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8/20/2019 Musico de Orquestra Pratica Instrumental e Desconforto Corporal http://slidepdf.com/reader/full/musico-de-orquestra-pratica-instrumental-e-desconforto-corporal 1/7  A ATIVIDADE DO MÚSICO DE ORQUESTRA:  PRÁTICA INSTRUMENTAL E DESCONFORTO CORPORAL Clarissa Stefani Teixeira Departamento de Engenharia de Produção / Universidade Federal de Santa Catarina Bairro Trindade 88040-970 – Florianópolis, Santa Catarina Email: [email protected]  Eugenio Andrés Díaz Merino Departamento de Engenharia de Produção / Universidade Federal de Santa Catarina Bairro Trindade 88040-970 – Florianópolis, Santa Catarina Email: [email protected]  Luis Felipe Dias Lopes Departamento de Engenharia de Produção / Universidade Federal de Santa Maria Faixa de Camobi, km 9 97105-900 – Santa Maria, Rio Grande do Sul  Email: [email protected]  Palavras-chave: trabalho, músico, prática instrumental, desconforto. Este estudo objetivou verificar a o desconforto musculoesquelético nas diferentes regiões corporais de músicos de orquestra e as associações entre o tempo e freqüência da prática instrumental. 19 músicos de cordas, madeiras e metais foram avaliados. Por meio da correlação de Spearman foi identificada associação alta e significativa apenas entre a parte do meio das costas e o tempo total de orquestra, demonstrando que o tempo que se toca na orquestra pode ser agravante para os sintomas de desconforto. As queixas no pescoço, ombro e  braço esquerdo foram as mais relatadas pelos músicos. Keywords: work, musician, instrumental practice, discomfort. This study aimed to verify to the discomfort musculoskeletal in different corporal areas of orchestra musicians’ orchestra and the associations between the time and frequency of the instrumental practice. 19 musicians of strings, brass and woodwind are apprised. By means of the correlation of Spearman was identified high and significant association between the middle backs and the total time of orchestra, demonstrating that the time that is played in the orchestra can be aggravating for the discomfort symptoms. The complaints in neck, shoulder and left arm were the more told by the musicians. 1. INTRODUÇÃO Durante a vida profissional, os músicos confrontam-se com demandas que podem conduzir ao adoecimento e mesmo à interrupção de suas carreiras. Especificamente nos músicos de orquestra, as demandas profissionais  podem estar relacionadas ao contexto produtivo em que o músico se encontra, tais como aspectos da organização do trabalho, das exigências de  produtividade e de cognição (disciplina, memorização, concentração, raciocínio, percepção criatividade, rápidas tomadas de decisões, musicalidade, além da expressão corporal), aos exercícios psicomotores complexos e à discriminação auditiva apurada (PETRUS, 2005; COSTA e ABRAHÃO, 2002). Para Araújo e Cárdia (2005) a execução de um instrumento musical exige do músico um grande esforço físico e mental e estas questões também podem estar relacionadas aos adoecimentos. De forma geral,  para Meija (1977), existe uma forte demanda em se adaptar o instrumento às possibilidades de movimento do homem, mas não o inverso, pois o instrumento de trabalho foi construído para o homem e não o homem  para o instrumento. Para Frank e Mühlen (2007) a  postura em relação ao instrumento é assimétrica e não ergonômica. Estas e outras questões fazem com que alguns autores cheguem à conclusão de que os músicos constituem um dos principais grupos de risco de adoecimento ocupacional (COSTA, 2005). Mesmo que exista a chamada escassez de informação em função da atividade desenvolvida pelos músicos não ser considerada como uma profissão, há necessidade de

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 A ATIVIDADE DO MÚSICO DE ORQUESTRA: PRÁTICA INSTRUMENTAL E DESCONFORTO CORPORAL 

Clarissa Stefani TeixeiraDepartamento de Engenharia de Produção / Universidade Federal de Santa Catarina 

Bairro Trindade88040-970 – Florianópolis, Santa Catarina 

Email: [email protected] 

Eugenio Andrés Díaz MerinoDepartamento de Engenharia de Produção / Universidade Federal de Santa Catarina 

Bairro Trindade88040-970 – Florianópolis, Santa Catarina 

Email: [email protected]  

Luis Felipe Dias LopesDepartamento de Engenharia de Produção / Universidade Federal de Santa Maria

Faixa de Camobi, km 997105-900 – Santa Maria, Rio Grande do Sul 

Email: [email protected]  

Palavras-chave: trabalho, músico, prática instrumental, desconforto.

Este estudo objetivou verificar a o desconforto musculoesquelético nas diferentes regiões corporais de músicosde orquestra e as associações entre o tempo e freqüência da prática instrumental. 19 músicos de cordas,madeiras e metais foram avaliados. Por meio da correlação de Spearman foi identificada associação alta esignificativa apenas entre a parte do meio das costas e o tempo total de orquestra, demonstrando que o tempoque se toca na orquestra pode ser agravante para os sintomas de desconforto. As queixas no pescoço, ombro e

 braço esquerdo foram as mais relatadas pelos músicos.

Keywords: work, musician, instrumental practice, discomfort.

This study aimed to verify to the discomfort musculoskeletal in different corporal areas of orchestra musicians’

orchestra and the associations between the time and frequency of the instrumental practice. 19 musicians of

strings, brass and woodwind are apprised. By means of the correlation of Spearman was identified high and

significant association between the middle backs and the total time of orchestra, demonstrating that the timethat is played in the orchestra can be aggravating for the discomfort symptoms. The complaints in neck,

shoulder and left arm were the more told by the musicians.

1. INTRODUÇÃO

Durante a vida profissional, os músicos confrontam-secom demandas que podem conduzir ao adoecimento emesmo à interrupção de suas carreiras. Especificamentenos músicos de orquestra, as demandas profissionais podem estar relacionadas ao contexto produtivo em queo músico se encontra, tais como aspectos da

organização do trabalho, das exigências de produtividade e de cognição (disciplina, memorização,concentração, raciocínio, percepção criatividade,rápidas tomadas de decisões, musicalidade, além daexpressão corporal), aos exercícios psicomotorescomplexos e à discriminação auditiva apurada(PETRUS, 2005; COSTA e ABRAHÃO, 2002).

Para Araújo e Cárdia (2005) a execução de uminstrumento musical exige do músico um grandeesforço físico e mental e estas questões também podemestar relacionadas aos adoecimentos. De forma geral, para Meija (1977), existe uma forte demanda em seadaptar o instrumento às possibilidades de movimentodo homem, mas não o inverso, pois o instrumento detrabalho foi construído para o homem e não o homem para o instrumento. Para Frank e Mühlen (2007) a

 postura em relação ao instrumento é assimétrica e nãoergonômica. Estas e outras questões fazem com quealguns autores cheguem à conclusão de que os músicosconstituem um dos principais grupos de risco deadoecimento ocupacional (COSTA, 2005).

Mesmo que exista a chamada escassez de informaçãoem função da atividade desenvolvida pelos músicos nãoser considerada como uma profissão, há necessidade de

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maiores investigações para possibilitar estratégias preventivas e de controle (ZAZA, 1998; SIQUEIRA etal, 2006). O que ocorre na verdade é que a atividade detocar um instrumento, segundo Zazá (1998) écomparada ás atividades de trabalhadores industriais oude escritórios.

As problemáticas identificadas pelos estudos demaneira geral apontam para as atividades trabalhistasde músicos, como por exemplo, os problemasmusculoesqueléticos (com prevalência de 55% a 86%em músicos profissionais de orquestras) (FRANK eMÜHLEN, 2007), dor (37% a 63% de prevalência) edesconforto (TULCHINSKY e RIOLO, 1994;MOURA, FONTES e FUKUJIMA, 2000; TRELHA etal., 2004; GLATZ, POFFO e PRZSIEZNY, 2006;FRANK e MÜHLEN, 2007).

Para Lederman (2003) os riscos musculoesqueléticos podem gerar queda no desempenho funcional ecomprometer as horas trabalhadas. Diante destas premissas Glatz, Poffo e Przsiezny (2006) encontraramcorrelações fortes e significativas entre o tempo de profissão e o tempo de dor. Porém, falta ainda aidentificação das relações entre tempo de estudo diárioindividual, semanal e com a orquestra com as questõesde desconforto em músicos de orquestra. Logo, esteestudo objetivou identificar e relacionar osdesconfortos musculoesqueléticos que a prática musicalgera com o tempo dedicado às atividades práticas como instrumento musical.

2. METODOLOGIA

Este estudo caracteriza-se, segundo Thomas e Nelson(2002), como um estudo descritivo-exploratório, decorte transversal, no qual foi realizado umlevantamento de informações ainda pouco investigadasem uma determinada população.

O estudo foi realizado com músicos de uma orquestrada região sul do Brasil, caracterizada como sendo semi profissional e constituída por jovens instrumentistas.Esta orquestra é composta por 29 músicos sendo estes

trabalhadores dos seguintes instrumentos: cordas,sopros, metais e percursão. Como há indicação de predomínio e não de diferenças estatisticamentesignificativas de sintomas em músicos de cordas esopro (TRELHA et al., 2004), neste estudo foramselecionados aqueles que realizam práticas sistemáticase desenvolvem seu trabalho relacionado a instrumentosde cordas e madeiras e metais, chamados de sopros.

Do total de 29 músicos, 19 concordaram em participardo estudo e responderam ao questionário paraidentificação da dor nas partes do corpo (QD) adaptadodo instrumento desenvolvido por Corlett e Bishop(1976), que consiste de uma folha com um mapacorporal dividido em 27 partes. Este questionáriosugere cinco respostas possíveis ao desconfortocorporal, que neste estudo, foi relacionado às práticasinstrumentais dos músicos de orquestra: 1) semdesconforto, 2) desconforto leve e/ou esporádico, 3)desconforto moderado e/ou periódico, 4) desconfortoconsiderável e/ou freqüente e, 5) desconforto intensoe/ou contínuo. Para questões de análise optou-se emclassificar os músicos em com ou sem presença dedesconforto.

Além do questionário, para as relações com odesconforto musculoesquelético, foram investigadas, por meio de perguntas, as atividades profissionaisrelacionadas ao tempo de prática instrumentalindividual, tempo de prática com a orquestra efreqüência semanal em que realiza a práticainstrumental, para poder assim contemplar os objetivos propostos. A aplicação dos instrumentos foi realizadaem sessões individuais, nos locais de trabalho dosindivíduos, após autorização dos responsáveis pelaorquestra e com a concordância dos músicos, que foraminformados sobre os objetivos do estudo.

Para a análise dos dados foi realizada estatísticadescritiva por meio da média, desvio padrão e percentual das respostas. Foram realizadas correlações

entre as respostas ao questionário de desconforto e aotempo de prática individual, tempo de prática com aorquestra e freqüência semanal de prática com oinstrumento por meio do teste de correlação deSpearman (rho), com nível de significância de 5%.

Considerou-se, para efeito de análise, os critériosadotados por Malina (1996), os quais descrevemcorrelação baixa para um valor menor que 0,30,moderada para valores entre 0,30 e 0,60 e alta paravalores superiores a 0,60. Para as análises foi utilizadoo programa estatístico SPSS 11.5 for Windows.

3 RESULTADOS

A idade média dos músicos foi de 27,00 ± 12,05 anos.O tempo em que se toca o instrumento foi 8,37 ± 11,04anos; o tempo que se toca na orquestra foi 3,11 ± 2,16anos. Os músicos estudam em uma freqüência semanalde 5,47 ± 1,50 dias, sendo desenvolvidos estudosindividuais de 2,21 ± 1,69 horas por dia e 3,47 ± 0,70horas com a orquestra.

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As queixas musculoesqueléticas apresentadas por todosos músicos (19) estão ilustradas na Figura 1. Asmaiores porcentagens estão indicadas em vermelho,sendo estas as mais relatadas pelos músicos. As regiõessem porcentagens foram aquelas que não houveramqueixas.

Figura 1 – Porcentagem das queixasmusculoesqueléticas relatadas pelos músicos em

cada região corporal.

A Tabela 1 ilustra a porcentagem das queixasmusculoesqueléticas relatadas pelos músicos decordas e de sopros nas regiões corporais do ombro, braço, cotovelo, antebraço, punho e mão. A Tabela2 ilustra as queixas relatadas no pescoço.

InstrumentoRegião

do corpo

Desconforto (%)

Esquerdo Direito

Sim Não Sim Não

Cordas

Soprosombro

50,042,9

50,057,1

  25,014,3

75,085,7

CordasSopros

 braço 33,328,6

66,771,4

  16,714,3

83,385,7

Cordas

Soproscotovelo

8,314,3

91,785,7

  8,314,3

91,785,7

Cordas

Soprosantebraço

16,714,3

83,385,7

8,314,3

91,785,7

Cordas

Sopros punho

8,3

57,1

91,7

42,9

  16,7

42,9

83,3

57,1Cordas

Soprosmão

25,042,9

75,057,1

  25,028,6

75,071,4

Tabela 1 – Porcentagem de desconforto na regiãodo ombro, braço, cotovelo, antebraço, punho emão no hemicorpo esquerdo e direito dos músicosde corda e sopros.

InstrumentoRegião

do corpoDesconforto (%)

Sim Não

Cordas

Sopros pescoço

58,342,9

  41,751,1

Cordas costas 50,0 50,0

Sopros superior 14,3 85,7Cordas costas 25,0 75,0Sopros meio 14,3 85,7Cordas costas 25,0 75,0Sopros inferior 14,3 85,7

Tabela 2 – Porcentagem de desconforto na regiãodo pescoço, parte superior, meio e superior dascostas, dos músicos de cordas e sopros.

A análise de correlação feita não mostrou

associação entre a freqüência semanal de estudo ecom tempo de estudos individuais. As únicasassociações significativas encontradas foram como tempo de orquestra e queixas de desconfortos naregião das costas (região do meio e inferior) eantebraço. A Tabela 3 ilustra as correlaçõesencontradas.

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Região corporal dedesconforto

Spearmantempo deorquestra

costas R 0,637meio r* 0,003

costas R 0,493inferior r* 0,032

antebraço R 0,463direito r* 0,046

* probabilidade do teste para a correlação deSpearman. Valor menor que 0,05 indica diferençaestatisticamente significativa

Tabela 3 – Correlação entre as queixas dedesconforto e o tempo de prática instrumental coma orquestra.

De acordo com os critérios de Malina (1996) apenas aassociação entre o desconforto na região do meio dascostas e com o tempo de orquestra pode ser consideradaalta. Neste sentido, pode-se dizer que há uma tendênciaem se ter dor nas costas (região do meio) com oaumento do tempo na orquestra.

Discussão

Os músicos sejam profissionais, professores ouestudantes, representam um grupo ocupacional único,no qual os problemas neuromusculares relacionados aotocar parecem ser comuns (LEDERMAN, 2003).

Durante o trabalho desenvolvido pelos musicistas háexposição a fatores de risco, propiciando muitas vezeso aparecimento de lesões (TRELHA et al., 2004).Segundo Mazzoni et al. (2006) foi a partir de 1980 quehouve um rápido aumento do desenvolvimento daclínica dos músicos, organização da medicina artística esurgimento de pesquisas visando a prevalência,tratamento e aspectos ergonômicos dos instrumentosusados.

A falta de conhecimento e de acompanhamento domeio científico relacionado às questões de saúde dosmúsicos, aliado com as problemáticas do medo em se

 perder oportunidades de um mercado restrito e até de perder o emprego, se afastados, fazem com que hajanegligência em não se aceitar ou de se conviver com asdores e com o desconforto gerado com a prática doinstrumento.Para Campos et al. (2006) estas preocupações fazemcom que haja convívio com a dor, sem reclamar dodesconforto, criando a “cultura do silêncio”. Para Franke Mühlen (2007) é conhecida a atitude de musicistas

 profissionais de não procurar auxílio médico aosurgirem sinais de alerta, com receio de perda deespaço profissional e diminuição de ganho financeiro.Estas atitudes levam a agravamentos do quadro clínico,que começa com um simples desconforto e pode setransformar em doenças que levam a piora da saúde eao afastamento do emprego.

De acordo com as queixas apresentadas foi possívelobservar que muitos músicos relatam queixasmusculoesqueléticas na região do pescoço, ombro e braço esquerdo e parte superior das costas (Figura 1).Um pouco diferente dos resultados encontrados com osmúsicos da orquestra semi-profissional foi a avaliaçãorealizada por Lederman (2003), que avaliou 1353instrumentistas mostrando que 64,4% delesapresentaram disfunções musculoesqueléticas nasregiões das mãos, punhos e antebraço. Resultadosemelhante obteve Brandfonbrener (2003) que avaliou2394 músicos, entre os anos de 1985 e 2002, obtendoos locais de maior acometimento os braços, punhos emãos. Neste mesmo estudo foram encontradas problemas de queixas nos ombros, joelhos e tronco,dependendo do posicionamento do instrumento.

Entre 45 músicos da Orquestra Sinfônica daUniversidade Estadual de Londrina também foramestudadas a localização dos sintomasmusculoesqueléticos. Os resultados mostraram que asregiões anatômicas mais acometidas nos últimos dozemeses foram os ombros (48,9%), coluna cervical(46,7%), coluna dorsal (46,7%) e punhos e mãos

(33,3%) (TRELHA et al., 2004). Durante a observaçãoda atividade de violinistas, observaram-se sintomas dedesgaste físico na região das costas (região dorsal) edos braços (região do tríceps braquial) (PETRUS eECHTERNACHT, 2004).

As diferenças dos locais encontrados pelo presenteestudo podem estar principalmente pelo número dehoras semanais despendido para as práticasinstrumentais. No presente estudo, por se tratar demúsicos semi-profissionais, há menores exigências de práticas de estudos com a orquestra (3,47 ± 0,70 horas).Além disso, o número de apresentações também é

reduzido, pois enquanto músicos de orquestras profissionais realizam apresentações semanais, nestaorquestra há apresentações mensais, o que permite maistempo de estudo e ensaio em cada peça musical. Noestudo de Trelha et al. (2004) o tempo de trabalhosemanal foi de 32,85 ± 9,26 horas, o que apresentadiferença de dedicação ao instrumento quandocomparado aos músicos do presente estudo. Pode-sedizer também que o tempo dedicado de estudo

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 individual também é relativamente baixo (2,21 ± 1,69horas por dia), mesmo tendo freqüência semanal de5,47 ± 1,50 dias.

A única variável que mostrou ter com associação comas queixas de desconforto, na região do meio dascostas, foi o tempo total de práticas com a orquestra(Tabela 3). Porém, uma das reflexões que podem serrealizadas em função destas informações é que mesmocom práticas consideradas baixas há comprometimentomusculoesquelético, o que demonstra que o desconfortoencontrado nas partes do corpo deve ser melhorestudado para poder selecionar outras atitudes que possam estar associadas a estas queixas.

Para Blum e Ahlers (1995) e Norris (1997) as problemáticas ocorrem em função de fatores predisponentes ao adoecimento, como o tempoexcessivo de dedicação ao instrumento, falta decondicionamento físico, hábitos incorretos na prática doinstrumento (não realização de alongamentos eaquecimentos, as posturas adotadas), questões técnicasdo instrumento (realização de força excessiva), a trocado instrumento e seu tamanho, as condições ambientais(como quantidade insuficiente de iluminamento, atemperatura), as características do mobiliário (uso decadeiras que não contemplam as diferençasindividuais), as técnicas de compensação e condiçõescorporais dos músicos. Logo, muitas destascaracterísticas devem se melhor investigadas, uma vezque, poucas associações foram encontradas com relaçãoa freqüência de estudo e além disso, apenas a

correlação com a parte do meio das costas foiconsiderada alta.

 Na verdade parece que a dor musculoesquelética deveser relacionada ao instrumento, conforme indicações deBrandfonbrener (2003). Com a análise das queixas dosmúsicos de cordas e sopros, parece que, de maneirageral, os antebraços, punhos, mãos dos músicos desopro são mais acometidos que os músicos de sopros(Tabela 1). Em contrapartida, os ombros, os braços, pescoço e costas são mais acometidos pelos músicos decordas, podendo então ser investigadas as diferenças dodimensionamento dos instrumentos, forma e

 posicionamento adotados durante o tocar (Tabela 1 e2).

Para Brandfonbrener (2003) as dores, advindas das práticas instrumentais, em músicos de violino e viola, podem estar relacionadas ao suporte fornecido peloombro no lado esquerdo pelo queixo e mandíbula nolado direito. O que ocorre é o posicionamento doombro para cima e anteriormente, enquanto o pescoço é

rotado para a esquerda e a mandíbula pressionada para baixo. Estas questões podem ser observadas pelo presente estudo, uma vez que, as queixas apresentadas pelos músicos encontraram-se principalmente na região pescoço, ombro esquerdo e costas superior. Estesachados merecem maiores investigações, pois tambémestão relacionados com a técnica de execução quedetermina o suporte correto ao instrumento, onde, porexemplo, os instrumentos de cordas, não devem serseguros pelo membro esquerdo e sim apoiados peloombro e cabeça, utilizando-se de acessórios como aqueixeira e a espaleira.

 No caso dos violoncelistas e baixistas, muitas vezes, há presença de dores em função da forma como carregamseus instrumentos, pela alta repetição e atividade dosdedos e pela prática por longas horas. Em instrumentosde sopro, a dor está associada às necessidadesindividuais de suporte de cada instrumento. O polegardireito suporta a carga estática dos clarinetes e oboés,levando a uma freqüência de dor maior que no polegaresquerdo, além de problemas no braço. Já, em relação àflauta transversal, observa-se maior demanda na mãoesquerda e antebraço, com hiperextensão de punho, podendo predispor a problemas no braço e pulsoesquerdos. Segundo Norris (1993) o peso doinstrumento quando sustentado e suportado pela mão, pode ser uma fonte significativa de carga estática, particularmente nos músculos do ombro, sendo paraBrandfonbrener (2003) fator etiológico nas lesões dostrabalhadores.

O estudo de Andrade e Fonseca (2001) identificouquatro causas de dor, tensão e fadiga nosinstrumentistas, sendo elas: 1) inadequações posturais primárias, ou seja, má postura não necessariamenterelacionada à execução do instrumento; 2)inadequações posturais secundárias à execução doinstrumento, decorrentes da inadequação da relação dasdimensões dos acessórios do instrumento com osinstrumentistas e excesso de tensão durante a performance; 3) vícios técnicos de execução semgrandes repercussões posturais, mas causadoras detensão ou contração muscular excessiva comsobrecarga articular ou neuromuscular; e 4) doenças

orgânicas articulares e periarticulares. Somado a estesfatores, além das posturas incorretas, outros agravantesdurante a prática musical podem ser citados, como porexemplo, a força aplicada para manipular oinstrumento, a repetitividade exercida pelos membrossuperiores, a vibração (GLATZ, POFFO ePRZSIEZNY, 2006) e a contração muscular utilizada para a sustentação do instrumento para a prática ou

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utilização indevida de determinados grupamentosmusculares.

Mesmo que exista indicação de Siqueira et al. (2006)em ocorrências de distúrbios nos membros inferiores,em função do trabalho com o instrumento sersustentado, muitas vezes, pelos membros inferiores, no

 presente estudo não foram encontradas queixasmusculoesqueléticas na região inferior corporal.

4 CONCLUSÃO

De acordo com os resultados encontrados, foramobservadas queixas musculoesqueléticas na regiãodo pescoço, ombro e braço esquerdo e partesuperior das costas. Houve diferenças de queixasquando os músicos foram analisados conforme ostipos de instrumentos tocados, sendo que osmúsicos de sopros apresentaram queixas principalmente na região dos antebraços, punhos,mãos, comparados aos músicos de cordas querelataram maiores desconfortos nos ombros, os braços, pescoço e costas.

A única correlação encontrada foi em relação aotempo total de prática com a orquestra, sendo que aassociação considerada alta e significativa foi naregião do meio das coisas (21,10% das queixas dosmúsicos avaliados) com o tempo total em que osmúsicos tocam juntamente com a orquestra (3,11 ±

2,16 anos).5 REFERÊNCIAS

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8/20/2019 Musico de Orquestra Pratica Instrumental e Desconforto Corporal

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