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INSPER INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA Renato Carlos Pereira Cotrim Turma MBEW 05 Estudo sobre a valorização de empresas que praticam o capitalismo consciente no Brasil

MBEW05 - TCC - Renato Cotrim v.1.8 FINAL

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INSPER INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA

Renato Carlos Pereira Cotrim

Turma MBEW 05

Estudo sobre a valorização de empresas que praticam o capitalismo consciente no Brasil

São Paulo – 2016

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INSPER INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA

Renato Carlos Pereira Cotrim

Turma MBEW 05

Estudo sobre a valorização de empresas que praticam o capitalismo consciente no Brasil

O aluno cumpriu todos os

requisitos necessários para a

elaboração do Projeto Aplicado,

estando, portanto, APROVADO.

São Paulo, 24 de Março de 2016

Silvio Abrahão Laban Neto

São Paulo – 2016

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“Do you want to make a profit or make a difference?”

Resumo

O objetivo primordial do gestor é maximizar o valor para os acionistas. O mercado, na

pessoa de investidores privados, funciona de forma racional, antecipando e incorporando ao

preço das empresas todas as informações públicas tão logo estas se tornam disponíveis. As

empresas são avaliadas por sua capacidade de gerar fluxo livre de caixa futuro, que são

trazidos a valor presente por uma taxa de desconto.

Empresas que buscam expandir o valor econômico e social gerado como parte inerente

de suas atividades devem ter maior valorização de mercado, pois têm modelo de geração de

fluxo livre de caixa mais sustentável no futuro, logo diminuem as incertezas quanto a geração

de caixa na perpetuidade.

1. Introdução

A pergunta que abre este trabalho, “você quer fazer lucro ou diferença?”, pode ser

encontrada em muitos panfletos que buscam voluntários para trabalhos sociais, normalmente

distribuídos por organizações não governamentais do terceiro setor.

O conceito assumido é que ambos são mutuamente excludentes: uma empresa que tem

lucro, o tem, necessariamente, às custas da sociedade, seja através da exploração de

alternativas de trabalho com baixa remuneração, ou em outras regiões geográficas menos

favorecidas; seja através do custo ambiental de dejetos poluentes, as chamadas externalidades

negativas, ou também da exploração de fornecedores e parceiros, que devem receber o

mínimo possível pelos insumos que fornecem A ideia que prevalece é que, para alguém

ganhar e ter mais, é preciso que alguém perca e ganhe menos, conhecido como “zero sum

game”, ou seja, o total é sempre o mesmo, o que muda é a distribuição.

Não deveria, porém, ser assim. Fazer a coisa certa deveria ser também fazer a coisa

mais lucrativa. Se a empresa pode ser avaliada pelo valor presente de seus fluxos de caixa

futuros, e se uma empresa consegue maximizar a criação de valor econômico e social, ao

mesmo tempo em que torna seu fluxo livre de caixa mais sustentável no longo prazo, esta

empresa deveria obter maior valorização.

O objetivo principal do gestor, de maximização de valor para o acionista, deveria ser

convergente com o objetivo de geração de valor social, desde que este valor social seja gerado

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a partir das atividades principais da empresa, e não como uma atividade acessória para

redistribuição de valor já gerado, e desde que a geração deste valor social também possibilite

uma maior eficiência que, de outra forma, não seria possível.

O objetivo deste trabalho é demonstrar que é possível, e desejável, perseguir metas de

maximização de valor econômico ao mesmo tempo em que se perseguem metas de geração de

valor social, que estes objetivos são conciliáveis e não conflitantes, e que o capitalismo está

evoluindo para uma nova fase na qual o mercado recompensará as empresas que busquem

modelos socialmente sustentáveis no longo prazo, e o fará não porque isso é socialmente

responsável, mas porque estas empresas se provarão mais rentáveis do que as empresas que

buscam apenas maximizar resultados de curto prazo.

2. Uma Breve História do Capitalismo

O comércio entre povos, ou capitalismo mercantil, floresceu no mundo antigo na baixa

idade média. O comércio era uma das poucas formas de acumulação de capital e de

movimentação entre camadas sociais.

Historicamente, com a queda do império romano ocidental e início da idade média, o

feudalismo foi o sistema sócio-político predominante (séculos IV e V). Neste, um senhor

feudal, oferecia terras (glebas) para cultivar e habitar, e proteção aos camponeses, que lhes

pagavam pesados tributos.

A partir do século XI, com as cruzadas e retomada do comércio com o oriente próximo

(Palestina), a população urbana aumenta, os alimentos ficam mais caros e os camponeses

acumulam capital para comprar suas terras e enfraquecem o sistema feudal, que dá lugar ao

capitalismo.

Tecnicamente, o capitalismo é um sistema econômico no qual os meios de produção e

comércio são de iniciativa privada, que os operam de forma a gerar lucro. Suas bases são a

propriedade privada, a acumulação de capital, o trabalho assalariado e, em alguma instâncias,

um mercado em competição perfeita, no qual as partes negociam e determinam a que preços

bens e serviços serão comercializados.

Ironicamente, o termo capitalismo foi popularizado por Karl Max, no século XIX,

porém seus princípios já haviam sido delineados pelo economista escocês Adam Smith, em

seu livro “An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations”, publicado em

1776. Nesta época o termo utilizado era “liberalismo”, ou uma economia livre de mercado.

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Com o advento da revolução industrial, que permitiu que bens fossem produzidos em

larga escala e custos reduzidos, o capitalismo ganhou força. O capitalismo pressupõe quatro

princípios básicos:

o capital de negócios é de propriedade privada

a economia é controlada por vendedores e compradores

as pessoas tem liberdade de gastar seu dinheiro no que desejarem

a intervenção e supervisão do governo deve ser a menor possível

No final do século XIX e princípio do século XX, os empregadores se aproveitaram da

falta de regulamentação para obrigar os trabalhadores a longas jornadas, falta de segurança no

trabalho e abuso do trabalho infantil. O que levou a criação de leis regulamentando estes

temas.

3. Trabalhando para Wall Street

O capitalismo tem sido o sistema econômico mais efetivo em promover melhores

condições de vida para a sociedade, além de mola propulsora da inovação e veículo de

mobilidade social. No sistema anterior, o feudalismo, se você nascia pobre, você morria

pobre, no capitalismo qualquer indivíduo tem a possibilidade de produzir e vender bens e

serviços que, dado a demanda, pode levar a acumulação de riquezas e mobilidade social.

Os conceitos fundamentais nesta promoção de melhoria social são:

o capital, na forma de seus acionistas, contrata meios de produção,

como insumos, equipamentos e trabalho, para produzir bens e serviços e vende-los ao

mercado para obtenção de lucro,

os negócios contribuem para a sociedade através da obtenção de lucro,

que gera os empregos, salários, compras, investimentos e impostos, conforme

expressado por Milton Friedman,

os gestores tomarão decisões no sentido de maximizar a criação de

lucro e valor para os acionistas e assim perpetuar este ciclo virtuoso,

Estes conceitos têm passado por modificações nas últimas décadas, que nos levam a

questionar se esta equação de geração de valor para a sociedade ainda é válida.

a. Companhias Globais

De acordo com o livro “O Mundo É Plano: uma Breve História do Século XXI”

publicado por Thomas Friedman em abril de 2005, o mundo é plano,. Uma metáfora para um

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mundo onde o comercio se dá a nível global, onde todos os competidores têm acesso às

mesmas oportunidades. As empresas, os países e os indivíduos devem se preparar para

competir em um mundo onde as fronteiras históricas e geográficas estão se tornando cada vez

mais irrelevantes.

As empresas, sem uma identidade com uma comunidade ou local específico, perdem

também a percepção de responsabilidade com a sociedade. Produtos, serviços e dinheiro

fluem livremente sem reconhecer fronteiras. Os benefícios do lucro como fomentador de

empregos, salários, compras, investimentos e impostos, também fluem livremente para locais

de menor custo, sem ligações com nenhuma sociedade específica.

b. Diversificação do Risco

A lógica do mercado de capitais afirma que o capital, que arca com a maior parte do

risco do empreendimento, deve receber o retorno residual deste. Este sempre foi o alicerce do

mercado livre e capitalismo competitivo.

No passado um capitalista investia uma boa parte de seu patrimônio em uma fábrica,

que contratava trabalhadores e pagava seus salários. Quem arcava com a maioria dos riscos

neste empreendimento e, por consequência, tinha eticamente o direito aos retornos residuais,

era o capitalista, que também tinha a melhor informação sobre o negócio e o poder de

assegurar a efetiva implementação de decisões operacionais.

Com a diversificação dos investidores em um número sem fim de acionistas, o risco

destes investimentos diversificados reduziu consideravelmente. Muitos investidores sequer

sabem em que companhias seus fundos de pensão estão investidos. Por outro lado os

trabalhadores de um empreendimento ainda detém um considerável risco em uma empresa,

seus investimentos são em forma de conhecimento do negócio, construção de relacionamentos

e reputação, investimentos estes que não são facilmente diversificáveis.

Partindo da premissa que os que detêm a maior parte do risco serão também os mais

motivados para assegurar que uma empresa permaneça competitiva, empresas nas quais as

decisões estratégicas são tomadas por conselhos com representantes laboristas deveriam ser

também as empresas com uma melhor vantagem competitiva de médio e longo prazo.

Os gestores das empresas, no entanto, tomam suas decisões operacionais para

contentar o mercado de capitais que, com a diversificação e minimização do risco buscam

resultados imediatos e não a perpetuação do círculo virtuoso de geração de valor. As decisões

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estratégicas, quando direcionadas pelas demandas de curto prazo do mercado de capitais, não

otimizam a competitividade de longo prazo.

c. Foco no Curto Prazo (ou Expectativas Trimestrais)

O capitalismo moderno por ser dividido em duas grandes eras, a primeira se inicia em

1932, com a publicação, por Adolf A. Berle e Gardiner C. Means, do tratado intitulado “The

Modern Corporation and Private Property” que advogava que a gestão e a propriedade de uma

empresa deveriam ser separadas.

Berle e Means, porém, já anteviam o conflito de agencia entre proprietários e gestores.

No sexto capítulo do primeiro livro, intitulado “A divergência de interesse entre propriedade e

controle”, eles alertavam que a justificativa para a premissa de que os que estivessem no

controle da corporação moderna irão operá-la no melhor interesse de seus proprietários

dependia do grau no qual os interesses próprios dos gestores se alinhassem com os dos

proprietários.

Eles mencionam ainda que, se assumirmos que o desejo de lucro pessoal é a força

mestre que motiva o controle, devemos também concluir que os interesses do controle serão

diferentes, e, às vezes, radicalmente opostos aos da propriedade, e que proprietários não serão

atendidos por um grupo de controle que busque lucro.

A segunda grande era do capitalismo também se inicia com a publicação de um

trabalho acadêmico. “Theory of the Firm: Managerial Behavior, Agency Cost and Ownership

Structure”, por Michael C. Jensen e William H. Meckling, publicado em 1976 no “Journal of

Financial Economics”.

Jensen e Meckling, entre vários outros tópicos, afirmam que a premissa que deve

dirigir uma corporação é que o propósito de todas corporações deveria ser maximizar o valor

para o acionista.

Este trabalho argumentava que a gestão profissional estava trabalhando em seu próprio

interesse, e não dos acionistas. Isto era ruim não somente para os acionistas como também

para a economia, os gestores estavam utilizando recursos corporativos e da sociedade para seu

próprio benefício.

Em resposta a este problema surgiu a figura do conselho corporativo, cujo trabalho é

alinhar os interesses da alta gerencia com os dos acionistas através da compensação baseada

em opções de ações.

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No entanto o mantra de maximização do valor para o acionista tem uma lógica falha

em si mesmo, aumentar o valor para o acionista, na maioria das vezes, não garante benefício

para este mesmo acionista. Vamos examinar um pouco mais detalhadamente como o valor

para o acionista é criado.

O acionista tem direito ao valor excedente sobre o patrimônio e ganhos da empresa

depois que outras partes como empregados, fundos de pensão, fornecedores, impostos e

credores são pagos. Logo o valor de suas ações é o valor presente de todos os fluxos de caixa

futuros após estes pagamentos. Como é impossível saber com exatidão os fluxos de caixa

futuros o valor da ação se baseia em uma estimativa, uma expectativa.

Portanto as implicações para os gestores são claras, a única forma de uma corporação

servir ao seu propósito e maximizar o valor para o acionista é aumentar as expectativas sobre

o desempenho futuro desta corporação. Infelizmente os gestores não podem fazer isso

indefinidamente, como diz Warren Buffett, “as árvores não crescem até o céu”.

Inevitavelmente, os acionistas e analistas vão aumentar suas expectativas futuras a um

ponto que os gestores não conseguirão atingir. Qualquer gestor que entenda que a criação e

destruição de valor são cíclicas, e não estão sob seu controle, irá investir em estratégias de

curto prazo, na esperança de sair antes da queda inevitável, e frequentemente criticar seu

sucessor.

Como os CEOs não podem vencer o jogo no longo prazo, eles transformam este jogo

em algo que possam vencer no curto prazo. De fato, as companhias negociadas no mercado

acionário vivem atualmente uma pressão sem precedentes para exceder as expectativas

trimestrais dos analistas.

Um notório exemplo desta manipulação é a General Eletric. Jack Welch é famoso por

ter transformado a GE, que quando ele assumiu em 1981 tinha uma capitalização de mercado

de US$ 13 bilhões, na maior empresa do mundo com US$ 484 bilhões de capitalização de

mercado quando ele se aposentou, em 2001.

Porém este crescimento foi, em grande parte alimentada pela unidade GE Capital, que

inicialmente tinha uma participação insignificante nos lucros da GE, e que era responsável por

metade dos lucros da GE no final da década de 90. Em 2009 a GE teve que assumir perdas

significativas relacionadas com a GE Capital e viu seu valor de mercado cair para US$ 75

bilhões.

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Concluindo, a valorização de mercado de US$ 471 bilhões, atribuída a gestão de Jack

Welch, beneficiou somente os que venderam na alta. Seu benefício para os acionistas no

médio e longo prazo é questionável.

A questão é, se a capitalização de mercado das empresas está no valor presente da

expectativa de geração de fluxo livre de caixa futuro, por que esta expectativa é traduzida por

estimativas de geração de caixa no curto prazo, os relatórios trimestrais?

O fato é que o encurtamento no horizonte de tempo dos investidores também estreita o

pensamento sobre os investimentos apropriados. Os investimentos, que normalmente seriam

avaliados pelo valor presente líquido dos fluxos futuros, passam a ser avaliado somente por

seus resultados imediatos, o futuro próximo, a perpetuidade passa a ser logo ali.

4. Filantropia

A filantropia foi a primeira tentativa do capitalismo de devolver para a sociedade uma

parte das riquezas acumuladas. A filantropia se diferencia da caridade no sentido de que esta

última tenta amenizar as dores de problemas sociais, enquanto a primeira tenta resolver este

problema na sua causa, ou como comumente mencionado, a diferença entre dar um peixe a

uma pessoa com fome, e ensina-lo a pescar o peixe.

Há diversos exemplos de caridade e filantropia na história da humanidade, e nem

sempre é fácil classificá-los. Na história moderna, podemos citar Henry Dunant, homem de

negócios suíço que, em 1863, usou sua fortuna pessoal para criar a “Geneva Society for

Public Welfare” que mais tarde se tornou o Comitê Internacional da Cruz-Vermelha, e lhe

valeu o primeiro Premio Nobel da Paz, concedido em 1901.

No final do século 19 e principio do século 20, a filantropia se tornou uma atividade

de moda entre os mais favorecidos na Inglaterra e América industrializadas. Andrew

Carnegie, por exemplo, escreveu sobre a responsabilidade das grandes fortunas e a

importância da justiça social em “Gospel of Wealth” (1889). O senhor Carnegie fundeou

bibliotecas públicas, escolas e universidades nos países de fala inglesa. Outros filantropos

famosos do princípio do século 20 foram John D. Rockefeller and Henry Ford, que

direcionaram seus esforços e atenção para as causas dos problemas sociais.

Mais recentemente, diversas celebridades do mundo do entretenimento, fortunas

pessoais do mundo financeiro, como Warren Buffett, ou da indústria de tecnologia, como Bill

e Melinda Gates, tem liderado ações de filantropia. Novas tecnologias também alteraram a

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forma como doações são feitas, muitas iniciativas baseadas em “crowdfunding” utilizam a

Internet para levantar fundos.

Duas críticas podem ser feitas à filantropia como ferramenta sustentável de resolução

de problemas sociais é que trata-se de iniciativa individual de caráter pessoal, e não

corporativo, e que redistribui o valor já produzido pelo capitalismo.

Por melhor intencionados que os filantropos sejam, e por melhor que sejam os

resultados de seus trabalhos para resolver as mazelas sociais, ainda serão insuficientes frente

ao desafio. Como é inerente a natureza humana a acumulação de bens, esforços para

endereçar as enfermidades sociais somente serão sustentáveis se forem parte deste esforço de

acumulação de bens.

5. Responsabilidade Social Corporativa

“The social responsibility of business is to increase profits”

Friedman, Milton

The New York Times Magazine

(1970, September 13)

Responsabilidade Social Corporativa (CSR, em inglês), é um termo que se

popularizou na década de 60, e segue sendo usado indistintamente por muitos com diferentes

significados.

Para alguns, CSR, às vezes também chamado de consciência corporativa, cidadania

corporativa ou práticas responsáveis de negócio, é uma regulação auto imposta por algumas

empresas, no sentido de monitorar e assegurar aderência dos negócios com as práticas legais,

padrões éticos e normas internacionais.

Para outros, CSR vai além da prática de “compliance”, e inclui o engajamento ativo

em ações que ampliem o bem estar social, além das exigências legais e responsabilidades da

corporação.

A ideia é encorajar ações corporativas que gerem um impacto positivo no ambiente e

“stakeholders”, que inclui os consumidores, os funcionários, investidores, a comunidade e

outros, como o governo. Aqueles que são a favor da Responsabilidade Social Corporativa

afirmam que as corporações que se engajam em ações de CSR, aumentam seus lucros,

enquanto os críticos respondem que a CSR desvia a corporação de seu verdadeiro objetivo,

que é aumentar os lucros, vide Milton Friedman.

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Um estudo, conduzido por Abagail McWilliams e Donald Siegel, intitulado

“Corporate social responsibility and financial performance: correlation or misspecification?”,

e publicado em 06 de abril de 2000 no Strategic Management Journal, comparou estudos

econométricos da relação entre resultados sociais e financeiros, e concluiu que não há impacto

de CSR nos resultados financeiros das corporações. Embora hajam outros estudos que,

contraditoriamente, relatam impactos positivos, negativos e neutros.

Conforme crítica de Peter Fleming e Marc T. Jones, em seu livro “The End of

Corporate Social Responsibility: Crisis and Critique”, a maioria das atividades relacionadas à

Responsabilidade Social Corporativa tem como objetivo ganhar a legitimidade de

consumidores e funcionários para maximizar seus lucros. Neste contexto, qualquer atividade

de CSR é somente uma forma de a empresa implementar sua agenda de exploração e

colonização.

Este livro, que na verdade é mais uma monografia do que um livro-texto, vai além

afirmando que os danos que as empresas causam são sistemáticos enquanto as iniciativas de

CSR são, em geral, as com maior visibilidade pública e de pequena escala, que são

irrelevantes para endereçar os danos sistemáticos causados. CSR busca reconciliar os

objetivos corporativos com o bem social o que, segundo Fleming e Jones, é

fundamentalmente impossível.

Por outro lado, governos e organizações não governamentais (NGO em inglês), tem

uma perspectiva mais ideológica e absolutista, na qual os benefícios sociais devem ser

perseguidos a qualquer preço.

A figura abaixo traz três abordagens diferentes de CSR em escala crescente de valor, e

também seus objetivos, impactos e benefícios.

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"CSR framework - value1" by Touro - Own work. Licensed under Public Domain via Wikimedia Commons -

https://commons.wikimedia.org/wiki/File:CSR_framework_-_value1.jpg#/media/File:CSR_framework_-_value1.jpg

Uma primeira abordagem é a da filantropia corporativa, ou seja, doações monetárias e

assistenciais para NGOs e comunidades. Estas doações podem abranger diversas áreas tais

como educação, saúde, artes, meio-ambiente, entre outras, incluindo o patrocínio de eventos

comerciais. Algumas críticas válidas para esta abordagem é o caráter distributivo do valor

gerado, mínimo impacto na corporação, benefícios não sustentáveis e de curto prazo.

Uma segunda abordagem é incorporar a estratégia de CSR nas

operações da corporação. Um exemplo desta abordagem é o movimento social

Fair Trade (http://www.fairtrade.net/) que procura assegurar melhores

negociações para trabalhadores e fazendeiros na compra de produtos agrícolas,

como café e chá. Esta é uma abordagem tipicamente de “compliance”, que diminui os riscos

e impactos da operação corporativa enquanto promove relações mais sustentáveis com

organizações externas.

Finalmente, temos a abordagem de responsabilidade social corporativa como base de

criação de valor de um modelo de negócios sustentável, com impacto estratégico e

operacional fundamental na corporação, com promoção de inovação e competitividade,

sustentabilidade do modelo de negócios e desenvolvimento do capital humano, que é crítico

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para promover o crescimento nos países em desenvolvimento. A criação de valor

compartilhado (CSR em inglês) será o assunto da próxima sessão deste trabalho.

6. Criando Valor Compartilhado (CSV em inglês)

O conceito de Criando Valor Compartilhado, ou “Creating Shared Value” (CSV) em

inglês, foi introduzido pela primeira vez em uma publicação, de Dezembro de 2006, da

Harvard Business Review intitulada “Strategy and Society: The Link Between Competitive

Advantage and Corporate Social Responsibility”, de autoria de Michael E. Porter e Mark R.

Kramer.

A ideia central deste conceito é que a competitividade de uma empresa e a saúde da

comunidade que a rodeia são mutualmente dependente, que o conceito de criação de valor,

que emergiu na última década, está ultrapassado, pois otimiza a performance financeira de

curto prazo, ignorando fatores críticos que são fundamentais para seu crescimento e geração

de valor de forma sustentável, entre os quais o bem-estar de seus clientes, manutenção dos

recursos naturais que são insumos críticos para sua atividade, a viabilidade econômica de

fornecedores chave, e a sustentação econômica nas comunidades onde produzem e vendem.

Do ponto de vista de CSV, a Responsabilidade Social Corporativa (CSR) coloca os

problemas sociais na periferia dos negócios, e não no núcleo do modelo de negócios adotado.

Quando colocado no centro do modelo de negócio adotado, a criação de valor econômico

também cria valor para a sociedade, endereçando suas necessidades e desafios.

Há diversos exemplos de empresas brasileiras e estrangeiras que adotaram a criação de

valor para a sociedade como parte de suas atividades, melhorando também sua

competitividade e sustentabilidade.

A Nestlé criou um programa global, chamado de Nescafé Plan, cujo objetivo é

fomentar o desenvolvimento de produtos locais de café, e educar os produtores para aumento

de produtividade com sustentabilidade. Para isso ela criou o Código Comum para a

Comunidade Cafeeira (4C), incentiva os produtores a fazerem parte desta iniciativa e compra

sua produção. O 4C discrimina práticas inaceitáveis (trabalho infantil e escravo, tráfico de

pessoas, utilização de agrotóxicos, corte de floresta primária, etc.), dimensão social (liberdade

de associação de trabalhadores, liberdade de negociação, discriminação, direito à infância e à

educação, condições de trabalho, etc.), dimensão ambiental (conservação da biodiversidade,

conservação do solo, uso responsável da água, descarte de resíduos, conservação de energia,

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etc.), dimensão econômica (informação e acesso ao mercado, qualidade, comércio e

rastreabilidade).

Este tipo de iniciativa, associado aos treinamentos periódicos que a Nestlé fornece

sobre melhores práticas, aumentam a produtividade da propriedade rural, a qualidade da

matéria prima e garantem a origem dos insumos comprados. Em última instancia o benefício é

compartilhado pelo produtor rural, pela Nestlé, pelo governo, pela sociedade que tem seu

meio-ambiente preservado e pelo país.

Há três maneiras de criar valor compartilhado, a primeira é reconceber produtos e

mercados. As iniciativas de microfinanciamento, por exemplo, se encaixam nesta categoria.

São mercados que não existiriam se o modelo de negócios não incorporasse em si mesmo o

endereçamento das necessidades de financiamento de populações mais pobres. Um bom

exemplo nesta categoria é a Vodafone, que desenvolveu um serviço de mobile-banking no

Quênia, chamado de M-PESA, que conseguiu 10 milhões de clientes em três anos de

existência, e manuseia fundos que contabilizam 11% do produto interno bruto do país.

Atualmente o serviço está lançado em dez países.

Uma segunda forma de criar valor compartilhado é redefinir a produtividade na

cadeia de valor. Segundo Porter e Kramer, há diversas maneiras de criação de valor

compartilhado quando reexaminamos a cadeia de valor:

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Uso de energia e logística - uso mais eficiente de energia através de melhores tecnologias,

reciclagem, cogeração, e uso de

fornecedores locais,

Uso de Recursos Naturais - uso mais

eficiente de água, insumos e embalagem

através de melhores tecnologias,

Compras - melhoria de produtividade e

qualidade de fornecedores (vide Nestlé

Nespresso),

Distribuição - redução de embalagens,

utilização de pequenos distribuidores de

comunidades rurais,

Produtividade do Funcionário - programas corporativos para deixar

de fumar

Localidade – fornecedores e produção próximos ao mercado de consumo.

Finalmente podemos criar valor compartilhado pelo desenvolvimento dos

agrupamentos (“cluster”) ao redor do negócio da empresa. Um agrupamento inclui

fornecedores, infraestrutura, negócios relacionados, provedores de serviços, associações de

comércio, organizações de normatização e programas acadêmicos. As deficiências nos

elementos do agrupamento aumentam o custo interno da empresa, por exemplo, estradas ruins

aumentam o custo de logística. As empresas podem criar valor compartilhado ajudando a

desenvolver o agrupamento ao seu redor, por exemplo, desenvolvendo fornecedores mais

capacitados e qualificados, como no caso da Nestlé exemplificado acima.

7. Capitalismo Consciente

O movimento do Capitalismo Consciente emergiu da teoria de Responsabilidade

Social Corporativa (em inglês CSR). Muitos acreditam que a pioneira deste movimento foi

Anita Roddick, que em 1976 fundou a “The Body Shop” com um modelo de negócios

inovador, que levava em conta os impactos ao meio ambiente, testes de cosméticos em

animais e direitos humanos. Porém John Mackey, que em 1978 fundou o supermercado

“Whole Foods Market” e coautor do livro “Conscious Capitalism”, tem sido um de seus

defensores mais vocais.

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O Capitalismo Consciente advoga que modelos de negócios que levam em conta todos

os “stakeholders”, os investidores, a comunidade, os funcionários, os fornecedores e os

clientes, são os que conseguem gerar maior valor sustentável para seus investidores, no médio

e longo prazo.

O Capitalismo Consciente se apoia em quatro pilares:

a) Propósito Maior nos Negócios

Assim como significado e propósito nos separa de outros animais, eles também

separam os negócios, um propósito maior nos motiva, nos torna resilientes e nos norteia na

rota correta, um negócio com um propósito inspira e engaja seus “stakeholders”, um propósito

inspirador desperta a admiração e até o amor de clientes e funcionário, um propósito

inspirador, quando vivenciado no dia a dia do negócio, une os “stakeholders”.

Os economistas frequentemente nos ensinam que o propósito dos negócios é

maximizar o lucro para seus investidores, o racional é que os investidores são os donos do

negócio, e tem o direito legal de contratar e despedir seus gestores, através de seu conselho.

Porém, quem cria e/ou descobre realmente o propósito do negócio é o empreendedor, não os

investidores, economistas, advogados ou o governo.

O empreendedor define a estratégia e negocia os termos de troca com os outros

“stakeholder”, inclusive investidores. Baseado nos termos de troca, estes investidores podem

decidir voluntariamente fazer o investimento ou não, conforme o fundamento ético dos

negócios e do capitalismo.

Dos muitos motivos pelos quais os empreendedores criam negócios, certamente uma

minoria deles o faz para maximizar o lucro. Claro que ganhar dinheiro é uma parte importante

do negócio, mas na maioria das vezes não é o propósito principal pelo qual o negócio foi

criado.

Da mesma forma que os negócios evoluem, seus propósitos também o fazem,

principalmente pela interação de seus “stakeholders”. Os valores centrais do negócio, via de

regra, são simples no princípio e assumem significância mais profunda na medida em que o

negócio se torna mais maduro, e seus “stakeholders” independentes interagem.

Negócios que não tem lucro não podem sobreviver por muito tempo em um mercado

competitivo, o lucro é essencial para a sobrevivência do negócio, porém maximiza-lo não é o

único propósito deste.

John Mackey defende que, embora possa parecer contra intuitivo, a melhor forma de

maximizar o lucro no longo-prazo é não fazê-lo o principal objetivo da empresa. Em uma

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analogia com a busca da felicidade, a melhor forma de encontrá-la não é focar suas energias

na busca de seus interesses diretos, tornando-se narcisista e obcecado em satisfazer de seu

ego, mas através de um senso de propósito, trabalho com significado, grandes amigos, boa

saúde, aprendizado e crescimento, relações afetuosas, e ajudando na realização dos outros.

Quando os modelos de negócios estão centrados apenas na maximização do lucro

imediato, eles negligenciam ou abusam de outros elementos e o sistema interdependente

criará, eventualmente, uma retroalimentação negativa, que irá prejudicar os interesses de

longo prazo dos investidores e acionistas.

A objeção mais frequente aos argumentos acima é que milhares de negócios são

altamente lucrativos e não são geridos de forma a maximizar o valor para todos os

“stakeholders”, mas sim os interesses de seus investidores. Porém, segundo Mackey, estes

negócios competem somente com negócios similares, que também são geridos e estão

organizados de forma a maximizar o lucro.

A questão é como estes negócios focados na maximização do lucro comparam com

negócios que seguem o Capitalismo Consciente. Um estudo de 2007 da Wharton School por

Rajendra Sisodia, David Wolfe e Jagdish Sheth, publicado depois em forma de livro,

comparou os resultados de longo prazo 30 empresas negociadas publicamente, e geridas para

otimizar o valor para todos os “stakeholders”, com o índice S&P 500.

Como o gráfico acima indica, as companhias geridas para criar valor para todos os

seus “stakeholders” tem um retorno do valor de ação extraordinariamente grande, tanto no

curto quanto no longo prazo. John Mackey acredita que este modelo de negócio superior, será

o modelo de negócios dominante no século 21.

b) Orientação ao Stakeholder

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Diferente do que observavam as primeiras teorias econômicas elaboradas na época da

revolução industrial, os negócios são uma rede intrínseca e interconectada de relações.

Negócios conscientes focam neste ecossistema no qual estão inseridos e criam e otimizam

valor para todos os “stakeholders”.

Como ressalta John Mackey, negligenciar ou abusar de um ou mais constituintes desse

ecossistema no qual está inserido o negócio, eventualmente criará um feedback negativo, que

prejudicará os interesses de longo prazo dos acionistas.

Por outro lado, “stakeholders” fortes e engajados levam a um negócio saudável,

sustentável e resiliente. O próprio Mackey conta que, pouco tempo após abrir as portas, o

“Whole Foods Market” enfrentou uma grande enchente na qual perdeu todas as mercadorias.

Sem o auxílio de seus fornecedores, que aceitaram vender sem receber no curto prazo, e de

clientes que literalmente ajudaram a limpar e arrumar a loja, a empresa provavelmente teria

falido.

Orientação ao “stakeholders” é reconhecer que funcionários, clientes, fornecedores,

fundadores, comunidades de suporte, e um ecossistema de sustentação de vida simplesmente

não há negócio.

Os negócios que levam em consideração todos os constituintes criam uma relação de

confiança e colaboração de longo-prazo.

c) Liderança Consciente

Como observou Robert K. Greenleaf, em seu ensaio de 1970 “The Servant As

Leader”, bons líderes tem que se tornar antes bons servidores.

Líderes conscientes reconhecem que seu papel é servir ao propósito do negócio, apoiar

as pessoas e criar valor para todos os “stakeholders”. Eles focam no “nós” e não no “eu”,

lideres conscientes inspiram e provocam transformações nos que estão a sua volta,

despertando melhor de todos.

Líderes conscientes lideram, por exemplo, nos inspiram a explorar novas áreas, e

tornar realidade nosso potencial.

Antes de mais nada, eles entendem o papel intrínseco da cultura na organização e

pessoalmente cultivam uma cultura de cuidado e crença nos outros.

d) Cultura Consciente

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Como diz uma frase atribuída a Peter Drucker, “cultura come estratégia no café da

manhã”. A cultura é a personificação dos valores, princípios e práticas sob a malha social de

um negócio, que permeia suas ações e conecta seus “stakeholder” e estes ao propósito do

negócio, pessoas e processos da organização.

Uma cultura consciente estimula amor e cuidado, e cria confiança entre seus membros,

e destes com seus “stakeholders”, uma cultura consciente é uma força energizante e de união.

Os valores centrais de um negócio são os princípios guia que este utiliza para realizar

seu propósito. Os propósitos do negócio devem estar refletidos nos seus valores centrais, e

estes devem levar em conta todos os constituintes do ecossistema na forma de lucro e

crescimento para os acionistas e investidores, produtos e serviços da melhor qualidade para os

clientes, ambiente de excelência e transparente para os funcionários, relações justas e de

confiança com fornecedores e cuidado com a comunidade e o meio-ambiente para a

sociedade.

8. “Firms of Endearment”

O conceito de “Firms of Endearment”, como descrito no livro de Raj Sisodia, David

Wolfe e Jag Sheth, se aplica a companhias que, pela prática de um capitalismo consciente e

relações de ganho mútuo baseadas em credibilidade com todos os “stakeholders”,

desenvolvem uma ligação emocional com estes “stakeholders”, sejam eles clientes,

fornecedores, parceiros, funcionários, a comunidade na qual operam ou a sociedade.

Essa ligação emocional vai além da lealdade de comportamento, que faz com que

consumidores comprem repetidamente de empresas com as quais não possuem nenhuma

ligação emocional, ela é a fundação para uma lealdade de atitude que é a que mais importa na

sustentação da sobrevivência e sucesso de longo prazo de uma companhia, especialmente em

um mercado em rápida transformação como vemos atualmente.

É essa ligação emocional que permite que as “Firms of Endearment” tenham um

resultado melhor em marketing mesmo com orçamentos menores que a média da indústria, ou

que fazem com que as municipalidades tentem atrai-las a abrir filiais em suas comunidades

com incentivos de isenção de impostos.

Até o final da década de 80, e início da década de 90, não havia um ambiente propício

para que os consumidores desenvolvessem laços emocionais com as empresas. Os autores

dividem as eras culturais dos Estados Unidos em três: a era do empoderamento (“age of

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empowerment”), a era do conhecimento (“age of knowledge”) e, finalmente, a era da

transcendência (“age of transcendence”).

A era do empoderamento começa na assinatura da declaração de independência, e

publicação do livro de Adam Smith, “An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of

Nations”, em 1776. Respaldados pela liberdade da nação e dos mercados, e por uma

legislação que protegia o empreendedorismo e a propriedade intelectual, os norte-americanos

utilizaram o capitalismo para melhorar seu padrão de vida. Nesta mesma época, a Europa

aristocrática vivia sua era do iluminismo (“age of enlightenment”). A era do empoderamento

termina por volta de 1880 com o início da era do conhecimento.

A era do conhecimento é marcada por grandes invenções tais como o telefone

(Graham Bell), o fonógrafo, a lâmpada incandescente e o sistema central elétrico (Thomas

Edison). Esta era viu os Estados Unidos passarem de uma sociedade agraria para uma

sociedade industrial, criando a sociedade de consumo moderna com o aumento da expectativa

de vida e grandes feitos científicos.

Embora não haja uma data específica para o início da era da transcendência, os autores

adotaram o ano de 1989 para tanto, pois foi o ano em que, pela primeira vez na história, a

maior parte da população dos Estados Unidos passou a ter mais de 40 anos. Esta população

mais madura aumenta a propensão a uma sociedade mais gentil e afetuosa, conforme escreveu

Peggy Noonan, ou uma sociedade que se move de perspectivas mais racionais, associadas ao

lado esquerdas do cérebro, para perspectivas mais emocionais e intuitivas, associadas ao lado

direito do cérebro, conforme vê o autor de “A Whole New Mind”, Daniel Pink.

É comum que pessoas que já passaram pelos anos de construção de carreira e sustento

da família em crescimento se pergunte o que farão com o resto de suas vidas, buscando um

propósito maior do que simplesmente acumular riquezas. Esta busca de propósito está

mudando as expectativas que as pessoas têm das empresas das quais consomem bens e

serviços, mudando a essência do capitalismo.

1989 foi também o ano que Tim Berners-Lee, engenheiro de software britânico,

inventou a interface gráfica para a Internet, o a World Wide Web como a conhecemos. A web

alterou de forma dramática a forma como interagimos, democratizando a informação e

forçando as companhias a operarem com muito mais transparência.

As “Firms of Endearment” tem em comum um conjunto de valores, políticas e

atributos operacionais que as distinguem. Os autores citam, por exemplo, as seguintes

características:

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propósito de existência que vai além da acumulação de dinheiro

alinham, através de modelos de negócios diferenciados, os interesses dos

vários “stakeholders”

compensação relativamente modesta para CEOs e altos executivos

política de portas abertas

compensação e benefícios para funcionários acima da média de mercado

mais treinamento para funcionários

menor rotatividade de colaboradores

funcionários com poder para tomar medidas não convencionais e satisfazer os

clientes

esforço consciente para contratar pessoas apaixonadas pela empresa e seus

produtos

espaço de trabalho humanizado para clientes e funcionários

desenvolvem uma conexão emocional genuína com seus clientes, o que os

autores chamam de “share of customer´s hearts”

orçamento de marketing substancialmente menor do que a média de seus

concorrentes

consideram a cultura corporativa como seu maior patrimônio e fonte primária

de vantagem competitiva

cultura resistente a pressões momentâneas porém capazes de adaptação rápida

quando necessário

O que podemos observar, pelo quadro abaixo, é que as empresas que conseguem

estabelecer este laço emocional com todos os “stakeholders” tem um desempenho financeiro

significativamente superior a seus concorrentes.

A eficiência operacional, que por muito tempo foi suficiente para garantir lucros

significativos e a perpetuidade das empresas, passou a ser necessária, porém não suficiente.

Em um período de 15 anos, de 1998 a 2013, as companhias classificadas como “Firms

of Endearment”, listadas no apêndice A, tiveram uma performance 14 vezes melhor do que a

média das 500 maiores companhias do índice “Standard & Poors”, e seis vezes maiores do

que as companhias classificadas como “Good to Great”.

Em períodos menores do que 15 anos, a diferença, embora menos pronunciada, segue

sendo significativa como podemos notar.

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O próximo passo é examinar o desempenho de empresas brasileiras que praticam o

capitalismo consciente em um esforço para estabelecer um laço emocional com seus

“stakeholders”.

Como não temos ainda nenhum estudo classificando as empresas Brasileiras como

“Firmas Mais Queridas” (“Firms of Endearment”), e precisaríamos de um estudo detalhado de

cada empresa candidata para assegurar esta classificação, tomamos como proxy as empresas

listadas como sustentáveis no índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).

Está claro em nosso estudo que somente uma pequena parte das empresas com

políticas e práticas sustentáveis podem realmente ser classificadas como praticantes do

capitalismo consciente e “Firms of Endearment”, porém podemos afirmar que todas as “Firms

of Endearment” têm estas políticas de sustentabilidade como qualidade necessária, porém não

suficiente.

Para esta comparação tomamos um período de cinco anos, de Janeiro de 2011 à

Janeiro de 2016, e as ações listadas no Índice de Sustentabilidade de Empresarial (vide

apêndice B).

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Examinando os índices ISE e iBovespa, e a razão entre ambos, no período de cinco

anos, chegamos a conclusão que as empresas que buscam praticas sustentáveis tiveram uma

performance 60% melhor do que as ações que compõe o iBovespa no período, se tomarmos

um período mais curto esta diferença se torna menos significativa, sendo provavelmente o

contrário também válido.

9. Conclusão final

Como podemos verificar, assim como o mercado Americano, o Brasileiro também

precifica adequadamente a perpetuidade e sucesso das empresas que praticam um capitalismo

consciente e tentam estabelecer uma ligação emocional com todos os “stakeholders”.

O melhor desempenho destas empresas se deve a expectativa de perenidade do

negócio e melhor desempenho no longo prazo. A eficiência operacional destas empresas

incorpora as melhores práticas de gestão aos benefícios procedentes do seu modelo de

interação com funcionários, a comunidade, fornecedores, governo e investidores. Esses

benefícios, como vimos, incluem um menor orçamento de marketing, menor rotatividade de

funcionários, benefícios fiscais, melhor treinamento entre outros.

Talvez seja inclusive o momento de reexaminar as cinco forças de Porter e acrescentar

outras forças, tais como funcionários, sociedade e acionistas às forças existentes (rivalidade

no mercado, fornecedores, clientes, novos entrantes e produtos substitutos) que permitem uma

empresa ter ganhos acima da média de mercado.

A questão que fica é; se há um benefício, historicamente comprovado pela

performance de mercado, em seguir práticas do capitalismo consciente e um modelo onde

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todas as partes podem colher o benefício de sua atividade, por que esta prática não é adotada

por todas as empresas?

Pelas expectativas racionais seria natural assumir que a prática de um capitalismo

consciente seria rapidamente incorporada a todas as empresas do mercado, o que, como

sabemos, não ocorreu, pelo menos não ocorreu ainda.

Em uma abordagem otimista, podemos assumir que, dado o envelhecimento da

população do mercado consumidor e uma nova geração mais consciente das externalidades

negativas do capitalismo convencional, a pratica do capitalismo consciente se estenderá a

todas as empresas do mercado ou, de outra forma, se estenderá a todas as empresas que

sobreviverão.

Em uma abordagem mais pessimista, a pressão por resultados de curto prazo, que

chamamos acima de expectativas trimestrais, deve permitir que seja mais rentável para

algumas empresas perseguir resultados de curto prazo, e não incorporar os interesses de todos

os “stakeholders” na gestão do negócio.

De minha parte prefiro a abordagem otimista, que o capitalismo continuará sendo a

melhor ferramenta para melhoria da vida das pessoas e mola propulsora de enriquecimento de

inovadores e empreendedores, porém passará por uma evolução, uma nova fase onde este

enriquecimento não será à custa da sociedade como um todo, onde fazer lucro e a diferença

seja não somente compatíveis como dependentes entre si.

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10. Apêndice A – “Firms of Endearment”

Abaixo a lista de companhias selecionadas como “Firms of Endearment” por Raj

Sisodia, David Wolfe e Jag Sheth:

Companhias públicas Norte-Americanas

3M Adobe Systems Amazon.com

Autodesk Boston Beer Company CarMax

Chipotle Chubb Cognizant

Colgate-Palmolive Costco FedEx

Google Harley-Davidson IBM

J.M. Smucker Marriott International MasterCard Worldwide

Nordstrom Pamera Qualcomm

Walt Disney Whole Foods Market

Companhias privadas Norte-Americanas

Barry-Wehmiller Bom Appetit Management Co. Clif Bar

Driscoll´s GSD&M Idea City Honest Tea

IDEO Interstate Batteries Jordan´s Furniture

L.L. Bean Method Millennium Oncology

New Balance Patagonia prAna

REI SAS Institute SC Johnson

Stonyfield Yogurt TDIndustries The Container Store

The Motley Fool Timberland TOMS

Trader Joe´s Union Square Hospitality Group USAA

Wegmans WL Gore

Companhias não Norte-Americanas

BMW (Alemanha) Cipla (India) FabIndia (India)

FEMSA (México) Gemalto (França) Honda (Japão)

IKEA (Suécia) Inditex (Espanha) Mahindra & Mahindra (India)

Marico (India) Novo Nordisk (Dinamarca) POSCO (Correia do Sul)

TCS (India) Toyota (Japão) Unilever (Reino Unido)

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11. Apêndice B – Índice de Sustentabilidade de Empresarial

Abaixo a lista das trinta e quatro companhias que compõe atualmente o Índice de

Sustentabilidade Empresarial:

Banco do Brasil Bradesco BRF

Braskem B2W Digital CCR SA

CESP Cielo CEMIG

CPFL Energia COPEL Duratex

Ecorodovias Eletrobrás Eletropaulo

Embraer Energias BR Even

Fibria Fleury Itaú Unibanco

Klabin S/A Lojas Americanas Light S/A

Lojas Renner Natura Oi

Santander Sul America Tractebel

AES Tiete TIM Participações Telefonica Brasil

WEG

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12. Bibliografia

"Creating Shared Value", by Michael E. Porter and Mark R. Kramer, Harvard Business

Review, January-February 2011 issue

“The Myth of Shareholders Capitalism”, by Loizos Heracleous and Luh Luh Lan, Harvard

Business Review, April 2010 issue

“The Age of Customer Capitalism”, by Roger L. Martin, Harvard Business Review,

January-February 2010 issue

“Time to Rethink Capitalism?”, Michael Yaziji, Harvard Business Review, November

2008

Wikipedia (https://pt.wikipedia.org), Capitalismo, Feudalismo e Cruzadas, Filantropia,

Corporate Social Responsibility

“O Mundo É Plano: uma Breve História do Século XXI”, Thomas Friedman, Abril 2005

“The Modern Corporation and Private Property”, Adolf Berle e Gardiner Means, 1932

“The End of Corporate Social Responsibility: Crisis and Critique”, Peter Fleming e Marc

T. Jones, December 2012

“Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social

Responsibility”, Michael E. Porter e Mark R. Kramer, Harvard Business Review,

Dezembro 2006

Conscious Capitalism with John Mackey Co-founder and Co-CEO of Whole Foods

Market, https://www.youtube.com/watch?v=ZLcIziUvw5Q

Conscious Capitalism – Creating a New Paradigm for Business, by John Mackey

“Companies that Practice “Conscious Capitalism” Perform 10x Better”, by Tony

Schwartz, Harvard Business Review, April 2013 issue

“Firms of Endearment – How World-Class Companies Profit from Passion and Purpose”,

Raj Sisodia, David Malfe e Jag Sheth, 2a. edição

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13. Trabalhos Citados

“Not All Profits Are Equal”, William F. Achtmeyer Center for Global Leadership, Chris

Trimble

“The Single Bottom Line”, Daniel Altman and Jonathan Berman, Stern School of

Business, New York University

“The end of capitalism has begun”, Paul Mason, The Guardian

(http://www.theguardian.com/books/2015/jul/17/postcapitalism-end-of-capitalism-begun?

CMP=share_btn_fb)

“How Good We Can Be by Will Hutton review – not socialism, just better capitalism”,

Peter Wilby, The Guardian (http://www.theguardian.com/books/2015/feb/19/how-good-

we-can-be-review-will-hutton-stakeholder-capitalism)

“The social responsibility of business is to increase profits”, Friedman, Milton - The New

York Times Magazine (1970, September 13)

“Corporate social responsibility and financial performance: correlation or

misspecification?”, Abagail McWilliams e Donald Siegel, Strategic Management Journal,

06 de Abril de 2000

“Creating Shared Value: The One-Trick Pony Approach – a comment on Michael Porter

and Mark Kramer”, Beschorner, Thomas (2013), Business Ethics Journal Review 17, no.

1, 106-112, p. 109 (http://businessethicsjournalreview.com/2013/09/08/beschorner-on-

porter-kramer-on-creating-shared-value)

Código Comum para a Comunidade Cafeeira (4C),

http://www.criandovalorcompartilhado.com.br/docs/default-source/default-document-

library/4c_code-of-conduct_illustratedguide_pt.pdf?sfvrsn=2

“An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations”, Adam Smith

“A Whole New Mind”, Daniel Pink