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Série de Publicações ILSI Brasil Volume 1 Toxicologia e Avaliação do Risco Modo de Ação (MoA): Avanços Recentes e Aplicação Regulatória Força-tarefa Agroquímicos Comitê de Avaliação do Risco ILSI Brasil Maio 2015 Ligia Mesquita Sampaio do Amaral Planitox – The Science-based Toxicology Company

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Série de Publicações ILSI Brasil

Volume 1

Toxicologia e Avaliação do Risco

Modo de Ação (MoA): Avanços Recentes e

Aplicação Regulatória

Força-tarefa AgroquímicosComitê de Avaliação do Risco

ILSI BrasilMaio 2015

Ligia Mesquita Sampaio do AmaralPlanitox – The Science-based Toxicology Company

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Rua Hungria, 664 - conj.11301455-904 - São Paulo - SP - Brasil

Tel./Fax: 55 (11) 3035 5585 e-mail: [email protected]© 2014 ILSI Brasil International Life Sciences Institute do Brasil

ISBN: 978-85-86126-50-5

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1. INTRODUçãO

Por diversas décadas, o potencial cancerígeno de substâncias químicas para os homens foi identificado considerando principalmente os resultados dos estudos com animais de experimentação de longa duração. Como em todos os estudos com animais, algumas suposições fundamentais são feitas, permitindo, assim, a extrapolação dos resultados obtidos no estudo para a situação de exposição humana. Na ausência de informações contrárias, geralmente assume-se que os tumores observados, e o modo de ação (MOA) pelos quais esses tumores ocorrem em animais de experimentação, são relevantes para o homem e preditivos do câncer em humanos (COHEN et al., 2003; COHEN et al., 2004). O MOA é definido como a sequência de eventos-chave celulares e moleculares (parâmetros mensuráveis) que resultam em um efeito tóxico (SEED et al., 2005).

Embora essas suposições sejam válidas para muitas substâncias químicas, o progresso científico no entendimento do MOA cancerígeno, durante as últimas décadas, aperfeiçoou muito a habilidade de avaliar rigorosamente essas suposições para substâncias químicas específicas. Assim, na medida que a determinação dos MOAs de substâncias químicas que produziam neoplasias em animais evoluiu, tornou-se extremamente importante a avaliação da relevância desses MOAs para os humanos (COHEN et al., 2004).

Para endereçar esse assunto, em uma série de publicações científicas, uma abordagem estruturada para análise do MOA e da relevância da indução de tumores para os homens foi proposta pelo International Programme on Chemical Safety (IPCS), da Organização Mundial de Saúde (OMS), e pelo Risk Science Institute (RSI), do International Life Sciences Institute (COHEN et al., 2003; BOOBIS et al., 2008; MEEK et al., 2003). Uma série de documentos sobre a utilização das informações de MOA e sua relevância foi publicada pelo IPCS e pelo RSI entre 2001 e 2008 (BOOBIS et al., 2008).

Um modelo estruturado teórico (framework) geral para utilização da informação de MOA em animais para a avaliação do risco para a saúde humana foi proposto, considerando informações do MOA em animais e humanos para análise do peso da evidência, suportando a caracterização de substâncias químicas com potencial efeito cancerígeno em humanos (COHEN et al., 2003; MEEK et al., 2003).

A análise do MOA utiliza uma abordagem de avaliação pelo peso da evidência baseada nos critérios de causalidade de Bradford Hill. Seu objetivo é determinar se é possível estabelecer um MOA para uma resposta cancerígena observada em um estudo com animais de experimentação, através da aplicação da abordagem pelo peso de evidência, que requer a identificação dos eventos-chave no processo de formação do câncer. Quando um MOA é estabelecido em animais de experimentação, o modelo fornece uma ferramenta analítica que permite a análise transparente dos dados a fim de avaliar a relevância do MOA para o homem (BOOBIS et al., 2008).

Desde então, muitas agências de regulamentação e organizações internacionais consideram dados mecanicistas na avaliação de substâncias químicas. O conceito de MOA se provou extremamente válido para suportar certas decisões na avaliação do risco, como determinar se uma resposta particular

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em animais é relevante para a avaliação da saúde humana, definir exposições equivalentes entre as espécies e caracterizar a relações dose-resposta, como base para predizer o risco (CARMICHAEL et al., 2011).

Embora esse modelo tenha sido desenvolvido inicialmente para MOAs cancerígenos, atualmente reconhece-se sua ampla aplicação a todos os endpoints, como efeitos para a reprodução e para o desenvolvimento, efeitos neurotóxicos, entre outros (BOOBIS et al., 2008; SEED et al., 2005).

Nesse contexto, o objetivo desse workshop foi apresentar e discutir os avanços científicos recentes e a aplicação para regulamentação da utilização da abordagem de MOA, incluindo endpoints como oncogenicidade, efeitos endócrinos e para a reprodução.

1.1. Estrutura do evento

14 de abril de 2014

Sessão 1: Panorama de como o MoA é usado no contexto regulatório (1 h) – Dr. Douglas Wolf, Sygenta (USA)

Sessão 2: Patogênese do câncer e MoA de cancerígenos humanos (45 min) – Dr. João Lauro Viana de Camargo, Universidade Estadual Paulista (UNESP): Campus de Botucatu (Brasil)

Sessão 3: MoA e Toxicologia da Reprodução (1 h) – Dra. Ione Pelegatti Lemonica, Universidade Estadual Paulista (UNESP): Campus de Botucatu (Brasil)

Sessão 4: Discussão (30 min)

15 de abril de 2014

Sessão 1: MoA e Efeitos Endócrinos (45 min) – Dr. Anderson Joel Martino Andrade, Universidade Federal do Paraná (UFPR) (Brasil)

Sessão 2: Framework da Organização Mundial da Saúde / Programa Internacional de Segurança Química (International Programme on Chemical Safety - IPCS) (1 h) – Dra. Bette Meek, University of Ottawa (Canadá)

Sessão 3: Aplicação do IPCS MoA Framework para Reguladores (1 h) – Dr. Alan Boobis, Imperial College London (UK)

Sessão 4: MoA: Perspectivas e Limitações (20 min) – Dr. Flavio Zambrone, Instituto Brasileiro de Toxicologia (IBTox) (Brasil)

Sessão 5: Mesa Redonda: MoA, integração de dados e decisões regulatórias (3 h) – Palestrantes e Convidados (Dra. Elizabeth de Souza Nascimento – Sociedade Brasileira de Toxicologia e Ana Maria Vekic – Agência Nacional de Vigilância Sanitária)

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2. RESUMO DAS APRESENTAçõES

Panorama de como o MoA é usado no contexto regulatório – Dr. Douglas Wolf

Bioensaios em animais são padrão para detectar o potencial de efeitos adversos em humanos de produtos para os quais é esperado o uso ou a exposição humana. Para a maioria dos compostos, é tipicamente necessário extrapolar as informações obtidas em animais (dose e espécie) para predizer ou estimar o risco humano, visto que poucos agentes tem dados suficientes em humanos que suportem essas avaliações. Progressos significativos têm sido feitos nos últimos 25 anos no entendimento dos processos biológicos, modo de ação, de como os efeitos adversos à saúde ocorrem em humanos e animais. As avaliações do risco têm melhorado através do uso científico organizado de dados sobre a farmacocinética e a farmacodinâmica de agentes caracterizando as bases biológicas do desenvolvimento ou intensificação de uma doença após a exposição à substâncias químicas. A adoção de um modelo teórico estruturado (framework) de modo de ação está difundida e é comumente utilizada hoje por muitas agências de regulamentação e organizações internacionais. Para refinar e melhorar o processo de identificação do perigo, e evitar a atribuição de possíveis perigos para o homem à substancias inofensivas, se tornou imperativo que a análise do modo de ação seja a abordagem analítica padrão para fins de regulamentação e que os dados para suportar tal análise sejam coletados de maneira completa e cientificamente rigorosa. A U.S. Environmental Protection Agency (EPA) publicou o documento Guidelines for Carcinogen Risk Assessment, em 2005, que caracteriza a análise do modo de ação como a estrutura central da avaliação do risco do câncer humano. No entanto, o modo de ação foi utilizado por muitos anos, antes da publicação desse documento, para suportar decisões políticas e de regulamentação pelo U.S. EPA. Esta apresentação irá introduzir o conceito de modo de ação e como ele tem sido utilizado pela U.S. EPA para suportar decisões, e discutir oportunidades de melhoria da avaliação do risco a partir de novas abordagens e tecnologias que constroem o modelo teórico estruturado (framework) de avaliação do modo de ação.

Patogênese do câncer e MoA de cancerígenos humanos – Dr. João Lauro Viana de Camargo

O câncer humano inclui muitas doenças; a primeira etapa para a prevenção de cada uma delas é identificar sua “causa”. No entanto, a identificação das “causas” e/ou “fatores de risco” de um câncer humano específico não é uma tarefa fácil. O entendimento do modo de ação (MoA) e/ou dos mecanismos exercidos por supostos agentes cancerígenos pode esclarecer as “causas” e suportar mais adequadamente formas otimizadas para prevenir o processo cancerígeno. Embora geralmente entendidos como processos diferentes, visto que cada um ocorre em diferentes níveis de complexidade, tanto o MoA quanto os mecanismos se referem a eventos sucessivos ou processos que ocorrem em resposta a um estímulo inicial até a expressão definitiva da doença, isto é, um fenômeno historicamente chamado de patogênese. Durante as duas últimas décadas uma posição clara foi tomada pela comunidade científica mundial: considerar MoA e/ou mecanismos para caracterizar agentes carcinogênicos. Historicamente, a Agência Internacional para Pesquisa

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do Câncer (IARC) procurou classificar os cancerígenos de acordo com a força da evidência causal obtida de dados em humanos e animais, sem considerar criticamente os mecanismos de oncogenicidade; recentemente, no entanto, a IARC tem dado mais ênfase as informações mecanicistas para classificar os agentes cancerígenos. Com uma postura semelhante, um modelo teórico estruturado (framework) conveniente foi proposto durante a última década pelo IPCS/WHO e ILSI/RSI para identificar o MoA de substâncias químicas cancerígenas e avaliar a relevância para o homem dos resultados dos estudos em animais. Esta apresentação tem como objetivo estabelecer um contexto e fornecer um repertório para discussão de cancerígenos humanos de uma perspectiva de MoA/mecanismos. Utilizando agentes já classificados como cancerígenos humanos (Grupo 1 - IARC) como exemplo, são destacadas a complexidade do desenvolvimento do câncer humano e a contribuição dos estudos mecanicistas para entender a patogênese do câncer. Os estudos de MoA/mecanismos são ferramentas científicas inextricáveis apropriadas para a identificação de cancerígenos e para suportar medidas intervencionistas para prevenir o câncer.

MoA e Toxicologia da Reprodução – Dra. Ione Pelegatti Lemonica

Para a avaliação de estudos de toxicidade de químicos sobre a reprodução e sobre o desenvolvimento intrauterino de mamíferos é necessária uma série de considerações adicionais.

Isso se deve ao fato de que neste tipo de estudos vários fatores devem ser considerados e, além das características do químico em questão, devemos considerar sua passagem transplacentária, as características de ADME diferentes das encontradas nos demais testes de toxicidade, o lapso de tempo entre exposição e a avaliação do efeito e o fato de que os efeitos devem ser avaliados não somente no organismo exposto, mas também na prole exposta direta ou indiretamente.

O conhecimento do modo de ação através do qual o químico atua sobre o organismo exposto permite, entre outras, a escolha adequada das doses de exposição e dos animais-teste, a escolha dos possíveis órgãos alvo, a seleção de tecidos para análise bioquímica e/ou histopatológica e possibilita relacionar os efeitos observados com outros efeitos esperados. Além disso, esse conhecimento permite a previsão de respostas a químicos que agem através do mesmo modo de ação.

As condições peculiares dos estudos em reprodução requerem considerações importantes quando se usa o modo de ação do químico para a extrapolação dos dados para a espécie humana. Para isso, devemos avaliar se os eventos chave e os fatores como a cinética e a dinâmica para o animal teste são aceitáveis para o homem e se existem modos de ação alternativos para as diferentes espécies.

Da mesma forma, como a resposta do organismo exposto pode variar dependendo do estágio de desenvolvimento intra ou extrauterino é importante considerar que um MoA específico pode atuar em uma fase e ser inoperante em outra fase de seu desenvolvimento.

Contempladas essas considerações o conhecimento do modo de ação de um químico sobre os organismos expostos consiste numa importante ferramenta para que possamos avaliar o perigo de exposição, classificar a substância teste e extrapolar os resultados para o homem.

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MoA e Efeitos Endócrinos – Dr. Anderson Joel Martino Andrade

Grande parte das informações toxicológicas das substâncias químicas são obtidas a partir de estudos com animais experimentais. A elucidação do modo de ação de agentes químicos, incluindo daqueles com potencial de ocasionar efeitos adversos mediados por alterações endócrinas, é fundamental para a avaliação da relevância dos efeitos tóxicos para os seres humanos. Além disso, a determinação do modo de ação pode revelar a existência de períodos críticos para a indução de determinados efeitos, alguns deles com diferenças importantes entre espécies animais, bem como possibilitar a identificação de eventuais subpopulações especialmente suscetíveis, como indivíduos com predisposições genéticas que favoreçam o surgimento de determinados efeitos tóxicos. Na presente apresentação serão abordados dois exemplos de aplicação da investigação do modo de ação na avaliação de efeitos tóxicos relacionados ao sistema endócrino – os efeitos anti-androgênicos do fungicida vinclozolin e a toxicidade reprodutiva e do desenvolvimento de “ftalatos ativos” em machos.

Framework da Organização Mundial da Saúde / Programa Internacional de Segurança Química (International Programme on Chemical Safety - IPCS) – Dra. Bette Meek

Modelos teóricos para considerar sistematicamente o peso da evidência para modos de ação hipotéticos em animais e sua relevância para o homem promoveram transparência na caracterização do perigo e na análise da relação dose-resposta. Esses modelos também incentivam considerações antecipadas de dados mecanicistas para permitir maior previsibilidade na avaliação do risco, facilitando a obtenção de dados, revisão e identificação de necessidades críticas de investigação. O uso interativo de tais modelos tem sido útil na integração da pesquisa e avaliação e na transição para o uso de dados de modo mais progressivo e preditivo de estratégias de estudos baseados no modo de ação. O modelo teórico estruturado de modo de ação e relevância humana da World Health Organization/International Programme on Chemical Safety (MOA/HR) foi recentemente atualizado para refletir a evolução da experiência na sua aplicação e para incorporar desenvolvimentos recentes nos estudos de toxicidade e métodos não experimentais. O modelo modificado é incorporado em um roteiro interativo, incentivando o refinamento contínuo da formulação do problema, estratégias de estudos baseados no modo de ação e avaliação do risco. Isso inclui a aplicação tradicional na qual o resultado da exposição à substância química é conhecido, ou em efeitos potenciais hipotéticos, baseado em eventos-chave para o estabelecimento de modos de ação a partir de evidências apropriadas em sistemas in vitro ou in silico, ou outras. Além de esclarecer a terminologia relacionada aos termos essencialmente conceituais de modo de ação e vias de respostas adversas (adverse outcome pathways), as considerações de Bradford Hill foram adicionalmente articuladas como base para simplificar sua aplicação ao considerar a avaliação pelo peso da evidência para modos de ação hipotéticos. Também foram desenvolvidos padrões para extensão da tabela de concordância entre as espécies no modelo estruturado teórico (framework) original para análise da relação dose-resposta e avaliações comparativas do peso

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da evidência e incertezas associadas para diversos modos de ação baseados nas considerações simplificadas de Bradford Hill. Mais recentemente, considerações sobre o peso da evidência para MOAs hipotéticos foram adicionalmente desenvolvidos em consideração as vias de respostas adversas (adverse outcome pathways) no programa da Organization for Economic Cooperation and Development (OECD).

Aplicação do IPCS MoA Framework para Reguladores – Dr. Alan Boobis

A avaliação do risco de substâncias químicas é atualmente baseada primariamente nos resultados dos estudos conduzidos com animais de experimentação. Nesses estudos, a duração da exposição é de aguda a crônica e os efeitos potenciais de preocupação incluem toxicidade sistêmica, toxicidade reprodutiva e carcinogenicidade. O modelo estruturado teórico (framework) IPCS MOA-HRF para análise de modos de ação cancerígenos e não cancerígenos fornece um meio sistemático e transparente de organizar todas as informações pertinentes na avaliação da relevância de tais efeitos para o homem. Até o momento, o modelo tem sido usado na maioria na avaliação de MOAs para carcinogenicidade. No entanto, sua aplicação está se tornando cada vez mais ampla em escopo e a experiência sugere que é aplicável a uma grande variedade de endpoints. O modelo teórico estruturado (framework) do IPCS primeiramente permite conhecer coerentemente se um modo de ação pode ser estabelecido para um determinado efeito adverso. Se assim for, o modelo pode ser útil para excluir a relevância do MOA para humanos, com base em diferenças qualitativas biológicas fundamentais ou diferenças quantitativas profundas na toxicocinética e toxicodinâmica. Embora possa não ser possível descartar a relevância de um efeito, o modelo teórico estruturado (framework) pode fornecer as bases para extrapolação da relação dose-resposta considerando as características da substância química. Informações do modo de ação são também inestimáveis na avaliação do risco da exposição combinada à substâncias químicas, para categorizar substâncias químicas para utilização em métodos comparativos por interpolação (read-across) e para o desenvolvimento de métodos não experimentais para priorizar a condução de testes direcionados para um grande número de substâncias químicas com dados escassos. A demonstração do modo de ação e o estabelecimento da sua relevância requerem um argumento razoável baseado na demonstração dos eventos chaves. Estas aplicações serão ilustradas utilizando estudos de caso. A principal razão para os modos de ação propostos não serem aceitos por agências de regulamentação é a deficiência em fornecer o conjunto de dados analisado pelo modelo adequado.

MoA: Perspectivas e Limitações – Dr. Flavio Zambrone

Considerando todas as apresentações feitas durante o evento, as perspectivas e limitações da utilização da abordagem de MOA foram pontuadas. As necessidades científicas atuais para utilização dessa abordagem para fins de regulamentação contemplam princípios antigos que ainda se mostram atuais, como, por exemplo, os critérios para atribuição de associação ou causalidade em epidemiologia, descritos por Bradford Hill em 1965. O modelo proposto para utilização de

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MOA deve ser considerado uma ferramenta para a tomada de decisão de regulamentação durante o processo de avaliação do risco. Uma vez que as informações relevantes estejam disponíveis, considerando a evolução da ciência, as mesmas devem ser utilizadas criteriosamente pelas agências de regulamentação. As dificuldades e as incertezas científicas nesse processo devem ser conhecidas e estudadas, no entanto, estas não devem impossibilitar a utilização de tal abordagem, sendo que os limites da regulamentação devem ser os limites da preocupação toxicológica.

3. DISCUSSõES, CONCLUSõES E RECOMENDAçõES

• O conceito de MOA se provou extremamente válido e uma ferramenta essencial para suportar o processo de avaliação do risco, melhorando a tomada de decisão para a regulamentação, com uma diversidade de aplicações, embora grande parte das substâncias químicas ainda seja avaliada considerando as suposições padrão.

• O modelo estruturado teórico (framework) proposto inicialmente, continua a evoluir à medida que aumenta a experiência na sua aplicação, considerando a abordagem pelo peso da evidência e o desenvolvimento de métodos para avaliação da toxicidade.

• O modelo foi recentemente atualizado para refletir uma evolução, baseada na experiência de sua aplicação e para incorporar desenvolvimentos recentes na maneira de avaliar a toxicidade das substâncias químicas, incluindo métodos experimentais e não experimentais. O modelo modificado encoraja o refinamento contínuo da formulação do problema, das estratégias de teste baseadas na avaliação do modo de ação e da avaliação do risco.

• Os estudos padrão de toxicidade normalmente não fornecem informações relevantes para suportar a análise de modo de ação. Assim, a necessidade de investigação dos modos de ação deve contribuir para o desenvolvimento de novas metodologias e tecnologias (toxicogenômica, bioinformática, toxicologia computacional, QSAR, etc.), assim como para a redução, refinamento e substituição de animais de experimentação, vindo de encontro aos esforços internacionais para desenvolver estratégias alternativas aos estudos de toxicidade em animais experimentais (in vitro).

• Inicialmente delineado para a avaliação de efeitos cancerígenos, o modelo (framework) é uma ferramenta útil também para avaliar o MOA de qualquer efeito tóxico. Estudos de caso de substâncias que causam efeitos endócrinos, para a reprodução e para o desenvolvimento e neurotóxicos foram apresentados nesse evento, mostrando, assim, a aplicabilidade do modelo para outros endpoints que não somente os efeitos cancerígenos.

• Existe a necessidade de aumentar a utilização do conceito de MOA para efeitos cancerígenos e não cancerígenos, com a identificação dos eventos-chave em animais e a relevância para os humanos. Atualmente, somente uma pequena parte das substâncias químicas possui o MOA esclarecido. Isso requer esforços conjuntos de todos os envolvidos, reguladores, academia e indústria.

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• Diversas agências e organismos internacionais (U.S. EPA, EFSA, Health Canadá, OMS) têm incorporado a abordagem do MOA durante o processo de avaliação do risco de diversos tipos de produtos, como praguicidas, cosméticos e medicamentos. Essa abordagem é utilizada como parte da avaliação pelo peso da evidência nas decisões para regulamentação. Em muitos casos, a aplicação da abordagem de MOA, considerando a relevância humana, têm levado a conclusões de ausência de risco para a exposição humana à determinadas substâncias químicas que causam respostas em animais não relevantes para o homem.

• Considerando a regulamentação de praguicidas no Brasil, embora o princípio de MOA tenha uma aceitação pela agência de regulamentação, não está claro em qual extensão esses dados serão aceitos e como serão analisados. A agência de regulamentação brasileira ressaltou que a avaliação considerando esses dados pode esbarrar nos requerimentos legais, visto que a legislação para esses produtos prevê um critério de corte. Além disso, a agência gostaria de participar da estruturação da hipótese do MOA e da estratégia de testes para avaliação dessa hipótese para praguicidas.

• É necessária mais clareza, transparência e organização na apresentação dos dados de MOA para as agências de regulamentação, incluindo a agência brasileira, facilitando o entendimento do dossiê de estudos como um todo. Diferenças no entendimento do MOA proposto, metodologias utilizadas e resultados obtidos nos estudos experimentais podem gerar avaliações diferentes entre as agências de regulamentação. Dessa forma, deve ser dada especial ênfase no treinamento e educação apropriada de todos os envolvidos, academia, indústria e reguladores.

• Novos temas para eventos futuros puderam ser obtidos desse evento, como esclarecimento de conceitos e utilização da abordagem de MOA; aplicação para regulamentação considerando áreas específicas; e utilização dessa abordagem frente as critérios de corte impostos para algumas substâncias químicas.

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4. REFERÊNCIAS

BOOBIS, A. R.; DOE, J. E.; HEINRICH-HIRSCH, B.; MEEK, M. E.; MUNN, S.; RUCHIRAWAT, M.; SCHLATTER, J.; SEED, J.; VICKERS, C. IPCS Framework for Analyzing the Relevance of Noncancer Mode of Action for Humans. Critical Reviews in Toxicology, v. 38, p. 87-96, 2008.

CARMICHAEL, N.; BAUSEN, M.; BOOBIS, A. R.; COHEN, S. M.; EMBRY, M.; FRUIJTIER-POLLOTH, C.; GREIM, H.; LEWIS, R.; MEEK, M. E.; MELLOR, H.; VICKERS, C.; DOE, J. Using mode of action information to improve regulatory decision-making: Na ECETOC/ILSI RF/HESI workshop overview. Critical Reviews in Toxicology, v. 41, n. 3, p. 175-186, 2011.

COHEN, S. M.; KLAUNIG, J. E.; MEEK, M. E.; HILL, R. N.; PASTOOR, T.; LEHMAN-MCKEENAN, L.; BUCHER, J.; LONGFELLOW, D. G.; SEED, J.; DELLARCO, V.; FENNER-CRISP, P. A.; PATTON, D. Evaluating the Human Relevance of Chemically Induced Animal Tumors. Toxicological Sciences, v. 78, p. 181-186, 2004.

COHEN, S. M.; MEEK, M. E.; KLAUNIG, J. E.; PATTON, D. E.; FENNER-CRISP, P. A. The Human Relevance of Information on Carcinogenic Modes of Action: Overview. Critical Reviews in Toxicology, v. 33, n. 6, p. 581-589, 2003.

MEEK, M. E.; BUCHER, J. R.; COHEN, S. M.; DELLARCO, V.; HILL, R. N.; LEHMAN-MCKEENAN, L. D.; LONGFELLOW, D. G.; PASTOOR, T.; SEED, J.; PATTON, D. E. A Framework for Human Relevance Analysis of Information on Carcinogenic Modes of Action. Critical Reviews in Toxicology, v. 33, n. 6, p. 591-653, 2003.

SEED, J.; CARNEY, E. W.; CORLEY, R. A.; CROFTON, K. M.; DESESSO, J. M.; FOSTER, P. M. D.; KAVLOCK, R.; KIMMEL, G.; KLAUNIG, J.; MEEK, M. E.; PRESTON, R. J.; SLIKKLER JR., W.; TABACOVA, S.; WILLIAMS, G. M. Overview: Using Mode of Action and Life Stage Information to Evaluate the Human Relevance of Animal Toxicity Data. Critical Reviews in Toxicology, v. 35, p. 663-672, 2005.

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