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// Revista da Faculdade de Direito // edição 5 // número 6 // 2º semestre de 2018 51 MIGUEL REALE, TERCIO SAMPAIO FERRAZ JR. E ALYSSON LEANDRO MASCARO: TRÊS ESTÁGIOS DA TEORIA SOBRE DIREITO, ESTADO E CONFLITOS SOCIAIS Camilo Onoda Caldas 1 1. Doutor em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Faculdade de Direito da USP. Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Portugal). Di- retor do Instituto Luiz Gama, entidade que atua na defesa dos direitos huma- nos. Professor da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu em São Paulo/SP e do Programa de Mestrado da Escola Paulista de Direito (EPD). Resumo: O presente artigo descreve três estágios distintos da teoria sobre Direito, Estado e conflito no Brasil con- siderando três pensadores do departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Universidade de São Paulo: Miguel Reale, Tercio Sampaio Ferraz Jr. e Alysson Leandro Mascaro. O objetivo é apresentar o contexto histórico no qual cada um está inserido a fim de indicar como a teoria a respeito do Estado e do Direito desenvolvida por eles encontra-se em cenários de conflitualidade social distintos, resultando em abordagens teóricas que revelam preocupações e horizontes diferenciados. Palavra-chave: Conflito; Teoria Geral do Direito e do Estado; Miguel Real; Tercio Sampaio Ferraz Jr.; Alysson Mascaro. Abstract: Abstract: This article describes three distinct stages of law, state and conflict theory in Brazil considering three thinkers from the department of philosophy and general theory of law of the University of Sao Paulo: Miguel Reale, Tercio Sampaio Ferraz Jr. and Alysson Leandro Mascaro. The objective is to present the historical context in which each one is inserted showing how the theory about the State and Law developed by them is found in different social conflict scenarios, resulting in theoretical approaches that reveal distinct concerns and horizons. Keywords: Conflict; General Theory of Law and State; Miguel Real; Tercio Sampaio Ferraz Jr.; Alysson Mascaro.

MIGUEL REALE, TERCIO SAMPAIO FERRAZ JR. E ALYSSON … · Resumo: O presente artigo descreve três estágios distintos da teoria sobre Direito, Estado e conflito no Brasil con-siderando

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// Revista da Faculdade de Direito // edição 5 // número 6 // 2º semestre de 2018

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MIGUEL REALE, TERCIO SAMPAIO FERRAZ JR. E ALYSSON LEANDRO MASCARO: TRÊS ESTÁGIOS DA TEORIA SOBRE DIREITO,ESTADO E CONFLITOS SOCIAISCamilo Onoda Caldas1

1. Doutor em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Faculdade de Direito da USP. Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Portugal). Di-retor do Instituto Luiz Gama, entidade que atua na defesa dos direitos huma-nos. Professor da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu em São Paulo/SP e do Programa de Mestrado da Escola Paulista de Direito (EPD).

Resumo: O presente artigo descreve três estágios distintos da teoria sobre Direito, Estado e conflito no Brasil con-

siderando três pensadores do departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Universidade de São Paulo:

Miguel Reale, Tercio Sampaio Ferraz Jr. e Alysson Leandro Mascaro. O objetivo é apresentar o contexto histórico

no qual cada um está inserido a fim de indicar como a teoria a respeito do Estado e do Direito desenvolvida por

eles encontra-se em cenários de conflitualidade social distintos, resultando em abordagens teóricas que revelam

preocupações e horizontes diferenciados.

Palavra-chave: Conflito; Teoria Geral do Direito e do Estado; Miguel Real; Tercio Sampaio Ferraz Jr.; Alysson

Mascaro.

Abstract: Abstract: This article describes three distinct stages of law, state and conflict theory in Brazil considering

three thinkers from the department of philosophy and general theory of law of the University of Sao Paulo: Miguel

Reale, Tercio Sampaio Ferraz Jr. and Alysson Leandro Mascaro. The objective is to present the historical context in

which each one is inserted showing how the theory about the State and Law developed by them is found in different

social conflict scenarios, resulting in theoretical approaches that reveal distinct concerns and horizons.

Keywords: Conflict; General Theory of Law and State; Miguel Real; Tercio Sampaio Ferraz Jr.; Alysson Mascaro.

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Nos diferentes estágios do desenvolvimento da

economia brasileira no século XX e XXI, podemos

observar transformações no campo da conflituali-

dade que se refletem não apenas em diferentes formas de

organização do Estado e do Direito, mas também em teorias

jurídico-políticas distintas, pois as reflexões teóricas não se

desvinculam do contexto histórico no qual estão inseridas.

Se considerarmos o capitalismo no Brasil ao longo do sécu-

lo XX e início do XXI, podemos destacar três momentos dis-

tintos em seu desenvolvimento (sem negar outros recortes

possíveis, evidentemente). O primeiro é consequência da

introdução da mão de obra assalariada no final do século

XIX, com destaque para as plantações de café no Oeste

Paulista, e do movimento de imigração do início do século

XX. O segundo abrange o processo de industrialização e

de integração do mercado nacional promovido por Getúlio

Vargas e vai até o final da ditadura militar, período no qual

o Estado se destacava por suas atuações nesses âmbitos.

O terceiro inclui a crise estrutural do capitalismo a partir

da década de 1980, com a ascensão do neoliberalismo, fi-

nanceirização da economia, desindustrialização do Brasil e

domínio do modelo de acumulação denominado de “pós-

-fordista” em nível global.

Em cada um destes contextos, parte dos conflitos existen-

tes se modifica substancialmente e isso impacta o campo da

teoria do Direito e do Estado (vide WOLKMER, 2014). A era

Vargas é momento no qual se evidencia o conflito entre os

interesses regionais e os nacionais, entre as oligarquias rurais

do eixo Minas-São Paulo e a burguesia urbano-industrial. As

concepções de Estado e, consequentemente de Direito, for-

jadas neste momento histórico, conforme veremos, consis-

tem justamente numa forma de resposta a esse problema.

Do mesmo modo, a formação de um (inacabado) Estado de

Bem-Estar Social no século XX e as sucessivas crises do ca-

pitalismo no século XXI constituirão cenários que permeiam

as teorias jurídicas e políticas destes períodos.

Reconhecemos, evidentemente, que cada momento da his-

tória e cada autor poderia ensejar um artigo individualizado

com maior profundidade, contudo, optar por uma exposição

individualizada mais exaustiva enfraqueceria um de nossos

propósitos neste artigo: privilegiar a descrição do movimento

das ideias, o que é feito a partir da apresentação dos as-

pectos centrais de três diferentes autores e seus respectivos

contextos históricos (como forma de compensação para a

opção aqui adotada, indicaremos em cada capítulo um con-

junto de referências que permitirão ao leitor se aprofundar

em cada autor e em cada momento histórico em particular).

Para descrever diferentes estágios da teoria do Direito e do

Estado no Brasil, adotaremos um recorte específico que in-

Introdução

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clui três pensadores, e igualmente docentes, oriundos do

departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Uni-

versidade de São Paulo (USP) e igualmente separados en-

tre si por pouco mais de três décadas: Miguel Reale, Tercio

Sampaio Ferraz Jr. e Alysson Leandro Mascaro. Sabemos

que a opção adotada exclui diversas outras teorias que po-

deriam ser consideradas e analisadas. Contudo, existem

razões que justificam o recorte adotado. Além da neces-

sidade de delimitação do objeto, este artigo é a exposição

de um primeiro resultado de uma pesquisa em curso, cujas

futuras publicações incluirão outros teóricos do Direito do

Brasil, bem como, irá se aprofundar no estudo dos pen-

sadores mencionados. Consideramos que nesse momento,

as teorias dos três autores mencionados serão suficientes

para o propósito deste artigo: descrever três estágios dis-

tintos da teoria sobre Direito, Estado e conflito no Brasil,

indicando que cada qual encontra-se inserido em diferen-

tes momentos da nossa realidade histórica, procurando

responder questões teóricas e práticas próprias de seus

respectivos tempos.

1. Miguel Reale: culturalismo jurídico, teoria tridimen-sional do Direito e o papel do Estado na formação da identidade nacional.

“[...] talvez pela primeira vez no Brasil, um imenso esforço

de síntese e superação, na direção de um sistema jusfilosó-

fico elaborado a partir de premissas universais, das quais

se extraem consequências próprias” – Tercio Sampaio Fer-

raz Jr. a respeito de Miguel Reale.

Miguel Reale, filho de imigrantes italianos, nasceu em 1910

e sua formação jurídica desenvolveu-se ao longo da déca-

da de 1930. Expoente do culturalismo jurídico, sua teoria

apresenta uma releitura da filosofia de Kant, Hegel e dialoga

com Nicolai Hartmann, Max Scheler e Husserl (Vide REALE,

354, et seq). Dentro da distinção estabelecida por Alysson

Mascaro – que delineia os três caminhos do pensamento

jurídico contemporâneo (MASCARO, 2016, p. 310) – Reale

é considerado um pensador do juspositivismo eclético. No-

tabilizou-se por sua Teoria Tridimensional do Direito – con-

cepção oriunda de pensadores europeus e norte-america-

nos (REALE, 1994, p. 23) – na qual o Direito é conceituado

nos seguintes termos:

Direito é a realização ordenada e garantida do bem comum

numa estrutura tridimensional bilateral atributiva, ou, de

uma forma analítica: Direito é a ordenação heterônoma,

coercível e bilateral atributiva das relações de convivência,

segundo uma integração normativa de fatos segundo valo-

res. Ultimamente, pondo em realce a idéia de justiça, temos

apresentado, em complemento às duas noções supra da

natureza lógico-descritiva, esta outra de caráter mais ético:

Direito é a concretização da idéia de justiça na pluridiver-

sidade de seu dever ser histórico, tendo a pessoa como

fonte de todos os valores. (REALE, 2002a, p. 67).

Nosso objetivo neste artigo não é destacar as mudanças

em seu pensamento no curso do tempo, nem simplesmente

apontar um substrato comum entre tais escritos. Tampou-

co pretendemos fazer um juízo de valor sobre suas posições

política ou destacar os (des)acertos de sua teoria sobre o

Direito e o Estado (sobre o tema, vide: ARAÚJO, 1988; CAR-

VALHO, 2011; COELHO, 2003, p. 285-298; MASCARO, p.

2016, 324-336). Nosso propósito é contextualizar a teoria de

Miguel Reale, apresentando-a como uma teoria que procura

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responder aos problemas políticos e econômicos, nacionais

e internacionais, colocados naquele momento da história.

A adesão de Miguel Reale aos movimentos integralistas é

pública e notória, sendo que até os últimos momentos de

sua vida, Reale procurou justificar suas posições, explicar

em que termos concordava com o integralismo e demonstrar

que não tinha simpatia com partidários do movimento que

se alinhavam com o ideário nazista e antissemita (Bertonha,

2013, p. 281). O ponto que queremos destacar é que essa

relação, do ponto de vista político e teórico, com o movimen-

to integralista, transparece nos escritos do filósofo brasileiro,

desde sua obra Estado Moderno (1934), passando por Filo-

sofia do Direito (1953), Teoria Tridimensional do Direito (1968)

até seu clássico Lições Preliminares do Direito (1973), ainda

que de maneira modificada ao longo do tempo.

Conforme dissemos, o nacionalismo é um elemento chave

do integralismo. A partir da década de 1920 no Brasil há

uma série de movimentos relevantes com objetivo de cons-

tituir a identidade nacional brasileira (no campo das artes, A

Semana de Arte Moderna de 1922 tornou-se o maior ícone

nesse sentido). O integralismo no Brasil, portanto, é um dos

movimentos políticos que se desenvolve com essa finalida-

de. Havia, naquele momento histórico, um acirramento de

conflitos sociais e políticos e o integralismo concebia que a

atuação do Estado deveria ocorre dentro de uma ambiva-

lência: de um lado, forjando o sentimento de nacionalidade

enquanto força moral e espiritual; de outro lado, encarnan-

do os valores contingentes e específicos herdados de um

determinado momento histórico (ABUD, 1998).

A república velha (1889-1930) foi período de reorganização

dos espaços de poder político e econômico existentes no

período do Brasil Império (1822-1889). O interregno entre

1930 e 1950, por sua vez, foi justamente o período no qual

se operou a transição para se estabelecer um verdadeiro

Estado nacional, sem, contudo, provocar uma ruptura ra-

dical com a hegemonia paulistana-mineira. O Estado Novo

de Getúlio Vargas se colocou como condutor desse pro-

cesso, feito para que “o sentimento de identidade nacio-

nal permitisse a omissão da divisão social, a direção das

massas pelas elites e a valorização da ‘democracia racial’,

que teria homogeneizado num povo branco a população

brasileira” (ABUD, 1998). Assim, não por acaso, dada suas

convergências, as diferenças entre varguistas e integralistas

puderam ser acomodadas entre si no decurso do tempo

(BERTONHA, 2013, p. 279).

Influenciado pelo contexto acima descrito, Miguel Reale vai

forjando sua Teoria Tridimensional do Direito e formulan-

do suas concepções de Estado. Para ele, Estado e Direito

estão vinculados a uma realidade fática e um conjunto de

valores que se manifestam historicamente. Assim, Reale re-

jeita a existência de um direito natural (ideia presente em

muitos pensadores liberais) e pode defender que o Direito e

o Estado se alinham com determinada experiência histórica

e, consequentemente, com valores específicos presentes

na cultura particular de uma nação. Wolkmer explica o de-

senvolvimento histórico este tipo de teoria no Brasil:

Concomitante com a crise socioeconômica que sacudiu a

estrutura capitalista da Velha República liberal-positivista

e com as contradições sociais decorrentes da emergên-

cia dos novos atores no âmbito da dominação política

burguesa oligárquica, sobressaíram novas teses como o

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culturalismo, a conciliação, o nacionalismo de esquerda e

o desenvolvimentismo. Essas tendências ideológicas ma-

terializadas em fins dos anos 30 (Revolução de 30, Estado

Novo, integralismo, nacionalismo conservador etc.) e ao

longo dos anos 40-50 (Segunda Grande Guerra, democra-

tização social do Brasil, populismo e desenvolvimentismo)

deixaram sulcos também na linearidade do pensamento

político-jurídico institucionalizado. Entende-se, assim, a

crise que atravessou o positivismo jurídico liberal (em suas

vertentes evolucionistas, naturalistas, sociológicas e cien-

tificistas) diante das críticas vigorosas e das renovadoras

propostas epistemológicas arguidas pelo ecletismo conci-

liador e pela retórica culturalista introduzidas na esfera da

teoria jurídica. O Culturalismo Jusfilosófico, que teve gran-

de impulso no Brasil após a Segunda Grande Guerra, ins-

pirando-se em Kant e considerando-se herdeiro de Tobias

Barreto, busca reorientar as diversas tradições filosóficas

nacionais rumo a uma interlocução centrada nos valores,

na pluralidade e no mundo da cultura. Sob a condução de

Miguel Reale e integrado por muitos pensadores, dentre

os quais Luiz Washington Vita, Renato Cirell Czerna, Djacir

Menezes, Paulo Mercadante, Nelson Saldanha e Antonio

Paim, a corrente culturalista fundou o Instituto Brasileiro de

Filosofia (IBF), que se projetou como “instituição devotada

a promover o diálogo entre as diversas correntes de filo-

sofia existentes no país”. [...] Provavelmente, a crítica mais

incisiva e mais séria à realidade de exaurimento e de derro-

cada do naturalismo jurídico-sociológico, enquanto estatu-

to epistemológico hegemônico, foi a tese de teor culturalis-

ta desenvolvida em Fundamentos do Direito, apresentada

por Miguel Reale, em 1940, no concurso para a cátedra de

Filosofia do Direito [...]. (WOLKMER, 2014, p. 357-358).

Reale, ao conceituar o que é o Estado, o define como “[...]

a organização da Nação em uma unidade de poder, a fim

de que a aplicação das sanções se verifique segundo uma

proporção objetiva e transpessoal. Para tal fim o Estado de-

tém o monopólio da coação no que se refere à distribuição

da justiça” (REALE, 2002a, p. 76). E também afirma que as

normas jurídicas devem “visar à realização de valores ou

fins essenciais ao homem e à coletividade” (REALE, 2002a,

p. 115). Com base em tais ideias, Reale afirma que o Esta-

do utiliza seu poder para garantir que as normas jurídicas

sejam respeitadas (impondo sanções aos eventuais trans-

gressores) e, ao mesmo tempo, encarna a realidade fático-

-axiológica existente. Noutras palavras, Reale afirma que as

normas jurídicas, garantidas e constituídas por um poder

coator, possuem correspondência com valores da socieda-

de, portanto, a cultura – enquanto produto histórico particu-

lar de uma nação – se expressa tanto no Estado quanto no

Direito enquanto fato, valor e norma (tridimensionalidade).

O culturalismo de Miguel Reale, portanto, expressa a ideia

de um Estado e de um Direito que correspondem à realida-

de fático-axiológica de uma nação e, ao mesmo tempo, se

apresenta como uma teoria de legitimação à submissão do

ordenamento jurídico e da autoridade estatal. Não quere-

mos problematizar aqui como Reale acredita que essa cor-

respondência entre valores sociais e normas jurídicas deve

ocorrer2. Queremos apenas destacar outro ponto: a teoria

de Reale expressa o momento de constituição da identida-

de nacional mediada pelo Estado responsável por positivar

as normas jurídicas.

Assim, a teoria culturalista de Miguel Reale encontra seu

sentido em um momento histórico no qual se pretende legi-

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timar a autoridade do Estado e do Direito por meio da ideia

de que os valores nacionais, historicamente constituídos,

ganham corpo e concretude por intermédio desta ordem

jurídica-estatal (logo, o Estado seria o ordenador social que

se contrapõe aos movimentos anarquistas e marxistas que

trazem ao mesmo tempo uma suposta “desordem” e valo-

res “estranhos” à cultura nacional)3. Tais ideias fazem Reale

concluir que “o Estado é, ao mesmo tempo e complemen-

tarmente, um meio e um fim” (REALE, 2002a, p. 107) em

relação à cultura/valores nacionais e que existe um proces-

so dialético de implicação e polaridade na constituição dos

fenômenos jurídicos, que implica “a solidariedade dinâmica

de vários elementos, segundo forças que tendem a preser-

var os bens já adquiridos, e outras que se projetam na liber-

dade constitutiva de novos bens” (REALE, 2002b, p. 362).

2. Tercio Sampaio Ferraz Jr.: modelo linguístico-prag-

mático, decidibilidade e o Estado de Bem-Estar Social

“Destacando-se por alguns anos do que lhe era

mais caro, Tercio deu exemplo de dedicação, à qual

se referiram com entusiasmo professores como

Von Rintelen e Theodoro Viehweg” – Miguel Reale.

Tercio Sampaio Ferraz Jr. nasceu em 1941 e sua formação

em Direito e Filosofia se desenvolveu ao longo da década

de 1960. Foi orientando de Miguel Reale e seu pensamento

sofreu influências de Theodor Viehweg e Niklas Luhmann,

com os quais teve contato em seu doutorado na Alemanha

(EDITOR, 1979). Sua doutrina sobre o direito encontra-se

permeada pela teoria da linguagem moderna, em especial

pela pragmática linguística. Na sua conhecida obra Teoria

da norma jurídica ele escreve:

c) finalmente, falamos, num terceiro sentido, do direito

enquanto linguagem, num relacionamento que assimila o

direito à linguagem; neste ultimo caso, estamos diante de

uma tese filosófica – tese da intranscendentalidade da lin-

guagem – que vai afirmar, de modo geral, que o jurista, em

todas as suas atividades (legislação, jurisdição, teorização)

não transcende jamais os limites da língua.

Assumimos, quanto à questão, uma posição intermédia.

Da terceira possibilidade (c), aceitamos limitadamente que

o fenômeno jurídico tem, basicamente, um sentido co-

municacional, que nos coloca sempre no nível da analise

linguística. Todo direito “tem por condição de existência

a de ser formulável numa linguagem, imposta pelo postu-

lado da alteridade”. Dizemos, entretanto, limitadamente,

porque recusamos a redução total do direito à linguagem,

mesmo tomando-se esta num sentido amplo de comuni-

cação. Nestes termos, preferimos dizer que o direito não

é só um fenômeno linguístico. Se ao nível normativo – o

direito como sistema de proposições normativas –, o as-

pecto linguístico pode ser encarado como fundamental,

não se pode esquecer que ele corresponde também a uma

série de fatos, empíricos, que não são linguagem, como

relações de força, conflitos de interesse, instituições admi-

nistrativas, etc., os quais, portanto, se não deixam de ter

uma dimensão linguística, nem por isso são basicamente

fenômenos linguísticos. Nossa opção pela possibilidade (c)

é, nestes termos, epistemológica e não ontológica, no sen-

tido de que, ao pretender-se o tratamento da norma como

linguagem, se o faz por necessidade operacional, sem fa-

zer-se, com isso, qualquer afirmação sobre a essência do

direito. (FERRAZ JR., 2006, p. 6-7).

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Mais adiante, em sua obra Introdução ao Estudo do Direi-

to: técnica, decisão e dominação, Tercio Sampaio apresen-

ta sua teoria sobre o Direito mantendo, no centro de suas

preocupações, a abordagem do fenômeno jurídico a partir

das contribuições oriundas da linguística moderna. Isso fica

evidenciado, por exemplo, no modo como o autor trata da

compreensão do conceito de “direito”, no qual ele destaca

que tal análise pode feita a partir das diversas vertentes lin-

guísticas existentes .

Em qual contexto histórico no qual Tercio Sampaio encon-

tra-se inserido nas décadas 1960-1970? Do ponto de vis-

ta político, existe no período uma forte repressão política

contra as correntes marxistas, seja na América Latina, seja

na Europa (na República Federal da Alemanha, por exem-

plo, o Partido Comunista da Alemanha (KPD) foi banido em

1956). Concomitantemente, neste período, será observado

o apogeu do Estado de Bem-Estar social na Europa (inclusi-

ve como resposta aos movimentos marxistas), preocupado

em organizar a economia capitalista a partir de maior inter-

venção no campo econômico e do incremento dos direitos

sociais (vide WOLKMER, 2014). No Brasil, o movimento de

construção desse modelo culminará na Constituição Fede-

ral de 1988, cujo caráter social superou em muito todas as

constituições anteriormente criadas no país. Assim, um dos

debates centrais neste período é o papel do Estado no pro-

cesso de reprodução do modo de produção capitalista, um

fenômeno que não escapa da análise de Tercio Sampaio

Ferraz Jr.:

O Estado serve ao desenvolvimento do capitalismo e à

acumulação contínua e eficiente da riqueza.

Essa nova forma de soberania exige do Estado uma ca-

pacidade gestora dos bens comuns, em consequência, a

ideia de cálculo, de arte econômica (economia política).

Como nos mostra Foucault (1982:188), o crescimento po-

pulacional exigiu uma espécie de quantificação raciona-

lizada da produção e do consumo social (estatística). As

populações passam a ser, simultaneamente, o sujeito das

necessidades, das aspirações, e o objeto nas mãos do go-

verno. Assim, a soberania, antes uma relação externa entre

o senhor e o súdito, toma agora a forma de um exercício

interno de comando e de organização. Ela burocratiza-se.

Multiplicam-se as agências estatais. O direito de sobera-

nia transforma-se também num direito de sistematização

centralizada das normas de exercício do poder de gestão.

(FERRAZ JR., 2018, p. 142).

A concepção de Estado de Bem-Estar social aponta para

uma atividade estatal muito mais ampla do que aquelas

desenhadas pelos autores liberais. O Estado não é mero

defensor da legalidade e das liberdades individuais (pres-

supostos necessários para reprodução do capitalismo). O

Estado assume outras funções no campo social e econômi-

co, atuando em diversos domínios e, ao mesmo tempo, tor-

nando-se elemento indispensável para o desenvolvimento e

a expansão do capitalismo em nível global (CALDAS, 2018,

p. 82 et seq). O Estado assume uma feição de gestor eco-

nômico-social e não meramente de repressor de condutas

contrárias à lei. Tercio Sampaio destaca que isso impacta

a própria função legiferante do Estado – exigindo dele uma

maior produção de normas jurídicas – trazendo consequên-

cias para a teoria das fontes do Direito . Conforme explica

Gilberto Bercovici:

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Com o advento do Estado Social, governar passou a não

ser mais a gerência de fatos conjunturais, mas também, e

sobretudo, o planejamento do futuro, com o estabelecimen-

to de políticas a médio e longo prazo. Com o Estado social,

o government by policies vai além do mero government by

law do liberalismo. A execução de políticas públicas, tarefa

primordial do Estado social, com a consequente exigência

de racionalização técnica para a consecução dessas mes-

mas políticas, acaba por se revelar muitas vezes incompa-

tível com as instituições clássicas do Estado Liberal.

Com as novas tarefas do Estado, o livre desenvolvimento

da personalidade é fundado nas próprias prestações esta-

tais. Ou seja, confia-se à instância estatal totalizante o po-

der de decidir, em nome de todos, o que é o bem de cada

um, por meio dos direitos sociais [...]

O Estado Social fundamenta e consolida a unidade política

materialmente, tornando–se o locus da luta de classes. Sua

função, geralmente, é de mediador, tentando buscar a inte-

gração social com base em um mínimo de valores comuns.

Não há, portanto, o desaparecimento da luta de classes,

mas a criação de meios que garantam que ela não irá, ne-

cessariamente, se degenerar em um confronto aberto.

A ampliação dos direitos políticos e o conteúdo material

dos direitos sociais tornou o pós Segunda Guerra Mundial

o período em que a emancipação e a reivindicação da de-

mocracia econômica e social chegaram ao seu momento

mais elevado.

No centro do sistema econômico mundial, o direito econô-

mico substituiu, de certo modo, o direito privado e a lógi-

ca da codificação como instrumento jurídico garantidor da

estabilidade do sistema. (BERCOVICI, 2013, p. 136-137).

Assim, o Estado de Bem-Estar Social aumenta a atuação

das três funções do Estado: legislar, julgar e exercer a ad-

ministração pública. Há o aumento da quantidade de textos

normativos (as demandas sociais são positivadas na forma

de leis e outras espécies normativas), consequentemente, o

Poder Executivo precisa adquirir uma nova postura diante

dessa normatividade (dando às leis maior ou menor eficá-

cia a depender do contexto), bem como o Poder Judiciário

passa a ser demandado para dar eficácia às normas positi-

vadas, sanando eventual inércia do legislador (e.g. não re-

gulamentando determinada norma já existente) e do Execu-

tivo (e.g. não implementando política pública determinada

pela lei), bem como circunscrevendo quais são os limites e

o alcance das normas jurídicas positivadas (e.g. decidindo

em relação às políticas públicas, direitos sociais e poder de

intervenção do Estado na economia etc). Portanto, nesse

contexto, diante das possiblidade abertas pela presença e

pela ausência do texto normativo, a decidibilidade é apre-

sentada por Tercio Sampaio como um conceito essencial

para se compreender o Direito:

O direito continua resultando de uma série de fatores cau-

sais muito mais importantes que a decisão, como valores

socialmente prevalentes, interesses de fato dominantes,

injunções econômicas, políticas etc. Ele não nasce da pena

do legislador. Contudo, a decisão do legislador, que não o

produz, tem a função importante de escolher uma possi-

bilidade de regulamentação do comportamento em detri-

mento de outras que, apesar disso, não desaparecem do

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horizonte de experiência jurídica, mas ficam aí, presentes e

à disposição, toda vez que uma mudança se faça oportuna.

Ora, essa situação modifica o status científico da Ciência

do Direito, que deixa de se preocupar com a determina-

ção daquilo que materialmente sempre foi direito com o fito

de descrever aquilo que, então, pode ser direito (relação

causal), para ocupar-se com a oportunidade de certas de-

cisões, tendo em vista aquilo que deve ser direito (relação

de imputação). Nesse sentido, seu problema não é propria-

mente uma questão de verdade, mas de decidibilidade.

[...] os enunciados da ciência jurídica têm sua validade

dependente de sua relevância prática. Embora não seja

possível deduzir deles as regras de decisões, é sempre

possível encará-los como instrumentos mais ou menos

utilizáveis para a obtenção de uma decisão. Assim, por

exemplo, Mário Masagão, em seu Curso de Direito Admi-

nistrativo (1977:108), após examinar, entre outras, uma teo-

ria sobre a função executiva do Estado, refuta-a, afirmando

que sua fórmula, segundo a qual essa função é desempe-

nhada quando o Estado “cria situações de direito subjetivo,

obrigando-se a si mesmo, ou aos indivíduos, ao cumpri-

mento de certa prestação’’, é manifestamente “estreita e in-

suficiente para caracterizar o Poder Executivo, que não se

limita a criar situações jurídicas de caráter subjetivo, mas

por meios diretos e indiretos promove a manutenção da

ordem e o fomento da cultura e da prosperidade do país’’.

A questão “como entender a função executiva do Estado

em relação à função legislativa e judiciária?’’ tem como

cerne dubitativo não diretamente a ocorrência histórico--

-social do fenômeno do Estado, mas uma concepção de

Estado que deve fomentar o bem-estar e a prosperidade

geral. A questão é tipicamente de decidibilidade. (FERRAZ

JR., 2018, p. 62-63).

O Brasil pós Constituição Federal de 1988 irá vivenciar exata-

mente essa experiência. O Poder Executivo e o Poder Judiciá-

rio, diante do texto normativo positivado, passaram a moldar,

por meio de seu poder concreto e de suas decisões políticas

(muitas vezes travestidas de decisões “técnicas”), o alcance

e os limites das normas constitucionais e infraconstitucionais.

O Legislativo, por sua vez, passou a agir no mesmo sentido,

emendando a constituição ou regulamentando as diretrizes

constitucionais por meio de leis complementares e outras

espécies normativas. Conforme assevera Gilberto Bercovici,

parte substancial deste movimento teve por finalidade “blo-

quear a realização do programa emancipatório e transforma-

dor presente no texto, de 1988, privilegiando a realização de

políticas ortodoxas de ajuste fiscal e a inclusão, pela via da

reforma constitucional, de dispositivos que servem para ‘blin-

dar’ a sua opção política, contrária às decisões fundamentais

originais da constituinte” (BERCOVIC, 2007, p. 463).

3. Alysson Leandro Mascaro: materialismo histórico, de-

rivação e os impactos das crises capitalistas no Estado.

“Simplesmente a obra mais importante do pensa-

mento político marxista nas últimas décadas” – Sla-

voj Žižek na quarta capa da obra Estado e Forma

Política de Mascaro.

A teoria do Direito de Alysson Mascaro, jurista nascido em

1976, surge no século XXI assentada sobre as premissas do

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materialismo histórico de Karl Marx. Se adotarmos a clas-

sificação de Ingo Elbe (2010, p. 29), podemos considerá-la

como integrante da nova leitura do marxismo, uma terceira

“etapa” do pensamento marxista iniciada a partir de 1965,

que agrupa determinadas correntes de pensamento (althus-

serianos, derivacionistas, críticos do valor etc) a partir de cri-

térios metodológicos e não simplesmente cronológicos. No

campo do Direito, Mascaro tem como principal referência a

teoria jurídica de Evguiéni Pachukanis (CALDAS, 2017), juris-

ta soviético que ganhou notoriedade por apresentar a formu-

lação marxista mais profícua a respeito da relação entre eco-

nomia e Direito (NAVES, 2010). A teoria pachukaniana trata

de mostrar a correlação intrínseca entre forma mercadoria

(nos termos definidos por Marx) e a constituição do Estado

de Direito (PACHUKANIS, 2017, p. 139 et seq). Assim, par-

tindo dessa premissa, Mascaro apresenta uma teoria sobre o

Estado e o Direito, explicando a derivação6 da forma política

e da forma jurídica a partir da forma mercadoria:

A forma jurídica é uma forma de sujeitos de direito atomi-

zados que se submetem ao poder estatal e transacionam

conforme mercadorias. A estrutura do capitalismo mercan-

til enseja as formas do direito, que então passam a pos-

sibilitar as próprias relações do capital. As normas e as

atitudes específicas dos juristas, muitas delas podem até

mesmo ir contra o capitalismo. A forma do direito não. Para

as atividades mercantis, a estrutura jurídica lhe é um dado

necessário e imediatamente correlato. Tal estrutura jurídica

– técnica, normativa, fria e impessoal, apoiada em catego-

rias como o sujeito de direito, o direito subjetivo e o dever –,

que vem a ser o fenômeno jurídico tal como o conhecemos

modernamente, nasceu apenas com o capitalismo, como

sua forma correlata necessária. (MASCARO, 2015, p. 06).

O fim da União Soviética e dos países que em seu redor,

levando a um refluxo global do marxismo, é uma contin-

gência histórica que não impacta o surgimento da teoria

mascariana do Direito. Pachukanis, aliás, sequer teve sua

teoria absorvida pela doutrina jurídica soviética oficial (pelo

contrário, suas ideias se contrapunham ao pensamento so-

viético-stalinista e esse confronto lhe custou a vida - CAL-

DAS, 2017). O elemento histórico central no qual a teoria de

Alysson Mascaro é outro: a crise do capitalismo no século

XXI, que tem por consequência outras subcrises e movi-

mentos reativos: crise do fordismo e ascensão do pós-for-

dismo; crise do Estado de Bem-Estar Social e ascensão do

neoliberalismo; crise dos regimes democráticos e ascensão

do pensamento neoconservador.

A crise estrutural do capitalismo após a década de 1980 ini-

ciou um novo regime de acumulação denominado de pós-

-fordista, no qual as tradicionais formas de organização do

trabalho e da economia existentes no fordismo passaram

a se modificar (sobre o tema, vide: HIRSCH, 2010, p. 33

et seq; BAUMAN, 2016; CLARKE, 1991). As consequências

no campo jurídico-político, inclusive, são visíveis e atuais:

diminuição de direitos trabalhistas e previdenciários, pre-

carização do trabalho, cortes de orçamento na área social,

privatização de empresas estatais, permanente limitação

dos gastos públicos, etc.

Esse cenário se combina (e ajuda a provocar) à crise política.

Os Estados encontram-se cada vez mais impotentes em re-

lação aos ditames das grandes corporações e do mercado

financeiro. Os indivíduos vivenciam ambiente de crescente

competitividade econômica que traz como consequência

o aumento da opressão no mundo do trabalho. Ao mesmo

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tempo, o trabalhador encontra-se cada vez menos provido

das garantias jurídicas tradicionais e vivencia um permanente

sentimento de desesperança para com o futuro (as perspec-

tivas de empregabilidade estável e aposentadoria se mos-

tram cada vez menos promissoras). Enquanto cidadão, tal

indivíduo vivencia dois sentimentos igualmente negativos:

(i) perde a convicção de que o voto e as eleições (e con-

sequentemente os representantes políticos) podem conduzir

o Estado a adotar políticas que mudem significativamente

as condições econômicas e os horizontes desalentadores;

(ii) culpa a suposta presença excessiva do Estado na eco-

nomia como responsável pelos problemas existentes, mas

não encontra ao redor do mundo, experiências socialmente

exitosas nas iniciativas neoliberais, pelo contrário, se depara

com o oposto (CALDAS, 2018, p. 27-28).

Nesse contexto, a teoria do Direito de Mascaro tem sua

trajetória permeada por duas grandes questões do século

XXI: (i) explicar como Estado e Direito estão estruturalmen-

te vinculados à reprodução do capitalismo e, portanto, são

incapazes de superar as contradições e consequências de-

letérias inerentes a este modo de produção; (ii) demonstrar

que o capitalismo é crise (sua ocorrência não é acidental, é

inevitável e agravada no curso do tempo) e que o Estado e

o Direito se reformulam como elementos de resposta à essa

dinâmica, criando mecanismos distintos para lidar com os

fenômenos emergentes (HIRSCH, 2010, p. 45 et seq). Tais

ideias, presentes nas obras de Mascaro, são apresentadas

de forma mais bem acabada em Estado e Forma Política, no

qual o autor argumenta:

Se os regimes de acumulação seguem uma tendência ao

seu constrangimento econômico, os modos de regulação

se assentam sobre uma multiplicidade de interesses, forças

e relações sociais. As crises no capitalismo podem se re-

velar tanto na dinâmica econômica – crise de acumulação

– quanto na consecução institucional da sociedade – crise

de regulação. Pelo acoplamento imperfeito entre economia

e politica, as crises parciais procedem a abalos que são rea-

bsorvidos posteriormente, ensejando novos níveis de arti-

culação sociais. Por sua vez, crises estruturais são aquelas

que comprometem a própria reprodução econômica geral

do capitalismo. Elas não só envolvem descontinuidades no

regime de acumulação e insuficiências nos modos de regu-

lação, mas também contradições profundas entre acumu-

lação e regulação, de tal sorte que não haja dinâmica eco-

nômica que carreie transformações politicas, institucionais e

sociais tampouco peso estatal e social suficiente para alterar

o modelo econômico. (MASCARO, 2013, p. 126).

Assim, a teoria mascariana do Direito se insere no contexto

da crise de legitimidade do Estado, provocada pela des-

crença nas instituições estatais, fenômeno que se manifes-

ta no nível político (questiona-se a possibilidade da vonta-

de popular ser respeitada) e no econômico (questiona-se

a capacidade do Estado enfrentar as crises sistêmicas do

modo de produção capitalista). Nesse contexto, inclusive,

é que surge a resposta neoconservadora ao fenômeno da

crise de legitimidade do Estado e da impotência de suas

instituições: apreço pelo autoritarismo, proliferação do dis-

curso de ódio, defesa da relativização dos direitos huma-

nos, diminuição da intervenção do Estado na economia

etc. Mascaro, se opondo ao pensamento neoconservador,

procura mostrar que o “fracasso” do Estado – em termos

político-econômicos – não são produto de uma falência

ética ou da incompetência administrativa dos governantes,

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D

Notas

1. Doutor em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Faculdade de Direito da USP. Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Portugal). Diretor do Instituto Luiz Gama, entidade que atua na defesa dos direitos humanos. Professor da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu em São Paulo/SP e do Programa de Mestrado da Escola Paulista de Direito (EPD).

2. “Bonfim (1995; 2001) indica, aliás, um ponto extremamente interessante. Para ele, Reale se aproximaria das crenças de outros autoritários – brasileiros e internacionais – para os quais o sistema liberal poderia até funcionar, desde que houvesse cidadãos habilitados para tanto. Num primeiro momento, a real participação no poder deveria se dar apenas para as elites, representadas nas corporações e no topo do poder. Com o tempo, contudo, se as condições educacionais e de esclarecimento das massas melhorassem, talvez fosse possível a elas sair da participação limitada nos municípios, exercendo plena-mente a sua cidadania dentro do Estado. Uma proposta próxima à de vários dos autoritários do Estado Novo, como Oliveira Vianna, e que, talvez, possa ter facilitado muito a transição de Reale de um grupo para outro”. (Bertonha, 2013, p. 281).

3. O Estado é “um meio na medida em que sua estrutura e sua força originam-se historicamente, através de mil vicissitudes, para possibilitar aos indivíduos uma vida condigna no seio de uma comunidade fundada nos valores da paz e do desenvolvimento. Por outro lado, o Estado se põe como fim, enquanto representa, e tão-somente enquanto representa, concomitantemente, uma ordem jurídica e uma ordem econômica, cujos valores devem ser respeitados por todos como condição de coexistência social harmônica, onde os direitos de cada um pressupõem iguais direitos dos demais, assegurando-se cada vez mais a plena realização desse ideal ético” (REALE, 2002a, p. 80).

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4. “Uma posição convencionalista exige ademais que se considerem os diferentes ângulos de uma análise linguística. Quando definimos o conceito de direito é, pois, importante saber se estamos preocupados em saber se se trata de um substantivo ou de um adjetivo, ou de um advérbio, tendo em vista seu relacionamento formal (gramatical) numa proposição. Ou se estamos preocupados em saber aquilo que queremos comunicar com seu uso, ou seja, se que-remos saber se direito se refere a um conjunto de normas ou a uma faculdade ou a uma forma de controle social. Ou ainda se nos preocupa a repercussão desse uso para aqueles que se valem da expressão quando, por exemplo, alguém proclama: “o direito é uma realidade imperecível!” No primeiro caso, a análise é sintática, isto é, estamos preocupados em definir o uso do termo tendo em vista a relação formal dele com outros vocábulos (por exemplo, direito é uma palavra que qualifica (adjetivo) um substantivo, digamos o comportamento humano, ou direito modifica um modo de agir – agir direito: advérbio). No segundo caso, a análise é semântica, isto é, queremos definir o uso do termo tendo em vista a relação entre ele e o objeto que comunica (por exemplo: direito designa um comportamento interativo ao qual se prescreve uma norma). No terceiro, definimos o uso do termo tendo em vista a relação do termo por quem e para quem o usa e, nesse caso, a análise é pragmática (por exemplo: a palavra direito serve para provocar atitudes de respeito, temor)”. (FERRAZ JR., 2018, p. 16).

5. “Na verdade, o advento e o crescimento do Estado-gestor tornou muito mais complexa a legislação como fonte do direito. Se no início ela pôde-se restrin-gir à produção de leis, hoje abarca um rol enorme de atos, como resoluções, regimentos, instruções normativas, circulares, ordens de serviço etc. que, em tese (liberal), deveriam estar subordinados às leis enquanto expressão da vontade do povo, mas que, na prática, implodem a chamada estrutura hierárquica das fontes. O que observamos, na verdade, é que a chamada hierarquia das fontes, não obstante ocultar uma relação de poder e de exercício de poder, num âmbito circunscrito, tecnicamente é um instrumento importante para o mapeamento formal das competências estatais. O ponto de partida é a Constituição, que, por pressuposto analítico, determina todas as competências normativas do Estado”. (FERRAZ JR., 2018, p. 192).

6. Sobre a teoria e conceito de derivação vide CALDAS, Camilo Onoda. A teoria da derivação do Estado e do Direito. São Paulo: Outras Expressões/Dobra Universitário. 2015.

7. Um estudo dentro dessa linha de pensamento aplicado à um tema específico pode ser observado em: ALMEIDA, Silvio. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte: Letramento, 2018.

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