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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM CURSO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM JANEIDE FREITAS DE MELLO CULTURA DE SEGURANÇA DO PACIENTE EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA: PERSPECTIVA DA ENFERMAGEM FLORIANÓPOLIS 2011

MELLO_Cultura de Segurança do Paciente em UTI

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CINCIAS DA SADE

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENFERMAGEM CURSO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM

    JANEIDE FREITAS DE MELLO

    CULTURA DE SEGURANA DO PACIENTE EM UNIDADE DE

    TERAPIA INTENSIVA: PERSPECTIVA DA ENFERMAGEM

    FLORIANPOLIS 2011

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    JANEIDE FREITAS DE MELLO

    CULTURA DE SEGURANA DO PACIENTE EM UNIDADE DE

    TERAPIA INTENSIVA: PERSPECTIVA DA ENFERMAGEM

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito para obteno do ttulo de Mestre em Enfermagem - rea de Concentrao: Filosofia, Sade e Sociedade Orientadora: Dra. Sayonara de Ftima Faria Barbosa Linha de pesquisa: Arte, Criatividade e Tecnologia em Sade e Enfermagem

    FLORIANPOLIS 2011

  • Catalogao na fonte pela Biblioteca Universitria

    da

    Universidade Federal de Santa Catarina

    .

    M527c Mello, Janeide Freitas de

    Cultura de segurana do paciente em unidade de terapia

    intensiva [dissertao] : perspectiva da enfermagem /

    Janeide Freitas de Mello ; orientadora, Sayonara de Ftima

    Faria Barbosa. - Florianpolis, SC, 2011.

    219 p.

    Dissertao (mestrado) - Universidade Federal de Santa

    Catarina, Centro de Cincias da Sade. Programa de Ps-

    Graduao em Enfermagem.

    Inclui referncias

    1. Enfermagem. 2. Cultura. 3. Unidade de tratamento

    intensivo. I. Barbosa, Sayonara de Ftima Faria. II.

    Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Ps-

    Graduao em Enfermagem. III. Ttulo.

    CDU 616-083

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    Dedicatria

    Dedico esta dissertao a meu filho, Tiago, meu maior

    tesouro. Que esta trajetria de dedicao e conquistas lhe

    sirva de exemplo. Que tenhas sempre sucesso na estrada que

    ainda ters de percorrer.

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    Agradecimentos

    Talvez as palavras no tenham fora e sensibilidade suficientes para expressar meus agradecimentos e alcanar a todos que participaram e contriburam nessa trajetria.

    O perodo de desenvolvimento desta dissertao foi marcado por mudanas, novas perspectivas, oportunidades e experincias, sobretudo profissionalmente. Ocorreram momentos de dvidas, insegurana e angstia, mas tambm de plena satisfao e esperana. Decises tiveram que ser tomadas e escolhas foram feitas. Houve partidas e chegadas, muito trabalho e dedicao.

    Agora chega o momento de agradecer as pessoas que de alguma forma contriburam para a concretizao desse sonho.

    Agradeo a Deus, luz divina a me guiar em todos os momentos, dando-me fora, sade e determinao para atingir meus objetivos.

    A meus pais, Nildo e Vernica, pelo exemplo de dignidade e responsabilidade. A minha Me, por sua presena constante e incondicional, sempre me auxiliando em casa e cuidando do meu filho. Pelo seu carinho e dedicao, muitssimo obrigada!

    A Saulo, meu esposo, pelo grande incentivo, apoio e carinho nessa trajetria. Sua pacincia, compreenso e auxlio, especialmente junto ao nosso filho foram elementares. O mrito dessa conquista tambm seu.

    A Tiago, meu filho, que suportou minhas ausncias em muitos momentos. Este um dos exemplos que posso lhe dar: o xito depende de esforo e dedicao. Sua existncia me impulsiona e d sentido a vida.

    Dra. Sayonara de Ftima Faria Barbosa, minha orientadora, muito obrigada por permitir que eu compartilhasse de sua competncia e sabedoria. Seu incentivo e ensinamentos permitiram que chegssemos at aqui. Sua pacincia, disponibilidade, dedicao e carinho me deram fora e segurana. Meu respeito, gratido e admirao.

    minha irm Janice, cunhado Nei e sobrinho Djefferson. Sua presena e auxlio foram importantes em muitos momentos da minha vida.

    Snia, companheira desde o incio desta caminhada. Pela

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    acolhida na UTI do Hospital Regional de So Jos, pela confiana, apoio e carinho.

    Sinara, companheira de trabalho na UTI do HRSJ e de estudos principalmente junto ao Giate. Obrigada pela parceria, amizade e grande impulso aos nossos trabalhos.

    Aos colegas e amigos da Clnica Mdica 3 do Hospital Universitrio, com os quais convivi grande parte da minha vida profissional. Agradeo as experincias, aprendizado, carinho e amizade. A Adriana, Alba, Alda e Carmem, um agradecimento especial pelos longos anos de convivncia, respeito e amizade. Saudades de todos!

    Aos colegas e amigos da UTI do Hospital Regional de So Jos, com os quais convivi nos ltimos anos adquirindo experincias, motivao em relao ao cuidado intensivo e um grande carinho por todos. Agradeo por esta convivncia, especialmente a minha equipe de trabalho da qual levo timas recordaes. Saudades de todos!

    Aos novos colegas e amigos na UTI do HU, agradeo pela acolhida, confiana e carinho. Espero poder contribuir muito.

    Monique e Rozeli, pelo companheirismo e por partilharem comigo conhecimentos e experincias em relao segurana do paciente.

    s professoras, colegas e amigos do Giate, pelo grande aprendizado em pesquisa, troca de experincias e entusiasmo adquirido a cada reunio. O Giate foi o caminho que me trouxe at aqui.

    Ao Comit de Segurana do Paciente do HU/Cosep, pelo esforo conjunto para sua criao e oficializao, bem como pelas discusses, projetos e perspectivas, alinhados com a temtica da minha dissertao.

    Aos professores da Ps-Graduao e colegas do mestrado pelos conhecimentos e agradvel convivncia.

    Roseli Silva, pelo importante apoio para a anlise estatstica dos dados e Cludia Crespi Garcia por suas contribuies na formatao deste trabalho.

    Aos membros da Banca de Qualificao de Mestrado (Dra. Grace Teresinha Marcon Dal Sasso; Dra. Lcia Nazareth Amante; Dra. Cleusa Rios Martins; Dda. Ana Paula Xavier Ravelli) e de Sustentao de Mestrado (Dra. Grace Teresinha Marcon Dal Sasso; Dra. Maria de Lourdes de Souza, Dra. Patrcia Kuerten Rocha; Dra. Francine Lima

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    Gelbcke; Dda. Nayala Gomes Gazola) pela disponibilidade que demonstraram ao meu convite e pelas preciosas contribuies para este trabalho.

    Aos meus queridos amigos, pelas palavras de conforto quando precisei, por terem ouvido minhas angstias, medos, dvidas, vitrias... Pela confiana, apoio e carinho mesmo a distncia. Tambm pelos momentos de alegria e descontrao.

    Em especial...

    Aos participantes desta pesquisa, pelo interesse, disponibilidade, ateno e receptividade. Suas contribuies foram valiosas e sem elas seria impossvel a realizao deste estudo. Deixo meu respeito e eterna gratido.

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    Epgrafe O valor das coisas no est no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecveis, coisas inexplicveis e pessoas incomparveis. Fernando Pessoa

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    MELLO, Janeide Freitas de. Cultura de segurana do paciente em unidade de terapia intensiva: perspectiva da enfermagem. 2011. 219f. Dissertao (Mestrado em Enfermagem) - Programa de Ps-Graduao em Enfermagem, Universidade Federa l de Santa Catarina, Florianpolis, 2011. Orientadora: Dra. Sayonara de Ftima Faria Barbosa Linha de pesquisa: Arte, Criatividade e Tecnologia em Sade e Enfermagem

    RESUMO

    Promover a cultura de segurana tem se tornado um dos pilares do movimento em prol da segurana do paciente. Nesse sentido, estratgias de avaliao da cultura de segurana tm sido estimuladas visando reconhecer as condies organizacionais que podem levar a eventos adversos e dano ao paciente nas instituies de sade. Foi definido como objetivo deste estudo analisar as dimenses da cultura de segurana do paciente sob a tica dos profissionais de enfermagem de duas unidades de terapia intensiva (UTIs) adulto na Grande Florianpolis/SC, Brasil. Trata-se de um survey quantitativo, transversal e comparativo cuja coleta de dados foi realizada entre abril e junho de 2011 com 103 profissionais. Foi aplicado o instrumento denominado Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC) e a seguinte questo: cite trs recomendaes que voc sugere para melhorar a segurana do paciente em sua unidade. Para anlise dos dados do survey foi utilizada estatstica descritiva com clculo dos percentuais de resposta positiva para cada dimenso da cultura de segurana avaliada e estatstica inferencial utilizando-se o teste Z para avaliao das diferenas entre as UTIs e teste r de Pearson para avaliar correlao entre as variveis. As respostas questo qualitativa foram categorizadas conforme as dimenses do HSOPSC e analisadas por meio de estatstica descritiva. Aps excluso de 11 questionrios incompletos dos 97 respondidos, foram analisados 86, obtendo-se uma taxa de respostas de 83,49% (19 enfermeiros, 60 tcnicos e 07 auxiliares); a questo qualitativa foi respondida por 91 profissionais (88,35%). As dimenses com maiores percentuais de avaliao positiva foram trabalho em equipe dentro das unidades (62,8%), expectativas e aes de promoo da segurana do paciente do supervisor/gerente (49,1%) e aprendizado organizacional, melhoria contnua (46,1%). As

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    dimenses com menores percentuais de respostas positivas foram: apoio da gesto hospitalar para a segurana do paciente (13,6%), respostas no punitivas aos erros (17,4%) e percepo geral de segurana do paciente (25,9%). Houve diferenas significativas nos percentuais de resposta positiva entre as duas UTIs para as dimenses comunicao a respeito de erros (p=0,271) e pessoal (p= 0,456). Resultaram correlaes moderadas a fortes (r=0,651 a r=0,838) entre os itens que avaliam a dimenso frequncia de eventos relatados. Dentre 267 recomendaes para melhorar a segurana do paciente nas duas UTIs, a maioria estava voltada para as dimenses aprendizado organizacional e melhoria contnua (19%); pessoal (16,5%), percepo geral de segurana do paciente (16%); apoio da gesto hospitalar para a segurana do paciente (14,6%). Foi identificado que capacitao e treinamento, melhoria dos processos de trabalho, disponibilizao de materiais e equipamentos bem como quantitativo adequado de profissionais, so necessidades prementes evidenciadas nas duas UTIs, dentre outras recomendadas com menor frequncia. Os resultados deste estudo revelam uma cultura de segurana frgil, necessitando investimentos para melhorar a segurana do paciente nas UTIs avaliadas, tendo em vista os baixos percentuais de respostas positivas. Requer primordialmente, na percepo dos profissionais, maior envolvimento da gesto para a segurana do paciente e mudana na abordagem dos erros. Palavras-chave: Segurana, Cultura, Unidades de Terapia Intensiva, Enfermagem

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    MELLO, Janeide Freitas de. Safety patient culture at the intensive care unit: nursing perspective. 2011. 219p. Dissertation (Masters Degree on Nursing) Post-Graduation Program on Nursing, Federal University of Santa Catarina, Florianpolis, 2011. Academic Tutor: Dr. Sayonara de Ftima Faria Barbosa. Research area: Art, Creativity and Technology on Health and Nursing.

    ABSTRACT

    Promoting safety culture has become one of the movement pillars for patient safety. Accordingly, strategies for safety culture assessment have been stimulated in order to recognize the organizational conditions that can lead to adverse events and patient harm, at the healthcare institutions. It was defined, as this study objective, to analyze the dimensions of patient safety culture from nursing staff perspective at two intensive care units (ICUs) for adults in Florianpolis/SC, Brazil. This is a comparative, transversal and quantitative survey whose data collection was conducted between April and June, 2011 and with 103 professionals. We used the tool called Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC), and the following topic: "mention three recommendations you would suggest to improve the patient safety at your unit". In order to analyze survey data, it was used descriptive statistics with percentage calculation of positive responses to each dimension of the evaluated safety culture, inferential statistics by applying the Z test to assess differences between ICUs and Pearsons "r" test to evaluate the correlation among variables. Answers for the qualitative question were categorized according to the qualitative dimensions from HSOPSC, and they were analyzed through descriptive statistics. After excluding 11 incomplete questionnaires out of 97, 86 were analyzed. It was obtained a response rate of 83.49% (19 nurses, 60 technicians and 7 assistants), and the qualitative question was answered by 91 professionals (88.35%). Dimensions with higher rates of positive assessment were teamwork within the units (62.8%), expectations and actions promoting supervisor/manager patient safety (49.1%), organizational learning and continuous improvement (46, 1%). Dimensions with lower percentage of positive responses were hospital management support for patient safety (13.6%), non-punitive responses to errors (17.4%) and general perception of the patient safety (25.9%).

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    There were significant differences in the percentage of positive response between both ICUs to the dimensions of communication about errors (p= 0.271) and personnel (p= 0.456). It came up strong and moderate correlations (r= 0.651 to r= 0.838) among items assessing the dimension reported events frequency. There were 267 recommendations to improve patient safety at both ICUs, and most of them were focused on the following dimensions: organizational learning and continuous improvement (19%), personnel (16.5%), general perception of patient safety (16%) and hospital management support to patient safety (14.6%). It was identified that capacity building and training, work processes improvement, availability of materials and equipments and appropriate quantitative of professionals are pressing needs highlighted at both ICUs, among others recommended less frequently. This study results show weak safety culture, requiring investments to improve patient safety at the evaluated ICUs, in view of the low percentage of positive responses. It requires primarily, according to the professionals perception, greater management involvement for patient safety and errors approaching change. Key words: Patient Safety, Culture, Intensive Care Units, Nursing.

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    MELLO, Janeide Freitas de. Cultura de la seguridad del paciente en una unidad de terapia intensiva: perspectiva de la enfermera. 2011. 219p. Disertacin (Maestra en Enfermera) - Programa de Ps-Graduacin en Enfermera, Universidad Federal de Santa Catarina, Florianpolis, 2011. Orientadora: Dra. Sayonara de Ftima Faria Barbosa Lnea de investigacin: Arte, Creatividad y Tecnologa en Salud y Enfermera.

    RESUMEN

    Promover la cultura de la seguridad se ha convertido en uno de los pilares del movimiento en favor de la seguridad del paciente. En ese sentido, las estrategias de evaluacin de la cultura de seguridad han sido estimuladas con el objetivo de reconocer a las condiciones organizacionales que pueden llevar a eventos adversos y dao al paciente, en las instituciones de salud. Fue definido como objetivo de este estudio, analizar las dimensiones de la cultura de seguridad del paciente bajo la ptica de los profesionales de la enfermera en dos unidades de terapia intensiva (UTIs) para adultos, en la Gran Florianpolis/SC, Brasil. Se trata de una investigacin cuantitativa, transversal y comparativa cuya colecta de datos fue realizada entre Abril y Junio del 2011, junto a 103 profesionales. Fue aplicado el instrumento denominado Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC) y la siguiente cuestin: mencione tres recomendaciones, de acuerdo a su opinin, para mejorar la seguridad del paciente en su unidad. Para el anlisis de los datos de la investigacin fue utilizada la estadstica descriptiva con el clculo de los porcentajes de respuestas positivas para cada dimensin de la cultura de seguridad evaluada, la estadstica inferencial utilizndose el test Z para la evaluacin de los diferenciales entre las UTIs, y el test r de Pearson para evaluar la correlacin entre las variables. Las respuestas a la pregunta cualitativa fueron categorizadas conforme a las dimensiones del HSOPSC y analizadas por medio de la estadstica descriptiva. Despus de excluir 11 cuestionarios incompletos, de los 97 respondidos, se analizaron los 86 restantes. Se obtuvo una taza de respuestas del 83,49% (19 enfermeros, 60 tcnicos y 7 auxiliares); la pregunta cualitativa fue respondida por 91 profesionales (88,35%). Las dimensiones con mayores porcentajes de evaluacin positiva fueron: trabajo en equipo dentro de las unidades (62,8%),

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    expectativas y acciones de promocin de la seguridad del paciente del supervisor/gerente (49,1%), aprendizado organizacional y mejora continua (46,1%). Las dimensiones con menores porcentajes de respuestas positivas fueron: apoyo de la gestin hospitalaria para la seguridad del paciente (13,6%), respuestas no punitivas para los errores (17,4%) y percepcin general de la seguridad del paciente (25,9%). Hubo diferencias significativas en los porcentajes de respuestas positivas, entre las dos UTIs, para las dimensiones de comunicacin a respecto de errores (p=0,271) y el cuadro de personal (p= 0,456). Resultaron en correlaciones moderadas a fuertes (r=0,651 para r=0,838) entre los puntos que evalan la dimensin frecuencia de eventos relatados. Entre las 267 recomendaciones para mejorar la seguridad del paciente, en las dos UTIs, la mayora estaba direccionada para las dimensiones del aprendizaje organizacional y mejora continua (19%); el personal (16,5%), percepcin general de la seguridad del paciente (16%) y apoyo de la gestin hospitalaria para la seguridad del paciente (14,6%). Fue identificado que capacitacin y entrenamiento, mejora de los procesos de trabajo, disponibilizacin de materiales y equipamientos, y tambin, la cantidad adecuada de profesionales son necesidades urgentes evidenciadas en las dos UTIs, entre otras recomendadas con menos frecuencia. Los resultados de este estudio rebelaron una cultura de seguridad frgil, necesitando de inversiones para mejorar la seguridad del paciente en las UTIs evaluadas, llevando en consideracin los bajos porcentajes de respuestas positivas. Se requiere primordialmente, en la percepcin de los profesionales, un mayor envolvimiento de la gestin para la seguridad del paciente y un cambio en el abordaje de los errores. Desciptores: Seguridad del Paciente, Cultura, Unidades de Terapia Intensiva, Enfermera.

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    LISTA DE SIGLAS

    ACSNI Advisory Committee on the Safety of Nuclear

    Installations ANVISA Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria AHRQ Agency for Healthcare Research and Quality AMIB Associao de Medicina Intensiva Brasileira BIREME Biblioteca Regional de Medicina CINAHL Cumulative Index to Nursing and Allied Health

    Literature COSEP Comit de Segurana do Paciente COREN/SP Conselho Federal de Enfermagem de So Paulo EUA Estados Unidos da Amrica FIOCRUZ Fundao Oswaldo Cruz GIATE Grupo de Pesquisa Clnica e Tecnologias,

    Informaes e Informtica em sade e enfermagem GUTIS Guia da UTI Segura ICICT IOM INSAG

    Instituto de Comunicao e Informao Cientfica e Tecnolgica em Sade Institute of Medicine International Nuclear Safety Advisory Group

    HSC HSOPSC HU/UFSC ICPS

    Health and Safety Commission Hospital Survey on Patient Safety Culture Hospital Universitrio da Universidade Federal de Santa Catarina International Classification for Patient Safety

    IHI Institute for Healthcare Improvement JCAHO JCI

    Joint Commission on Accreditation of Healthcare Organization Joint Commission International

    MEDLINE Medical Literature Analysis and Retrieval System Online

    MIFS The Medical Insurance Feasibility Study OMS Organizao Mundial de Sade OPAS Organizao Pan-Americana da Sade PEN/UFSC QUIC

    Programa de Ps-Graduao em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina Quality Interagency Coordination Task Force

    RDC Resoluo da Diretoria Colegiada

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    REBRAENSP Rede Brasileira de Enfermagem e Segurana do Paciente

    SAQ SBAR

    Safety Attitude Questionnaire Situation-Background-Assessment-Recommendation

    SEPAESC Polo de Segurana do Paciente de Santa Catarina SUS Sistema nico de Sade TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TJC The Joint Commission

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    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - Componentes da Cultura de Segurana .............................. 58

    Figura 2 Modelo do Queijo Suo ..................................................... 60

    Figura 3 - Caractersticas da Cultura de Segurana ............................ 63

    Figura 4 - Aspectos da Cultura de Segurana ...................................... 69

    Figura 5 - Classificao das variveis do estudo ................................. 91

    Artigo 1

    Figura 1 - Escores percentuais positivos das dimenses da cultura de segurana do paciente de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011 ..................................................................................................... 109

    Figura 2 - Avaliao do grau de segurana do paciente por enfermeiros tcnicos e auxiliares de enfermagem de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011 ............................................................ 110

    Figura 3 - Nmero de eventos comunicados a chefia imediata nos ltimos 12 meses por enfermeiros, tcnicos e auxiliares de enfermagem de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011 ...................... 111

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    LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Resultados e critrios de busca s bases de dados Medline e Cinahl acerca dos instrumentos de avaliao da cultura de segurana do paciente e dimenses avaliadas, 2010. ............................................. 74

    Artigo 2

    Quadro 1 - Recomendaes para melhorar a segurana do paciente no mbito da unidade apresentadas por profissionais de enfermagem de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011. .................... 131

    Quadro 2 - Recomendaes para melhorar a segurana do paciente no mbito da organizao hospitalar apresentadas por profissionais de enfermagem de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011. .................................................................................................... 132

    Quadro 3 - Recomendaes para melhorar a segurana do paciente no mbito de resultados apresentadas por profissionais de enfermagem de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011 ..................... 134

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    LISTA DE TABELAS Artigo 1

    Tabela 1 Caractersticas scio-demogrficas dos profissionais de enfermagem de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011 ..................................................................................................... 107

    Tabela 2 Correlaes entre as dimenses grau de segurana do paciente, nmero de eventos comunicados nos ltimos 12 meses, percepo geral de segurana do paciente e frequncia de eventos relatados de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011. .... 113

    Artigo 2

    Tabela 1 - Caractersticas scio-demogrficas dos profissionais de enfermagem de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011. .................................................................................................... 127

    Tabela 2 Recomendaes dos profissionais de enfermagem para melhorar a segurana do paciente e resultados dos escores percentuais positivos da avaliao da cultura de segurana do paciente conforme as dimenses do HSOPSC de duas UTIs na Grande Florianpolis/SC, Brasil, 2011. ........................................................................................ 129

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    SUMRIO

    LISTA DE SIGLAS ............................................................................. 21

    LISTA DE FIGURAS .......................................................................... 23

    LISTA DE QUADROS ........................................................................ 25

    LISTA DE TABELAS.......................................................................... 27

    1 INTRODUO ................................................................................ 31

    2 OBJETIVOS ..................................................................................... 39 2.1 OBJETIVO GERAL ...................................................................... 39 2.2 OBJETIVOS ESPECFICOS .......................................................... 39

    3 REVISO DE LITERATURA ....................................................... 41 3.1 CONCEITOS EM SEGURANA DO PACIENTE ........................ 41 3.2 HISTRIA DA SEGURANA DO PACIENTE ........................... 42 3.3 CULTURA DE SEGURANA DO PACIENTE............................. 53 3.4 AVALIAO DA CULTURA DE SEGURANA DO PACIENTE ............................................................................................ 70 3.5 CUIDADO INTENSIVO E SEGURANA DO PACIENTE ......... 77

    4 METODOLOGIA ............................................................................ 83 4.1 TIPO DE ESTUDO ......................................................................... 83 4.2 POPULAO E AMOSTRA ......................................................... 83 4.3 CRITRIOS DE INCLUSO E EXCLUSO ............................... 83 4.4 LOCAL DE REALIZAO DO ESTUDO .................................. 84 4.5 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS ................................ 85 4.6 DEFINIO DAS VARIVEIS .................................................... 88 4.7 COLETA DE DADOS ..................................................................... 91 4.8 ORGANIZAO DOS DADOS ................................................... 93 4.9 ANLISE DOS DADOS ............................................................... 94 4.10 ASPECTOS TICOS ................................................................... 97

    5 RESULTADOS E DISCUSSES ................................................... 99 5.1 ARTIGO 1 - CULTURA DE SEGURANA DO PACIENTE EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA AVALIAO DA EQUIPE DE ENFERMAGEM ................................................................................... 99 5.2 ARTIGO 2 - CULTURA DE SEGURANA DO PACIENTE EM TERAPIA INTENSIVA: CONTRIBUIES DA ENFERMAGEM . 121

    6 CONSIDERAES FINAIS ........................................................ 141

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    REFERNCIAS ................................................................................ 147

    APNDICES ..................................................................................... 173

    ANEXOS ............................................................................................ 197

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    1 INTRODUO Nos ltimos anos a sociedade tem acompanhado um grande

    avano no desenvolvimento cientfico e tecnolgico na rea da sade. Entretanto, embora a cincia tenha condies de conhecer melhor e propor intervenes mais efetivas para a melhoria do cuidado em sade; o desenvolvimento de novas tcnicas, procedimentos e processos tambm tm contribudo para ocorrncia de novos riscos no cuidado em sade (LEAPE, 2009). Atualmente, apesar de se saber mais sobre diagnstico e tratamento de doenas, ainda existe a possibilidade da ocorrncia de erros e por consequncia, o comprometimento na segurana do paciente.

    A preocupao com a segurana do paciente no um fenmeno recente. Pode ser percebida desde Hipcrates, o pai da medicina, a quem foi atribudo o conhecido e clebre aforismo que deveria nortear o exerccio da medicina: primum non nocere ou seja, em primeiro lugar, no causar dano (LOEFLER, 2002). Florence Nightingale, um dos marcos da enfermagem moderna, sustentava que o primeiro dever de um hospital deveria ser o de no causar mal ao paciente (NIGHTINGALE, 1863). Assim, antes mesmo de se discutir a biotica nos padres atuais, j existia a explicitao de um de seus princpios: a no-maleficncia (PBSP, 2011).

    Mesmo sendo remota essa noo de que o cuidado em sade pode ser inseguro, o ponto de partida para o reconhecimento geral e conscincia do problema foram estudos de erros e eventos adversos realizados nas dcadas de 1970 e 1980 nos Estados Unidos da Amrica (EUA) (BRENNAN, 1991; MILLS, 1978), que revelaram um contexto perturbador e um tema de importncia mundial.

    Na atualidade, um marco na literatura internacional que chamou a ateno governamental e da comunidade cientfica, foi o relatrio do Institute of Medicine (IOM) publicado em 2000 nos EUA, intitulado To Err Is Human: Building a Safer Health System - Errar humano: construindo um sistema de sade mais seguro (KOHN; CORRIGAN; DONALDSON, 2000). Este relatrio descreveu o quanto so frequentes os erros durante a assistncia em sade provocando milhares de mortes e sequelas irreversveis. Apontou estimativas, baseadas em estudos anteriores (THOMAS, 2000; BRENNAN, 1991), da ocorrncia de 44.000 e 98.000 mortes a cada ano nos EUA, decorrentes de erros relacionados com a assistncia sade, sendo 7000 destas mortes

  • 32

    causadas por erros de medicao (IOM, 2000). A divulgao desses dados, alm de chamar para a ao as partes

    interessadas, como foi o caso do governo americano, tambm envolveu e mobilizou vrias organizaes e programas, surgindo diversas campanhas e aes voltadas para a segurana do paciente.

    A Organizao Mundial de Sade (OMS) adotou este tema como de alta prioridade na agenda de polticas dos seus pases membros a partir do ano de 2000. Em 2004, lanou formalmente a World Alliance for Patient Safety, visando a socializao dos conhecimentos e das solues encontradas aos problemas de segurana do paciente. Seu objetivo foi conscientizar e conquistar o compromisso poltico, lanando recomendaes para garantir a segurana do paciente mundialmente (WHO, 2004).

    Alm da OMS, outras organizaes tambm foram mobilizadas. Dentre as quais se destacam a Joint Commission on Accreditation of Healthcare Organizations (JCAHO), hoje denominada The Joint Commission (TJC) e a Joint Commission International (JCI), importantes empresas de acreditao de qualidade e segurana hospitalar, que foram designadas pela OMS em 2005 como os primeiros centros colaboradores para as solues na segurana do paciente (TJC; JCI, 2008); o Institute of Healthcare Improvement (IHI) pela Campanha 5 Milhes de Vidas (IHI, 2011) e a Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ), designada pelo governo americano como agncia federal responsvel pela educao e pesquisa em segurana do paciente e muitas outras organizaes que surgiram no EUA e mundialmente com propostas de mudana para uma assistncia de sade mais segura (AHRQ, 2011a).

    Embora as iniciativas e atividades propostas pela World Alliance for Patient Safety ou mesmo outras organizaes possam ser implementadas em praticamente todos os lugares onde o cuidado em sade prestado, convm destacar que existem generalidades e especificidades inerentes aos diversos ambientes de assistncia em sade.

    Deste modo, dentre os diferentes cenrios assistenciais de cuidado em sade, destaca-se a Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Esta unidade tem por peculiaridade um cuidado que intensivo, ou seja, deve ser prestado de forma rpida, envolve muitos procedimentos, produz um grande volume de informaes, realizado por um nmero grande e variado de profissionais que, em face de gravidade dos pacientes, trabalha sob forte stress, por lidarem diretamente com situaes de vida e morte em que as decises devem ser tomadas

  • 33

    rapidamente. Assim, por ser um cenrio assistencial de alto risco, torna o paciente vulnervel a ocorrncia de um evento adverso (ROTHSCHILD et al, 2005).

    A prtica profissional nesses locais traz implcita a necessidade de uma formao profissional e aperfeioamento que atendam as demandas dos pacientes que se encontram internados nessas unidades. Em um mbito geral, a maior parte da formao desses profissionais est pautada no desenvolvimento de habilidades tcnicas que permitam o desempenho de procedimentos de forma mais segura.

    Embora no senso comum se imagine que a ocorrncia de erro esteja atrelada nica e exclusivamente a competncia profissional, os estudos mostram que as relaes organizacionais tm um profundo efeito para a segurana do paciente (HOFFMAN; MARKS, 2006; NIEVA; SORRA, 2003).

    Assim, ao contrrio do que se poderia pensar, o principal pilar da segurana do paciente no reside apenas na capacitao do profissional ou na qualidade da infraestrutura da instituio, mas sim na cultura da organizao onde este profissional atua (VINCENT, 2009). Neste sentido, Leape (1994), baseado na psicologia do erro e do desempenho humano, afirmou que as limitaes e falibilidades humanas dependem mais das condies de trabalho do que de treinamento.

    H muito tempo, indstrias de alto risco, tais como aviao e energia nuclear, dispensam ateno considervel segurana e tratam a questo de forma sistemtica servindo de exemplo para a rea da sade. Essas indstrias se concentraram na previso de medidas de segurana, impulsionadas pela conscincia de que fatores organizacionais, gerenciais e humanos, e no apenas falhas tcnicas, so as principais causas de acidentes (SINGER et al., 2003; COLLA et al., 2005).

    Nos ltimos anos, tem havido um crescente entendimento de que vrios fatores na rea da sade tais como a nfase na produo, eficincia e controle de custos, a incapacidade organizacional e individual de reconhecer a falibilidade e normas profissionais visando o perfeccionismo entre os prestadores de cuidados, combinam para criar uma cultura contraditria s exigncias da segurana do paciente. Deste modo, cada vez mais, a cultura do setor de sade considerada como um fator de risco potencial que ameaa os pacientes (NIEVA; SORRA, 2003).

    Nesta perspectiva, entende-se que o ambiente organizacional das instituies de sade pode comprometer a segurana do paciente, pois este tem influncia direta no comportamento e atitudes dos profissionais que a exercem as suas atividades. Assim, se insere o conceito de cultura

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    de segurana, que repercute direta e indiretamente na segurana do paciente.

    O termo cultura se refere a crenas, atitudes e valores que so compartilhados dentro de um grupo de pessoas (NEWMAN, 2000). De uma maneira breve e intuitiva, a cultura tambm pode ser compreendida como a forma como as coisas so feitas por aqui, bem como so entendidas, julgadas e avaliadas (DAVIES; NUTLEY; MANNION, 2000).

    Uma definio de cultura de segurana que tem sido adaptada ao contexto de segurana do paciente no cuidado em sade, proposta pela Advisory Committee on the Safety of Nuclear Installations (ACSNI), que define a cultura da segurana como o produto de valores individuais e de grupo, atitudes, percepes, competncias, e padres de comportamento que determinam o compromisso, o estilo e a competncia da gesto da segurana e sade da organizao (HSC, 1993, p. 23).

    Uma organizao com uma cultura de segurana favorvel possui algumas caractersticas, dentre as quais pode ser citada a sua postura diante da ocorrncia de erros, que se caracteriza por ser aberta e justa com os profissionais, no sentido de procurar aprender com os erros, em vez de culpar os indivduos; sob esta tica o foco o que deu errado no sistema (NIEVA; SORRA, 2003). Em consonncia, uma cultura de segurana consiste em atitudes e prticas dos membros de uma organizao, dispostos em detectar erros e aprender a partir deles (HSC, 1993, p. 23), proporcionando um ambiente profissional com esprito de coeso, elevado nvel de comprometimento entre os diferentes profissionais, servios e departamentos que constituem toda a rede de cuidado (SOUZA, 2006).

    Alcanar uma cultura de segurana requer uma compreenso dos valores, crenas e normas sobre o que importante em uma organizao, e que atitudes e comportamentos relacionados segurana do paciente so esperados e adequados (SORRA; NIEVA, 2004).

    Assim, para que seja possvel desenvolver aes que promovam um cuidado mais seguro, considera-se necessrio que seja avaliada a cultura de segurana existente na unidade onde o profissional atua de forma a identificar as fragilidades e fortalezas para, em um nvel gerencial, trabalhar os diferentes aspectos em direo a uma prtica mais segura.

    Nos ltimos anos, em paralelo com o crescente foco na melhoria da cultura de segurana, tem aumentado o interesse na avaliao da cultura nas organizaes de sade, a exemplo das indstrias de alto risco

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    como aviao e energia nuclear. Isto parte do entendimento que para se transformar uma cultura, primeiramente necessrio compreend-la, ou seja, do entendimento pode emergir a ao (NIEVA; SORRA, 2003). Este entendimento pode ser proporcionado por meio de instrumentos de avaliao da cultura de segurana do paciente que atualmente vem sendo amplamente utilizados.

    A avaliao da cultura de segurana resulta do clima que envolve o ambiente organizacional e percebido pelos profissionais. Muitas vezes usado como sinnimo de cultura de segurana, o termo clima de segurana se refere aos componentes mensurveis da cultura, tais como comportamentos de gesto, sistemas de segurana e as percepes dos profissionais (SINGER et al., 2003; COLLA et al., 2005).

    Existem vrios instrumentos de avaliao da cultura de segurana do paciente; estes procuram focar seus questionamentos em caractersticas da cultura, denominadas dimenses, que so aspectos que podem interferir na segurana do paciente. Dente estes instrumentos destaca-se o Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSPSC), criado pela AHRQ (AHRQ, 2011b), sendo apontado por suas propriedades psicomtricas favorveis e por ser um dos melhores para avaliao da cultura de segurana do paciente no hospital (VINCENT, 2009, p. 215).

    Atualmente, embora se tenha o conhecimento dos riscos na assistncia em sade e medidas que podem ser adotadas para melhorar a segurana dos pacientes, percebe-se que os pases caminham de forma diversa em relao a segurana do paciente.

    Dentre as iniciativas governamentais que se revelam importantes para a segurana do paciente no Brasil, pode-se destacar a relevante atuao da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (Anvisa), por meio da Rede Sentinela e do seu constante monitoramento dos produtos de sade utilizados no Brasil (BRASIL, 2005).

    Os processos de acreditao no Brasil, que ocorrem com maior frequncia em instituies privadas interessadas em atingir excelncia na prestao de servios bem como serem reconhecidas por isto; tambm revelam-se de grande importncia para a segurana do paciente. Garantem aos pacientes, profissionais e pblico em geral a segurana indispensvel aos servios de sade, tendo em vista que sua avaliao volta-se principalmente a segurana do paciente que o primeiro nvel a ser avaliado ( ONA, 2011).

    Embora os processos de acreditao predominem nas instituies privadas, o Programa Nacional de Reestruturao dos Hospitais Universitrios, lanado pelo Decreto N 7.082 de 27 de janeiro de 2010, prev a instituio de processos permanentes de avaliao tanto das

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    atividades de ensino, pesquisa, extenso e inovao tecnolgica, como da ateno sade prestada populao (BRASIL, 2010a) apontando para a necessidade de reestruturao das instituies pblicas de sade, especialmente em relao segurana do paciente. Convm destacar que o Hospital Universitrio da Universidade Federal de Santa Catarina (HU/UFSC) caminha neste sentido, tendo em vista a criao de um Comit de Segurana do Paciente na instituio, denominado Cosep e oficializado desde outubro de 2010 (BRASIL, 2010b).

    Outra iniciativa no mbito governamental o Centro Colaborador para a Qualidade do Cuidado e a Segurana do Paciente (Proqualis), vinculado ao Instituto de Comunicao e Informao Cientfica e Tecnolgica em Sade (Icict) da Fundao Oswaldo Cruz (Fiocruz), responsvel por divulgar informaes sobre qualidade e segurana do paciente (BRASIL, 2009).

    Tambm fazem parte do cenrio da segurana do paciente no Brasil iniciativas de rgos de regulamentao como a do Conselho Regional de Enfermagem de So Paulo (Coren/SP), que em 2010 lanou uma ampla campanha para a segurana do paciente (PEDREIRA; HARADA, 2009) e de organizaes profissionais como a Associao de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) que criou o Guia da UTI Segura (Gutis) (CASTRO et al., 2010) e a Campanha Nacional Orgulho de Ser Intensivista com o tema segurana do paciente em 2010 (REZENDE, 2010).

    No mesmo sentido e com o objetivo de disseminar e sedimentar a segurana do paciente nas organizaes de sade, escolas e universidades, foi criada em 2008 a Rede Brasileira de Enfermagem e Segurana do Paciente (Rebraensp) por meio de uma iniciativa da Organizao Pan-Americana da Sade (OPAS) (REBRAENSP-SP, 2009), a qual est vinculado o Polo de Segurana do Paciente de Santa Catarina (Sepaesc) criado em 2009 (SEPAESC, 2009).

    No estado de Santa Catarina, j existem projetos nos cursos de graduao, ps-graduao e grupos de pesquisa com foco na segurana do paciente. Exemplo disso a disciplina Tpico Especial-Segurana do Paciente do Programa de Ps-Graduao em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (PEN/UFSC) promovida no segundo semestre de 2010. No Grupo de Pesquisa Clnica e Tecnologias, Informaes e Informtica em sade e enfermagem (GIATE), algumas iniciativas foram desenvolvidas nessa rea, abordando-se a temtica segurana do paciente de forma direta (PAESE, 2010; desenvolvimento de vrios captulos em publicao da Organizao Panamericana de Sade (COMETTO et al, 2011) ou

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    indiretamente em algumas pesquisas que foram desenvolvidas, relacionadas, por exemplo, a extubao acidental, mensurao da presso intra-abdominal, utilizao do cateter central de insero perifrica (PICC).

    Porm, sob o mbito da produo cientfica brasileira, o tema segurana do paciente ainda no tem sido explorado de forma ampla e abrangente como vem ocorrendo no contexto mundial, o que reflete na falta de dados precisos em relao a segurana na assistncia em sade. fato que no sabemos ao certo a quantidade de erros e acertos de nossa prtica, justamente devido a carncia deste dimensionamento.

    Em linhas gerais, o movimento para a segurana do paciente tem demonstrado sua relevncia por meio de diversas aes e envolvimento de organizaes expressivas. Dentre muitas destas aes, esto includas as pesquisas de avaliao da cultura de segurana do paciente. Ampla aplicao destas pesquisas tem sido feita em vrios pases, principalmente nos EUA. No Brasil esta prtica ainda pouco realizada.

    A enfermagem destaca-se em relao a segurana do paciente pelo seu contingente e a proximidade constante na assistncia ao paciente. Sua atuao norteada por preceitos ticos que estabelecem o comprometimento com a sade do ser humano e da coletividade e a atuao na promoo, proteo, recuperao da sade e reabilitao das pessoas. Alm disso, deve assegurar ao paciente uma assistncia de enfermagem livre de danos decorrentes de impercia, negligncia ou imprudncia (COFEN, 2007). Assim, mais que uma assistncia consciente, promover a segurana do paciente representa um compromisso tico a ser seguido pelos profissionais de enfermagem.

    O interesse em desenvolver este estudo surgiu inicialmente no grupo de pesquisa Giate, onde j vinha sendo estudada esta temtica. Tambm a realizao de um curso de capacitao para enfermeiros em 2009 no HU/UFSC, do qual fez parte um mdulo sobre segurana do paciente, que inclua cultura de segurana do paciente, despertou para o assunto.

    Alm da abordagem dessa temtica na literatura mundial, em 2010 aconteceram no Brasil vrios eventos, alguns especficos em segurana do paciente, outros no, mas trazendo o assunto em destaque. O contato com essa literatura, bem como a participao em alguns dos eventos realizados no Brasil, demonstraram a necessidade de aproximar a questo da segurana do paciente ao seu contexto, tendo em vista a relevncia e propores que estava tomando mundialmente.

    A escolha em trabalhar especificamente com cultura de segurana do paciente surgiu do entendimento que a cultura deve ser a base para

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    qualquer mudana voltada para os propsitos atuais de segurana do paciente. Este interesse decorre do entendimento do quanto a cultura pode interferir na segurana do paciente e da importncia de identificar quais aspectos desta cultura precisam ser melhorados.

    O xito de novas iniciativas em segurana do paciente depende primeiramente da mudana de aspectos que esto arraigados na cultura da instituio ou unidade, dentre os quais a forma como interpretado e abordado o erro.

    Complementarmente, a participao no Cosep, desde o inicio de sua criao, s veio reforar a importncia do estudo para a instituio e especificamente para as atividades do comit.

    Ademais, estudo como este se revela importante tendo em vista os benefcios diretos que pode trazer para a prtica ao propiciar um diagnstico e avaliao do estado atual da cultura de segurana do paciente, identificando pontos fortes e reas para um cuidado mais seguro e consequentemente de melhor qualidade. Tambm, seus resultados podem servir de base para futuras pesquisas, como a avaliao da mudana da cultura de segurana do paciente ao longo do tempo, bem como do impacto cultural de iniciativas de segurana do paciente e intervenes. Tambm fundamental sua contribuio para sensibilizar os profissionais sobre a segurana do paciente.

    Diante disso, este estudo visa responder a seguinte pergunta de pesquisa: Qual a cultura de segurana do paciente sob a tica dos profissionais de enfermagem de duas unidades de terapia intensiva adulto na Grande Florianpolis/SC, Brasil?

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    2 OBJETIVOS

    2.1 OBJETIVO GERAL - Analisar as dimenses da cultura de segurana do paciente na

    tica dos profissionais de enfermagem de duas UTIs Adulto na Grande Florianpolis/SC, Brasil.

    2.2 OBJETIVOS ESPECFICOS

    - Identificar e comparar as dimenses da cultura de segurana do

    paciente entre duas UTIs. - Sistematizar as recomendaes dos profissionais de

    enfermagem acerca na segurana do paciente em UTI.

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    3 REVISO DE LITERATURA Neste capitulo segue uma reviso de literatura que fundamentar

    as discusses e a anlise dos resultados obtidos das perspectivas e recomendaes dos profissionais de enfermagem de duas UTIs em relao a cultura de segurana do paciente . O objetivo desta reviso apresentar um panorama geral da segurana do paciente com foco na cultura de segurana, explorando suas origens, conceitos e pressupostos bem como os fundamentos de sua avaliao, particularmente no contexto de cuidado intensivo.

    Assim, estrutura-se com os seguintes tpicos: Conceitos em segurana do paciente Histria da Segurana do paciente Cultura de segurana do paciente Avaliao da cultura de segurana do paciente Cuidado intensivo e segurana do paciente

    3.1 CONCEITOS EM SEGURANA DO PACIENTE O entendimento do contexto que envolve a segurana do paciente

    implica primeiramente no conhecimento de sua verdadeira acepo bem como de outros conceitos que esto diretamente relacionados.

    Segundo a OMS, segurana do paciente significa reduzir o risco de danos desnecessrios associados aos cuidados de sade a um mnimo aceitvel (WHO, 2009a). Entendendo-se como um mnimo aceitvel aquilo que vivel diante do conhecimento atual, dos recursos disponveis e do contexto em que a assistncia foi realizada frente ao risco de tratamento ou no tratamento (WHO, 2009a). Neste sentido, a segurana do paciente nada mais do que a reduo de atos inseguros nos processos assistenciais e uso das melhores prticas descritas, de forma a alcanar os melhores resultados possveis para o paciente (ZAMBON 2010). Em breves palavras, segurana do paciente definida como a liberdade de leso acidental (KOHN; CORRIGAN; DONALDSON, 2000).

    Quando se fala em segurana do paciente existem termos estreitamente relacionados ao assunto que tambm precisam ser compreendidos, pois fazem parte de sua base conceitual. Dentre estes termos, destacam-se os conceitos de erro e evento adverso.

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    Erro definido como uma falha para realizar uma ao planejada da forma como deveria acontecer, ou a realizao incorreta de um plano. Assim, os erros podem manifestar-se quando se faz algo errado (erros de comisso) ou quando no se faz corretamente (erros de omisso), seja no planejamento ou na execuo (WHO, 2009). Por exemplo, administrar um medicamento para um paciente com alergia documentada para este medicamento seria um erro de comisso. Por sua vez, deixar de prescrever um medicamento, comprovado seus benefcios como o caso de se usar heparina no fracionada como profilaxia do tromboembolismo venoso em um paciente aps cirurgia para qual seria indicado, representa erro de omisso (AHRQ, 2011c).

    No entanto, em algumas situaes, apesar de haver um significativo potencial de dano, o incidente no ocorre, como o caso do quase erro ou near miss. Exemplo disso seria o caso de uma unidade de sangue ser conectada erroneamente a linha venosa do paciente mas isto ser detectado antes de iniciar a infuso do sangue (WHO, 2009a).

    Importante tambm a classificao do erro em ativo e latente feita por James Reason. O mesmo esclarece que erros ativos ocorrem na linha de frente e seus efeitos so sentidos quase imediatamente j os erros latentes ocorrem longe da linha de frente, fora do controle direto do operador incluindo situaes como treinamento inadequado, ms decises gerenciais, organizaes mal estruturadas, falta de manuteno dentre outros. Acrescenta que ao contrrio dos erros ativos cujas formas especficas so muitas vezes difceis de prever, as condies latentes podem ser identificadas e corrigidas antes que um evento adverso ocorra (REASON, 2000).

    3.2 HISTRIA DA SEGURANA DO PACIENTE A cultura de segurana do paciente um fenmeno complexo.

    Sua base conceitual vem se delineando nas ltimas dcadas, bem como o entendimento da sua importncia para uma assistncia em sade com maior qualidade e segurana para o paciente. Seu desenvolvimento caminha com a prpria historicidade do fenmeno segurana do paciente num processo de sinergia e influncias. Assim, uma fundamentao terica sobre cultura de segurana do paciente necessariamente implica no conhecimento do contexto maior onde ela se insere, ou seja, como se desenvolveu historicamente o movimento para a

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    segurana do paciente e o que este movimento desencadeou. Desde os primrdios da medicina, j existe o entendimento dos

    riscos aos quais o paciente est sujeito quando recebe assistncia de sade. Embora j existisse esta noo, somente nas ltimas dcadas houve a maior conscincia do problema e da necessidade do desenvovimento de aes para proporcionar uma assistncia mais segura aos pacientes.

    O desenvolvimento da segurana do paciente teve diferentes influncias que possibilitaram assumir a importncia que tem hoje. Neste elenco, destacam-se aspectos como o aumento de litgios e situaes de erros e eventos adversos na rea da sade, o interesse e preocupao dos profissionais envolvidos na assistncia de sade em melhorar sua qualidade e a influncia de outras indstrias como a aviao e energia nuclear com seus conhecimentos e compreenso mais sofisticada das caractersticas do erro e dos acidentes (VINCENT, 2009, p. 18).

    A maior ocorrncia de litgios representaram um poderoso estmulo segurana do paciente, pois aumentaram a ateno dos profissionais em relao aos eventos adversos e mais recentemente levaram ao desenvolvimento de medidas com objetivo de eliminar leses aos pacientes. H muito tempo, as demandas decorrentes de negligncia mdica eram vistas como um problema exclusivamente financeiro e legal, contudo, mais recentemente passou-se gradualmente a entender que eram reflexo do problema subjacente, muito mais grave da leso causada aos pacientes. (VINCENT, 2009, p. 21).

    Dentre estas demandas jurdicas envolvendo a assistncia em sade, alguns acidentes ocorridos na dcada de 1980 e 1990, foram altamente divulgados pela imprensa e provocaram reaes entre profissionais de sade, entidades reguladoras e no pblico em geral, o que significou o avano em direo ao movimento da segurana do paciente nos EUA.

    Neste perodo, dois acidentes com grande repercusso foram os que conduziram a morte de, Willie King que sofreu amputao da perna errada em um hospital de Nova Iorque em 1984 (HOSPITAL, 1995) e o de Libby Zion que morreu aos 18 anos por interao medicamentosa entre o antidepressivo fenelzina que estava usando e o analgsico narctico meperidina que recebeu ao ir para o hospital com febre (BRODY, 2007). Estes casos tornaram-se simblicos de algumas maneiras. O caso Willie King, ao tornar-se o caso da perna errada captou o pavor coletivo de cirurgia em local errado. J a morte de Libby Zion, representou no apenas o perigo da interao medicamentosa, mas

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    tambm questes como nmero de horas de trabalho e superviso de residentes, capturando simbolicamente o medo de cuidados mdicos oferecidos por profissionais sobrecarregados, cansados, novatos, sem superviso adequada (COOK; WOODS; MILLER, 1998, p. 07).

    Outro exemplo importante foi o caso Josie King, que foi uma menina internada na UTI peditrica do Johns Hopkins Hospital, vtima de queimaduras com gua de banheira. Apesar de todos os esforos dos profissionais de um dos melhores hospitais do mundo, a criana veio a falecer de desidratao em 2001; apesar tambm dos esforos e envolvimento da me que a acompanhava, e que referia constantemente aos profissionais que a menina referia sede (JOSIE KING FOUNDATION, 2011). Esse desfecho poderia ter sido evitado se a equipe de sade tivesse dado ateno s informaes e preocupaes da me, no entanto isso no aconteceu. So situaes como esta que justificam a nfase atual no cuidado centrado no paciente e famlia envolvendo-os no tratamento e na sua segurana. Dada a relevncia, esse um dos focos de atuao estabelecidos pela World Alliance for Patient Safety (WHO, 2008a).

    Outro caso, este mais recente e que se destacou por seu desfecho, foi o caso em que o ator Dennis Quaid e sua esposa, processaram os fabricantes de heparina aps seus filhos gmeos recm-nascidos terem recebido inadvertidamente dose excessiva deste medicamento em 2007. Alegaram que a Baxter Healthcare Corp foi negligente ao apresentar doses diferentes do produto em frascos semelhantes (JABLON, 2007).

    importante destacar que situaes de acidentes como os citados anteriormente tambm foram clebres em outros pases. Uma delas foi o caso de Bristol que ocorreu no Reino Unido, onde em um hospital na dcada de 1980 houve uma sequncia de mortes de crianas submetidas a cirurgia cardaca. Os pais de algumas crianas registraram reclamaes no Conselho Mdico Geral, que em 1997 analisou os casos de 53 crianas, 29 das quais haviam morrido e 4 sofreram leso cerebral grave. Trs mdicos foram considerados culpados por m conduta profissional e dois perderam o registro profissional. O Canad tambm passou por situao similar com o caso ocorrido no Servio de Cirurgia Cardaca Peditrica de Winnipeg (VINCENT, 2009, p. 22).

    No contexto brasileiro, casos recentes de erros tambm despertam a ateno da opinio pblica e intensos debates sobre o tema. Um deles o caso de uma menina de 12 anos que morreu aps receber vaselina na veia em lugar do soro, ocorrido em dezembro de 2010 (DESIDRIO, 2010); outro foi o de uma menina de 1 ano que teve parte do dedo cortada por uma auxiliar de enfermagem durante a retirada de uma

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    bandagem (BEB, 2011). O evento mais recente documentado na imprensa, trata de um recm-nascido que recebeu leite materno por via endovenosa (RECM-NASCIDO, 2011). Percebe-se que, apesar de transcorrida uma dcada de mobilizao global para a segurana do paciente, as discusses e abordagens dessas situaes no avanaram muito alm da esfera criminal, e tem tido como principal desfecho a sumria demisso dos profissionais envolvidos, sem considerar os diferentes fatores que podem ter colaborado para a ocorrncia destes erros. Contudo, questes como a qualidade da escola na formao dos profissionais (PORTO, 2010), carga horria de trabalho da enfermagem e problemas estruturais das organizaes de sade (RODRIGUES, 2011), tm sido identificados, mesmo que no mbito da discusso e debate.

    Estas foram algumas das tragdias que ocorreram em instituies de sade que levaram a intensos processos de investigao, revelando o quanto fatores sistmicos e contextuais foram relevantes para tais desfechos, bem como a influncia do ambiente e da organizao nas aes dos indivduos (VINCENT, 2009, p. 24).

    Neste contexto, profissionais envolvidos na assistncia em sade e estudiosos tambm j haviam despertado para a problemtica da segurana do paciente. Estudos comearam a ser realizados j na dcada de 1970 para avaliar a proporo do problema.

    O pioneiro nestes estudos foi The Medical Insurance Feasibility Study (MILLS, 1978), realizado nos EUA em 1974, que revisou 21 mil pronturios de pacientes hospitalizados em 23 hospitais da Califrnia, encontrando eventos adversos em 4,6% dos pacientes. Outro estudo que causou impacto, publicado em 1991, denominado The Harvard Medical Practice Study (BRENNAN et al., 1991), encontrou dados semelhantes ao estudo anterior em relao a frequncia de eventos adversos, ao revisar 30 mil pronturios de pacientes internados no estado de Nova Iorque, ou seja, em 3,7% dos casos, sendo que destes, 27,5% foram eventos adversos evitveis; mostrando tambm que 13,6% dos eventos levaram a bito o paciente. O Utah Colorado Medical Practice Study foi outro importante estudo realizado nos EUA, nos estados de Utah e Colorado, em 1992 onde analisando uma amostra de 14700 pronturios de pacientes internados, envolvendo 26 hospitais, foi encontrada uma incidncia de eventos adversos de 2,9 por 100 pacientes, sendo 32,6% dos casos em Utah e 27,4% no Colorado (GAWANDE, 1999).

    Estudos subsequentes realizados na dcada de 1990 na Austrlia (WILSON et al.,1995), Reino Unido (SMITH, 1999) e Nova Zelndia (DAVIS et al., 2001) revelaram incidncias de eventos adversos de

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    16,6%, 6,7% e 12,9% respectivamente. Embora evidncias mostrassem o problema dos riscos

    relacionados a assistncia em sade, nem mesmo o estudo The Harvard Medical Practice Study (BRENNAN et al., 1991) publicado em primeira pgina no New York Times, provocou impacto na poca. Foi somente com a edio em 2000 do livro To err is human: building a safer health care system (KOHN; CORRIGAN; DONALDSON, 2000) que o assunto da problemtica na assistncia em sade foi para o topo da agenda poltica e vanguarda do debate pblico em todo o mundo (WHO, 2008a). Este livro considerado o marco frente temtica da segurana do paciente. Foi publicado pelo IOM, uma organizao independente e sem fins lucrativos que busca divulgar informaes baseadas em evidncias sobre medicina e sade. Trouxe na poca os dados dos estudos sobre prevalncia de eventos adversos em pacientes internados, com estimativas de mortalidade e custo, causando um grande impacto na opinio pblica norte-americana. Alm de estimar uma mortalidade de 44.000 a 98.000 norte-americanos ao ano em decorrncia de erros durante a assistncia em sade, tambm classificou estes erros como a 8 causa de mortes nos EUA, ultrapassando o nmero de mortes por acidentes automobilsticos (43.458 mortes em um ano), cncer de mama (42.297 mortes em um ano) e Aids (16.516 mortes em um ano), com custos estimados chegando a 29 bilhes de dlares ao ano.

    Diante disso, o Congresso norte-americano promoveu uma anlise nos dados apresentados e posterior determinao s agncias federais de sade para que aplicassem as determinaes da publicao, as quais eram balizadas por quatro afirmaes: o problema dos danos causados por eventos adversos grave; o principal problema est em sistemas falhos e no em falhas de pessoas; necessrio redesenhar os sistemas; e a segurana do paciente deve se tornar uma prioridade nacional (ZAMBON, 2009).

    Salienta-se que o relatrio do IOM promoveu trs efeitos importantes. Primeiramente, ele encerrou o perodo de negao diante das evidncias de pesquisas que apontavam para a gravidade dos atos inseguros na assistncia em sade. Em segundo lugar, mobilizou um nmero de partes interessadas ao. O primeiro foi o congresso americano que, dentre algumas de suas iniciativas, em 2001 destinou 50 milhes de dlares anuais para a AHRQ para a investigao em segurana do paciente, designando-a como agncia federal responsvel pela educao e pesquisa em segurana do paciente. O terceiro impor-tante efeito foi a motivao para os hospitais fazerem mudanas neces-srias para tornar os cuidados de sade mais seguros. (LEAPE, 2008).

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    O relatrio To err is human: building a safer health care system (KOHN; CORRIGAN; DONALDSON, 2000) alm de mostrar a dimenso dos erros com os resultados que apresentou, tambm tinha uma segunda mensagem, ou seja, a de que a causa desses erros no era decorrente da insensibilidade ou descuido de mdicos e enfermeiros, mas sim, de sistemas defeituosos. O relatrio tambm aponta que, corrigindo estes sistemas, seria possvel reduzir em 90% as leses evitveis (LEAPE, 2008). Disso, surge a mudana de paradigma cultural no meio mdico e o tema cultura de segurana, difundido na indstria nuclear nos anos 80 faz sua apario na indstria mdica a partir do ano 2000 (NASCIMENTO, 2011).

    Muitos dos princpios que atualmente regem o campo da segurana do paciente, particularmente em relao a cultura de segurana, foram influenciados por organizaes de alto risco como a aviao, setor petroqumico e as usinas nucleares. Antes da rea da sade, estas organizaes comearam a investigar as caractersticas dos erros humanos, criaram estratgias e desenvolveram infraestrutura, processos e tecnologia possibilitando maximizar a ao humana e prevenir erros e acidentes (PEDREIRA, 2009a, p.07).

    A anlise cuidadosa de alguns acidentes graves tais como do nibus espacial Challenger (1986) que explodiu logo aps o lanamento, Piper Alpha (1988) que consistiu na exploso de em poo de petrleo matando 167 pessoas e Chernobyl (1996) pela exploso de um reator liberando radioatividade por toda a Europa, aumentou a compreenso nestas organizaes do desdobramento destes desastres, provocando mudanas importantes. Percebeu-se principalmente que muitos desses eventos decorreram de uma cultura deficiente e inadequada, com vrios traos culturais e prticas organizacionais deficientes e prejudiciais segurana (VINCENT, 2009, p. 98). Da advm a forte atribuio dos atos inseguros nas instituies de sade cultura da organizao e a importncia do seu conhecimento para torn-la mais segura.

    A partir disso, essas indstrias investiram muito em fatores humanos, uma disciplina hbrida baseada na Ergonomia, Psicologia e conhecimento prtico adquirido nas indstrias onde a segurana crtica. Foi por meio do estudo destes acidentes que houve um importante desenvolvimento na psicologia do erro, que vem at hoje sustentando as aes de segurana nas organizaes. (VINCENT, 2009, p. 30).

    Embora estas indstrias se diferenciem bastante da rea da sade, elas compartilham caractersticas importantes. Ambas so atividades perigosas, realizadas em organizaes grandes e complexas e na maioria

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    das vezes realizadas por pessoas dedicadas e treinadas. Presses comerciais, polticas, sociais e humanitrias tm impelido estas organizaes a elevar seus padres de produo e a melhorar e manter a segurana por meio de esforos contnuos. No entanto, o atendimento em sade tem se baseado exclusivamente no profissionalismo e na motivao intrnseca de seus profissionais, o que vital, mas no o suficiente para garantir a segurana. As anlises de outras organizaes de alto risco tm proporcionado ajuda para o entendimento de que vrios outros fatores precisam ser considerados, permitindo reconhecer as caractersticas gerais de uma organizao segura (VINCENT, 2009, p. 102). Deste modo, lies aprendidas com estas organizaes foram claramente relevantes para os gestores e operadores de instituies de sade (VINCENT, 2009, p. 102; REASON, 2000).

    Destaca-se que talvez a caracterstica mais importante que diferencia estas organizaes de alto risco sua preocupao coletiva com a possibilidade de falha. Elas treinam sua fora de trabalho para reconhecer os erros e recuper-los, e continuamente ensaiam cenrios familiares de fracasso e se esforam muito para imaginar novas situaes. Em vez de isolar falhas, essas organizaes as generalizam; em vez de fazer reparos locais, olham para as reformas do sistema (REASON, 2000). Isso diferente da abordagem que tradicionalmente sempre prevalece na rea da sade, ou seja, a de atribuir os erros exclusivamente pessoa, na tentativa de identificar a existncia de negligncia, desateno, descuido, falta de conhecimento ou desmotivao (WACHTER, 2010, p. 38)

    Motivadas por estas influncias que fizeram o movimento da segurana do paciente acontecer, sobretudo o relatrio do IOM, vrias campanhas e aes, algumas citadas a seguir, foram surgindo em mbito mundial, lideradas por programas e institutos voltados para a segurana do paciente que foram dando-lhe fora e expressividade.

    A OMS se tornou uma importante aliada para a promoo da segurana do paciente. Em 2002, na sua 55 Assembleia foi recomendada aos pases membros a mxima ateno ao problema da segurana do paciente e ao fortalecimento de evidncias cientficas necessrias para melhorar a segurana dos pacientes e a qualidade do cuidado em sade. Na poca, criou um grupo de trabalho com o objetivo de estudar metodologias para avaliar riscos para a segurana do paciente nos servios de sade de forma sistemtica. Em 2004, em sua 57 Assembleia estabeleceu a Aliana Mundial para a Segurana dos Pacientes, sendo uma de suas diretrizes o desenvolvimento e difuso de conhecimentos sobre polticas e melhores prticas na segurana do

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    paciente (WHO, 2004). A partir de ento, a OMS tem lanado campanhas internacionais

    que renem experincia e evidncias sobre a segurana do paciente e formulam recomendaes para garantir a segurana dos pacientes que recebem cuidados no contexto mundial. At o momento trs grandes campanhas foram promovidas: Cuidado limpo Cuidado mais Seguro Clean Care is Safer Care- em 2005; Cirurgia Segura Salva Vidas -Safe Surgery Saves Lives- em 2008 e mais recentemente, em abril de 2011, foi lanada a campanha de Combate a Resistncia Antimicrobiana - Combat Antimicrobial Resistance- (WHO, 2011a).

    Alm destas campanhas, tambm foram definidas em 2007 nove reas prioritrias de atuao que so as Solues para a Segurana do Paciente, caracterizadas como qualquer projeto de sistema ou interveno baseado em evidncia cientfica que tem demonstrado a capacidade de prevenir ou atenuar os danos ao paciente decorrentes dos processos de cuidados de sade. Inclui-se ainda, a iniciativa em desenvolver uma taxonomia internacional, denominada de International Classification for Patient Safety (WHO, 2009a), visando definir e harmonizar os conceitos construdos sobre segurana do paciente em uma classificao aceita internacionalmente e tambm elencar reas com maior necessidade de investigao em nvel mundial, incluindo entre elas a cultura de segurana do paciente (WHO, 2011b).

    Destacam-se tambm a TJC e a JCI, reconhecidas como lderes em segurana do paciente, e que vm promovendo e oferecendo a prestao de cuidados seguros e de alta qualidade atravs de seus padres, base de dados de eventos sentinela, alerta de eventos sentinela, preveno de erros na transferncia de cuidados ao paciente, Metas Nacionais de Segurana dos Pacientes dentre outros (TJC; JCI, 2008). Alm disto, tambm passou a acrescentar em seu programa de acreditao a necessidade de programas de gerenciamento de riscos para melhorar a segurana do paciente (ZAMBON, 2009).

    Outra importante campanha foi lanada pelo IHI, uma organizao independente e sem fins lucrativos criada em 1991 nos EUA, que baseia suas aes e iniciativas na possibilidade da melhoria da assistncia em sade ao redor do mundo. Em 2006 o IHI lanou a Campanha 5 Milhes de Vidas, que consistiu em uma iniciativa para melhorar a segurana do paciente e transformar a qualidade da assistncia nos Estados Unidos. A campanha tinha por objetivo evitar cinco milhes de casos de danos decorrentes da assistncia em sade, em um perodo de dois anos (dezembro de 2006 a dezembro de 2008), aproveitando o sucesso da campanha exatamente anterior, a Campanha

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    100.000 Vidas (dezembro de 2004 a junho de 2006), cujo objetivo era evitar cem mil mortes decorrentes da assistncia. Estas campanhas foram baseadas em grupos ou pacotes de intervenes (bundles) estruturados em evidncias cientficas de excelente custobenefcio; como exemplo destas medidas foi sugerido o bundle para preveno de infeces por cateter central e pneumonia associada ventilao mecnica (ZAMBON, 2009).

    notrio que importantes iniciativas para a segurana do paciente partiram dos EUA, entretanto, esta nfase na segurana do paciente se espalhou em todo o mundo, estimulada pela Aliana Mundial pela Segurana do Paciente. Campanhas internacionais de controle de infeco, higiene das mos e cirurgia segura, tm estimulado mudanas nos cuidados de sade em pases to diversos como Gana e Espanha (LEAPE, 2008).

    Alm disso, surgiram vrias organizaes em diversos pases com iniciativas importantes. Dentre estas se pode citar a Australian Patient Safety Foundation Inc. que criou um sistema avanado de gerenciamento de incidentes (Advanced Incident Management System AIMS) ; Danish Society for Patient Safety com seu Kit para a Segurana do Paciente (Danish Patient Safety Toolkits); o Canadian Patient Safety Institute, responsvel pela campanha Cuidado Seguro Sade Imediatamente (Safer Healthcare Now!) e pela criao de uma Simulao de Paciente; uma Ferramenta Educacional para a Segurana (Patient Simulation: An Educational Tool for Safety). Outra iniciativa expressiva o programa que iniciou estudo de prevalncia em pases do Leste do Mediterrneo e na frica (Egito, Jordo, Marrocos, Tunsia, Sudo, Imen, Qunia e frica do Sul) denominada Pesquisa para a Segurana do Paciente (Research for Patient Safety). Na Amrica Latina o programa est sendo desenvolvido em colaborao com a Espanha e a Organizao Pan-americana da Sade, envolvendo hospitais da Argentina, Colmbia, Costa Rica, Mxico e Peru (GOMES, 2008).

    No Brasil j existem alguns programas nacionais nessa direo, no entanto, no se observa a criao de polticas nacionais especficas, nem institutos e fundaes no governamentais que pesquisem e promovam recomendaes sobre o tema, como o IHI nos EUA (PEDREIRA, 2009a, p. 06).

    Embora ainda no existam no Brasil aes de grande abrangncia a exemplo de outros pases, iniciativas importantes vem se estruturando, principalmente nos ltimos anos. Iniciativas estas restritas a ambientes especficos como: instituies em processo de acreditao, instituies de ensino, organizaes governamentais e no governamentais.

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    H algum tempo, instituies interessadas em atingir excelncia na prestao de seus servios bem como serem reconhecidas por isto, tem ingressado em processos de acreditao, caracterizados pela avaliao dos recursos institucionais de maneira voluntria, peridica, reservada e sigilosa, tendendo a garantir a qualidade da assistncia atravs de padres previamente aceitos (NOVAES; PAGANINI, 1994).

    Apesar da acreditao ainda ser investimento de uma minoria de instituies privadas que se propem a esta avaliao, nas instituies pblicas brasileiras comeam a despontar polticas voltadas para isso. Exemplo disso o Programa Nacional de Reestruturao dos Hospitais Universitrios, lanado pelo Decreto N 7.082 de 27 de janeiro de 2010, que j prev a instituio de processos permanentes de avaliao tanto das atividades de ensino, pesquisa, extenso e inovao tecnolgica, como da ateno sade prestada populao (BRASIL, 2010a). Deste modo, percebe-se o quanto premente a necessidade de reestruturao das instituies, em especial no que tange a segurana do paciente, pois muito em breve isto lhes ser exigido.

    Desde o incio de 2010 um grupo de profissionais vem atuando na implantao do Cosep no Hospital Universitrio, cuja oficializao se deu em 09 de outubro de 2010 pela portaria N 140/DG-HU/2010 (UFSC, 2010). Este Comit composto por uma equipe multidisciplinar de profissionais docentes e assistenciais das reas de enfermagem, farmcia, medicina e administrao, ue tm atuado em alguns aspectos considerados importantes em relao a segurana do paciente tais como: capacitao sobre segurana do paciente, identificao do paciente e notificao de erros e eventos adversos.

    Uma importante iniciativa governamental em prol da segurana do paciente foi a criao da Anvisa em 1999, com a misso de proteger e promover a sade, garantindo a segurana sanitria dos produtos e servios. A criao da Rede Brasileira de Hospitais Sentinela visando a obteno de informao qualificada do desempenho dos produtos de sade utilizados no Brasil foi elementar para seu desempenho. Esta rede de servios tem a finalidade de notificar eventos adversos e queixas tcnicas de produtos de sade, sangue e hemoderivados, materiais e equipamentos mdico hospitalares. Destaca-se que dentre suas aes, a implantao de gerentes de risco nos hospitais da Rede Sentinela teve um papel importante para a segurana do paciente nas instituies, ainda que esse no havia sido o propsito inicial (CASSIANI, 2010).

    Outra importante iniciativa voltada a difundir conhecimento tcnico cientfico em segurana do paciente no Brasil o Proqualis. Esse centro est vinculado ao Icict da Fiocruz. Foi criado visando-se a

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    disseminao ampla de informao selecionada, atualizada e de qualidade sobre medidas que garantam a segurana aos profissionais envolvidos no cuidado (BOLETIM INFORMATIVO PROQUALIS, 2010).

    O portal Proqualis um espao difusor de contedos selecionados pelos especialistas em reas de informao clnica e segurana do paciente. A cooperao entre o Proqualis e a Bireme (Biblioteca Regional de Medicina) foi muito proveitosa para o desenvolvimento de metodologias e tecnologias do portal (BOLETIM INFORMATIVO PROQUALIS, 2010).

    A enfermagem tambm tem avanado em relao segurana do paciente no Brasil. Exemplo disto a atuao do COREN-SP manifestada por iniciativas como: Declarao da Enfermagem do Estado de So Paulo para a Promoo da Segurana do Paciente; 1 Frum de Enfermagem do COREN-SP - Segurana do Paciente, realizado em 2010; Cartilha com 10 Passos para a Segurana do Paciente e recomendaes para boas prticas (COREN-SP, 2011).

    Ainda no elenco destas iniciativas, em 2008 foi criada a REBRAENSP, outro passo da enfermagem para a segurana do paciente. Esta organizao tem como objetivo disseminar e sedimentar a segurana nas organizaes de sade, escolas, universidades, programas e organizaes no governamentais com intuito de preveno de danos e de fortalecimento das aes na assistncia ao paciente. A rede constituda de membros de todo o Brasil, reunidos por meio de Plos Regionais (REBRAENSP-SP, 2009). O plo de Segurana do Paciente de Santa Catarina foi criado em 2009 com objetivo de promover a cultura da segurana do paciente em Santa Catarina por meio de cursos de extenso, oficinas, seminrios, eventos e fruns de experincia (SEPAESC, 2011).

    Posto isto, percebe-se que a segurana do paciente um movimento em expanso, proporcionado por polticas governamentais e desenvolvimento de novos saberes. Neste contexto, nfase tem sido dada a cultura de segurana, considerada como principal determinante de uma assistncia em sade segura. H o entendimento que a fim de se melhorar a segurana do paciente, alm de mudanas estruturais necessrio tambm que ocorram mudanas culturais e comportamentais (NIEVA; SORRA, 2003; LEAPE, 1994). Portanto, o principal desafio para a segurana do paciente no apenas clnico ou assistencial, mas tambm organizacional (RAMANUJAM; KEYSER; SRIO, 2005).

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    3.3 CULTURA DE SEGURANA DO PACIENTE A acepo que se tem atualmente sobre cultura de segurana do

    paciente procede de conceitos que foram construdos nos ltimos 30 anos a partir de experincias de organizaes de risco como aviao, energia nuclear dentre outras, que muito tem influenciado a rea da sade. Estas organizaes tm lanado esforos no sentido de definir, especificar e medir a cultura de segurana bem como em desenvolver diferentes estratgias para o manejo de acidentes e situaes de risco por meio de novas concepes que vem sendo difundidas principalmente em relao ao erro (CLARKE, 1999; ZOHAR, 1980). Segundo o Departament of Health (DOH, 2000), embora estas organizaes tenham caractersticas bem diferentes da rea da sade, deve ser considerado que ambos os sistemas so complexos, esto propensos a cometer erros similares e sujeitos ao mesmo tipo de presso.

    O termo cultura de segurana comeou a despontar na rea da sade por meio do relatrio do IOM (KOHN; CORRIGAN; DONALDSON, 2000) que alm de destacar a necessidade de colocar a segurana do paciente como uma prioridade das autoridades mdicas, tambm focou as suas recomendaes sobre como alterar a cultura no hospital.

    Alguns anos antes da publicao do relatrio do IOM, a ocor-rncia de graves desastres comeou a preparar a base para uma nova concepo do erro e suas causas. A anlise cuidadosa de graves aci-dentes aumentou a compreenso sobre como os eventos que precedem um desastre se desdobram. No caso do acidente de Chernobyl (1986), por exemplo, foram admitidas violaes sistemticas e numerosas dos procedimentos de segurana; em relao ao acidente de Piper Alpha (1988) foram identificadas vrias causas tcnicas e organizacionais enraizadas na cultura, na estrutura e nos procedimentos da empresa, atribuindo-se o erro a inexperincia, rotinas de manuteno ruins e mecanismos de aprendizado deficientes; j para o acidente no trem de Paddington (1999) foram identificados problemas como treinamento deficiente de condutores, no avaliao dos relatos que indicavam visibilidade ruim da sinalizao, cultura de segurana inadequada e falhas significativas de comunicao (VINCENT, 2009, p. 99).

    Com base nestas constataes, pde-se perceber que alm de aes ou omisses por pessoas que estavam no local do acidente, outros fatores prvios da cadeia sequencial de causas tambm fizeram parte da gnese destes acidentes (VINCENT, 2009, p. 100). Estes fatores,

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    denominados de condies latentes por Reason (1997), estudioso do erro, prepararam o terreno para os acidentes, pois criaram as condies nas quais os erros e as falhas pudessem acontecer.

    Dentre as condies elencadas como causas de alguns dos principais desastres citados, destacaram-se a cultura organizacional e a cultura de segurana. A partir destas constataes, a ateno se voltou para a importncia da cultura de segurana e o impacto de fatores gerenciais e humanos sobre o resultado de segurana (FLIN et al. 2000; INTERNATIONAL NUCLEAR SAFETY ADVISORY GROUP - INSAG, 1991). Por isto, nas ltimas dcadas, cientistas que estudam segurana tm voltado sua ateno ao ambiente organizacional e em particular ao conceito de segurana.

    Importante citar que at se chegar ao entendimento atual da etiologia dos acidentes, segundo Wiegmann et al. (2002) as teorias progrediram em quatro fases ao longo do tempo: na primeira fase, muitas vezes referida como o perodo tcnico, durante o qual houve rpida evoluo dos novos sistemas mecnicos, atribuam-se os erros a falhas mecnicas, em especial na concepo, construo e confiabilidade dos equipamentos; na segunda fase, conhecida como o perodo de erro humano, as falhas do operador humano foram vistas como a origem do colapso do sistema; j na terceira fase, conhecida como o perodo sociotcnico, considerava-se a interao de fatores humanos e tcnicos ao explorar as causas de erros e acidentes e finalmente, na quarta fase, que vem sendo testemunhada nos ltimos anos, chamado perodo da cultura organizacional, se reconhece que os operadores no esto realizando suas funes ou interagindo com a tecnologia de forma isolada, mas sim que esto atuando como uma equipe coordenada de forma organizacional, que est inserida dentro de uma cultura particular.

    Assim, a cultura considerada um dos pontos-chave para a compreenso das aes humanas, funcionando como um padro coletivo que identifica os grupos, suas maneiras de perceber, pensar, sentir e agir. Deste modo, mais do que um conjunto de regras, de hbitos e de artefatos, cultura significa construo de significados partilhados pelo conjunto de pessoas que pertencem a um mesmo grupo social. A cultura expressa os valores e as crenas que os membros desse grupo partilham (PIRES; MACDO, 2006).

    No mbito das organizaes, a cultura pode ser entendida como o conjunto de pressupostos bsicos que um grupo criou, descobriu ou desenvolveu, ao aprender como lidar com os problemas de adaptao externa e integrao interna e que funcionou bem, o suficiente para serem considerados vlidos e ensinados a novos membros como a forma

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    correta de perceber, pensar e sentir, em relao a esses problemas. A cultura, sob este aspecto, inclui normas, valores e rituais que caracterizam um grupo ou organizao; servindo como mecanismo de controle social, traduzido por meio das expectativas sobre atitudes e comportamentos apropriados de um grupo (SCHEIN, 1991).

    O conceito de cultura de segurana foi proposto inicialmente para explicar a catstrofe de Chenobyl em 1986, quando mostrou a importncia da cultura de segurana e o impacto de fatores gerenciais e humanos sobre o resultado do desempenho de segurana e desde ento se tornou essencial no vocabulrio da gesto de riscos industriais (CHEVRAU, 2008) e mais recentemente para a rea da sade. Vincent (2009, p. 202) destaca que a cultura da segurana no surgiu completamente formada, ela resultou de uma cultura organizacional. Assim, ao se falar em cultura de segurana, implicitamente aborda-se a cultura organizacional mais ampla. Nesse sentido, o termo cultura de segurana visto como um aspecto focado, ou seja, uma dimenso de um conceito mais global da cultura (HAUKELID, 2008).

    Existe uma ampla variedade de conceitos para definir cultura de segurana. Guldenmund (2000) identificou 17 conceitos sendo que destes 29% eram oriundos do setor nuclear. No entanto, o conceito que tem sido amplamente reconhecido e que tambm pode ser adotado no contexto da assistncia em sade o da ACSNI:

    A cultura de segurana de uma organizao o produto de valores, atitudes, competncias e padres de comportamento, tanto individuais como coletivos, que determinam o comprome-timento, o estilo e a facilidade de execuo de programas de Sade e segurana organizacionais. Organizaes com uma cultura de segurana positiva so caracterizadas por comunicao baseada na confiana mtua, por percepes compartilhadas da importncia da segurana e pela confiana na eficcia das medidas preventivas. (HSC, 1993, p. 23) (traduo nossa)

    Ainda, segundo o HSC (1993, p.23), em uma organizao segura,

    este padro de conceitos compartilhados coloca a segurana como uma das mais altas prioridades, ou seja, qualquer pessoa sob influncia desta prioridade passa a lidar com os novos eventos e toma decises baseadas nela. Neste sentido, o comprometimento, o estilo e a facilidade de execuo de um programa de segurana organizacional so importantes,

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    assim como a definio formal desses programas. Esse comprome-timento e estilo decorrem de valores e atitudes individuais e grupais.

    Seguindo este entendimento, pensar em termos de segurana consiste numa atitude de questionamento sistemtico, de recusa de estar satisfeito com os resultados alcanados, uma preocupao permanente para a perfeio, e um esforo de responsabilidade pessoal e autodisciplina do grupo para a segurana (NASCIMENTO, 2011).

    Entende-se que produzir e manter uma cultura de segurana um processo contnuo, sistemtico e demorado. No haver momento em que o trabalho de melhorar e manter a cultura de segurana esteja terminado (VINCENT, 2009, p. 203).

    Hudson (2003) criou um modelo de Maturidade Cultural representativo da evoluo da cultura de segurana de uma organizao, caracterizado por cinco estgios assim definidos:

    - Patolgica: neste estgio a segurana um problema causado pelo profissional. norteada pelos negcios e o desejo de no ser descoberto pelo agente regulador.

    - Reativa: as organizaes comeam a tratar a segurana como algo srio, mas aes corretivas so implementadas somente aps a ocorrncia de incidentes;

    - Calculada: a segurana gerenciada por sistemas administrativos, com a utilizao de coleta de dados. Melhorias so impostas pelos gerentes.

    - Proativa: existe a melhoria dos processos. Funcionrios da organizao comeam a ter iniciativas para a melhoria da segurana, diferentemente de uma abordagem meramente horizontal;

    - Participativa: h participao ativa dos funcionrios de todos os nveis. A segurana encarada como parte inerente do negcio (HUDSON, 2003).

    Conforme Pires e Macedo (2006), as organizaes esto inseridas

    dentro de um ambiente e interagem com ele, recebendo influncias e influenciando-o. As pessoas que atuam nas organizaes so agentes que contribuem para esse intercmbio constante e seus valores constituem componentes para a formao da cultura da organizao.

    A cultura considerada um dos pontos-chave para a compreenso das aes humanas, funcionando como um padro coletivo que identifica os grupos, suas maneiras de perceber, pensar, sentir e agir. Deste modo, mais do que um conjunto de regras, de hbitos e de

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    artefatos, cultura significa construo de significados partilhados pelo conjunto de pessoas que pertencem a um mesmo grupo social. A cultura expressa os valores e as crenas que os membros desse grupo partilham (PIRES; MACDO, 2006).

    As organizaes com uma cultura de segurana compartilham o compromisso com a segurana nos seus vrios nveis, incluindo suas polticas, lideranas e profissionais da linha de frente. Cada pessoa envolvida na assistncia em sade incentivada a identificar possveis problemas de segurana e solues, a se engajar em comportamentos seguros, a relatar erros e quase erros, sem medo de ser responsabilizado e punido. Esse compromisso implica em mudana nas polticas, procedimentos, em aquisio de equipamentos necessrios, bem como em lideranas dispostas em agir e efetuar as mudanas necessrias.

    Todos, independentemente de sua posio, so incentivados a fazer o que preciso, certificando-se de fazer cada parte do cuidado e do meio ambiente de forma to segura quanto possvel. Envolve uma ampla participao. Um membro do pessoal de limpeza, por exemplo, pode reconhecer que alguns aspectos do meio ambiente podem ser perigosos para uma criana que est internada. Um paciente pode questionar uma medicao que lhe oferecida porque parece diferente. Um estudante pode achar que dois medicamentos prescritos para o paciente podem resultar em interao. Diante destes achados, a resposta do grupo em uma cultura de segurana de incentivo e valorizao a cada um. Este tipo de cultura chamada de "participativa". Todos os nveis na hierarquia so incentivados a participar na identificao de potenciais problemas de segurana e solues (GALT; PASCHAL, 2010, p. 94)

    A International Nuclear Safety Advisory Group - INSAG (INSAG, 1991), elencou os componentes que constituem uma cultura de segurana (figura1) e aponta as responsabilidades inerentes aos nveis que compem a cultura de segurana.

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    Figura 1 - Componentes da Cultura de Segurana Fonte: INSAG (1991).

    Explicando os componentes da cultura de segurana de cada nvel

    de uma organizao (figura1), no que tange s polticas, cabe considerar que as atividades que abrangem um ambiente de trabalho exigem compromisso em nvel corporativo para o sucesso. Quando este compromisso firmado publicamente e bem conhecido por meio de declaraes e estruturas de gesto bem definidos, bem como disponibilizao de recursos adequados com investimento em formao de pessoal e mecanismos de auto-regulao, pode-se identificar a postura de gesto empresarial em relao vontade de ser aberta em matria de segurana (INSAG, 1991).

    As atitudes dos indivduos so influenciadas pelo seu ambiente de trabalho. A chave para uma cultura de segurana eficaz est em prticas de moldagem do ambiente e promoo de atitudes favorveis segurana. Assim, cabe aos gestores a responsabilidade de instituir tais prticas de acordo com a poltica de segu