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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS Exmo. Sr. Dr. Juiz da ____ª Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por conduto do Procurador da República in fine assinado, no ofício de uma de suas atribuições legais, com fundamento nos artigos 5°, inciso XXXII, 129, inciso III, da Constituição da República, c/c os artigos 6º, inciso XIII, da Lei Complementar n°. 75/93 e 82, inciso I, da Lei n.° 8.078/90, vem, perante Vossa Excelência, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA em face de McDONALD´S COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º 42.591.651/0001-43, com sede na Alameda Amazonas, n.º 253 – Alphaville Industrial – Barueri – SP, CEP 06454- 070,

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

Exmo. Sr. Dr. Juiz da ____ª Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por conduto do Procurador da

República in fine assinado, no ofício de uma de suas atribuições legais, com fundamento

nos artigos 5°, inciso XXXII, 129, inciso III, da Constituição da República, c/c os artigos

6º, inciso XIII, da Lei Complementar n°. 75/93 e 82, inciso I, da Lei n.° 8.078/90, vem,

perante Vossa Excelência, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA

em face de McDONALD´S COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA.,

pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º 42.591.651/0001-43, com

sede na Alameda Amazonas, n.º 253 – Alphaville Industrial – Barueri – SP, CEP 06454-

070,

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pelos fundamentos de fato e de direito a seguir apresentados.

1. DOS FATOS

Foi instaurado Procedimento Administrativo Cível1 nesta Procuradoria da

República em Minas Gerais, com o escopo de apurar eventuais irregularidades na oferta

dos produtos da empresa McDonald´s Comércio de Alimentos Ltda., ora requerida,

especificamente na falta de informações veiculadas nas embalagens dos produtos

alimentícios ofertados no mercado de consumo referentes às características nutricionais

dos mesmos.

Conforme a última alteração contratual da empresa ré (DOC. 1), a

mesma explora e opera restaurantes e lanchonetes, por sua própria conta ou de terceiros.

Assim, neste último caso, a requerida firma contrato de franquia com diversas empresas,

cedendo para estas últimas o direito de uso da marca McDonald´s, o direito de

comercialização dos produtos alimentícios fabricados pela requerida e o direito de uso de

tecnologia de implantação e administração de negócios de venda de produtos alimentícios,

mediante uma remuneração previamente acertada.

Nesse quadro, a requerida repassa, dentre outras coisas, as embalagens

dos produtos McDonald´s para as franqueadas comercializarem esses produtos e/ou indica

o padrão das embalagens que todos os franqueados deverão adotar obrigatoriamente.

Portanto, as características das embalagens dos produtos alimentícios comercializados

tanto pela requerida quanto por suas franqueadas são definidos por aquela (empresa

McDonald´s Comércio de Alimentos Ltda.).

Nessa mesma lógica, todas as campanhas publicitárias de divulgação dos

produtos McDonald´s são realizadas pela requerida.

Tal obrigatoriedade das franqueadas seguirem as determinações da

empresa ré na comercialização dos produtos alimentícios restou esposado no site da

requerida que afirma que “a principal característica de um restaurante franqueado é que ele 1 PAC n.º 1.22.000.002821/2003-19

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é fruto de uma parceria entre o empreendedor local e o McDonald´s. Este empreendedor

também responde pela administração do restaurante, sempre em fina sintonia com a

direção da empresa, o que garante a qualidade dos produtos e do atendimento”. (DOC. 2)

A fim de averiguar as eventuais irregularidades contidas nas embalagens

dos produtos McDonald´s, através do ofício n.º 488/2003 PRMG SOTC FAM, este

Parquet Federal requisitou à requerida que a mesma esclarecesse os procedimentos pelos

quais fornece informações aos consumidores dos produtos alimentícios que oferece.

Em 22 de dezembro de 2003, atendendo à requisição ministerial, a

requerida informou que “além de buscar sempre a excelência de suas refeições, a

McDonald´s preocupa-se em oferecer o máximo possível de informações e orientações aos

seus consumidores e às comunidades onde atua, haja vista as recentes participações em

programas de saúde e qualidade de vida como o ‘Agita São Paulo’ e o ‘Saber em

Movimento’, o lançamento do site www.comendoeaprendendo.com.br, que traz informações

nutricionais para adultos e crianças, o hot site ‘Nutrição e Saúde’, a parceria com a

Sociedade Paulista de Pediatria e a disponibilidade do Guia Nutricional nos Restaurantes

da Rede (exemplar)” (DOC. 3).

Da manifestação supra, depreende-se induvidosamente que a empresa

requerida não disponibiliza nas embalagens dos produtos alimentícios que comercializa

quadro nutricional que informe ao consumidor o percentual fornecido pelo produto

colocado no mercado de consumo em relação ao valor diário recomendado de cada

nutriente, tais como os valores percentuais de carboidratos, proteínas, gorduras, gorduras

saturadas, gorduras trans, fibra alimentar, sódio etc.

A participação da requerida em eventos que visam divulgar hábitos

alimentares saudáveis, bem como o patrocínio de sites na internet que veiculem

conhecimentos sobre o valor nutricional dos alimentos e a disponibilização nos

Restaurantes da Rede de Guias Nutricionais, não bastam para que a mesma cumpra seu

dever de informar aos consumidores todas as características nutricionais dos alimentos que

oferece no mercado de consumo, pois a única forma de garantir essas informações aos

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consumidores é disponibilizar o quadro nutricional informativo do percentual fornecido

pelo produto fornecido pela requerida em relação ao valor diário recomendado de cada

nutriente nas próprias embalagens dos alimentos.

Ora, indubitável que não se pode admitir o condicionamento do

oferecimento das informações nutricionais dos alimentos ofertados aos consumidores à

participação dos mesmos em eventos sociais, ao acesso à Internet ou à leitura de um Guia

Nutricional disponibilizado no balcão dos estabelecimentos comerciais, uma vez que,

muitas vezes, o consumidor não terá acesso ao conhecimento destes informativos, sendo,

como se demonstrará adiante, dever do fornecedor de produtos no mercado de consumo

veicular informações claras, precisas e ostensivas sobre as características, qualidade,

quantidade, composição, dentre outros elementos do produto.

Para se garantir o efetivo direito de informação do consumidor, a

requerida deve disponibilizar, nas embalagens dos produtos alimentícios que comercializa,

quadro nutricional que informe ao consumidor o percentual fornecido pelo produto

colocado no mercado de consumo em relação ao valor diário recomendado de cada

nutriente, tais como os valores percentuais de carboidratos, proteínas, gorduras, gorduras

saturadas, gorduras trans, fibra alimentar, sódio etc.

Nesse diapasão, este Parquet Federal inquiriu a requerida sobre a

possibilidade de se disponibilizar tal quadro nutricional nas embalagens dos produtos

oferecidos pela mesma.

Em 26 de fevereiro de 2004, atendendo à requisição ministerial, a

requerida se manifesta no seguinte sentido:

“(...) a McDonald´s pôs-se a estudar a possibilidade da divulgação

de informações nutricionais de seus produtos em cada uma de suas

embalagens.

Ocorre que a empresa segue os mais rigorosos padrões mundiais,

não só quanto à qualidade de seus alimentos e bebidas, mas

também quanto às suas apresentação (sic).

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Neste momento, ainda, caminha-se para uma padronização nunca

antes vista, que, a médio prazo, deve apresentar embalagens

idênticas em todo o mundo, sem, portanto, nenhuma palavra, letra

ou sinal indicativo de determinado idioma.

Aliado a esse projeto, existe também a constante preocupação da

McDonald´s em cumprir rigorosamente a legislação de cada país

em que a marca se apresenta. E temos agora, no Brasil, a Resolução

RDC n.º 360 de 23/12/2003 que, ao tratar do controle sanitário na

área de alimentos, visando a proteção e saúde do consumidor,

dispôs claramente em seu Anexo (Regulamento Técnico sobre

Rotulagem Nutricional de Alimentos Embalados):

‘1. Âmbito de Aplicação

O presente Regulamento Técnico se aplica à rotulagem nutricional

dos alimentos produzidos e comercializados, qualquer que seja sua

origem, embalados na ausência do cliente e prontos para serem

oferecidos aos consumidores.

(...)

O presente Regulamento Técnico não se aplica:

(...)

8. aos alimentos preparados e embalados em restaurantes e

estabelecimentos comerciais, prontos para o consumo’.

Sendo assim, a McDonald´s opta por divulgar o teor nutricional de

seus produtos de formas alternativas à própria embalagem, como

aliás já demonstrou em sua última manifestação neste mesmo

feito”. (DOC. 4).

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Diante do posicionamento adotado pela requerida, oficiou-se a Agência

Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para que se manifestasse sobre as questões

alegadas pela empresa ré.

Através da Nota Técnica n.º 003/04/GPESP/GGALI/ANVISA, a agência

reguladora em questão se manifesta no sentido de que:

“O Ministério da Saúde considera que a promoção de práticas

alimentares saudáveis está inserida no contexto da adoção de

estilo de vida saudáveis (sic) e é um componente importante da

promoção da saúde. A socialização do conhecimento sobre os

alimentos e processos de alimentação e o acesso à informação

precisam ser enfatizados, como condição indispensável à

construção da cidadania. Esta abordagem inclui a adoção de

medidas voltadas ao disciplinamento da publicidade de

produtos alimentícios e também as iniciativas que possibilitem

o monitoramento de práticas de marketing de alimentos. (...)

Recentemente, a ANVISA aprovou as normas de rotulagem

nutricional, Resoluções – RDC 359 e 360 de 26 de dezembro de

2003, tornando obrigatória a declaração do valor energético

carboidratos, proteínas, gorduras, gorduras saturadas,

gorduras trans, fibra alimentar e sódio nos rótulos dos

alimentos com a respectiva informação sobre o percentual

fornecido pelo produto em relação ao valor diário

recomendado de cada nutriente”. (DOC. 5).

A Resolução – RDC n.º 359, de 23 de dezembro de 2003, da ANVISA

dispões que:

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“1. ÂMBITO DE APLICAÇÃO

O presente Regulamento Técnico se aplica à rotulagem

nutricional dos alimentos produzidos e comercializados,

qualquer que seja sua origem, embalados na ausência do

cliente e prontos para serem oferecidos aos consumidores”

(DOC. 6).

Da resposta fornecida pela ANVISA, verifica-se que a promoção de

práticas alimentares saudáveis está inserida num contexto da adoção de estilo de vida

saudável e é um componente importante para a promoção da saúde.

Todavia, atualmente, a tendência que se evidencia em todo mundo é do

avanço da comida industrializada, acessível a dezenas de milhões de pessoas. Conforme

ressalta Ricardo Uauy y Carlos A. Monteiro 2, “as culturas alimentares tradicionais

baseadas em alimentos primários com limitado processamento, exceto por métodos

tradicionais de preservação, como a desidratação solar, a fermentação e o salgado; são uns

hábitos predominantemente rurais. A urbanização se associa freqüentemente ao abandono

da alimentação tradicional e a introdução de uma cultura alimentar urbana. A dieta rural

predominantemente baseada em produtos vegetais com pequenas quantidades de alimentos

de origem animal contrasta com a dieta urbana ocidental típica pela diferença de

quantidade e qualidade, a virtual ausência de açúcar e outros carboidratos refinados, exceto

pelo açúcar de frutos e pela maior quantidade de fibra”.

Assim, em nossa sociedade, os alimentos são produzidos por corporações

gigantescas, que atuam globalmente. A produção massificada e padronizada das grandes

empresas leva a uma significativa redução dos custos das matérias primas e da mão de

obra, e assim o consumidor pode dispor de porções maiores de comida a um custo menor.

Na lógica capitalista de um mercado competitivo, o bom andamento dos

negócios de cada empresa depende do aumento do consumo de seus produtos. Os

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� MONTEIRO, Ricardo Uauy y Carlos A. El Reto de Mejorar la Alimentación y Nutrición en las Américas.

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fornecedores trabalham, portanto, para que as pessoas consumam cada vez mais e mais

alimentos. As estratégias empregadas para aumentar o consumo de alimentos são

sofisticadas. Conquistar o gosto dos consumidores é objetivo de suma importância, e é

considerada uma tendência generalizada do paladar humano a preferir o sabor da gordura e

do açúcar. Uma vez que as técnicas industriais – enlatamento, desidratação e congelamento

– destroem grande parte do sabor dos alimentos, e com o intuito de seduzir consumidores,

os fabricantes manipulam cuidadosamente ingredientes químicos, criando colorantes,

espessantes e aromatizantes para obter a cor, o aroma, a consistência e o gosto mais

atraentes.

Os produtos alimentícios oferecidos pela requerida estão dentro

deste contexto capitalista de produção, acarretando o oferecimento de quantidades

cada vez maiores de alimentos altamente calóricos aos consumidores.

Tal situação vem causando um agravamento dos casos de obesidade pela

maior ingestão de calorias através do consumo dos produtos alimentícios produzidos sobre

o modelo de produção capitalista. Especialistas do mundo inteiro apontam para duas

constatações inequívocas: 1) a obesidade é hoje um problema mundial de saúde

pública, por si só considerada uma doença de escala pandêmica, tantos são os distúrbios e

doenças para as quais concorre; e 2) embora outros fatores (como a predisposição genética

e o sedentarismo) concorram para a obesidade, a dieta é sua principal causa.

Conforme conclui um estudo publicado pela Universidade Federal

Fluminense, de autoria dos Doutores Cristina Pinheiro Mendonça e Luis Antônio dos

Anjos (DOC. 7):

“A obesidade pode ser definida, de forma simplificada, como uma doença caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, sendo conseqüência de balanço energético positivo e que acarreta repercussões à saúde com perda importante não só na qualidade como na quantidade de vida. Diversos autores têm apontado motivos diferentes para o surgimento e a manutenção da obesidade em inúmeras populações. Os estudos que têm sido empreendidos correlacionando aspectos genéticos à ocorrência de obesidade não têm sido capazes de evidenciar a interferência destes em mais de um quarto dos obesos, fazendo

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com que ainda se acredite que o processo de acúmulo excessivo de gordura corporal, na maioria dos casos, seja desencadeado por aspectos sócio-ambientais.

Os dois aspectos mais apresentados como relacionados a um quadro de balanço energético positivo têm sido mudanças no consumo alimentar, com aumento do fornecimento de energia pela dieta, e redução da atividade física, configurando o que poderia ser chamado de estilo de vida ocidental contemporâneo. Assim, fica claro o papel dos aspectos sócio-culturais nesta determinação, formando uma rede de fatores, cuja aproximação vai permitir compreender e intervir no atual quadro em evolução.

(...)

Ao se focalizar a obesidade pelos aspectos vinculados a alterações na dieta, cabe destacar que o aumento da ingestão energética pode ser decorrente tanto da elevação quantitativa do consumo de alimentos como de mudanças na dieta que se caracterizem pela ingestão de alimentos com maior densidade energética, ou pela combinação dos dois. O processo de industrialização dos alimentos tem sido apontado como um dos principais responsáveis pelo crescimento energético da dieta da maioria das populações do Ocidente.

(...)

No setor industrial agroalimentar brasileiro, mudanças começaram a ocorrer nos anos 70 e se consolidaram nos anos 80, potencializando um mercado urbano e jovem, o que pode ser exemplificado pelo crescimento das despesas com alimentação fora de casa, particularmente em restaurantes do tipo fast food e com a alimentação em locais de trabalho ou em bares e restaurantes com a utilização de vale-refeição. Uma rede internacional de alimentação rápida se vangloria de ter o Brasil, hoje, entre os oito maiores mercados internacionais da corporação, com 570 restaurantes, cerca de 640 quiosques e 17 McCafés ( http:// www.mcdonalds.com.br ). O faturamento da empresa no país, em 2001, foi de R$ 1,60 bilhão com o atendimento de 514 milhões de clientes média de 1,4 milhão de clientes a cada dia. O Brasil está entre os cinco países que mais cresceram nos últimos anos entre todos os mercados da corporação no planeta. De fato, o crescimento em termos de número de lojas é exponencial desde sua introdução no país em

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1979, sobremodo a partir dos anos 90 ( Figura 2 ). A introdução desses hábitos importados além de comprometer o padrão tradicional alimentar no país faz com que ele seja alterado com substituição de refeições. Essas modificações podem contribuir para a dificuldade na manutenção da massa corporal dentro de padrões considerados saudáveis. Por exemplo, Sichieri demonstrou, em inquérito de base domiciliar na Cidade do Rio de Janeiro, que um padrão dietético, por ela chamado de tradicional e que dependia principalmente de feijão com arroz, estava associado com risco menor, em adultos, de sobrepeso/obesidade em modelo logístico ajustado para idade e atividade física de lazer em comparação a uma dieta chamada de ocidental na qual a gordura e açúcar eram os principais componentes, ou uma dieta de padrão misto na qual não havia um alimento que se destacasse”.

Por fim aponta o mencionado estudo “os dez passos para o peso

saudável do Ministério da Saúde do Brasil”, dentre os quais se observa explicitamente

a orientação para se evitar o consumo de alimentos altamente calóricos.

Diante das conclusões do estudo científico supra transcrito, pode-se

definir a obesidade como a acumulação excessiva de tecido adiposo num grau em que a

saúde é prejudicada, e que concorre para distúrbios metabólicos, físicos e emocionais no

indivíduo, sendo bem conhecida e documentada a correlação da obesidade com diversas

doenças nos vários aparelhos e sistemas.

Consoante estudo de pesquisadores da Fundação de Amparo à Pesquisa

do Estado de São Paulo (FAFESP), do Curso de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública

da Universidade de São Paulo, do Departamento de Bioquímica da Universidade Estadual

de Campinas, do Laboratório de Nutrição e Metabolismo Aplicado à Atividade Motora da

Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo e da Escola de

Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo, a obesidade pode potencializar a

ocorrência das seguintes doenças (DOC. 8):

• Sistema cardiovascular: hipertensão arterial, arritmias

cardíacas, insuficiência cardíaca, aterosclerose, acidente

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vascular cerebral, trombose sistêmica, tromboflebite

superficial;

• Sistema respiratório: apnéia do sono, restrição ventilatória;

• Sistema endócrino-metabólico: resistência insulínica, diabetes

mellitus tipo 2, dislipidemias, gota, diminuição da fertilidade

em homens e mulheres;

• Sistema digestório: litíase biliar, esteatose hepática, refluxo

gastroesofágico, hérnia;

• Sistema ósteo-articular: osteoartrose, deformidades ósseas;

• Sistema tegumentar: erisipela;

• Distúrbios psico-sociais: distúrbios do comportamento, do

humor (afetivos), da personalidade, distúrbios neuróticos;

• Alguns tipos de câncer (como o de mama, útero, próstata,

esôfago, estômago e intestino.

Nesse diapasão, o Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde

Pública da Universidade de São Paulo, publicou estudos dos pesquisadores doutores Ana

Maria Cervato, Rosa Nilda Mazzilli, Ignez S. Martins e Maria de Fátima N. Marucci em

que se constata que inúmeras doenças são potencializadas pela ocorrência da obesidade,

tais como (DOC. 09):

“Em relação aos fatores de risco para doenças cardiovasculares investigados junto a amostra da população do Município de Cotia, foram diagnosticados, segundo os critérios adotados, 285 indivíduos (51,2%) com, pelo menos, um dos fatores de risco (Tabela 7). A prevalência de obesidade foi de 37,5%, de diabetes 4,9% e de dislipidemia 25,9%. A maioria dos indivíduos com dislipidemia apresentou baixos valores de HDL-colesterol, que pode ser decorrente tanto da obesidade quanto da desnutrição.

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Tabela 7 - Prevalência dos fatores de risco estudados para doenças cardiovasculares.

Table 7 - Prevalence of risk factor for the cardiovascular diseases studied.

Fatores de risco n %Obesidade 123 22,08Dislipidemia + Obesidade 73 13,10Dislipidemia 62 11,13Diabetes melito 10 1,80Obesidade + Diabetes melito 8 1,44Dislipidemia + Obesidade + Diabetes melito

5 0,90

Dislipidemia + Diabetes melito

4 0,72

Total 285 51,17 A obesidade apresentou maior prevalência (22%), seguida pela dislipidemia associada à obesidade (13%). O diabetes melito, por sua vez, foi observado em apenas 4,9% dos indivíduos, sendo que apenas 1,8% sem outra patologia; 3,1% deles apresentaram diabete associado à obesidade ou à dislipidemia. Entretanto, a elevada proporção de obesos encontrada na população leva a supor que esse grupo corre o risco de desencadear o diabete, pois a obesidade é um dos fatores importantes na manifestação dessa doença. (...) Esses autores ainda apontaram a obesidade isolada ou associada como um importante fator de risco e, em decorrência disso, sugerem que a dieta possa ter papel importante na determinação dos níveis lipêmicos.

São muitos os fatores associados à obesidade e, entre eles, destaca-se o consumo de uma dieta com aporte calórico superior às necessidades. Resultados de pesquisas mostram que a obesidade, no Brasil, afeta proporcionalmente, mais mulheres do que os homens. Coitinho e col. mostraram que, enquanto 27% da população masculina maior de 18 anos apresentaram algum grau de excesso de peso, entre as mulheres a prevalência foi de 38%; no Município de Cotia, a prevalência foi de 38% na amostra total, sendo 31,8% entre os homens e 41,7% entre as mulheres. A média do IMC (24,6 kg/m 2 ), foi muito semelhante à

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encontrada por Dressler, em Ribeirão Preto, interior do Estado de São Paulo.

Os fatores de risco para doenças cardiovasculares não podem ser eliminados, mas alguns podem ser modificados. Diversas investigações reforçam a importância de programas de intervenção, principalmente àqueles relacionados às mudanças no estilo de vida. No município de Cotia, verificou-se a necessidade de aumentar o conhecimento sobre o estado de saúde da população e também da elaboração de estratégias e política de saúde que permitam o diagnóstico precoce dessas doenças, assim como de programas preventivos em nível populacional.

Assim, a dieta da população em questão apresenta-se inadequada, tanto quanto aos aspectos qualitativos, quanto aos aspectos quantitativos. Os estados fisiológicos prevalecentes na população possivelmente sejam reflexos deste quadro”.

No Brasil, segundo a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e

Metabologia (SBEM), “os inquéritos populacionais brasileiros mostram que, apesar

dos 46 milhões de pessoas que mal têm o que comer, há pelo menos 70 milhões (40%

da população) acima do peso. O sobrepeso e a obesidade atingem todas as classes

sociais e idades” (DOC. 10).

Desta forma, a requerida vem contribuindo para a escalada da

obesidade na população brasileira, uma vez que as principais causas de seu aumento

são a redução de atividades físicas e as dietas ricas em gorduras saturadas e açúcar.

Segundo especialistas, “a crescente epidemia reflete as profundas mudanças na

sociedade e nos padrões de comportamento nas comunidades nos últimos 20 a 30

anos. As pessoas podem se tornar obesas, em parte porque têm predisposição genética

para ganhar peso facilmente quando expostas a dietas e estilos de vida não saudáveis.

De qualquer forma, as causas fundamentais para a epidemia são mudanças de

comportamento e de estilo de vida, especialmente dietas” 3 .

3

� Obesity Epidemic Puts Millions at Risk from Related Diseases, Press Release OMS/46, 12/06/97, (http://www.who.int/archives/inf-pr-1997/en/pr97-46.html).

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Analisando o quadro nutricional dos alimentos comercializados pela

requerida (DOC. 11), nota-se que quase todos estão bem acima da ingestão diária

recomendada. Assim, ingerindo apenas um sanduíche, o consumidor ingere quase a

totalidade de nutrientes que necessita ou algumas vezes até o ultrapassa.

Assim, por exemplo, um sanduíche Cheddar McMeit oferecido pela

requerida, conforme dados fornecidos pela mesma, fornecem 56% da proteína

recomendada para um adulto e 116,7% da proteína recomendada para uma criança.

Por seu turno, consumindo um sanduíche McMax, um adulto ingere 37,5 % de

gordura diária recomendada, enquanto uma criança ingere 50% da gordura

recomendada diariamente.

Destarte, conforme exaustivamente demonstrado nos estudos

científicos que acompanham a presente exordial, os alimentos comercializados pela

requerida e suas franqueadas, se consumidos em excesso, possuem o condão de

potencializar a aparecimento de obesidade nos consumidores destes produtos, pois,

segundo a Organização Mundial de Saúde, a ocorrência da obesidade deriva, dentre

outros fatores, da ingestão de alimentos ricos em calorias.

Ora, sendo a embalagem o melhor meio de comunicação entre o

produtor e o consumidor, pois é impossível que este tenha acessa ao produto sem ter

acesso à embalagem, é inobjetável que a requerida tem a obrigação de advertir o

consumidor que o consumo em excesso de produtos alimentícios podem acarretar no

desenvolvimento da obesidade e de doenças correlatas a mesma. Assim, a ANVISA,

para cumprir efetivamente sua missão de “orientar o consumo de alimentos com

vistas a uma alimentação saudável” e a lei consumerista que impõe ao fornecedor a

veiculação informação adequada, clara e ostensiva , deveria também exigir que a

requerida veiculasse informação ao consumidor nos rótulos de suas embalagens

advertindo-o dos riscos de se consumir produtos alimentícios em excesso.

Pelos mesmos fundamentos, em todas as suas campanhas

publicitárias, deveria a requerida advertir ao consumidor dos riscos do

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desenvolvimento da obesidade que o consumo em excesso de seus alimentos

proporcionam, pois, tendo a publicidade comercial o escopo de estimular o consumo

dos produtos alimentícios da requerida, há de ser veiculada na própria publicidade os

riscos que esse consumo pode ocasionar.

Ora, considerando que, quando um produto alimentício é anunciado,

não se está promovendo apenas uma determinada marca, mas, indiretamente, está se

propondo uma mudança de hábito alimentar, havendo uma persuasão no sentido da

adoção de uma nova dieta, deveria a requerida informar também os riscos inerentes

na adoção pelo consumidor dos hábitos alimentares que propõe.

Relativamente às campanhas publicitárias empreendidas via televisa,

torna-se mais inadmissível ainda a inércia do Estado em relação ao problema, pois tal

conduta se reveste de maior gravame uma vez que as emissoras de televisão são

concessionárias de um serviço público.

Dessarte, uma política pública visando uma alimentação saudável

deve incluir a restrição de publicidade na televisão de alimentos de valor nutricional

mínimo, e a veiculação de mensagens fomentando a diminuição do consumo de

alimentos.

Uma vez que o alcance e a influência da televisão no comportamento

dos brasileiros são avassaladores, é possível afirmar que a intensa publicidade de

produtos cujo consumo inadequado pode causar obesidade, veiculada pelas

emissoras, concorrem eficientemente para agravar a saúde pública.

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Não tendo sido possível a adequação consensual das práticas comerciais

adotadas pela empresa ré ao disposto na legislação em vigor, outra opção não resta a este

Parquet Federal senão a proposição da presente Ação Civil Pública para defesa dos

direitos dos consumidores, a fim de obrigar a requerida a imprimir nas embalagens dos

produtos que oferece no mercado de consumo quadro nutricional informativo do

percentual fornecido pelo produto comercializado em relação ao valor diário recomendado

de cada nutriente, tais como os valores percentuais de carboidratos, proteínas, gorduras,

gorduras saturadas, gorduras trans, fibra alimentar, sódio etc e a veiculação de mensagem

alertando o consumidor do risco do consumo em excesso dos produtos alimentícios que

oferece.

2. DO DIREITO

2.1. A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR E O PRINCÍPIO DA

TRANSPARÊNCIA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO

O incremento da vida contratual, a massificação dos contratos, que

passaram a ser pré-elaborados unilateralmente pelas empresas e pelo Estado, a

concentração de capitais e de força econômica e os monopólios na nova sociedade de

consumo, decorrentes do desenvolvimento natural do modo de produção capitalista,

levaram a um desequilíbrio marcante nas relações contratuais entre consumidores e

fornecedores, exigindo uma ação protetora do Estado para com os parceiros contratuais

hipossuficientes.

Consoante doutrina Maria Antonieta Zanardo Donato 4:

“(...) o consumidor atingido por essa explosão produtiva, que o

induz a buscar mais e mais a satisfação de suas necessidades e

desejos e, ao mesmo tempo, torna-o impotente face à robustez

adquirida pelo produtor. Contrariamente ao esperado, ou seja, 4

� DONATO, Maria Antonieta Zanardo. Proteção ao Consumidor – Conceito e Extensão. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1994, pág. 18.

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ver-se o consumidor engrandecido pelo seu poder de compra,

deparamo-nos com sua fragilidade, sua vulnerabilidade frente

ao poderio econômico.

Do ideal propagado pela Revolução Francesa – Igualdade,

Liberdade e Fraternidade – restaram, pois, nas últimas

décadas, encampado pela sociedade capitalista, a tão-somente:

igualdade e liberdade.

Ideais estes que estavam a refletir unicamente a realidade

jurídica positiva já existente e que, por essas razões, não mais

refletiam verdadeiramente a realidade fática.

Perante essas transformações sociais, econômicas e suas

conseqüências muitas vezes brutais, gerando desequilíbrios de

todas as ordens, especialmente para o consumidor, não poderia

o Direito – enquanto Ordem Jurídica – manter-se

marginalizado e indiferente.

E isso porque, se de um lado o consumidor, isoladamente

considerado, se mostra frágil e impotente para enfrentar as

novas ofensas que lhe eram arremessadas pelo mundo

moderno, de outro lado impunha-se ao Estado conferir um

tratamento jurídico peculiar a esse conflito oriundo de uma

relação que não mais se estabelecia no plano eminentemente

individual”.

Tendo em vista esta realidade fática, a Constituição da República de

1988, ao normatizar a vida econômica do Estado brasileiro, dispôs que toda e qualquer

atividade econômica deverá atender, dentre outros princípios, ao princípio da defesa do

consumidor (artigos 5º, XXXII e 170, inciso V). Desta forma a Constituição da República

delega ao Estado a proteção e a defesa do consumidor, mantendo-se firme aos ditames do

paradigma do atual Estado Democrático de Direito, no qual o Estado tem papel

17

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preponderante ao interferir na esfera de atuação privada para garantir ao hipossuficiente da

relação jurídica de consumo de ter resguardado seus direitos e de não serem onerados

demasiadamente por cláusulas contratuais abusivas ou em desconformidade com a lei.

Nesse diapasão, dando concretude à determinação constitucional, o

Código de Defesa do Consumidor (CDC) tem como fim justamente reequilibrar as relações

de consumo, harmonizando e dando maior transparência às relações contratuais no

mercado brasileiro (art. 4.º do CDC).

Para viabilizar a proteção jurídica ao hipossuficiente, evitando, assim,

que seja prejudicado em suas relação firmadas no mercado de consumo, o Código de

Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90) regulou, dentro outros elementos, os aspectos

fundamentais da formação do contrato, impondo novos deveres para o fornecedor do

produto e assegurando novos direitos para o consumidor.

Dentro desse quadro, consagrou o CDC o princípio da Transparência

como regra norteadora das relações entre consumidores e fornecedores. Tal princípio foi

estatuído pelo art. 4.°, caput, da Lei n.º 8.078/90, in verbis:

“Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por

objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o

respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus

interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida,

bem como a transparência e harmonia das relações de consumo

(...)”.

Comentado a norma supra transcrita, afirma a inigualável Cláudia Lima

Marques5 que:

“A idéia central é possibilitar uma aproximação e uma relação

contratual mais sincera e menos danosa entre consumidor e

fornecedor. Transparência significa informação clara e correta

5 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, pág. 286.

18

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sobre o produto a ser vendido (...), significando lealdade e

respeito nas relações entre fornecedor e consumidor, mesmo

na fase pré-contratual, isto é, na fase negocial dos contratos de

consumo”.

Destarte, o princípio da transparência impõe ao fornecedor o dever

de informar sobre as características dos produtos colocados no mercado de consumo.

Pretendeu, assim, o legislador evitar qualquer tipo de lesão ao consumidor, pois,

adquirindo um produto sem ter informações claras e precisas sobre suas qualidades e

características, pode adquirir um produto que não é adequado ao que pretende.

A consagração do princípio da transparência no mercado de

consumo acaba por inverter os papéis tradicionais, aquele que encontrava-se na

posição ativa e menos confortável, aquele que necessitava atuar, informar-se,

perguntar, conseguir conhecimentos técnicos ou informações suficientes para realizar

um bom negócio, o consumidor, passou para a confortável posição de detentor de um

direito subjetivo de informação (art. 6.º, III, do CDC), enquanto aquele que se

encontrava na segura posição passiva, o fornecedor, passou a ser sujeito de um novo

dever de informação.

Ora, dentro de uma economia organizada sob o modo capitalista de

produção e consumo, o dever de buscar informação sobre o produto veiculado no mercado

de consumo tem que recair sobre o fornecedor, uma vez que é o mesmo que possui os

recursos financeiros indispensáveis para a construção de conhecimentos científicos que

comprovem a qualidade e características do produto.

2.2. O DEVER DO FORNECER INFORMAÇÕES SOBRE OS PRODUTOS COLOCADOS NO MERCADO DE CONSUMO

Apesar do princípio da transparência impor ao fornecedor o dever de

informar as características do produto oferecido no mercado para os consumidores, o

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Código de Defesa do Consumidor consignou expressamente este dever no seu art. 31, ipsis

literis:

“Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços

devem assegurar informações corretas, claras, precisas,

ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características,

qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de

validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os

riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores”.

Da norma supra transcrita, nota-se claramente que, sendo a apresentação

do produto o momento antecedente da conclusão do ato de consumo, deve ser precisa e

transparente o suficiente para que o consumidor, devidamente informado, possa exercer o

seu direito de livre escolha. Assim, é óbvio que as informações constantes no ato de

apresentação do produto devem ser verdadeiras e corretas, incidindo sobre os elementos

que interessam ao consumidor para fazer sua escolha, como características e dados

técnicos (qualidade, quantidade, composição, preço garantia, prazos de validade, origem,

além de outros).

A relação de consumo pautada pela lealdade e pela boa-fé pressupõe que

toda informação relevante seja devidamente propiciada. Somente dispondo de informações

completas sobre cada aspecto dos bens ofertados, o consumidor torna-se apto a exercer seu

direito de escolha. Como explica Paulo Luiz Netto Lobo 6:

“A concepção, a fabricação, a composição, o uso e a utilização

dos produtos e serviços atingiram, em nossa era, elevados níveis

de complexidade, especialidade e desenvolvimento científico e

tecnológico cujo conhecimento é difícil ou impossível de

domínio pelo consumidor típico, ao qual eles se destinam. A

massificação do consumo, por outro lado, agravou o

6

� LÔBO, Paulo Luiz Netto. A informação como direito fundamental do consumidor. Revista de Direito do Consumidor 37/67-68.

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distanciamento da informação suficiente. Nesse quadro, é

compreensível que o direito avance para tornar o dever de

informar um dos esteios eficazes do sistema de proteção ( do

consumidor ) ”.

Verifica-se, portanto, que o dever do fornecedor de informar ao

consumidor sobre as características dos produtos colocados no mercado de consumo

abrange tanto a veiculação de informações nas embalagens dos produtos quanto na

publicidade de seus produtos, correspondendo a embalagem no invólucro material

que apresenta o produto ao consumidor e a publicidade nos atos destinados a

estimular o consumo de bens e serviços, bem como promover instituições, conceitos e

idéias.

Relativamente ao dever de informar sobre as características dos produtos

nas embalagens dos mesmos, expõe a insuperável Cláudia de Lima Marques 7 que:

“Inicialmente devemos constatar que o art. 31 inclui no dever

de informar, instituído pelo CDC, as informações constantes da

embalagem do produto . (...) No Brasil, a disciplina legal das

embalagens e rotulagens estava restrita aos produtos

alimentícios e farmacêuticos. O Código de Defesa do

Consumidor revigora essa obrigação do fornecedor e inclui a

recusa em dar cumprimento ao que prometia na apresentação

ou embalagem na regra do art. 35, para benefício do

consumidor brasileiro.

(...)

Segundo o art. 31 do CDC o fornecedor deve cuidar para que

sua oferta, assim como a apresentação de seu produto, assegure

7

� MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, pág. 326/327.

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ao consumidor informações claras, precisas e ostensivas sobre

as características principais do produto. O rol de

características destacado pelo art. 31 é meramente

exemplificativo, preocupando-se com as características físicas

do produto (quantidade, qualidade, composição), com a sua

repercussão econômica (preço e garantia), com a saúde do

consumidor (prazo de validade e origem do produto) e com a

segurança do consumidor (informação sobre os riscos que

podem advir do produto)”.

Desta forma, a obrigação da requerida em veicular quadro

nutricional informativo acerca do percentual de carboidratos, proteínas, gorduras

diversas, fibra alimentar e sódio fornecido pelo produto em relação ao valor diário

recomendado de cada nutriente nas embalagens de seus produtos alimentícios, bem

como exigir que suas franqueadas o façam, decorre da sistemática adotada pelo

Código de Defesa do Consumidor.

Regulamentando tal obrigação criada pelo CDC, a Agência Nacional

de Vigilância Sanitária – ANVISA – editou a Resolução RDC n.º 359, de 23 de

dezembro de 2003, para fixar os padrões do quadro nutricional dos alimentos

produzidos e comercializados, qualquer que seja sua origem, embalados na ausência

do cliente e prontos para serem oferecidos aos consumidores, a serem veiculados

pelos fornecedores nas embalagens de seus produtos.

Como ato infra legal, a Resolução n.º 359/03 da ANVISA apenas

evidencia os critérios técnicos a serem observados no cumprimento pelo fornecedor

da obrigação criada pelo art. 31 da Lei n.° 8.078/90 de informar ao consumidor a

composição nutricional dos alimentos colocados no mercado de consumo, não

podendo essa resolução restringir o dever do fornecedor de informar ao consumidor

as características dos produtos apenas para os alimentos embalados na ausência do

consumidor.

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Essa vedação de limitar a abrangência de obrigações criadas ex lege por

atos regulamentares encontra-se coetânea com o Texto Constitucional brasileiro que, em

seu art. 5.º, inciso II, expressamente estatui que: “Ninguém será obrigado a fazer ou

deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Note-se que preceptivo não diz “decreto”, “regulamento”, “portaria”,

“resolução” ou quejandos. Exige lei para que o Poder Público possa impor obrigações aos

administrados e, consequentemente, somente poderá ser limitada uma obrigação por meio

de outra lei superveniente, nunca através de ato do Poder Executivo. É que a Constituição

brasileira, seguindo tradição já antiga, firmada por suas anteriores republicanas, não quis

tolerar que o Executivo, ou suas entidades indiretas, valendo-se de regulamentos, pudesse,

por si mesmo, interferir com a liberdade ou a propriedade das pessoas.

Assim, o conceito de regulamento no direito brasileiro deverá se

adequar ao princípio constitucional da legalidade. Dentro dessa adequação pode-se

afirmar que regulamento, em nosso Direito, é um ato geral e (de regra) abstrato,

expedido com a estrita finalidade de produzir as disposições operacionais

uniformizadoras necessárias à execução de lei cuja aplicação demande atuação da

Administração Pública.

Desta forma, em face do Direito brasileiro, o regulamento possui o

caráter de ato estritamente subordinado, isto é, meramente subalterno, e, ademais,

dependente da lei.

Destarte, deve-se concluir pela ilegalidade do aspecto da Resolução

n.º 359/03 da ANVISA que limita a obrigação do fornecedor de produtos alimentícios

embalados na ausência do cliente de informarem ao consumidor as características

nutricionais desses produtos, pois, conforme exposto, injurídico a limitação de uma

obrigação criada por lei através de regulamento expedido pelo Poder Executivo.

Assim sendo, deve-se aplicar inteiramente o disposto em tal

Resolução aos produtos alimentícios fornecidos pela requerida.

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In casu, como exaustivamente demonstrado pelos documentos que

acompanham a inicial, a requerida não vem veiculando nas embalagens de seus

produtos quadro nutricional com o valor energético de carboidratos, proteínas,

gorduras, gorduras saturadas, gorduras trans, fibra alimentar e sódio nas

embalagens dos alimentos com a respectiva informação sobre o percentual fornecido

pelo produto em relação ao valor diário recomendado de cada nutriente, nos moldes

estabelecidos pela Resolução n.° 359/03 da ANVISA, representando tal conduta da

empresa ré violação expressa ao disposto no art. 31 da Lei n.° 8.078/90.

Argumenta a requerida que vem cumprindo seu dever de informar

ao consumidor as características e composição de seus produtos através de um Guia

Nutricional disponibilizado em todas as lojas da Rede McDonald´s. Todavia, tal

modalidade de informação viola expressamente o dever, contido no caput , do art. 31,

do CDC, de a mesma ser ostensiva ao consumidor. Nesse sentido, comentando o

requisito da ostentação contido no caput do art. 31 do CDC, afirma Fábio Ulhôa

Coelho 8 que “as informações destinadas ao esclarecimento dos consumidores devem

ser ostensivos, ou seja, devem-se apresentar aos olhos destes, dispensando qualquer

esforço para sua localização, na embalagem, na oferta ou publicidade”.

O mesmo posicionamento expõe Eduardo Gabriel Saad 9:

“Ostensiva tem que ser a informação, o que constrange o

produtor a colocar os termos desta em lugar bem visível e com

aspectos diferente de muitos contratos, sobretudo de adesão,

cujos caracteres só se tornam legíveis com poderosas lupas.

Tem a informação sobre o produto que se referir às

características, qualidade, quantidade, composição, preço,

garantia, prazos de validade e origem”.

8 COELHO, Fábio Ulhoa e outros. Comentários ao Código de Proteção do Consumidor. São Paulo: Editora Saraiva, 1991, pág. 151/152.9

� SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor.São Paulo: LTr Editora, 2002, pág. 348.

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A necessidade de serem ostensivas as informações destinadas ao

esclarecimento dos consumidores foi pacificamente assentada pelo pretório pátrio em

casos análogos ao do presente.

Nesse diapasão, em várias oportunidades, decidiu o STJ que os

preços dos produtos não podem ser apenas expostos pelos supermercados em

máquinas leitoras de códigos de barras, mas devem ser afixados os preços dos

produtos nas embalagens dos mesmos. Vejam-se três decisões nesse sentido, sendo as

duas primeiras prolatadas pelo STJ e a terceira pelo Tribunal Regional Federal da 5ª

Região, dentre inúmeras outras pacificamente assentadas pelo pretório pátrio:

Acordão Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Classe: MS - MANDADO DE SEGURANÇA - 5943Processo: 199800638067 UF: DF Órgão Julgador: PRIMEIRA SEÇÃOData da decisão: 29/02/2000 Documento: STJ000345672

Fonte DJ DATA:27/03/2000 PÁGINA:59 JSTJ VOL.:00015 PÁGINA:74 RSTJ VOL.:00130 PÁGINA:30

Relator(a) NANCY ANDRIGHIDecisão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Seção

do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, denegar a segurança e cassar a liminar, nos termos do voto da Sra. Ministra-Relatora. Votaram com a Sra. Ministra-Relatora os Srs. Ministros Garcia Vieira, Francisco Peçanha Martins, Milton Luiz Pereira, José Delgado, Eliana Calmon, Paulo Gallotti e Franciulli Netto. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.

Ementa PROCESSO CIVIL. CONSTITUCIONAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. MANDADO DE SEGURANÇA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 6°, INCISO III, E ART. 31. DECRETO N.º 90.595/84. PORTARIA SUPER 02/96 DA EXTINTA SUNAB. SISTEMA DE CÓDIGO DE BARRAS PARA INDICAR OS PREÇOS DAS MERCADORIAS. SUPERMERCADOS. PROCESSO ADMINISTRATIVO N.º 08012.001556/98-18. ADOÇÃO EM CARÁTER ALTERNATIVO: DE AFIXAÇÃO DIRETA, NOS BENS EXPOSTOS À VENDA, MEDIANTE ETIQUETAS OU SIMILARES, DO RESPECTIVO PREÇO À VISTA; OU, NA HIPÓTESE DE EXISTÊNCIA DE CÓDIGO DE BARRAS (DEC. 90.595/84), PROCEDER À INFORMAÇÃO DOS PREÇOS DAS MERCADORIAS EM LISTA APOSTA EM LOCAL VISÍVEL AO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. DEFESA DA ORDEM ECONÔMICA. DIREITO DO CONSUMIDOR À INFORMAÇÃO ADEQUADA E CLARA. SEGURANÇA DENEGADA.

I - É necessária a colocação de etiquetas em todos os produtos, mesmo se adotado mecanismo de código de barras com os esclarecimentos nas gôndolas correspondentes.

II - Por ser assegurado ao consumidor o direito de informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, não há que se falar em "intervenção

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abusiva no domínio econômico", com desrespeito aos arts. 1°, IV, 170, "caput" e inciso II e 174, "caput", todos da C.F.-88, porque incensurável o despacho proferido pelo Excelentíssimo Ministro de Estado da Justiça, publicado no DO 1, de 14-08-98.

III - O poder hierárquico exercido pelo Ministro de Estado da Justiça teve por objetivo coordenar as atividades administrativas, no âmbito interno, e, assim o fez, na modalidade "revisão", bem como no exercício de poder de polícia, limitando direitos individuais em benefício da coletividade.

IV - É inerente à natureza normativa do despacho a repercussão em casos análogos, sendo mero sofisma a conclusão de seu caráter "erga omnes", porque o ato administrativo é ordinatório, sem invasão de competência legislativa da União.

Acordão Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAClasse: MS - MANDADO DE SEGURANÇA - 6010Processo: 199800762353 UF: DF Órgão Julgador: PRIMEIRA SEÇÃOData da decisão: 13/10/1999 Documento: STJ000318197

Fonte DJ DATA:06/12/1999 PÁGINA:62 LEXSTJ VOL.:00128 PÁGINA:53Relator(a) GARCIA VIEIRADecisão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Exmºs. Srs. Ministros da

Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.Votaram com o Exmº. Sr. Ministro relator os Exm°s. Srs. Ministros Hélio Mosimann, Demócrito Reinaldo, Demócrito Reinaldo, Humberto Gomes de Barros, Milton Luiz Pereira e José Delgado (voto-vista).Não participaram do julgamento os Exmºs. Srs. Ministros Eliana Calmon, Paulo Gallotti e Francisco Falcão.

Ementa DIREITO DO CONSUMIDOR - PREÇO - PRODUTOS - SUPERMERCADOS – EXIGÊNCIA - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

Um dos princípios básicos em que se assenta a ordem econômica é a defesa do consumidor. A Lei nº 8.078/90, em seu artigo 6o, inciso III, relaciona entre osdireitos básicos do consumidor:

"A informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como, sobre os riscos que apresentam."

Os donos de supermercados devem fornecer ao Consumidor informações adequadas, claras, corretas, precisas e ostensivas sobre os preços de seus produtos à venda.

O fato de já existir, em cada produto, o código de barras não é suficiente para assegurar a todos os consumidores estas informações.

Para atender realmente o que estabelece o Código do Consumidor, além do código de barras e do preço nas prateleiras, devem os supermercados colocar o preço em cada produto.

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Segurança denegada.

Acordão Origem: TRIBUNAL - QUINTA REGIAOClasse: AG - Agravo de Instrumento - 19833Processo: 9805408477 UF: RN Órgão Julgador: Primeira TurmaData da decisão: 16/03/2000 Documento: TRF500040010

Fonte DJ DATA:02/06/2000 PAGINA:606Relator(a) Desembargador Federal Ubaldo Ataíde CavalcanteDecisão UNÂNIMEEmenta ADMINISTRATIVO. AFIXAÇÃO DE PREÇOS DE PRODUTOS. ETIQUETA. CÓDIGO

DE BARRA.

- “UM DOS PRINCÍPIOS BÁSICOS EM QUE SE ASSENTA A ORDEM ECONÔMICA É A DEFESA DO CONSUMIDOR.

- A LEI Nº 8.078/90, EM SEU ARTIGO 6º, INCISO III, RELACIONA ENTRE OS DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR:

"A INFORMAÇÃO ADEQUADA E CLARA SOBRE OS DIFERENTES PRODUTOS E SERVIÇOS, COM ESPECIFICAÇÃO CORRETA DE QUANTIDADE, CARACTERÍSTICAS, COMPOSIÇÃO E PREÇO, BEM COMO, SOBRE OS RISCOS QUE APRESENTAM".

- OS DONOS DE SUPERMERCADOS DEVEM FORNECER AO CONSUMIDOR INFORMAÇÕES ADEQUADAS, CLARAS, CORRETAS, PRECISAS E OSTENCIVAS SOBRE OS PREÇOS DE SEUS PRODUTOS À VENDA.

- O FATO DE JÁ EXISTIR, EM CADA PRODUTO, O CÓDIGO DE BARRAS NÃO É SUFICIENTE PARA ASSEGURAR A TODOS OS CONSUMIDORES ESTAS INFORMAÇÕES.

- PARA ATENDER REALMENTE O QUE ESTABELECE O CÓDIGO DO CONSUMIDOR, ALÉM DO CÓDIGO DE BARRAS E DO PREÇO NAS PRATELEITRAS, DEVEM OS SUPERMERCADOS COLOCAR O PREÇO EM CADA PRODUTO”.

SEGURANÇA DENEGADA.

(STJ, MS Nº 5.986 - DF, REL. MINISTRO GARCIA VIEIRA, POR UNANIMIDADE, VOTARAM COM O EXMº. SR. MINISTRO RELATOR, OS EXMºS. SRS. MINISTROS FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, MILTON LUIZ PEREIRA, JOSÉ DELGADO, ELIANA CALMON E PAULO GALLOTTI, JULGADO EM 13.10.99, D.J.U. 29.11.99).

- AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO, CASSANDO A TUTELA ANTECIPADA CONCEDIDA PELO JUIZ MONOCRÁTICO.

- AGRAVO REGIMENTAL PREJUDICADO.

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Por último, em outro caso análogo ao presente, nosso pretório manteve

firme sua posição de exigir publicidade ostensiva das características e composição dos

produtos colocados no mercado de consumo. Assim, o Tribunal Regional Federal da 4ª

Região decidiu que, em virtude do dever de informação ostensivo sobre as características

dos produtos colocados no mercado de consumo, devem as concessionárias do serviço de

telecomunicação discriminar nas contas telefônicas as ligações efetuadas pelos

consumidores:

Acordão Origem: TRIBUNAL - QUARTA REGIÃOClasse: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 154858Processo: 200304010307723 UF: SC Órgão Julgador: QUARTA TURMAData da decisão: 18/02/2004 Documento: TRF400094130

Fonte DJU DATA: 24/03/2004 PÁGINA: 578 DJU DATA:24/03/2004Relator(a) JUIZ EDGARD A LIPPMANN JUNIORDecisão PROSSEGUINDO O JULGAMENTO, A TURMA, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR,

DEU PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO, NOS TERMOS DO VOTODO DES. CAPELETTI, QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO.

Ementa PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E CONSUMIDOR. SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÃO. DIREITO À INFORMAÇÃO. LIGAÇÕES TELEFÔNICAS. DISCRIMINAÇÃO NAS CONTAS. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. ELEMENTOS PRESENTES.

I - Consoante o estabelecido na Lei nº 8.078/90, o direto à informação, decorrente do princípio da boa-fé objetiva, é direito básico do consumidor e consiste no direito deste à "informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem" (art. 6º, III, CDC), tendo-se claro que "A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores" (art. 31).

II - Considerado que entre fornecedores de serviços de telecomunicações e usuários estabelece-se uma relação de consumo, protegida constitucional (art. 5º, XXXII) e infraconstitucionalmente (CDC), aplicam-se-lhe tais princípios. Outrossim, a própria Lei 9.427/97, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, estatui o direito do usuário "à informação adequada sobre as condições de prestação dos serviços, suas tarifas e preços" (art. 3º, IV), norma que só vai ao encontro do que se aplica às relações de consumo em geral. E, nesse diapasão, há plausibilidade na postulação que visa à discriminação, nas contas telefônicas, das informações acerca os pulsos e minutos utilizados, a título de ligações locais para telefones fixos, detalhando a data da ligação, horário da ligação, duração da ligação e o telefone chamado.

III - Por isso tudo, há que se reconhecer a presença de verossimilhança nas alegações trazidas pelo Ministério Público. O fundado receio de dano irreparável ou de difícil

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

reparação, por sua vez, reside no caráter cativo dos contratos em questão, em que a lesão se reitera dia a dia mediante a omissão da fornecedora. É de se mantida, portanto, a antecipação já deferida. Contudo, em face do decurso de mais de sete meses entre o início do prazo para a tomada de providências e o julgamento desta Turma, período em que suspensa a decisão agravada, exclui-se a aplicação de multa diária até a presente data e restabelece-se o prazo para cumprimento das determinações da decisão agravada, em 30 (trinta) dias, a contar, porém, da data da decisão desta Turma.

De todo exposto, verifica-se que a doutrina e jurisprudência

caminham pacificamente no sentido de ser obrigação do fornecedor veicular nos

rótulos de suas embalagens as informações sobre suas características, qualidade,

quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros

dados, de maneira clara, precisa e ostensiva.

Assim sendo, deve o Excelentíssimo Magistrado condenar a

requerida na obrigação de fazer, consistente em veicular, e exigir que suas

franqueadas o veiculem, nas embalagens de seus produtos quadro nutricional com o

valor energético de carboidratos, proteínas, gorduras, gorduras saturadas, gorduras

trans, fibra alimentar e sódio dos alimentos colocados no mercado de consumo com a

respectiva informação sobre o percentual fornecido pelo produto em relação ao valor

diário recomendado de cada nutriente, nos moldes estabelecidos pela Resolução n.°

359/03 da ANVISA.

2.3. A PROIBIÇÃO DA PUBLICIDADE ABUSIVA OU ENGANOSA

Além do dever de informar, e a ele relacionado, o CDC impõe a

proibição de publicidade abusiva ou enganosa:

“Art. 37 – É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

§ 1° - É enganosa qualquer modalidade de informação ou

comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente

falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz

de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza,

29

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

características, qualidade, quantidade, propriedades, origem,

preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

§ 2° - É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de

qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a

superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e

experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que

seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma

prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

§ 3° - Para os efeitos deste código, a publicidade é enganosa por

omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do

produto ou serviço”.

Os dispositivos acima mencionados não deixam dúvida sobre a

possibilidade legal de exigir-se dos fornecedores o completo esclarecimento dos

consumidores, abrangendo dois aspectos: a publicidade em geral e a rotulagem em

particular.

Quando se pensa em obesidade, os dispositivos que determinam o dever

de informar e proíbem a publicidade enganosa e/ou abusiva devem ser interpretados em

conjunto. A publicidade de alimentos que geram excesso de caloria não raramente provoca

confusão na mente das pessoas. Assim, quando se avalia a legalidade dessa publicidade, é

preciso considerar:

1) que pode ser enganosa mesmo que sua capacidade de induzir ao erro

manifeste-se apenas em relação a consumidores particularmente

vulneráveis como as crianças;

2) que pode ser enganosa por omitir informações relevantes;

3) que pode ser enganosa em razão de seu contexto, da impressão que

gera;

30

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS4) que pode ser abusiva por aproveitar-se da deficiência de julgamento e

experiência da pessoa;

5) que pode ser abusiva por ser capaz de induzir a pessoa a se comportar

de forma prejudicial à sua saúde.

É preciso considerar ainda que a publicidade não pode enganar nem

diretamente (e.g., através de afirmações falsas expressas), nem indiretamente, através de

associações sutis, sugestões implícitas ou outros efeitos subliminares. Exatamente por isso,

o legislador, quando restringiu a propaganda comercial de cigarros, procurou impedir

também a publicidade indiretamente enganosa, proibindo, além do emprego de

imperativos que induzam diretamente ao consumo, a publicidade que associe o uso do

produto à prática de atividades esportivas ou olímpicas; proibindo a publicidade que sugira

o consumo exagerado ou irresponsável, ou induza ao bem-estar ou saúde; proibindo a

publicidade que atribua aos produtos propriedades calmantes ou estimulantes, que reduzam

a fadiga ou a tensão, ou qualquer efeito similar; proibindo a publicidade que associe idéias

ou imagens de maior êxito na sexualidade de pessoas fumantes; proibindo a publicidade

que inclua a participação de crianças ou adolescentes.

Dentro dessa mesma lógica capitalista, a requerida veicula

campanhas publicitárias a fim de incutir no consumidor um apelo exagerado de

produtos que podem causar obesidade. É certo afirmar que uma das principais

causas do crescimento da obesidade é a publicidade indiscriminada de produtos

alimentícios.

A requerida, no afã de vender seus produtos alimentícios, deixou de

se preocupar com as conseqüências que o excesso de consumo de alimentos altamente

calóricos poderia causar para a saúde das pessoas.

Por todo exposto, é mister concluir que é obrigação da requerida

veicular em todos os instrumentos de campanhas publicitárias que realize, qualquer

que seja o meio utilizado (radiodifusão, televisão, panfletos etc.), informação acerca

31

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

dos riscos de desenvolvimento da obesidade e doenças correlatas que o consumo

excessivo de seus produtos pode ocasionar.

2.4. O DEVER DO FORNECER DE ADVERTIR O CONSUMIDOR

DOS PERIGOS DO CONSUMO EM EXCESSO DE SEUS

PRODUTOS ALIMENTÍCIOS

A função estatal de proteção à saúde do consumidor prevista na

Constituição concretiza-se através de leis que criam direitos para a população e deveres

para os agentes econômicos. O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é certamente a lei

que mais determina a interferência estatal no mercado de consumo, e existe em função do

reconhecimento de que nele o consumidor é vulnerável e precisa ser adequadamente

informado para tomar suas decisões. Assim, justamente para dar transparência às relações

de consumo, vários dispositivos do CDC criam para o fornecedor um dever de informar o

consumidor dos riscos da aquisição de produtos e serviços colocados no mercado de

consumo:

“Art. 6° - São direitos básicos do consumidor:

I – a proteção da saúde contra os riscos provocados por

práticas no fornecimento de produtos considerados nocivos;

II – a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos

produtos;

III – a informação adequada e clara sobre os diferentes

produtos com especificação correta sobre os riscos que

apresentem”.

“Art. 9° - O fornecedor de produtos e serviços potencialmente

nocivos ou perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de

maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou

32

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas

cabíveis em cada caso concreto”.

Por ser o contrato elemento básico das relações econômicas, a forma de

contratar precisou ser condicionada a cooperar com a promoção do bem-estar social.

Ronaldo Porto Macedo Jr. 10 aponta as causas que determinaram a adoção, pelo direito

contratual de princípios do “welfarismo”, em substituição daqueles que vinham da doutrina

liberal. E lembra o reconhecimento de uma “falha do mercado”: “os indivíduos

simplesmente não têm tempo ou recursos para adquirir todas as informações e planejar

todos os aspectos de todas as transações a cada vez que elas se fazem necessárias”.

Não é possível admitir a omissão de advertência ao consumidor de

produtos McDonal´s diante da constatação de que a obesidade é um problema que

afeta a saúde de milhões de pessoas no Brasil. A adoção de uma política sanitária de

combate à obesidade passa, necessariamente, por medidas visando o esclarecimento

do consumidor sobre o nexo etiológico com o consumo exagerado dos produtos

alimentícios da requerida.

A relação de consumo pautada pela lealdade e pela boa-fé pressupõe

o fornecimento ao consumidor de informações acerca dos riscos do uso exagerado de

determinado produto. O professor John F. Banzhaf III, da Faculdade de Direito da

Universidade de George Washington é um dos pioneiros em ações judiciais contra as

indústrias de tabaco nos EUA, e agora destaca-se apontando a responsabilidade das

empresas de fast food pela epidemia de obesidade. Em entrevista concedida a um

jornal médico, perguntaram-lhe se não era óbvio para o consumidor que o fast food

não é saudável. Eis sua resposta:

“Nós temos advertências para todo tipo de perigos que são

muito mais óbvios – por exemplo, nas escadas portáteis e

secadores de cabelos elétricos – porque as empresas que se

10 MACEDO JR., Ronaldo Porto. Contratos Relacionais e Defesa do Consumidor. São Paulo: Max Limonad, 1998, pág. 60.

33

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

omitem em fornecê-las têm sido responsabilizadas mesmo

quando se trata desses perigos notórios.

Quando você recebe refeições que em alguns casos possuem

mais gordura ou calorias do que alguém pode consumir com

segurança num dia inteiro, parece-me que elas ( as empresas)

têm uma obrigação de revelá-lo. E, aqui, nós estamos

freqüentemente lidando com crianças. O que pode ser óbvio

para um adulto pode não ser óbvio para uma criança de 9 ou

de 12 anos de idade” 11

Cumpre ressaltar que, em iniciativa inédita e surpreendente, o

McDonald´s na França publicou voluntariamente anúncio admitindo que o número

de visitas a seus restaurantes deveria ser limitado, e que não há razão para comer

quantidades excessivas de junk food, nem para ir mais do que uma vez por semana ao

McDonald´s 12.

Quando se trata de nutrição, a relação de consumo vincula-se mais

diretamente com a saúde do consumidor: as informações relevantes aqui são

imprescindíveis. Aliás, uma interpretação sistemática e teleológica dos dispositivos

sobre proteção da saúde do consumidor leva à conclusão de que o dever do

fornecedor vai além de simplesmente informar . O dever é mesmo o de advertir o

consumidor, ou seja, acautelá-lo, preveni-lo, precatá-lo.

Nessa ordem de idéias, através do Decreto n.° 4.680/03, o Presidente

da República, com fundamento no direito à informação assegurado pelo CDC,

determina que “na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares

11

� Fast-food sellers under fire for helping supersize people – One of the leading anti-tobacco legal activists hás set his sights on a new target, the fat-laden fast-food industry. In American Medical News. Victoria Stagg Elliott, AMNews staff. 21/04/03. Amednews.com – (http://www.ama-assn.org/sci-pubs/amnews/pick_03/hlsc0421.htm). 12

� O anúncio foi veiculado em maio de 2002 na revista francesa Femme Actuell. O porta-voz do McDonald´s nos EUA disse que a empresa não concorda com as opiniões expressas no anúncio (New York Times, Marian Burros, Late Edition – Final, Section C, Page 7, Column 1.30.10.2).

34

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a

partir de organismos geneticamente modificados, com presença acima do limite de

um por cento do produto, o consumidor deverá ser informado da natureza

transgênica desse produto” (art. 2°). Ora, se há obrigação de informar o consumidor

sobre a presença de organismos transgênicos nos alimentos – cujos efeitos nocivos à

saúde são ainda objeto de polêmica – como aceitar a falta de informação sobre a

concorrência de diversos produtos para a obesidade, quando os prejuízos que causam

para a saúde estão comprovados?

Por todo exposto, é mister concluir que é obrigação da requerida

veicular nos rótulos dos produtos alimentícios informação acerca dos riscos de

desenvolvimento da obesidade e doenças correlatas que o consumo excessivo de seus

produtos pode ocasionar.

Nesse sentido, num caso análogo, o TRF da 4ª Região reconheceu o

dever dos fornecedores de bebidas alcoólicas inserirem nos rótulos de tais produtos as

informações sobre os riscos que acarretam o consumo excessivo de tais produtos.

Acórdão Origem: TRIBUNAL - QUARTA REGIÃOClasse: AC - APELAÇÃO CIVEL - 478166Processo: 200204010006100 UF: PR Órgão Julgador: TERCEIRA TURMAData da decisão: 27/05/2003 Documento: TRF400087806

Fonte DJU DATA: 04/06/2003 PÁGINA: 562 DJU DATA:04/06/2003Relator(a) JUIZA MARGA INGE BARTH TESSLERDecisão A TURMA, POR UNANIMIDADE, DEU PROVIMENTO AO RECURSO.Ementa AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO DO CONSUMIDOR. CORRETA INFORMAÇÃO

ACERCA DOS RISCOS E POTENCIAIS DANOS QUE O CONSUMO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS CAUSA À SAÚDE. INSCRIÇÃO NECESSÁRIA NOS RÓTULOS DE BEBIDAS ALCOÓLICAS.

1. É possível e exigível do Judiciário, impor determinada conduta ao fornecedor, sem que esta esteja expressamente prevista em lei, desde que afinada com as políticas públicas diretamente decorrentes do texto constitucional e do princípio da plena informação ao consumidor (art. 6º, II, III e IV, da Lei 8.078/90), pois traduz-se em dever do Estado, do qual o Judiciário é poder, de acordo com o art. 196 da Constituição.

2. O consumo de alcoólicos não interessa só à comunicação social, propaganda e ao comércio de tais produtos, interessa sob o aspecto da saúde pública, da proteção do menor e do adolescente, da segurança veicular, do direito de informação e de proteção ao consumidor.

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3. O comando do art. 9º, do Código do Consumidor, indica os direitos básicos do consumidor à informação adequada e clara sobre o produto e sobre os riscos que apresenta, sobretudo, tratando-se de produto potencialmente nocivo à saúde, cuja informação deve ser feita de maneira ostensiva, a despeito da previsão do art. 4ª, § 2º, da Lei 9.294/96 determinar que os rótulos de bebidas alcoólicas conterão advertência para que os consumidores evitem o consumo excessivo de álcool.

(...)

4. Condenada a ré União a exigir na rotulagem de todas as bebidas alcoólicas produzidas ou comercializadas no território pátrio, do teor alcoólico e do alerta em expressão gráfica adequada, de que "O ÁLCOOL PODE CAUSAR DEPENDÊNCIA E EM EXCESSO É PREJUDICIAL À SAÚDE" e a ABRABE a expedir esta informação a todas as suas associadas e comunicar aos demais produtores de alcoólicos, quanto à necessária adequação.

5. Provido o recurso.

2.5. A VIOLAÇÃO DA AUTONOMIA REAL DA VONTADE DO CONSUMIDOR PELAS PRÁTICAS DA REQUERIDA

Conforme cabalmente demonstrado ao longo da presente exordial, a

requerida vem descumprindo seu dever de fornecer informação precisa, clara e ostensiva

aos consumidores sobre os produtos alimentícios que a mesma ou suas franqueadas

colocam no mercado de consumo.

Agindo desta forma, a requerida impede que o consumidor expresse

validamente sua vontade em adquirir seus produtos, pois o dever do fornecedor de dar ao

consumidor as informações essenciais sobre os produtos que comercializa visa também

garantir uma nova proteção da vontade dos consumidores na formação dos contratos, isto

é, garantir uma autonomia real da vontade do contratante mais fraco.

Ora, ao se negar ao consumidor informações sobre as características,

qualidade, quantidade e composição dos produtos colocados no mercado de consumo, está

simultaneamente impedindo que o hipossuficiente da relação de consumo formule uma

vontade baseada em dados reais, ou seja, uma vontade baseada na realidade, sendo,

portanto, uma vontade falseada pela malícia do fornecedor. Não conhecendo o consumidor

36

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todas as características dos produtos colocados no mercado de consumo, impossível saber

se a aquisição de tais produtos irá satisfazer suas necessidades.

A autonomia real da vontade do consumidor indica a importância dos

novos direitos dos consumidores e dos novos deveres dos fornecedores, em especial

dos deveres de informar, de cooperar, de tratar com lealdade e com cuidado o

consumidor no momento de formação dos contratos, pois somente se assegurarmos

este novo patamar de conduta no mercado de consumo podemos alcançar uma

vontade realmente refletida, autônoma e ‘racional’ dos consumidores.

Visualiza-se, neste ponto, um reflexo da função positiva, da força

criadora de deveres do princípio da boa-fé objetiva, princípio que interpretando as

normas positivas impostas impõe uma atuação refletida do contratante mais forte em

relação aos interesses do contratante mais fraco.

A boa-fé, assim, significa transparência obrigatória aos normais

interesses do outro contratante, uma ação positiva do parceiro contratual mais forte

para permitir ao parceiro contratual mais fraco as condições necessárias para a

formação de uma vontade liberta e racional. Assegurar informação e proteção contra

as malícias dos métodos de venda hoje usuais na sociedade de consumo são objetivos

legais nesta procura de uma decisão racional do consumidor.

Diante desse quadro traçado, deve-se, mais uma vez, utilizar os

ensinamentos de Cláudia Lima Marques 13 para concluir que:

“A ratio legis do Código de Defesa do Consumidor é justamente

valorizar este momento de formação do contrato de consumo

(...). A tendência atual é de examinar a ‘qualidade’ da vontade

manifestada pelo contratante mais fraco, mais do que a sua

simples manifestação: somente a vontade racional, a vontade

realmente livre (autônoma) e informada legitima, isto é, tem o

13 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, pág. 285.

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poder de ditar a formação e, por conseqüência, os efeitos dos

contratos entre consumidor e fornecedor”

Assim, é mister concluir que somente a vontade realmente livre,

formada pelo conhecimento de todas as características do produto comercializado

pelo fornecedor, é que possui o condão de gerar uma relação de consumo

juridicamente válida.

In casu, ao não veicular nas embalagens dos produtos que oferece no

mercado de consumo quadro nutricional informativo do percentual fornecido pelo

produto comercializado em relação ao valor diário recomendado de cada nutriente, a

requerida inviabiliza a formação da vontade real do consumidor, pois este não é

capaz de discernir racionalmente se o produto adquirido é capaz de satisfazer seus

anseios.

Desta forma, por exemplo, como irá o consumidor saber se os

produtos alimentícios oferecidos pela requerida são inferiores ou superiores aos

nutrientes necessários que uma pessoa normal deve ingerir diariamente?

Portanto, é mister concluir que a violação pela requerida de dar

cumprimento ao seu dever de informar o consumidor de todas as características do

produto colocado no mercado de consumo vem inviabilizando a formação de uma

vontade real do consumidor, possibilitando, nas palavras de Fábio Konder

Comparato 14 , que “o consumidor, vítima de sua própria incapacidade crítica ou

suscetibilidade emocional, dócil objeto da exploração de uma publicidade obsessora e

obsidional, passa a responder ao reflexo condicionado da palavra mágica, sem

resistência”.

Diante de tais acontecimentos, é inafastável a tutela jurisdicional do

Estado a fim de impor à requerida a observância dos direitos consagrados ao consumidor.

14 COMPARATO, Fábio Konder. A proteção do consumidor: importante capítulo do direito econômico. In: Defesa do consumidor: textos básicos. Brasília: Conselho Nacional de Defesa do Consumidor, 1987, pág. 40.

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2.6. DA OBRIGAÇÃO DA ANVISA EM FISCALIZAR E

NORMATIZAR PRODUTOS ALIMENTÍCIOS

O ordenamento jurídico brasileiro reflete a preocupação com a atuação

estatal na promoção da saúde e na defesa do consumidor. De acordo com a Constituição

da República, a saúde é um direito social (art. 6°), é um “direito de todos e dever do

Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do

risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e

serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

A mesma Constituição determina que “o Estado promoverá, na forma da

lei, a defesa do consumidor” e que “compete à lei federal estabelecer os meios legais que

garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem (...) da propaganda de

produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde (...)” (artigos 5.°, inciso

XXXII, e 220, § 3°, inciso III).

Os dispositivos constitucionais que criam para o Estado o dever de

defender a saúde e proteger o consumidor são de cunho programático, ou seja, traçam “os

princípios para serem cumpridos pelos seus órgãos (legislativos, executivos, jurisdicionais

e administrativos), como programas das respectivas atividades, visando à realização dos

fins sociais do Estado” 15. Ou seja, a Constituição orienta toda atividade estatal,

condicionando-a. Nesse contexto, não é possível nenhuma interpretação restritiva dos

dispositivos do CDC que visam a defesa da saúde do consumidor.

O destaque é dado a ambos – direito à saúde e direito à proteção do

consumidor – simultaneamente para realçar que, quando o Estado atua no tratamento e na

prevenção da obesidade, a legitimação das medidas vem desses dois direitos de matriz

constitucional.

15 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: Editora Malheiros, 3ª edição, 1999, pág. 138.

39

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

Em sua missão de promover o bem-estar social (art. 3°, inciso IV, e art.

193, ambos da CR/88), deverá o Estado implementar mecanismos que conciliem a

atividade econômica com o respeito aos direitos sociais. Na medida em que determinada

atividade econômica – como a produção e o consumo de alimentos – interfere de forma

direta e significativa na saúde da população, a intervenção estatal torna-se necessária no

contexto de sua política sanitária. Como ocorre em toda atuação do Poder Público, a defesa

do consumidor tem por fundamentos a supremacia do interesse público sobre os interesses

privados.

Dentro desse quadro, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária

(ANVISA) é a entidade pública, vinculada ao Ministério da Saúde da União, que tem

como finalidade institucional promover a proteção da saúde da população, por

intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e

serviços submetidos à vigilância sanitária. Exerce o chamado poder de polícia na área

sanitária, destinado a condicionar o exercício da liberdade econômica das empresas

de produtos alimentícios para ajustá-lo aos interesses coletivos.

Assim, incumbe à ANVISA regulamentar, controlar e fiscalizar os

produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública, como é o caso dos alimentos

comercializados no mercado de consumo..

Usando seu poder normativo a Agência editou a Resolução – RDC

n.° 359, de 23 de dezembro de 2003, que aprovou o presente Regulamento Técnico

para disciplina da rotulagem nutricional dos alimentos produzidos e comercializados,

qualquer que seja sua origem, embalados na ausência do cliente e prontos para serem

oferecidos aos consumidores. Este ato normativo exige a declaração do valor

energético carboidratos, proteínas, gorduras, gorduras saturadas, gorduras trans,

fibra alimentar e sódio nos rótulos dos alimentos com a respectiva informação sobre o

percentual fornecido pelo produto em relação ao valor diário recomendado de cada

nutriente.

40

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

Ora, a embalagem é certamente o melhor meio de comunicação entre

o produtor e o consumidor, pois é impossível que este tenha acessa ao produto sem ter

acesso à embalagem. Assim, a ANVISA vem cumprindo efetivamente sua missão de

“orientar o consumo de alimentos com vistas a uma alimentação saudável” e a lei

consumerista que impõe ao fornecedor a veiculação informação adequada, clara e

ostensiva , exigindo a veiculação de informações nutricionais através dos rótulos dos

alimentos.

Todavia, relativamente à advertência ao consumidor dos perigos do

consumo em excesso dos produtos alimentícios comercializados pela requerida, vem a

ANVISA descumprindo a sua missão ao não exigir a veiculação de informações ao

consumidor do risco que o consumo em excesso dos produtos da requerida

representa.

2.7. DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

A competência da Justiça Federal é notória no caso em questão.

Sustentam a competência desta Justiça especializada, no caso, tanto a Constituição da

República quanto a Lei n. 8.078/90. A lide em questão não se resume a danos causados aos

consumidores. É mais ampla. Tem como objeto produto alimentício que tem sua

comercialização no mercado de consumo submetida a fiscalização e autuação da Agência

Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) em virtude da feição da saúde envolvida na

comercialização de produtos alimentícios, conforme se demonstrará posteriormente.

Se, por um lado, temos a atuação administrativa eficiente da ANVISA no

cumprimento das obrigações que lhe foram impostas legalmente, qual seja, a fiscalização e

regulamentação dos deveres do fornecedor de produtos alimentícios de veicularem nos

rótulos dos produtos informações do percentual fornecido pelo produto comercializado em

relação ao valor diário recomendado de cada nutriente, tais como os valores percentuais de

carboidratos, proteínas, gorduras, gorduras saturadas, gorduras trans, fibra alimentar, sódio

41

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

etc., a atuação jurisdicional em respeito aos direitos fundamentais em tela cabe, por

conseguinte, à Justiça Federal.

A presença da ANVISA, como agência reguladora da União federal, na

questão em tela, justifica, desta forma, a competência desta Justiça, como se afere nos

termos da nobre Constituição da República:

"Art. 109. Aos Juízes Federais compete processar e julgar:

1 - as causas em que a União, entidade autárquica ou

empresa pública federal forem interessadas na condição de

autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência,

as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e

a Justiça do Trabalho;"

Nestes termos, havendo evidente interesse da ANVISA, conforme

ressaltado, a lide em tela está sujeita a competência da Justiça Federal.

Corroboram ainda para a prevalência desta competência o Código de

Proteção e Defesa do Consumidor, o qual estatui em seu artigo 93:

“Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é

competente para a causa a justiça local.”

É de extrema relevância o ensino de Ada Pellegrini Grinover quanto ao

tema:

“o artigo 93 do CDC rege todo e qualquer processo

coletivo, estendendo-se às ações em defesa de interesses

difusos e coletivos.”16

A vinculação da ANVISA, por sua vez, à atividade administrativa em

questão, é conseqüência do próprio arcabouço legal que serve de fundamento para esta

ação.

16 - GRINOVER, Ada Pelegrini. Op. Cit. p.679

42

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

Nestes termos, a lei atribuiu competência direta à ANVISA, em prol da

proteção da coletividade, daí advindo o interesse da União, configurando-se, portanto, a

competência da Justiça Federal para a ação.

2.8. DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL EM MINAS

GERAIS

O presente interesse, que aponta para a necessidade de observância dos

mandamentos do art. 221 da Lei Maior, qualifica-se indubitavelmente como difuso. Com

efeito, em primeiro lugar, ele se caracteriza, à evidência, como “transindividual”, já que

não pertence, de modo singularizado, a qualquer dos membros da comunidade, senão a um

conjunto indeterminado – e, ao menos para fins práticos, indeterminável – de seres

humanos. Tais seres ligam-se uns aos outros pela mera circunstância de fato de serem os

destinatários dos produtos alimentícios ofertados pela requerida através de suas campanhas

publicitárias. De outra sorte, é inquestionável que o interesse em jogo é ainda indivisível,

eis que, além de ser insustentável a argumentação no sentido de que a requerida, num dado

momento, oferta seus produtos para um único consumidor, também não se concebe que se

realize uma campanha publicitária dirigida a um só consumidor.

Uma vez tecidas essas breves, mas necessárias, considerações, insta frisar

que a doutrina é assente no sentido de que a competência territorial nas ações civis

públicas que têm por objeto tais interesses difusos é regulada expressamente pelo art. 93 do

CDC. E a regra expressa da lex specialis é no sentido da competência da Capital do

Estado (ou do Distrito Federal ) nas causas em que se discute dano ou perigo de dano de

âmbito nacional.

Nesse sentido, inclusive, já se pronunciou o Colendo Superior Tribunal de

Justiça:

43

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CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO CIVIL COLETIVA.

CÓDIGO DO CONSUMIDOR, ART. 93, II. A ação civil

coletiva deve ser processada e julgada no foro da capital do

Estado ou no do Distrito Federal, se o dano tiver âmbito

nacional ou regional; votos vencidos no sentido de que,

sendo o dano de âmbito nacional, competente seria o foro do

Distrito Federal. Conflito conhecido para declarar

competente o Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado

de São Paulo. (STJ-2ª Seção, Conflito de Competência nº

17.532 – DF, rel. Min. Ari Pargendler, j. 29.02.2000).

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

1. Interpretando o artigo 93, inciso II, do Código de Defesa

do Consumidor, já se manifestou esta Corte no sentido de

que não há exclusividade do foro do Distrito Federal para o

julgamento de ação civil pública de âmbito nacional. Isto

porque o referido artigo ao se referir à Capital do Estado e

ao Distrito Federal invoca competências territoriais

concorrentes, devendo ser analisada a questão estando a

Capital do Estado e o Distrito Federal em planos iguais,

sem conotação específica para o Distrito Federal.

2. Conflito conhecido para declarar a competência do

Primeiro Tribunal Civil do Estado de São Paulo para

prosseguir no julgamento do feito. (STJ-2ª Seção, Conflito de

Competência nº 17.533 – DF, rel. Min. Carlos Alberto

Menezes Direito, j. 13.09.2000) – os destaques são nossos

44

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

Os consumidores mineiros, nesta esteira, fazem parte do universo de

pessoas atingidas pela irregular oferta e publicidade dos produtos alimentícios da

requerida e suas franqueadas, razão mais que suficiente para firmar a competência

territorial da Justiça Federal em Minas Gerais, e, mais precisamente, dessa seção

judiciária.

2.9. DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

FEDERAL

O Ministério Público é o órgão ao qual a Constituição Federal incumbiu a

guarda dos interesses coletivos e difusos. Assim, tem-se como função institucional do

Ministério Público, determinadas pelo art. 129, inciso III, da Constituição da República c/c

art. 82 do Código de Defesa do Consumidor:

“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a

proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de

outros direitos difusos e coletivos”.

“Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são

legitimados concorrentemente:

I – Ministério Público”.

A ação civil pública aqui proposta, com o escopo de assegurar os direitos

difusos relativos aos consumidores em geral, tem como legitimado de forma clara o

Ministério Público, nos termos da Lei n. 7.347/85:

45

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

“Art. 1º - Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da

ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e

patrimoniais causados:

(...)

II – ao consumidor.

(...)

“Art. 5º - A ação principal e a cautelar poderão ser

propostas pelo Ministério Público, pela União, pelos

Estados e Municípios. Poderão também ser propostas

por autarquia, empresa pública, fundação, sociedade

de economia mista ou associação.”

Quanto às funções institucionais do Ministério Público, deixa claro o art.

6º, inciso VII, alínea c), da Lei Complementar n.º 75/93:

“Art. 6º. Compete ao Ministério Público da União:

(...)

VII – promover o inquérito civil e a ação civil pública para:

(...)

c) a proteção dos direitos individuais indisponíveis, difusos e

coletivos, relativos às comunidades indígenas, à família, à

criança, ao adolescente, ao idoso, às minorias étnicas e

consumidor”.

Em virtude da competência da Justiça Federal, verifica-se também a

legitimidade do Ministério Público da União para a propositura da presente ação. A

jurisprudência consagra de forma clara a legitimidade do Ministério Público Federal em

tais questões:

46

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

"EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL.

MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PUBLICA. 1. O

Ministério Público é instituição nacional, subordinada aos

princípios de unidade, indivisibilidade e independência

funcional (CF. art. 127), e compreende o Ministério Público

da União e o dos Estados(CF. art. 128). 2. A atuação dos

agente do Ministério Público se dá em forma estruturalmente

organizada e mediante repartição de atribuições. 3. E

incompatível com os princípios de regência da instituição e

do sistemas de repartição de atribuições a atuação do

Ministério Público Estadual, fora do seu Estado ou fora da

jurisdição estadual. 4. Compete ao Ministério Público da

União, e não ao do Estado, exercer as funções institucionais

do órgão relativas a promoção de ações civis públicas de

competência da Justiça Federal."(AC 91.04.13275-0, TRF4,

SEGUNDA TURMA, Relator JUIZ TEORI ALBINO

ZAVASCKI, Data da decisão 17/10/91, DJU 06/11/91,

PAGINA 27825).

Diante de todo exposto, dúvidas não devem subsistir quanto à

legitimidade do Ministério Público Federal para a presente causa, haja vista tratar-se de

ação civil pública para tutela dos interesses difusos dos consumidores brasileiros.

2.10. DA NECESSÁRIA EXTENSÃO DO PEDIDO A TODO O

TERRITÓRIO NACIONAL

Tendo em vista que a requerida é empresa que comercializa seus

produtos alimentícios em todo território nacional, os efeitos da decisão de concessão do

presente pedido devem alcançar todos os Estados em que ocorra a oferta e publicidade dos

47

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

produtos alimentícios da requerida, sob pena de se criar uma situação insustentável,

qual seja, a declaração de que tais práticas comerciais são inadequadas para o Estado

de Minas Gerais, e, ao mesmo tempo, adequadas para os demais entes federados.

Ademais, por mais razão ainda, relativamente à obrigação da requerida

em veicular quadro nutricional nas embalagens dos alimentos que comercializa, que

pressupõe atuação administrativa por parte da ANVISA, uma vez que esta fixa os critérios

técnicos para dar aplicabilidade à obrigação criada pelo art. 31 do CDC, os efeitos da

sentença de condenação da requerida deverão ser estendidos a todos os Estados, sob pena

de se dar aplicabilidade em Minas Gerais do disposto na Resolução n.º 359/03 da ANVISA

e não se aplicar mencionado ato administrativo-regulatório nos demais Estados-membros.

A propósito, cumpre trazer à tona trecho da decisão em que, apreciando-

se lide semelhante a esta, que fora submetida ao crivo do Poder Judiciário por este mesmo

órgão ministerial, acabou sendo julgado procedente o pedido deduzido (DOC. 12):

“Os efeitos da presente sentença estendem-se a todo território

nacional, uma vez que atinge ato administrativo de órgão

federal em sua substância que trata de matéria de forma

genérica. Não há, pois, como anular o ato administrativo

circunscrito a determinada região, o que configuraria uma

anomalia jurídica. Não se lhe aplica, portanto, o art. 16 da Lei

7.347, de 24 de julho de 1985, com a nova redação dada pela

Lei 9494/97”.

Além do que, nos casos de produtos que se revelem nocivos, nosso

ordenamento jurídico (art. 102 do Código de Defesa do Consumidor), prevê a possibilidade

de ajuizamento de ações que visem compelir o Poder Público competente a proibir, em

todo o território nacional, a produção, divulgação, a distribuição ou venda deste produto,

razão mais que suficiente para, por analogia, aplicar a extensão pretendida. In litteris:

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“Art. 102. Os legitimados a agir na forma deste Código

poderão propor ação visando compelir o Poder Público

competente a proibir, em todo o território nacional, a

produção, divulgação, distribuição ou venda, ou a determinar

alteração na composição, estrutura, fórmula ou

acondicionamento de produto, cujo uso ou consumo se revele

nocivo ou perigoso à saúde pública e à incolumidade pessoal.”

Poder-se-ia argumentar no sentido de que o art. 16, da Lei 7.347/85

(LACP), com a redação que lhe foi dada pela Lei 9494, não permitiria tal entendimento.

No intuito de demonstrar a fragilidade de tal argumentação, transcrevemos

trechos de excelente artigo, no qual a sempre imbatível Professora Ada Pellegrini

Grinover, comentando a alteração em tela na LACP, demonstra a inaplicabilidade da

mesma ao caso, por diversos aspectos (in Código Brasileiro de Defesa do Consumidor –

Comentado pelos autores do anteprojeto – Ada Pellegrini Grinover e outros, 5a ed., Forense

universitária, p.724):

“1) Limitar a abrangência da coisa nas ações civis públicas

significa multiplicar demandas, o que, de um lado contraria

toda a filosofia dos processos coletivos, destinados

justamente a resolver molecularmente os conflitos de

interesses, ao invés de atomizá-los e pulverizá-los; e de outro

lado, contribui para a multiplicação de processos , a

sobrecarregarem os tribunais, exigindo múltiplas respostas

jurisdicionais quando uma só poderia ser suficiente. No

momento em que o sistema brasileiro busca saídas até nos

precedentes vinculantes, o menos que se pode dizer do

esforço redutivo do Executivo é que vai na contramão da

história.

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Em segundo lugar, pecou pela incompetência.

Desconhecendo a interação entre a Lei da Ação Civil

Pública e o Código de Defesa do Consumidor, assim como

muitos dos dispositivos deste, acreditou que seria suficiente

modificar o art. 16 da Lei nº 7.347/85 para resolver o

problema. No que se enganou redondamente. Na verdade, o

acréscimo introduzido ao art. 16 da LACP é ineficaz.

Senão vejamos:

Já foi exposta à sociedade a necessidade de se lerem de

maneira integrada os dispositivos processuais do Código de

Defesa do Consumidor e as normas da Lei da Ação Civil

Pública, por força do disposto no art. 90 daquele e no art. 21

desta.

Desse modo, o art. 16 da LACA, na redação que lhe foi dada

pela Medida Provisória, não pode ser interpretado sem

levar-se em consideração os arts. 93 e 103 do CDC.

Reza o art. 16, alterado pela medida provisória:

“ Art. 16 . “ A sentença civil fará coisa julgada erga omnes,

nos limites da competência territorial do órgão prolator,

exceto se o pedido for julgado improcedente por

insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado

poderá intentar outra ação com idêntico fundamento,

valendo-se de novas provas” (grifos no texto acrescido).”

Mas o dispositivo há de ser lido em, conjunto com os três

incisos do art. 103 que permanecem inalterados.

Percebe-se, pela análise conjunta dos mencionados artigos,

que o art. 16 da LACP só diz respeito ao regime da coisa

50

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julgada com relação aos interesses difusos ( e quando muito,

coletivos) pois a regra permissiva do non liquet, por

insuficiência de provas, é limitada aos incis I e II do art. 103,

relativos, exatamente aos interesses transindividuais supra

apontados. Na verdade, a regra do art. 16 da LACP só se

coaduna perfeitamente com o inc. I do art. 103, que utiliza a

expressão erga omnes, enquanto o inc. II se refere à coisa

julgada ultra partes. Assim sendo a nova disposição adapta-

se exclusivamente, em tudo e por tudo, à hipótese de

interesses difusos (art. 103, I ), já indicando a necessidade

de operação analógica para que também o art. 103, II

(interesses coletivos) se entenda modificado. Mas aqui a

analogia pode ser aplicada, uma vez que não há diferença

ente o regime da coisa julgada nos interesses difusos e

coletivos.

.........................................................

Assim, afirmar que a coisa julgada restringe aos “limites da

competência do órgão prolator” nada mais indica do que a

necessidade de buscar a especificação dos limites legais da

competência: ou seja, os parâmetros do art. 93 do CDC, que

regula a competência territorial nacional e regional para os

processos coletivos.

E, acresça-se, a competência territorial nacional e regional

tanto no âmbito da Justiça Estadual como no da Justiça

Federal.

O que se disse arreda qualquer dúvida quanto à previsão

expressa da competência territorial, de âmbito nacional ou

regional, nas ações coletivas em defesa de interesses

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

individuais homogêneos, o que configura mais um

argumento para sustentar a total inoperância do novo art. 16

da LACP para os objetivos que o executivo tinha em mente

ao baixar o art. 3º da Medida Provisória.

E com relação aos interesses difusos e coletivos? Já

admitimos que o acréscimo introduzido pela Medida

Provisória ao art. 16 da LACP se aplica aos incs. I e II do

art. 103, e somente a estes. Trata-se, agora, de saber qual é

o alcance da expressão “nos limites da competência

territorial do órgão prolator” no tocante aos interesse

difusos e coletivos.

Em última análise, é preciso verificar se a regra de

competência territorial, nacional ou regional, do art. 93 do

CDC é exclusiva dos processos em defesa de interesses

individuais homogêneos, ou se também incide na tutela

jurisdicional dos interesses difusos e coletivos.

Em última análise, é preciso verificar se a regra de

competência territorial, nacional ou regional, do art. 93 do

CDC é exclusiva dos processos em defesa de interesses

individuais homogêneos, ou se também incide na tutela dos

interesses difusos e coletivos.

Já afirmamos nossa posição no sentido de que o art. 93 do

CDC, embora inserido no capítulo atinente às “ações

coletivas em defesa de interesses individuais homogêneos”,

rege todo e qualquer processo coletivo , estendendo-se às

ações em defesa de interesses difusos e coletivos (supra,

comentário nº 1 ao art. 93)~. Não há como não se utilizar,

aqui, o método integrativo, destinado ao preenchimento da

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lacuna da lei, tanto pela interpretação extensiva (extensiva

do significado da norma) como pela analogia (extensiva da

intenção do legislador).

...............................................................

Mas há mais o indigitado dispositivo da Medida Provisória

tentou (sem êxito) limitar a competência, mas em lugar

algum aludiu ao objeto do processo. Ora, o âmbito da

abrangência da coisa julgada é determinado pelo pedido, e

não pela competência. Esta nada mais é do que a relação de

adequação entre o processo e o juiz, nenhuma influência

tendo sobre o objeto do processo. Se o pedido é amplo (de

âmbito nacional) não poderá por intermédio de tentativas de

restrições da competência que o mesmo poderá ficar

limitado.

Em conclusão: a) o art. 16 da LACP não se aplica à coisa

julgada nas ações coletivas em defesa de interesses

individuais homogêneos); b) aplica-se à coisa julgada nas

ações em defesa de interesses difusos e coletivos, mas o

acréscimo introduzido pela Medida Provisória é inoperante,

porquanto é a própria lei especial que amplia os limites da

competência territorial, nos processos coletivos, ao âmbito

nacional ou regional; c) de qualquer modo, o que determina

o âmbito de abrangência da coisa julgada é o pedido, e não

a competência. Esta nada mais é do que uma relação de

adequação entre o processo e o juiz. Sendo o pedido amplo

(erga omnes), o juiz competente o será para julgar a respeito

de todo o objeto do processo; d) em conseqüência, a nova

redação do dispositivo é totalmente ineficaz.

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2.10. DA CONCESSÃO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

A antecipação da tutela justifica-se face à presença de prova inequívoca

da verossimilhança da alegação e por haver fundado receio de dano irreparável ou de

difícil reparação. Quanto ao direito, as infrações são cabais e fora de questionamento, posto

que provadas de plano, e ofendem o direito do consumidor em obter todas as

informações pertinentes acerca das características dos produtos colocados no

mercado de consumo, o direito do consumidor de ser advertido sobre os riscos que o

consumo dos produtos possam acarretar e direito e o direito a não ser submetido a

publicidade abusiva ou enganosa.

No que tange ao perigo da demora, infere-se-o claramente pelas

violações aos direitos dos consumidores cujas vítimas se vão sucedendo no tempo. Por

isso não há que se falar que o dano já existe e vem sendo suportado pelos consumidores,

porquanto, a persistirem as práticas comerciais da requerida sem a suspensão que

coíba de plano os danos materiais e morais causados a vítimas diversas, ter-se-á cada vez

mais acrescido o número de vítimas.

É importante frisar que há realmente fundado receio de dano irreparável

ou de difícil reparação, pois a não concessão da tutela antecipatória só fará por permitir que

continuem as violações aos direitos dos consumidores, e, o que é pior, propiciará que,

durante o curso do processo, os produtos alimentícios oferecidos pela requerida continuem

contribuindo para a proliferação da obesidade no país, sem que o consumidor seja

advertido.

A reparação dos danos é muito difícil e provavelmente ineficaz, ainda

que se cogite de indenização para as situações já ocorridas. Os efeitos da proliferação da

obesidade e das complicações de saúde que são decorrentes dela não serão afastados

mediante indenização - que de qualquer modo será devida - e nem tampouco o prejuízo à

administração da justiça.

Mister, pois, a imediata concessão da tutela antecipatória, o que, desde

já, e com fundamento no art. 273, I, do CPC, requer-se, nos termos seguintes:

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1. seja determinado que a requerida, imediatamente após a notificação

do teor da decisão antecipatória, veicule, em todo território nacional, nas embalagens

e/ou nos rótulos dos produtos alimentícios que comercializa, quadro nutricional que

informe ao consumidor o percentual fornecido por qualquer produto McDonald´s em

relação ao valor diário recomendado de cada nutriente, tais como os valores percentuais de

carboidratos, proteínas, gorduras, gorduras saturadas, gorduras trans, fibra alimentar e

sódio, nos moldes da Resolução n.º 359/03 da ANVISA, sob pena de ser imposta multa

cominatória no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), por produto alimentício

irregularmente comercializado, a qual se reverterá ao Fundo de que trata a Lei n.º 7.347/85;

2. e/ou, seja determinada que a requerida, imediatamente após a

notificação do teor da decisão antecipatória, veicule, em todo território nacional, nas

embalagens e/ou nos rótulos dos produtos alimentícios que comercializa, advertência

acerca dos riscos de desenvolvimento da obesidade e doenças correlatas que o consumo

excessivo de seus produtos pode ocasionar, nos seguintes termos: “O consumo em excesso

deste alimento pode ocasionar o desenvolvimento de obesidade e doenças correlatas”,

sob pena de ser imposta multa cominatória no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), por

produto alimentício irregularmente comercializado, a qual se reverterá ao Fundo de que

trata a Lei n.º 7.347/85.

3. e/ou, seja determinado que a requerida, imediatamente após a

notificação do teor da decisão antecipatória, veicule, em todo território nacional, em

todos os instrumentos de campanhas publicitárias que realize, qualquer que seja o meio

utilizado (radiodifusão, televisão, panfletos etc.), advertência acerca dos riscos de

desenvolvimento da obesidade e doenças correlatas que o consumo excessivo de seus

produtos pode ocasionar, sob pena de multa cominatória no valor de R$ 500,00

(quinhentos reais), por produto alimentício irregularmente comercializado, a qual se

reverterá ao Fundo de que trata a Lei n.º 7.347/85.

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3. DO PEDIDO

Por todo o exposto, o Ministério Público Federal requer, mediante o

julgamento de mérito:

1. A citação da Requerida, na pessoa de seu representante legal, para,

querendo, contestar a presente ação, no prazo legal, sob pena de revelia e confissão;

2. A intimação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) a

fim de que atue ao lado do Ministério Público Federal, como litisconsorte necessário. Em

caso de recusa, fica requerida, desde já, sua citação para compor o pólo passivo desta

demanda;

3. Seja julgado procedente o pedido, condenando a requerida na

obrigação de fazer, consistente em veicular, em todo o território nacional, nas

embalagens e/ou nos rótulos dos produtos alimentícios que comercializa, quadro

nutricional que informe ao consumidor o percentual fornecido por qualquer produto

McDonald´s em relação ao valor diário recomendado de cada nutriente, tais como os

valores percentuais de carboidratos, proteínas, gorduras, gorduras saturadas, gorduras

trans, fibra alimentar e sódio, nos moldes da Resolução n.º 359/03 da ANVISA, sob pena

de ser imposta multa cominatória no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), por produto

alimentício irregularmente comercializado, a qual se reverterá ao Fundo de que trata a Lei

n.º 7.347/85;

4. Seja julgado procedente o pedido, condenando a requerida na

obrigação de fazer, consistente em veicular, em todo território nacional, nas embalagens

e/ou nos rótulos dos produtos alimentícios que comercializa, advertência acerca dos riscos

de desenvolvimento da obesidade e doenças correlatas que o consumo excessivo de seus

produtos pode ocasionar, nos seguintes termos: “O consumo em excesso deste alimento

pode ocasionar o desenvolvimento de obesidade e doenças correlatas”, sob pena de

multa cominatória no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), por produto alimentício

irregularmente comercializado, a qual se reverterá ao Fundo de que trata a Lei n.º 7.347/85;

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5. Seja julgado procedente o pedido, condenando a requerida na

obrigação de fazer, consistente em veicular, em todo território nacional, em todos os

instrumentos de campanhas publicitárias que realize, qualquer que seja o meio utilizado

(radiodifusão, televisão, panfletos etc.), advertência acerca dos riscos de desenvolvimento

da obesidade e doenças correlatas que o consumo excessivo de seus produtos pode

ocasionar

Protesta, por fim, provar o alegado por todos os meios de prova em

direito admitidos, especificamente documental, testemunhal e pericial.

Dá-se à causa, para efeitos meramente fiscais, o valor de R$ 1.000,00

(um mil reais).

Nestes termos, pede deferimento.

Belo Horizonte, 25 de maio de 2004.

FERNANDO DE ALMEIDA MARTINS

Procurador da República

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RELAÇÃO DE DOCUMENTOS ANEXOS:

1. CONTRATO SOCIAL DE MCDONALD´S COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA;

2. ESTRUTURA DA REDE DE FRANQUIA MCDONALD´S;

3. INFORMAÇÕES DA REQUERIDA SOBRE A AUSÊNCIA DE VEICULAÇÃO DE INFORMAÇÕES SOBRE AS CARACTERÍSTICAS DOS PRODUTOS NAS EMBALAGENS DOS MESMOS;

4. MANIFESTAÇÃO DA REQUERIDA INFORMANDO QUE NÃO IRÁ VEICULAR INFORMAÇÕES NUTRICIONAIS NOS RÓTULOS DE SEUS PRODUTOS;

5. NOTA TÉCNICA N.º 003/04/GPESP/GGALI/ANVISA;

6. RESOLUÇÃO – RDC N.º 359, DE 23 DE DEZEMBRO DE 2003;

7. ESTUDO CIENTÍFICO PUBLICADO PELA UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE SOBRE OS ASPECTOS DAS PRÁTICAS ALIMENTARES E DA ATIVIDADE FÍSICA COMO DETERMINANTES DO CRESCIMENTO DO SOBREPESO/OBESIDADE NO BRASIL

8. ESTUDO CIENTÍFICO PUBLICADO PELAFUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO (FAFESP), DO CURSO DE NUTRIÇÃO DA FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, DO DEPARTAMENTO DE BIOQUÍMICA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, DO LABORATÓRIO DE NUTRIÇÃO E METABOLISMO APLICADO À ATIVIDADE MOTORA DA ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO E DA ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ACERCA DA OBESIDADE E AS DOENÇAS PROVENIENTES DELA;

9. ESTUDO CIENTÍFICO DO DEPARTAMENTO DE NUTRIÇÃO DA FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO;

10. PARECER DA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO;

11. GUIA NUTRICIONAL FORNECIDO NOS ESTABELECIMENTOS DA REDE MCDONALD´S;

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