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Metodologia Científica 1 – Prolegômenos 1.1 – O Conhecimento e seus Níveis O homem não age diretamente sobre as coisas. Sempre há um intermediário, um instrumento entre ele e seus atos. Isto também acontece quando faz ciência, quando investiga cientificamente. Ora, não é possível fazer trabalho científico, sem conhecer os instrumentos. E estes se constituem de uma série de termos e conceitos que devem ser claramente distinguidos, de conhecimentos a respeito das atividades cognoscitivas que nem sempre entram na constituição da ciência, de processos metodológicos que devem ser seguidos, a fim de chegar a resultados de cunho científico e, finalmente, é preciso imbuir-se de espírito científico. Se a apropriação é física, sensível, por exemplo, a representação de uma onda luminosa, de um som, o que acarreta uma modificação de um órgão corporal do sujeito cognoscente, tem-se 4

Metodologia Científica - UFJF | Universidade … · Web viewPelo conhecimento o homem penetra as diversas áreas da realidade para dela tomar posse. Ora, a própria realidade apresenta

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Metodologia Científica

1 – Prolegômenos

1.1 – O Conhecimento e seus Níveis

O homem não age diretamente sobre as coisas. Sempre há um intermediário, um instrumento

entre ele e seus atos. Isto também acontece quando faz ciência, quando investiga cientificamente.

Ora, não é possível fazer trabalho científico, sem conhecer os instrumentos. E estes se constituem

de uma série de termos e conceitos que devem ser claramente distinguidos, de conhecimentos a

respeito das atividades cognoscitivas que nem sempre entram na constituição da ciência, de

processos metodológicos que devem ser seguidos, a fim de chegar a resultados de cunho científico

e, finalmente, é preciso imbuir-se de espírito científico.

Se a apropriação é física, sensível, por exemplo, a representação de uma onda luminosa, de

um som, o que acarreta uma modificação de um órgão corporal do sujeito cognoscente, tem-se

um conhecimento sensível. Tal tipo de conhecimento é encontrado tanto em animais como no

homem.

Se a representação não é sensível, o que ocorre com realidades tais como conceitos, verdades,

princípios e leis, tem-se então um conhecimento intelectual.

Pelo conhecimento o homem penetra as diversas áreas da realidade para dela tomar posse.

Ora, a própria realidade apresenta níveis e estruturas diferentes em sua própria constituição.

Assim, a partir de um ente, fato ou fenômeno isolado, pode-se subir até situá-lo dentro de um

contexto mais complexo, ver seu significado e função, sua natureza aparente e profunda, sua

origem, sua finalidade, sua subordinação a outros entes, enfim, sua estrutura fundamental com

todas as implicações daí resultantes.

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Esta complexidade do real, objeto de conhecimento, ditará, necessariamente, formas

diferentes de apropriação por parte do sujeito cognoscente. Estas formas darão os diversos níveis

de conhecimento segundo o grau de penetração do conhecimento e conseqüente posse, mais ou

menos eficaz, da realidade, levando ainda em conta a área ou estrutura considerada.

Ao tratar, por exemplo, do homem, pode-se considerá-lo em seu aspecto externo e aparente e

dizer uma série de coisas que o bom senso dita ou que a experiência cotidiana ensinou; pode-se,

também, estudá-lo com espírito mais sério, investigando experimentalmente as relações

existentes entre certos órgãos e suas funções; pode-se, ainda, questioná-lo quanto a sua origem,

sua liberdade e destino; e, finalmente, pode-se investigar o que dele foi dito por Deus através dos

profetas e de seu enviado, Jesus Cristo.

Têm-se, assim, quatro espécies de considerações sobre a mesma realidade, o homem, e

consequentemente o pesquisador está se movendo dentro de quatro níveis diferentes de

conhecimento. O mesmo pode ser feito com outros objetos de investigação.

Tem-se, então, conforme o caso:

- conhecimento empírico,

- conhecimento científico,

- conhecimento filosófico,

- conhecimento teológico.

1.1.1- Conhecimento Empírico

Conhecimento empírico, também chamado vulgar, é o conhecimento do povo, obtido ao

acaso, após inúmeras tentativas. É ametódico e assistemático.

O homem comum, sem formação, tem conhecimento do mundo material exterior, onde se

acha inserido, e de um certo número de homens, seus semelhantes, com os quais convive. Vê-os

no momento presente, lembra-se deles, prevê o que poderão fazer e ser no futuro. Tem

consciência de si mesmo, de suas idéias, tendências e sentimentos. Cada qual se aproveita da

experiência alheia. Pela linguagem os conhecimentos se transmitem de uma pessoa à outra, de

uma geração à outra.

Pelo conhecimento empírico, o homem simples conhece o fato e sua ordem aparente, tem

explicações concernentes às razões de ser das coisas e dos homens e tudo isso obtido pelas

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experiências feitas ao acaso, sem método, e por investigações pessoais feitas ao sabor das

circunstâncias da vida; ou então haurido no saber dos outros e nas tradições da coletividade; ou,

ainda, tirado da doutrina de uma religião positiva.

1.1.2- O Conhecimento Científico

O conhecimento científico vai além do empírico: por meio dele, além do fenômeno,

conhecem-se suas causas e leis que o regem. É metódico.

“Conhecer verdadeiramente, é conhecer pelas causas”, diz Bacon. Assim, saber que um

corpo abandonado a si cai, que a água sobe num tubo em que se fez vácuo, etc., não constitui

conhecimento científico; só o será se explicar estes fenômenos, relacionando-os com a sua causa

e com sua lei.

Conhecemos uma coisa de maneira absoluta, diz Aristóteles, quando sabemos qual é a

causa que a produz e o motivo porque não pode ser de outro modo; isto é saber por

demonstração; por isso a ciência reduz-se à demonstração.

Daí as características do conhecimento científico:

1) é certo, porque sabe explicar os motivos de sua certeza, o que não ocorre com o

empírico;

2) é geral, isto é, conhece no real o que há de mais universal, válido para todos os casos

da mesma espécie. A ciência, partido do indivíduo procura o que nele há de comum

com os demais da mesma espécie;

3) é metódico, sistemático. O sábio não ignora que os seres e os fatos estão ligados entre

si por certas relações. O seu objetivo é encontrar e reproduzir este encadeamento.

Alcança-o por meio do conhecimento das leis e princípios. Por isso, toda a ciência

constitui um sistema.

Além disso, são ainda propriedades da ciência a objetividade, o desinteresse e o espírito

crítico.

Pode-se dizer que a ciência é um sistema de proposições rigorosamente demonstradas,

constantes, gerais, ligadas entre si pelas relações de subordinação relativas a seres, fatos e

fenômenos da experiência. É um conhecimento apoiado na demonstração e na experimentação. A

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ciência só aceita o que foi provado. Segue o método experimental com seus diversos processos,

desenvolvidos mais adiante.

1.1.3- Conhecimento Filosófico

O conhecimento filosófico distingue-se do científico pelo objeto de investigação e pelo

método. O objeto das ciências são os dados próximos, imediatos, perceptíveis pelos sentidos ou

por instrumentos, pois, sendo de ordem material e física, são por isso suscetíveis de

experimentação (método científico = experimentação). O objeto da filosofia é constituído de

realidades imediatas, não perceptíveis pelos sentidos e por serem de ordem supra-sensível

ultrapassam a experiência (método racional).

Na acepção clássica, a filosofia era considerada como a ciência das coisas por suas causas

supremas. Modernamente, prefere-se falar em filosofar. O filosofar é um interrogar, é um

contínuo questionar a si e à realidade. A filosofia não é algo feito, acabado. A filosofia é uma

busca constante do sentido, de justificação, de possibilidades, de interpretação a respeito de tudo

aquilo que envolve o homem e sobre o próprio homem em sua existência concreta.

Filosofar é interrogar. A interrogação parte da curiosidade. Esta é inata. Ela é

constantemente renovada, pois surge quando um fenômeno nos revela alguma coisa dum objeto e

ao mesmo tempo nos sugere o oculto, o mistério. Este impulsiona o homem a buscar o

desvelamento do mistério.

A filosofia procura compreender a realidade em seu contexto mais universal. Não dá

soluções definitivas para grande número de questões. Habilita, porém, o homem a fazer uso de

suas faculdades para ver melhor o sentido da vida concreta.

1.1.4- O Conhecimento Teológico

Duas são as atitudes que se podem tomar diante do mistério.

A primeira é tentar penetrar nele com o esforço pessoal da inteligência. Mediante a

reflexão e o auxílio de instrumentos, procura-se obter o conhecimento que será científico ou

filosófico.

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A segunda atitude consistirá em aceitar explicações de alguém que já tenha desvendado o

mistério. Implicará sempre numa atitude de fé diante de um conhecimento revelado.

Este conhecimento revelado ocorre quando houver algo oculto ou um mistério, alguém

que o manifesta e alguém que pretende conhecê-lo.

O conhecimento revelado – relativo a Deus – aceito pela fé teológica, constitui o

conhecimento teológico. É aquele conjunto de verdades a que os homens chegaram, não com o

auxílio de sua inteligência, mas mediante a aceitação dos dados da revelação divina. Vale-se, de

modo especial, do argumento de autoridade. São os conhecimentos adquiridos nos Livros

Sagrados e aceitos racionalmente pelos homens, depois de ter passado pela crítica histórica mais

exigente. O conteúdo da revelação, feita a crítica dos fatos aí narrados e comprovados pelos

sinais que a acompanham, reveste-se de autenticidade e de verdade. Passam tais verdades a ser

consideradas como fidedignas, e por isso aceitas. Isto é feito com base na lei suprema da

inteligência: aceitar a verdade, venha donde vier, contanto que seja legitimamente adquirida.

1.2 – O Trinômio: Verdade – Evidência – Certeza

Já foi visto que o problema do conhecimento é, em grande parte, enigmático. O Homem é

cheio de limitações e a realidade que pretende conhecer e dominar é múltipla e complexa. Diante

disto surge a questão: o homem pode conhecer a verdade? O que é verdade?

1.2.1 - A Verdade

Todos falam, discutem e querem estar com a verdade. Nenhum mortal, porém, é o dono

da verdade. Isto porque o problema da verdade radica na finitude do homem de um lado, e na

complexidade e ocultamento do ser da realidade, de outro lado. O ser das coisas e objetos que o

homem pretende conhecer oculta-se e manifesta-se sob múltiplas formas. Aquilo que se

manifesta, que parece em dado momento, não é, certamente a totalidade do objeto, da realidade

investigada. O homem pode apoderar-se e conhecer aquele aspecto do objeto que se manifesta,

que se impõe, que se desvela e isto ainda de modo humano, isto é, imperfeito, pois não entra em

contato direto com objetos, mas apenas com sua representação e impressões que causa.

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Isto, porém, não invalida o esforço humano na busca da verdade, na procura incansável de

decifrar os enigmas do universo. O ser se desvela aqui e acolá, numa e noutra área, com mais ou

menos intensidade, mais para uns que para outros... Pode-se dizer que, em certas áreas, o homem

já entendeu bastante daquilo que o ser é e manifesta: a conquista tecnológica, as viagens espaciais

mostram quanto já foi aprendido e isto graças, certamente, aos instrumentos científicos de que o

homem se serviu para perceber e ver o que os sentidos jamais teriam visto. Mas esta é apenas

uma faceta da realidade, do ser.

O desvelamento do ser das coisas supõe, e isto é inegável, a capacidade do homem em

receber as mensagens, isto implica em atenção, bons sentidos, bons instrumentos. Inútil lembrar

que o método e os instrumentos são a alma de toda a pesquisa científica, rumo à abertura do ser, à

manifestação do ser, ao conhecimento da verdade.

O que é, pois a verdade? É o encontro do homem com o desvelamento, com o

desocultamento e com a manifestação do ser. O ser das coisas se manifesta, torna-se translúcido,

visível ao olhar, à inteligência e à compreensão do homem. Pode-se dizer que há verdade, quando

o homem (inteligência) percebe e diz o ser que se desvela, que se manifesta. Há uma certa

conformidade entre o que o homem julga e diz, e aquilo que do objeto se manifesta.

O objeto, porém, nunca se manifesta totalmente, nunca é inteiramente transparente. Por

outro lado, o homem não é capaz de perceber tudo aquilo que se manifesta e nem lhe é possível

estar de posse plena do objeto de conhecimento; quando muito, pode conhecer os objetos por

suas representações e imagens.

Muitas vezes ocorre, ainda, que o homem, levado por certas aparências e sem o auxílio de

instrumentos adequados, emite juízos precipitados que não correspondem aos fatos e à realidade:

temos então o erro. Tais erros são freqüentes através da História; temos, por exemplo, as

afirmações do geocentrismo, da geração espontânea...

1.2.2 – A Evidência

Tais afirmações erradas decorrem muito mais da atitude precipitada e ignorância do

homem, com relação à natureza do ser que se oculta e se desvela fragmentariamente, do que da

própria realidade.

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A verdade só resulta quando houver evidência. Evidência é manifestação clara, é

transparência, é desocultamento e desvelamento do ser. A respeito daquilo que se manifesta do

ser, pode-se dizer uma verdade. Mas como nem tudo se desvela de um ente, não se pode falar

arbitrariamente sobre o que não se desvelou. A evidência, o desvelamento, a manifestação do ser

é, pois, o critério da verdade.

1.2.3 – A Certeza

Finalmente, a certeza é o estado de espírito que consiste na adesão firme a uma verdade,

sem temor de engano. Este estado de espírito se fundamenta na evidência, no desvelamento do

ser.

Relacionando o trinônimo, poder-se-ia concluir dizendo: havendo evidência, isto é, se o

objeto se desvela ou se manifesta com suficiente clareza, pode-se afirmar com certeza, isto é, sem

temor de engano, uma verdade.

Quando houver evidência ou suficiente manifestação do objeto, o sujeito encontrar-se-á

em outros estados de espírito, o que deve transparecer também na expressão ou na linguagem.

São os casos da ignorância, da dúvida e da opinião.

Ignorância é um estado puramente negativo, que consiste na ausência de todo

conhecimento relativo a qualquer objeto por falta total de desvelamento. A ignorância pode ser:

1) vencível: quando pode ser superada;

2) invencível: quando não pode ser superada;

3) culpável: quando há obrigação de fazê-la desaparecer;

4) desculpável: quando não há obrigação de fazê-la desaparecer.

A dúvida é um estado de equilíbrio entre a afirmação e a negação. A dúvida é espontânea,

quando o equilíbrio entre afirmação e a negação resulta da falta do exame do pró e do contra.

A dúvida refletida é o estado de equilíbrio que permanece após o exame das razões pró e

contra.

A dúvida metódica consiste na suspensão fictícia ou real, mas sempre provisória, do

assentimento a uma asserção tida até então por certa, para lhe controlar o valor.

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A dúvida universal consiste em considerar toda asserção como incerta. É a dúvida dos

céticos.

A opinião se caracteriza pelo estado de espírito que afirma com temor de se enganar. Já se

afirma, mas de tal maneira, que as razões em contrário não dão uma certeza. O valor da opinião

depende da maior ou menor probabilidade das razões que fundamentam a afirmação. A opinião

pode, às vezes, assumir as características da probabilidade matemática. Esta pode ser expressa

sob a forma de uma fração, cujo denominador exprime o número de casos possíveis e cujo

numerador expressa o de casos favoráveis. Por exemplo, havendo numa caixa 6 "tampinhas"

amarelas e 4 brancas, a probabilidade de extrair uma " tampinha" branca será, matematicamente,

4/10.

Só haverá certeza quando o numerador se igualar ao denominador.

A preocupação do cientista é chegar a verdades que possam ser afirmadas com certeza.

1.3 – Formação do Espírito Cientifico

Feita a distinção entre os níveis de conhecimento, esclarecidas as condições da verdade e

do erro, e aprendidas as técnicas da investigação cientifica (veja mais adiante), ainda não será

possível realizar um trabalho científico. É necessário, além disso, ter uma reserva de outras

qualidades que são decisivas para desencadear a verdadeira pesquisa.

Esta atmosfera de seriedade que envolve e perpassa todo o trabalho, só aparece e

transparece se o autor estiver imbuído de espírito científico.

1.3.1- Natureza do Espírito Científico

O espírito científico é, antes de mais nada, uma atitude ou disposição subjetiva do

pesquisador que busca soluções sérias, com métodos adequados, para o problema que enfrenta.

Essa atitude não é inata na pessoa. É conquistada ao longo do tempo da vida, à custa de muitos

esforços e exercícios. Pode e deve ser aprendida, nunca, porém, transmitida.

O espírito científico, na prática, se traduz por uma mente crítica, objetiva e racional.

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A consciência crítica levará o pesquisador a aperfeiçoar seu julgamento e a desenvolver o

discernimento, capacitando-o a distinguir e separar o essencial do acidental, o importante do

secundário.

Criticar é julgar, distinguir, discernir, analisar para melhor poder avaliar os elementos

componentes da questão.

A crítica, assim entendida, não tem nada de negativo. É antes uma tomada de posição, no

sentido de impedir a aceitação do que é fácil e superficial. O crítico só admite o que é suscetível

de prova.

A consciência objetiva, por sua vez, implica no rompimento corajoso com todas as

posições subjetivas, pessoais e mal fundamentadas do conhecimento vulgar. Para conquistar a

objetividade científica, é necessário libertar-se de toda a visão subjetiva do mundo, arraigada na

própria organização biológica e psicológica do sujeito e ainda pelo meio social.

A objetividade é a condição básica da ciência. O que vale não é o que algum cientista

imagina ou pensa, mas aquilo que realmente é. Isto porque a ciência não é literatura.

A objetividade torma o trabalho científico impessoal a ponto de desaparecer, por

completo, a pessoa do pesquisador. Só interessa o problema e a solução. Qualquer um pode

repetir a mesma experiência, em qualquer tempo, e o resultado será sempre o mesmo, porque

independe das disposições subjetivas.

A objetividade do espírito científico não aceita meias soluções ou soluções apenas

pessoais. O “eu acho”, o “creio ser assim” não satisfazem a objetividade do saber.

Finalmente, o espírito científico age racionalmente. As únicas razões explicativas de uma

questão só podem ser intelectuais ou racionais.

As “razões” que a razão desconhece, as “razões” da arbitrariedade, do sentimento e do

coração nada explicam nem justificam no campo da ciência.

1.3.2 – Qualidades do Espírito Científico

Além das propriedades fundamentais, já referidas, poder-se-iam acrescentar outras tantas

qualidades de ordem intelectual e moral que o espírito científico implica.

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Como virtude intelectual ele se traduz no senso de observação, no gosto pela precisão e

pelas idéias claras, na imaginação ousada, mas regida pela necessidade da prova, na curiosidade

que leva a aprofundar os problemas, na sagacidade e poder de discernimento.

Moralmente, o espírito científico assume a atitude de humildade e de reconhecimento de

suas limitações, da possibilidade de certos erros e enganos.

É imparcial. Não torce os fatos. Respeita escrupulosamente a verdade.

O possuidor do verdadeiro espírito científico cultiva a honestidade. Evita o plágio. Não

colhe como seu o que outros plantaram.

Tem horror às acomodações. É corajoso para enfrentar os obstáculos e os perigos que uma

pesquisa possa oferecer.

Finalmente, o espírito científico não reconhece fronteiras. Não admite nenhuma

intromissão de autoridades estranhas; ou limitações em seu campo de investigação. Defende o

livre exame dos problemas.

A honestidade do cientista está relacionada, unicamente, com a verdade dos fatos que

investiga.

1.3.3 – Importância do Espírito Científico

Diante do exposto, é desnecessário encarecer a importância do espírito científico. O

universitário, por exemplo, consciente de sua função na Universidade irá procurar imbuir-se

desse espírito científico, aperfeiçoando-se nos métodos de investigação e aprimorando suas

técnicas de trabalho. Os conhecimentos científicos que vai adquirir, os bons ou maus mestres que

vai enfrentar não constituirão o essencial da vida acadêmica. O essencial é, todos concordam

nisto, aprender como trabalhar, como enfrentar e solucionar os problemas que se apresentam não

só na Universidade, mas principalmente na vida profissional. E isto não é adquirir conhecimentos

científicos feitos, fórmulas mágicas para todos os males, mas sim hábitos, consciência e espírito

preparado no emprego dos instrumentos que levarão a soluções de problemas. Estas sempre se

apresentarão, na carreira profissional, com novos matizes, de tal forma que as soluções feitas,

porventura aprendidas na Universidade, serão inadequadas. Urge então apelar para o espírito de

criatividade e de iniciativa que, aliadas ao espírito científico, adquirido ao longo dos estudos

universitários, irão achar a solução mais indicada que as circunstâncias exigem.

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Aqui vale o ditado: ao pobre que bater à porta não se dá o peixe, mas a linha e o anzol. O

peixe resolve a situação presente, mas a linha e o anzol poderão resolver o problema, em

definitivo.

Por outro lado, a ciência, hoje em dia, não se resume na criatividade de um gênio isolado

que faz descobertas decisivas. A pesquisa científica se apresenta como um edifício, da dimensão

dos arranha-céus, que supõe a mobilização de um exército de técnicos e inventores, trabalhando

em equipes disciplinadas e que dispõe de orçamentos da importância de um tesouro de Estado.

Como se filiar a tal exército sem a mentalidade e o espírito que o anima?

1.4 – Paradigmas de Pesquisa

A pesquisa investiga o mundo em que o homem vive e o próprio homem. Para esta atividade,

o investigador recorre à observação e à reflexão que faz sobre os problemas que enfrenta, e à

experiência passada e atual dos homens na solução destes problemas, a fim de munir-se dos

instrumentos mais adequados à sua ação e intervir no seu mundo para construí-lo adequado à sua

vida.

Nessa tarefa, confronta-se com todas as forças da natureza e de si próprio, arregimenta

todas as energias da sua capacidade criadora, organiza todas as possibilidades da sua ação e

seleciona as melhores técnicas e instrumentos para descobrir objetos que transformem os

horizontes da sua vida. Transformar o mundo, criar objetos e concepções, encontrar explicações e

avançar previsões, trabalhar a natureza e elaborar as suas ações e idéias, são fins subjacentes a

todo esforço de pesquisa.

Considera-se que, ao longo do tempo, a ciência estrutura um conjunto de preceitos,

noções e processos que caracterizam os procedimentos dominantes em uma comunidade

científica nacional ou internacional, em um aspecto particular da ciência durante um período de

tempo, que é revolucionado quando um ou vários pesquisadores demonstram as anomalias de

uma ciência normal e põem em crise o universo de certezas, obrigando a comunidade toda a

repensar os fatos e teorias explicativas, como se pode atestar na astronomia, com Ptolomeu,

Corpérnico, Galileu ou, na física, com Aristóteles, Newton, Einstein. O paradigma da pesquisa

dominante envolve uma concepção e esta estabelece os critério de definição e de formulação de

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um problema a ser pesquisado, implicando uma abordagem e os processos de seleção do

problema.

2– O Método Científico

2.1– Noção e Importância do Método

Em seu sentido mais geral, o método é a ordem que se deve impor aos diferentes

processos necessários para atingir um fim dado ou um resultado desejado. Nas ciências, entende-

se por método o conjunto de processos que o espírito humano deve empregar na investigação e

demonstração da verdade.

O método não se inventa. Depende do objeto da pesquisa. Os sábios, cujas investigações

foram coroadas de êxito, tiveram o cuidado de anotar os passos percorridos e os meios que os

levaram aos resultados. Outros, depois deles, analisaram tais processos e justificaram a eficácia

dos mesmos. Assim, tais processos, empíricos no início, transformaram-se gradativamente em

métodos verdadeiramente científicos.

Deve-se disciplinar o espírito, excluir das investigações o capricho e o acaso, adaptar o

esforço às exigências do objeto a ser estudado, selecionar os meios e processos mais adequados.

Tudo isso é dado pelo método. Assim, o bom método torna-se fator de segurança e economia.

Muitas vezes, um espírito medíocre guiado por um bom método faz mais progresso nas

ciências que outro mais brilhante que vai ao acaso.

Fontenelle assim exaltou o método: “A arte de descobrir a verdade é mais preciosa que a

maioria das verdades que se descobrem”.

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Evidentemente, o método não substitui o talento, a inteligência do cientista. Ele tem

também os seus limites, não ensina a encontrar as grandes hipóteses, as idéias novas e fecundas.

Isto depende do gênio e da reflexão do cientista.

2.2 – Método Científico

Existem autores que identificam a ciência com o método, entendido como um modo

sistemático de explicar um grande número de ocorrências semelhantes.

O método científico quer descobrir a realidade dos fatos, e estes, ao serem descobertos,

devem, por sua vez, guiar o uso do método. Entretanto como já foi dito, o método é apenas um

meio de acesso: só a inteligência e a reflexão descobrem o que os fatos realmente são.

O método científico segue o caminho da dúvida sistemática, metódica, que não se

confunde com a dúvida universal dos céticos, que é impossível. O cientista, sempre que lhe fata a

evidência, como arrimo, precisa questionar e interrogar a realidade.

O método científico, mesmo aplicado no campo das ciências sociais, deve ser aplicado de

modo positivo, e não de um modo normativo, isto é, a pesquisa positiva deve preocupar-se com o

que é e não com o que se pensa que deve ser.

Toda investigação nasce de um problema observado ou sentido, de tal modo que não pode

prosseguir, a menos que se faça uma seleção da matéria tratada. Esta seleção requer alguma

hipótese ou pressuposição que irá guiar e, ao mesmo tempo, delimitar o assunto a ser investigado.

Daí o conjunto de processos ou etapas de que se serve o método científico, tais como a

observação e coleta de todos os dados possíveis, a hipótese que procura explicar provisoriamente

todas as observações de maneira simples e viável, a experimentação que dá ao método científico

também o nome de método experimental, a indução da lei que fornece a explicação ou o

resultado de todo o trabalho da investigação, a teoria que insere o assunto tratado num contexto

mais amplo. O método científico aproveita ainda a análise e a síntese, os processos mentais da

dedução e indução, processos esses comuns a todo o tipo de investigação, quer experimental,

quer racional. Em suma, método científico é a lógica geral tácita ou explicitamente empregada

para apreciar os méritos de uma pesquisa.

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É oportuno distinguir, aqui, método e processo. Por método entende-se o dispositivo

ordenado, o procedimento sistemático, em plano geral. O processo (a técnica), por sua vez, é a

aplicação específica do plano metodológico e a forma especial de o executar. Comparando,

poder-se-á dizer que a relação existente entre método e processo é a mesma, que existe entre

estratégica e tática. O processo está subordinado ao método e lhe é auxiliar imprescindível.

2.3 – Processos do Método Científico

O método se concretiza nas diversas etapas ou passos que devem ser dados para

solucionar um problema. Esses passos são as técnicas ou processos.

Os objetivos de investigação determinam o tipo de método a ser empregado, a saber: o

experimental ou o racional. Um e outro emprega técnicas específicas como também técnicas

comuns a ambos.

Pode-se dizer que a maioria das técnicas que compõem o método científico e racional são

comuns, embora devam adaptar-se ao objeto de investigação.

Por isso, as técnicas ou processos que, a seguir, serão desenvolvidos, dizem respeito ao

método experimental e indiretamente, com as adaptações que se impõem, ao método racional.

2.3.1. Observação

Observar é aplicar atentamente os sentidos a um objetivo, para dele adquirir um

conhecimento claro e preciso.

A observação é de importância capital nas ciências. É dela que depende o valor de todos

os outros processos. Sem a observação o estudo da realidade e de suas leis reduzir-se-á sempre à

simples conjetura e adivinhação. Para o bom êxito da observação exigem-se certas condições.

A – Condições Físicas

Órgãos são, que possam ter sensações normais e corretas.

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Bons instrumentos são necessários, porque os sentidos não bastam sempre para satisfazer

o rigor da ciência. É preciso armar os cientistas de instrumentos:

1) que lhes aumentem o alcance, por exemplo, o microscópio, o telescópio, etc.;

2) que lhes aumente a precisão, e os ajudem a medir com rigor os diversos fenômenos

observados: a duração, o peso, a temperatura, etc.;

3) que supram, até certo ponto, os próprios sentidos, apontando e registrando os

fenômenos com sua intensidade variável. Tais são os aparelhos registradores, as

chapas fotográficas.

B – Condições Intelectuais

Curiosidade: “Requer-se muita filosofia, diz J.J. Rousseau, para observar o que se vê

todos os dias”.

Sagacidade: saber discernir os fatos significativos.

C – Condições Morais

Paciência, para resistir à precipitação natural que nos leva sempre a concluir antes do

tempo.

Coragem, que sabe enfrentar o perigo para colher do fato certos fenômenos raros ou

decisivos.

Imparcialidade, isto é, a libertação de toda a preocupação com o resultado, o respeito

escrupuloso e o amor apaixonado pela verdade.

D – Regras da Observação

Deve ser atenta.

Deve ser precisa. Para isso é preciso conseguir dar valores numéricos a tudo quanto no

fenômeno observado é suscetível de medida quantitativa. Daí a importância que assume as

medidas no método científico.

Deve ser sucessiva e metódica.

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2.3.2 – Hipótese

Em termos gerais a hipótese consiste em supor conhecida a verdade ou explicação que se

busca. Em linguagem científica a hipótese eqüivale, habitualmente, à suposição verossímil,

depois comprovável ou denegável pelos fatos, os quais hão de decidir, em última instância, da

verdade ou falsidade que se pretendem explicar. Ou a hipótese é a suposição de uma causa ou de

uma lei destinada a explicar provisoriamente um fenômeno até que os fatos a venham contradizer

ou afirmar.

Para Meyerson, as hipóteses são alguma coisa mais que um andaime destinado a

desaparecer quando o edifício (das ciências) está construído; têm um valor próprio e

correspondem, certamente, a alguma coisa bem profunda e bastante essencial na própria natureza.

As hipóteses têm como função:

1) prática: orientar o pesquisador, dirigindo-o na direção da causa provável ou da lei que

se procura;

2) teórica: coordenar e completar os resultados já obtidos, agrupando-os num conjunto

completo de fatos, a fim de facilitar a sua inteligibilidade e estudo.

Podemos obter hipóteses ou por dedução de resultados já conhecidos, ou pela experiência.

Neste caso, são indutivas, se a suposta causa do fenômeno é um dos seus antecedentes, que

parece apresentar todos os caracteres de antecedentes causal; são analógicas, quando são

inspiradas por certas semelhanças entre o fenômeno que se quer explicar e outro já conhecido.

Praticamente, não há regras para descobrir as hipóteses. Não se descobrem, também, por

obra do acaso, mas são fruto do gênio científico. Há, contudo, certas condições que ajudam na

descoberta: o próprio curso da pesquisa, a analogia, a indução, a dedução, as reflexões.

Natureza da hipótese:

1) não deve contradizer nenhuma verdade já aceita, ou explicada;

2) deve ser simples, isto é, o sábio, entre várias hipóteses, deve escolher a que lhe parece

menos complicada;

3) deve ser sugerida e verificável pelos fatos: “Não invento hipóteses”, dizia Newton.

2.3.3 – Experimentação

19

A experimentação consiste no conjunto de processos utilizados para verificar as hipóteses.

Difere da observação porque obedece a uma idéia diretriz e não, simplesmente, porque implica na

intenção do sábio em vista de modificar os fenômenos. A observação, de fato, pode comportar

também uma tal intervenção: chama-se, então, observação ativa ou provocada, mas é anterior à

formulação da hipótese.

A idéia geral que governa os processos de experimentação é a seguinte: consistindo a

hipótese, essencialmente, em estabelecer uma relação de causa e efeito ou de antecedente e

conseqüente entre dois fenômenos, trata-se de descobrir se realmente B (suposto efeito ou

conseqüente) varia cada vez que se faz variar A (suposta causa ou antecedente) e se varia nas

mesmas proporções.

O princípio geral em que se fundamentam os processos da experimentação é o do

determinismo, que se anuncia assim: nas mesmas circunstâncias, as mesmas causas produzem os

mesmo efeitos – ou ainda – as leis da natureza são fixas e constantes.

Regras que Bacon sugeriu para a experimentação:

1) Alargar a experiência: é aumentar, pouco a pouco e tanto quanto possível, a

intensidade da suposta causa, para ver se a intensidade do fenômeno (= efeito) cresce

na mesma proporção.

2) Variar a experiência: é aplicar a mesma causa a objetos diferentes.

3) Inverter a experiência: consiste em aplicar a causa contrária da suposta causa, a fim

de ver se o efeito contrário se produz. Esta contraprova experimental faz suceder as

exigências negativas às positivas. Assim, depois de conhecer a água pela análise,

inverte-se a experiência, fazendo a síntese a partir do hidrogênio e do oxigênio.

4) Recorrer aos casos da experiência. Por vezes, é preciso recorrer aos casos da

experiência de ensaio, “a fim de procurar pescar em águas turvas”, como diz Claude

Bernarde.

2.3.4 – Indução

A indução e a dedução são, antes de mais nada, formas de raciocínio ou de argumentação

e, como tais, são formas de reflexão e não de simples pensamentos.

20

O pensamento alimenta-se da realidade externa e é produto direto da experiência. O ato de

pensar caracteriza-se por ser dispersivo, natural e espontâneo. A reflexão, porém, requer esforço e

concentração voluntária. É dirigida e planificada. A conclusão de raciocínio constitui o último elo

de uma cadeia, o período final de um ciclo de operações que se condicionam necessariamente.

Freqüentemente, prefere-se pensar os problemas em vez de raciocinar sobre eles,

confundindo a divagação irresponsável com a reflexão sistemática.

O raciocínio é algo ordenado, coerente e lógico, podendo ser dedutivo ou indutivo.

Na indução, a conclusão está para as premissas, como o todo está para as partes. De

verdades particulares, concluímos verdades gerais. Exemplos: Terra, Marte, Vênus, Saturno, são

todos planetas. Ora, a Terra, Marte, Vênus, Saturno, etc. não brilham com luz própria. Logo os

planetas não brilham com luz própria.

O argumento indutivo baseia-se na generalização de propriedades comuns a certo número

de casos, até agora observados, a todas as ocorrências de fatos similares que se verificam no

futuro. O grau de confirmação dos enunciados induzidos depende das evidências ocorrentes.

A indução e a dedução são processos que se complementam. Por isso, a indução reforça-

se bastante pêlos argumentos dedutivos extraídos de outras disciplinas que lhe são correlatas ou

afins. Na prática, recorre-se a ambos estes instrumentos para demostrar a verdade das proposições

submetidas à análise.

Para que as conclusões da indução sejam verdadeiras o mais freqüentemente possível e

tenham um maior grau de sustentação, podem-se acrescentar ao argumento evidências adicionais,

sob a forma de premissas novas que figuram ao lado das premissas inicialmente consideradas. Já

que a conclusão de um argumento indutivo pode ser falsa, mesmo quando são verdadeiras as

premissas, a evidência adicional pode favorecer a percepção, com mais precisão, se a conclusão

é, de fato, verdadeira.

Não é entretanto, a repetição da experiência ou o grande número de observações que

conduz à conclusão. Basta uma experiência para autorizar a concluir do fenômeno para lei. Se for

repetida a experiência, não é por desconfiar da experiência. Basicamente, a repetição é uma

simples verificação da primeira prova e não uma condição necessária da indução.

Espécies de indução:

21

1) Indução formal (de Aristóteles). Eqüivale ao inverso da dedução e é submetida

unicamente às leis do pensamento, e tem como ponto de partida todos os casos de uma

espécie ou de um gênero e não apenas alguns. Por exemplo:

Os corpos A,B,C, D, atraem o ferro;

Ora, os corpos A,B,C, D são todos ímãs;

Logo, os ímãs atraem o ferro.

Neste tipo de indução, não há propriamente uma inferência, mas uma simples substituição

de uma coleção de termos particulares por um termo equivalente. Este processo é indutivo

apenas na forma, visto que realmente passa do mesmo ao mesmo, por ser a soma das partes

igual ao todo. Esse o motivo pelo qual a indução formal é de pouco uso.

2) Indução científica (de Bacon). É o raciocínio pelo qual conclui-se de alguns casos

observados pela espécie que os compreende e a lei geral que os rege. Ou, é o processo que

generaliza a relação de causalidade descoberta entre dois fenômenos e da relação causal

conclui a lei. Verifica-se, por exemplo, certo número de vezes que o óxido de carbono

paralisa os glóbulos sangüíneos; desta observação infere-se que sempre, dadas as mesmas

condições, o óxido de carbono paralisará os glóbulos sangüíneos.

Esta indução é a alma das ciências experimentais. Sem ela a ciência não seria outra coisa

senão um repositório de observação sem alcance.

Valor e legitimidade da indução científica:

Deve-se recorrer a algum princípio que dê às verdades induzidas o caráter de necessidade

e generalidade que as torne independentes do tempo e do espaço. Este princípio é o princípio das

leis. Formula-se de várias maneiras: a natureza rege-se por leis – as causas atuam de maneira

uniforme - as mesmas causas produzem os mesmo efeitos – toda relação de causalidade é

constante.

O raciocínio indutivo pode-se exprimir sob a forma de um silogismo em que o princípio

das leis é a premissa maior. Exemplo: as relações de causalidade são constantes; ora, verificou-se

um relação causal entre calor e dilatação; logo, é constante esta relação: sempre e em toda parte,

o calor dilata os corpos.

22

Não é do número necessariamente restrito dos fatos observados que se infere a

generalidade e a constância da relação, como algumas vezes se objeta, mas do princípio

formulado na premissa maior que assegura que, sendo todas as relações da causalidade

constantes, também o será a que foi descoberta.

Regras da Indução:

1) Deve-se estar seguro de que a relação que se pretende generalizar seja verdadeiramente

essencial, isto é, relação causal quando se trata de fatos, ou relação da coexistência necessária

de duas formas, quando se trata de seres ou coisas. Assim, sendo uma relação de dependência

necessária a que une o calor à dilatação., tem-se o direito de generalizar a lei segundo a qual o

calor sempre dilata os corpos.

2) É necessário que os fatos, a que se estende a relação, sejam verdadeiramente similares aos

fatos observados e, principalmente, que a causa se tome no sentido total e completo.

2.3.5 – Dedução

A dedução é a argumentação que torna explícitas as verdades particulares contidas em

verdades universais. O ponto de partida é o antecedente que afirma uma verdade universal, e o

ponto de chegada é o conseqüente, que afirma uma verdade menos geral ou particular, contida

implicitamente no primeiro.

A técnica desta argumentação consiste em construir estruturas lógicas, através do

relacionamento entre antecedente e conseqüente, entre hipótese e tese, entre premissa e

conclusão. O cerne da dedução é a relação lógica que se estabelece entre proposições,

dependendo o seu vigor do fato de a conclusão ser sempre verdadeira, desde que as premissas

também o sejam. Assim, admitindo as premissas, deve-se admitir também a conclusão, isto

porque toda a afirmação ou conteúdo fatual da conclusão já estava, pelo menos implicitamente,

nas premissas.

23

O processo dedutivo, por um lado, leva o pesquisador do conhecido ao desconhecido com

pouca margem de erro, mas, por outro lado, é de alcance limitado, pois a conclusão não pode

assumir conteúdos que excedam o das premissas. Concluir daí que a dedução é infrutífera e

estéril, é não perceber a seu verdadeiro significado. Para desfazer tal impressão basta ver, por

exemplo, o procedimento do matemático. Seus argumentos são, na maior parte, dedutivos.

Exemplos familiares podem ser recolhidos da Geometria Euclidiana do plano. Na geometria os

teoremas são demonstrados a partir de axiomas e postulados. O método de demonstração é

deduzir os teoremas (conclusão) dos axiomas e postulados (premissas). O método da dedução

garante que os teoremas devem ser verdadeiros se são verdadeiros os axiomas e os postulados.

Embora o conteúdo dos teoremas já esteja fixado nos axiomas e postulados, esse conteúdo está

longe de ser óbvio. É verdadeiramente iluminadora a tarefa de tomar explícito o conteúdo de

axiomas e postulados.

E isto é válido para os demais casos de dedução. Como regras gerais, quanto à validade

das conclusões do processo dedutivo, são apontados duas:

1) Da verdade do antecedente segue-se a verdade do conseqüente. Por exemplo: todos os

animais respiram. Ora, o mosquito é animal. Logo, o mosquito respira.

2) Da falsidade do antecedente pode seguir-se falsidade ou a veracidade do conseqüente.

Por exemplo: todos os animais são quadrúpedes. Ora, o cisne é animal. Logo, o cisne é

quadrúpede (conseqüente falso). Ou então: toda árvore é racional. Ora, Gilberto é árvore. Logo,

Gilberto é racional (conseqüente verdadeiro).

O raciocínio dedutivo pode ser expresso pelo silogismo, que poderá ter forma:

a) Categórica: todas as crianças têm pais. Ora, Gilberto é criança. Logo, Gilberto tem

pais.

b) Hipotética: se Henrique estuda, passará nos exames. Ora, Henrique estuda. Logo,

passará nos exames.

No Raciocínio dedutivo a conclusão ou conseqüente está contido nas premissas ou

antecedentes, como a parte no todo.

2.3.6 – Análise e Síntese

24

René Descartes, procurando traçar normas gerais e indispensáveis a qualquer trabalho

científico, formulou quatro regras:

1) Nunca aceitar como verdadeira qualquer coisa, sem a conhecer como tal. Evitar

cuidadosamente a precipitação e a prevenção. (É a evidência como critério da

verdade).

2) Dividir cada uma das dificuldades a abordar, no maior número possível de parcelas

que forem necessárias, para melhor resolvê-las. (É a análise)

3) Conduzir por ordem os pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais

fáceis de conhecer, para subir pouco a pouco, gradualmente, até ao conhecimento dos

mais complexos. (É a síntese).

4) Fazer sempre enumerações tão completas e revisões tão gerais que dê certeza de nada

omitir. ( É a condição comum e a garantia da análise e síntese).

A análise é a decomposição de um todo em suas partes. A síntese é a reconstituição do

todo decomposto pela análise. Ou, por outra: a análise é o processo que parte do mais simples

para o menos simples.

A análise e a síntese são necessárias. Qual a razão?

O grande obstáculo que é preciso vencer nas ciências é, por um lado, a complexidade dos

objetos e, por outro lado, a limitação da inteligência humana. A inteligência não é capaz de tirar

da complexidade de idéias, de seres e de fatos, relações de causa e efeito e as relações entre

princípio e conseqüência. Por isso há necessidade de analisar, de dividir as dificuldades para

melhor resolvê-las.

Sem a análise todo o conhecimento é confuso e superficial. Sem a síntese é fatalmente

incompleto.

O conhecimento de um objeto não se limita ao conhecimento minucioso de suas diversas

partes. Quer ainda apreender o lugar que tem no conjunto e a respectiva parte que toma na ação

global. Por isso, à análise deve seguir-se a síntese.

2.3.7 – Teoria

O emprego usual do termo teoria opõe-se ao da prática. Neste sentido a teoria refere-se

ao conhecimento (= saber, conhecer) em oposição à prática como ação (= agir, fazer).

25

Aqui, entretanto, o termo teoria é empregado para significar um resultado a que tendem as

ciências. Estas não se contentam apenas com a formulação das leis. Ao contrário, determinadas as

leis, procuram interpretá-las ou explicá-las.

Assim, surgem as chamadas teorias cientificas, que reúnem determinada número de leis

particulares sob a forma de uma lei superior e mais universal.

Ou conforme Lahr: “Um conjunto de leis particulares, mais ou menos certas, ligadas por

uma explicação comum, toma o nome de sistema ou teoria, por exemplo o sistema de Laplace, a

teoria da evolução...”

Ou ainda segundo Luís Washington Vita: “O sentido primário do vocábulo teoria é

contemplação, sendo então a teoria definida como uma visão inteligível ou uma contemplação

racional.

Atualmente, porém, teoria designa uma construção intelectual que aparece como

resultado do trabalho filosófico ou científico ( ou ambos). A teoria não pode ser reduzida, como

alguns pretendem, à hipótese, mas é certo que as hipóteses – enquanto supostos fundamentais –

não podem ficar excluídas da construção teorética”.

A teoria se distingue da hipótese, porquanto esta é verificável experimentalmente,

enquanto aquela não. Todas as proposições da teoria se integram no mundo do discurso

(conhecimento), enquanto a hipótese comprova a sua validade, submetendo-se ao teste da

experiência.

A teoria é interpretativa, enquanto a hipótese resulta em explicação através de leis

naturais.

A teoria formula necessariamente hipóteses, ao passo que estas subsistem

independentemente dos enunciados teoréticos.

Função das teorias:

- coordenam e unificam o saber científico;

- são instrumentos preciosos do sábio, sugerindo-lhe analogias até então ignoradas e

possibilitando-lhe, assim, novas descobertas.

Valor das Teorias:

- Até meados do século XIX, os cientistas, de um modo geral, admitiam que as teorias não

só explicavam os fatos, mais ainda eram uma apreensão da própria natureza ontológica

(última) da realidade.

26

- A partir dos meados do século XIX para cá, restringiram o valor explicativo da teoria.

Assim:

E. Mach: as teorias apenas orientam o sábio com economia de pensamento.

Henri Poincaré: as teorias não são verdadeiras nem falsas, são cômodas.

Pierre Duhem: as teorias servem apenas para classificar os fatos e as leis

- Atualmente, a tendência é assumir uma posição intermediária entre os dois extremos.

Segundo o realismo moderado (explicação filosófica), as teorias científicas são

explicativas, isto é, expressam a essência da natureza sensível, visto que toda ciência tem por

objetivo o que as coisas são ou suas essências. Contudo, não expressam a essência nela mesma

(como pretende a filosofia), e sim em seus sinais observáveis e experimentais.

2.3.8 – Doutrina

A ciência visa explicar os fenômenos. Para isto observa, analisa, levanta hipóteses e as

verifica em confronto com os fatos pela experimentação, induz a lei, colocando-a num contexto

mais amplo, através de teorias.

São operações que se desenvolvem num ambiente de objetividade, de indiferença e de

neutralidade.

A doutrina, porém, propõe diretrizes para a ação. É a priori que o autor fixa o fim que

espera atingir e, para elaborar a doutrina ajustada a esse fim, vai buscar seus argumentos nas mais

variadas fontes. Numa doutrina há idéias morais, posições filosóficas e políticas e atitudes

psicológicas. Há também, subjacentes, interesses individuais, interesses de classes ou nações.

A doutrina é, assim, um encadeamento de correntes, de pensamentos que não se limitam a

constatar e a explicar os fenômenos, mas apreciam-nos em função de determinadas concepções

éticas e, à luz destes juízos, preconizam certas medidas e proíbem outras.

A doutrina situa-se na linha divisória dos problemas do espírito e dos fatos (teoria =

ciência x ação) e, porque largamente assentada nesses dois domínios, permite perceber a síntese.

27

3– A Pesquisa: Noções Gerais

3.1– Características do método de pesquisa científica

Van Dalen e Meyer lembram que “o trabalho de pesquisa não é de natureza mecânica,

mas requer imaginação criadora e iniciativa individual”. E acrescentam: “entretanto, a pesquisa

não é uma atividade feita ao acaso, porque todo o trabalho criativo pede o emprego de

procedimentos e disciplinas determinadas”,

Talvez uma das maiores dificuldades, de quem se inicia na pesquisa científica, seja a de

imaginar que basta um roteiro minucioso, detalhado, para seguir e logo a pesquisa estará

realizada. Na verdade, o roteiro existe: são as diversas fases do método. Entretanto, uma pesquisa

devidamente planejada, realizada e concluída, não é um simples resultado automático de normas

cumpridas ou roteiros seguidos. Mas deve ser considerada como obra de criatividade, que nasce

da intuição do pesquisador e recebe a marca de sua originalidade, tanto no modo de empreendê-la

como no de comunicá-la. As fases do método podem ser vistas como indicadoras de um caminho,

dando, porém, a cada um a oportunidade de manifestar sua iniciativa e seu modo próprio de

expressar-se.

28

Fazer uma pesquisa científica não é fácil. Além da iniciativa e originalidade de que já

falamos, exige do pesquisador persistência, dedicação ao trabalho, esforço contínuo e paciente,

qualidades que tomam sua feição específica e são reconhecidas por cada um em si mesmo,

quando alguém vivencia a sua própria experiência de pesquisador. E, no entanto, é uma das

atividades mais enriquecedoras para o ser humano e, de modo geral, para a ciência.

Embora enfatizando o valor da criatividade, convém lembrar que a pesquisa científica não

pode ser fruto apenas da espontaneidade e intuição do indivíduo, mas exige submissão tanto aos

procedimentos do método como aos recursos da técnica. O método é o caminho a ser percorrido,

demarcado, do começo ao fim, por fases ou etapas. E como a pesquisa tem por objetivos um

problema a ser resolvido, o método serve de guia para o estudo sistemático do enunciando,

compreensão e busca de solução do referido problema. Examinando mais atentamente, o método

da pesquisa científica não é outra coisa do que a elaboração, consciente e organizada, dos

diversos procedimentos que nos orientam para realizar o ato reflexivo, isto é, a operação

discursiva de nossa mente.

Whitney nos recorda que costumamos utilizar o processo reflexivo quando nos

encontramos diante de uma situação, que consideramos problema e sentimos a exigência de

resolvê-lo. Em atos mais simples, como o de amarrarmos os cordões do sapato, barbearmo-nos,

procedermos diante de amigos, estranhos ou inimigos, o nosso procedimento é espontâneo e

reagimos sem reflexão ou quase sem reflexão. Estes mesmos atos, hoje tão fáceis e familiares,

foram considerados por nós, em outros tempos, como problemas mais ou menos complexos, que

tivemos de resolver.

3.2– Conceito de Pesquisa

3.2.1– Conceito

Define-se a pesquisa como uma atividade voltada para a solução de problemas. Seu

objetivo consiste em descobrir respostas para perguntas, através do emprego de processos

científicos.

Convém distinguir, quanto à natureza da pesquisa, o trabalho científico original, chamado

também “memória científica original”, do resumo de assunto.

29

3.2.2– Trabalho Científico Original

Entende-se por trabalho científico original aquela pesquisa, cujos resultados venham

representar novas conquistas para a ciência respectiva.

Trata-se, portanto, de uma pesquisa sobre um determinado assunto levada a efeito, em

parte ou em conjunto, pela primeira vez. São Trabalhos desta natureza que, finalmente,

concorrem para o progresso das ciências com novas descobertas.

A memória científica será redigida de tal maneira que, a partir das indicações do texto, um

pesquisador qualificado possa:

1) reproduzir as experiências e obter os resultados descritos no trabalho com igual ou menor

número de erros;

2) repetir as observações e formar opinião sobre as conclusões do autor;

3) verificar a exatidão das análises, induções e deduções, nas quais estão baseadas as

descobertas do autor, usando como fonte as informações dadas no trabalho.

3.2.3– Resumo de Assunto

Entende-se por resumo de assunto aquele texto que reúne, analisa e discute conhecimento

e informações já publicadas.

O resumo de assunto não é um trabalho original, mas exige de seu autor a aplicação dos

mesmos métodos científicos utilizados no trabalho científico original.

A maior parte dos trabalhos elaborados durante os cursos de formação (nível de licença)

são, quanto a sua natureza, um resumo de assunto e, dificilmente, um trabalho científico original.

Uma das desvantagens que justificam a elaboração de resumos de assunto resulta do fato

de ser ele um meio apto a fornecer aos alunos a bagagem de conhecimentos e o treinamento

científico que os habilitem a lançarem-se em trabalhos originais de pesquisa.

3.3– Tipos de Pesquisa

3.3.1– Objeto de Investigação

30

As ciências se subdividem de acordo com a natureza do objeto que investigam.

Uma determinada área das ciências (ciências biológicas, por exemplo) pode ter um

mesmo objeto de investigação.

Tal objeto é focalizado sob um aspecto significativo, dando lugar a subdivisões ou

especificações (ciências naturais, ciências do comportamento) no termo das quais localizamos

uma ciência isolada (odontologia, botânica, etc.).

3.3.2– Métodos e Técnicas

Podem-se chamar técnicas aqueles procedimentos específicos utilizados por uma ciência

determinada, no quadro das pesquisas próprias desta ciência.

Assim, há técnicas associadas ao uso de certos testes em laboratório, ao levantamento de

opiniões de massa, à coleta de dados estatísticos; há técnicas para conduzir uma entrevista, para

determinar a idade em função do carbono, para decifrar inscrições desconhecidas, etc.

As técnicas em uma ciência são os meios corretos de executar as operações de interesse de

tal ciência. O treinamento científico reside, em grande parte, no domínio destas técnicas.

Ocorre, entretanto, que certas técnicas são utilizadas por inúmeras ciências ou, ainda, por

todas elas.

O conjunto destas técnicas gerais constitui o método. Método são, portanto, técnicas

suficientemente gerais para se tornarem procedimentos comuns a uma área das ciências ou a

todas as ciências.

Existe, pois, um método fundamentalmente idêntico para todas as ciências. Compreende

um certo número de procedimentos ou operações cientificas levadas a efeito, em qualquer tipo de

pesquisa. Estes procedimentos foram descritos anteriormente, no parágrafo intitulado “Processos

do método científico” (item 2.3). Podem ser resumidos da seguinte maneira:

a) formular questões ou propor problemas e levantar hipóteses;

b) efetuar observações e medidas;

c) registrar tão cuidadosamente quanto possível, os dados observados com o intuito de responder

às perguntas formuladas ou comprovar a hipótese levantada;

31

d) elaborar explicações ou rever conclusões, idéias ou opiniões que estejam em desacordo com

as observações ou com as respostas resultantes;

e) generalizar, isto é, estender as conclusões, obtidas a todos os casos que envolvem condições

similares; a generalização é tarefa do processo chamado indução;

f) prever ou predizer, isto é, antecipar que, dadas certas condições, é de se esperar que surjam

certas relações.

É lícito distinguir as três áreas seguintes, onde classificar-se-iam os respectivos métodos:

1) Pesquisa Bibliográfica

2) Pesquisa de campo

3) Pesquisa de laboratório

Buscar-se-á, pois, descrever e analisar estes métodos, realçando sua utilidade.

3.3.3– Pesquisa Bibliográfica

A pesquisa bibliográfica pode ser realizada independentemente ou como parte da pesquisa

de campo e de laboratório. Em ambos os casos, busca conhecer as contribuições culturais ou

científicas do passado.

É realizada independentemente, por vezes, isto é, percorre todos os passos formais do

trabalho científico.

Constitui parte da pesquisa de campo ou de laboratório, enquanto é feita com o intuito de

recolher informações e conhecimentos prévios acerca de um problema para o qual se procura

resposta, acerca de uma hipótese que se quer experimentar.

A pesquisa bibliográfica é meio de formação por excelência. Como trabalho científico

original constitui a pesquisa propriamente dita na área das Ciências humanas. Como resumo de

assunto constitui geralmente o primeiro passo de qualquer pesquisa científica. Os alunos de todos

os Institutos e Faculdades devem, portanto, ser iniciados nos métodos e técnicas da pesquisa

bibliográfica.

3.3.4– Pesquisa de Campo

32

As técnicas específicas da pesquisa de campo têm por finalidade recolher e registrar

ordenadamente os dados relativos ao assunto escolhido como objeto de estudo. Eqüivalem,

portanto, a instrumentos de observação controlada.

Dentre as principais técnicas utilizadas em pesquisa de campo, destacam-se a entrevista, o

questionário, o formulário, o teste, etc.

3.3.5– Pesquisa de Laboratório

Os mais modernos aparelhos e instrumentos de precisão e experiências que a técnica

coloca à disposição dos homens, invadem aos poucos nossas Universidades, alojando-se nos

chamados “laboratórios”.

Os alunos serão acompanhados pelos mestres especializados no treinamento necessário ao

uso de tais instrumentos, para realizarem experiências ou pesquisas de laboratório.

A pesquisa de laboratório terá sempre uma parte introdutória sob forma de resumo de

assunto. Nessa parte, o pesquisador deve apresentar os conhecimentos já publicados sobre o

assunto, servindo-se, para tanto, da bibliografia existente. Só assim poderá ser evitada a repetição

inútil de pesquisas e experiências já realizadas.

3.4– Projeto de Pesquisa

Desde que se tenha em vista uma pesquisa qualquer, deve-se pensar antes de tudo em

elaborar um projeto que possa garantir sua viabilidade.

Muitas pesquisas importantes, tanto para as ciências como para a pessoa do pesquisador,

viram-se fadadas ao fracasso por não se ter feito um projeto das mesmas.

O projeto de pesquisa deve conter informações sobre diversos aspectos do trabalho, tais

como:

- justificativa: envolvendo a delimitação do problema, a análise da situação que o projeto

pretende modificar e uma demonstração de como modificará a situação analisada;

- objetivos: indicam o que se pretende alcançar com o projeto;

- metas: detalhamento, qualificação e localização dos objetivos no tempo;

- revisão da literatura referente à questão;

33

- hipóteses e variáveis de controle;

- metodologia: envolvendo definição dos termos, descrição dos instrumentos de coleta e de

análise dos dados;

- orçamento: prevendo as despesas com pessoal, materiais e serviços;

- cronograma de execução: escalonamento, no tempo, de todas as fases e tarefas da

pesquisa;

- normas e instrumentos de acompanhamento, avaliação e controle;

- bibliografia referente ao assunto de pesquisa.

Tudo deve ser estudado e planejado, a fim de que as fases da pesquisa se processem

normalmente, sem riscos de surpresas desagradáveis. O projeto de pesquisa é muitas vezes, a

garantia de seu êxito.

Pode, evidentemente, ser modificado, adaptando-se às novas contingências. Será sempre

motivo de tranqüilidade para o pesquisador, além de testemunhar seu espírito sistemático e sua

força de vontade.odo pesquisador deve desenvolver a capacidade de elaborar projetos de

pesquisa, pelo menos para atender a seus interesses pessoais ou do grupo em que está inserido.

As instituições financiadoras de projetos, tanto públicas como privadas, possuem geralmente um

roteiro próprio com instruções específicas para montagem do projeto. O interessado deve então

submeter-se aquele modelo. Não raro ocorre, porém, que a elaboração do projeto, sobretudo

quando se trata de pesquisas importantes, seja confiada aos técnicos em planejamento que fazem

parte dos Institutos de Pesquisa e Planejamento. Nossas universidades, em boa hora, procuram

criar órgãos como estes que têm, entre outras finalidades, a de dispensar assistência direta aos

estudantes, incentivando-os e orientando seus passos na pesquisa.

34

Metodologia Científica

Escolha de Assunto

a) Investigação Formulação de Problemas

Estudos Exploratórios

A PESQUISA

Coleta e Análise de dados

Estrutura do Trabalho

b) Comunicação

Redação

35

Apresentação

4 – Como Proceder à Investigação

4.1 – Escolha do Assunto

É o primeiro passo da pesquisa, mas não o mais fácil. Não faltam, evidentemente, assuntos

para pesquisas: a dificuldade está em decidir-se por um deles. Para muitos pesquisadores, a

decisão final é precedida por momentos de verdadeira angústia, mormente quando se trata de

pesquisas decisivas para a carreira do investigador.

Um assunto de pesquisa pode nascer de leituras, de reflexões pessoais, de problemas

reconhecidos, da atividade profissional, de fontes de informações, etc.

Quando alguém decide investigar um assunto determinado, sua escolha, em geral, é feita em

função de um interesse atual, da intuição e reflexão, da formação antecedente, de meios

exeqüíveis (tempo, recursos financeiros e humanos, equipamentos, etc.) de informações

documentadas, etc.

Sugerem-se certas operações que podem facilitar a escolha: são técnicas especiais, operações

particulares a serem executadas neste primeiro passo da pesquisa.

4.1.1– Seleção

36

Selecionar um assunto eqüivale a eliminar aqueles que, por uma razão plausível, devem ser

evitados e fixar-se naquele que merece prioridade. Não pode haver seleção sem critérios de

seleção: convém, portanto, definir os critérios que o investigador tomará em consideração,

quando tiver que proceder à escolha de um assunto. Tais critérios desempenham a função de guia

metodológico, orientando o investigador em direção do assunto prioritário.

O assunto de uma pesquisa é qualquer tema que necessita melhores definições, melhor

precisão e clareza do que já existe sobre o mesmo.

A primeira escolha deve ser feita com relação a um campo delimitado, dentro da respectiva

ciência de que trata o trabalho científico.

As razões que podem levar o pesquisador a formular questões de pesquisa são de dois tipos:

intelectuais, baseadas simplesmente no desejo de conhecer ou compreender; práticas, baseadas no

desejo de conhecer para realizar algo melhor ou de maneira mais eficiente. Não há contradição ou

exclusão mútua das pesquisas a que conduzem estes dois tipos de questões. Observa-se que,

historicamente, a pesquisa científica tanto se interessou pelo conhecimento em si mesmo, quanto

pelo conhecimento aplicado aos interesses práticos.

O assunto pode surgir de um interesse particular ou profissional, de algum estudo ou leitura.

As vezes, o professor indica o assunto, outras vezes cabe ao aluno escolher o mesmo.

Teórico ou prático, o assunto deve corresponder ao gosto do pesquisador, além de

proporcionar-lhe experiências de valor e contribuir para o progresso das ciências. Evitem-se

assuntos fáceis e sem interesse, que não compensam o esforço exigido.

O assunto será, naturalmente, adequado à capacidade e à formação do pesquisador,

corresponderá a suas possibilidades, quando ao tempo e aos recursos econômicos.

Na escolha do assunto, deve-se, igualmente levar em conta material bibliográfico: este deve

ser suficiente e estar disponível.

Evite-se, finalmente, fixar a escolha sobre assuntos a respeito dos quais já existem estudos

exaustivos: a quantidade de assuntos novos à espera de pesquisadores torna injustificável a

duplicação de estudos.

4.1.2- Delimitação

37

Convém superar a tendência muito comum de escolher temas que, por sua extensão e

complexidade, não permitam a profundidade. Feita, portanto, a escolha do assunto, passa-se a

fixar a extensão do mesmo.

Delimitar o assunto é selecionar um tópico ou parte a ser focalizada.

Para facilitar esta operação, pode-se recorrer, por um lado, à divisão do assunto em partes

constitutivas e, por outro, à definição da compreensão dos termos.

A decomposição do assunto eqüivale ao desdobramento do mesmo em partes, enquanto a

definição dos termos implica na enumeração dos elementos constitutivos ou explicativos que os

conceitos envolvem. Nem todos os assuntos poderão ser delimitados com auxílio destas técnicas

especiais. De acordo com a natureza do assunto selecionado, recorrer-se-á a uma outra técnica de

delimitação.

Assim, para delimitar o assunto, pode-se ainda fixar circunstâncias, sobretudo de tempo e

espaço: trata-se de indicar o quadro histórico e geográfico, em cujos limites se localiza o assunto.

Além disso, o pesquisador pode indicar sob que ponto de vista vai focalizar o assunto. Um

mesmo assunto pode receber diversos tratamentos, tais como psicológico, sociológico, histórico,

filosófico, estatístico etc. Estes tratamentos correspondem à luz sob a qual o assunto será

focalizado.

4.1.3– Explicação dos Objetivos

Os objetivos que se têm em vista definem, muitas vezes, a natureza do trabalho, o tipo de

problemas a ser selecionado, o material a coletar, etc.

4.2- Formulação de Problemas

Escolhido o assunto e delimitado o seu campo, a fase seguinte é a transformação do tema em

problemas

Problemas é uma questão que envolve intrinsecamente uma dificuldade teórica ou prática,

para a qual deve-se encontrar uma solução.

A primeira etapa da pesquisa é a formulação do problema ou formulação de perguntas.

38

Enquanto o assunto permanecer assunto, não se iniciou a investigação propriamente dita. O

assunto escolhido, submeter-se-á, portanto, ao questionamento. Será questionado pela mente do

pesquisador, que o transformará, mediante seu esforço de reflexão, sua curiosidade ou talvez seu

gênio, em problema. Descobrir os problemas que o assunto envolve, identificar as dificuldades

que ele sugere, formular perguntas ou levantar hipóteses significa abrir a porta, através da qual o

pesquisador penetrará no terreno do conhecimento científico.

As perguntas variam. Partindo-se da observação de um fato ou de uma série de fatos, pode-se

perguntar se estes seguem sempre o mesmo padrão ou se, por vezes, os resultados são diferentes,

se há possibilidades de explicar este processo.

As perguntas devem ser de tal sorte que haja possibilidades de respostas através da pesquisa.

Nunca se passa diretamente da escolha do assunto à coleta de dados, pois as vantagens da

formulação do problema são inegáveis:

1) Ao formular uma pergunta, sabe-se com exatidão o tipo de resposta que deve ser

procurado.

2) O pesquisador é levado a uma reflexão benéfica e proveitosa sobre o assunto.

3) Um problema ou uma pergunta fixa freqüentemente roteiros para o início do

levantamento bibliográfico e da coleta de dados.

4) Auxilia, na prática, a escolha de cabeçalhos para o sistema de tomada de

apontamentos.

5) Discrimina com precisão os apontamentos que serão tomados, isto é, todos e tão-

somente aqueles que respondem às perguntas formuladas.

Para bem se formular o problema, supõem-se conhecimentos prévios do assunto, além de uma

imaginação criadora que, em grande parte, é responsável pelo progresso das ciências.

Os passos que o pesquisador terá que percorrer a seguir, até o término da pesquisa,

dependerão deste passo inicial: a formulação do problema. Esta será interessante ou não,

contribuirá para o progresso da ciência ou não, terá valor ou não terá, se o problema formulado

tiver sido interessante ou banal. Embora o pesquisador não chegue a um solução –

freqüentemente não são encontradas soluções imediatas para os problemas – cabe-lhes o mérito

de ter aberto o caminho . Outros virão secundá-lo em sua marcha através do emaranhado terreno

do conhecimento científico. “É precisamente este sentido do problema – afirma Bachelard – que

dá a marca do verdadeiro espírito científico”.

39

Desde Einstein, acredita-se que é mais importante para o desenvolvimento da ciência saber

formular problemas do que encontrar soluções.

Uma vez formulado o problema, as etapas seguintes, nas fases da pesquisa, devem ser

previstas, a fim de que se tenha certeza da viabilidade da mesma, através das técnicas existentes.

Elabora-se, pois um plano provisório do assunto. Este servirá de guia, embora venha a adaptar-se

posteriormente, à marcha da pesquisa, modificando-se ou transformando-se em razão dos

resultados parciais ou definitivos.

4.3 - Estudos Exploratórios

Esta fase do trabalho destina-se ao levantamento do material necessário para a

investigação. De acordo com o tipo de pesquisa, ter-se-á que reunir instrumentos, aparelhos,

materiais diversos ou documentos. Estes últimos constituem a matéria-prima da pesquisa

bibliográfica.

4.3.1 – Levantamento Bibliográfico

Praticamente todo o conhecimento humano pode ser achado nos livros ou em

outros impressos que se encontram nas bibliotecas. A pesquisa bibliográfica tem como objetivo

encontrar respostas aos problemas formulados e o recurso é a consulta dos documentos

bibliográficos. Para encontrar o material que interessa numa pesquisa é necessário saber como

estão organizadas as bibliotecas e como podem servir os documentos impressos.

Para um levantamento do problema a ser pesquisado convém:

a) fazer um levantamento do material mais recente, aproveitando-se do acervo de

conhecimentos atualizados sobre o problema;

b) selecionar a documentação mais importante, evitando um acúmulo excessivo de

material;

c) concentrar-se nas informações e bibliografia mais importantes. Para isto:

- utilizar-se das fontes de informação bibliográfica;

- organizar a própria documentação bibliográfica;

40

- proceder de forma a iniciar-se pelas publicações gerais antes das obras específicas, ou

de artigos de revista ou resumos de pesquisa.

O contato com pessoas-fonte ou pessoas que se especializaram em um tema pode auxiliar na

orientação da literatura mais atualizada e na definição mais precisa do problema.

A elaboração escrita da revisão bibliográfica, reunido as informações atuais sobre o problema,

é útil para o pesquisador definir com precisão a sua pesquisa e pode ser indispensável para

apresentar o objetivo da investigação e a contribuição nova que traz.

O pesquisador deve estar informado dos principais dados que já foram recolhidos sobre o

problema que aborda. A assimilação de resultados já alcançados por outros pesquisadores evita

repetições desnecessárias, situa a pesquisa no contexto dos trabalhos científicos e auxilia a

formulação da própria problemática. Permite, ainda, identificar como os problemas foram postos

e conceitualizados, dá acesso às teorias e modelos explicativos que foram propostos e leva a

conhecer os paradigmas experimentais que foram utilizados. A elaboração escrita da revisão

bibliográfica deve indicar ao menos a situação atual do problema, os avanços e limites, os

resultados alcançados e as posições divergentes.

4.3.1.1 – Documentação

Julgamos conveniente reter o conceito de documento apresentado pela Union

Française des Organismes de Documentation, por nos parecer o mais preciso e completo de

todos os conceitos já apresentados:

Documento é toda base de conhecimento fixado materialmente e suscetível

de ser utilizado para consulta, estudo ou prova.

Os documentos são classificados de acordo com sua natureza e forma.

4.3.1.2 – Natureza dos Documentos

Quanto à natureza, devem-se distinguir dois tipos de documentos, cujo valor é

desigual numa pesquisa: fontes e trabalhos.

1)Fontes

41

Fonte é todo e qualquer documento ligado diretamente ao objeto de estudo. São as

testemunhas diretas ou “contemporâneas” do fato estudado, material bruto, não elaborado.

Estudando-se, por exemplo, a evolução do pensamento econômico na Inglaterra,

pelos fins do século XVIII, início do século XIX, as fontes são os escritos dos economistas de

então, tais como Adam Smith, David Ricardo, Stuart Mill e outros.

2)Trabalhos

Trabalho é todo e qualquer estudo científico, elaborado a partir das fontes e

relacionado com objeto da pesquisa.

Para a mesma questão, podem-se citar, entre outros, os seguintes trabalhos: Paul

HUGON, História das Doutrinas Econômicas, São Paulo, Atlas, 1969; Eduard HEIMANN,

História das Doutrinas Econômicas, Rio de janeiro, Zahar ed., 1965

Um estudo feito sobre trabalhos em nada pode contribuir para o progresso das ciências,

portanto limita-se a repetir os resultados alcançados. Sendo as memórias e as teses trabalhos

científicos originais, devem sempre basear-se sobre as fontes. Durante os cursos de graduação

(nível de licença) os alunos são, entretanto, iniciados no estudo das fontes, em particular por meio

dos comentários de texto.

4.3.1.3 – Formas dos documentos

Quanto à forma, podem-se distinguir vários tipos de documentos:

1) Manuscritos;

2) Impressos sem periodicidade: livros, folhetos (menos de 100p.), catálogos comerciais,

textos legais, processos, pareceres, correspondência publicada, etc.

3) Periódico: revistas, boletins, jornais, anuários, etc.;

4) Microfilmes que reproduzem outros documentos;

5) Diversos: mapas, planos, desenhos, documentos fotográficos, filmes,cd-room, etc.

4.3.2 – O uso da Biblioteca

A habilidade em fazer pesquisas em bibliotecas começa com uma compreensão de

como elas são organizadas e com uma familiaridade na utilização dos seus recursos.

42

Todo livro que chega a uma biblioteca é registrado com as informações a ele

referentes, classificado e agrupado segundo o assunto de que trata e, finalmente, incluído no

catálogo que deve conter todas as publicações de que dispõe a biblioteca.

4.3.3 – O uso dos documentos bibliográficos

Nos primeiros passos da consulta o pesquisador necessita de informações gerais

sobre o assunto que deve desenvolver: poderá encontrá-las em artigos de dicionários

especializados, em enciclopédias e em manuais. Estes o remeterão aos tratados completos, isto é,

às obras que abordam e desenvolvem amplamente o assunto. Se necessitar de um estudo

atualizado e recente, o pesquisador procura um artigo em revista. Se necessitar de notícias ou

crônicas da atualidade, procura a seção dos jornais. Tentando reunir a documentação referente a

sua pesquisa, faz-se a leitura de reconhecimento, examinado a folha rosto, o sumário, a

bibliografia, a introdução, o prefácio e as orelhas dos livros. Estes elementos fornecem uma idéia

das informações existentes na obra. A leitura das notas ao pé da página servem de pista para

identificação das fontes, isto é, dos documentos primários. Este serão a matéria-prima da

pesquisa.

Não se trata, pois, no início, de um estudo exaustivo da documentação, mas apenas

de um rápido exame.

4.3.4 – O material de pesquisa

Nesta fase do levantamento, faz-se a coleta de todo o material necessário para o

trabalho. À medida que os documentos, que interessam ao assunto, são localizados através da

leitura de reconhecimento, devem-se anotar as referências bibliográficas. Em outros termos

procede-se à elaboração da bibliografia.

A bibliografia para uso do pesquisador deve estar relacionada com o plano de

assunto, de sorte que corresponda a suas partes constitutivas.

Faz-se, pois, a seleção deste material com vistas ao tema ou ao aspecto que se quer

focalizar.

43

Chega então o momento da leitura, análise e interpretação dos documentos. Antes,

porém, convém saber como se há registrar cuidadosamente os dados selecionados para maior

eficiência.

4.3.5 – O uso da Internet

Trata-se de uma rede de informações, de abrangência mundial, onde estão

registradas para consultas dos interessados, uma infinidade de assuntos.

O acesso à rede é feito por intermédio de computador que possua o recurso para tal

(placa de FAX MOLDEN ligada a um provedor).

4.3.6 – Tomada de Apontamentos e Confecções de Fichas

Uma vez selecionado o material, recolhem-se os dados, informações ou afirmações

que os documentos podem fornecer. Trata-se da tomada de apontamentos.

É preciso assegurar a retenção daquilo que se quer conservar, pois a memória

interna é frágil. Os apontamentos são como uma memória exterior. Bem organizados, podem se

constituir numa mini-biblioteca para uso pessoal.

O apontamento será formal, quando se transcrevem as palavras textuais extraídas

de um documento ou conceptual, quando se traduzem as idéias de outrem com as próprias

palavras. Registrem-se somente os dados, fatos ou proposições mais importantes.

Ângelo Domingos Salvador, inspirando-se em outros autores, sintetiza desta

maneira as qualidades de um bom apontamento:

1) Um bom apontamento é mais do que um mero assunto ou esboço de temas. Indique-se

com precisão o que foi escrito sobre o tema, distinguindo-se o assunto e o conteúdo.

2) Um bom apontamento é tão preciso que não deixa dúvida sobre seu significado.

Lembrar-se de que, passado algum tempo, pode-se não reconhecer mais o sentido de um

apontamento.

3) Um bom apontamento possui todos os dados necessários para voltar rapidamente a sua

fonte original.

4) Um bom apontamento tem um encabeçamento bem definido.

44

5) Um bom apontamento é o que é feito com o pensamento de que o material será

incorporado no trabalho.

O importante é saber distinguir o essencial do acessório. Evite-se acumular

material excessivo, fazendo-se os apontamentos com reflexão e sobriedade. Às vezes, são mais

importantes as idéias gerais que as particulares.

Não se tome nenhuma nota antes de realizar a leitura reflexiva e crítica de todo o

texto: é medida de prudência para evitar a inutilização dos apontamentos feitos às pressas.

Aconselha-se utilizar frases ou palavras próprias, cuidando-se de reproduzir com

fidelidade o significado do que o autor expressa. Procedendo-se desta maneira, entendeu-se bem

a leitura realizada.

Como assegurar a eficiência de um apontamento? Observem-se as seguintes

normas práticas:

1)Ter em vista os objetivos do trabalho, procurando anotar somente os dados suscetíveis

de fornecer alguma luz sobre o problema formulado.

2)Percorrer antes todo o texto para evitar anotações de dados que são desenvolvidos mais

adiante.

3)Sublinhe-se com lápis os pontos principais se o livro é próprio. Caso contrário,

registrem-se as anotações em folhas numeradas, colocando-se a página do livro em cada nova

afirmação ou pensamento do autor.

4)Transcrever as anotações em fichas, cadernos ou folhas, colocando-se entre aspas as

citações textuais e anotando-se em folhas separadas ou no verso as idéias próprias que surgirem.

- Modelo de ficha para apontamentos

45

Termo genérico termo específico §

Página referências bibliográficas

Vê-se, portanto, que, numa pesquisa bibliográfica, um bom apontamento deve ser feito em

duas etapas:

a) Num primeiro momento, registrem-se os dados sobre folhas de papel, com o cuidado de

colocar no alto de cada folha as referências bibliográficas da obra consultada, à margem

esquerda as páginas respectivas e, no verso, as idéias pessoais que surgirem durante a leitura.

A ordem da leitura dos apontamentos é simplesmente cronológica: os dados são registrados à

medida que a leitura avança.

b) Num segundo momento, registrem-se os dados sobre fichas. O tipo ou modelo da ficha é

questão de preferência pessoal. A experiência mostra que entre os pesquisadores existe

grande liberdade neste particular. O que todos observam, entretanto, é o seguinte: as fichas

são organizadas em função dos assuntos. A ordem dos apontamentos registrados sobre as

fichas não é mais uma ordem cronológica, mas lógica. O cabeçalho da ficha deve identificar,

através de um termo ou dois, o conteúdo da mesma. Em geral esses cabeçalhos correspondem

ao sumário do trabalho. Devem figurar sobre uma ficha outros elementos indispensáveis: as

referências bibliográficas e a respectiva página da obra de onde se extraiu o apontamento.

Aquele que tiver a suficiente paciência para realizar estas tarefas cansativas com esmero,

terá a grande satisfação de constatar que seu esforço será compensado ante a facilidade com que

poderá proceder à redação de seu trabalho: basta dispor todas as fichas referentes a um mesmo

assunto sobre a mesa.

4.4– Coleta e Análise de Dados

1) EXPERIMENTAL OU CIENTÍFICA (QUANTITATIVA)

Tipos de Pesquisa

2) QUALITATIVA

46

As pesquisas têm sido caracterizadas pelo tipo de dados coletados e pela análise

que se fará desses dados:

Quantitativas : prevêem a mensuração de variáveis preestabelecidas, procurando verificar e

explicar sua influência sobre outras variáveis, mediante a análise da freqüência de incidências

e de correlações estatísticas. O pesquisador descreve explica e prediz.

Qualitativas : fundamentam-se em dados coligidos nas interações interpessoais, na co-

participação das situações dos informantes, analisadas a partir da significação que estes dão

aos seus atos. O pesquisador participa, compreende e interpreta.

4.4.1 - Coleta, Análise e interpretação de dados na pesquisa experimental

4.4.1.1 - A pesquisa Experimental

A pesquisa experimental se apoia nos pressupostos do positivismo e pretende que os

conhecimentos opinativos ou intuitivos e as afirmações genéricas sejam substituídos por

conhecimentos rigorosamente articulados, submetidos ao controle de verificação empírica e

comprovados por meio de técnicas precisas de controle.

Segundo essa concepção, não existe relação entre os sujeitos que observam e o objeto

observado. Os fatos ou os dados são frutos da observação, da experiência e da constatação, e

devem ser transformados em quantidades, reproduzidos e reiterados em condições de controle,

para serem analisados de modo neutro e objetivo a fim de se formular leis e teorias explicativas

dos fatos observados.

Estabelecidas essas premissas, o pesquisador pode aceder aos conhecimentos positivos, à

realidade objetiva e elaborar conhecimentos válidos e legitimá-los cientificamente. Há um

método para desvendar a complexidade aparente dos fenômenos. Este método pressupõe que a

natureza é uniforme, logicamente organizada e funcionalmente determinada. O pesquisador,

aplicando-se à observação metódica, pode encontrar as relações constantes em circunstâncias

47

idênticas e determinar as leis que regem e explicam as relações causais entre os fenômenos e

fatos observados, e predizer comportamentos ou fatos. Supõe, portanto, que o mundo está

definitivamente constituído e regido por leis invariáveis e constantes, que podem ser apreendidas,

verificadas e previstas.

4.4.1.2 - A coleta de dados Quantitativos

A coleta de dados é a etapa da pesquisa que exige um grande volume de tempo e trabalho

para se reunir as informações indispensáveis à comprovação da hipótese. Pressupõe a

organização criteriosa da técnica e a confecção de instrumentos adequados de registro e leitura

dos dados colhidos em campo.

A coleta de dados comporta algumas normas que dependem e se ajustam ao tipo de pesquisa

que se empreende. A definição da técnica e a elaboração do instrumento mais adequado à

pesquisa não são arbitrárias. Estão conexas com as hipóteses que se quer comprovar, com os

pressupostos que são assumidos e com a análise que se fará do material coligido. As técnicas e os

instrumentos decorrem, pois, de decisões que são tomadas no início da pesquisa, com a

formulação do problema a ser investigado.

As pesquisas experimentais se apoiam em instrumentos adequados aos seus fins

mensurativos. As principais técnicas que usam instrumentos sistematizados de coleta de

informações mensuráveis são:

- observação sistemática ou estruturada;

- questionários fechado ou semi-aberto;

- entrevista diretiva ou estruturada.

4.4.1.2.1- Observação direta

A observação estruturada ou sistemática consiste na coleta e registro de eventos

observados que foram previamente definidos. O observador, munido de uma listagem de

comportamento, registra a ocorrência destes comportamentos em um determinado período de

tempo, classificando-os em categorias ou caracterizando-os por meio de sinais.

48

No sistema de categorias, os comportamentos estão incluídos em um dos itens da relação

de categorias que o observador definiu, previamente; no sistema de sinais, os registros são feitos

em uma listagem de comportamentos bem precisos, assinalando a freqüência, a duração e outras

circunstâncias, por meio de sinais gráficos.

O registro dos dados pode ocorrer no ato, observando-se diretamente, no momento em

que ocorrem. Deste modo, pode-se observar os eventos no contexto em que se dão e observar a

relação cm outros atos e as circunstâncias que influenciaram a sua ocorrência, e permitir uma

análise mais compreensiva dos dados. Pode-se também filmar os acontecimentos e extrair os

dados de filmes e vídeos. Neste caso, a câmera fixa e seleciona um ângulo circunscrito da

observação, mas não capta os fatos intervenientes que se deram fora do plano da câmera.

A análise dos eventos observados deve produzir descrições que se fundamentem na

freqüência das incidências e garantam a confiabilidade das descrições. A observação sistemática

objetiva superar as ilusões das percepções imediatas e construir um objeto que, tratado por

definições provisórias, seja descrito por conceitos e estes permitam ao observador formular

hipóteses explicativas a serem ulteriormente constatadas e analisadas.

4.4.1.2.2 – Questionário

O questionário consiste em um conjunto de questões pré-elaboradas, sistemática e

seqüencialmente dispostas em itens que constituem o tema da pesquisa, com o objetivo de

suscitar dos informantes respostas por escrito ou verbalmente sobre assunto que os informantes

saibam opinar ou informar. É uma interlocução planejada. Sua execução necessita que:

. O pesquisador saiba:

Claramente as informações que busca, objetivo da pesquisa e de cada uma das questões, o

que e como pretende medir ou confirmar suas hipóteses. É uma tarefa que exige critérios e

planejamento para exaurir todos os aspectos dos dados que se quer obter, sem negligenciar os

aspectos essenciais da pesquisa;

. O informante compreenda:

Claramente as questões que lhe são propostas, sem dúvidas de conteúdo com termos

compatíveis com seu nível de informações, com sua condição e com suas reações pessoais.

49

. O questionário contenha:

Estrutura lógica: seja progressivo ( parta do simples e vá para o complexo), seja preciso

( uma questão por vez) e coerentemente articulado ( as questões centrais ou “filtros” eliminem as

questões derivadas), e que questões e subquestões componham um todo lógico e ordenado

(unidade das partes), linguagem com palavras simples, usuais, exatas e facilmente inteligíveis,

sem termos técnicos especializados ou eruditos. O sentido preciso deve evitar ambigüidades,

dúvidas ou incompreensões, recusas e “não sei”, e produzir respostas curtas, rápidas e objetivas.

Os questionários são, em geral, testados: respondidos por alguns presumíveis informantes,

para se identificar problemas de linguagem, de estruturas lógica ou das demais circunstâncias que

podem prejudicar o instrumento.

A literatura trata sinteticamente de cada uma das partes e etapas de aplicação de

questionários, adequados ao tipo e ao objetivo de diferentes pesquisas. Além das referências dos

manuais, algumas obras específicas tratam exaustivamente dos múltiplos aspectos da técnica e da

construção do questionário.

4.4.1.2.3 – Entrevista dirigida

A entrevista dirigida em pesquisa é um tipo de comunicação entre um pesquisador que

pretende colher informações sobre fenômenos e indivíduos que detenham essas informações e

possam emiti-las. As informações colhidas sobre fatos e opiniões devem constituir-se em

indicadores de variáveis que se pretende explicar. É, pois, um diálogo preparado com objetivos

definidos e uma estratégia de trabalho.

Os problemas da pesquisa fazem variar o grau de liberdade entre os interlocutores e o tipo

de resposta do entrevistado. Quando se pretende informações simples e superficiais, as respostas

podem ser precisas e estandardizadas sobre questões “fechadas” para servirem de indicadores

explicativos do problema; quando o nível de profundidade psicológica da entrevista for mais

profunda, as respostas são registradas a partir de questões previamente elaboradas sobre as quais

o entrevistador discorre (questões semi-abertas) ou a partir do discurso livre do entrevistado sobre

um tema, auxiliado pelo papel facilitador das respostas, que o entrevistador desenvolve. A

entrevista pode ter uma forma não-diretiva, como ocorre em pesquisas de inspiração

50

psicoterapêutica. Nesse caso, o tema é previsto, mas seu conteúdo e as palavras do diálogo são

escolhidos livremente durante a entrevista.

O diálogo interpessoal e a relação interindividual dos interlocutores na entrevista podem

provocar situações e reações emotivas, viés e erros, decorrentes da personalidade do pesquisador

no curso da entrevista ( oportunidade das questões, clareza na formulação das perguntas,

manifestações pessoais de surpresa, agrado ou desaprovação às respostas).

Alguns riscos de erro podem ser minimizados com a explicação prévia dos objetivos e

fins que se almeja com a entrevista, com a escolha de um local e horário convenientes ao

entrevistado e com a escolha de um local e horário conveniente ao entrevistado e com a criação

de um clima de colaboração e confiança.

A transcrição das informações pode ser feita por meio de notas manuscritas, respeitando-

se o vocabulário, o estilo das respostas e as eventuais contradições da fala, ou por meio de

gravador ou vídeo, se não houver reticências do entrevistado. Todas as informações transcritas

devem ser passíveis de codificações para serem transformadas em indicadores e índices objetivos

de variáveis que se pretende explorar.

4.4.1.3 – Análise dos dados Quantitativos

A análise dos dados em pesquisa experimental supõe a quantificação dos eventos para

submetê-lo à classificação, mensuração e análise. Seu objetivo é propor uma explicação do

conjunto de dados reunidos a partir de uma conceitualização da realidade percebida ou

observada.

Para essa análise, utiliza-se de análises estatísticas ou sistêmicas. Pode-se recorrer também

a análises comparativas, históricas, genéticas etc.

Usa-se a análise estatística para mostrar a relação entre variáveis por gráficos,

classificados por categorias e medidos por cálculos de parâmetros característicos (média,

mediana e quartis, etc.) ou para mostrar a relação entre variáveis. Os processos de análise

estatística, com o auxílio do computador, abreviaram muito a ordenação explanatória dos dados e

os meios de correlacionar variáveis, ampliando as possibilidades de correlação, comparação e

análise dos dados.

51

4.4.2 – Coleta, Análise e Interpretação de dados na Pesquisa Qualitativa.

4.4.2.1 - A Pesquisa Qualitativa

A pesquisa qualitativa é uma designação que abriga correntes de pesquisa muito

diferentes. Em síntese, essas correntes se fundamentam em alguns pressupostos contrários ao

modelo experimental e adotam métodos e técnicas de pesquisa diferentes dos estudos

experimentais.

Os cientistas que partilham da abordagem qualitativa em pesquisa se opõem, em geral, ao

pressuposto experimental que defende um padrão único de pesquisa para todas as ciências,

calcado no modelo de estudo das ciências da natureza. Estes cientistas se recusam a admitir que

as ciências humanas e sociais devam-se conduzir pelo paradigma das ciências da natureza e

devam legitimar seus conhecimentos por processos quantificáveis que venham a se transformar,

por técnicas de mensuração, em leis e explicações gerais. Afirmam, em oposição aos

experimentalistas , que as ciências humanas têm sua especificidade – o estudo do comportamento

humano e social – que faz delas ciências específicas, com metodologia própria. Consideram,

ainda, que a adoção de modelos estritamente experimentais conduz a generalizações errôneas em

ciências humanas, baseiam-se em um simplismo conceitual que não apreende um campo

científico específico e dissimulam, sob pretexto de um modelo único, o controle ideológico das

pesquisas. Em oposição ao método experimental, estes cientistas optam pelo método clínico ( a

descrição do homem em um dado momento, em uma dada cultura) e pelo método histórico-

antropológico, que captam os aspectos específicos dos dados e acontecimentos no contexto em

que acontecem.

Um segundo marco que separa a pesquisa qualitativa dos estudos experimentais está na

forma como apreende e legitima os conhecimentos. A abordagem qualitativa parte do

fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma

interdependência viva entre sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e

a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados

por uma teoria explicativa; o sujeito-observador é parte integrante do processo de conhecimento e

interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado. O objetivo não é um dado inerte e

neutro; está possuído de significados e relações que sujeitos concretos criam em suas ações.

52

4.4.2.2 – Coleta de dados Qualitativos

A coleta de dados não é um processo acumulativo e linear cuja freqüência, controlada e

mensurada, autoriza o pesquisador, exterior à realidade estudada e dela distanciada, a estabelecer

leis e prever fatos.

Os dados são colhidos, interativamente, num processo de idas e voltas, nas diversas etapas

da pesquisa e na interação com seus sujeitos. Em geral, a finalidade de uma pesquisa qualitativa

é intervir em uma situação insatisfatória, mudar condições percebidas como transformáveis, onde

pesquisador e pesquisados assumem, voluntariamente, uma posição reativa. No desenvolvimento

da pesquisa, os dados colhidos em diversas etapas são constantemente analisados e avaliados. Os

aspectos particulares novos descobertos no processo de análise são investigados para orientar

uma ação que modifique as condições e as circunstâncias indesejadas.

Os instrumentos de coleta de dados são: a observação participante, a entrevista individual

e coletiva, o “teatro da espontaneidade”, o jogo dos papéis, a história de vida autobiográfica ou

etnobiográfica, as projeções de situações de vida, análise de conteúdo ou qualquer outro que

capte as representações subjetivas dos participantes, favoreça a intervenção dos agentes em sua

realidade ou organize a ação coletiva para transformar as condições problemáticas.

4.4.2.2.1 – Observação Participante

A observação participante é obtida por meio do contato direto do pesquisador com o

fenômeno observado, para recolher as ações dos atores em seu contexto natural, a partir de sua

perspectiva e seus pontos de vista.

A observação participante pode visar uma descrição “fina” dos componentes de uma

situação: os sujeitos em seus aspectos pessoais e particulares, o local e suas circunstâncias, o

tempo e suas variações, as ações e suas significações, os conflitos e a sintonia de relações

interpessoais e sociais, e as atitudes e os comportamentos diante da realidade. A observação pode

ser participante: experienciar e compreender a dinâmica dos atos e eventos, e recolher as

informações a partir da compreensão e sentido que os atores atribuem aos seus atos. A descrição

e a compreensão podem estar compostas em uma observação compreensiva dos participantes

53

descrevendo suas ações no contexto natural dos atores. A atitude participante pode estar

caracterizada por uma partilha completa, duradoura e intensiva da vida e da atividade dos

participantes, identificando-se com eles, como igual entre pares, vivenciando todos os aspectos

possíveis da sua vida, das suas ações e dos seus significados. Neste caso, o observador participa

em interação constante em todas as situações, espontâneas e formais, acompanhando as ações

cotidianas e habituais, as circunstâncias e sentido dessas ações, e interrogando sobre as razões e

significados dos seus atos.

Os resumos descritivos das observações feitas descrevem as formas de participação do

pesquisador (intensidade, freqüência etc.), as circunstâncias da participação (tensões, mudanças e

decisões) e os diversos instrumentos (fotografia, filmagem, anotações de campo) que deverão ser

reduzidas ao registro das observações. Este deve conter todas as informações sobre as técnicas, os

dados, o desenrolar do cotidiano da pesquisa, as reflexões de campo e as situações vividas

(percepções, hesitações, interferências, conflitos, empatias, etc.) que correram no curso da

pesquisa.

4.4.2.2.2 – Entrevista Não-Diretiva

A entrevista não-diretiva, ou abordagem clínica, é uma forma de colher informações

baseadas no discurso livre do entrevistado.

Originária de uma técnica psicoterapêutica, centrada no cliente e desenvolvida por Carl

Rogers, pressupõe que o informante é componente para exprimir-se com clareza sobre questões

da sua experiência e comunicar representações e análises suas, prestar informações fidedignas,

manifestar em seus atos o significado que têm no contexto em que eles se realizam, relevando

tanto a singularidade quanto a historicidade dos atos, concepções e idéias.

O acesso às informações mais significativas, porém, requer alguns cuidados especiais. O

entrevistador deve manter-se na escuta ativa e com a atenção receptiva a todas as informações

prestadas, quaisquer que sejam elas, intervindo com discretas interrogações de conteúdo ou com

sugestões que estimulem a expressão mais circunstanciada de questões que interessem à pesquisa.

A atitude disponível à comunicação, a confiança manifesta nas formas e escolhas de um diálogo

descontraído devem deixar o informante inteiramente livre para exprimir-se, sem receios, falar

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sem constrangimentos sobre os seus atos e atitudes, interpretando-os no contexto em que

ocorreram.

O entrevistador deve permanecer atento às comunicações verbais e atitudinais (gesto,

olhar, etc.) sem qualificar os atos do informante, exortá-lo, aconselhá-lo ou discordar das suas

interpretações, nem ferir questões íntimas, sem um preparo prévio. A técnica exige ainda outras

habilidades do entrevistador para auxiliar a expressão livre, estimular adequadamente e orientar o

discurso para questões fontais. O pesquisador, nas interações verbais e não-verbais, e na

compreensão do contexto das ações do informante, vai recolhendo os dados que o conduzem à

progressiva elucidação do problema, à formulação e à confirmação de suas hipóteses.

A entrevista não-diretiva tem vantagens e limites que devem ser ponderados pelo

pesquisador antes de definir-se pelo seu uso, tais como a profusão informe de dados que devem

ser reduzidos, as interferências emocionais, a tendência do entrevistado em posicionar-se a

cavaleiro de todas as situações narradas. A vantagem do contato imediato com questões

relevantes pode aprofundar a significação dos fenômenos que se estuda.

A entrevista vai requerer cuidados especiais para assegurar a cientificidade da técnica, a

qualidade das informações recolhidas, seu registro e a redução do volume de dados e elementos

passíveis de análise.

Esses cuidados incluem, além da posição atitudinal do entrevistador, formas adequadas de

registro, redução e análise dos dados.

4.4.2.2.3 – História de Vida

A história de vida é um instrumento de pesquisa que privilegia a coleta de informações

contidas na vida pessoal de um ou vários informantes. Pode ter a forma literária biográfica

tradicional como memórias, crônicas ou retratos de homens ilustres que, por si mesmo ou por

encomenda própria ou de terceiros, relatam os feitos vividos pela pessoa.

A história de vida ou relato de vida pode ter a forma autobiográfica, onde o autor relata

suas percepções pessoais, os sentimentos íntimos que marcaram a sua experiência ou os

acontecimentos vividos no contexto da sua trajetória de vida. Pode ser um discurso livre de

percepções subjetivas ou recorrer a fontes documentais para fundamentar as afirmações e relatos

pessoais. Outra forma dos relatos de vida é a psicobiografia, onde o autor se situa no interior de

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uma trama de acontecimentos aos quais atribui uma significação pessoal e diante dos quais

assume uma posição particular. A psicobiografia reúne informações tanto sobre fatos quanto

sobre o significado de acontecimentos vividos que forjaram os comportamentos, a compreensão

da vida e do mundo da pessoa. Outras formas de comunicar o conteúdo vivido na relação com o

contexto da vida tem sido criado com a contribuição de várias ciências: psicologia, lingüística,

filosofia, sociologia, etc.

4.4.2.2.4 – Análise de Conteúdo

Análise de conteúdo é um método de tratamento e análise de informações, colhidas por

meio de técnicas de coleta de dados, consubstanciadas em documentos. A técnica se aplica à

análise de textos escritos ou de qualquer comunicação (oral, visual, gestual) reduzida a um texto

ou documento. Segundo Badin, é “um conjunto de técnicas de análise de comunicação” que

contém informação sobre o comportamento humano atestado por uma fonte documental.

O objetivo da análise de conteúdo é compreender criticamente o sentido das

comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente, as significações explícitas ou ocultas.

A decodificação de um documento pode utilizar-se de diferentes procedimentos para

alcançar o significado profundo das comunicações nele cifradas. A escolha do procedimento mais

adequado depende do material a ser analisado, dos objetivos da pesquisa e da posição ideológica

e social do analisador.

Esses procedimentos podem privilegiar um aspecto da análise, seja decompondo um texto

em unidades léxicas (análises léxi-cológica) ou classificando-se segundo categorias (análise

categorial), seja desvelando o sentido de uma comunicação no momento do discurso (análise da

enunciação) ou revelando os significados dos conceitos em meios sociais diferenciados (análise

de conotações), ou seja, utilizando-se de qualquer outra forma, inovadora de decodificação de

comunicações impressas, visuais, gestuais etc., apreendendo o seu conteúdo explícito ou

implícito.

Esta técnica procura reduzir o volume amplo de informações contidas em uma

comunicação a algumas características particulares ou categorias conceituais que permitam

passar dos elementos descritivos à interpretação ou investigar a compreensão dos atores sociais

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no contexto cultural em que produzem a informação ou, enfim, verificando a influência desse

contexto no estilo, na forma e no conteúdo da comunicação.

4.4.2.2.5 – Estudo de Caso

O estudo de caso é uma caracterização abrangente para designar uma diversidade de

pesquisas que coletam e registram dados de um caso particular ou de vários casos a fim de

organizar um relatório ordenado e crítico de uma experiência, ou avaliá-la analiticamente,

objetivando tomar decisões a seu respeito ou propor uma ação transformadora.

O caso é tomado como unidade significativa do todo e, por isso, suficiente tanto para

fundamentar um julgamento fidedigno quanto propor uma intervenção. É considerado também

como um marco de referência de complexas condições socioculturais que envolvem uma situação

e tanto retrata uma realidade quanto revela a multiplicidade de aspectos globais, presentes em

uma dada situação.

O desenvolvimento do estudo de caso supõe 3 fases:

a) a seleção e delimitação do caso

A seleção e delimitação do caso são decisivas para a análise da situação estudada. O caso

deve ser uma referência significativa para merecer a investigação e, por comparações

aproximativas, apto para fazer generalização a situações similares ou autorizar inferências em

relação ao contexto da situação analisada.

A delimitação deve precisar os aspectos e os limites do trabalho a fim de reunir informações

sobre um campo específico e fazer análise sobre objetos definidos a partir dos quais se possa

compreender uma determinada situação. Quando se toma um conjunto de casos, a coleção deles

deve cobrir uma escala de variáveis que explicite diferentes aspectos do problema.

b) o trabalho de campo

O trabalho de campo visa reunir e organizar um conjunto comprobatório de informações. A

coleta de informações em campo pode exigir negociações prévias para se aceder a dados que

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dependem da anuência de hierarquias rígidas ou da cooperação das pessoas informantes. As

informações são documentadas, abrangendo qualquer tipo de informação disponível, escrita, oral,

gravada, filmada que se preste para fundamentar o relatório do caso que será, por sua vez, objeto

de análise crítica pêlos informantes ou por qualquer interessado.

c) a organização e redação do relatório

A posse de um volume substantivo de documentos, rascunhos, notas de observação,

transcrições, estatísticas, etc., coligidos em campo, devem ser reduzidos ou indexados segundo

critérios predefinidos a fim de que se constituam em dados que comprovem as descrições e as

análises do caso.

O relatório poderá ter um estilo narrativo, descritivo, analítico, ser ilustrado ou não, filmado,

fotografado ou representado. Seu objetivo é apresentar os múltiplos aspectos que envolvem um

problema, mostrar sua relevância, situá-lo no contexto em que acontece e indicar as

possibilidades de ação para modificá-lo.

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5 - Referências Bibliográficas

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