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8/17/2019 Monografia O Cavaleiro Das Trevas Da Imprensa
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CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA DO IPA
RAPHAEL TREVISOL DE OLIVEIRA
O CAVALEIRO DAS TREVAS DA IMPRENSA
Uma leitura sobre a mídia por trás do manto do Batman
Porto Alegre
2012
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RAPHAEL TREVISOL DE OLIVEIRA
O CAVALEIRO DAS TREVAS DA IMPRENSA
Uma leitura sobre a mídia por trás do manto do Batman
Monografia apresentada como requisito parcial para a
conclusão do curso e obtenção do título de bacharel em
Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, do
Centro Universitário Metodista, do IPA.
Porto Alegre
2012
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RAPHAEL TREVISOL DE OLIVEIRA
O CAVALEIRO DAS TREVAS DA IMPRENSA
Uma leitura sobre a mídia por trás do manto do Batman
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para a obtenção do grau de
Bacharel no Curso de Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo do Centro
Universitário Metodista do IPA.
Porto Alegre, Novembro de 2012
Prof.Mariceia Benetti
Coordenadora do Curso
Apresentado à banca examinadora integrada pelos professores:
________________________ ________________________
Orientadora Professora Drª. Mariceia Benneti
Professora Mª. Luciana Kraemer Centro Universitário Metodista do IPA
Centro Universitário Metodista do IPA
________________________
Professor Léo Flores Vieira Nunez
Centro Universitário Metodista do IPA
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AGRADECIMENTOS
À Bob Kane, Bill Finger, Frank Miller, Christopher Nolan e à todos que deram vida
de alguma forma ao Batman e seu universo de maneira inspiradora.Aos que os conhecimentos serviram de inspiração para esse trabalho sem imaginar a
sua contribuição e importância. Alexandre Ottoni e Deive Pazos ou Jovem Nerd e Azaghal.
Affonso Solano, Diogo Braga e Roberto Duque Estrada os Matadores de Robôs Gigantes e à
Thiago Borbolla, o Borbs.
Aos meus amigos, conhecidos e desconhecidos que demonstraram interesse no
trabalho instantaneamente ao ouvir a palavra “Batman” sem nem mesmo saber sobre o que se
tratava.
E especialmente ao meu pai, cujo gosto por quadrinhos infelizmente descobri tarde
demais.
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RESUMO
O trabalho em questão é a realização de um estudo sobre a mídia retratada nas histórias emquadrinhos (HQs), através da HQ: Batman – O Cavaleiro das Trevas de Frank Miller. Para
delimitar a pesquisa, o objetivo escolhido foi identificar qual o modelo de mídia que ganhavisibilidade na HQ de Frank Miller e de que forma(s) o jornalismo colabora na construção da percepção pública sobre o personagem Batman e a violência em Gotham, cidade fictícia dahistória. Para chegar à análise do objeto, foi realizada uma pesquisa sobre a história das HQs,o personagem Batman e também sobre teorias do jornalismo. Após apresentado o referencial,a metodologia utilizada para a análise é a Semiótica através do método de Umberto Ecoconhecido como Leitor-Modelo. A análise pelo método de Eco explana três fases deinterpretação, a leitura dicionário, enciclopédia e a do leitor-modelo. Com a união doreferencial e da metodologia foram analisadas quatro cenas da HQ envolvendo tanto o
personagem quanto a mídia buscando confirmar a hipótese de que a mídia influencia tambémos contadores de histórias em quadrinhos além do público em geral.
Palavras-chave: HQs, Batman, Mídia, Imprensa, TV, percepção, influência, leitor-modelo.
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ABSTRACT
The paper in question is a study on the media portrayed in comics using: Batman - The DarkKnight Returns (TDKR) by Frank Miller. To delimit the search, the chosen objective was to
identify which model of media gaining visibility in the comic TDKR and in what form(s)Journalism collaborates in building the public perception of the character Batman andviolence in Gotham, the history’s fictional city. To get to the object of analysis, we conducted
a survey on the history of comics, the Batman character itself and also about theories of journalism. After the presented framework, the methodology used for the analysis is themethod of Semiotics by Umberto Eco known as Model-reader. The analysis by the method ofEco explains three stages of interpretation, reading dictionary, encyclopedia and the modelreader. With the union of reference and methodology were analyzed four scenes of TDKRinvolving both of character and media seeking to confirm the hypothesis that the media alsoinfluences the storytellers in comics than the general public.
Keywords: Comics, Batman, Media, Press, TV, perception, influence, model reader.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 09
1.1 O POTENCIAL DE GOTHAM PARA A PESQUISA EM COMUNICAÇÃO .............. 10
1.2 JUSTIFICATIVA .............................................................................................................. 11
2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................. 13
2.1 A HISTÓRIA DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E SEUS SUPER-
HERÓIS................................................................................................................................... 13
2.2 O NASCIMENTO E A IMPORTÂNCIA DO HOMEM MORCEGO ............................ 18
2.3 UMA BREVE LEITURA DE O CAVALEIRO DAS TREVAS ..................................... 24
2.4 BATJORNALISMO E A MÍDIA ..................................................................................... 26
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................................................................... 31
3.1 TÉCNICAS DE COLETA E DE ANÁLISE DE DADOS................................................ 34
4 ANÁLISE ............................................................................................................................ 35
4.1 DICIONÁRIO ................................................................................................................... 35
4.2 ENCICLOPÉDIA .............................................................................................................. 36
4.3 TRECHOS SELECIONADOS ......................................................................................... 37
4.4 LEITOR MODELO .......................................................................................................... 47
5 CONCLUSÃO .................................................................................................................... 50
REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 53
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Ou você morre como herói ou vive o bastante para se tornar um vilão.
Harvey Dent
Batman - O Cavaleiro das Trevas (2008)
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1 INTRODUÇÃO
A imprensa tem uma forma característica de narrar os fatos do cotidiano. Para
retratar situações que viram notícia, especialmente na televisão, a reportagem se utiliza da
escolha de personagens. No jargão jornalístico, personagem é o indivíduo entrevistado que
representa um grupo de pessoas com características, dificuldades, problemas, histórias
semelhantes. Não raro, acabam se tornando estereótipos de questões abordadas. Mas o feitiço
também vira contra o feiticeiro. A imprensa ocasionalmente é retratada de forma estereotipada
pela ficção: filmes, seriados para TV, livros, histórias em quadrinhos. Em 2008, estreava nos
cinemas Batman – O Cavaleiro das Trevas, escrito e dirigido por Christopher Nolan. O
cineasta americano colocou um sorriso na cara de muitos fãs do homem-morcego que há anos
não viam uma história do personagem no cinema tão bem feita. Para satisfação deste
estudante de jornalismo, a obra adicionou um ingrediente diferenciado em relação aos filmes
anteriores ao tornar Batman uma figura pública. E esta publicização foi feita através da
imprensa. Um exemplo é quando o promotor de justiça da cidade de Gotham, Harvey Dent,
convoca uma coletiva de imprensa para entregar o Batman à policia. Em quatro minutos de
cena o filme revela várias peculiaridades sobre os formatos de apresentação da notícia emtelevisão. Este elemento narrativo acabou despertando o interesse pelo estudo. Como age a
imprensa da cidade fictícia de Gotham e como ela constrói a imagem do personagem que
encarna um dilema moral que aparece frequentemente no noticiário: qual o limite ético para
enfrentar a violência urbana?
Mas são nas histórias em quadrinhos (HQs) do Batman que a presença da mídia se
faz mais visível, e é utilizada até mesmo para criar romances como o de Bruce Wayne com a
Repórter de Gotham Vicky Vale. Foi Frank Miller, em 1987, quem criou a maior HQ doBatman já feita do personagem e utiliza o ponto de vista da imprensa, mais especificamente
da televisão, para construir a opinião pública sobre o personagem. Um dos diferenciais dessa
história é a crítica implícita que o autor faz à mídia, mais especificamente às coberturas
jornalísticas da época, vistas por ele como pobres e sensacionalistas. As coberturas da mídia
eram feitas especialmente nos casos de violência e em cima dos altos índices de criminalidade
de Gotham transformando as notícias em relatos de guerra onde a população parecia não fazer
nada para impedir esse cenário.
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1.1 O POTENCIAL DE GOTHAM PARA A PESQUISA EM COMUNICAÇÃO
A maioria dos autores que estuda Batman e os personagens do seu universo
realizaram pesquisas sobre os seus perfis psicológicos levantando teorias filosóficas de como
funciona a mente dos personagens ou realizando estudos sobre a história deles e suas
influências. Exemplo são os livros que serviram como inspiração e bibliografia para esse
trabalho como o Dicionário do Morcego do jornalista e fã de Batman, Silvio Ribas, e
Batman e a Filosofia de William Irwin, Mark White e Robert Arp com excelentes discussões
além de grandes teorias sobre o personagem. Outro livro que serviu de pretexto para o estudo
do personagem, mas dessa vez por outro motivo, é o gerador da maior polemica da história
das histórias em quadrinhos, o livro Sedução do Inocente, do alemão Fredric Wertham
lançado na década de 50 que praticamente excomungava as HQs e lançou polêmica sobre a
relação entre Batman e Robin. Porém, nenhum desses estudos trata diretamente da imprensa
nas histórias de Batman apesar de ser um tema já bastante abordado. Qual a influência da
mídia nas ações dos personagens e no comportamento do público? Quais são os elementos
utilizados pela mídia para colocar a violência como destaque em sua programação? O objetivo
desse estudo é identificar qual o modelo de imprensa que ganha visibilidade na HQ de Frank
Miller, Batman – O Cavaleiro das Trevas e de que forma(s) o jornalismo colabora naconstrução da percepção pública sobre o personagem Batman e a violência em Gotham.
Para responder essas perguntas e chegar ao objetivo o estudo será organizado a partir
de um referencial teórico sobre a história das HQs e do personagem Batman. Depois, durante
o capitulo “Batjornalismo e a Mídia” iremos buscar uma definição de mídia a partir dos
estudos do autor John Thomson e a utilização da violência como uma forma de linguagem por
Elizabeth Rondelli. A construção de personagem e as teorias jornalísticas utilizadas serão
abordadas a partir do ponto de vista de Eliza Casadei, Ivannoska Gurgel, Stephania Padovani,Antonio Hohlfeldt, François Jost e Beatriz Marocco.
Já que falamos de uma HQ, um recurso visual e com uma interação que demanda
basicamente criatividade do leitor em dar vida à cena, talvez o método mais adequado para
realizar tal análise no trabalho seja o Leitor-Modelo de Umberto Eco e para isso utilizaremos
os trabalhos de Lucia Santaella e Jauranice Cavalcanti. O autor italiano diz em seus estudos
que o texto demanda uma participação de seu destinatário. Uma participação que vai desde a
camada mais rasa do leitor que só percebe a obra pelo que ela literalmente é e a mais profunda
onde o universo que envolve o objeto de estudo é considerado e as referências externas e
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internas são incorporadas pelo leitor para absorver o conteúdo na posição de leitor-modelo.
Isso tudo ele estava apenas se referindo a textos, talvez em HQs a análise vá ainda mais a
fundo.
1.2 JUSTIFICATIVA
As histórias em quadrinhos tem uma forte ligação com o jornalismo. A popularização
das HQs se deu graças à publicação dos mesmos em periódicos, no final do século XIX. Hoje
já é possível perceber, não ainda como tendência, o uso do formato para retratar um fato
jornalístico. Um dos exemplos mais recentes é o caso do show de Bob Dylan em São Paulo. O
cantor norte americano em sua passagem pelo Brasil fez um requerimento inusitado. Sem
fotógrafos e imprensa no seu show. Como se pode visualizar na figura 1, uma das soluções
encontradas pelo jornal Folha de São Paulo, foi retratar o show em forma de quadrinho. Para
isso o veículo convidou o quadrinista gaúcho Rafael Grampá, que havia ido ao show, para
desenhar um retrato da sua perspectiva sobre aquela noite. Por outro lado, ambientes que
costumam cercar o mundo jornalístico também são temas para as histórias em quadrinhos. O
jovem Tim-Tim, por exemplo. Criado pelo belga Georges Prosper Remi, com o pseudônimo
de Hergê, talvez seja o melhor repórter das histórias em quadrinhos e quem sabe do mundo. Não é simples coincidência também que Clark Kent enquanto não está trajando o
colant azul e vermelho do Super-Homem para salvar o mundo, é jornalista no Planeta Diário
da fictícia Metrópolis. Ou então Peter Parker e seu trabalho como o único fotojornalista capaz
de registrar em fotos as ações dele mesmo como Homem-Aranha. É o que também conta a
obra já citada e considerada como a maior das histórias em quadrinhos, Batman - O
Cavaleiro das Trevas, objeto de estudo desse trabalho, que faz uso da narrativa de telejornais
para contar a história de maneira singular. A importância e a influência das HQs são o maiormotivador dessa pesquisa que retrata tanto a busca de um fã em se tornar um leitor-modelo de
uma obra quanto a análise de um jornalista sobre o porquê a imprensa é retratada de maneira
estereotipada na ficção.
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Figura 01: Quadrinho de Rafael Grampá para a Folha de São Paulo sobre o show de Bob
Dylan que teve a entrada de jornalistas e fotógrafos vetada.
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2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 A HISTÓRIA DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E SEUS SUPER-HERÓIS
O formato conhecido hoje das HQs, com desenhos e balões com diálogos teve
origem nas tirinhas de jornal. Em 1895, as histórias de um garoto amarelo chamado Yellow
Kid, criação do norte-americano Richard Outcault, surgia com o título de At the Circus in
Hogan’s Alley. As tiras saíam nas edições dominicais, primeiro em preto e branco, mas a
partir de cinco de maio do mesmo ano, em páginas coloridas do jornal estadunidense New
York World, e duraram até 1898. Mas segundo o jornalista e fã de histórias em quadrinhos
Silvio Ribas, também há quem diga que o pai do primeiro personagem de histórias em
quadrinhos é brasileiro, só não foi reconhecido (RIBAS, 2005). Em 1869, o italiano radicado
no Brasil, Angelo Agostini, escrevia histórias no formato de charges sobre um personagem
chamado Nhô Quim para a revista Vida Fluminense, e em 1883 ele também publicou uma
saga com 75 capítulos chamada As Aventuras de Zé Caipora. Não muito depois, em 1905
surgia a primeira história em quadrinhos brasileira, destinada ao público infantil e criada por
Luís Bartolomeu e Renato de Castro: O Tico Tico. Independentemente da paternidade das
histórias em quadrinhos, o período que abrange o final do século XIX e o começo do séculoXX foi o marco inicial para a nona arte. Quarenta anos depois, teria os super-heróis
aparecendo nas histórias e tomando conta das bancas.
Esses super-heróis, como Batman e Super-Homem, surgiram no que se chama hoje
de Era de Ouro dos quadrinhos, o período inicial de sucesso das HQs que ocorreu entre a
década de 30 e de 50. Em 1935, o major Malcolm Wheeler-Nicholson, conhecido por escrever
romances e contos para revistas pulps1 na época, após ver o surgimento de uma revista de
tamanho gigante que reimprimia as famosas tiras de jornal, resolveu criar uma das primeiraseditoras especializadas em histórias em quadrinhos dos Estados Unidos: a National Allied
Publications. Foi a partir dela que nasceu a DC Comics, uma das maiores do ramo hoje, e
detêm os direitos das histórias de Batman, Super-Homen, Lanterna Verde, Flash e muitos
outros heróis. Segundo Trindade (2010) enquanto a maioria das editoras vivia de títulos que
traziam apenas reimpressões de tiras, Wheeler-Nicholson lançou a revista New Fun, em
1 Revistas Pulps eram publicações surgidas no começo do século XX e em grande maioria dedicadas a
histórias de ficção científica sendo várias escritas pelo grande escritor Isaac Asimov.
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fevereiro de 1935, a qual trazia material inédito e foi a primeira do ramo a trazer anúncios.
Pouco tempo depois, haveria o lançamento de dois novos títulos, a New Comics e a Detective
Comics, onde em 1937 surgiria o Batman. O maior problema enfrentado pelo major na época
era a relutância dos donos de bancas de jornal em estocar material de uma editora
desconhecida e sem público ainda. Essa relutância fez o empresário quase declarar falência e
ser obrigado a aceitar o dono da gráfica onde imprimia as revistas como sócio na época, que
futuramente viria a ser o novo dono da empresa tirando o major de cena.
O primeiro período de grande sucesso das HQs, quando as vendas iam bem e as
bancas estavam cheias de exemplares de uma enorme variedade de títulos, veio juntamente
com a Segunda Guerra Mundial. Elas conquistaram um espaço não como apenas tiras de
jornal, mas um meio de entretenimento de massa e uma maneira de contar histórias que existe
e é renovada até hoje. Com a guerra também veio o esforço de apoio militar do governo por
meio da mídia, incluindo nesse esforço as histórias em quadrinhos, um meio barato de
investir, de divulgação e de esperança para a população e os soldados que participavam da
guerra. Um personagem importante a surgir nessa época como parte desse esforço foi o
Capitão América da Timely Comics, que se tornaria a Marvel Comics futuramente, e que na
capa de sua primeira revista trazia o capitão invadindo o bunker de Hitler como meio de
acabar com a guerra. Um dos motivos para as HQs se tornarem tão populares nesse períodoera justamente o preço. As revistas publicadas tanto pela National Comics como pelas outras
empresas que surgiram na época custavam apenas 10 centavos de dólar, isso desde a primeira
revista lançada em fevereiro de 1935. Esse era talvez a forma de entretenimento mais barata
na época e acesso a literatura, além de ser um meio para distrair os soldados com um
entretenimento barato, de fácil acesso e motivacional. O preço das revistas em quadrinhos à
10 cents durou por um longo período de tempo, o primeiro aumento registrado foi somente
em junho de 1962 quando passou a custar 12 centavos de dólar. Ou seja, o material que estavaem ascensão de público, permaneceu 27 anos com o mesmo valor. Mas as histórias em
quadrinhos antes do período de guerra também teve outro background que contribuía pela
procura da população por uma maneira de entretenimento barato. O mundo inteiro ainda
estava sentindo os efeitos da grande depressão causada pela crise de 1929 durante a década de
30, onde os super-heróis surgiram e tentavam resgatar uma esperança para a população.
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Figura 02: Capas das primeiras aparições de Super-Homem, Batman e Capitão América na
Era de Ouro.
Mas não somente de super-heróis combatendo as forças do Eixo viviam as histórias
em quadrinhos durante a Era de Ouro. Revistas de faroeste, aventuras na selva como as de
Tarzan e histórias infantis com os personagens da Disney enchiam as bancas na época e
vendiam bem. Mas passado o período de guerra, a Era de Ouro dos quadrinhos chegava ao
fim. Porém, a história das HQs também é marcada por outras três épocas até agora. As eras de
Prata, Bronze e a Moderna.A transição entre as eras de Ouro e de Prata foi marcada por dois momentos
importantes. O grande procura e os novos experimentos realizados com materiais atômicos
que criou uma tensão de uma guerra nuclear entre EUA e União Soviética envolvendo a
utilização de material atômico nuclear como fonte de energia de abastecimento para diversas
cidades e também na criação de armas que acabou se tornando tema de diversas histórias. Já o
outro momento foi a publicação de um livro que fez com que os quadrinhos passassem por
talvez seu pior período na história. Em 1954, o psiquiatra alemão naturalizado norte-americano Frederic Whertam publicou um polêmico livro chamado Seduction Of The
Innocent , baseado em suas análises e depoimentos de jovens da época. Ribas (2005) ainda
afirma que:
“Ele acusava as revistas de induzirem à delinquência juvenil, à perversidade sexual e
aos sentimentos antiamericanos, além de levar a uma certa preguiça mental. (...) Otexto foi um dos principais fundamentadores da histeria moralista dos anos 50,também conhecida por “caça às bruxas”. (RIBAS, Silvio. 2005, p.220)
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Um dos pontos mais debatidos no livro e gerador de maior polêmica é a constatação
do autor de uma relação homossexual entre Batman e Robin nas histórias dos anos 40 e 50.
Com a recente criação do Subcomitê sobre Delinquência Juvenil do Senado dos Estados
Unidos em 1953, os editores de histórias em quadrinhos foram submetidos a códigos de ética
e censura que regulamentavam e auditavam o conteúdo das HQs e que impactou fortemente
nas vendas. Segundo Trindade (2010):
No fim, as editoras se uniram e voluntariamente criaram o Código de Ética dosQuadrinhos (em inglês Comics Code Authority), o qual controlaria o conteúdo das
publicações. (...) Dessa forma, uma época singular chegou ao fim de um modo umtanto quanto melancólico. A Era de Prata se avizinhava...(TRINDADE, Levi.2010o, p.8)
Com a queda de interesse das pessoas nos quadrinhos devido ao conteúdo mais fraco causado
pela censura em todos os tipos e formatos de HQs, a DC Comics decidiu por reformular
alguns de seus personagens para tentar sair desse período de depressão, e foi em 1956 com a
nova versão do herói Flash que as HQs entraram em uma nova era. A classificação como Era
de Prata foi adotada, segundo o produtor cinematográfico e historiador de quadrinhos,
Michael Uslan, quando um leitor comentou na sessão de cartas da revista Justice League of
America 42, em 1966, que com o relançamento de heróis de décadas passadas pela DC as
pessoas chamariam isso de “Anos Sessenta de Prata”. Esse período foi marcado pelos
relançamentos de personagens da DC como o Lanterna Verde, Gavião Negro, Elécktron e
também com o surgimento da Liga da Justiça da América para tomar o lugar da antiga
Sociedade da Justiça. Outro tema que marcou a época foi o conceito de universos paralelos
criado pela DC para explicar o que aconteceu com os heróis e as histórias antigas publicadas
na Era de Ouro. Também enchiam as prateleiras das bancas nessa época as histórias de ficção
científica e outras baseadas em seriados televisivos dos anos 60 como Star Trek e
Frankstein Jr. Diversas editoras surgiram nessa época com personagens que duravam em
média um ou dois anos. No entanto, outro movimento surgiu nessa época, o do quadrinho
underground . Ainda de acordo com Levi Trindade (2010p, p. 10) “Enquanto a maioria dos
gibis tratava de temas fantasiosos e irreais, as revistas independentes focavam em temas
adultos e refletiam o movimento da contracultura da época.”. Já o final desse período foi
marcado por diversos fatores segundo historiadores. O aumento de preço registrado em 1969
quando as HQs saíram da marca de 12 cents, a troca de profissionais entre as principaiseditoras e também a publicação da história que conta a morte da personagem Gwen Stacy,
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namorada de Peter Parker na revista Amazing Spider-Man em junho de 1973, o que marcou
também o retorno de temas mais sérios e adultos para as HQs de super-heróis.
Findada a Era de Prata, durante os anos 70 e meados de 80 é a vez da Era de Bronze
tomar posto na história das HQs. Durante esse período as revistas com temas mais
diferenciados com as de faroeste, guerras e os romances entraram em decadência e muitas
foram canceladas. Já as principais empresas como a Marvel e a DC Comics estavam lutando
para retomar a temática adulta e por vezes sombria nas suas HQs e o marco principal dessa
temática aconteceu quando ambas empresas publicaram histórias em duas de suas principais
publicações, o Homem-Aranha da Marvel e o Lanterna Verde na DC, sobre o uso de
drogas pesadas por personagens secundários, mas que teriam problemas ainda com o temido
Código de Ética dos quadrinhos.
Essa seria a primeira vez, desde os anos 50, que uma revista seria publicada sem o selo
da censura. Outro fato importante para as histórias em quadrinhos e que aconteceu durante a
Era de Bronze foi a criação da primeira mega saga. Em comemoração aos 50 anos da DC
Comics, a editora decidiu criar um evento em suas histórias que colocaria fim nas terras
paralelas criadas na Era de Prata e ajudaria a colocar ordem na casa da editora deixando todos
os heróis e vilões em um único universo. Essa saga recebeu o nome de Crise das Infinitas
Terras. O sucesso de vendas foi enorme, assim como o de crítica dos fãs, o que fez do eventoum marco na história das HQs e representar o fim e começo de mais uma era.
Figura 03: Os títulos Lanterna Verde e Homem-Aranha foram os primeiros a trazer o uso de
drogas pelos jovens como tema de suas historias e o Mega Evento da DC, Crisis.
Com o final de Crise nas Infinitas Terras, a maxissérie em 12 partes da DC, começou
também um novo período para as HQs. Esse período conhecido com Era Moderna dos
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quadrinhos apresentou o surgimento de vários estúdios e editoras independentes de
quadrinhos que resultou na ida de artistas das principais editoras para elas devido a maior
liberdade de criação. Essa época nas histórias de super-heróis teve grande importância para o
personagem Batman. As principais histórias do personagem como O Cavaleiro das Trevas, A
Piada Mortal, A Queda do Morcego, Morte em família e Ano Um surgiram nesse espaço de
tempo recriando o ar sombrio do cavaleiro das trevas e fazendo com que a década de 80 fosse
quase inteira dominada pelo Homem Morcego. Outra importante história que definiu o
período foi a maxissérie Watchmen de Alan Moore e Dave Gibbons, publicada entre 1986 e
1988 que se tornou um dos maiores sucessos editoriais da DC até hoje. A história ainda
recebe formatos de aniversário e de luxo para os fãs e em 2012 ganha um prequel onde vai
contar os acontecimentos anteriores à história original. A Era Moderna é o período atual das
HQs e ficou caracterizado também pelas constantes e grandiosas sagas criadas pelas editoras
após o sucesso de Crise nas Infinitas Terras o que fez com que muitos leitores acabassem por
abandonar as revistas mensais e procurarem apenas as publicações especiais. Em 2011 a DC
também passou por um reboot completo em suas revistas onde zerou todas as numerações de
todas as revistas publicadas para contar novamente a origem e os primeiros anos de todos os
heróis. Essa manobra editorial foi chamada de Os Novos 52 que reduziu justamente para 52 o
número de revistas publicadas pela editora. Dessas publicações, 11 títulos são pertencentes aouniverso de Batman reforçando a importância do personagem tanto para a editora quanto para
as histórias em quadrinhos.
2.2 O NASCIMENTO E A IMPORTÂNCIA DO HOMEM-MORCEGO
O personagem Batman surgiu em 1939, criado por Bob Kane para a revista Detective
Comics. O personagem veio como o segundo super-herói da editora da National Comics, que já tinha emplacado a HQ do Super-Homem um ano antes.
Kane veio com a ideia de um herói mascarado chamada Bird-Man que possuía asasmecânicas fixadas em seus braços. Ele levou, então, seu personagem para seu amigoe respeitado escritor Bill Finger, o qual sugeriu que uma revista como a DetectiveComics deveria ter algo mais no estilo noir , ao invés de um homem-pássaro voador.De volta à prancheta, Bob Kane mudou o nome do herói para Batman, transformousuas asas numa longa capa, acrescentou um capuz e luvas, tentando aproximá-lo dosheróis pulps que gostava quando criança. (TRINDADE, 2010o, p.7)
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O herói veio como um contraponto ao kryptoniano Super-Homem. Era mais obscuro, não
tinha superpoderes e parecia inicialmente um detetive fantasiado que teria sua história e
psicologia desenvolvida ao longo de 70 anos.
Batman é o carro chefe de sua editora a DC Comics, do grupo Time-Warner ,acompanhado de perto pelo alienígena Super-Homem. O homem de aço é, alias, oamigo que serve de contraponto ideal do Homem-morcego, opondo visual e caráter,
passando pela dualidade das cidades onde cada um mora: a obscura Gotham e aradiante Metrópolis. (RIBAS, 2005, p.9)
Segundo Ribas (2005), o Cavaleiro das Trevas nasceu da influência de outras figuras já
consagradas como Zorro, Drácula, Sherlock Holmes, e o Sombra. Inclusive em uma das
versões do surgimento do Batman nas histórias em quadrinhos conta que no momento da
morte dos pais de Bruce Wayne, eles saiam de uma sessão de cinema do filme A Marca do
Zorro, referenciando as influências da criação do herói. Porém Ribas (2005) também diz que
há quem considere os verdadeiros pais do morcego, quando se fala em influências, Mary
Roberts Rinechart, autora do livro A Escada Circular (1908) e os romances policiais de Lew
Merril dos anos 30 que serviram de inspiração para toda a obra de Bob Kane.
Assim como a Era de Ouro dos quadrinhos, a época de lançamento do personagem
Batman também fazia parte do período de recuperação pós-crise financeira com a quebra da
bolsa de valores de Nova York em 1929 que havia abalado todos os mercados mundiais. O
final do período de longa depressão econômica era fértil para a literatura barata dos romances
policiais e para a proliferação do crime na vida real, o que contribui para o surgimento do
herói. Também era um período de tensão de guerra. Enquanto nos Estados Unidos Bob Kane
lançava a Detecti ve Comics #27 onde surgiu a primeira história do personagem Batman, na
Europa Adolf Hittler expandia os domínios alemães até setembro do mesmo ano quando
invadiu a Polônia, culminando na II Guerra Mundial. De acordo com Trindade (2010), aSegunda Guerra Mundial eclodiu e os quadrinhos passaram a retratar os super-heróis lutando
contra as forças do Eixo. “No geral os gibis venderam muito bem nessa fase, seja por seus
preços baixíssimos ou por apresentar às massas histórias retratando o triunfo do bem sobre o
mal.” (TRINDADE, 2010o, p.8)
Segundo Ribas (2005) as primeiras histórias de Batman exageravam na violência,
mostrando um herói justiceiro que usava armas de fogo para combater criminosos. Porém
logo depois ele largaria as armas e passaria a utilizar o seu maior e principal poder, a dedução.A origem do personagem foi contada na revista Detective Comics #33 , sete edições após a sua
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primeira aparição na publicação. Batman é o alterego de Bruce Wayne. Bilionário de Gotham
que viu seus pais serem assassinados, ainda quando era criança, ao saírem de um cinema (ou
teatro, de acordo com algumas versões da história). O garoto de apenas oito anos teve sua
custódia dada ao mordomo da família, Alfred Pennyworth que o criou e virou uma espécie de
mentor.
Bruce “morre” com seus pais, assassinados por tiros à queima-roupa disparados porum ladrão nas ruas. O que sobrou foi a personificação de sua vingança. Convicto desua tarefa, ele acaba arrastando sem esforço para seu lado outros descontentes com ocaos, como o comissário de policia James Gordon, os auxiliares diretos Alfred,Harold e Sasha, batgirls, robins e demais pseudônimos para identidades secretas.(RIBAS, 2005, p.11)
O assassinato dos pais de Bruce é o momento onde ele jura, sobre o corpo de seus pais
vinga-los combatendo o crime de todas as formas, e assim, impedir que inocentes sofram.
Desde os 14 anos de idade, ele busca levar seu corpo e mente ao limite da perfeição, indo às
melhores faculdades e buscando especialistas que pudessem lhe ajudar na sua formação para
combater o crime. Após 12 anos nessa busca pela perfeição, Bruce Wayne encontra a sua
maneira de combater o crime. na história Batman – Ano Um, uma releitura mais detalhada da
origem do herói após uma fracassada tentativa de combater o crime, Bruce está derrotado nasala de sua mansão, ensanguentado quando um morcego arrebenta sua janela. É o morcego
que dá a ele a ideia. “Já vi essa criatura antes... em algum lugar. Ela me aterrorizou quando
criança... me aterrorizou...Sim pai. Eu me tornarei um morcego.” (MILLER, 2011, p.32)
O antes a que Bruce se refere é um dia enquanto ainda era criança, antes da morte de
seus pais, quando ele cai em um buraco no jardim de casa ao perseguir um coelho (alguns fãs
de Batman acreditam ser uma clara alusão ao livro Alice no País das Maravilhas de Lewis
Carroll). Dentro desse buraco que mais tarde viria ser descoberto como batcaverna, o menino
é afugentado por morcegos até seu pai vir resgata-lo, e se torna o medo que ele decide abraçar
para afugentar seus inimigos.
Batman surge como um vigilante noturno e solitário, mas acabou ganhando muita
companhia combatendo o crime ao longo dos anos. Na década de 40 surge o primeiro
ajudante. O personagem Dick Grayson foi inserido nas histórias do homem-morcego e
apresentado como primeiro Robin e também o primeiro ajudante adolescente nas histórias de
super-heróis, ou “ sidekiks” como são conhecidos. Para Ribas (2005, p.212) Robin “Foi criado
para suavizar a imagem soturna de Batman para, assim, atrair o público mais jovem,
sobretudo crianças.”. Dick Grayson é o primeiro Robin e que depois cresce, vai para a
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faculdade, assume a identidade secreta de Asa Noturna e ganha revista própria. Além dele, até
hoje existem mais 3 Robins na cronologia oficial. O segundo, Jason Todd, é morto espancado
com um pé de cabra pelo coringa na história Morte em Família. A morte do personagem foi
decidida pelos leitores que deviam ligar para um número de telefone dado na história. Após
Jason Todd quem assume o posto é Tim Drake, um jovem que descobre a identidade secreta
de Batman e r esolve ajudá-lo na luta contra o crime, mas que depois sede lugar a outro
personagem. A salteadora.
O último e mais recente Robin é o jovem de 12 anos, Damian Wayne. Filho que Bruce
teve com Talia Al Gul e que foi treinado pela Liga das Sombras, um dos clãs onde Bruce
também havia sido treinado. Talia deixa o menino sob custódia de Bruce que nem sabia da
existência do filho e ele acaba adotando a identidade de Robin depois de um tempo. O
“batsquad ” como é conhecido os outros heróis que surgiram inspirados por Batman, tem ele
como mentor ou estão enquadrados dentro do universo do personagem incluem Batgirl,
Batwoman, Mulher Gato, Oráculo, Asa Noturna e diversos outros.
Ainda de acordo com Ribas (2005), as histórias de Batman incluem batalhas solitárias
e em equipe, o caos de uma cidade arrasada por terremotos e epidemias e até as dores da
abstinência de drogas. Os enredos do cavaleiro das trevas já o colocaram em coma profundo,
crises existenciais, duelos com fantasmas reais e imaginários. Durante os mais de 70 anos do personagem, Bruce também “morreu”, ficou paralítico e foi preso sob injusta acusação de
assassinato. E é claro, saiu dos quadrinhos para ganhar espaço em todas as outras mídias.
Livros, filmes, grupos musicais, desenhos animados, videogames e brinquedos. Na década de
60 surgiu o famoso seriado televisivo do Batman (1966-1968), com Adam West e Burt Ward
nos papéis de Batman e Robin respectivamente, o que serviu para incrementar ainda mais a
popularidade do personagem e também consolidar vários estereótipos e fazer com que
Batman se tornasse um sinônimo de comédia na época. Demorou bastante tempo até o personagem recuperar o tom sombrio novamente fora das HQs. Em 1989, o diretor Tim
Burton realiza a adaptação para o cinema de Batman que retoma o clima sombrio e obscuro
para Gotham e para o personagem, um alívio para os fãs.
Batman hoje possui 8 filmes, 11 títulos mensais nas HQs, 1 musical na Brodway, mais
de 36 jogos de videogame e segundo Ribas (2005), já em 2005 havia duas revistas em
quadrinhos na lista das 10 mais valiosas do mundo, a Detective Comics 27 de 1939 e a
Batman 1 de 1940 que valiam 350 mil e 110 mil dólares respectivamente. O cavaleiro das
trevas foi e continua sendo um mito no universo dos quadrinhos e da cultura pop mundial.
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Figura 04: Batman Ano Um, quando Bruce Wayne decide incorporar o morcego como
símbolo.
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2.3 UMA BREVE LEITURA DE O CAVALEIRO DAS TREVAS
Batman - O Cavaleiro das Trevas é o título em português dado para a obra de Frank
Miller lançada em 1986, The Dark Knight Returns. Essa história do homem morcego foi
dividida em quatro partes e lançada em março do mesmo ano. Ela não faz parte da cronologia
oficial do personagem, acontece em um universo alternativo da DC já que Frank Miller não
fazia parte da equipe criativa mensal de Batman e foi convidado exclusivamente para escrever
e ilustrar essa revista. O convite veio, pois o personagem precisava de um novo fôlego, afinal
ele já era quase um cinquentão ainda combatendo o crime. Batman estava próximo de
completar meio século de publicações nos quadrinhos desde a Detective Comics 27 e
precisava retomar as boas tiragens de vendas, o agrado dos fãs e da critica.
Apesar de não fazer parte da cronologia oficial do personagem, o autor utiliza de todo
o plano de fundo existente nas histórias em quadrinhos do Batman para ambientar a sua
versão. Pegando esse gancho, Frank Miller mostra a vida de Bruce Wayne com 50 anos de
idade. Dez após ter aposentado o manto de Batman em razão da morte de Jason Todd 2, o
segundo Robin. Em contra ponto a aposentadoria do herói, Gotham agora está passando por
um período de alta criminalidade onde as gangues dominam e governam a cidade nãooficialmente.
“A minissérie em quatro edições se passa numa Gotham futurística e caótica, onde
os criminosos e mutantes fazem a festa. Nessa época Batman já é um homem velhoe cansado que está aposentado. Quando resolve voltar à ativa, a opinião pública sedivide: as tribos urbanas se mostram cada vez mais perigosas e uma delas chega a seapossar da imagem do herói.” (RIBAS, 2005. P.104)
E é essa divisão de opinião que se transforma no grande trunfo da história, pelo menos para os estudantes de jornalismo e fãs de Batman. Frank Miller decide por utilizar uma
narrativa jornalística para contar grande parte da história. Não escrevendo matérias e
publicando em tirinhas de jornal, mas a opinião pública é vista através dos telejornais de
Gotham, programas de entrevistas, debates, e até na previsão do tempo. Tudo relacionado
com o retorno do Batman e a sua influência na cidade.
2
Jason Todd morreria na cronologia oficial das histórias em quadrinhos apenas em 1988, na históriaMorte em Família, já mencionada nesse trabalho anteriormente. Alguns fãs acreditam que O Cavaleiro das
Trevas foi o responsável pela escolha futura da morte de Robin.
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Bruce cansado de ver o crescimento da criminalidade em Gotham é chamado pela
memória do assassinato de seus pais e a visão do morcego a se tornar novamente o Batman e
limpar a cidade dos criminosos. Apesar de Bruce estar fora de forma e velho, Gotham precisa
novamente do cavaleiro das trevas. Junto com a volta de Batman, a sua galeria de vilões
também retorna. Pelo menos os mais icônicos, Harvey Dent que era conhecido como o vilão
Duas Caras, tem o tratamento médico para a reconstrução de seu rosto e psicológico custeado
por Bruce Wayne, mas mesmo Dent não acredita que seja possível curá-lo e continua agindo
criminalmente. Coringa também se faz presente, após o desaparecimento de Batman há 10
anos, ele não via mais sentido em continuar sua vida de criminoso e entrou em estado
catatônico, porém com o retorno do herói o sorriso volta a aparecer no rosto do vilão junto
com seu propósito de vida e crimes. Com a volta do Batman, os noticiários e programas
televisivos bombardeiam a população com conteúdo sobre o herói. Discussões, entrevistas,
críticas e matérias de todos os tipos envolvendo o cavaleiro das trevas fazem parte
diariamente da vida das pessoas que acabam criando imagens e mitos sobre Batman baseados
no que vêem.
Apesar de todos os vilões clássicos da história, ainda com o acréscimo de novos como
o líder da gangue dos mutantes cuja luta com o cavaleiro das trevas na lama marca de vez o
retorno de Batman como um ideal e o surgimento de um novo Robin. O verdadeiro confrontode Batman é com a sociedade que está relaxada e com o governo que abraça a criminalidade e
a corrupção. O símbolo máximo disso é a batalha entre o cinquentão Bruce vestindo não mais
um traje, e sim uma armadura e o Super-Homem, transformado em um agente do governo. A
luta é arranjada para acontecer no mesmo local onde os pais de Bruce morreram, os acessos
são bloqueados pela polícia, a imprensa proibida de cobrir qualquer acontecimento na área e
especula uma manobra para capturar o Batman no que seria o embate definitivo de ideologias
e não um espetáculo de luta apenas. Os dois confrontantes não estão ali como heróis, mas osideais por trás de cada um. Batman utilizando todos os seus artifícios dá uma surra no
Kryptoniano, e também planeja a sua morte na batalha, mostrando-se como Bruce Wayne,
para que assim todos que o apoiavam e os membros de gangue que ele converteu para aliados
possam seguir a sua cruzada sombria contra o crime. A notícia da morte de Batman e a
revelação de sua identidade secreta marcariam uma nova era para a cidade de Gotham, porém
Bruce finge sua morte por ataque cardíaco usando uma droga durante a luta com Super-
Homem que faz com que seu coração volta a bater alguns dias depois. Batman agora volta
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agir no silêncio e com a ajuda dos novos membros recrutados, sem dar pista novamente de seu
retorno ou de vida. Batman volta a ser um cavaleiro das trevas.
2.4 O BATJORNALISMO E A MÍDIA
Como já foi visto, em Batman – O Cavaleiro das Trevas a imprensa televisiva é
muito utilizada na história, seja como recurso narrativo ou como parte da trama. Frank Miller
também utiliza a HQ para fazer uma crítica à imprensa do período da Era Reagan 3, conforme
declarou no texto de abertura da edição comemorativa dos 20 anos da publicação original de
sua obra. Para o autor, essa época foi rica para produzir histórias em quadrinhos devido à
explosão do índice de criminalidade, ameaças, e eventos cobertos e produzidos pela mídia.
O Cavaleiro das Trevas é, obviamente, uma história do Batman. Em grande parte, procurei usar a escalada da criminalidade ao meu redor para retratar um mundo que precisava de um gênio obsessivo, hercúleo e razoavelmente maníaco para por ascoisas em ordem. Mas isso era apenas metade do serviço. Eu não guardei meuveneno mais poderoso para o Coringa ou pro Duas-Caras, mas para as insípidas eapelativas figuras da mídia que cobriam de forma tão pobre os gigantescos conflitosdaquela época. O que essas pessoas insignificantes fariam se gigantes andassemsobre a terra? Que tratamento elas dariam a um herói poderoso, exigente einclemente?(MILLER, Frank. 2011, p.9)
Miller (2011) refere-se à imprensa como um sinônimo de mídia, mas para poder
analisar melhor os efeitos de “um gigante andando sobre a terra” e o tratamento que seria
dado ao “herói poderoso, exigente e inclemente” é necessário descobrir de que mídia estamos
falando.
De acordo com Thompson (1998), pode-se considerar a mídia como um poder
simbólico e que teve o surgimento como tal na segunda metade do século XV, juntamente
com o desenvolvimento das técnicas de impressão. “O advento da indústria gráfica
representou o surgimento de centros e redes de poder simbólico que geralmente escapavam ao
controle da igreja e do estado.” (THOMPSON, John. 1998, p.54). O estado e a igreja
utilizavam essas técnicas em benefício próprio, mas não tinha um controle sobre o seu
alcance. Porém, em menos de um século, as técnicas de impressão foram aperfeiçoadas o
suficiente para serem exploradas comercialmente. Os livros e manuscritos que simbolizavam
3 A era Reagan corresponde ao período de mandato do presidente norte americano Ronald Reagan, de
1981 a 1989 marcado principalmente pelos altos índices de criminalidade.
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o conhecimento de poucos letrados na época eram de difícil acesso, mas a partir dos avanços
nas técnicas de impressão eles começaram a ser replicados e vendidos alcançando um número
maior de pessoas. Febvre e Martin (apud THOMPSON, 1998) estimam que antes de 1500,
cada edição de uma obra tinha em média 500 cópias. No intervalo de um século, até 1600,
algo entre 150 e 200 mil edições foram produzidas com uma média de mil cópias por edição,
ou seja, quase 200 milhões de cópias foram produzidas no período. Com a enorme reprodução
de material surgiram editoras e consequentemente uma indústria editorial. Para Thompson
(1998), o surgimento de novas redes de poder dessa vez “se baseavam principalmente nos
princípios de produção mercantil e que eram por isso mesmo relativamente independentes do
poder político e simbólico controlado pela igreja e pelo estado.” (THOMPSON, John. 1998,
p.57). De certa forma, a mídia surge como uma forma de poder diferente do econômico,
político e do coercitivo, aquele que faz uso da força física, mas semelhante ao poder da igreja.
O poder simbólico nasce da produção, transmissão e recepção do significado das formas
simbólicas que de acordo com Thompson (1998, p.24), “podem provocar reações, liderar
respostas de determinado teor, sugerir caminhos e decisões, induzir a crer e a descrer, apoiar
os negócios do estado ou sublevar as massas em revolta coletiva.”.
Frank Miller critica tanto o poder que a mídia tem para induzir o público a tomar
decisões, quanto o conteúdo transmitido diariamente através da televisão. Para Jost (2010)uma mídia só se constitui verdadeiramente como tal, a partir do momento em que passa de
novidade técnica para o estágio de elaboração de programas e conteúdo. Para o autor, a
televisão é sem dúvida a única mídia que mobiliza a atenção de todas as outras diariamente
com sua programação. Para ele, apesar dessa mobilização a mídia televisiva é desvalorizada e
um dos motivos para que isso aconteça é a confusão entre média (mídia) e medium (meio).
“Condena-se a televisão (mídia), porque assistir passivamente às imagens (meio)seria uma atividade menos dignificante que outras. (...) A questão é frequentementealudida em proveito de uma amálgama entre os conteúdos e a mídia, comotestemunha o relatório Kriegel sobre a violência na televisão (2002), que toma como
ponto de partida a condenação dos programas demasiado violentos ou pornográficos. (JOST, François. 2010, p.29)
A história da HQ é contada em vários momentos através da televisão e do destaque da
cobertura feita pela mídia sobre o cotidiano violento das cidades americanas a partir do
personagem Batman. Ao analisar um fenômeno semelhante no Brasil, a antropóloga Elizabeth
Rondelli notou que durante as duas últimas décadas no país a violência tem ocupado lugar de
destaque em todos os meios de comunicação. Para Rondelli (2000), a cobertura jornalística
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dada à criminalidade é destacada pela mídia e que gera debates, nos últimos anos tem sido
aquela em que a polícia esteve envolvida. Nesse caso, onde o Batman esteve envolvido.
Rondelli (2000, p. 155), também acredita que a valorização dada a esse tipo de notícia tenha
uma finalidade de utilidade pública. Pra ela, “(...) a mídia além de enquadrar a violência
segundo os requisitos e de acordo com as suas necessidades de rotina produtiva, oferece-a a
visão, ao conhecimento e ao julgamento de outros sujeitos sociais.”, de uma maneira a se
tornar um “dispositivo que pauta a violência na agenda diária da constituição dos discursos e
ou sujeitos sociais.” (RONDELLI, Elizabeth. 2000, p.156).
Cada notícia dessas contada pela imprensa é como uma história. Possui um início,
meio e fim. Às vezes o fim não aconteceu ainda e será acompanhado pelos jornalistas, mas
não deixa de ser uma história. O jornalismo conta histórias transmitindo informação de um
grupo ou pessoa detentor dessa mensagem, para um grupo ou pessoa que vai receber a
mensagem, chamado receptor de acordo com o pesquisador Mauro Wolf. Wolf (2003 p.144)
“(...) muitas vezes, a repartição efetiva da opinião pública se regula pela opinião reproduzida
pelos mass media e se adapta a ela segundo um esquema de conjecturas que se auto
modificam.”, o termo mass media na frase representa um emissor, seja um grupo, um
indivíduo ou alguém que produz conteúdo, informações, ideologias e teorias. Já o receptor das
mensagens ou do conteúdo limita-se somente a incorporar esse conhecimento e utiliza-locomo seu sem responder diretamente ao emissor. O autor francês Pierre Bourdieu (1997)
também aborda a questão do emissor de maneira semelhante. Para ele os jornalistas têm
“óculos” especiais a partir dos quais veem certas coisas e não outras e que operam uma
seleção e uma construção do que é selecionado. “O principio de seleção é a busca do
sensacional, do espetacular. A televisão convida à dramatização, no duplo sentido: põe em
cena, em imagens, um acontecimento e exagera-lhe a importância, a gravidade, e o caráter
dramático, trágico.” (BOURDIEU, Pierre. 1997, p.25). Uma das maiores críticas implícitas naHQ é ao mostrar Bruce Wayne zapeando a sua televisão e só encontrando exploração à
violência das ruas e o crime cotidiano.
O professor e teórico Mauro Wolf colabora novamente com outro pensamento. Para
ele os “(...) estudos sobre a produção de notícias relacionam a imagem da realidade social,
fornecida pelos mass media, com a organização e a produção rotineira dos aparelhos
jornalísticos” (WOLF, 2003 p.182), ou seja, a opinião e a visão sobre a realidade social de um
indivíduo com função apenas de receptor é construída e possivelmente moldada através das
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mensagens e informações disponibilizadas pelo olhar ou pelos “óculos” dos mass media, a
imprensa.
As histórias contadas pela imprensa são uma visão sobre o mundo em que vivemos. E
toda a história precisa de personagens. Segundo Scott McCloud (apud GURGEL;
PADOVANI, 2006), seja em que mídia for os criadores sabem que os personagens são um
elemento fundamental para garantir o envolvimento do público. No jornalismo não é
diferente.
O personagem é quem participa da história e muitas vezes, quem conta o ato. Segundo
Vilas Boas (2002, p.125), o personagem no jornalismo "refere-se ao que é esperado de um
sujeito e a maneira como ele acredita que sua imagem deve aparecer publicamente", afinal é
ele quem constrói essa imagem (apesar de passar pelo olhar e avaliação do jornalista, editor e
todos envolvidos em divulgar a notícia) a partir do seu depoimento e postura. Na maioria das
vezes esse personagem é anônimo, desconhecido, cuja visibilidade na mídia será única e
exclusivamente a partir daquela participação em uma reportagem e sua construção será
completamente baseada no seu depoimento ou importância para a história. Mas e quando o
personagem é uma figura conhecida, pública? Para Casadei (2010) é aí que se encontra o
problema da construção de personagens no jornalismo, pois esse personagem já apresenta
uma série de características e expectativas e será apresentado da maneira mais conveniente para a imprensa.
Assim, mesmo quando se trata de personalidades públicas, o modo de se contar suavida pode ser bastante diferente a partir do tipo de urdidura de enredo que areportagem coloca. Assim, uma personagem como Sarney pode ser descrita tantocomo “ex- presidente da República” quanto como “apoiador do regime militar”, semque nenhuma destas duas informações seja falsa ou necessária em umareportagem. Escolher uma ou outra (ou as duas) depende quase sempre do tipo deestória que se conta (da problemática da urdidura de enredo) e do tipo de discursoque se quer respaldar. (CASADEI. 2010, p.87)
Essa não é necessariamente uma maneira de manipular a informação e sim de usar ela
da maneira mais proveitosa para o jornalista, mas que pode passar uma visão distorcida do
personagem ao público.
Esse personagem chega aos olhos da mídia por alguma razão. E aos olhos da massa
somente após a pré-seleção do jornalista. Essa escolha sobre o que é importante ou não, é
explicado a partir do conceito de gatekeeper . A premissa se assemelha a usada por Bourdieu
(1997) quando se refere aos filtros usados pelos jornalistas para selecionar informações. Wolf
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(2003) diz que essas escolhas de conteúdo são como zonas de filtros controladas por sistemas
objetivos de regras ou por gatekeepers. Nesse último caso, há um indivíduo, ou um grupo que
tem o poder de decidir se deixa passar a informação ou se a bloqueia. Se deixa tal personagem
fazer parte da história ou não.
Outro conceito semelhante é o newsmaking . Wolf (2003) cita duas perguntas feitas por
Golding e Elliott que ajudam a melhor exemplificar o conceito. Que imagem os noticiários
televisivos fornecem do mundo e como se associa essa imagem às exigências quotidianas da
produção de noticias? Segundo ele essa abordagem se articula em dois limites, a cultura
profissional do jornalista e a organização do trabalho e do processo produtivo. Cabe ao
jornalista e as empresas jornalísticas selecionarem o que acontece no cotidiano, no dia-a-dia
que é capaz de virar notícia. “A seleção implica, pelo menos, o reconhecimento de que um
acontecimento é um acontecimento, e não uma casual sucessão de coisas cuja forma e cujo
tipo se subtraem ao registro.” (WOLF, 2003, p.188), ou pelo exemplo dado em todas as
faculdades de jornalismo, notícia é quando o dono morde o cachorro.
Se por um lado, há uma abundancia de fatos e histórias acontecendo e cabe ao
jornalista filtrar o que é, e o que não é notícia, por outro lado existem restrições nas
organizações de trabalho que acabam por criar convenções e determinações de o que pode e o
que não pode ser noticiado. Essas restrições estabelecem critérios de relevância que definem anoticiabilidade de um acontecimento. Porém, os critérios acabam por vezes fragmentando um
fato e transformando apenas uma parte em notícia, descontextualizando a informação sem
mostrar os acontecimentos que levaram o fato a virar notícia.
As pesquisas sobre o conteúdo dos telejornais revelam como eles (mas não apenaseles) se diferenciam pela fragmentação da imagem da sociedade, mediante a [...]
justaposição de acontecimentos-notícias cada um dos quais é apresentado comoauto-suficiente, não explicado nenhum outro acontecimento-noticia. (ROSITI apud
WOLF, 2003, p.192)
Já a teoria e o fenômeno do agendamento de notícias estudado por Maxwell McCombs
na década de 70 também se aplica bastante ao caso estudado. Como cita o autor Antonio
Hohlfeldt (1997, p.44) “dependendo dos assuntos que venham a ser abordados – agendados –
pela mídia, o público termina, a médio e longo prazos, por incluí-los igualmente em suas
preocupações.”, fazendo com que as pessoas acabem sendo suscetíveis ao que a mídia julga
importante e da maneira em que ela julga importante.
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Hohlfeldt (1997) ainda cita um acompanhamento feito por McCombs sobre a
campanha eleitoral nos EUA que comprovou como a mídia agendou o tema na opinião
pública e também nos sujeitos envolvidos diretamente com o tema. Segundo ele:
Verificou-se, então, que a mídia, de fato, havia provocado um forte impacto einfluenciado significativamente o eleitor. A novidade, contudo, é que, mais do queinfluenciar o eleitor (em princípio, o receptor que estava sendo pesquisado),verificou-se que a mídia terminara por influenciar também os próprios candidatos,fazendo com que muitos deles incluíssem em suas agendas temas que, inicialmente,não constavam das mesmas, mas que, ou por terem sido abordados por seusconcorrentes, ou porque foram agendados pela mídia, terminaram por serconsiderados pelas agendas dos candidatos. (HOHLFELDT 1997, P.46)
Portanto, além do público simplesmente receptor da mensagem, os personagens
também podem ser afetados pela mídia como no caso das eleições americanas da década de
70, onde os candidatos incorporaram assuntos ditados pela mídia como importantes em suas
campanhas. Pessoas se transformam em personagens à medida que ganham importância para
a história, caso contrário, permanecem como figurantes do ato ou consumidores da história.
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Analisar uma HQ envolve diversos tipos de interpretação. Além da
compreensão do texto e a percepção da ilustração, existem elementos não implícitos, mas que
contribuem para ter mais um ponto de vista sobre a obra. O traço característico de um artista
específico, as cores utilizadas pelo colorista ou não utilização delas, e também o
conhecimento do contexto histórico em que a obra se insere. No caso do Batman, são mais de
70 anos de histórias e uma galeria enorme de escritores, roteiristas e ilustradores ao longo
desse tempo. As HQs, que também são chamadas de artes-sequenciais, funcionam como
frames congelados de um filme, cujas transições e “animações” fazem parte da imaginação do
leitor, o que também permite uma enorme gama de possibilidades para a interpretação dentro
da história. Dentre as possíveis maneiras de reunir esses elementos, a metodologia escolhida
foi a análise qualitativa através da semiótica.
A semiótica poderia ser definida de maneira simplificada como o estudo da
linguagem e suas interpretações. Porém, somente o significado de linguagem já exige um
maior aprofundamento. Para a autora do livro “O que é Semiótica?”, Lucia Santaella (1983),
Quando dizemos linguagem, queremos nos referir a uma gamaincrivelmente intrincada de formas sociais de comunicação e de significação queinclui a linguagem verbal articulada, mas absorve também, inclusive, a linguagem
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dos surdos-mudos, o sistema codificado da moda, da culinária e tantos outros.Enfim: todos os sistemas de produção de sentido aos quais o desenvolvimento dosmeios de reprodução de linguagem propiciam hoje uma enorme difusão.(SANTAELLA, 1983, p.11)
É um conceito bem amplo. Amplo no sentido de que envolve praticamente qualquer
área de desejo da pesquisa, pois tudo é feito através da linguagem, seja ela específica e única
da área estudada ou universal. Santaella (1983) considerava ainda na década de 80 a semiótica
como uma ciência que estava nascendo e em processo de crescimento com um território ainda
não sedimentado, em progresso. A semiótica tem por objetivo “o exame dos modos de
constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e de
sentido.” (SANTAELLA, 1983, p.13). Para não confundir a utilização do termo linguagem
com língua, usasse a nominação signo como forma de referir-se ao objeto de estudo da
semiótica. Portanto, o estudo dos signos nada mais é do que a análise da produção de
significado de um objeto linguístico.
Para a autora, a origem dessa ciência é divida pelo mundo em estudos semelhantes
feitos praticamente no mesmo período, durante o final do século XIX, nos Estados Unidos, na
União Soviética e também na Europa Ocidental. O modelo que ficou mais conhecido e
também foi adotado por Lucia Santaella para contar as origens da semiótica, foi do cientista,
lógico e filósofo norte americano Charles S. Peirce. De acordo com a autora, uma das
principais contribuições de Peirce mostra qualquer produção, realização e expressão humana
como sendo uma questão semiótica, apesar de isso não significar que ela tenha sido concebida
como uma ciência onipotente, ou toda suficiente. O cientista ainda dizia que os fenômenos da
linguística aparecem à consciência do ser humano de três modos ou camadas. A primeiridade,
secundidade e terceiridade.
Primeiridade refere-se à camada mais rasa da consciência, imediata e espontânea.
Santaella (1983) refere-se a essa primeira camada como “qualidade de sentimento e, por isso
mesmo, é primeira, ou seja, a primeira apreensão das coisas, que para nós aparecem.”
(SANTAELLA, 1983, p.46), e que serve como incentivo e gancho para a secundidade. O
sentimento registrado na primeira camada necessita de uma experiência em seu caráter
factual, da existência da matéria e é essa a definição de secundidade.
Certamente, onde quer que haja um fenômeno, há uma qualidade, isto é,sua primeiridade. Mas a qualidade é apenas uma parte do fenômeno, visto que, para
existir, a qualidade tem de estar encarnada numa matéria. A factualidade do existir(secundidade) está nessa corporificação material. (SANTAELLA, 1983, p.47)
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Terceiridade então realiza a união entre o primeiro e o segundo nível em um
pensamento de significações, interpretações dos signos vistos. Santaella (1998) diz que a ideia
mais simples dessa camada de pensamento é a de um signo ou representação que “diz respeito
ao modo, o mais proeminente, com que nós, seres simbólicos, estamos postos no mundo.”
(SANTAELLA, 1983, p.51).
Dentro da semiótica o modelo de análise escolhido foi o modelo proposto pelo
italiano Umberto Eco, chamado Leitor-Modelo. Foi em Lector in Fabula , obra escrita em
1979 onde Umberto Eco acrescenta uma sedimentação teórica ao tema e onde esse modelo de
leitor deixou de ser apenas um tópico de discussão entre intelectuais e se tornou um objeto de
estudo e ensino. Cavalcanti (2008) no seu artigo “o leitor modelo de eco” explica que Eco
acreditava que a língua não se reduz a um código, que é necessário haver certa capacidade do
leitor de pôr em funcionamento certos pressupostos.
Quando o autor produz um texto, faz uma hipótese sobre como este serálido, que caminhos o leitor deve percorrer. Faz uma previsão de como será esseleitor. ECO o denomina leitor modelo. Ele deve se mover no nível da interpretaçãoda mesma forma que o autor o fez no nível generativo. (CAVALCANTI. 2008, p.2)
Uma importante ressalva que a autora também faz, é que não se espera que esse tipo
de leitor exista e sim que o texto seja trabalhado de maneira à construí-lo. Há diversasmaneiras de fazer isso, pela escolha da linguagem, a escolha do tipo de enciclopédia exigida
do leitor ou que deve trabalhar com ele. O importante também é que o leitor não se mantenha
preso no texto e se permita sair dele. Não desistir da leitura e sim realizar os chamados por
Eco “passeios inferenciais”. Para ele essas saídas devem ser orientadas pelo texto, enquanto o
leitor interpreta e atualiza a obra de maneira própria. Isso não quer dizer que o leitor
transforme o processo de leitura em uma investigação onde ele irá procurar por pistas,
passeios inferenciais e referências de enciclopédia. Cavalcanti (2008) diz ainda existir a
possibilidade do leitor fugir do texto e não obedecer às previsões feitas pelo autor. Descobrir
novas inferências, realizar diferentes análises e descobrir caminhos não pensados, não
navegados, mas que se sustentam no texto.
Ler é, portanto, na perspectiva de ECO, muito mais apreender o que otexto não diz, aquilo que sugere, implícita. Um leitor que tem acesso à gramática dalíngua, ao vocabulário, mas não a outros códigos, tem dificuldades em (re)fazer acaminhada interpretativa. (CAVALCANTI. 2008, p.3)
Para Eco, só se pode falar em leitura quando o leitor é capaz de preencher os espaços
em branco da obra, seja da forma prevista pelo autor ou também de maneira autorizada pelo
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próprio texto. É importante que o leitor faça hipóteses, crie suas teorias e teste elas de maneira
ilimitada ou enquanto o texto permitir. Toda essa construção é a busca necessária para atribuir
sentido à obra pelo leitor-modelo. Esse modelo é semelhante aos níveis de análise de Peirce e
apresenta três camadas de pensamento. A análise dicionário, enciclopédia e o leitor modelo. A
visão dicionário da obra remete a aquilo que ela é, a primeira impressão da obra. A camada
enciclopédia refere-se ao universo onde o leitor precisa estar inserido e que facilitará a
interpretação dos signos. “Na competência enciclopédica do leitor partilhada pela comunidade
na qual está inserido.” (CAVALCANTI. 2008, p.2). E por fim, Leitor-Modelo é a etapa onde
acontece os passeios inferenciais e as interpretações em cima da obra analisada a partir de
uma ou diversas enciclopédias de conhecimento.
3.2 TÉCNICAS DE COLETA E DE ANÁLISE DE DADOS
A análise será feita a partir da compreensão sobre o Leitor-Modelo de Eco, e foram
utilizadas as pesquisas bibliográficas, através de obras referentes ao objeto analisado e as
hipóteses levantadas, e também a pesquisa documental, como o recorte de quatro momentos
distintos da HQ Batman – O Cavaleiro das Trevas (1986). A versão da HQ utilizada foi a
Edição Definitiva lançada em 2011 que compila além da história original, uma continuação e
material exclusivo que foi utilizado apena como apoio, pois a análise se baseia na obraoriginal e no seu contexto. Das 203 páginas que compõe a história criada por Frank Miller em
1986, serão analisadas oito páginas referentes a esses quatro momentos.
4.ANÁLISE
Como já foi visto, o modelo de Eco divide a análise em três partes. Serão duas visões
gerais da obra, a dicionário utilizada para um entendimento da HQ como um todo e a
enciclopédia, que permitirá compreender melhor o universo de referências utilizado nashistórias do Batman. Já o leitor-modelo será aplicado ao conjunto de cenas analisadas,
individualmente e como um todo. Seguiremos uma sequência cronológica nas cenas
analisadas que, além de facilitar o entendimento da história, permite acompanhar a evolução
do posicionamento utilizado pela imprensa nas notícias que envolvem o Batman.
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Figura 05: Capa original de Batman – O Cavaleiro das trevas, 1986 e da edição
definitiva lançada pela Panini em 2011.
4.1 DICIONÁRIO
Batman – O Cavaleiro das Trevas, como citado antes, é uma obra que não está nalinha cronológica do personagem, acontecesse em um universo paralelo às histórias mensais
do Batman. A história foi encomendada para marcar o cinquentenário do homem morcego e
tentar retomar as boas vendas das revistas da DC Comics. Escrita e desenhada por Frank
Miller, arte-finalizada por Klaus Janson e com cores de Lynn Varley, a obra foi lançada em
1986 e dividida em quatro partes. A história mostra Bruce Wayne com 50 anos de idade, dez
após ter largado o posto de vigilante fora da lei de Gotham e agora sendo forçado a retomar
sua cruzada contra o crime de uma cidade em clima de guerra civil, onde as gangues seintitulam donas das ruas e não temem à polícia. Além do conflito urbano, Batman enfrenta
uma dualidade de visões passada sobre ele pela mídia onde alguns o apoiam e outras
recriminam seus feitos.
A HQ também mostra a rivalidade de ideais entre Bruce Wayne e o governo com o
seu ponto alto na batalha entre Batman e Super-Homem, cada um representando um dos lados
que de acordo com Ribas (2005) serve para “finalmente definir quem é o maior herói do
universo DC.” (RIBAS, 2005, p.104). A minissérie tem grande importância para a indústria
que ganhou novo fôlego após o sucesso imediato da obra e serviu para alavancar o gosto por
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quadrinhos de super-heróis em países como o Brasil, ao ganhar a primeira edição de luxo de
uma HQ importada. Já para os fãs, é uma história que nunca morre, pois até hoje existe
material sendo feito em cima da obra. Exemplo desse sucesso é a edição definitiva lançada
pela Panini em 2011, 25 anos após a primeira publicação e com material exclusivo como o
roteiro original, estudos de personagem e uma introdução escrita pelo próprio Frank Miller.
Outro exemplo é o longa de animação baseado na HQ que está sendo lançado diretamente em
DVD e Blu-ray pela DC dividido em duas partes. A primeira foi lançada em 2012 e a segunda
está prevista para o primeiro semestre de 2013.
4.2 ENCICLOPÉDIA
O universo que compõe as histórias do cavaleiro das trevas apesar de ser ficcional
possui referências ao cotidiano do mundo real. A primeira delas está na cidade do herói, a
fictícia Gotham. A cidade localizada em Nova Jersey é um retrato gótico de Manhattan e sua
metrópole Nova York. Segundo Ribas (2005, p.142), “(...) o nome da cidade surgiu na revista
Wow Comics 1, da Fawcet, no inverno de 1940. Até então o Cavaleiro das Trevas morava em
Nova York, que sempre teve o apelido de Gotham.”, além disso a cidade também é conhecida
pelos altos índices de criminalidade, cenário que era frequente na metrópole americana nos
anos 40 quando começaram as histórias do herói mascarado. Gotham possui seu diferencial justamente na proximidade com o real. Ao contrário de Metrópolis, Starlling City, Coast City,
e as outras cidades fictícias do universo DC, que funcionam somente no contexto dos super-
heróis dos quadrinhos, Gotham é uma cidade possível e com problemas reais. Entre os
principais problemas estão a violência, a desigualdade e até as catástrofes naturais como na
história “Terra de Ninguém”, onde um terremoto destruiu a cidade.
Miller (2011) em seu texto de abertura deixa claro que além de fazer uma história
sobre o Batman, aproveitou o espaço para criticar a imprensa e o sensacionalismo que ele vianas coberturas televisivas. Para realizar a crítica, utilizou as coberturas dos jornais de assuntos
que retratavam a criminalidade cotidiana e sua ideia de como Batman poderia fazer parte
dessas coberturas e de que maneira seria retratado. O autor, apesar de saber a história seria
considerada um futuro alternativo para o personagem, sem fazer parte da cronologia mensal
oficial, fez uso do contexto histórico do personagem como os vilões, sua origem e até
problemas enfrentados fora das histórias em quadrinhos. Exemplo desse contexto são as
acusações do psiquiatra alemão Fredric Whertam no livro “A Sedução do Inocente”, que
foram incorporadas a um personagem da HQ, o psicólogo Bartholomew Wolper. O psicólogo
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1ª Cena – Um retrato do mundo
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2ª Cena – Quem é o vigilante mascarado
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3ª Cena – Os atos do Batman
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4ª Cena - A Culpa é do Batman
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4.4 LEITOR MODELO
A primeira cena escolhida acontece logo no primeiro capítulo da graphic novel e
mostra Bruce Wayne zapeando pela televisão em sua mansão. Bruce se lembra, após passar
por um canal transmitindo o filme Zorro, do dia da morte de seus pais. Por todas as emissoras
que passa somente enxerga a criminalidade retratada nos boletins jornalísticos e um relato
sobre a previsão do tempo. Se o jornalismo é uma forma de retratar o mundo em que vivemos,
Gotham está tomada pela violência e essa é a notícia mais importante já que está em todos os
telejornais. Essa é a primeira visão crítica de Frank Miller sobre a mídia e a imprensa. As
linguagens da violência externadas na mídia têm sido estudadas pela antropologia, e Rondelli
(2000, p.147) traz a seguinte contribuição: “Tais imagens apontam para aquilo que
caracteriza, sobretudo, a existência social neste país: a desigualdade brutal, estrutural, tão
atávica que passa a ser, de certa maneira, naturalizada.”.
A autora se refere ao Brasil, mas o cenário de violência se encaixa facilmente ao
retratado na história no contexto da época. No universo das histórias de Batman existe um
grande abismo entre Wayne com sua milionária conta bancária e o resto da população que
vive às margens da pobreza onde a criminalidade acaba sendo tratada como um fenômeno
natural. Como visto antes no capitulo “O Batjornalismo e a Mídia”, a autora Elizabeth
Rondelli também vê a violência pautada diariamente como maneira de agendar discursos e pautar discussões de outras figuras sociais (o telespectador), como uma maneira de fazer com
o que a população se de conta do problema social. Bruce Wayne, como “receptor” do
conteúdo que retrata a violência e criminalidade reproduzida pela mídia, é afetado diretamente
e responde ao estimulo retomando seu manto de cavaleiro das trevas no combate ao crime.
Outra crítica que parece implícita e que se relaciona a este atavismo exposto por
Rondelli (2000) é a é a justaposição de assuntos. Há um grande abismo entre um tema e outro:
a violência junto com o uso da previsão do tempo.Batman ainda não apareceu nos telejornais até essa parte do quadrinho, a única
menção ao homem morcego ocorre nas primeiras páginas da HQ anunciando que naquele dia
se comemoraria “o décimo aniversário da última vez que Batman foi avistado.” Não temos
uma posição da mídia sobre o personagem, mas pode-se começar a construir um perfil sobre a
imprensa de Gotham, onde a violência é considerada natural e apesar disso, ganha destaque
em toda a grade de programação.
Na segunda cena, Batman aparece pela primeira vez nos noticiários sendo descrito
pelos seus atos. Para alguém que possivelmente não conhecesse o homem morcego, a
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primeira impressão que os jornais passam é de uma criatura com “aspecto de morcego”,
semelhante ao “Drácula” e que combate o “submundo de Gotham”. Novamente a
criminalidade tem lugar de destaque nos telejornais. O primeiro jornalista a retratar a volta do
morcego interrompe o seu informe sobre “os avanços nas técnicas de implante de cabelo”
para dar a noticia.
Batman começa a ser construído como um personagem necessário para o
envolvimento do público na história (nas notícias e não da HQ em si) como já foi visto
anteriormente. O homem morcego é um justiceiro que combate o crime com as próprias mãos
e sem se importar com o pensamento da polícia ou dos grupos que fazem a defesa dos direitos
humanos. Batman é um reflexo da indignação da população de Gotham que gostaria de
combater a criminalidade de igual para igual, sem a intimidação imposta pelas gangues à
polícia e aos cidadãos. Nesse contexto, temos a construção de um herói para o público, mas
criminoso para a polícia. Uma linha sombria para ser retratada na mídia, pois qualquer
terminologia, herói ou criminoso, está correta. Só depende da maneira como será empregada e
o impacto que se quer causar como exemplificado por Eliza Casadei anteriormente.
A terceira cena serve como reforço para essa posição midiática sobre o homem
morcego e ao agendamento noticioso agregado a ele e à violência. Tanto o porta voz do
presidente da república quanto o psicólogo que aparecem no programa televisivo, acreditamque Batman seja uma invenção da mídia. Não que ele não exista, mas que a discussão e a
valorização do “fenômeno” Batman só existe, pois a imprensa o traz à tona. A opinião das
duas primeiras pessoas que aparecem na cena é igual ao discurso apresentado pelos
especialistas na sequencia, uma maneira de mostrar que as pessoas são influenciadas pela
mídia para criar suas percepções da realidade e dos personagens. Muito semelhante a este
entendimento é o pensamento de Wolf (2003) de que a opinião pública se regula através da
opinião reproduzida pelos mass media. Já o último quadro da cena, mostra uma intervençãocaracterística e até estereotipada do jornalista em debates, principalmente os de temas
políticos, com a afirmação “Você não respondeu exatamente a minha pergunta.”, que
funciona como uma sátira e crítica à maneira de conseguir informações da mídia.
Na quarta cena, temos a ocasião mais próxima a um acontecimento real recente e
retratado de forma muito semelhante pela imprensa. Essa cena é fechada, começa e termina na
mesma página e não tem relação direta com o andamento da história, é apenas uma crítica às
associações feitas pela mídia. A cena começa com Arnold Crimp, um sujeito com distúrbios
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mentais que mata quatro pessoas em um cinema pornô sem motivo aparente, porém o fato é
noticiado como um “atentado a bala inspirado no Batman”.
A semelhança do trecho com a realidade é maior do que uma simples crítica e é
atemporal. Em julho de 20124 estreava nos cinemas o último filme da trilogia Batman de
Christopher Nolan, “Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge”. Durante uma sessão de
estreia nos Estados Unidos, um homem matou 12 pessoas e feriu outras 59 dentro da sala de
cinema sem motivos aparente, fato muito semelhante ao retratado na HQ. Logo que a notícia
se espalhou, muitas pessoas começaram a discutir a influência de Batman na ocasião, alguns
dizendo que o atirador havia se vestido como o vilão das HQs Coringa para realizar o
massacre e a mídia acabou fazendo uso dessas opiniões para dar a notícia. A crítica de Frank
Miller, na época, foi justamente à atribuição de acontecimentos isolados a alguém que estava
sempre presente na mídia, como o caso do Batman, criando o sensacionalismo. Essa distorção
dos fatos também pode ser vista como uma maneira de manter o assunto em pauta e “trazer
mais lenha à fogueira”. Batman não teve nenhuma influência em ambos os casos, foi acusado
de responsável pela mídia na HQ e no caso americano acabou tendo a imagem manchada
durante um tempo. Na HQ toda a construção, até então parcial, em cima do homem morcego
tratado tanto como “doença social” pelo psicólogo e como “herói” por algumas pessoas e por
Lana Lane, editora do Planeta Diário é desconsiderada por um jornalista. Uma “análise
dicionário” realizada por um possível espectador em cima da notícia e que não conheça o
Batman, certamente levaria a crer que Batman é um assassino, já que outros cometem crimes
inspirados nele.
A análise dos quatro momentos consegue fazer um balanço entre a imagem do
Batman onde em alguns trechos é tratado como herói e outros como alguém que inspira a
criminalidade pela mídia, porém a influência no pensamento do público pela mídia é notável.
Não temos como saber de fato qual a posição do público entrevistado pela mídia na HQ emrelação ao Batman e a criminalidade pautada pela imprensa, mas podemos dizer que a mídia
representada na HQ assemelha-se ao que hoje vemos nas editorias de policia na TV. Com
uma espetacularização da violência capaz de criar programas televisivos só para exibir a
criminalidade e tomar conta de toda a grade de programação. Os noticiários começaram a
4 Exemplo de matéria sobre o caso do atirador que matou as 12 pessoas dentro da sala de cinema na
estreia do filme “Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge” com suposta influência do personagem Coringa no
caso foi feita pelo portal IG com o título “‘Sou o coringa’, teria di