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1 Metade dos gastos de Dilma vai para programas sociais FSP, 03/02/2013 Recursos pagos diretamente a famílias representaram 50,4% das despesas do governo federal no ano passado Previdência, amparo ao trabalhador e assistência levam 9,2% do PIB; maior expansão é do Bolsa Família GUSTAVO PATU DE BRASÍLIA Com o impulso do reajuste do salário-mínimo e da reformulação do Bolsa Família, os programas sociais de transferência de renda alcançaram peso inédito no gasto público e na economia do país. Recursos pagos diretamente a famílias representaram mais da metade -exatos 50,4%- das despesas do governo federal no ano passado, excluídos da conta os encargos da dívida pública. Dados recém-apurados da execução orçamentária mostram que o montante chegou a R$ 405,2 bilhões, distribuídos entre o regime geral de previdência, o amparo ao trabalhador e a assistência. Trata-se de 9,2% do Produto Interno Bruto, ou seja, de todos os valores recebidos pela população e pelas empresas instaladas no país. São proporções sem paralelo entre países emergentes, o que ajuda a explicar a também anômala carga de impostos brasileira, na casa de 35% da renda nacional. Na maior parte das economias latino-americanas e asiáticas, a arrecadação dos governos varia entre 20% e 25% do PIB -apenas recentemente, a Argentina chegou aos patamares do Brasil. A carga tributária dos dois sul-americanos é similar à média de 34 países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, que reúne, na sua maior parte, nações desenvolvidas. O aparato de seguridade social no Brasil é encabeçado pela previdência social urbana, cuja clientela cresce ano a ano em linha com o aumento da expectativa de vida da população. As despesas recordes do ano passado foram alimentadas pelo aumento do salário mínimo de 7,5% acima da inflação, o maior desde o ano eleitoral de 2006. Além das aposentadorias e pensões, os benefícios trabalhistas e assistenciais de caráter universal -direitos de todos os que preencherem os requisitos da legislação- também têm o piso salarial como referência. Estão nessa lista o seguro-desemprego, o abono salarial e a assistência obrigatória a idosos e deficientes de baixa renda, todos com aumento de transferências em 2012. O abono salarial cresce ainda com a formalização da mão de obra, uma vez que trabalhadores sem carteira não têm direito ao benefício. Na quinta-feira, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística divulgou taxa de desemprego de 5,5% em 2012, a menor da série histórica anual iniciada em 2003. Já no caso do seguro-desemprego, foi editado decreto destinado a conter o aumento de gastos, com a exigência de curso profissionalizante para os trabalhadores que ingressam pela terceira vez no programa. BOLSA FAMÍLIA

Metade dos gastos de Dilma vai para programas sociais · 2013-11-05 · Os benefícios foram reajustados e passaram a ser calculados para que as famílias com ... dinheiro do Bolsa

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Metade dos gastos de Dilma vai para programas sociaisFSP, 03/02/2013Recursos pagos diretamente a famílias representaram 50,4% das despesas do governo federal no ano passado Previdência, amparo ao trabalhador e assistência levam 9,2% do PIB; maior expansão é do Bolsa Família GUSTAVO PATU DE BRASÍLIA Com o impulso do reajuste do salário-mínimo e da reformulação do Bolsa Família, os programas sociais de transferência de renda alcançaram peso inédito no gasto público e na economia do país.Recursos pagos diretamente a famílias representaram mais da metade -exatos 50,4%- das despesas do governo federal no ano passado, excluídos da conta os encargos da dívida pública.Dados recém-apurados da execução orçamentária mostram que o montante chegou a R$405,2 bilhões, distribuídos entre o regime geral de previdência, o amparo ao trabalhadore a assistência.Trata-se de 9,2% do Produto Interno Bruto, ou seja, de todos os valores recebidos pela população e pelas empresas instaladas no país.São proporções sem paralelo entre países emergentes, o que ajuda a explicar a também anômala carga de impostos brasileira, na casa de 35% da renda nacional.Na maior parte das economias latino-americanas e asiáticas, a arrecadação dos governosvaria entre 20% e 25% do PIB -apenas recentemente, a Argentina chegou aos patamaresdo Brasil.A carga tributária dos dois sul-americanos é similar à média de 34 países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, que reúne, na sua maior parte, nações desenvolvidas.O aparato de seguridade social no Brasil é encabeçado pela previdência social urbana, cuja clientela cresce ano a ano em linha com o aumento da expectativa de vida da população.As despesas recordes do ano passado foram alimentadas pelo aumento do salário mínimo de 7,5% acima da inflação, o maior desde o ano eleitoral de 2006.Além das aposentadorias e pensões, os benefícios trabalhistas e assistenciais de caráter universal -direitos de todos os que preencherem os requisitos da legislação- também têmo piso salarial como referência.Estão nessa lista o seguro-desemprego, o abono salarial e a assistência obrigatória a idosos e deficientes de baixa renda, todos com aumento de transferências em 2012.O abono salarial cresce ainda com a formalização da mão de obra, uma vez que trabalhadores sem carteira não têm direito ao benefício.Na quinta-feira, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística divulgou taxa de desemprego de 5,5% em 2012, a menor da série histórica anual iniciada em 2003.Já no caso do seguro-desemprego, foi editado decreto destinado a conter o aumento de gastos, com a exigência de curso profissionalizante para os trabalhadores que ingressampela terceira vez no programa. BOLSA FAMÍLIA

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A expansão mais aguda de despesas se dá no Bolsa Família, que paga benefícios não vinculados ao salário-mínimo a uma clientela cadastrada pelo governo entre famílias pobres e miseráveis.Principal marca da administração petista, o programa passou, na gestão de Dilma Rousseff, pela maior reformulação desde que foi criado há quase uma década.Os benefícios foram reajustados e passaram a ser calculados para que as famílias com filhos possam ultrapassar a linha da miséria, fixada em R$ 70 mensais por pessoa.Em consequência, a despesa com a clientela de 13,9 milhões de famílias saltou de R$ 13,6 bilhões, no fim do governo Lula, para R$ 20,5 bilhões no ano passado. Colaborou GITÂNIO FORTES, de São Paulo

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Folha transparência O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

13 mil famílias deixam lista da miséria após extra deR$ 2Aporte é feito por programa do governo federal que visa erradicar pobreza extrema Efeito estatístico se dá porque piso de R$ 70 per capita é superado; economistas dizem que não é só renda que conta DANIEL CARVALHO ENVIADO ESPECIAL AO PIAUÍ "Com R$ 2 não dá para comprar nem meio quilo de frango. Comprei um coco hoje com R$ 2", afirma Luiza Sousa, 51, desempregada em Demerval Lobão, no Piauí.Para o governo, ela e seus quatro filhos deixaram de ser "miseráveis" no fim de 2012, quando passaram a receber, cada um, R$ 2 mensais do programa Brasil Carinhoso.Com esse programa, famílias já beneficiadas pelo Bolsa Família recebem um complemento financeiro para tecnicamente deixar a miséria. Segundo os critérios do governo, uma família com renda mensal de até R$ 70 por pessoa é "miserável".Luiza já recebia R$ 140 do Bolsa Família. No final do ano passado, os R$ 2 do Brasil Carinhoso foram somados ao benefício, a doações e ao que ela, como lavadeira, e o filho mais velho, como caseiro, conseguem com bicos.Com esses R$ 2 extras, Luiza e seus filhos passaram a engrossar a estatística oficial, quecomemora 16,4 milhões de "ex-miseráveis" apenas nos últimos sete meses.Próximo à Luiza vivem Joelina Maria de Sousa, 31, e a filha Jucélia, 7, que também receberam R$ 2 para sair oficialmente da miséria.Para o governo, por exemplo, um casal com três crianças com renda mensal de R$ 350 é"miserável" (R$ 70 por pessoa). Com mais R$ 2 do Brasil Carinhoso, atinge R$ 352 e deixa oficialmente a "miséria" (com renda de R$ 70,40 por pessoa).Segundo dados do programa obtidos pela Folha com base na Lei de Acesso à Informação, as piauienses Luiza e Joelina e outras 13,1 mil famílias em todo o país recebem R$ 2 por mês para integrar essa estatística que ajuda Dilma a chegar perto de sua promessa: acabar com essa "miséria" até o "início de 2014".O programa foi lançado em meados do ano passado com o objetivo de erradicar a pobreza extrema."Quando a gente tem essa preocupação de retirar da miséria (...) estamos não só praticando um ato moral, um ato ético, mas, também, nós estamos olhando para o futurodo Brasil", disse a presidente Dilma em recente discurso em Teresina (PI).Complementar ao Bolsa Família, o benefício do Brasil Carinhoso varia de R$ 2 a R$ 1.140, sendo que esse valor máximo é pago a apenas uma única família, segundo mostradocumento do programa ao qual a reportagem teve acesso. O valor médio do complemento é de R$ 86.Em média, uma família beneficiada pelo Bolsa Família e pelo Brasil Carinhoso recebe R$ 245 ao mês do governo. METADe acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social, há ainda cerca de 600 mil famílias na extrema pobreza em todo o país. Antes do lançamento do Bolsa Família, em 2003, havia 8,5 milhões de famílias nessa situação, segundo a pasta.Economistas ouvidos pela Folha dizem que é preciso levar em consideração outros aspectos, além da renda da família, para se falar em erradicação da miséria.

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"A saída da pobreza, efetivamente, é quando a pessoa tem condições de moradia, vestuário, educação, saúde e emprego para poder se autofinanciar", diz Socorro Lira, coordenadora do doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Piauí (UFPI).Jaíra Alcobaça, também da UFPI, afirma que iniciativas que trazem algum tipo de melhoria de vida são válidas, mas precisam ser encaradas como políticas emergenciais etambém deveriam levar em conta as diferenças regionais.As avaliações remetem à piauiense Luíza. Ela recebeu a Folha na casa de tijolos em quevive há dois anos. O imóvel foi erguido pelo irmão após a casa de taipa desmoronar.Na cozinha, ela tinha pão, dois cocos e um pouco de arroz. "Só não fico sem porque como na casa da minha mãe", diz Luiza.

Frase "A saída da pobreza, efetivamente, é quando a pessoa tem condições de moradia, vestuário, educação, saúde e emprego para poder se autofinanciar"SOCORRO LIRAcoordenadora do doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Piauí

Ex-miseráveis vivem de maneira precária, mas têm o que comerDO ENVIADO AO PIAUÍ

Famílias que nos últimos meses deixaram a miséria com o complemento do Brasil Carinhoso enaltecem Dilma, Lula e o Bolsa Família, enquanto ainda vivem sob uma estrutura precária, sem emprego, porém com mais comida no prato.Esse foi o quadro encontrado pela Folha há duas semanas em diferentes municípios do Piauí, onde conversou com famílias que tecnicamente são ex-miseráveis.Antônia Pereira Galvão, 35, dona de casa em Joaquim Pires (a 229 km de Teresina), recebeu um complemento de R$ 28 no Bolsa Família, que agora atingiu R$ 162 mensaise ajuda a sustentar o marido e os três filhos.

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Ela diz que o aumento é "ajuda que Deus dá" e que o utiliza para comprar comida. A seca impede o marido de fazer bicos na roça.Apesar de dizer que o Bolsa Família melhorou a vida dela "100%", Antônia ainda passa por dificuldades. "Leite para as crianças às vezes falta", conta ela, que pretende votar em Dilma, caso a petista dispute a reeleição em 2014.Na casa ao lado, o agricultor Antônio da Conceição Sousa, 39, a mulher e os sete filhos receberam complemento de R$ 224, chegando a R$ 492 mensais de ajuda federal."O dinheiro do Bolsa Família serviu para botar comida em casa, comprar o material dos meninos", declara.A 23 km dali fica o município de Murici dos Portelas, onde, segundo o IBGE, 48,2% dos 8.464 habitantes vivem na pobreza extrema.Francisca Oliveira, 36, o marido e sete filhos vivem em casa de taipa e dormem em redes com galinhas.A comida, que Francisca diz não faltar depois que o Bolsa Família pulou de R$ 322 paraR$ 422, é feita em um arremedo de fogão de barro. O ambiente cheira a urina.Francisca era agricultora, mas decidiu parar de trabalhar após o aumento no benefício. Questionada pela reportagem, disse: "Acho que não [sou mais miserável]. Melhorou muito minha vida". (DANIEL CARVALHO) Frases "Acho que não [sou mais miserável]. Melhorou muito minha vida"FRANCISCA OLIVEIRAdesempregada "Leite para as crianças às vezes falta"ANTÔNIA PEREIRA GALVÃOdona de casa Outro lado

Programas são bem-sucedidos e estão em fase de 'consolidação', diz ministérioDO ENVIADO AO PIAUÍ Programas de transferência de renda como o Bolsa Família e o seu complemento, o Brasil Carinhoso, são bem-sucedidos, estão ajudando milhões de famílias a deixar a pobreza extrema e, de acordo com o governo federal, se encontram em fase de "consolidação". De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social, uma análise dos valores extremos de complemento de renda provoca uma avaliação distorcida da realidade.O secretário nacional de Renda de Cidadania da pasta, Luís Henrique Paiva, afirma que o número de famílias que recebem R$ 2 e o de que recebem valores acima de R$ 500 é muito pequeno quando levado em consideração o total de 16,4 milhões de beneficiados pelo Brasil Carinhoso (veja mais informações no quadro acima).O valor médio de transferência do Bolsa Família com o complemento do Brasil Carinhoso é de R$ 245.O secretário afirma que, nos últimos dois anos, o governo Dilma Rousseff tomou uma série de medidas voltadas para "atacar" a miséria.Paiva diz que o governo já alcançou resultados, como a redução pela metade da extremapobreza na faixa contemplada pelo Brasil Carinhoso (famílias com crianças de até 15 anos).

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"O momento é de consolidação desse conjunto de medidas", afirma o secretário. SOMENTE RENDAO critério adotado pelo governo para definir quem é miserável leva em consideração apenas a renda das famílias.Para o ministério, outras carências, como acesso a saúde, educação e saneamento básico, por exemplo, estão ligadas à questão financeira.O governo leva em consideração a linha de extrema pobreza que já era adotada pelo Bolsa Família e a de US$ 1,25 por dia, adotada pelo Banco Mundial.Desde maio de 2011, quando Dilma definiu que famílias com renda per capita de até R$70 seriam o público-alvo do combate à miséria, o valor não foi corrigido.No mesmo período, no entanto, os preços dos gêneros alimentícios aumentaram, em média, 12,45%, segundo cálculo da FGV realizado a pedido da Folha.O governo afirma que um eventual reajuste dos benefícios não está em discussão no momento.Segundo o secretário, mesmo após atingir uma renda per capita mensal de ao menos R$ 70,01 e assim deixar estatisticamente a miséria, a família não deixa de integrar outros benefícios.

Análise Linha da pobreza Boa conta, sem truques, inclui mais parâmetros além da rendaLENA LAVINAS ESPECIAL PARA A FOLHA Para 69,4% dos brasileiros, a linha de indigência fixada em R$ 70 mensais para identificar quem é a população miserável é de valor muito baixo. Proporção semelhante,73,1%, julga que, se quiser, o governo tem meios de erradicar a miséria no Brasil.Somos 64% a concordar que o benefício médio de R$ 130 mensais aos beneficiários do Bolsa Família é baixo, o que explica que só um terço da população com mais de 16 anosacredite que o Bolsa Família é eficaz em retirar muita gente da pobreza.Tais números, retirados de levantamento nacional conduzido pelo Instituto de Economiada UFRJ e pelo Departamento de Economia da UFF em fins de 2012, revelam uma percepção sensível e precisa de como são tratados pobres e indigentes no Brasil.Não é preciso muita conta para concluir que o Bolsa Família deveria ser mais efetivo na definição dos parâmetros para estimar a magnitude real e incômoda da miséria.A sensibilidade do governo, talvez parcialmente amputada pelos cortes que ceifam o Orçamento da seguridade social e condenam o sistema de saúde pública, se mostra indiferente àquilo que salta aos olhos de quem mira a realidade brasileira mesmo sem grande expertise técnica. Com bom-senso apenas.Os cortes fazem com que 50% dos domicílios brasileiros não disponham de água tratadae 35% não tenham saneamento adequado.Segundo o IBGE, enquanto 7% da população pode ser considerada vulnerável exclusivamente por falta de renda, o percentual pula para 58,4% se forem adicionados outros déficits que não rendimentos monetários. SEM ATUALIZAÇÃODesde 2009 o governo não atualiza a linha de indigência, que permanece em R$ 70 per capita mensais. Intocável também permanece a linha da pobreza.

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Salários são atualizados, o salário mínimo igualmente, numa progressão que fomenta a redistribuição e reduz as desigualdades.Os benefícios do INSS não escapam à regra da correção do poder de compra.Mas, sem dúvida, manter o valor nominal da linha de indigência quando aumenta a renda média, e quando o IPCA acumulado entre janeiro de 2009 e dezembro de 2012 bate 24,53%, já é uma boa contribuição para reduzir o número e o percentual de indigentes do país. No automático.Atualizada, a linha de indigência valeria hoje R$ 87,17, aumentando o contingente de miseráveis. Ainda assim, seria um valor muito baixo.O Brasil é hoje um país de renda média alta, na rota das grandes mudanças estruturais. Étempo de voltar à discussão pendente sobre como definir com rigor qual o patamar mínimo de bem-estar que a nação solidariamente vai estabelecer. LENA LAVINAS, doutora em economia, é professora associada do Instituto de Economia da UFRJ.

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UOL 04/02/2013 - 6:00 http://achadoseconomicos.blogosfera.uol.com.br/2013/02/04/sozinho-bolsa-familia-nao-elimina-miseria-diz-banco-mundial/

Sozinho, Bolsa Família não elimina miséria, diz Banco Mundial Sílvio Guedes Crespo

•Texto atualizado às 11h44 (acrescentada foto abaixo)

Sueli Dumont recebe Bolsa Família e trabalha em lixão em Jaboatão dos Guararapes, PE

A presidente Dilma Rousseff disse há duas semanas que o país vai erradicar a pobrezaextrema até o início de 2014. Na última sexta-feira, ela reiterou o compromisso e pediu ajuda aos prefeitos para cadastrar a população no programa Bolsa Família.Num momento de economia fraca, vale acrescentara informação de que o dinheiro que as famílias miseráveis recebem diretamente do governo teve papel secundário na elevação da renda dos que saíram dessa situação, conforme aponta um estudo recente doBanco Mundial.Diferentemente do que aconteceu no México e em alguns outros países da América Latina, no Brasil o fator que mais contribuiu para que 17 milhões de pessoas saíssem da pobreza extrema na década passada foi o aumento da renda obtida no próprio trabalho, mostra a pesquisa.Intitulado “A renda do trabalho é responsável pela redução da pobreza?”, o estudo identificou de onde veio o aumento da renda das pessoas que saíram da situação de miséria – entendidas pelo Banco Mundial como aquelas que vivem com menos de US$ 2,50 por dia.

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No caso do Brasil, 52% desse aumento veio do rendimento que as famílias obtiveram com o trabalho; 32% vieram de doações e programas de transferência de renda (como o Bolsa Família). Os 16% restantes se referem a mudanças na composição da família – por exemplo, quando um filho atinge idade de trabalhar e passa a colaborar com a rendado domicílio.“O que contribuiu mais expressivamente [para a redução da pobreza extrema no Brasil] foi a renda do trabalho”, disse ao blog o brasileiro João Pedro Azevedo, economista sênior do Banco Mundial e um dos autores da pesquisa.Segundo ele, as famílias que receberam o benefício, mas não conseguiram ao mesmo tempo aumentar a renda do trabalho, não saíram da miséria; apenas reduziram o grau de extrema pobreza, mas sem superar a faixa de ganhos de US$ 2,50 por dia.Nesse estudo, o Banco Mundial não analisou os possíveis efeitos indiretos das políticas de transferência de renda. Por exemplo, se um vendedor passou a ganhar mais porque seus clientes receberam Bolsa Família e passaram a gastar mais, esse aumento de renda foi registrado apenas como uma conquista dele por meio do próprio trabalho.Pelas contas da instituição, o número de pessoas que vivem com menos de US$ 2,50 pordia passou de 45,5 milhões em 2000 para 28,4 milhões em 2010.América LatinaAs outras grandes economias da América Latina que reduziram a pobreza seguiram um caminho um pouco diferente do Brasil, segundo o estudo. No México e na Argentina, a renda não proveniente do trabalho teve uma importância igual ou até maior do que aquela que vem do emprego, conforme mostra o gráfico abaixo. El Salvador foi o país onde as políticas de transferência de renda tiveram maior impacto.

De onde veio o dinheiro das pessoas que saíram da miséria*

PaísRenda dotrabalho

Renda não proveniente do trabalho(doações, transferências,

programas sociais)

Renda obtida commudanças na composição

da famíliaPanamá 56 35 9Colômbia 55 35 10Honduras 55 8 37Brasil 52 32 16Paraguai 50 -7 57Equador 47 28 25Argentina 40 39 21Costa Rica

34 41 25

Chile 28 40 32México 19 49 32El Salvador

-12 68 44

•• * Os números mostram quanto cada um dos três grupos de fonte de renda contribuiu para o aumento

dos ganhos daqueles de saíram da condição de pobreza extrema

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• Fonte: Azevedo e outros. “Is Labor Income Responsible for Poverty Reduction? A decomposition approach”

Fila de miseráveis vai ser zerada até março, diz DilmaFSP, 05/02/2013Dados oficiais do governo apontam que 600 mil famílias ainda vivem com menos de R$70 por mês Presidente admitiu que cadastros do governo sobre pobreza estão defasados e que número de famílias é maior PAULO GAMA ENVIADO ESPECIAL A ARAPONGAS (PR) A presidente Dilma Rousseff afirmou ontem que até março o governo terá retirado da extrema miséria todas as pessoas que vivem nessa situação no país e que estejam cadastradas pelo governo. Ela, porém, disse ter ciência de que há mais famílias nessa situação que não fazem parte das contas da União."Tiramos, entre 2011 e 2012, mais de 19,5 milhões de pessoas da pobreza extrema. Faltam, pelas nossas contas, muito pouco, mas as nossas contas estão incompletas."E emendou: "Até o mês de março nós vamos zerar o cadastro, não vai ter mais ninguém abaixo da pobreza extrema, mas aí (...) temos de ir atrás dos que faltam, porque sabemosque faltam."Dilma visitou assentamento do MST em Arapongas (330 km de Curitiba).O governo considera extremamente pobres famílias com renda mensal per capita de até R$ 70 -cerca de 600 mil famílias, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social.Reportagem da Folha de domingo mostrou que 13 mil famílias deixaram o cadastro em que constavam como extremamente pobres depois que passaram a receber R$ 2 do programa Brasil Carinhoso. Somados ao que já recebiam do Bolsa Família, esses recursos são suficientes para elevar a renda per capita a mais de R$ 70.O cadastro ao qual se refere a presidente é o Cadastro Único. Atualmente, conta com informações de cerca de 21 milhões de famílias.Para receber o Bolsa Família, por exemplo, a família deve fazer parte desse cadastro, que é consolidado pelo governo federal, mas abastecido pelas prefeituras. Ou seja, se o município não se mexe para localizar e cadastrar famílias pobres, o governo, em Brasília, nem fica sabendo se elas existem.No mês passado, Dilma disse que acabaria com a pobreza extrema até o "início de 2014". De acordo com o Desenvolvimento Social, em 2003, antes do lançamento do Bolsa Família, havia 36 milhões de miseráveis.O programa do governo Lula (2003-2010) tirou 17 milhões dessa condição, segundo dados do governo. Com o programa Brasil Carinhoso, que complementa a renda até quecada pessoa tenha mais de R$ 70 por mês, 16,4 milhões de brasileiros deixaram a extrema pobreza.Ontem, durante o lançamento de um programa de estímulo à industrialização da produção agrícola de assentamentos, Dilma disse que seu governo está "acelerando os passos" para reduzir a desigualdade social no país. Ela visitou o assentamento DorcelinaFolador para lançar programa que vai investir R$ 300 milhões em projetos de industrialização da produção agrícola em assentamentos. Ela disse que um de seus objetivos é "criar uma classe média no campo".

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A miséria dos números que ninguém entende

Posted: 06 Feb 2013 04:22 AM PST

.Sem maiores explicações, Dilma muda dados sobre os extremamente pobres

BRASÍLIA E RECIFE — A promessa da presidente Dilma Rousseff de erradicar a miséria até 2014 continua de pé, mas o

tamanho do desafio mudou — sem maiores explicações por parte do governo. Quando lançou o programa Brasil sem

Miséria, em junho de 2011, Dilma dizia que era preciso resgatar 16,2 milhões de brasileiros da pobreza extrema. O

número tinha origem no censo do IBGE, de 2010. Nas últimas semanas, porém, ela tem afirmado que os programas

sociais já retiraram da miséria 19,5 milhões de pessoas nos últimos dois anos. Ou seja, 3,3 milhões a mais do que o

número informado por ela mesma.

Isso não significa que a pobreza extrema tenha acabado: desde dezembro, Dilma passou a dizer que ainda falta atender,

pelo menos, outros 2,5 milhões de miseráveis. O que elevaria para 22 milhões de pessoas o universo de extremamente

pobres na mira do governo, no atual mandato. Portanto, 5,8 milhões a mais do que os 16,2 milhões de miseráveis

identificados pelo Censo de 2010.

De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, os números usados por Dilma têm origem

no Cadastro Único (CadÚnico), lista oficial da população de baixa renda produzida pelas prefeituras, que são

encarregadas de coletar os dados. Diferentemente do IBGE, que obtém informações para fins estatísticos, o CadÚnico é

a porta de acesso ao Bolsa Família. Os dados do CadÚnico são chamados de registros administrativos e devem ser

atualizados a cada dois anos. De novo, pelas 5,5 mil prefeituras.

O ministério diz que o cadastro foi modernizado ao longo de 2011, e constitui atualmente uma fonte mais apropriada

para medir a “pobreza longitudinal” no país. Assim, quando Dilma afirma que 19,5 milhões de pessoas saíram da

miséria, passando a viver com renda familiar per capita superior a R$ 70, está se referindo aos registros do CadÚnico.

Segundo o ministério, antes do lançamento do Brasil sem Miséria, em 2011, havia 22,1 milhões de extremamente

pobres, conforme o CadÚnico. Na ocasião, porém, o governo optou por utilizar os números do IBGE, que indicavam

16,2 milhões nessa situação.

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O conceito de miséria adotado pelo governo é exclusivamente monetário: famílias com renda por pessoa de até R$ 70

mensais são classificadas como extremamente pobres. É o caso de Rosângela Maria das Neves, de 30 anos, moradora de

uma favela no bairro do Pina, em Recife. Analfabeta, com quatro filhos para criar, ela nunca teve emprego formal, e seu

último trabalho lhe rendia R$ 50 por semana. Foi despedida desde que engravidou e agora, com um bebê de apenas oito

dias, só tem uma fonte de renda: os R$198 que recebe do Bolsa Família.

Sua vida só não é pior porque não paga aluguel. Quando a mãe morreu, deixou uma casa de dois cômodos para a filha.

O chão é de terra batida, falta água encanada e banheiro, mas antes do aterro a situação era pior.

— A cada chuva, as panelas ficavam boiando ao redor da cama e a água batia na canela — lembra.

Ela diz que o dinheiro que recebe do governo mal dá para comer e que, muitas vezes, recorre ao irmão, pescador, para

alimentar a família.

Em meio à dança de números, Dilma prometeu anteontem que o universo remanescente de 2,5 milhões de miseráveis

deixará a pobreza extrema até março. Ela não explicou como isso será feito. Para produzir tamanho resultado em menos

de dois meses, só há um caminho: criar uma nova modalidade de repasse do Bolsa Família ou de seu congênere, o Brasil

Carinhoso, que dá benefícios adicionais ao público do Bolsa Família.

Ex-economista sênior do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Flávio Comin, atualmente

professor na Universidade de Cambridge, no Reino Unido, diz que os dados sobre miseráveis no Brasil são dissonantes:

há divergência até mesmo entre o Censo e a Pnad do IBGE. Ele critica o conceito de miséria adotado pelo governo:

— Todas essas estimativas compartilham o mesmo entendimento de que os pobres são aqueles que sofrem de

insuficiência de renda. Esquecem, assim, que pessoas que estão acima da linha da pobreza oficial, mas que não dispõem

de acesso à saúde ou educação dignas, também deveriam ser considerados pobres — diz Comin, por e-mail.

(colaborou Letícia Lins)

O Globo

ISSO É BRASIL...

Posted: 06 Feb 2013 03:04 AM PST

Psicólogo varreu as ruas da USP para concluir sua tese de mestrado da

'invisibilidade pública'. Ele comprovou que, em geral, as pessoas

enxergam apenas a função social do outro. Quem não está bem posicionado

sob esse critério, vira mera sombra social.

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Plínio Delphino, Diário de São Paulo.

O psicólogo social Fernando Braga da Costa vestiu uniforme e trabalhou

oito anos como gari, varrendo ruas da Universidade de São Paulo. Ali,

constatou que, ao olhar da maioria, os trabalhadores braçais são 'seres

invisíveis, sem nome'. Em sua tese de mestrado, pela USP, conseguiu

comprovar a existência da 'invisibilidade pública', ou seja, uma

percepção humana totalmente prejudicada e condicionada à divisão

social do trabalho, onde enxerga-se somente a função e não a pessoa.

Braga trabalhava apenas meio período como gari, não recebia o salário de

R$ 400 como os colegas de vassoura, mas garante que teve a maior lição

de sua vida:

'Descobri que um simples bom dia, que nunca recebi como gari, pode

significar um sopro de vida, um sinal da própria existência', explica o

pesquisador.

O psicólogo sentiu na pele o que é ser tratado como um objeto e não

como um ser humano. 'Professores que me abraçavam nos corredores da USP

passavam por mim, não me reconheciam por causa do uniforme. Às vezes,

esbarravam no meu ombro e, sem ao menos pedir desculpas, seguiam me

ignorando, como se tivessem encostado em um poste, ou em um orelhão',

diz.

No primeiro dia de trabalho paramos pro café. Eles colocaram uma

garrafa térmica sobre uma plataforma de concreto. Só que não tinha

caneca. Havia um clima estranho no ar, eu era um sujeito vindo de outra

classe, varrendo rua com eles. Os garis mal conversavam comigo, alguns

se aproximavam para ensinar o serviço. Um deles foi até o latão de lixo

pegou duas latinhas de refrigerante cortou as latinhas pela metade e

serviu o café ali, na latinha suja e grudenta. E como a gente estava num

grupo grande, esperei que eles se servissem primeiro. Eu nunca apreciei

o sabor do café. Mas, intuitivamente, senti que deveria tomá-lo, e

claro, não livre de sensações ruins. Afinal, o cara tirou as latinhas de

refrigerante de dentro de uma lixeira, que tem sujeira, tem formiga, tem

barata, tem de tudo. No momento em que empunhei a caneca improvisada,

parece que todo mundo parou para assistir à cena, como se perguntasse:

'E aí, o jovem rico vai se sujeitar a beber nessa caneca?' E eu bebi.

Imediatamente a ansiedade parece que evaporou. Eles passaram a conversar

comigo, a contar piada, brincar.

O que você sentiu na pele, trabalhando como gari?

Uma vez, um dos garis me convidou pra almoçar no bandejão central. Aí

eu entrei no Instituto de Psicologia para pegar dinheiro, passei pelo

andar térreo, subi escada, passei pelo segundo andar, passei na

biblioteca, desci a escada, passei em frente ao centro acadêmico, passei

em frente a lanchonete, tinha muita gente conhecida. Eu fiz todo esse

trajeto e ninguém em absoluto me viu. Eu tive uma sensação muito ruim. O

meu corpo tremia como se eu não o dominasse, uma angustia, e a tampa da

cabeça era como se ardesse, como se eu tivesse sido sugado. Fui almoçar,

não senti o gosto da comida e voltei para o trabalho atordoado.

E depois de oito anos trabalhando como gari? Isso mudou?

Fui me habituando a isso, assim como eles vão se habituando também a

situações pouco saudáveis. Então, quando eu via um professor se

aproximando - professor meu - até parava de varrer, porque ele ia passar

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por mim, podia trocar uma idéia, mas o pessoal passava como se tivesse

passando por um poste, uma árvore, um orelhão.

E quando você volta para casa, para seu mundo real?

Eu choro. É muito triste, porque, a partir do instante em que você está

inserido nessa condição psicossocial, não se esquece jamais.

Acredito que essa experiência me deixou curado da minha doença burguesa.

Esses homens hoje são meus amigos. Conheço a família deles, freqüento a casa

deles nas periferias. Mudei. Nunca deixo de cumprimentar um trabalhador.

Faço questão de o trabalhador saber que eu sei que ele existe.

Eles são tratados pior do que um animal doméstico, que sempre é chamado pelo

nome.

São tratados como se fossem uma 'COISA'