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Marxismo e Relações Internacionais: Estado e Sociedade Civil na Teoria Marxista José Cauby Soares Monteiro* *Professor de C. Política RI (FCS – IFCH - UFPA) ([email protected]) . Resumo: O marxismo nas relações internacionais (RI), como ressalta Benno Teschke, antecede ao próprio estabelecimento formal das RI como campo institucionalizado de estudo, porém sua incorpora- ção ao padrão ocidental de abordagens de RI foi postergada, tornando-se parcial e problemática, que era sintomático da disputa entre comunismo e capi- talismo. Durante a Guerra Fria o marxismo nas RI foi marginalizado, porém esta condição começou a mudar a partir do aprofundamento dos conflitos Norte-Sul em conjunção com o surgimento das correntes pós-positivistas e críticas nas RI no início da década de 80 e acabou por se consolidar com o fim da Guerra Fria, quando então o marxismo se torna uma das principais abordagens criticas da situação mundial. Mas no interior do pensamento marxista surgem também objeções acerca de deter- minadas utilizações da metodologia marxiana pelo neomarxismo e pelos neogramscianos. Guido Li- guori, por exemplo, questiona o uso e abuso de conceitos gramscianos como sociedade civil ou hegemonia no âmbito das RI. Tal crítica reivindica um cuidado mais filológico com as categorias gramscianas, o que não significa que tais conceitos não possam ser apropriados ou reinventados, embo- ra tal procedimento requeira uma explicitação desse uso ou uma ruptura. Não foi este o método dos autores da coletânea de Stephen Gill para “reinven- tar” Gramsci que, apesar de ser conhecido pelo seu anti-economicismo, foi apropriado pela via da Eco- nomia Política Internacional neomarxista. O neo- institucionalista liberal Robert Keohane já observa- ra que o conceito gramsciano de hegemonia, como “perspicaz complemento” aos argumentos materia- listas de hegemonia próprios das RI, tanto poderia ser empregado por marxistas ou realistas, esvazian- do deste modo o conceito de hegemonia de seu conteúdo crítico e radical. Estes estudos anglo- americanos subestimam o conceito gramsciano de Estado ampliado e não levam em conta a embrioná- ria concepção de RI existente nos escritos do autor. Problemas não menos preocupantes podemos en- contrar nas versões marxistas da teoria da depen- dência e da teoria da globalização. A temática das continuidades filosóficas entre a dialética hegeliana e a dialética marxista, apesar da crise que a teoria marxista vem enfrentando nos últimos 30 anos, mostra-se ainda como um instigante exercício heu- rístico e filológico de compreensão de um dos clás- sicos das Ciências Sociais mais violentamente ata- cado e religiosamente venerado por gerações de estudantes, professores, cientistas e militantes polí- ticos. Para além das paixões e das ideologias, há aspectos ainda bastante obscuros no núcleo duro da teoria marxista principalmente no que concerne à análise da organização política e da estrutura eco- nômica da sociedade moderna. Neste artigo se propõe a discutir criticamente o fortalecimento ou ressurgimento do marxismo nas RI, e, concomitan- temente, reavaliar seu papel como abordagem críti- ca da política mundial, retomado o tema das rela- ções entre Estado e Sociedade Civil a partir da polêmica ruptura e superação que obra de Marx pretensamente teria apresentado face à filosofia hegeliana. 1. Introdução Há algum tempo sentíamos inclinados a reconstituir como surgiu em Marx,do ponto de vista, a intenção de proceder a uma crítica à economia política, considerando o conjunto da obra marxiana.

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Marxismo e Relações Internacionais: Estado e Sociedade Civil na Teoria Marxista

José Cauby Soares Monteiro* *Professor de C. Política RI (FCS – IFCH - UFPA) ([email protected]) .

Resumo: O marxismo nas relações internacionais (RI), como ressalta Benno Teschke, antecede ao próprio estabelecimento formal das RI como campo institucionalizado de estudo, porém sua incorpora-ção ao padrão ocidental de abordagens de RI foi postergada, tornando-se parcial e problemática, que era sintomático da disputa entre comunismo e capi-talismo. Durante a Guerra Fria o marxismo nas RI foi marginalizado, porém esta condição começou a mudar a partir do aprofundamento dos conflitos Norte-Sul em conjunção com o surgimento das correntes pós-positivistas e críticas nas RI no início da década de 80 e acabou por se consolidar com o fim da Guerra Fria, quando então o marxismo se torna uma das principais abordagens criticas da situação mundial. Mas no interior do pensamento marxista surgem também objeções acerca de deter-minadas utilizações da metodologia marxiana pelo neomarxismo e pelos neogramscianos. Guido Li-guori, por exemplo, questiona o uso e abuso de conceitos gramscianos como sociedade civil ou hegemonia no âmbito das RI. Tal crítica reivindica um cuidado mais filológico com as categorias gramscianas, o que não significa que tais conceitos não possam ser apropriados ou reinventados, embo-ra tal procedimento requeira uma explicitação desse uso ou uma ruptura. Não foi este o método dos autores da coletânea de Stephen Gill para “reinven-tar” Gramsci que, apesar de ser conhecido pelo seu anti-economicismo, foi apropriado pela via da Eco-nomia Política Internacional neomarxista. O neo-institucionalista liberal Robert Keohane já observa-ra que o conceito gramsciano de hegemonia, como “perspicaz complemento” aos argumentos materia-

listas de hegemonia próprios das RI, tanto poderia ser empregado por marxistas ou realistas, esvazian-do deste modo o conceito de hegemonia de seu conteúdo crítico e radical. Estes estudos anglo-americanos subestimam o conceito gramsciano de Estado ampliado e não levam em conta a embrioná-ria concepção de RI existente nos escritos do autor. Problemas não menos preocupantes podemos en-contrar nas versões marxistas da teoria da depen-dência e da teoria da globalização. A temática das continuidades filosóficas entre a dialética hegeliana e a dialética marxista, apesar da crise que a teoria marxista vem enfrentando nos últimos 30 anos, mostra-se ainda como um instigante exercício heu-rístico e filológico de compreensão de um dos clás-sicos das Ciências Sociais mais violentamente ata-cado e religiosamente venerado por gerações de estudantes, professores, cientistas e militantes polí-ticos. Para além das paixões e das ideologias, há aspectos ainda bastante obscuros no núcleo duro da teoria marxista principalmente no que concerne à análise da organização política e da estrutura eco-nômica da sociedade moderna. Neste artigo se propõe a discutir criticamente o fortalecimento ou ressurgimento do marxismo nas RI, e, concomitan-temente, reavaliar seu papel como abordagem críti-ca da política mundial, retomado o tema das rela-ções entre Estado e Sociedade Civil a partir da polêmica ruptura e superação que obra de Marx pretensamente teria apresentado face à filosofia hegeliana.

1. Introdução

Há algum tempo sentíamos inclinados a reconstituir como surgiu em Marx,do ponto

de vista, a intenção de proceder a uma crítica à economia política, considerando o conjunto da

obra marxiana.

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A interpretação estruturalista de Althusser havia estabelecido a existência de “dois

Marx”, aquele da “juventude” e um outro da “maturidade”. O “jovem Marx” encontrar-se-ia

ainda enredado na filosofia idealista hegeliana e só após o texto de ruptura com esta filosofia,

“A Ideologia Alemã”, e o contato com a economia política teria surgido o “Marx da maturi-

dade”.

Este esquema interpretativo muito em voga até o final da década de 1970, nunca foi

aceito por todos aqueles que viam no conjunto da obra de Marx continuidades, rupturas, ino-

vações e renovações, muito mais do que apenas um grande corte epistemológico marcado pela

ruptura com a filosofia hegeliana (mais exatamente com a filosofia neo-hegeliana de esquer-

da). Além do que se constatou que a própria temática da crítica da economia política já se

encontrava presente desde os tempos dos textos juvenis e, mais importante ainda, a metodolo-

gia dialética de análise deve muito mais a Hegel do que se pode imaginar, principalmente em

sua problemática ontológica. Como diria o próprio Marx, em um dos prefácios a “O Capital”,

jamais pensara tratar Hegel como um “cachorro morto”, como o fizeram os neo-hegelianos de

esquerda.

Este artigo pretende desenvolver a tese de que a crítica à economia política realizada

por Marx tem sua origem na crítica à filosofia hegeliana do Estado e do direito. Para isto de-

senvolveremos nossa argumentação através dos seguintes pontos: (1) O método de crítica da

Economia Política e a dialética hegeliana, onde demonstraremos que a principal exposição do

método marxiano mantém estreita relação tanto com as categorias dialéticas hegelianas quan-

to com a problemática da anatomia da Sociedade Civil; (2) a gênese da crítica da Economia

Política na crítica da filosofia hegeliana, onde demonstraremos que a problemática da crítica

da economia política marxiana, que é de expor e analisar a estrutura da sociedade burguesa,

tem sua gênese primeira na problemática da constituição da Sociedade Civil hegeliana e da

relação desta com o Estado, ou seja, há traços de continuidade e renovação da temática de

crítica da filosofia de Hegel da juventude de Marx com a crítica da economia política da ma-

turidade.

2. O Método da Crítica da Economia Política e a Dialética Hegeliana

A relação entre a obra marxiana e a filosofia de sua época é de uma tensão permanen-

te, mediada, num primeiro momento, pela crítica à filosofia hegeliana e, num segundo mo-

mento, pela crítica à economia política que passa então a ter na obra marxiana uma importân-

cia central em seu modelo teórico.

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Marx, como a maioria dos pensadores do século XIX, partilhava da crença, comum

aos grandes pensadores sociais daquele século, na “superação da Filosofia” pela “ciência”, o

que, embora não o identifique com uma concepção positivista de ciência, aproxima-o bastante

das concepções “cientificistas” comuns aos pensadores sociais que elaboraram suas obras na

segunda metade do século XIX, isto, todavia, dificilmente seria diferente para um intelectual

que produziu sua obra teórica do final da década de 1840 até sua morte em 1883 e que reali-

zou seu maior esforço de elaboração intelectual da segunda metade da década de 1850 até o

final da década de 1860.Até mesmo cronologicamente Marx esteve impregnado e engajado

nas polêmicas e disputas políticas, filosóficas e econômicas de seu século. Além do profundo

conhecimento da Economia Política e da Filosofia, Marx não esteve alheio também aos estu-

dos antropológicos e históricos de sua época (Krader, 1983), embora declarasse seu desprezo

à sociologia positivista (comteana), por outro lado, entretanto, é bem provável que não tenha

tomado conhecimento do surgimento da economia marginalista de Jevons, Menger e Walras1,

embora a problemática destes autores não lhe teria sido nem um pouco ininteligível a sua crí-

tica do pensamento econômico. A pretensão de um conhecimento objetivo e metodologica-

mente controlado, ao contrário do que normalmente se supõe, é um traço marcante de teoria

marxiana, ou então, a que atribuir, para utilizarmos um exemplo diretamente relacionado ao

mundo subjetivo da política, a discutida e discutível pretensão de um socialismo “científico”

em contraposição, ao tão criticado por Marx, socialismo “utópico”?

É preciso também ressaltar que a tradição filosófica hegeliana, a qual Marx pertenceu,

nunca deixou de se contrapor às influências cientificistas do positivismo francês. A presunção

1 Ao final do século XIX, a Economia tinha deixado de ser apenas uma “ciência melancólica” como costumava ser chamada. Sofrera também uma “grande revolução teórica”, na opinião do pensamento liberal e acadêmico, a assim chamada “revolução neoclássica ou marginalista”. Nos anos de 1870 William Stanley Jevons, na Inglater-ra, Carl Menger, na Áustria, e Leon Walras, na França, começaram a dar atenção às preferências dos consumido-res e às demandas por produtos. Assim procedendo, eles preencheram o que faltava à visão básica da economia de mercado do modelo liberal, transformando e generalizando a teoria econômica do liberalismo (Hausman, 1994, p 32). Na crise do pensamento econômico conhecida como Methodenstreit confrontaram-se os defensores da tradição historicista e aqueles que, ao contrário, como Carl Menger (1840-1921), se esforçavam em separar a economia da história para fazer uma ciência teórica, visando estabelecer as leis abstratas que determinariam os aspectos especificamente econômicos dos fenômenos sociais. Os segundos decidiram o futuro da ciência econô-mica: o marginalismo e a economia geral, que através de diversas adaptações e revisões críticas, manteve-se até os nossos dias em boa posição nos estudos econômicos, realizando exatamente suas intenções. Menger teria defendido, segundo Outhwaite, uma abordagem analítica ou “exata” para a ciência econômica contra a “Escola Histórica” de economistas que enfatizavam a inserção do processo econômico em tendências evolutivas da histó-ria da humanidade. Weber, por exemplo, que era simpático à abordagem de Menger, sustentou, contudo, uma concepção de “ciência empírica da realidade” (wirklichkeitswissenschaft) contra o “preconceito naturalista” de que os economistas e outros cientistas sociais deveriam procurar leis gerais do tipo daquelas encontradas nas ciências naturais. Esta “disputa metodológica” (Methodenstreit) continuou através da filosofia das ciências soci-ais no século vinte, especialmente na filosofia analítica da história nos países de língua inglesa nos anos cinqüen-ta e no início dos anos sessenta (Outhwaite, 1996, p 85-86).

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de ter extraído o cerne racional da forma mística da dialética hegeliana, fez com que Marx

mantivesse e superasse, ao mesmo tempo, a problemática ontológica de Hegel, isto é, Marx

não abandonou a possibilidade do “ser” da dialética e desta forma manteve uma metodologia

de análise dialética, por mais paradoxal que pareça, “hegelianamente” materialista. Daí por-

que para buscarmos a gênese da crítica da economia política marxiana faz-se mister iniciar-

mos pela exposição de seu método dialético.

Há pelo menos duas formas principais de se captar o método dialético de Marx. Uma

maneira mais complexa e exaustiva seria tentar revelar a gênese e a estrutura de sua análise

científica e desse modo desnudar seus procedimentos metodológicos e o arcabouço teórico de

suas formulações analíticas. A outra maneira seria inquirir em sua obra as revelações metodo-

lógicas que ocasionalmente Marx viu-se na contingência de expor, pelas mais diversas moti-

vações, mas geralmente instado por situações de polêmicas e disputas teóricas. A primeira

forma de expor o método dialético de Marx já possui um exemplo clássico na obra de Roman

Rosdolsky (Rosdolsky, 1978). Ainda que a opção deste autor nos pareça adequada, não será

por nós adotada por constituir-se num esforço intelectual considerável para os limites deste

artigo. Adotaremos a segunda maneira que talvez nos aproxime, como exercício intelectual,

do que há de mais próximo de uma moderna pesquisa científica na obra marxiana.

O texto que melhor explicita os procedimentos metodológicos de Marx talvez seja o já

célebre “Método da Economia Política”, item 3 da não menos famosa “Introdução Geral” à

obra “Para Crítica da Economia Política” (Marx, 1984, 1986). Neste texto, através do exem-

plo do conceito de população, entendida como a base e o sujeito da totalidade do processo

social de produção2, Marx demonstra que o impulso do economista de sempre iniciar sua in-

vestigação pelo que se considera como real e concreto leva geralmente a uma visão empiricis-

ta e abstrata. Uma visão empiricista porque não ultrapassa a realidade imediata e uma visão

abstrata porque não alcança a concretude do real. População é uma abstração se não conside-

rarmos, por exemplo, as classes sociais que a compõe. As classes por sua vez pressupõem a

existência do trabalho assalariado, do capital, etc.. Desse modo, o capital sem o trabalho assa-

lariado, sem o valor, sem o dinheiro, sem o preço, etc., não é nada. Se um pesquisador tomar a

população como ponto de partida teria apenas uma vaga noção de uma totalidade complexa.

Só através de uma determinação mais precisa e de uma análise percuciente chegaríamos a

conceitos cada vez mais simples.

2 Toda as citações da “Introdução” feitas a seguir estão em Marx, 1984 e 1986.

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Da população como representação caótica do todo, isto é, dos termos do concreto ima-

ginário aproximar-se-ia cada vez mais de tênues abstrações até alcançar-se definições mais

simples. A partir destas definições mais simples faríamos a viagem de modo inverso até re-

constituirmos o conceito de população que não seria mais um concreto idealizado ou uma

representação caótica do todo, mas agora já seria uma totalidade compreendendo muitas de-

terminações e relações. Marx observa que os economistas do século XVIII começavam suas

investigações pelo “organismo vivo”: a população, a nação, o Estado, vários Estados, etc.,

depois, através da análise, descobriam um certo número de “abstrações categóricas, relações

genéricas”. Estas relações gerais e abstratas são apresentadas como determinantes, tais como,

divisão do trabalho, o dinheiro, o valor, etc.. Serão estes elementos que isolados e mais ou

menos fixados e abstraídos que darão origem aos sistemas econômicos, cuja principal caracte-

rística teórica e metodológica é o fato de que se elevam de conceitos simples, como trabalho

(labour), divisão do trabalho, demanda, troca (exchange-value), e avançam para categorias

como Estado, trocas internacionais e mercado mundial. Para Marx, entretanto, o concreto não

se confunde com o empírico, pois para ele o concreto é síntese de muitas definições, pois re-

presenta a unidade de aspectos diversos. Ele aparece entretanto racionalmente como uma so-

ma, um resultado, e não como um ponto de partida, embora seja o verdadeiro ponto originário

da percepção e da imaginação.

No primeiro método, aquele que não “procede a viagem de volta” (“to make the jour-

ney again in the opposite direction”), não se alcança a concretude do real, pois nele: a repre-

sentação plena é se volatiliza em uma determinação abstrata. No segundo método as determi-

nações abstratas conduzem a reprodução do concreto por intermédio do pensamento. Por isto

o segundo método é, para Marx, o método cientificamente exato, pois ao proceder a “viagem

de volta” alcança a concretude do real, isto é, a síntese de muitas determinações, a unidade do

diverso.

Para Hegel o real era o resultado do pensamento que se sintetiza em si, se aprofunda

em si, e se move por si mesmo. Ou seja, Hegel confundiu na verdade o processo do pensa-

mento para se apropriar do concreto, para reproduzi-lo como concreto pensado. Pois, como

afirma Marx, enquanto o método de avançar do abstrato para o concreto é simplesmente a

maneira pela qual o pensar assimila o concreto e o reproduz como categoria mental da reali-

dade. Isto existe, no entanto, pelo processo de evolução do mundo real em si mesmo.

Não se deve confundir o processo lógico com o processo histórico e, muito menos, não

se deve confundir o real-concreto enquanto pressuposição do conhecimento, enquanto exis-

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tência que antecede a consciência (flertando aqui com a linguagem sartreana), com a forma

com a qual a consciência se apropria do real e o reconstitui. Pois, como diz Marx, o procedi-

mento do pensar abstrato que avança dos conceitos mais simples para os mais complexos, está

de acordo com o verdadeiro desenvolvimento histórico, isto é, o pensamento abstrato acaba

trocando a lógica do pensamento com a efetividade da história. Daí a necessidade de distin-

guir-se entre a categoria mais simples e a categoria mais concreta, isto é, não há precedência

histórica necessária da categoria mais simples sobre a categoria mais concreta:

É evidente que a categoria mais simples, como Marx procurará explicar depois, só po-

de ser separada metodologicamente da categoria mais concreta numa sociedade em que esta

categoria tenha alcançado um alto grau de generalização em decorrência de um completo de-

senvolvimento concreto mais rico. O exemplo do trabalho humano como uma categoria mais

simples na sociedade burguesa ilustra muito bem este procedimento metodológico. O trabalho

considerado como categoria simples e colocado num alto grau de abstração, apesar do concei-

to possuir validade para todas épocas históricas, é, contudo, na determinidade (bestimheit)

desta abstração, um produto de condições históricas específicas, e só possui plena validade

para estas condições e dentro dos limites por elas estabelecidos. Poderíamos dizer que, deste

ponto de vista, a visão de Marx de método é uma visão retrospectiva, em que o ponto de par-

tida e de chegada da retrospecção é sempre o presente. Num certo sentido, do ponto de vista

da lógica da análise, é o presente que explica o passado e não o contrário: “the anatomy of

man is the key to the anatomy of the ape”. Acreditamos que há aqui um forte elemento heurís-

tico, daí o cuidado de não entendermos este trecho tão literalmente. O sentido da história é

algo que se estabelece post facto, ou então estaríamos diante de uma enteléquia, o resultado

em vez do processo. A explicação, todavia, do passado pelo presente não deve ser realizada

como um anacronismo: “in manner of those economists who obliterate all historical differen-

ces and who see in all social phenomena only bourgeois phenomena”, isto é, a luz do presente

sobre o passado não deve ofuscar as especificidades das diversas épocas históricas, mas, in-

versamente, deve torná-las mais discrimináveis à análise a que são submetidas.

Procedimentos lógicos e metodológicos não podem substituir a historicidade dos fe-

nômenos estudados, da mesma forma que a historicidade destes fenômenos não pode impedir

o uso dos procedimentos metodológicos que se impõem à sua reconstituirão teórica. Não ob-

stante:

Just as in general when examining any historical or social science, (...) is it necessary to remember that subject, in this context contemporary bourgeois society, is presupposed both in reality and the mind, and that therefore categories express forms of existence - and sometimes merely separate aspects - of this par-

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ticular society, the subject; thus the category, even from the scientific standpoint, by no means begins at moment when it is discussed as such Uma leitura com essa orientação que até agora estabelecemos de “A Ideologia Ale-

mã”, assim como também uma interpretação mais “filológica” e menos literal do famoso

“Prefácio” de 1859 de “Para Crítica da Economia Política”, revelaria esta mesma tensa e

complexa relação entre conhecimento, método e realidade. Uma exposição sucinta do método

marxiano feita por Carlos Nelson Coutinho vem também ao encontro de nossa interpretação.

Para este autor, Marx concebe a dialética como um método de articulação categorial que pro-

cede mediante a elevação do abstrato ao concreto, do menos complexo ao mais complexo;

essa elevação tem como meta a construção progressiva de uma "totalidade concreta", de uma

“síntese de múltiplas determinações”, na qual as várias determinações abstratas (parciais) apa-

recem repostas e transfiguradas na totalidade que as mediatiza e - precisamente por isso - as

concretiza (Coutinho, 1985, p 10).

Esta complexa discussão sobre as relações existentes entre conhecimento, método e

realidade na obra de Marx que estamos empreendendo, ficaria com uma grande lacuna se não

abordássemos dois aspectos basilares, do ponto de vista da lógica investigativa: 1) A distinção

formal entre o método de exposição e o método de pesquisa, 2) e a distinção que Marx faz

entre seu método dialético e o método dialético de Hegel. Para Marx o método de exposição

deve distinguir-se formalmente de método de investigação. A investigação deverá assimilar-se

detalhadamente à matéria investigada, a analisar suas diversas formas de desenvolvimento e

descobrir seus nexos internos (Marx, 1956, p 14).

Três são as regras metodológicas (para usar um termo metodológico tão caro a Dur-

kheim) que o trecho suscita: (1) a necessidade de um conhecimento o mais abrangente e deta-

lhado sobre o objeto em estudo; (2) a análise de todas as formas possíveis de desenvolvimento

que o objeto focalizado conheceu ou poderá vir a possuir, e (3) o desvelamento das relações e

conexões internas que o objeto mantém em sua estrutura. É uma metodologia que pressupõe

uma investigação exaustiva e rigorosa. Estes procedimentos metodológicos propugnados por

Marx, pela exigência científica na qual eles implicam, deixam já implícitas as razões pelas

quais a investigação se distingue formalmente da exposição científica. O porquê desta distin-

ção formal deve ser buscado no fato de que só após de realizada esta tarefa, isto é, os proce-

dimentos metodológicos exigidos pela investigação, poderá o pesquisador expor adequada-

mente o movimento real e, se souber fazê-lo e conseguir reproduzir idealmente na exposição a

vida da matéria, haverá sempre a possibilidade de que se crie a impressão de uma construção

a priori ( Marx, 1956, p 14).

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A partir deste trecho podemos entender porque Marx não iniciou “O Capital” pelo ca-

pítulo XXIV (“A Assim Chamada Acumulação Primitiva”), mas o inicia-o pelo capítulo sobre

a mercadoria. Um leitor incauto teria a impressão que nosso autor primeiro descobriu a estru-

tura do modo de produção capitalista para depois estudá-lo, no entanto nada disso ocorre, a-

penas acontece que na exposição marxiana a lógica do processo precede o processo histórico

real; na investigação marxiana, como de resto na própria realidade, é o processo histórico real

que produz o processo lógico.

Para aprofundar-nos um pouco mais no entendimento destes procedimentos metodoló-

gicos marxianos é necessário, mesmo que abreviadamente, examinar como Marx distinguia o

seu método dialético da dialética hegeliana:

Mi método dialéctico no solo es fundamentalmente distinto del método de Hegel, sino que es, en todo y por todo, su reverso. Para Hegel, el proceso del pensamiento, al que él convierte incluso, bajo el nombre de idea, en sujeto con vida propia, es el demiurgo de lo real, y esto es la simple forma externa que toma cuer-po. Para mí, lo ideal no es, por el contrario, más que lo material traducido y transpuesto a la cabeza del hombre (Marx, 1956, p 14). A inversão da dialética não significa a exclusão pura e simples da problemática do su-

jeito da dialética. Entendemos que ocorre na verdade uma inversão na concepção do sujeito

do que a sua simples exclusão enquanto problema filosófico. Assim como o “jovem” Marx,

na sua crítica à Filosofia do Direito de Hegel, conceituará a Sociedade Civil não mais como o

predicado e sim como o sujeito da História e o Estado como seu verdadeiro predicado, para

depois avançar, retomando Hegel em outro nível, para uma compreensão da Sociedade Civil

como verdadeiro cenário da História, entendida como a história das lutas de classes, para,

finalmente, ir buscar em sua análise a anatomia da Sociedade Civil na crítica da Economia

Política. Marx não aceitava que o processo de pensamento fosse o sujeito (Sein) com vida

própria (como Ser), mas como material transposto e traduzido na cabeça dos homens, ou, em

outras palavras, o ideal torna-se a tradução do real, não como particularidade empírica, mas

como totalidade dialética, isto é, “a synthesis of many definitions”. Marx, contudo, não des-

carta em momento algum a importância metodológica da dialética hegeliana desde que despi-

da de suas mistificações. Para ele, o fato de o fato de que a dialética adquira em Hegel uma

mistificação, não impediu que este filósofo tivesse sido o primeiro que souber expor de um

modo amplo e consciente as formas gerais do movimento dialético. O que ocorre é que em

Hegel a dialética aparece invertida, de ponta cabeça. “No hay más que darle la vuelta, mejor

dicho enderezarla, y enseguida se descubre bajo la corteza mística la semilla racional” (Marx,

1956, p 14).

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A dificuldade principal para a compreensão deste último procedimento (inversão da

dialética hegeliana) está em definir os termos desta inversão, ou, para ser mais exato, os limi-

tes epistemológicos da superação marxiana do invólucro místico da dialética hegeliana. A

solução apresentada pela vulgata marxista, e pretensamente criticada pelo antimarxismo vul-

gar, de que Marx teria colocado a “matéria” no lugar do “espírito” e com isto retirado o con-

teúdo “reacionário” (ou “idealista”) do método essencialmente “revolucionário”, tem levanta-

do diversos problemas hermenêuticos de difícil solução. Um destes problemas, de fundamen-

tal importância, foi muito bem formulado por José Arthur Giannotti que questionou como

seria possível pensar uma forma de investigação independente de seu conteúdo quando se visa

precisamente a confluência de ambos?.

3. A Gênese da Crítica da Economia Política na Crítica da Filosofia Hegeliana 3.1. Estado e Sociedade Civil

Marx observa já em “A Ideologia alemã” que “a primeira condição de toda história

humana é evidentemente a existência de seres humanos vivos” (Marx & Engels, 1980, p 18),

mas esta condição, em si mesma, não nos diz muito, sendo, portanto, apenas um ponto de par-

tida, do qual outras categorias decorrerão necessariamente. Considerando-se, todavia, que o

homem só adquire sua existência social a partir do momento em passa a produzir seus meios

de existência, o que nada mais é do que a produção indireta de sua vida material (Marx &

Engels, 1980, p 19). Marx vai além desta constatação, aparentemente banal, quando observa

também que a mera reprodução dos meios de existência não se constitui num modo de produ-

ção, pois o conceito de modo de produção é mais abrangente e significa “uma forma determi-

nada de manifestar a sua vida, um modo de vida determinado” (Marx & Engels, 1980, p 20).

Desta maneira a produção de idéias, representações, consciência, etc., está intimamente ligada

à atividade material dos homens, de tal modo que ambas formam uma unidade indissolúvel,

na qual a superestrutura só ganha explicitação mais completa a partir do momento em que se

desvenda sua infra-estrutura que a determinou, em “última instância” como disse Engels e que

o marxismo estruturalista, particularmente o francês, repetiu ad nauseam nas décadas de 1960

e 1970. Na verdade, mais do que um recurso de “última instância”, trata-se de um jogo dialé-

tico, no qual as determinações (Bestimung) precisam ser diferenciadas das “determinidades”

(Bestimheit), que nada mais são do que as diversas mediações que a realidade recebe em seu

percurso de constituição empírica. É através do método dialético que Marx constata que “em

toda ideologia os homens e as suas relações nos surgem invertidos, tal como acontece numa

camera obscura, isto é apenas o resultado do seu processo de vida histórico, do mesmo modo

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que a imagem invertida dos objetos que se forma na retina é uma conseqüência do seu proces-

so de vida diretamente físico” (Marx & Engels, 1980, p 25-26). Destarte, para Marx, a ideolo-

gia, em oposição à ciência, é principalmente a inversão da realidade e não sua negação, ou

simplesmente sua imagem falsa e desconexa. É também em “A Ideologia Alemã” que Marx

apresenta um conceito de Sociedade Civil que demonstra implicitamente no seu desdobra-

mento que esta categoria vai perdendo seu caráter abstrato que possuía na formulação hegeli-

ana e adquirindo um conteúdo mais concreto3, que, diga-se de passagem, em parte já possuía

na formulação hegeliana, embora que numa relação inversa com o Estado. Para Marx, a Soci-

edade Civil possui duas características básicas: significa (1) “o conjunto das relações materi-

ais dos indivíduos no interior de um determinado estádio de desenvolvimento das forças pro-

dutivas”, e (2) “encerra o conjunto da vida comercial e industrial existente numa fase e ultra-

passa por isso mesmo o Estado e a nação, se bem que deva afirmar-se no exterior como na-

cionalidade e organizar-se no interior como Estado” (Marx & Engels, 1980, p 94). Se o Esta-

do é a forma sob a qual a Sociedade Civil se organiza interiormente e a Nação é forma sob a

qual a Sociedade Civil se apresenta exteriormente diante das outras sociedades, deste modo o

Estado é também “a forma através da qual os indivíduos de uma classe dominante fazem valer

os seus interesses comuns e na qual se resume toda Sociedade Civil de uma época, concluí-se

que todas as instituições públicas têm o Estado como mediador e adquirem dele uma forma

política” (Marx & Engels, 1980, p 95-96). A ideologia é desta maneira o discurso do poder no

interior da nação, que se exerce através do Estado, pois à medida que

cada classe no poder é obrigada, quando mais não seja para atingir os seus fins, a representar o seu interes-se como sendo o interesse comum a todos os membros da sociedade ou, exprimindo a coisa no plano das idéias, a dar aos seus pensamentos a forma da universalidade, a representá-los como sendo os únicos razo-áveis, os únicos verdadeiramente válidos (Marx & Engels, 1980, p 57). Nos textos anteriores a “A Ideologia Alemã”, Marx critica a perspectiva neo-hegeliana

da relação entre Sociedade Civil e o Estado. No caso específico do livro “A Questão Judaica”,

que Bobbio considera que muitas vezes é um texto superestimado, embora reconheça que nele

Marx formule uma das questões fundamentais da Política, ou seja, que a emancipação política

não pode ser confundida com a emancipação humana, a desigualdade dos indivíduos na Soci-

edade Civil corresponde à igualdade dos cidadãos perante o Estado, o direito então se biparte

em direito privado para os membros desiguais e atomizados da Sociedade Civil e direito pú-

blico para os cidadãos na esfera do Estado. Marx constata esta dicotomia no texto da Declara-

ção dos Direitos do Homem e do Cidadão surgido na Revolução Francesa. Mais que um arti-

3 Cabe lembrar que, para Marx, o concreto só é concreto “porque é síntese de múltiplas determinações, isto é, unidade do diverso”, Marx, 1978, p 116.

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fício ideológico a dicotomia Estado e Sociedade Civil metamorfoseia-se numa realidade polí-

tica, cuja grande armadilha é induzir a confusão entre emancipação política e emancipação

humana, entendida aqui como emancipação das estruturas que oprimem e alienam o homem e

reproduzem uma sociedade de desiguais, impedindo desta maneira a realização do ser (sein),

mas também do Espírito (Geist) do homem. Marx não poupa esforços em proceder à crítica ao

fictio juris que a separação entre Estado e Sociedade Civil permite surgir. A separação entre

Estado e Sociedade Civil (direito privado / direito público, direitos do homem / direitos do

cidadão, indivíduo /cidadão) é uma formulação ideológica da essencialmente burguesa. Marx

afirma que a emancipação política proposta pela burguesia “é a redução do homem de um

lado, a membro da sociedade burguesa ou indivíduo egoísta independente e, de outro, a cida-

dão do Estado, a pessoa moral” (Marx, s/d, p 51). Por isto o direito à cidadania tem muito a

ver com a liberdade política (num certo sentido é a própria liberdade burguesa também), na

medida em que na sociedade burguesa o homem não se liberta, por exemplo, da religião (en-

carada aqui neo-hegelianamente como alienação), mas obtém liberdade religiosa, não se liber-

ta da propriedade privada, mas obtém liberdade de propriedade, etc.. Há na obra de Marx uma

articulação íntima e constante entre todos estes aspectos da vida social, de tal maneira que o

modo de produção capitalista muito mais que uma forma de produzir é também um modo

determinado de pensar (ideologia) e uma organização política de exercício do poder de classe

(Estado) que se exerce sobre determinado território sob o pressuposto de uma homogeneidade

cultural, lingüística, etc., (a nação).

A atualidade dos conceitos de Estado e Sociedade Civil deve-se, em primeiro lugar, a

sua generalidade conceitual e a sua especificidade empírica, o que de por si mesmo já lhes

garantiria ampla aplicabilidade científica, pelo menos de um ponto de vista heurístico provo-

cativo; em segundo lugar, deve-se também a sua longa tradição na Filosofia Política e na E-

conomia Política modernas e, em terceiro lugar, the last but not the least, pela confirmação

histórica e ontológica que estes conceitos encontram na realidade empírica do mundo con-

temporâneo (Bobbio, 1982, Bobbio & Bovero, 1986, Bobbio, 1987).

Ainda que seja possível depararmos na filosofia grega com noções semelhantes, no

conteúdo e, mesmo, na forma, aos conceitos de Estado e Sociedade Civil, é mais prudente, do

ponto de vista da história da filosofia, datá-los na Filosofia Política Moderna e na Economia

Política, mais particularmente ainda na corrente filosófica do Jusnaturalismo contratualista de

Hobbes, Locke e Rousseau. Sem dúvida que é a partir do Jusnaturalismo que estes conceitos

se cristalizam, por assim dizer, e chegam até os dias de hoje (Bobbio & Bovero, 1986; Bobbi-

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o, 1982). Na evolução dos conceitos de Estado e Sociedade Civil foi de fundamental impor-

tância a inflexão teórica ocorrida quando tais conceitos foram absorvidos pela filosofia hege-

liana (Hegel, 1976; Hegel, 1979; Bobbio, 1982, Bobbio & Bovero, 1986) e quando eles foram

retomados pela crítica a esta filosofia realizada por Marx (Marx, 1983; Marx & Engels, 1976;

Bobbio & Bovero, 1986 E; Bobbio 1982). Hegel recusa as concepções jusnaturalistas do Di-

reito Natural e do Contrato, no entanto conserva as noções de Estado e Sociedade Civil, dan-

do-lhes um novo estatuto teórico no contexto de sua filosofia idealista (Bobbio & Bovero,

1986). Hegel retoma as concepções hobbesianas de uma sociedade pré-política, “na verdade,

Hegel não recusa a noção de estado de natureza: critica sua visão idílica dada por Rousseau,

mas louva Hobbes, precisamente o fundador do modelo, por ter entendido ‘em seu reto senti-

do’ tal conceito”, (Bobbio & Bovero, 1986, p 118; Marx, 1983, p 63-64). A Sociedade Civil

para Hegel é a passagem da sociedade pré-política para sociedade política. É onde os homens

buscam a satisfação de suas necessidades materiais e o campo onde também se confrontam

interesses materiais antagônicos (lutas de classes). A Sociedade Civil é o “Reino da Necessi-

dade” e o resumo da vida material de uma época, isto é, “a Sociedade Civil burguesa é a dife-

rença que intervém entre a família e Estado” (Hegel, 1979, p 62-72; Hegel, 1976, p 172-174).

Assim como a Sociedade Civil é a antítese da família (a comunidade), o Estado é a

síntese espiritual da sociedade pré-política - “natural” - (família/comunidade), com a socieda-

de civil - “artificial” – (Hegel, 1979, p 62; Hegel, 1976, p 265). O Estado é a realização da

idéia moral objetiva (o Direito). O Estado de direito - Rechsstaats - é o “Reino da Liberdade”,

comandado pelos funcionários públicos, membros da “classe universal” - a burocracia -, tendo

à frente o soberano que encarna a soberania do Estado. O Estado encontra-se, portanto, acima

das querelas movidas pelos conflitos antagônicos entre os interesses materiais que dominam a

Sociedade Civil, isto é, “a classe universal ocupa-se dos interesses gerais da vida social”,

(Hegel, 1976, p 185, 216, 265, 269). O Estado é a única garantia possível contra a completa

devassidão e a iminente desagregação e desordem constitutivas da Sociedade Civil, dilacerada

pelas lutas de classes (Hegel, 1976, p 265).

Para Hegel o Estado é o sujeito da História e a Sociedade Civil o seu predicado. A

História é o desenvolvimento do Espírito (Geist), cuja realização ocorre no e através do Esta-

do. Contra esta mistificação do Estado e contra a inversão idealista entre sujeito e predicado

da História, é que incidirá contundentemente a crítica marxiana à filosofia hegeliana do Esta-

do e do direito (Marx, 1983, p 10-16. Marx, s. d., Marx & Engels, 1976).

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Marx nunca aceitou, desde seus textos juvenis de crítica à filosofia hegeliana, a espiri-

tualização e a mistificação do Estado burguês e da burocracia estatal e muito menos aceitara a

inversão ideológica entre o sujeito e o predicado da História. Entretanto até o texto de ruptura

com a filosofia idealista (em “A Ideologia Alemã”), escrito em parceria com Engels, não en-

contramos muito claramente a determinação do conteúdo de classes do Estado e nem ainda a

determinação econômica da Sociedade Civil (Marx & Engels, 1976).

A partir de “A Ideologia Alemã”, o Estado já começa a ser conceituado como órgão

repressivo e ideológico de dominação política e de manutenção da exploração econômica da

qual se beneficia a classe burguesa, colocado acima da Sociedade Civil e sob a qual exerce

seu poder repressivo, transformando através da ideologia os interesses particulares da burgue-

sia em interesses gerais da sociedade (Marx, 1976 p 52, 67-68, 99). Embora, em Marx, o Es-

tado seja fundamentalmente a expressão dos interesses econômicos das classes dominantes,

enquanto que a garantia e a manutenção desses interesses se realiza através, principalmente,

de um poder coercitivo material (repressão / coação) (Coutinho, 1985 p 15-46), há pelo menos

um momento em que Marx confere em sua análise teórica uma certa autonomia ao Estado4,

trata-se da condição histórica em que sob determinadas circunstâncias estruturais e políticas

ocorre uma situação em que a classe burguesa perde momentaneamente a capacidade de go-

vernar e por outro lado a classe operária ainda não adquiriu essa capacidade, temos então o

fenômeno político do “bonapartismo”, no qual o Estado parece estar pairando no ar, desenrai-

zado da Sociedade Civil, um momento “en que la burguesía había perdido ya la facultad de

gobiernar la nación y la classe obrera no la había adquirido aún” (Marx & Engels, s/d, p 297).

Mas este desenraizamento é ilusório. Na verdade, a própria estrutura material e institucional

do Estado e o seu modus operandi mantêm intactos - ainda que alguns arranhões - os interes-

ses mais gerais das classes dominantes. Decorre daí o porquê de que o maior desenvolvimento

capitalista na França veio a ocorrer exatamente no reinado de Luís Bonaparte, um governo

burguês por excelência, mas sem a participação direta da burguesia, contrariando às vezes até

mesmo seus interesses mais imediatos (Ianni, 1984, p 35).

No texto de “A Ideologia Alemã”, Marx está há um passo de um rompimento comple-

to com a concepção hegeliana de Sociedade Civil, nesta obra a Sociedade Civil é conceituada

como o conjunto das relações de produção, num determinado estágio de desenvolvimento das

forças produtivas, e que se organiza internamente como Estado e externamente como nação,

4 Nas obras “As Lutas de Classes na França”, “O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte” e “A Guerra Civil na França”.

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embora ultrapasse os conceitos de Estado e Nação (Marx & Engels, 1976, p 28). Marx aban-

donará o conceito hegeliano de Sociedade Civil no famoso “Prefácio” de 1859, quando dis-

tingue explicitamente entre a sua elaboração teórica sobre a sociedade burguesa - bürgerlische

Gesellschaft - e a noção de Sociedade Civil (também em alemão bürgerlische Gesellschaft) de

Hegel e dos pensadores ingleses e franceses (Marx, 1984, 20; 1978, p 1295). Marx reduz então

o conceito de Sociedade Burguesa à estrutura econômica, isto é, ao modo de produção capita-

lista. As outras esferas da vida social, espiritual, política, artística, etc. passam a ser localiza-

das no conceito de superestrutura (Marx, 1984, p 20-21). Esta divisão metodológica e abstrata

ainda hoje é motivo de muita confusão e polêmica, tanto por parte dos adeptos quanto por

parte dos críticos da teoria marxiana.6

Quase todo pensamento político moderno foi elaborado tendo em vista a dicotomia en-

tre Estado e Sociedade Civil. Isto atesta tanto a importância quanto à complexidade em que

implica esta dicotomia. Deve-se em grande parte à teoria marxiana a permanência e a supera-

ção de alguns aspectos desta dicotomia, seja no que ela tem de ênfase no Estado ou de ênfase

na Sociedade Civil. Na verdade esta problemática como afirmamos anteriormente encontra-se

na gênese mesma da crítica à economia política marxiana, daí porque iremos buscar agora os

principais momentos de elaboração e superação dessas concepções nos instantes que prece-

dem e iniciam a critica marxiana à economia política.

Para Marx e Engels o conceito de Sociedade Civil:

Embraces the whole material intercourse of individuals within a definite stage of the development of pro-ductive forces. It embraces the whole commercial and industrial life of a given stage and, insofar, tran-scends the state and nation, though, on the other hand again, it must assert itself in its external relations as nationality and internally must organize itself as state. The term ‘civil society’ emerged in the eighteenth century, when property relations had already extricated themselves from the ancient and medieval commu-nity. Civil society as such only develops with the bourgeoisie; the social organization evolving directly out of production and intercourse, which in all ages forms the basis of the state and of the rest of the idealistic superstructure, has, however, always been designated by the same name (Marx & Engels, 1976, p 98). Este trecho foi escrito pelos autores entre os anos de 1845/1846. Treze anos depois,

Marx, no Prefácio de 1859 ao livro “Para Crítica da Economia Política”, retoma o conceito de

Sociedade Civil com mais precisão e menos abrangência com que ele foi definido nas páginas

de “A Ideologia Alemã”. À época em que escreveu o prefácio Marx já havia chegado a um

estágio bastante avançado de seus estudos que lhe permitiriam alguns anos depois publicar o

volume I de “O Capital” (1867). É portanto com estilo de “relatório final de pesquisa” que

Marx repensa o conceito de Sociedade Civil:

5 Especialmente a nota de nº 15 dos tradutores Giannotti e Malagodi. 6 Esta é uma discussão “teórico-metodológica”, geralmente enfadonha, entre a vulgata marxista e a vulgata anti-marxista. Ciosas de seus dogmas, acabam por falar a mesma linguagem, com a mesma estrutura de pensamento e raciocínio e ainda assim travam amiúde um diálogo de surdos!

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My inquiry led me to the conclusion that neither legal relations nor political forms could be comprehended whither by themselves or on the basis of so-called general development of the human mind, but that on the contrary they originate in the material conditions of life, the totality of which Hegel, following the example of English and French thinkers of the eighteenth century embraces within the term ‘civil society’; that the anatomy of this civil society, however, has to be sought in political economy (Marx, 1984, p 20). A diferença fundamental entre os dois conceitos de Sociedade Civil, além da abran-

gência concomitante à precisão da formulação marxiana, encontra-se evidentemente na gêne-

se teórica das duas formulações, a marxiana e a hegeliana. Bobbio no seu ensaio sobre o con-

ceito de Sociedade Civil (Bobbio, 1982, p 24-32), embora situe com erudição e perspicácia a

formulação original que o conceito recebeu na obra hegeliana, não aprofunda, entretanto, a

análise da formulação teórica marxiana, mesmo porque o interesse imediato de Bobbio era

discutir a concepção gramsciana de Sociedade Civil como caudatária da formulação de Hegel.

Bobbio acentua muito mais a semelhança entre a formulação de Marx e Engels de 1845/46,

resultante da crítica ao idealismo neo-hegeliano, e a elaboração de 1859 de Marx, no Prefácio,

resultante da crítica à economia política. Não obstante as formulações, encontradas tanto no

texto de “A Ideologia Alemã” quanto no Prefácio de 1859, identifiquem a Sociedade Civil em

primeiro lugar com a infra-estrutura da sociedade burguesa, todavia o grau de generalidade

com que o conceito é tratado no texto de “A Ideologia Alemã” dispensa demonstração argu-

mentativa, enquanto que no “Prefácio” o conceito de Sociedade Civil restringe-se apenas à

totalidade das condições materiais da vida, sendo que a anatomia da Sociedade Civil é revela-

da pela crítica da economia política, nessa perspectiva “O Capital” é o estudo da anatomia da

Sociedade Civil burguesa (bürgerlische Gesellschaft). Marx no “Prefácio” havia separado

explicitamente a Sociedade Civil da superestrutura, ao contrário do que ocorre no trecho de

“A Ideologia Alemã”, no qual a Nação e o Estado eram apresentados como formas de organi-

zação da Sociedade Civil que, portanto reduziam-se a ela. No Prefácio há o abandono implíci-

to do conceito de Sociedade Civil por categorias analíticas de maior rigor científico, como

pode ser constatado na “Introdução Geral” de 1857 (Marx, 1984, p 188-217; 1986, p 3-33).

Aliás, diga-se de passagem, que a crítica e a prefiguração de uma futura superação do concei-

to de Sociedade Civil já podem ser encontradas nas teses ad Feuerbach de 1845: “The highest

point reached by contemplative materialism, that is, materialism which does not comprehend

sensuousness as practical activity, is the contemplation of single individuals and civil society;

the standpoint of the new is human society, social humanity” (Marx & Engels, 1976, p 617).

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3.2. A gênese hegeliana do conceito de Sociedade Civil

O conceito de Sociedade Civil superado pelas novas categorias que a crítica à econo-

mia política fornecera, só será, dentro do marxismo, colocado em relevo por Gramsci no bojo

de um aparato conceitual muito mais complexo e genérico que reavivará traços de sua gênese

hegeliana. Daí porque não é possível compreender a gênese do conceito de Sociedade Civil na

teoria marxiana se não compreendermos o surgimento da elucubração filosófica hegeliana do

conceito, assim como a absorção crítica a qual Marx o submeteu. Para Hegel:

A Sociedade Civil burguesa é a diferença que intervém entre a família e o Estado, embora o seu desenvol-vimento completo se remate mais tarde que o do Estado, por que, como diferença, pressupõe o Estado; tem de tê-lo diante de si como qualquer coisa de autônomo para poder existir. A criação da Sociedade Civil burguesa pertence, de resto, ao mundo moderno, que é o primeiro a conceder todo seu direito às determina-ções da Idéia (Hegel, 1979, p 62). Vale lembrar que para Hegel o termo civil society, traduzido para o alemão como bür-

gerlische Gesellschaft, significava uma sociedade pré-estatal, embora este tipo de sociedade

não represente mais como na tradição jusnaturalista “sociedade natural” (que no sistema filo-

sófico hegeliano é a família), A Sociedade Civil hegeliana não é nem a sociedade política e

nem a sociedade natural dos jusnaturalistas, não obstante se aproxime bastante da noção de

estado natural hobbesiano (Bobbio, 1982; Bobbio & Bovero, 1986). Hegel, assim como Hob-

bes do estado natural, tinha uma imagem negativa da Sociedade Civil, quando afirma que “em

suas oposições e complicações oferece a Sociedade Civil o espetáculo da devassidão bem

como da miséria” (Hegel, 1976, 172). Por sua relação com o Estado, mas principalmente, por

ser um sistema de carências onde os homens buscam a satisfação de suas necessidades mate-

riais e a defesa de seus interesses de propriedade, é que a Sociedade Civil contém três mo-

mentos:

(A) A mediação da carência e a satisfação do indivíduo singular pelo seu trabalho e pelo trabalho e satisfa-ção das carências de todos os outros: é o sistema das carências. (B) A realidade efetiva do universal da li-berdade que nela está contido, a proteção da propriedade pela administração da justiça. (C) O momento em que são tomadas as precauções contra o que pode restar de contingência nesses sistemas e em que ele é provido ao interesse particular como interesse coletivo, pela polícia (Polizei) e a corporação (Hegel, 1979, p 72). Por constituir-se numa situação social caracterizada por uma struggle for life (que es-

tará presente posteriormente na concepção de natureza e evolução de Darwin) a Sociedade

Civil hegeliana cria a necessidade do Estado como realização da liberdade e como manuten-

ção da única ordem possível na luta pela satisfação das carências: a proteção da propriedade

pela administração da justiça que é atribuição do Estado e dele emana. No sistema de carên-

cias que estrutura a Sociedade Civil a carência subjetiva alcança sua objetividade através da

satisfação material que é o momento do particular. A economia política para Hegel é a ciência

que apresenta o movimento das massas em suas situações e relações qualitativas e quantitati-

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vas. O objetivo da Sociedade Civil é o bürger (bourgeois), isto é, o cidadão. “Como cidadãos

deste Estado, os indivíduos são pessoas privadas que têm como fim o seu próprio interesse”

(Hegel, 1976, 174). Este fim egoísta vai ser a base de um sistema de dependências recíprocas

no qual “a subsistência, o bem-estar e a existência jurídica do indivíduo estão ligados à sub-

sistência, ao bem-estar e à existência, de todos, em todos assentam e só são reais e estão asse-

gurados nessa ligação” (Hegel, 1976, 172).

Estas relações existentes na Sociedade Civil são todas mediatizadas pelo trabalho. A

divisão do trabalho aumenta a aptidão do homem para o trabalho abstrato de tal forma que

leva a estabelecer-se uma necessidade total. A crescente abstração da produção leva a meca-

nizar cada vez mais o trabalho que por fim “é possível que o homem seja excluído e a máqui-

na o substitua” (Hegel, 1976, 181).

A Sociedade Civil na concepção hegeliana pode ser considerada como a passagem da

sociedade natural (família) para a sociedade propriamente política (Estado), nela se estabelece

um “sistema de carências”, onde os homens buscam a satisfação de suas necessidades materi-

ais, daí porque a Sociedade Civil resume toda vida material de uma época. Por estar enredada

nos interesses materiais dos homens a Sociedade Civil é um sistema incompleto no qual as

contradições e disputas afetam e condicionam sua moralidade, levando-a a um estado de cor-

rupção e miséria que só é e só pode ser regularizado e superado pela ação moral e repressiva

do Estado. Hegel afirma que a Sociedade Civil é um sistema constituído de classes com inte-

resses materiais estabelecidos que muitas vezes conflitam entre si e geram antagonismos por

si mesmo inconciliáveis (Hegel, 1976, 180-184). Hegel diferencia Stand (estado social) e

Klasse (classe social), o primeiro termo refere-se àqueles grupos sociais socialmente reconhe-

cidos (que possuem status), por sua vez classe social é o agrupamento social resultante do

processo de produção que nem sempre tem status social. A superação da condição de particu-

laridade das classes sociais e de seus antagonismos só se torna possível através de um Stand

que possui um caráter universal. Esta

classe universal (Stand) ocupa-se dos interesses gerais, da vida social. Deverá ela ser dispensada do traba-lho direto requerido pelas carências, seja mediante a fortuna privada, seja mediante uma indenização dada pelo Estado que solicita a sua atividade, de modo que, nesse trabalho pelo universal, possa encontrar satis-fação o seu interesse privado (Hegel, 1976, 185). Esta “classe universal” nada mais é do a classe média ou petite bourgeoisie urbana e a

organização que lhe corresponde é a burocracia estatal. Chegamos aqui a uma complexidade

analítica em que a Sociedade Civil não pode ser entendida mais sem com que se compreenda

a concepção hegeliana de Estado, os dois conceitos além de estarem imbricados são comple-

mentares um ao outro. O segundo abrange o primeiro em sua determinação ideal, pois:

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O Estado é a realidade em ato da Idéia moral objetiva, o espírito como vontade substancial revelada, clara para si mesma, que se conhece e pensa, e realiza o que sabe e porque sabe. (...) O Estado, como realidade em ato da vontade substancial, realidade que esta adquire na consciência particular de si universalizada, é o racional em si e para si: esta unidade substancial é um fim próprio absoluto, imóvel, nele a liberdade obtém o seu valor supremo, e assim este último fim possui um direito soberano perante os indivíduos que em se-rem membros do Estado têm o seu mais elevado dever (Hegel, 1976, 216). A crítica de Marx à filosofia do Estado e do direito de Hegel, que vai ter seu ponto de

inflexão em “A Ideologia Alemã”, caminha no sentido de superar a concepção hegeliana de

Estado encarnando a razão universal e o valor supremo da liberdade. Neste sentido é que de-

vemos compreender a crítica marxiana à concepção hegeliana de Estado. A crítica de Marx

incide com maior contundência sobre o conceito hegeliano de Estado do que propriamente

sobre o conceito de Sociedade Civil. Isto se explica pelo fato de que a obra de Hegel possibili-

tou a Marx desenvolver o conceito de lutas de classes a partir da concepção hegeliana de So-

ciedade Civil na acepção (hobbesiana) de guerra de todos contra todos. Hegel havia acentuado

esta característica na seguinte passagem: “Assim como a Sociedade Civil é o campo de bata-

lha dos interesses individuais de todos contra todos, assim aqui se trava o conflito entre este

interesse geral e os da comunidade particular e por outro lado, entre as duas espécies de inte-

resses reunidas e o ponto de vista mais elevado do Estado e das suas determinações” (Hegel,

1976, p 265).

Na continuidade deste trecho Hegel reconhece explicitamente que os interesses parti-

culares dos indivíduos estão presentes como interesse geral no Estado. Esta argumentação

impressiona Marx que observa que:

A argumentação precedente é notável: 1) Porque a Sociedade Civil é definida como bellum omnium contra

omnes; 2) Porque o egoísmo privado apresenta-se como ‘segredo do patriotismo dos cidadãos’ e como ‘profundidade e força do Estado nos sentimentos’; 3) Porque o ‘cidadão’, o homem do interesse particular, oposto ao geral, o membro da Sociedade Civil, é considerado como ‘indivíduo fixo’; e é através deste ‘in-divíduos fixos’ que o Estado se opõe aos ‘cidadãos’ (Marx, 1983, p 64-65). A garantia da universalidade do Estado através de uma burocracia esclarecida recebe

por parte de Marx uma contundente e devastadora crítica (Marx, 1983, p 68-83). Marx consi-

dera simplesmente um absurdo a afirmação de Hegel de que “os membros do Governo e os

funcionários do Estado constituem a parte principal da classe média que é onde residem a

inteligência culta e a consciência jurídica do conjunto de um povo” (Hegel, 1976, p 269). Para

Marx:

A burocracia constitui o Estado imaginário, paralelo ao Estado real, é a espiritualidade do Estado. Tudo tem, portanto, dois significados, um real e outro burocrático, assim como o saber é duplo; um real e outro burocrático (o mesmo acontece com a vontade). Mas o ser real é tratado de acordo com o seu ser burocráti-co, irreal, espiritual. A burocracia ‘possui’ o ser do Estado; o ser espiritual da Sociedade Civil é sua propri-edade privada. O espírito geral da burocracia é o segredo, o mistério, guardado no seu seio pela hierarquia e no exterior pelo seu caráter de corporação fechada. O espírito do Estado, se for conhecido por todos, as-sim como a opinião pública surge à burocracia como uma traição ao seu mistério. A autoridade é conse-qüentemente o princípio da sua sabedoria e a idolatria da autoridade constitui seu sentimento (Marx, 1983, p 73).

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Esta crítica à burocracia é parte fundamental da crítica marxiana à concepção hegelia-

na de Estado e vai retornar nas obras da maturidade quando Marx elabora sua análise da polí-

tica e do Estado franceses, em que este último surge como a imensa máquina burocrática, su-

focando os poros da sociedade, impedindo-a de respirar, e também o Estado aparece como o

butim de guerra da luta política, o lócus de poder disputado pelas várias facções das classes

dominantes em luta pela apropriação da máquina estatal.

Marx ainda que tenha conservado em essência a concepção hegeliana de Sociedade

Civil (enquanto “resumo da vida material de uma época”), tinha consciência de que no siste-

ma hegeliano a Sociedade Civil era vista como um predicado do Estado, como um predicado

da Idéia. Como o Estado é a encarnação da Idéia, ele é, portanto, sujeito e a Sociedade Civil

seu predicado: “o que há de importante consiste no fato de que de Hegel transformar sempre a

idéia em sujeito e fazer do sujeito real propriamente dito, (...), o predicado. Mas o que se de-

senvolve é sempre o predicado” (Marx, 1983, p 16).

Como Hegel inverte em sua dialética idealista a relação entre Estado e Sociedade Ci-

vil, o Estado torna-se sujeito da História entendida aqui hegelianamente como desenvolvi-

mento do Espírito (Idéia) e a Sociedade Civil como predicado da História e subordinada ao

Estado, que é o seu fim último, sua síntese absoluta e resolvida, ou, nas palavras de Marx: “A

família e a Sociedade Civil aparecem como obscuro fundo natural em que se projeta a luz do

Estado. (...) A família e a Sociedade Civil são partes do Estado” (Marx, 1983, p 10 e 12).

O ponto de partida da elaboração conceitual de Marx sobre o Estado e Sociedade Ci-

vil, é a crítica que ele elabora para a filosofia hegeliana do Estado. Seria interessante indagar

por que Marx não se interessou em criticar diretamente a 1ª e a 2ª Partes dos “Princípios de

Filosofia do Direito” de Hegel, assim como a também não criticou a 1ª e a 2ª seções da 3ª

Parte e principalmente a 2ª secção da 3ª Parte que tratam da Sociedade Civil? Por que o objeto

fundamental da crítica marxiana é a concepção hegeliana de Estado e não a concepção de So-

ciedade Civil? Em nosso entender Marx sabia que para manter o conteúdo inovador do con-

ceito hegeliano de Sociedade Civil far-se-ia necessário, em primeiro lugar, demolir o arca-

bouço idealista e reacionário de sua concepção de Estado que revestia o núcleo central de uma

formidável compreensão da sociedade burguesa. Só depois de realizada esta tarefa pôde Marx

formular sua própria concepção de Estado tendo como ponto de partida a noção de Sociedade

Civil hegeliana, entendida como: “the true focus and the theatre of all history, and how absurd

is the conception of history held hitherto, which neglected the real relations and confines itself

to spectacular historical events” (Marx & Engels, 1976, p 57-58).

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Fazia-se mister, portanto, superar uma concepção de história que subordinava a Socie-

dade Civil ao Estado e lhe negava o papel de verdadeiro palco da História, da organização da

produção econômica e da vida material, comercial e industrial da sociedade. Esta superação

só poderia ser alcançada quando se desfizesse a inversão ideológica entre sujeito e predicado

da história e quando se formulasse uma nova concepção de Estado que o adequasse a seu pa-

pel subordinado em relação à Sociedade Civil, isto é, que revelasse seu conteúdo de classe,

que lhe retirasse a áurea de representante da volonté générale e encarnação da Razão Univer-

sal

A primeira formulação mais explícita da relação entre Estado e lutas de classes, isto é,

Estado como expressão política das classes dominantes, pode ser encontrada em “A Ideologia

Alemã” e em sua forma mais radicalizada no “Manifesto do Partido Comunista” como comitê

executivo para gerir os negócios comuns da classe burguesa. Em “A Ideologia Alemã” o con-

ceito de Estado ainda está muito próximo do conceito de Sociedade Civil. A filiação filosófica

hegeliana do conceito de Sociedade Civil é mantida quase intacta e de forma mais explícita,

ao mesmo tempo em que se tem uma superação radical e notável do conceito de Estado atra-

vés de uma formulação própria e inovadora deste conceito como expressão política da estrutu-

ra de classes da sociedade burguesa.

Já demonstramos que desde a crítica à filosofia hegeliana do Estado que Marx estabe-

lecera que, ao contrário do que pensava Hegel, a sociedade civil era o verdadeiro sujeito da

história e o Estado o seu predicado, Marx empreendera uma crítica às concepções neo-

hegelianas na Alemanha e às concepções jurídicas burguesas originárias da Revolução Fran-

cesa que separavam o “homem” do “cidadão”, isto é, o bourgeois do citoyen. Para Marx, co-

mo já observamos, a emancipação humana não podia confundir-se com a emancipação políti-

ca (Marx, 1983, p 10-16, 64-73, 83; Marx, s.d.).

O texto de ruptura de Marx e Engels com a ideologia alemã, isto é, com a filosofia ne-

o-hegeliana, acentua o caráter histórico das formas de propriedade como expressão da corres-

pondência dialética entre o desenvolvimento das forças produtivas e das relações sociais de

produção. Há uma acentuada e significativa relação entre propriedade privada, classe domi-

nante e Estado como mecanismo articulados de perpetuação das desigualdades socioeconômi-

cas cuja superação dar-se-ia no âmbito da expropriação dos expropriadores (classe dominante)

e na assunção das classes dominadas e exploradas ao poder do Estado (Marx & Engels, 1976).

Nas obras da maturidade, Marx foi buscar a anatomia da sociedade civil na crítica da

economia política e as conclusões a que chegou, magistralmente expostas no prefácio de ja-

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neiro de 1859, vaticinam o fim da pré-história da humanidade com a superação do modo de

produção burguês moderno (Marx, 1984). A inspiração hegeliana desta passagem é evidente

na proposição de Marx de que a desigualdade cessa ao concluir-se a passagem histórica do

“reino da necessidade” ao “reino da liberdade”, isto é, da sociedade de classes à sociedade

comunista. Esta é uma temática que se repetirá ao longo das obras de Marx e Engels.

Conclusão

Nosso objetivo principal neste texto foi o de procurarmos indícios fortes de que a críti-

ca à economia política realizada por Marx tem sua origem na crítica à filosofia hegeliana do

Estado e do direito. Ao deparar-se com o conceito hegeliano de Sociedade Civil, Marx nele

encontrou a motivação heurística que lhe faltava para dedicar-se à tarefa inacabada de que

Hegel não pôde dar continuidade à excepcional descrição e análise da vida material que a no-

ção de Sociedade Civil continha.

À medida que avançava em seus estudos, entretanto, Marx convencia-se da insuficiên-

cia analítica do conceito de Sociedade Civil para abarcar tanto a crítica quanto a análise da

economia política para além unicamente da descrição do modo de produção da vida material

burguês. Com avanço, contudo, na elaboração de sua metodologia materialista de análise eco-

nômica e com uma compreensão mais ampla do funcionamento das estruturas fundamentais

da sociedade capitalista Marx pôde abandonar parcialmente a noção hegeliana de Sociedade

Civil e partir para o estudo ampliado das estruturas econômicas que já estavam pressupostas

na constituição e funcionamento desta organização socioeconômica.

Mesmo assim, Marx jamais conseguiu elaborar com a mesma precisão, cuidado analí-

tico e síntese as complexas relações que no capitalismo ocorrem entre Estado, Sociedade e

Economia que Hegel, no final de sua vida, sob o ponto de vista de sua filosofia idealista, ela-

borara.

Para Marx, em ambicioso plano de estudo da sociedade burguesa, o Estado e o Merca-

do mundial constituíam-se num fecho magistral que nunca pôde ser concluído. Ainda restou

também inconcluso o famoso capítulo sobre as classes sociais em “O Capital”, que desenvol-

veria a análise essencial para o entendimento da problemática relação entre o Estado e a di-

nâmica antagônica das classes.

Poderíamos afirmar, à guisa de conclusão, que paradoxalmente, se, por um lado, po-

demos encontrar uma importante superação da concepção hegeliana de Estado e Sociedade

Civil na obra econômica de Marx, através da apurada crítica da economia política, por outro

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lado, no entanto, restam inacabados os desenvolvimentos necessários a uma nova compreen-

são daquilo que havia de inovador e heurístico na concepção original idealista de Hegel: uma

explicação formidável dos mecanismos de funcionamento e finalidade da origem, desenvol-

vimento e articulação do Estado, Sociedade e Economia, isto é, da política, história e produ-

ção material da sociedade burguesa.

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