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Módulo V – Adaptação às Alterações Climáticas · pela sua variabilidade e por forçamentos (ver parte I do manual do módulo II) e, por outro, pelos processos socioeconómicos

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Projeto:

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Índice

1 SUMÁRIO ............................................................................................................................... 1

2 ENQUADRAMENTO GERAL .................................................................................................... 2

3 O QUE É A ADAPTAÇÃO ÀS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS? ....................................................... 3

3.1 Medidas de adaptação às alterações climáticas ........................................................... 5

3.2 Mecanismos de adaptação às alterações climáticas ..................................................... 9

4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................... 11

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1 SUMÁRIO

Todas as evidências apontam para o contínuo aumento da temperatura média

global da superfície terrestre, durante o século XXI. Assim, nações por todo o mundo

precisam de investir, quer na mitigação das emissões de gases com efeito de estufa

quer na adaptação às consequências das alterações climáticas globais em curso e que

não se podem evitar. A adaptação consiste no ajustamento de sistemas naturais ou

humanos a estímulos climáticos, no sentido de reduzir danos ou de explorar

oportunidades benéficas. A adaptação pode assumir um caráter preventivo, quando se

adotam medidas antes de serem observados os efeitos das alterações climáticas, ou

simplesmente curativo, se as medidas a adotar vierem a ser implementadas depois da

ocorrência daqueles efeitos. As medidas, ou respostas, de adaptação estão

intimamente ligadas à identificação e análise dos perigos, riscos, vulnerabilidade e

exposição associados aos sistemas afetados. Neste contexto, o perigo é o potencial

para ocorrer um acontecimento relacionado com o clima que pode causar danos

humanos, sociais ou naturais. O risco é o potencial de ocorrência de consequências

para algo de valor, decorrentes de algum evento, sendo que tais consequências são

incertas. A exposição consiste na presença de pessoas, meios de subsistência,

ecossistemas, infraestruturas e recursos em locais que podem ser afetados

adversamente. Já a vulnerabilidade é a propensão de um sistema natural ou humano a

ser afetado desfavoravelmente por um evento ou tendência climática de risco, onde

entram em interação características como a sensibilidade ou suscetibilidade a

determinado dano e a capacidade em lidar com o (e adaptar-se ao) dano causado.

Uma adaptação de sucesso é influenciada pela resiliência do sistema em ajustar-se,

isto é, pela sua capacidade em lidar com eventos ou tendências de risco, respondendo

ou reorganizando-se de forma a manter as suas funções, identidades e estruturas

essenciais. Existem medidas de adaptação em todos os setores de atividade humana.

As melhores respostas de adaptação parecem ser aquelas que abrangem vários

setores, promovem a capacidade adaptativa dos indivíduos e/ou sistemas e são

implementadas numa lógica de desenvolvimento sustentável.

Palavras-chave: adaptação, perigo, risco, risco climático, exposição, vulnerabilidade,

sensibilidade, resiliência

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2 ENQUADRAMENTO GERAL

Adaptação e mitigação são estratégias complementares de combate às alterações

climáticas para as quais nações de todo o mundo estão a direcionar intensos esforços.

Isto porque todas as evidências apontam para o contínuo aumento da temperatura

média global da superfície terrestre, durante o século XXI (IPCC, 2014a). Por tal, já não

se trata de parar as alterações climáticas, mas sim de abrandá-las, reduzindo

drasticamente as emissões antropogénicas de gases com efeito de estufa. Além disso,

será ainda necessário implementar medidas, ou respostas, de adaptação para lidar

com os impactes provocados pelo aquecimento que já não podem ser evitados.

Em módulos anteriores, esclarecemos conceitos fundamentais: causas (ver parte I

do manual do módulo II), impactes (ver parte I do manual do módulo III) e propostas

de mitigação (ver parte I do manual do módulo IV) das alterações climáticas. O

presente manual foca o enquadramento científico e as propostas que a literatura

recomenda para a adaptação dos sistemas naturais e humanos ao novo sistema

climático terrestre e às mudanças que ele produz.

Continuando a lógica de manuais de módulos anteriores, também neste

continuamos a recorrer às publicações do Intergovernmental Panel On Climate

Change1 (IPCC), entidade que analisa e sintetiza as evidências acumuladas pela

comunidade científica em relação às alterações climáticas. Muitas das sínteses aqui

apresentadas baseiam-se nos relatórios do segundo grupo de trabalho da quinta

avaliação do IPCC, publicada em 2014, sobre adaptação, impactes e vulnerabilidade

dos sistemas.

Iniciamos este manual com uma secção que equaciona o conceito de adaptação

em conjunto com os de perigo, risco, exposição, vulnerabilidade e resiliência.

Passamos, em seguida, a uma síntese das principais características de respostas de

adaptação em curso ou em desenvolvimento, com alguns exemplos por setor chave.

Concluímos com uma breve apresentação de alguns mecanismos internacionais e

nacionais que enquadram as respostas de adaptação.

1 Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas.

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3 O QUE É A ADAPTAÇÃO ÀS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS?

O segundo grupo do IPCC, na sua quinta avaliação (2014b), define adaptação como

o ajustamento de sistemas naturais ou humanos a estímulos climáticos, verificados ou

projetados, reduzindo danos ou explorando oportunidades benéficas. Muitos sistemas

naturais acabam por adaptar-se autonomamente, a longo prazo, mas podem ver

facilitada essa adaptação, com intervenção humana adequada. O efeito dessa

intervenção dependerá da capacidade de adaptação do sistema (incluindo instituições,

seres humanos e outros seres vivos), isto é, da sua capacidade em ajustar-se a um

determinado estímulo climático, aproveitando a oportunidade de transformação ou

respondendo às consequências (IPCC, 2014a). Dependendo do momento em que uma

medida de adaptação é implementada, esta pode assumir um caráter preventivo ou

curativo, numa nomenclatura adotada da área da saúde pública (WHO, 2013). A

adaptação preventiva2 é levada a cabo antes da ocorrência dos impactes projetados

das alterações climáticas, no sentido de prevenir as suas consequências. A adaptação

curativa3 ocorre depois de se sentirem os impactes das alterações climáticas.

Na proposta e análise de possíveis respostas de adaptação aos impactes das

alterações climáticas, a avaliação de perigos e de riscos reveste-se de especial

importância. Neste contexto, perigo é o potencial para ocorrer um acontecimento

relacionado com o clima, de origem natural ou humana, que pode causar danos a

nível: 1) humano, ou seja, mortes, ferimentos ou outros problemas de saúde, 2) social,

isto é, perdas ou danos de infraestruturas, bens, serviços, meios de subsistência e

recursos naturais, 3) natural, ou seja, nos ecossistemas. Já risco refere-se ao potencial

de ocorrência de consequências para algo de valor, decorrentes de algum evento ou

tendência, sendo que tais consequências são incertas. O risco de impactes

relacionados com eventos meteorológicos ou climáticos extremos tem sido

identificado como risco climático e resulta da interação desses eventos com a

vulnerabilidade e exposição dos sistemas naturais e humanos.

2 Também identificada na literatura como antecipatória ou proativa (Adger et al., 2007; Smit, Burton,

Klein & Wandel, 2000). 3 Também identificada na literatura como reativa ou responsiva (Adger et al., 2007; Smit, Burton, Klein

& Wandel, 2000).

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A exposição consiste na presença de pessoas, meios de subsistência, ecossistemas,

infraestruturas e recursos (biológicos, geológicos, económicos, sociais e culturais) em

locais ou instalações com risco de serem afetados adversamente. Já a vulnerabilidade

é a propensão de um sistema, natural ou humano, para ser afetado desfavoravelmente

por um evento ou tendência climática de risco. Na vulnerabilidade, entram em

interação características como a sensibilidade ou suscetibilidade do sistema a

determinado dano, bem como a capacidade ou incapacidade desse sistema em lidar

com o (e adaptar-se ao) dano causado (IPCC, 2014c). Um primeiro passo para a

adaptação dos sistemas a diferentes cenários climáticos envolve reduzir a

vulnerabilidade e a exposição dos sistemas à variabilidade climática atual (PNUD,

2014).

Ações de adaptação de sucesso são, ainda, influenciadas pela resiliência dos

sistemas, isto é, pela sua capacidade para lidar com eventos, tendências ou distúrbios

perigosos, respondendo ou reorganizando-se de forma a manter as suas funções,

identidades e estruturas essenciais, mantendo também a capacidade de adaptação,

aprendizagem e transformação (IPCC, 2014c).

Como evidencia a figura 1, impacte, risco, perigo, vulnerabilidade e exposição são

componentes de uma engrenagem fortemente movimentada, por um lado, pelo clima,

pela sua variabilidade e por forçamentos (ver parte I do manual do módulo II) e, por

outro, pelos processos socioeconómicos que possibilitam as respostas humanas de

adaptação (IPCC, 2014b) e de mitigação (ver parte I do manual do módulo IV).

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Figura 1 – O risco de ocorrência de impactes relacionados com o clima resulta da interação de perigos

associados ao clima com a vulnerabilidade e exposição de sistemas, naturais e humanos. Mudanças no

sistema do clima (esquerda) e em processos socioeconómicos, incluindo em medidas de adaptação e de

mitigação (direita), influenciam a existência de perigos, exposição e vulnerabilidade (IPCC, 2014b, p. 3).

Para países de todos os níveis de desenvolvimento, impactes muito significativos,

generalizados e irreversíveis coincidem com uma significativa falta de preparação em

alguns setores para a variabilidade climática atual (IPCC, 2014b). Por exemplo, na

Europa, onde se encontram vários países desenvolvidos, eventos meteorológicos

extremos, como as ondas de calor e os nevões, têm tido impactes significativos em

múltiplos setores económicos, bem como efeitos sociais adversos (por exemplo,

efeitos na saúde pública) (Field et al., 2014). A Europa revela, desse modo, uma

adaptação insuficiente nos setores afetados.

3.1 Medidas de adaptação às alterações climáticas

O potencial de redução de riscos climáticos, na base da seleção de medidas de

adaptação, varia com a região, o seu contexto, as suas vulnerabilidades, a sua gestão

de riscos climáticos, a sua proatividade no planeamento e, por fim, com o setor de

atividade humana considerado. Contudo, as ações de adaptação podem aumentar a

emissão de GEE, como o aumento do uso de ar condicionado, que utiliza eletricidade

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gerada a partir da queima de combustíveis fósseis, em resposta ao aumento da

temperatura ambiente. Ao mesmo tempo, as medidas de mitigação podem limitar a

adaptação dos sistemas, como o uso de solo para fazer crescer culturas destinadas à

produção de bioenergia, com impactes negativos nos ecossistemas. Nesta ótica, as

respostas de adaptação estão necessariamente ligadas às respostas de mitigação e

devem ser pensadas de forma a promoverem sinergias, compromissos significativos e

benefícios partilhados.

O planeamento e implementação de uma estratégia de adaptação deve passar

pelas seguintes fases (UNDP, 2004; IPCC, 2014b; IPCC, 2012):

1 – Identificar impactes observados e projetados de eventos ou alterações

climáticas num determinado local ou região.

2 – Avaliar a exposição e as vulnerabilidades das comunidades e sistemas naturais

que se situam na região sujeita a risco climático.

3 – Selecionar a estratégia de adaptação de acordo com os valores sociais,

objetivos e perceções de risco das comunidades.

As respostas de adaptação devem ser, também, escolhidas e implementadas numa

lógica de desenvolvimento sustentável o que, a longo prazo, aumenta a probabilidade

de as comunidades e sistemas desenvolverem respostas mais adequadas e uma

preparação reforçada para futuras alterações climáticas (IPCC, 2014a).

Outros critérios a termos em conta na escolha das medidas de adaptação são a sua

eficácia e os seus custos. Por exemplo, o IPCC (2014a) reuniu evidências de que a

eficácia da resposta de adaptação sai reforçada se se investir no desenvolvimento da

capacidade adaptativa das comunidades e sistemas afetados. Adicionalmente, parece

ser importante integrar formas de conhecimento e práticas indígenas, locais ou

tradicionais nas respostas de adaptação dos seus detentores que, muitas vezes, são

comunidades mais vulneráveis às alterações climáticas. Nesta matéria, evidências

apontam para o facto de que, se estas populações forem envolvidas precocemente na

escolha e implementação de respostas de adaptação, os seus custos podem ser

reduzidos aumentando, assim, a probabilidade de serem compatíveis com uma via de

desenvolvimento sustentável (IPCC, 2014a). Existem também evidências de que as

medidas de adaptação mais eficazes e mais aptas a promover um desenvolvimento

sustentável, envolvem a transformação de situações económicas, sociais, tecnológicas

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e políticas, mais do que pequenas mudanças que mantenham a essência e integridade

dos sistemas, processos ou instituições.

Existem medidas de adaptação em todos os setores de atividade humana, dos

quais alguns exemplos são ilustrados na tabela 1.

Tabela 1 – Exemplos de medidas de adaptação por setor de atividade humana (adaptado de IPCC, 2014a).

Exemplos de medidas de adaptação

Agricultura, pescas e produção de alimentos

- Desenvolver variedades de culturas adaptadas a novas taxas de dióxido de carbono (CO2),

temperatura e precipitação (por exemplo., resistentes a períodos de seca);

- implementar sistemas de rega mais eficientes;

- reforçar a capacidade de gestão de risco das culturas existentes;

- compensar economicamente os proprietários pelas alterações nos usos dos solos;

- melhorar o apoio financeiro a culturas de pequena escala;

- expandir mercados agrícolas;

- disponibilizar respostas tecnológicas avançadas (como sistemas mais seguros de armazenamento e

de preservação de alimentos ou sistemas de rápida translocação de atividades piscatórias industriais

para locais não afetados pelas alterações climáticas).

Saúde

- Melhorar o acesso a água potável e a saneamento básico;

- expandir a vacinação e serviços de apoio à saúde materna e infantil;

- aumentar a capacidade de resposta a desastres naturais;

- estabelecer sistemas eficazes de alertas de saúde.

Ordenamento de território

- Planear zonas urbanas com o intuito de reduzir as pressões do stress térmico;

- gerir áreas propensas a inundações e outros riscos;

- reformular leis para ocupação de terrenos, incluindo áreas protegidas;

- melhorar as infraestruturas de transportes.

Pobreza, desigualdades e conflitos

- Melhorar o acesso à educação, à alimentação, aos serviços de saúde, à energia, à habitação segura e

às estruturas de apoio, bem como a qualidade das mesmas;

- desenvolver programas de redução das desigualdades de género e outras formas de exclusão;

- aumentar o acesso das populações a recursos locais e do seu controlo;

- reduzir os riscos de desastres;

- disponibilizar redes de segurança social e de esquemas de seguros;

- diversificar e disponibilizar meios de rendimento e de subsistência;

- melhorar o acesso a tecnologias e a fóruns de tomadas de decisão sobre o seu desenvolvimento e

utilização.

Muitas das medidas enunciadas na tabela têm-se tornado parte integrante de

políticas públicas e privadas em regiões de todo o mundo, particularmente no que diz

respeito a programas de gestão de risco, de recursos hídricos e de adoção de algumas

opções tecnológicas já disponíveis (como o uso de sistemas de observação e de alertas

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climáticos mais eficazes). Contudo, existem poucas evidências que comprovem a sua

efetiva implementação e os seus efeitos na real redução da vulnerabilidade e

exposição dos ecossistemas e comunidades em risco (IPCC, 2014b). O seu adiamento

acarreta consequências, pois mesmo as medidas com caráter preventivo, quanto mais

tarde forem implementadas, serão tanto menos preventivas quanto mais curativas.

Em Portugal, no âmbito do projeto SIAM II4, em reação à projeção da diminuição

da produtividade de culturas de trigo, milho e arroz, sugeriu-se o desenvolvimento de

culturas resistentes à seca e mudanças no período de plantação (Miranda & Moita,

2006; Pinto, Braga & Brandão, 2006). Mais tarde, já no âmbito da avaliação da

Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas (ENAAC), foi sugerida a

necessidade de envolver todos os agentes do setor da agricultura e florestas nas

respostas de adaptação implementadas, de acordo com a respetiva natureza e

responsabilidades (APA, 2013), aumentando e transferindo o conhecimento entre tais

agentes.

No que concerne aos recursos hídricos, Portugal é especialmente vulnerável a

secas no verão, com consequências no caudal dos cursos de água e mesmo na sua

contaminação, por exemplo, devido à salinização da água subterrânea (Cunha et al.,

2006). Assim, recomenda-se uma gestão da água que tenha em conta a mudança de

cenários climáticos, a utilização de tecnologias, como a de purificação da água, e o

consumo mais eficiente da água. Na avaliação de 2013 da ENAAC (APA, 2013),

vulnerabilidades semelhantes voltaram a ser identificadas, pelo que se reforçou a

necessidade de implementação das medidas de adaptação, já antes referidas, bem

como do aumento da capacidade de armazenamento e de regularização do

escoamento, do controlo do risco de cheias e da qualidade no abastecimento à

população.

As secas em Portugal deixam o país também mais vulnerável em termos de saúde,

isto é, ao aparecimento de certas doenças, como o esgotamento por calor e certas

doenças infeciosas (Calheiros & Casimiro, 2006), pelo que se tem recomendado uma

aposta em programas de monitorização de parasitas e outros vetores de doenças e,

4 O SIAM II corresponde à segunda fase do projeto Climate Change in Portugal. Scenarios, Impacts and Adaptation Measures, decorrida de 2002 a 2006, que visava avaliar os impactes e medidas de adaptação às alterações climáticas em Portugal Continental, de forma integrada. Para mais informação, consultar http://siam.fc.ul.pt/.

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ainda, em programas de vigilância. Em 2013, essa aposta foi reforçada, salientando-se

também a importância de melhorar o sistema de previsão, alerta e resposta a eventos

extremos, como ondas de calor.

3.2 Mecanismos de adaptação às alterações climáticas

A adaptação foca, primeiramente, resultados ao nível local ou regional. Mas a sua

eficácia pode ser aumentada através da coordenação de governos que promova a

cooperação internacional (IPCC, 2014a). Pese embora, tal como a mitigação, a

adaptação já fosse considerada na United Nations Framework Convention on Climate

Change (UNFCCC) e no Protocolo de Quioto (ver manual da componente científica do

Módulo IV), a cooperação internacional para a adaptação tem vindo a surgir mais

lentamente, e com menos recursos financeiros disponíveis, do que a que surgiu para a

mitigação. Todavia, o investimento na adaptação tem vindo a crescer

substancialmente nos últimos anos, particularmente depois da quarta avaliação do

IPCC (2014a). Em parte, isto deveu-se ao impulso dos Acordos de Cancún (2010), para

a criação do Quadro de Adaptação de Cancún, que foca as respostas de adaptação aos

impactes das alterações climáticas, particularmente nos países mais vulneráveis. A

adaptação às alterações climáticas voltou a ser abordada na Conferência de Varsóvia,

dando origem ao Mecanismo de Perdas e Danos, a iniciar em 2016. Importa salientar

que, ao contrário das ações de mitigação, as ações de adaptação têm vindo a ser

implementadas mais ao nível nacional, regional e local, do que ao nível internacional.

Nesta matéria, os governos nacionais desempenham papéis chave no planeamento,

implementação e monitorização de medidas de adaptação, através da coordenação de

ações e no fornecimento de enquadramentos e apoios. Assim, Portugal desenvolveu a

ENAAC, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º24/2010, de 1 de Abril, a

qual tem sido avaliada anualmente. Essa estratégia enquadrou ações que têm vindo a

ser implementadas em nove setores estratégicos: ordenamento do território e

cidades, recursos hídricos, segurança de pessoas e bens, saúde humana, energia e

indústria, turismo, agricultura, florestas e pescas, zonas costeiras, e biodiversidade.

Programas como o AdaPT (financiado pelo EEA Grants) e o Fundo Português do

Carbono são importantes instrumentos que tornam possível a implementação de

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medidas naqueles setores (APA, 2014). Indo ao encontro das recomendações do IPCC,

a avaliação da primeira fase da estratégia revelou a necessidade de maior articulação

intersetorial, uma base científica mais sólida e a priorização da atuação e o apoio

institucional e político.

As estratégias nacionais, como a portuguesa, fundamentam-se em quadros

internacionais como o Adaptation Policy Framework (2004), do United Nations

Development Programme5 e o Guia para o Desenvolvimento de Políticas de Integração

da Adaptação às Alterações Climáticas na Cooperação para o Desenvolvimento (2011),

da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Estes

quadros revelam o esforço internacional de promoção da adaptação, de modo

concertado e persistente, a nível global.

5 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

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4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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