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80 v5 DE MARÇO DE 2009 COMPORTAMENTO SOCIEDADE C omeça por ser um sonhar acordado que se insinua à medida que os dias avançam, um atrás do outro, sem cor nem sentido. Aos poucos, a paciên- cia dilui-se e abre caminho à revol- ta, tornando cada vez mais inúteis os esforços para segurar as pontas. Atingido este nível, o refrão da can- ção de António Variações sintetiza tudo: Se tu não vives satisfeito/ estás sempre a tempo de mudar/ não deves viver contrafeito/ muda de vida, se há vida em ti a latejar. Quando o matemático americano Richard Bandler in- ventou, juntamente com o linguista John Grinder, um modelo de treino mental – Programação Neuro-Linguís- tica (PNL) – não podia prever que um adepto seu elevaria o modelo à escala planetária. Com a obra Mude a Sua Vida em Sete Dias (Lua de Papel, €14), o milionário britânico Paul McKenna, 45 anos, está a dar que falar entre as es- trelas do desporto e do showbiz. Actualmente a viver em Los Angeles, nos Estados Unidos, este filho mais velho de um construtor civil e de uma professora de Economia era conhecido por detestar a escola, ser bastante persuasivo e ter uma determinação invulgar. Aos 12 anos, aventurou-se nas lides de DJ e vingou no meio radiofónico. Aos 20, dizia que ia ser rico até aos trinta. E foi, com um senão: «Tinha sucesso mas não era feliz, só desejava ser outra pessoa.. Após uma incursão nos trilhos da hipnose e da PNL, fez furor com o programa televisivo The Hypnotic World of Paul McKenna. Vieram, então, os seminários, os livros, os fãs (Ellen Denegeres, David Bowie, David Beckham, entre outros), as entrevistas e as demonstrações das técnicas, ao vivo, que proliferam no YouTube. Em Portugal, o seu livro saltou directamente para o top das vendas, já vai em três edições e vendeu cerca de 23 mil exemplares. Escritor motivacional com fama mundial, Paul é um defensor do lema «tome decisões, porque se não o fizer alguém o fará por si». No seu entender, mudar de vida impli- ca focar-se nos valores pessoais e reprogramar o mind-set , ou seja, os padrões de linguagem que usamos mentalmente, quando falamos com os nossos botões. E para que não restem dúvidas de que o aviso foi feito, especifica: «O que você for da- qui a uns anos é o resultado do que está a fazer agora; isto é claro para a maioria e, se não é, passa a ser, quando se concentram nisso.» Não se trata de pensamento mágico, antes de visão e acção focada. E usar com critério, aqui-e-agora, o poder das palavras – pensadas e ditas – como um hábito de higiene íntima. Conscientemente ou de forma ins- tintiva, há quem ouse sair da caixa e, em sede própria, assuma o papel de realizador e reescreva, por comple- to, o guião do seu filme. «A única chave que existe está na fechadura», diz Cláu- dia, enquanto bate a porta e se prepara para atravessar o terreno que liga a sua casa ao monte de turismo rural, no concelho de Odemira. Mas há outros motivos que fazem a ex-psicóloga Cláudia Coimbra, 38 anos, orgulhar-se de ter deixado Lisboa, aos 27 anos, escolhendo o Alentejo para residência. «Não há dia sem um raio de sol, os miú- dos andam por aí à vontade, vivo descansada.» A sua his- tória é feita de coincidências. Imagine-se um cenário de filme, literalmente – foi ali perto que decorreu a rodagem de A Casa dos Espíritos, baseado na obra de Isabel Allende, que conta a vida de Estebán Trueba, numa terra chamada Tresmarias. Foi a paixão por um suíço com um apelido parecido, Balthasar Trueb, dez anos mais velho, que a fez mudar de vida: viram-se quatro vezes e juntaram-se. «Quando estamos apaixonados, fazemos coisas assim.» Instalaram-se em Vila Nova de Milfontes: ela começou por trabalhar numa pizzaria, ele empregou-se numa imo- biliária. Seguiram-se dois golpes de sorte: encontraram um terreno no Parque Natural do Sudoeste Alentejano com autorização para construir e conseguiram vender a casa de Milfontes. Montaram um restaurante, num monte. «Estava sempre cheio.» Muitas vezes, era preciso Mudar de vida Trocaram carreiras na banca e na publicidade para seguirem convicções religiosas ou terem mais tempo para si. Como ensina Paul McKeena, autor no top de vendas nacional, tomaram decisões antes que alguém o fizesse por eles POR CLARA SOARES* É no meio da vida que se repensa a forma de viver: como ter mais tempo livre, menos ansiedade e mais qualidade no relacionamento com os outros’ Isabel Freire de Andrade, Psicóloga e coach de empresários FOTOS: MARCOS BORGA

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que se repensa a forma de viver: como ter mais tempo livre, menos ansiedade e mais qualidade no relacionamento com os outros’ Trocaram carreiras na banca e na publicidade para seguirem convicções religiosas ou terem mais tempo para si. Como ensina Paul McKeena, autor no top de vendas nacional, tomaram decisões antes que alguém o fizesse por eles SOCIEDADE 80 v 5 DE MARÇO DE 2009 Psicóloga e coach de empresários Isabel Freire de Andrade, POR CLARA SOARES* FOTOS: MARCOS BORGA

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80 v 5 DE MARÇO DE 2009

COMPORTAMENTO SOCIEDADE

Começa por ser um sonhar acordado que se insinua à medida que os dias avançam, um atrás do outro, sem cor nem sentido. Aos poucos, a paciên-cia dilui-se e abre caminho à revol-ta, tornando cada vez mais inúteis os esforços para segurar as pontas. Atingido este nível, o refrão da can-

ção de António Variações sintetiza tudo: Se tu não vives satisfeito/ estás sempre a tempo de mudar/ não deves viver contrafeito/ muda de vida, se há vida em ti a latejar.

Quando o matemático americano Richard Bandler in-ventou, juntamente com o linguista John Grinder, um modelo de treino mental – Programação Neuro-Linguís-tica (PNL) – não podia prever que um adepto seu elevaria o modelo à escala planetária. Com a obra Mude a Sua Vida em Sete Dias (Lua de Papel, €14), o milionário britânico Paul McKenna, 45 anos, está a dar que falar entre as es-trelas do desporto e do showbiz. Actualmente a viver em Los Angeles, nos Estados Unidos, este filho mais velho de um construtor civil e de uma professora de Economia era conhecido por detestar a escola, ser bastante persuasivo e ter uma determinação invulgar. Aos 12 anos, aventurou-se nas lides de DJ e vingou no meio radiofónico. Aos 20, dizia que ia ser rico até aos trinta. E foi, com um senão: «Tinha sucesso mas não era feliz, só desejava ser outra pessoa.. Após uma incursão nos trilhos da hipnose e da PNL, fez furor com o programa televisivo The Hypnotic World of Paul McKenna. Vieram, então, os seminários, os livros, os fãs (Ellen Denegeres, David Bowie, David Beckham, entre outros), as entrevistas e as demonstrações das técnicas, ao vivo, que proliferam no YouTube. Em Portugal, o seu livro saltou directamente para o top das vendas, já vai em três edições e vendeu cerca de 23 mil exemplares.

Escritor motivacional com fama mundial, Paul é um defensor do lema «tome decisões, porque se não o fizer alguém o fará por si». No seu entender, mudar de vida impli-ca focar-se nos valores pessoais e reprogramar o mind-set, ou seja, os padrões de linguagem que usamos mentalmente, quando falamos com os nossos botões. E para que não restem dúvidas de que o aviso foi feito, especifica: «O que você for da-qui a uns anos é o resultado do que

está a fazer agora; isto é claro para a maioria e, se não é, passa a ser, quando se concentram nisso.»

Não se trata de pensamento mágico, antes de visão e acção focada. E usar com critério, aqui-e-agora, o poder das palavras – pensadas e ditas – como um hábito de higiene íntima. Conscientemente ou de forma ins-tintiva, há quem ouse sair da caixa e, em sede própria, assuma o papel de realizador e reescreva, por comple-to, o guião do seu filme.

«A única chave que existe está na fechadura», diz Cláu-dia, enquanto bate a porta e se prepara para atravessar o terreno que liga a sua casa ao monte de turismo rural, no concelho de Odemira. Mas há outros motivos que fazem a ex-psicóloga Cláudia Coimbra, 38 anos, orgulhar-se de ter deixado Lisboa, aos 27 anos, escolhendo o Alentejo para residência. «Não há dia sem um raio de sol, os miú-dos andam por aí à vontade, vivo descansada.» A sua his-tória é feita de coincidências. Imagine-se um cenário de filme, literalmente – foi ali perto que decorreu a rodagem de A Casa dos Espíritos, baseado na obra de Isabel Allende, que conta a vida de Estebán Trueba, numa terra chamada Tresmarias. Foi a paixão por um suíço com um apelido parecido, Balthasar Trueb, dez anos mais velho, que a fez mudar de vida: viram-se quatro vezes e juntaram-se. «Quando estamos apaixonados, fazemos coisas assim.»

Instalaram-se em Vila Nova de Milfontes: ela começou por trabalhar numa pizzaria, ele empregou-se numa imo-biliária. Seguiram-se dois golpes de sorte: encontraram um terreno no Parque Natural do Sudoeste Alentejano com autorização para construir e conseguiram vender a casa de Milfontes. Montaram um restaurante, num monte. «Estava sempre cheio.» Muitas vezes, era preciso

Mudar de vidaTrocaram carreiras na banca e na publicidade para seguirem convicções religiosas ou terem mais tempo para si. Como ensina Paul McKeena, autor no top de vendas nacional, tomaram decisões antes que alguém o fizesse por eles POR CLARA SOARES*

‘É no meio da vida que se repensa a forma de viver: como ter mais tempo livre, menos ansiedade e mais qualidade no relacionamento com os outros’ Isabel Freire de Andrade, Psicóloga e coach de empresários FO

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