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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO Igor Natusch Vieira VÍDEO NA INTERNET: UMA ALTERNATIVA DE DISTRIBUIÇÃO PARA O CINEMA BRASILEIRO? Porto Alegre 2007

Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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Trabalho de conclusão de curso defendido no segundo semestre de 2007 para obtenção de grau de Bacharel em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Brasil.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO

DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO

Igor Natusch Vieira

VÍDEO NA INTERNET: UMA ALTERNATIVA DE DISTRIBUIÇÃO PARA O CINEMA BRASILEIRO?

Porto Alegre 2007

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Igor Natusch Vieira

VÍDEO NA INTERNET: UMA ALTERNATIVA DE DISTRIBUIÇÃO PARA O CINEMA BRASILEIRO?

Trabalho de conclusão de curso de graduação apresentado ao Departamento de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social – Hab. Jornalismo.

Orientadora: Profa. Dra. Miriam de Souza Rossini

Porto Alegre 2007

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais, que me ensinaram a ter humildade e persistência na

busca pelo conhecimento. À minha orientadora, Miriam Rossini,

pela tranqüilidade e dedicação. E aos amigos, que nos trazem as

lições mais valiosas.

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RESUMO

Este trabalho apresenta um estudo das possibilidades de convergência existentes entre as tecnologias virtuais (representadas pela Internet) e o processo de distribuição da produção cinematográfica brasileira. O objetivo é identificar características formais, narrativas e conceituais que melhor se identificam com o modelo da Internet, e a partir daí apontar tendências que possam guiar o trabalho dos realizadores que optarem por distribuir seus produtos pela Rede Mundial de Computadores. Concentrando-se nas realizações em curta-metragem, o trabalho analisa o conteúdo de três portais dedicados à exibição de material audiovisual pela Internet: YouTube, Porta Curtas e Curta O Curta. De início, será elaborado um referencial teórico que permita a compreensão de conceitos relacionados à distribuição cinematográfica e às tecnologias virtuais. Após, os sites serão descritos em relação a suas características históricas e funcionais. Determinaremos por meio do número de acessos quais vídeos são os mais assistidos, utilizando os mesmos como amostragem e procedendo a uma análise comparativa dos conteúdos que apresentam.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ....................................................................................... 7

1 DISTRIBUIÇÃO: A BUSCA PERMANENTE PELO PÚBLICO.............. 12

1.1 DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA .................................................. 13

1.2 DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA NO BRASIL .............................. 15

1.3 DISTRIBUIÇÃO ATRAVÉS DA WEB ..................................................... 20

2 INTERNET: UMA NOVA DIMENSÃO DO HUMANO............................. 27

2.1 PROCESSOS BÁSICOS ........................................................................ 28

2.2 A IMAGEM NA INTERNET .................................................................... 36

3 DESCRIÇÃO DOS SITES SELECIONADOS ........................................ 42

3.1 CRITÉRIOS DE ESCOLHA DOS SITES ............................................... 42

3.2 YOUTUBE .............................................................................................. 45

3.2.1 Histórico ................................................................................................ 45

3.2.2 Navegação e conteúdo ........................................................................ 47

3.3 PORTA CURTAS ................................................................................... 50

3.3.1 Histórico ................................................................................................ 50

3.3.2 Navegação e conteúdo ........................................................................ 52

3.4 CURTA O CURTA .................................................................................. 54

3.4.1 Histórico ................................................................................................ 54

3.4.2 Navegação e conteúdo ........................................................................ 56

4 ANÁLISE DOS SITES PESQUISADOS ................................................ 60

4.1 CRITÉRIOS E PROCESSOS DE AVALIAÇÃO ..................................... 60

4.2 DESCRIÇÃO DOS VÍDEOS ESCOLHIDOS COMO AMOSTRAGEM ... 64

4.2.1 Vídeos hospedados no YouTube ........................................................ 64

4.2.2 Vídeos hospedados no Porta Curtas ................................................. 66

4.2.3 Vídeos hospedados no Curta O Curta ............................................... 68

4.3 ANÁLISE COMPARATIVA DOS VÍDEOS PRESENTES NOS SITES ... 69

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................... 77

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................... 83

ANEXO A – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (I) .. 88

ANEXO B – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (II) 89

ANEXO C – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (III) 90

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ANEXO D – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (IV) 91

ANEXO E – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (V) 92

ANEXO F – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (VI) 93

ANEXO G – PÁGINA INICIAL DO SITE PORTA CURTAS (I) ............. 94

ANEXO H – PÁGINA INICIAL DO SITE PORTA CURTAS (II) ............ 95

ANEXO I – VISUALIZAÇÃO DA JANELA DE EXIBIÇÃO DO SITE

PORTA CURTAS ...................................................................................

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ANEXO J – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O

CURTA (I) ..............................................................................................

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ANEXO K – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O

CURTA (II) .............................................................................................

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ANEXO L – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O

CURTA (III) ............................................................................................

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INTRODUÇÃO

O cinema realizado fora de Hollywood e do controle das majors sempre

esteve de um modo ou de outro às voltas com dois problemas relativos à sua

viabilização prática. Um deles refere-se a sua produção, aos recursos instrumentais

e financeiros que necessitam ser mobilizados para que possa ocorrer a

materialização do roteiro através da captação de imagens, montagem e efeitos de

pós-produção. O outro é relativo à visibilidade do produto final, aos espaços e

mecanismos utilizados para que o filme possa ser exibido e para que seus

potenciais espectadores tenham acesso a sua exibição.

Na última década, a produção cinematográfica foi diretamente afetada pela

escalada da tecnologia digital, em um processo que trouxe possibilidades renovadas

para os realizadores. As tecnologias digitais de captação de vídeo e áudio

desenvolveram-se rapidamente, e logo passaram a ser utilizadas pelo cinema em

escalada crescente. No começo, por serem de custo muito alto, ficaram mais

restritas aos grandes estúdios e às empresas de cinema – mas, com o

barateamento de câmeras e demais artigos digitais, tornaram-se uma opção

tentadora para iniciantes e produtores independentes de modo geral. No Brasil,

mesmo diretores renomados como Eduardo Coutinho e Domingos de Oliveira

apostaram no formato digital para suas realizações, e concluíram produções

cinematográficas com valores muito inferiores aos que seriam investidos em

produções baseadas em película. Apesar das discussões conceituais sobre as

vantagens e desvantagens do vídeo em comparação com películas e latas de filme,

o fato é que o cinema em vídeo é uma realidade, que barateia a produção e aponta

para um processo cada vez mais ágil e aberto a um número maior de produtores e

realizadores.

No entanto, um segundo dilema permanece para boa parte desses

realizadores. Por mais que o cinema independente nacional esteja vivenciando um

salto no ritmo de produção, ele ainda não alcançou uma contrapartida no

escoamento de todo esse material, e esse nicho de mercado ainda é carente em

opções para a exibição de suas realizações. Praticamente excluídos de um circuito

comercial que privilegia o blockbuster norte-americano de custos e rendimentos

milionários, realizadores muitas vezes têm suas janelas de exibição limitadas a

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festivais, pequenas mostras alternativas e, eventualmente, programas alternativos

na televisão, a maior parte deles promovidos por emissoras públicas. Vivencia-se,

hoje, uma realidade pouco animadora: produz-se muito mais rápido e com

acabamento mais cuidadoso, mas boa parte desta produção é condenada a ser

assistida por quase ninguém. Como ninguém faz cinema para si mesmo, o dilema se

impõe, e muito tem se pensado em busca de soluções para essa situação.

Uma alternativa que pode estar se consolidando para a solução de tal

problema encontra-se, como no primeiro caso, na exploração da tecnologia digital.

No entanto, ao invés de equipamentos físicos, refere-se ao suporte virtual oferecido

pela Rede Mundial de Computadores, ou World Wide Web (WWW). Com a evolução

das tecnologias de transmissão de dados, arquivos que antes necessitavam de

muitas horas para serem descarregados ou “baixados” tornam-se acessíveis de

modo muito mais rápido – realidade especialmente positiva para o material em

vídeo, quase sempre o de maior volume de dados e de transferência mais

dispendiosa. Assim, a praticidade em obter material audiovisual pela Internet é cada

vez maior – e não só através do download, muitas vezes não autorizado, dos

grandes filmes de Hollywood. Depois do sucesso obtido pelo YouTube, site

especializado na hospedagem livre de vídeos na Internet, disseminou-se a idéia de

que é possível assistir a vídeos diretamente pela rede, sem necessariamente copiá-

los para dentro de computadores pessoais – e nessa facilidade pode estar nascendo

uma nova cultura, com reflexos imediatos na realização audiovisual brasileira e

mundial.

Diante de tal panorama, nos vemos confrontados com uma série de questões.

Pode a Internet, de fato, ser um espaço para a veiculação e distribuição de cinema,

em especial de cinema realizado em nosso País? Em qual estágio se encontra essa

possível convergência? Que tipo de produto melhor se aplica a esta forma de

distribuição, qual gênero se adapta melhor a ser visto através da web? Qual é o

público potencial para o cinema na Internet, e quais são seus interesses e

motivações? Essas são questões que nos parecem pertinentes, e que nos instigam

a um esforço de compreensão em busca de possíveis respostas.

O trabalho aqui apresentado propõe-se a abordar essa relação nascente

entre a Internet e o cinema independente brasileiro, a partir de suas possibilidades

de exibição. Pretende-se lançar alguma luz sobre aqueles questionamentos; expor

experiências já existentes na exibição de realizações nacionais pela Internet, e

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determinar pontos nos quais essas experiências possam ser úteis para guiar ações

futuras nesse sentido. Buscaremos igualmente perceber o uso que é feito da

linguagem cinematográfica nos trabalhos disponíveis na Rede, concentrando nossa

atenção em elementos formais e narrativos. Como a projeção de filmes em longa-

metragem via web ainda é inviabilizada por limitações técnicas, deteremos nosso

olhar sobre o universo dos produtos cinematográficos em curta-metragem, que

encontram em domínios da Internet um espaço aparentemente favorável para sua

exibição.

Para orientar essa apreciação, usaremos os estudos de Manuel Castells e

Pierre Lévy sobre a World Wide Web, explorando especialmente os conceitos de

sociedade em rede do primeiro e os estudos de intertextualidade do segundo.

Autores como Dominique Wolton e Lucia Santaella serão igualmente vistos por nós

no decorrer das observações sobre a Internet. A partir destes conceitos, buscaremos

atingir a realidade atual da tecnologia digital aplicada ao cinema, tendo como base o

trabalho de Luiz Gonzaga de Luca sobre o tema. Analisaremos igualmente os

estudos de Paulo Sérgio Almeida, Pedro Butcher e Aletéia Selonk sobre o panorama

cinematográfico brasileiro, concentrando nosso foco de análise em suas

considerações a respeito da distribuição e exibição. Paralelamente, traçaremos um

breve apanhado histórico a respeito da exibição de vídeo na Internet – uma

realidade que, se tomamos como ponto de partida o surgimento do pioneiro

YouTube, tem ao todo menos de três anos de existência.

Tendo estabelecido sobre essa bibliografia as bases de nossa análise,

abordaremos o problema da exibição via Internet por meio de três diferentes portais

dedicados a conteúdos em vídeo: YouTube <http://www.youtube.com>, Porta Curtas

<http://www.portacurtas.com.br/index.asp> e o site Curta O Curta <

http://www.curtaocurta.com.br/>. Utilizando os recursos de medição que cada um

dos domínios oferece, é possível saber quais vídeos obtêm maior repercussão, e a

partir daí determinar quais características dos filmes analisados melhor ou mais

eficientemente se ajustam à “janela” Internet. Cada um dos domínios tem critérios

diferentes para aceitação, exibição e medição qualitativa dos vídeos que

apresentam, e esses elementos serão igualmente descritos no presente trabalho.

Em termos de metodologia, a idéia inicial direcionava-se a um uso conjunto

da análise de conteúdo dos sites e de entrevistas com realizadores cujos produtos

estivessem disponíveis em um ou mais dos domínios escolhidos para o estudo. No

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entanto, dificuldades envolvidas na execução do projeto original nos levaram a optar

pela eliminação da segunda parte da análise, restringindo nossa ação ao conteúdo

disponível nos endereços eletrônicos em si. Assim sendo, vamos concentrar nossa

atenção sobre os sites, seus mecanismos de navegação, os conteúdos que

apresentam e as diferenças de formato e proposta apresentadas por cada um deles.

Comparando os dados coletados, buscaremos apontar tendências indicativas de que

tipo de realização encontra na Internet seu melhor espaço, e igualmente tentaremos

localizar as potencialidades da web na distribuição de vídeos ligados ao cenário

cinematográfico brasileiro.

No primeiro capítulo de nosso estudo, chamado “Distribuição”, falaremos

sobre as circunstâncias que envolvem esse tipo de atividade, descrevendo os

processos de seu funcionamento. Traçaremos também um breve panorama da

distribuição de cinema no Brasil, concluindo com uma apreciação das

potencialidades da Rede Mundial de Computadores no sentido de auxiliar o trabalho

de distribuição de conteúdos audiovisuais. No capítulo seguinte, chamado “Internet”,

discutiremos as tecnologias virtuais e seu impacto sobre a sociedade atual. Após

algumas considerações sobre os processos básicos da Internet, procederemos a

uma descrição da imagem aplicada à web e as revoluções que o progresso

tecnológico tem trazido para nossa compreensão a respeito dos próprios conceitos

imagéticos de modo geral. Buscaremos, assim, situar os dois universos que serão

objeto de análise neste trabalho. Em seguida, desenvolveremos o capítulo

“Descrição dos sites selecionados”, onde constará um levantamento de dados

históricos do YouTube, Porta Curtas e Curta O Curta, e posteriormente uma

descrição das possibilidades de navegação e conteúdo oferecidas por cada um

deles. O quarto capítulo, “Análise dos sites pesquisados”, apresentará os vídeos

escolhidos para amostragem, e a observação comparativa de seus conteúdos,

temáticas e recursos técnicos e narrativos. Considerações finais, bibliografia e

anexos, mostrando imagens dos sites pesquisados, completam nossa pesquisa.

Optamos, conscientemente, pelo desenvolvimento de um trabalho

exploratório, sem o estabelecimento prévio de hipóteses e sem a pretensão de

atingir conclusões pétreas sobre nosso objeto de estudo. Parece-nos importante ter,

nesse momento inicial, a humildade de tentar compreender uma realidade ainda

muito recente e em constante mutação. Estudos futuros certamente estarão em

melhor posição que a nossa para a formulação de hipóteses sobre o cinema em

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conexão com a Internet – e é nossa esperança contribuir, ainda que parcialmente,

com dados que possam auxiliar esses esforços que estão por vir. O resultado de

nosso estudo poderá ser avaliado a partir de agora.

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1. DISTRIBUIÇÃO: A BUSCA PERMANENTE PELO PÚBLICO

É fato notório que todo o esforço envolvido na concretização de um produto

cinematográfico tem como objeto final o espectador. É um desafio permanente que é

imposto ao cinema de todos os tipos – convencer o maior número possível de

pessoas a abrirem mão de um grande número de opções oferecidas pela indústria

cultural e dedicarem parte do seu tempo e do seu dinheiro à apreciação de uma obra

cinematográfica. Trata-se de uma condição quase inerente a uma manifestação

artística dedicada desde seus momentos iniciais a conquistar a admiração e a

atenção das massas.

Embora o espectador tome real contato com o filme apenas no estágio final

de sua trajetória – quando toda a produção está já há tempos concluída e o

resultado está disponível para ser assistido – há um grande volume de trabalho

desenvolvido para que o material capturado e editado possa chegar às janelas de

exibição, atendendo tanto às necessidades financeiras dos estúdios quanto à

demanda dos consumidores.

Uma das dificuldades enfrentadas por quem se propõe a traçar um panorama

sobre a distribuição cinematográfica é a escassez dos estudos acadêmicos sobre o

tema. Especialmente no Brasil, o assunto é objeto de um número bastante reduzido

de pesquisas – o que cria a necessidade de construção de referenciais próprios para

que se possa avançar em direção ao problema que queremos analisar. No decorrer

do capítulo, tentaremos unir uma série de referências sobre o tema – a maior parte

delas indireta – para situar da maneira mais precisa possível a distribuição

cinematográfica, tanto em seus aspectos mais gerais quanto nas particularidades

que assume no nosso país. Posteriormente, descreveremos a Internet como

alternativa de distribuição, enumerando os avanços ocorridos nesse sentido dentro e

fora do Brasil.

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1.1. DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA

São duas as tarefas básicas de uma empresa distribuidora de cinema. Cabe

aos distribuidores a) comercializar o filme junto aos exibidores, garantindo do melhor

modo possível espaços para exibição, e b) informar o público da existência do filme

e da possibilidade, próxima ou imediata, de assisti-lo. Dizendo de outro modo, o

distribuidor trabalha com dois tipos de convencimento: o do exibidor, que veiculará o

material, e o do público consumidor de cinema, destinatário final dos esforços de

produção e cujo retorno garantirá ou não o sucesso comercial do filme.

O processo básico de distribuição é de estrutura simples, embora de

concretização complexa. A empresa distribuidora adquire os direitos de um filme,

negociando a partir daí os espaços nos quais o produto será exibido e,

paralelamente, trabalhando os mecanismos publicitários de modo a divulgar o filme

da maneira mais eficiente possível. Uma vez o filme estando nas salas de cinema, o

desafio passa a ser outro: mantê-lo em cartaz, atraindo público e lutando contra a

concorrência de muitos outros trabalhos pelos espaços de exibição existentes.

Antigamente, as possibilidades de exibição resumiam-se às salas de cinema,

mas com o progresso tecnológico novas alternativas se tornaram viáveis,

aumentando o público potencial e a vida comercial de um filme. Com o

estabelecimento da televisão como entretenimento doméstico, um novo mercado

surgiu e, com ele, um novo público, disposto a abrir mão das salas de cinema em

troca do conforto de assistir ao filme na comodidade do seu lar. Mais ainda, a

televisão tornou-se de certo modo um estímulo ao progresso tecnológico no próprio

cinema – afinal, coincide com a consolidação dos aparelhos de TV o

desenvolvimento de uma série de tecnologias cinematográficas, como o som estéreo

e o conceito de cinema a cores.

O surgimento posterior do VHS e, mais recentemente, do DVD abriu ainda

novas possibilidades de apreciação do cinema. Agora, além de não estar mais preso

ao ambiente da sala de cinema, o espectador ganha a perspectiva de assistir ao

conteúdo cinematográfico na hora em que desejar, não mais dependendo de

horários pré-estabelecidos para desfrutar de seu entretenimento. O VHS e o DVD

tornaram viável uma nova modalidade de comércio relacionada ao cinema: além da

exibição, via salas de cinema ou TV, passava a ser oferecido também o aluguel de

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cópias dos filmes, o que permitiu o surgimento e disseminação das locadoras de

vídeo. Do mesmo modo, as cópias de filmes tornaram-se objeto passível de

aquisição definitiva em lojas comerciais e, graças às novas tecnologias de uso

doméstico, passaram mesmo a serem produzidas nas próprias residências, com

gravações feitas a partir da televisão com o uso de aparelhos de videocassete.

Atualmente, a televisão busca de certo modo reproduzir as comodidades oferecidas

pela tecnologia DVD, disponibilizando conteúdo especial por um valor pré-definido

através do sistema pay-per-view.

Para contornar eventuais problemas decorrentes da nova gama de opções –

que poderiam, por exemplo, acarretar a perda de público nos cinemas na medida em

que os espectadores optassem por assistir os filmes em casa – foi desenvolvida

uma política de “janelas” de exibição. Cada uma das mídias onde um filme pode ser

exibido é tratada como uma janela, e é criado um calendário de veiculação,

privilegiando as salas de cinema. Só depois de determinado tempo após a estréia no

circuito clássico de exibição é que o conteúdo cinematográfico é liberado para outras

mídias. Entre outras coisas, essa política consagra a sala de cinema como espaço

“nobre”, onde o filme atinge o público pela primeira vez e cujos resultados servem de

indicativo para seu desempenho nas outras mídias. No caso do Brasil, um filme é

lançado em DVD cerca de 180 dias depois da estréia no cinema, enquanto o

sistema pay-per-view aguarda 270 dias, e a televisão aberta espera quase dois anos

para ter autorizada a veiculação do filme (LUCA, 2004, p.197).

Segundo o estudo de Aletéia Selonk (2004), produtora cinematográfica e

Doutora em Comunicação Social pela PUC-RS, o espaço para iniciativas na área de

distribuição de cinema é concentrado, e as características atuais deste mercado,

sustentado na comercialização em escala e em grandes estoques de títulos,

dificultam a consolidação de novas empresas do ramo. Além disso, trata-se de um

mercado de alto risco para investidores, a) pela dificuldade de prever a reação do

público a produtos que muitas vezes primam pela inovação, e b) pela disputa de

espaços de exibição e lucros de bilheteria com um grande número de concorrentes

diretos e indiretos.

Tentando diminuir o mais possível essa margem de incerteza, as empresas

distribuidoras adotam uma série de estratagemas, a maior parte deles relacionado

com a publicidade de um filme junto ao público potencial do mesmo. Assessorias de

imprensa trabalham junto à imprensa para garantir comentários sobre o filme nos

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meios de comunicação, enquanto promoções são realizadas com a oferta de brindes

ou de entradas gratuitas para sessões. Em uma escala mais ampla, há um

direcionamento de produção, com a realização de filmes em série (como as

conhecidas trilogias), muitas vezes privilegiando gêneros de maior aceitação

popular, bem como a exploração das franquias dos filmes em outros produtos (livros,

CDs com trilhas sonoras, brinquedos, jogos de computador etc.). Todas essas

medidas são tomadas com motivações notadamente capitalistas, buscando

prolongar e potencializar a vida comercial de um determinado produto audiovisual e,

assim, compensar os gastos envolvidos na realização do mesmo.

Nos países ditos de terceiro mundo, as potencialidades comerciais do cinema

são geralmente pouco desenvolvidas, o que torna o investimento em filmes um

negócio ainda mais arriscado e de retorno muito mais incerto. Embora mesmo nos

países tidos como pólos de produção cinematográfica o apoio estatal seja

importante para concretização dos filmes, nos países periféricos a necessidade de

investimentos do Estado é bem mais acentuada – e as dificuldades de disputar

espaço com uma indústria forte e de tendências monopolistas como a dos Estados

Unidos complicam ainda mais uma atividade que já carrega em si mesma uma série

de empecilhos. Ao voltarmos nosso foco para as especificidades do cinema

brasileiro, muitas dessas questões apresentar-se-ão de maneira ainda mais

evidente.

1.2. DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA NO BRASIL

Em seus estudos, Selonk (2004) propõe uma abordagem histórica da

distribuição de cinema no Brasil, dividindo-a em cinco fases:

a) a primeira (1896 – 1931) é marcada pela chegada de equipamento e idéias

cinematográficas ao País. Os distribuidores surgidos nesse estágio inicial trabalham

com filmes importados, produtos já acabados e de grande apelo junto ao público

devido a sua aura de novidade. O distribuidor é também responsável pela exibição,

e o contato com a filmografia estrangeira desperta em alguns brasileiros o desejo de

uma produção cinematográfica totalmente nacional;

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b) em seguida (1932 – 1946), surgem as primeiras leis dedicadas ao

audiovisual, e são criadas entidades como o Instituto Nacional de Cinema Educativo

(INCE) e o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), que possuía um

Conselho dedicado ao cinema brasileiro. A distribuição do produto nacional ainda é

encarada de modo um tanto ingênuo – e é o estado que, por meio de medidas de

cumprimento obrigatório, fomenta a exibição dos filmes realizados no país;

c) na terceira fase (1947 – 1966), surge o Instituto Nacional de Cinema (INC),

com o objetivo de atender às necessidades de uma produção cinematográfica

crescente – e, teoricamente, regulamentar a entrada dos filmes estrangeiros no

Brasil. Começam a se sedimentar problemas que, infelizmente, subsistem ainda hoje

na distribuição do cinema nacional – como, por exemplo, a falta de interesse da

maior parte dos exibidores e a falta de impacto das estratégias de divulgação

anteriores e posteriores ao lançamento. Mesmo cineastas de repercussão

internacional, como Glauber Rocha e Walter Lima Júnior, conseguiam resultados

modestos nas bilheterias brasileiras, muito devido a esses problemas. É nesse

período que surge, finalmente, a noção da distribuição como grande problema do

cinema brasileiro, o que motiva as ações do período subseqüente;

d) a quarta fase descrita por Selonk (1967 – 1989) marca primeiramente um

comprometimento maior do INC na viabilização do cinema brasileiro, atuando com

atenção maior no nicho da distribuição. Surge a Embrafilme, primeiramente para

promover os filmes brasileiros no exterior, e mais tarde fomentando a produção e

distribuição do cinema brasileiro dentro do país. Muitas das maiores bilheterias da

história do cinema brasileiro ocorrem nesse período, o que pode ser visto como

indicativo de sucesso. Porém, a concorrência do produto estrangeiro é forte, e o

caráter muitas vezes paternalista do incentivo à produção acaba criando problemas

sérios de controle de qualidade e escoamento de recursos, que acabam corroendo o

modelo construído e provocando questionamentos a respeito de sua real eficácia;

e) O quinto e último período (que, para Selonk, vai de 1990 até 2002) é o que

mais interessa para os fins que buscamos atingir, de modo que nos deteremos mais

profundamente na análise do mesmo.

Em abril de 1990, um decreto do então presidente Fernando Collor de Mello

extingue a Embrafilme. A medida acaba sendo desastrosa para o cinema nacional,

uma vez que não há nenhuma espécie de transição e não são propostas alternativas

para o papel que a empresa desempenhava na realização e distribuição do cinema

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nacional. Muitas produções acabam tendo suas finalizações comprometidas pela

mudança repentina, e acabam restando inconclusas ou inéditas nos cinemas. Um

exemplo é o longa-metragem “Perfume de Gardênia”, que começou a ser rodado no

início dos anos 90, teve sua finalização interrompida quando da extinção da

Embrafilme e cujo projeto só seria retomado cerca de um ano depois, em co-

produção com a Argentina. O filme participou em 1992 de festivais como os de

Gramado (RS) e Brasília (DF), mas apenas em 1995 conseguiu chegar de fato aos

cinemas. Em um âmbito mais geral, podemos dizer que, em substituição aos

problemas causados pela falta de prestação de contas e pela formação de

“panelas”1, surgiram os problemas decorrentes da falta de apoio estatal e do total

abandono da produção cinematográfica brasileira à concorrência contra a indústria

estrangeira, muito melhor estruturada e com espaço garantido na imensa maioria

das salas de exibição.

O surgimento da Riofilme, em 1992, foi uma tentativa de achar um substituto

à Embrafilme no tocante a muitas de suas funções mais importantes. O órgão foi

criado por iniciativa da Câmara de Vereadores e da Prefeitura do Rio de Janeiro – e,

como explicam Almeida e Butcher (2003), dedicou-se em um primeiro momento a

uma espécie de “operação de salvamento” (p.38), trabalhando no sentido de

viabilizar a conclusão e o lançamento dos trabalhos interrompidos com o fechamento

da Embrafilme. No entanto, a Riofilme não pôde atuar diretamente nos mecanismos

de financiamento de novas produções, uma vez que seus recursos estavam ligados

à dotação orçamentária da Câmara de Vereadores e ao conseqüente trâmite

burocrático para a liberação dos valores em questão.

A partir da promulgação da Lei nº. 8.313 (que se tornou conhecida como Lei

Rouanet), o panorama começa a apresentar possibilidades de melhoria. A lei prevê

benefícios fiscais para pessoas físicas e jurídicas que façam investimentos em

atividades ligadas à cultura. Em 1993, já no governo de Itamar Franco, esse

mecanismo é reforçado com a Lei nº. 8.685 – a assim chamada Lei do Audiovisual.

Estabelecendo critérios para a escolha das produções que poderiam receber

incentivos e especificando os benefícios concedidos aos investidores que 1 Na realidade do cinema brasileiro da época, o termo refere-se ao favorecimento a determinados realizadores quando da liberação de recursos para realização ou finalização de filmes. O procedimento, além de obviamente dificultar a renovação e o estabelecimento de novos realizadores audiovisuais, comprometia também a qualidade geral dos filmes, resultando mesmo em películas com erros grosseiros de montagem ou falhas gritantes de direção – que acabavam depondo contra a reputação do cinema nacional como um todo.

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apostassem no audiovisual, a então nova lei potencializou os efeitos da anterior, e

ambas atenderam razoavelmente bem as necessidade do setor produtivo ligado ao

cinema.

A distribuição cinematográfica se beneficiou especialmente do artigo 3º da lei

do Audiovisual, que trata do abatimento de impostos para as empresas que invistam

na co-produção de materiais audiovisuais. Aos poucos, as majors estrangeiras

começaram a se envolver com a produção nacional, o que garantiu a vários filmes o

acesso a esquemas de divulgação e distribuição muito mais eficientes do que o

usual em nosso País. Paralelamente, um número crescente de empresas

independentes passou a se interessar pelos benefícios da Lei e a investir na

distribuição do cinema nacional.

Algumas medidas específicas para o formato de curta-metragem foram

experimentadas. Em 2006, o Ministério Público Federal sugeriu a regulamentação

do art. 13 da Lei nº 6281, de 1975, que obriga os exibidores a projetarem curtas-

metragens brasileiros antes de longas-metragens estrangeiros. Embora jamais tenha

sido revogada, a lei caiu em desuso, especialmente pela baixa aceitação do público

– como não eram previstos mecanismos de controle de qualidade, qualquer curta-

metragem era beneficiado pela lei, o que muitas vezes resultava em material de má

qualidade sendo exibido para um público que não tinha nenhum interesse inicial em

assisti-lo. Além disso, alguns dos próprios exibidores passaram a financiar filmes,

para não terem que pagar percentuais de arrecadação aos produtores

independentes, o que tornou a lei ainda mais ineficaz.

Se nos últimos anos não tivemos falta de interesse governamental na

melhoria de condições para a distribuição cinematográfica em território brasileiro, o

exemplo da Lei nº 6281 citado acima nos dá um indício das dificuldades envolvidas

em regulamentar um mercado dinâmico e imprevisível como o cinema. Faz parte do

trabalho do distribuidor lidar com esse percentual de incerteza – e, ao mesmo tempo

em que se faz necessário o uso das leis de incentivo, a busca de mercados

específicos e de produtos de maior potencial junto ao público acaba sendo parte

importante da atividade de um distribuidor.

Tomando como base os estudos de Octavio Getino, Aletéia Selonk propõe

uma divisão das empresas distribuidoras de cinema em atividade no Brasil em três

categorias. As empresas estrangeiras são filiais das majors norte-americanas, e se

concentram na distribuição nacional da cinematografia realizada especialmente nos

Page 19: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

19

grandes centros de produção. Trabalham com divulgação em escala massiva, e

detém a maior parte dos espaços de exibição. As distribuidoras locais de filmes

estrangeiros, conhecidas como independentes, são formadas por capital local, e

trabalham basicamente com a aquisição de direitos de produções internacionais

realizadas fora dos grandes estúdios. Por fim, as empresas nacionais, que

trabalham especificamente com a produção realizada no Brasil. O trabalho de tais

empresas é difícil, especialmente pela falta de uma indústria cinematográfica forte

no país, e geralmente acaba restrita a iniciativas de cunho estatal, como as já

citadas Embrafilme e Riofilme (2004, p.20-22).

De qualquer modo, mesmo com a considerável melhoria no panorama

recente do cinema brasileiro, muitos realizadores – em especial os mais novos – não

encontram espaço adequado para o desenvolvimento de suas filmografias. As leis

de incentivo, embora sejam reconhecidas por seu papel na retomada do cinema

nacional, ainda recebem críticas por não preverem meios de fomentar mais

especificamente trabalhos de novos cineastas – afinal, como são as empresas que

decidem onde aplicarão os recursos que disponibilizam, acabam no mais das vezes

optando por realizadores consagrados ou por propostas mais conservadoras, que

supostamente têm maiores chances de sucesso de público e, consequentemente,

de projeção para o nome de seus patrocinadores. Por outro lado, as próprias salas

de exibição optam geralmente por filmes que tendem a receber maior aceitação do

público – e tudo isso acaba conspirando contra a renovação de cineastas e

produtores, tão necessária para a continuidade do cinema realizado no Brasil.

Constitui-se, portanto, uma grande quantidade de realizadores brasileiros sem

penetração no circuito tradicional de produção e exibição – e muitos deles, na busca

de alternativas que permitam a realização cinematográfica, acabam investindo em

tecnologias mais baratas ou de acesso mais livre do que o modelo clássico de

películas 35mm e salas de cinema. É nessa realidade que surgem e se

desenvolvem alternativas como a captação e edição de imagens em plataforma

digital e a divulgação ou distribuição de trabalhos via Rede Mundial de

Computadores – possibilidades não ignoradas pelo universo das majors, mas que

encontram utilização mais plena nas mãos de realizadores independentes de modo

geral.

Page 20: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

20

1.3. DISTRIBUIÇÃO ATRAVÉS DA WEB

Em um primeiro momento, a Rede Mundial de Computadores não parece ter

impressionado a indústria do cinema, e só em tempos mais recentes a Internet

tornou-se de fato um foco de atenção do setor cinematográfico. Como

aprofundaremos logo adiante, a transmissão de dados via web é especialmente

problemática na questão de arquivos de vídeo, e disponibilizar filmes de longa

duração para exibição direta via Internet permanece ainda hoje uma possibilidade

remota e de difícil concretização. Além disso, assistir a um filme de quase duas

horas de duração através da tela de um computador pessoal parece ser uma opção

que desagrada à maioria dos usuários, sendo suportes como a televisão ou mesmo

o home theater opções bem mais comuns na hora de assistir a filmes.

É uma tendência da indústria de entretenimento a eliminação progressiva dos

suportes de conteúdo, como, por exemplo, na oferta de arquivos de áudio e

softwares para aquisição direta via Internet. Alguns grupos musicais de grande

expressão parecem aos poucos tentar adaptar suas atividades a essa situação –

como por exemplo o AC/DC, que incluiu em seus CDs um arquivo que permite

acessar o site da banda e obter conteúdo extra2, e o White Stripes, que

recentemente lançou seu novo trabalho também no formato pen drive3. Já a banda

de rock Radiohead lançou seu novo trabalho diretamente na Rede, e inova por

permitir que o próprio comprador decida o valor a pagar pelos arquivos referentes ao

lançamento. Quanto aos softwares, tornou-se procedimento comum das empresas

que o desenvolvem oferecer uma versão de avaliação para download gratuito na

Rede, passando depois a cobrar pela renovação ou pela ampliação das capacidades

do programa.

Estuda-se uma alternativa semelhante para o cinema digital. No momento, os

esforços estão voltados para a instalação de equipamentos capazes de receber

através de redes de transmissão o conteúdo para exibição nas salas de cinema. No

entanto, o consórcio batizado de Digital Cinema Initiative (DCI), organizado pelos

grandes estúdios para coordenar a eventual mudança do suporte película para o

2 Conforme visto no domínio <http://www.acdcrocks.com/>, 22 out. 2007. 3 Dispositivo móvel utilizado para o transporte de arquivos, que tem um princípio de funcionamento semelhante ao hard disk (HD) de um computador.

Page 21: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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digital, estabeleceu padrões de qualidade de imagem e de compressão de arquivos

muito além dos atualmente alcançados pela tecnologia disponível, travando

temporariamente a expansão do cinema digital. Luiz Gonzaga Assis de Luca, Doutor

em Ciências da Comunicação pela USP, interpreta essa ação do DCI como uma

atitude consciente das majors no sentido de ter mais controle sobre as inovações

tecnológicas aplicadas ao cinema e de postergar o quanto possível a exibição

cinematográfica digital (2004, p.256).

No entanto, se a transmissão direta é pouco provável em um futuro próximo, o

download de arquivos tornou-se uma ameaça preocupante para toda a indústria do

entretenimento – e o cinema tem sentido de modo crescente o impacto desta

realidade. Arquivos de vídeo de longa duração são disponibilizados por usuários em

programas de compartilhamento baseados nas tecnologias peer to peer (P2P) e

torrent, sendo de acesso relativamente simples e de controle muito difícil para os

detentores dos direitos legais das obras copiadas. Softwares de compressão de

vídeo como o DivX e o Microsoft Windows Video permitem a criação de arquivos

que, embora não alcancem padrões industriais de qualidade, ocupam menor número

de dados e mantêm qualidade de imagem e som suficientes para o consumo

doméstico, o que potencializa ainda mais a troca deste tipo de arquivos via Internet.

No entanto, e apesar de algumas visões pessimistas, é interessante apontar

que o mercado de filmes em DVD vive um momento de crescimento, tanto no Brasil

quanto em boa parte dos mercados internacionais. No território brasileiro, a

aquisição de cópias em DVD para consumo doméstico no ano de 2005 cresceu 60%

em comparação com o ano anterior, enquanto o comércio de cópias destinadas para

locação simplesmente dobrou no espaço de um ano. Esse bom momento encontra

respaldo em outros setores, como o de equipamentos de home vídeo, que

apresentou crescimento de vendas de 70% a 80% no ano de 2005.

Embora os dados pareçam ir de encontro ao cenário de perdas alarmantes

que muitas vezes é associado à pirataria digital e ao crescimento do

compartilhamento de arquivos via Internet, é importante analisarmos alguns detalhes

relacionados a essa conjuntura. Não podemos ignorar, por exemplo, a queda dos

preços dos eletrodomésticos em geral e dos aparelhos eletrônicos em particular, que

sofreram em 2005 uma deflação de 9%. Isso pode ser interpretado como um

indicativo do aumento de poder aquisitivo das camadas mais baixas da população

brasileira, que potencializa a compra de aparelhos eletrônicos e, por conseqüência,

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22

de DVDs para uso doméstico ou locação. O quanto esse momento de crescimento

pode ser afetado pela disseminação dos computadores pessoais e do acesso à

Internet é uma incógnita. De qualquer modo, estudos divulgados através de sites de

notícias como o UOL afirmam que o crescimento do número de brasileiros com

acesso à web é sensível nos últimos anos, embora o percentual ainda seja inferior

ao de países como Suécia, Austrália e Estados Unidos.

Outro aspecto que nos parece não poder ser ignorado é a modificação dos

hábitos do consumidor de cinema de modo geral. A sala de cinema, antes uma

alternativa de lazer coletivo dotada até mesmo de certa nobreza, tornou-se uma

opção cara e parece cada vez menos atraente para os espectadores na hora de

assistir filmes. A locação de um DVD custa, comparativamente, muito menos do que

um ingresso para uma sala de projeção – e não somente em valores absolutos: os

custos de um DVD para assistir em casa podem ser divididos entre várias pessoas,

podendo todas elas assistir ao mesmo filme sem gastos adicionais, o que é

impossível no caso de entradas para uma sessão de cinema. Além disso, os gastos

de ir a uma sala de exibição vão além dos custos da entrada, envolvendo transporte

de ida e volta (incluindo-se possivelmente a necessidade de pagar por

estacionamento) e consumo de gêneros alimentícios (pipoca, refrigerantes, balas

etc.), gastos que podem ser amortizados com a opção de assistir ao filme em casa,

ao lado de familiares ou amigos. Os benefícios do espetáculo na sala de projeção

são quase todos de cunho técnico (imagem de alta definição, som estereofônico de

grande potência) e simplesmente não são capazes de atrair a maioria dos

consumidores de cinema, que se satisfaz com as comodidades de assistir a filmes

no ambiente doméstico, mesmo que com padrões técnicos de menor qualidade.

Podemos interpretar, então, o aumento constante nas locações de filmes, a

venda acentuada de equipamentos de home theater e, mesmo, o crescimento do

número de downloads não-autorizados de filmes pela Internet como indicativos

diferenciados de uma mesma realidade. Parece estar em curso uma mudança no

perfil do consumidor de cinema de modo geral – um consumidor que, embora

continue gostando de assistir a filmes, não se sente mais atraído pelas sensações

produzidas em uma sala de cinema, e opta sem remorsos por alternativas mais

práticas ou mais baratas na realização de tal atividade de lazer. Em apoio a essa

idéia, é interessante notar que são justamente os assim chamados blockbusters –

filmes de menor conteúdo intelectual e que utilizam mais intensamente os efeitos

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23

sonoros e visuais realçados nas salas de exibição – os que ainda mobilizam maiores

fatias de público e que rendem lucros mais significativos aos exibidores. Atualmente,

são esses produtos os que garantem as maiores bilheterias nas salas de cinema –

compreensível, portanto, que sejam os que recebem investimentos mais vultosos

para sua realização e divulgação.

Ainda que não seja vista pelas grandes produtoras e distribuidoras como uma

“janela” nos mesmos moldes da televisão ou da indústria de DVDs, a Internet tem

sido utilizada nos grandes mercados especialmente como uma ferramenta de

divulgação das produções cinematográficas. Um grande número de sites adota o

cinema como seu tema principal, e acabam servindo como espaço para a divulgação

das produções recentes dos grandes estúdios, apresentando chamadas

publicitárias, notícias e fotos de bastidores e de sets de filmagem. Uma breve

procura através de ferramentas de busca listará literalmente centenas de sites

dedicados ao cinema, não só em suas realizações mais recentes como também no

resgate de antigas produções e até mesmo funcionando como bancos de dados. Um

dos mais conhecidos e acessados sites sobre cinema é o Internet Movie Database

(ou IMDb) – que, embora lide com notícias e informações sobre filmes recentes, tem

como principal chamariz a inclusão quase enciclopédica de fichas técnicas e outros

dados relativos a centenas de milhares de filmes, oriundos de todas as épocas e de

praticamente todos os países do globo.

Além disso, ocorre na Rede a divulgação de teasers (pequenas chamadas de

cerca de trinta segundos, com imagens de filmes ainda em produção) e de trailers,

antes restritos às salas de exibição e que agora são apresentados também na

Internet. Com isso, um número maior de pessoas é atingido do que seria possível

apenas com a veiculação na abertura das sessões tradicionais. O portal da empresa

Apple, especializada em produção de computadores e sistemas ligados à Internet,

possui uma extensa seção dedicada à exibição de trailers, enquanto domínios como

o ComingSoon.net o Movie-List.com especializaram-se na hospedagem de

conteúdos semelhantes, com boa aceitação dos usuários. No Brasil, o site Omelete

– que não se limita ao cinema, hospedando conteúdo ligado à cultura pop em geral –

oferece a visualização de trailers de produções ainda inéditas no País, enquanto

provedores de Internet como o Terra e o UOL oferecem em suas páginas variadas

opções para quem deseja assistir a esse tipo de conteúdo. Essa política segue de

certo modo a lógica dos trailers incluídos no início das fitas VHS, e lida mais

Page 24: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

24

diretamente com o formato audiovisual do cinema, sendo atualmente uma das

grandes ferramentas das majors na divulgação de suas realizações4.

Paralelamente, novas associações de conteúdos surgem como mecanismos

de divulgação cinematográfica, aumentando ainda mais a abrangência da Internet

como meio de incentivo ao consumo de filmes, bem como ampliando

consideravelmente as possibilidades de lucro das realizações dos grandes estúdios

de cinema. Além dos já citados teasers – que, de certo modo, tomam emprestado o

formato dos comerciais de televisão, adaptando-o às especificidades tanto do

produto divulgado quanto do suporte utilizado na divulgação – surgem alternativas

talvez ainda mais engenhosas, como a associação do cinema ao universo dos jogos

de computador (games). Tal associação se dá em duas frentes. Por um lado, há

uma associação dos enredos e personagens de realizações cinematográficas a

jogos de computador, muitas vezes com os roteiros dos filmes já sendo planejados

no sentido de permitirem uma extensão dos mesmos em forma de games. Os jogos,

explorando tramas paralelas ou desenvolvendo histórias ligadas a personagens

carismáticos de realizações financiadas pelas majors, são não raro produzidos

juntos com os filmes dos quais são derivados, quando não lançados conjuntamente

com os mesmos. Uma segunda utilização, talvez menos impressiva, porém mais

diretamente ligada a nosso objeto de estudo, se dá por meio da inclusão de jogos

nas páginas de divulgação de filmes recém lançados ou de lançamento previsto para

um futuro próximo. São mais simples do que os games destinados a lançamento

comercial, mas funcionam de modo próximo aos trailers e teasers, antecipando

características dos roteiros ou dos personagens dos filmes que os inspiram. Além

disso, podem servir também para gerar meios diferenciados de interação com o

público – como, por exemplo, no site de divulgação do filme “Os Simpsons”, que

oferece uma ferramenta que permite a qualquer usuário criar um avatar de traços

semelhantes aos personagens do desenho animado5. Como parte da estratégia de

4 O papel dos trailers foi, sem dúvida, redefinido de forma profunda pelo advento das tecnologias digitais e pela popularização da Internet, sofrendo praticamente uma reinvenção em suas atribuições e funcionalidades. Atualmente, nos parece possível falar de uma estética dos trailers, bem como do surgimento e gradativa consolidação de um público específico, que consome os trailers não apenas como uma antecipação das salas de cinema, mas praticamente como um produto cultural encerrado em si mesmo. Isso para não citarmos o surgimento e consolidação dos teasers, praticamente impensável no tempo das salas de exibição e da locação de fitas VHS. É um panorama de grande atualidade, que tem sido negligenciado pelos meios acadêmicos – e que, embora não seja alvo do trabalho que ora desenvolvemos, é merecedor de uma apreciação mais detida pelos estudiosos de cinema e de Internet. 5 Conforme visto no domínio <http://www.simpsonsmovie.com/main.html?cid=br> em 11 nov.2007.

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25

divulgação, foi levantada inclusive a possibilidade de utilização dos avatares criados

pelos visitantes da página em futuros episódios do seriado de televisão.

Já os produtores independentes, que desenvolvem seus trabalhos fora do

domínio das grandes empresas, encontram na web novas alternativas para a

superação de dificuldades inerentes ao seu trabalho. Ao contrário das grandes

empresas de cinema, que parecem temer as aplicações diretas da Internet sobre

seus produtos e optam por fazer uso da Rede apenas como mecanismo de

divulgação, o cinema independente utiliza as potencialidades do mundo virtual de

maneira bem mais ativa, associando a web diretamente aos processos criativos e de

distribuição de seus produtos. A exibição de vídeos diretamente na Rede, principal

motivador de nosso estudo, nada mais é que uma manifestação crescente de tal

realidade – um verdadeiro nicho que surge quase sem alarde, mas que se mostra

cada vez mais atraente para diretores e produtores localizados do lado de fora dos

grandes estúdios.

Como as tecnologias de streaming6 são relativamente recentes e se

encontram em pleno desenvolvimento, a visualização direta de materiais

audiovisuais de longa duração ainda é pouco prática e de difícil aceitação para os

usuários de Internet. Além do mais, é amplamente associada ao ambiente virtual a

idéia de brevidade, de rapidez de acesso e de alta variedade de conteúdos –

conceitos que, à primeira vista, parecem distantes de um filme de longa-metragem,

que demanda muitos minutos de atenção direta e exclusiva de quem quer que se

disponha a assisti-lo. Por tudo isso, parece natural que a linguagem e o formato dos

curtas-metragens se adapte muito melhor às potencialidades da Internet, e que a

esmagadora maioria dos realizadores opte por produções simples e pouco extensas

na hora de associá-las a esse ambiente virtual. Do mesmo modo, pelo simples fato

de se tratar de um ambiente novo e diferenciado para a exibição de produtos

audiovisuais, não causa estranheza o fato de muitos desses vídeos serem

enquadrados dentro do que chamaríamos de gênero experimental, rompendo em

diferentes níveis com as linguagens e os padrões estéticos tidos como “típicos” no

cinema tradicional. Desnecessário dizer que tais características se mostram ainda

mais atraentes quando aplicadas a um mercado cinematográfico como o brasileiro,

que enfrenta desde sempre problemas estruturais e cujo acesso aos grandes meios

6 Tecnologia que permite o envio de dados multimídia através da Internet, muito utilizada em arquivos envolvendo áudio e vídeo.

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de produção e exibição é ainda mais restrito do que em territórios onde a indústria

do cinema se encontra mais consolidada.

Para avançarmos no sentido de compreender este novo ambiente de

realização e veiculação de conteúdo audiovisual, nos parece igualmente impreterível

um esforço de compreensão do suporte onde essas experimentações e inovações

tomam forma – a Internet propriamente dita. No capítulo seguinte, deteremos nosso

olhar sobre o mundo virtual, tentando abarcar pelo menos parte das incontáveis

características de um meio marcado pela multiplicidade de possibilidades que

oferece. Assim procedendo, esperamos clarear um pouco nossa visão não apenas

do espaço onde as novas alternativas de realização e distribuição se processam,

mas também daqueles que delas fazem uso – e, por que não dizer, nossa visão a

respeito daqueles que a esse espaço recorrem em busca de emoção, reflexão e

entretenimento.

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2. INTERNET: UMA NOVA DIMENSÃO DO HUMANO

A Internet é um mercado em crescimento, e a sua presença está se tornando

realidade para um número cada vez maior de brasileiros. Dados de 2006, fornecidos

pelos provedores brasileiros de acesso à Internet, revelam que 32,8 milhões de

computadores utilizam serviços de rede no Brasil, sendo que 6,95 milhões são

usuários de conexões de banda larga, mais adequadas aos processos de exibição

de vídeo que nos propomos a estudar. Estimativas dão conta de que cerca de 30

milhões de usuários brasileiros podem acessar a Internet em suas próprias

residências, sem recorrerem a terminais públicos como os disponíveis em centros

comunitários e universidades. Ou seja, mesmo que pessoas de camadas mais

humildes da população sejam capazes de acessar a Internet, o fato é que a maioria

dos usuários pertence às classes média e alta – incluindo aí quase a totalidade dos

usuários de banda larga.

Embora as tecnologias em rede não sejam fruto de um acontecimento abrupto

e sim de décadas de pesquisa, a verdade é que a Internet ainda é capaz de

surpreender quando contemplada por um olhar crítico, e oferece dilemas

insuspeitados para quem busque analisá-la academicamente. Muito devido às

mudanças constantes que caracterizam a web, ainda é pouco volumosa a

bibliografia referente ao assunto, e a formação de um olhar teórico sobre a questão

acaba oferecendo algumas dificuldades. A abrangência da Internet segue em

expansão, e boa parte da população apenas agora começa a experimentar os

efeitos dos processos em rede. Não surpreende, portanto, que a reflexão acadêmica

sobre a Internet feita até aqui acabe refletindo essa contemporaneidade, focando-se

muito mais sobre aspectos gerais da tecnologia digital e da World Wide Web do que

exatamente nas implicações dessas tecnologias na sociedade atual.

De qualquer modo, é Manuel Castells (2004), sociólogo espanhol autor de

mais de vinte livros e respeitado por seus estudos sobre organizações sociais na

Internet, quem contribui com um conceito simples, mas fundamental: a Internet,

muito mais do que uma perspectiva de futuro, é uma realidade que atua diretamente

em nossa vida cotidiana.

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Internet é o tecido de nossas vidas neste momento. Não é futuro. É presente. Internet é um meio para tudo, que interage com o conjunto da sociedade e, de fato, apesar de tão recente em sua forma societária [...] não precisa de explicação, pois já sabemos o que é Internet (CASTELLS, 2004, p.255).

É uma visão que, a despeito de sua quase singeleza, influi profundamente no

desenvolvimento de análise aqui apresentada. Não é de nosso interesse descrever a

evolução das tecnologias digitais, traçar percursos históricos ou procurar prever os

desdobramentos futuros da web: acreditamos que muitos autores já o fizeram com

maior propriedade e que pouco teríamos o que acrescentar a tais estudos neste

momento. Optamos, então, por uma observação mais detida dos processos

envolvendo a Internet, das relações que a sociedade estabelece tanto

conjuntamente quanto em resposta a esses processos – o que, acreditamos, é muito

mais pertinente para a abordagem de nosso objeto de estudo. A partir daí,

teceremos considerações sobre o tratamento que a imagem recebe na era virtual,

tratando tanto de conceitos mais gerais quanto dos processos de vídeo

propriamente ditos.

2.1. PROCESSOS BÁSICOS

Uma característica marcante da Internet, e possivelmente uma das maiores

responsáveis pelo sucesso dos sites de vídeo, reside na possibilidade de interação

entre o usuário e o conteúdo acessado, muito mais ampla do que a dos meios de

comunicação anteriores. Há um processo intenso de construção, de conexão de um

conteúdo com vários outros conteúdos, uma reconstrução baseada em critérios

subjetivos e eternamente inacabada. Em muitas situações, o usuário torna-se ele

mesmo provedor de conteúdo e não apenas um mero espectador. É a esse

processo que Pierre Lévy, filósofo francês que há anos se dedica a estudar os

fenômenos sócio-culturais relativos à Internet, chama de hipertexto (1996, p.36).

O trabalho de Lévy aplica-se mais especificamente à problemática dos blogs

e da interatividade textual. No entanto, nos parece não só viável como oportuno

associar as considerações do autor aos nossos estudos sobre a distribuição de

vídeo via Internet. Segundo ele, a intertextualidade é uma característica que não

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29

surgiu com a tecnologia digital, mas que existe desde o surgimento da linguagem –

afinal, a qualquer conteúdo que absorvemos se aplica nossa bagagem intelectual,

nossa capacidade interpretativa, e se estabelece uma série de ligações com

conhecimentos e conceitos que trazemos conosco desde antes deste contato inicial

(1996, p.36-37). O extraordinário da Internet estaria na capacidade de potencializar

essa relação, processo que só se torna efetivo na medida em que o elemento

subjetivo da interpretação humana é inserido no processo tecnológico que

disponibiliza os conteúdos. Seria, no caso, ler o que se quer ler, na ordem em que

se deseja e na lógica de conteúdo de nossa preferência – um processo, parece-nos

oportuno frisar, não inédito, mas potencializado pelos links e pelo websurfing7 de

maneira que nenhum outro aparato tecnológico havia conseguido anteriormente.

A aplicação da lógica do hipertexto no processo funcional dos domínios

dedicados à reprodução de vídeos é mais clara, talvez, do que parece a princípio.

Não mais é o espectador uma pessoa que apenas assiste a programas dentro de

uma grade de possibilidades e preso à disponibilidade de tempo: ele pode selecionar

o que deseja em um leque de opções muito mais amplo, na hora que for mais

propícia para si, e através de links pode entrar em contato com vários conteúdos que

não tencionava assistir, ou nem mesmo sabia que estavam à sua disposição. Além

disso, passa a ser oferecida a possibilidade de ele mesmo postar vídeos e criar

links, ligando esse material a outros conteúdos. Estabelece-se um processo

constante de escolha, de seleção ativa da informação com participação direta e

fundamental do usuário:

[...] a partir de um estoque de dados iniciais, de um modelo ou de um metatexto, um programa pode calcular um número indefinido de diferentes manifestações visíveis, audíveis e tangíveis, em função da situação em curso ou da demanda dos usuários. Na verdade, é somente na tela, ou em outros dispositivos interativos, que o leitor encontra a nova plasticidade do texto ou da imagem [...] A tela informativa é uma nova “máquina de ler”, o lugar onde uma reserva de informação possível vem se realizar por seleção, aqui e agora, para um leitor particular. Toda leitura em computador é uma edição, uma montagem singular (LÉVY, 1996, p.41).

A navegação por sites pode, à primeira vista, lembrar o movimento errático do

zapping na televisão, uma série alienada de troca de canais em que o espectador

não estabelece nenhum tipo de ligação com o conteúdo que passa diante de seus

7 Hábito de “navegar” pela Internet, acessando uma série de páginas em uma mesma sessão.

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olhos. No entanto, compartilhamos da visão de Lévy, que atribui ao leitor do

hipertexto um papel muito mais participativo e decisivo. De fato, a navegação na

Internet sempre se inicia a partir do interesse específico do usuário, que escolhe

qual tipo de conteúdo (e-mail, notícias, entretenimento, salas de bate-papo etc.)

deseja acessar. A partir daí, uma série de novos conteúdos são oferecidos a cada

novo link escolhido, oferecendo uma gama de opções muitas vezes insuspeitada e

que muda permanentemente ao sabor das iniciativas do próprio usuário, que vai

decidindo por si mesmo o caminho a seguir. Eis, nos parece, uma diferença

importante para a simples troca de canais em uma TV: a mudança de um programa

de esportes para um seriado ou para um filme não se dá mecanicamente, e sim por

meio de escolhas, nas quais o papel do espectador deixa de ser passivo e passa a

ser fundamental.

A participação do usuário descrita acima encontra uma correspondência na

variedade cada vez maior de conteúdos disponíveis para acesso direto via web.

Dominique Wolton, cientista político francês e pesquisador do Centro Nacional de

Pesquisas Científicas da França, elabora em seu trabalho de 2003 uma divisão dos

conteúdos da Internet em quatro categorias:

a) serviços (divulgação de eventos, meteorologia, catálogos, sites de busca

etc.);

b) lazer (jogos interativos, sites que oferecem conteúdos em áudio e vídeo);

c) informação-notícia (em especial a fornecida por jornais e agências de

notícia on line);

d) informação-conhecimento (bancos de dados e sites de informação

enciclopédica como o Wikipedia).

Para efeitos de nossa análise, a segunda categoria (lazer) é a mais

significativa, embora, à época da publicação da sua obra, Wolton considerasse o

vídeo na Internet um processo que, “devido a problemas técnicos, continua em

estado embrionário” (2003, p.91). Retornaremos a Wolton e seus questionamentos

de todo o tipo muito em breve.

É essa diversidade de conteúdos e possibilidades que leva um número

considerável de teóricos a enxergar na Internet, mais do que uma nova mídia, um

novo meio de integração social. Manuel Castells é talvez o autor que mais longe foi

na questão, ao ponto de desenvolver o já consideravelmente conhecido conceito de

“sociedade em rede”, o que ele fez em ao menos dois textos (1999 e 2004). No

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centro de tal conceito encontra-se a idéia de que a Internet é muito mais do que uma

tecnologia ou uma mídia, sendo na verdade um elemento capaz de concentrar em si

“os processos sociais, os interesses sociais, os valores sociais, as instituições

sociais” (2004, p.286). Trata-se de uma série de relações constituídas em círculos

virtuais, com dimensões e instituições que transcendem o tempo e o espaço (1999,

p.427), nas quais se baseia nada menos do que uma nova forma societária. De

modo mais claro, a Internet seria o suporte para uma série de relações sociais dos

mais variados tipos – pessoais, econômicas, políticas, culturais – protagonizando ou

potencializando modificações em todas essas áreas. Praticamente todas as esferas

da atividade humana seriam contempladas, em diferentes níveis, pela Internet, e é

tal abrangência que concederia à Rede o caráter de modelo organizacional de nossa

sociedade atual.

Em nível econômico, a Internet influencia em dois sentidos. Por um lado, o

centro da economia mundial está ligado aos mercados financeiros globalizados, nos

quais as conexões entre computadores exercem papel preponderante – uma relação

que, embora não necessariamente inserida na web, converge para ela (2004, p.269-

270). Por outro, a Rede acaba influenciando também os meios de valoração

econômica, através das transações baseadas em capital de risco – muitas vezes

sustentadas em idéias que usam a Internet como veículo ou suporte fundamental.

Podemos citar brevemente as empresas Google e Yahoo! como exemplos visíveis e

bem-sucedidos desta associação.

Em nível social, movimentos utilizam a World Wide Web como forma de ação

e organização, aproveitando as características da Rede para a criação e

sustentação de entidades que, ao mesmo tempo em que são estruturalmente

flexíveis, contém em si a organização e a mobilização necessárias para sua

manutenção. Apesar de admitir a idéia de que a Internet desenvolve modos

particulares de exclusão social (como, por exemplo, a divisão entre os “que têm” e

os “que não têm” acesso à Internet), Castells considera que a situação está em

processo de mudança – e atribui ao ambiente virtual a capacidade de articular

movimentos alternativos locais e a união de comunidades que usam de forma

correlata a sociabilidade real e a virtual. Da mesma forma, contesta Castells a noção

de que a Internet seria um ambiente superficial, onde se fala de qualquer coisa e se

permite a proliferação de todo o tipo de bobagem e mesquinharia. Para o autor, não

é a Internet que é tola em si mesma; é seu caráter absolutamente livre, capaz de

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potencializar todos os tipos de relação social, que acaba permitindo que se

propaguem também as tolices e as atitudes mal intencionadas – ao lado de variados

tipos de utilização instrumental da Internet, tão ou mais presentes do que as

frivolidades, mas levados bem menos em consideração pelos críticos da Rede.

Deixemos claro que, na visão de Castells (2004), as relações sociais atingidas

pela web não surgem com as novas tecnologias, sendo reflexo de mudanças

históricas vivenciadas pela sociedade. Porém, o autor defende que essas

modificações só são possíveis a partir do advento da Internet, e que seriam

inimagináveis sem a sua existência. De fato, o autor chega a comparar o novo

paradigma ao surgimento de fábricas e grandes corporações no começo da era

industrial (2004, p.287).

Do mesmo modo, nos estudos de Castells a Internet pode potencializar

comportamentos, mas não os modifica, senão acaba sendo modificada por eles.

Relações de afinidade geradas por convergência de interesses sempre existiram; o

que a World Wide Web permite é um intensificação de tais laços, um aumento de

abrangência e uma série de possibilidades para sua manutenção. Castells associa a

isso o que ele chama de privatização da sociabilidade: diminui a importância do

relacionamento de bairro, das ligações geradas pela vizinhança física, e são cada

vez mais formadas redes pessoais, com pessoas que compartilham de interesses

particulares, mesmo que a distância física entre elas seja muito grande para permitir

a convivência diária. Do mesmo modo que se busca conteúdo na Rede, se busca

pessoas ou grupos de pessoas – e, tanto quanto no caso do hipertexto, essa busca

é não-alienada, movida por nada menos que os próprios interesses do usuário.

Lucia Santaella é outra autora a abordar, em pelo menos dois trabalhos

distintos (1997, 2003), o mundo virtual como responsável por uma nova ordem para

as sociedades humanas. No entanto, se Castells aborda a Internet como modelo de

organização social em todos os níveis, Santaella prefere lançar seu olhar

especificamente sobre as implicações da virtualidade e da multimídia sobre a própria

condição humana. Trabalhando com a idéia de modos culturais, a autora afirma

estarmos vivenciando um período de “cultura digital”, no qual a interação entre

homem e máquina é cada vez mais profunda e de conseqüências e desdobramentos

imprevisíveis. Trata-se, na verdade, de um processo iniciado ainda na época

denominada “cultura de massas”, tendo passado também pela “cultura de mídias”.

Enquanto a primeira se basearia na transmissão de um número limitado de

Page 33: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

33

mensagens simultâneas a uma audiência idealmente massificada, a segunda

trabalharia no sentido de multiplicar as mensagens possíveis, segmentando públicos

e aumentando as possibilidades interativas do receptor. A cultura digital, no caso,

ampliaria decisivamente a participação do receptor no processo, não só

potencializando a segmentação como levando mesmo à imersão do humano dentro

da máquina. No centro dessa profunda mudança, o virtual, e sua capacidade de

aglutinar inúmeras manifestações em uma só: de fato, ao contrário da convivência

de mídias distintas e pouco intercambiáveis entre si que caracterizaria a cultura de

mídias, temos uma convergência de mídias ao mesmo ponto, um espaço onde todas

convivem e acabam por tornarem-se, no fundo, uma só (2003, p.17).

O processo de cultura digital que, segundo Santaella, estamos vivenciando

implica uma conseqüência talvez perturbadora em um primeiro momento: a de que a

imersão do humano dentro do virtual está não só modificando nossa relação com as

máquinas, como causando uma redefinição do próprio conceito de humano. Se

desde o início da era industrial utilizamos as máquinas como instrumento, aos

poucos fomos aplicando conceitos sensoriais sobre o funcionamento e utilização de

tais mecanismos, tornando-os até certo ponto extensões de nossos órgãos de

sentidos. Para a autora, estamos neste exato momento avançando para um estágio

além: a utilização de softwares, interfaces, conexões de rede e todos os tipos de

ferramentas interativas estão derrubando as fronteiras entre máquina e humano,

fazendo com que a primeira atue como extensão cognitiva e sensorial do segundo.

Santaella denomina estes mecanismos como “máquinas cerebrais”, que não mais

buscam ampliar capacidades motoras ou sensoriais, mas sim atuam como

extensões de processos mentais humanos, como o processamento de dados e a

memória (1997, p.41-42). A Internet, portanto, é uma das manifestações de um novo

estágio, onde as redes de dados potencializam o avanço em direção a um processo

de fusão entre o homem e a máquina – uma redefinição não só social, mas que

avança ainda além, em direção ao pós-humano.

Mas, e quanto ao contraditório? O que pode ser contraposto a tais

interpretações superlativas da web e de seu impacto sobre o homem? Na busca de

uma visão diferenciada da Rede e de suas potencialidades, nos reportaremos aos

estudos de Dominique Wolton (2003), autor que mantém uma posição de

questionamento quanto ao caráter revolucionário das tecnologias virtuais. Com

efeito, Wolton chega a questionar a própria natureza da Internet, ao afirmar que

Page 34: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

34

“quanto ao que é essencial a Net não é uma mídia” (2003, p.101) e ao designá-la

como um sistema de transmissão de informações – talvez mais eficiente do que a

maioria dos outros, mas que não os tornaria obsoletos pelo simples fato de superá-

los de algum modo. ‘Mídia', segundo o autor, é um conceito que remete a uma

relação de emissor e público, o que não ocorreria necessariamente na Internet, cujo

maior potencial acaba sendo o de transmitir e permitir acesso a informações de todo

o tipo. Explicando de outra maneira, a Internet não definiria a priori um público -

posto que qualquer pessoa com acesso à rede, de qualquer cultura ou função social,

poderia em teoria acessar qualquer informação - enquanto um dos pontos

constituintes de uma mídia seria justamente a definição de um público.

Questão igualmente pertinente refere-se ao tipo de diferenciação social que a

Internet, na visão de Wolton, acaba por promover. Para o autor, a democracia no

acesso à informação é apenas aparente: embora teoricamente todo o conteúdo da

Internet possa ser acessado por todos os usuários, o uso das ferramentas para

localização da informação e a própria interpretação que se faz dela acabam sendo

tolhidos pela necessidade de especialização. Vistos por essa ótica, meios mais

“arcaicos” como o rádio e a televisão seriam até mais democráticos, pois pelo menos

ofereceriam o mesmo conteúdo a todos os usuários indistintamente (2003, p.96).

Segundo o autor, é real o risco de se criar uma nova e até mais perigosa forma de

segregação social através da Internet, causada:

a) pela capacidade financeira – em um sentido no qual o acesso ao conteúdo

informativo seria mais simples ou mais pleno para as pessoas que possuíssem o

maquinário mais avançado ou os recursos para pagar pela informação –;

b) pela segmentação social – apresentando informações de um modo que

apenas determinados estratos possam compreender plenamente;

c) pela dificuldade de acesso para determinadas regiões geográficas ou

classes sociais.

São preocupações constantemente presentes na argumentação do autor, e

que oferecem um claro contraste com a visão por vezes quase idílica oferecida por

outros teóricos.

Wolton questiona com firmeza a visão esperançosa muitas vezes aplicada

sobre a Internet. Embora admita o potencial da web na disseminação de

informações e atribua ao mundo virtual a capacidade para sediar novas formas de

solidariedade, é defendida em seus trabalhos a idéia de que o grande objetivo da

Page 35: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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Internet é de natureza comercial. Isso se aplica tanto à renovação constante das

tecnologias digitais, que incentiva um consumo contínuo sem que o consumidor faça

qualquer reflexão sobre a utilidade real dos novos produtos, quanto ao próprio

conteúdo da Internet, direcionado ao comércio eletrônico e ao reforço dos

mecanismos da economia global. É uma visão notadamente diferente da de teóricos

como Castells (2004), que afirma que a Internet surge sem interesses comerciais e

não é vista por seus empreendedores como uma possibilidade de lucro. Para

Wolton, a idéia da web como um espaço quase utópico de relações sociais

desinteressadas é até mesmo maléfica, pois inibe as movimentações no sentido de

regulamentar o uso da Rede. Por ser um meio gerido por interesses financeiros, a

Internet teria necessariamente que ser submetida a mecanismos de controle – e a

visão atualmente aplicada sobre a Internet acabaria por tolher a discussão sobre tal

tipo de medida, favorecendo aos grupos econômicos que a utilizam para a obtenção

de lucros cada vez maiores.

Wolton não nega o potencial democrático da Internet, e admite mesmo que

ela se presta a várias utopias modernas, dizendo ser justo que as novas gerações

se abracem a elas e tentem através da Rede algum tipo de redenção em escala

mundial. Mas adverte:

A Web não cria nenhum conceito novo. Ela oferece, por outro lado, uma extensão considerável tanto à informação narrativa quanto à informação funcional (...) Simplesmente, na web está tudo misturado em proporção ao extraordinário volume de informações e de comunicação que ela gera (WOLTON, 2003: 102-103).

Em resumo, fica bastante clara a amplitude das discussões e a variedade de

opiniões que a Rede e seus mecanismos têm despertado no mundo das idéias.

Parte de seu fascínio está inclusive nisso mesmo: por ser um elemento em

constante mutação, modificam-se também os paradigmas, e multiplicam-se os

pontos de vista e as possibilidades de abordagem. Mesmo porque a Internet

abrange boa parte das manifestações humanas, promovendo modificações em

todas elas e reforçando ainda mais seu caráter multifacetado. Na área da produção

e reprodução de imagem (que, por motivos evidentes, é a que mais nos interessa no

presente trabalho), isso se manifesta em variados níveis, provocando efeitos muitas

vezes inesperados.

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36

2.2. A IMAGEM NA INTERNET

Para caracterizar de maneira clara e não muito extensa o progresso da

imagem em sua apreciação pelo homem, citemos primeiramente Edmond Couchot

(1993) e seus estudos sobre o conceito de imagem aplicado às tecnologias virtuais.

Segundo o autor, desde a Renascença há um esforço continuado no sentido de

automatizar a produção de imagens, de decodificá-las até um elemento mínimo que

permita sua reprodução fiel e sua disseminação. Teria sido este objetivo o

responsável pela idéia de perspectiva de projeção central, fundamental para toda a

arte renascentista – que aponta, além da tendência à automatização, para a

utilização de recursos matemáticos para a sistematização da produção imagética. A

chegada do processo fotográfico, por seu turno, implicaria, pela primeira vez, na

produção de imagem sem uma intervenção manual sobre o suporte no qual ela

surge.

O cinema e, posteriormente, a televisão evoluíram no sentido da captura do

movimento – e, no caso do segundo, também na transmissão da imagem via a

redução da mesma a elementos cada vez menores. A televisão, por exemplo, torna

possível a reprodução da mesma imagem em lugares muito diferentes por meio do

ordenamento correto de feixes de luz no que Couchot descreve como “uma espécie

de mosaico luminoso” formado por pontos vermelhos, verdes e azuis ordenados por

síntese aditiva (1993, p.38). Em resumo, a imagem da televisão consiste

basicamente em um mesmo ponto de luz, que varia de cor e de intensidade no

decorrer de sua trajetória pelas linhas da tela do televisor, criando assim o registro

que nossos olhos compreendem como imagem. No entanto, são a era virtual e a

lógica dos computadores que, para o autor, efetuam a redução da imagem a seu

menor ponto constituinte, a sua partícula mais elementar: o número, o valor

representado em termos visuais pelo conceito de pixel.

O computador permitia não somente dominar totalmente o ponto de imagem – pixel – como substituir, ao mesmo tempo, o automatismo analógico das técnicas televisuais pelo automatismo calculado, resultante de um tratamento numérico da informação relativa à imagem. A procura do constituinte único da imagem concluía-se com o pixel – ponto de convergência, se pode dizer isso, de duas linhas de investigação tecnológica: uma que buscava o máximo de automatismo na constituição da imagem; outra, o domínio completo de seu constituinte mínimo (COUCHOT, 1993, p.38).

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37

O pixel é, conceitualmente falando, o menor ponto de um suporte de

visualização ao qual seja possível atribuir uma informação visual – ou seja, uma cor

ou um conjunto de cores. Cada pixel carrega em si um valor numérico, e é a leitura

de tais valores que torna possível a visualização da imagem em diferentes suportes

eletrônicos. A fidelidade de reprodução de uma imagem passa, então, a ser medida

pela quantidade de pixels usados para constituir essa imagem e pela capacidade do

mecanismo de visualização de reproduzir esses pixels com precisão. Do mesmo

modo que uma imagem gerada a partir de uma grande quantidade de pixels ainda

assim parecerá imperfeita se reproduzida por um equipamento impressor de má

qualidade, uma tela ou monitor de altíssima definição pouca utilidade terá se a

imagem que deve ser visualizada for gerada por uma quantidade de pixels

inadequada para uma representação fiel de suas características.

Segundo Couchot, o pixel funciona como um “permutador invisível” (1993,

p.39), que uma vez determinado permite a qualquer imagem ser transferida do

mundo material para o virtual e, de lá, praticamente para qualquer lugar. Do mesmo

modo, a imagem pode ser “materializada” a qualquer momento, a partir das mesmas

seqüências numéricas às quais foi reduzida. É a automação levada a um grau de

exatidão nunca antes atingido: mais do que ser gerada com precisão e transportada

com facilidade, a imagem se torna (ou pretende se tornar) uma reprodução cada vez

mais exata do que busca representar – além de cada vez mais passível de

decodificação, uma representação que se pretende precisa onde quer que um

computador seja capaz de ler os dados e dispô-los de modo correto. Assim, a

Internet se torna um veículo para o deslocamento e reprodução incessantes das

imagens digitalizadas, transformando o espaço visível em dados numéricos e

aplicando à criação de imagens, antes direta ou indiretamente subordinada à

subjetividade humana, um valor de desempenho tecnológico e de precisão mecânica

nunca antes associado à produção imagética.

De qualquer modo, embora a lógica acima descrita se aplique à

representações imagéticas de todos os tipos, pertence ao senso comum a

compreensão de que, por exemplo, uma pintura e uma gravação em vídeo são

visualizações muito diferentes, ainda que eventualmente sejam referentes à mesma

coisa. Uma pintura encontra-se estática no tempo, enquanto um filme ou um vídeo é

capaz de nos transmitir a idéia de movimento, de deslocamento, de atividade

Page 38: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

38

temporal e espacial. De fato, o cinema já foi descrito como a primeira forma artística

a de fato tratar o tempo como uma categoria significante, como parte integrante e

indissociável de sua representação. Arlindo Machado (1993, 1997), embora não

critique de todo essa visão, propõe questões que nos parecem dignas de menção.

Para o autor, a própria constituição do cinema como uma sucessão de fotogramas

estáticos reproduzidos de modo a gerar a ilusão de movimento é contrária a tal

concepção – afinal, não existe nos fotogramas em si a captura do movimento, e a

sucessão temporal entre eles só se torna clara quando são exibidos na ordem e na

velocidade corretas. Citando Bergson, Machado diz que, de certo modo, o

movimento não está no filme, e sim no aparelho utilizado para sua reprodução – e

que ele não está nas imagens, e sim que através dele somos capazes de imprimir

sentido a elas (1993, p.101-102). E, mesmo que o cinema brinque com

manipulações do tempo – editando cenas em ordem reversa, usando flashbacks,

acelerando ou diminuindo a velocidade dos movimentos – nenhuma dessas

trucagens atinge a imagem em si, que continua cristalizada no tempo, apesar dos

fotogramas serem ordenados ou apresentados de modo diferente do usual. Apenas

com o advento do digital a imagem passa a ser manipulável em suas características

constituintes – e, portanto, passível de infinitas modificações e reposicionamentos

espaciais e temporais.

Trata-se de uma diferença bastante importante para que se tornem

compreensíveis as modificações que a Internet trouxe ao acesso e visualização de

imagens. A imagem que uma pessoa vê em um livro ou em uma tela de cinema não

é nunca a mesma que está sendo vista em outro local qualquer, mesmo que esta

seja uma reprodução perfeita daquela. A imagem que vejo em um livro não é a

mesma que um eventual antípoda vê em outro livro igual, porque são livros

diferentes – do mesmo modo que a cópia de um filme sendo exibido em uma cidade

é diferente da cópia sendo assistida em uma sala de outro município. A menos que

estejamos todos na mesma sala, olhando para o mesmo livro ou a mesma tela de

projeção, estaremos vendo representações imagéticas diferentes, mesmo que

referentes à mesma imagem original. A Internet elimina esse conceito: afinal,

milhares de pessoas podem acessar no mesmo instante o mesmo endereço virtual,

e selecionarem para exibição a mesma foto ou o mesmo vídeo em streaming. O que,

à primeira vista, interpretamos como um suporte – no caso, o computador ligado à

Internet – na verdade não mais carrega em si a imagem como os meios anteriores:

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39

ao invés disso, serve como modo de acesso ao endereço onde ela se encontra, este

sim o verdadeiro “suporte” do conteúdo acessado. Quando assisto a um vídeo a

partir de um site especializado nesse tipo de conteúdo, ele só está no meu

computador na medida em que o equipamento cria arquivos temporários que

permitem a decodificação de dados e, a partir daí, a visualização – na verdade, o

vídeo está hospedado no servidor que estou acessando, e pode ser assistido ao

mesmo tempo por quantas pessoas acessem o site até o limite de sua capacidade

de banda. Trata-se, por assim dizer, da eliminação do espaço físico entre a imagem

e o observador – conseqüência direta do hipertexto e da virtualidade, e uma

modificação profunda de nossas concepções a respeito do acesso a conteúdos.

Outro aspecto digno de consideração refere-se às cada vez mais amplas

possibilidades de manipulação de imagens, tornadas possíveis pela tecnologia

digital. Muito além da formação de fractais (manifestação de ordem matemática

tornada visível através do advento da computação), surge uma gama de softwares

destinados à edição de imagens móveis ou estáticas, permitindo não só o acréscimo

ou supressão de elementos visuais como a criação de imagens absolutamente

novas, geradas sem qualquer intervenção que não as envolvidas no próprio

ambiente virtual. Uma foto, por exemplo, pode ser modificada em praticamente todos

os seus elementos: suas cores podem ser trocadas por outras, pode-se aumentar ou

diminuir a iluminação, eliminar ou incluir elementos, corrigir todo tipo de

imperfeições. Tudo isso através de softwares acessíveis a qualquer usuário e

passíveis de serem instalados em qualquer computador pessoal. A indústria das

imagens em movimento, por sua vez, já há tempos passou a utilizar essas

tecnologias de manipulação digital, tornando possíveis inúmeros tipos de trucagens

e efeitos especiais que durante décadas eram praticamente inatingíveis.

Para Louise Poissant, Ph.D. em filosofia e professora da Universidade de

Quebec, Canadá, a manifestação mais completa desta possibilidade de criação de

imagens sintéticas encontra-se na animação. Segundo o trabalho de sua autoria

publicado em 1997, as ferramentas oferecidas pela virtualidade para desenhar ou

pintar ainda não conseguem substituir a gama de opções e as sensibilidades da

criação nos moldes tradicionais - enquanto na área da animação, ao contrário, as

possibilidades de criação de imagens sintéticas, de moldagem de figuras (morphing)

e de modificação quase ilimitada de modelos e características acabam abrindo um

leque criativo inimaginável até pouco tempo atrás. De fato, embora seja uma

Page 40: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

40

manifestação surgida muito antes das tecnologias digitais, a animação encontra

nelas um enorme espaço para a experimentação e para o aperfeiçoamento. Isso

desperta interesse ainda maior se considerarmos que boa parte das produções que

serão analisadas no quarto capítulo são obras de animação, incluídas diretamente

na situação descrita por Poissant em seu artigo.

De qualquer modo, talvez uma das características mais impressionantes do

atual status da imagem no ambiente virtual esteja em sua aparente e quase absoluta

perenidade. Como bem nos aponta o professor francês Michel Bret (1997), a

imagem decodificada pelos processos numéricos não está sujeita aos efeitos de

desgaste do papel, do tecido ou de suportes fílmicos ou magnéticos: com efeito, a

imagem inserida na lógica virtual é “potencialmente inalterável (todas as cópias são

originais) e eterna (salvo algum acidente, a informação numérica não se deteriora

com o tempo)” (1997, p.104). Assim, podemos dizer que a Internet não só tornou a

imagem livre das limitações de espaço e das imperfeições de reprodução, mas

também garantiu uma existência potencialmente infinita – uma vez que o código

numérico envolvido pode, em tese, ser preservado indefinidamente e sem

alterações8. O que não se preserva inalterada, no entanto, é a impressão que a

imagem provoca sobre quem a observa – afinal, como coloca Bret, a intenção de

uma imagem não é permanente ou necessária, mas fruto da interpretação e da

bagagem cultural do receptor de sua mensagem. É, no fundo, o conceito mesmo da

interatividade, aplicado à representação imagética do mesmo modo que se aplica a

todas as outras manifestações humanas englobadas pela web. Ou seja, o mundo

virtual garante perenidade a uma imagem, mas não à sua intenção, antes o

contrário: ao dinamizar o acesso à sua visualização, multiplica as possibilidades

interpretativas aplicadas sobre ela, tanto na atualidade quanto no tempo futuro.

A apreciação de Bret se torna mais instigante na medida em que avança

sobre a representação imagética de ordem sintética enquanto relação entre o

homem e a máquina que gera a imagem e a preserva. Afinal, na visão do autor, o

homem passa a agir não sobre a imagem propriamente dita, mas sim sobre sua

simulação – e, embora potencialmente eterna dentro do universo virtual, ela existiria

8 Na verdade, sabemos que a idéia de eternidade do material contido na Internet é ilusória; de fato, basta que uma página seja retirada do ar para que o conteúdo que ela apresentava seja apagado e se torne a partir daí inacessível. A idéia, aqui, é de que o código pode ser salvo fora do ambiente virtual – e, a partir daí, retornar à Internet um número ilimitado de vezes, podendo manter indefinidamente suas características particulares.

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para nós apenas na medida em que com ela interagimos. Embora ela não “exista”,

por não ser necessariamente materializada, ela é real; e, ainda que a interpretemos

com nossa consciência e nosso intelecto, a imagem só se torna interpretável na

medida em que projetamos nosso imaginário sobre a máquina que nos serve de

meio de interação.

A imagem das realidades virtuais, mais do que uma imagem, é uma sensação (visual, auditiva, cinestética...), seu tempo é aquele da vida, mas de uma vida simulada, isto é, de uma réplica simbólica do mundo real. Longe de ser uma memória, ela se desenvolve numa duração que não é mais aquela do momento, mas a da simulação (BRET, 1997, p.105).

Conforme procuramos mostrar nas páginas anteriores, a idéia mesma da

imagem aplicada à virtualidade e à Internet modifica profundamente vários dos

conceitos antes tão arraigados à visualização e mesmo à representação imagética

como um todo. Se no primeiro capítulo os aspectos ligados à realização audiovisual

em geral, e à sua distribuição em particular, mostraram-se em um processo de

mudança graças ao mundo virtual, neste segundo capítulo a Internet e seus

processos revelam-se capazes de modificar conceitos em todos os níveis da

experiência humana – e, em última análise, do próprio conceito de humano. Não se

modificam somente o vídeo e o cinema como manifestações humanas, modifica-se

também o próprio espectador, confrontado com um leque de possibilidades e

desafios capazes de redefinir sua interação e seus conceitos a respeito do mundo

que o cerca. Não apenas alternativas como assistir vídeos por sites ou fazer o

download deles pela Internet são novidades se comparadas aos meios clássicos de

exibição, como o próprio usuário que “baixa” vídeos ou visita portais especializados

é um espectador potencialmente diferente daquele que encarava a sala de cinema

como uma opção de lazer para si e para sua família e amigos.

Nos próximos capítulos, tentaremos encontrar elementos que nos permitam

indicar, em um âmbito restrito ao Brasil, até que ponto este novo espectador e esta

nova possibilidade de exibição estão integrados e atuando de modo convergente

neste ambiente, já não tão novo, que é a Internet.

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3. DESCRIÇÃO DOS SITES SELECIONADOS

No presente capítulo, procederemos a uma descrição dos três sites

escolhidos para o presente trabalho. Depois de uma breve explicação sobre os

critérios que guiaram nossa decisão de utilizá-los, voltaremos nosso olhar de modo

mais específico a cada um deles, buscando compreender seus mecanismos e

particularidades. Faremos primeiramente um resgate histórico de cada um, partindo

a seguir para a descrição de suas ferramentas, conteúdos e elementos constituintes.

3.1. CRITÉRIOS DE ESCOLHA DOS SITES

Desde o começo, ainda no estágio de definição de tema e de recorte do

trabalho, parecia claro que um número de três sites de exibição de vídeos era o ideal

para o estudo que nos propusemos a realizar. Não apenas por estreitar

consideravelmente o campo de amostragem, mas por permitir que diferentes

propostas de exibição e de conteúdo fossem contempladas de maneira satisfatória.

Foi esse, portanto, o principal critério a guiar a escolha dos domínios que entrariam

no estudo – encontrar endereços eletrônicos que, mais do que diferenciados uns dos

outros, fossem complementares entre si, no sentido de formarem uma amostragem

capaz de dar conta dos vários aspectos passíveis de discussão em uma pesquisa

como a que nos propusemos a fazer9.

O YouTube era uma opção que se impunha, por mais de um motivo. É,

atualmente, o mais famoso site de exibição de vídeos da Internet, contando com

milhões de acessos diários, e sua fórmula serviu de inspiração para a maioria dos

9 Por certo não desconhecemos a quantidade cada vez maior de sites dedicados a exibir conteúdos em vídeo, bem como a crescente especificidade de conteúdos e abordagens que muitos deles apresentam. Parece-nos que há, a nível internacional, uma tendência à postagem de conteúdos temáticos, visando públicos mais segmentados do que o atingido por YouTube e Google Video, os mais bem sucedidos sites de vídeo até o momento. Como exemplos, podemos citar domínios com vídeos violentos ou chocantes (NothingToxic e UselessJunk), conteúdo mais direcionado a subgrupos específicos (Danerd e AnimeEpisodes) ou mesmo por vídeos de cunho sensual e/ou pornográfico (como o PornoTube, que tem uma interface diretamente inspirada nos mecanismos do YouTube e até imitando parte da sua identidade visual). É discussão bastante interessante e atual, que não cabe nos limites do trabalho aqui apresentado, mas que acreditamos merecer atenção em estudos futuros sobre o tema.

Page 43: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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outros domínios que a ele se seguiram. Não possuindo critérios de pré-seleção, e

permitindo que qualquer pessoa faça um cadastro e carregue vídeos, o portal acaba

sendo o mais democrático dentre os sites incluídos na pesquisa, permitindo que

usuários do mundo todo disponibilizem e assistam a vídeos praticamente sem

restrições de qualidade ou temática. É uma linha de atuação bem-sucedida, que

elimina a maioria das barreiras entre quem produz conteúdo e quem o assiste, e que

simplesmente não poderia ser ignorada no estudo que ora apresentamos. Por outro

lado, estando o YouTube contemplado em nossa pesquisa, nos pareceu

desnecessária a inclusão de outros endereços comprometidos com a mesma

proposta – ainda que, em casos como o Google Video, estejam já bastante próximos

em termos de praticidade e abrangência.

A proposta do Porta Curtas, por sua vez, é consideravelmente diferente.

Trata-se de um portal financiado de forma majoritária por uma empresa estatal (a

Petrobras), que exibe em versão digital filmes produzidos através de leis de

incentivo fiscal, a maioria deles realizados total ou parcialmente através de

equipamentos analógicos. Ou seja, são em sua grande maioria trabalhos que foram

originalmente planejados para as mídias tradicionais (salas de cinema e, em menor

escala, televisão e home video), mas que acabaram descobrindo na Internet uma

nova possibilidade para sua distribuição e exibição. Além disso, é uma ferramenta

utilizada pela própria Petrobras para incentivar a produção cinematográfica,

atividade que tem na empresa a maior patrocinadora do País. No caso do Porta

Curtas, há uma curadoria que faz a análise dos trabalhos antes de autorizar a

inclusão dos mesmos no arquivo permanente do site – de modo que é perfeitamente

aceitável deduzirmos que os vídeos disponíveis no portal atendem a padrões de

qualidade e conteúdo, formando um conjunto muito mais seleto do que o que

podemos encontrar no YouTube, por exemplo. É uma opção que passa pelo Estado

e que, pela própria natureza do projeto, acaba por restringir o acesso aos recursos

do site a filmes já previamente aprovados quando da utilização de leis de incentivo.

Finalmente, o Curta O Curta trabalha com idéias que, de certo modo, unem os

dois extremos acima descritos, e acaba apontando para novas direções. Além de ter

sido o primeiro portal brasileiro a exibir curtas-metragens nacionais através da

Internet, acabou diversificando suas atividades com o decorrer do tempo, sendo hoje

uma empresa constituída que presta vários serviços ligados à realização

audiovisual. Não nos parece fora de propósito afirmar, com base na análise que

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44

descreveremos daqui por diante, que o que antes era o centro da atividade do site (a

exibição de curtas nacionais) tornou-se apenas um de vários serviços oferecidos – e

que o caráter virtual da atividade do portal presta-se atualmente como chamariz para

atividades que, embora ligadas ao mundo digital, não convergem necessariamente à

Internet de onde surgiram. Boa parte dos trabalhos apresentados no Curta O Curta

foram realizados com os serviços prestados pela própria empresa que comanda o

portal, sendo bem menos numerosos os casos de curtas-metragens que se servem

do site apenas como meio de exibição. Temos, portanto, uma abordagem bastante

diferenciada das duas anteriormente citadas, o que nos parece justificar a inclusão

do Curta O Curta no presente estudo.

Um critério um tanto óbvio, mas que requer uma breve explicação, refere-se à

necessidade de exibir produções realizadas em território brasileiro, produzidas e

dirigidas por realizadores nacionais. Tanto o Porta Curtas quanto o Curta O Curta

restringem-se a conteúdo realizado no Brasil e por brasileiros – ao contrário do

YouTube, que por sua própria proposta aceita vídeos de todo o mundo. No entanto,

optamos por concentrar nossa apreciação do YouTube em conteúdos de origem e

realização claramente identificados com o Brasil, de modo que nossa idéia original

de contemplar o cinema independente brasileiro não resultasse comprometida.

Considerando as diferenças (e semelhanças) entre os três portais que

escolhemos para constituírem a amostragem do trabalho, nos parece que temos

bem representadas boa parte das características apresentadas pela exibição de

vídeos na Internet. Da mesma forma, já em uma comparação superficial dos três

sites investigados surgem questões interessantes, desenhadas brevemente acima e

que pretendemos aprofundar neste capítulo e no próximo. A seguir, faremos uma

descrição mais detida de cada um dos domínios escolhidos, apresentando um

histórico e analisando em detalhe os mecanismos de navegação e os conteúdos –

em vídeo ou não – oferecidos por cada um deles.

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45

3.2. YOUTUBE

3.2.1. Histórico

O YouTube surgiu no início de 2005, da iniciativa de Steve Chen, Chad Hurley

e Jawed Karim. Os três eram funcionários do PayPal (sistema de pagamentos e

depósitos largamente utilizado para compras via Internet), e juntos desenvolveram a

idéia de um site simples, onde os usuários pudessem disponibilizar vídeos com

rapidez e sem maiores despesas. Alegadamente, a inspiração veio depois de uma

festa, na qual os amigos gravaram alguns vídeos e depois passaram a pensar em

um jeito de disponibilizá-los para os que não tinham ido à comemoração.

O domínio foi registrado em fevereiro de 2005, e em maio do mesmo ano foi

trazido a público pela primeira vez, ainda em caráter experimental. Apenas em

novembro de 2005, ele passaria a funcionar plenamente, oferecendo aos usuários a

possibilidade de assistir livremente uma grande quantidade de vídeos. Naquele

momento, o grande diferencial do site com relação a outras iniciativas semelhantes

foi permitir a postagem de vídeos pelo próprio usuário, através de um processo

simples e relativamente rápido, que será explicado em detalhe mais adiante.

Tratava-se de uma possibilidade até então inédita, e que parece ter sido decisiva

para o imenso sucesso do portal. Pouco depois, novos recursos foram

disponibilizados, permitindo a postagem de video responses (vídeos inspirados ou

diretamente ligados a outros, formando uma rede de links entre eles), sistemas mais

avançados de busca, e a possibilidade de “assinar” um determinado usuário ou

canal, recebendo avisos sempre que um novo vídeo é postado.

O conteúdo variado do YouTube é, certamente, uma das maiores explicações

para seu sucesso e ascensão. Inicialmente, tratava-se quase exclusivamente de

vídeos caseiros, postados pelos usuários a partir de gravações feitas por eles

mesmos em câmeras digitais de baixo custo. Logo, no entanto, uma série de

programas antigos de TV, gravações históricas e videoclips foram sendo

digitalizados por colecionadores e disponibilizados através do YouTube para quem

quisesse assistir. Na mesma medida em que esses conteúdos trouxeram um grande

público para o site, acabaram gerando igualmente a insatisfação das várias

Page 46: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

46

companhias detentoras dos direitos de exibição do material disponibilizado sem

autorização prévia – e um grande número de processos foram abertos contra o

YouTube, exigindo pagamento de royalties e muitas vezes implicando na retirada de

vídeos do ar. Empresas tradicionais no ramo de vídeo como Viacom, Fox e

Columbia moveram ações contra o site, gerando discussões cada vez mais intensas

sobre as leis de direito autoral e sobre as implicações legais do livre acesso a

conteúdo, uma das pedras basilares de toda a Internet.

Em outro sentido, o surgimento do YouTube foi visto com entusiasmo por uma

grande quantidade de criadores independentes. A possibilidade de postar qualquer

material levou vários realizadores iniciantes a apostarem na nova plataforma, da

mesma maneira que muitas bandas e artistas independentes acharam na

possibilidade de postar videoclips e trechos de shows uma nova maneira de

divulgarem suas carreiras.

O crescimento do YouTube foi rápido e pegou de surpresa até mesmo os

responsáveis por sua idealização. Na metade de 2006, o site da Alexa,

especializado em estatísticas sobre navegação na Internet, declarou o YouTube o

quinto domínio mais popular na Rede – isso em menos de um ano de funcionamento

aberto ao público. Atualmente, o YouTube consta no Alexa como o terceiro domínio

mais visitado na Internet10. Logo depois da divulgação dos dados da Alexa, a revista

Time elegeu o YouTube a “Invenção do Ano” de 2006. Dados divulgados em junho

de 2006 dão conta de que quase 100 milhões de vídeos são assistidos diariamente

via YouTube, em uma média de 22 milhões de visitas por mês, e que cerca de 66 mil

novos arquivos são postados por dia no site.

O sucesso da idéia levou, compreensivelmente, ao surgimento de um grande

número de domínios com a mesma proposta básica – disponibilizar gratuitamente

conteúdo em vídeo via World Wide Web. Nomes como Metacafe, DailyMotion, iFilm

e Lulu TV passaram a atuar, com diferentes graus de sucesso, mas até o presente

momento sem terem conseguido alcançar repercussão semelhante a do pioneiro

que os inspirou. Por seu próprio pioneirismo e engenhosidade, o YouTube

segmentou-se não só como uma opção de entretenimento virtual, mas como uma

marca presente na mente dos usuários da Rede – e não demorou para que grandes

10 Conforme visto em <http://www.alexa.com/site/ds/top_500>, em 11 nov. 2007.

Page 47: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

47

investidores passassem a planejar a compra da marca, cujo potencial econômico

crescia quase que diariamente.

Finalmente, depois de várias especulações, a companhia Google – que já

tinha criado o Google Video, o concorrente até então mais proeminente do YouTube

– anunciou a compra do site por nada menos de 1.65 bilhão de dólares, em uma das

maiores transações envolvendo tecnologia digital ocorridas até então. O acordo foi

selado oficialmente em novembro de 2006, gerando discussões e levantando

dúvidas sobre o futuro do YouTube como um domínio gratuito e de livre acesso. De

acordo com as regras do contrato, os 67 funcionários da empresa continuam ligados

ao site, e os fundadores continuam comandando o YouTube sem a necessidade de

prestarem contas ao Google.

3.2.2. Navegação e conteúdo

A interface básica do site é bastante simples e de fácil compreensão para o

visitante de primeira viagem, e pode ser vista com maiores detalhes nos Anexos A,

B, C e D. A janela de reprodução aparece na página principal, à esquerda, sem a

necessidade de abertura de janelas extras (pop-ups), e seus comandos são muito

semelhantes aos utilizados em aparelhos comuns de vídeo ou DVD: reprodução,

pausa, controle de volume etc. Entre os recursos disponíveis, há o de diminuir a

imagem (para que tenha a melhor definição possível) ou ampliá-la até o ponto de

assistir em tela inteira. À direita da janela de exibição, ficam as informações

disponibilizadas pelo responsável pela postagem, geralmente uma descrição

superficial ou jocosa do conteúdo do vídeo. Aparecem, igualmente, as tags

(palavras-chave usadas no mecanismo de busca), além dos links do vídeo e do

embed11 do mesmo (cuja utilidade será descrita em detalhes logo adiante).

Abaixo das informações sobre o vídeo, uma outra janela mostra vídeos que

de algum modo estão ligados ao que está sendo assistido. Os links surgem em

forma de pequenas imagens dos vídeos, e são organizados em três abas: related

(vídeos semelhantes em conteúdo e/ou estética), more from this user (lista dos

11 Codificação de arquivos de áudio ou vídeo em forma de texto. Permite a mescla de diferentes arquivos, e o transporte rápido de arquivos que seriam muito mais volumosos. Os protocolos mais conhecidos do tipo são o XML e o XSL.

Page 48: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

48

vídeos já postados pelo usuário em questão) e playlists (que contém listas de

execução de outros usuários que de algum modo se relacionam com o vídeo que

está sendo assistido). Ao lado esquerdo dessa janela, abaixo da janela de exibição

propriamente dita, ficam expostos os comentários sobre o vídeo. Somente usuários

conectados ao site podem postar comentários, e o responsável pela postagem do

vídeo pode apagá-los ou mesmo desabilitar completamente a postagem dos

mesmos, caso julgue conveniente.

Junto aos comentários, existe um mecanismo que permite ao espectador

cadastrado avaliar o vídeo em uma escala de uma a cinco estrelas, bem como

adicioná-lo a sua lista de favoritos ou mesmo oferecer honrarias (honors) ao autor da

postagem que se está assistindo. Os favoritos podem ser acessados através da

página pessoal do usuário cadastrado, tornando mais fácil assistir repetidas vezes o

mesmo conteúdo. Como ferramenta de auto-controle, no mesmo espaço é possível

também denunciar o material postado como inadequado ou agressivo, tornando o

acesso a ele restrito ou fazendo com que seja retirado do ar.

A grande diferença do YouTube para a maioria dos demais sites de exibição

de vídeos está na liberdade que oferece aos próprios usuários para a postagem de

conteúdo audiovisual. Qualquer pessoa, mediante um cadastro breve e gratuito,

pode se tornar proprietária de uma conta no YouTube – e, uma vez fazendo o login,

o usuário está livre para desfrutar de uma série de recursos inacessíveis aos

visitantes ocasionais do domínio. Além da postagem de vídeos em si, cujo processo

descreveremos logo a seguir, o usuário cadastrado pode adicionar vídeos de outras

contas como favoritos, tornar-se assinante das contas de outros usuários (o que

garante avisos especiais sempre que os usuários assinados postarem novos vídeos)

e trocar mensagens e video responses com outros cadastrados.

No momento da inscrição, o usuário tem a opção de cadastrar-se como

usuário comum (standard) ou através de alguma das opções extras oferecidas:

musician (opção voltada para pessoas ligadas à área da produção musical),

comedian (artistas ligados à paródia, sátira, quadros do tipo stand-up e outras

manifestações cômicas do tipo), director (direcionado a realizadores audiovisuais) ou

guru (aberto para quem deseja usar o YouTube como meio para ensinar a realizar

trabalhos artísticos ou técnicos de todos os tipos). Cada uma delas oferece

vantagens como limite maior de tamanho ou duração dos arquivos para postagens,

Page 49: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

49

além de evidenciar o usuário nos mecanismos de busca, aproximando-o de outras

pessoas com os mesmo interesses.

O processo de postagem de vídeos é igualmente simples, e uma visualização

pode ser encontrada nos Anexos E e F. Vídeos em vários formatos são aceitos,

desde que tenham no máximo dez minutos de duração e tamanho de 100mb (cem

megabytes) ou menos. Durante e logo após a postagem, o autor pode selecionar um

nome para o arquivo, bem como a descrição do conteúdo, quais tags serão

aplicadas a ele, as regras para acesso e para postagem de comentários e outros

detalhes do tipo. Ao serem carregados no site, os arquivos são convertidos para a

terminação “.flv” (formato Flash), e em cerca de quarenta e cinco minutos já podem

ser assistidos e localizados através das ferramentas de busca.

Um dos recursos que colaborou para a popularidade do YouTube é a inclusão

de vídeos disponíveis neste site em outros endereços da Internet, como blogs e

páginas pessoais. O embed de cada vídeo é fornecido na página onde o mesmo

está hospedado, e caso o responsável pelo mesmo não restrinja o acesso a ele,

qualquer um pode copiar esse código e aplicá-lo no código-fonte de outras páginas,

permitindo que o vídeo seja assistido sem a necessidade de acesso direto à página

original. Isso torna o acesso e a utilização dos recursos do site ainda mais ampla, já

que vídeos hospedados no YouTube podem ser assistidos em muitas outras páginas

sem relação direta com o mesmo. É um recurso que aos poucos foi sendo

incorporado por outros portais, mas que ainda representa uma vantagem do

YouTube com relação à maioria de seus concorrentes.

Quanto ao conteúdo presente no YouTube, as restrições são poucas, e na

maior parte das vezes de ordem legal. Materiais protegidos por leis de direitos

autorais ou de cunho considerado ofensivo costumam ser mantidos no ar até que

ocorra uma reclamação formal – segundo o representante do YouTube no Brasil,

seria impossível rastrear permanentemente os milhares de vídeos novos postados

por dia , de modo que a equipe do site precisaria receber avisos dos usuários para

tomar as atitudes necessárias em cada caso. Tais explicações, no entanto, não

convencem muitas empresas e órgãos jurídicos – em um evento já célebre, uma

ação judicial movida pela apresentadora Daniela Cicarelli fez com que os provedores

brasileiros de Internet bloqueassem por alguns dias o acesso de seus usuários ao

YouTube. A idéia era impedir que os usuários do portal assistissem a um vídeo feito

clandestinamente, que mostra Cicarelli mantendo relações com seu namorado em

Page 50: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

50

um local público. A medida mostrou-se pouco eficiente e bastante impopular, mas

tornou ainda mais evidenciado o debate sobre a Internet e sobre as modificações

que ela acarreta à esfera da vida pública – e, em outro sentido, sobre a dificuldade

de controlar a disseminação de conteúdos colocados na Rede, evidenciando a

ineficácia das políticas atualmente existentes para lidar com essa questão.

É muito difícil fazer uma descrição do tipo de vídeo que está disponível no

YouTube, justamente porque quase todo tipo de conteúdo audiovisual pode ser

veiculado através dele. É possível encontrar desde vídeos caseiros de festas e

brincadeiras até produções bastante elaboradas, muitas já realizadas com o intuito

de serem exibidas através do site. O realizador Lev Yilmaz, por exemplo, faz

sucesso com sua série de animações “Tales Of Mere Existence”, feitas à mão em

papel jornal e exibidas contra a luz de uma lâmpada. Já o diretor norte americano

Mark Bunker utilizou o YouTube como veículo para sua série de documentários

contra a religião Cientologia, postando mais de cem vídeos na sua conta (chamada

XENUTV) e conseguindo considerável repercussão internacional. Em escala menor,

são incontáveis os exemplos de pessoas que editam vídeos em suas próprias casas,

usando programas simples, e os colocam no site para homenagear algum amigo ou

ídolo de adolescência. Isso sem citarmos todos os usuários que disponibilizam

seriados antigos, videoclips, trechos de shows raros, programas de TV há muito fora

do ar e toda uma série de materiais inacessíveis até há pouco tempo atrás. Existe,

portanto, toda uma gama de possibilidades, que permite a praticamente todos os

usuários encontrarem pontos de interesse e incentivos para colocarem seus próprios

arquivos para exibição no portal – algo que se diferencia consideravelmente do

modelo seguido pelo Porta Curtas, que descreveremos a seguir.

3.3 PORTA CURTAS

3.3.1. Histórico

O surgimento do Porta Curtas está associado de modo curioso a um dos

curtas-metragens mais conhecidos de nossa filmografia. Em 1988, os realizadores

Page 51: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

51

Ana Luiza Azevedo e Jorge Furtado produziram “Barbosa”, que conta uma história

de ficção baseada na final da Copa do Mundo de futebol de 1950 – jogo graças ao

qual o goleiro que dá nome ao filme acabou tornando-se uma espécie de anti-herói

nacional. Quando do falecimento de Barbosa, em abril de 2000, surgiu a idéia de

incluir na notícia divulgada pela Internet um link que levasse a uma reprodução do

curta-metragem baseado na sua história. Um dos envolvidos – o realizador Julio

Worcman – tirou do incidente a inspiração para um projeto que permitisse a

distribuição de curtas-metragens através da Rede Mundial de Computadores. Em

2002, tal projeto se concretizaria na forma do Porta Curtas.

Desde sua idealização, o projeto responsável pelo Porta Curtas se destina a

duas finalidades paralelas. Por um lado, há a preocupação com a exibição de vídeos

propriamente dita; por outro, um interesse no desenvolvimento de uma catalografia

da produção nacional – que de início se restringe aos filmes de curta-metragem,

mas que em breve deve ser estendida a toda a realização cinematográfica brasileira.

Está presente desde um primeiro momento, portanto, uma preocupação documental

e de preservação da memória, gerada pela noção de que informações importantes

eram perdidas pela falta de um ambiente que as centralizasse – e que se manifesta,

ainda hoje, não só na existência do catálogo como na própria inclusão, em

streaming, de realizações não-recentes, muitas delas lançadas há cerca de vinte

anos ou mais.

O patrocínio da Petrobras foi e continua sendo fundamental para a

viabilização do portal e das atividades a ele ligadas. O aporte oferecido pela

empresa estatal de energia é majoritário, representando 57% da receita utilizada

pelo Porta Curtas em suas diversas atividades. A maior parte do valor restante é

obtida através das leis nacionais de incentivo à cultura. Embora possa parecer um

montante não tão significativo em uma análise superficial, o fato é que o patrocínio

oferecido pela Petrobras constitui-se na única fonte de receita não-variável,

mantendo a segurança necessária para que as atividades do projeto se mantenham

de forma constante e ininterrupta.

No momento de seu surgimento, o portal apresentava cem filmes para serem

assistidos. Em dez meses de atividades, a quantidade de reproduções dos filmes

disponíveis superava a marca de quinhentos mil acessos – um sucesso descrito

pelos administradores do site como inesperado. A evolução do domínio e

informações técnicas (como a quantidade de vídeos exibidos ou catalogados e o

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52

número de acessos recebidos) estão disponíveis ao visitante via uma série de

relatórios, hospedados em uma das sessões do Porta Curtas. Pela análise de tais

documentos é possível observar aspectos significativos da evolução do site através

dos anos – como, por exemplo, a opção definitiva pela plataforma de exibição

Windows Media (wmv), em detrimento da Real Player, utilizada paralelamente com o

wmv nos primeiros meses de atividade do Porta Curtas.

A expansão do projeto se deu igualmente em atividades junto a festivais de

cinema brasileiro, através do Prêmio Porta Curtas Petrobras. Abrangendo as

produções participantes de grandes eventos – como o Festival de Brasília e o Mix

Brasil - Festival de Cinema e Vídeo da Diversidade Sexual –, o prêmio desenvolve-

se em duas fases. Após uma seleção entre as realizações inscritas no prêmio, elas

são incluídas em uma página especial, para serem alvo de avaliação do público. Os

mais votados a partir desta consulta recebem um prêmio-aquisição e passam a

integrar o acervo do portal.

Atualmente, o Porta Curtas conta com mais de quinhentos curtas-metragens

para exibição – superando amplamente a meta estabelecida para o ano 2007, que

previa um número de 119 trabalhos no acervo – e apresenta 4.140 fichas técnicas

disponíveis em catálogo para consulta e armazenamento. Os dados fornecidos pelos

relatórios igualmente dão conta de que 94% das fichas disponíveis motivaram

alguma interatividade pró-ativa até o momento – ou seja, não foram apenas

consultadas, mas também indicadas por e-mail para outros usuários ou

armazenadas em cinematecas individuais. Os números em questão são bastante

superiores aos inicialmente previstos, e servem como indicativos do sucesso da

fórmula adotada pelo portal.

3.3.2. Navegação e conteúdo

Por ser um domínio que apresenta uma série de conteúdos além da exibição

de filmes propriamente dita, o Porta Curtas pode parecer de início um pouco

confuso. É necessário alguma procura na página para encontrar as indicações que

garantam o acesso ao que se deseja, e um usuário iniciante pode ficar bastante

perdido em um primeiro momento. Basicamente, os conteúdos são divididos em três

Page 53: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

53

colunas: a primeira com links diretos para os vídeos; a do meio com informações

sobre as atrações do site e notícias sobre o cinema nacional (“Curtinhas”), e a da

direita apresentando parte dos projetos paralelos ligados ao portal, bem como links

para sites semelhantes – o Curta O Curta está relacionado, inclusive. Uma visão

parcial da página inicial do Porta Curtas está presente nos Anexos G e H.

Os vídeos disponíveis no arquivo do Porta Curtas podem ser acessados

através de uma ferramenta de busca, ou por links diretos como os que aparecem

nas listas de mais acessados ou nas estréias do período. Abrem em uma nova

janela (pop-up) e são hospedados no formato Windows Media (.wmv). Antes da

exibição de todos eles, há uma vinheta de cerca de dez segundos mostrando a

marca da Petrobras – o que evidencia ainda mais a ligação do portal com a

instituição que o promove. Ao lado do espaço onde é exibido o vídeo, estão

dispostos pequenos ícones, indicativos dos prêmios recebidos pelo trabalho ou de

sua exibição em grandes festivais de cinema. A janela é relativamente pequena (240

x 180 pixels) e não está configurada para mudanças no tamanho ou definição da

imagem – o espaço de exibição é menor do que o disponível no YouTube, por

exemplo. No entanto, outros recursos comuns aos demais sites estão presentes,

como a possibilidade de postagem de comentários e atribuição de notas ao filme –

no caso, em uma escala de uma a cinco estrelas. Uma visão da janela de exibição

está apresentada no Anexo I.

Para os cadastrados no site, são oferecidos serviços especiais como a

Cinemateca, que consiste na seleção e rápido acesso aos filmes favoritos e a

informações contidas no catálogo de curtas-metragens. Os dados são guardados e

organizados pelo usuário em pastas, que podem ser acessadas rapidamente a

qualquer momento e enviadas por e-mail para outros usuários, multiplicando os

acessos a uma cinemateca particular. Ocorre igualmente o envio de boletins via e-

mail (newsletters) com notícias e informações sobre os vídeos incluídos mais

recentemente. É permitido igualmente aos cadastrados colocar vídeos em sites

pessoais e blogs, sem nenhum ônus. Há ainda uma ferramenta chamada Roleta,

que faz uma busca aleatória (random) no arquivo do site e exibe automaticamente o

curta-metragem selecionado no processo.

Um dos projetos desenvolvidos pela equipe Porta Curtas – e que recebe

posição de destaque no site – é o Curta Na Escola, que atua junto a escolas de

ensino fundamental de todo o País. Atuando desde 2006, o projeto tem como meta

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54

estimular a utilização de curtas-metragens brasileiros como material pedagógico, e

oferece atualmente um DVD com oito títulos (considerados pelos coordenadores

como de alto valor didático) para os professores cadastrados na página. Através da

Internet, é possível ler a ficha técnica dos trabalhos selecionados e trocar idéias com

outros professores por meio da publicação de pareceres e da participação em fóruns

de discussão. A idéia, segundo a apresentação do site do Curta Na Escola, é reunir

um grande material sobre a experiência inicial, de modo a aperfeiçoar o projeto em

etapas futuras. O projeto tem um domínio próprio, que pode ser acessado por um

link disponível em todas as diferentes sessões do Porta Curtas.

Quanto aos trabalhos disponíveis no Porta Curtas, é feita por parte da

curadoria do portal uma avaliação de questões narrativas e conceituais para

escolher quais filmes serão exibidos no site. No entanto, o principal critério alegado

pela equipe do site é de cunho técnico: como a janela de exibição é pequena e o

áudio geralmente oferecido pelas caixas de som de um computador é de baixa

qualidade, há a necessidade de que o trabalho tenha imagens bastante nítidas e

uma boa qualidade de captação e edição de som. Para efeitos de arquivamento no

portal, os curtas-metragens são divididos em categorias relacionadas com seu

conteúdo – animação, documentário, experimental e ficção. Há também indicações

especiais para atrações que contenham conteúdo adulto ou que estejam

participando no momento de mostras competitivas em festivais dentro ou fora do

Brasil. Características distintas das apresentadas pelo portal Curta O Curta –o qual

tem um conceito de exibição de vídeos consideravelmente diferente dos outros sites

estudados até aqui.

3.4. CURTA O CURTA

3.4.1. Histórico

É disponibilizado no próprio site um histórico do surgimento do portal, escrito

em primeira pessoa por seu fundador, o jornalista e realizador Guilherme Whitaker.

Surgido em 2000, foi o primeiro portal no Brasil dedicado à exibição de curtas-

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55

metragens nacionais, e desde o primeiro momento tinha como objetivos a exibição

de vídeos e a divulgação de notícias sobre o audiovisual brasileiro. As mesmas

diretrizes, embora mais elaboradas, continuam sendo seguidas pelo domínio ainda

hoje.

Quando da inauguração, em outubro de 2000, o Curta O Curta disponibilizava

um total de 30 vídeos para exibição em streaming no formato Real Player, além de

uma seção de notícias de atualização constante, coordenada pelos sócios Phillipe

Cortês e João Alfredo. Em pouco tempo, o portal alcançou o número de cem curtas

em exibição simultânea – o que era, conforme as alegações contidas no próprio site,

algo inédito na época. Paralelamente, passou a apoiar e a participar de eventos

ligados ao modelo clássico de exibição de filmes – como a mostra carioca Mostra O

Que Neguinho Tá Fazendo, realizada mensalmente durante três anos e focada em

curtas-metragens de cunho alternativo.

Com o gradual crescimento no número de acessos e de material

disponibilizado, os responsáveis pelo site começaram a buscar formas de diversificar

as atividades ligadas ao nome Curta O Curta. Notadamente, o portal envolve-se,

desde 2001, na organização da Mostra do Filme Livre, que exibe várias produções

independentes de cinema, além de divulgar uma série de outros eventos

semelhantes pelo País. Trata-se de uma mostra sem restrições de bitola, estilo ou

duração dos filmes, com inscrição gratuita e on-line. O site trabalha em parceria

também com o Ateliê da Imagem, escola de fotografia da cidade do Rio de Janeiro,

promovendo cursos ligados à realização cinematográfica.

O maior empreendimento de todos, no entanto, ocorreu em 2005, com a

formação da firma jurídica “Curta O Curta Distribuição e Comércio Ltda.”, que

transformou a marca em uma distribuidora e produtora de cinema independente. As

idéias nesse sentido surgiram logo depois da página entrar no ar, e foram se

intensificando na medida em que o caráter não-profissional do site foi se tornando

prejudicial ao crescimento do mesmo. As atualizações acabavam ocorrendo em um

ritmo mais lento do que o necessário, e a expansão do Curta O Curta tornou

inevitável um processo gradativo de profissionalização – que, depois de atingir o

domínio propriamente dito, expandiu-se sobre as atividades paralelas da equipe

responsável, que resultaram na oficialização da firma jurídica.

Atualmente, o Curta O Curta, enquanto domínio de Internet, tornou-se

parcialmente um veículo de distribuição da empresa constituída em 2005, além de

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56

se prestar à divulgação dos serviços prestados pela firma – que englobam a

produção e distribuição de filmes de curta-metragem, além de serviços de aluguel de

equipamentos, autoração de DVD’s, tradução e legendagem. Paralelamente,

mantém a divulgação de vídeos não ligados diretamente a sua firma jurídica, além

de oferecer notícias sobre festivais e mostras de cinema brasileiro, com atualização

diária. Essas características são bastante evidenciadas quando analisamos mais

detidamente as características visuais e as opções de navegação oferecidas no site.

3.4.2. Navegação e conteúdo

De modo semelhante ao que encontramos no Porta Curtas, um visitante

interessado somente em assistir aos vídeos disponíveis no portal pode ficar confuso

ao entrar na página inicial do mesmo. Coerente com a direção tomada a partir da

transformação em empresa jurídica constituída, o Curta O Curta tornou-se muito

mais um domínio voltado à atividade da realização audiovisual em curta-metragem

como um todo do que um mero espaço para exibição de vídeos. O material em

vídeo, embora ainda apareça com destaque, disputa espaço com links de notícias,

serviços, cursos e outros conteúdos semelhantes, caracterizando-se cada vez mais

como um chamariz do que exatamente como a atividade principal do Curta O Curta.

Nos Anexos J e K, são visíveis algumas das principais características visuais do

portal.

Na abertura do site, há um painel no qual são mostradas pequenas imagens

(thumbnails) de filmes recentemente adicionados ao acervo, ao lado de pequenos

resumos de cada um. É possível também acessar o arquivo permanente do portal

por meio de um botão na parte superior da página, à direita. Trata-se de uma sessão

específica, onde os curtas-metragens são listados e são oferecidas ferramentas para

facilitar a busca de filmes em particular. Aparecem thumbnails de cada filme, ao lado

de pequenas sinopses e de links para acesso ao vídeo propriamente dito ou à ficha

técnica do mesmo. É oferecida também a possibilidade de fazer download dos

programas (players) necessários para assistir aos vídeos – os mais antigos podem

requerer o uso de Real Player, Flash Player ou Quicktime, enquanto a maioria dos

mais recentes já está padronizada no formato Windows Media (wmv).

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57

A janela de exibição abre na própria página de navegação, sem necessidade

de pop-ups para visualização, e apresenta um visual que facilita a compreensão dos

comandos e recursos extras disponíveis. Um exemplo pode ser visto no Anexo L. O

tamanho de visualização padrão é pequeno, mas um duplo click sobre o vídeo faz

com ele possa ser visto também em tela inteira. É possível acessar, ao mesmo

tempo, os comentários sobre o vídeo que se está assistindo, bem como postar suas

próprias impressões sobre ele, sem a necessidade de abertura de janelas

adicionais. Está igualmente disponível um link que permite a visualização da ficha

técnica do vídeo – embora, no caso, a reprodução do streaming seja interrompida. A

exibição dos vídeos escolhidos pelo usuário é imediata, sem a inclusão de vídeos

introdutórios ou de institucionais do site.

A parte dedicada às notícias sobre audiovisual (chamada “Jornal do Curta”) é

tão valorizada quanto a seção de vídeos, e apresenta grande quantidade de

informação, com atualização diária. As notas publicadas abrangem diversos

aspectos da produção cinematográfica, noticiando lançamentos em curta e longa-

metragem, prazos de inscrição e realização de festivais, inaugurações de novas

salas de exibição e uma série de informações relacionadas direta ou indiretamente

com o tema. Há seções específicas para artigos e entrevistas, e os usuários podem

enviar notícias para possível publicação no site, por meio de um pequeno formulário.

Existe igualmente uma página de classificados, que permite separar os anúncios por

filtros e realizar buscas por Estado ou por categorias de serviço. Um outro diferencial

é a seção “Curta O Longa”, que apresenta críticas e pequenos ensaios sobre

realizações brasileiras em longa-metragem, privilegiando textos longos e de maior

densidade.

Há uma quantidade razoável de anúncios (banners) de apoiadores do Curta O

Curta, bem como de serviços ligados de modo direto ou indireto com a empresa que

controla o domínio. Em sua maioria, são cursos relacionados com fotografia,

captação e edição em vídeo, oferecidos pelo próprio Curta O Curta ou por empresas

atuando em parceria com o mesmo. Na verdade, o oferecimento de serviços merece

uma seção própria no site, com descrição cuidadosa das opções e até mesmo a

inclusão de uma tabela de preços para inclusão de banners e para os demais

serviços disponíveis através da empresa. Há ainda uma página específica para a

análise de audiência, voltada para empresas que estejam cogitando a inclusão de

anúncios em alguma das páginas (principal, internas e áreas interativas) do portal.

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58

Nesta página, são exibidas informações sobre a firma jurídica Curta O Curta, além

de gráficos demonstrativos do crescimento de acessos e das áreas mais visitadas

pelos usuários do site.

Outra área coberta pela equipe da empresa está relacionada com a

distribuição de curtas-metragens propriamente dita. Através de um serviço especial,

o realizador interessado pode garantir a inscrição de seu trabalho em uma série de

festivais nacionais, ficando por conta da empresa contratada os custos de inscrição,

produção de cópias e envio de material. O contratante pode conferir sempre que

desejar a efetividade do serviço por meio de um painel de controle (disponibilizado

no site), e o contrato pode ter a duração de até dois anos. A inclusão da obra no

acervo do portal é apenas um opcional do contrato em questão, sendo perfeitamente

possível a aquisição do serviço de distribuição sem que o trabalho fique disponível

para visualização ou mesmo que seja listado no arquivo do Curta O Curta.

Quanto aos critérios para inclusão de vídeos, o Curta O Curta adota,

atualmente, uma postura mais comercial do que a seguida pelo Porta Curtas ou

mesmo pelo YouTube. Grande parte dos vídeos incluídos no acervo são realizações

envolvidas de modo total ou parcial com a empresa Curta O Curta, seja em

produção e direção propriamente ditas, ou na utilização de serviços de captação ou

edição de imagens. E o espaço no arquivo permanente do portal é alvo de transação

comercial: para hospedar o vídeo e financiar os trabalhos de conversão, o produtor

deve pagar uma taxa de cem reais (R$ 100,00) ao ano (que aumenta de valor caso

a duração do trabalho exceda os dez minutos) e assinar uma autorização em duas

vias com firma reconhecida em cartório. Embora ainda haja uma avaliação prévia

dos filmes enviados para que atendam a critérios específicos de qualidade e

conteúdo (por exemplo, não é aceita a inclusão de cenas de sexo ou de violência

explícita), a concessão de um espaço no site tornou-se mais um dos negócios da

empresa, que comercializa esse serviço em condições bastante claras com seu

cliente – o realizador de curtas-metragens. Parece-nos um ponto decisivo para

diferenciar o Curta O Curta dos outros portais aqui analisados: a utilização de seus

recursos de exibição em um contexto econômico – não como um serviço gratuito ou

uma espécie de prêmio para trabalhos de qualidade superior, mas sim como um

espaço comercial cedido por meio de contrato entre as partes. Contrato que é

regido, inclusive, por condições semelhantes às que orientam outras janelas de

Page 59: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

59

exibição como a televisão, vídeos para locação, ou mesmo o modelo clássico das

salas de cinema.

Tendo sido estabelecidas as particularidades de cada um dos domínios

inclusos na pesquisa que aqui apresentamos, bem como explicitadas as diferenças

de abordagem no tocante ao recurso de exibição de vídeos pela Internet, chega o

momento de entrarmos na parte final de nosso estudo: a análise dos conteúdos

distribuídos através de cada um dos sites pesquisados. No capítulo a seguir,

trabalharemos com parte dos conteúdos mais acessados pelos visitantes de cada

portal, analisando suas particularidades e procurando identificar elementos capazes

de explicar sua aceitação nesse espaço de constante mudança que é a Internet.

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60

4. ANÁLISE DOS SITES PESQUISADOS

O capítulo que se segue será dividido em três partes. Na primeira,

relataremos os critérios utilizados para a escolha dos vídeos analisados e para a

observação que será efetuada a partir dos mesmos. A seguir, listaremos os vídeos

escolhidos como amostragem, descrevendo brevemente seu conteúdo e as técnicas

utilizadas para a concretização de cada um. Finalmente, passaremos à análise

propriamente dita, comparando os vídeos e, a partir daí, buscando determinar

elementos convergentes e divergentes entre eles – o que nos levará também a

algumas considerações sobre os domínios que hospedam esses conteúdos.

4.1. CRITÉRIOS E PROCESSOS DE AVALIAÇÃO

A abordagem da pesquisa que aqui apresentamos sofreu considerável

modificação em relação a nossos planos iniciais. Era intenção de nosso projeto unir

a análise de conteúdo dos domínios pesquisados com entrevistas, conversando

tanto com realizadores que usam a Internet como meio de exibição quanto com

representantes dos sites estudados, que poderiam oferecer informação mais

personalizada do que a disponível em relatórios ou outros documentos encontráveis

nos próprios sites. Deste modo, tencionávamos atingir dois diferentes aspectos

desta nova realidade de exibição: um, digamos, ‘externo’ (referente aos aspectos

das realizações em si, que atingem diretamente todos os que assistem as mesmas),

e outro ‘interno’ ou de bastidores, relativo aos que fazem uso do novo recurso a fim

de saber o que consideram mais positivo ou produtivo na utilização deste tipo de

site. Uma vez que o trabalho aqui desenvolvido é de caráter exploratório, nos

parecia uma maneira bastante adequada de abordar nosso problema de pesquisa.

No entanto, como já tínhamos antecipado na introdução, não foi possível

seguir o caminho planejado no início do trabalho. A dificuldade de contatar

adequadamente os realizadores dos vídeos acabou sendo maior do que a

originalmente prevista, o que acabou provocando uma mudança de planos. Revelou-

se, no decorrer dos esforços para viabilizar a idéia original, um aspecto talvez pouco

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61

considerado, mas bastante presente na Internet: a impessoalidade que caracteriza

boa parte dos contatos via Rede. Não está estabelecido, em muitos casos, um

espaço no qual uma pessoa possa ser alcançada por outras – mesmo que tenhamos

enviado um grande número de e-mails e deixado mensagens em vários fóruns de

discussão, a resposta recebida acabou sendo não menos do que desanimadora. Ao

mesmo tempo em que um conteúdo ou informação disponibilizado na Internet deixa

de pertencer a seu responsável e passa a ser acessível a todos os usuários da web,

o simples ato de não responder a um ou dois e-mails é suficiente para cortar a

comunicação de modo quase irremediável. No nosso caso, que envolvia o diálogo

com realizadores de vários lugares do País, tal dificuldade se mostrou ainda mais

opressiva – e, tendo o trabalho sido realizado em um espaço de tempo relativamente

curto, tornou-se inviável um período de insistência que talvez tivesse possibilitado a

coleta de mais depoimentos. Em resumo, a quantidade de dados efetivamente

disponível nos pareceu insuficiente para a concretização da idéia inicial – e

concluímos então que seria mais produtivo repensarmos nossa análise. Ao invés de

insistirmos na aplicação de um método que, por limitações físicas e temporais,

tornava-se cada vez mais difícil e temerário, decidimos analisar apenas o conteúdo

disponível nos sites – ou seja, os vídeos, que podem ser assistidos por qualquer

visitante a qualquer momento.

Desde o começo, tínhamos em mente a utilização do número de visitas ou

exibições como critério para a escolha dos trabalhos contemplados em nosso

estudo. A lógica que guia essa decisão é bastante simples: a partir de uma análise

dos vídeos mais assistidos, seria possível observar as características comuns entre

eles, e assim apontar tendências de estilo, linguagem, temática e formato que

funcionariam “melhor” no universo da Internet. Tal idéia foi mantida na concretização

do trabalho, e acabou se tornando o norte pelo qual foi guiada a nossa análise. A

partir da quantificação do número de acessos aos vídeos disponíveis em cada um

dos sites estudados (fornecida, de um modo ou de outro, por todos eles),

determinamos quais vídeos seriam mais adequados ao estudo que tencionávamos

efetuar, e a partir daí procedemos a uma análise comparativa entre eles –

levantando, da melhor forma possível, dados que nos permitam conjeturar sobre

quais potencialidades são, no presente momento, melhor atendidas pela distribuição

e exibição de produções brasileiras através da Rede Mundial de Computadores.

Page 62: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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O período compreendido na nossa quantificação estende-se do dia 23 de

setembro de 2007 ao dia 03 de novembro de 2007 – pouco mais de um mês,

portanto. Durante o período, a modificação no ranking de visitas ou acessos de cada

site modificou-se muito pouco, de modo que antes mesmo de concluído o tempo

previsto para a contagem já nos parecia bastante claro quais vídeos seriam

selecionados. Tanto os vídeos presentes na seleção final, quanto muitos outros

presentes nos domínios estudados, foram assistidos no mínimo uma vez – em

muitos casos, até quatro ou cinco observações foram feitas, na tentativa de capturar

detalhes mais específicos de linguagem e estética.

Um diferencial entre os sites analisados, e que acabou se mostrando uma

dificuldade considerável na aplicação da metodologia prevista, está no caráter

descentralizado do YouTube em comparação ao modelo adotado por Porta Curtas e

Curta O Curta. Por ser um espaço internacional, e pelas dificuldades envolvidas em

quantificar acessos em um site aberto que recebe milhares de novos vídeos por

minuto, não existem dados sobre vídeos brasileiros no YouTube que possam ser

diretamente aplicados aos fornecidos pelos outros dois domínios abordados em

nosso estudo. As listas de vídeos mais assistidos (top views), de votação mais alta

(top rated) ou mais incluídos em listagens de favoritos (top favorites) são todas

internacionais, e ainda não são oferecidos recursos de busca que restrinjam as

estatísticas a postagens por país. Em resumo, não é possível selecionar os vídeos

brasileiros mais assistidos no YouTube com a mesma precisão do Porta Curtas e do

Curta O Curta, que oferecem listagens específicas neste sentido. Para contornar

essa dificuldade, optamos por escolher vídeos postados no YouTube que tenham

recebido menção em outros espaços não marcados pela exibição de vídeos, com

uma ligeira preferência pelos veículos não diretamente ligados ao mundo virtual. Na

falta de um método quantitativo mais específico, essa nos pareceu a alternativa mais

próxima em termos de repercussão junto ao público. Não há dúvida de que é um

critério sujeito a falhas – afinal, não devemos ignorar o fato de que a própria escolha

do objeto de uma notícia se dá por critérios não raro subjetivos – mas acreditamos

ser mais adequado do que a seleção de vídeos ao acaso, e mais prático do que

efetuar buscas demoradas através das ferramentas convencionais do site, sem

nenhuma garantia de sucesso.

Outra dificuldade específica do YouTube consiste na quase completa

ausência de filtros que controlem a entrada de conteúdo no site. Se nos outros dois

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63

portais estudados a inclusão de vídeos obedece a critérios específicos de

adequação, no YouTube isso praticamente inexiste, de modo que muitas vezes se

torna difícil determinar o que é relevante ou não em termos de linguagem e

conteúdo. Dizendo de outro modo: não restam dúvidas de que a esmagadora

maioria das atrações hospedadas no Porta Curtas e no Curta O Curta podem ser

incluídas nos limites de nossa análise (afinal, são quase todas realizações

audiovisuais em curta-metragem), mas o mesmo não pode ser dito do YouTube,

onde praticamente tudo pode ser disponibilizado e é possível encontrar desde

produções cinematográficas premiadas até vídeos de família feitos por meio de

aparelhos celulares. Isso gera algumas áreas cinzentas onde conceitos se misturam,

e nos levou a fazer algumas escolhas. Assim, a maioria dos vídeos mais acessados

do YouTube simplesmente foi excluída de nossa análise – ou por serem demasiado

caseiras, ou por não apresentarem um roteiro definido, ou por não apresentarem

objetivos artísticos facilmente definíveis – e optamos por trabalhar com material

claramente identificável com o que o senso comum chama de “cinema” – ou seja,

escolhemos produções que poderiam ser exibidas sem maiores traumas em salas

de projeção, caso houvesse interesse por parte dos responsáveis pela programação

das mesmas. Admitimos que a escolha em questão acaba sendo guiada por critérios

subjetivos em maior ou menor grau – mas acreditamos que, na medida em que

forem sendo desenvolvidas nossas argumentações, essa aparente discrepância

mostre-se bem menos preocupante do que possa parecer em um primeiro momento.

Por ser um trabalho exploratório, não adotamos hipóteses anteriores à coleta

de dados e ao desenvolvimento da análise propriamente dita. Não nos interessa,

aqui, alcançar conclusões sólidas sobre o futuro do cinema na Internet ou receitar

algum tipo de “fórmula mágica” capaz de garantir o sucesso de vídeos destinados à

exibição via web. Na verdade, dado o próprio estágio inicial da exploração do vídeo

no mundo virtual, nos parece prematura e descabida qualquer tentativa de ser

categórico nesse sentido. É nosso objetivo, antes disso, encontrar elementos

comuns, estabelecer ligações entre os vídeos que maior repercussão têm alcançado

neste momento ainda inicial – e, a partir daí, apontar algumas possíveis tendências

para o segmento em um futuro não muito distante. Dizendo de outro modo, nos

interessa menos formular teorias, e muito mais fornecer – ainda que timidamente –

subsídios que possam guiar futuramente a elaboração de estudos mais

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aprofundados sobre o tema. É essa opinião que observamos desde o início do

projeto, e cujos resultados passaremos a descrever a partir de agora.

4.2. DESCRIÇÃO DOS VÍDEOS ESCOLHIDOS COMO AMOSTRAGEM

Tendo explicitado os critérios que levaram à escolha da amostragem,

passemos a uma breve enumeração dos elementos que a constituem, descrevendo

rapidamente as características mais evidentes de cada um dos vídeos selecionados.

Embora tenhamos assistido a uma grande quantidade de realizações

apresentadas em cada um dos portais, nos pareceu que a escolha de cinco (05)

vídeos de cada site seria suficiente para embasar nossas observações, formando

um total de quinze (15) vídeos para amostragem. De modo geral, os escolhidos

estão entre os mais bem-sucedidos em cada um dos portais, mas eventualmente

optamos por vídeos que, embora não tão assistidos quanto alguns dos que não

foram escolhidos, explicitam de modo mais claro características que nos parecem

dignas de observação em nosso trabalho. A seguir, passamos a descrever

brevemente cada um dos quinze vídeos selecionados.

4.2.1. Vídeos hospedados no YouTube

- TAPA NA PANTERA12 (2006, cor, 4 minutos). Dirigido por Esmir Filho,

Mariana Bastos e Rafael Gomes (todos realizadores associados também a

produções em película cinematográfica), tornou-se uma atração emblemática devido

à grande repercussão atingida através da Internet. No momento, somando pelo

menos cinco páginas diferentes de hospedagem no YouTube, o vídeo se aproxima

dos 4 milhões de acessos – um número que dificilmente seria alcançado por meios

tradicionais de exibição. Trata-se de uma comédia apresentada em formato de falso

documentário, compilando as declarações de uma senhora de meia-idade que se diz

12 Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=6rMloiFmSbw>. Consultado em 02 out. 2007.

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consumidora contumaz de maconha (personagem interpretada por Maria Alice

Vergueiro). O vídeo alcançou tanto sucesso que acabou obtendo considerável

repercussão nos grandes meios de comunicação, transformando a atriz do filme em

celebridade e gerando modismos como o uso das expressões “dar um tapa na

pantera” e “o que faz mal é o papelzinho”. É seguro afirmarmos que, no momento, é

o exemplo mais bem-sucedido da utilização da Internet como alternativa exibidora

para o cinema brasileiro – o momento mais próximo de uma exibição clássica que o

vídeo recebeu foi na 14ª edição do festival Gramado Cine Vídeo (2006),

especializado em produções digitais e que o incluiu na mostra independente de

ficção.

- O PARADOXO DA ESPERA DO ÔNIBUS13 (2007, cor, 3 minutos). Trata-se

de um exemplo curioso, uma vez que o vídeo em questão foi originalmente realizado

para exibição no Curta O Curta – apresentando inclusive os créditos da empresa no

início e no final da exibição. Mas, enquanto os acessos ao vídeo em seu espaço

original não chegavam a quatro mil visitas14, no YouTube ultrapassam o número de

230 mil exibições. Animação com um enredo baseado nos devaneios de um jovem

que espera a chegada do ônibus que o levará para casa, o vídeo já foi selecionado

para festivais de exibição de curtas-metragens, como o Goiânia Mostra Curtas e o

Festival Internacional de Curtas do Rio de Janeiro.

- AFINAÇÃO DA INTERIORIDADE15 (2001, cor, 1 minuto). Vídeo dirigido por

Roberto Berliner que se tornou conhecido na Internet como “Efeitos da Maconha”.

Foi realizado na época em que o músico Gilberto Gil não havia se tornado Ministro

da Cultura, e trata-se de um documentário experimental que usa de modo

intencional a característica de Gil de fazer grandes intervalos entre as palavras. Ao

ser colocado no YouTube, o trabalho teve sua lógica de certo modo subvertida, e

passou a ser visto como um trabalho satírico que mostra as pausas como seqüelas

do uso excessivo de substâncias ilícitas. Embora suas várias hospedagens no

YouTube tenham sido efetivadas alegadamente sem o apoio do diretor, o vídeo já

13 Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=Ibow_K7fqF0>. Consultado em 02 out. 2007. 14 Dados revisados pela última vez em 04/11/2007, às 22h. 15 Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=ubO3taHEHig>. Consultado em 02 out. 2007.

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ultrapassa as 500 mil exibições no site e já foi notícia até em revistas semanais de

informação, de modo que sua inclusão no presente trabalho acaba sendo inevitável.

- O DIA EM QUE O BRASIL FOI INVADIDO16 (2006, cor, 10 minutos). Dirigido

por Abel Filho, o vídeo é na verdade o trabalho de conclusão de curso de alguns

alunos de Publicidade e Propaganda das Faculdades Integradas Barros Melo (PE).

Trata-se de uma animação utilizando técnica de recortes, que relata em tom satírico

os acontecimentos de uma suposta invasão do Brasil pelos Estados Unidos. Após

sua inclusão no YouTube, o trabalho alcançou mais de um milhão de acessos, e

está entre as realizações brasileiras mais assistidas em todo o portal – o que ganha

em importância se considerarmos que o material teve pouca ou nenhuma cobertura

de mídia, alcançando seu sucesso principalmente na base dos comentários dos

espectadores.

- QUACK!17 (2007, cor, 4 minutos). Uma produção realizada pela produtora

Trapizonga Voadora, com a direção de Carlos Eduardo Sobral, Leandro Ibraim e

Bernardo Warman. É um curta-metragem de animação, que conta a história de um

patinho de borracha que sonha em voar junto com os patos de verdade. As

animações em computação gráfica do vídeo são de alta qualidade, semelhantes às

utilizadas por grandes estúdios de animação, e o vídeo inclusive participou de

festivais de animação como o Anima Mundi. Embora tenha sido disponibilizado no

YouTube há menos de cinco meses, já soma mais de 170 mil acessos, um número

respeitável levando em conta o pouco tempo de exibição online.

4.2.2 Vídeos hospedados no Porta Curtas

- A SAUNA18 (2003, cor, 15 minutos). Dirigido por Marco Abujamra, narra a

história de um cidadão comum que, ao envolver-se em uma aventura extraconjugal,

acaba provocando uma tragédia familiar e mudando completamente os rumos de

16 Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=JffmWtjxVq8>. Consultado em 02 out. 2007. 17 Conforme visto em <http://br.youtube.com/watch?v=aP2TnodSXoI>. Consultado em 02 out. 2007. 18 Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=1484>. Consultado em 02 out. 2007.

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sua vida. É, atualmente, o vídeo mais assistido de todo o acervo do Porta Curtas –

curiosamente, um filme que teve uma repercussão modesta em festivais e salas de

cinema, alcançando apenas na Internet sua repercussão mais plena.

- ALMAS EM CHAMAS19 (2000, cor, 11 minutos). Animação de forte conteúdo

erótico, dirigida por Arnaldo Galvão, que descreve a relação destrutiva que se

estabelece entre um bombeiro e a moça que salvou de um incêndio. Recebeu dois

prêmios no Festival de Gramado de 2000, além de ter sido selecionado para o

Festival Internacional de Curtas de São Paulo do mesmo ano. Conta com a

participação da atriz Marisa Orth, famosa por seus trabalhos na televisão, que faz a

voz feminina quando da leitura de uma carta.

- SEXO VIRTUAL TÁCTIL20 (2003, cor, 8 minutos). Vídeo experimental

realizado sob a direção de Marcius Barbieri, igualmente marcado por seu conteúdo

sexual. Lida com as circunstâncias que envolvem dois homens e a utilização por um

deles de uma boneca de borracha. Curta-metragem com uma longa lista de

premiações e seleções em festivais, está atualmente entre os vídeos mais visitados

do acervo do Porta Curtas.

- A BREVE ESTÓRIA DE CÂNDIDO SAMPAIO21 (2001, cor, 16 minutos).

Segundo as estatísticas fornecidas pelo site, trata-se do vídeo com melhor votação

do público dentre todos os incluídos no arquivo do Porta Curtas. Ficção dirigida por

Pedro Carvana, mostra o drama que surge quando uma emergente pouco inteligente

interfere na vida de uma mãe miserável para causar boa impressão em seu círculo

social. É uma realização de estética totalmente referente ao modelo clássico dos

curtas-metragens, sem maiores experimentações estéticas ou narrativas – embora

conte com um roteiro inventivo, que dispõe as surpresas de modo inteligente ao

longo do filme.

- A CASA22 (2004, cor, 3 minutos). Animação dirigida por Andrés Lieban, que

usa a clássica música de Vinícius de Moraes (era uma casa muito engraçada...)

19 Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=52>. Consultado em 02 out. 2007. 20 Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=2033>. Consultado em 02 out. 2007. 21 Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=200>. Consultado em 02 out. 2007. 22 Conforme visto em <http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=2038>. Consultado em 02 out. 2007.

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como base para seu roteiro. Mostra um mímico que vai aos poucos construindo uma

casa, com elementos que pertencem ao reino da imaginação. Um dos poucos

curtas-metragens do Porta Curtas realizados diretamente em suporte digital, é um

trabalho visualmente bastante simples, mas singelo, e que foi exibido com destaque

também no festival Anima Mundi de 2004.

4.2.3. Vídeos hospedados no Curta O Curta

- TORTO23 (2006, cor, 13 minutos). O documentário dirigido por Samuel Alves

de Castro é o campeão de visitas no sistema do Curta O Curta, contando com mais

de 26 mil acessos em cerca de um ano de exibição online. O vídeo se propõe a

retratar a vida de pessoas que moram em alguns dos prédios ‘tortos’ da cidade de

Santos (SP), construídos em áreas impróprias para edifícios de grande porte.

Mesclando depoimentos dos moradores com a opinião de pessoas que nunca

entraram em prédios do tipo, vai sendo construído um mosaico da vida dentro

dessas residências, revelando aspectos cômicos ou surpreendentes do dia-a-dia de

quem nelas vive.

- SENHORES DA GUERRA24 (2004, cor, 5 minutos). Dirigido por Pedro

Lobito, o vídeo é basicamente uma dura crítica às políticas econômicas do governo

dos Estados Unidos, apresentando uma série de imagens obtidas em veículos de

imprensa com o fundo musical de uma canção de Bob Dylan. É talvez um dos

primeiros e mais bem sucedidos de uma série de trabalhos criados por inúmeros

realizadores, profissionais ou amadores, todos com um princípio semelhante: fazer

colagens de imagens estáticas exibidas em seqüência com uma música ao fundo.

No caso específico, a motivação é de natureza acusatória, e o vídeo está disponível

também em um domínio próprio25, com versões em português e inglês – no Curta O

Curta, ele aparece com legendas em português.

23 Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/258/>. Consultado em 02 out. 2007. 24 Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/28/>. Consultado em 02 out. 2007. 25 Disponível em <http://www.pedrolobito.com/exp_senhores_da_guerra.html>. Acessado em 11 nov. 2007.

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- BAIESTORF – FILMES DE SANGUEIRA E MULHER PELADA26 (2005, cor,

20 minutos). Documentário que faz um resgate da carreira do realizador catarinense

Petter Baiestorf, que há décadas produz filmes de terror de baixo custo em formato

VHS. O trabalho é dirigido por Christian Caselli, e mescla entrevistas com imagens

de arquivo para contar a história de vida de Baiestorf, um produtor quase obsessivo

que acabou se tornando uma figura cultuada no circuito alternativo de terror.

- ANTES / DEPOIS27 (2005, cor, 9 minutos). Também dirigido por Christian

Caselli, esse curta-metragem de ficção aborda questões bem distintas das incluídas

no trabalho anterior. Realizado com os negativos recebidos como prêmio no Festival

de Taguatinga (2002), o curta-metragem conta uma história fragmentada que brinca

com elementos ligados à sexualidade e explora uma linha narrativa próxima do

absurdo. A ligar os diferentes recortes da trama, a utilização dos conceitos de

“antes” e “depois”, que vão guiando o espectador durante as reviravoltas do roteiro.

- TRIÂNGULO28 (2004, cor, 7 minutos). Produzido durante uma oficina

ministrada pelo Ateliê da Imagem, uma das empresas parceiras do Curta O Curta. O

vídeo tem sua direção assinada por Robson Lopes, e explora situações geradas

pelo desprezo de um marido às tentativas de aproximação de sua esposa. É um

trabalho mais linear, que explora elementos de subjetividade e mescla imagens

modificadas digitalmente com trechos captados através da técnica stop-motion29.

4.3. ANÁLISE COMPARATIVA DOS VÍDEOS PRESENTES NOS SITES

Já em uma análise superficial dos vídeos incluídos na fase final de nosso

estudo ficam bastante claras as várias diferenças visuais e conceituais que os

separam e os individualizam. Temos, entre outros, trabalhos que circulam pela

ficção, pelo documentário ou por ambos ao mesmo tempo; que apostam em 26 Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/122/>. Consultado em 02 out. 2007. 27 Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/123/>. Consultado em 02 out. 2007. 28 Conforme visto em <http://www.curtaocurta.com.br/curta/58/>. Consultado em 02 out. 2007. 29 Técnica de utilização mais comum em filmes e vídeos de animação, que consiste na produção de uma série de imagens paradas (stills), na qual a disposição dos objetos vai sendo modificada para que, quando editadas em seqüência, produzam a ilusão de movimento.

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histórias cômicas, dramáticas, poéticas ou de denúncia política; vídeos que se

constituem a partir da atuação de atores ou que fazem uso de variados tipos de

animação; produtos realizados diretamente para exibição na Internet ou que, por

variadas circunstâncias, acabaram incluídos na Rede em um momento posterior. A

uni-los, apenas o fato de terem, de um modo ou de outro, alcançado sucesso junto

ao público virtual. No entanto, onde em um primeiro momento se enxerga apenas

uma mistura pouco coerente de idéias e diferenças, nos parece possível encontrar

também consideráveis semelhanças – e a partir da localização de tais elementos

convergentes, revelam-se aspectos que indicam, se não respostas, ao menos

tendências para a realização audiovisual no terreno ainda quase inexplorado da

Internet.

Primeiramente, nos chama a atenção o fato de a maioria dos vídeos possuir

durações iguais ou inferiores a dez minutos. De fato, apenas quatro dos quinze

trabalhos ultrapassa com folga essa marca – “Almas em Chamas”, embora

apresente duração final de onze minutos, possui créditos finais extensos que

acabam alongando sua projeção, tendo cerca de nove minutos e meio de história

propriamente dita. E dos que passam largamente da duração “padrão”, dois são

documentários e dois são curtas-metragens planejados originalmente para salas de

cinema, que só em momento posterior encontraram espaço na web para sua

exibição. Certamente, parte dos demais trabalhos também foi originalmente

projetada para a distribuição tradicional (o próprio “Almas em Chamas” e “Quack!”

são dois exemplos), mas parece que se insinua aí um primeiro elemento de ligação,

uma primeira característica observável nos vídeos de maior demanda no mundo

virtual, e que se refere ao tempo que utilizam para contarem suas histórias. E que,

mais do que apontar uma função dos filmes, pode referir-se igualmente, ou de modo

ainda mais intenso, a uma função do público que os assiste.

Como já dito em momentos anteriores de nosso estudo, os recursos técnicos

envolvidos na projeção de vídeos pela Internet ainda estão em desenvolvimento, o

que acarreta dificuldades perceptíveis em sua utilização. Vídeos maiores demandam

mais tempo para que o streaming seja plenamente carregado, além de oferecerem

mais riscos de interrupção indesejada em sua reprodução. Em uma conexão de

Internet cuja velocidade de transferência não seja tão boa, o tempo necessário para

carregar plenamente um conteúdo de 13 ou 15 minutos pode ser simplesmente

longo demais, desestimulando o usuário a esperar e o levando para outras páginas

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e outros conteúdos. Mais do que isso, o usuário da Rede pode simplesmente não

estar disposto a investir tanto tempo em um único conteúdo. Praticamente todos os

autores utilizados na construção dos conceitos teóricos de Internet concordam que o

multimídia prevê acesso instantâneo, multiplicidade de conteúdos e a navegação

rápida entre os diferentes pólos de informação (websurfing). De fato, já é

praticamente senso comum associarmos a Internet a esses conceitos. Vídeos de

duração menor não só seriam tecnicamente mais fáceis de assistir, como se

adequariam melhor aos interesses do próprio público consumidor da web –

oferecendo entretenimento rápido e que logo abre espaço para que o usuário

busque outros conteúdos, outras possibilidades de informação. Um trabalho de

quinze minutos pode ser breve para os padrões do cinema – mas não esqueçamos

que o ambiente da projeção cinematográfica prevê a imersão, o mergulho da

consciência em um mundo à parte onde nada deve distraí-lo do espetáculo oferecido

a seus olhos e ouvidos. Duas horas de filme é uma duração adequada para uma

sala de projeção, mas possivelmente jamais o seja para a tela de um computador –

de fato, talvez mesmo uma duração de vinte minutos já se mostre demasiado longa

neste caso. Em resumo, um trabalho mais extenso pode não só não ser adequado

ao formato da Internet, mas igualmente falhar em relação ao público da Internet –

razão pela qual as produções mais breves alcançariam maior êxito no presente

estágio de utilização da web.

A produção de histórias mais curtas e de trabalhos menos extensos é uma

prerrogativa que parece bastante adequada ao âmbito da animação – o que nos

conduz a outra característica perceptível na amostragem que analisamos. De fato, e

desde o seu surgimento, a animação apresenta um elo que a une aos formatos de

menor duração – basta lembrarmos que originalmente os desenhos animados eram

destinados a preencher espaço entre as sessões de cinema, oferecendo

entretenimento por alguns minutos enquanto o filme de longa-metragem não

iniciava. Cinco dos quinze trabalhos escolhidos são animações, realizadas com

diferentes graus de complexidade – e um sexto trabalho, “Senhores da Guerra”,

pode talvez ser incluído na conta, uma vez que apresenta uma série de imagens

estáticas (stills) que só ganham sentido quando dispostas em ordem e com o tema

musical ao fundo. De qualquer modo, é nada menos do que um terço dos vídeos

selecionados – uma porcentagem que nos parece significativa, e que encontra

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consonância nos estudos de Louise Poissant sobre a animação e suas

possibilidades criativas dentro do universo virtual.

As possibilidades de trabalhar com animação libertam o realizador de uma

série de amarras. De fato, uma grande quantidade de histórias ou situações podem

se tornar inviáveis artisticamente sem a utilização de recursos animados: do

contrário, como contar a história de um pato de borracha que anseia voar (“Quack!”)

ou de um mímico que constrói sua casa no vazio, a partir de coisa nenhuma (“A

Casa”)? Uma vez que possam ser mobilizados os recursos necessários para

viabilizar a produção, a imaginação do realizador envolvido com a animação torna-

se seu único limite, e o tempo a ser dispensado à concretização de suas ambições

passa a ser o seu maior, talvez único, obstáculo. Já as técnicas utilizáveis não se

limitam aos processos caros e dispendiosos da computação gráfica ou dos

desenhos animados em duas dimensões: enquanto “O Paradoxo da Espera do

Ônibus” trabalha com ilustrações estáticas, cujo movimento advém somente de

efeitos simples de edição, “O Dia Em Que o Brasil Foi Invadido” utiliza imagens

recortadas como personagens e cenários para sua história – aproveitando inclusive

figuras emblemáticas da cultura pop americana como elementos cômicos em sua

sátira aos movimentos bélicos norte-americanos. São alternativas

consideravelmente mais baratas, que apresentam resultados estéticos apreciáveis –

e que podem até não terem potencializado, mas certamente não tolheram as

possibilidades de sucesso dos projetos que as utilizaram.

E, se a simplicidade guiou parte das animações brasileiras mais bem-

sucedidas na Internet, sem dúvida esta mesma simplicidade se manifesta na maioria

das demais produções vitoriosas dentro da nova janela de exibição. Podemos tomar

como exemplo “Tapa Na Pantera”, que de todas é a de maior público e de maior

repercussão no mundo virtual. Não há requintes de cenário, movimentos ousados de

câmera ou efeitos surpreendentes de pós-produção: há apenas uma senhora de

óculos escuros sentada em uma poltrona, falando de sua vivência com o uso de

maconha, e mais nada. O interessante para o espectador, o que prende sua atenção

e o faz assistir ao vídeo até o fim não está na imagem, intencionalmente simples e

despojada: está no texto, nas falas cômicas que se sucedem, na sucessão de

declarações absurdas de uma mulher que diz não ser viciada, mesmo que consuma

a droga há mais de trinta anos. A simplicidade do aspecto visual libera o espectador

para a cumplicidade; a partir daí é o riso, a entrega a uma breve e divertida

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experiência no papel de ouvinte semelhante a que temos todos os dias, todas as

horas, entre nossos amigos ou familiares. Tamanho minimalismo possivelmente

falhasse se exibido em uma sala de cinema ou mesmo em um canal aberto de

televisão: no ambiente de Rede, já foi capaz de capturar a atenção das pessoas em

mais de quatro milhões de oportunidades.

“O Paradoxo da Espera do Ônibus” e “Afinação da Interioridade” lidam, em

outros termos, com essa mesma simplicidade. O primeiro, que já descrevemos como

simples em sua abordagem visual, se mostra igualmente descomplicado em seu

conteúdo. Durante pouco mais de três minutos, nos tornamos cúmplices dos

pensamentos de uma pessoa em uma parada de ônibus – ouvimos suas

reclamações pela demora da condução, suas dúvidas se o coletivo virá mesmo ou

não, seu dilema entre continuar esperando o mesmo ônibus ou pegar outro que não

o deixa perto de casa, mas que pode passar antes na parada. Mais uma vez, temos

a cumplicidade – o homem é qualquer pessoa que já tenha aguardado por um

ônibus, e seus pensamentos são os de qualquer um que tenha vivenciado situação

semelhante. Já “Afinação da Interioridade” é ainda mais minimalista: durante um

minuto, vemos pouco mais do que uma sucessão de longas pausas de uma pessoa

conhecida (Gilberto Gil) que procura a palavra certa para continuar uma sentença. É

praticamente um não-texto: a graça está no que não é dito, no raciocínio que não se

conclui, até que finalmente surja o conceito estranho e belo que se revela também

como o nome do filme. Por terem sido gravadas em momentos diferentes, as

imagens apresentam enquadramentos distintos, mas mesmo isso seria dispensável:

poderia ser como em “Tapa Na Pantera”, um mesmo campo visual mantido durante

toda a duração do vídeo, e ainda assim o efeito do mesmo restaria inalterado. São

duas simplicidades que andam lado a lado, portanto: a simplicidade estética e a

simplicidade de discurso. Um conteúdo que é breve não deve, em princípio, ser

muito complicado: a não-compreensão implica repetição, voltar ao começo, e no fim

das contas pode resultar tão desagradável para o usuário da Internet quanto a

demora para o encerramento de uma trama ou situação. Caminhamos, então, em

direção a vídeos que apostam no menos pujante, no mais rápido e no mais fácil de

entender – vídeos como os que estão entre os mais buscados e assistidos nos sites

que abraçamos em nosso estudo.

Concentrando nosso olhar sobre os enredos e temáticas dos vídeos, é

possível constatar que, mesmo que a disparidade de assuntos indique claras

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74

diferenças, a maior parte deles trata de situações semelhantes quando observadas

de um ponto de vista mais geral. De certo modo, apontam para uma tendência já

presente em quase todas as produções cinematográficas independentes, de quase

todos os lugares: a busca por assuntos incomuns, “à margem”, distantes das linhas

de conteúdo geralmente seguidas no cinema consagrado pela grande indústria. De

fato, mesmo produções como “A Breve Estória de Cândido Sampaio” e “Sexo Virtual

Táctil”, que nasceram em películas de 35mm e foram concebidas para as salas de

cinema, carregam em seus enredos o uso mais ou menos explícito de temáticas que

fogem dos padrões geralmente associados a grandes bilheterias. O primeiro mistura

a elite insensível e alienada, que busca uma filantropia torta e distorcida para a mera

satisfação de seu círculo de amizades, com a pobreza quase absoluta da pedinte

que carrega o filho em suas peregrinações, e que come dos mesmos restos que

oferece para seu cachorro vira-lata de estimação. O segundo curta-metragem vai

mais longe, e de maneira mais chocante: bonecas infláveis (tema, aliás, de certo

modo dividido com “Antes / Depois”), pênis de borracha, voyeurismo e masturbação

– elementos que convergem para uma denúncia dura e sem consolos do

esvaziamento das relações contemporâneas. As cenas de sexo presentes no filme

chocam ainda mais por serem artificiais: a boca que pratica o sexo oral é de plástico,

e o pênis que participa do ato é feito de borracha. Até mesmo um documentário

como “Baiestorf – Filmes de Sangueira e Mulher Pelada” entra sem problemas em

tal conceito – afinal, o homem cuja história é relatada não encontrou sua fama nos

holofotes das mídias consagradas, e sim no submundo, no “lado de fora” do

cotidiano e, no caso específico, do próprio cinema. Não se pode dizer que qualquer

um desses temas seja inédito para a expressão cinematográfica – mas, a julgar pela

recepção recebida por esses filmes quando transpostos ao ambiente virtual, são

elementos que apelam diretamente ao público que busca vídeos na Internet.

Parece-nos importante deixar claro, nesse ponto, que a idéia de “à margem”

parece cobrir satisfatoriamente apenas parte das produções de melhor desempenho

nos sites brasileiros de vídeos para Internet. De fato, um mesmo assunto – por

exemplo, a atual situação de hegemonia política e militar dos Estados Unidos – pode

ser tratado tanto em uma perspectiva amarga e revoltada (“Senhores da Guerra”),

quanto em tons mais irônicos e até mesmo debochados (“O Dia em Que o Brasil Foi

Invadido”). Na verdade, parece que chegamos aqui em uma bifurcação: de um lado,

conteúdos que atendem a um público mais sério e em busca de algum tipo de

Page 75: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

75

desafio ou confrontação, e do outro vídeos mais leves, que tratem de questões

variadas com um toque de humor e desprendimento. A julgar pela amostragem aqui

analisada, há espaço para os dois extremos, embora com uma ligeira predileção do

público pelo segundo. No fundo, insistimos, não há tanta novidade nisso: é a mesma

equação que se aplica há décadas ao cinema tradicional, aqui apenas transportada

para um ambiente virtual e multimídia. Somos levados, então, a concordar com

Castells: a Internet não se mostra capaz de mudar os interesses de seus usuários,

mas sim de se moldar a eles, adaptando seus recursos no sentido de atender a

esses desejos e ambições. Um usuário que queira entretenimento leve e pouco

profundo encontrará o que deseja, do mesmo modo que alguém que busque

projeções audiovisuais de sua inconformidade com o status quo será igualmente

contemplado por conteúdos adequados aos seus interesses. O que muda não é

tanto o conteúdo, muito menos o interesse: é o formato, a ordenação dos elementos

usados na representação da parcela de realidade que se pretende mostrar. E nisso

o vídeo aplicado à Internet parece pouco diferir do efeito causado sobre outras

expressões humanas, como a escrita, a música e a ilustração – por mais que

pudéssemos, no início, pensar o contrário.

Por fim, o que poderia ser dito sobre o e para o realizador, aquele que no fim

das contas tem a oportunidade de usar criativamente os recursos e ferramentas da

exibição em streaming pela Rede Mundial de Computadores? De modo geral, somos

levados a deduzir que os melhores desempenhos são alcançados ou pelos vídeos

idealizados para a Internet, ou pelas produções que coincidentemente apresentavam

elementos de melhor funcionamento dentro das especificidades do meio. A luta de

um diretor ou roteirista segue inalterada: capturar a atenção do espectador, mantê-lo

atento ao vídeo ou filme do seu começo até o seu encerramento. E isso passa

necessariamente – e como, aliás, não poderia deixar de ser – por uma compreensão

do público a ser atingido e do espaço onde seu produto estará disponível. A simples

realização de um trabalho nos moldes tradicionais e sua aplicação posterior no

espaço virtual pode até funcionar em muitos casos, mas aparentemente não é o

melhor procedimento para quem deseja de fato usar a Internet como meio de

distribuição e exibição daqui por diante. Para realizações já concluídas, a Internet

parece uma alternativa de alcance simples e possibilidades reais de bons resultados

– temos aqui alguns exemplos claros que não nos permitem pensar de outro modo.

“A Sauna”, por exemplo, não é exibido em cinemas ou televisão há anos, mas no

Page 76: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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espaço oferecido pelo Porta Curtas usufrui de um público constante, renovável e

potencialmente inesgotável. O dilema proposto aqui não se aplica a essas

realizações: refere-se, isso sim, aos novos realizadores, aos novos distribuidores,

àqueles que têm em suas mãos a responsabilidade de trazer renovação ao cinema

brasileiro. Um diretor que queira atingir sucesso na web possivelmente terá que ter

um pouco de ousadia – do mesmo modo que um produtor que quiser usar a Internet

no máximo possível de suas potencialidades terá que buscar esse tanto de ousadia

nos diretores e roteiristas com os quais decida trabalhar. Tendo como base a análise

sem dúvida incompleta que aqui realizamos, consideramos lícito concluir que os

melhores resultados foram obtidos por quem teve sucesso em ser diferente, em

entender pelo menos parte das muitas mudanças que a virtualidade trouxe ao

mundo e usar essas mesmas características a favor de sua própria criatividade.

Talvez alguns tenham, por assim dizer, ido longe demais – é difícil imaginar, por

exemplo, “Tapa Na Pantera” sendo exibido em uma sala de cinema, logo antes de

algum blockbuster norte-americano. Mas, para um trabalho que custou muito pouco

e já foi assistido por milhões de pessoas, isso faz realmente diferença? Eis, talvez, a

real natureza da questão que a Internet levanta para realizadores e distribuidores: ou

adaptar a virtualidade a seus interesses, buscando obter o melhor de dois mundos,

ou abraçar de vez a Internet e tudo o que ela representa.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

De modo geral, acreditamos que nosso estudo foi produtivo e que

conseguimos atingir os objetivos propostos para o trabalho. As leituras realizadas

auxiliaram na construção de um referencial teórico importante para nossas

observações, permitindo compreender a complexidade envolvida na fusão de duas

realidades (Internet e cinema) que já são bastante complexas quando vistas

individualmente. Em especial a parte dedicada às tecnologias virtuais serviu para

revelar que, mesmo entre teóricos respeitados mundialmente, a incerteza e a

diversidade de opiniões impera – e que acertávamos em optar por um estudo de

caráter exploratório, que no fim das contas se mostrou mais produtivo do que

poderia ter sido se tivéssemos limitado nossa ação à tentativa de comprovar

algumas hipóteses pré-estabelecidas. Já a apreciação que fizemos dos sites

selecionados, mesmo que tenha se distanciado ligeiramente do modelo

originalmente imaginado para sua execução, resultou produtiva, gerando uma série

de reflexões interessantes.

Julgamos pertinente fazer, agora que nosso estudo se aproxima do final, uma

apreciação pessoal sobre os sites e os efeitos que cada um deles possui em termos

de distribuição dos vídeos neles hospedados. Primeiramente, nos parece oportuno

lembrar que, de modo geral, a exibição de filmes em streaming pela Internet não

produz lucro direto algum que não seja a visibilidade para um vídeo – mesmo porque

ninguém paga para assistir vídeos na maioria dos sites do tipo, de modo que a

exibição no caso não gera receita direta. Assim, o foco de atuação da distribuição

pela Internet se modifica: os dividendos obtidos com a exibição não são financeiros,

objetivos, e sim de caráter subjetivo – basicamente, visibilidade para os participantes

no projeto, que a partir daí podem buscar posicionamento em outras mídias ou, em

outro sentido, atrair atenção para outros aspectos de seu trabalho. Por exemplo, os

três diretores de “Tapa Na Pantera” obtiveram sucesso em atividades além da

Internet. Esmir Filho já recebeu várias premiações em festivais de cinema com suas

obras em 35mm, e atualmente está em processo de produção de seu primeiro

longa-metragem. Mariana Bastos também recebeu premiação em Gramado pelo

curta-metragem em película “Perto de Qualquer Lugar” (2007), e os três diretores de

“Tapa Na Pantera” seguem desenvolvendo uma série de vídeos especialmente para

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a Internet (batizada de “vídeos virais”), obtendo variados graus de sucesso. Tudo

isso nos leva a questionamentos que dizem respeito não somente aos méritos da

Internet como distribuição de cinema, mas também qual tipo de cinema se beneficia

com a sua abrangência – e, conseqüentemente, quais características visuais e

narrativas parecem mais adequadas à Internet e ao público que ela atinge.

Uma conclusão bastante óbvia refere-se ao público visitante de cada página –

a quantidade de espectadores atingida de cada portal, por assim dizer. Nesse

sentido, o sucesso do YouTube e sua primazia sobre os outros dois sites estudados

aqui é evidente. Enquanto os recordistas de acessos nos domínios Porta Curtas e

Curta o Curta oscilam na faixa das 25 mil visitas, o mais visitado dentre os que

selecionamos no YouTube ultrapassa os 4 milhões de acessos – uma diferença de

resultados impressionante. Na verdade, os próprios padrões de sucesso virtual se

modificam consideravelmente em um e nos outros: uma média de dez mil acessos

seria considerada excelente para os padrões do Curta O Curta, mas seria tida como

discreta, ou mesmo insuficiente, se o mesmo vídeo estivesse hospedado no

YouTube.

Algumas explicações podem ser consideradas em um esforço para

compreender essa situação. É evidente que o YouTube tem recebido maior atenção

das mídias clássicas, e que sua abrangência planetária transcende totalmente as

próprias diretrizes de atuação dos outros dois sites. No entanto, acreditamos que a

liberdade de acesso a seus recursos e a variedade de seus conteúdos são os

diferenciais mais significativos no caso em questão. O YouTube um lugar onde é

disponibilizado todo tipo de material em vídeo, o que acaba compreensivelmente

atraindo para o portal todo o tipo de usuário de Internet. A maioria dos conteúdos,

como já colocamos anteriormente, não podem ser diretamente associados com

cinema, por não apresentarem características que julgamos, já quase por senso

comum, referenciais de tal manifestação artística – a maior parte deles de cunho

estético e textual. Porém, tem sido esse material – que é audiovisual, embora não

cinematográfico – que tem atraído o maior número de visitas no YouTube, e não

surpreende que os reflexos dessa reunião de novas características reflita-se no

conteúdo mais próximo do cinema, também disponível no site. Em resumo, quem vai

ao Porta Curtas ou ao Curta O Curta já tem uma idéia concebida no sentido de

querer assistir a cinema em curta-metragem – ninguém procuraria vídeos de festas

ou trechos de shows de música nesses domínios, pois é evidente que tais conteúdos

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não seriam incluídos no acervo deles. Já quem visita o YouTube, na maior parte das

vezes, busca simplesmente entretenimento em vídeo – possivelmente entrando em

contato com os trabalhos de curta-metragem de maneira muito mais casual.

Há, portanto, uma divisão de público que se insinua nesse momento – e que

pode ser de interesse para quem invista na distribuição via Internet. No Porta Curtas

e no Curta O Curta, o público é mais específico, pessoas de fato interessadas em

produções de cunho cinematográfico e na linguagem estética e textual, geralmente

aplicada ao cinema. Já no YouTube, a fórmula é livre, quase anárquica – fórmula

que, de qualquer modo, produz os melhores resultados práticos em termos de

público. O que interessará mais ao distribuidor, a partir daí, é uma decisão dele –

que talvez não seja consoante com os interesses do diretor ou das demais pessoas

envolvidas com a produção de um material audiovisual, de qualquer modo.

Acreditamos ser igualmente digno de menção o tratamento dado por cada um

dos portais ao espaço de exibição dos vídeos – ou seja, à janela de exibição

propriamente dita. O Youtube é, dos três sites, o mais versátil – permitindo que o

usuário assista ao vídeo em dimensões tanto maiores quanto menores do que o

tamanho original. Do mesmo modo que o Curta O Curta, o YouTube oferece a opção

de tela inteira (full screen), de visualização mais agradável quando a imagem

apresenta boa definição. O Porta Curtas, infelizmente, está na contramão dos outros

dois portais, e oferece os vídeos em um tamanho fixo, bastante pequeno e que se

torna desconfortável após poucos minutos de exibição. Ou seja, o portal soma às

dificuldades inerentes ao ato de assistir a filmes no computador – tela pequena e de

luminosidade que agride à visão, assentos pouco confortáveis, som de baixa

fidelidade – um empecilho extra, que dificulta a imersão e acaba se tornando quase

um convite ao abandono do vídeo e à procura de outros sites de entretenimento.

Considerando o estudo que desenvolvemos até aqui, o problema mostra-se bem

mais grave do que poderia parecer em um primeiro momento – ainda mais por tratar-

se de vídeos que não foram feitos para a plataforma virtual, e que acabam sofrendo

ainda mais se exibidos em um espaço incapaz de realçar suas qualidades

imagéticas. Parece-nos importante que o Porta Curtas reveja o formato e as

dimensões da janela de exibição dos vídeos, sob pena de distanciar-se mais ainda

do público que assiste a filmes na web.

Outro ponto que se evidencia é a limitação que atinge o Porta Curtas e o

Curta O Curta devido ao idioma que utilizam para a navegação. São sites em

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português, focados no público brasileiro, e que não oferecem opções para usuários

de outras línguas. O YouTube, ao contrário, tem no inglês a sua língua matriz, e

oferece opções de navegação em outros idiomas – inclusive em português. Ou seja,

já se mostra de imediato mais aberto ao público da Internet do que os outros dois

portais estudados aqui – um público que, é importante frisar, não está contido pela

maior parte das barreiras nacionais na hora de escolher o que deseja acessar na

Internet. Uma das maiores potencialidades da Internet está justamente em suas

possibilidades interativas, na utopia que transforma todo conteúdo em material

acessível a qualquer um – e a utilização exclusiva do português é uma evidente

inadequação, especialmente se levarmos em conta que o material incluído nos sites

destina-se à apreciação do maior número possível de pessoas. Parece-nos que a

opção de navegação em inglês ou a inclusão de arquivos com legendas nesse

idioma – coisa que alguns realizadores já fazem no YouTube por conta própria –

poderia modificar consideravelmente os números obtidos por Porta Curtas e Curta O

Curta até o momento.

Seja como for, acreditamos serem naturais essas dificuldades de

compreensão da Internet enquanto suporte para cinema – especialmente por

refletirem uma indefinição muito maior e que, de diferentes maneiras, se manifestou

no decorrer de nosso estudo. Talvez inconscientemente, carregávamos no começo

de nosso trajeto a idéia de que o cinema, de algum modo, podia encontrar na

Internet um espaço para sua disseminação – e agora temos elementos que, embora

não exatamente a refutem, são capazes de abalar essa certeza. Àqueles que acham

que basta colocar um vídeo na Internet para atingir os benefícios de exposição em

um espaço sem fronteiras, somos levados a dizer que, a julgar pelo aqui exposto, as

coisas não são bem assim. O que dá certo na Rede, de certo modo, é o que não é

cinema – ou, pelo menos, o que reinventa o cinema a ponto de em certos casos

torná-lo quase irreconhecível. A linguagem que nos acostumamos a apreciar em

salas de projeção ou mesmo no conforto de nosso lar não é, na maior parte do

tempo, a mesma que encontramos em sites de vídeo, entre visitas a algum blog ou

conferindo as novas mensagens em nossa caixa de e-mails. O que será essa

linguagem, no fim das contas, é difícil dizer, e vai além dos objetivos que traçamos

para esse trabalho. Mas a idéia de distribuir cinema pela Internet, que foi a maior

motivadora do nosso esforço de compreensão, acaba posta sob suspeita: afinal, se

os conteúdos de maior sucesso são os que se distanciam do modelo

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cinematográfico padrão, pode ser que para um distribuidor acabe não sendo

interessante distribuir, no fim das contas, o que nos acostumamos a chamar de

cinema.

Nesse momento, sentimos-nos seguros para indagar: afinal de contas, o que

quer o público que assiste a vídeos pela Internet? Com base nos dados que

coletamos e analisamos, evidencia-se que a maioria não está diretamente

interessada em cinema, pelo menos não nos moldes clássicos que nos

acostumamos a associar a ele. Trata-se, como fica claro no decorrer do nosso

estudo, de um espaço diferente, que por vários motivos não pode ser diretamente

comparado ao que existia antes dele – e nada mais natural que o público atingido

por essa renovação seja, ele próprio, renovado também. Assim, não estamos

tratando a priori com o mesmo tipo de espectador que paga ingresso para ir a uma

sala de cinema ou que divide com a família o aluguel de um DVD para assistir em

casa – e, mesmo que sejam muitas vezes as mesmas pessoas, nada nos dá a

entender que elas busquem na web o mesmo que buscam no cinema ou nas

locadoras. Pelo contrário: os resultados de nosso estudo apontam em outro sentido.

Se as respostas obtidas pelos vídeos nos servem de referencial - e acreditamos que

sirvam – temos um público que prefere atrações de poucos minutos de duração,

com mensagens de fácil apreensão, e que não dá tanta atenção a requintes

narrativos ou de linguagem visual. Um público que quer, sim, rir ou se emocionar,

mas que não parece disposto a esperar muito tempo por isso – mesmo porque

existe muita informação em outros lugares da web, e ele deseja estar livre o mais

rápido possível para acessá-los. E, além disso, trata-se de um público que tende a

crescer, na medida em que se democratiza o acesso a conexões de banda larga e

vão se sofisticando os processos tecnológicos envolvidos na transmissão de vídeos

pela Rede Mundial de Computadores.

Ou seja, a realização cinematográfica só poderá usar a Internet a pleno na

medida em que compreender não só seus mecanismos, mas também o público que

nela navega – e, a partir de tal conhecimento, planejar suas ações no sentido de se

adequar à web, e não ficar esperando que aconteça o contrário. Acreditamos,

tomando como base a nossa pesquisa, que a fórmula até aqui utilizada pelas

empresas cinematográficas – ou seja, a liberação do mesmo filme para uso nas

demais janelas de exibição, no máximo com algum material extra no caso dos DVD’s

– tende a não reproduzir os mesmos resultados caso seja aplicada na Rede sem

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adaptações. Seria, no fundo, sub aproveitar as potencialidades da Internet, e

acreditamos que quem desejar utilizar a Rede no máximo de suas capacidades deve

investir na busca de novas linguagens, de caminhos mais adequados a uma

realidade que está em todos os lugares e que pode atingir uma quantidade enorme

de usuários em questão de instantes. A web não é apenas mais um lugar para exibir

filmes, mesmo que eles sejam curtas-metragens – é um novo espaço, que engloba

os outros meios e os reinventa, e que assim deve ser visto e interpretado. Parece-

nos que só assim a Internet poderá, de fato, cumprir todas as suas promessas, e

representar um novo momento para a realização audiovisual brasileira e mundial.

Page 83: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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<http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u66071.shtml>. Acessado em: 10

out. 2007.

Fãs acham que novo CD do Radiohead vale entre R$10 e R$16. Disponível em:

<http://cifraclub.terra.com.br/noticias/6484-fas-acham-que-novo-cd-do-radiohead-

vale-entre-r10-r16.html>. Acessado em: 23 out. 2007.

Revista Time considera YouTube a melhor invenção do ano. Disponível em:

<http://pcworld.uol.com.br/noticias/2006/11/07/idgnoticia.2006-11-07.7160768985/>.

Acessado em: 11 nov. 2007.

Page 87: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

87

SILVA, Daniel. O vídeo "O dia em que o Brasil foi Invadido" e o filme "Sede,

Invasão Gota a Gota". Disponível em: <

http://www.duplipensar.net/artigos/2007s1/video-o-dia-em-que-o-brasil-foi-invadido-

filme-sede-invasao-gota-a-gota.html>. Acessado em: 04 out. 2007.

The White Stripes em formato de pen-drive. Disponível em:

<http://portal180.uol.com.br/interna.php?ID=373>. Acessado em 22 jul. 2007.

Revistas e periódicos:

NAUGHTON, John. Os 15 reis do clique. Carta Capital, São Paulo, Ano XIII, nº 408,

p. 10-18, ago. 2006.

SANCHES, Pedro Alexandre. A marca da pantera. Carta Capital, São Paulo, Ano

XIII, nº 408, p. 06-07, ago. 2006.

SOUSA, Ana Paula. Já vi esse filme... Carta Capital, São Paulo, Ano XIII, nº 408, p.

58-60, ago. 2006.

Entrevistas:

WORCMAN, Júlio. Sem censura. Entrevistadora: Leda Nagle. Rio de Janeiro: TVE /

Rede Brasil, 2003. Disponível em

<http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=1534>. Acessado em: 14 out. 2007.

Page 88: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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ANEXO A – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (I)

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ANEXO B – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (II)

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ANEXO C - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (III)

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ANEXO D - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (IV)

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92

ANEXO E - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (V)

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93

ANEXO F - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE YOUTUBE (VI)

Page 94: Monografia - Igor Natusch (UFRGS 2007)

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ANEXO G – PÁGINA INICIAL DO SITE PORTA CURTAS (I)

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ANEXO H – PÁGINA INICIAL DO SITE PORTA CURTAS (II)

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ANEXO I – VISUALIZAÇÃO DA JANELA DE EXIBIÇÃO DO SITE PORTA CURTAS

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ANEXO J – VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O CURTA (I)

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ANEXO K - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O CURTA (II)

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ANEXO L - VISUALIZAÇÃO DE PÁGINAS DO SITE CURTA O CURTA (III)