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ISSN 1809-5860 Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 11, n. 50, p. 113-129, 2009 MODELAGEM NUMÉRICA DE PILARES MISTOS CURTOS DE SEÇÃO CIRCULAR DE AÇO PREENCHIDO COM CONCRETO EM SITUAÇÃO DE INCÊNDIO Rodrigo Tadeu dos Santos 1 & Jorge Munaiar Neto 2 Resumo Os pilares mistos de aço e concreto, além de apresentar comportamento estrutural bastante satisfatório, reduzem o fenômeno denominado “spalling” presente em elementos de concreto submetidos a elevadas temperaturas, devido ao confinamento imposto pelo tubo de aço, mais pronunciado em seções tubulares circulares. Destaca-se ainda a reduzida taxa de aquecimento desse mesmo elemento misto em razão da baixa condutividade térmica do concreto, aspecto de grande interesse para fins de dimensionamento. O presente trabalho tem como objetivo principal modelar numericamente, em campo tridimensional, pilares mistos curtos com seções tubulares circulares de aço preenchidos com concreto submetidos ao incêndio-padrão ISO 834:1999. A modelagem se faz com vistas à simular o comportamento estrutural em situação de incêndio e a influência da elevação de temperatura na resistência e no confinamento desses mesmos elementos. Para a modelagem numérica, em campo térmico e estrutural, se utiliza o pacote comercial ANSYS ® V9.0, elaborado com base no Método dos Elementos Finitos, o qual permite a análise transiente do gradiente térmico nos elementos estruturais. Os resultados das análises são comparados com valores obtidos por meio do código computacional TCD 5. Palavras-chave: Estruturas de aço. Pilares mistos de aço e concreto. Incêndio. Análise térmica. Análise numérica. NONLINEAR NUMERICAL ANALYSIS OF CIRCULAR CONCRETE FILLED STEEL SHORT COLUMNS UNDER FIRE CONDITION Abstract Concrete-filled steel columns when subjected to high temperatures present satisfactory structural behavior and the reduction of the spalling phenomenon in the concrete. The aim of this work is to develop 3D numerical models of circular concrete-filled steel short columns under fire exposure according to the ISO-834:1999 standard. The numerical models are developed to simulate the structural behavior of those composite short columns under fire condition, in order to evaluate the influence of increasing temperature in the strength of the structural element. To perform the numerical model of thermal, structural and thermal-structural fields, a commercial finite element analysis package ANSYS ® V9.0 is used, which allows transient analysis of the thermal gradient effects in the structural elements. The results from thermal, structural and coupled analyses are previously compared with the ones obtained with TCD 5.5 package. The coupled analysis is performed for three different columns, changing the diameter and concrete compression strength to be used in a parametric analysis. Keywords: Composite structures. Composite steel-concrete columns. Fire situation. Thermal analysis. Numerical analysis. 1 Mestre em Engenharia de Estruturas - EESC-USP, [email protected] 2 Professor do Departamento de Engenharia de Estruturas da EESC-USP, [email protected]

MODELAGEM NUMÉRICA DE PILARES MISTOS CURTOS DE … · desses mesmos elementos, garantindo uma considerável eficiência estrutural em termos de resistência e de rigidez. No caso

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ISSN 1809-5860

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 11, n. 50, p. 113-129, 2009

MODELAGEM NUMÉRICA DE PILARES MISTOS CURTOS DE SEÇÃO CIRCULAR DE AÇO PREENCHIDO COM CONCRETO EM SITUAÇÃO DE

INCÊNDIO

Rodrigo Tadeu dos Santos1 & Jorge Munaiar Neto2

R e s u m o Os pilares mistos de aço e concreto, além de apresentar comportamento estrutural bastante satisfatório, reduzem o fenômeno denominado “spalling” presente em elementos de concreto submetidos a elevadas temperaturas, devido ao confinamento imposto pelo tubo de aço, mais pronunciado em seções tubulares circulares. Destaca-se ainda a reduzida taxa de aquecimento desse mesmo elemento misto em razão da baixa condutividade térmica do concreto, aspecto de grande interesse para fins de dimensionamento. O presente trabalho tem como objetivo principal modelar numericamente, em campo tridimensional, pilares mistos curtos com seções tubulares circulares de aço preenchidos com concreto submetidos ao incêndio-padrão ISO 834:1999. A modelagem se faz com vistas à simular o comportamento estrutural em situação de incêndio e a influência da elevação de temperatura na resistência e no confinamento desses mesmos elementos. Para a modelagem numérica, em campo térmico e estrutural, se utiliza o pacote comercial ANSYS ® V9.0, elaborado com base no Método dos Elementos Finitos, o qual permite a análise transiente do gradiente térmico nos elementos estruturais. Os resultados das análises são comparados com valores obtidos por meio do código computacional TCD 5. Palavras-chave: Estruturas de aço. Pilares mistos de aço e concreto. Incêndio. Análise térmica. Análise numérica.

NONLINEAR NUMERICAL ANALYSIS OF CIRCULAR CONCRETE FILLED STEEL SHORT COLUMNS UNDER FIRE CONDITION

A b s t r a c t Concrete-filled steel columns when subjected to high temperatures present satisfactory structural behavior and the reduction of the spalling phenomenon in the concrete. The aim of this work is to develop 3D numerical models of circular concrete-filled steel short columns under fire exposure according to the ISO-834:1999 standard. The numerical models are developed to simulate the structural behavior of those composite short columns under fire condition, in order to evaluate the influence of increasing temperature in the strength of the structural element. To perform the numerical model of thermal, structural and thermal-structural fields, a commercial finite element analysis package ANSYS ® V9.0 is used, which allows transient analysis of the thermal gradient effects in the structural elements. The results from thermal, structural and coupled analyses are previously compared with the ones obtained with TCD 5.5 package. The coupled analysis is performed for three different columns, changing the diameter and concrete compression strength to be used in a parametric analysis. Keywords: Composite structures. Composite steel-concrete columns. Fire situation. Thermal analysis. Numerical analysis.

1 Mestre em Engenharia de Estruturas - EESC-USP, [email protected] 2 Professor do Departamento de Engenharia de Estruturas da EESC-USP, [email protected]

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1 INTRODUÇÃO

A consideração do trabalho em conjunto dos elementos de aço e de concreto para a concepção de elementos mistos como, por exemplo, as lajes mistas de aço e concreto, as vigas mistas de aço e concreto e os pilares mistos de aço e concreto, surgiu, inicialmente, como forma de proteção ao fogo e à corrosão dos elementos estruturais de aço, em que o concreto não possuía qualidade estrutural, contribuindo pouco com a resistência do elemento e, consequentemente, do sistema ao qual estava inserido. Posteriormente, se passou a considerar a contribuição do concreto na resposta estrutural desses mesmos elementos, garantindo uma considerável eficiência estrutural em termos de resistência e de rigidez. No caso dos pilares mistos de aço e concreto, o elemento de aço (tubular) pode ser utilizado na forma de perfis laminados, soldados ou formados a frio, enquanto que o concreto pode ser simples ou armado. Os pilares mistos preenchido com concreto, quando analisado em temperatura ambiente, asseguram uma maior e mais adequada eficiência estrutural para fins de utilização em estruturas correntes. Apresentam como vantagens: ausência de fôrmas, redução ou até mesmo a ausência de armaduras, o núcleo de concreto é responsável por aumentar a rigidez e a resistência do perfil tubular, redução da seção transversal, redução no consumo dos materiais, aumento da área útil no pavimento e uma melhora na ductilidade do pilar. No contexto do presente trabalho, cabe ressaltar que as atenções serão direcionadas aos pilares de aço de seção circular preenchidos com concreto e, em particular, voltadas para a análise desses elementos submetidos a temperaturas elevadas. Atualmente, as pesquisas referentes às estruturas em situação de incêndio crescem de forma significativa no cenário mundial. Tal fato se justifica pela necessidade de se avaliar o desempenho das estruturas quando essas são submetidas à ação térmica. O aumento gradativo de temperatura provoca alterações nas propriedades mecânicas dos materiais, fazendo com que ocorra redução de resistência e rigidez, podendo levar a estrutura ao colapso prematuro. No caso de pilares mistos de aço preenchidos por concreto, Fig. 1, quando submetidos a ação térmica, além de apresentar comportamento estrutural bastante satisfatório, reduz ou mesmo evita o fenômeno do lascamento, denominado “spalling” (presente em elementos de concreto submetidos a elevadas temperaturas), devido ao efeito do confinamento do concreto imposto pelo tubo de aço.

(a)

perfil deaço

(b)

concreto

tubularperfil

Figura 1 – Pilares mistos de aço preenchidos por concreto: (a) seção circular e (b) seção quadrada. Fonte: De Nardin (2006).

Conforme descrito em Han (2003), o tubo de aço começa a se expandir axialmente no início da fase de aquecimento, passando a receber a maior parte da carga aplicada, fazendo com que a tensão de compressão no núcleo de concreto diminua. Posteriormente, com o aumento da temperatura, o aço passa a se deformar localmente e a carga passa também a ser resistida pelo concreto. Em um estágio final o aço, axialmente, não suporta mais a carga aplicada, porém, ainda mobiliza restrição à deformação radial do núcleo de concreto até o instante de ruptura do elemento misto como um todo.

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Segundo Ding e Wang (2008), a maioria dos pesquisadores assume como hipótese simplificadora, durante a exposição ao fogo, o contato perfeito na interface entre o aço e o concreto nos pilares mistos preenchidos. No entanto, essa última referência ressalta o fato de a dilatação do aço ser maior que a do concreto, impondo um descolamento no contato dando origem à existência de uma “folga” (Gap de ar) entre ambos, fenômeno que deve ser levado em conta em análises experimental e numérica. No entanto, a mesma referência destaca que tal consideração deve ser melhor estudada em trabalhos futuros, tendo em vista que ocorrem casos em que o tempo de resistência ao fogo cresce devido à folga, mostrando que as análises por meio de modelos convencionais (sem Gap) estão a favor da segurança, e, para os casos em que o contrario se verifica, a diferença se mostra pouco expressiva. Em razão dos aspectos citados nos parágrafos anteriormente apresentados, o presente trabalho tem como objetivo principal modelar numericamente, em campo tridimensional, pilares mistos curtos com seções tubulares circulares de aço preenchidos com concreto submetidos ao incêndio-padrão, determinando o tempo e a temperatura de colapso referente a uma determinada carga aplicada. Para tanto, utiliza-se como proposta modelos numéricos do tipo termo-estrutural acoplado, elaborado com o auxílio do código de cálculo ANSYS ® V9.0.

2 INCÊNDIO

O incêndio caracteriza-se pela existência de fogo sem controle, e só ocorrerá se houver fonte de calor, combustível e oxigênio (comburente), juntos denominado “triangulo do fogo”. A reunião desses três elementos origina uma reação química exotérmica que libera calor em grande intensidade. O risco de ocorrer um incêndio, sua intensidade e duração, está diretamente associado à quantidade, ao tipo e ao posicionamento da carga de incêndio (material combustível) que constitui o mobiliário ou equipamentos de um dado ambiente. Devido à grande dificuldade em se determinar a curva temperatura-tempo para o incêndio natural, dependente das condições de ventilação e aberturas do compartimento, da distribuição e da quantidade de carga de incêndio, entre outros aspectos, se convencionou adotar um modelo de curva temperatura-tempo, para análises de estruturas, elementos estruturais, materiais e elementos de proteção térmica. Esse modelo é conhecido como incêndio-padrão, representado pela equação (1), a qual determina a temperatura dos gases (Tg) em função do tempo, de acordo com a norma ISO 834:1999. Na equação (1), t é o tempo em minutos e a temperatura dos gases é dada em °C. A Fig. 2 representa graficamente a curva de incêndio-padrão.

( )1t8log34520=Tg ++ (1)

0

200

400

600

800

1000

0 10 20 30 40 50 60

Tempo (h)

Tem

pera

tura

(°C

)

Figura 2 – Curva referente ao incêndio-padrão de acordo com a ISO 834:1999.

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A verificação estrutural em situação de incêndio deve-se ao fato de as propriedades mecânicas do aço e do concreto resultarem reduzidas quando expostas a elevadas temperaturas, podendo provocar o colapso da estrutura em um tempo reduzido, não garantindo a desocupação da edificação. A influência da temperatura na resistência ao escoamento e na rigidez do aço e do concreto, pode ser observada, de maneira geral, conforme informações apresentadas nas Fig. 3 e Fig. 4, elaboradas com base em SILVA (2000). Nota-se, com base na mesma figura, que a capacidade resistente, tanto do aço como do concreto, diminui consideravelmente com o aumento da temperatura.

0

0,25

0,5

0,75

1

0 300 600 900 1200

Temperatura (oC)

Res

itênc

ia re

lativ

a

concretoaço

Figura 3 – Reduções da resistência, do aço e do concreto, em função da temperatura.

0

0,25

0,5

0,75

1

0 300 600 900 1200

Temperatura (oC)

Mód

. Ela

stic

. rel

ativ

o

aço

concreto

Figura 4 – Reduções do módulo de elasticidade, do aço e do concreto, em função da temperatura.

Um primeiro parâmetro de interesse para fins de análise térmica é o calor específico (Ca), que representa a quantidade de calor requerida para aumentar em uma unidade de temperatura a massa unitária do material. A norma brasileira ABNT NBR 14323:1999 disponibiliza valores de calor específico, em J/kg°C, em função do tempo, para o aço e para o concreto, conforme Fig. 5a e Fig. 5b, respectivamente.

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0

1000

2000

3000

4000

5000

6000

0 200 400 600 800 1000 1200

T (°C)

c a

0

500

1000

1500

2000

2500

0 200 400 600 800 1000 1200

T (°C)

c a

(a) (b) Figura 5 – Representação gráfica - calor específico para: (a) aço e (b) concreto.

Outro parâmetro de interesse é condutividade térmica (λ), parâmetro que estabelece a razão com a qual o calor é conduzido para o interior do material em análise. A norma brasileira ABNT NBR14323:1999 disponibiliza valores para a condutividade térmica, em W/m°C, em função do tempo, para o aço e para o concreto, conforme Fig. 6a e Fig. 6b, respectivamente.

0

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0 200 400 600 800 1000 1200

T(°C)

λ a

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1

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0 200 400 600 800 1000 1200

T(°C)

λ a

(a) (b) Figura 6 – Representação gráfica - condutividade térmica para: (a) aço e (b) concreto.

É importante ressaltar que as informações disponibilizadas nas figuras 3, 4, 5 e 6 foram utilizadas (fornecidas ao ANSYS) nas análises realizadas no presente trabalho. Também foram adotados os seguintes valores: αc = 25 W/m2ºC (coeficiente de transferência de calor por convecção) e εr = 0,5 (emissividade resultante). É também importante destacar que a ABNT NBR14323:1999 recomenda o dimensionamento em situação de incêndio realizado por meio de resultados de ensaios, por meio de métodos avançado ou simplificado de dimensionamento. A modelagem numérica aqui desenvolvida, apresentada nos item que se seguem, se enquadra em métodos avançados.

3 MODELAGEM NUMÉRICA – PILARES MISTOS PREENCHIDOS

Para a modelagem numérica dos pilares mistos de seção circular preenchidos foi utilizado o pacote comercial ANSYS ® V9.0, o qual permite a análise transiente do gradiente térmico nos elementos estruturais, conforme descrito em Rigobello (2007). Foi realizada em campo tridimensional, conforme esquematiza a Fig. 7, modelando pilares mistos curtos com seções tubulares circulares de aço preenchidos com concreto submetidos ao incêndio-padrão.

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(a) (b)

Figura 7 – Esquematização da malha de elementos finitos utilizada: (a) tubo de aço e (b) núcleo de concreto.

A modelagem aqui proposta é feita com vistas a simular satisfatoriamente o comportamento estrutural, bem como a influência da elevação de temperatura na resistência e no confinamento desses mesmos elementos em situação de incêndio. A modelagem foi dividida em duas etapas: a análise térmica e aplicação do campo térmico no modelo numérico e, em seguida, análise termo-estrutural, com aplicação do carregamento (axial) juntamente com a influência da temperatura no comportamento dos materiais. Tomando como ponto de partida a análise em temperatura ambiente, foram utilizados valores de resultados experimentais apresentados em Oliveira (2008), os quais se referem a pilares mistos circulares preenchidos e servirão como valores de comparação (referência) para os resultados em temperaturas elevadas. As características do modelo experimental utilizado no presente trabalho, é aqui denominado PMC-19 e se refere a um pilar misto curto de seção circular preenchido com concreto, com relação D/t = 19 e com seguintes dimensões: ● D (diâmetro total) = 114 mm, t (espessura de chapa) = 6 mm e h (altura) = 343 mm; ● Resistência característica à compressão do concreto (fck = 32 MPa) ● Resistência ao escoamento do aço (fy = 343 MPa)

3.1 Elementos finitos adotados

Na elaboração dos modelos numéricos para a análise térmica se seguiu a mesma estratégia adotada em Rigobello (2007), em que foram utilizados dois tipos de elementos finitos: o SOLID70 para modelar o pilar misto de aço preenchido por concreto, e o SURF152, para aplicar ao modelo as condições de contorno respectivas à carga térmica (referente à convecção e à radiação). O SOLID70, apresentado na Fig. 8, é um elemento finito sólido que possui oito nós, com um grau de liberdade em cada nó, no caso, a temperatura. O SURF152, apresentado na Fig. 9, possui de quatro a nove nós, além de um nó extra para simular efeitos térmicos, todos com apenas um grau de liberdade, no caso, também a temperatura.

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Figura 8 – Elemento finito utilizado: SOLID70.

Figura 9 – Elemento finito utilizado: SURF152.

Na elaboração dos modelos numéricos para a análise termo-estrutural também se segue a mesma estratégia adotada em Rigobello (2007), em que foram utilizados quatro tipos de elementos finitos: o SOLID45 para modelar o tubo de aço, o SOLID185 para modelar o concreto, e os elementos de contato TARGE170 e CONTA174, para representar o contato entre os materiais aço e concreto. O SOLID45, apresentado na Fig. 10, possui oito nós, com três graus de liberdade, em cada nó, referentes às translações nas direções X, Y e Z (coordenadas globais). O SOLID185, apresentado na Fig. 11, possui oito nós, com três graus de liberdade, em cada nó, referentes às translações nas direções X, Y e Z (coordenadas globais), diferenciando-se do SOLID45 apenas por permitir simular materiais com características hipoelásticas e hiperelásticas, aspectos que não representam interesse no presente trabalho.

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Figura 10 – Elemento finito utilizado: SOLID45.

Figura 11 – Elemento finito utilizado: SOLID185.

O elemento finito TARGE170, ilustrado na Fig. 12, é um elemento finito tridimensional utilizado em conjunto com o elemento de contato CONTA174, ilustrado na Fig. 13, estes dois elementos apresentam as mesmas características, possuem oito nós, com três graus de liberdade por nó, referentes às translações nas direções X, Y e Z (coordenadas globais).

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Figura 12 – Elemento finito utilizado: SOLID185.

Figura 13 – Elemento finito utilizado: SOLID185.

3.2 Modelos constitutivos adotados

As relações constitutivas “σ x ε” adotadas para representar o comportamento dos materiais aço e concreto foram baseadas no EUROCODE. No caso do aço foi utilizado o EN 1993-1-2:2005, para temperaturas variando de 20 a 1100 ºC. A relação constitutiva adotada para o concreto foi adaptada daquela apresentada no EN 1992-1-1:2004, em que se considera como simplificação, regime plástico perfeito após a ruptura, tanto por tração quanto por compressão. A não consideração do “softening” se faz com vistas a evitar problemas de convergência nos modelos numéricos. A Fig. 14 esquematiza o diagrama “fy x ε” para o aço. A Fig. 15 e a Fig. 16 esquematizam os diagramas “fc x ε” para o concreto solicitado à tração e solicitado à compressão, respectivamente. Em

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todas as figuras citadas, elaboradas por meio do ANSYS, seguem a temperatura com unidade em oC e a tensão com unidade em N/m2.

Figura 14 – Relações “Tensão x Deformação” para aço, em função da temperatura.

Figura 15 – Relação “Tensão x Deformação” para o concreto tracionado em função da temperatura.

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Figura 16 – Relação “Tensão x Deformação” para o concreto comprimido, em função da temperatura.

3.3 Condições de contorno e de carregamento

Na face inferior (base) do modelo que representa o pilar misto curto os deslocamentos foram impedidos nas três direções (X, Y e Z), enquanto que na face superior foram permitidos apenas os deslocamentos na direção vertical (Z). Optou-se ainda por acoplar os nós da seção superior do pilar (na direção Z), possibilitando atribuir um nó de referência (chamado nó mestre). A força é aplicada no nó mestre, tal que todos os nós acoplados na seção apresentem o mesmo deslocamento. Nas direções (X e Y) os deslocamentos foram impedidos. O impedimento no deslocamento nas direções (X e Y) se fez com vistas a simular o forte atrito entre as faces do corpo-de-prova com os apoios, comumente observado nos experimentos realizados em laboratório.

4 ANÁLISE TÉRMICA – RESULTADOS OBTIDOS

O pacote computacional ANSYS é reconhecido pelo seu grande potencial quando aplicado em análises de interesse por meio da aplicação do Método dos Elementos Finitos. Porém, é importante ressaltar que o mesmo não foi construído especificamente para análise térmica, razão pela qual se faz necessária a validação dos seus resultados, em campo térmico, para uma adequada calibração e análise dos modelos de pilares a serem aqui analisados. Para a validação do campo térmico, o mesmo modelo de pilar misto foi analisado via ANSYS e via SuperTempCalc (TCD 5.5), em ambos os casos submetido ao incêndio padrão, bem como se adotando as mesmas propriedades térmicas, coeficiente de transferência de calor por convecção e emissividade resultante. A Fig. 17, extraída do ANSYS, e a Fig. 18, extraída do TCD representam a distribuição da temperatura na seção transversal do pilar misto, para um TRRF igual a 60 minutos. Na mesma Fig. 19 também pode ser visualizada a malha gerada pelo TCD para fins de análise térmica. Vale destacar que os resultados obtidos via TCD foram gentilmente cedidos por Valdir Pignatta e Silva, atualmente professor da Escola Politécnica da USP. Para comparação dos resultados obtidos entre ambos os programas, foram construídos dois gráficos referentes ao modelo numérico PMC-19, apresentados na Fig. 19 e na Fig. 20. A Fig. 19 representa a elevação da temperatura na seção transversal para tempos (TRF-Tempo de Resistência ao Fogo) iguais a 15 minutos, 30 minutos e 60 minutos, enquanto a Fig. 20 representa a elevação da temperatura em relação a alguns dos pontos da seção transversal, apresentados na Tabela. 1.

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Figura 17 – Distribuição da temperatura na seção transversal via ANSYS.

Figura 18 – Distribuição da temperatura na seção transversal via TCD.

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0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1000

0,000 0,010 0,020 0,030 0,040 0,050

Raio (m)

Tem

pera

tura

(°C

)

t=15min Ansys t=15min TCD t=30min Ansys t=30min TCD t=60min Ansys t=60min TCD

Figura 19 – Elevação da temperatura na seção transversal.

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1000

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60

Tempo (min.)

Tem

pera

tura

(°C

)

ISO 834 Ponto-1 Ansys Ponto-1 TCD Ponto-3 Ansys Ponto-3 TCDPonto-5 Ansys Ponto-5 TCD

Figura 20 – Elevação da temperatura nos pontos.

Tabela 1 – Pontos analisados na seção mista

Pontos Raio (cm) 1 0,0 3 35,7 5 57,0

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De acordo com a tabela 1, o ponto 1 está localizado no centro da seção transversal, o ponto 3 está localizado dentro do núcleo de concreto e o ponto 5 na face externa do tubo de aço. As Figuras 19 e 20 mostram que as curvas de temperatura extraídas do ANSYS e do TDC resultam muito próximas e, portanto, em concordância com as necessidades da análise termo-estrutural apresentada no item que segue.

5 ANÁLISE TERMO-ESTRUTURAL – RESULTADOS

A análise termo-estrutural (análise acoplada) consiste basicamente em aplicar uma carga axial de compressão no modelo de pilar misto curto e, após a aplicação do referido carregamento, acoplar o campo térmico, determinando o tempo de ruptura para a força aplicada, bem como determinar o deslocamento axial do pilar misto em função da elevação da temperatura. A análise acoplada que será realizada permite a determinação do “tempo crítico” (ou temperatura crítica) para cada nível de carregamento aplicado e, com isso, permitir apresentar uma dada curva referente ao fator de redução da força resistente do pilar misto curto, aqui definido pelo parâmetro KPM, obtido em função do tempo de incêndio. Na Fig. 21 está apresentado o gráfico de Deslocamento Axial x Tempo para vários níveis de carregamento aplicados, com o qual passa a ser possível determinar o tempo de ruptura do pilar misto para cada nível de carregamento e, com isso, construir o gráfico da curva de redução de resistência (KPM) para o Modelo - PMC-19.

PMC-19-A (M1.4)

-3

-2

-1

0

1

2

3

4

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55

Tempo (min.)

Des

loca

men

to (m

m)

F/Fu=15% F/Fu=30% F/Fu=45% F/Fu=60% F/Fu=75% F/Fu=90% F/Fu=95%

Figura 21 – Deslocamento x Tempo para vários níveis de carregamento aplicados no modelo PMC -19.

O tempo crítico (máximo) de exposição ao incêndio para cada nível de carregamento, a ser utilizado na construção futura do gráfico ‘KPM x Tempo’, foi adotado como sendo aquele correspondente ao último passo de carga alcançado quando do processamento do modelo numérico em análise. Como é possível observar nos gráficos da Fig. 21 para os últimos passos de carga, os valores de deslocamentos são praticamente assintóticos.

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Na Fig. 22 é apresentado um gráfico da relação de força crítica em incêndio (Fc,ti) com a força crítica em temperatura ambiente (Fc,ta), denominado fator de redução de força resistente (KPM) do elemento em situação de incêndio, conforme equação (2). Na mesma figura também são comparados os resultados obtidos pelo TCD, agora utilizado também para fins de análise termo-estrutural, com os resultados obtidos pelo ANSYS, permitindo a determinação do tempo de ruptura do pilar misto para um determinado nível de carregamento.

ta,c

ti,cPM F

F=K (2)

CURVA K - PMC-19-A

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

0 10 20 30 40 50 60

Tempo (min.)

Rel

ação

Fc,

ti/F c

,ta

TCD ANSYS

Figura 22 – Curva de redução de força resistente, para o Modelo PMC-19.

Figura 23 – Configuração deformada para níveis de deformação do modelo PMC-19, para KPM igual a 0,75 e tempo de exposição ao fogo igual a 17 minutos.

Rodrigo Tadeu dos Santos & Jorge Munaiar Neto

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A Fig. 23 apresenta a configuração deformada final para o Modelo 1: PMC-19 obtida via ANSYS, para KPM =0,75 e tempo de 17 minutos. Com base nos resultados obtidos e apresentados no gráfico da Fig. 22, se constata concordância bastante satisfatória dos resultados obtidos por meio do ANSYS, quando comparados àqueles obtidos por meio do programa TCD.

6 CONSIDERAÇÕES E CONCLUSÕES

O presente trabalho aborda o estudo de um modelo numérico de pilar misto curto de seção circular de aço preenchido com concreto em situação de incêndio, com o objetivo de avaliar a redução o efeito do confinamento, sempre presente nesse tipo de elemento misto. No modelo aqui proposto, foram considerados o acoplamento dos nós da face superior e a existência de elementos de contato entre ambos os materiais, bem como a não consideração de “gap” de ar na interface entre tubo de aço e núcleo de concreto. Primeiramente, com relação à análise térmica, a comparação dos resultados obtidos no ANSYS e no TCD se mostra bastante satisfatória, indicando a potencialidade do código ANSYS para a análise do campo térmico de pilares mistos, fato já constatado em estudos realizados em Rigobello (2007). A identificação do tempo crítico para os vários níveis de carregamento considerados possibilitou a construção da Curva de Redução de Força Resistente para o Modelo PMC-19, denominada curva KPM (determina o tempo de colapso do pilar misto em função do nível de carregamento aplicado). Nesse caso, os resultados obtidos pelas análises acopladas utilizando o ANSYS foram comparados com resultados obtidos via TCD, e resultaram praticamente coincidentes. Vale destacar que, nesta etapa, foi considerada carga térmica uniforme ao longo de todo o contorno da seção transversal do pilar analisado. Tendo em vista a boa representatividade da curva de redução de força resistente do elemento em situação de incêndio (curva KPM) do ANSYS, quando comparada com a curva do TCD, e sua fácil utilização, fica simples a determinação do tempo de ruptura para um determinado carregamento em situação de incêndio com a proposta de modelagem aqui sugerida. Tal aspecto ainda sugere o fato de as instabilidades locais não resultarem pronunciadas em pilares curtos, quando da análise dos modelos no ANSYS, tendo em vista o fato de o TCD não considerar este mesmo fenômeno em seu equacionamento. Diante do exposto pode-se afirmar que a proposta de modelagem numérica aqui apresentada, com o uso do pacote computacional ANSYS, mostra-se adequada para o estudo de modelos numéricos de pilares mistos curtos de seção circular de aço preenchido com concreto em situação de incêndio, quando empregada para a análise térmica e termo-estrutural.

7 AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao CNPq e ao Departamento de Engenharia de Estruturas pelo o auxílio e apoio à pesquisa aqui desenvolvida.

8 REFERÊNCIAS

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Modelagem numérica de pilares mistos curtos de seção circular de aço preenchido com concreto em situação...

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