta%elecidas e t6m sido alteradas em fun$)o da distri%ui$)oe presen$a sazonal de %aleias na re&i)o. A mesma l0&ica se repete

    para os peixes ;incluso todas as esp1cies so%re as 'uais existem

    disputas=, or&anismos com influ6ncia essencial e ati(a naor&aniza$)o das disputas entre pesca industrial e artesanal nare&i)o, assim como no posicionamento dos atores humanosimplicados no conflito.

    !om efeito, as tensGes particulares entre pesca artesanal eindustrial na A+A-9 s)o reproduzidas e UaprofundadasV pelacompeti$)o por recursos pes'ueiros e #reas de pesca especficos elocalizados. Zuanto natureza dessas disputas, o conflito est#

    correlacionado a duas pro%lem#ticas distintas: o crescimentoeconXmico da pesca industrial e a fra&ilidade do ordenamentoespacial da ati(idade pes'ueira. Esses s)o, respecti(amente, aori&em e a conse'u6ncia do pro%lema e referem4se, no primeirocaso, s incon&ru6ncias esta%elecidas entre o desen(ol(imento

    pes'ueiro de %ase industrial e a conser(a$)o das esp1cies pescadas,resultando em assimetrias no acesso aos recursos. Hu sea, 'uantomenos peixe, pior para o setor artesanal, menos capitalizado e

    dotado de menor potencial de captura, e maiores as tensGes entre osatores implicados nas disputas. H se&undo caso, diz respeito aoordenamento da pesca na A+A-9 'ue, ainda hoe, encontra4se Uema%ertoV e 1 causa, mas tam%1m conse'u6ncia dos conflitos. Seefeti(amente implantado, o ordenamento da ati(idade pes'ueira

    poderia minimizar as disputas localizadas com o se&mentoindustrial, na medida em 'ue seriam criadas re&ras e crit1rios clarose Ufiscaliz#(eisV para re&ulamentar a ati(idade dentro da 3!.

    Em tese, dentro de uma 3! de uso sustent#(el, oordenamento e a &est)o territorial s)o ati(idades menos complexas

    Geosul, v.30, n.60, 2015C

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    do 'ue fora desses espa$os, onde os interesses n)o s)o re&uladospela premissa da conser(a$)o am%iental e da manuten$)o daspopula$Ges tradicionais. Nas A+As, essa prerro&ati(a 1 ainda maispresente, haa (ista 'ue essa cate&oria de 3! 1 criada com oo%eti(o conunto de prote&er a di(ersidade %iol0&ica, est1tica ecultural, al1m de disciplinar o uso e ocupa$)o de determinadosespa$os &eo&r#ficos com rele(ante import/ncia para a manuten$)oda 'ualidade de (ida das popula$Ges humanas ;-RASI, BCCB=.

    Nessa perspecti(a, o fa(orecimento das popula$Ges pes'ueiras de%ase artesanal da A+A-9 seria uma a$)o esperada e deseada, dadaa (ariedade de incenti(os normati(os ;plano de maneo, portarias,instru$Ges normati(as, etc.= dispon(eis para a ado$)o de medidasnessa dire$)o. Se efeti(amente implantado, o ordenamento espacialdas ati(idades pes'ueiras na re&i)o poderia minimizar as disputaslocalizadas com a pesca industrial. Entretanto, como (eremos, arealidade 1 mais complexa do 'ue aparenta e os pr0prios

    pescadores artesanais s)o, em parte, respons#(eis pela fra&ilidadeda re&ulamenta$)o espacial da pesca na 3!.

    ! se'mento es$ueiro

    !onforme ressaltam diferentes autores 'ue in(esti&aram ouni(erso da pesca artesanal na re&i)o, o se&mento pes'ueiro de

    %ase artesanal nessa #rea n)o 1 uno nem coeso ;A"RIANH, BCDD29IAR"I, BCC>=. Adriano ;BCDD= descre(e as intera$Ges entre os

    pescadores dos municpios de 5aropa%a e Im%itu%a comoextremamente hierar'uizadas e or&anizadas mediante rela$Ges dedomina$)o dentre as 'uais os la$os familiares, o poder econXmico;dos propriet#rios de ranchos, %arcos e demais utenslios de pesca=,o conhecimento inter&eracional ;dos mais idosos, chamados deUmestres de pescaV= e as associa$Ges poltico4partid#riasinterferem, em distintos n(eis e intensidades, na or&aniza$)ocoleti(a dos pescadores se&undo contextos especficos.

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    E, nesse sentido, 'uanto maior a aproxima$)o das lentes dean#lise te0rica e emprica, mais su%di(isGes, disputas edi(er&6ncias ser)o encontradas. Simultaneamente o%ser(am4se,tam%1m, no(as alian$as e con(er&6ncias inter&rupais, muitas(ezes, inesperadas. 3m exemplo marcante s)o os pe'uenosacordos feitos entre al&uns pescadores artesanais e %arcosindustriais de pesca, no 'ual o pescador artesanal a(isa para omestre da em%arca$)o industrial 'uando os cardumes de sardinha e

    manu%a est)o perto da praia, para 'ue a em%arca$)o industrialpossa captur#4los e utiliz#4los na pesca do atum em alto mar. Emtroca, rece%em com%ust(el para sua em%arca$)o e, por (ezes, uma'uantidade de atuns pescados. Essa situa$)o 1 no mnimo curiosahaa (ista o peso hist0rico dos conflitos entre pesca industrial eartesanal em torno da modalidade industrial de captura com isca4(i(a, 'ue se apropria de esp1cies pes'ueiras da %ase da cadeia, isto1, 'ue ser(em de alimento para outras esp1cies al(o das pescarias

    artesanais. Se&undo 9ilardi ;BCC>=, casos contradit0rios como esse,em 'ue al&uns pescadores ()o de encontro s demandas coleti(asda cate&oria, n)o s)o nem exce$)o, nem a re&ra. Eles acontecemcom certa fre'u6ncia e s)o elementos 'ue caracterizam a estruturaor&anizati(a do se&mento pes'ueiro de %ase artesanal na re&i)o.

    3ma ima&em metaf0rica interessante para definir o uni(ersoda pesca artesanal na A+A-9 1 a'uela formada 'uando olhamosatra(1s de um caleidosc0pio e nos deparamos com uma fi&ura

    &eom1trica multifacetada e or&anizada por inFmeras su%di(isGes'ue, untas, compGem um todo. Na medida em 'ue &iramos ocaleidosc0pio, ainda 'ue a fi&ura &eom1trica maior se mantenha,os pe'uenos fra&mentos de cristais 'ue su%di(idem essa fi&ura serea&rupam para formar no(as su%fi&uras. Mo(imento semelhante 1o%ser(ado para a or&aniza$)o coleti(a do se&mento pes'ueiroartesanal. Nessa re&i)o, o se&mento 1 composto por inFmerossu%&rupos menores 'ue se estruturam e desestruturamconstantemente conforme a situa$)o, interesses e proetos polticos

    presentes nas disputas cotidianas e localizadas. +ara tratar dessa

    Geosul, v.30, n.60, 2015B

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    or&aniza$)o complexa, multifacetada e din/mica, a teoria do ator4rede 1 %astante oportuna. Ela nos auda a compreender e aceitar'ue certas estruturas sociais n)o podem e n)o de(em serapreendidas mediante um en'uadramento analtico pr1(io eest#tico, 'ue aloca de antem)o os sueitos ou atores sociais dentrode estruturas or&anizati(as te0ricas preconce%idas. Assim, osexemplos mencionados acima, 'ue su%linham a presen$a deacordos ocasionais entre pescadores artesanais e em%arca$Ges

    industriais de pesca de atum, nos mostram 'ue em%ora haadisputas concretas en(ol(endo os pescadores dos se&mentosindustrial e artesanal, n)o 1 poss(el considerar os su%&rupos 'uecompGem essa Fltima cate&oria como homo&6neos e coesos.

    !s atores olticos

    Este item pretende destacar as rela$Ges entre am%os osse&mentos pes'ueiros ;industrial e artesanal= e os atores estataisimplicados no conflito da pesca com o prop0sito de compreendercomo se esta%elece e se perpetua a rela$)o entre as a&6ncias estataisde &est)o am%iental e pes'ueira e o se&mento pes'ueiro na A+A-9 ea(aliar seus resultados para a conser(a$)o dos am%ientes marinhos dare&i)o. A an#lise das interfaces esta%elecidas entre esses atores

    permitiu identificar tr6s pontos centrais, 'ue somados hetero&eneidade do se&mento pes'ueiro de %ase artesanal e sassimetrias de poder entre esse se&mento e o de %ase industrial,

    podem auxiliar na elucida$)o dos principais o%st#culos aoordenamento da pesca na'uela re&i)o: i= o direcionamento dosesfor$os de &est)o relati(os pesca e recursos pes'ueiros para ose&mento de %ase artesanal2 ii= a fra&ilidade de interface entre a e'uipe&estora da A+A-9 e o se&mento industrial da pesca2 iii= asincon&ru6ncias e incertezas relacionadas as institui$Ges estataisrespons#(eis pela administra$)o am%iental nas di(ersas escalas dafedera$)o.

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    !om %ase na an#lise dos e(idosmexicanosJ, Nuiten ;DJ=su&ere forte correspond6ncia entre a falta de compreens)o, por partedos ser(idores das a&6ncias estatais, da real condi$)o estrutural dosse&mentos sociais al(o de determinados pro&ramas &o(ernamentaise o insucesso de muitos desses pro&ramas. +ara essa autora, &rande

    parte das a$Ges &o(ernamentais no campo do desen(ol(imento depolticas pF%licas 1 sustentada por teorias 'ue i&noram a l0&ica e o(alor das formas existentes de or&aniza$)o local, considerando4as

    simplesmente como de natureza fra&mentada e ca0tica e, portanto,pass(eis de serem controladas e or&anizadas pelos atores estatais.No &eral, o discurso desses ser(idores reproduz o ide#riodesen(ol(imentista de 'ue os se&mentos menos fa(orecidos do

    ponto de (ista socioeconXmico s)o incapazes de ne&ociar e disputarUem p1 de i&ualdadeV com os &rupos mais capitalizados ;capitaleconXmico e co&niti(o=. So% esse prisma, os pro&ramas estataisdedicados a promo(er o desen(ol(imento local e a melhoria das

    condi$Ges de (ida das popula$Ges de(em atender esses &rupos nosentido de Ucapacit#4losV para a atua$)o nas situa$Ges de interfaceconflituosas. No &eral, tais iniciati(as s)o direcionadas para

    promo(er a inser$)o dessas popula$Ges nos mercados e com isso, nomodus oerandido sistema socioeconXmico (i&ente. +ara Nuiten;DJ=, as teorias 'ue sustentam esse tipo de iniciati(a ne&li&enciamo fato de 'ue a diferencia$)o ;entre &rupos menos e maiscapacitados= tende a criar ou refor$ar diferen$as de poder.

    Em nossa in(esti&a$)o encontramos situa$)o semelhante descrita por essa autora. Entre BCC e BCDC, a 'uase totalidade dasa$Ges de &est)o da e'uipe da A+A no campo da pesca centrou4se

    JHs e(idos mexicanos s)o propriedades rurais de uso comum 'ue det1mexpressi(a import/ncia no meio rural do pas. H sistema consiste naapropria$)o, pelo Estado, de terras pri(adas e na sua disponi%iliza$)o parauso pF%lico. "e acordo com Nuiten ;DJ=, a pr#tica foi muito comumdurante a reforma a&r#ria mexicana e a%olida com a reforma da le&isla$)o

    a&r#ria da constitui$)o nacional em DB. A or&aniza$)o e(idalera pr#ticacorrente durante o Imp1rio Asteca.

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    em tr6s frentes de a$)o interconectadas e so%repostas (oltadasexclusi(amente para o se&mento pes'ueiro de %ase artesanal. A

    primeira, (oltada para o fortalecimento poltico dos atores locaisassociados pesca artesanal. A se&unda, no apoio cria$)o de duasReser(as Extrati(istas ;RESEY= de pesca artesanal: a RESEY do!a%o de Santa Marta 5rande e a RESEY de I%ira'uera,rei(indicadas pelo se&mento artesanal. A terceira, atuando comomediador em situa$Ges conflituosas especficas demandadas pelos

    pescadores artesanais.So%re a 'uase aus6ncia de interface com o se&mento

    industrial, com exce$)o de al&uns contatos indiretos ;(ia ofcios outelefonemas=, n)o hou(e tentati(as por parte da e'uipe da A+A-9no sentido de de%ater com diri&entes da pesca industrial assitua$Ges conflituosas li&adas pesca na re&i)o. Zuando inda&adoso%re o moti(o da aus6ncia de intera$)o com o setor industrial, orespons#(el pelas a$Ges de &est)o dos recursos pes'ueiros da

    A+A-9 considera 'ue o contato com a indFstria pes'ueira ser#esta%elecido posteriormente no momento em 'ue os setoresartesanais esti(erem mais %em preparados, do ponto de (ista

    poltico, para ne&ociar com o se&mento industrial.A relati(a i&nor/ncia das lideran$as do maior sindicato

    patronal da pesca industrial do -rasil ;SIN"I+I= so%re a exist6nciade uma #rea de prote$)o marinha no litoral centro4sul catarinensecomplementa o 'uadro de inexist6ncia de intera$)o entre a e'uipe

    da A+A-9 e o se&mento industrial da pesca. Zuando 'uestionadosse tinham conhecimento da exist6ncia de uma A+A na re&i)o, aslideran$as do SIN"I+I demonstraram n)o ter maiores informa$Gesso%re a 3!. No &eral, detinham uma (a&a lem%ran$a da cria$)o deuma #rea prote&ida para as %aleias, mas n)o a associaram aocontrole do uso do espa$o pes'ueiro ou a proi%i$Ges de pescaocasionadas pela presen$a da 3!.

    Essa situa$)o corro%ora as considera$Ges de Nuiten ;DJ=,'uando afirma 'ue os atores estatais tendem a desconsiderar o o&ode for$as 'ue se manifestam nos espa$os extra4locais onde incidem

    Geosul, v.30, n.60, 2015

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    os pro&ramas &o(ernamentais. +ara essa autora, ainda 'ue al&uns&rupos care$am de medidas particulares e especializadas, i&norar a

    presen$a de atores Umais estruturadosV, material e su%eti(amente,pode implicar &ra(es erros de &est)o e, conse'uentemente,comprometimento do sucesso das a$Ges estatais localizadas, o 'uede fato ocorreu, como ficar# e(idente na an#lise do caso dare&ulamenta$)o da pesca da tainha, apresentado a se&uir.

    ! caso da re'ulamenta)o da esca da tainha

    3m dos principais conflitos 'ue compGem a tens)o mais&eral entre pesca artesanal e industrial na A+A-9 refere4se captura da tainha pelo sistema de UarrastoV. A tainha 1 uma esp1ciemi&rat0ria 'ue realiza um percurso no sentido sul8norte,deslocando4se a partir da a&oa dos +atos, no Rio 5rande do Sul,extremo sul do -rasil, se&uindo pela linha da costa at1 o estado doRio de Qaneiro, sudeste do -rasil, para realizar a deso(a. Nessedeslocamento, os cardumes percorrem as partes mais rasas, %em

    pr0ximas s praias, onde 1 poss(el a captura pelos pescadoresartesanais ;ME"EIRHS, BCC=. A disputa entre os dois tipos de

    pesca pela tainha 1 recente, por1m extremamente contundente parao contexto da A+A-9, e en(ol(e, na sua ori&em, uma conun$)o defatores defla&rados a partir de sucessi(as inter(en$Ges do Estado

    %rasileiro para o controle dos esto'ues de sardinha, com maior6nfase a partir da Fltima crise da sardinha de BCCC. H modo como o

    caso da re&ulamenta$)o da tainha (em sendo &erido pela e'uipe daA+A-9 tem influenciado a forma como os pescadores artesanais serelacionam com a e'uipe &estora da 3!.

    As %ruscas redu$Ges hist0ricas no (olume dos esto'ues desardinha somadas s sucessi(as oscila$Ges nos perodos de

    proi%i$)o da pesca ;perodos de defeso= resultaram na insta%ilidadedo se&mento industrial e fizeram com 'ue, em particular a partir do

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    ano de BCCC, parte da frota traineira mi&rasse para a pesca datainha, so%retudo, durante os perodos de defeso da sardinha. !omo tempo, essa situa$)o foi se a&ra(ando em conse'u6ncia docrescente interesse do mercado internacional pela o(a da tainha,considerada o Uca(iarV %rasileiro e lar&amente exportada para Wsiae Europa. "e(ido ao ele(ado poder de captura das em%arca$Gestraineiras, os esto'ues de tainha foram a%ruptamente reduzidos;MIRAN"A et al., BCDD=. A so%reposi$)o de #reas de pesca

    industrial com o setor artesanal tam%1m reduziu de formaexpressi(a o (olume dos cardumes capturados por esse Fltimo&rupo.

    Nesse contexto se aprofundaram as disputas entre pescaartesanal e industrial com reflexos diretos na A+A-9, pois nessazona a tainha 1 uma das esp1cies com maior representati(idadesocioeconXmica para o setor de %ase artesanal. H perodo da safra;maio e ulho= 1 um dos momentos mais esperados pelas

    popula$Ges locais, incluindo n)o s0 os se&mentos en(ol(idosdiretamente com a pesca, mas tam%1m por a'ueles 'ue dela se%eneficiam mediante a a'uisi$)o do produto, a exemplo derestaurantes, peixarias, mercados, hot1is, dentre outros. Medeiros;BCCB= o%ser(ou 'ue a captura da tainha incrementa a rendafamiliar do pescador em at1 'uatro (ezes, &arantindo uma mar&emfinanceira para os perodos de escassez da pesca. Al1m daimport/ncia material, a pesca da tainha 1 uma ati(idade 'ue

    articula outros aspectos li&ados socia%ilidade e territorialidadedas popula$Ges pes'ueiras. A pesca artesanal da tainha 1 realizadatradicionalmente no sistema de arrasto de praia desde o tempo dosimi&rantes portu&ueses. Nesse tipo de pesca, Uos pescadoresreFnem4se num sistema de ^camaradas_ e ^tripulantes_ para arealiza$)o da ati(idade. Hs ^tripulantes_ s)o compostos por P a

    pescadores profissionais, al1m dos (i&ias, respons#(eis por a(istar

    Em%arca$Ges 'ue operam com redes de cerco especficas para a pescada sardinha.

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    o cardume e coordenar, da %eira da praia, o lan$amento da redepelos tripulantes. Hs ^camaradas_ s)o formados por pescadores,aposentados e moradores da comunidade 'ue completam um ritocomunit#rio de inte&ra$)o, reciprocidade e partilha dos recursos

    pes'ueirosV ;ME"EIRHS, BCC, p.DK=.Em BCCJ, o I-AMA pu%licou a Instru$)o Normati(a n` D>D

    ;IN D>D=, 'ue esta%elece normas, crit1rios e padrGes para oexerccio da pesca da tainha no litoral das re&iGes sudeste e sul do

    -rasil ;-rasil, BCCJ=. Essa le&isla$)o estipula a proi%i$)o da pr#ticade todas as modalidades de pesca, exceto a pesca com tarrafa, nasdesem%ocaduras estuarino4la&unares e permite a pesca anual datainha somente a partir de 'uinze de maio tanto para a pesca de

    %ase artesanal 'uanto industrial. Importante &rifar 'ueanteriormente a captura da tainha come$a(a entre os meses demar$o e a%ril 'uando as em%arca$Ges industriais se desloca(am

    para a sada da a&oa dos +atos, tida como o U%er$#rioV natural de

    muitas esp1cies de pescado, inclusi(e das tainhas ;ME"EIRHS,BCC=. Al1m disso, a IN D>D limitou o esfor$o de pesca m#ximopermitido para frota industrial de traineiras a sessenta em%arca$Gese proi%iu o exerccio de todas as modalidades de pesca artesanal,com exce$)o do arrasto de praia, em uma faixa de uma milhan#utica da costa e trezentos metros dos costGes rochosos em todolitoral de Santa !atarina durante a temporada da tainha. EssaFltima proi%i$)o tinha o prop0sito de (alorizar a pesca de arrast)o

    de praia e diminuir os constantes conflitos, internos ao setorartesanal, entre a pesca comunit#ria pelo arrasto de praia e a pescacom redes de emalhe. Na tentati(a de resolu$)o do pro%lema daso%reposi$)o de #reas de pesca entre os setores artesanais eindustriais foi esta%elecido um corredor de exclus)o de pescaindustrial 'ue, dentro da A+A-9, incide so%re uma faixa de cincomilhas da costa. Assim, 'uando a%erta a temporada da tainha, a

    partir de 'uinze de maio, as traineiras com permiss)o para a pr#ticada ati(idade na re&i)o s0 podem pescar na #rea externa ao corredorde cinco milhas n#uticas.

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    H aparato le&al foi rece%ido com indi&na$)o pelo setorindustrial e por parcela do setor artesanal da pesca. Hs empres#riosda frota industrial consideram o corredor de exclus)o da pescamuito amplo e sentiram4se preudicados com o reduzido nFmero deem%arca$Ges li%eradas para a pr#tica: sessenta no m#ximo.Medeiros ;BCC= explica 'ue antes, esse nFmero era deaproximadamente duzentas em%arca$Ges podendo aumentarindefinidamente, pois so%re a modalidade de captura da tainha n)o

    incidia nenhum tipo de controle le&al. Ademais, parcela do setorartesanal, em particular os pescadores 'ue opera(am com %arcos erede de emalhar, ficaram descontentes com a proi%i$)o da pescaartesanal na faixa de uma milha ;D.JCC metros= das praias etrezentos metros dos costGes. Eles ar&umenta(am 'ue 'uase todo oesfor$o de pesca se concentra nessa faixa. Em contrapartida, a&rande maioria dos pescadores do arrasto comunit#rio de praia 8

    pr#tica 'ue mo%iliza de trinta a cem pessoas, dependendo do

    tamanho dos cardumes 8 sentiu4se contemplada em suasrei(indica$Ges, pois os conflitos com os pescadores artesanais 'ueoperam com rede de emalhe diminuiriam.

    Em nossa pes'uisa de campo foi poss(el perce%er, noentanto, posi$Ges contradit0rias de pescadores artesanais emrela$)o s implica$Ges da Instru$)o Normati(a para a pesca doarrasto comunit#rio de praia, um dos tipos de pesca maisimportantes para as comunidades da A+A-9. !omo a tainha se

    desloca pela costa influenciada pelas condi$Ges clim#ticas eoceano&r#ficas, a cada ano ela passa pelas praias em momentosdiferentes. !om a no(a re&ulamenta$)o, os pescadores n)o poder)ocaptur#4la antes da data de 'uinze de maio. "essa forma, o perododa safra fixado pelo I-AMA pode fa(orecer al&umas comunidadesem detrimento de outras. !omo se pode perce%er, ocomportamento do nosso ator4rede UtainhaV modificaconsidera(elmente o padr)o de disputas e alian$as dentro daA+A-9. H relato, a se&uir, do respons#(el pelas a$Ges de &est)odos recursos pes'ueiros da A+A-9, clarifica essa afirma$)o e

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    explicita o ponto de (ista da e'uipe da A+A e, por extens)o doI!M-io, respons#(el pela administra$)o da 3!. Al1m disso,expressa al&umas das dificuldades de a&6ncia do I!M-io, nocen#rio local, en'uanto intermedi#rio de distintos modos de (ida einteresses, incluindo a'ueles atri%udos s tainhas.

    5 fato 7 o se4uinte, todo mundo 6uer re4ra desde 6uese(a para os outros, isso 7 um problema 6ue a 4ente temna 4esto de recursos pes6ueiros. S1rio, todo mundo 'uerre&ra desde 'ue sea pros outros, a3 inclusive, 4eraconflitos dentro da prpria pesca artesanal, a maior partedos conflitos internos da pesca artesanal s)o por causadisso. 7oe, se eu for tomar mais ou menos, 1 poss(el 'ueexista uma tens)o entre os artesanais 'ue pescam tainha de

    %ote e os artesanais 'ue s0 pescam com arrasto de praia.Em rela$)o a essa data, os artesanais 'ue pescam de %otedizem melhor, prote&e mais o esto'ue e com certeza (ou

    pescar mais da'ui a al&um tempo independente disso, e os

    outros, n)o, eu 'uero a&ora, eu s0 pesco 'uando ela passaa'ui eu n)o saio atr#s dela... ento harmoni*ar essecon(unto 7 extremamente dif3cil. ;&rifos dos autores=.

    As conse'u6ncias da posi$)o intermedi#ria ocupada pelosser(idores pF%licos 'ue tra%alham com a implanta$)o de

    pro&ramas &o(ernamentais s)o amplamente discutidas pelosestudos %aseados no enfo'ue das interfaces. Nele, esses atoresfi&uram como um elemento central na media$)o entre os proetos

    &o(ernamentais, planeados e &eridos nas esferas nacionais, e asesferas localizadas onde incidem. Zuando eficientes, eles s)o o fiocondutor 'ue une as escalas macro e micro de or&aniza$)o social.Mas, para cumprir essa fun$)o, precisam empreendercompreensGes cotidianas pr0prias e modelos de a$)o h%ridos,resultantes da fus)o de elementos extrados da l0&ica defuncionamento da %urocracia e cultura poltica dos 0r&)os&o(ernamentais, assim como da l0&ica de funcionamento das

    popula$Ges localizadas onde atuam ;HN5, BCC>=. !om efeito,

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    pode ser extremamente difcil, para n)o dizer imposs(el, conciliara conser(a$)o dos esto'ues de tainha com a satisfa$)o dasnecessidades dos pescadores artesanais presentes na A+A-9, dadaa (ariedade dos espa$os de pesca e m1todos de capturas aliexistentes e as conse'uentes di(er&6ncias entre os pr0prios

    pescadores artesanais. on& ;BCC>= destaca 'ue, apesar dasdificuldades inerentes posi$)o intermedi#ria desses atores, existeuma associa$)o direta entre a efici6ncia do tra%alho de media$)o

    realizado por eles e o incremento da 'ualidade de (ida daspopula$Ges influenciadas por pro&ramas de inter(en$)o estatallocalizado, como 1 o caso da cria$)o de unidades de conser(a$)o eda re&ulamenta$)o da captura da tainha, a'ui analisadas.

    "iante das pressGes de am%os os setores, um dia antes daa%ertura da safra de tainha de BCC, o I-AMA foi induzido porlideran$as do Minist1rio da +esca e A'uicultura, a pu%licar umano(a instru$)o normati(a. !om a efeti(a$)o dessa medida, a faixa

    de proi%i$)o de pesca artesanal com redes de emalhar foi reduzidade uma milha n#utica para JCC metros da praia e a concess)o depesca foi li%erada para todas as em%arca$Ges traineiras 'ueapresentassem Mapas de -ordo ;relat0rio oficial de produ$)o

    pes'ueira das em%arca$Ges industriais=, compro(ando a captura detainhas no ano de BCCJ. !om isso, DD em%arca$Ges traineirasconse&uiram permiss)o de pesca em BCC ;MIRAN"A et al.,BCDD=. Apesar dos estudos t1cnicos e acordos locais firmados entre

    os setores 'uando da or&aniza$)o e pu%lica$)o da primeirainstru$)o normati(a, as articula$Ges polticas empreendidas pelose&mento industrial, diretamente no espa$o poltico federal ;untoao M+A=, determinaram a forma de uso e &est)o da pesca da tainhaem escala localizada ;ME"EIRHS, BCC=.

    No(amente, as o%ser(a$Ges de Nuiten ;DJ= so%re ainefici6ncia de al&umas estrat1&ias de &est)o se&re&adoras por

    parte dos atores &o(ernamentais locais mostraram4se ade'uadaspara a an#lise da realidade emprica da A+A-9. Apesar de todos osesfor$os da e'uipe &estora dessa A+A no sentido de produzir

    Geosul, v.30, n.60, 2015 PD

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    acordos e alian$as locais com os pescadores artesanais paradefini$)o de uma normati(a 'ue contemplasse os anseios da maior

    parte dos pescadores da re&i)o, a falta de ha%ilidade em incluir nane&ocia$)o o se&mento industrial pode ter contri%udo paraUminarV as possi%ilidades de sucesso de efeti(a$)o da instru$)onormati(a tal como fora pu%licada ori&inalmente em comumacordo com o se&mento pes'ueiro de %ase artesanal. Hsrepresentantes do se&mento industrial sentindo4se contrariados pela

    primeira normati(a iniciaram um processo de articula$)odiretamente com as esferas federais de representa$)o da cate&oriaem -raslia, # 'ue n)o se tem tradi$)o de &est)o da pescaindustrial em escala local.

    !omo conse'u6ncia, os pescadores artesanaisresponsa%ilizam a e'uipe da A+A-9 e o I!M-io pelas altera$Gesfeitas de Fltima hora na instru$)o normati(a. +ara eles, essedocumento aca%ou %eneficiando o se&mento industrial, pois

    'uando a temporada 1 a%erta os %arcos industriais, atra(1s de seussonares, conse&uem rastrear os cardumes e deslocar4serapidamente at1 eles, onde 'uer 'ue esteam. Q# os pescadoresartesanais, 'ue tam%1m precisam a&uardar a a%ertura datemporada, necessitam esperar 'ue o peixe che&ue pr0ximo costa. "e acordo com os pescadores entre(istados, a cada ano,menos cardumes U%atemV na praia, pois os %arcos industriais oscapturam antes 'ue se aproximem da costa.

    Nas pala(ras de uma das lideran$as da pesca artesanal epresidente de uma das institui$Ges parceiras da A+A: Ua A+A-9 s0faz prometer, mas na hora de resol(er os pro%lemas reais dos

    pescadores nada acontece, ^morre na praia_V. Se&undo ele, desde acria$)o do conselho &estor da 3!, os pescadores sempre esti(eramen&aados nos proetos da A+A, inclusi(e na'ueles 'ue n)o diziamrespeito pesca, mas poucos foram os retornos para a cate&oria.Em sua opini)o, se a A+A-9 contri%uiu, por um lado, para frear aocupa$)o, so%retudo, de terrenos de marinha e #reas prote&idas

    pr0ximas s praias, por outro, n)o se conse&uiu a(an$ar na

    Geosul, v.30, n.60, 2015PB

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    re&ulamenta$)o da parte martima. Na sua (is)o, a cria$)o da 3!piorou a situa$)o da pesca artesanal, pois al1m de n)o promo(er are&ulamenta$)o de #reas especficas para o setor deixou 'uefossem criadas portarias 'ue restrin&em a captura da tainha a fa(orda prote$)o das %aleias. Ele relata 'ue a maioria dos pescadores'ue anteriormente eram mais pr0ximos da A+A-9, a&ora receiaesta%elecer no(os acordos, pois as promessas # efetuadas nunca secumprem. Ao 'ue parece al&uns pescadores tri%utaram demasiada

    esperan$a nas a$Ges da e'uipe da A+A-9, n)o somente comrela$)o ao tema da re&ulamenta$)o da pesca da tainha comotam%1m aos demais assuntos demandados pelo setor pes'ueiroartesanal.

    Nuiten ;DJ, p.P>= discorre lar&amente so%re ascaractersticas do Estado mexicano e suas implica$Ges para odesen(ol(imento de pro&ramas estatais localizados e descre(esitua$)o semelhante encontrada nesta pes'uisa. Essa autora rotula

    o &o(erno mexicano como sendo uma Um#'uina &eradora deesperan$asV, referindo4se sua ha%ilidade para Uem certos pontos eem certas circunst/ncias superar o ceticismo do po(o e, de fato,seduzi4lo para come$ar a fantasiar no(amente so%re no(os

    proetos, portanto, recome$ar um ciclo intermin#(el de &randesexpectati(as se&uido de desilus)o e riso irXnicoV. A forma$)o daideia popular de Uum EstadoV 'ue exerce autoridade e tudocontrola, 1 central para o funcionamento da %urocracia como uma

    Um#'uina &eradora de esperan$asV. Na medida em 'ue cria a falsaideia de 'ue todos os proetos s)o poss(eis e 'ue as coisas ser)odiferentes a partir de Ua&oraV, ao in(1s de produzir certaracionalidade e coer6ncia, a Um#'uinaV &era ale&rias e prazeres,mas tam%1m medo e frustra$)o. Hs pr0prios ser(idores estataisencontram4se, de certa forma, cooptados pelo mecanismo deU&era$)o de esperan$asV da Um#'uinaV %urocr#tica. 9uncion#rios&o(ernamentais o(ens e pes'uisadores contratados para car&os deconfian$a na #rea socioam%iental podem ser i&ualmente seduzidos

    pela ideia da mudan$a. Mas %astam al&uns anos para 'ue perce%am

    Geosul, v.30, n.60, 2015 P

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    'ue %oas propostas e inten$Ges n)o s)o suficientes para transformara cultura poltica de um pas, assim como a cultura e formas deor&aniza$)o das popula$Ges so%re as 'uais incidem os proetos.

    8onsidera9es finais

    "iante do exposto so%re as rela$Ges esta%elecidas entre osoito atores4rede en(ol(idos no conflito mais &eral entre pesca

    industrial e artesanal e suas implica$Ges para a conser(a$)omarinha do litoral centro4sul de Santa !atarina, 'uatro aspectosmerecem ser destacados. +rimeiro, o excesso de fra&menta$)o,disputas e di(er&6ncias presentes no interior do se&mento

    pes'ueiro artesanal tende a dificultar ou fre'uentemente %lo'uear oesta%elecimento de acordos e alian$as internas ao setor,dificultando, portanto, o planeamento e execu$)o pelos atores&o(ernamentais de a$Ges concretas de re&ulamenta$)o espacial da

    ati(idade pes'ueira dentro da A+A-9. A realidade su&ere 'ue ouni(erso da pesca artesanal na re&i)o 1 muito mais fra&mentado esocialmente disperso do 'ue se ima&ina. Essas caractersticasde(em ser apreendidas como parte da ess6ncia da estruturaor&anizati(a do se&mento e tomadas como pressuposto, ou pontode partida, para in(esti&ar as rela$Ges entre pesca artesanal, pescaindustrial, popula$Ges locais e institui$Ges polticas na A+A-9.

    Se&undo, os conceitos de ator social e ator4rede da TAR

    deram suporte te0rico a uma (is)o do social 'ue nos permitiureconhecer o papel dos atores n)o4humanos na or&aniza$)oterritorial da A+A -9. Entendemos 'ue %aleias francas e peixes n)odet6m, eles mesmos, a&6ncia so%re as sociedades e seus espa$os dea$)o, mas est)o no centro das disputas e proetos 'ue or&anizam osterrit0rios. Sem eles, a A+A-9 n)o seria uma realidade e porinflu6ncia deles os demais atores se posicionam, ora cooperandoora disputando, dentro do conflito mais &eral da pesca na re&i)o.

    Geosul, v.30, n.60, 2015PP

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    Terceiro, o sistema poltico e administrati(o da Um#'uinaVestatal, %aseado em intera$Ges mais interpessoais do 'ue emnormati(as e em mecanismos %urocr#ticos sinuosos, confusos,ineficazes e, por (ezes, o%scuros, tende a estimular uma posturadesconfiada e reati(a por parte das popula$Ges. A impossi%ilidadeda e'uipe &estora em le(ar a ca%o determinadas a$Ges importantesacordadas pre(iamente nos espa$os locais decorre de interfer6ncias

    %urocr#ticas decididas em espa$os administrati(os alocados em

    -raslia, onde o setor industrial exerce maior influ6ncia. No casoda &est)o espacial da pesca e dos recursos pes'ueiros da A+A-9,essa intera$)o ficou e(idente no conflito da tainha, na medida em'ue os esfor$os de parte do se&mento de %ase artesanal emesta%elecer parcerias com a e'uipe da A+A-9 foram frustrados

    pelas mano%ras do se&mento pes'ueiro industrial unto ao M+A em-raslia.

    Zuarto, nossos resultados su&erem 'ue para desen(ol(er ou

    alterar as atuais formas de or&aniza$)o com (istas a melhorar aposi$)o de certos &rupos, primeiro 1 necess#rio o estudo daspr#ticas existentes nos contextos localizados a fim de se o%ter uma(is)o concreta e mais aproximada das rela$Ges de for$a em 'ueessas pr#ticas se constituram. Mas, dado 'ue essas rela$Ges defor$a s)o moldadas sem li&a$)o direta com os contextos

    particulares por atores em mudan$a constante, o sucesso da &est)osocioam%iental em unidades de conser(a$)o pode depender menos

    dos &estores pF%licos e or&aniza$Ges da sociedade ci(il do 'ue daarticula$)o de um conunto muito mais amplo e difuso deintera$Ges. +arafraseando Nuiten ;DJ, p.>=, Uuma constela$)o,mais do 'ue uma estruturaV, ou sea, depende muito mais de umarede de for$as e atores interati(os, do 'ue de estruturas formaisor&anizati(as e centralizadoras como o Estado, os pescadores, asindFstrias, a e'uipe de ser(idores da A+A-9 etc.

    Referncias biblio4r;ficas

    Geosul, v.30, n.60, 2015 P

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    un. BCCP, pp. P>4KJ

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    9ERREIRA, . !. !onflitos sociais e o uso de recursos naturais:%re(es coment#rios so%r