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92 v 30 DE JUNHO DE 2011 A entrada da Junta de Freguesia de São João Baptista, em ple- no centro histórico de Porto de Mós, podia ser banal, não fosse haver um contentor circular de plástico verde a dar as boas-vindas aos visitantes. A estranha peça é um com- postor, usado para reaproveitar resíduos orgânicos (cascas de vegetais e frutas, fo- lhas secas, relva cortada...), e, por ação de minhocas e bactérias, transformá-los em composto, um adubo natural com aspeto de terra, muito rico em nutrientes. A ideia foi de José Gomes dos Santos, 57 anos, reformado. Ele é o presidente da- quela junta e um dos mais entusiastas parceiros do projeto que a Valorlis – em- presa que recolhe e trata os resíduos só- lidos urbanos da região de Leiria – desen- volve desde 2007. Além de fazer publicidade e despertar a curiosidade dos visitantes, o autarca encarrega-se de dar a formação e os reci- pientes. «Já distribuí mais de 200 e tenho 70 pessoas à espera. Penso que estão mais sensíveis em relação aos químicos.» Ele também está. Não usa fertilizantes artificiais e nutre os seus 400 metros quadrados de quintal apenas com o que o compostor lhe dá. «Misturo tudo e a mi- nhoca faz o resto. O grande segredo são as cascas de fruta e vegetais.» Dica anotada. ATERRO EM FORMA A família Silva Gomes, de Milagres, Lei- ria, foi das pioneiras. Há já quatro anos AMBIENTE SOCIEDADE Minhocas mágicas Um projeto de compostagem doméstica pôs milhares de famílias a produzir adubo 100% natural, na região de Leiria POR PEDRO MIGUEL SANTOS DE PEQUENINOS... Thierry (à esq.) e Cristofer, filhos de um casal português, ex-emigrante na Suíça, acompanharam os pais na formação sobre compostagem caseira Dicas Faça em casa O que deve saber para entrar no mundo da compostagem Compre um compostor ou construa-o com paletes de madeira. Coloque-o à sombra de uma árvore, em contacto com a terra. Disponha ramos grossos e deite terra por cima. Junte uma parte de resíduos verdes (cascas de fruta e vegetais, borras de café, flores) e duas de castanhos (fo- lhas secas, ramos de podas, cascas de batata). Remexa semanalmente. Regue, se estiver muito seco. Ao fim de três a seis semanas, o composto está pronto. NÃO PONHA Restos de comida, excrementos de animais domésticos, cinza, plantas tra- tadas com químicos, produtos lácteos, medicamentos. Mais informações em www.valorlis.pt que Célia Margarida, técnica de recursos humanos, e Paulo Jorge, metalúrgico, ambos com 39 anos, fabricam adubo ca- seiro para a horta. É ao sábado que o casal e as duas filhas, de 10 e 5 anos, se dedicam à jardinagem. Têm 1 800 metros qua- drados de terra para cuidar: além de um grande relvado e várias árvores de fruto, sobra espaço para canteiros de roseiras, gladíolos, lírios e ervas aromáticas. «Usa- mos o composto para plantar e há muita diferença no sabor dos vegetais», garante o homem da casa. Miguel Aranda da Silva, administrador da Valorlis, orgulha-se do projeto. Não só pela aceitação – foram realizadas 145 sessões de formação e distribuídos quase 7 mil contentores –, como pelos resulta- dos. «Já evitámos que 8 369 toneladas de resíduos fossem depositadas em aterro.» A estratégia é simples: quem quiser um compostor gratuito tem de ir a uma ação de formação, para aprender como se faz. Nesses dias, há gente dos 8 aos 80, famí- lias inteiras, como os Bernardino, da Ma- rinha Grande: Ana Paula, 40 anos, e Luís, 49, ex-emigrantes na Suíça, trouxeram os filhos de 10 e 14 anos, Cristofer e Thierry. Têm um quintal, queriam melhorar a qua- lidade da terra e aproveitar os resíduos da cozinha. «Temos de mudar as mentali- dades desde cedo; trouxe os meus filhos porque quero um futuro melhor para eles e para o planeta», diz Ana Paula. Será que vai também colocar o compostor à entra- da de casa?

Minhocas mágicas

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Um projeto de compostagem doméstica pôs milhares de famílias a produzir adubo 100% natural, na região de Leiria

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92 v 30 DE JUNHO DE 2011

Aentrada da Junta de Freguesia de São João Baptista, em ple-no centro histórico de Porto de Mós, podia ser banal, não

fosse haver um contentor circular de plástico verde a dar as boas-vindas aos visitantes. A estranha peça é um com-postor, usado para reaproveitar resíduos orgânicos (cascas de vegetais e frutas, fo-lhas secas, relva cortada...), e, por ação de minhocas e bactérias, transformá-los em composto, um adubo natural com aspeto de terra, muito rico em nutrientes.A ideia foi de José Gomes dos Santos, 57 anos, reformado. Ele é o presidente da-quela junta e um dos mais entusiastas parceiros do projeto que a Valorlis – em-presa que recolhe e trata os resíduos só-lidos urbanos da região de Leiria – desen-volve desde 2007. Além de fazer publicidade e despertar a curiosidade dos visitantes, o autarca encarrega-se de dar a formação e os reci-pientes. «Já distribuí mais de 200 e tenho 70 pessoas à espera. Penso que estão mais sensíveis em relação aos químicos.»Ele também está. Não usa fertilizantes artificiais e nutre os seus 400 metros quadrados de quintal apenas com o que o compostor lhe dá. «Misturo tudo e a mi-nhoca faz o resto. O grande segredo são as cascas de fruta e vegetais.» Dica anotada.

ATERRO EM FORMAA família Silva Gomes, de Milagres, Lei-ria, foi das pioneiras. Há já quatro anos

AMBIENTE SOCIEDADE

Minhocas mágicasUm projeto de compostagem doméstica

pôs milhares de famílias a produzir adubo 100% natural, na região de Leiria

POR PEDRO MIGUEL SANTOS

DE PEQUENINOS... Thierry (à esq.) e Cristofer, filhos de um casal português, ex-emigrante na Suíça, acompanharam os pais na formação sobre compostagem caseira

Dicas Faça em casaO que deve saber para entrar no mundo da compostagem

• Compre um compostor ou construa-o com paletes de madeira.

• Coloque-o à sombra de uma árvore, em contacto com a terra.

• Disponha ramos grossos e deite terra por cima.

• Junte uma parte de resíduos verdes (cascas de fruta e vegetais, borras de café, flores) e duas de castanhos (fo-lhas secas, ramos de podas, cascas de batata).

• Remexa semanalmente. Regue, se estiver muito seco. Ao fim de três a seis semanas, o composto está pronto.

NÃO PONHA Restos de comida, excrementos de animais domésticos, cinza, plantas tra-tadas com químicos, produtos lácteos, medicamentos.

Mais informações em www.valorlis.pt

que Célia Margarida, técnica de recursos humanos, e Paulo Jorge, metalúrgico, ambos com 39 anos, fabricam adubo ca-seiro para a horta. É ao sábado que o casal e as duas filhas, de 10 e 5 anos, se dedicam à jardinagem. Têm 1 800 metros qua-drados de terra para cuidar: além de um grande relvado e várias árvores de fruto, sobra espaço para canteiros de roseiras, gladíolos, lírios e ervas aromáticas. «Usa-mos o composto para plantar e há muita diferença no sabor dos vegetais», garante o homem da casa.Miguel Aranda da Silva, administrador da Valorlis, orgulha-se do projeto. Não só pela aceitação – foram realizadas 145 sessões de formação e distribuídos quase 7 mil contentores –, como pelos resulta-dos. «Já evitámos que 8 369 toneladas de resíduos fossem depositadas em aterro.» A estratégia é simples: quem quiser um compostor gratuito tem de ir a uma ação de formação, para aprender como se faz.Nesses dias, há gente dos 8 aos 80, famí-lias inteiras, como os Bernardino, da Ma-rinha Grande: Ana Paula, 40 anos, e Luís, 49, ex-emigrantes na Suíça, trouxeram os filhos de 10 e 14 anos, Cristofer e Thierry. Têm um quintal, queriam melhorar a qua-lidade da terra e aproveitar os resíduos da cozinha. «Temos de mudar as mentali-dades desde cedo; trouxe os meus filhos porque quero um futuro melhor para eles e para o planeta», diz Ana Paula. Será que vai também colocar o compostor à entra-da de casa?