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Missio Dei — Márcio Monteiro Rocha UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI MÁRCIO MONTEIRO ROCHA

MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

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Este trabalho de Conclusão de Curso é uma reflexão sobre o tema Missio Dei abordado na teologia de missão em meados do séc. XX. No primeiro capítulo o autor trabalha o sentido e significado da Missio Dei para o período do século XIX que ficou conhecido como “o Século das Missões” O segundo capítulo aborda superficialmente a tensão entre o desenvolvimento missionário ecumênico e evangelical que deu grande ênfase ao tema Missio Dei na última metade do século XX e uma breve relação dos grandes encontros mundiais de missão e evangelização. Finalmente, o terceiro capítulo trabalha a relevância do tema Missio Dei para o séc. XXI. http://projetoluzevidamissaoamazonia.blogspot.com.br/2014/11/assim-como-o-pai-me-enviou-tambem-eu.html http://bit.ly/missiodei21

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

MISSIO DEI:UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

MÁRCIO MONTEIRO ROCHA

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São Bernardo do Campo — novembro de 2014

Umesp

2014

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MÁRCIO MONTEIRO ROCHA

MISSIO DEI:

UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Colegiado de Curso, com vistas à obtenção de grau de Bacharel em Teologia da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista — Universidade Metodista de São Paulo. Sob a orientação do Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth.

São Bernardo do Campo — novembro de 2014

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FOLHA DE APROVAÇÃO

A Banca Examinadora considera o trabalho: __________________________________

E atribui o conceito: __________________________________

Orientador/a: __________________________________

Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth

Leitor/a: __________________________________

Prof. Dr. Jorge Schutz

Professor de TCC: __________________________________

Prof. Dr. Paulo Ayres Mattos

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“Assim como o Pai me enviou, também Eu vos envio a vós” João 20.21

(Base bíblica sobre a qual se fez a primeira abordagem sobre Missio Dei)

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AGRADECIMENTOS

.............Ao Deus Pai, que enviou a nós o Seu Filho, e nos deu o Seu Espírito, para que

a Igreja pregue o evangelho à toda criatura, em todas as parte do mundo (Mc 16.15); Igreja

da qual participam ilustres pastores, doutores, mestres (Ef 4.11) e leigos (I Co 1.26), aos

quais com alegria e gratidão faço lembrar: Blanches de Paula (Área de Teologia Pastoral e

Ciências Humanas e Sociais); Claudio de Oliveira Ribeiro (Docente de Teologia); Douglas

Nassif Cardoso (Área de Teologia e História); Helmut Renders (Área de Teologia e

História); Jorge Schultz Dias (Leitor deste Trabalho de Conclusão de Curso); José Carlos de

Souza (Área de Teologia e História); Lauri Emilio Wirth (Área de Teologia e História e

orientador deste Trabalho de Conclusão de Curso); Luiz Carlos Ramos (Liturgia da Fateo);

Magali do Nascimento Cunha (Docente de Teologia); Marcelo Furlin (Docente de Língua

Portuguesa); Margarida Fátima Souza Ribeiro (Área de Teologia e História); Nicanor Lopes

(Área de Teologia Pastoral, Ciências Humanas e Sociais e Coordenador do Curso de

Teologia da Fateo); Oswaldo de Oliveira Santos Júnior (FAHUD); Paulo Augusto de Souza

Nogueira (Área de Bíblia); Paulo Ayres Mattos (Área de Teologia e História e Prof. do

módulo de TCC); Paulo Roberto Garcia (Área de Bíblia e Diretor da Fateo); Rui de Souza

Josgrilberg (Teologia Sistemática); Sandra Duarte de Souza (Área de Teologia Pastoral e

Ciências Humanas e Sociais) ; Suely Xavier do Santos (Área de Bíblia) e Tércio Machado

Siqueira (Área de Bíblia).

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ROCHA. Márcio Monteiro. Missio Dei: Uma Teologia de Missão para o Século XXI. São Bernardo do Campo, 2014. 45 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Teologia) — Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2014.

RESUMO

Este trabalho de Conclusão de Curso é uma reflexão sobre o tema Missio Dei abordado na teologia de missão em meados do séc. XX. No primeiro capítulo o autor trabalha o sentido e significado da Missio Dei para o período do século XIX que ficou conhecido como “o Século das Missões” O segundo capítulo aborda superficialmente a tensão entre o desenvolvimento missionário ecumênico e evangelical que deu grande ênfase ao tema Missio Dei na última metade do século XX e uma breve relação dos grandes encontros mundiais de missão e evangelização. Finalmente, o terceiro capítulo trabalha a relevância do tema Missio Dei para o séc. XXI.

Palavras-chave: Deus – Missão – Missio Dei – Triúno – Trindade

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SUMÁRIO

Introdução __________________________________________________________________7

Capítulo 1 O Século das Missões e a Missio Dei ____________________________________9

1. Breve introdução à Missio Dei ______________________________________________9

2. Lutero e a Missio Dei ____________________________________________________10

3. A Tarefa Inconclusa _____________________________________________________11

Capítulo 2 Ecumenismo, Evangelicalismo e Missio Dei ____________________________17

1. Eventos e movimentos a serviço da Missio Dei ________________________________17

2. Igreja e Missio Dei ______________________________________________________20

3. Missio Dei : A trajetória de um conceito ______________________________________22

Capítulo 3 Uma Teologia de Missão para o Século XXI _____________________________34

1. A contextualização da Missio Dei no Brasil __________________________________34

2. A relevância do conceito Missio Dei no Brasil ________________________________36

3. Missio Dei: Deus Conosco no Século XXI ___________________________________39

Conclusão _________________________________________________________________42

Referência _________________________________________________________________43

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INTRODUÇÃO

Este trabalho de conclusão de curso será dividido em três capítulos, cada qual com três

subdivisões. O primeiro capítulo procurará abordar a temática da Missio Dei a partir do

fenômeno que ficou conhecido no séc. XIX como “O Século das Missões”. A primeira parte

trata-se de uma breve introdução à Missio Dei, introdução que busca situar o tema muita

além da época de sua sistematização. A segunda parte procura trazer à memória a

perspectiva missionária presente nos dias da Reforma Protestante empreendida inicialmente

por Martinho Lutero. A terceira parte procurará demostrar que a tarefa missionária do

século das missões não foi concluída e carece de um paradigma de missão adequado para

sua continuidade no tempo presente.

O segundo capítulo deste trabalho procurará abordar o desenvolvimento dos grandes

movimentos missionários mundiais. A primeira parte pretende descrever o movimento

missionário ecumênico e o evangelical e qual a posição da Missio Dei neste contexto. A

segunda parte procura brevemente demonstrar o lugar da igreja cristã na Missio Dei e qual a

relevância da Missio Dei para a Igreja. A terceira parte busca demonstrar a trajetória do

conceito Missio Dei a partir de sua sistematização na teologia de missão em meados do séc.

XX até nossos dias.

O terceiro e último capítulo deste trabalho ocupar-se-á em demostrar que a Missio Dei é

uma teologia de missão adequada ao tempo presente e pode encarregar-se de dar o impulso

necessário à ordem missionária. Para tanto, a primeira parte procura demonstrar a

necessidade de contextualização de aspectos relevantes da Missio Dei para a realidade da

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América Latina. A segunda parte ocupa-se em demonstrar a importância do conceito Missio

Dei para o Brasil e de que maneira ela afeta a realidade cristã nas igrejas. A terceira e última

parte deste capítulo procura reafirmar a Missio Dei como uma teologia de missão adequada

a igreja brasileira e latino-americana promovendo libertação não somente para o mundo

sofredor, mas também para a igreja sofredora em sua ação missionária no mundo.

Os problemas encontrados na pesquisa situam-se nas relações entre o movimento

missionário ecumênico mundial e o evangelical que carecem de uma compreensão mais

clara do potencial da Missio Dei para o desenvolvimento de seu mandato missionário, tanto

de forma ecumênica como também evangelical, em que a participação de todos os setores da

cristandade esteja sob a Missio Dei e não sobre ela.

O principal referencial teórico deste trabalho foi a obra do teólogo protestante alemão Georg

Vicedom, do teólogo reformado David Bosch e do teólogo brasileiro luterano Roberto

Zwetsch, cada um deles com uma visão teológica própria, mas que se convergem à

participação comunitária e voluntária na Missio Dei.

O objetivo geral deste trabalho é apresentar a Missio Dei como uma teologia de missão

plausível e mensurável para o universo cristão em suas ações missionárias no mundo

vigente, seja na Europa, na América do Norte ou na América Latina, porém com uma visão

compassiva e acolhedora aos povos tradicionais remanescentes vítimas de um sistema

colonizador ainda presente e insustentável.

O objetivo específico deste trabalho é motivar a igreja brasileira e latino-americana a

abraçar a Missio Dei e deixar-se por ela abraçar a fim de que o Senhor da Missão realize a

tarefa missionária, contando com a participação do maior número de pessoas, sem importar

quem sejam ou onde estejam.

A metodologia adotada para realização deste trabalho foi a pesquisa bibliográfica na qual se

destacam as obras “Missio Dei” de George Vicedom, “Missão Transformadora” de David

Bosch e “Missão como Compaixão” de Roberto Zwetsch. Foram também utilizadas várias

outras obras como fontes de apoio à pesquisa aqui empreendida e que estão elencadas na

bibliografia deste trabalho.

A realização deste trabalho de conclusão de curso se justifica pela presente crise

missionária, tanto por parte da igreja como da teologia cristã e é desenvolvido com o

propósito de produzir subsídios auxiliares para a formulação de um novo paradigma de

9

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missão para o tempo presente a fim de satisfazer as necessidades e exigências comuns ao

século XXI.

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CAPÍTULO 1

O SÉCULO DAS MISSÕES E A MISSIO DEI

1. Breve introdução à Missio Dei

Para que a Missio Dei possa ser discutida de forma compreensível no tempo presente, é

preciso que se busque conhecer suas origens dentro do universo em que se revela. Em

função dos limites de tempo e de espaço a que este trabalho de conclusão de curso está

submetido, a Missio Dei será estudada a partir de sua localização cronológica na Reforma

Protestante1 do séc. XVI, na Alemanha de Martinho Lutero2. Os três séculos seguintes não

serão abordados, pois a discussão principal a que este trabalho se ocupa dar-se-á a partir do

desenvolvimento missionário mundial do séc. XIX

A vantagem em se iniciar a abordagem a partir de Lutero é que ela pode oferecer um

panorama menos obscuro àquele encontrado na história do cristianismo praticado antes da

Reforma Protestante, quando muitas doutrinas que obscureciam a cristandade Católica

Romana não haviam ainda sido confrontadas. A desvantagem é que deixar de aprofundar a

pesquisa até as épocas mais remotas à humanidade, deixa-se também de se experienciar

parte significativa da missão do Deus Triúno dentro da história dos seus atos.

1 A Reforma Protestante foi um movimento reformista cristão culminado no início do século XVI por Martinho Lutero, quando através da publicação de suas 95 teses, em 31 de outubro de 1517 na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, protestou contra diversos pontos da doutrina da Igreja Católica Romana, propondo uma reforma no catolicismo romano.2 Martinho Lutero (1483 em Eisleben, Alemanha - 1546, Eisleben) foi um monge alemão agostiniano e professor de teologia que se tornou uma das figuras centrais da Reforma Protestante. Levantou-se veementemente contra diversos dogmas do catolicismo romano, contestando sobretudo a doutrina de que o perdão de Deus poderia ser adquirido por meio da compra e venda de indulgências.

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Se aos homens fosse dada tal graça, seguramente a Missio Dei poderia ser contemplada em

plena atividade, muito antes da Reforma Protestante, e até mesmo antes da existência

humana e, porque não dizer, da própria fundação do mundo (Ef 1.4). Isto porque -

independentemente da conceituação e sistematização teológica que a Missio Dei veio a

receber em meados do séc. XX, cujo teor é parte significativa do presente estudo - a Missio

Dei preexiste a tudo e a todos na pessoa daquele a quem se refere: DEUS.

2. Lutero e a Missio Dei

Desde o início do séc. XVI a perspectiva missionária da Reforma Protestante foi tratada por

muitos representantes da missiologia do séc. XIX como uma experiência decepcionante e

seu maior representante, Matinho Lutero, como um teólogo de pouca ou nenhuma

consciência missionária. O principal articulador desta crítica foi o missiólogo Gustav

Warneck3, apontado por Brandt4 como aquele para quem Lutero sequer tinha conhecimento

da “obrigação missionária”, sendo desprovido de qualquer “ato missionário” ou de

qualquer “noção de missão”.5

Apesar de Brandt reconhecer que o termo “missão” e o interesse em “atividades

missionárias” não se encontram em Lutero, a “questão da missão... tem nele o seu lugar

vivencial em sua interpretação da Sagrada Escritura e em sua reforma da igreja”, pois “a

fonte de seus enunciados sobre missão são sua interpretação da Bíblia e suas prédicas” 6.

Neste sentido Brandt defende que “o sujeito da missão é o próprio Deus em sua palavra”, e

estabelece a figura de Lutero como “um precursor da posterior tese da Missio Dei”.7

3 Gustav Adolf Warneck (1834, Naumburg – 1910, Halle), pioneiro na missiologia como disciplina acadêmica, nasceu e cresceu em uma família de artesãos alemães humildes perto de Halle. Pastor, professor da missão em Halle (1897-1908), Alemanha. Fundador da ciência de estudos de missão. O primeiro a estimular a criação de missiologia católica romana. O primeiro a iniciar um tratamento objetivo e responsável dos temas missiológicos. O primeiro a produzir um compêndio abrangente sobre a ciência das missões (1892-1903) e promover cooperação eficaz entre missões. Nunca entrou em um campo missionário no exterior. Críticas a Warneck surgem num momento de reavaliação radical da missio Dei. A missiologia deve mais à Warneck do que a qualquer outra pessoa. (Biographical Dictionary of Christian Missions, New York: Macmillan, 1998, p. 718)4 Hermann Brandt, (1940, Münster - 2009, Erlangen) estudou teologia entre 1960 e 1964 nas Universidades de Münster, Heidelberg e Göttingen. Em 1969, defendeu tese de doutorado na área de Teologia Sistemática em Göttingen, foi professor de Teologia Sistemática na Faculdade de Teologia EST entre 1971 e 1977 e, em 1990, concluiu seu PhD (Habilitation) com a tese “A presença de Deus na América Latina”.5 WARNECK, apud BRANDT, H. O Encanto da Missão: Ensaios de missiologia contemporânea. Sinodal, São Leopoldo: 2006, 188p. p. 55, 56.6 WARNECK, apud BRANDT. p. 55.7 BRANDT, H. O Encanto da Missão: Ensaios de missiologia contemporânea. Sinodal, São Leopoldo: 2006, 188p. p. 57

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Assim também compreende Scherer8, afirmando que “para Lutero, a missão é sempre de

forma preeminente obra do Deus Triúno – missio Dei –, e seu alvo e resultado são a vinda

do reino de Deus”9 10 11. Em Lutero, a Igreja, a Palavra de Deus e os crentes são vistos juntos

“como instrumentos divinos cruciais para a missão [...] em nenhum lugar o reformador faz

da igreja o ponto de partida ou o alvo final da missão [...] É sempre a missão do próprio

Deus que domina o pensamento de Lutero, e a vinda do reino de Deus representa sua

culminação final”12.

Para Lutero a natureza missionária da igreja se revela através da Palavra de Deus que lhe é

pregada e, consequentemente, anunciada ao restante do mundo por meio da igreja através de

cada sacerdote leigo no mundo que é o crente batizado. Desta percepção de Lutero advém

sua informal tríade missionária composta pela Palavra, pela Igreja e pelo crente. Apesar de

sua concepção missionária partir da função que a comunidade cristã exerce na missão,

Lutero jamais entendeu a Igreja como algo além de um instrumento operado, do início ao

fim, pela vontade do próprio Deus.13

3. A Tarefa Inconclusa

“Desde a época de Constantino, raramente a política imperial e os interesses do reino de

Deus – César e Cristo – estiveram numa convergência tão próxima e confortável ”14 É com

esta perspectiva missionária que James A. Scherer no livro “Evangelho, Igreja e Reino:

estudos comparativos de Teologia de Missão” de 1987 descreve o resultado do

desenvolvimento missionário no mundo contemporâneo desde o início do cristianismo

8 James A. Scherer (1870-1944) escritor americano, pastor luterano e um dos fundadores da Igreja Luterana Evangélica do Japão.9

ZWETSCH. Roberto E. De Fé em Fé, Caminhamos! Por uma Teologia da Missão Evangélica Luterana no Chão Brasileiro. Estudos Teológicos, Estudos Teológicos, v. 45, n. 2, p. 170. 2005. Disponível em: <http://periodicos.est.edu.br/index.php/estudos_teologicos/article/viewFile/547/508>. Acesso em: 10/11/2014. 10 SCHERER, apud ENGELSVIKEN. p. 48111 O Reino de Deus (gr. βασιλεία τοῦ θεοῦ, “basileia tou theou”) designa um governo ou domínio que tem  Deus por soberano ou governante. O Reino de Deus é um conceito fundamental nas três principais religiões monoteístas existentes: Judaísmo, Islamismo e Cristianismo. No Cristianismo, o Reino de Deus constitui o tema principal da pregação de Jesus de Nazaré, no séc. I, e através dos séculos por meio dos seus discípulos. O conceito de Reino de Deus é um dos temas mais discutidos hoje por teólogos e teólogas da Igreja cristã e tem sido considerado como o alvo principal da Teologia de Missão conhecida como Missio Dei, que tem por objetivo incluir a humanidade no Reino de Deus através da Justificação proporcionada em Jesus Cristo.12 SCHERER, James A. Evangelho, igreja e reino. Estudos comparativos de teologia da missão. São Leopoldo: Sinodal, IEPG/EST, 1991, p. 4413 SCHERER, op. cit., p. 4814 SCHERER, op. cit., p. 13

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institucional até o início do séc. XX, com a realização da primeira grande Conferencia

Missionária Mundial, em Edimburgo, Escócia, em 1910.

Scherer chama de “antiga era missionária” aquela que culminou com o “século das

missões” (XIX), período em que se verificou um grande desenvolvimento na missão cristã

em todo o mundo, e de “nova era missionária” aquela que existe desde então e está em

pleno desenvolvimento. Ao descrever a transição de uma “era” para a outra, Scherer cita

brevemente alguns dos muitos períodos missionários que ocuparam os dois últimos milênios

da história da igreja, passando inicialmente pela era dos primeiros apóstolos no séc. I, pelo

monasticismo da era medieval, pelas missões jesuíticas que atuaram junto aos colonizadores

do séc. XVI na conquista do Novo Mundo e pelos evangelicais das missões protestantes do

sec. XVIII, adentrando à era missiológica do séc. XIX, “o século das missões” que

produziu um dos movimentos missionários mundiais mais intensos de toda a história. 15

Este movimento missionário mundial comprometeu-se com a evangelização global e com o

objetivo de concluí-lo ainda em seus dias. Apesar deste audacioso resultado não ter sido

alcançado, ele produziu o maior número de frentes missionárias já registrado na história da

igreja e o evangelho avançou no mundo como jamais havia acontecido desde os dias de

Cristo. No entanto, após décadas de avanço missionário vigoroso e frutífero o papel das

missões mundiais havia se tornado inadequado, sendo considerado obsoleto e desnecessário

pelo emergente movimento ecumênico mundial. A partir de então, verifica-se o vertiginoso

declínio espiritual da igreja ocidental e suas instituições em termos de missão. O movimento

ecumênico mundial se estabelece e interpreta que uma nova era missionária é necessária. 16

Antes do “século das missões”, descreve Scherer, a Rússia ainda era o maior país cristão da

Europa, os Estados Unidos da América ainda seriam evangelizados, a Europa estava em

franco processo de secularização e o Marxismo difundia o ateísmo pelo mundo todo, mas

mesmo assim, sociedades missionárias já atuavam em muitos lugares do globo e, na reta

final do séc. XIX e limiar do séc. XX, o movimento missionário mundial eclodiu de um

modo excepcional. Sociedades bíblicas foram criadas para a tradução das Escrituras em

todas as línguas conhecidas, protestantes e católicos dos Estados Unidos e da Europa

operavam juntos na missão com o firme propósito de cumprir a tarefa global de

evangelização.17

15 SCHERER, op. cit., p. 09, 1016 SCHERER, op. cit., p. 10, 1117 SCHERER, op. cit., p. 13

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A teoria de missão protestante do séc. XIX havia determinado metas para as novas

comunidades cristãs e jovens igrejas que iam surgindo. A “ tripla autonomia” era a teoria de

missão que estabelecia que as novas igrejas deveriam se tornar “auto-governadoras”,

“auto-sustentadoras” e “auto-propagadoras”. Este seria o perfil da igreja ideal do mundo

cristão que criaria o palco para a existência do movimento ecumênico mundial do séc. XX,

“o grande fato novo de nossa época”, segundo William Temple.18 19

Neste ponto faz-se necessário compreender as razões que levaram a esta dinâmica

missionária repentina e inesperada no séc. XIX. De acordo com Scherer muitos estudos

foram realizados para chegar a um consenso sobre a interpretação deste fenômeno e, como

resultado, muitos estudiosos concluíram que não fora outra coisa senão a atuação

sobrenatural do Espírito Santo de Deus. Scherer não discorda, mas completa, afirmando que

o Espírito Santo não operou isoladamente, mas considerou a estrutura das “ poderosas forças

políticas então atuantes” e os “desenvolvimentos técnicos acontecidos no final do sec.

XIX”.20

Aliado a estes dois fatos históricos do séc. XIX, combinam-se ainda outros fatores tais

como as estruturas favoráveis do “imperialismo americano” e do “colonialismo europeu”

nas quais jovens estudantes universitários cristãos norte-americanos e europeus confiaram

suas vidas e ministérios sob a orientação de líderes como Dwight L. Moody 21, A. T.

18 William Temple (1881, Exeter, Reino Unido - 1944), arcebispo de Canterbury, estadista ecumênico, defensor de missões. Temple se graduou, lecionou e foi ordenado em Oxford. Bispo de Manchester, em 1921, arcebispo de York, em 1929, e arcebispo de Canterbury, em 1942. Líder do Movimento Cristão Estudantil, serviu em 1910 na Conferência Missionária Mundial de Edimburgo. Destaque no movimento missionário mundial, na reunião de Jerusalém do CoMIn, em 1928. Leu a declaração da Conferência de Fé e Ordem de Lausanne, em 1927. Em 1938 foi eleito presidente da comissão provisória do Conselho Mundial de Igrejas. Falou da "irmandade mundial de cristãos", resultante do empreendimento missionário, como "o grande fato novo de nossa era" em Canterbury, 1942. Morreu dois anos mais tarde. Considerado um dos maiores defensores da missão e da unidade cristã do século XX. (Dicionário Biográfico de missões cristãs, New York: Macmillan, 1998, p. 661-662)19 SCHERER, op. cit., p. 1120 Idem21 Dwight Lyman Moody (1837, Northfield, Massachusetts - 1899), evangelista americano, converteu-se sob a influência de seu professor de escola dominical e uniu-se a uma igreja Congregacional.  Em 1856, em Chicago, envolveu-se em uma variedade de atividades evangelísticas. Começou uma escola dominical em 1858 e serviu como evangelista na Comissão Cristã Norte americana durante a Guerra Civil. A conferência da YMCA (Associação Cristã de Moços) para estudantes universitários em Northfield, em 1886, levou à formação do Movimento Estudantil Voluntário para as Missões Exteriores (SVM), que adotou o lema "a evangelização do mundo nesta geração". Em 1889 Moody ajudou na fundação de um instituto bíblico em Chicago para treinar evangelistas urbanos e missionários estrangeiros. Esta escola, rebatizada de Instituto Bíblico Moody, tem treinado mais missionários do que qualquer outra instituição nos Estados Unidos até os dias atuais. (Dicionário Biográfico de missões cristãs, ed. Gerald H. Anderson, New York: Macmillan, 1998, p. 470-471)

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Pierson22 e John R. Mott, todos sob o lema “A evangelização do mundo nesta geração” 23.

Significativo nestes movimentos é sua relação com a natureza da teologia de missão que

viria a ser conhecida como Missio Dei em meados do séc. XX, pois estes não eram

movimentos eclesiocêntricos, ou que estavam sendo criados ou controlados pelas igrejas

cristãs de então, mas eram movimentos totalmente impulsionados e dirigidos pela

voluntariedade e espontaneidade dos seus participantes.24

Movidos por grande entusiasmo missionário, muitos destes participantes, que em sua

maioria eram estudantes, tornaram-se mártires nos tempos iniciais destes movimentos,

acreditando que o mundo inteiro seria alcançado através da evangelização durante o tempo

de suas vidas, o que obviamente não aconteceu. No entanto, com o objetivo de organizar

esforços missionários para completar a “tarefa inconclusa”, tarefa inspirada principalmente

no texto bíblico de Mt 28.16-20, realizou-se a Conferência Missionária Mundial de

Edimburgo, Escócia, em 1910 com o propósito de “delinear a estratégia para uma

campanha final por parte das forças concertadas do reino de Deus”, pois todos

concordavam que a “Grande Comissão”25 precisava ser cumprida durante o tempo de suas

vidas. Edimburgo concentrou-se nos continentes não cristãos (Ásia e África) que receberiam

a mensagem de países cristãos (Europa, EUA). Mesmo sem a inclusão direta da América

Latina, Edimburgo demonstrou uma unidade de espírito, propósito e compromisso tão

intensa que nenhuma declaração teológica formal foi emitida como resultado deste

encontro.26

Com a responsabilidade de gerenciar e garantir a continuidade dos resultados de

Edimburgo, e desta forma “promover a proclamação do evangelho de Jesus Cristo ao

mundo todo, a fim de que todos os homens creiam nele e sejam salvos”, em 1921 foi

constituído o Conselho Missionário Internacional (CoMIn) com a responsabilidade principal 22 Arthur Tappan Pierson (1837 - 1911), teórico e promotor da missão, catalisou o movimento americano missionário evangélico no final do século XIX. Tornou-se pastor em 1869 no Fort Street Presbyterian, em Detroit. Em 1876, realizou trabalhos na casa de ópera local, resultando em um avivamento. Em 1883 tornou-se pastor da Igreja Presbiteriana de Filadélfia, uma igreja que investiu na missão entre os pobres urbanos. Desenvolveu uma escola de treinamento missionário e ganhou reputação nacional como promotor de missões. Em 1885, exortou as igrejas protestantes a lançar uma campanha missionária em todo o mundo. Pierson falou sobre as missões a um grupo de colegiais da YMCA (Associação Cristã de Moços) em uma conferência em 1886. Como resultado, 100 jovens se ofereceram para ser missionários estrangeiros no Movimento Estudantil Voluntário para as Missões Exteriores (SVM) sob o lema de Pierson "a evangelização do mundo nesta geração" (Dicionário Biográfico de missões cristãs, ed. Gerald H. Anderson, New York: Macmillan, 1998, p. 536)23 SCHERER, op. cit., p. 11, 1224 SCHERER, op. cit., p. 1225 A Grande Comissão, na tradição cristã, é a instrução dada pelo Jesus ressuscitado aos seus discípulos para que eles espalhassem seus ensinamentos para todas as nações do mundo. Ela se tornou um ponto chave da  teologia cristã sobre o trabalho missionário, o evangelismo e o batismo.26 SCHERER, op. cit., p. 14

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de convocar uma conferência missionária mundial. Esta responsabilidade lhe rendeu uma

influência duradoura sobre o movimento missionário mundial e, assim, o CoMIn tornou-se

o mais respeitável conselho ecumênico para cooperação e consulta missionária, ajudando a

organizar importantes conferências missionárias mundiais como em Jerusalém (1928), em

Tambaram-Madras (1938)27, em Whitby (1947), em Willingen (1952), em Gana (1958) e

Nova Délhi (1961).28

Juntamente com o desenvolvimento industrial urbano, com o avanço da ciência a da

tecnologia e do constante processo de secularização observado em meados do séc. XX,

observou-se também o declínio espiritual da comunidade cristã, abatida e desarticulada pela

desintegração da antiga era missionária. Tanto a missão como a evangelização tornaram-se

desprovidas de clareza, objetivo e propósito e já não havia mais motivação definida para dar

testemunho de Cristo e do reino de Deus. A “tarefa inconclusa” que impulsionava ações

missionárias em todo o globo já não era sequer reconhecida pela cristandade. Em meio à

obscuridade, uma nova era de missão era necessária. A “teologia de missão” ciência tão

desprezada antes de 1950, tornava-se agora fundamental para teólogos sistemáticos e

praticantes da missão global.29

No início dos anos 1950, o Conselho Nacional de Igrejas de Cristo dos Estados Unidos

(CNI)30 produziu para o Conselho Missionário Internacional um relatório intitulado “Por

que Missão?”, como parte da preparação para a Conferência Mundial de Missão, em

Willingen, Alemanha, em 1952, cujo tema era “A Obrigação Missionária da Igreja”.

Apesar de contar com a contribuição dos maiores teólogos da época, a Conferência de

Willingen não foi capaz de chegar a um termo consensual sobre o tema proposto. No

entanto, moveu-se proficuamente no sentido de estabelecer uma base sólida para a missão e

o fez sobre a Doutrina da Trindade31 em conexão com a Missio Dei, tema emergente na

época. Os esforços empreendidos em Willingen somados à próxima Conferência Mundial

27 SCHERER, op. cit., p. 1528 NETO, Luiz L. O Novo Rosto da Missão: Os movimentos ecumênico e evangelical no protestantismo latino-americano. Viçosa: Ultimato, 2002, 303 p., p. 46, 7029 SCHERER, op. cit., p. 17-3030 O Conselho Nacional de Igrejas de Cristo nos EUA (CNI) é uma associação com 100.000 congregações locais e 45.000.000 de aderentes. As denominações de seus membros incluem uma grande variedade das principais igrejas protestantes, Ortodoxas, Áfrico-Americanas, Evangélicas e igrejas históricas. O CNI tem sido visto como líder no movimento cristão ecumênico nos EUA. É relacionado fraternalmente a centenas de conselhos locais e estaduais de igrejas, organizações e ao Conselho Mundial de Igrejas. 31 A Trindade é a doutrina acolhida pela maioria das Igrejas cristãs que professa a Deus único preconizado em três pessoas distintas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Para os seus defensores, é um dos dogmas centrais da fé cristã, e considerado um mistério.

Page 19: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

de Missão, em Gana, (1958) e aos do Conselho Mundial de Igrejas na Assembleia de Nova

Délhi (1961) ainda refletiriam nos dias atuais.32

Em escala mundial, tanto Edimburgo quanto o Conselho Missionário Internacional foram

responsáveis por estimular a formação de uma rede de cooperação mútua entre diversas

organizações missionárias. Esta rede viria a favorecer as bases do movimento missionário

ecumênico mundial. No entanto, a partir do início do processo de descolonização dos países

do terceiro mundo, a partir de 1945, a estrutura segura que o “colonialismo europeu” havia

oferecido aos jovens estudantes em suas ações missionárias pelo mundo deixou de existir e,

a partir de então, observou-se a desintegração da “antiga era missionária”. Assim, a

sintonia entre a “política imperial e os interesses do reino de Deus”, ou o elo entre “César

e Cristo”, do qual falou Scherer, entrou em colapso e desmantelou-se.33

32 SCHERER, op. cit., p. 3133 SCHERER, op. cit., p. 18,19

Page 20: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

CAPÍTULO 2

ECUMENISMO, EVANGELICALISMO E MISSIO DEI

1. Eventos e movimentos a serviço da Missio Dei

Na Conferência Missionária Mundial em Nova Délhi (1961), o Conselho Missionário

Internacional (CoMIn) foi incorporado ao Conselho Mundial de Igrejas (CMI). Nesta

ocasião foi criada uma Divisão do CMI que veio a se chamar Comissão de Missão e

Evangelismo, a qual realizou as Conferências Mundiais de Missão e Evangelização no

México (1963), em Bangcoc (1972), Melbourne (1980), San Antonio (1989) e Salvador

(1996). Em solo latino-americano realizaram-se congressos sobre o trabalho cristão na

América Latina e diversas conferências evangélicas e institucionais34.

O primeiro dos congressos aconteceu no Panamá (1916) como forma de reação à

Conferência Ecumênica de Edimburgo (1910), reafirmando a América Latina como campo

de missão. Depois, vieram os congressos de Montevidéu (1925) e Havana (1929). As

Conferências Evangélicas Latino-americanas (CELA) realizadas foram as de Buenos Aires,

Argentina (1949) (CELA I), a de Lima, Peru (1961) (CELA II) e novamente Buenos Aires

(1969) (CELA III). Outras conferências só foram realizadas pela iniciativa ecumênica

institucional do Isal35 no Peru (1961), Rio de Janeiro (1963) e El Tabo (1966). O Clai36

34 NETO, 2002, p. 46, 7035 O Movimento Igreja e Sociedade na América Latina (ISAL) foi criado em 1961 e pretendia ampliar a experiência do Brasil para a América Latina, reunindo teólogos e sociólogos cristãos de diversas igrejas. Buscando superar uma visão reformista das questões de desenvolvimento e dependência. O ISAL abriu um diálogo com o pensamento revolucionário que amadurecia no continente e lançou as sementes para o que depois veio a ser conhecido como “Teologia da Libertação”. (Bittencourt, 1988). 36 O Conselho Latino Americano de Igrejas (CLAI) é uma organização de Igrejas e entidades ecumênicas da América Latina e do Caribe cuja finalidade é promover a unidade entre o povo cristão do continente, preservando as identidades

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também realizou conferências em Oaxtepec (1978), Lima (1982), Indaiatuba (1988),

Concepción (1995), e Barranquilla (2001)37. Não houve mais realizações de CELA porque a

iniciativa ecumênica considerou-as demasiadamente comprometidas por correntes

teológicas europeias e norte-americanas.

No Brasil, realizou-se conferências pela Confederação Evangélica do Brasil 38 (CEB) sobre a

“Responsabilidade Social da Igreja” (1955), “A Igreja e as rápidas transformações sociais

do Brasil” (1957) e “Cristo e o processo revolucionário brasileiro” (Conferência do

Nordeste – 1962), além da 1ª Jornada Ecumênica (1994) e a 2ª Jornada Ecumênica (2002).

Desde a incorporação do Conselho Missionário Internacional (CoMIn) ao Conselho

Mundial de Igrejas (CMI), a iniciativa evangelical começou a articular na América Latina

esforços para a cooperação entre as igrejas rumo à construção de uma nova proposta de

missão e trabalho como forma de reação, desafio e até mesmo condenação à Assembleia

sobre Igreja e Sociedade realizada pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI), em 1966, em

Genebra, Suíça. Em razão dos evangelicais não se sentirem representados nas propostas da

iniciativa ecumênica39, “os congressos organizados por evangélicos conservadores fizeram-

se como uma estratégia de luta contra o movimento ecumênico internacional e o latino

americano, em particular”40.

Faz-se necessário considerar neste ponto a relevância da perspectiva teológica da Missio

Dei, entendida neste trabalho de conclusão de curso como uma teologia de missão para o

séc. XXI, cuja natureza revela Deus como aquele que ama o mundo, como aquele que se

envolve no e com o mundo e a Igreja, compreendendo ambos em sua Missio. Desta Missio a

Igreja tem o privilégio de participar, enunciando a boa nova de que Deus é um Deus para as

pessoas e pelas pessoas.41 Nesse sentido a Missio Dei é maior que a missão da Igreja42, seja

ela latino-americana, norte-americana ou europeia e, somente por este motivo, tanto o

movimento missionário ecumênico, quanto o evangelical deveriam ter permanecido desde o

início até agora sob a mesma unidade de propósitos, sob a mesma missão, sob a Missio

Dei.43 44

de cada tradição. (www.claibrasil.org.br)37 NETO, 2002, p. 46, 7038 A Confederação Evangélica do Brasil (CEB) foi uma entidade representativa do Protestantismo brasileiro, fundada em 1934, já extinta.39 NETO, 2002, p. 152, 15440 NETO, 2002, p. 15441 BOSCH, 2009, p. 28.42 BOSCH, 2009, p. 469.43 BOSCH, 2009, p. 55444 ZWETSCH, 2005, p. 170.

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Page 22: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

Ainda que importantes espaços de diálogo tenham sido construídos e importantes

convergências teológicas tenham acontecido ao longo do tempo45, é sob este espírito de

“luta contra o movimento ecumênico internacional e latino-americano, em particular” que

foram realizados todos os Congressos Latino Americanos de Evangelização (Clade). Desse

modo, fez-se realizar a Consulta Latino-Americana sobre Evangelização (Clase), em 1962;

o Clade I, em Bogotá, na Colômbia (1969); em 1970 foi constituída a Fraternidade de

Teólogos Latino-americanos (FTL); o Clade II, em Lima, no Peru (1979); o Clade III, em

Quito, Equador (1992); o Clade IV novamente em Quito, Equador (2000) e o Clade V, em

São Jose, na Costa Rica (2012).

Assim também foram realizados o Congresso sobre Missão Mundial, em Wheaton (1966),

Congresso Mundial de Evangelização, em Berlim (1966), Congresso Internacional de

Evangelização Mundial, em Lausanne (1974), Consulta sobre Evangelização Mundial, em

Pattaya (1980), Conferência Internacional sobre Natureza e Missão da Igreja, em Wheaton

(1983), Conferência Internacional de Evangelistas Itinerantes, em Amsterdã (1983) e

Congresso Internacional de Evangelização Mundial, em Manilla (1989). Realizou-se

também, no Brasil, o Congresso Brasileiro de Evangelização (1983) e o Congresso

Nordestino de Evangelização (1988).

Faz-se necessário destacar aqui o fato de que todas estas conferências, concílios, consultas,

congressos, reuniões, por fim todos os esforços realizados desde os primeiros anos da

década de 1920 até os dias atuais, tanto pela iniciativa missionária ecumênica, quanto pela

evangelical, tendo como justificativa a busca pela “unidade cristã”, seja para criar “uma

campanha final por parte das forças concertadas do reino de Deus”, ou para “promover a

proclamação do evangelho de Jesus Cristo ao mundo todo”, todas elas “só fazem sentido se

servem à Missio Dei”46.

45 De acordo Roberto Zwetsch, 2008. p. 91 “A teologia da missio Dei tem despertado renovado interesse entre evangélicos do Movimento de Lausanne, ainda que sua compreensão seja diferenciada em relação ao âmbito ecumênico” (Cf. Cf. ARAGÃO, Jarbas Luiz Lopes. Missio Dei: A trindade em missão. Dissertação de mestrado. Orientador: Ms. Roberto E. Zwetsch. Viçosa: CEM, 2004. Cf. Também DEIROS, 1992.)46 BOSCH, 2009, p. 554

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Page 23: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

2. Igreja e Missio Dei

De acordo com Engelsviken47, o desenvolvimento da missiologia48 durante a segunda

metade do séc. XX ocorreu de forma dramática, especialmente a partir da Conferência

Mundial de Missão, em Willingen, na Alemanha, realizada pelo Conselho Missionário

Internacional (CoMIn), em 1952, em que o conceito de Missio Dei foi claramente ancorado

na doutrina da Trindade. Engelsviken destaca que durante a década de 1960 e início dos

anos 1970 percebeu-se uma mudança radical na tradicional compreensão de missão do séc.

XIX, em que a perspectiva missiológica passou de uma tendência antropocêntrica 49 e

eclesiocêntrica50 para uma perspectiva mais teocêntrica51 e cosmocêntrica52, a partir da qual

a preocupação com questões sociais, políticas e religiosas passou a estabelecer novas

tendências.53

Desde o final da Segunda Guerra Mundial, em 1948, o pensamento missionário mundial foi

capaz de identificar pelo menos três estágios de desenvolvimento ecumênico que surgiram

em resposta à deficiência missionária registrada na primeira metade do séc. XX. Entre 1948

e 1961 a Igreja foi considerada como agente da Missio Dei, uma nova teologia de missão

que ganhou cada vez mais espaço no mundo ecumênico. Entre 1961 e 1975 a Igreja é

deslocada do centro para a periferia da Missio Dei que restabelece o campo missionário

mundial como centro das atenções. O período de 1975 até os dias atuais tem sido marcado

pelo esforço de devolver à Igreja o lugar central da ação missionária, em que a cristologia,

revalorizada pela missão ecumênica, assume uma função mais próxima ao centro. 54

47 Tormod Engelsviken é professor de missiologia na Lutheran School of Theology, Oslo Noruega, e professor da Escola de Jornalismo e Comunicação Gimlekollen, Kristiansand. Ele também é membro do Conselho Mundial de Igrejas e da Comissão Mundial sobre Missão e Evangelização.48 Missiologia (lat. missio "envio"; gr. logia "estudo") ou Teologia de Missão é um ramo da Teologia que estuda as missões. No Cristianismo, a Missiologia é uma subdisciplina da Teologia pastoral e surgiu no protestantismo do século XIX. 49 Antropocentrismo (do grego άνθρωπος, anthropos, "humano"; e κέντρον, kentron, "centro") é uma concepção que considera que a humanidade deve permanecer no centro do entendimento dos humanos. O antropocentrismo coloca o homem no centro do universo, postulando que tudo o que existe foi concebido e desenvolvido para a satisfação humana.50 Eclesiocentrismo (do grego Εκκλησία; ekklesia e κέντρον, kentron, "centro"), no catolicismo, se funda na ideia de que fora da Igreja Católica não pode haver salvação. No protestantismo, o eclesiocentrismo inclina-se sobre a pessoa de Jesus Cristo como forma de se expressar a ideia de que fora de Cristo não há salvação. O eclesiocentrismo católico foi definido pelos Concílios de Latrão (1215) e de Florença (1442) e o eclesiocentrismo protestante a partir da Reforma Protestante (1516)51 Teocentrismo (do grego θεóς, theos, "Deus"; e κέντρον, kentron, "centro") é a doutrina que considera Deus o fundamento de toda a ordem no mundo. O significado e o valor das ações feitas às pessoas ou ao ambiente são atribuídos a Deus. 52 Cosmocentrismo (do grego "κόσμος" e κέντρον, kentron, "centro"), em seu sentido mais geral, um cosmos é um sistema ordenado ou harmonioso que significa ordem ou ornamentos e é a antítese do caos. 53 ENGELSVIKEN, T. Missio Dei: a compreensão e a incompreensão do conceito teológico em igrejas europeias e Missiologia. (2003), International Review of Mission, 92: 481-497. 54 SCHERER, op. cit., p. 71, 72

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Este retorno ao eclesiocentrismo no contexto da Missio Dei já recebia fortes críticas desde

Willingen que, do ponto de vista de Scherer e outros teólogos, também não foi capaz de

desempenhar a tarefa de “reformular a base teórica de missão” assim como havia proposto,

pois continuar colocando a igreja como ponto de partida da missão ou fazer com que a

igreja seja o objetivo da missão, constitui um esforço ilegítimo na Missio Dei que leva à

degradação da evangelização, transformando a missão em um mero processo de

implantação de igrejas e de difusão de propaganda institucional em torno de interesses e

exigências institucionais e denominacionais.55 Assim, Bosch descreve sua percepção sobre

eclesiocentrismo na Missio Dei:

Não é possível negar que a noção de Missio Dei tenha ajudado a articular a convicção de que nem a Igreja nem qualquer outro agente humano pode, alguma vez, ser considerado o autor ou o portador da missão. Ela é, primordialmente e em última análise, a obra do Deus Triúno, Criador, Redentor e Santificador por amor ao mundo, um ministério do qual a Igreja tem o privilégio de participar. A missão possui sua origem no coração de Deus. Deus é uma fonte de amor que envia. Esse é o manancial mais profundo da missão. É impossível penetrar mais fundo; existe missão porque Deus ama as pessoas. Reconhecer que a missão é de Deus representa um avanço crucial em relação aos séculos precedentes. É inconcebível que pudéssemos voltar de novo a uma concepção estreita e eclesiocêntrica de missão.56

Se há um lugar para a igreja “ser” ou “acontecer” na Missio Dei, este lugar deve ser

entendido em termos de sua função apostólica dentro da lógica missionária: Reino →

Evangelho → Apostolado → Mundo. A igreja deve assumir sua natureza apostólica como

proclamadora do evangelho e emissora dos sinais do reino de Deus e abandonar qualquer

pretensão de ser uma instituição permanente.57 Um dos principais problemas em se resgatar

o sentido pleno da Missio Dei é vencer esta tendência de identificá-la com o trabalho da

igreja em geral.

O termo “missão” quase sempre é cooptado para dar sentido e significado a ministérios e

atividades da igreja sem, no entanto, tornar plausível e mensurável o fato de que a missão

ocorre quando o evangelho da salvação em Jesus Cristo é testemunhado na linha divisória

entre fé e descrença, quando “a Igreja sai de si, indo além de sua vida interior, e

testemunha o evangelho no mundo”. Tal compreensão sobre o que é missão deve permear a

cristandade e estar muito bem clara e definida, pois “quando tudo é missão, nada é

missão”58. Deste entendimento alcança-se a garantia de que a missão não vá ser absorvida

55 SCHERER, op. cit., p. 73, 7456 BOSCH, 2009, p. 470.57 SCHERER, op. cit., p. 73, 7458 Frase tradicionalmente atribuída a Stephen Charles Neill (1900- Edimburgo, Escócia - 1984), missionário na Índia, ordenado diácono na Catedral de Tinnevelly, 1927, sacerdote, 1928, bispo em Tinnevelly 1939, trabalhou para o Conselho Mundial de Igrejas (1947-1954), professor de missão na Universidade de Hamburgo (1962-1967), professor

Page 25: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

ou deturpada por interesses que visam apenas atender às exigências institucionais ou

denominacionais.59

3. Missio Dei: A trajetória de um conceito

Seis anos após a Missio Dei ter sido reconhecida na teologia de missão e também “por todas

as ramificações cristãs”60 como resultado da Conferência Mundial de Missão, em

Willingen, Alemanha, o missiólogo luterano Georg F. Vicedom61 (1903-1974) lançou o

livro Missio Dei, um trabalho originalmente editado em Munique, no ano de 1958, oferecido

como uma introdução a uma teologia de missão. Quase quatro décadas após seu lançamento

na Alemanha, o livro chega ao Brasil (1996), mais de uma década após o final do Regime

Militar, com o título “A Missão como Obra de Deus: introdução a uma teologia de missão”,

trazendo em seu escopo o significado e a razão de ser desta teologia, isto é, Deus como

única e suficiente fonte e autoridade na missão.

Como camponês, filho de camponeses, trabalhador da roça e empreendedor da agricultura

familiar, Vicedom tinha sensibilidade às agruras do campo e às necessidades dos povos da

terra. Foi enviado como missionário aos papuanos na Nova Guiné, onde permaneceu por

dez anos, criou dois postos missionários e produziu uma importante obra etnológica. 62 63 Foi

após 1946, tendo servido na Segunda Guerra Mundial, que passou a lecionar no seminário

em que se formou, tornando-se o primeiro catedrático de missiologia e docente da

universidade da Baviera, na Alemanha. Cooperou com muitos grupos de trabalho,

congressos, assembleias e sínodos, tanto no âmbito da comunidade luterana internacional

de filosofia e estudos religiosos em Nairóbi (1969-1973), pioneiro em educação teológica vernáculo na Índia e na África, pregador inspirador e escritor, considerado um pastor profundamente espiritual. (Dicionário Biográfico de missões cristãs, ed. Gerald H. Anderson, New York: Macmillan, 1998, p. 488)59 SCHERER, op. cit., p. 3060 BOSCH, 2009, p. 46861

Georg Friedrich Vicedom (1903, Baviera, Alemanha - 1974), missiólogo alemão protestante, nasceu em uma família de agricultores, treinado no Seminário de Neuendettelsau, preparação etnológica na Universidade de Hamburgo, serviço missionário pioneiro na Nova Guiné (1929), missiologia centrada no fundamento bíblico de missões, bibliografia com mais de 400 títulos, Exerceu uma profunda influência sobre o luteranismo e Movimento Ecumênico Mundial, sua herança missiológica será amplamente lembrado em conexão com o termo Missio Dei, que, embora não tenha sido inventado por ele, interpreta uma ênfase teocêntrica para a teologia da missão. (BIOGRAPHICAL DICTIONARY OF CHRISTIAN MISSIONS, New York: Macmillan, 1998, p. 701-702)62 Cf. VICEDOM, Georg F. O Mbowamb: A cultura das tribos Hagenberg no leste-central de Nova Guiné; vol. 1: Cultura Material, Hamburgo, 1943-1948, 264 p; vol. 2: Sociedade, Religião e Visão de Mundo, Hamburgo, 1943, 484 p; vol. 3: Mitos e Histórias, Hamburgo, 1943, 196 p.63 VICEDOM, Georg. A Missão como Obra de Deus: introdução à teologia de missão. São Leopoldo: Sinodal, 1996, 127 p., p. 7.

Page 26: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

quanto no Conselho Mundial de Igrejas64 (CMI). Entre centenas de obras teológicas

publicadas inclui-se “A justificação como força conformadora da missão” (1952) e “Missio

Dei” (1958), considerada neste trabalho de conclusão de curso.

Apesar de ter contribuído na formação de muitos alunos que atualmente compõe a liderança

da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), de ter estimulado a prática

comunitária e o zelo pelos povos indígenas brasileiros, a partir de uma perspectiva latino-

americana, Vicedom não ficou muito conhecido no novo mundo. Apesar disso, nenhuma

parte de seu trabalho pode ser desprezada enquanto Missio Dei for considerada uma teologia

de missão, pois são poucos os teólogos que abordaram o tema com a mesma profundidade e

abrangência de Vicedom.65 66

Karl Müller, teólogo católico, e Hans-Werner Gensichen67, missiólogo luterano, descrevem

em “Teologia da Missão: uma introdução” que a perspectiva de Vicedom sobre a Missio

Dei está em franca sintonia com a missão entre os povos não cristãos: “os pensamentos

desenvolvidos nos primeiros cinco capítulos de Ad Gentes correspondem no essencial às

colocações de Vicedom sobre a Missio Dei”68.

64 O Conselho Mundial de Igrejas (CMI) é a principal organização ecumênica em nível internacional, fundada em 1948, em Amsterdam, Holanda. Com sede em Genebra, Suíça, o CMI congrega mais de 340 Igrejas e denominações protestantes, ortodoxas, pentecostais e independentes que representam mais de 500 milhões de fiéis presentes em mais de 120 países. A Igreja Católica não tem nenhum vínculo e não faz parte desta organização, mas tem com ela um grupo de trabalho permanente e participa como membro pleno de alguns departamentos, como na Comissão de Fé e Ordem e na Comissão de Missão e Evangelismo.65 BOSCH, David J. Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, São Leopoldo: Sinodal, 2009, 690p., p. 389-393. 66 VICEDOM, 1996, p. 7.67 Hans-Werner Gensichen (1915, Lintorf, Alemanha - 1999), missiólogo alemão protestante de uma família de pastores e missionários, doutorado em história da igreja em Göttingen (1950), lecionou em faculdades teológicas em Tranquebar e Madras, cadeira da história das religiões e missiologia na Faculdade de Teologia da Universidade de Heidelberg (1957-1983), secretário do CMI (1961 -1964) para assuntos da África, promoveu formação teológica no continente Africano, atuou em vários conselhos de missiologia e ecumênicos, presidente da Sociedade Alemã de Missiologia (1965-1991), membro fundador e primeiro presidente da Associação Internacional de Estudos da Missão (1972-1974), acreditava que só na continuidade e diálogo com a história a igreja pode cumprir a sua missão no mundo e que a missão é a dimensão decisiva da vida da Igreja em todo o mundo.  (Biographical Dictionary of Christian Missions, New York: Macmillan, 1998, p. 238)68 MÜLLER, Karl. Teologia da Missão: uma introdução. Petrópolis: Vozes, 1995, 213p., p. 68.

Page 27: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

O Ad Gentes69 é o decreto conciliar da Igreja Católica que trata da atividade missionária da

Igreja cristã em sete capítulos produzidos pelo Concílio Vaticano II 70, em 196571, que define

a atividade missionária como “nada mais, nada menos, que a manifestação ou epifania do

plano divino e seu cumprimento no mundo e em sua história”72

Em seu livro Missio Dei, Vicedom aponta para as primeiras tentativas de fundamentar a

missão cristã a partir do leigo luterano Justinian von Welz73 (1621-1668) que contestou o

posicionamento da ortodoxia luterana74 que negava a validade atual da “Grande Comissão”

de Mateus 28.16-20. Vicedom legitima também as iniciativas do teólogo alemão Gustav

Warneck (1834-1910), a partir das quais a teologia de missão evangélica conhecida no

mundo moderno foi desenvolvida e sistematizada, levando às primeiras concepções sobre

Missio Dei na Igreja cristã75

De acordo com Bosch76, no entanto, “um dos primeiros expoentes daquilo que hoje se

conhece como Missio Dei” remonta ao séc. XVI na obra de Gisbertus Voetius77, “o

primeiro protestante a desenvolver uma ampla teologia de missão”, cujos pontos de vista

são por um lado “irremediavelmente obsoletos”, mas por outro “surpreendentemente 69 Ad Gentes “Para as Nações” é um Decreto Conciliar da Igreja Católica que trata da atividade Missionária da Igreja definida como "a evangelização e a implantação da Igreja entre os povos ou grupos entre os quais ainda não se enraizou, reconhecendo e reafirmando que a Igreja de Jesus Cristo tem uma natureza missionária (Mc 16.15). O documento é dividido em sete capítulos e foi promulgado pelo Papa Paulo VI em 07 de dezembro de 1965 no Concílio Vaticano II.70 O Concílio Vaticano II é o 21º Concílio Ecumênico realizado pela Igreja Católica. Foi convocado no dia  25 de dezembro de 1961, através da bula papal "Humanae salutis", pelo Papa João XXIII. O Concílio teve quatro sessões e só terminou no dia 8 de dezembro de 1965, já sob o papado de Paulo VI. Mais de dois mil prelados de todo o planeta discutiram e regulamentaram vários temas com o objetivo de atualizar a Igreja Católica. As suas decisões estão expressas em quatro constituições, nove decretos e três declarações elaboradas e aprovadas pelo Concílio.71 Müller, apud Vicedom, p. 772 BOSCH, 2009, p. 46873 Justinian Ernst Baron von Welz (1621, provavelmente em Styria - provavelmente em 1668 no Suriname) foi um advogado e teólogo luterano voltado para a missão mundial que lutou pelo envio de estudantes cristãos a pregar o Evangelho ao mundo não cristão, contribuindo para a formação das primeiras sociedades missionárias evangélicas. Morreu como missionário na América do Sul.74 As Igrejas luteranas ditas ortodoxas abraçam como confissão todos os textos contidos no Livro de Concórdia, enquanto as Igrejas luteranas não ortodoxas adotam somente a Confissão de Augsburgo e o Catecismo Menor de Martinho Lutero.75 VICEDOM, 1996, p. 13.76 David Jacobus Bosch (1929 - 1992) foi um influente missiólogo e teólogo membro da Igreja Reformada Holandesa na África do Sul, mais conhecido por seu livro Missão Transformadora: mudanças de paradigma na Teologia da Missão (1991), um grande trabalho em missiologia cristã pós-colonial.77

Gisbertus Voetius (1589, Heusden, Brabante do Norte, Países Baixos - 1676), teólogo reformado holandês, primeiro a escrever uma teologia abrangente da missão, estudou teologia em Leiden, ministro Reformado em Vlijmen e em Heusden (1610-1634), fundador da Universidade de Utrecht, discute teologia da missão em SELECTAE DISPUTATIONES THEOLOGICAE (5 vols., 1648-1669) e em POLITICA ECLESIÁSTICA (3 vols., 1663-1676). Missões são baseadas na vontade de Deus, não é direito do papa, de príncipes, de magistrados ou de instituições. MISSÃO OBJETIVA conversão dos não-crentes, hereges e cismáticos; o plantio, coleta, e estabelecendo igrejas; e a glorificação e manifestação da graça divina (tríplice objetivo). Igrejas de missão não devem subordinar-se às igrejas de envio (BIOGRAPHICAL DICTIONARY OF CHRISTIAN MISSIONS, New York: Macmillan, 1998, p. 708)

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modernos”, principalmente no que tange à “sua formulação do tríplice objetivo da missão”

descrito com o objetivo imediato de alcançar a conversão dos gentios, seguido do objetivo

intermediário de implantar a Igreja, culminando com o objetivo supremo de manifestar a

graça e a glória de Deus. Até tempos modernos não foi possível encontrar formulação mais

adequada para se descrever Missio Dei.78

De acordo com Flett, o primeiro uso contemporâneo do termo Missio Dei é encontrado em

um artigo da Revista Evangélica de Missões, de 1934, intitulado "Wozu nötigt die

Finanzlage der Mission"79 ou “A atual situação Financeira da Missão” escrito pelo

missiólogo alemão Karl Hartenstein80 em resposta à reflexões do teólogo alemão Karl

Barth81, feitas em 1932, que apresentam também a missão como obra empreendida pelo

próprio Deus. Em sua abordagem, Hartenstein inaugura o uso do termo Missio Dei

declarando que “A Missão é hoje chamada a examinar-se em todos os sentidos, e sempre de

novo diante de Deus, para determinar se é o que deveria ser: missio Dei” 82

Apesar de não fazer qualquer referência a Vicedom em toda sua obra, senão para citar outro

autor, Bosch também descreve a evolução histórica do pensamento missionário na

perspectiva da Missio Dei como um esforço para se compreender a missão como uma obra

de Deus. Em uma breve retrospectiva histórica da Igreja, Bosch elenca algumas das diversas

maneiras pelas quais a missão foi entendida e descrita pela teologia cristã no decorrer dos

séculos.

A missão já foi considerada soteriologicamente como a tábua de salvação para os seres

humanos condenados ao inferno. Foi interpretada culturalmente como dádiva de Deus para

os povos estrangeiros que habitam “os confins da terra”, cujo centro sempre se localizou no

ocidente. Foi tomada eclesiologicamente como meio de expansão do reino de Deus e dos

domínios territoriais da Igreja. Foi reconhecida como um processo escatológico que culmina

com a destruição total da terra habitada para o surgimento de novos céus e uma nova Terra,

nos quais habita a justiça.83

78 JONGENEEL, apud BOSCH, 2009, p. 313, 314.79 Cf. Hartenstein, Karl. “Wozu nötigt die Finanzlage der Mission”. Evangelisches Missions-Magazin 79 (1934): 217-229, apud Flett, p. 131.80 Karl Hartenstein (1894, em Cannstatt - 1952, em Stuttgart) cunhou a concepção de missão evangélica no século XX. Inspetor da Missão da Basileia e membro do Conselho Missionário Internacional.81 Karl Barth (1886, Basileia, Suíça – 1968) foi um dos maiores teólogos cristãos protestantes do século XX e pastor da Igreja Reformada. Foi um dos principais líderes da teologia dialética e da neo-ortodoxia protestante.82 FLETT, John G. The Witness of God: the Trinity, Missio Dei, Karl Barth and the Nature of Christian Community. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2010. 272 p. [p. 131] 83 BOSCH, 2009, p. 466.

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Page 29: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

De acordo com Bosch, muitos missiólogos atentaram para mudanças que ocorriam na

teologia bíblica e sistemática como resultado da Primeira Guerra Mundial. Durante o

período entre guerras, Karl Barth (1932) se tornou um dos principais teólogos a desenvolver

a ideia de missão como uma atividade produzida pelo próprio Deus, rompendo com a

abordagem iluminista da teologia, e Karl Hartenstein fez o mesmo no ano seguinte (1933).

Em Hartenstein Missio Dei é “o envio de Deus, que é o envio de Cristo, o Senhor, que

ordena aos Apóstolos: "Como o Pai me enviou, também eu vos envio"84. Assim, Hartenstein

atribui a origem de toda obra missionária ao Filho, que é enviado pelo Pai e que envia seus

apóstolos a repassar a mensagem da salvação à “Igreja de todos os tempos” 85, cujo mandato

se encontra em textos bíblicos como o de Marcos 16.15 “Ide por todo o mundo, pregai o

evangelho a toda criatura”.86 A concepção missiológica de Hartenstein nasce da realidade

do Cristo ressuscitado87.

Apesar de Hartenstein ter sido o primeiro a cunhar o termo Missio Dei na primeira metade

do séc. XX, Flett demonstra que ele não o fez com base na doutrina da Trindade, mas com

base em sua compreensão do texto de João 20.21 “Assim como o Pai me enviou, Eu também

vos envio.”, divergindo significativamente da tradicional compreensão da Doutrina da

Trindade defendida por Agostinho88 a qual dezoito anos mais tarde nortearia o conceito de

Missio Dei na declaração final da Conferência Mundial de Missão (CoMIn), realizada pelo

Conselho Missionário Internacional, em Willingen, Alemanha, em 1952.

Bosch esclarece que é em Willingen que, pela primeira vez, a Missio Dei foi claramente

compreendida como obra derivada do Deus Triúno e não mais a partir da eclesiologia ou da

soteriologia como era comum na missiologia do séc. XIX. “De Trinitate”, o mais

importante tratado de Agostinho sobre a doutrina da Trindade foi retomado em Willingen e

se tornou a principal sustentação teórica da Missio Dei a partir da segunda metade do séc.

XX. Assim, a autoridade da Missio Dei foi reconhecida tanto na teologia de missão quanto

em diversas igrejas cristãs até os dias atuais.89

84 FLETT, op. cit., p. 13185 FLETT, op. cit., p. 13186 FLETT, op. cit., p. 13187 FLETT, op. cit., p. 13388 Agostinho, bispo de Hipona, conhecido universalmente como um dos mais importantes teólogos e filósofos dos primeiros anos do cristianismo cujas obras foram muito influentes no desenvolvimento do cristianismo e filosofia ocidental. 89 BOSCH, 2009, p. 263.

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É a partir dos resultados de Willingen, sob a forte crise que se estabelecia na missão e na

teologia alemã do pós-guerra, que “começou a engendrar-se um novo modelo de missão”90

com dois claros objetivos: “reformular o mandato missionário e revisar as políticas

tradicionais de missão”91 92. Este é o marco cronológico e referencial a partir do qual

Vicedom desenvolve a teologia da Missio Dei, tornando-se um de seus principais

articuladores.

A doutrina tradicional da Missio Dei era que o Pai envia seu Filho ao mundo e o Pai e o

Filho enviam o Espírito Santo. Depois de Willingen, o “Pai, Filho e Espírito Santo enviam

a Igreja para dentro do mundo”93. Mesmo com esta “inovação importante”94 Vicedom nos

descreve a animosidade que se estabelecia na missão e na teologia alemã, onde se difundia

“um subjetivismo tal que hoje ninguém mais sabe dizer em que consiste a fé dos cristãos, da

qual a Igreja vive. Por isso mesmo ela não pode ser transmitida a outros”95

Este diagnóstico de Vicedom foi realizado sob fortes ataques à missiologia alemã

provocados por sua paralisia e esterilidade diante da situação que se seguiu ao final da

Segunda Guerra Mundial, em 1945. Tal conjuntura levou Vicedom a considerar a

possibilidade de estabelecer um “confronto crítico” com os opositores, apontando para a

necessidade de se “[...] elaborar a auto compreensão da missão sem que nos percamos em

discussões sem fim” e “[...] construir uma nova fundamentação da missão”, estabelecendo

“[...] primeiro o que a Bíblia diz a respeito, para então fazer a comparação” com as

oposições, às quais classificou como “estímulos muito frutificantes”96. Eram os primeiros

sinais de um novo paradigma de missão no pós-guerra.

Esta crise na missão e na teologia vivenciada por Vicedom e expressa no livro “Missio Dei”

no final da década de cinquenta (1958) é captada também na tese do livro Missão

Transformadora de David J. Bosch no início da década de noventa (1991). Contemporâneo

a Vicedom, Bosch foi um teólogo da Igreja Reformada Holandesa 97 e atuava como professor 90 BOSCH, 2009, p. 444.91 VICEDOM, 1996, p. 15.92 SCHERER, op. cit., p. 73.93 BOSCH, 2009, p. 467.94 AAGAARD, apud BOSCH, 2009, p. 467.95 VICEDOM, 1996, p. 14.96 VICEDOM, 1996, p. 14.97 A Igreja Reformada Holandesa foi uma denominação cristã reformada que existiu entre 1570 e 2004, quando se fundiu com outras três Igrejas holandesas para formar a Igreja Protestante na Holanda. Foi uma das muitas Igrejas novas, criadas em toda Europa durante a Reforma Protestante, no século XVI. Enquanto a Igreja Reformada Holandesa foi baseada nos Países Baixos, outras Igrejas que exploraram os semelhantes pontos de vista teológicos foram fundadas também na França, Suíça, Alemanha, Hungria, Inglaterra e Escócia. A teologia e a prática da Igreja Reformada Holandesa, e suas Igrejas irmãs dos países mencionados, foram baseadas nos ensinamentos do reformador francês João Calvino e outros reformadores de outras épocas.

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Page 31: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

de missiologia na Universidade da África do Sul, desde 1971, após prestar serviço

missionário em Transkei98, entre 1957 e 1971.99

Em 1974, ano do falecimento de Vicedom, Bosch tornou-se decano na Faculdade de

Teologia, até 1977, depois entre 1981 e 1987. Foi Secretário Geral da Sociedade

Missiológica Sul-Africana a partir de 1968 e editor da revista Missionalia, a partir de 1973.

Foi Presidente Nacional da Assembleia de Liderança Cristã da África do Sul, em 1979, e da

Iniciativa Nacional pela Reconciliação em 1989, buscando a paz entre grupos raciais,

denominacionais e teológicos na África do Sul.100

As primeiras evidências de um novo paradigma de missão que emergia como resultado da

crise na missão e na teologia cristã no período que se seguiu à Segunda Guerra Mundial e

que foram vivenciadas por Vicedom são interpretadas posteriormente por Bosch não como

algo acerca do qual alguém pudesse esperar reversão ou retorno ao estado original, mas o

define como “resultado de uma fundamental mudança de paradigma, não apenas na missão

ou na teologia, mas na experiência e no pensamento do mundo inteiro” 101.

A percepção de Bosch nos anos noventa parece complementar aquela vivenciada por

Vicedom nos anos cinquenta. Ele se encontra em um momento histórico favorável à

atualização da percepção de Vicedom ao considerá-la junto com o fato de que o fenômeno

paradigmático102 havia também causado mudanças em escala mundial ao reconhecer que

“muitos de nós só estamos conscientes da crise com que nos defrontamos agora” , isto é, na

crise que tem produzido mudanças também “na experiência e no pensamento do mundo

inteiro”103.

Assim como Vicedom tinha poucas chances de prever nos anos cinquenta, com as mesmas

condições de Bosch nos anos noventa, as transformações paradigmáticas que o mundo

sofreria além daquelas que já decorriam na missão e na teologia alemã como resultado

incógnito deixado pela Segunda Guerra Mundial, assim também não poderia prever, com as

mesmas condições dos teólogos do séc. XXI, os desdobramentos decorrentes do

extraordinário processo de globalização mundial que afetaria também o universo das

religiões mundiais.98 Transkei é uma região criada pelo governo sul-africano durante o regime do apartheid para agrupar um grupo de sul-africanos falantes de isiXhosa, no nordeste da província do Cabo. 99 BOSCH, 2009, p. 9.100 BOSCH, 2009, p. 9.101 BOSCH, 2009, p. 20.102 Um fenômeno paradigmático é algo novo para qual os nossos conhecimentos anteriores não estão prontos para compreender.103 BOSCH, 2009, p. 20, 232, 353, 374, 389, 428, 452, 539, 599.

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Page 32: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

Em seus dias, Vicedom pôde compreender outras religiões apenas a partir das ligações que

estabeleciam com o que ele chamou de “outro reino”, ou de “reino do diabo”, um reino

coeso que “concentra em si todas as forças opostas a Deus” e à sua Missio. Este “outro

reino” milita contra a instauração do reino de Deus, o reino que visa a redenção do mundo,

o reino que é alvo de Deus para os seres humanos e objetivo final de sua Missio. Para

Vicedom, deixar de considerar a realidade deste “outro reino” é ser incapaz de atuar na

Missio Dei e, consequentemente, de fazer parte do reino de Deus.104

Neste aspecto, a Missio Dei, em Vicedom, recebeu fortes críticas e encontrou opositores em

praticamente todas as religiões do mundo, inclusive dentro do próprio cristianismo, que

foram se intensificando à medida que as transformações na vida econômica, social, política,

religiosa e “na experiência e no pensamento do mundo inteiro”105 surgiam, exigindo uma

nova conformação, inclusive por parte das demais religiões, e apontava para a necessidade

de aprofundamento do diálogo inter-religioso, tanto como meio de assegurar a continuidade

da paz entre as nações como de contribuir mutuamente na luta pela preservação dos recursos

naturais e do meio ambiente como um todo106.

Assim, Bosch chega à conclusão de que “mais do que em qualquer época anterior, sabemos

atualmente que vivemos em um planeta que fica cada vez menor e que só dispõe de recursos

finitos. Agora estamos conscientes de que as pessoas e seu meio ambiente são

interdependentes”107 Portanto, a Missio Dei em Vicedom requer contextualização do

aspecto inter-religioso para a realidade do séc. XXI, tanto para garantir que o conteúdo da

mensagem cristã e o testemunho cristão dos mensageiros seja eficazmente compartilhado

entre as nações e religiões mundiais, quanto para garantir a viabilidade do cristianismo e de

suas instituições na busca pela sustentabilidade planetária e pela preservação da paz

mundial.

A perspectiva ecumênica na teologia de missão de Vicedom é marcante. O campo

missionário de Deus é o mundo todo e, como Senhor de todo o mundo, ele fará uso de tudo

que nele há para cumprir sua determinação em salvar os povos que nele habitam. A Igreja é

incluída neste processo como convidada de honra à Missio Dei, sendo ela mesma evidência

e testemunha de sua salvação.

104 VICEDOM, 1996, p. 23-26.105 BOSCH, 2009, p. 20.106 BOSCH, 2009, p. 577-582.107 BOSCH, 2009, p. 236.

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Page 33: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

Bosch fala da ecumenicidade da Missio Dei, salientando o fato de que “todas as uniões de

Igrejas que vem acontecendo desde a década de 1920 e todos os “conselhos de Igrejas”

nacionais que se formaram durante, mais ou menos, o último meio século só fazem sentido

se servem à Missio Dei”108

Para Bosch, tal ecumenicidade não é uma derivação da conformação a uma nova situação

mundial, mas é “dádiva divina de unidade no corpo uno de Cristo”. Para Bosch não é

aceitável, e até mesmo anômalo, referir-se à “unidade das Igrejas”, pois só pode existir

“unidade da Igreja” desenvolvida no sentido de preservar toda a diversidade existente, cujo

centro é sempre Jesus Cristo109.

Em Vicedom, a Missio Dei não é algo que é dado à Igreja como missão a ser realizada por

ela, mas uma tarefa que permanece nas mãos de Deus, operacionalizada única e

exclusivamente por ele, por meio dele e para ele. De acordo com Vicedom “Todo serviço da

Igreja só tem sentido se levar à missão e nisso encontrar seu objetivo último” sem “tornar-

se o ponto de partida da missão, seu objetivo, seu sujeito”. Na Missio Dei a “Igreja é

apenas um instrumento na mão de Deus” e, de igual modo, a missão110.

Em Vicedom, a participação na Missio Dei é dádiva concedida a todo aquele que crê.

Assim, ela acontece todo o tempo em todos os lugares. Seus participantes são pessoas cujos

pecados foram perdoados, pessoas que entraram na vivência da graça através da fé, não

importando a que povo pertençam, ou o lugar onde se encontrem, nem quais sejam suas

ocupações, dons, talentos, capacidades ou incapacidades. Na Missio Dei ordens não são

emitidas nem regras são ditadas (cf. Mt 28.16-20). Somente a graça de Deus é o bastante

para conduzir os participantes através de sua Missio (II Co 12.9)111.

Em Vicedom, Missio Dei é obra de Deus, executada por Jesus Cristo e difundida pelo

Espírito Santo que, por sua vez, chama e congrega o povo de Deus de todos os cantos e

religiões do mundo para dentro do seu reino para, outra vez, enviá-lo na condição de

mensageiros. Deus opera sem descanso de muitas e diferentes maneiras em meio aos povos

e religiões de todo o mundo a fim de salvá-los. À sua Igreja concede participação neste

processo de salvação a fim de que, junto com Ele, transmita os mesmos sinais da sua graça,

amor e misericórdia.

108 BOSCH, 2009, p. 554.109 BOSCH, 2009, p. 554, 555. 110 VICEDOM, 1996, p. 15.111 VICEDOM, 1996, p. 10, 16, 63.

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Page 34: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

Para Vicedom o Evangelho de Jesus Cristo não está limitado apenas à ação evangelizadora

da Igreja. Seu alcance perpassa civilizações e culturas, etnias e nações de muitas e variadas

formas, espalha a santidade bíblica, fertiliza a vida e dá vigor às mais diversas formas de

expressão cultural em todos os lugares da terra. A Igreja trabalha e descansa, mas o Deus

Triúno está sempre em missão. Acima de toda e qualquer particularidade, Vicedom declara

universal o alcance e a autonomia da Missio Dei.112

Bosch, no entanto, parece distanciar-se significativamente de Vicedom quanto à

compreensão sobre a soberania da Missio Dei quando atribui aos seres humanos a

possibilidade de serem tentados a “enclausurar a Missio Dei nos estreitos caminhos de

nossas predileções”113.

Vicedom sequer contempla tal possibilidade, mas descreve a Missio Dei como expressão do

governo de Deus, em que ele é o enviador, o enviado e o determinador do conteúdo e

sentido do trabalho da Igreja e da missão. Na compreensão de Vicedom qualquer tentativa

de se “enclausurar a Missio Dei” necessariamente representa uma restrição ao agir de Deus

para o serviço e salvação o que para ele implica tão somente em prejuízo para o

desenvolvimento missionário114.

Em Vicedom, Missio Dei está sempre alicerçada sobre a doutrina da Trindade, considerada

originalmente por Agostinho. Segue, portanto, que o Pai envia seu Filho ao mundo e o Pai e

o Filho enviam o Espírito Santo. Em Vicedom o Deus Triúno envia sua Igreja ao mundo

como testemunho vivo e incontestável de sua salvação. A Igreja é desenvolvimento de

Deus, assim como também o é sua missão salvadora. Neste processo, nem a influência da

religião nem a influência dos opositores da religião interferem. A Missão é de Deus. Ele é

soberano sobre tudo e sobre todos e onipotente na decisão de enviar a si mesmo como obra

salvadora do mundo.

Neste processo de envio de si mesmo ao mundo, Deus necessariamente provoca mudanças e

alterações no status quo social, político, econômico e religioso, naturalmente envolto em

iniquidades (Rm 12.1,2). Por causa disso, Vicedom não concorda com movimentos como o

Evangelho Social115 que parece tomar para si esta missão de transformar o mundo, pois para 112 VICEDOM, 1996, p. 10, 11, 16.113 BOSCH, 2009, p. 610.114 VICEDOM, 1996, p. 17.115 O “Evangelho Social” foi um movimento de grande importância no protestantismo norte-americano por cerca de cinquenta anos (1880-1930). Foi uma resposta à crise urbana ocasionada pelo crescimento econômico posterior à Guerra Civil. Seu principal teórico foi Walter Rauschenbusch (1861-1918). O Evangelho social tendia a dar uma ênfase excessiva à transformação da sociedade, via a missão cristã no mundo principalmente em termos de ação social e tinha um otimismo pouco realista em relação ao ser humano.

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Page 35: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

ele a aceitação do Evangelho de Jesus Cristo já implica, necessariamente, na transformação

da vida social, política, econômica e religiosa. Os povos do mundo todo são confrontados

com a verdade do Evangelho de Jesus Cristo e, sob sua luz, recebem graça e misericórdia

para a salvação ou não podem ser incluídos no reino de Deus.

Esta operação de Deus é refletida na teologia de missão de Vicedom e confere todo o

contorno à Missio Dei (Rm 11.32). À Igreja de Deus e aos salvos que vão sendo incluídos

nela, nada mais resta senão receber este amor e compartilha-lo durante sua vida e existência.

Desprezar este amor, pode significar a perda da graça de Deus e da alegre participação na

Missio Dei.116

Como Missão de Deus, tudo o que a Cruz de Cristo é e representa se manifesta na teologia

da Missio Dei. É a partir da encarnação do Filho e do envio do Espírito Santo que Deus

promove a evangelização aos pobres, a cura aos quebrantados de coração, a liberdade aos

cativos e aos oprimidos e a restauração da vista aos cegos (Lc 4.18-19 ). À Igreja importa

seguir este mesmo caminho, imitar os sinais da graça e misericórdia de Deus, transmitir o

significado da vida, obra, morte e ressurreição de Jesus Cristo, colocado por Deus como o

cabeça da Igreja (Ef 1.22; 5.23).

Vicedom destaca que do mesmo modo que o envio do Espírito Santo trouxe o revestimento

necessário aos apóstolos para que pudessem se tornar testemunhas eficazes de Jesus e

anunciar o Evangelho a todas as nações (At 1.8), assim também a Igreja, como resultado

óbvio do apostolado, é enviada ao mundo para dele chamar os perdidos a fim de completar a

Igreja de Deus. Assim, são enviados novamente ao mundo à semelhança dos primeiros

apóstolos, para trazer dele mais uma vez àqueles que vão sendo salvos. Certamente, esta

dinâmica demonstra o empreendimento missionário que está sendo operacionalizado por

Deus e o lugar que sua Igreja possui em sua Missio à medida que nela puder ser

encontrada117.

O contexto histórico e social a partir do qual Vicedom difunde esta teologia de missão situa-

se num momento do pós-guerra em que a compreensão da missão, da teologia e do

Evangelho estão dilacerados por ideologias fascistas, comunistas e socialistas e por um

certo ideal democrático de inspiração norte-americana, conhecido como american way of

life118 que levou a população mundial a optar pela busca de um estilo de vida pautado na

116 VICEDOM, 1996, p. 9, 16.117 VICEDOM, 1996, p. 46, 47, 62, 63.118 O american way of life, ou “estilo de vida americano” foi desenvolvido na década de 1920, amparado pelo bem-estar econômico que desfrutavam os Estados Unidos. O sinal mais significativo deste way of life é o consumismo,

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valorização pessoal, na evolução da qualidade de vida e na crença na supremacia de um

sistema econômico financeiro totalmente inviável à paz e à justiça social.

É refletindo neste mesmo contexto que Vicedom, na década de cinquenta, declara viver

“numa época em que todas as coisas surgidas historicamente são desvalorizadas” . O cerne

de sua declaração ecoa na crise da missão que persiste sobre a Igreja no tempo presente e se

torna ainda mais compreensível quando declara que esta desvalorização “acontece também

na teologia”119

materializado na compra exagerada de eletrodomésticos e veículos.119 VICEDOM, 1996, p. 13.

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Page 37: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

CAPÍTULO 3

UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

1. A contextualização da Missio Dei no Brasil

Na América Latina, nove anos depois da publicação de Missio Dei, Vicedom esteve no

Brasil com o pastor luterano e colonizador120 Norberto Schwantes121, no Parque Indígena do

Xingu e entre os Xavante no Mato Grosso, em 1967. A experiência missionária de Vicedom

nestas reservas representou uma nova oportunidade de introduzir na prática missionária

latino-americana o exercício da “indigenização122 do Evangelho”, difundido por Vicedom

entre os aborígenes da Nova Guiné como resultado da experiência adquirida com Christian

120 OS HOMENS DO PRESIDENTE. Paulo Rufino. Casa de Cinema. Rio de Janeiro: Embrafilme, 1984. Filme original em 16mm, COR, 51min, 565m, 24q, sonoro, legendas em inglês e áudio em português. Série Plante que o João Garante. A entrevista com Norberto Schwantes é parte integrante do filme disponível também em <http://youtu.be/ieAVnx1Rpec> cf. documentário autobiográfico em <http://youtu.be/XeQSl78IXq0> Acesso em: 30/10/2014121 Norberto Schwantes, teólogo luterano, irmão mais velho de Milton Schwantes, professor no programa de pós-graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Norberto foi Assessor de Diretoria da Construtora Andrade Gutierrez S.A. para Assuntos de Colonização entre 1983-1985 e Subsecretário de Estado em Brasília, DF, entre 1987-1988. Entre suas principais realizações está a colonização de extensas regiões do sul e centro-oeste do Brasil, entre elas as terras do atual Mato Grosso do Sul, acerca das quais relata “encontramos terras excelentes, baratas, ... muita terra com dono sim, mas sem gente. E para cá nós trouxemos estes agricultores”. A atual crise em torno do direito sobre uso e ocupação da terra pode ter origem em processos de colonização (e.g. degeneração dos Guarani Kaiwá no MS).122 Processo de indigenização é um fenômeno de adaptação de um princípio de valor humano que foi pregado, ensinado ou incutido entre povos indígenas. De acordo com a sociologia, indigenização é o conjunto de medidas para tornar peculiar a um povo ou etnia uma determinada ideia.

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Keysser123, seu professor de missiologia no seminário da Baviera, cerca de quarenta anos

antes124.

A desvalorização da história e da teologia, conforme descrita por Vicedom, também foi

observada na América Latina e pôde ser estudada por teólogos como Roberto E. Zwetsch 125.

Na apresentação da edição brasileira do livro Missio Dei, de Vicedom, o teólogo luterano

aponta para o fato de que a atual conjuntura da Igreja latino-americana exige que

determinados aspectos da teologia de missão em Vicedom sejam cuidadosamente

contextualizados.

Ao relembrar a missão cristã europeia empreendida no Novo Mundo a partir do séc. XVI e

as assolações pelas quais culturas milenares e povos inteiros foram submetidos sob a

imagem da cruz de Cristo, Zwetsch destaca o fato de que o cristianismo latino-americano

deve sempre primar por uma mensagem do Evangelho que seja valorizadora, defensora e até

mesmo promotora das culturas, religiões e interesses dos povos tradicionais

remanescentes126 como forma de testemunhar o Cristo verdadeiro127.

Assim sendo, a universalidade da Missio Dei em Zwetsch já não mais se coloca acima de

toda e qualquer forma de expressão cultural ou religiosa, como ocorre em Vicedom, mas em

cada uma das expressões culturais e religiosas em particular, de modo que a soberania de

Deus se mostre, não “sobre”, mas “na” cultura e “na” religião de cada povo oprimido 128,

“pois Deus não enviou o Filho ao mundo para condená-lo, mas para que o mundo seja

salvo por ele”. (Jo 3.17)129

Também pelo fato de determinadas denominações cristãs da América Latina serem

apontadas como instituições organizadas com o fim de “manipular a noção de pecado” nos 123 Christian Keysser (1877, Baviera - 1961), missionário luterano alemão na Nova Guiné, treinado na Missão Neuendettelsau (1895-1899), enviado ao nordeste de Nova Guiné (Papua), em 1899, chefiou a estação de missão em Sattelberg, defensor do uso de evangelistas da igreja indígena sob orientação de missionários;  proclamação do evangelho culturalmente apropriada, considerando válidos os interesses religiosos e seculares, honoris causa por suas realizações científicas em 1929, treinou uma nova geração de missionários sensível à mentalidade e à cultura dos povos, seu ex-aluno Georg F. Vicedom assumiu a maioria de seus escritórios no pós-nazismo. (Biographical Dictionary of Christian Missions, New York: Macmillan, 1998, p. 360)124 VICEDOM, 1996, p. 8.125 Roberto Zwetsch é professor de Teologia Prática e Missiologia das Faculdades EST, professor do Programa de Pós-Graduação e do Programa de Formação do Conselho de Missão entre Indígenas da IECLB. Participa do Conselho Permanente do Fórum Mundial de Teologia e Libertação representando a Comunidade de Educação Teológica Ecumênica Latino-Americana e Caribenha (Cetela) e Faculdades EST. (www.ihuonline.unisinos.br)126 Jornal do Brasil. Indígenas reivindicam a educação que respeite suas identidades culturais. Disponível em <http://www.jb.com.br> Acesso em 29/11/2014.127 VICEDOM, 1996, p. 11.128 VICEDOM, 1996, p. 11, 71, 72.129 BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2. ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. Edição revista e atualizada no Brasil.

Page 39: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

cristãos e assim usurpar-lhes o vigor financeiro, Zwetsch orienta interpretar com cautela o

que Vicedom chama de “o começo da missão de Deus” descrito a partir do

“arrependimento de pecados” e do “juízo de Deus”, a fim de que estas realidades não sejam

então manipuladas em prejuízo da Igreja em vista da sociedade130.

2. A relevância do conceito Missio Dei no Brasil

Apesar da Missio Dei em Zwetsch seguir a mesma perspectiva trinitária da Conferência de

Willingen, ele reconhece que a conceituação e o consenso sobre teologia de missão na

América Latina não é tarefa simples, pois, as discussões teológicas em missão tem seguido

ao menos por dois caminhos distintos que, algumas vezes podem conflitar, mas também

podem se complementar131.

Em um destes caminhos distintos, Zwetsch identifica a teologia de missão integral descrita

como uma atividade da Igreja, muito produtiva e centrada na sua capacidade de frutificação,

cujo sentido aproxima-se mais do conceito de missiones Ecclesiae132 do que do conceito da

Missio Dei. Neste caminho Zwetsch identifica que o ponto de concentração incide mais

acentuadamente sobre o segundo momento do “tríplice objetivo da missão” de Voetius,

abordado neste trabalho de conclusão de curso como a melhor definição já criada para

Missio Dei, isto é, incide primeiramente e de modo mais vigoroso sobre o sentido de

plantatio Ecclesiae, ou plantação de Igrejas133.

Para as missiones Ecclesiae, diz Bosch, a Missio Dei acarreta consequências importantes,

pois seu propósito não poderá ser primeiramente a implantação de igrejas ou a salvação de

almas, mas terá que ser primeiramente o serviço à Missio Dei134que procura englobar em si

as missiones Ecclesiae, os programas missionários da Igreja. Não é a Igreja que empreende

a missão; é a Missio Dei que constitui a Igreja135.

130 VICEDOM, 1996, p. 11131 ZWETSCH, 2008, p. 85132 Bosch considera as missiones Ecclesiae, ou as missões da Igreja, como empreendimentos missionários particulares da Igreja em missão que estão “relacionados com tempos, lugares ou necessidades específicas de participação na Missio Dei” (DAVIES, apud BOSCH, p. 28)133 A plantação de igrejas é o estabelecimento de um corpo organizado de crentes em um novo local. O processo de plantar uma igreja envolve o evangelismo, o discipulado de novos crentes, a formação de líderes e a organização da igreja de acordo com o modelo do Novo Testamento. Disponível em: <www.gotquestions.org/Portugues/plantacao-plantar-igrejas> Acesso em: 29/10/2014.134 BOSCH, 2009, p. 468.135 BOSCH, 2009, p. 618.

Page 40: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

Neste sentido Zwetsch parece reconhecer que aquilo que se conhece como missão integral

vem afirmar-se como um modelo missionário orientado para resultados, desarticulando

assim, a plenitude conceitual de Voetius sobre missão, abrindo espaço para outras

definições sobre o que venha a ser Missio Dei no século XXI. Aqui o foco da missão recai

novamente sobre a obediência ao chamado à “Grande Comissão” de Mateus 28.16-20 136,

agora amalgamada a uma clara perspectiva sócio-política de missão, e seu propósito é a

proclamação do Evangelho a toda criatura, independentemente de quem seja ou onde quer

que esteja137.

No outro caminho, Zwetsch identifica a Missio Dei descrita como uma ação desvinculada à

instituição e que se volta para um alvo muito mais diversificado e que não se encontra

unicamente no caminho das metas e objetivos que as missiones Ecclesiae almejam alcançar,

mas em meio às estruturas sociais vulneráveis à injustiça e à desigualdade. Neste contexto a

diaconia138 é entendida como participação no envio de Deus (Missio Dei) superando toda

forma de descaso social.

Neste sentido, primeiro importa o testemunho vivo da verdade, depois a palavra falada;

antes o exercício e a prática da fé, depois a metodologia; primeiro a promoção e a defesa da

vida, depois a formação de comunidades e a plantatio Ecclesiae. Aqui missão é amor de

Deus em ação no mundo e no ensino de Jesus à Igreja que se torna participante e

instrumento da Missio Dei139.

Para Zwetsch, deve-se ressaltar a importância da discussão sobre a Missio Dei, cuja

superioridade reside na realidade de sua praticidade e eficiência em tornar o testemunho do

Evangelho de Jesus Cristo compreensível para o mundo presente, alvo e propósito da Missio

Dei140. “Onde se efetivou a libertação para a verdadeira humanidade, podemos concluir

que a Missio Dei alcançou seu objetivo”141

Durante a realização da Semana Acadêmica de Teologia, CADES - 2012, Roberto Zwetsch

palestrou sob o tema “Panorama do Contexto da América Latina” e falou sobre Igreja e

136 BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2. ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. Edição revista e atualizada no Brasil.137 ZWETSCH, 2008, p. 85.138 Adital, Notícias da América Latina e Caribe. Encontro no Vaticano: Papa convoca movimentos sociais de todo o mundo a combaterem causas estruturais da pobreza. Disponível em: <site.adital.com.br/site/noticia> Acesso em: 29/10/2014.139 ZWETSCH, 2008, p. 85.140 Idem.141 HOEKENDJIK, apud BOSCH, p. 605.

Page 41: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

Teologia. Em sua palestra ele alerta para a profunda crise que afeta as igrejas em todo o

mundo ocidental, seja na Europa, na América do Norte ou na América Latina.

Zwetsch assevera que no fundo desta crise no mundo, que também é a crise da Igreja e do

Cristianismo mundial, está a crise da missão, e que neste contexto faz-se urgente resgatar o

conceito de Missio Dei, isto é, que Deus está operando no mundo e que, ainda que a Igreja,

muitas vezes, não compreenda isso, precisa debater o assunto e chegar a um consenso sobre

qual seja seu lugar na missão, pois Deus “continua realizando sua missão conosco, sem nós

ou as vezes contra nós” 142.

Isto porque para Zwetsch, apesar da missão determinar a natureza e a razão de ser da Igreja,

“é quase impossível dizer o que ela é.” Assim, Zwetsch considera a “autocomunicação de

Deus” em sua relação com Israel, com a vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo e com o

povo de Deus inserido no mundo para fazer entender que missão “diz respeito às relações

entre Deus e o mundo”. Portanto, é tarefa de cada geração determinar o que entende por

missão, sabendo que “o envolvimento da igreja na missão de Deus é um ato de fé para o qual

não há garantia”, e o bom uso da Bíblia143 (2 Tm 2.15)144 poderá torná-la em um instrumento

valioso que levará cada geração a encontrar seu lugar na Missio Dei, tornando-se participante

na existência de Deus no mundo, vendo “o mundo com os olhos de Deus”145.

Assim sendo, a pobreza, a discriminação, a fome, a violência, a guerra, a corrupção, a

desesperança e toda forma de mazela e sofrimento pelos quais a humanidade sem Deus tem

escrito sua história, não serão mais razão de vergonha ou humilhação e ninguém se atreverá a

“virar o rosto” ou “dar as costas” à situação porque agora se pensa com a mente de Deus (1

Co 2.16)146, se vê com os olhos de Deus, se age com as mãos de Deus, visto haver plena

participação em sua Missio. “É o que a Bíblia expressa com a encarnação do Filho de Deus

que torna presente o reinado de Deus, uma realidade nova de justiça e paz já atuantes no

mundo”, onde os filhos e filhas de Deus atuam (actio Dei), não mais como pessoas que

142 Semana Acadêmica de Teologia CADES – 2012: Palestra: Panorama do Contexto da América Latina: <http://youtu.be/GYsGWIsIADo> 53º minuto.143 Com “bom uso da Bíblia” o autor quer fazer referência ao texto de 2 Tm2.15: “Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade. ”, e textos correlatos: (1 Tm 4.6-16; 2 Pe 1.10; 2 Co 6.3; Hb 5.14).144 BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2. ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. Edição revista e atualizada no Brasil.145 ZWETSCH, 2008, p. 87, 88.146 BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2. ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. Edição revista e atualizada no Brasil.

Page 42: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

pertencem ao mundo, mas à Missio Dei (Jo 17.15s), pois, “nem igreja separada ou sectária,

nem igreja secularizada podem articular bem a Missio Dei”147.

Zwetsch concorda com Vicedom quanto a soberania de Deus em sua Missio, tornando

impossível às “religiões, governos, potestades, ciência, incredulidade, piedade

(especialmente a piedade cristã) ” conter a ação livre de Deus. Ele age através do envio de

Jesus de Nazaré, do Espírito Santo, da Igreja, dos profetas do antigo Israel, e através de outras

“realidades totalmente impessoais e expressa com isso que também atua diretamente sobre o

mundo”148 (cf. Jr 9.16; Jl 2.19; Sl 57.3; Sl 43.3; Sl 107.20; Am 8.11; Sl 111.9)149 e, ainda que

não haja provas disso, é possível crer, confiar e procurar entender, por meio da fé, que Deus é

aquele que sustenta o mundo todo e trabalha para conduzir os seres humanos ao seu reino.

Para Zwetsch é imperativo recobrar a compreensão de quem somos em relação a Deus e que 1

Co 3.9 expressa com tanta propriedade: “[...] nós somos cooperadores de Deus; [...] lavoura

de Deus e edifício de Deus”, e também aquilo que Vicedom resumidamente definiu como

Missio Dei:150

A missão como obras da misericórdia divina, que Deus iniciou através do envio de seu Filho, é continuada por ele agora ao incumbir sua comunidade, por meio de seu enviado, da propagação e da proclamação de sua vontade salvadora. Assim o senhor dá a ordem missionária [...] (mas) esse serviço da Igreja somente é possível porque ela mesma experimentou compaixão através da ação redentora do Filho de Deus e agora representa a comunidade dos crentes e justificados [...]. Por conseguinte, esse serviço é engajamento na atuação de Deus, obediência da fé, não estar desligado de Deus, mas ser tomado por ele, não é algo que é acrescentado à ação de Deus, mas é submeter-se ao agir de Deus.151

3. Missio Dei: Deus Conosco no Século XXI

De acordo com Zwetsch, a própria história do protestantismo, que também inaugura a

primeira abordagem da Missio Dei neste trabalho de conclusão de curso na pessoa de

Martinho Lutero, revela que por mais que tenha havido extraordinários esforços, laboriosa

dedicação e, porque não dizer também, uma piedosa consciência na condução da missão

cristã em muitas partes do mundo, nem sempre estas ações representaram a vontade de Deus

ou a sua Missio. Isto porque faz parte do conhecimento histórico que o protestantismo, de

147 ZWETSCH, 2008, p. 88.148 VICEDOM, 1996, p. 18.149 Com a citação destas passagens bíblicas, Vicedom objetiva demonstrar que Deus se revela presente no mundo de muitas e variadas maneiras, cuidando, alimentando, corrigindo seu povo, compartilhando de sua bondade, sabedoria, fidelidade, instruindo na Palavra e produzindo desejo ardente pela sua Palavra. 150 ZWETSCH, 2008, p. 89, 90, 91.151 VICEDOM, 1996, p. 107s.

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Page 43: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

modo geral, tem uma dívida universal com os povos escravizados, sejam eles negros,

indígenas152 ou outra etnia subjugada pelo empreendimento missionário colonizatório e

civilizatório que, tem-se que admitir, apenas começou no final do séc. XV.

Zwetsch também lembra que o protestantismo, “na sua relação com os governos, assumiu

posições ambíguas mais preocupado em garantir espaços institucionais do que com as

consequências da proclamação do evangelho do reino de Deus” 153. Por mais de três

séculos, o sistema colonial, unido à fé católica, subjugou a vida dos povos tradicionais

latino-americanos em favor de um projeto missionário mercantil absolutamente

insustentável154. Insustentável não apenas por seu caráter econômico e ambiental, mas, sem

dúvida, pela destruição e extermínio das populações originárias que caracterizaram esse

período, ações para as quais foram providenciadas justificativas políticas, jurídicas e, até

mesmo, cristãs e teológicas.155

A crise espiritual, sem precedentes, que assola o cristianismo do séc. XXI, não é outra crise

senão aquela que foi deflagrada pela cruz aliada à espada, deixando profundas marcas na

história, na cultura, na mentalidade e na consciência dos povos latino-americanos. Estas

marcas criminosas perpetradas contra a humanidade “superam as descrições mais

fidedignas atestadas em inúmeros relatos do período colonial” e estão hoje presentes e

espalhadas por toda sociedade latino-americana, em cuja face tanto catolicismo quanto

protestantismo se revelam.

Para Zwetsch a compaixão é atributo primário na Missio Dei e, portanto, seu evangelho é apto

para transformar toda a existência humana. Compaixão fala da ação compassiva

originalmente encontrada na base do amor de Deus e que estende a toda humanidade. É nesta

mesma base de amor compassivo que a Igreja deve estar, para que sua participação na Missio

Dei conduza ao “reinado de paz e justiça”. Proclamando assim o evangelho, vivendo assim a

fé, a Igreja torna-se participante da Missio Dei e torna-se apta para ao serviço libertador e à

toda boa obra, para a qual não há “fronteiras geográficas, culturais, de gênero” ou de

gerações, e pode, então, propor uma nova experiência de liberdade e alegria comunitária,

conforme Gl 3.28: “Nisto não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho

nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”

152 ZWETSCH, 2008, p. 91.153 ZWETSCH, 2008, p. 91, 92.154 ZWETSCH, 2008, p. 395.155 ZWETSCH, 2008, p. 22

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Page 44: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

No início deste séc. XXI “a Missio Dei desafia as igrejas cristãs a se libertarem de suas

amarras organizativas, de sua visão eclesiocêntrica e de uma teologia reducionista do

evangelho do reinado de Deus, para uma nova e apaixonada convivência”. Evidentemente,

este compromisso missionário só se torna sustentável à medida que cada membro do Corpo de

Cristo, aqui entendido como o cabeça da Igreja (Ef 5.23)156, deixa-se tanto permear pelo

evangelho do Deus Triúno como pelo seu governo, que não é outro governo senão aquele que

vem para libertar, curar e salvar. Cabe a amada de Cristo (Jo 3.29)157 ser zelosa para com o

noivo e assumir todas as consequências de sua decisão.

“Na perspectiva da missio Dei, missão significa que tudo o que diz respeito à humanidade e

ao cosmos diz respeito à vida, ao serviço e à esperança do povo de Deus. Portanto, não pode

faltar no horizonte da missão das igrejas cristãs.”158 Assim, Zwetsch conclui sua obra

sintetizando sua perspectiva missionária da Missio Dei:

A missão é o instrumento de Deus para a libertação da igreja por meio do seu Espírito. É o Espírito de Cristo que impulsiona o povo de Deus, hoje e aqui, a assumir e participar de uma ação missionária que se manifesta como compaixão no seguimento de Cristo para a transformação do mundo. Animados por aquele que, no Espírito, intercede por nós junto a Deus (Romanos 8.34), não temos por que nos atemorizar. Há uma firme esperança que nos está posta como plataforma para a ação e a luta por dignidade humana e o resgate do sentido da vida para todos. Nessa esperança fomos salvos159 (Romanos 8.24)160.

156 BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2. ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. Edição revista e atualizada no Brasil.157 Idem158 ZWETSCH, 2008, p. 402.159 Idem160 BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2. ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. Edição revista e atualizada no Brasil.

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Page 45: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

CONCLUSÃO

Este trabalho de conclusão de curso procurou abordar o tema Missio Dei a partir da

teologia de missão em que foi concebida em meados do séc. XX, buscando torná-la

compreensível ao universo cristão que, atualmente, sofre em uma crise missionária sem

precedentes e que se estende à teologia e à ação da igreja cristã no mundo, diminuindo sua

influência e alcance de acordo com aquilo que deveria ser, ao menos segundo a missiologia

moderna.

Através deste trabalho procurou-se demonstrar que a Missio Dei, como teologia de

missão, é um referencial teórico seguro à prática missionária, pois que repousa sobre a

disciplina e orientação do próprio Deus Triúno. Sua influência sobre a presente situação

missionária da Igreja Cristã pode produzir situações de convergência teológica entre as mais

diversas orientações doutrinárias, promover a criação de espaços de diálogo extremamente

enriquecedores à atual conjuntura política, econômica, social e religiosa através da difusão

da mensagem bíblica e do amor de Deus em todo o mundo.

Ao leitor/leitora deste trabalho de conclusão de curso recomenda-se dar continuidade

à pesquisa oferecida na bibliografia, a qual em si mesma é inesgotável, face a dinâmica do

mundo presente e, consequentemente, da Igreja que tem a ilustre responsabilidade de buscar

meios e soluções para seus sofrimentos, angústias e desafetos, promovidos por um sistema

econômico financeiro extraordinariamente injusto e empobrecedor, não apenas em termos

econômicos, mas também na ordem moral e ética na qual vivem e se movem os filhos e

filhas de Deus.

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Page 46: MISSIO DEI: UMA TEOLOGIA DE MISSÃO PARA O SÉCULO XXI

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