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Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2 · Mas tenho em frente uma paisagem branca com relevos diversos, formas diversas, cada uma comunicando algo E se eu morrer O

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JJuulliioo PPeerreeiirraaJJJuuuuuulliiooooo PPPeeeeerrreeeeeeiiiirrrraaaaaa

Capa - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira3.indd 1 02/04/2013 17:08:43

Lembro diversas vezes que chegava em casa cansado de um

plantão mas querendo escrever algo. Às vezes me vinha uma

cena inusitada à vista, uma frase ouvida ou caso triste vivenciado.

Nem sempre conseguimos nos expressar dentro de um hospital,

ainda mais quando há os doentes graves, não há tempo. Mas foi

assim que o livro “Escrito em Letra de Médico” surgiu.

O meu livro traz textos que eu escrevi durante a faculdade,

mas também durante a residência de neurocirurgia. Eu poderia

defi nir o livro “Escrito em Letra de Médico” como recortes

de pensamentos.

ISBN 978-85-64855-70-0

Capa - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira3.indd 1 02/04/2013 17:08:43

São Paulo, 2013

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

Julio Pereira

Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 3Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 3 06/03/2013 10:41:0506/03/2013 10:41:05

Título Original Em Português: Escrito em Letra de Médico© 2013 de Júlio Pereira

Todos os direitos desta edição reservados ao autor.

É PROIBIDA A REPRODUÇÃONenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida, copiada, transcrita ou mesmo transmitida por meios eletrônicos ou gravações, assim como traduzida, sem a permissão, por escrito, do autor e da editora. Os infratores serão punidos pela Lei nº 9.610/98.

Diretor: Ednei ProcópioEditor Executivo: Silvio AlexandrePublisher: Rafael M. RegoComercial: Cláudia dos SantosRevisão: Sandra Garcia CortesEditorial: Felipe Arruda Tavares de LimaImpressão: Alternativa Prol Gráfi caca

Livrus Negócios EditoriaisRua Maria Paula, N° 54, Cj. 42 – Bela Vista

CEP 01319-000 – São Paulo – SP E-mail: [email protected]

Site: www.livrus.com.br Fone: [11] 3101-3286

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Daniela Momozaki – CRB8/7714)

Índice para Catálogo Sistemático1. Literatura brasileira : Contos : 869.93

Impresso no Brasil/ Printed in Brazil

Pereira, Julio

Escrito em letra de médico / Julio Pereira -- São Paulo : Livrus Negócios Editoriais, 2013.

ISBN: 978-85-64855-70-0

1. Literatura brasileira – Contos 1. Pereira, Julio 2. Título

CDD 869.93

Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 4Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 4 06/03/2013 10:41:0506/03/2013 10:41:05

“Melhor é ir a casa onde há luto do que ir a casa onde há festa; porque

naquela se vê o fi m de todos os homens, e os vivos o aplicam ao seu coração”

Eclesiastes 7:2

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Oração •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 10Ponto ou Mutação •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 14Céu ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 17Meu Professor ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••22Relato de Caso - Pobreza Crônica •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••24Anamnese da Vida ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••26Resumo Científi co ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••28Poesia Stricto Senso ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••29Olhos da Alma •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••30Hospital de Emergências •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••35Meus Pobres Pacientes Pobres •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••36O Epidemiologista ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••38Neuroembriologia •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••40Sem Sentimentos ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••42Triálogo•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••44Abridor de Cabeça •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••47O Tumor Cerebral •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 51Perguntas no Pronto-Socorro •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••53Nossos Défi cits •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••55Malignamente Benigno •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••57Dor Lombar ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••59

sumarioumario

Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 6Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 6 06/03/2013 10:41:0506/03/2013 10:41:05

As Mortes •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 61Omissão de Socorro no Facebook •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••64O Protocolo para Morrer ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••66A Morte da Mãe •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••69Sobre uma Guerra Estranha •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 71

sumarioumario

Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 7Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 7 06/03/2013 10:41:0506/03/2013 10:41:05

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Oração

A fi losofi a sempre ajudando a Fé

Ajudando o cristão a não pecar

Senhor, muito obrigado por Agostinho

Compreender para crer, crer para compreender

Maniqueísmo e o neoplatonismo

Abençoe Tomás

Retomada do Santo Aristóteles

Escolástica

Giordano Bruno?

Morrestes por nós quando nós ainda éramos intolerantes

Cordeiro da ciência

São Copérnico

Que culpa você tem de perceber a natureza

Kepler mecanizou-nos

Nada te deteve

Galileu Galilei

Negou como Pedro

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10

Julio Pereira

Maquiavel, sempre nosso príncipe

Bacon e sua tábua da lei

Observarás

Organizarás racionalmente

Experimentarás

Metodifi carás

Newton

Simples e uniforme é o mundo. E recorrendo ao senhor

como regente.

Descartes

Cogito ergo sum

Como o senhor gosta, em latim.

Obrigado pelo pensamento cartesiano

Pascal, ainda pensamos como você.

Espinosa, por que natureza é Deus?

Sondas o coração de Espinosa

Locke, quanto nos iluminastes

Você foi sal da terra e iluminismo no mundo

Somos mais tolerantes, nos tornastes mais livres

Você foi o pai da liberdade

Hume, nos mostrastes quanto o costume nos guia

Voltaire

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11

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

Por que tanto defendia o direito de falarmos livremente?

Se não fosse você, será que Deus fi caria preso nos mosteiros?

Nos libertastes das trevas

Kant como criticastes a razão pura

Por que não é possível dizer nada sobre a alma humana ou

sobre Deus?

Será que tens razão?

Comte

Nos conte sobre a ordem, o progresso

Seus estados seriam a trindade?

Agora eu te agradeço por toda a genealogia da ciência

O pensamento clássico gerou os naturalistas, que geraram os

sistemáticos, que geraram o cristianismo, que gerou a escolástica, que

gerou a renascença, que gerou os empiristas, que geraram o iluminismo,

que gerou o criticismo Kantiano, que gerou o idealismo, que gerou o

positivismo, que gerou

Senhor Deus quanto aos intolerantes, puni-os

Deixo, agora, o banquete de Salomão

Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 11Miolo - Escrito em Letra de Médico - Júlio Pereira2.indd 11 06/03/2013 10:41:0506/03/2013 10:41:05

12

Julio Pereira

“A sabedoria já edifi cou sua casa, já lavrou as suas sete

colunas; Já sacrifi cou suas vítimas; misturou seu vinho e já preparou

a sua mesa.”

Em nome da ciência, da religião e da fi losofi a.

Amém

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13

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Ponto ou Mutação

A Ciência é oligárquica

A Ciência não é compreendida

Gosto da ciência, ela é

Queixam-se do reducionismo

Mas buscando uma redução, mantendo-se a escala, podemos

encontrar respostas

Talvez não puras

Nossos sentidos talvez não repliquem a realidade

Seleção artifi cial resume a ciência

Ideias são incorporadas às ideias anteriormente selecionadas

Descartes foi aceito

Houve quem acrescesse e uma pessoa ao acaso acrescentou

As mutações cartesianas se manterão

Oh! Ciência, quanta pobreza de raciocínio

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14

Julio Pereira

Até mecanismos de correção de falhas encontrou

As hipóteses são testadas

Uma metalinguagem?!

Science more simile

In english is more science

I believe that science, now a days, have one language

Artigos, textos, frases, até as fórmulas que não são precedidas

do inglês são malquistas

Ciência que se renova

Odeiam mas não vivem sem

Limítrofe entre o abstrato mas concreto

Fantasioso e o real

Elocubra mesmo que não descubra

Desconheço seus fundamentos

Só leio

Sou leigo

Não fui selecionado

Não faço parte dos seus grandes saltos ao acaso

Me resta escrever para os que sabem menos que eu

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15

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

Só para estes

Criar histórias para que você seja mais clara para os leigos

Uma claridade metonímica entretanto fascinante

Sem mais palavra, sem mais anáforas, sem mais prosopopeias...

Não sei! Não conheço o que é a ciência

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Julio Pereira

Céu

Quero escrever

Ouvir música

Sair

Amar

Mas tenho em frente uma paisagem branca com relevos

diversos, formas diversas, cada uma comunicando algo

E se eu morrer

O amor fi caria, os prazeres da vida fariam parte de mim

Mas para onde iria a neuroanatomia

Para onde a fi siologia, se eu nunca a apliquei

Perco muito tempo descobrindo o que já se sabe hoje

São milênios de conhecimento

E eu só tenho anos de vida

Dediquei muito deles para aprender o que já se sabe nas ciências

Restringi meu campo de atuação

Mas é impossível

Vida inútil

Nunca descobrirei nada do que já não se saiba

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

Outro dia descobri por que as crianças colocam tudo na boca

Hipótese da higienização

Já sabiam

Mas pensei tudo sozinho

Eu não tenho culpa de ter nascido depois

Tanta vida, tantos amores, só lembro que tudo que faço pode

ser inútil quando alguém morre

Morrer

Será que meus conhecimentos vão para o céu

Acho que não

Só as artes vão para o céu

Os anjos tocando bossa deve ser bonito

Eu não sei tocar nada

O que eu vou fazer no céu para ocupar minha eternidade

Não haverá doenças

Anatomia dos anjos deve ser mais complexa

Será que as asas são inseridas no trapézio ou nos MM eretores

da espinha

Os anjos vão acabar com uma lordose com aquele peso nas costas

E eu, o que vou fazer?

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Julio Pereira

Seria até interessante atender um anjo com o AVC isquêmico

e com perda da mobilidade da asa

Como deve ser o homúnculo deles, onde fi caria a área da

auréola ou das asas

Imagine um anjo com asa fantasma, deve ser complicado

Os cardiologistas também terão muito trabalho, os anjos

provavelmente terão cardiopatia, aquelas asas devem sobrecarregar o

coração deles

Eu tinha esquecido que não haverá doenças

Mas não podia resistir e imaginar que os querubins teriam um

nanismo hipofi sário

Tudo isso se perderá

No céu não haverá dor ou ranger de dentes

Que perda de tempo minha

Estudar isso para quê?

Trabalhar num ambiente triste

Não sorria, aqui não é lugar para isso

Eu quero rir

Vou para um ambiente sombrio

Com doentes, sofrimento, choro, morte

Quero poder rir

Quero brincar

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

Sempre sério, preocupado

Atencioso

Para quê? Se na eternidade não haverá dor

Os anjos, arcanjos, querubins, Maria, José, Abraão, Enoque,

Paulo nunca aumentarão a secreção de eritropoetina na altitude celeste

Agora dançar, cantar, ler, isso todos farão

Se eu cantasse, ao morrer todos diriam que eu cantaria no céu

E se eu morrer, não poderei operar no céu. Como não haverá

dor, e micro-organismo (esses vão para o inferno), eu operaria bem

mais tranquilo

Meu bisturi seria mais penetrante que espada de dois gumes

Não poderei

Só se pode cantar, dançar e conversar

Até que para mim seria uma boa

Lendo os livros celestiais

Conversando com Deus

Vendo ele face a face

Perguntando por que ele fez isso ou aquilo

Deus deve ser bem alegre

Principalmente porque depois do apocalipse ele se aposentará

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20

Julio Pereira

Não terá que fi car ouvindo orações, deixando que aconteça

isso ou punindo alguém

Não precisará gerir nada

Que maravilha!

Eu poderei parar de ver as coisas como enigmas

O céu

Que vontade de ir para o céu

Mas ainda não posso, tenho que fazer algumas coisas ainda aqui

Tipo: deixar meus genes, aprender algumas coisas, conhecer

alguns lugares

Acho que vou aprender a tocar algum instrumento

Só não pode ser percussão

Por acaso você já imaginou um anjo tocando um timbau

Só se for uma anjo rasta,

Um anjo tocando berimbau

Não

No céu só entrarão instrumentos harmônicos

Amém

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Meu Professor

Sutil

Pueril

O ensino suave que não depende do professor, mas ele é

imprescindível

Não me lembro das aulas

Na verdade elas não existiram

Aprendi muito

Era capaz de me ensinar desconhecendo o conteúdo

Talvez o meu maior professor

Informal

Amigo

Quem aprende sem conhecer seu professor?

Sem sala de aula

Sem presença

Toda aula é vaga

Aula às 3 da manhã

Semanas sem aula

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Julio Pereira

Não sei o que aprendi

Na verdade nem sei se ele se conscientizou do processo

Conteúdo?

Para quê?

Ele era adepto do espontaneismo

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Relato de Caso - Pobreza Crônica

Paciente, masculino, 13 anos, relatando pobreza crônica há 13

anos e 49 semanas. Refere história familiar de pobreza – pais, familiares

paternos e maternos fazendo parte do proletariado. Queixa-se por não

saber ao certo o motivo da sua patologia, o que leva a um constante

incômodo. Menciona doenças virais da infância, mas não procurando

atendimento médico em razão das imensas fi las, mãe referindo que

seria mais fácil agravar a doença se comparecesse à clínica médica, já

que teria que esperar na fi la 20 horas para conseguir atendimento de 10

minutos (SIC). Refere que assistir televisão e jogar na Mega-sena são

fatores de melhora dos sintomas da pobreza crônica. Sonha em ser rico

para ajudar seus amigos pobres.

Nos antecedentes familiares refere morte de avós maternos de

“custipiu após chupar manga e tomar banho” e “Ziguizira após feijoada

e com boca torta após passar o vento” (SIC). Hábitos alimentares: come

de tudo que arranja. Ao exame, fácies pobre típica, negro, emagrecido,

cicatrizes feridas pobris em MMII e MMSS. Nega náuseas, tontura,

vômitos, diarreia e atendimento médico prévio.

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Julio Pereira

Discussão do Caso

A literatura científi ca e a mídia têm mostrado que a pobreza

é uma patologia hereditária e de alta penetrância1,2,3,4

. No entanto o

conhecimento popular1 tem incentivado a esperança de ganhar na loteria

e/ou vencer na vida, entretanto a literatura científi ca tem mostrado

se tratar de uma ilusão coletiva, uma vez que fi lho de pobre, pobre

será, com exceções da ordem 1 para cada 100.000 pobres. A história

clínica em questão apresenta um caso clássico de pobreza crônica1,4

.

Fazem-se necessários novos estudos para uma melhor compreensão

da epidemia de pobreza crônica em curso. Corroboramos também com

a Organização de Saúde dos Ricos4, que estimula que não chamemos

de países pobres, e sim países em desenvolvimento, dessa forma fi ca

mais ilusivo, apesar de denotativamente signifi car países miseráveis.

Diante deste fato, passaremos a chamar as pessoas pobres de pessoas

em enriquecimento.

Referências Bibliográfi cas:

1 Conhecimento popular

2 Revistas da classe média

3Jornais da classe média

4 Banco Mundial dos Países Ricos

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Anamnese da Vida

QWER, 20 anos, ateu,ndn,ndn,ndn

Tristeza há vinte anos.

Não existia quando há aproximadamente 20 anos passou a

existir. Refere não lembrar como ou o porquê disso. Relata tristeza

constritiva e lacerante, que era persistente sem fatores de melhora ou

piora. Nega uso de alucinógenos ou bebidas alcoólicas.

Lembra-se de poucas coisas da infância, lembra de poucas

coisas da adolescência e lembra de poucas coisas de ontem.

Epidemiologia positiva para morte. Gosta de chocolate, pizza

e pão. Abstenho de livro há três dias. Consumia 3 páginas/dia por 10 anos.

Relata briga com Deus há 6 anos. Refere que não entende o

porquê das coisas, para que criar seres pensantes e falou outras coisas

sem relevância.

Paciente lúcido demais, ausente no presente e vive no espaço.

Normocefálico, normopescoço, normotronco, normobarriga e

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Julio Pereira

normoextremidades. A alma não pode ser avaliada devido às limitações

apresentadas.

Suspeita Diagnóstica:

S1: Sofi smo crônico

Afastar: Nada

Mentiras

Coisas que desconheço

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Resumo Científico

A Vida — análise crítica de suas etapas, efeitos, defeitos e

impressões

Autores: et al.

Introdução: Após a fecundação, nascimento seguido de

crescimento e posteriormente morte.

Objetivos: Nenhum elucidado.

Materiais e Métodos: Depende da classe social. Quanto aos

métodos foi utilizado o estudo ver e refl etir simples.

Teste estatístico: qualitativo, quantitativo, opinativo e paliativo.

Resultados: Diversos

Conclusão: Outras observações são necessárias.

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Julio Pereira

Poesia Stricto Senso

O que te trouxe aqui?

Começou quando?

Alguma coisa melhora isso?

Teve febre?

A menstruação está normal?

Como assim mais ou menos?

Sente mais alguma coisa?

Tem alguém na família com alguma doença cardiovascular?

Cardiovascular ... do coração. Entendeu?

Toma algum remédio?

Não, não precisa dizer os chás.

Sim, às vezes eu também faço afi rmações. Está vendo?

?

??

????

????????????????

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Olhos da Alma

Fui obrigado a fazer uma anamnese. Não gosto de cumprir

obrigações, mas, àquela altura, último ano, na faculdade de medicina

era só o que eu fazia. E ser obrigado a conversar com alguém num

hospital é uma das piores tarefas que se pode ter. Conversar com alguém

que está precisando descansar. E pior, sua conversa não terá nenhum

efeito prático. Não ajudará no tratamento, os médicos já acompanham

e já estão investigando ou tratando. Mas felizmente os pacientes não

sabem disso. Arrumei minha pasta, peguei o meu jaleco e fui escolher

meu paciente.

Cheguei ao hospital e fui entrando de enfermaria em enfermaria

atrás de um bom paciente para minha anamnese. Geralmente escolho

pelo rosto e pelo comportamento. Pessoas deitadas e cobertas não

gostam de te responder. Na parede tem a data de internação, prefi ro

escolher pessoas que estejam internadas há menos de uma semana,

essas ainda gostam de conversar sobre sua doença.

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30

Julio Pereira

Na enfermaria de pediatria encontrei meu paciente.

“Olá, Wesley, meu nome é Theo. Posso conversar com você?”

“Claro, Doutor, mas minha doença é difícil. Vários médicos

conversaram comigo, mas só aqui em Salvador descobriram o que eu

tenho.”

“O que você tem?”

“Eu vejo a pessoa e a alma.”

Realmente Wesley tinha razão, a doença dele era difícil de

diagnosticar, mas sua narrativa era impressionante. Com apenas 8

anos, ele descreveu a diplopia (um sintoma no qual a pessoa apresenta

visão dupla), da forma mais criativamente realista que já ouvi: ver a

pessoa e alma.

“Os médicos disseram que terão que abrir minha cabeça para

tirar um tipo de olho que nasceu dentro dela.”

Wesley fi cou por 1 mês internado numa cidade do interior,

esperando a transferência. Ao chegar fez a ressonância e descobriu

que se tratava de um tumor cerebral. A cirurgia estava marcada para

segunda-feira.

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

“Mas você sempre vê a pessoa e a alma?”

“Claro que não, Doutor, basta eu fechar um olho que só vejo

você sem sua alma.”

“Mas como é a alma?”

“Normal, uma alma normal.”

Wesley respondeu como se ver uma alma fosse a coisa mais

corriqueira para um médico.

Já tinham se passado 30 minutos de conversa e eu já sabia a

doença que Wesley tinha. Tinha alguns itens que tinha que perguntar,

como se ele morava em casa de taipa. Mas, sinceramente, não tinha

sentido fi car fazendo algumas perguntas.

“A senhora é a mãe do Wesley?”

“Sou, doutor.”

“Ele teve algum problema antes desse?”

“Não, doutor. Ele sempre foi forte, nunca nem foi no médico.

Ele é muito forte, doutor, acho que essa doença dele foi um feitiço dos

parentes do pai dele.”

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Julio Pereira

Voltei para casa contente com minha anamnese. Tinha colhido

uma história interessante. Geralmente as histórias são muito iguais.

Às vezes o chato da medicina é a mesmice. Fico muito feliz quando

atendo alguém diferente como Wesley. O telefone tocou.

“Diga, Hiago? Fiz uma anamnese boa hoje.”

“Com quem?”

“Uma criança da pediatria.”

“Wesley?”

“Como você sabe?”

“Tá todo mundo fazendo com ele, acho melhor você fazer

outra ...”

Infelizmente sempre acontece isso. Um caso interessante, e

todo mundo sabe. Mantive minha anamnese e fi quei o fi m de semana

ansioso para saber da cirurgia de Wesley. Na terça-feira, fui direto ao

CTI para saber da cirurgia de Wesley.

“Como você tá, Wesley?”

“Estou bem.”

Wesley ainda estava um pouco cansado, nem parecia ter

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33

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

operado em menos de 24 horas. Passados dois dias, Wesley teve alta do

CTI, em bom estado e contando que na cirurgia tiraram o olho da alma.

Passada uma semana, voltei para saber como ele estava.

“Wesley teve alta?”

“Não, morreu ontem.”

“Como?”

“Ninguém sabe direito, mas parece que foi embolia pulmonar.”

Não consegui encontrar mais a mãe do Wesley ou saber

melhor como foi a morte dele. Mas ele foi meu único paciente que

conseguia ver a pessoa e a alma.

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Julio Pereira

Hospital de Emergências

Chegou mais um baleado!

Preto e pobre

É Safado?

Foi Baleado!

Vamos Tratar!

Não, deixe pra lá

Se viver volta a roubar

Mas estamos aqui para ajudar

Esqueça a ajuda

Aqui a emergência depende

Se for ladrão ninguém atende

Mas quem julga se é ladrão?

É só olhar pra saber

Não consegue me entender?

Poderia ser eu?

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Meus Pobres Pacientes Pobres

Paciente Pobre

Pobre paciente

Por que é tão paciente?

Não vês que és pobre

Se és pobre, não pode ser paciente

Sou médico paciente

Paciente sou médico

Sou culpado pela sua doença

Não devia ser paciente com a pobreza

Por isso vejo todo dia a mesma tristeza

O mesmo paciente pobre e paciente

Também estou doente

Doente de ver a pobreza

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36

Julio Pereira

O colírio embaçador acabou

Enxerguei o paciente

O pobre

Pobre paciente Pobre

Ciente?

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

O Epidemiologista

Nos primeiros anos conte com a sorte

Sem anomalias, malformações e pais de bom coração

Se pobre, teve pouca sorte. Infecção?!

Na infância, pernas moles e braços fracos

Hoje, pouca morte.

Após crescência

Esta na adolescência

Não brigue

Só fi que

O trauma te acompanha

Olhe as facas, as armas, os carros e as quedas

Na velhice?

Quer que liste?

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Julio Pereira

A morte te espera

O que quer?

Raro ou comum?

Infarto ou câncer?

Trauma ou derrame?

Na vida se nasce, quase sempre cresce, geralmente reproduz

e sempre adoece e morre.

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39

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Neuroembriologia

Fui assistir a uma neurocirurgia

Que lindo ver a dura-máter

É incrível saber que a ectoderma gerou aquilo

E se impressionar ao saber que a estrutura mais interna a pia-

máter tem origem mesodérmica

Para quê?

Eu acho que nunca vou utilizar esse conhecimento

Talvez isso tenha me dado o mesmo prazer de saber que as

lagartixas não sonham

Inútil

Mas maravilhoso

Eu não vejo mais as lagartixas como via antes

Na verdade nem conferi se a informação era verídica, mas

acho que isso não é muito importante.

Eu me identifi quei com a lagartixa e a pia-máter

Eu não sonho

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40

Julio Pereira

Sou a pia-máter, quase tudo que me cerca tem origem na

porção externa

Só eu não

Eu não escolhi não sonhar nem ter origem mesodérmica

Pia e lagartixa, o que fi zemos?

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41

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Sem Sentimentos

Escrever sobre o físico

Sobre o que é racional

Isento de emoção

Para que serve o sentimento?

Já foi útil, hoje inútil

Quero a frieza

Uma amídala estática

Um sistema simpático sobre meu controle

Quero sentir o percorrer de cada impulso

Desde a mais simples sinapse

Sentir

Homúnculo. Só motor!

Refl exo, só!

Siglas …muitas siglas

SNC

ELA

MRI

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42

Julio Pereira

TC

Por que meu nocioceptor pode decidir pelo que devo sofrer?

Paccini, sempre a sentir. Não pare! Quero sentir sempre!

Racional

Cortical

Pré-frontal

Giro angular

Sem piegas

Nu, cru…

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43

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Triálogo

Claramente um problema espiritual.

Acredito se tratar de uma esquizofrenia paranoide.

Não tenho ideia do que ele tem, mas o chá pode ajudar.

Se Deus ajudar, todos os problemas podem se acabar.

O processo evolutivo traz consigo uma competição, que pode

prejudicar alguns.

Eu não sei direito, não, mas se derem um aumento legal as

coisas fi cam numa boa.

A saúde é um dom de Deus.

As inovações tecnológicas têm que ser inseridas no Sistema

de Saúde para todos.

Rapaz, na boa, o negócio é não fi car doente. Se fi car, ferrou

tudo. Remendar não resolve.

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44

Julio Pereira

A morte é apenas uma etapa que todos, crentes e não crentes,

irão passar.

O morrer é indefi nível. Atuamos para tentar evitá-la. Uma luta

sem fi m pela vida.

Morrer é dose. Dá até medo de pensar. Por isso que nem quero

fi car pensando para não atrair coisa ruim.

Alegria é crer no Senhor Jesus, salvador e vivifi cador.

Um processo neuroendócrino, selecionado no processo evolutivo.

É tomar uma ou duas. (risos)

(Frases fortes, confi ança, gestos enfáticos, emotivo, frases

de efeito)

(Gestos lentos, precedido de refl exões curtas, fala calma)

(Agitado, sorrindo, fala contínua e término abrupto das frases)

Não sei.

Não me recordo do signifi cado.

Colé, aí você quer ferrar a gente mesmo.

Causa Mortis: Câncer de Reto

Causa Mortis: Trauma Craniano

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Causa Mortis: Infarto do miocárdio

Aqui jaz Sr. Bruno

Aqui jaz Sr. Moises

Aqui jaz Sr. Carlos

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46

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Abridor de Cabeça

No início tudo me parecia novo. Não conhecia ao certo o dia a

dia da minha escolha. Só me lembro dos conselhos de minha avó, que

dizia para fazer algo que pouca gente fazia. Com essa frase, fi z minhas

escolhas. E vou ser sincero: sou bom em fazer provas, gosto de estudar

e de aceitar desafi os.

A senhora tem um tumor cerebral.

E isso é grave, Dr.?

É, mas podemos operar e tirar.

Abrir a cabeça?

É.

Posso morrer?

Pode.

Tem outro jeito?

Não.

E se não operar?

Pode morrer com ele crescendo.

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47

Julio Pereira

Mas vocês fazem isso sempre?

Todo dia.

Os diálogos eram sempre muito iguais. Acho que na verdade

todas as pessoas leem o laudo e procuram na internet. Mas realmente

abrir a cabeça não parece uma boa ideia. Tenho a impressão de que

existem coisas que não devem ser feitas.

Não tem como tomar um remédio?

Não.

O problema é que criamos soluções humanas demais. Na

literatura, as soluções são mais mágicas e com um signifi cado maior.

Abrir a cabeça? Cortar a pele até encontrar o osso e depois retirá-

lo. Sempre colocamos o osso no soro. Depois abrimos as meninges.

Procuramos o tumor e retiramos. Tudo isso com sangue e emoção.

Humano demais. Na verdade, nas primeiras vezes, um pouco mais de

emoção, depois acostumamos.

O senhor já fez alguma cirurgia dessa?

Já.

Dá certo?

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48

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

A maioria.

Posso fi car paralisada na cama?

Pode.

As pessoas deveriam ter direito a uma realidade única,

diferente. Cada um teria uma doença única, só dela.

Por que as pessoas têm essa doença?

Não sabemos, são várias causas.

É genética?

Também.

Esse na verdade é a etapa que menos gosto: Os porquês. Na

verdade só sei o que tem e o que fazer. Até teria vontade de conversar

sobre o existencialismo, mas não seria oportuno.

A senhora faz esses exames e vamos marcar a cirurgia.

Vai ser aqui mesmo?

Isso.

Fico quantos dias depois da cirurgia?

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Julio Pereira

Se tudo der certo, de 5 a 10 dias.

E se não der?

Não se preocupe, espero que tudo dê certo.

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50

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

O Tumor Cerebral

O tumor está em qual leito?

Lembrei! Leito 03 da 3a enfermaria.

Você é Pedro?

Comeu?

Vamos operar, Pedro!

Depois você vai para a UTI.

Claro que vai dar certo!

Daqui a pouco nos veremos

Sua mãe não pode entrar.

Porque ela não é médica.

Vai! Ela está te esperando lá fora.

Pensei que você era mais velho ... só 7 anos.

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51

Julio Pereira

Pedro, agora você vai sentir uma tonteira.

Respire fundo esse ventinho.

Já podemos começar?

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52

EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Perguntas no Pronto-Socorro

Ela vai morrer?

O que aconteceu?

Ela está grave?

Posso vê-la?

Vai precisar operar?

Tem que abrir a cabeça?

Corta o cabelo?

Há risco de morrer?

O sr. fala com a fi lha dela?

Ela está em coma?

Pode me ouvir?

Fica quantos dias internada?

Demora quantas horas?

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Julio Pereira

Podemos esperar?

E agora?

Ainda tem risco?

Foram quantos pontos?

Que dia ela acorda?

Ela ainda pode morrer?

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Nossos Déficits

Ela nasceu assim

Assim como?

Com alguns défi cits

É um atraso no desenvolvimento?

É, parcial.

Ela vai ter um futuro?

Não queria um fi lho assim?

Assim como?

Com défi cits.

Todos os défi cits são ruins.

Qual te incomoda mais?

Os meus.

O pior são os olhares.

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Julio Pereira

Dela?

Não, dos outros.

A cabeça irá diminuir?

Provavelmente estabilizará.

E os olhares?

Precisará trocar a válvula?

Depende.

Volto em seis meses?

Sabe, acho ela normal.

Sem défi cits?

Isso, sem défi cits.

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Malignamente Benigno

É benigno, Doutor?

Quase.

Quase por quê?

Porque é no tronco cerebral.

Mas no tronco é benigno?

Benigno é o tipo do tumor … Tronco é o local.

Mas então é benigno?

O tumor é, mas o local não.

Mas no geral é benigno?

Mais ou menos.

O Dr. preferiria ter um tumor maligno num local benigno?

Não sei, depende.

Então para que dizer que é benigno?

Para saber se é ruim.

E o que é esse tronco cerebral?

É o local mais importante para a vida …

Mais importante que o coração?

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Julio Pereira

Eu acho.

O sr. preferia ter um tumor benigno no coração?

Acho que sim.

Vou ser sincero com o sr., não gostei desse negócio de maligno

e benigno.

Às vezes é difícil de entender.

Tem algum tratamento?

Vamos discutir seu caso.

Meu cabelo vai cair?

Vai depender do tratamento.

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Dor Lombar

Qual o seu problema?

Não consigo trabalhar

Por quê?

A dor lombar

Quando começou?

No trabalho, fui pegar um peso.

Você trabalha?

Não consigo.

Sente mais alguma coisa?

Quando vou trabalhar piora a dor.

O sr. fez os exames?

Não consegui, vão demorar 6 meses. O sr. sabe o SUS demora.

Como é essa dor?

Uma dor normal que me impede de trabalhar.

Começa onde?

Do pescoço até a perna.

Temos que esperar os exames.

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Julio Pereira

Tudo bem. O sr. pode fazer um relatório?

Claro.

Tenho perícia na próxima semana.

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

As Mortes

Na verdade é pouco defi nida

Não existe uma só

Devia ser adjetivada

A morte

Parece triste

E pode ser

Mas não é sempre

Pode ser até alegre

Morte-descanso

A pior é a morte-susto

Na surpresa

Repentina

Ela morreu, foi?

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Julio Pereira

Foi

Como?

Morte-susto.

A Morte-preparada

Ela leva um tempo

Prepara

Avisam da sua chegada

A doença é grave

O fi nal geralmente se sabe

Ninguém fala

Todos esperam

A Morte-prestação

Vem aos poucos

Chega aos poucos

Retira a vida à prestação

Odeio essa

Quando chega

Morte-prestação

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Nem se espera mais

ou Morte-sofrimento?

Morte-alegre

Nos ensinam que não existe

Mas existe

eu vejo

Viveu bem

Nem sempre muito

Não é tempo

É como

Vive bem

Morreu bem

A Morte-alegre

Quase choro de felicidade

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Julio Pereira

Omissão de Socorro no Facebook

Mensagens: segunda, 15 de outubro de 2012 às 0:15

Doutor, o sr. está online?

O Paulo piorou, doutor.

Quando o sr. “tiver” online me avise.

Queria levar para o hospital mas prefi ro ouvir o que o sr. acha.

Chegou a ressonância nova que diz o Laudo: Conclusão sinais

de reincidiva do tumor com compressão do tronco cerebral.

Doutor, ele agora está um pouco mais sonolento mas não

dormiu bem ontem.

O senhor vai estar no consultório amanhã?

Mensagens: segunda, 15 de outubro de 2012 às 1:25

Doutor, o Paulo piorou e trouxe ele para o hospital.

O médico que atendeu disse que ele não está bem e é a

evolução do tumor.

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Mensagens: segunda, 15 de outubro de 2012 às 2:25

Olá, Ana, só vi agora sua mensagem.

Quando puder, ligue no meu telefone.

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Julio Pereira

O Protocolo para Morrer

Estamos fazendo alguns testes!

Mas ela morreu, doutor?

Precisamos esperar os testes.

Os testes iram confi rmar se ela morreu?

Isso mesmo, Ana.

Ela precisa descansar, doutor, sofreu muito. Mas a pessoa não

morre e pronto?

Alguns vezes, outras precisamos confi rmar com testes.

E demora quanto tempo?

6 horas

Nesse tempo ela está morta?

Ainda não, só depois de confi rmar.

Não estou entendendo, Dr. Precisa de teste para saber se morreu?

Algumas vezes sim. É o que chamamos de morte encefálica.

Mas demora 6 horas?

É que o protocolo exige esse tempo de espera entre os testes.

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Protocolo? Morte?

Isso mesmo, é um protocolo.

Acho que estou muito confusa. Tem protocolo para morrer?

Isso, no Brasil, para o adulto fazemos 2 testes com diferença

de 6 horas.

No Brasil? Adulto?

Isso, em alguns países é diferente.

Posso chamar meu irmão. Ele é estudado e o sr. explica para ele.

Olá Dr., eu sou Pedro. Minha mãe morreu?

Estamos esperando a confi rmação.

Do quê?

Da morte.

Mas depende do quê?

Do teste de morte encefálica.

Ah ... entendi. É no sangue?

Também, mas é uma série de exames do protocolo.

Muito obrigado.

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Julio Pereira

O sr. tem alguma dúvida?

Não. Muito obrigado.

Pedro, você entendeu o que o médico explicou? Parece que

eles não sabem se ela morreu.

Sabem sim, Ana, mas tem que seguir o protocolo.

Que protocolo?

O protocolo deles.

Qual protocolo?

É deles, Ana, se você quiser saber, tem que virar médica.

Deus do céu. Parece que está cada dia mais difícil, até para

morrer tem protocolo.

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

A Morte da Mãe

Um acidente de carro

Por quê?

O corpo imóvel

Nunca mais te verei?

Os três abraçados

Você sabia que te amo?

Pai nosso que estás nos céus

O que farei sem você?

Santifi cado seja o vosso nome

Mãe, por que não me responde mais?

Comprar o caixão, fl ores, velas, um funeral

Ela ia querer que você fosse forte!

As lágrimas terminavam e só restavam os sons

Minha mãe morreu. Não foi?

Impossibilidade de reação

Deus irá te ajudar

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Julio Pereira

Talvez o celular tenha tocado

O CD ia ser trocado

Quem sabe um desmaio

A preocupação do que deverá ser feito amanhã pela manhã

Talvez tivesse repensando na vida, o que deveria mudar

A MORTE

Dor

Saudade

A MORTE

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EscritoEscritoemem LetraLetradedeMédicoMédico

PB

Sobre uma Guerra Estranha

Ontem você me perguntou o porquê de você ter um tumor

cerebral. Respondi quase de forma refl exa: “Essas coisas acontecem”.

Ao sair fi quei pensando como deveria ter te respondido, afi nal sou seu

amigo.

Fui treinado para explicar pouco o porquê. Prefi ro explicar o

que deve ser feito e as possibilidades de tratamento. Pensei em voltar

para te responder, mas não conseguiria, então resolvi escrever essa

carta.

O tumor cerebral acontece. Só isso. Assim como outras

casualidades da vida, ele ocorre. Sem motivo especial ou causa clara.

Diversos artigos científi cos tentam buscar fatores de risco, que seriam

fatores que predispõem certas doenças. Mas tudo isso dará números e

probabilidades. O que te importam, meu amigo, essas chances? Para

você elas não têm importância agora.

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Julio Pereira

Tentar te explicar o porquê do tumor é muito difícil. Talvez a

resposta que você queira saber eu não possua. Só tenho informações

que não te ajudarão em nada e talvez até te atrapalhem. Consideramos,

a nós mesmos, importantes demais para saber nossa realidade humana,

nossa fragilidade.

Leio muito pouco. Infelizmente tenho pouco tempo para me

dedicar a isso e tentar responder algumas perguntas que são feitas para

mim diariamente. Posso te dizer que perguntam mais no hospital sobre

fi losofi a que sobre medicina. Geralmente não sei o que responder, tento

mudar de assunto ou falar uma frase de efeito qualquer.

Gostaria de pedir desculpas por não poder responder sobre o

seu tumor. Consigo te explicar sobre como tratar um tumor, mas não é

isso que você quer saber.

O que você quer saber não te responderei. Sua dúvida

continuará. Mas tinha que te dar uma resposta mais franca: Eu não sei.

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Esta obra foi composta em fonte Times 10e impressa em papel Cartão Supremo 250 g/m2 [capa]

e em papel Alta Alvura 75g/m² [miolo].

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