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NARRATIVAS DE ARTE/EDUCADORA: O APRENDIZADO ATRAVÉS EXPERIÊNCIA DIDÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA À UNIVERSIDADE Flávia Maria de Brito Pedrosa Vasconcelos Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF) Resumo Neste artigo, procuro compartilhar algumas experiências que marcaram a maneira como venho aprendendo a ensinar artes. Baseada nos estudos de Dubar (1997), que trata do conceito de narrativa como história a ser contada, principalmente na reflexão acerca dos processos formativos em educação, compreendo que o olhar em memória na docência, é construção individual e influenciado pelo meio em que está inserido. Exponho trajetórias de ensinar arte, desde o início de minha trajetória enquanto arte/educadora. Busco explicitar questões que envolvem a prática docente, dos passos pelos quais percorri durante todo o processo, desde a faculdade até o educar no ensino superior. Procuro, portanto, traduzir em narrativa de memória, reflexões sobre a práxis pedagógica e questionar sobre a arte de ser arte/educador na contemporaneidade. Palavras-chave: narrativas, ensino de artes, memória. 1 Introdutório: caminhos da narrativa Os processos históricos podem ser vistos como narrativas que percorrem a memória e, a partir da capacidade imaginativa, delineiam as experiências e os fatos para serem descritos ou recontados. Aparada nos conceitos de Bosi (2007), Belting (2006), Le Goff (1996) e Benjamin (1996), os quais tratam, sob diferentes olhares, a visão de história como

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artigo publicado no V Fórum Bienal de Pesquisa em Arte UFPA

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NARRATIVAS DE ARTE/EDUCADORA: O APRENDIZADO

ATRAVÉS EXPERIÊNCIA DIDÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA À

UNIVERSIDADE

Flávia Maria de Brito Pedrosa Vasconcelos

Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF)

Resumo

Neste artigo, procuro compartilhar algumas experiências que marcaram a maneira como venho aprendendo a ensinar artes. Baseada nos estudos de Dubar (1997), que trata do conceito de narrativa como história a ser contada, principalmente na reflexão acerca dos processos formativos em educação, compreendo que o olhar em memória na docência, é construção individual e influenciado pelo meio em que está inserido. Exponho trajetórias de ensinar arte, desde o início de minha trajetória enquanto arte/educadora. Busco explicitar questões que envolvem a prática docente, dos passos pelos quais percorri durante todo o processo, desde a faculdade até o educar no ensino superior. Procuro, portanto, traduzir em narrativa de memória, reflexões sobre a práxis pedagógica e questionar sobre a arte de ser arte/educador na contemporaneidade.

Palavras-chave: narrativas, ensino de artes, memória.

1 Introdutório: caminhos da narrativa

Os processos históricos podem ser vistos como narrativas que percorrem a memória e, a

partir da capacidade imaginativa, delineiam as experiências e os fatos para serem descritos

ou recontados. Aparada nos conceitos de Bosi (2007), Belting (2006), Le Goff (1996) e

Benjamin (1996), os quais tratam, sob diferentes olhares, a visão de história como

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narrativa cultural, em perspectiva social num movimento de quebra das metanarrativas

vigentes, desconstruindo-as, recontando-as sob os olhares que antes haviam sido

renegados, outros além da versão oficial.

Assim, procuro reaver na memória, um reconhecimento de momentos em que aprendi e

ensinei artes, quando identifiquei-me como arte/educadora.

A noção de identidade exposta em Hall (2005), na qual somos influenciados pelo meio

cultural em que estamos inseridos e pelas ações que realizamos no contexto híbrido da

pós-modernidade, me fez construir noções que identificam os processos didáticos em

períodos que se relacionam na construção de ser arte/educador.

Os processos formativos na docência são permeados por paradigmas, que não possuem

“uma identidade fixa, essencial ou permanente” (HALL, 2005, p.13). A partir dessa

concepção, procuro relembrar as experiências passadas com o ensino público, particular e

na universidade, numa releitura de ações pedagógicas como meios significantes do

aprender a docência continuadamente no cotidiano da sala de aula.

Em um relato de discurso autobiográfico, recorro primeiramente a minha trajetória pessoal

enquanto professora das séries iniciais, para falar sobre o ensino de artes enquanto

memória histórica, releio momentos que delinearam o ensino de artes no Brasil,

dialogando com a revisão dos passos que me trilharam até o ensino de artes visuais e o

ensino universitário.

De acordo com os estudos de Dubar (1997), a identidade é uma elaboração não só

individual, mas também coletiva, que se constituem a um só tempo, associada aos

processos de intervenção de fatores externos e do indivíduo sobre si mesmo. Além disso,

ele coloca que identidade é fruto de um processo dinâmico, contraditório e que não

constitui somente uma identidade de profissão.

2 Caminhos por onde percorri: diferentes realidades de escola e ensino

2.1 A realidade da escola pública

Alguns estudiosos abordam em suas pesquisas a realidade escolar brasileira, suas grandes

faltas, em um discurso negativo sobre o fenômeno atual de educar nas escolas.

Bem, em parte, eles tem razão, há muitos professores por aí que são professores de

“temporada”, porém não devemos negar que há professores interessados e ativos,

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competentes e que mesmo em frente à adversidades, batalham por uma educação melhor

para o futuro.

No início, fui polivalente no ensino básico em uma escola pública no interior do Ceará, na

qual tive como experiência uma turma de aceleração. O desafio do começo me fez reagir

contra métodos tradicionais de ensino a todo momento proclamados em reuniões por

coordenação e direção de escola.

Na compreensão educacional e empírica do filósofo grego Aristóteles, o aluno enquanto

“tábua rasa” infelizmente ainda era predominante no pensamento sobre o ensinar e

aprender, havendo na escola apenas poucos colegas que tinham visões mais abrangentes

sobre o fenômeno educativo e ainda não havia se contaminado com o conformismo e a

indiferença sobre o ato de ensinar e suas implicações na vida dos alunos e da sociedade.

Podemos dizer que a coordenação pedagógica dava liberdade ao professor para agir

segundo sua didática, enfatizando que resultados seriam cobrados ao final do ano com as

provas finais e os testes que a secretaria de educação aplicai.

Muitos colegas professores que me diziam “olha, você finge que ensina e os alunos fingem

que aprendem”. Escutei isso por diversas vezes, como era duro aprendizado do giz branco.

O objetivo pedagógico era avaliar a capacidade de leitura, escrita e matemática dos

estudantes destas séries. Comenius, pedagogo do século XVII , aborda em seu livro

Didática Magna sobre a “arte universal de ensinar tudo a todos” , tal como sua premissa,

tentei inutilmente lecionar todas as disciplinas que me cabiam: Português, Matemática,

Ciências, Geografia, História e Artesii para uma 4ª série (5º ano) que não sabia ler nem

escrever.

Em um período de algumas semanas, cansada de insistir com alunos que aparentemente

não desejavam aprender, ia para casa com os cabelos brancos do pó de giz e uma grande

decepção. Questionava sobre onde poderia estar errando, pois já havia tentado todos os

métodos pedagógicos que conhecia: tradicional, construtivista, experimentalista.

Certo dia, prestei atenção a um aluno que se levantava da mesa e ia até a porta, correndo

em disparada. Fazia uns três dias que ele atravessava a sala dessa forma. Comecei a

dedicar o final das aulas a conversar com cada um deles. Descobri horrores familiares,

problemas mentais advindos de maus tratos em casa, e até prostituição infantil.

A atitude que optei apresentar, não só como professora deles, mas como ser humano

indignado com a realidade que me apresentava foi intervir. Numa madrugada revendo toda

a situação e meus procedimentos didáticos em sala de aula, decidi dar ênfase a leitura e a

escrita, utilizando-se da Arte para incentivo e estímulo a capacidade de ler e escrever dos

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alunos.

Hernandez (2005) menciona, em seu estudo sobre a formação de professores de artes

visuais, que se deve buscar produzir profundas transformações nas formas de

representação e estratégias para investigar desde e sobre elas, produzindo, assim, uma

mudança significativa na educação.

Depois das primeiras semanas de aula, refiz todo o planejamento do ano letivo e decidi

focar na questão do letramento. Segundo Soares (1998), “letrar é mais do que alfabetizar, é

ensinar a ler e a escrever dentro de um contexto onde a escrita e a leitura tenham sentido e

façam parte da vida do aluno”.

Utilizei materiais recicláveis, músicas, imagens de obras de artistas, de revistas, jornais e

expressão corporal como ferramentas didáticas, o que proporcionou além do estímulo

visual, a busca pelo entendimento da ligação entre o objeto, seu sentido e sua adequação

formal (escrita).

Vejo hoje que na época, mesmo sem saber, me inspirei nos conceitos de Hernandez (2007,

p.38), quando diz que “Se não se ensina aos estudantes a linguagem do som e das imagens,

não deveriam ser eles considerados analfabetos da mesma maneira como se saíssem da

universidade sem saber ler ou escrever?”.

Acredito que fiz o possível para a mudança na vida daqueles jovens. Considero este

primeiro passo na educação o essencial, pois me fez entrar em contato com a realidade da

escola pública e nascer a vontade pela transformação na educação.

As concepções apreendidas e aprendidas quando fui discente de um curso superior só

fizeram sentido quando usadas para pensar a prática pedagógica, na ação de ser professor

vi que Paulo Freire, Edgar Morin, Piaget e tantos outros pensadores da educação,

mostravam possibilidades de pensar o ensino/aprendizado que deviam ser adequadas de

acordo com cada situação no ambiente educativo. Na época, reli algumas páginas

Pedagogia da Autonomia de Freire (2005), que me auxiliaram a repensar a minha práxis

no sentido de reforçar características criticizantes na mediação pedagógica.

2.2 O ensino de dança e artes visuais numa escola de artes

O segundo momento que tive com a educação foi em outra cidade no interior do Ceará, em

uma escola pública, mas esta tinha características diferentes. Era uma escola de artes, que

tinha como finalidade a terapia ocupacional através de atividades artísticas que

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propiciassem a criança e o adolescente de realidades sociais desfavorecidas a expressão em

dança, teatro, música ou artes visuais de suas habilidades.

A instituição escolar era ligada administrativamente à secretaria de cultura e não de

educação, o que implicava além dos salários menores, uma política de espetacularização

das atividades artísticas desenvolvidas com os alunos. Outra característica era a ausência

de conteúdo em história e estética da arte e sua contextualização, dando ênfase apenas ao

fazer artístico.

De acordo com a concepção de arte como atividade extracurricular à serviço para liberação

emocionaliii, fruto das ideias de John Deweyiv mal interpretadas no Brasil, as atividades não

possuíam planejamento específico, resultando em um mero fazer no intuito de “revelar

artistas”, pois segundo a coordenadora, esta era “a função da escola, mostrar para as

cidades os artistas infantis e juvenis”v, promovendo assim um ensino visando ao produto

final, a demonstração do que foi feito.

No período, tive sérios embates com os dirigentes da escola sobre o ensino/aprendizado

dos estudantes. Estava responsável pelas aulas de Dança (Ballet e Dança Contemporânea)

e Artes Visuais (denominado erroneamente pelos professores anteriores de “Artes

Plástica”). Decidi ousar e desobedecer as diretrizes de ensino e agir de acordo com meus

estudos sobre o que era um ensino de artes.

A primeira ação pedagógica que tomei, foi abrir vagas para estudantes a partir de 3 anos de

idade e crianças especiais, que até então anão eram atendidos pela escola com a desculpa

de que eram “alunos mais difíceis de se controlar”.

Mudei dessa forma, a dinâmica das aulas. As aulas de dança foram divididas pela idade e o

trabalho de exposição cênica em espetáculos se daria apenas com os jovens mais

experientes e desinibidos. O restante dos alunos teria aulas de dança de forma a conhecer

seu corpo e suas possibilidades de expressão com conhecimentos básicos em ballet

clássico e alongamento corporal.

No que concerne às aulas de artes visuais, procurei abordar a história da arte em aulas

expositivas, com imagens em slides através de uma televisão e dvd, assim como em

construção de materiais cênicos, desenho, pintura, colagem, escultura e fotografia. Com

esta última linguagem, elaborei uma oficina cujo fruto além da exposição foi a monografia

que defendi em minha especialização em Língua Portuguesa e Arte-educaçãovi.

Ativamente participei de espetáculos de dança e exposições artísticas com os alunos, numa

forma de aproximação entre professor e aluno, dividia com eles saberes construídos e em

construção, visível era o diálogo e a disposição de todos em participar e aprender.

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Em relação aos alunos com necessidades especiais, consegui grande avanços com um

jovem de 21 anos, que tinha paralisia cerebral, que após as aulas de Pintura e Desenho e o

constante incentivo e apoio, criou obras abstratas magníficas e ampliou seu universo

comunicativo, demonstrando maior confiança ao expor seus trabalhos aos colegas, pais de

alunos, direção e até mesmo ao prefeito da cidade.

O aprendizado na prática pedagógica em ensino de artes, trouxe uma vontade de

apropriação de maiores leituras em didáticas do ensino e história do ensino da arte, como a

necessidade de voltar à capital e aplicar no ensino particular minhas práticas de ensino e

observar de que forma seriam recebidas.

2.3 O ensino de Artes em escolas particulares

As práticas pedagógicas seguintes foram três: ensino em escola particular 1 (seis meses),

ensino em escola particular 2 (três meses) e ensino à distância como professora

pesquisadora I (seis meses).

Na instituição educacional particular 1, a professora anterior da disciplina Artes, no ensino

fundamental I, havia realizado um trabalho predominantemente modernista, cujo ápice se

dava ao final do ano com uma exposição dos “pequenos artistas”. A sala de artes estava

disposta unicamente para o ensino de artes plásticasvii e o conteúdo distribuído por séries

na finalidade de seguir os livros paradidáticos sobre artistas inseridos pela professora, que

havia feito um “convênio” com uma editora. Nos livros, eram privilegiados artistas

referenciais diversos, tidos como modelos para a elite cultural como: Portinari, Monet,

Renoir, Van Gogh, Picasso, Leonardo da Vinci, Michelangelo, Rembrandt, Di Cavalcanti,

Tarsila do Amaral, Aleijadinho entre outros, em detrimento a arte e cultura locais.

A conduta pedagógica de ensino/aprendizagem sem embasava no tecnicismo, aprender

uma técnica como atividade principal da cartilha do currículo em Artes nas séries do

ensino fundamental, consolidando fazeres acima dos saberes em sala de aula. Os livros

eram apoio didático para demonstrar as técnicas usadas pelos artistas e suas possibilidades

estéticas e profissionais para os futuros alunos-artistas, o que também remonta uma

concepção modernista quando assume o aluno deva produzir livremente e se expressar

através da criação de obras artísticas.

Através da utilização de livros como pontos de partida, dialogando sempre com os alunos,

fazendo comparações e mostrando outros artistas e inserindo historicamente as obras e as

correntes do pensamento artístico. Contextualizar todo o planejamento anterior, que me foi

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incumbido de usar como base pela direção da escola foi um desafio.

Os jovens que já haviam cursado a disciplina com a professora anterior estava “mal

acostumados” a um ensino baseado no fazer, tanto é que nas minhas primeiras aulas um

deles dizia “Oba! Agora vamos desestressar!”. Grande era a alegria em ir para a sala de

Artes e, a professora polivalente que quisesse dar o castigo em seus alunos era tirá-lo das

aulas de Artes. Acredito que esta foi a parte positiva do ensino de artes modernista nesta

escola: tornar as aulas sinônimo de prazer criativo aos alunos.

Na instituição educacional particular 2, lecionei Artes desde o maternal ao ensino

fundamental I, assim como era professora da escolinha de esportes, dando aulas de Ballet

infantil. Comecei , então, do zero, a professora anterior havia se aposentado e pude

elaborar o planejamento no ensino de Artes à minha maneira. Construí durante três meses

um ensino de artes visuais pós-moderno com o uso da abordagem triangular (fazer

artístico, contextualização e leitura da imagem) em estudos sobre a dinâmica da cor,

leituras dialéticas de imagens de obras de artistas diversos (havia uma ordem cronológica

seguida) e atividades expressivas que dependendo da faixa etária, iam da modelagem,

passando pelo recorte e reciclagem até a performance, assim como organizamos diversas

exposições dos trabalhos dos alunos, fazendo pequenos debates entre as sériesviii.

2.4 Ensino a Distância em Graduação

No ensino a distância (EAD), lecionei presencial e virtualmente duas disciplinas:

Introdução à Arte-educação e Metodologia Científica no Curso Superior de Licenciatura

em Artes Plásticas pela Universidade Estadual do Ceará – UECE/Universidade Aberta do

Brasil/UAB, no qual tem como pólo de ensino a cidade de Orós – CE. Na primeira

disciplina, abordei com fervor as teorias de Herbert Read, Viktor Lowenfeld, Ana Mae

Barbosa, no ensino e na mudança através do ensino de artes visuais.

A prática pedagógica em EAD, me fez visualizar a relevância das tecnologias

contemporâneas na dinamização do ensino, quando utilizadas de forma consciente a

incentivar o aluno a desenvolver certa autonomia em seus estudos, tornando-se responsável

por sua trajetória acadêmica de uma maneira mais visível. Atividades em ambientes

virtuais são construídas colaborativamente, porém não se pode esquecer que a presença do

professor é extremamente necessária, na mediação do aprendizado, seja este virtual ou não.

Lecionar disciplinas em uma graduação a distânciaix me fez observar que os discentes, seus

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questionamentos de maneira síncrona nos encontros presenciais, nos bate-papos online e,

de maneira assíncrona, nos fóruns e mensagens por email, estão presentes nas disciplinas

de uma outra maneira. Pude compreender que conteúdo que não é dialogado e permanece

no debate dialético acadêmico não é aprendido. O conhecimento para se tornar parte do

aprendizado necessita da troca e este é o principal instrumento do lecionar.

2.5 Ensino Presencial em Graduação

Na insituição de ensino superior, Universidade Federal do Vale do São Francisco

(UNIVASF), no ano de 2009, trabalhei com duas disciplinas: Fundamentos

Sociofilosóficos da Educação e Núcleo Temático Políticas Públicas e Educação. A primeira

era parte da carga horária obrigatória do Curso de Licenciatura em Artes Visuais, a

segunda funcionava como Núcleo Temático Multidisciplinar - NT, que “é uma

atividade(...) que visa o estudo, a pesquisa e a aplicação de conhecimentos integrados,

voltados para o encaminhamento e a solução de questões socioeconômicas, ambientais,

culturais, científicas e/ou tecnológicas”.x

No diretório de grupos da disciplina NT, escolheu-se o Núcleo Temático Políticas Públicas

e Educação – NUTEPP, que tem como base a intervenção nas escolas públicas, aliando a

pesquisa realizada na universidade com a realidade escolar. Com o Grupo de Trabalho

denominado Ensino de Artes Visuais no NUTEPP, que entre os meses de agosto a

dezembro de 2009 exerceu atividades no intuito de pesquisar o ensino de artes visuais em

algumas escolas. Juntamente com os discentesxi, projetou-se um questionário que foi

aplicado por eles em nove escolas públicas nos anos finais do ensino fundamental, entre

Petrolina e Juazeiro, com entrevistas a doze professores de artes. Este trabalho inicial

resultou em uma pesquisa que está em andamento sobre os fundamentos e práticas no

ensino de artes visuais em Petrolina – PE e Juazeiro – BAxii.

Durante todo o semestre letivo, me propus a escutar as experiências dos alunos e relacionar

as falas em debate com as leituras de teóricos da educação, assim como demonstrar através

da avaliação contínua e progressiva da disciplina com a entrega de fichamentos dos

discentes sobre os que eles liam. Priorizei em todo momento a discussão crítica sobre o

ambiente escolar, seus sujeitos de aprendizado e os gestores da escola.

6 Considerações sem finais

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Suspeito que esta narrativa é um início e se apresenta como artigo no intuito de conectar

relações de práticas pedagógicas na construção do aprender ser docente em artes e pode se

consolidar como pesquisa sobre as memórias dos arte/educadores no ensino superior, que

trabalham com a área ensino de arte, sugerindo assim uma investigação das trajetórias

destes profissionais. Outras possibilidades de estudo, são as perspectivas moderna e pós-

moderna, assim como as influências das narrativas históricas do ensino de arte no Brasil no

processo de formação do docente.

Assim, na tabela abaixo, ressalto as seguintes atitudes que percebi em relação ao ensino:

Tipo de escola NecessidadePública maiores intervenções e diálogos

Pública de Artes revisão de parâmetros, currículo e metodologias e didática

Particular transformação da visão tecnicista e modernista em visão pós-moderna

Ensino a distância em graduação Diálogo contínuo

Ensino presencial em graduação Contínua leitura e releitura problematizadora

Tab. 1. Síntese das necessidades por tipo de escola

Acredito que esta narrativa possibilite uma reflexão e que a mesma esteja inacabada e

permaneça nesse processo de pensar e repensar ações de ensinar, tendo em vista que a

práxis pedagógica é fruto de uma construção contínua que perpassa toda a vida do

educador.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 BELTING, Hans. O Fim da História da Arte: uma revisão dez anos depois. São Paulo: Cosac Naify, 2006.2 BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de história. São Paulo: Rouanet, 1996.3 BOSI, Eclea. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. 4 DUBAR, Claude. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. Porto: Porto Editora, 1997.5 FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 2005.6 HERNANDEZ, Fernando. Catadores da cultura visual. Porto Alegre: Mediação,2007.7 HERNANDEZ, F; OLIVEIRA, Marilda Oliveira(orgs.). A formação do professor e o

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ensino das artes visuais. Santa Maria: Ed. UFSM, 2005.8 HALL, Stwart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.9 LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas: Editora da Unicamp, 1996.10 SOARES, Magda Becker. Letramento: Um Tema em Três Gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 1998.

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i Entre eles o Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), sendo aplicadasnas turmas de 4ª série (5ºano) e 8ª série (9º ano) entre os dias 5 e 20 de novembro de 2007. O principal objetivo

é avaliar a capacidade de leitura, escrita e matemática dos estudantes destas séries.ii Do corpo docente, eu era a única que me preocupava em ensinar Artes aos estudantes. O restante dos professores utilizava o calendário das datas comemorativas e faziam adornos e objetos, descontextualizados, resquícios ainda vivos do ensino tecnicista em nosso país.iii Em BARBOSA (2008), este tipo de visão do ensino de arte predominava a prática, a exploração e a

experimentação de materiais.iv John Dewey (1859-1952) desenvolveu uma pesquisa sobre as experiências cognitivas do “aprender fazendo”. Para ele, o aprendizado deve acontecer de uma sequência metodológica, pressupondo, a partir de uma atividade, o suscitar de um problema para o levantamento de dados, formulação de hipóteses e a

experimentação. Seu trabalho posteriormente foi aproveitado para explicar a concepção de ensino de artes sob o uso da “livre-expressão”v Havia toda uma programação bimensal de espetáculos e mostras ao público da cidade, assim como uma ênfase nas Artes Cênicas (Dança e Teatro), levando os espetáculos nessas áreas a diversas cidades do Ceará de forma a divulgar não só a Arte em si, mas a cidade e seus políticos.vi Realizada pela Universidade Regional do Cariri (URCA). A Abordagem Triangular é uma epistemologia do ensino

de arte desenvolvida pela pesquisadora Ana Mae Barbosa, na década de 1980, que tem três pilares como ênfase: ler, contextualizar e fazer. Maiores informações sobre o trabalho desenvolvido vide em : http://www.fotoscriancas.blogspot.com, acesso em 25 de janeiro de 2010.

vii Refiro-me à ensino de artes plásticas para designar o ensino que se dá com o uso somente das atividades artísticas tradicionais: desenho, pintura, escultura, etc. Consistia-se em 2 grandes pias, 3 mesas grandes de madeira antiga com 8 cadeiras cada , 3 estantes de madeira 2 cavaletes para pintura. Materiais: Tintas guache, pincéis pequenos e grandes em espessura variadas mas com o pêlo já bem gasto, 20 pires de porcelana, alguns vidros de conserva, potes com lápis de cor quebrados e canetinhas falhando.viii Por exemplo, as obras criadas na 1ª série (2º ano) eram observadas pelos alunos da 2ª série (3º ano), e assim por diante.ix Para ler mais sobre o assunto, ver a pesquisa de Cláudia Gianetti sobre a Estética Digital e o livro organizado por de Ângela Carrancho da Silva, Aprendizagem em ambientes virtuais e educação a distância,

editado pela Editora Mediação.x UNIVASF. Normas Gerais de Ensino de Graduação da UNIVASF. 2007. p. 07xi Os discentes participantes são alunos de diversas graduações da universidade, que durante a matrícula no núcleo temático, optam por um grupo de trabalho específico que é ofertado por um docente. No NUTEPP em 2009, sete discentes se inscreveram no GT Ensino de Artes Visuais, todas do sexo feminino, dentre elas, duas alunas do Curso de Administração e o restante do Curso de Psicologia.xii Estou desenvolvendo esta pesquisa no programa de mestrado em Artes Visuais da Universidade Federal da Paraíba

- UFPB, em associação com a Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, na linha Ensino das Artes Visuais no Brasil, sob orientação de Prof.Dr. Sebastião Gomes Pedrosa e co-orientação de Prof. Dr. Erinaldo Alves Nascimento.