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LUIS FERNANDO ZULIETTI NAS ASAS DA EMBRAER: URBANIZAÇÃO, CRISE E MUDANÇAS EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS – SP (1994 – 2004) Pontifícia Universidade Católica São Paulo – 2006

NAS ASAS DA EMBRAER: URBANIZAÇÃO, CRISE E MUDANÇAS … Fernando... · of Embraer, including an analysis of how this process affected the spatial distribution of these people within

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LUIS FERNANDO ZULIETTI

NAS ASAS DA EMBRAER: URBANIZAÇÃO, CRISE E MUDANÇAS EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS –

SP (1994 – 2004)

Pontifícia Universidade Católica São Paulo – 2006

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LUIS FERNANDO ZULIETTI

NAS ASAS DA EMBRAER: URBANIZAÇÃO, CRISE E MUDANÇAS EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS –

SP (1994 – 2004)

Tese apresentada à Banca

Examinadora da pontifica Universidade

Católica – PUC-SP, como exigência

parcial para a obtenção do título de

DOUTOR em Ciências Sócias, sob a

orientação da Prof.ª Drª. Lucia Maria

Machado Bógus.

Pontifícia Universidade Católica São Paulo - 2006

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SUMÁRIO

Lista de Tabelas

Lista de Figuras

Lista de Gráficos

INTRODUÇÃO CAPÍTULO 1 – SÃO JOSÈ DOS CAMPOS: DO NASCIMENTO AO CRESCIMENTO DA INDÚSTRIA AERNÁUTICA NACIONAL 26

1.1 – Evolução histórica da cidade de São José dos Campos 26

1.2 - A primeira fase do processo de industrialização do município

de São José dos Campos 30

1.2.1 - O modelo de desenvolvimento industrial e tecnológico

nacional 31

1.3 - A segunda fase do processo de industrialização do município

de São José dos Campos 33

1.3.1 – O processo de industrialização 34

1.3.2 - Políticas desenvolvimentistas 47

1.4 – O desenvolvimento da indústria aeronáutica nacional 52

1.4.1 – Os primórdios da indústria aeronáutica brasileira 54

1.4.2 – A criação do CTA e do ITA 60

1.5 – Embraer: o nascimento 64

1.5.1 - Políticas de desenvolvimento econômico nos anos setenta 66

1.6 – Embraer: segunda fase: o desenvolvimento 69

1.6.1– A presença do estado 73

1.6.2 - Desenvolvimento tecnológico 77

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CAPÍTULO 2 – DA CRISE À PRIVATZAÇÃO DA EMBRAER 87 2.1 - O declínio 88

2.1.1 – Abertura Econômica, suprimento e transferência de

tecnologia 88

2.1.2 – As dificuldades da sobrevivência no ramo aeronáutico 97

2.1.3 - A mudança da economia e do ambiente político-institucional

no final da década de oitenta e início de noventa 102

2.2 – O processo de preparação para privatização 116

CAPÍTULO 3 – UM NOVO CAMINHO PARA A EMBRAER (1994-1998) 126

3.1-Tempo de mudança 126

3.1.1 - Privatização e transformação 128

3.1.2 - Perfil dos controladores 129

3.1.3 – Uma nova administração profissional 131

3.1.4 – Estratégia financeira 133

3.2. – Plano de ação 136

3.2.1 - Processo organizacional 140

3.2.2 - Processos de trabalho 141

3.3 - O modelo de gestão de desenvolvimento do produto 142

3.3.1 – Projeto de transformação 144

3.3.2 – Plano de cargos, salários e carreira 148

3.3.3 - Desenvolvimento profissional e educação 156

3.4 - Plano de reestruturação (1994 - 1998) 160

3.4.1 - Da síndrome dos sobreviventes à síndrome da insegurança no

emprego 169

3.5 - A Embraer na atualidade 175

3.5.1 - Nova estrutura da Embraer 194

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CAPÍTULO 4 – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS – LÓCUS DA PESQUISA: “O IMPACTO OCORRIDO NA VIDA DOS FUNCINÁRIOS DA EMBRAER NO PERÍODO QUE ANTECEDE E LOGO APÓS A PRIVATIZAÇÃO 199

4.1- O impacto sobre os demitidos 201

4.1.1. Caracterização dos funcionários demitidos 201

4.1.2. As mudanças ocorridas na vida dos funcionários demitidos 203

4.2- O impacto ocorrido na vida dos que permaneceram e dos novos

funcionários contratados pela embraer logo após sua privatização 219

4.3 – A visão dos funcionários que permaneceram a respeito das

mudanças na empresa 228

CONSIDERAÇÔES FINAIS 237

REFERÊNCIAS 247 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 256 ANEXO 1 – QUESTIONÁRIOS / ENTREVISTAS 259

ANEXO 2 – FOTOS DAS AERONAVES 267

ANEXO 3 - FOTO E MAPA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP 275

ANEXO 4 - BAIRROS E FAVELAS DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP. 277

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ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 – Região administrativa do Vale do Paraíba 27

Tabela 2 –Evolução das indústrias em São José dos Campos 37

Tabela 3 – Distribuição da população por local de nascimento 37

Tabela 4 – Distribuição da população do município nascida em outros estados 38

Tabela 5 - Indústrias conforme porte industrial em São José dos Campos –

2000 39

Tabela 6 – Indústrias conforme porte industrial em São José dos Campos –

2004 40

Tabela 7 – Evolução do comércio em São José dos Campos 40

Tabela 8 – Riqueza do Estado 41

Tabela 9 – Riqueza do País 41

Tabela 10 – Volume de exportações em São José dos Campos (em US$) 42

Tabela 11 – Volume de exportações da Embraer (em US$) 42

Tabela 12 – ICMS arrecadado na indústria 43

Tabela 13 – Empresas industriais 44

Tabela 14 – Empregos na indústria 44

Tabela 15 – Dados econômicos de São José dos Campos 46

Tabela 16 - Aeronaves Construídas ou montadas no Brasil na fase pré Embraer 59

Tabela 17 – Indicadores de desempenho econômico-financeiro da Embraer

valores em US$ milhões) 108

Tabela 18 – Indicadores de desempenho econômico financeiro da Embraer

( US$ milhões) 135

Tabela 19 – Média de horas de treinamento por empregado 158

Tabela 20 – Entregas de aeronaves (1996-2001)

166

Tabela 21 – Salário médio do total de trabalhadores, dos mensalistas e dos

horistas (em US$) 167

Tabela 22 – Salário médio da indústria aeronáutica por hora/pessoal/produção

por país (US$) 169

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Tabela 23 – Pesquisa de ambiente organizacional da Embraer 173

Tabela 24 – Número de empresas subcontratadas, suas localizações regionais

e distância da Embraer medida em kilômetros (1999) 182

Tabela 25 – Fornecedores de primeiro nível do Programa ERJ – 145/140/135 183

Tabela 26 – Fornecedores de primeiro nível do Programa ERJ – 170/190 185

Tabela 27 – Total de jatos entregues (1996-2005) 189

Tabela 28 – Balança comercial brasileira em 2004 190

Tabela 29 – Cidade de origem dos ex-funcionários demitidos da Embraer 201

Tabela 30 - Distribuição da população residente no município de São José dos

Campos, por local de nascimento – 2000 202

Tabela 31 – Escolaridade dos ex-funcionários 202

Tabela 32 – Ex-funcionários que trabalham atualmente 203

Tabela 33 - Renda atual dos ex-funcionários 203

Tabela 34 – Tempo de retorno dos ex-funcionários ao mercado de trabalho 204

Tabela 35 – Motivo principal da mudança da família por bairro, considerando o

total de famílias do município que mudaram de residência 206

Tabela 36 – Motivo principal da mudança da família de bairro considerando

todas as regiões de São José dos Campos 207

Tabela 37 – Mudou de residência depois da demissão 209

Tabela 38 – Motivo principal da mudança da família de bairro dos

ex-funcionários 210

Tabela 39 – Endereço atual dos ex-funcionários da Embraer 211

Tabela 40 – Número de habitantes por região de São José dos Campos 216

Tabela 41 – Faixa etária dos ex-funcionários 219

Tabela 42 – Faixa etária dos novos contratados 220

Tabela 43 – Número de ex-funcionários demitidos por sexo 220

Tabela 44 - Número de funcionários contratados por sexo 220

Tabela 45 – Está satisfeito com a empresa 221

Tabela 46 – Cidade de origem dos novos contratados 222

Tabela 47 – Motivo principal da mudança da família de bairro dos novos

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Funcionários 224

Tabela 48 – Situação atual (Moradia) 225

Tabela 49 – Mudou de endereço logo após a sua contratação 225

Tabela 50 – Endereço anterior dos novos contratados que morram na cidade de

São José dos Campos 226

Tabela 51 – Endereço atual de todos os novos contratados na cidade de São José

dos Campos 226

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ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Mapas São Paulo e São José dos Campos 28

Figura 2 – Cidade do Vale do Paraíba 29

Figura 3 – Estrutura organizacional do Ministério da Aeronáutica 71

Figura 4 – Plano de Ação 137

Figura 5 – Organograma da embraer pós-privatização 140

Figura 6 – Processos Empresariais 142

Figura 7 – Fases do desenvolvimento do produto 144

Figura 8 – Remuneração global 151

Figura 9 – Perfil / indicadores – Instrumento de gestão 156

Figura 10 – Distritos de São José dos Campos 212

Figura 11 – Mapas das Regiões de São José dos Campos 213

Figura 12 – Mapa dos bairros de São José dos Campos 214

Figura 13 – Limites de Zona e número de habitantes por zona de São José dos

Campos 215

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INDICE DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Evolução do Faturamento, 1970-1994 89

Gráfico 2 – Produção, exportação e importação, 1970-1994 89

Gráfico 3 – Evolução do nível de emprego total da Embraer 90

Gráfico 4 – Grau de abertura comercial empresarial, 1970-1994 94

Gráfico 5 – Evolução dos gastos com P&D, 1970-1994 95

Gráfico 6 – Evolução do nível de emprego da Embraer, 1980-1994 119

Gráfico 7 – Composição do faturamento em 1994 122

Gráfico 8 – Composição da receita bruta por produto entre 1989 e 1994 123

Gráfico 9 – Evolução do nível de emprego da Embraer – 1990-1998,

Números absolutos 161

Gráfico 10 – Receita por empregado em milhões de dólares 165

Gráfico 11 – Evolução do número de empregos (1995 à 1999) 178

Gráfico 12 – Evolução do número de empregado (2000 à 2005) 178

Gráfico 13 – Receita líquida (R$ milhões) 187

Gráfico 14 – Ebitda (R$ milhões) 187

Gráfico 15 – Evolução do volume de jatos entregues pela Embraer 188

Gráfico 16 – Lucro líquido (R$ milhares) 190

Gráfico 17 – Pedidos em carteira (US$ bilhões) 191

Gráfico 18 – Gráficos de Dívidas 192

Gráfico 19 – Qualificação e treinamento (R$ milhões investidos) 193

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AGRADECIMENTOS

A realização deste trabalho contou com a colaboração, esforço e afeto de

várias pessoas, às quais gostaria de manifestar meus sinceros agradecimentos.

Correndo o risco de deixar de citar algumas, desde já me desculpo.

Em primeiro lugar, quero agradecer e ressaltar o privilégio de ter recebido

contribuições e sugestões preciosas da orientadora professora Drª. Lucia Maria

Machado Bógus na maior parte do percurso.

Meu muito obrigado à professora Ive Ramos que me ajudou na realização

desse trabalho e ás professoras Leila Maria da Silva Blass e Noêmia Lazzareschi

pelas importantes contribuições dadas no exame de qualificação.

Agradeço à minha esposa Ana Paula T. Veneziani que teve paciência, aos

meus filhos que também contribuíram para que eu pudesse concluir o trabalho.

Agradeço também a disponibilidade e generosidade dos Srs. Horácio

Forjaz, e Arthur Santacreu funcionários da Embraer, que abriram as portas da

empresa e forneceram as informações Almejadas desde o início da pesquisa.

A todos, muito obrigado!

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RESUMO O presente trabalho tem como temática central o impacto social sofrido

pelos funcionários demitidos e os novos funcionários admitidos, durante e logo

após a privatização da Embraer, incluindo uma análise da mobilidade espacial

dessas pessoas na cidade de São José dos Campos – SP, como uma decorrência

de sua situação frente à empresa. Buscou-se também compreender e analisar o

desenvolvimento, crise e recuperação da Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB),

representada pela Embraer S.A.

O percurso metodológico foi construído a partir das informações

bibliográficas, das experiências de vida dos ex-funcionários e dos novos

funcionários, além de depoimentos da nova direção da Embraer, com relação ao

processo de privatização da empresa. Nesse percurso, além de levantamentos

quantitativos e qualitativos, a linha de pesquisa adotada abordou os aspectos

histórico-sociológicos, com o propósito de analisar os impactos vivenciados pelos

trabalhadores envolvidos no processo. Através das entrevistas, pudemos

identificar e caracterizar a mobilidade espacial durante o período das demissões e

contratações de novos funcionários pela Embraer no Município de São José dos

Campos - SP, devido a motivos profissionais, preço dos imóveis, acesso a infra-

estrutura e serviços, segurança e qualidade de vida.

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ABSTRACT The main theme of this paper is the social impact on the employees who

were dismissed and on the new ones hired during and soon after the privatization

of Embraer, including an analysis of how this process affected the spatial

distribution of these people within the city of São José dos Campos – SP. The

objective is also to understand and analyze the development, crisis and recovery of

the Brazilian Aeronautics Industry (IAB), represented by Embraer S.A.

The methodological path was built from the bibliographical research, the life

experiences of the former and new employees, and statements given by the new

direction of Embraer, regarding the process of privatization of the company. In this

process, added to the quantitative and qualitative surveys, the adopted line of

research approached historical and sociological aspects, with the purpose of

analyzing the impacts on the life of the workers involved in the experience.

Through the interviews, we were able to identify and characterize the spatial

changes that occurred during the period of the dismissals and hirings of employees

by Embraer in the City of São José dos Campos – SP, due to professional

reasons, cost of property, access to infrastructure and services, security and

quality of life.

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INTRODUÇÃO O presente estudo busca analisar, a partir da privatização da empresa

Embraer, em 1994, as mudanças ocorridas com os funcionários demitidos, os que se

mantiveram empregados e o perfil dos novos funcionários contratados, bem como os

impactos dessas mudanças nas vidas dos envolvidos no processo. Dentre esses

impactos destaca-se a queda no poder aquisitivo dos demitidos, o que os obrigou,

por vezes, a residir em áreas da cidade de São José dos Campos, diferentes

daquelas onde residiam anteriormente. Essa mobilidade espacial intra-urbana e seus

impactos sobre a cidade, também são objeto de nossa análise. Além disso,

buscaremos, também, compreender e analisar o desenvolvimento, crise e

recuperação da Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB), representada pela ex-estatal

Embraer S.A, enfatizando os fatores críticos de instalação de uma indústria de alta

tecnologia, tendo em vista as condições estruturais de uma economia de

industrialização tardia e periférica, como é o caso da brasileira. Assim serão

analisadas as condicionantes para o sucesso industrial da Embraer nas décadas de

setenta e oitenta, sua posterior crise, deflagrada no final dos anos oitenta e

aprofundada nos anos noventa, culminando na sua privatização em 1994. A partir de

então, inaugura-se uma fase de transição rumo a um novo modelo de gestão

empresarial, com a profissionalização dos seus quadros diretivos, com uma nova

configuração na gestão tecnológica e a análise das condições futuras de

recuperação e sustentabilidade da competitividade da empresa.

A opção por esse campo temático deveu-se, sobretudo, às particularidades e

à complexidade do processo de constituição e desenvolvimento tecnológico dessa

indústria no Brasil, aos condicionantes que contribuíram para seu êxito,

posteriormente sua crise e mais recentemente sua recuperação apoiada no

programa de parcerias de risco para o desenvolvimento do avião ERJ-145 e

atualmente dos novos aviões Embraer 170/190 e Legacy Executivo/Shuttle.

A indústria aeronáutica configura um caso singular e atípico, por ser

representada por uma única empresa, a Embraer – Empresa Brasileira de

Aeronáutica. Foi criada por iniciativa do governo federal no dia 19 de agosto de 1969

e fundada em 2 de janeiro de 1970, como sociedade de economia mista de capital

aberto, controlada pela União e vinculada ao Maer (Ministério da Aeronáutica), tendo

seus fundadores recebido a missão de criar e disseminar a indústria aeronáutica no

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país. É importante considerar que desde o início a empresa contou com generoso e

continuado apoio do Estado, sem precedentes na história do desenvolvimento

tecnológico e industrial brasileiro, seja mediante incentivos fiscais e benefícios,

políticas governamentais de compra, para o estímulo da formação de recursos

humanos de alto nível, seja no fomento para a execução de pesquisa básica e

aplicada. Em grande medida, essa experiência foi viabilizada também graças ao

apoio de institutos cativos de excelência como o Centro Tecnológico da Aeronáutica

– CTA e o Instituto Tecnológico da Aeronáutica – ITA. Dessa forma, delineou-se uma

trajetória de autonomia e inovação tecnológica de sucesso, nucleada basicamente

no aprendizado seletivo de tecnologias-chave para a sua estratégia de manufatura e

na conquista planejada de nichos do mercado doméstico e mundial de aeronaves de

médio porte.

A adição de outros fatores vinculados à própria estratégia seguida quando da

instalação dessa indústria, teve influência significativa no êxito alcançado.

Diferentemente da instalação da indústria automobilística (em que corporações

transnacionais ocuparam o nível mais elevado da atividade industrial), a Embraer foi

concebida como uma estatal e como uma montadora final, que se dedicaria

exclusivamente à montagem de aviões por meio da materialização de um projeto

aeronáutico endogenamente concebido (DAGNINO, 1994).

Houve uma consistente capacitação de pesquisa com a formação dos

recursos humanos capazes de se apropriarem de soluções tecnológicas específicas,

objeto de consultorias e acordos de cooperação, caminho privilegiado para aumentar

o potencial inovador da empresa.

Foi também com base na capacitação em projeto aeronáutico (em especial na

área aerodinâmica) que foi possível assimilar as demais capacitações não

propriamente tecnológicas pela associação com parceiros externos, viabilizadas em

grande medida por meio da atuação governamental. Apoiada por um programa

governamental, a empresa criou extensa rede de fornecedores, promovendo

esquemas interativos de desenvolvimento tecnológico especialmente na área de

eletrônica. Tendo alto grau de interação com universidades, centros e institutos de

pesquisa em geral, pode-se afirmar que possui uma escola e um centro de

tecnologia cativas – ITA e CTA.

A Embraer conquistou o mercado de transporte aéreo regional internacional

com a linha do EMB-110 Bandeirante, para dezenove passageiros, e o EMB-120

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Brasília, de trinta assentos. Os dois aviões garantiram à empresa, no passado, a

liderança de vendas na categoria turboélices para os Estados Unidos, o maior

mercado de aviões e maior cliente da companhia no mundo. Desde a fundação até

2005, a Embraer consolidou-se como uma empresa que projetou, construiu e

comercializou aproximadamente 8.700 aviões que voam em mais de 63 países.

Foram produzidos 21 modelos de aviões nestes 36 anos.

Em 7 de dezembro de 1994, a empresa foi transferida para a iniciativa

privada. Atualmente, a Embraer – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – é uma

sociedade anônima de capital aberto, situada próxima ao quilômetro 146 da Via

Dutra, na região de São José dos Campos, estado de São Paulo. Hoje é controlada

por um consórcio de empresas e fundos de pensão liderados pelo Grupo Bozano

Simonsen, um dos principais conglomerados brasileiros, com atuação nas áreas

financeira, mineral, imobiliária, agrícola e industrial.

Nos últimos anos, a Embraer conquistou o prêmio de melhor empresa com

Estratégia corporativa da Indústria Aeroespacial Mundial promovido pela revista

especializada Flight 2.

Ao que tudo indica, fatores críticos eleitos como virtuosos e recomendados

por numerosos estudos sobre competitividade, tendo como referência experiências

empresariais paradigmáticas, tais como a elevada qualificação de seu quadro

técnico de engenheiros, o avançado estágio de autonomia e capacitação

tecnológica, investimentos pesados em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), o apoio

governamental irrestrito, parecem não ter sido suficientes para garantir o sucesso do

2 Em 1996, a empresa foi premiada na categoria Destaque Tecnológico. Em 21 de novembro de 1997, recebeu o

prêmio Destaque de Comércio Exterior na categoria Exportador, concedido pelo Ministério da Indústria, do

Comércio e do Turismo. Foi certificada em julho de 1997 pela ISO 9001. Desde 1995, ano seguinte à

privatização, a Embraer exportou US$ 17 bilhões em produtos e serviços, tendo sido a maior exportadora

brasileira entre 1999 e 2001. Contribuiu, ao longo desses dez anos, com US$ 6,6 bilhões para o saldo da balança

comercial do país. Desta forma, as exportações da Embraer em 2004 totalizaram US$ 3,699 bilhões, um recorde

que marca a segunda posição de maior exportadora brasileira, com um contribuição líquida na balança comercial

de 2004 de 4% do saldo. Em 2005 totalizou US$ 3,478 bilhões, sendo o quarto setor em exportação do país.

Atualmente, a Embraer é líder no mercado de jatos comerciais de até 110 assentos. A partir de 2004, entrou em

operação o Embraer 170, primeira das quatro aeronaves da nova família de jatos comerciais Embraer 170/190,

programas nos quais vêm sendo investidos cerca de US$ 1 bilhão.

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empreendimento e a estabilidade de emprego dos seus funcionários (BERNARDES,

2000). A partir desse quadro, esse estudo procura abordar as seguintes questões:

- Por que a crise no setor?

- Quais as principais mudanças ocorridas com o processo de privatização?

- Quais foram as mudanças ocorridas com os funcionários demitidos em 1994?

- Quais foram as mudanças ocorridas com os funcionários que se mantiveram

empregados logo após a privatização em 1994?

- Qual o perfil dos novos funcionários contratados logo após a privatização?

- Quais foram os impactos ocorridos em relação à mobilidade espacial dos

funcionários demitidos e dos novos admitidos no Município de São José dos

Campos após a privatização da Embraer?

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A questão que se inscreve como objeto deste estudo refere-se ao impacto

sócio-econômico da privatização da Embraer sobre os funcionários demitidos e os

novos funcionários da Embraer durante e logo após o processo de privatização, bem

como a mobilidade espacial desses funcionários, no contexto da cidade de São José

dos Campos. Busca–se, também, compreender e analisar as condicionantes para o

sucesso industrial da Embraer, nas décadas de setenta e oitenta, sua posterior crise

deflagrada no final dos anos oitenta e aprofundada nos anos noventa, culminando

na sua privatização em 1994.

Essa investigação pretende captar a configuração social de cada realidade

estudada, de forma a possibilitar a compreensão. Se, de um lado, os dados

estatísticos dão uma primeira aproximação à investigação, de outro, têm seu alcance

analítico ampliado, quando complementados com outras informações.

Assim sendo, foram utilizadas as seguintes fontes de informação:

1. Entrevistas com os ex-funcionários, funcionários que permaneceram e novos

funcionários da Embraer.

2. Relatos de experiências e depoimentos dos ex-funcionários, funcionários que

permaneceram e novos funcionários da Embraer.

3. Depoimentos dos diretores e gerentes da Embraer.

4. Histórias de vida com alguns ex-funcionários, direção e novos funcionários da

Embraer.

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Neste levantamento de campo foram obtidas informações sobre os aspectos

sócio-econômicos, psicológicos, educacionais, profissionais, além de informações

sobre a mobilidade espacial desses indivíduos em função das alterações ocorridas

na empresa.

O PROCESSO DA APROXIMAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

A escolha do tema partiu das lacunas existentes no conhecimento acerca dos

impactos observados entre funcionários que permaneceram, ex-funcionários, novos

funcionários e nova direção da Embraer e o impacto da mobilidade espacial com dos

mesmos sobre o Município de São José dos Campos – SP.

A aproximação do objeto de estudo iniciou-se com o cotejo de bibliografias

sobre a Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB) e, principalmente, sobre a Embraer

sob diversos aspectos.

A produção acadêmico–científica, como dissertações, teses e livros sobre o

tema, da história da Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB), muito contribuíram para o

entendimento da Embraer.

Também foram considerados textos e artigos que tratam da temática Embraer

e dos problemas ligados a ex-funcionários, novos funcionários, e suas vidas na

cidade: jornais, mapas, cadernos especializados e sites da Aeronáutica e Embraer.

O interesse pela temática surgiu a partir de duas grandes paixões que se

interpuseram ao longo da minha experiência de vida: a paixão pela arte da aviação e

a paixão pela cidade de São José dos Campos. A primeira das paixões surgiu na

infância, quando tive o primeiro contato com os aviões, mais especificamente,

quando meu pai que era Engenheiro Mecânico Aeronáutico (ex-funcionário do CTA)

me levou para conhecer o local onde ele trabalhava.

A segunda paixão começou a ser esboçada a partir da minha dissertação de

mestrado em Planejamento Urbano Regional, quando tive contato com minha cidade

e minhas raízes, passando pela experiência de pesquisa com o crescimento

populacional da cidade e culminando com a atual experiência de pesquisa no qual

as duas paixões se encontraram: isso despertou em mim alguns questionamentos

acerca dos conflitos, impasses ou dilemas que se interpõem na construção do objeto

de estudo.

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Estes questionamentos foram colocados ao longo dessa proposta no

processo de construção do objeto de pesquisa.

O conhecimento real do objeto de estudo também incluiu visitas à Embraer

com a orientadora desse estudo, Dra. Lucia Maria Machado Bógus e com a Dra.

Leila Maria da Silva Blass, professora do PEPGCS.

CENÁRIO DO ESTUDO O processo metodológico concebido a partir das informações, das

experiências de vida dos ex-funcionários, dos novos funcionários e nova direção nas

entrevistas realizadas, com relação ao processo de privatização da Embraer no

Município de São José dos Campos - SP, dentro e fora do espaço operacional da

mesma, ao longo de sua existência, associados à sociedade local.

Nessa busca, a linha de pesquisa adotada, com abordagem histórico-

sociológica, tem como propósito analisar a experiência de constituição,

desenvolvimento, crise e recuperação da Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB),

representada pela ex-estatal Embraer S.A e o impacto sócio-econômico, bem como

a mobilidade espacial ocorridos com os mesmo no Município de São José dos

Campos.

O resgate histórico será registrado não apenas seguindo o relato, a

memória e o sentimento individuais, mas tem como objetivos somar a esses

registros os momentos sociais, institucionais e coletivos, cristalizados nas vivências

com o lugar e com os grupos de referência das pessoas entrevistadas (BOSI, 2001).

LEVANTAMENTOS DE CAMPO

Como será explicitado no capítulo 4, nos procedimentos metodológicos, foram

utilizados levantamento de campo quantitativos e qualitativos. A presente pesquisa

foi realizada mediante um levantamento de campo que incluiu:

1) um questionário contendo quarenta e oito perguntas aplicadas a oitenta e

uma pessoas demitidas e entrevistas qualitativas com sete pessoas, também

demitidas da Embraer nos períodos anterior e posterior à sua privatização;

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2) um questionário contendo trinta e duas perguntas aplicadas a cento e oito

pessoas admitidas e entrevistas qualitativas com seis pessoas, também admitidas

logo após a privatização da Embraer;

3) entrevistas em profundidade realizadas com duas pessoas que trabalham

na Embraer desde a sua formação;

4) Foram realizadas ainda, duas entrevista em profundidade com AN, 44

anos, casada, Assistente Social e ex-diretora de Sindicato e MB, 64 anos, casado,

dois filhos, Engenheiro Mecânico, onde tem ocupado posições de chefia.

As Entrevistas foram realizadas a partir de roteiro estruturado, tendo as

perguntas sido feitas oralmente, utilizando – se o gravador para registro das

respostas.

O registro das entrevistas multiplica as oportunidades de melhor entender o

entrevistado, considerando-se que a subjetividade e o valor do assunto criam

espaço para discussão e confronto de informações.

A experiência das entrevistas com os ex-funcionários, novos funcionários,

gerência e nova direção da Embraer é preciosa e singular.

Trata-se de uma pesquisa de caráter exploratório porque, embora a

Embraer seja uma empresa mundialmente conhecida pela sua história vitoriosa e

objeto de vários estudos acadêmicos, trata-se de uma realidade multifacetada, que

ainda comporta muitas interpretações. Este trabalho pretende agregar informação

que possibilitem ampliar o conhecimento dos processos ocorridos na empresa e de

seus impactos sobre a vida da cidade de São José dos Campos.

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REALIZAÇÃO DE ENTREVISTAS EXPLORATÓRIAS COM INFORMANTES QUALIFICADOS Foram realizadas entrevistas com: - LF, ex-Ilustrador Técnico, 44 anos, casado, que trabalhou por 18 anos na Embraer

demitido na crise de 1994.

- MJF, 53 anos, casado, três filhos, ex-Controlador de Qualidade, foi um dos

demitidos da Embraer na crise de 1994.

- PRA, 53 anos, casado, dois filhos, Supervisor de Assistência Técnica, foi um dos

demitidos da Embraer na crise de 1994.

- RTR, 55 anos, casado, três filhos, Supervisor Administrativo, logo após completar

23 anos de trabalho na Embraer foi demitido.

- PG, 45 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Aeronáutico, ex- supervisor de

projetos, foi demitido logo após privatização.

- AFM, 47 anos, casado, três filhos, Chapeador, foi demitido na crise de 1994.

- PRB, Engenheiro, 51 anos, casado, dois filho, trabalhou 25 anos na Embraer

demitido logo após a privatização.

- ACMS, 45 anos, casado, cinco filhos, Engenheiro Mecânico Aeronáutico, há 22

anos trabalha na Embraer.

- HAF, 54 anos, divorciado, dois filhos, Engenheiro Mecânico Eletrônico, há 28 anos

trabalha na Embraer.

- MPM, 31 anos, solteira, Técnico de Logística, há 6 anos trabalha na Embraer.

- ERF, 27 anos, separada, dois filhos, Técnica de Informática, há 3 anos trabalha na

Embraer.

- DL, 54 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Mecânico, há 12 anos trabalha na

empresa.

- CEEL, 26 anos, solteiro, Técnico em Eletrônica, há 5 anos trabalha na Embraer.

- MB, 64 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Mecânico trabalha na Embraer desde

1994, onde tem ocupado posições de chefia.

- CC, 32anos, Solteira, Técnica em Gestão Empresarial, contratada em 2000.

- CJP, 42 anos, casado, um filho,Técnico Eletrônico, há 6 anos na Embraer.

- AN, 44 anos, Assistente Social e ex-Diretora do Sindicato dos Metalúrgicos.

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As entrevistas realizadas foram selecionadas de forma não intencional,

direcionadas para os benefícios ou conflitos ocasionados pela privatização da

Embraer e a mobilidade espacial ocorrida com os ex-funcionários e novos

funcionários na cidade de São José dos Campos – SP.

VISITAS ÀS INSTALAÇÕES As visitas realizadas aos setores de produção, logística, recursos humanos

e qualidade, possibilitaram perceber a Embraer e suas várias faces, vivenciar a

realidade e confrontá-la com as referências bibliográficas.

Assim, o estudo e análise das fontes secundárias foram articulados ao

levantamento de campo empírico, através do conhecimento dos espaços fora da

Embraer , o que permitiu traçar o quadro no qual o objeto se situa, buscando

elementos e contribuições teóricas, por diferentes ângulos do problema, com vistas a

definições, conexões e mediações para demonstrar as expressões e manifestações

da realidade em que se inscreve o problema, sem se limitar, no entanto, a simples

exibição de dados, mas compreender através deles, a questão da Embraer, ex-

funcionários, novos funcionários, nova direção e suas variáveis estruturais e sociais.

A pesquisa “não visa o futuro mas captar um campo de constrangimento e de

possibilidades, bem como os desafios que esse campo define”(QUIVY, 1998, p. 28).

A identificação e o levantamento de campo foram estruturadas a partir da

importância da presença da Embraer no Município de São José dos Campos - SP. A

pesquisa bibliográfica e as entrevistas exploratórias muito contribuíram para a

elaboração deste estudo. A coleta de registros proporcionou revelações

substantivas, que ampliaram o conhecimento sobre as relações entre a Embraer,

seus ex-funcionários, novos funcionários, nova direção e sobre a mobilidade

espacial observada no Município, durante e após o processo de privatização da

empresa.

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Assim, os resultados obtidos da somatória dos instrumentos aplicados, dos

estudos bibliográficos aos registros e anotações em levantamento de campo,

constituíram a base para as análises realizadas.

OBJETIVOS

Em face do tema exposto, foram definidos como os principais pontos a serem

desenvolvidos e integrados ao escopo temático da investigação:

1. Analisar a gênese, evolução, crise e recuperação da indústria aeronáutica em

São José dos Campos, SP.

2. Realizar uma análise do processo de mudança de gestão organizacional, dos

processos de aprendizagem e inovação tecnológica e das formas de

integração e organização do trabalho na Embraer.

3. Analisar o impacto ocorrido com os demitidos e os novos admitidos pela

Embraer, durante e logo após a sua privatização e a mobilidade espacial dos

mesmos, no município de São José dos Campos.

SUBJACENTES A ESSES OBJETIVOS, ESTÃO AS SEGUINTES QUESTÕES: a) Como a nova política de reestruturação societária da Embraer irá garantir

a sobrevivência da empresa?

b) Será necessária uma nova e decisiva participação e incentivo do Estado

nacional para o desenvolvimento da Embraer?

c) Se esta nova reestruturação não atrair investimentos para futuros projetos,

como possibilitar a manutenção e geração de novos empregos?

d) Como esta nova fase de desenvolvimento e retomada de crescimento

podem afetar a mobilidade espacial com a vinda de novas pessoas para São José

dos Campos - SP?

e) Se uma nova crise ocorrer, quais poderão ser os impactos sobre a cidade

de São José dos Campos?

Para atingir os objetivos expostos, estruturamos o trabalho da seguinte

maneira:

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No capítulo I, apontamos os aspectos considerados relevantes para o

presente trabalho, a evolução histórica de São José dos Campos – SP, o

nascimento da indústria aeronáutica e o padrão de desenvolvimento industrial, o

estilo de intervenção governamental, o papel decisivo dos militares na montagem do

sistema científico e tecnológico nacional entre as décadas de cinqüenta a setenta.

Serão analisadas as fases de consolidação da Embraer descrevendo as trajetórias

de lançamento e desenvolvimento dos seus principais produtos, sua participação no

mercado mundial de aviões e os sucessos e fracassos comerciais.

No capítulo II, serão analisados os motivos que conduziram a empresa à sua

crise no final da década de oitenta e posteriormente ao processo de privatização em

1994. Neste capítulo, será descrito e analisado o desenho das estratégias de

transformação na filosofia de gestão empresarial e moldura institucional da Embraer,

que priorizavam sintonizá-la ao atual ambiente de competição mundial de mercado,

mediante a instituição de uma administração de resultados, um plano de ação para

restauração e reestruturação da empresa, com o lançamento de novos produtos e

uma nova política de contratos, celebração de parcerias e alianças estratégicas.

No capítulo III, serão analisadas as estratégias de transformação na filosofia

de gestão empresarial e moldura institucional da Embraer, que prioriza sintonizá-la

ao atual ambiente competitivo internacional, mediante a uma administração de

resultados, um plano de ação para restauração e reestruturação da empresa. Em

seguida, a Nova Embraer no mercado atual.

No capítulo IV, passamos a analisar o impacto ocorrido com os funcionários

demitidos o perfil dos novos admitidos da Embraer no período que antecede e logo

após sua privatização em 1994, as mudanças ocorridas com os funcionários que se

mantiveram empregados e o impacto ocorrido na mobilidade espacial do município

de São José dos Campos – SP, após a privatização da Embraer, com relação aos

funcionários demitidos e os novos admitidos.

Por fim, apresentamos, nas considerações finais, nosso entendimento do

processo em andamento das políticas de competitividade e inovação para o futuro

da Embraer e do município de São José dos Campos - SP, a partir de depoimentos

obtidos e das análises realizados.

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CAPÍTULO 1 - SÃO JOSÉ DOS CAMPOS: DO NASCIMENTO AO CRESCIMENTO DA INDÚSTRIA BRASILEIRA AERONÁUTICA 1.1 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CIDADE DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS

São José dos Campos é um município de 1.142 quilômetros quadrados, 594

metros de altitude, localizado a 85 quilômetros a nordeste da capital paulista. Integra

uma das 15 regiões administrativas do Estado, criadas a partir de um decreto

estadual de 1990.

Com 600.049 habitantes, São José dos Campos é o maior em

população entre os oito municípios que compõem a denominada região de governo

de São José dos Campos (Caçapava, Igaratá, Jacareí, Jambeiro, Monteiro Lobato,

Paraibuna, Santa Branca e a própria São José). Atrás de São José estão Jacareí e

Caçapava (IBGE, 2004), conforme Tabela 1 e como mostram as Figuras 1 e 2:

Sua população está distribuída em dois distritos (São Francisco Xavier e

Eugênio de Melo), dois subdistritos (Santana e o Centro) e 318 bairros urbanos, 77

bairros rurais, 94 loteamentos clandestinos e 22 favelas (em anexo).

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TABELA 1 – Região Administrativa do Vale do Paraíba

Cidade População Cidade População

Aparecida 35.942 Natividade da Serra 7.261

Arapeí 2.821 Paraibuna 18.336

Areias 3.798 Pindamonhagaba 141.039

Bananal 10.113 Piquete 15.483

Caçapava 82.440 Potim 16.020

Cachoeira Paulista

29.770 Queluz 9.990

Campos do Jordão

48.711 Redenção da Serra 4.071

Canas 4.049 Roseira 10.056

Caraguatatuba 95.237 Santa Branca 14.704

Cruzeiro 76.530 Santo Antonio do Pinhal

6.938

Cunha 22.857 São Bento do Sapucaí 11.395

Guaratinguetá 111.673 São João do Barreiro 4.275

Igaratá 9.545 São José dos Campos 600.049

Ilhabela 25.408 São Luis do Paraitinga 10.747

Jacareí 208.471 São Sebastião 73.167

Jambeiro 4.435 Silveiras 5.669

Lagoinha 5.159 Taubaté 267.471

Lavrinhas 6.844 Tremembé 39.366

Lorena 82.854 Ubatuba 79.055

Monteiro Lobato 3.762 TOTAL 2.205.448

Fonte: IBGE, 2004.

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FIGURA 1 – Mapas São Paulo - São José dos Campos

Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano de São José dos Campos, 2003.

São Paulo - Município de São José dos Campos. Svg (1215KB, tipo MIME:

image/svg).

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FIGURA 2 – Cidades do Vale do Paraíba

Fonte: Secretária de Planejamento e Meio Ambiente, São José dos Campos, 2004. Ao longo de sua história, São José dos Campos tem vivido em constante

transformação, passando de pequena aldeia a um dos maiores pólos industriais e

tecnológicos do país (SINDUSCON,1994).

A povoação teve várias denominações:

• Vila Nova de São José

• Vila de São José do Sul

• Vila de São José do Paraíba, tendo este último os foros da cidade. Em

atenção à topografia do seu sítio, pela lei provincial n° 47, de 2 de abril de

1871, passou a se chamar São José dos Campos.

Em sua evolução o município passou por quatro distintas fases, a saber:

• Ciclo do algodão

• Ciclo do café

• A fase sanatorial (Estância Climática e Hidromineral)

• A fase industrial.

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1.2 - A PRIMEIRA FASE DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS

Segundo estudiosos, São José dos Campos foi uma cidade-laboratório graças

a estímulos externos. Assim foi com a fase sanatorial (primeira metade do século

XX).

De acordo com o Centro de Informações e Referências Culturais – (CIRC,

1996), a cidade era um depósito de balões de ensaio de instituições paulistanas,

como a Santa Casa de Misericórdia, depois a implementação do CTA, da Dutra, dos

investimentos multinacionais e militares. São José descaracteriza-se totalmente. É

quando se processa a transformação vertiginosa de cidade-sanatório para cidade-

indústria bélica e multinacional.

A cidade-indústria tinha como panorama político nacional um período

conturbado, com eficazes interferências na vida política do município. A visível

presença do Estado na vida da população do município mostrava a importância que

este adquiria para o desenvolvimento da indústria brasileira.

No período de 1889 a 1984, ou seja, em quase 100 anos de República, a

cidade teve apenas quatro prefeitos eleitos.

A arquitetura moderna e o urbanismo entraram em cena e passaram a

representar o cartão postal que atestava um novo tempo. Um dos destaques de São

José dos Campos era a passagem da Dutra, arte significativa da história do Estado

Nacional (DIAS, 2000).

Após a inauguração da Rodovia Presidente Dutra, no mês de janeiro de 1951,

não só São José dos Campos, mas todo o Vale do Paraíba tiveram um grande

impulso no seu desenvolvimento, com a instalação, às suas margens, de grandes

indústrias multinacionais. São José dos Campos foi beneficiada pelas condições

sociais e culturais de que era dotada:

• Possuía bons terrenos industriais, planos e baratos;

• Estava próximo dos grandes centros consumidores e distribuidores, São

Paulo e Rio de Janeiro;

• Situava-se perto dos centros fornecedores de matérias-primas, como

Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro;

• Apresentava clima seco, o que favorecia o ramo de telefonia;

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• Estava ligada à rede elétrica;

• Dispunha de mão-de-obra barata;

• Situava-se próxima do parque industrial paulistano, que, necessitando

expandir-se, procurou implantar subsidiárias próximas as suas sedes;

• Possuía um centro de pesquisas e de capacitação profissional de alto

nível como o Centro Técnico Aeroespacial (CTA);

• Oferecia incentivo fiscal.

A partir desta década, o papel do Estado como força motriz foi fator

determinante para a industrialização tardia, caracterizando São José dos Campos

como cidade industrial, tendo sido de grande importância também a implantação do

CTA para seu desenvolvimento.

1.2.1 - O MODELO DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL E TECNOLÓGICO NACIONAL

Um dos traços marcantes do desenvolvimento do capitalismo no Brasil,

identificado por alguns autores pela sua natureza tardia3 (Cardoso de Mello, 1992a),

está relacionado ao papel do Estado como a força motriz ou fator determinante ao

impulso à industrialização4. Esse papel foi exercido não só por intermédio das

funções fiscais e monetárias e de controle do mercado de trabalho ou de sua função

de provedor dos chamados bens públicos, mas sobretudo pela definição, articulação

3 Os estudos sobre a formação e o padrão de industrialização brasileira realizados por Cardoso de Mello (1992ª) e Carlos Alonso de Oliveira (1977) identificavam certos padrões industriais que se encontravam na base do conceito de capitalismo tardio, a saber: as industrializações originárias; as industrializações atrasadas (que se realizavam no momento da etapa concorrencial e têm um passado feudal), e as industrializações tardias (de passado colonial e de economias exportadoras nacionais, realizadas na etapa monopolista do capitalismo internacional). Cardoso de Mello estabelece uma periodização para entender o processo de formação e desenvolvimento da economia brasileira: economia colonial, economia mercantil escravista nacional e economia exportadora capitalista retardatária. A ´´ultima subdividida em três fases: nascimento e consolidação da grande indústria, “industrialização restringida” e “industrialização pesada”. Conforme a periodização adotada, a “industrialização restringida”, 1930 e 1955, seria caracterizada por um movimento endógeno de acumulação, cuja dinâmica seria dada pela acumulação industrial com a reprodução da força de trabalho e parte crescente do capital constante, porém sem as bases técnicas e financeiras suficientes para que se instalasse de um só golpe o núcleo fundamental da indústria de bens de produção que permitiria á capacidade produtiva crescer à frente da demanda. Por sua vez, “industrialização pesada” seria introduzida por um bloco de investimentos concentrados, entre 1955 e 1961, que teria alterado a estrutura do sistema produtivo, moldando um novo padrão de acumulação caracterizado pelo crescimento acelerado, à frente de seus mercados, dos setores de bens de população e duráveis de consumo (CARDOSO de MELLO, 1992a). 4 Concebemos como processo de industrialização “a constituição de uma estrutura industrial que progressivamente emancipa o processo de acumulação das restrições impostas pela base técnica e do bloqueio estabelecido pela divisão internacional do trabalho” (CARNEIRO, 1992, p. 145).

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e sustentação financeira dos grandes blocos de investimento que conduziram às

principais modificações estruturais da economia no pós-guerra e na criação da infra-

estrutura e produção direta de insumos intermediários indispensáveis à fase de

industrialização pesada (CASSIOLATO, 1994).

O desenvolvimento econômico e industrial no Brasil durante o pós-guerra tem

sido sempre relacionado à presença do chamado Estado desenvolvimentista5, ou,

em outras palavras, a intervenção estatal se constituiu na força motriz que permitiu a

criação e a dinamização do capitalismo no Brasil. “Em grandes linhas, a literatura

sobre história política e econômica brasileira classifica três grandes períodos que

foram cruciais na ação estatal no processo de industrialização. De modo geral, essa

linha interpreta que o processo de industrialização brasileiro passa a ser dirigido de

forma deliberada pelo Estado, no segundo governo de Getúlio Vargas, vai ser

moldado durante a industrialização pesada com o Plano de Metas, no governo de

Juscelino Kubstichek, apoiado na formação de tríplice aliança entre a empresa

estatal, a grande multinacional e a empresa privada nacional, e finalizado na década

de setenta pelo II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento), quando é

complementada a sua matriz de relações interindustriais. Nesse modelo político e

econômico o Estado cumpriu função ativa na estruturação e consolidação do

desenvolvimento da indústria nacional, viabilizando as condições necessárias para a

formação de uma economia industrial relativamente integrada, com participação

extensa do capital privado internacional e dos capitais nacionais privados e públicos,

e uma expressiva participação no comércio mundial. A partir da consecução de uma

estratégia de grandes blocos de inversões estatais, ampla e permanente proteção,

promoção e regulação, a estrutura industrial brasileira tinha alcançado, em 1980, alto

grau de regulação e integração intersetorial e diversificação da produção,

5 Bielschowsky (1988) identifica o período 1930-45 – sobretudo os anos do Estado Novo, como um início para um salto qualitativo na ideologia industrializante. O período é considerado pelo autor como a fase de origem do “ciclo ideológico do desenvolvimentismo”, conceitualmente entendido como um projeto de industrialização planejada e apoiada pelo Estado. O desenvolvimentismo, isto é, “a ideologia de superação do subdesenvolvimento nacional com base numa estratégia de acumulação de capital na indústria”, só viria a tornar-se hegemônico na segunda metade dos anos cinqüenta. Mas foi na segunda metade da década de 1950, até o início dos anos sessenta, que a industrialização brasileira sofreu transformações decisivas. Com a edição do Plano de Metas, no governo Juscelino Kubstichek (1956-1960), houve a primeira experiência efetiva de planejamento do desenvolvimento industrial como elemento central de uma estratégia abrangente de desenvolvimento econômico. Com o Plano de Metas, o Estado conseguiu pôr em marcha o processo de industrialização pesada, coordenando a formação de uma tríplice aliança entre a empresa estatal, a grande multinacional e a empresa privada nacional; a última, considerada a parte mais frágil do tripé, criando um sistema de proteção à indústria do mercado interno, fomentou o desenvolvimento industrial e investiu pesadamente em infra-estrutura e indústria de base.

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apresentando um dinamismo exportador de manufaturados bastante satisfatório. O

esforço tecnológico acumulado ao longo do processo de desenvolvimento

econômico conhecido como MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES6

limitou-se ao necessário à produção industrial stricto sensu. Essa foi a base que

estruturou o capitalismo brasileiro, desde a década de 1950 até o início dos anos

noventa” (CASSIOLATO, 1994).

1.3 - A SEGUNDA FASE DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS

A segunda fase do processo de industrialização do município de São José dos

Campos teve seu início a partir da década de 50.

Os principais atores responsáveis pela motivação da industrialização e

urbanização do município foram:

• a implantação da Rodovia Presidente Dutra (1950);

• a posição geográfica do município, situado entre as duas principais

regiões metropolitanas do país (São Paulo e Rio de Janeiro);

• a instalação do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (1950) – ITA, órgão

vinculado ao Centro Técnico Aeroespacial (1947) – CTA;

• a Política de Desenvolvimento Urbano e Regional do Estado de São

Paulo.

Conseqüentemente, instalaram-se no município de São José dos Campos

indústrias de grande porte como General Motors, Johnson & Johnson, Eaton,

Kanebo, Embraer, entre outras.

Com a instalação destas indústrias cresceu a oferta de trabalho no município,

ocasionando, assim, uma transformação na organização da população, que deixou

de ser predominante rural para se tornar predominantemente urbana (ARAÚJO,

2001).

6 A âncora de tal modelo de desenvolvimento estava assentada nas seguintes bases: na ampliação do mercado interno; em práticas protecionistas; nos investimentos públicos em infra-estrutura; nos investimentos públicos de longo prazo; nos subsídios e incentivos fiscais e nos investimentos e financiamento externos. O padrão de desenvolvimento era induzido pela liderança das indústrias metalmecânicas e químicas, que alavancavam os setores fornecedores de insumos (CONCEIÇÃO TAVARES, 1976).

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1.3.1 – O PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÂO Em 1925 é instalada a Tecelagem Parahyba, especializada em brim, que

depois se transformou em fábrica de cobertores. No final da década de 40, com o

reerguimento econômico do Vale do Paraíba, o município passa por um processo

acelerado de mudanças no sistema urbano. Destaca-se a instalação do Instituto

Tecnológico de Aeronáutica em 1947, inspirado no modelo americano do MIT

(Instituto de Tecnologia de Massachussets), projetado pelo arquiteto Oscar

Niemeyer, e a inauguração da Rodovia “Eurico Gaspar Dutra”, em 19 de janeiro de

1951 (BONDESAN, 1996).

O advento da Rodovia, que encurtava o percurso entre Rio-São Paulo, e o

desenvolvimento de pesquisas tecnológicas possibilitaram a intensificação da

industrialização nas décadas de 1960/1970, quando indústrias de grande porte

vieram ocupar grandes áreas de expansão urbana e ao longo da Via Dutra. A partir da década de 50, com a inauguração da Rodovia Presidente Dutra, a

cidade passou a sediar uma industrialização mais moderna e intensa. A própria

rodovia tornou-se o primeiro parque industrial joseense, surgindo espontaneamente

na medida em que as fábricas passaram a instalar-se às suas margens.

Os campos de São José de vegetação arbustiva e topografia regular, foram

transformados em enormes canteiros de obras: um após outro, todos com suas

respectivas placas de sinalização indicando a procedência da indústria a ser

instalada e informando prazos, os terrenos industriais passavam pela ocupação.

Tal como as indústrias, os loteamentos também foram surgindo em toda

parte, sem que a Prefeitura Municipal tivesse pessoal técnico para acompanhamento

das inaugurações relâmpagos e vendas simultâneas. Inúmeros loteamentos foram

vendidos em um único final de semana.

O surgimento apressado de indústrias e loteamentos se acentuou no início da

década de 60, dando origem a um crescimento desordenado, não permitindo que os

poderes públicos municipais conseguissem legislar e direcionar o crescimento

através de um zoneamento urbano – fabril (TEIXEIRA, 2000).

Inúmeras tentativas disciplinares foram tomadas pela Prefeitura Municipal,

inclusive a contratação de escritórios especializados em estudos e planos diretores.

Nada foi seguido: a Prefeitura Municipal mal teve tempo de cobrar os impostos, em

decorrência das mudanças bruscas verificadas na cidade durante a década de 60.

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Enquanto isso, São José dos Campos começava a receber um fluxo cada vez

maior de imigrantes, decênio após decênio.

Juntamente com a industrialização há o aprimoramento da educação. Esse

processo praticamente se inicia no ano de 1954 com a inauguração da Faculdade de

Direito, que foi a 5ª do Estado e a 3ª do interior, originando a Fundação

Valeparaibana de Ensino, hoje Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), seguida

em 1960 pela instalação da faculdade de Odontologia (UNESP). Em 1961 é criado o

Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e instituído o curso de Mestrado no

Instituto Técnico Aeroespacial (ITA), consolidando São José dos Campos como um

pólo científico-tecnológico e viabilizando a instalação de empresas nacionais de

base tecnológica (Embraer, Avibrás e outras) nos ramos aeroespacial, bélico e

eletrônico.

Além dos fatores descritos, o que muito contribuiu para essa intensificação no

processo de industrialização foi a interiorização das indústrias.

Na década de 70, houve um conjunto de investimentos públicos e federais

que contribuíram para a promoção da desconcentração regional de capital industrial

produtivo, tendo sido o Estado de São Paulo o maior beneficiado, assim como os

seus municípios.

Entre as políticas que ajudaram no processo de interiorização do

desenvolvimento econômico do Estado de São Paulo, encontramos:

• Plano rodoviário de interiorização de desenvolvimento, facilitando o

escoamento de produto para outros estados e cidades;

• Política de incentivos às exportações, que beneficiaria São José dos Campos,

devido às indústrias bélica e aeronáutica instaladas na cidade;

• Criação dos escritórios regionais de planejamento (ERPLAN’S), como

instrumento de ação e elaboração de diagnóstico sócio-econômico regional.

Na segunda metade dos anos 70, o Governo Estadual, com o apoio do

Governo Federal, procurou implantar o que se denominou Política de

Desenvolvimento Urbano e Regional do Estado de São Paulo, mediante a

introdução de alguns programas como “cidade média”, “macro-eixo”, entre outros.

Com essas medidas, houve um grande fluxo de recursos públicos destinados

ao interior do Estado para melhoria de infra-estrutura urbana, principalmente viária:

com isso houve a construção das rodovias dos Bandeirantes, Airton Senna e dos

Imigrantes.

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Essa descentralização teve o objetivo de aliviar o “caos urbano” da cidade de

São Paulo, pois o governo não havia sido capaz de resolver as questões urbanas,

que também seriam passadas de herança para o interior.

Devido a essas medidas São José dos Campos se tornou uma cidade

hospedeira tanto para migração de pessoas como para a instalação de novas

indústrias, conforme as Tabelas 2, 3 e 4. Nas últimas décadas, São José dos

Campos tem se destacado como um dos maiores pólos de pesquisa e produção

científica e tecnológica do país. Atualmente a Embraer é a quarta maior indústria

aeronáutica do mundo e a primeira da América do Sul7. Com uma economia

crescente, sua produção abrange os setores automobilístico, farmacêutico,

eletrodoméstico, além do aeronáutico, espacial e de telecomunicações. Este

desenvolvimento tem se refletido nas atividades de comércio e de prestação de

serviços.

7 A Embraer nasceu a 19 de agosto de 1969, como empresa de economia mista na qual a União detinha, por exigência legal, pelo menos 51% do capital votante, os quais deveriam ficar sob controle do governo por meio do Ministério da Aeronáutica.

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TABELA 2 - Evolução das Indústrias em São José dos Campos EVOLUÇÃO DAS INDÚSTRIAS JOSEENSES

Anos 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2003 2004

N° de Estabelecimentos

65 72 284 390 628 999 682 693

Pessoas Ocupadas 3515 6003 17866 49917 61532 47499 42098 49720

Fonte: 1950 – Divisão de pesquisa sócio-econômica – Ano 1976 1960 a 2000 – Cadastro Industrial São José dos Campos – Ano 2001 - 2004 – IBGE, 2004. TABELA 3 – Distribuição da população por local de nascimento em São José

dos Campos

Descrição População % Município de São José dos Campos 256.924 49,83 Outro município do Vale do Paraíba 42.405 8,23 Outro município do Estado de São Paulo

66.396 12,88

Outro Estado 145.229 28,17 Outro País 3.794 0,74 Não Informa 805 0,16 TOTAL 515.553 100,00

Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos

Campos, 2000.

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TABELA 4 - Distribuição da população do município nascida em outros estados brasileiros

Descrição População % REGIÃO NORTE 1.744 1,20 Acre 153 0,10 Amazonas 211 0,15 Amapá 38 0,03 Pará 652 0,45 Rondônia 96 0,07 Roraima 441 0,30 Tocantins 153 0,10 REGIÃO NORDESTE 35.335 24,33 Alagoas 2.491 1,71 Bahia 7.741 5,33 Ceará 3.832 2,64 Maranhão 1.246 0,86 Paraíba 3.583 2,47 Pernambuco 9.754 6,72 Piauí 3.967 2,73 Rio Grande do Norte 1.974 1,36 Sergipe 747 0,51 REGIÃO SUDESTE 85.175 58,65 Espírito Santos 1.342 0,92 Minas Gerais 71.052 48,92 Rio de Janeiro 12.871 8,81 REGIÃO SUL 20.484 14,10 Paraná 18.453 12,71 Rio Grande do Sul 1.227 0,84 Santa Catarina 804 0,55 REGIÃO CENTRO-OESTE 2.491 1,72 Distrito Federal 364 0,25 Goiás 862 0,50 Mato Grosso do Sul 767 0,53 Mato Grosso 498 0,34 TOTAL 145.229 100,00

Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos

Campos, 2000.

Como podemos verificar na Tabela 3, a metade das famílias atualmente

residindo no município de São José dos Campos não é natural do município. A

Tabela 4 mostra que a maioria dos “imigrantes” é originária da própria Região

Sudeste. Na Tabela 2, podemos ver o grande crescimento das indústrias e o maior

número de pessoal ocupado em 1990, com 61.532 pessoas, tendo em vista que

nesta década o município tornou-se o maior pólo industrial do Estado, com 628

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indústrias. Para o ano de 2000, houve um crescimento em números de indústrias,

mas o número de pessoas ocupadas diminuiu, devido à automação das indústrias e

à internacionalização econômica.

Conforme mostram as Tabelas 5 e 6, o parque industrial do município de São

José dos Campos, segundo os dados da Secretaria de Planejamento e Meio

Ambiente em 2000, era composto por 999 indústrias, sendo que em 2003 (Tabela 2)

houve uma redução para 682 indústrias e a diminuição das pessoas ocupadas para

42.098. Em 2004 o número de indústrias volta a crescer para 693 e aumenta o

número de pessoas ocupadas para 49.720.

TABELA 5 - Indústrias Conforme Porte Industrial em São José dos Campos - 2000

INDÚSTRIAS CONFORME PORTE INDUSTRIAL

PORTE INDUSTRIAL INDÚSTRIAS PESSOAL OCUPADO

Classificação N° % N° %

Micro/Pequenas 946 94,7 9.500 20,0

Médio 37 3,7 7.126 15,0

Grande 16 1,6 30.878 65,0

TOTAL 999 100,0 47.504 100,0

Fonte: Secretária de Planejamento e Meio Ambiente, São José dos Campos, 2000.

Micro / Pequena 0 – 99

Média 100 – 499

Grande 500 e mais.

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TABELA 6 - Indústrias Conforme Porte Industrial em São José dos Campos- 2004

INDÚSTRIAS CONFORME PORTE INDUSTRIAL

PORTE INDUSTRIAL INDÚSTRIAS PESSOAL OCUPADO

Classificação N° % N° %

Micro/Pequenas 658 94,94 9.447 19,0

Médio 28 4,0 8.452 17,0

Grande 7 1,0 31.821 64,0

TOTAL 693 100,0 49.720 100,0

Fonte: Secretária de Planejamento e Meio Ambiente, São José dos Campos, 2004.

Micro / Pequena 0 – 99

Média 100 – 499

Grande 500 e mais.

Fonte: Ano de 1950 a 1975 – Divisão de pesquisa sócio econômica – Ano 1976, IBGE, 2004

TABELA 7 – Evolução do Comércio em São José dos Campos EVOLUÇÃO DO COMÉRCIO JOSEENSE

Anos 1950 1960 1970 1975 1990 2000 2003 2004

N° de Estabelecimentos

222 357 1.020 1.240 7.340 11.270 20.581 20.890

Pessoas Ocupadas 597 977 3.243 5.800 13.720 27.440 50.112 52.780

Fonte: Ano de 1950 a 1975 – Divisão de pesquisa sócio econômica – Ano 1976, IBGE, 2004.

Analisando as Tabelas 2 e 7, podemos ver que São José dos Campos

apresenta um cenário diferente do país até 2000, em 2004 isso mudou, 51,9% das

vagas de trabalho se encontram nos serviços, 19,8% na indústria, 16% no comércio,

9% nos serviços domésticos e 2,8% na construção, segundo dados do IBGE. Em

São José dos Campos, 31.821 pessoas, ou seja, 64% das pessoas empregadas na

indústria joseense estão na grande indústria, sendo 14.466 pessoas empregadas na

Embraer. Isso representa 29% das 49.720 pessoas que estão empregadas na

indústria em São José dos Campos.

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Atualmente São José dos Campos é a terceira cidade mais rica do

estado e a nona cidade mais rica do país, segundo pesquisa divulgada pelo IBGE

em 2004, com um PIB de 13,6 bilhões de reais, que representa 1,08% de toda

riqueza produzida no Brasil, conforme Tabelas 8 e 9.

TABELA 8 – Riqueza no Estado As dez cidades com maior PIB do Estado (2004) Posição/cidade R$ 1º) São Paulo 140 bilhões 2º) Guarulhos 13,9 bilhões 3º) São José dos Campos 13,6 bilhões 4º) São Bernardo 11,3 bilhões 5º) Campinas 10,8 bilhões 6º) Santo André 7,7 bilhões 7º) Barueri 7,5 bilhões 8º) Jundiaí 6 bilhões 9º) Osasco 5,6 bilhões 10º) Sorocaba 4,8 bilhões

Fonte: IBGE 2004.

TABELA 9 – Riqueza no País As nove cidades com maior PIB do Brasil (%)

Posição/cidade 1999 2004 1º) São Paulo 11,6 10,4 2º) Rio de Janeiro 5,6 4,7 3º) Brasília 2,3 2,7 4º) Manaus 1,3 1,5 5º) Belo Horizonte 1,5 1,4 6º) Duque de Caxias (RJ) 0,8 1 7º) Curitiba 1,3 1 8º) Guarulhos 1,1 1 9º) São José dos Campos 1 1

Fonte: IBGE 1999/2004. O principal fator que coloca São José dos Campos entre as de maior poder

econômico do país é o grande volume de exportações conforme a Tabela 10. Uma

das principais empresas exportadoras e gerado de empregos diretos na cidade é a

Embraer, que exportou em 2003, R$ 2.007 bilhões , em 2004 R$ 3.348 bilhões e em

2005 R$ 3.267 Como mostra a Tabela 11 e gráfico 15 abaixo:

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TABELA 10 - Volume de Exportações em São José dos Campos (em US$)

2001 3.891,634

2002 4.221,553

2003 3.326,881

2004 3.974,488

2005 4.724,816

Fonte: Secretaria de Desenvolvimento Econômico de São José dos Campos, 2005.

TABELA 11- Volume de Exportações da Embraer (em US$)

2001 2.897,765

2002 2.396,431

2003 2.007,076

2004 3.348,985

2005 3.267,976

Fonte: Embraer 2005.

Segundo o IBGE, São José dos Campos em 2002 apresentou uma renda per

capita de R$ 23.982, média acima da registrada no Estado de São Paulo, que foi de

R$ 11.363. Isso se deve às grandes empresas e institutos de pesquisas na cidade,

como Embraer, General Motors, Johnson & Johnson, ITA, INPE, entre outros.

São José dos Campos vivenciou a ascensão e queda do setor industrial nos

últimos 20 anos. Este segmento foi o principal responsável pela projeção da cidade,

além de ter sido decisivo na expansão e no desenvolvimento, sendo causa do

crescimento e da mobilidade espacial e da renda municipal.

Mais de dois terços da riqueza de São José dos Campos estão concentrados

nos recursos gerados por três empresas: Revap, General Motors e Embraer. O

Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS)

arrecadado pelo município em 2000 foi de R$ 824 milhões, sendo aproximadamente

R$ 713 milhões provenientes do setor industrial. Em 2002 o valor total foi de R$

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509,5 milhões, cabendo R$ 412,4 milhões ao setor industrial. Em 2004 o valor total

foi de R$ 620,2 milhões, um aumento de 11,7%, sendo R$ 460,2 milhões providos

pelo setor industrial, conforme Tabela 12.

TABELA 12 – ICMS Arrecadado na Indústria

Ano Valores (R$) 2000 713.905.855 2001 594.434.225 2002 412.426.245 2004 460.212.213

ICMS total

1985 279.966.569 1990 738.050.414 1995 730.139.815 2000 824.113.946 2002 509.507.982 2004 620.220.412

Fonte: Fundação Seade 2005.

Esses números levam à constatação que o setor industrial tem registrado

perda de arrecadação, por outro lado continua sendo o principal responsável pelo

recolhimento de ICMS na cidade.

Nos últimos 15 anos, o setor vem sofrendo com o fechamento e transferência

de indústrias da cidade, influenciados pela abertura de mercado e pela chamada

“guerra fiscal” dos municípios.

Dados da Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) apontam

que em 1995 a cidade contava com 880 estabelecimentos industriais, sendo que em

2001 este número atingiu sua máxima com 1.073 indústrias; já em 2002 a tendência

de queda se confirmou com a diminuição para 675 estabelecimentos. Em 2003

houve um pequeno aumento, para 682 estabelecimentos e em 2004, para 693,

dados já citados na Tabela 2 - Cadastro Industrial de São José dos Campos. A

Tabela 13.

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TABELA 13- Empresas Industriais

Ano Estabelecimentos 1995 880 1996 910 1997 952 1998 963 1999 994 2000 999 2001 1.073 2002 675 2003 682 2004 693

Fonte: Fundação Seade – 2005.

O número de trabalhadores no setor industrial foi imediatamente atingido,

passando de 50.119 em 1991, para seu número mais baixo, 40.515, em 2002, uma

queda de quase 24% no emprego local. A partir desse ano podemos notar alguma

recuperação; já em 2004, com relação a 2003, houve um aumento de 22% no

emprego local, conforme Tabela 14 dados já citados na Tabela - Cadastro Industrial

de São José dos Campos):

TABELA 14 – Empregos na Indústria

Ano Vagas 1991 50.119 1995 45.268 1996 44.996 1997 40.644 1998 43.098 1999 41.939 2000 47.499 2001 47.504 2002 40.515 2003 42.098 2004 49.720

Fonte: Fundação Seade 2005.

Mesmo assim, logo após a reestrutração industrial que houve na década de

90, a indústria continua absorvendo o maior número de empregados.

Entre os 123.239 trabalhadores com carteira assinada em São José dos

Campos, 22.961 recebem mais que 10 salários mínimos. O percentual, de 18,6% do

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total da mão-de-obra no município, é um dos maiores do país, só comparável no

Estado de São Paulo com a renda dos empregados em São Bernardo do Campo -

SP.

O setor industrial é que eleva a renda dos trabalhadores nesses municípios.

Enquanto boa parte das cidades no Estado de São Paulo tem no setor de serviços a

principal força de trabalho, em São José dos Campos, a força motriz está na

indústria de transformação, com 39.892 vagas, seguida pelos serviços com 39.241

vagas.

A cidade de São José dos Campos tem a maior concentração de

trabalhadores nas grandes empresas, como no caso da Embraer, com 16.953

trabalhadores em 2005.

Essas indústrias atraem, para a cidade, profissionais com boa escolaridade.

Cerca de metade desses profissionais possuem o ensino médio completo. A

porcentagem de pessoas que recebem menos de 3 salários mínimos fica abaixo de

50% em São José dos Campos, ou seja, 53.096 pessoas; 20.090 ganham entre 3 e

5 salários mínimos e 26.867 entre 5 e 10 salários mínimos. As pessoas que recebem

mais de 10 salários são 22.961, como mostra a Tabela 15 abaixo:

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TABELA 15 – Dados Econômicos de São José dos Campos

Renda do Trabalhador • Total de trabalhadores formais (homens e mulheres):

123.239 • Total de mulheres: 40.914 • 1 salário mínimo: 2.024 • 1 a 3 salários: 51.074 • 3 a 5 salários: 20.090 • 5 a 10 salários: 26.867 • Mais de 10 salários: 22.961

Escolaridade • Analfabeto: 249 • 4ª série incompleta: 3.099 • 4ª série completa: 5.502 • 8ª série incompleta: 12.6195 • 8ª série completa: 20.848 • Ensino médio incompleto: 10.568 • Ensino médio completo: 45.566 • Superior incompleto: 5.599 • Superior completo: 9.613

Por Setores (homens e mulheres) • Extração mineral: 114 • Indústria de transformação: 39.892 • Serviços industriais de utilidade pública: 2.092 • Construção civil: 4.180 • Comércio: 24.066 • Serviços: 39.241 • Administração Pública: 12.946 • Agropecuária: 12.946

Por Setores (mulheres) • Extração mineral: 17 • Indústria de transformação: 6.420 • Serviços industriais de utilidade pública: 444 • Construção civil: 226 • Comércio: 9.249 • Serviços: 17.475 • Administração Pública: 6.964 • Agropecuária: 119

Fonte: Sesi (dados de 2004).

Esta pesquisa mostra que o trabalhador, em São José dos Campos, é bem

remunerado, principalmente se analisarmos o restante do país. Segundo a pesquisa

do SESI (Serviço Social da Indústria), apenas 2 milhões de pessoas no Brasil

ganham acima de 10 salários mínimos. Entre elas, 60% estão na Região Sudeste.

Mais de 40% do total, 813.117, estão no Estado de São Paulo.

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Podemos observar a grande importância da Embraer, que é o objeto de

estudo a ser analisado, no desenvolvimento e na geração de empregos na cidade de

São José dos Campos.

Podemos dividir a história da Embraer em duas fases: os anos como empresa

estatal, herança desenvolvimentista, que começam com sua fundação em 1969; e o

seu crescimento e consolidação quando se inicia a segunda fase, após sua

privatização em 1994, trazendo novos ciclos de investimentos e crescimento

econômico para a Embraer e a cidade de São José dos Campos.

1.3.2 - POLÍTICAS DESENVOLVIMENTISTAS As características do Estado brasileiro são singulares, pois ele nunca evoluiu

plenamente para um estado de bem-estar, tal como o construído nas sociedades

afluentes européias, mas também não chegou a concluir um sistema produtivo

industrial e de relações de trabalho do tipo fordista maduro8. Segundo Fiori (1993,

p.21) “analisando as características da industrialização brasileira, entre 1930 e 1980,

a fragilidade política do Estado impeliu o país a uma fuga para frente e pelos

8 O desenvolvimento industrial brasileiro, no início da década de cinqüenta, caracterizou-se pelo reduzido grau de aprimoramento tecnológico e pela simples importação de tecnologia, sobretudo incorporada ao setor de bens de capital. No decorrer da metade dos anos cinqüenta, com a crescente proteção do mercado mundial às importações, começaram a ser introduzidos no país os segmentos produtores de bens de consumo duráveis cuja base técnica, no cenário mundial, já se encontrava em adiantado grau de maturação. A estratégia industrial seguida deu-se basicamente por meio do investimento direto de empresas estrangeiras, nomeadamente no segmento de duráveis, e do investimento estatal nos segmentos de maior prazo de maturação e maiores requerimentos de capital. Assim como no Japão e na Coréia, a ação governamental foi crucial na montagem da estrutura industrial; uma característica distinta, segundo observaram Fleury; Fleury (1995), “foi a presença das multinacionais que, no Brasil, revelaram-se mais significativas”. De modo geral, ao longo do processo de substituição de importações, ocorreu a incorporação e a difusão de tecnologias estrangeiras por um número relativamente reduzido de empresas líderes. Enquanto se intensificou um movimento de importação de tecnologia e serviços tecnológicos, não se verificou, de forma sistemática, tal esforço interno na compra, transferência e adaptação de tecnologia externa (COUTINHO; FERRAZ, 1994). As reflexões elaboradas enfatizam bem esse argumento. Em seu estudo sobre o setor automotivo, tendo como objeto de análise as plantas da Ford do Brasil e da Inglaterra, Silva notava que a racionalidade e as práticas de gestão e organização do trabalho na indústria brasileira tinham sido mais determinadas pelo poder de um Estado de configuração militar do que pela lógica do paradigma clássico de produção taylorista-fordista. Silva acredita “que foi o caráter autoritário do Estado que moldou o fordismo no Brasil, da forma peculiar observada durante o período do «milagre econômico» [...]. A ditadura constitui importante condição específica da evolução do fordismo no Brasil. Durante mais de vinte anos, os militares determinaram as condições para o desenvolvimento econômico. Embora estas tenham disso estabelecidas nos moldes de algumas das condições institucionais anteriormente existentes, o caráter autoritário das relações em diferentes níveis – local de trabalho, repressão aos sindicatos, arrocho salarial, tribunais trabalhistas e Estado – aumentou enormemente, num processo de realimentação recíproca”.

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caminhos de menor resistência, criando uma estrutura industrial altamente

desenvolvida, porém sem auto-sustentação financeira e tecnológica”. Uma

industrialização que avançou e acomodou-se a um ambiente macroeconômico volátil

e permanente inflacionário. O Estado brasileiro não reproduziu a performance dos

Estados desenvolvimentistas asiáticos, tampouco foi keysiano e, evidentemente, em

nenhum momento foi social democrata. Com relação ao keynesianismo, Segundo

Fiori (1993, p.3) “seu recurso ao déficit público não visou ao pleno emprego ou à

sustentação do consumo ou a sustentação da economia”.

Para Fiori, o país percorreu, na mesma época do fordismo ou do capitalismo

administrado ocorrido em alguns países de velha industrialização, um ciclo

desenvolvimentista que se encerrou com a crise dos anos oitenta. Foi um ciclo

orientado pelo paradigma tecnológico industrial norte-americano, mas que não

logrou articular os seus mercados e sua institucionalidade sociopolítica segundo o

modo de regulação fordista. Ao mesmo tempo, não foi uma industrialização liberal do

tipo anglo-saxão, nem de tipo nacional, como a européia ou japonesa. Para Fiori, no

Brasil, ao contrário das industrializações tardias asiáticas, houve uma

industrialização baseada em uma estratégia baseada na tríplice aliança entre o

capital privado, internacional e o Estado, mas em que o investimento direto externo e

a instalação das grandes corporações num mercado interno protegido eram uma

marca decisiva e própria. De tal forma que, completado o ciclo de industrialização,

cerca de 40% do produto industrial já era produzido pelas grandes corporações

multinacionais que lideravam a produção de quase todos os setores mais dinâmicos

da economia brasileira. No Brasil, a industrialização se realizou de forma distante de

um estilo que se queira chamar de via prussiana, mas por um processo que

poderíamos denominar de via associada (FIORI, 1997, p.173)9.

No Brasil, até a década de oitenta, o setor público era a principal fonte de

recursos para a Ciência e Tecnologia (C&T), responsável por cerca de 80% do

dispêndio na área. Com o desequilíbrio financeiro do setor público, observa-se

paulatina redução dos orçamentos para C&T e progressivo enfraquecimento político

da infra-estrutura para a pesquisa científica e tecnológica montada nos anos setenta.

A crise externa e interna, nas últimas décadas, expôs a fragilidade de grande parte

9 Via de desenvolvimento da agricultura própria da Prússia Ocidental, durante o século XIX. Era caracterizada por uma aliança dos grandes proprietários de terras (Nobreza) e os grandes capitalistas urbanos, em especial os capitalistas financeiros, em detrimento do campesinato, sendo o Estado um co-financiador do processo.

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dos esforços privados em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e C&T, e a

dependência do sistema de conseqüências negativas da dicotomia institucional entre

os órgãos encarregados de formular a política científica e tecnológica estrutural do

país ficou mais nítida ante das dificuldades de internalizar e gerar capacidade de

inovação no complexo eletrônico10 (LAPLANE, 1997).

Com as políticas de corte desenvolvimentista alterou-se profundamente a

estrutura da indústria e de suas relações com o exterior, estabelecendo um padrão

mais próximo dos países centrais. Contudo, a manutenção do modelo de

desenvolvimento econômico apoiado no tripé não encontrava mais sustentação. As

incertezas geradas pelas mudanças no mercado financeiro internacional, o aumento

da participação do Estado e, em menor medida, do capital multinacional na

composição do PIB (Produto Interno Bruto), estimulavam o processo disruptivo do

tripé. No plano interno, a adversidade do quadro macroeconômico da década de

oitenta, aliado a uma desarticulação do padrão institucional do Estado

desenvolvimentista, e, de outro ângulo, no front externo, as mutações impostas pela

internacionalização da economia mundial e os novos padrões de competição

empresariais, surtiram efeitos nefastos sobre os fatores político-institucionais ou as

determinantes sistêmicas que regiam a competitividade da economia brasileira. A

herança da crise foi a perda progressiva da capacidade tanto da intervenção estatal

na aplicação das políticas fiscais, industriais e tecnológicas ativas, quanto de

ordenar e operar as políticas nas quais seu papel é mais passivo e de caráter

regulatório11.

10 Cassiolato (1994) apresenta informações que atestam que “desde os anos setenta, os pagamentos relativos à importação de tecnologia entraram em queda acentuada, atingindo níveis bastante baixos. Se medirmos essa queda com base nos pagamentos pelos contratos registrados no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), a redução foi de U$ 321 milhões, em 1980, para 174 milhões, em 1987. A porcentagem de pagamentos de contratos de transferência de tecnologia como porcentagem do PIB, que chegou a 0,35% em 1972, caiu firmemente, para 0,24% em 1980 e 0,07% em 1987. O colapso nos pagamentos por tecnologia importada reflete a quase total desvinculação da indústria brasileira em termos de uma importante fonte de conhecimentos para a sua competitividade internacional”. (Fleury, A; Fleury, M. T. L., 1995, p. 137). 11 Os esforços ou tentativas para “definir uma política industrial, entre 1985 e 1988, fracassaram por falta de respaldo político ou foram apenas parcialmente implementadas (como a Nova Política Industrial do governo Sarney, em 1988). Sobreviveram apenas algumas políticas e programas setoriais, tais como a Política Nacional de Informática, mal implementada (inclusive devido à falta de apoio dos ministros da área econômica) e fortemente contestada por interesses contrariados, e programas de investimentos em setores exportadores, geralmente com financiamento do BNDES” (SUZIGAN, 1996, p. 15).

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Com a crise política e econômica do Estado12 declinaram os investimentos

públicos no sistema infra-estrutural (energia, transporte e telecomunicações). Por

outro lado, a crise impactou de forma também desfavorável os determinantes sociais

de competitividade, sobretudo na qualidade e na magnitude das variáveis relativas à

educação, à qualificação da mão-de-obra e aos padrões de vida dos trabalhadores e

de consumo da sociedade. Sob grande incerteza em face da ameaça recorrente de

hiperinflação e regressão do sistema de financiamento e desagregação do Estado, a

estrutura empresarial brasileira não pôde crescer e se concentrar em grandes

grupos privados. O estreitamento da fronteira de oportunidades de acumulação

produtiva de capitais direcionou as estratégias para objetivos rentistas e para a

busca de ganhos patrimoniais, relegando a segundo plano a inovação industrial e

tecnológica. Enquanto algumas economias do Leste Asiático (notadamente a Coréia

do Sul) puderam saltar para frente, constituindo grandes grupos econômicos com

crescente capacitação técnica e com afirmação de marcas mundiais, o sistema

privado brasileiro foi obrigado a marcar passo (COUTINHO, 1996).

A principal fragilidade da indústria brasileira revelou-se não exclusivamente na

defasagem em relação às novas máquinas e equipamentos, mas, sobretudo, na

ausência de eficiência dinâmica; em outras palavras, a deficiência estrutural de

capacitação e inovação tecnológica. Esse baixo grau de desenvolvimento e de

aquisição de potencialidade tecnológica refletia a inexpressividade do setor industrial

no que se refere ao lançamento de novos processos e produtos que impliquem

ganhos significativos de produtividade e competitividade. Isso resulta, notadamente,

de práticas empresariais conservadoras de organização e gestão do trabalho, que

não só não estimulam como inviabilizam a incorporação da força de trabalho no

processo de aprendizagem e inovação técnica.

Na visão oficial do Governo o Brasil, desde o início da década de noventa,

ocorre uma transição de paradigmas, mudando-se de um modelo empresarial

12 A crise econômica no início dos anos oitenta encerra uma época de extraordinário sucesso do processo de industrialização. A característica do ajuste nos anos oitenta é que ele foi promovido pela política econômica que: “1 – provocou queda do salário real; 2 – permitiu ao setor privado transferir para o Estado sua dívida externa; 3 – promoveu fortes desvalorizações cambiais; 4 – aceitou a subida das margens de lucro; 5 – elevou as taxas de juros. A crise financeira do Estado se dá por três razões básicas: 1 – pelos efeitos das desvalorizações cambiais sobre a dívida externa; 2 – pelas conseqüências da recessão e da aceleração da inflação sobre a arrecadação fiscal e sobre as receitas das empresas estatais; 3 – pelo impacto das altas taxas de juros sobre a dívida mobiliária e bancária. Outro elemento decisivo é o aumento do poder econômico da grande empresa frente ao Estado” (CARDOSO de MELLO, 1992, pp. 61-62).

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familiar, comandado pelo Estado, de economia fechada, de baixa contestabilidade e

cultura inflacionária, para um modelo de economia internacionalizada, mais

“plugada” às correntes e tendências do livre comércio e aos fluxos tecnológicos

internacionais (MENDONÇA de BARROS; GOLDENSTEIN, 1997). A economia

brasileira, segundo alguns analistas, tem atravessado simultaneamente quatro

diferentes processos – abertura e internacionalização da economia, estabilização e

privatização, que vem provocando profundas transformações no seu funcionamento.

Por sua vez, o processo de privatização tira de cena, ou reduz muito, o papel de

uma das principais pernas do tripé, a empresa estatal. Essa ampla redefinição do

papel do Estado na economia, por meio da abertura comercial, da privatização das

empresas estatais e da desregulamentação de algumas atividades econômicas, vem

sendo conduzida sob a égide de reformas estruturais de inspiração neoliberal. Como

conseqüência, o modelo de desenvolvimento econômico e tecnológico tem sofrido

profundas mudanças. Um dos traços principais da estratégia de desenvolvimento

adotada no país foi a criação de empresas estatais, que tiveram a atribuição de

explorar recursos considerados prioritários, servindo para fornecer insumos básicos

ao setor privado. Nesse contexto, os órgãos públicos e as empresas estatais

tornaram-se os instrumentos efetivos da política industrial. O Estado, além de

assegurar a infra-estrutura básica, ocupava o papel empresarial nos segmentos da

indústria pesada e de alta tecnologia que o grande capital internacional não tinha

interesse e o nacional não tinha condições de se inserir em razão do alto custo de

entrada ou do risco de retorno dos investimentos. A base produtivo-tecnológica, ao

longo do processo de industrialização, fundou-se em investimentos de grande porte

e longo prazo e na aquisição de tecnologia estrangeira, exigindo participação ativa

do Estado na liderança no desenvolvimento econômico13.

13 Parece haver um certo consenso entre um conjunto de autores quanto ao papel desempenhado pelo empresariado diante do processo de industrialização brasileiro ou a ausência de articulação de coalizões industrializantes que alavancassem o processo de modernização nacional de forma dinâmica, tal como o visto em países retardatários bem-sucedidos. Nos estudos clássicos de Bresser Pereira, “Origens étnicas e sociais do empresário Paulista” (1964), de F.H. Cardoso, “Empresário industrial e desenvolvimento econômico” (1964), e de Eli Diniz, “Empresário, Estado e capitalismo no Brasil” (1978), os autores buscavam desvendar as razões que explicariam a fragilidade ou a aversão ao risco do empresário nacional e da burguesia industrial, ou, ainda, os fatores que inibiram a formação de uma força hegemônica capaz de conduzir o processo brasileiro de modernização econômica, técnico-produtiva e social. Nesses estudos observou-se que os empresários industriais no Brasil não chegaram alçar-se à posição de uma classe com ramificações e interesses econômicos e políticos em escala nacional. A rigor, os empresários indústriais avançadas (Esse trecho não faz sentido)– nas quais as camadas ou “elites” industrializantes se propunham mediante transformações radicais da estrutura econômica, mesmo do setor primário, a estabelecer um mercado nacional amplo

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Nessa direção, é possível identificar um número significativo de experiências

bem-sucedidas em áreas específicas, demonstrando as potencialidades das

estratégias tecnológicas autônomas sob certas condições. Tais casos salientam

especialmente a importância da existência de segmentos industriais que,

percebendo as oportunidades apresentadas por investimentos em tecnologia como

fator de aumento de competitividade, desenvolveram estratégias comprometidas, a

longo prazo, com P&D e que foram efetivamente capazes de explorar mercados

“customizados”, em que as relações fonecedores/produtores/usuários são

fundamentais. Entre esses casos, investigaremos a experiência estatal na indústria

aeronáutica. O estudo sobre a indústria aeronáutica brasileira insere-se neste novo

cenário de dramática e rápida mudança, no qual as oportunidades de entrada ou a

própria sobrevivência para os segmentos de alta tecnologia são cada vez mais

restritas (Ibidem).

Na seqüência vamos demonstrar o nascimento da indústria aeronáutica no

Brasil, a importância da política desenvolvimentista e a reestruturação produtiva na

indústria aeronáutica através do aprendizado e inovação científica e tecnológica.

Com o nascimento e instalação da Embraer, cresceu a oferta de trabalho no

município de São José dos Campos, ocasionando assim uma transformação na

organização da população: o município tornou-se um dos maiores pólos industriais

do Estado.

1.4 – O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA AERONÁUTICA NACIONAL A indústria aeronáutica caracteriza-se por ser um setor em que dispêndios em

P&D e os esforços em aquisição tecnológica são bastante elevados. O uso de

e integrado, faltou aos empresários a visão necessária, a consciência ou qualidade e atributos indispensáveis á ação transformadora, para liderar o avanço da industrialização e impor sua hegemonia política no processo de desenvolvimento econômico. Nesse sentido, os comentários de Sônia Draibe sobre este tema são bastante elucidativos e sintetizam de forma abrangente estas análises. Para a autora, “a industrialização não se fez sob o comando de um empresariado inovador, capaz de cumprir as tarefas impostas ao desenvolvimento do capitalismo em condições como as nossas. Mas também demonstraram que o processo de industrialização brasileiro esteve longe de se desenvolver a partir do desdobramento «natural» de uma estrutura industrial, que se teria diferenciado gradativamente sob os impactos dinâmicos de sucessivos estrangulamentos externos. Já na etapa de industrialização restringida o crescimento econômico requereu não somente uma forte coordenação estatal, mas também uma ação do Estado inclusive como empresário, capaz de estender e levar até os seus limites os horizontes estreitos do setor privado. A fase de industrialização restringida implicou um avanço significativo das forças produtivas e da divisão social do trabalho, avanço que certamente foi precondição para a industrialização pesada” ( DRAIBE, 1985).

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produtos de alta densidade tecnológica, a manipulação de novos materiais,

equipamentos e máquinas de última geração, componentes aviônicos, engenharia

de sistemas, inovações de design e uma força de trabalho de altíssima qualificação

sugerem que países pobres em capital humano e em tecnologia devem enfrentar

grandes barreiras de entrada para a instalação e o desenvolvimento aeronáuticos

nacionais. O sucesso da Embraer no mercado internacional e a capacidade dessa

empresa para desenvolver projetos próprios não podem ser adequadamente

compreendidos sem serem considerados os esforços e investimentos em tecnologia

que o país (governos e alguns empresários privados) efetuou a partir dos anos trinta

(CABRAL; BRAGA, 1986 apud BERNARDES, 2000, p.147).

Em toda a experiência histórica de formação da Indústria Aeronáutica

Brasileira (IAB), tal como o padrão histórico de instalação do sistema produtivo

industrial nacional, é patente o papel exercido pelo Estado no processo de evolução

tecnológica dessa indústria. Seja por meio do treinamento propiciado a engenheiros

brasileiros no exterior (em sua quase totalidade, oficiais das forças armadas

brasileiras)14, seja por meio de contratos de cessão de tecnologia com empresas

estrangeiras, seja por meio do fomento e manutenção de centros de P&D, ou ainda

convidando professores e técnicos estrangeiros, em todas essas formas o Estado

brasileiro buscava estimular o domínio da tecnologia aeronáutica. Contudo, os

esforços com tais objetivos não lograram apresentar grandes progressos

(BERNARDES, 2000, p.148).

Apesar de um brasileiro (Santos Dumont) ser considerado um dos pais da

invenção do avião, pelo projeto do 14 Bis, uma indústria aeronáutica nativa, no

Brasil, só iria surgir nos anos setenta. Entre as décadas de trinta e quarenta, no

entanto, houve algumas iniciativas de produção nacional sob licença e até alguns

projetos locais. Nesse período ocorre também crescente conscientização a respeito

do impacto estratégico das aeronaves no âmbito das Forças Armadas. Foram estas

Para (DAGNINO, 1987) “iniciativas fracassadas que conscientizaram os militares das

limitações e do despreparo industrial e tecnológico do Brasil em atender as

exigências da indústria moderna mundial, particularmente na questão da mão-de-

obra especializada”. No início dos anos cinqüenta, apesar dos esforços iniciados nas

14 O “primeiro engenheiro-aeronáutico brasileiro foi o coronel-aviador Raymundo Vasconcelos Aboim, que se graduou no Imperial College of Science and Technology (Londres) em 1924”. O M-6 havia sido projetado pelo major-aviador engenheiro Antonio Guedes Muniz, que fora formado em 1930 pela École Nationale Supérieure d´Aéronautique de Paris.

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décadas anteriores, a IAB não passava de uma promessa, sendo a Fábrica do

Galeão a única unidade operacional em funcionamento dessa indústria. A explicação

para tal descompasso residiria na falta de vontade política coordenada e na

debilidade da infra-estrutura industrial/tecnológica (DAGNINO, 1987, p. 219). Por

sua vez, tal fracasso deveria ser associado à ausência de uma política industrial

explícita para a IAB, somente aplicada na década de setenta com o surgimento da

Embraer, que privilegiasse o setor de forma continuada levando tais

empreendimentos a ficarem à mercê dos interesses conjunturais. Todavia, a

experiência de manufatura e o aprendizado de engenharia acumulado por essas

iniciativas serão cruciais na fase de consolidação da indústria aeronáutica brasileira

(CABRAL; BRAGA, 1986 apud BERNARDES, 2000, p.148).

1.4.1 – OS PRIMÓRDIOS DA INDÚSTRIA AERONÁUTICA BRASILEIRA A história da produção seriada de aviões no Brasil remonta à década de trinta.

Nesse período, foi projetado e produzido um número significativo de aviões de

pequeno porte, civis e militares. Em função dos limites do mercado interno, o

governo (por intermédio dos ministérios militares e de uma política de compras)

constituiu a única fonte de demanda capaz de viabilizar um empreendimento

aeronáutico no país.

A Companhia Nacional de Navegação Costeira, de propriedade do armador

Henrique Lage, foi a primeira empresa a produzir aviões em escala comercial, com o

incentivo do presidente Getúlio Vargas, em 1935. O projeto escolhido para a

produção foi o Muniz M-6. A concepção estrutural do M-6 serviu de inspiração ao

segundo projeto desenvolvido na fábrica de Henrique Lage: o M-7, um biplano de

treinamento, que se trasformou no primeiro avião a ser construído em série no

Brasil. Em 1940, Henrique Lage envolve-se na tarefa de projetar um monomotor de

asa alta tendo como modelo o protótipo EAY-201 Ypiranga, que havia sido

desenvolvido em São Paulo. Esse avião voaria pela primeira vez em 193515. Apesar

de terem sido construídos apenas cinco exemplares do Ypiranga, o seu projeto

inspirou o desenvolvimento de dois dos maiores sucessos da história da IAB: o HL-1

15 Esse avião foi resultado dos esforços de Orthon W. Hoover (piloto americano radicado no Brasil), Fritz Roesler e Henrique Santos Dumont, que organizaram a Empresa Aeronáutica Ypiranga em São Paulo em 1931 (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 2 apud BERNARDES, 2000, p. 148).

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e o CAP-4 (o Paulistinha). Esses aviões foram construídos pela Companhia Nacional

de Navegação Área (CNNA), também organizada por Henrique Lage. Ressalve-se

que nenhum desses aviões apresentava condições de competição em preço ou

qualidade com os aviões norte-americanos, em especial o Fairchild PT-19, que

passou a ser importado em meio à Segunda Guerra Mundial. Com a morte de

Henrique Lage em 1942 e o início das montagens de aviões PT-19 (concorrente

direto dos aviões produzidos por Lage) na fábrica do Galeão, o grupo Lage encerra

suas atividades da divisão aeronáutica em 1948 (CABRAL; BRAGA, 1986 apud

BERNARDES, 2000, pp.149-150).

A Fábrica do Galeão é um episódio importante na história da IAB, antes da

criação do Ministério da Aeronáutica em 1941, mediante acordo entre o Exército e a

Marinha e a firma alemã Focke Wulf Flugzeugbau Gmb. Tendo em vista a resolução

dos problemas de manutenção dos aviões das forças armadas, a Marinha brasileira

compromete-se a construir os pavilhões industriais do Galeão e a Focke Wulf se

encarregaria de fornecer os equipamentos e o ferramental. Em 1939, embarca para

o Brasil um grupo de técnicos alemães, chefiado pelo engenheiro Friedrich Stein

para treinar os operários brasileiros. Os programas desenvolvidos na Fábrica do

Galeão foram muito valiosos para a formação de mão-de-obra especializada e para

a acumulação de um estoque de conhecimentos cruciais para a consolidação futura

da IAB. Os aviões que aí foram produzidos ou montados eram superiores

tecnologicamente aos fabricados pelo grupo Lage. Finda a guerra e terminado do

contrato com a Fairchild, a Fabrica do Galeão realizou esforços para o

desenvolvimento de outros projetos sem muito sucesso, tais como uma aeronave de

treinamento com base em modificações no modelo PT-19 ou desenvolvimento de

um helicóptero experimental, monoplace, que foi abandonado em 1953. A realização

mais importante do período foi a produção em série, entre 1952 a 1953, do Niess 1-

80, um monomotor, monoplano de asa alta, biplace lado a lado com duplo comando

(Ibidem).

As experiências do Grupo Lage e da Fábrica do Galeão, cujas origens

estiveram associadas às necessidades da aviação militar, não foram as únicas. Na

área da aviação civil existiram investimentos, dentre eles destacando-se a

Companhia Aeronáutica Paulista (CAP), criada em 1942 por Francisco Pignatari.

Nessa experiência, como notaram Cabral & Braga, “pela primeira vez no Brasil uma

empresa aeronáutica utilizou-se dos serviços de um centro de pesquisa e

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desenvolvimento exógeno a sua estrutura: o Instituto de Pesquisas Tecnológicas

(IPT) da Universidade de São Paulo” (CABRAL; BRAGA, 1986, p.6 apud

BERNARDES, 2000, pp.150-151). O IPT será uma das peças importantes para a

criação da IAB. Este instituto nasce do Laboratório de Ensaio de Matérias da Escola

Politécnica da Universidade de São Paulo. Em 1934, o IPT transforma-se em

instituto independente, dedicado à prestação de serviços tecnológicos à indústria

nacional. Tais descobertas impulsionaram a formação de um grupo ativo de

pesquisadores voltados para as questões aeronáuticas dentro do IPT16. Por fim, em

1938 surge a Seção Aeronáutica, que desenvolveu uma série de projetos de

planadores e de aviões.

Na CAP – Companhia Aeronáutica Paulista, foram produzidos dois

planadores, um dos quais o Saracura, projetado pela equipe do IPT. O primeiro

avião da CAP foi o Planalto, um monomotor de treinamento, construído em madeira

nacional e que fora desenvolvido no IPT – onde recebera a sigla IPT-4. O maior

sucesso comercial da CAP foi o Paulistinha (CAP-4). Monomotor de asa delta e linha

clássica (como o HL-1 de Henrique Lage, ou o Pipper J-3 do Taylor Cub), o

Paulistinha abasteceu a FAB e os aeroclubes e ainda era exportado para Uruguai,

Paraguai, Argentina, Chile, Estados Unidos, Portugal e Itália. O sucesso do projeto

deveu-se não apenas às suas próprias qualidades, mas também ao

desencadeamento da Campanha Nacional de Aviação em 1941, lançada pelo

presidente Getúlio Vargas e apoiada pelos Diários Associados de Assis

Chateaubriand; transformar-se-ia num dos maiores sucessos comerciais da indústria

brasileira. Essa campanha, que visava a acelerar o processo de formação de pilotos

mediante a disseminação de aeronaves de treinamento pelos aeroclubes brasileiros,

forneceu a demanda necessária para a elevada cadência de produção da CAP-4.

Todavia, eventos originados pelo final da Segunda Guerra, desaceleração da

Campanha Nacional de Aviação e a retomada das importações de aviões civis

estimuladas pela crescente preferência por aviões de maior capacidade, em parte

motivados pela saturação de mercado para aviões tipo biplace, provocaram rápida

deterioração das condições de sobrevivência da empresa. Excetuando-se o CAP-9,

16 As pesquisas conduzidas nesse instituto eram dedicadas à identificação de madeiras nacionais apropriadas para a construção aeronáutica; dentre elas se destacava o freijó, que era importado em larga escala pelo Japão antes da Segunda Guerra Mundial para ser empregado na produção do caça Zero.

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nenhum desses modelos apresentava condições de competitividade com os

similares importados na época (Ibidem).

Houve ainda duas experiências significativas que fracassaram. Uma diz

respeito à criação, em 1943, da Fábrica Nacional de Motores (FNM) na Baixada

Fluminense (RJ). A FNM, que ficou conhecida historicamente como fabricante de

caminhões, inicialmente foi idealizada com o intuito de produzir motores para

aviação. A história da FNM está relacionada ao projeto de desenvolvimento nacional

forjado durante o Estado Novo, no contexto da Segunda Guerra Mundial. As

empresas estatais eram consideradas peças-chave na estratégia do Estado

brasileiro de dotar o país de uma infra-estrutura industrial visando novas formas de

acumulação (RAMALHO, 1997, p. 159). A conjuntura histórica mundial foi decisiva

na criação da fábrica. Foi o próprio presidente Getúlio Vargas, por um processo de

negociação com as forças “aliadas” (especialmente com o governo norte-

americano), que conseguiu os recursos para a montagem da fábrica, tendo como

contrapartida o envolvimento direto do Brasil na guerra. A montagem de motores de

aviação asseguraria uma reserva de mercado estratégica de produção fora da

Europa e do Oriente. A escolha de localização da fábrica nos contrafortes da serra

de Petrópolis, no Estado do Rio de Janeiro, se deu por fatores políticos internos e a

segurança proporcionada pela geografia da região, que a deixava a salvo de

bombardeios aéreos inimigos (VALLE, 1983, p. 5). Problemas relacionados à

instalação do projeto (em particular, a questão do fornecimento das máquinas

importadas em meio à guerra) atrasaram o início de suas operações resultando no

abandono dos planos originais. Além disso, com o fim da guerra e a queda de

Vargas houve interrupção das atividades produtivas da FNM.

A outra experiência refere-se à Fábrica de Lagoa Santa, originada também do

entusiasmo de Getúlio Vargas com a primeira travessia comercial do Atlântico Sul

por um trimotor francês em 1933. Segundo (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 9 apud

BERNARDES, 2000, p.152) “o projetista deste avião, o engenheiro René Couzinet,

foi convidado por Vargas a estabelecer as bases de uma indústria aeronáutica no

Brasil. Em 1935, Couzinet e uma comissão organizada pelo Ministério da Viação e

Obras Públicas escolheram Lagoa Santa a cerca de cinqüenta quilômetros de Belo

Horizonte como local para instalação da fábrica. A razão para tal escolha,

certamente inadequada do ponto de vista econômico, foi determinada por um

raciocínio estratégico: o desejo de manter a fábrica a salvo de ataques”. Ao erro

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locacional somaram-se a morosidade da burocracia governamental e o desinteresse

de grupos privados nacionais e estrangeiros em particular pelo empreendimento. A

conjuração de problemas relativos à aquisição de equipamento, dificuldades

administrativas, ineficiência na burocracia estatal não familiarizada com os trâmites

legais para importação de peças acabaram por inviabilizar os cumprimentos dos

prazos estabelecidos com os contratos, tornando a empresa inviável. Contudo,

conforme demonstrado na Tabela 16, o balanço das experiências pioneiras exprime

como saldo um número significativo de aviões de pequeno porte, civis e militares

(CABRAL; BRAGA, 1986 apud BERNARDES, 2000, pp apud BERNARDES, 2000,

pp.152-153).

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TABELA 16 – Aeronaves Construídas ou Montadas no Brasil na Fase Pré-Embraer

Período Modelo Produção Fabricante Protótipo

Henrique Lage e Muniz 1936 M-7 26 Fábrica Brasileira de Aviões 1

1937 M-9 40 Fábrica Brasileira de Aviões 1 1940-41 HL-1 108 Cia. Nacional de

Naveg.Aérea 1

1942-48 HL-6 60 Cia. Nacional de Naveg.Aérea

1

Grupo Pignatari 1942-43 CAP-1

Planalto 9 CAP 1

1945 CAP-3 8 CAP 1 1943-48 CAP-4 777 CAP 1 Neiva e Aerotec 1945-58 Neiva-B2* 20 Neiva 1 1952-56 Neiva-B1* 4 Neiva 1 1956-66 Paulistinha-

56 280 Neiva 1

1961-66 Regente 80 Neiva 1 1968-71 Regente-Elo 40 Neiva 1 1965-79 T-25 160 Neiva 1 1965-77 T-23 150 Aerotec 1 Fábrica do Galeão 1940-42 1 FG

2 FG 40 25

Fábrica do Galeão Fase alemã (Focke-Wulf)

1944-47 3 FG 220 Fábrica do Galeão

1947-53 5 FG 80 Fase americana (Faichild)

1953-59 Gloster Meteor TF-7 S-11(T-21) S-12 (T-22)

70 10 100 35

Fábrica do Galeão Fase holandesa Fase holandesa

Fonte: Dados reunidos por (Cabral; Braga 1986)

* Planadores

As empresas privadas e estatais surgidas nessa fase não desfrutaram dos

fatores estruturais que favoreciam o desenvolvimento do setor, em virtude das

limitações do mercado brasileiro; com isso o governo brasileiro constituía-se na

única fonte de demanda capaz de viabilizar um empreendimento de tal envergadura.

Segundo Bernardes (2000, pp.154-155) “dois traços marcantes dos primeiros vinte

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anos da IAB: a) a falta de continuidade, ou seja, nenhuma das fábricas ou das

iniciativas privadas e estatais que surgiram no período sobreviveu até a fundação da

Embraer;

b) o caráter restrito do processo de desenvolvimento tecnológico do setor. Os

projetos nacionais que eram desenvolvidos até então dependeram de esforços

individuais, personificados na figura de alguns poucos nomes como Muniz,

Vandaele, Niess, etc”. Em linhas gerais, nas etapas críticas do processo de

aquisição de tecnologia, a experiência da IAB não era estruturalmente propícia à

disseminação dos conhecimentos necessários para um desenvolvimento tecnológico

alicerçado em uma dinâmica endógena.

1.4.2 –A CRIAÇÃO DO CTA E DO ITA O início do processo que culminará no surgimento da Embraer dá-se com a

criação do Centro Tecnológico de Aeronáutica (CTA) em 1945, por iniciativa do

tenente Coronel Casimiro Montenegro Filho, quatro anos após a criação da FAB –

Força Aérea Brasileira. O primeiro instituto do CTA foi a escola idealizada por

Montenegro: o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA)17. Após quatro anos de

operação em caráter provisório no Rio de Janeiro, na praia Vermelha, o ITA é

transferido definitivamente, em 1950, para São José dos Campos18. O instituto foi

viabilizado pela cooperação do MIT – Massachusetts Institute of Technology

(E.U.A.). A criação do CTA funcionou como um divisor de águas na história da IAB.

Com o CTA, o Estado demonstrava a sua intenção de viabilizar o surgimento e a

manutenção de uma massa crítica de cientistas devotados ao desenvolvimento e/ou

absorção da tecnologia aeronáutica (CABRAL & BRAGA, 1986 apud BERNARDES,

2000, p.155). O primeiro reitor do ITA foi Richard H. Smith, que era professor do MIT

e veio, a convite de Montenegro, organizar o instituto. Os vetores básicos que

caracterizavam o plano de Smith para o CTA previam uma estratégia de longo

17 Na verdade, a primeira inspiração para o ITA surgiu quando Montenegro visitou o Centro de Pesquisas de Wright Field, no ano de 1943 (LOPES, 1994). Montenegro faleceu em fevereiro de 2000. 18 No final dos anos cinqüenta, São José dos Campos, situada no interior de São Paulo, na região do Vale do Paraíba, era uma cidade de cerca de 25.000 habitantes, muito procurada pelas suas virtudes climáticas. Em menos de trinta anos, essa cidade está transformada em um dos pólos tecnológicos mais desenvolvidos do estado de São Paulo, com uma mudança do perfil local dos recursos humanos assim como na formação de uma estrutura produtiva altamente avançada composta por segmentos do setor bélico, aeroespacial e eletrônico.

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prazo. A idéia-força do plano consistia na centralidade que o CTA ocuparia nas

atividades aeronáuticas desenvolvidas doravante no Brasil. Foram ainda criados

institutos associados, dedicados ao ensino de graduação e pós-graduação,

pesquisas, qualificação de fornecedores e atividades aeroespaciais. Embora o

enfoque central na formação dos estudantes do ITA fossem na área de projeto e

construção aeronáutica, poucos profissionais recém-formados poderiam alimentar

sonhos quanto ao uso de sua qualificação, uma vez que o segmento industrial

aeronáutico era incipiente, dirigido para a fabricação de aeronaves leves. A atitude

de poder fazer em pesquisa tecnológica com base científica implementada pelo ITA,

por pesquisadores treinados no MIT, foi responsável por alguns dos grandes

programas tecnológicos perseguidos ao longo das décadas de 60 e 70 (aeronáutica,

informática, microeletrônica e espacial) (CABRAL; BRAGA, 1986 apud

BERNARDES, 2000, p.155).

Ao fim da Segunda Guerra, é posto em marcha o processo de reconstrução

de uma nova ordem política e econômica mundial. O coronel Montenegro viu, nesse

momento, a oportunidade de atrair grandes pesquisadores do cenário científico para

o Brasil. A fama do engenheiro alemão Henrich Focke, um dos fundadores da fábrica

Focke Wulf de aviões, atraiu as atenções do coronel Montenegro, que prontamente

o convidou com sua equipe para dar o impulso inicial das atividades aeronáuticas no

CTA. Segundo (CABRAL; BRAGA, 1986, p.11 apud BERNARDES, 2000, p.155) “o

professor Focke impôs algumas condições para sua vinda ao Brasil – ele aceitaria o

convite, desde que lhe permitissem dar prosseguimento e fornecessem toda a infra-

estrutura necessária para o desenvolvimento do seu ambicioso projeto denominado

Heliconair, um avião de decolagem vertical. “A fama do professor Focke, a audácia

do projeto e a possibilidade de importar uma equipe completa de técnicos altamente

capacitados atraíram a atenção dos responsáveis pelo CTA. Em 1951, o coronel-

engenheiro Aldo Weber Vieira da Rosa entrou em contato com o professor Focke e

após uma visita deste às instalações do CTA foi acertada sua transferência (e de

sua equipe com cerca de vinte técnicos) para o Brasil. Em torno do projeto reuniu-se

uma equipe com cerca de quarenta integrantes (a equipe original dispunha de uma

série de técnicos brasileiros e estrangeiros radicados no país, tais como Joseph

Kovacs19), que trabalhou intensamente ao longo de 1952 e 1953”.

19 Como relatam Cabral; Braga (1986, p.11 apud BERNARDES, 2000, p. 155), “Kovacs era um projetista húngaro radicado no Brasil após a II Guerra. Antes de trabalhar como o grupo Focke,

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Com efeito, o primeiro grande projeto foi também um grande fracasso. Em

1954, era posto em curso o ambicioso projeto do Convertiplano, um avião com hélice

de decolagem vertical como helicóptero e a trajetória de vôo na horizontal como de

um avião convencional. Ele deparou-se com a precariedade do parque

metalmecânico nacional e a própria complexidade do projeto; após dispêndios da

ordem de 7 a 8 milhões de dólares, seu desenvolvimento foi interrompido, em 1955.

Todavia, afora o seu fracasso, o projeto constitui-se num processo de aprendizado

inestimável para toda a equipe técnica envolvida, assim como para os avanços

tecnológicos dos programas aeronáuticos elaborados posteriormente. Em termos

práticos segundo (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 12 apud BERNARDES, 2000, p.156),

“o único resultado desse projeto foi o protótipo BF-1 – o Beija-flor, um helicóptero

biplace – desenvolvido por Hans Swoboda (um integrante da equipe Focke, que

permaneceu no Brasil) e que viria a ser testado em vôo já nos anos 60”. O Instituto

de Pesquisa e Desenvolvimento (IPD) foi criado em 1954, com a finalidade de

realização de pesquisas nas áreas fundamentais de aplicação aeronáutica (projeto

de aeronaves, eletrônica, materiais, ensaios em vôo e motores). O aprimoramento

de motores pulso-jato pelo Departamento de Motores do IPD foi uma das principais

atividades do CTA na segunda metade dos anos cinqüenta. Desse instituto viriam

posteriormente os que seriam os primeiros produtos da Embraer.

Um evento significativo nessa fase é a consolidação da sociedade

Construtora Aeronáutica Neiva Ltda., ocorrida na década de 1950, tendo-se tornado

a maior empresa privada do setor, instalada em Botucatu, no estado de São Paulo.

Com as compras efetuadas pelo governo, a Neiva seria capaz de expandir as suas

instalações e atrair os melhores técnicos do setor nos anos sessenta. Nessa década,

a Neiva desenvolveu alguns aviões que se consagram na história da aviação

nacional, como o Regente (a primeira aeronave inteiramente produzida de metal e

em escala no Brasil) e o Universal (um monoplano de treinamento avançado). A

Neiva, posteriormente, transferiria sua divisão de Projetos para São José dos

Campos, e tornar-se-ia um dos principais centros de P&D em aeronáutica no país.

Para (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 13 apud BERNARDES, 2000, p.157) “A

dependência quase total da Neiva em relação ao Ministério da Aeronáutica (para

Kovacs esteve no IPT e após a experiência frustrada do Convertiplano, trabalhou na Neiva (1961-73), transferindo-se para a Embraer em 1973. Kovacs é um dos projetistas mais férteis da história da indústria aeronáutica brasileira, tendo sido o principal responsável pelo projeto do T-25 Universal da Neiva e pela concepção do Tucano T-27 da Embraer”.

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quem a quase totalidade de sua produção era vendida) acabaria, no entanto, por

determinar sua absorção pela Embraer em 1980” (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 13).

Atualmente, a empresa (Indústria Aeronáutica S.A.) é uma subsidiária da Embraer

dedicada à produção de aviões leves da linha Piper.

Na segunda metade dos anos sessenta, o IPD concentrou esforços em um

projeto: um avião turboélice bimotor, denominado originalmente IPD-6504. Mais

precisamente, em 1965, o então ministro da Aeronáutica, brigadeiro Eduardo

Gomes, aprovou o início do projeto IPD-6504, referente ao desenvolvimento desse

avião, de asa baixa e trem de pouso escamoteável. O Departamento de Aeronaves

(PAR) do IPD era chefiado pelo então tenente-coronel-aviador Ozires Silva,

graduado pelo ITA em 1962. Posteriormente, Ozires Silva estará entre os

fundadores da Embraer e será o principal executivo da empresa por dezesseis anos

consecutivos. E, em 1967, com o objetivo de atuar como órgão de homologação e

certificação de todos os aviões nacionais e estrangeiros que voassem no território

nacional, é inaugurado o IFI – Instituto de Fomento e Coordenação Industrial.

Posteriormente, atuará também como órgão qualificador das empresas fornecedoras

da Embraer. O IFI tinha por missão institucional atuar como interface entre os

institutos do CTA e a indústria e como órgão de certificação – (CABRAL; BRAGA,

1986 apud BERNARDES, 2000, p.157).

Com o aparecimento do CTA, inaugura-se nova fase, com o delineamento de

uma política setorial de longo prazo para a formação de recursos humanos e as

atividades de P&D. Nesse quadro, os instrumentos de incentivos perderam sua

natureza conjuntural. Os engenheiros egressos do ITA viriam a dar conotação

claramente nacionalista aos debates sobre a questão tecnológica na IAB. As

soluções nacionalistas, no entanto, deparavam-se com a capacidade financeira

limitada dos empresários brasileiros ou com a aversão e desinteresse aos seus

riscos. De outro ângulo, as empresas privadas nacionais (Neiva, Aerotec, etc) eram

“prisioneiras” do dilema imposto pelo descompasso e assincronia das políticas

governamentais. Uma vez que o mercado interno de aeronaves leves não era

protegido contra produtores estrangeiros, essas empresas tinham no próprio

governo a única fonte de demanda com capacidade de alavancá-las

economicamente. No final dos anos sessenta, com a IAB ainda incipiente, já haviam

sido fabricadas 2.000 aeronaves (em sua quase totalidade, monomotores) e o país

contava com dois centros de pesquisa (o IPT e o IPD do CTA) nos quais projetos

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aeronáuticos eram elaborados e onde havia uma escola de engenharia aeronáutica

(ITA) de excelente qualidade. A existência dessa infra-estrutura e científica e de um

estoque de recursos humanos, em grande medida concentrados no CTA, será fator

determinante para o sucesso futuro da Embraer (CABRAL; BRAGA,1986 apud

BERNARDES, 2000, p.158).

1.5 – EMBRAER: O NASCIMENTO Do mesmo modo que o CTA significou uma nova etapa na história da

indústria aeronáutica, a Embraer vai inaugurar o que podemos designar como a fase

moderna, como arranjo produtivo, econômico e comercial na fabricação de

aeronaves nacionais. Ozires Silva, que chefiava a equipe do PAR do IPD – sob o

comando técnico do francês Max Holste – havia convencido o Ministério da

Aeronáutica a autorizar uma alocação específica de recursos para o

desenvolvimento do IPD-6504. Segundo Ozires Silva, “o valor estimado do custo

deste projeto foi de US$ 70 milhões”. Os vários anos de estudos contínuos no

ITA/CTA (algo como três anos, da concepção à produção do protótipo desse projeto)

frutificaram no projeto do avião bimotor IPD-6504, batizado posteriormente como

BEM-110-Bandeirante, cujo primeiro protótipo voou em 36 de outubro de 1968. Vale

realçar que foi o próprio Ozires Silva quem conduziu o primeiro vôo do Bandeirante

até Brasília, quando o presidente Costa e Silva e alguns ministros de Estados

tiveram oportunidade de conhecer tal protótipo20. Nesse período o PAR-IPD também

desenvolveu outros dois projetos: um monomotor agrícola (o Ipanema) e um

planador de alto desempenho (o Urupema) (BERNARDES, 2000, p.159).

No final dos anos sessenta, o parque industrial brasileiro já havia

amadurecido razoavelmente. A indústria automobilística havia propiciado o

desenvolvimento de amplo e complexo parque de apoio, o que, ao menos em parte,

removia um dos obstáculos estruturais à produção doméstica para o fornecimento de

materiais e componentes para a produção de aeronaves. Nesse momento, tal

projeto passou a ser apoiado politicamente pelo regime militar, que interpretava ser

20 Conforme relata o próprio Ozires silva, em entrevista a Dagnimo, “este projeto além de contar com muita competência contou também com muita sorte, pois no retorno a São Paulo, logo após o vôo inaugural do Bandeirante, em Brasília, do qual o presidente Costa e Silva e seus acompanhantes haviam participado, o avião enfrentou uma pane elétrica que o fez navegar sem os instrumentos elétricos até a primeira escala em Minas Gerais”.

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chegada à hora da instalação de uma fábrica pioneira que, entre outros projetos

futuros, se dedicaria à produção do Bandeirante. O passo seguinte foi desencadear

intenso trabalho de convencimento e mobilização da iniciativa privada com objetivo

de atrair investimentos para a realização de tal empreendimento. Segundo Ozires

Silva, “desde o início os objetivos e os esforços foram realizados para que a

empresa fosse de capital e gestão privados”. Os militares buscaram o apoio dos civis

ou mais precisamente do capital nacional privado para a realização de uma empresa

civil21 (DAGNINO, 1987, p. 221).

Diante do desinteresse e aversão ao risco do setor privado em injetar

recursos em uma empresa aeronáutica desse porte, sem garantia concreta de

investimentos governamentais, como última alternativa utilizou-se o argumento de

que somente o governo poderia viabilizar tal empreendimento.

Coube, então, ao brigadeiro Paulo Victor, na época diretor do CTA, pressionar

o governo federal para a tomada de decisão sobre o futuro do empreendimento.

Após uma seqüência de reuniões com vários ministros, sob a liderança do ministro

da Aeronáutica, foi elaborada a primeira minuta do decreto-lei de criação da

Empresa Brasileira de Aeronáutica, uma indústria nova, destinada à fabricação

seriada do Bandeirante. Como recorda Ozires Silva, “o ministro da Fazenda, Dr.

Delfim Netto, propôs uma dedução de até 3% nas taxas devidas ao Imposto de

Renda para todas as empresas que investissem na Embraer. Esse incentivo, afinal,

foi fixado em 1%. Na realidade, eu próprio não acreditava que depois de tanto

esforço o nosso velho sonho fosse, finalmente, se transformar em realidade. Ao

término da reunião, quando fui me despedir do ministro Delfim, este referiu-se a

minha pessoa: até logo, Santos Dumont!” (Ibidem).

A Embraer nasceu a 19 de agosto de 1969, como empresa de economia

mista na qual a União detinha, por exigência legal, pelo menos 51% do capital

votante, os quais deveriam ficar sob controle do governo por meio do Ministério da

21 A previsão inicial estimava que seriam necessários investimentos da ordem de US$50 milhões para o início das operações da Embraer. “As razões para tal desinteresse eram basicamente as seguintes: a) as principais empresas privadas existentes na época, a Neiva e a Aerotec (fundadas em São José dos Campos em 1962), encontravam-se envolvidas com seus próprios projetos (o universal T-25 no caso da Neiva e o uirapuru T-23 (um monomotor de treinamento básico) no caso da Aerotec, e não tinham nenhum incentivo para investir recursos em um projeto de alto risco; b) empresários externos à indústria aeronáutica encaravam com reservas o seu potencial econômico e guardavam na memória os fracassos de iniciativas anteriores (Muniz, Pignatari, Lagoa Santa, Fokker...); c) as condições de transferência de tecnologia não chegaram a ser explicitadas, tornando difícil a avaliação do retorno ou dos riscos dos investimentos” (CABRAL ;BRAGA, 1986, p. 15 apud BERNARDES,2000, p. 159).

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Aeronáutica. Um arranjo de incentivo fiscal – pessoas jurídicas poderiam investir

anualmente até 1% do imposto de renda devido em ações da empresa sem direito a

voto, deduzindo tal quantia do pagamento de Imposto de Renda Pessoa Jurídica

(IRPJ) (Decreto-Lei nº 770.8/69), foi criado como forma de capitalizar a empresa

mediante investimentos privados. Com base nesse sistema de capitalização, a

demanda garantida pelo governo, que financiaria novos programas de P&D da

empresa e a qualidade de seus produtos, transformaria a Embraer no centro

dinâmico da IAB (Ibidem).

1.5.1 - POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO NOS ANOS SETENTA

É necessário não desconsiderar o ambiente econômico, o contexto político e

a ideologia nacionalista militar que governavam a estratégia de desenvolvimento do

país, e de certa forma influenciaram a criação e formação empresarial e tecnológica

da Embraer. Ozires Silva, em seu livro sobre a criação da Embraer, descreve muito

bem essa passagem: “Em 1969, o Presidente Costa e Silva, vítima de um enfarte,

viria a falecer lançando o país em uma crise institucional superada pelo triunvirato –

constituído pelos Ministros Militares, do Exército, da Aeronáutica e da Marinha, e os

quais assinaram os estatutos da empresa em novembro de 1969” (SILVA, 1985

apud BERNARDES, 2000, p.161).

Já no início da década de setenta, sob gestão do governo Médici, seria

implementado o I Plano Nacional de Desenvolvimento, correspondendo ao período

de 1972 a 1974. Esse plano priorizava como principais objetivos a serem

alcançados: incluir o Brasil, no espaço de uma geração, na categoria das nações

desenvolvidas; duplicar até 1980 a renda per capita, e, no período de vigência do

Plano, conquistar uma taxa de crescimento do PIB da ordem de 8 a 10%,

associando-a ao aumento da taxa de expansão do emprego, à redução da taxa de

inflação e uma política econômica internacional que acelerasse o desenvolvimento

econômico. Para a estratégia industrial, o I PND destacava como diretrizes

principais, além do fortalecimento do poder de competição da indústria nacional, o

fortalecimento da empresa privada nacional, equiparando as condições em que

operava às da empresa estrangeira, e a ampliação do papel da indústria como

instrumento de transformação tecnológica dos demais setores. A política científica e

tecnológica almejava o fortalecimento do poder de competição nacional em setores

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prioritários, especialmente em indústrias de alta densidade tecnológica. O setor de

bens de capital seria altamente estratégico, pois funcionaria como instrumento de

difusão de novas tecnologias. Havia preocupação com a modernização das

indústrias tradicionais e a expansão das exportações de manufaturados e dos

produtos de alta densidade tecnológica22.

Para Tapia (1995, p. 35 apud BERNARDES, 2000, pp.161-162) “a utopia de o

Brasil vir ser a grande potência em meados do século XXI alimentava as

expectativas dos setores militares e integrava a conclusão de um argumento

geopolítico, cujas premissas se apoiavam em evidências geográficas e em alguns

indicadores significativos do perfil do país (espaço e posição)”. Os pressupostos

baseavam-se na dimensão do espaço geopolítico interno, a massa demográfica, os

recursos naturais e a posição geoestratégica do Brasil, que reforçava sua condição

de maior potência sul-americana, de primazia entre os países em desenvolvimento,

de maior produtor de armamentos do Terceiro Mundo e de oitava economia do

mundo ocidental. Mas, “O aspecto novo desse nacionalismo reside na importância

do desenvolvimento científico e tecnológico para a construção do Brasil-Potência. A

autonomia e a soberania nacionais dependem da criação de uma capacitação

interna em termos científicos e tecnológicos. Orientação esta, que já vinha desde o

governo Costa e Silva com o Programa Estratégico de Desenvolvimento (PED)”

(TAPIA, 1995, p. 35 apud BERNARDES, 2000, pp.161-162). Havia convergência

entre o nacionalismo militar enraizado na doutrina da Segurança Nacional e o das

elites civis – burocráticas e científicas – associado à idéia do desenvolvimento

científico e tecnológico como fator de soberania para a autonomia (TAPIA, 1995

apud BERNARDES, 2000, p.156).

Como resposta ou “ajuste face ao primeiro choque energético”, nos anos

1970, o governo Geisel (1974-1978) adotará ambicioso programa destinado a

completar a industrialização pesada e redirecionar a economia brasileira para as

exportações. Com a implementação do II PND – Plano Nacional de

Desenvolvimento, nos anos 1970, conhecido como o período do milagre

22 O programa de ciência e tecnologia previsto para o triênio 1972 a 1974 previa acelerar a ação do governo mediante a operação do sistema financeiro de apoio ao desenvolvimento tecnológico e a coordenação da atuação das principais instituições governamentais por meio de um primeiro Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCT); desenvolver áreas tecnológicas prioritárias (energia nuclear, pesquisa espacial, oceanografia, indústrias intensivas em tecnologia, tecnologia de infra-estrutura e pesquisa agrícola), fortalecimento da infra-estrutura tecnológica e a capacidade de inovação da empresa nacional, privada e pública; acelerar a transferência de tecnologia; e integrar indústria-pesquisa-universidade.

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econômico23, ocorre nova experiência efetiva de planejamento do desenvolvimento

industrial no âmbito de um plano de investimentos. No governo Geisel foi arquitetado

um projeto de desenvolvimento ambicioso com o objetivo de inserir o país no grupo

das nações desenvolvidas. No II PND consubstanciou-se um projeto cujo núcleo

central estava integrado por duas diretrizes interligadas: a montagem de um novo

padrão de industrialização e o fortalecimento da empresa privada nacional (LESSA,

1978). Além disso, a ambição implícita e de longo prazo do II PND de fazer da

empresa nacional hegemônica no tripé (Estado, Capital estrangeiro, Capital

nacional) – uma recuperação com base em uma visão autoritária, de enunciados

estratégicos da década de 1950 – certamente reforçava as convergências entre

esses nacionalismos de vários matizes (TAPIA, 1995 apud BERNARDES, 2000,

p.161). Sob a égide do nacional-desenvolvimentismo, o II PND partia do pressuposto

da centralidade que a ciência e a tecnologia representavam para o progresso e a

modernização social e econômica do país24. Nesse quadro foram desenhadas as

diretrizes de PCT no II PND e no II PBDCT que abrangiam os setores de fronteira

tecnológica (nuclear, aeronáutico, etc), indústrias básicas de alto conteúdo

tecnológico (eletrônica e computadores) bens de capital, petroquímica e química,

telecomunicações, etc.25

23 O período compreendido entre 1967 e 1973, denominado de “milagre econômico brasileiro”, será caracterizado por um novo ciclo de expansão econômica, puxado pela indústria pesada e crescente importância do financiamento externo na economia. 24 Grande parte dos institutos de pesquisa e centros de P&D industrial de caráter público no Brasil foram instalados no período 1966-80 e, a partir de 1967, criou-se a maioria dos centros de pesquisa das empresas estatais. O período militar foi caracterizado pela edificação de um sistema de planejamento e desenvolvimento de instituições ou suportes institucionais direcionadas para a Ciência e a Tecnologia, uma vez que essas variáveis eram percebidas pelas forças armadas como elementos estratégicos para o poderio militar e para a segurança nacional. A ação governamental foi formalmente organizada na primeira metade dos anos 1970, em um Sistema Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – SNDCT. Desde então foram, “elaborados três PNDs – Planos de Desenvolvimento, e dois PBDCTs – Programas de Desenvolvimento Científico e tecnológico”. “O principal mecanismo utilizado pelo PBDCTs era o de incentivos fiscais para as atividades de P&D elaborados pelas empresas individualmente. Parecia haver uma premissa implícita de que a criação de capacitação para a inovação seria uma decorrência natural de atividades executadas em laboratórios” (FLEURY ;FLEURY, 1995, p.126 apud BERNARDES, 2000). A política científica e tecnológica do país, desde o início, foi marcada por forte intervenção do Estado, tendo como característica o distanciamento do setor produtivo, e a formação de “coalizão de interesses entre cientistas e militares” (GUIMARÃRES, ARAÚJO Jr.; ERBER, 1985 apud BERNARDES 2000). 25 Nesse contexto, a política científica e tecnológica formulada pelo governo Geisel foi consubstanciada no II PBDCT, que previa uma ação governamental voltada para o apoio à engenharia de projeto nacional e às empresas de consultoria; incentivo à instalação de centros de pesquisa nas empresas de maior porte ou através da associação de empresários; e a difusão no sistema produtivo dos resultados das pesquisas realizadas por instituições governamentais. Nesse período, como salienta Erber (1990, p.34 apud BERNARDES, 2000), são adotadas medidas para gerar no país uma norma de inovação interna e setores motores do progresso técnico, sob controle nacional, com as experiências das indústrias de informática, equipamentos de telecomunicações,

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É importante observar que o nacionalismo, que então nutria o II PND,

almejava conciliar o projeto político de Grande-Potência com uma sociedade

industrial moderna e socialmente justa e um maior grau de interdependência na

economia mundial (LESSA, 1978). O projeto “Brasil Potência” tornou-se também

conhecido como projeto de “construção da grande potência”, concebido pelos

militares ainda antes do golpe de 31 de março de 1964. Na visão militar, grande

potência é a configuração futura do Estado desejável, do Estado com capacidade

para conduzir qualquer guerra, em qualquer lugar, a qualquer momento e sob

quaisquer circunstâncias, para garantir interesses vitais do Brasil, no contexto das

relações internacionais. A partir do início da década de 1970, o conceito de grande

potência passou a ser considerado um dos principais vetores teóricos do

pensamento militar brasileiro (Ibidem).

1.6 – EMBRAER: SEGUNDA FASE: O DESENVOLVIMENTO Como demonstrado, a onipresença do Estado sob a orientação de uma

racionalidade estratégico-militar foi, sem dúvida, fundamental para a formação dos

fatores críticos de competitividade, mas, para o sucesso comercial e tecnológico, a

Embraer precisou voar além da posição confortável e segura do “céu de brigadeiro”

proporcionado pelas políticas de apoio governamentais ou do protecionismo de

mercado. Revelou-se imperativo para sua existência voar nas zonas turbulentas de

um mercado altamente competitivo, no qual a estratégia do plano de vôo se

materializou por uma coerente e consistente estratégia de capacitação tecnológica

pautada pela constante atualização e renovação técnico-produtiva, pelos

investimentos vigorosos em bens tangíveis e intangíveis, pela excelência na

formação dos seus funcionários, e, sobretudo, por não evitar em nenhum momento a

exposição à concorrência internacional. Conquistando e sustentando uma posição

armamentos, energia nuclear e aeronáutica. A política de inovação, segundo Erber, desdobrou-se em duas frentes – “de um lado, o Estado estruturava o setor de pós-graduação e pesquisa científica, dando-lhe nova dimensão e lançado os fundamentos dos serviços de tecnologia básica, de uso generalizado – normalização, metrologia (através do Conmetro – Conselho para Metrologia, Normalização e Controle e Qualidade), propriedade intelectual (reguladas pelo INPI – Instituto Nacional de Propriedade e Direito Industrial). De outro lado, fez uma política de fomento às atividades de inovações das empresas nacionais, através das empresas estatais – nelas montando centros de pesquisa e procurando combinar a política de compras com financiamentos à pesquisa e produção para capacitar tecnologicamente os fornecedores”. As políticas para os setores motores da inovação caracterizam-se pelo objetivo de buscar o controle nacional sobre a produção e a capacitação tecnológica.

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de destaque no mercado mundial de fabricantes de aeronaves, a Embraer

assegurou as economias de escalas necessárias para sua sobrevivência. Segundo

Panhoca (1995, p. 137) “a evolução de seus produtos foi um processo de

aprendizado tecnológico, de capacitação industrial e dos recursos humanos. O

sucesso da Embraer é o resultado desse aprendizado e capacitação tecnológica”

A indústria aeronáutica brasileira superou grande parte dos obstáculos

descritos acima com a criação da empresa estatal Embraer, em 1969, mediante a

assinatura do Decreto-Lei nº 770, pelo presidente Artur da Costa e Silva.

Efetivamente, a Embraer iniciou as atividades fabris em janeiro de 1970, tendo à

frente como o seu primeiro superintendente geral o coronel Ozires Silva, que

exerceria essa função por mais quase duas décadas. A Embraer iniciou as

operações com um quadro efetivo de 150 funcionários (todos provenientes do CTA)

num terreno estimado em 700.000m². Os primeiros operários que viriam a trabalhar

na linha de produção seriam recrutados, posteriormente, nos estratos superiores da

indústria automobilística. O capital inicial que foi subscrito pela União Federal era da

ordem de CR$ 5 milhões (cerca de US$ 1 milhão).

Segundo Fleury (1989 apud BERNARDES, 2000, p.166) os propósitos e

diretrizes que norteariam a produção de aeronaves no Brasil, assim como a função

que essa estatal ocuparia no desenvolvimento industrial do setor, são bem

classificados na ata de fundação da empresa, na qual se sobressaíam como

objetivos:

1. “promover o desenvolvimento da indústria aeronáutica brasileira e atividades

correlatas; projetar, construir e comercializar aeronaves e respectivos

acessórios, componentes e equipamentos”;

2. “promover ou executar atividades técnicas vinculadas à produção e

manutenção do material aeronáutico, de acordo com programas e projetos

aprovados pelo Poder Executivos”;

3. “contribuir para a formação de pessoal técnico necessário à indústria

aeronáutica e preparação de operários qualificados, podendo, para isso,

organizar cursos, conceder auxílios a estabelecimentos de ensino do país,

bolsas de estudo e, ainda, assinar convênio com entidades públicas ou

privadas para a formação de técnicos especializados”.

Para a compreensão da estratégia tecnológica e empresarial adotada

pela empresa é necessário verificar seu status de autonomia no arcabouço político e

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Instituições de Administração Direta

Fonte: Fleury (1989)

institucional do Estado desde a sua criação (ver Figura 3). Apesar de desfrutar de

elevado grau de autonomia no que tange a sua administração e no gerenciamento

interno de suas atividades operacionais, a Embraer era considerada uma instituição

de administração indireta vinculada diretamente ao Ministério da Aeronáutica. As

relações institucionais, de suporte e as atividades complementares entre a Embraer

e o CTA eram desenvolvidas pelo Ministério da Aeronáutica (FLEURY, 1989, p. 211

apud BERNARDES, 2000, p.168).

FIGURA 3 –Estrutura Organizacional do Ministério da Aeronáutica

O perfil dos principais

Funcionários do CTA que ajudaram a fundar a empresa nos propiciam uma

boa compreensão do grau de coesão e compromisso deste grupo de funcionários

MAER Ministério da Aeronáutica

Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento

CTA Centro Tecnológico

Aeroespacial

IFI Instituto de Fomento

Industrial

IPD Instituto para Pesquisa

e Desenvolvimento

ITA Instituto de Tecnologia

Aeronáutica

INPE Instituto de Pesquisa

Espaciais

EMBRAER

Instituições de Administração Indireta

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com o desenvolvimento dessa indústria. Esse perfil foi traçado em um estudo

realizado por (SBRAGIA; TERRA, 1989 apud BERNARDES, 2000, p.168). Segundo

Sbragia & Terra, este grupo oriundo do CTA era bastante jovem; na época, o mais

velho tinha 37 anos, mas eram pessoas com elevada capacidade técnica. Dos 35

engenheiros transferidos do CTA para Embraer, 33 ainda estavam na empresa em

1990, e muitos se tornaram diretores. “A Embraer foi fundada por companheiros de

escola, com alguma experiência trabalhando no CTA e alguns estágios realizados

no exterior (todos os diretores da Embraer fizeram estágios ou cursos no exterior)”

(SBRAGIA; TERRA, 1989, p. 29 apud BERNARDES, 2000, p.168).

Esses dirigentes que iniciaram a empresa e ficaram nela até antes da sua

privatização em 1994, como Ozires Silva e Ozílio Silva, dentre outros, “foram

pessoas que tiveram, então, a oportunidade de crescer junto com a empresa e

interagir no início, com profissionais estrangeiros altamente qualificados. A

criatividade, a coragem de inovar e a capacidade de auto-aprendizado, portanto,

podem ser destacadas como características importantes desse grupo de pessoas”

(Ibidem). Com relação a esse grupo podemos acentuar sua coesão. “A confiança

mútua e a informalidade nas relações pessoais sempre foram características desta

equipe” (SBRAGIA; TERRA, 1989, p. 290 apud BERNARDES, 2000, p.168).

A Embraer desde o início de suas operações dedicou-se ao projeto e

fabricação de produtos simples e adaptados às necessidades e condições do país.

Os primeiros produtos fabricados pela empresa foram justamente os desenvolvidos

pelo IPD do CTA, ou seja, o EMB-110 Bandeirantes (IP-6404), o planador Urupema

(EMB-400), o EMB-201 Ipanema (IPD-6909) e o EMB-326 Xavante. A estratégia

impediu que a empresa internalizasse os altos custos de desenvolvimento, uma vez

que todos eles foram integralmente desenvolvidos no CTA e, no caso da BEM-326,

na empresa italiana Aermacchi.

Com razoável sucesso, a empresa evoluiu gradualmente, pela escolha

tecnológica adotada baseada na geração de uma capacitação técnico-produtiva,

pela oferta de mão-de-obra fornecida pelo ITA26, pelo suporte irrestrito da ação

26 Como já notamos, a única escola de engenharia plena do Brasil é o Instituto Tecnológico de Aeronátuica – ITA. O ITA gradua também engenheiros-mecânicos-aeronáuticos, eletrônicos, de infra-estrutura aeronáutica e de computação. Desde 1950, mais de 8 mil engenheiros foram aí graduados. A pós-graduação, com a realização de cursos formais de mestrado e doutorado, foi organizada a partir de 1968, e no Inpe – Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais, a partir de 1968. Esses institutos, com sede em São José dos Campos, desenvolvem trabalhos em diferentes áreas de especialização do setor aeroespacial. O ITA dispõe de programas de pós-graduação em Engenharia

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governamental, pela relativa liberdade de ação dos executivos da empresa na

gestão dos negócios, e, em parte, pela forma como se desenvolveu, na época, a

demanda por aviões da Embraer (Ibidem).

1.6.1– A PRESENÇA DO ESTADO Desde sua fundação, a Embraer, ao longo de sua história, desfrutou de um

conjunto amplo e irrestrito de benefícios, isenções fiscais e tributárias, reserva de

mercado, encomendas governamentais, aliado ao inconteste apoio político

orquestrado ao empreendimento, até então inédito, de política industrial e

tecnológica no Brasil (PAULA, 1991 apud BERNARDES, 2000, p.170). O governo

concedeu um amplo terreno de 1.150.000m², em São José dos Campos (região

situada no Vale do Paraíba a oitenta quilômetros do município de São Paulo),

situado próximo ao quilômetro 146 da via Dutra, estrategicamente localizado ao lado

das instalações do CTA, assim como prédio, equipamentos, máquinas, pessoal

técnico e administrativo do IPD e os projetos desenvolvidos por esses institutos sem

ônus algum para a empresa. Suas instalações foram interligadas a um aeroporto,

que serve como pista de teste, vôos e preparação dos aviões para entrega. Segundo

Dagnino (1987, p. 222) “isto significou a continuidade, dentro da Embraer das

equipes de projeto, e da política dos militares, que haviam se envolvido com esta

indústria desde os anos 50 [...] assegurando um alto grau de coesão e coordenação

de todos os escalões superiores de administração e engenharia, assim como o

compromisso com os ideais de construção de uma indústria aeronáutica nacional”.

Assim sendo, a empresa pôde assumir de imediato a capacitação técnica necessária

na fase de projeto27.

Aeronáutica e Mecânica, eletrônica e Computação, infra-Estrutura Aeroespacial, engenharia e Organização Industrial e Física, além de cursos de extensão. O Inpe foi criado em 1961. É um instituto de pesquisa federal subordinado ao Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT, que tem como objetivo realizar pesquisas e desenvolvimentos nas áreas de Ciências Espaciais e da Atmosfera e Aplicações Espaciais; as atividades concentram-se em satélites e seus sub-sistemas, incluindo integração testes, rastreio e controle. O Inpe possui cursos de pós-graduação em Meteorologia, Sensoriamento Remoto, Engenharia e Tecnologia Espaciais, Computação Aplicada, Geofísica Espacial e Astrofísica. 27 Após a criação da empresa, houve um processo de distanciamento entre a Embraer e o CTA, quanto a investimentos em P&D (pesquisa básica e pura e aplicada), pois os projetos posteriores de tecnologia avançada foram realizados sem participação dos institutos de pesquisa. “Entre os motivos que levaram a esse distanciamento podem ser associados a forma como se deu a transferência da tecnologia desenvolvida pelo IPD para a Embraer, que provocou um esvaziamento do instituto, tornando-o incapaz de desenvolver outros projetos. O governo passou a investir diretamente na

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Em janeiro de 1970, foi promulgada a Lei nº 7.714, que permitia a dedução

de um por cento do Imposto de Renda de qualquer empresa sediada no país desde

que adquirissem ações da Embraer28. Esse engenhoso arranjo fiscal, arquitetado

pelo coronel Ozires Silva e pelo presidente Costa e Silva para a resolução do

problema de capitalização da empresa29, permitiu que desde a fundação até o ano

de 1985 a empresa captasse cerca de 500 milhões de dólares (DAGNINO, 1993, p.

51). Essa lei de incentivo, fundamental na fase inicial da empresa, foi extinta em

29/12/1988, portanto, vigorou por dezoito anos. Sem dúvida, a extinção do incentivo

contribuirá para a crise financeira que se abaterá posteriormente sobre a empresa.

Já no primeiro ano de vida da Embraer, em 1970, o governo, por intermédio

do Ministério da Aeronáutica, utilizou seu poder de compra encomendando oitenta

Bandeirantes e planejou a produção, sob licença, de 112 Xavantes (Aermachi 326).

Em seguida, o Ministério da Agricultura fez um pedido de cinqüenta aviões leves.

Essas encomendas correspondiam a aproximadamente oito anos de produção da

Embraer, a uma cadência de produção de duas unidades por mês. Essa encomenda

inicial correspondia, em valores de 1993, a US$ 600 milhões. O mercado inicial da

Embraer foi o mercado doméstico garantido pela política governamental. O uso do

poder de compra, especialmente nos cinco primeiros anos de existência da

empresa, revelou-se uma das grandes contribuições, quando a necessidade de

capital era intensa e o mercado interno era suprido pelas importações. Vale lembrar

que até a primeira metade da década de setenta o Brasil era um dos maiores

importadores de aeronaves americanas pequenas (monomotores e bimotores de até

dez lugares) (BECKER, 1986).

Em 31 de dezembro de 1974, pelo Decreto-Lei nº 1.386, a Embraer foi

isentada da tributação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI),

contemplando produtos aeronáuticos saídos de estabelecimento industrial

homologado pelo Ministério da Aeronáutica, bem como aparelhos e instrumentos

destinados a emprego em aeronaves, equipamento de segurança de vôo e

empresa, no desenvolvimento de aeronaves e capacitação da empresa passaram a ser custeados pelo Ministério da Aeronáutica. Com isso, o ITA passou a ser mero fornecedor de engenheiros, não havendo mais nenhum acordo para pesquisas relacionadas a área de construção de aviões” (BECKER, 1986, p. 49). 28 Foi então encetada uma grande campanha para estimular os empresários a comprar ações da empresa sob o slogan: “um país que voa vai longe: aplique 1% de seu imposto de renda na compra das ações da Embraer” (LOPES, 1994, p.165). 29 Pelo menos 95% do capital da Embraer era na época possuído por mais de 200.000 empresas. Até então nenhum outro setor da indústria tinha se beneficiado de um incentivo dessa magnitude.

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treinamento e, ainda, máquinas, equipamentos, ferramentas e gabaritos utilizados

pela indústria aeronáutica. Assegurou-se, de outra parte, manutenção e utilização do

crédito de IPI sobre insumos. Fixou-se em 10% a alíquota do IPI sobre aeronaves

em geral. Posteriormente, em 1976, a empresa foi beneficiada com isenções do

Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM). Conforme Dagnino (1987, p. 223)

“estes subsídios eram bastante consideráveis, pois representavam quase 2/3 do

preço de venda dos produtos como automóveis, por exemplo”.

A solução fiscal, na realidade, retirou as restrições de ordem tributária que

impediam a existência da atividade da indústria aeronáutica no país, haja vista a

importância não somente do mercado, mas também do domínio tecnológico

vinculado a esse segmento da produção; os concorrentes, sediados no exterior,

atuavam em condições reconhecidamente mais favoráveis, amparados de diferentes

formas para promover o desenvolvimento de produtos, o que lhes permitia ofertar

diferentes tipos de aeronaves e equipamentos de preços altamente competitivos,

contando ainda com o esforço de eficientes e diversificados esquemas de

financiamento. Isso a despeito do entendimento de que o Decreto-Lei nº 1.386/74

continua atualmente a beneficiar a indústria aeronáutica nacional.

Em 1975, mediante o Decreto 76.590, de 12 de novembro, foi estabelecido

o Sistema Integrado de Transportes Aéreos Regionais (Sitar). Esse decreto dividiu o

país em cinco regiões distintas, cada uma a ser operada por uma empresa de

transporte aéreo, criada especialmente para servir a área que lhe fosse destinada.

Segundo Dagnino (1987, p. 223) o objetivo da criação dos Sitars foi servir

localidades com razoável, porém não suficientemente grande, número de

passageiros para demandas de aeronaves modernas e maiores, por isso mesmo

abandonadas pelas empresas que operavam as linhas-tronco, e atender ao novo

mercado proveniente do crescimento econômico de algumas cidades, criando dessa

maneira um tráfego regular. Surgiram assim quatro empresas:

- “Taba (Transporte aéreo da Bacia Amazônica S.A.), responsável pela

operação de transporte na região Norte-Oeste, Acre, Amazônica, Pará, Mato

Grosso, Roraima, Rondônia”;

- “Nordeste (Linhas aéreas Regionais S.A.), operando na região Nordeste-

Leste: Piauí, Ceará, rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Maranhão, Espírito

Santo, estabelecendo conexões com o Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília”;

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- “TAM (Transportes Aéreos Regionais S.A.), operando na região Centro-

Oeste: parte dos estados de São Paulo, Mato Grosso com conexões para o Paraná

e o Rio de Janeiro”;

- “Rio-Sul (Serviços aéreos Regionais S.A.), operando na região Sul, Rio

Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo”.

O papel do governo nessa área foi crucial, pois é o Departamento de

Aviação Civil que ratifica a aquisição de equipamentos, além de controlar as rotas e

tarifas. No caso, foram concedidas às empresas linhas de financiamento para

aquisição das aeronaves Bandeirantes que se adaptavam perfeitamente a esse tipo

de transporte. Como resultado dessas medidas, as empresas adquiriram 52

aeronaves (DAGNINO, 1993, p.51). Outras políticas destinadas ao setor foram,

segundo Dagnino (1993, p.51): direção de recursos governamentais por intermédio

das agências de fomento à pesquisa e ao desenvolvimento industrial, mediante a

compra de ações da empresa; a virtual reserva de mercado estabelecida para os

produtos de emprego não estritamente militar; créditos e subsídios especiais à

exportação; empréstimos liberados em condições favoráveis pelo governo; forte

apoio da diplomacia brasileira à exportação de aeronaves de emprego militar;

celebração de associações estratégicas com parceiros externos, que se revelaram

fundamentais para o desenvolvimento da empresa. Em 1987, na gestão do

presidente Sarney, o primeiro governo civil eleito após o golpe militar de 1964, houve

concessão de 100 milhões de dólares provenientes do fundo Nacional de

Desenvolvimento Social, para o programa de desenvolvimento do caça a jato AMX

(DAGNINO, 1987, p. 353). Neste período o mercado civil de aeronaves respondia,

por 59% do faturamento da empresa, e a área militar por 41% das vendas.

Para Dagnino, presenciou-se no setor uma sincronia sem paralelo na

experiência de instalação e desenvolvimento industrial no país, entre a política

científica e tecnológica explícita, visando ao estabelecimento de mecanismos de

fomento à capacitação tecnológica, e políticas implícitas que as potencializavam.

Chamava a atenção para o grau de sintonia identificado no setor que não havia

“nem mesmo ocorrido em setores, como das telecomunicações, da informática e do

petróleo, onde se materializavam o que pode ser caracterizado como ‘subsistemas’

que levaram à implementação, de forma atípica em relação ao conjunto do sistema

de desenvolvimento científico e tecnológico nacional, de políticas de capacitação

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tecnológica convergentes com as políticas mais abrangentes adotadas no campo

econômico e industrial (DAGNINO, 1993, p. 52).

1.6.2 - DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO O processo inicial de transferência e aquisição de tecnologia pela Embraer

deu-se de forma excepcional e inédita na história da indústria nacional; além da

absorção de toda a tecnologia desenvolvida pelo IPD nos projetos das aeronaves

(Bandeirantes, Urupema e Ipanema), houve a cessão de todo o corpo técnico,

pessoal de administração e de quase a totalidade de sua Divisão de Aeronaves e

parcelas menores de outras divisões do Instituto, proporcionando à nova empresa a

imediata capacidade técnica e organizacional na fase de projeto, permitindo que

assumisse de pronto sua posição como organização produtiva e pudesse queimar

etapas como centro de consolidação da indústria aeronáutica nacional. A Embraer

passou a atrair a mão-de-obra com as melhores qualificações disponíveis no

mercado (CTA, IPT e empresas privadas), em virtude das condições e das

perspectivas favoráveis de trabalho e remuneração oferecidas pela empresa30.

Para compreender melhor a estratégia tecnológica eleita pela Embraer, vale

retroceder um pouco na história e lembrar a experiência das corporações

transnacionais do ramo automobilístico, que se instalaram no Brasil no final dos anos

cinqüenta, no governo de Juscelino Kubitschek (JK); elas controlaram e se

ocuparam do nível mais elevado da atividade produtiva industrial, a montagem

final31. Tal estratégia permitiu que as montadoras fossem capazes de controlar

plenamente o desenvolvimento do complexo produtivo e, assim, dirigir a cadeia de

fornecedores em toda a sua extensão. Essas lições foram bem apreendidas pelos

militares que almejam a soberania tecnológica e administrativa da indústria

aeronáutica. Nessa perspectiva, a Embraer foi então concebida como uma

montadora final, que se dedicaria exclusivamente à montagem de aeronaves. Para

não verticalizar desnecessariamente a produção de componentes e onerar a

30 Ressalte-se que a aquisição pela Embraer do que “havia de importante no IPD em termo de fonte de conhecimento tecnológico gerou como conseqüência o total esvaziamento deste instituto. Praticamente, duas décadas transcorreriam entre o término dos projetos desenvolvidos nos anos sessenta e o início de uma nova pesquisa de conteúdo tecnológico significativo no IPD: o desenvolvimento de uma aeronave não-tripulada (a Acauã)” (CABRAL ; BRAGA, 1986 apud BERNARDES, 2000p. 172). 31 Os detalhes de todo o processo de instalação da indústria automobilística estão bem documentadas em ARBIX; ZILBOVICIUS, (1997).

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estrutura de custos da Embraer, decidiu-se que o fornecimento de componentes

seria efetuado por outras empresas nacionais ou estrangeiras. A Embraer foi

concebida como uma estatal e como uma montadora final, que se dedicaria

exclusivamente á montagem de aviões pela materialização de um projeto

aeronáutico endogenamente concebido, tendo assim condições de determinar com

autonomia, em função da posição que ocupava e da estratégia de capacitação

tecnológica que adotou, o desenvolvimento do setor (DAGNINO, 1987, p. 224).

Uma analogia entre a indústria automobilística e a indústria aeronáutica

brasileira, no início dos anos setenta, pode ajudar a entender as discrepâncias

produtivas que as separavam. Enquanto as montadoras de automóveis produziam

cerca de 12.000 ou mais unidades a cada trinta dias, a cadência de produção da

Embraer era de quatro aeronaves por mês. Na produção de automóveis um

empregado trabalha em média cerca de vinte segundos por veículo produzido;

enquanto isso, na linha do Bandeirante (considerando a produção de quatro

unidades no mês), o tempo de trabalho é de quarenta horas por avião fabricado

(SILVA, 1985 apud BERNARDES, 2000, p.175).

A Embraer centrou seus esforços nas tecnologias-chave que determinam o

avião como produto final, renunciando aos sonhos dos anos trinta e quarenta de

construir um avião, com motores, componentes, peças e aviônicos totalmente

nacionalizados. A empresa estrategicamente privilegiou o domínio e a capacitação

tecnológica nas áreas de aerodinâmica, fuselagem e integração de projeto. Os

esforços foram dirigidos para a capacitação na área de projetos de aviões e na

integração do mix de componentes que não tinham condições de serem fabricados

pela Embraer, por inúmeras razões–escala, mercado, confiabilidade, tecnologia, etc.

A conquista de competência e capacitação na área de fuselagem da aeronave foi

considerada estratégica para o futuro competitivo da empresa.

A competência no projeto da fuselagem “era a única área-chave na qual o

conhecimento necessário não poderia ser obtido satisfatoriamente fora das fronteiras

brasileiras”. Esta era uma condição essencial para a definição autônoma do seu

produto e afirmação da empresa como montadora final de aeronaves. Conforme a

experiência demonstrará, tal enfoque provou-se indispensável ao controle e à

autonomia da indústria aeronáutica e da correspondente tecnologia, capacitando a

Embraer a gerir seu próprio negócio, e a criar as oportunidades de mercado.

Segundo Dagnino (1987, p.225) “ela foi mais importante para o sucesso comercial

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dos aviões da empresa do que o controle sobre as mais sofisticadas e numerosas

tecnologias que a produção de uma aeronave requer e dos outros militares de itens

que a compõem”.

Desde o início a Embraer tem investido na qualificação de seus recursos de

engenharia em aerodinâmica, estruturas, projeto, fabricação e integração de

componentes através de uma sólida competência na área de engenharia de

sistemas (entendida basicamente com a capacidade de combinar e integrar

componentes aviônicos, peças, sistemas eletroeletrônicos, mecânicos, materiais e

softwares de distintas procedências com a fuselagem fabricada localmente).

Saliente-se, tendo em vista as características de alta densidade tecnologia do setor,

que a autonomia tecnológica não é traduzida necessariamente na intensidade da

nacionalização das peças e componentes utilizados na produção de uma aeronave.

Na estratégia delineada para essa empresa, o controle de tecnologia por meio da

capacidade de integração de sistemas foi interpretado como uma meta mais crucial

que o aumento do índice de nacionalização 32.

A percepção singular sobre o conceito de produção, isto é, a noção de que

algumas tecnologias reproduzem pequenas variantes ou avanços tecnológicos

cumulativos e incrementais (“filhotes tecnológicos”) constitui-se como uma estratégia

vital e prioritária para a Embraer. Para Bernardes (2000, p. 176) “essa consciência

permitiu que a empresa identificasse dois tipos de “tecnologias-chave”, que deveria

atentar cada vez galgado um degrau da escada tecnológica”. São as que

apresentam um futuro promissor, como por exemplo, os novos materiais, cujo

potencial tecnológico e comercial é altamente estratégico. E, de outro lado, as

tecnologias que apresentam baixo nível de complexidade, mas que são essenciais,

pois asseguram a liberdade de ajuste na fabricação de demandas específicas de

projeto, de modo que permita a concepção autônoma de projetos (Ibidem).

Por outro lado, a descoberta das vantagens existentes no desenvolvimento

de versões derivadas de modelos básicos, provenientes de custos mais reduzidos e

rapidez no ciclo de produção, acabou por conduzir a Embraer a adotar o conceito de

32 Se as autoridades do setor aeronáutico tivessem perseguido a “miragem do índice de nacionalização, nos anos noventa ela poderia ter chegado próximo aos 50%, mas este fator teria implicado na adoção de uma estratégia tecnológica completamente diferente. Os custos seriam talvez até mesmo proibitivos e o tempo de entrada no mercado seguramente maior, pois tal estratégia implicaria a reprodução de todo o ciclo de desenvolvimento dos países centrais. Basta lembrar, por exemplo, que o número de pauses que fabricam motores aeronáuticos com tecnologia própria não é superior a cinco” (DAGNINO, 1993, p. 59).

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“família” usado tanto pela Boeing como pela Airbus em suas linhas de grandes jatos

comerciais. A “família” oferece a vantagem de comunalidade entre os aviões, o que

significa menor custo de infra-estrutura de manutenção, menores custos de

treinamento de pilotos e pessoal técnico. Ou seja, menores custos e mais rápida

disponibilidade dos aviões operadores. Além de reduzir o tempo nas decisões de

marketing, permitindo ao fabricante entrar com o seu produto no mercado em menor

espaço de tempo, cerca de dois ou três anos, metade dos cinco ou seis que leva

normalmente um projeto novo. Esse conceito foi aplicado no desenvolvimento de

vários aviões como no caso do Bandeirante, do Xingu, do Brasília, do CBA-123 e do

ERJ-145.

Segundo Dagnino (1987, p.238) “esses três enfoques – o conceito de

“família”, que permite a vantagem da comunalidade, associado às trajetórias de

cumulatividade no aprendizado organizacional e tecnológico de alta complexidade33;

o que permite identificar as tecnologias-chave críticas que permitem seu

aperfeiçoamento e sua apropriação; e a estratégia de investimentos vigorosos na

capacitação dos recursos humanos se cristalizaram na coluna central na busca pela

autonomia tecnológica pela Embraer”.

O processo de aprendizagem e formação da capacitação tecnológica é

especialmente estratégico para os países e empresas que pretendam competir nos

mercados avançados, tratando-se de uma questão de alcançar os concorrentes,

além de manter-se competitivo. Por sua vez, fazem uma distinção importante entre a

capacitação produtiva e a capacitação tecnológica de uma empresa. Segundo

Fleury; Fleury (1995 apud BERNARDES, 2000, p.179) “a capacitação produtiva

estaria relacionada à capacidade de implementar os componentes de um dado

33 É importante mencionar que a concepção de aprendizado está relacionada a um “fenômeno social pelo qual os indivíduos, a partir de capacitações acumuladas e ao interagirem em um contexto institucional específico, atuam de modo a gerar novas idéias, habilidades, conhecimentos e artefatos” e sustenta que as atividades inovativas são o resultado de vários processos de aprendizado. Esses processos de aprendizado se caracterizam por elevada incerteza quanto aos seus resultados” (PONDÉ, 1993). Os trabalhos de Nelson; Winters (1977 e 1982) evidenciaram que no uso e nas aplicações de tecnologia, existe em maior ou menor grau um conteúdo de conhecimentos tácitos e específicos (“idiossincráticos”), cuja transmissão e compartilhamento não se materializarão por meio de uma linguagem formal e codificada por manuais, pois estão intimamente incorporados às pessoas ou às rotinas de operação da firma, e, portanto, não podem ser inteiramente difundidos, tanto sob a forma de informação pública quanto de propriedade privada. Exigindo também relações interpessoais duradouras, acumulação de experiências compartilhadas e aquisição de capacitações pela demonstração efetiva” e pela abrangência e complexidade das capacitações necessárias à geração de novos produtos e processos. Um dos condicionantes da intensidade e da eficácia do aprendizado e das atividades inovadoras está nas suas relações sociais estabelecidas entre os agentes direta ou indiretamente responsáveis por sua geração. Em outras palavras, “a conduta interativa de vários agentes é responsável pelos processos de aprendizado e inovação” (PONDÉ, 1993, p. 72).

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sistema de produção, ao passo que a capacidade tecnológica envolveria os recursos

necessários para gerar e gerenciar a mudança técnica”.

Diante das definições apresentadas, a Embraer configura-se como empresa

que vem delineando uma trajetória dinâmica quanto aos processos de capacitação e

inovação tecnológica. Nesse sentido, o apoio governamental consistente e

continuado oferecido ao longo de sua história à Embraer diferiu das experiências

presenciadas por outros países periféricos, que utilizaram o que se denomina na

literatura como “estratégia de aprendizagem”34 Devemos acrescentar também que,

no caso da Embraer, verificou-se a importância das formas de aprendizado por

contratação, que possibilitou a apropriação de conhecimentos e habilidades

mediante a contratação de empresas ou pessoas. Esse aprendizado foi possível

pela associação com parceiros externos e viabilizado em grande medida pela

atuação governamental do Ministério da Aeronáutica. A produção industrial,

mediante acordo com a Aermacchi, para a produção do avião militar Xavante, é um

bom exemplo. Com a decisão do Ministério da Aeronáutica de equipar a FAB com os

aviões Aermacchi-236, não como produtos acabados, mas como um projeto de

fabricação licenciado por meio da Embraer, tornou-se imprescindível a vinda para a

empresa de especialistas italianos, que vieram auxiliar pessoalmente a produção

local, transferindo tecnologia e repassando o conhecimento “homem-a-homem”

(DAGNINO, 1987, p. 227). Nesse plano, destacam-se, ainda, o aprendizado

adquirido com a comercialização, mediante acordo com a Piper viabilizado pela

virtual reserva de mercado estabelecida pelo governo; assistência técnica e

manutenção de aeronaves (acordos de venda com companhias aéreas operadoras);

fabricação de componentes complexos sob encomenda (subcontratação com a

34 Os principais processos de aprendizagem podem ser identificados pelos mecanismos de: learning by doing, que “consiste em uma forma de aprendizado que ocorre no processo de manufatura, após as atividades de P&D terem se completado, materializando-se no desenvolvimento de uma habilidade crescente na produção, que reduz os custos com mão-de-obra por unidade de produto, ou ainda diminui a incidência de problemas de qualidade”; o learning by using “que ocorre com o uso do produto por seu usuário final, podendo resultar tanto em práticas de operação e manutenção mais eficazes quanto em informações que, repassadas para a firma produtora, repercutem na adoção de melhorias incrementais no produto (Pondé, 1993, p. 71); e o learning by interacting, que decorre da interação entre parceiros ligados por fluxos de bens e serviços que se originam da produção sendo um pré-requisito para as relações entre usuários e produtores sejam duradouras (LUNDVALL, 1988, p. 362). Para Kline; Rosenberg (1986, p. 382 apud BRNARDES, 2000, p.181), as inovações não devem ser exclusivamente associadas às rotinas de P&D, uma vez que os processos de aprendizagem tecnológicos têm demonstrado que “estas requerem a junção das esferas técnica e econômica de uma maneira que possa ser desempenhada pela organização ao mesmo tempo em que atenda também às necessidades do mercado, o que implica a fusão e cooperação entre muitas atividades nas áreas funcionais de marketing P&D e produção”.

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Douglas e a Boeing). O acordo do Ministério da Aeronáutica com a empresa norte-

americana Northrup Grumman, de quem o Brasil havia adquirido os F-5, beneficiou a

Embraer na aquisição de alguma capacitação tecnológica na engenharia, nas áreas

de soldagem metal-metal, materiais compostos e no uso de máquinas de controle

numérico (DAGNINO, 1993, p. 52).

A Embraer também se tornou conhecida no mercado mundial por ser

usuária de equipamento e softwares extremamente qualificados, não se contentando

simplesmente em saber operar os serviços ou a tecnologia que comprava. Ela vem,

sobretudo, buscando, com base no conhecimento operacional, modificar a

tecnologia para adequá-la às suas necessidades e, em muitos casos, aperfeiçoando,

corrigindo defeitos, ou, até mesmo, abrindo novas oportunidades de mercado para o

produto, fazendo a alegria dos fabricantes fornecedores. Nesse aspecto a Embraer

deve ser considerada uma usuária ativa e altamente qualificada de tecnologia.

Desse modo, a empresa tem conquistado consideráveis avanços no aprendizado por

mudança.

Saliente-se ainda que a Embraer sempre se distinguiu, em relação ao setor

produtivo brasileiro, pela percepção estratégica quanto aos programas de

qualificação e formação profissional dos seus funcionários no plano geral. Na

construção de sua escalada tecnológica, a excelência nos recursos humanos

sempre foi considerada como fator crítico de sucesso. E, nesse sentido,

identificamos também a importância e o enfoque estratégico que a empresa conferiu

ao longo de sua existência às formas de aprendizado pelo treinamento. Nos anos

iniciais da empresa, durante o processo de transferência da tecnologia de fabricação

do programa Xavante, cerca de setenta funcionários da empresa foram treinados na

Itália. Desse modo, a empresa pôde rapidamente passar da operação de montagem

à operação de fabricação nacional do avião. Especialmente relevantes foram as

parcerias para o treinamento da mão-de-obra desenvolvidas nos programas AMX e,

posteriormente, nos anos noventa, no ERJ-145 (SBRAGIA; TERRA, 1993, p. 25

apud BERNARDES, 2000, p.182). A empresa investiu, ao longo de sua história,

cerca de 3% do seu faturamento em treinamento, seja com recursos próprios, seja

com a complementação do governo brasileiro. O apoio do governo com bolsas do

CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento científico e Tecnológico, por

intermédio do programa RHAE – Recursos Humanos em Áreas Estratégicas, voltado

especificamente para a concessão de diversos tipos de bolsas, abrangendo desde o

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nível técnico até o nível especializado, com mecanismos de atração de retenção de

profissionais, foi fundamental para a consolidação e maturação da estratégia

tecnológica adotada pela empresa. A Embraer habitualmente enviava vários

engenheiros para o exterior para fazerem cursos de doutoramento e especialização

nas melhores escolas americanos, alemãs, japonesas, inglesas e francesas. Essa

conduta em relação aos investimentos de qualificação e formação profissionais, só

será alterada após a privatização da empresa, em 1994, quando os gastos

destinados a esse tipo de atividade serão reduzidos (cerca de 1% em relação ao

faturamento da empresa) e mais bem equalizados (Ibidem).

A coerência, cumulatividade e continuidade de uma trajetória tecnológica

fomentada de forma consistente pelas políticas governamentais de curto e longo

prazo e endogenamente cristalizada na empresa, além da intensa interação entre os

vários institutos do CTA, permitiram à Embraer a obtenção de uma capacitação

tecnológica e uma posição competitiva bastante incomuns em relação aos países

em desenvolvimento. Segundo Cabral (1989, p. 27) “planejadas ou não, as decisões

foram sendo tomadas dentro de uma seqüência bastante lógica quanto ao processo

de desenvolvimento tecnológico. Em primeiro lugar, a empresa adquire capacitação

em projetos em função da forma de transferência de tecnologia ocorrida.

Simultaneamente, faz-se um contrato de produção sob licença com o qual se ganha

muita tecnologia de fabricação (programa Xavante). Em seguida, celebra-se um

acordo com a Piper onde os benefícios se prendem mais aos aspectos de

comercialização e assistência técnica, completando, em linhas gerais, o processo de

desenvolvimento e aprendizado tecnológico”.

Por fim, é interessante notar que, embora esta fase seja caracterizada por

uma estratégia de desenvolvimento, aprendizado e capacitação tecnológica

consistente, coerente e bem sucedida, na qual se identificam formas ativas de

aprendizado tecnológico, devemos sublinhar que um sistema de análise do

desempenho não consistia uma das preocupações centrais desta estratégia. A

análise por desempenho é um tipo de aprendizagem dependente de mecanismos

formalizados e institucionalizados para gerar, registrar, analisar e interpretar

informações sobre o desempenho da produção. A escolha dos indicadores a partir

dos quais fazer a análise crítica do desempenho deve refletir a estratégia competitiva

da empresa. Genericamente falando, as informações mais importantes talvez sejam

as de custos. Um erro na identificação das variáveis críticas pode trazer sérios

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prejuízos para as empresas (FLEURY; FLEURY, 1995, p. 65 apud BERNARDES,

2000, p.182).

A constituição de uma visão de longo prazo, e o aprendizado fornecido pelas

experiências mal sucedidas na produção de aeronaves no passado permitiram a

conscientização de que esse setor só seria viável se houvesse boa oferta de mão-

de-obra qualificada e centros de pesquisa que organizassem e estimulassem o

desenvolvimento e a difusão dos conhecimentos aeroespaciais e aeronáuticos. Com

efeito, a criação do CTA e do ITA foi fundamental para o surgimento e o posterior

sucesso da Embraer. Por sua vez, a própria criação da Embraer foi um fato crucial

para o sucesso dessa indústria, uma vez que permitiu a centralização das

informações técnicas, produtivas e comerciais, possibilitando o acúmulo do

conhecimento tecnológico necessário para ao processo de inovação e

competitividade no plano mundial

A sincronia e consistência das políticas governamentais fiscais e tributárias,

industrial e tecnológica de corte direcionada ao setor, associadas à robusta infra-

estrutura tecnológica criada na região de São José dos Campos gerou economia de

aprendizados e externalidades importantes, que beneficiaram tanto a região como a

própria empresa. A Embraer também foi beneficiada por poderosos sistemas fiscais

que isentavam as importações de peças e componentes e linhas de crédito que

financiavam suas exportações. É digno de menção que a Embraer não usufruiu de

dispositivo institucional que impedisse a concorrência interna, ou seja, de nenhum

monopólio ou de reserva de mercado, de que desfrutava a Petrobrás ou que

protegeu as firmas nacionais de computadores da concorrência estrangeira.

Para Bernardes (2000, p.290), “a empresa contou também com uma

conjuntura externa favorável. O ajuste energético na década de setenta configurou

um ambiente internacional propício para as vendas do Bandeirante, a primeira

aeronave a ser vendida no exterior e que atendia às singularidades do mercado,

naquele momento, quanto à economia de consumo, desempenho e preço”. No plano

nacional, o Brasil da década de setenta atravessava um dos seus períodos históricos

mais fúnebres e sangrentos, como o governo ditatorial dos presidentes militares

Médici e Geisel. Nesse período, o Congresso Nacional foi fechado, houve a

perseguição a opositores do regime, inúmeros desaparecimentos, torturas e

assassinatos foram realizados pelos órgãos de repressão, os meios de comunicação

sofreram censura total, entre outros feitos repugnáveis e tristes dessa fase. Nesse

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quadro, os militares mantinham total controle político do país, e, portanto, não havia

o compromisso de submeter os gastos ou subsídios destinados a essa indústria à

aprovação da sociedade política ou civil, para conferir legitimidade quanto à

finalidade ou ao retorno social e econômico dos benefícios gerados por essas

atividades (Ibidem).

Podemos também relacionar o sucesso da Embraer à arquitetura de uma

estratégia empresarial dotada de uma racionalidade endogenamente determinante.

Uma gestão ativa quanto ao aprendizado e à coerência na trajetória tecnológica, a

excelência na qualificação dos recursos humanos com investimentos vultosos nos

ativos tangíveis e intangíveis, procurando acompanhar o “avanço” no setor e a

capacidade de identificar nichos de mercado mundial a serem explorados,

demonstraram-se estratégias sensatas. No entanto, tal como consta nos enunciados

descritos na ata de criação da Embraer, o objetivo do projeto militar era a instalação

e o desenvolvimento de uma capacidade tecnológica autônoma na produção

aeronáutica, e não a necessidade de gerar lucros. Talvez pela segurança e a

certeza que a fonte de onde provinham os recursos não se esgotasse tão cedo, a

empresa não dedicou tanta importância aos critérios de gestão de desempenho

financeiro, de custos de produção e de financiamento, sobretudo os relacionados ao

setor militar, como destinou à modernização das atividades tecnológicas (Ibidem).

Nesse aspecto, o descuido na análise de mercado no lançamento de alguns

produtos, a ênfase excessiva na tecnologia (como no caso das aeronaves Xingu e

do CBA-Vector) e o fator preço como reflexo de uma estrutura de custos e de

financiamento pouco adequada à realidade já apresentavam indícios dos problemas

que estariam por vir no final da década de oitenta. A cultura da empresa era

fortemente movida e influenciada pelos valores técnicos, corporativos e

nacionalistas. Se por um lado esses valores garantiam alto grau de união e

idealismo aos funcionários da empresa, por outro, eles certamente dificultaram o

desenvolvimento gerencial da empresa em direção a uma gestão mais competitiva

dos fatores de produção e dos recursos financeiros. Esses fatores já despontavam

na segunda metade da década de oitenta como elemento preocupante e

potencialmente desestabilizador na estratégia de gestão da empresa.

Esse ponto levantado por Bernardes (2000, p. 209) “é crucial para a

compreensão da crise que se abaterá sobre a Embraer nos anos noventa. Os

prejuízos que essa empresa acumulará e a vulnerabilidade de sua posição

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competitiva podem ser relacionados, em grande parte, a um sistema de análise de

desempenho bastante deficiente e, sobretudo, totalmente inadequado à realidade

política e econômica da segunda metade da década de oitenta em diante, quando os

arranjos fiscais e isenções tributárias que financiavam e sustentavam as operações

da empresa serão extintos, e o cenário de competição global será outro”.

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CAPÍTULO 2 – DA CRISE À PRIVATIZAÇÃO DA EMBRAER

A Embraer, tal como descrevemos, consagrou-se como um caso atípico de

autonomia e capacitação tecnológica no cenário produtivo nacional. Todavia, mesmo

essas vantagens competitivas consideradas virtuosas e paradigmáticas para uma

companhia de classe mundial, tais como a elevada qualificação de seu quadro

técnico de engenheiros, o avançado estágio de autonomia e capacitação

tecnológica, investimentos pesados em P&D, apoio governamental irrestrito, elas

revelaram-se não ser, por si próprias, precondições suficientes para impedir que a

empresa enfrentasse grave crise. A empresa desenvolveu fortes vínculos de

dependência em relação às políticas governamentais, seja para o financiamento

para a produção e atividades de P&D, seja para as vendas de seus produtos.

Dessa ótica segundo Bernardes (2000, p. 213-214), “alguns aspectos são

importantes, como a crise e a transição do modelo político e econômico de

desenvolvimento nacional experimentadas durante a década de oitenta e aguçadas

a partir da sua segunda metade”. O avanço do processo de democratização política

e o fortalecimento da sociedade civil, com a eleição indireta de um presidente civil,

marcado pelo advento da Nova República em 1986 e a eleição direta para a

presidência em 1990, com a adoção de vários planos de estabilização da economia,

nesses períodos, caracterizam-se como fatos relevantes para o entendimento da

crise da Embraer, visto que nesses períodos serão extintos os incentivos fiscais que

subsidiavam a empresa e serão gerados novos mecanismos de controle social do

gasto público.

Por outro lado, houve a modelagem de um novo marco político-institucional e

econômico, criado com a edição do Plano Collor, no início dos anos noventa, pela

aplicação de um conjunto de diretrizes políticas e econômicas que defendiam a

abertura e desregulamentação da economia com a reformulação ampla das políticas

industrial e de comércio exterior, além da adoção de um programa de privatização

das empresas públicas. A recessão do mercado aeronáutico mundial, o fim da

Guerra Fria, o desarmamento das nações, entre outros eventos importantes, iriam

contribuir para a agudização desse quadro adverso, obrigando a empresa a iniciar

um processo de ajuste profundo que culminará na sua privatização (Ibidem).

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2.1 - O DECLÍNIO

Como podemos entender que uma empresa tão capacitada tecnologicamente,

com bom desempenho de vendas e gerando empregos de alta qualificação, ao

longo de sua existência, considerada o “braço industrial - tecnológico” do ministério

da Aeronáutica, pudesse entrar em colapso no início dos anos noventa, atolada em

dívidas e tendo de dispensar mais de 50% do seu quadro de funcionários? Segundo

Bernardes (2000, p. 215) “a Embraer até o final da gestão de Ozires Silva, no início

de 1986, era considerada uma empresa estatal emblemática, administrada por

gestão profissional, na qual a direção desfrutava de elevado grau de autonomia e

ampla liberdade de contratação e demissão dos seus empregados, destoando

claramente, por isso, do perfil clássico de outras empresas públicas nacionais,

caracterizadas pelo empreguismo, ineficiência, dependência financeira e burocracia”.

Na atual realidade, é importante analisarmos, inicialmente, alguns dos

argumentos virtuosos de competitividade em relação à Embraer com o objetivo de

tentar elucidar os fatores que motivaram sua crise. A princípio podemos identificar

dois argumentos bem definidos, que já haviam sido ressaltados por Dagnino (1987)

em seu estudo sobre o setor armamentista, que incluía o segmento aeronáutico, e

que imputavam ao desequilíbrio financeiro da empresa a razão de sua crise. Por sua

vez, a situação de desequilíbrio financeiro devia-se basicamente a dois fatores: o

alto custo dos componentes importados das aeronaves brasileiras e a baixa

prioridade dada a um enunciado primário que é considerado básico para a existência

de qualquer empresa capitalista, ou seja, toda a empresa que deseja sobreviver no

ramo aeronáutico tem de obter lucro ao vender seus aviões (DAGNINO, 1987, p.

56).

2.1.1 – ABERTURA ECONÔMICA, SUPRIMENTO E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA

Em relação ao argumento da importância que a empresa exercia nos efeitos

de rápida rotação para o setor produtivo nacional e o alto custo do valor das

importações na participação do valor da produção da Embraer, podemos verificar

inicialmente, observando os Gráficos 1 e 4, algumas dinâmicas importantes. Em

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primeiro lugar, analisando a evolução dos indicadores de produção, exportação e

faturamento, notamos a demarcação de quatro fases: a inicial, que se estende de

1975 (ano em que começam as exportações da empresa) a 1979, caracterizada por

um crescimento modesto; a segunda, que principia em 1979 e avança até 1984,

marcada por uma estabilidade relativa; uma terceira fase de intenso crescimento

entre 1985 e 1990; e, por fim, uma quarta fase de queda vertiginosa, entre 1990 e

1994, ano da privatização da empresa.

GRÁFICO 1 – Evolução do Faturamento, 1970-1994

US$ Milhões

0100200300400500600700800

70 74 76 78 80 82 84 86 88 90 92 94

Fonte: Embraer (1996).

GRÁFICO 2 – Produção, Exportação e Importação, 1970-1994

0100200300400500600700800

75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94

Valor da Produção Exportação Importação

Fonte: Embraer (1996).

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No que tange a evolução do indicador de emprego, verificamos pela

expressão plástica do Gráfico 3, o delineamento de três fases, que poderíamos

associar às fases de gestão e direção da empresa. Segundo Dagnino (1993) “na

primeira, que abrange o período entre 1970 e 1985, caracterizada pela direção de

Ozires Silva, notamos uma trajetória moderada e sustentada de crescimento do

emprego. Numa segunda que principia em 1986, com a posse do comando da

empresa por Ozílio Silva, e termina em 1989, identificamos um período de

crescimento intenso e estabilização em um patamar elevado do emprego”. A partir

de 1990, verificamos nova fase marcada pela queda vertiginosa do nível do

emprego, caracterizada pelas gestões de João Cunha e o regresso de Ozires Silva,

que conduzirá a empresa até sua privatização. Ressalve-se que será sobre o

período de gestão de Ozires Silva que a Embraer sofrerá o processo de

racionalização da mão-de-obra mais profundo, para posteriormente ser privatizada.

Pela análise do Gráfico 3, notamos também que a performance da produção é

notadamente condicionada pelo desempenho das exportações. As exportações da

empresa iniciam-se em 1975. Nesse ano, as exportações representavam cerca de

5% do faturamento da empresa.

GRÁFICO 3 – Evolução do Nível de Emprego Total da Embraer

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

14000

70 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94

Fonte: Embraer (1996).

Já em 1980 as exportações eram responsáveis por 53% desse valor. E, no

período de 1985 a 1994, passavam a responder por mais de 60% do faturamento da

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empresa, sendo os 40% restantes destinados ao mercado nacional, caracterizados

pelas vendas dos aviões leves da linha Piper e o atendimento à demanda da Força

Aérea Brasileira (FAB). Em relação à performance das importações, chama a

atenção a alta participação que elas apresentam em relação à produção da

empresa: entre 40% a 50% dos insumos e 60% e 70% da produção. No início dos

anos noventa, a Embraer registrava cerca de quatrocentos fornecedores, fabricando

ampla gama de produtos, com graus diferenciados de complexidade tecnológica.

Entre os principais países fornecedores de insumos da Embraer, encontravam-se

E.U.A.: kits de aviões leves (Piper), placas de alumínio aeronáutico (Alcan, Alcoa),

conectores, placas de inox e outras ligas, parafusos e porcas, válvula, aviônicos,

motores; Grã-Bretanha: motores; França: peças e componentes aviônicos; Itália: kits

de aviões militares, peças e componentes; Canadá: motores, entre outros

(DAGNINO, 1993, pp. 57-58).

Os altos níveis das exportações e importações, que podem ser observados no

Gráfico 5, na verdade fazem parte da tendência mundial do setor, e por isso não

devem ser considerados tão surpreendentes; no entanto, pode-se considerar

preocupante a participação relativa que assumiam as importações em relação à

produção, dadas as características do baixo nível de capacitação tecnológica dos

fornecedores locais. Esse fato indicava que a alta proporção das importações no

valor da produção já seria suficiente para questionar o argumento da importância do

setor no comércio exterior brasileiro, uma vez que mesmo os fornecedores nacionais

importariam boa parte dos subsistemas utilizados pela Embraer (DAGNINO, 1993).

No entanto, a alta dependência em relação à importação não caracterizava,

por si própria, situação de dependência tecnológica. Para Dagnino (1993, p. 59) “a

autonomia tecnológica não se reflete necessariamente no índice de nacionalização.

Principalmente neste setor onde a alta densidade tecnológica e a estratégia de

desenvolvimento foi caracterizada mais pelo controle nacional de tecnologia do que

pelo aumento do índice de nacionalização”. Nos casos em que não há um controle

nacional do empreendimento e quando se parte de uma fronteira tecnológica

conhecida pela empresa estrangeira instalada no País, mas que não domina

localmente, a estratégia do aumento do índice de nacionalização mostra-se atrativa.

Pois nestes casos, uma das formas de aumentar o ganho do país é estipular índices

crescentes de nacionalização e, assim, cotas de produção local cada vez maiores. O

domínio por empresas nacionais, neste caso, não é um resultado a buscar; seja

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porque não interessa ao país obtê-lo, seja porque ele é inacessível. Quando o

controle do empreendimento está desde o começo assegurado, a estratégia não tem

por que ser de aumento do índice de nacionalização. O leque de opções que se abre

aos responsáveis pelo empreendimento é, neste último caso, muito maior. O

resultado de uma estratégia de aumento puro e simples do índice de nacionalização

faria com que se pudesse estar hoje produzindo no país aviões totalmente

nacionais. Estes, porém, poderiam demonstrar ser inadequados para a satisfação

das necessidades civis do pequeno mercado nacional e, principalmente, daqueles

visualizados pelos segmentos militares” (DAGNINO, 1993). No caso da Embraer,

como já foi anotado, em virtude da alta razão entre as importações e o valor da

produção, questionavam-se os efeitos de rápida rotação que a Embraer exercia

sobre a indústria nacional.

Cálculos realizados por Dagnino estimavam que no ano de 1989, quando o

valor de produção era de aproximadamente US$ 700 milhões e a importação de 350

milhões, o total da folha de salários e encargos teria alcançado quase US$ 300

milhões, o que corresponderia a um gasto com o custo de mão-de-obra da ordem de

50%, o que seria um fato coerente com a experiência internacional do setor. No

entanto, “supondo que a empresa tivesse apresentado uma receita líquida nula

naquele ano, então cerca de US$ 50 milhões teriam sido alocados para efetuar

todos os outros gastos no país” (DAGNINO, 1993, p.61). Assim, o autor concluía que

os efeitos econômicos de rápida rotação gerados pela empresa, se não eram

desprezíveis, no mínimo eram bem menos positivos do que os responsáveis pelo

setor costumavam divulgar (DAGNINO, 1993, p. 62).

Em relação às proposições elaboradas por Dagnino, embora considerando

corretas as afirmações do autor, devemos desenvolver melhor e relativizar alguns

comentários. Segundo Bernardes (2000, p. 219) “atualmente, em uma economia

internacionalizada, marcada pela atuação de grandes grupos econômicos atuando

em escala mundial, o grau de abertura econômica setorial ou mesmo dessas

empresas, assim como os fluxos comerciais intra e extra-empresariais têm-se

demonstrado bastantes intensos”. Assim sendo, o indicador calculado a partir da

razão entre as importações e a produção não deve ser utilizado inapropriadamente

como um indicador de dependência tecnológica, uma vez que as estratégias

empresariais contemporâneas têm procurado a otimização e a redução dos custos

dos fatores da produção, através da internacionalização do fornecimento dos

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insumos e componentes ou do que poderíamos denominar de “financeirização da

produção”.

A internacionalização da produção e do fornecimento de materiais, peças e

componentes é uma tendência da indústria mundial e também do segmento

aeronáutico internacional. A Boeing, por exemplo, tem internacionalizado a

produção, ao mesmo tempo que se utiliza de uma rede colossal de fornecedores

dentro e fora dos Estados Unidos. Portanto, o fato de a Embraer comprar insumos,

peças, componentes ou eletrônica embarcada não constitui demérito algum, nem

configura um caso de dependência tecnológica. A fabricação de motores, peças ou

aviônicos, seja pela Embraer, seja por fornecedores locais, exigiria o aporte de

investimentos altíssimos, de escala de produção, tradição de mercado e outras

variáveis que assegurassem o sucesso do empreendimento, além de que o custo do

produto deveria ser competitivo no mercado mundial, o que certamente seria inviável

economicamente (Ibidem).

A nova natureza da economia internacional é dada pela alta intensidade do

“conhecimento” nas atividades de produção de bens e serviços. O que dinamiza a

agregação de valor é a produção intelectual, o trabalho de inteligência baseado em

capital intelectual. Os atuais condicionantes que regem as estratégias de competição

virtuosas indicam que, para uma indústria hoje, a excelência no design de produto (a

capacidade de inovar), no marketing, uma logística bem planejada para distribuição

e comercialização do produto, uma infra-estrutura tecnológica integrada e dinâmica,

a coordenação da cadeia produtiva, são variáveis muito mais importantes do que a

verticalização ou o domínio do ciclo completo de fabricação de um produto ou

mesmo de determinadas partes dele. Segundo Fleury, (1998, p. 65 apud

BERNARDES, 2000, p. 220) “as montadoras de automóveis são o exemplo mais

evidente disso: hoje, as atividades que mais lhes interessam são o marketing, as

finanças (os bancos associados às montadoras são extremamente lucrativos), o

projeto do produto e a organização da cadeia produtiva. Paradoxalmente, o que

menos interessa é o trabalho manual, repetitivo, de montagem, que é terceirizado”35

.

35 Fleury prossegue citando o livro de Robert Reixh, O Trabalho das Nações. Segundo o autor, essa lógica pode ser aplicada para a dinâmica concorrencial e a divisão internacional do trabalho entre as nações. Na nova economia são identificadas três categorias de trabalho: “o trabalho rotineiro de produção (que não interessa aos EUA e pode ser exportado); o trabalho rotineiro de serviços (que também não interessa, mas não pode ser exportado); e o trabalho intelectual (ou, como ele

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Fleury (1998, p. 65 apud BERNARDES, 2000, p. 220) quer dizer, “com isso,

que o fato de a Embraer não fabricar alguns dos subsistemas principais, sejam

motores, aviônicos, ou poltronas, é menos importante. Na verdade, o que deve ser

enfatizado é que a Embraer domina a atividade mais nobre e a mais complexa que é

o design, o que possibilita a coordenação da rede de parcerias de risco. Acrescente-

se, ainda, que a empresa focalizou suas atividades na fase de agregação de valor,

ou seja, é uma integradora de sistemas, e domina completamente as diversas

especificidades de projeto”. O avião quem projeta e monta é a Embraer. Lembremo-

nos que sem o projeto essas partes e componentes, isoladamente, “não saem

voando por aí”. Além do mais, quem vende e provê a assistência técnica e suporte

aos clientes é a própria empresa. A variável estratégica nesse setor são os

investimentos em P&D, a capacidade de desenvolver novos projetos e a capacitação

em determinadas tecnologias críticas. E esse é um dos pontos fortes da Embraer.

Pela apreciação do Gráfico 5 é possível notar que a Embraer, ao longo de sua

história, tem realizado investimentos significativos em P&D, especialmente ao longo

da década de oitenta, quando se intensificam os gastos, somente declinando

acentuadamente no período pré-privatização, quando há o aprofundamento da crise

da empresa, recuperando-se, logo em seguida entre 1993 e 1994, em razão do

desenvolvimento do programa ERJ-145. (ver Gráfico 4).

GRÁFICO 4 – Grau de Abertura Comercial Empresarial, 1970-1994

0102030405060708090

75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94

(PROD/EXP) (PROD/IMP)

Fonte: Embraer (1996).

denominou, «os analistas simbólicos», que interessa e deve ser cada vez mais incentivado)” – ver Fleury, A. O mistério do ministério. Folha de S.Paulo, Opinião Econômica, 23/12/1998.

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95

GRÁFICO 5 – Evolução dos Gastos com P&D, 1970-1994

US$ Milhões

020406080

100120140

73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 89 90 91 92 93 94

Fonte: Embraer (1996).

Ressalte-se que, ao contrário das experiências internacionais, o setor

aeronáutico nacional apresenta baixa integração com o complexo eletrônico e

metalmecânico e fracos efeitos de encadeamento tecnológico. Devemos acrescentar

que, embora a Embraer possa ter configurado um tipo de “enclave econômico”, pelo

fato de serem constatados baixa integração com o setor produtivo nacional e alto

direcionamento de sua produção ao mercado externo, a empresa tem cumprido

papel importante na indústria nacional na formação de quadros profissionais e na

oferta de uma mão-de-obra de altíssima qualificação para vários setores econômicos

e entidades relacionadas à difusão da boa prática produtiva e do conhecimento

científico e tecnológico, que não pode ser desconsiderado. O fato de ser uma

empresa pouco integrada ao sistema técnico-produtivo talvez deva ser associado à

ausência de uma política industrial e tecnológica dinâmica que estimulasse a

execução de programas civis e relações mais intensas e extrovertidas entre a

Embraer, o CTA e a indústria nacional. É ilustrativo o caso do CTA (DAGNINO,

1987, p.62).

O CTA, atualmente, é composto de quatro institutos. Além do ITA, fazem

parte do Centro o Instituto de Aeronáutica e Espaço – IAE, o Instituto de Estudos

Avançados – IEAV – e o IFI – Instituto de Fomento Industrial. Cerca de dois mil e

cem funcionários aí pesquisam, executam projetos e desenvolvem produtos de

interesse dos Sistemas Aeronáutico, Espacial e Bélico. Trabalhos de base são

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realizados nas áreas de materiais, ciências atmosféricas, física, química,

aeronáutica, mecânica, eletrônica e computação. Esses trabalhos envolvem e são

complementados por simulações computacionais, ensaios em túneis de vento,

ensaios e integração no solo e ensaios em vôo. A transferência dos resultados das

pesquisas requer ainda o tratamento, no CTA, de questões sobre homologação,

normalização, metrologia, qualidade, confiabilidade e gerenciamento em C&T. O

modelo institucional público, mantenedor das atividades aeroespaciais no país, o

impede de vender serviços de forma lucrativa para o mercado, assim como dificulta

o repasse do conhecimento e a tecnologia gerada internamente por meio de

desenvolvimento de relações mais dinâmicas ou de um intercâmbio mais integrado

com o mercado. Esse modelo institucional foi se deteriorando cada vez mais com a

crise do Estado nas décadas de oitenta e noventa e, atualmente, carece de uma

reestruturação profunda para responder aos desafios contemporâneos.

A conformação desse quadro acabou por desestimular o corpo técnico dos

institutos, que tem sofrido perdas irreparáveis com a saída e demissão de vários

técnicos qualificados e professores, muitos com doutoramento no exterior, em

virtude dos baixos salários e das condições precárias de trabalho. O CTA, por

exemplo, já chegou a ter seis mil funcionários, mas atualmente conta com apenas

dois mil e cem. Vários pesquisadores brasileiros têm migrado para países que vêm

valorizando e considerando estratégico o desenvolvimento das atividades

aeroespaciais, notadamente Canadá, Alemanha, Espanha, Portugal, Indonésia e

Estados Unidos, entre outros. O parque tecnológico encontra-se desatualizado, e as

pesquisas sofreram cortes com o processo de contenção de gastos governamentais.

Esse é, aliás, um fator preocupante quanto ao futuro do setor aeronáutico nacional,

uma vez que as pesquisas e a formação da mão-de-obra no CTA foram e continuam

sendo fundamentais para a consolidação do setor no Brasil e a manutenção da sua

competitividade no mercado mundial (BERNARDES, 2000, p. 223).

Todavia, não resta dúvida quanto ao fato de os custos elevados das compras

de insumos e componentes no exterior e os custos internos de produção terem

obrigado a Embraer a gastar suas preciosas divisas, auferidas com as vendas de

suas aeronaves no mercado externo, pressionando a estrutura de custos internos e

deteriorando sua saúde financeira. Esse fato não passou despercebido pela direção

da empresa. Em 1982, a Embraer, com apoio da Avibrás, promoveu no Instituto de

Engenharia de São Paulo uma série de palestras destinadas a despertar o interesse

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da iniciativa privada pelo campo aeroespacial, captando mais empresas nacionais no

elenco de fornecedores da Embraer e da Avibrás, visando a reduzir o dispêndio

dessas duas companhias com a importação de itens não produzidos no Brasil. O

próprio diretor superintendente da Embraer, Ozires Silva, conduziu o evento que não

logrou êxito algum (LOPES, 1994, pp. 168-169).

Justificando-se pela necessidade de importar materiais e equipamentos em

lotes econômicos, a política de compras da empresa prosseguiu de forma pouco

realista com o volume de recursos investidos em seus estoques. Como resultado, os

giros de estoque eram muito vagarosos, mesmo levando em consideração que a

empresa tinha um ciclo produtivo-financeiro longo. Em 1993, por exemplo, o volume

de estoque equivalia a quase um ano de faturamento. Esses problemas agravaram-

se nos anos noventa com a crise da Embraer, em virtude dos atrasos constantes dos

pagamentos a fornecedores, que passaram a encarecer seus preços de venda, para

se prevenirem da insegurança quanto ao recebimento das faturas no prazo

estabelecido.

2.1.2 – AS DIFICULDADES DA SOBREVIVÊNCIA NO RAMO AERONÁUTICO

O segundo eixo explicativo para a crise da Embraer já havia sido também

apontado e previsto. Portanto, numa situação em que as vendas da empresa se

encontravam em crescimento, o nível de endividamento e, sobretudo a sua

composição (baseada em créditos de curto prazo) tornavam o seu futuro

problemático. Segundo Dagnino (1993, p. 77) “nos anos oitenta se reconhecia que a

política de endividamento que está sendo seguida tinha de ser revista através de

novo aporte de capital e isto não ocorreu. Apesar de ter conseguido levantar US$

185 milhões em 1989, nada ocorreu até 1991, quando a injeção de capital por parte

do governo de centenas de milhões de dólares permitiu um relativo equilíbrio entre

seu endividamento de curto e longo prazo [...] as despesas financeiras líquidas

alcançaram naquele ano US$ 122 milhões de dólares, ou seja, 30% da receita bruta

da empresa”.

Na verdade, as deficiências na gestão administrativo-financeira e o elevado

nível de endividamento acumulado pela empresa ao longo dos anos despontavam

como componentes desestabilizadores do seu desempenho. A raiz desse

comportamento deve ser buscada na forma como a Embraer foi concebida, no status

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conferido à empresa sob a ótica da estratégia tecnológica militar, na condução dos

programas, na estratégia de financiamento, no próprio modelo político institucional

vigente naquele período histórico. Segundo Suzigan; Villela (1997, pp. 28-29 apud

BERNARDES, 2000, p. 225) A opção do uso recorrente dos endividamentos de curto

prazo devia-se a algumas razões:

- “eram poucas as instituições financeiras privadas que concediam crédito de

longo prazo, e quando concediam, exigiam juros muito elevados”;

- “a Embraer, como era empresa estatal, tinha de submeter os financiamentos

à aprovação do Congresso Nacional. O processo era longo, incerto e, muitas vezes,

a autorização de captação de recursos não era aprovada. Dessa forma, recorria-se

aos empréstimos de curto prazo concedidos pelas agências ou bancos

governamentais ou estrangeiros”;

- “as modalidades de financiamento, como o “suprimento de crédito de longo

prazo para o investimento e o financiamento do desenvolvimento tecnológico,

particularmente gastos em P&D, dificilmente eram atendidas exclusivamente pelo

sistema privado”. No Brasil, as duas modalidades tornaram-se, por razões

conhecidas, totalmente dependentes de agentes financeiros do setor público:

BNDES (e a subsidiária Finame36) para créditos de longo prazo para investimento e

aquisição de bens de capital, e Finep para financiamento do desenvolvimento

científico e tecnológico. Por razões que já descrevemos, “houve forte contração da

disponibilidade de recursos nos anos oitenta e na primeira metade dos anos

noventa” (SUZIGAN; VILLELA, 1997, pp. 28-29 apud BERNARDES, 2000, p. 225).

Em relação à condução dos programas e às formas de vendas das

aeronaves, consideravam-se muito importantes as vendas externas, mesmo que

implicassem algum prejuízo financeiro para a empresa e, conseqüentemente, aos

cofres públicos. É ilustrativo dessa prática o episódio da concorrência para o

36 O Finame é uma agência especial de financiamento industrial, subsidiária do BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Para o setor industrial são disponibilizadas linhas de financiamento por meio do Finame Automático, que financia a aquisição de máquinas e equipamentos novos fabricados no país, sem limite de valor; e o Finame Especial, que se destina ao financiamento, para todos os setores, exceto o de comércio e serviços, de máquinas adequadas para a sua viabilização. Existe, ainda, uma linha do Finame Especial para concorrência internacional que permite à indústria nacional melhorar as condições de competição com as estratégias nas licitações. Atualmente, o custo dessa linha é fornecido pela correção cambial, mais o Libor, mais o spread do BNDES de 5% a.a, mais o del credere do agente de 2% a.a. O prazo máximo de amortização é de dez anos e a participação do Finame do financiamento é de 80%. Se o fabricante do equipamento tiver ISSO-9001 e 9002 e suas máquinas estiverem registradas no “Cadastro Tecnológico” do Finame, as condições de participação sobem para 88%.

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fornecimento, em co-produção com Short Brothers, em 1985, de aviões de

treinamento militar Tucano para a RAF inglesa, durante a gestão de Ozires Silva, de

1970 a 15 de julho de 1986. O contrato previa tantas alterações de componentes,

que os funcionários apelidaram o avião de Super-Tucano. O único detalhe, porém,

foi que essas modificações provocaram aumento significativo no custo de produção

da aeronave, que foi só parcialmente repassado ao seu preço final. Segundo

Dagnino (1987, pp. 235-236) “esta disposição refletia a disposição da Embraer em

desenvolver variantes que serviriam para atender à demanda dos consumidores e

que possibilitaram o aumento das suas próprias capacidades tecnológicas, mesmo

sob pena de algum prejuízo financeiro momentâneo”. Na visão dos militares de

acordo com Lopes (1994, p. 226 ) “esse era o preço que a nação deveria pagar para

ter uma indústria de valor estratégico como a Embraer”. Na realidade, no entanto, foi

demonstrado que esses prejuízos não eram transitórios e nem momentâneos, ao

contrário, eram estruturais e cumulativos.

Com a saída de Ozires Silva do cargo que ocupara durante quase dezessete

anos na Embraer37, assume, em 16 de julho de 1986, o novo diretor

superintendente, Ozílio Silva. Em 1987, sob novo comando, foram anunciados

investimentos ambiciosos para os cinco anos seguintes, da ordem de US$ 350

milhões em novos projetos – quatro vezes e meia os US$ 77 milhões gastos em

P&D entre 1982 e 1986. A percepção da nova direção entendia que para manter

competitiva a empresa deveriam ser realizados investimentos em novas instalações

físicas, a renovação do ferramental, e, sobretudo, o apoio do Maer (LOPES, 1994, p.

280).

O programa AMX, iniciado em 1979, já havia consumido até 1987 cerca de

US$ 1,8 bilhão. Segundo a visão do Maer, “mesmo sendo um investimento custoso,

o projeto AMX era visto como um programa que traria retorno tecnológico para o

país”. Na verdade, a execução e o desenvolvimento do programa AMX revelou-se

um empreendimento maior que a Embraer e a própria FAB juntas. Nesse ano, o

jornalista Gilberto Dimenstein apurou, pela Folha de S.Paulo, que os recursos

arrecadados mediante taxações compulsórias, sobre mercadorias como

combustíveis e automóveis – dinheiro oficialmente destinado ao financiamento de

programas de desenvolvimento econômico e social – estavam na verdade sendo

37 Ozires Silva afastou-se da Embraer para assumir a presidência da Petrobrás, em 1986. Posteriormente, assumiria o cargo de ministro da Infra-Estrutura durante o governo Collor.

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desviados para o “saco sem fundo” do programa, argumentado que o dinheiro gasto

pelo governo brasileiro no programa AMX permitiria ao ministério montar a mais

poderosa aviação militar do continente. Quando comparado aos caças supersônicos

de última geração, como os F-16 Falcon, norte-americanos, e os Mirage 2000,

franceses, o AMX era considerado lento, pouco manobrável em grande altitude e

custava caro demais, podendo alcançar custos próximos ao F-16. Para atender as

modificações requisitadas pela FAB o avião teve seu custo unitário elevado de US$

8 para US$ 18 milhões de dólares, e, de acordo com os armamentos e uma série de

opcionais, seu valor poderia ascender aos US$ 21 milhões, diminuindo

consideravelmente as possibilidades de retorno do investimento realizado no

programa. O então diretor superintendente da Embraer, Ozílio Silva, em resposta às

críticas, argumentava “que o governo não havia investido no AMX para ter retorno

financeiro, havia investido para ter o avião” (LOPES, 1994, p. 340).

A situação começou a agravar-se no final da década de oitenta e início de

noventa, com a crise financeira que atingiu o Estado brasileiro, enfraquecendo os

orçamentos destinados aos fabricantes da área militar e aos fornecedores do

governo. A previsão inicial “era de uma produção anual entre 48 a 60 aviões,

destinada a atender o plano de defesa italiano e europeu, além do brasileiro. [...]

Com o final da guerra-fria, o programa AMX teve uma redução de 40% nas suas

entregas” (TÁPIA, 1993, p. 61 apud BERNARDES, 2000, p. 227). Para a Embraer,

por ter presença consolidada na área comercial, os cortes orçamentários nos gastos

de defesa não tiveram impacto imediato nos programas militares, mas o programa

AMX passou a consumir um terço do faturamento da empresa, acelerando seu

processo de degradação e decadência. Com a instauração de um governo civil,

cortaram-se os orçamentos militares, por intermédio do Itamaraty, e o Maer não mais

repassou os recursos para o desenvolvimento do programa. Outro dado que

comprometeu a saúde financeira da empresa foi o fato de a Embraer ter honrado até

o final o compromisso firmado entre o governo brasileiro e o italiano, com seus

próprios recursos, o que foi uma atitude muito digna, mas que custou caro à

empresa.

A crise financeira da Embraer começou a se tornar pública com o fracasso do

projeto CBA-123 Vector, avião turboélice pressurizado para dezenove passageiros

desenvolvido em conjunto com a empresa Argentina FMA (Fábrica Militar de

Aviões), iniciado em 1989. O programa CBA Vector partiu de acordo binacional

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decorrente de uma iniciativa política do presidente Sarney com o governo da

Argentina, que teve sua origem na chamada “Declaração de Iguaçu”, visando ao

estreitamento dos laços e a dinamização do Mercosul38. A Embraer desenvolveu o

CBA-123 para substituir o Bandeirante no mercado externo. O acordo entre os dois

países estabelecia que o Brasil seria responsável por 70% do avião e a Argentina

pelos 30% restantes. O contrato previa ainda a compra de quarenta unidades pelo

governo brasileiro e de vinte unidades pelo governo argentino. Os dois países não

cumpriram o acordo.

Segundo Bernardes (2000, p. 228) “as críticas a esse programa, feitas por

dirigentes da Embraer, alegavam o uso político da empresa pelo governo brasileiro e

a falta de tino comercial. Ozires Silva, no entanto, contesta essa visão. Em sua

opinião, ocorreu justamente o contrário. Naquele momento a Embraer entendia que,

envolvendo a Argentina, ganharia respaldo político para que o projeto fosse

considerado pelas autoridades brasileiras”. De qualquer modo, o fato é que o

programa carecia de estudo detalhado de mercado e esquecia-se do principal, ou

seja, de identificar qual seria o usuário e se ele estaria disposto a comprá-lo,

sobretudo tendo em vista a tecnologia avançada e o preço mais elevado em relação

aos concorrentes.

A empresa investiu US$ 220 milhões e a FMA Argentina US$ 60 milhões no

desenvolvimento do avião, que nunca chegou a ser produzido em série por falta de

mercado. Sob a ótica técnica o CBA-123 foi um sucesso, o avião incorporava o que

havia de mais moderno na engenharia aeronáutica em aeronaves de sua classe,

operava em grandes velocidades e altitudes (680 km/h e 12.000 metros) e exibia

conforto interno com baixo ruído e vibração na cabine de passageiros. Porém,

apesar de ser avançado, o avião, que custava cerca de US$ 6 milhões, apresentava

preço muito superior ao de mercado. Análises de mercado na época já emitiam

sinais de redução no segmento regional na categoria de dez a vinte lugares. Além

disso, estudos demonstravam que seu preço real não poderia ultrapassar a faixa de

US$ 4,5 milhões. Os modelos americanos Beech 1900 e Jetstream apresentavam a

mesma performance que o CBA-123 por custos operacionais muito menores, até

38 Recorde-se que as primeiras iniciativas para a formação do Mercosul são tomadas em 1986, pelos governos brasileiro e argentino, consubstanciadas na assinatura dos primeiros convênios de integração comercial entre os dois países. Em 1989, são assinados vários protocolos de natureza geral e setorial com o objetivo de facilitar as trocas de bens e serviços (COMIN, 1996, p. 20 apud Bernardes, 2000, p. 228).

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45%, custando entre US$ 3,5 e US$ 4,5 milhões (BERNARDES, 2000, p. 229). Além

de uma visão excessivamente tecnológica, a absoluta falta de uma avaliação

criteriosa de mercado e o estabelecimento de metas inatingíveis condenaram o

programa ao fracasso e aceleram a degradação financeira da empresa. Outro fato

inusitado que não constava das previsões foi o aquecimento dos mercados de

aviões usados, nos anos noventa, na faixa de dezenove lugares. A Embraer chegou

a fabricar dois protótipos do CBA-123. Seu vôo inaugural deu-se em julho de 1990 e

teve sua apresentação internacional em Farnborough (Inglaterra) em setembro do

mesmo ano. O CBA-123 chegou a contar com 157 opções de compra, mas

nenhuma venda firme. Para a entrada em linha do CBA-123 seriam necessários

mais US$ 140 milhões, recursos que não puderam ser viabilizados pela Embraer (

BERNARDES, 2000, p. 229) .

Na parte de gestão financeira da empresa os problemas relativos à estrutura

de financiamento revelaram-se inadequados. O volume de capital de risco que

ingressou na Embraer demonstrou-se insuficiente diante do fluxo de investimentos

efetivados. Entre 1970 e 1993, foram investidos cerca de US$ 750 milhões, para a

entrada, no mesmo período, de US$ 270 milhões, ou seja, havia um déficit de US$

480 milhões. Considerando-se que a geração interna de recursos não pôde cobrir

essa diferença, a Embraer teve de se financiar com recursos de terceiros. Todavia,

projetos de maturação de médio e longo prazo exigem linhas de financiamento

compatíveis, em prazos e taxas, o que não se verificou na empresa (Ibidem).

2.1.3 - A MUDANÇA DA ECONOMIA E DO AMBIENTE POLÍTICO-INSTITUCIONAL NO FINAL DA DÉCADA DE OITENTA E INÍCIO DE NOVENTA

É importante resgatar o período histórico em que se desenvolve a crise da

Embraer, para melhor situarmos o processo de mudança institucional que sofrerá a

empresa. No final da década de oitenta e início da década de noventa, a situação da

Embraer ficou mais complicada por causa das transformações que se processaram

na economia mundial e no cenário político e econômico brasileiro. No ambiente

externo desenhou-se um cenário francamente desfavorável em decorrência da

recessão mundial do mercado aeronáutico civil e o arrefecimento da demanda por

aeronaves militares em virtude do final de Guerra Fria.

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Para Ozires Silva, a gestão da Embraer começou a sofrer pressões do

governo para controlar as estatais, a partir de 197939. Na década de oitenta,

segundo ele, as autoridades públicas já não diferenciavam a administração indireta

(as empresas) da direta (as repartições públicas). Os decretos que regulavam os

órgãos do governo passaram a incluir também as empresas, sociedades anônimas

de economia mista e todos os órgãos da administração indireta da União Federal.

Para Ozires, “o preço pago foi alto. O resultado foi uma grande perda de agilidade

das empresas estatais que nitidamente começaram a mostrar deterioração. Ao invés

de procurar corrigir melhorando os padrões básicos organizacionais, a resposta da

burocracia foi no sentido de apertar os controles. [...]. As posturas governamentais

foram claras. As regras para uma grande siderúrgica passaram a ser as mesmas

aplicáveis a uma indústria aeronáutica como a Embraer, ou a um hotel em Santa

Catarina que por estranho que pareça era também uma estatal. Isto afetou muito a

Embraer” (SILVA, 1985 apud BERNARDES, 2000, pp. 230-231).

No plano do marco regulatório institucional interno, o Brasil começa a sofrer

transformações políticas e econômicas profundas. Em 1985 iniciou-se a etapa final

do processo de transição do regime militar à democracia, com gradual substituição

no comando da política econômica de quadros oriundos do antigo regime por outros

identificados com a oposição. Após as eleições de novembro de 1986, ascende ao

poder, em eleição indireta, uma aliança civil de centro-esquerda, tendo à frente,

como candidato à Presidência da República, o senador Tancredo Neves, com o

compromisso popular de democratizar o Estado e mudar os rumos da economia do

39 Neste ano, referente ao início do governo Figueiredo, são adotadas medidas ostensivas para reduzir a participação das estatais na economia, com a criação do Programa Nacional de Desburocratização e da Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais (Sest). O ponto central de discussão nesse momento era a ineficiência do setor público empresarial de inibir a expansão do setor produtivo estatal, pois havia percepção do governo de que estatais tinham escapado do controle orçamentário das autoridades federais. Pinheiro (1999 p. 156 apud BERNARDES, 2000, p. 230)“não se tratava de uma guinada ideológica quanto ao papel do desenvolvimento do Estado, mas antes uma mudança na ênfase da política econômica, imposta por transformações até certo ponto fora do controle governamental. A prioridade não era mais o crescimento e a suspensão da crise cambial. [...] Sendo as estatais responsáveis por parcela considerável dos investimentos e do consumo doméstico, seria quase impossível estabilizar a economia sem alguma forma de controle sobre elas. Imperativos de ordem macroeconômica – a crise cambial, em particular – afetaram as estatais de duas maneiras. Antes da crise da dívida externa (1982), as estatais foram levadas a contrair empréstimos no exterior além de suas necessidades, de forma a financiar os crescentes déficits em conta corrente no país. Com débitos bastante ampliados essas empresas veriam suas despesas crescerem rapidamente, com o aumento das taxas de juros internacionais a partir de 1979 e a significativa desvalorização cambial depois de 1981. Assim o uso dessas empresas como instrumento de política macroeconômica apresentou seus limites em relação ao investimento, aumento de endividamento, redução do valor real de preços e tarifas e a própria perda de foco nos objetivos empresariais”.

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país, até então governado, desde o golpe de 1964, por presidentes militares. Com o

falecimento do presidente Tancredo Neves, assume seu lugar o vice, José Sarney,

com a obrigação de manter e aplicar os compromissos celebrados pela aliança

democrática.

Diante da crise fiscal e econômica do Estado, com o governo da Nova

República, são realizados esforços para disciplinar o gasto público e estabilizar a

economia nacional.

Com o equilíbrio financeiro do setor público, cujas necessidades de

financiamento chegavam a perto de 10% do PIB em 1985 e a escalada inflacionária

da economia, o governo foi obrigado a adotar medidas enérgicas, alterando o

comando da economia e implementando, em 1986, o Plano Cruzado, um programa

de estabilização que tinha por objetivo combater a inflação inercial mediante a

adoção de uma nova moeda (reforma monetária) e do congelamento geral de

preços. No plano estrutural, o governo não deu prosseguimento às reformas

institucionais no âmbito tributário e financeiro, com a meta de reduzir o problema da

dívida interna e externa40. Segundo Eber; Vermulm (1993, pp. 21-32 apud

BERNARDES, 2000, p. 232) “sem lograr a implementação de reformas profundas,

utilizando-se da reforma monetária e do congelamento, o plano Cruzado era muito

limitado sob o ponto de vista industrial e, embora o sucesso relativo do plano tivesse

aumentado a credibilidade do governo, este foi incapaz de avançar em qualquer

política industrial efetiva para o país. [...] Posteriormente, com o insucesso do

programa de estabilização, a credibilidade do governo e do próprio Estado

desmoronam e os aparatos públicos se deterioram”41 .

No governo Sarney, houve a declaração de uma Nova Política Industrial:

“apesar do comprometimento formal do governo e do apoio que recolhia no

empresariado industrial [...] tal agenda de intenções nunca chegou a se traduzir em

medidas efetivas de maior alcance. Enquanto esteve em vigor, ela consistiu quase

40 A privatização avançou no governo Sarney em ritmo semelhante ao de seu antecessor, apesar da retórica mais agressiva, como refletido na série de decretos presidenciais e projetos de lei reestruturando e ampliando o programa de privatização. No total, dezoito empresas, avaliadas em US$ 533 milhões, foram vendidas, com igual número sendo transferido para os governos estaduais, duas incorporadas a outras instituições federais e quatro desativadas. Na maior parte eram de empresas de pequeno porte. 41 Em 1988 é aprovada nova Carta Constitucional, alterando a distribuição dos recursos tributários e conferindo maior autonomia às unidades da Federação; o governo reduz a participação nas receitas do setor público de 17% do PIB em 1980 para 13% em 1989 (ERBER; VERMULM, 1993 apud BERNARDES, 2000, p. 232).

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exclusivamente em promessas, pretensão, discursos... sua existência não foi muito

longa. Desde então, a receita oficial para assegurar a modernização e o dinamismo

do parque industrial brasileiro passava a privilegiar a ampliação do grau de abertura

da economia, a supressão dos entraves burocráticos à atividade empresarial e o

tratamento mais flexível para o capital estrangeiro” (EBER; VERMULM,1993 apud

BERNARDES, 2000, p. 232).

A paralisia de decisão e a incapacidade de administração dos conflitos pelo

Estado, aliados à crise financeira profunda e econômica, impossibilitaram a

implementação de forma integrada da Nova Política Industrial, tornando-a

incompatível com as políticas econômicas de curto prazo. Todavia, nesse quadro,

são criados mecanismos de controle orçamentário e os primeiros passos para o

processo de abertura da economia que terão impactos substantivos na gestão

financeira da Embraer42. Em 1988, por exemplo, a empresa sofre um golpe profundo

com a extinção do Decreto-Lei nº 7.708/69, que garantia à Embraer a atração de

recursos proporcionados pelo investimento de pessoas jurídicas que podiam investir

até um por cento do imposto de renda devido em ações da empresa sem direito a

voto, deduzindo tal quantia do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ). A

legislação do incentivo de um por cento foi extinta com a Lei nº 7.714, de 29 de

dezembro de 1988.

Depois de trinta anos de vigência da chamada Lei das Tarifas, em 1988 é

realizado o processo de reforma da estrutura tarifária brasileira. A estrutura tarifária

vigente na economia brasileira no final da década de oitenta havia sido concebida à

luz da lógica do Modelo de Substituição das Importações e orientava-se na Lei de

Tarifas de 1957. As principais características foram apontadas por Simões de

Almeida (1996, p. 85 ): “a) tarifas altas e redundantes; b) abundância de regimes

especiais; c) proliferação de controles quantitativos de importação; d) existência de

tributos adicionais”. De outro lado, “o governo estabeleceu diversas barreiras não

tarifárias com o intuito de atingir dois objetivos. Primeiro, em face da abundante

concessão de regimes especiais ou de eclosão de choques exógenos afetando a

economia brasileira (como a crise do petróleo), buscava-se obter certo saldo

comercial para evitar déficit no balanço de pagamentos. Segundo, devido à

42 Na verdade, a preocupação e os esforços para disciplinar gasto público já haviam levado o governo brasileiro a criar em 1979 a Sest – Secretaria Especial das Estatais, cuja finalidade era limitar e controlar a complementação dos programas de investimentos das estatais, restringindo-lhes crédito e monitorando os preços.

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106

exagerada concessão de regimes especiais de importação, lançava-se mão de

estabelecer barreiras não tarifárias para fornecer proteção à indústria. Tais controles

quantitativos das importações significaram um reforço dos níveis de proteção

tarifários e contribuíram para a eliminação das fontes de contestabilidade,

proporcionadas pela entrada de bens importados e o posterior ingresso da empresa

exportadora do exterior, motivados pelas importações pretéritas” (SIMÕES DE

ALMEIDA, 1996, p. 91).

Segundo Simões de Almeida ( 1996, p. 93) resumindo, “a estrutura tarifária

brasileira e a política comercial no final dos anos oitenta apresentavam traços

evidentes de irracionalidade, inadequabilidade sistêmica, instabilidade e

discricionariedade. A irracionalidade ficava com a existência da redundância tarifária

e enorme renúncia fiscal. A inadequabilidade sistêmica surgia também por causa da

renúncia fiscal, da estrutura tarifária que era uma fonte de crises de Balanço de

pagamentos e do estímulo para o comportamento competitivo dos empresários. A

característica de discricionariedade nas regras impunha outro estímulo para o

comportamento por parte dos produtores domésticos, tanto aqueles que se

esforçavam por pleitear o enquadramento dos seus insumos necessários a seu

processo produtivo em regimes especiais quanto aos que pressionavam o governo

para levantar barreiras não tarifárias de importação para seus produtos no mercado,

assim como impunham dificuldades (incertezas e riscos) no horizonte de

planejamento para a empresa”. A saída para tal impasse, que havia proporcionado

uma proteção demasiadamente grande ao mercado nacional, foi a proposição de

uma reforma tarifária que restaurasse novamente a racionalidade à estrutura do

comércio exterior e rompesse com os elos da estrutura antiga de proteção e

estimulasse a competitividade das empresas brasileiras (Ibidem).

Nesse contexto, é elaborada entre 1986-87, submetida ao Congresso em

novembro de 1987 e aplicada efetivamente em 1988, a Reforma Tarifária, como

parte integrante de uma Nova Política Industrial, na qual se previa redução

significativa das alíquotas de importação. Porém a Reforma Tarifária não conseguiu

avançar na eliminação dos regimes especiais de importação e nem na redundância,

sendo incapaz de assumir uma “natureza liberalizante”, como viria a ser a Reforma

de 1990, no governo Collor (SUZIGAN; VILLELA, 1997; SIMÕES DE ALMEIDA,

1996). Nesse novo ambiente, em 19 de maio de 1988, é aprovado o Decreto-Lei nº

2.434, pelo qual se reduziu em oitenta por cento o imposto de importação sobre

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aeronaves, dentre outras, por empresas concessionárias de linhas regulares de

transporte aéreo. Este decreto-lei será revogado pela Lei nº 8.032, de 12 de abril de

1990, e em seu lugar será editado, já na gestão do presidente Collor, o Decreto nº

99.694, de 16 de dezembro de 1990, reduzindo a zero alíquota do Imposto sobre

Produtos Industrializados (IPI) sobre aeronaves em geral, exceto aviões a jato de

pequeno e médio porte. Tal redução objetivava a redução do ônus tributário sobre os

preços de aviões, estimulando a renovação das frotas das empresas nacionais

concessionárias de linhas regulares de transporte aéreo, sob o imperativo de

segurança de vôo, economia e capacidade competitiva das mesmas.

Essa situação acabou prejudicando a Embraer e a Neiva, uma vez que um

avião como o EMB-120 Brasília apresentava carga tributária de 19,2% do seu preço,

ao passo que a importação de um avião estrangeiro, mesmo sendo usado,

desfrutava de uma alíquota de IPI de zero por cento. Com isso, para a Embraer

vender um avião para o mercado doméstico, tinha de exportá-lo para depois

revendê-lo ao cliente nacional. Segundo Bernardes (2000, p. 235) “a União, é bom

lembrar, era detentora de 97% das ações de controle da Embraer, e uma vez que

essas medidas dificultavam as vendas das aeronaves dessa empresa, oneravam

também as finanças do governo”.

O conjunto dessas medidas aplicadas no âmbito governamental, a crise fiscal

e a desestruturação do Estado com a perda de capacidade da aplicação das

políticas industriais e tecnológicas, no decorrer da década de oitenta, somado ainda

aos problemas internos atravessados pela Embraer, acabaram por eclodir no

colapso financeiro da empresa em 1989. Sua situação começou então a ficar

insustentável. Em 1990, por exemplo, os prejuízos somavam cerca de US$ 241

milhões, o patrimônio líquido apresentava queda de 30,3%, o faturamento declinava

de US$ 700milhões, em 1989, para US$ 500 milhões, o endividamento geral da

empresa registrava US$ 620 milhões, sendo US$ 502 milhões em dívidas de curto

prazo (ver Tabela 17).

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108

TABELA 17 – Indicadores de Desempenho Econômico-Financeiro da Embraer (valores em US$ milhões)

1989 1990 1991 1992 1993 1994

Faturamento

Vendas

Mercado externo (%)

Mercado interno (%)

Ativo total

Patrimônio líquido

Prejuízo

Investimentos em P&D

% P&D/faturamento

Endividamento

Geral

Curto prazo

Longo prazo

700

36

64

1.145

416

89

107

15,8

-

-

-

582

37

63

1.092

126

(265)

128

22,0

620

502

118

402

32

68

1.435

324

(241)

48

11,9

804

241

563

333

32

68

1.227

86

(258)

24

7,2

877

309

568

261

38

62

1.125

156

(116)

35

13,4

758

394

364

177

40

60

1.067

281

(310)

55

31,0

410

221

189

Fonte: Embraer (1996).

A deterioração do ambiente empresarial interno da Embraer foi magnificado

com os desdobramentos do processo de desgaste e evolução do quadro político e

econômico nacional. Recorde-se que a fase final da Nova República foi

estigmatizada pelo imobilismo do governo Sarney, erodido por amplo descrédito na

sociedade civil e pela defesa de privilégios setoriais no meio empresarial.

Concomitantemente, começou a disseminar-se como idéia-força, tanto nas esferas

governamentais como empresariais e intelectuais, a crença no esgotamento da

estratégia clássica de industrialização, com a irrupção de uma crise do nacionalismo

tecnológico e a necessidade de se redefinir a concepção global de desenvolvimento

junto com as práticas de políticas setoriais (TÁPIA, 1995, p. 285 apud BERNARDES,

2000, p. 236).

Em 1990, quando é eleito para a Presidência da República o candidato

Fernando Collor de Mello, duas questões estavam consensualmente impostas na

agenda nacional: a redefinição da estratégia industrial global do Brasil e a

reestruturação da política de reserva de mercado. O governo Collor estava pautado

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por uma agenda liberal que pregava reformas políticas radicais como a

desregulamentação e abertura da economia, assim como um programa de

privatização das empresas públicas e revisão geral das políticas industriais e de

comércio exterior. O governo Collor iniciou sua gestão com a implementação de um

programa de estabilização, tendo em vista interromper o processo hiperinflacionário

(a taxa de inflação chegava a 81% ao mês) e criar condições de estabilidade para a

retomada do crescimento. Depois de uma década de crise política e instabilidade

macroeconômica, expressa tanto no comportamento errático da economia, quanto

na ausência de modificações estruturais no sistema produtivo industrial, o processo

recessivo instaurado com a edição do Plano Collor, combinado à abertura da

economia promovida pela reformulação das políticas industrial e de comércio

exterior, acabaram por modelar um novo marco político-institucional e econômico no

país (Ibidem).

As diretrizes de ação governamental foram estruturadas e norteadas pelo

trinômio liberalização/desregulamentação/privatização e pela implementação de uma

Nova Política Industrial e de Comércio Exterior (Pice) do governo Collor, que foi

consubstanciada em quatro documentos básicos: Diretrizes Gerais para a Política

Industrial e de Comércio Exterior, de 26 de junho de 1990, nas quais se

encontravam formalizados os objetivos e as linhas gerais do projeto governamental

para a área industrial; o Programa de Apoio à Capacitação Tecnológica da Indústria

Brasileira (Pacti), de 12 de setembro de 1990; o Programa Brasileiro de Qualidade e

Produtividade (PBQP), de 7 de novembro de 1990 e o Programa de Competitividade

Industrial (PCI), de 27 de fevereiro de 199143.

No plano geral, a Pice partia do diagnóstico que o padrão de industrialização

anterior (modelo de substituição às importações) havia se esgotado como fator

dinâmico do desenvolvimento econômico. Associou-se à grave crise da capacidade

de financiamento do Estado, que levou ao longo dos anos oitenta a uma crescente

43 É importante considerar que as críticas feitas a esse conjunto de medidas advertiam que, embora a nova política industrial e de comércio exterior priorizasse o progresso técnico, beneficiando os setores dinâmicos da indústria, na prática, confirmou-se a predominância de preceitos liberais, ao se optar pelo ajuste produtivo orientado pelo mercado e pela inserção passiva da economia no comércio internacional, não instrumentalizando o Estado com mecanismos que permitissem a defesa da indústria nacional contra práticas desleais de comércio ou que estimulassem um processo de reestruturação industrial competitiva. Tanto o PCI, um dos alicerces da Política Industrial e de Comércio Exterior (Pice), como a PBQP, tinham como objetivo a capacitação para a produção de bens e serviços competitivos, mas ignoravam o papel central da inovação não seria necessária para países de industrialização tardia (ERBER, 1990; ERBER e VERMULM, 1993 apud BERNARDES, 2000, p.236).

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instabilidade macroeconômica, cuja principal expressão foi a tendência à aceleração

inflacionária (FURTADO et al, 1994). Os objetivos nucleares da Pice consagravam-

se em “deslocar a prioridade da política industrial da internalização da produção

local, com um objetivo em si mesmo, para a busca do desenvolvimento industrial,

fundamentado em ganhos crescentes de produtividade e na melhora da qualidade

dos produtos e serviços. A estratégia seria a revisão da inserção do país na

economia internacional, a partir de maior competitividade dos produtos brasileiros”

(FURTADO et al, 1994, p.75).

Esse programa deveria ser contextualizado ainda na redefinição dos papéis

do Estado, do capital nacional no modelo proposto pelo governo Collor, nos

seguintes termos: “A principal responsabilidade do Estado nesta fase do

desenvolvimento industrial brasileiro é garantir a estabilização macroeconômica e a

reconstrução de um ambiente favorável aos investimentos em geral, com o

esclarecimento de regras claras e estáveis para a vida econômica” (BAPTISTA,

1993, p. 241). Devido exclusivamente a suas funções básicas e recuperada a sua

capacidade nacional, abre espaço para que o capital privado exerça plenamente seu

papel de principal agente no processo produtivo (Ibidem).

Erber (1991, p. 345 apud BERNARDES, 2000, p. 238) identificava na nova

política industrial as seguintes proposições:

- “redefinição dos papéis desempenhados pelos setores público e privado na

dinâmica industrial, retirando-se do Estado a sua função produtiva e de

planejamento”;

- “eliminar a discriminação em favor do capital privado nacional frente ao

capital estrangeiro, conferindo a este último papel central na retomada do

desenvolvimento”;

- “reduzir substancialmente o nível de proteção à indústria local ao restringi-la

à proteção tarifária, cujos níveis são rebaixados”;

- “o grau de discriminação setorial da política tarifária é restringido ao se

reduzir substancialmente a dispersão das tarifas”.

As razões da baixa competitividade da indústria brasileira eram explicadas

pelo fato segundo Quadros Carvalho; Bernardes (1998, pp. 7-8) que a “política

industrial da fase anterior, com seu corte para dentro e pouca consideração dos

critérios de eficiência estática e dinâmica, fora capaz de lograr a constituição de um

parque industrial complexo e relativamente integrado, mas acumulou deficiências

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111

estruturais significativas. Entre elas, destacavam-se o baixo crescimento da

produtividade, a limitada capacitação tecnológica e a dependência de um padrão de

exploração de recursos humanos. Estes fatores, associados ao custo fiscal dos

programas de fomento industrial e regional vigentes, contribuíram para alimentar a

espiral inflacionária, reduzir o horizonte dos negócios e provocar a retração dos

investimentos. A combinação da proteção comercial excessiva com a concessão

ilimitada de incentivos fiscais generosos e crédito público subsidiado acabou por

conduzir a um comportamento empresarial conservador, contrário ao risco e a

inovação”.

Com base nesse diagnóstico Quadros Carvalho; Bernardes (1998, pp. 7-8) “a

implementação da Pice pretendia introduzir uma estratégia no conceito de

integração internacional e aumento da competitividade (integração competitiva).

Segundo esta estratégia, o governo deveria aumentar a pressão competitiva sobre

os agentes econômicos a fim de impulsioná-los a buscarem eficiência produtiva e

qualidade como maneira de enfrentar a concorrência. Tal pressão seria

conseqüência da revisão das barreiras protecionistas às importações.

Complementariamente, o governo buscou introduzir um mecanismo regulador da

concorrência mais adequado às novas condições de mercado (lei de concorrência).

Aos agentes dispostos a modernizar-se, o governo daria apoio através de programas

de reestruturação e de apoio a capacitação tecnológica e a produtividade e a

qualidade”.

Na prática, no entanto, segundo Quadros Carvalho; Bernardes (1998, p.9) “a

contradição entre as metas de restrição ao gasto público, determinadas pela gestão

de curto prazo imposta pela racionalidade da política de estabilização econômica,

terminou por tornar inviável qualquer ação governamental significativa em relação às

políticas de reestruturação e competitividade [...]. Durante esta primeira fase, elas

funcionaram mais como slogans ou símbolos, que como programas efetivos”.

Além disso, a falta de “discussão da reestruturação do papel do Estado na

industrialização brasileira na Pice” foi enfatizada por Furtado (1994). Para o autor

(1994, p.81), “a Pice assumia uma fé desmedida na capacidade dos investimentos

privados virem a substituir integralmente o papel do Estado nos anos vindouros [...].

O discurso e a prática da Pice terminaram por resvalar numa fé pouco fundamentada

em que a iniciativa privada no Brasil possa assumir, repentinamente, setores mais

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112

ou menos estratégicos, cujos investimentos, ao longo de várias décadas de

industrialização, estiveram a cargo do Estado”.

Por sua vez, descreviam a Pice como uma estratégia de “pinça” formada pela

política de concorrência (cujo eixo estrutural seria a abertura da economia) e pela

política de competitividade. Para os autores haveria um descompasso na aplicação e

no gerenciamento entre as políticas de competitividade que teriam um período de

maturação de longo prazo. Esse desequilíbrio estrutural entre as duas pernas da

pinça, em que as políticas de competição são mais fortes que as de competitividade,

faria com que a resultante do campo de força pendesse decisivamente para o lado

das primeiras. Ademais, alertavam para os impactos distintos provocados pela

abertura das fronteiras comerciais nos setores da indústria, e para o fato de a Pice

não dispor de mecanismos adequados de monitoramento e políticas setoriais

específicas para os setores mais atingidos por tal processo44 (ERBER; VERMULUM,

1993, p. 58 apud BERNARDES, 2000, p. 240). Por exemplo, reconhecia a

existência de descompassos, no processo de implementação da Pice, entre a

desmontagem dos instrumentos, da política industrial protecionista e a construção de

novo arcabouço institucional implicando o aumento do grau de instabilidade para o

cálculo estratégico das empresas.

Por outro ângulo, com a inauguração do programa brasileiro de privatizações,

pretendia-se a redução do papel do Estado na economia, revelando-se também

instrumento adicional da política de abertura da economia ao capital estrangeiro

(BAPTISTA, 1994, p. 241). O tratamento ao capital estrangeiro na Lei nº 8.301, de

12 de abril de 1990, passava a definir a estrutura do Plano Nacional de

Desestatização: “O PND tratava o capital estrangeiro de forma mais liberal que os

processos anteriores e mesmo que as privatizações em países como a Espanha, a

Itália, a França e, mais recentemente, Portugal. [...] O capital estrangeiro poderia

comprar até 40% do capital votante (ações ordinárias) e até 100% do capital não

44 No campo das relações entre capital e trabalho, as negociações celebradas no âmbito da Câmara setorial do complexo automotivo pareceram despontar como um caminho promissor para a formulação de políticas de intervenção governamental para a área industrial. Nesse sentido, a nova experiência pode ser vista como um avanço das formas de negociação entre os sindicatos e as empresas, assim como para os rumos e desdobramentos futuros que o processo de reestruturação produtiva pudesse vir a ter. Contudo a nova experiência não foi consolidada e não obteve o mesmo êxito nos demais segmentos da indústria. Ver Guimarães, I.G.R. Câmaras setoriais – notas sobre sua constituição, quadro atual e perspectivas. Série Seminários nº 22/94. Rio de Janeiro: Ipea, dez. 1994. Arbix, G.A.T. A câmara setorial na indústria automobilística no Brasil. Tese de doutorado. São Paulo: Departamento de Sociologia, FFLCH/USP, 1995.

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votante (ações preferenciais). Três anos após a privatização, caem quaisquer

restrições à transferência de controle dessas empresas ao capital estrangeiro”

(BAPTISTA, 1994, p.243). Recorde-se que o plano de privatização das empresas

públicas só se iniciou realmente no quarto trimestre de 1991, com o leilão de uma

importante siderúrgica: a Usiminas.

As críticas ao PND foram bem elaboradas por Furtado: o autor notava a “total

desarticulação entre a política de privatização e a Pice, a ausência de uma política

de reestruturação das estatais e a inexistência de alternativas para o financiamento

de investimentos em infra-estrutura [...] o programa de privatização não tinha

desenvolvido qualquer instância ou mecanismo de articulação com a nova política

industrial. A definição dos procedimentos e critérios de privatização não levaram em

consideração nenhum aspecto relativo à necessidade de preservar / ampliar a

competitividade e a capacitação tecnológica dos setores envolvidos [...]. O Programa

de Privatização do governo Collor operou exclusivamente dentro de critérios

financeiros, a fim de atender metas de redução do passivo do setor público [...] não

se condenam os objetivos fiscais do programa, mas a ausência de mecanismos, em

sua operacionalização, que previssem e viabilizassem investimentos para a

reestruturação e a ampliação da competitividade dos setores privatizados. Para além

da troca de propriedade de ativos, o programa de privatização poderia e deveria

comportar um conjunto de metas e mecanismos para a modernização produtiva e a

preservação / ampliação da capacitação tecnológica das empresas privatizadas”

(FURTADO, 1994, pp. 81-82).

Nesse período, devem ser considerados eventos importantes a nova reforma

tarifária de 1991 e os esforços de integração hemisférica com os países do cone Sul

consagrados na formação de um mercado comum45 (Mercosul).Conforme Comin

(1996b, p. 20 apud BERNARDES, 2000, p. 241) “o movimento em direção a um

padrão mais aberto de comércio exterior no Brasil tem início com a reforma tarifária,

a abertura assume a dinâmica que caracterizaria os anos noventa: velocidade e

profundidade muito intensas, sem paralelo no histórico de outros países”. A redução

da tarifa média de importação é acelerada passando de 41% em 1988 para 13,5%

45 O tratado do Mercosul, que conforma sua atual estrutura, foi assinado em 1991. No documento, os quatro países – Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai – comprometeram-se a reduzir suas tarifas aduaneiras de forma gradual até atingir, em 1º de janeiro de 1995; a condição de livre circulação de mercadorias e serviços entre eles. Recentemente o bloco recebeu a adesão do Chile e da Bolívia (COMIN, 1996b,p.20 apud Bernardes, 2000, p. 241).

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em 1994. A reforma tarifária de 1991, “além de ter tido caráter racionalizante,

apresentou um fator liberalizante no ambiente econômico, sinalizando aos agentes

econômicos uma grande mudança – profunda e irreversível – da estrutura de

proteção à indústria brasileira. Seu papel ultrapassou os limites de uma mera

interferência no regime de comércio exterior e pôs em movimento expectativas com

relação a um novo momento da economia. Além disso, constituiu-se em um fator

mutagênico fundamental na profunda modificação dos condicionantes do ambiente

econômico brasileiro (SIMÕES DE ALMEIDA, 1995, p. 101).

Do ponto de vista da reestruturação empresarial, a introdução de novas

regras na orientação da economia irradiou modificações radicais e estruturais na

dinâmica concorrencial do mercado interno e nas estratégias de ajustes das firmas46.

Por um lado, o forte ciclo recessivo, provocado pela política monetária e fiscal

restritiva, produziu um impacto negativo no nível de atividade industrial e,

conseqüentemente, reduziu as escalas de produção das empresas. Esse

componente recessivo induziu as unidades industriais a promover um ajuste de

caráter nitidamente defensivo Coutinho; Ferraz, (1994, pp. 55-54 apud

BERNARDES, 2000, p. 242), especialmente as que mantinham no mercado interno

seu principal espaço de atuação, e, em muitas delas, adquiriu caráter predatório,

limitando-se a mudanças organizacionais que visavam a simplesmente reduzir o

contingente de empregados e racionalizar os fatores de produção47. De outro

ângulo, a percepção da irreversibilidade do processo de abertura comercial pelos

agentes econômicos e a contestação das posições de mercado geraram pressões

para que algumas empresas buscassem soluções sistêmicas48. Essas estratégias de

46 Como observou Souza, “o sentido amplo desse movimento – que associou reestruturação e a internacionalização, no âmbito internacional, e abertura comercial e recessão, no mercado interno -, se analisado à luz das esferas de decisões das empresas e de suas relações nas áreas de concorrência, pode ser também apreendido por alguns fatores básicos: crise de estruturas aparentemente sólidas e «bem protegidas»; aumento da instabilidade e contestabilidade dos mercados; internacionalização dos mercados de fornecedores e de compradores; novas exigências de clientes e consumidores finais” (1993, p. 35 apud BERNARDES,2000,p.242). 47 Na economia, a constituição de um verdadeiro “choque de concorrência”, com o aumento repentino da exposição à competição internacional, pela diminuição da proteção cambial e tarifária aliado às expectativas de integração hemisférica (pelas oportunidades abertas com o Mercosul), desencadeou um ajuste microeconômico racionalizante (Bielschowsky, 1992), incidindo diretamente na grande empresa industrial e obrigando, por sua vez, também as pequenas e médias a se reorganizarem em busca de eficiência e competitividade, de modo que assegurem espaço e a própria sobrevivência num mercado em que as exigências de consumo e as rivalidades competitivas se acentuaram significativamente. 48 Fleury (1988 apud BERNARDES,2000, p. 242) definiu uma estratégia industrial de modernização sistêmica como a busca da integração, da flexibilização e da produtividade, mediante a introdução das novas tecnologias de organização da produção, podendo haver ou não o uso de equipamentos

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115

reestruturação envolveram desde a refocalização do negócio com a especialização

em produtos mais competitivos até a externalização dos serviços com a flexibilização

das relações e dos contratos de trabalho. Em alguns setores mais avançados, foram

disseminadas novas tecnologias organizacionais, redução no volume médio de

estoques, simplificação dos níveis hierárquicos, diminuição dos índices de defeitos,

disseminação de programas de controle de qualidade, renovação e atualização dos

modelos, com a informatização e a racionalização dos fluxos de produção, aplicando

técnicas de produção “just-in time” (a peça certa, no lugar certo, no momento certo)

difundindo processos de integração informacional entre fornecedores e

distribuidores, resultando em ganhos de eficiência (COUTINHO; FERRAZ, 1994, pp.

55-54 apud BERNARDES, 2000, p. 242).

Reconhecendo os limites de análises muito generalizantes, dada a

heterogeneidade que marca a indústria nacional, poderíamos dizer que o ajuste

estrutural, nessa fase, delineou trajetórias de decadência nas estruturas

organizacionais, administrativas e dos processos produtivos nas empresas, seguidas

de degradação da produção industrial.

Esse ajuste em determinados setores ou empresas implicou o aumento das

importações de insumos, sobretudo os de maior conteúdo tecnológico – reduzindo

coeficientes de nacionalização de produtos em substituição à antiga produção local.

É o caso de setores da informática, mecânica, entre outros. Em alguns ramos

industriais, especialmente nos setores de alta tecnologia, como em segmentos da

eletrônica e de química fina, pode ser identificado um tipo perverso de

“especialização regressiva”, com o fechamento de plantas e linhas produtivas, a

desativação de laboratórios de P&D, a substituição da fabricação de produtos mais

nobres e de atividades intensivas em tecnologia pela redução dos índices médios de

nacionalização de peças e componentes. Esse movimento resultou na destruição de

postos de trabalho com perfis mais elevados de qualificação e no abandono da

microeletrônicos. Identificam-se, nestas estratégias de reestruturação mais abrangentes, formas de adaptação global que compreendem ações direcionadas para a busca de novos padrões de produtividade e competência, sustentadas em mudanças profundas, envolvendo desde aspectos operativos (TQC, JIT, kanban, CEP) até fatores culturais internos à empresa. Não impedem, porém, que muitas dessas empresas adotem expedientes conservadores ou predatórios para algumas funções, tais como índices elevados de turn-over, trabalho temporário, empregos part-time, informalização. Contudo, uma pesquisa realizada por Fleury; Humphrey (1993 Apud BERNARDES, 2000, p.242) revelou que o padrão de difusão dessas inovações era bastante desigual inter e intra-setores e que algumas das mais raras e “sistêmicas” experiências de modernização se contrapunham a mudanças pontuais em um grande número de firmas.

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116

fabricação de produtos com maior densidade tecnológica, substituídos pela

importação ou comercialização de produtos e componentes similares. Esse padrão

de especialização levou à regressão de trajetórias empresariais de promoção da

tecnologia, interrompendo processos de aprendizagem, o que por sua natureza

cumulativa significou perdas substanciais na capacitação tecnológica local.

Conforme Bernardes (2000, p. 244) “em linhas gerais, o processo de ajuste e

de reestruturação produtiva caracterizou-se pela ausência de coordenação

governamental federal e dos estados quanto às diretrizes que deveriam orientar as

estratégias concorrenciais no médio e longo prazo para o setor industrial”.

2.2 – O PROCESSO DE PREPARAÇÂO PARA PRIVATIZAÇÂO

Tal como descrevemos, as mudanças ocorridas no ambiente político-

institucional e econômico brasileiro e a revisão do regime de política industrial no

início da década de noventa, evidentemente, repercutiram de modo contundente nos

rumos traçados pela Embraer. A empresa chegava ao final da década de oitenta em

uma condição crítica no tocante à sua capacidade de financiamento e gestão

financeira, de desatualização do seu parque tecnológico, além de seu prestígio

começar a ser questionado. Segundo Lopes (1994, p. 364) “com o intuito de

economizar US$ 109 milhões e “salvar a empresa”, seu diretor presidente Ozílio

Silva ordenou a redução dos 12.607 funcionários que a empresa contratava, em

1989, para 8.353 trabalhadores em 1990, ou seja, eliminou 4.254 vagas. Essa

medida controvertida lhe custou a própria demissão”.

Com o agravamento da crise da Embraer, no início de 1990, é indicado um

novo diretor presidente, João Cunha, homem de confiança do presidente Collor, que

vinha com a missão de sanear e restaurar a empresa. Um dos seus primeiros atos

diante das pressões exercidas pelo vencimento das dívidas de curto prazo foi

requisitar ao Banco Central a aprovação de um reempréstimo de US$ 600 milhões e

determinar a demissão de mais 3.100 funcionários. É digno de menção que em

1991, pela primeira vez em catorze anos, a Embraer não montava o seu estande na

Feira de Le Bourget, por absoluta falta de dinheiro. Passados alguns meses, mesmo

com a aprovação da operação do reempréstimo pelo então presidente Collor, João

Cunha não resistiu às pressões internas e renunciou ao cargo da empresa (LOPES,

1994, p. 346). O reempréstimo que foi concedido pelo Banco do Brasil, mediante

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117

operação concretizada pela agência do banco no paraíso fiscal das ilhas Cayman,

pode ser considerado o último grande apoio do governo, uma vez que o Tesouro

deu aval a essa operação, que visava a consolidar diversas dívidas bancárias e com

fornecedores.

Com a saída de Cunha, em junho de 1991, regressa novamente para a

Embraer, para ocupar o cargo de diretor presidente, Ozires Silva, com a missão de

recuperá-la, conduzindo a empresa até a etapa final de privatização, em 1994. Na

visão de Ozires Silva, quando reassumiu o comando da Embraer, “a empresa tinha

se transformado quase numa repartição pública: estava burocratizada, o governo

não lhe repassava recursos, seus produtos estavam desatualizados. Tinha dívidas

de curto e médio prazos no total de US$ 600 milhões. A ficar na mão do Estado, vi

que iria desaparecer, o que seria uma perda irreparável para o Brasil, porque foi a

única empresa do país que criou uma marca internacional”49.

A partir desse momento, em consonância com a conjuntura interna e externa

adversa (recessão do mercado mundial de aviões), a Embraer procedeu a uma série

de ajustes internos que visavam a modelar sua atividade produtiva à nova realidade

de mercado. A primeira grande alteração foi na política de comercialização, a qual

no seu segmento civil levou à transferência das atividades de marketing e vendas

para a subsidiária integral da Embraer nos Estados Unidos da América, a EAC –

Embraer Aircraft Corporation. Nessa linha, vinculou-se à EAC a Embraer Aviation

Internacional localizada na França, com o propósito de reforçar uma política

coerente e integrada de busca e conquista de mercados (LOPES, 1994, p. 346).

No plano microempresarial, foi instaurado um extenso programa de prestação

de serviços e fabricação de produtos, não só para indústrias nacionais, como

internacionais, cobrindo as áreas de usinagem, materiais compostos, informática e

laboratório de aferição e testes, entre outras. Contudo, o pesado endividamento – o

vencimento das dívidas registravam US$ 241,5 milhões, em 1992 – aliado à redução

das vendas, acarretaram a suspensão da entrega de materiais, com reflexos

negativos para as linhas de produção (Brasília, AMX, flaps do MD-11, etc.), abalando

o prestígio, a credibilidade e a imagem da empresa no exterior. De outro lado, a

Embraer, por ser empresa estatal, não dispunha de acesso a fontes tradicionais de

financiamento, como o BNDES. A ausência de linhas de crédito à exportação a partir

49 Entrevista à revista Rumos do Desenvolvimento, 22 (41). Rio de Janeiro, outubro de 1997.

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118

de outubro de 1990, quando foram suspensas as linhas de financiamento do Finex,

somente retomadas em 1991, com a criação do programa de Financiamento à

Exportação – Proex, prejudicou muito a competitividade da empresa (Ibidem).

Essa situação foi bem percebida quando se criticava a falta de sincronia entre

o processo de abertura comercial e o gerenciamento da política governamental.

Essa falta de articulação, ou mesmo de visão, acabava por prejudicar a

competitividade das empresas. Para Furtado “à medida que caíram os incentivos

fiscais às empresas exportadoras, estas se viram numa posição difícil, não apenas

devido aos problemas de competitividade, como também devido ao fato de que

muitos vieses anti-exportadores, ainda vigentes na economia brasileira, não haviam

sido superados ou revistos. Os três vieses principais são: a oneração de impostos

federais e estaduais incidentes sobre insumos e produtos industrializados

destinados à exportação; a ausência de mecanismos de financiamento pré e pós-

embarque, afetando sobretudo o setor de bens de capital; e a obsolescência e

excesso de regulamentação da estrutura portuária no Brasil, agravando sobre-

maneira a exportação de manufaturados” (FURTADO, 1994, p. 80). É necessário

assinalar que as aeronaves produzidas pela Embraer, para efeito da legislação

tributária, são classificadas no item referente aos bens de capital e, portanto, a

empresa foi também afetada por essas medidas.

Nesse novo contexto, a privatização da empresa passa a ser concebida

seriamente como a única alternativa para o resgate das condições de

competitividade e a própria sobrevivência da Embraer. Em janeiro de 1992 ela foi

incluída no Programa Nacional de Desestatização do governo brasileiro. Entre 1991

e 1994, a empresa apresentou níveis elevados de prejuízo e de endividamento, além

de forte queda do seu faturamento, perdendo em média US$ 235 milhões por ano.

Os anos que precederam o processo de privatização foram seguidos por vigorosa

política de saneamento e de racionalização da mão-de-obra. Entre 1989 e 1994,

foram eliminados 7.354 postos de trabalho, provocando uma redução global do nível

de emprego (ver Gráfico 6). Segundo Sbrigia; Terra (1993, p.26 apud BERNARDES,

2000, p. 247) ” tal processo de racionalização demonstrou-se traumático, causando

impacto negativo no conjunto de funcionários. Houve perda de quadros qualificados

e estratégicos para a empresa, muitos com longa e sólida trajetória de formação

profissional, alguns que haviam custado milhares de dólares para o Estado brasileiro

com cursos de especialização e doutoramento no exterior. O processo de ajuste e

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119

desestruturação empresarial acabou por gerar sérias dúvidas no mercado

internacional quanto à viabilidade e às condições reais da Embraer de honrar os

seus compromissos”.

GRÁFICO 6 – Evolução do Nível de Emprego da Embraer, 1980-1994

02000400060008000

100001200014000

80 85 89 90 91 92 93 94

Emprego TotalNúmero de pessoas ligadas à produçãoNúmero de pessoas não ligadas à produção

Fonte: Embraer (1996)

Em virtude de tal legislação, a Embraer provisionava em seus balanços antes

da privatização uma dívida de U$ 56 milhões por conta de ações trabalhistas

diversas. Note-se, no entanto, que embora tenha ocorrido “a perda de quadros de

funcionários de alta competência e qualificação, o Departamento Técnico,

considerado o coração da empresa, foi preservado, sendo, em 1993, somente 10%

informes àquele existente antes da primeira onda de demissões” (SBRIGIA &

TERRA, 1993, p. 26 apud BERNARDES, 2000, p. 247).

Por fim, após três anos de um processo desgastante de cortes e saneamento

da empresa, a Embraer, por meio de leilão na Bovespa (Bolsa de Valores de São

Paulo) realizado em 7 de dezembro de 1994, foi transferida para a iniciativa privada.

O leilão foi adiado seis vezes até essa data. Na época, representantes dos

sindicatos locais questionavam a venda de uma estatal do porte da Embraer. Os

argumentos defendidos pelos representantes dos trabalhadores e das entidades que

se manifestavam contra a privatização foram expressos em um documento

apresentado à direção da empresa, sem sucesso, que basicamente se resumia em

dois pontos” (SBRIGIA; TERRA, 1993 apud BERNARDES, 2000, p. 248): 1. “a privatização representaria um risco de perda de investimentos em

tecnologia e treinamento de mão-de-obra especializada, obtidos ao longo de

24 anos com sacrifício de outros programas prioritários para o país”;

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2. “a privatização poderia levar a Embraer à condição de mera montadora de

aeronaves, com a desativação da área de projetos, com transferência de

tecnologia nacional à concorrência internacional e com geração de demissões

em massa de pessoal altamente qualificado”.

Quando foi privatizada, a Embraer continuava a enfrentar uma situação

delicada quanto a sua gestão interna, sua condição no mercado mundial de

aeronaves e seu conflito com o sindicato local. Conforme relata: AN, 44 anos,

casada, Assistente Social e ex-diretora de Sindicato

“a saída de Ozílio Silva da Embraer marca o fim de um ciclo político da

empresa e da indústria nacional. Representa o fim de um domínio ativo da cúpula da

Aeronáutica, derrotada pelo Ministério da Economia, que imobilizou a empresa

dando continuidade à política de Collor para as estatais.

A Embraer é mais do que um local de disputa de áreas do governo, é a prova

viva da possibilidade econômica e tecnológica da empresa nacional. É uma pedra no

sapato dos que querem entregar as estatais e o mercado interno em troca da dívida.

A construção de base tecnológica eficiente, independente dos objetivos

militares que a conduziram, fornece ao país uma tecnologia de ponta, para além da

indústria bélica e da própria indústria aeronáutica, capaz de criar empregos e

melhores condições de vida. As dificuldades colocadas pelo governo americano para

liberar a compra do supercomputador, dá uma idéia de quanto é dolorido para o

imperialismo este desenvolvimento. Esta eficiente empresa já é a maior fornecedora

de aviões para a aviação regional dos Estados Unidos.

Isto demonstra que a Embraer é uma empresa que pode ser lucrativa se bem

administrada. Mas o maior lucro que a Embraer pode dar é o desenvolvimento de

tecnologia independente. A Embraer é uma empresa eficiente. Os críticos do seu

“inchaço”, que acusam a empresa de passar de 7,7 mil trabalhadores em 1985 para

12 mil em 1988, não revelam que a receita bruta por trabalhador aumentou de US$

28 mil em 1985 para US$ 43 mil em 1988. Esses números representam à passagem

de uma empresa média para uma grande empresa, de importância internacional.

Demonstram que agora seria a hora de dar um salto de qualidade de todo

investimento de capital humano, revertendo em benefícios para a população. É neste

momento que o governo tenta vendê-la para o capital estrangeiro.

Por trás do discurso neoliberal, de abrir fronteiras, de liberdade de

investimento, de liberdade de capital e para os trabalhadores, o que existe, o que é

posto em prática, é a política de favorecimento dos grandes monopólios

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internacionais, a desarticulação do movimento sindical e o desprezo pela

representação política, pela organização independente da sociedade.

A saída oferecida pelo neoliberalismo à Embraer é a privatização. É uma

privatização que visa a destruir tanto a organização dos trabalhadores quanto a

resistência dos militares que querem a manutenção dos privilégios, tanto quanto dos

que pretendem a independência tecnológica da aviação.

A privatização começa com a demissão de 4 mil trabalhadores – incluindo

gente que estava na empresa desde a sua fundação há 20 anos – de projetistas,

operários especializados, e ganha corpo com a quebra da organização dos

trabalhadores, demissão de cipeiros e afastamento de diretores do sindicato e

repressão à ação sindical no interior da fábrica.

É neste contexto que chega o novo presidente João Cunha, uma cara nova,

nem parecendo que foi excluído do Ministério da Economia e que ganhou o cargo

para fazer o papel sujo de entregar a empresa para o capital privado. Ele vem para

“acertar a contabilidade”, na intenção de acelerar o processo de privatização.

Mas o processo de privatização é bem mais do que isso. A gestão de Cunha

vai continuar a política de demissões em nome do “enxugamento”, vai continuar sem

reajustar salários, concedendo abonos aqui e ali, colocando sempre os trabalhadores

na defensiva. Uma gestão sem garantia de emprego, sem garantia de trabalho.

Transformar a Embraer em uma montadora de aviões, com salários baixos e sem

pesquisa, este é o projeto de privatização.

Os empresários tecem pequenas lamúrias de suas perdas, o prefeito amigo

de Collor faz promessas de ajuda, enquanto os trabalhadores e o povo de São José

dos Campos sofrem na pele as conseqüências da política do governo. Enquanto

isso, os “amigos” da Embraer põem em ação o sucateamento da empresa, primeiro

passo para a desmontagem de uma indústria nacional de ponta”.

Neste período, o programa ERJ-145 encontrava-se em desenvolvimento e a

principal fonte do faturamento da empresa provinha em grande parte dos programas

Brasília e AMX (ver Gráfico 7).

Por sua vez, a venda das aeronaves EMB-120 Brasília havia declinado com a

recessão mundial (Gráfico 8). Apesar de ser um produto notável, o preço do Brasília

era considerado alto, em parte por causa da tecnologia de ponta de alguns de seus

sistemas, mas sobretudo pelos altos preços que eram cobrados pelos fornecedores

estrangeiros ao fabricante brasileiro. As dificuldades por que passou a Embraer no

período pré-privatização contribuíram para o aumento dos custos financeiros, com

impactos diretos na formação do preço do avião, no início da fase final do seu ciclo

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de vida, uma vez que o mercado aeronáutico já demonstrava claros sinais da

preferência pelos aviões movidos a jato. A dificuldade de financiamento ao

comprador, pela ausência de linhas competitivas de crédito para exportação, no

período entre o término do programa Finex e a entrada em vigor do seu substituto

Proex (1991/1992), foi outro fator negativo de impacto nas vendas do avião

(BERNARDES, 2000, p. 249).

O programa AMX, por sua vez, padecia das dificuldades da FAB em honrar

seus compromissos. O programa ERJ-145, jato de cinqüenta lugares, destinado ao

transporte aéreo regional, achava-se na fase de conclusão do protótipo. A empresa

encontrava-se desatualizada e necessitava de grandes investimentos para fazer

crescer o seu parque tecnológico. Em linhas gerais, isso significava dizer que os

desafios a serem superados pelos atuais donos da Embraer não eram pequenas e

nada triviais.

GRÁFICO 7 – Composição do Faturamento em 1994

5%

6%

8%

15%

32%

34%

0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40%

Outros

MD-11

EMB-312 - Tucano

Peças e componentes

AMX

EMB-120 Brasília

Fonte: Embraer (1996).

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123

GRÁFICO 8 – Composição da Receita Bruta por Produto entre 1989 e 1994, em US$ milhões

0

50

100

150

200

250

300

89 90 91 92 93 94

EMB-120AMXEMB-312Aviões LevesMD-11BandeirantesOutrosPeças e Partes

Fonte: Embraer (1996).

Por fim, é importante observar que a privatização da Embraer era inevitável,

por todos os motivos que já apresentamos neste estudo. Todavia a questão que

problematizamos é um ponto que já havia sido notado, ou seja, o programa de

privatização a partir do governo Collor não contemplou, desde a sua concepção e

execução, a construção estratégica de mecanismos ou estruturas de gestão

institucionais que previssem e viabilizassem investimentos para a reestruturação e a

ampliação da competitividade das empresas privatizadas (FURTADO, 1994, p.81).

No caso da Embraer, esse fato é crucial, pois repercutiu negativamente nas

negociações de privatização e venda da empresa. A indefinição quanto aos objetivos

e metas destinados para a Embraer, qual o lugar que ela ocuparia em uma

perspectiva de estratégia de desenvolvimento industrial e tecnológico, produziu

incertezas quanto ao futuro da empresa e à capacidade de ela responder aos

desafios que lhe eram reservados, abalando o prestígio e os negócios da empresa.

Nesse quadro, muitos não acreditavam na recuperação da Embraer e a

consideravam praticamente falida.

Podemos concluir que o desequilíbrio financeiro, em alguns momentos

o uso político da empresa pelo governo, a falta de acesso a linhas de financiamento

de longo prazo para o desenvolvimento dos programas, a ausência de uma

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consciência de custos na gestão empresarial e de uma visão negocial; e, além disso,

uma abordagem e cultura empresariais excessivamente voltadas para a tecnologia,

são os pontos críticos que explicam a decadência e a crise da empresa,

especialmente a partir da segunda metade dos anos oitenta.

As causas que produziram o desequilíbrio econômico-financeiro como

descrevemos foram diversas, destacando-se entre as principais:

- grandes projetos sem estrutura adequada de financiamento;

- desenvolvimento de projetos sem verificação prévia das condições do

mercado e das necessidades de clientes potenciais;

- não-cumprimento de encomendas pelo governo;

- mercado externo civil e militar em recessão;

- falta de competitividade nos mercados interno e externo no que tange à

oferta de financiamento aos clientes;

- apesar da história de excelência tecnológica da Embraer, sua gestão era

excessivamente mecânica, ou seja, muito orientada para a técnica e pouco para os

resultados financeiros;

- perda de competitividade no mercado interno por causa da carga de

impostos;

- redução do apoio financeiro governamental, como acionista, emprestador,

avalista e regulador de crédito a empresas estatais;

- relações precárias e dissociamento gerencial com as subsidiárias sediadas

no exterior (Embraer Aircraft – EAC e Embraer Aviation Interancional – EAI) que

afetaram negativamente os negócios da Empresa, tanto comercial quanto

financeiramente.

No entanto, é necessário considerar ainda, o seu modelo institucional, como

uma empresa estatal, a falta de flexibilidade empresarial para a captação de

recursos, o engessamento institucional da empresa e, por isso, a pouca liberdade

para a celebração de parcerias estratégicas, a falta de consciência de custos, os

problemas e as ingerências internas da empresa e, em determinados momentos,

seu uso político pelo governo e pelas forças armadas, que estariam na raiz de sua

crise.

De outro ângulo, não podemos deixar de considerar que a deterioração das

condições macroinstitucionais do ambiente político e econômico do país, a falta de

sincronia entre as políticas industrial, tecnológica e de privatização, as questões

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relacionadas ao chamado custo Brasil (deficiências na infra-estrutura física e

tecnológica, a legislação tributária, mesmo considerando os altos incentivos e

isenções fiscais), a falta de linhas de créditos mais competitivas para o

financiamento das exportações e vendas internas, a recessão mundial no mercado

de aviões, todos esses condicionantes afetaram negativamente a performance da

empresa, agudizando, ainda mais, sua frágil situação econômica. Esse fato é

importante também para explicar, em parte, a dificuldade para a Embraer encontrar

ou formar fornecedores de alta tecnologia no Brasil.

Nos anos setenta, os militares constituíram-se nos protagonistas centrais para

a gênese e formação da Embraer. Eles atuaram de modo que se garantisse a

aplicação continuada e coerente de políticas industriais e tecnológicas e a

concessão de benefícios à empresa. Com a conclusão nos anos oitenta do processo

de transição no comando da política econômica de quadros oriundos do antigo

regime por outros comprometidos com a democratização do Estado brasileiro, sai de

cena, ou pelo menos é reduzido significativamente, o poder de pressão dos militares

nas decisões e nos rumos do desenvolvimento econômico do país. Com efeito, a

Embraer acaba por perder também importante suporte político para seus

empreendimentos. Esse conjunto de fatores, aliado ao esgotamento do modelo

político e institucional de desenvolvimento tecnológico e econômico e a falta de

coesão sistêmica entre as políticas industrial e tecnológica na década de oitenta e

na primeira metade da de noventa, também constituíram óbices que dificultaram a

recuperação da empresa, após a finalização do processo de privatização, ajuste e

mudança que a Embraer enfrentará posteriormente.

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CAPÍTULO 3 – UM NOVO CAMINHO PARA A EMBRAER (1994 - 1998) 3.1-TEMPO DE MUDANÇA

A Embraer foi privatizada em dezembro de 1994, no mesmo ano da adoção

do Plano Real, sob gestão de Itamar Franco, que assume a Presidência logo após o

impeachment de Fernando Collor de Mello, motivado pelos fracassos das suas

sucessivas tentativas de estabilização da economia e pelas denúncias de corrupção

generalizada no aparelho público. Com o êxito relativo do Plano Real, consagrado

na estabilização da economia e na expansão do consumo doméstico, na fase inicial

do programa, Fernando Henrique Cardoso, então ministro da Economia, será

conduzido à Presidência da República. Assim, a nova visão do processo de

desenvolvimento econômico e industrial nacional, fundamentada nos princípios de

abertura, desregulamentação e integração regional da economia, instituída

efetivamente no governo Collor, é aprofundada no governo Cardoso. Segundo

Bernardes (2000, p. 253) “se no governo anterior as reformas políticas e econômicas

transcorriam num quadro recessivo e de crise institucional e de governabilidade, no

governo Cardoso tais reformas ocorrerão em ambiente de estabilidade

macroeconômica interna, na sua fase inicial, e posteriormente, de agravamento e

instabilidade da conjuntura financeira internacional, ocorrendo novidades e rupturas

com relação às tendências verificadas ao longo dos anos oitenta e início dos

noventa”.

O aspecto central desta fase, que se estende de 1994 ao primeiro semestre

de 1997, será o relativo êxito da política de estabilização lograda pelo Plano Real,

amparado na adoção de uma "âncora cambial" e no aprofundamento da abertura

comercial - redução das tarifas nominais e efetivas e eliminação de barreiras não

tarifárias, contribuindo para uma estrutura de proteção menor ao mercado doméstico

e promovendo crescente pressão das importações, o que resultou em grandes

déficits na balança comercial. Em agosto de 1994, após a edição do Plano Real, o

governo ensaiou uma mudança política, deixando a taxa de câmbio flutuar e

abandonando os esforços de preservar a taxa de câmbio real. Tal mudança,

associada a uma nova ampliação dos diferenciais de juros internos e externos por

razões de política monetária, levou a uma apreciação nominal do câmbio e, por

conseguinte, a um aprofundamento da tendência à valorização da taxa de câmbio

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127

real. Em março de 1995, sob impacto da crise do México e pressionado pela

deterioração da balança comercial, o governo brasileiro promoveu uma

desvalorização nominal de 5,2%, adotando novo regime cambial cujo principal

objetivo seria uma desvalorização gradual do real com relação ao dólar, mas sem

dar ao mercado nenhum sinal quanto à velocidade e a intensidade dessas

desvalorizações. (MOREIRA; CORRÊA, 1997, p. 71 apud BERNARDES, 2000, p.

254).

Na dimensão econômica, essa fase será caracterizada pela vulnerabilidade

econômica provocada pela combinação destruidora de sobrevalorização do câmbio

e juros elevados, abertura pouco criteriosa, altas taxas de desemprego e fé cega no

aporte dos investimentos estrangeiros no país. No plano político, essa fase pode ser

interpretada como uma grande mobilização governamental para a implementação

das reformas econômicas e constitucionais de natureza neoliberal, orientadas para

as mudanças estruturais (reforma econômica, tributária, administrativa e da

previdência social, relações de trabalho, entre outras), consideradas essenciais para

a consolidação da estabilidade, e para a continuidade do programa de privatizações

das empresas públicas como condição básica para garantir a estabilidade da

economia, cobrindo o déficit nas contas públicas, gerada, diga-se de passagem, pela

própria política econômica governamental e a criação de um ambiente mais

favorável para atração dos investimentos diretos estrangeiros (IDE) (Ibidem).

Nesse quadro de transição do modelo de desenvolvimento econômico, de

incertezas e indefinição quanto à direção das políticas industriais e tecnológicas, e

sob a gestão de um novo plano de estabilização da economia, a Embraer será

privatizada e submetida a um novo processo de ajuste econômico-financeiro,

mudança radical de seus valores e do seu modelo de competição. Sob comando dos

novos controladores da empresa, lançará o seu novo avião o ERJ-145 que será um

sucesso de venda no mercado mundial.

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128

3.1.1 - PRIVATIZAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO

Os elevados e contínuos prejuízos, num quadro de crise fiscal e institucional

do Estado, no início dos anos noventa, acabaram por inviabilizar qualquer tentativa

governamental para a resolução do impasse financeiro sofrido pela empresa,

tornando-se impraticável a manutenção de subsídios ou sua capitalização. As

dívidas da estatal alcançaram cerca de US$1 bilhão, em 1994. O governo federal

realizou um programa de saneamento financeiro, mediante uma operação de

capitalização, injetando recursos da ordem de R$350 milhões, sendo R$202 milhões

relativos a uma parte da dívida com o Banco do Brasil, R$68 milhões de uma dívida

com debêntures e R$125 milhões de um débito com a empresa canadense EDC.

Mais R$23 milhões de debêntures foram convertidas em ações. O governo assumiu

cerca de US$700 milhões da dívida da empresa, reduzindo o endividamento para

algo na ordem de US$350 milhões. Além disso, dois meses antes do leilão, o Banco

do Brasil fez um empréstimo para a Embraer no valor R$30 milhões, utilizados para

manter a empresa em funcionamento (MENDONÇA, 1997, p.14).

O leilão de privatização foi postergado por seis vezes, em virtude das

interrupções provocadas pelas manifestações e questionamentos dos sindicatos

locais (em especial, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos). No

leilão que ocorreu no dia 7 de dezembro de 1994, foram ofertados 6,2 milhões de

ações ou 55,4% do capital votante, ao valor mínimo de RS$153,75 milhões. O preço

mínimo do lote de mil ações foi definido em R$48,32, o que significou um deságio de

20% em relação ao valor patrimonial do lote de mil ações (R$60,00). O edital de

privatização exigiu que os novos acionistas capitalizassem a empresa em curto

prazo, numa proporção de cerca de 170 ações para cada lote de mil, o que se

estimou à época que corresponderia a um total de R$30 milhões (MENDONÇA,

1997, p.5 ).

A empresa foi arrematada por R$154,1 milhões, 0,3% acima do preço mínimo

fixado para o leilão, pagos integralmente em títulos da dívida de estatais “moedas

podres”( sendo o seu valor de mercado bem inferior). Foram vendidos 3.074 lotes de

mil ações, sendo 2.295 ao preço mínimo, totalizando R$114,750 milhões; e 779

lotes, a R$49, somando R$39.408 milhões. Esse valor foi pago integralmente com

títulos da dívida pública, o que significou um deságio médio de 50% sobre o valor

pago. O principal investidor individual foi o banco de investimentos Wasserstein

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129

Perella, um dos maiores dos Estados Unidos, sócio da maior corretora do mundo, a

Nomura Securities, que detinha participação de 20% no capital do banco. O

Wasserstein Perella passou a controlar 19,09% das ações ordinárias da Embraer,

investindo cerca de R$58 milhoes na aquisição. O consórcio liderado pelo grupo

Bozano Simonsen adquiriu cerca de 40% das ações com direito a voto da empresa.

Entre os principais investidores do consórcio estavam: o Bozano Simonsen Limited

(13,65%), o Sistel (10,42%), a Previ (10,40%), o Bozano Leasing (3,63%) e a

Fundação Cesp (1,9%). Considerando os 10% reservados aos funcionários da

empresa, a Embraer foi privatizada por R$265 milhões. Na privatização estava

incluída também a Embraer Aircraft Corporation, a Embraer Aviation International e a

Neiva, fabricante de aviões leves (MEDONÇA, 1997, p.5). Após o processo de

privatização, foi criada uma classe especial de ações, as Golden Share, conferindo à

União o direito de veto em matérias relativas à atuação da Embraer em programas

militares, mudança do objeto social e transferência do controle acionário.

3.1.2 - PERFIL DOS CONTROLADORES

O acordo de acionistas firmado em 7 de dezembro de 1994, no processo de

privatização da Embraer, garantia aos seus signatários o controle da companhia. A

composição acionária da Embraer, desde essa data, sofreu alterações com a saída

de alguns acionistas. Segundo Bernardes (2000, p. 257) atualmente, a empresa é

controlada por um consórcio constituído por:

- “Grupo Bozano Simonsen: uns dos principais conglomerados brasileiros,

com atuação nas áreas financeira, mineral, imobiliária, agrícola e industrial. O grupo

participa de 41 empresas dentre controladas direta ou indiretamente e coligadas.

Começou a existir há 34 anos, criado por Julio Bozano e Mario Henrique Simonsen.

Desde os anos setenta, vem diversificando seu patrimônio fora da área financeira,

participando da gestão das empresas do grupo. A obrigatoriedade da carta-patente

para a expansão no setor financeiro foi uma das causas da adoção dessa estratégia

da atuação do banco há duas décadas. Como banco atacadista, não precisava

realizar pesados investimentos na manutenção ou expansão de rede de agências.

Os seus lucros auferidos foram investidos primeiro no setor agrícola (café e laranja),

depois na mineração em sociedade com o grupo anglo-americano da África do Sul

(ouro, ferro, níquel e ferro-nióbio). Além dos empreendimentos imobiliários (shopping

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130

centers), atuava até 1992 nos setores industriais de fertilizantes, aglomerados de

madeira e produtos serrados. No biênio 1992/93, a participação nas privatizações

permitiu à instituição ampliar sua participação na área industrial – setor siderúrgico

(Usiminas, Cosipa, Companhia Siderúrgica de Tubarão). O grupo Bozano Simonsen

ficou conhecido também por participar dos processos de privatizações, com o

objetivo de saneamento das contas ativas e passivas, tornar as empresas rentáveis,

valorizar seus ativos e posteriormente revendê-las, auferindo, assim, sua margem de

lucro dessas operações”.

- “Previ - Caixa de Previdência Privada do Banco do Brasil: instituição pioneira

e o maior fundo de pensão do Brasil com 145.000 associados e reservas de US$12

bilhões, o que corresponde a um quarto de todo o sistema de seguridade social

brasileiro. Sua carteira de investimentos reúne mais de noventa empresas, das

áreas de mineração, bancos, telecomunicações, siderurgia e de imóveis. A Previ foi

criada há 81 anos, muito antes da instituição de seguridade oficial do país”.

- “Sistel – Fundação Telebrás de Seguridade Social: segundo maior fundo de

pensão do Brasil, com cerca de 300.000 participantes e capital de mais de US$2,7

bilhões. A maior parte dos investimentos da Sistel é dirigida aos setores de

telecomunicações, metalurgia, eletricidade, mineração, aviação, alimentação,

imóveis e shopping centers”.

- “Clube de Investimento dos Empregados da Embraer (Ciemb) – Clube

formado por empregados da empresa. O Ciemb foi criado em 4 de abril de 1994,

durante o processo de privatização da Embraer, e tem como objetivo obter a maior

participação acionária possível dos empregados no capital da Embraer”.

Conforme Bernardes (2000, p. 259) “alguns comentários sobre a estratégia e

o histórico de atuação do grupo Bozano Simonsen, líder do consórcio de empresas

que administram a Embraer, fazem-se necessários, pois tiveram e ainda têm

repercussão importante na rotina operacional da empresa, mesmo com o processo

de recuperação econômica da empresa alavancado pelas vendas do ERJ-145 no

mercado mundial”. Tal como descrevemos, este grupo tem um histórico mais voltado

às atividades de especulação financeira do que propriamente vocação produtiva

industrial, especialmente em áreas de alta tecnologia, como no caso do segmento

aeronáutico, caracterizado por elevados custos de desenvolvimento e alto risco

quanto ao retorno dos investimentos. Esse histórico de atuação do grupo gerou e

ainda tem gerado grande insegurança quanto ao futuro da empresa, uma vez que,

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131

com a saída do grupo Bozano Simonsen, e o eventual desinteresse de compra por

outro grupo nacional, seria aberta a retaguarda para que outra empresa concorrente

internacional adquirisse o controle acionário da Embraer e desativasse suas

atividades de projeto.

De acordo com Bernardes (2000, p.259) “esse temor ainda existe, apesar de

o governo brasileiro poder lançar mão das Golden shares, conferindo à União o

direito de veto em matérias relativas à atuação da Embraer em programas militares,

capacitação de terceiros em tecnologia para programas militares, mudança de

objetivo social e transferência do controle acionário”.Considerando a hipótese de

eventual saída do grupo Bozano Simonsen e o desinteresse de grupos nacionais,

considerando a já conhecida aversão ao risco do empresariado nacional e a falta de

estrutura de financiamento de longo prazo adequado às atividades tecnológicas de

risco e, de outro ângulo, a falta de objetividade e clareza quanto às contrapartidas e

ao interesse do governo no tocante ao estímulo de tais atividades produtivas high

tech, teríamos uma combinação de fatores desagregadores, que poderiam culminar

em um processo de desestabilização da trajetória de recuperação da empresa. Esse

é um problema ou uma questão importante, ainda a ser equacionada pela empresa

em relação ao seu futuro. Contudo, um aspecto importante da abordagem adotada

pelos novos controladores foi a continuidade da tradição e a preservação da

identidade de excelência tecnológica que caracterizou a Embraer quando estatal. A

nova diretoria executiva soube transformar e refinar esses valores adaptando-os

uma nova realidade concorrencial de mercado (Ibidem).

3.1.3 – UMA NOVA ADMINSTRAÇÃO PROFISSIONAL

Os novos controladores acionistas, liderados pelo Banco Bozano Simonsen,

preocupados em constituir uma nova administração profissional com a missão de

recuperar a empresa, elegem para o cargo de diretor-presidente Maurício Botelho,

engenheiro mecânico formado pela Escola Nacional de Engenharia, no Rio de

Janeiro, executivo que trazia em sua bagagem profissional passagem pelo grupo

Odebrecht e o cargo de diretor executivo do Bozano Simonsen. Se tentássemos

compilar a expressão que traduzisse mais fielmente o perfil desse novo corpo

administrativo, composto por executivos e profissionais de mercado e antigos

funcionários de carreira da Embraer, sem dúvida, seria o estabelecimento de um

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132

novo ciclo de negócios expresso no compromisso de uma administração empresarial

voltada para os resultados econômicos e a satisfação dos clientes.

Para Bernardes (2000, p. 260) “uma visão negocial pragmática e mais

objetiva, além de uma escala de valores pessoais menos romântica ou idealista: a

missão negocial da Embraer é construir aviões!”.

Do ponto de vista da estratégia de mercado, é o reconhecimento que a

sobrevivência e o desenvolvimento de novos projetos da empresa se realizarão

mediante parcerias institucionais ou empresariais e celebração de alianças

estratégicas que agreguem valor e fortaleçam economicamente a Embraer. Uma das

primeiras tomadas de decisão quanto à arquitetura de uma estratégia de mercado foi

a mudança de enfoque de mercado e a execução de um plano de reestruturação

profunda na Embraer. Foi uma mudança em relação à abordagem tradicional da

empresa, historicamente marcada pela excelência tecnológica do produto e dirigida

pela engenharia.

Para a nova direção, essa abordagem deveria ser radicalmente transformada:

se na gestão estatal o principal foco era o produto, a atenção de agora em diante

deveria ser o cliente e todas as ações deveriam ser orientadas para satisfazê-lo.

Além disso, havia agora a preocupação em demonstrar também resultados para os

acionistas da empresa. Esse fato não quer dizer que a Embraer, quando estatal, não

supria as necessidades do cliente, mas esse esforço, segundo dirigentes da

empresa, era muito mais intuitivo do que propriamente desenhado e elaborado em

uma estratégia racional e formal de mercado. Um exemplo desse argumento foi,

como já descrevemos, o programa CBA-123 Vector. Pela nova filosofia de

focalização em atividades de alta tecnologia, a empresa Neiva, depois de amargar

sucessivos prejuízos, foi posta à venda, sem sucesso.

Segundo Bernardes (2000, p. 261) a nova administração centrou sua

estratégia em quatro vetores básicos:

-“Formalização de um compromisso com uma administração de resultados

mediante uma estratégia de Reengenharia Financeira, Reestruturação Patrimonial,

Organização e Produtiva”.

-“Reconstrução das relações com os clientes e fornecedores mediante uma

política de busca incessante e focalização dos esforços da empresa para satisfação

ao cliente”.

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133

-“Plano de Ação com a identificação da missão da empresa, nova estratégia

de mercado e um plano de reestruturação organizacional e produtiva”.

-“Prioridade para a viabilização do programa ERJ-145”.

3.1.4 – ESTRATÉGIA FINANCEIRA

Durante os últimos anos, após a privatização da Embraer, foram

desenvolvidas estratégias financeiras destinadas a prover a empresa de uma

estrutura de capitalização compatível com suas operações, mediante alongamento

do perfil de endividamento e redução das despesas financeiras. A estratégia

delineada para a Embraer previa um plano de recuperação da empresa, que se

daria com o lançamento, certificação e vendas do projeto ERJ-145. Para auxiliar no

cumprimento dessa etapa, os novos acionistas injetaram US$500 milhões, em

capital e debêntures, entre janeiro de 1995 e agosto de 1996.

Com objetivo de suportar as atividades de comercialização e de

financiamento das operações da Embraer e suas controladas, além de agilizar a

compra de materiais necessários à fabricação de produtos da empresa, é constituída

no segundo semestre de 1995, como subsidiária integral, a EFL – Embraer Finance

Ltda., sediada em George Town Cayman, ilhas Cayman. Em 1995, a Embraer

obteve a aprovação de uma linha de financiamento do BNDES – Banco Nacional de

Desenvolvimento Econômico e Social, no montante de US$120 milhões, com prazo

de dez anos e três de carência. Segundo Bernardes (2000, p.262) “tais recursos

destinavam-se exclusivamente ao término do desenvolvimento do projeto ERJ-145 e

do programa de fornecimento de peças e equipamentos que integrarão o projeto do

helicóptero S-92 Helibus. Depois de tal evento, a empresa passa a desenvolver

relações mais coordenadas com o BNDES, em busca de financiamento para as

vendas externas dos seus produtos e serviços. Serão utilizados os recursos do

Proex (Programa de Financiamento às Exportações), gerenciado pelo Banco do

Brasil, Ministério da Fazenda e Ministério da Indústria, Comércio e Turismo, bem

como os financiamentos com recursos da Agência Especial de Financiamento

Industrial – Finame, por meio do programa Finamex – Financiamento à Exportação

de Máquinas e Equipamentos, gerenciado pelo BNDES”. Ressalte-se que esses

programas de incentivos às exportações são semelhantes aos existentes em outros

países, como o Eximbank nos Estados Unidos e Japão, Coface na França e Hermes

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134

na Alemanha, e evidenciam a confiança dos respectivos governos nos produtos

fabricados por eles. A ação do BNDES por meio dos programas de financiamento,

tanto o Proex como o Finamex, revelaram-se cruciais para a recuperação econômica

e competitiva da Embraer, como demonstraremos à frente. Após a privatização, a

empresa procurou estabelecer um adequado suporte à comercialização de suas

aeronaves comercias, instituindo a operação de compra e venda de aviões usados,

aplicáveis como pagamento parcial de aeronaves novas. Esse procedimento,

denominado comércio interno, objetivava atender a uma antiga exigência do

mercado doméstico e internacional para compra de aeronaves (BERNARDES, 2000,

p. 262).

. Segundo Bernardes (2000, p 263), “nos anos que se seguiram à privatização,

com o processo de reestruturação financeira e organizacional, a empresa começou a

apresentar melhora gradual do seu quadro econômico. Embora tenha auferido

faturamento de US$380 milhões em 1996, apresentando crescimento de 46,6%,

quando comparada a 1994 e o prejuízo tenha sido reduzido a US$42 milhões, o

endividamento da empresa ainda era significativamente alto – cerca de US$530

milhões” (ver Tabela 18).

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135

TABELA 18 – Indicadores de Desempenho Econômico-Financeiro da Embraer (valores em US$ milhões)

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Receita Bruta

Vendas

Mercado

externo (%)

Mercado

interno (%)

Ativo total

Patrimônio

líquido

Prejuízo

Endividamento

Geral (%)

Geral

Curto prazo

Longo prazo

582

37

63

1.092

126

(265)

88,3

620

502

118

402

32

68

1.435

324

(241)

77,2

804

241

563

333

32

68

1.227

86

(258)

93,6

877

309

568

261

38

62

1.125

156

(116)

86,2

758

394

364

177

40

60

1.067

281

(310)

73,6

410

221

189

295

39

61

1.107

188

(253)

82,2

470

226

244

380

35

65

1.221

281

(123)

71,2

535

214

321

833

84

16

1.424

-

(33)

45,8

382

251

131

1.581

89

11

-

-

86,7

51,5

815

665

150

Fonte: Embraer (2000).

Para Bernardes (2000, pp.263-264) “esse resultado devia-se, sobretudo, às

despesas financeiras decorrentes do período de pré-privatização e do volume

reduzido de produção que resultou em estoques excessivamente elevados”. O

mesmo ocorreu com excedente de mão-de-obra e de capacidade instalada, cujos

valores não utilizados na produção resultavam em despesas operacionais elevadas.

O quadro começará a ser revertido com o lançamento do projeto ERJ-145, que

alavancará as vendas da empresa, em virtude do reaquecimento do mercado

internacional de aviação regional e dos ganhos obtidos com a redução de custos

com o plano de reestruturação organizacional da empresa, com a redução de 11%

do quadro funcional acompanhado de um processo de modernização e

informatização das linhas de produção, que resultarão em níveis crescentes de

eficiência e qualidade dos ciclos de trabalho. As estratégias de reestruturação

produtiva e financeira possibilitaram o crescimento do faturamento, uma valorização

do patrimônio e o resgate do prestígio e da credibilidade da Embraer (Ibidem).

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136

3.2. – PLANO DE AÇÃO

Até sua privatização, a Embraer nunca dispusera de planejamento estratégico

ou plano de ação de longo prazo nos quais estivessem previstas metas a serem

atingidas, um sistema de indicadores de análise de desempenho e, sobretudo,

cobrança efetiva quanto ao cumprimento dos resultados da empresa.

Um sistema de planejamento com as projeções de metas de curto e longo

prazo, elaborado por todas as áreas da empresa, foi realizado pela primeira vez em

1996. Segundo Bernardes (2000, p. 267), “conforme afirmaram técnicos da empresa,

tal procedimento de planejamento e, sobretudo, a formalização de indicadores de

análise crítica de desempenho (Produtivo-Industrial, Financeiro, Recursos Humanos

e de Suporte aos Clientes) nunca haviam sido realizados antes, e no novo plano de

ação, passam a ser considerados o dínamo vital para a sobrevivência da empresa.

Esse Plano de Ação (PA) consistiu-se um instrumento central do novo modelo de

planejamento, acompanhamento, avaliação e julgamento, em que estão impressos

os compromissos da empresa com seus clientes, empregados e acionistas”. O plano

projeta uma visão de cinco anos, sendo acompanhado e avaliado mensalmente, e

revisto anualmente ou se alterando em decorrência de algum evento relevante que

modifique o cenário no qual a Embraer está inserida. O Plano de Ação e os

Programas de Ação baseiam-se nos seguintes princípios que objetivam atingir os

propósitos de Sobrevivência, Crescimento e Perpetuidade do Negócio: Satisfação do

Cliente; Descentralização das Ações; Planejamento; Delegação Planejada e

Parceria; e Retorno aos Acionistas. Os acionistas passam a ser considerados tão

importantes quanto os clientes e empregados, pelo fato de que deles provém o

capital para as atividades da empresa.

As estruturas do Plano e dos Programas de Ação da Embraer foram

constituídas segundo Bernardes (2000, pp. 267-268) “a partir dos seguintes pontos:

cenários socioeconômicos, políticos, industriais e mercadológicos; negócio e missão,

em que foram definidas a responsabilidade e a estratégia de ação do ponto de vista

político, mercadológico e empresarial; objetivos estratégicos; prioridades e

concentrações; as estratégias para se alcançar determinadas metas; os resultados

desejados; fatores críticos e apoios requeridos; a estrutura organizacional;

orçamento; e, por fim, a remuneração variável de acordo com o desempenho e os

objetivos atingidos” (ver figura 4).

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137

FIGURA 4 – Plano de Ação

Fonte: Embraer (2000). 1 Nacional e internacional, político, econômico, tecnológico, análise de mercado (regional, militar, etc), análise de competitividade (concorrência). 2 Produtos, instalações, recursos humanos, recursos financeiros, processos e tecnologia, estrutura organizacional, produtividade.

No mercado aeronáutico os compradores estão situados em um mercado

ofertante e com várias opções de escolha. Os compradores são poucos e a

GERÊNCIAS

DIRETORIA

Cenário Interno2

Diretrizes de Acionistas

Cenário Externo1

Integração dos resultados

EMPRESA

Análise Ambiental SWOT

Monitoramento

Verificação, adequação e Análise Funcional (Visão)

Plano de Ação EMBRAER

Prioridades e Concentrações Globais

Fatores Críticos

Diretrizes Globais • Cenário e Tendências • Negócio • Missão • Posicionamento e

Objetivos Estratégicos • Políticas Funcionais Hipóteses de Planejamento

Objetivos e Metas Globais • Vendas • Entregas • Produção • Dês. Programas • Projetos Corporativos

Políticas e Estratégias de Atuação Funcional

Negociação e Elaboração de diretrizes e objetivos específicos: • Negócio • Prioridades e Concentrações • Estratégias • Fatores Críticos

Diretrizes, Metas e Objetivos Específicos

Análise, Negociação e Adequação

• Negócio • Prioridades e Contratações • Táticas • Resultados Desejados • Orçamento • Organização • Fatores Críticos

Programas de Ação dos Gerentes

Programa de Ação dos Diretores

Elaboração PMS’s

Integração dos resultados

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138

concentração de compra é grande. O custo de mudança do comprador é

relativamente baixo. O comprador possui informações precisas sobre os

fornecedores. Esse mercado caracteriza-se como “pull”, ou seja, os grandes

compradores influenciam na decisão de compra dos menores. A qualidade dos

produtos oferecidos é semelhante e os “trade off” (possibilidade de realização de

negócio com outras empresas) é alto e existe a possibilidade de realizar “Leilão na

Compra”. Portanto, toda atenção vem sendo dada às expectativas e necessidades

das operadoras de transporte aéreo.

Conforme Bernardes (2000, pp.269-270) a estratégia e o plano global são

desenvolvidos com o foco voltado para o ambiente externo, analisando Cliente,

Fornecedores e Concorrentes. Na estratégia e no ambiente competitivo da Embraer

existem três categorias de risco:

1. “Risco de Liderança. É o risco ao qual a Embraer está sujeita em virtude da

ação dos concorrentes. A principal característica que compromete a liderança de um

participante desse mercado é a mudança tecnológica. Em razão do longo ciclo de

vida do produto e das características da fabricação, a mudança de um determinado

patamar tecnológico necessita de grandes investimentos. Os produtos que surgem

posteriormente no mercado e que incorporam novas tecnologias de engenharia e

produção podem ser elaborados com um custo menor. Dessa forma, a liderança

conquistada anteriormente fica comprometida”.

2. “Risco de Diferenciação. É o risco de que os produtos concorrentes

lançados no mercado incorporem maior valor agregado para o cliente. Novos

lançamentos tendem a incorporar as últimas solicitações do mercado, tanto em

evolução como em custos. A empresa líder que lançou seus produtos quando da

identificação de um nicho de mercado sofre as conseqüências desse pioneirismo”.

3. “Risco da Estratégia de Lucro. É o risco de os compromissos e as

estimativas adotadas na fase de estudo e concepção de um novo produto não

poderem ser cumpridos. A demanda prevista inicialmente pode, por motivos

econômicos e de mercado, não ser atingida. Devem ser considerados aqui também

os riscos financeiros, políticos e sociais”.

Anteriormente, a estratégia competitiva da empresa era articulada mediante

estudos prospectivos sobre a demanda de aeronaves encomendadas para

empresas de consultoria externa, e a metodologia era um atributo desses

consultores. A partir de 1998, foi criada uma área denominada de “Inteligência de

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139

Mercado”, em que a metodologia desses estudos prospectivos sobre o

conhecimento do mercado passou a ser endogeneizada na cultura e estratégia

competitiva Embraer, ou seja, a empresa começou a realizar seus próprios estudos

de mercado. Basicamente, os estudos incorporam as tendências de mercado pela

quantificação da demanda global de aeronaves mediante uma técnica de análise

chamada top down (de cima para baixo), que consiste em avaliar elementos como:

frota, quantidade de aviões em operação e condição da frota, evolução das vendas,

backlog (carteira de pedidos), unidades vendidas e não entregues, previsão de

vendas. A outra metodologia para quantificação é chamada bottom-up (de baixo

para cima) e consiste em abordagem direta com os clientes, sondando a

quantificação e o real interesse pelo novo produto. Para o ERJ-145 foram realizadas,

em 1997, por duas equipes, entrevistas diretas com 24 operadores norte-americanos

e europeus, apoiados por um estudo técnico e comercial, que representava 30% do

total de passageiros transportados no mercado da aviação regional. No caso do

ERJ-145 foram visitadas cerca de 50 empresas, avaliando-se requisitos como preço,

conforto operacional e técnico, entre outros (BERNARDES, 2000, p.269-270).

Para a elaboração dos estudos de Cenários e Tendências, de natureza

qualitativa, são consideradas as principais zonas de transporte mundiais como a

América do Norte, a Europa, a América do Sul e Central, o Oriente Médio, a África e

a Austrália. Nesses estudos são examinados critérios como: o número de assentos /

passageiros, distâncias típicas percorridas, tipos de motores (turboélices ou jatos),

custos de operação, requisitos homologadores e de clientes, projeções de

crescimento de PIB, custo do petróleo, distribuição da renda per capita, expansão e

abertura de novas rotas aéreas, entre outros. Em suma, em relação à estratégia

competitiva estatal, constatamos que hoje a Embraer dispõe de instrumentos de

análise bem mais refinados e sintonizados com os sinais de mercado, podendo

antecipar as tendências que, para esse setor sujeito a turbulências, pode significar a

própria vida da empresa. (Ibidem).

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140

3.2.1 - PROCESSO ORGANIZACIONAL

A partir da cristalização desse novo enfoque, iniciou-se amplo processo de

reorganização da empresa segundo uma visão integrada. A nova diretoria promoveu

uma mudança radical na organização interna da empresa. Foram criadas três vice-

presidências, todas integradas ao único objetivo estratégico de atender à

necessidade do cliente: industrial, financeira; e de planejamento organizacional e

qualidade. O processo de tomada de decisões passa a transcorrer em um novo

circuito de poder hierárquico. Na vice-presidência de planejamento, as ações

nascem a partir das demandas de mercado e dos clientes. Segundo Bernardes

(2000, p. 271) “nela são organizadas e institucionalizadas as consultas e as

demandas aos clientes, que resultarão no planejamento estratégico da empresa. A

vice-presidência financeira tem por diretriz de ação não somente exercer a função de

controladoria fiscal, tributária ou tesouraria, mas servir como ferramenta na

atividade-fim, provendo recursos para o desenvolvimento tecnológico e as vendas de

aviões e fazendo a intermediação financeira, que envolve desde a fabricação até a

venda do produto” (ver Figura 5).

FIGURA 5 – Organograma da Embraer Pós-Privatização

Fonte: Embraer (2000)

Diretor vice-

presidente Industrial

Satoshi Yokota

Conselho de Administração

Diretor presidente

Maurício Novis Botelho

Diretor vice-presidente de

Planejamento e Desenvolvimento Organizacional

Frederico Fleury Curado

Diretor vice-presidente

Financeiro e de Relações com o

Mercado

Antonio Luis F. Manso

Diretor vice-presidente

Comercial para Mercado Militar

Romualdo M. de Barros

Embraer Aircraft Corporation

Samuel D. Hill Presidente

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141

Foram também organizadas duas áreas de mercado distintas, tendo em vista

a natureza dos clientes e o foco de atuação de cada uma delas. A vice-presidência

civil comercial para mercado regional responde por 80% do faturamento da empresa,

e visa a atender ao mercado mundial de aviação de transporte regional. E, por fim, a

vice-presidência comercial para mercado militar, que responde por 20% do

faturamento da empresa. O produto militar é basicamente por encomendas,

atendendo às especificações minuciosas feitas pelo cliente e desenvolvendo o

produto em conjunto com ele. Nesse caso, o principal cliente da Embraer é a Força

Aérea Brasileira (FAB), mas os demais clientes também são considerados

importantes. Ressalve-se que 60% das aeronaves em uso pela FAB foram

fabricadas pela Embraer. (Ibidem).

3.2.2 - PROCESSOS DE TRABALHO

O processo de trabalho e gerenciamento da Embraer, quando estatal, era

considerado, tanto pelos funcionários quanto pela nova diretoria, departamentalizado

e hierarquizado. Com o objetivo de alterar tal sistema, a empresa iniciou em julho de

1996 um projeto denominado Redesenho de Processo de Negócio. De acordo com

Bernardes (2000, p.272) “o projeto foi dividido em cinco etapas distintas: diagnóstico

do ambiente, direcionamento, especificação, implantação e operação. Foi prevista,

em todas as etapas, notadamente na etapa de operação, a implementação de

melhoras contínuas nos processos por meio da Gestão da Qualidade Total”. A

construção do ambiente de negócio da Embraer baseou-se na missão da empresa,

seus produtos, volumes, características, metas de curto e médio prazos, fatores

críticos de sucesso, pontos fortes e fracos, unidades operacionais. Posteriormente,

foram modelados e formalizados os processos empresariais (oito ao todo), criando-

se o conceito de cadeia de valores da empresa, no centro da qual se encontram os

processos que são chamados de básicos, acima o processo que gera as diretrizes

do negócio e abaixo os que suportam os básicos, todos criando valor para o cliente

(BERNARDES, 2000, p. 272) (ver figura 6).

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FIGURA 6 – Processos Empresariais

Fonte: Embraer (2000)

Foram identificados também os macroprocessos (53 ao todo) que detalham

os processos empresariais. Para cada macroprocesso e processo prioritários foram

concebidos os principais atributos, tais como: missão, entradas e saídas,

funcionalidades, proprietários e diretrizes. Nesse estágio os principais instrumentos

para o gerenciamento das informações na empresa, como já descrevemos, são os

Planos e Programas de Ação. Na dimensão dos processos empresariais será

iniciada a gestão por indicadores e medidores, que irá monitorar o desenvolvimento

dos projetos e a análise de desempenho da empresa (Ibidem).

3.3 - O MODELO DE GESTÃO DE DESENVOLVIMENTO DO PRODUTO

O atual processo de Gestão de Desenvolvimento do Produto, quando

comprado ao modelo adotado na gestão estatal, implicou avanço considerável,

tornando-se muito mais integrado, eficiente e interativo, e por isso mais

interdependente dos times de inovação e dos departamentos, pois passou a ter

estreito relacionamento com todos os demais macroprocessos, encontrando-se mais

sincronizado com a Estratégia Geral da Empresa. Segundo Mendonça (1997, p. 29)

o objetivo desse macroprocesso é desenvolver produtos novos e/ou modificados

voltados para o mercado com preços e qualidade assegurados por meio de

processos bem definidos, recursos adequados com metas arrojadas de custo e

prazos que satisfaçam clientes, fornecedores, parceiros, acionistas, empregados. O

Produção

Suporte Empresarial

Gestão do Relacionamento com o mercado

Gestão do Desenvolvimento

do produto

Gestão do Material

Gestão de serviços ao

cliente

Gestão do Negócio

Gestão Econômico Financeiro

VALOR

VALOR

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143

modelo Gestão de Desenvolvimento de Produto, em relação ao modelo anterior,

considerado linear e pouco comunicante, é muito mais integrado, flexível e orientado

para um modelo arquitetural em rede de informações, interagindo com as diversas

áreas, e valendo-se de avanços importantes decorrentes das inovações

organizações e técnicas participativas implementadas no período, e por isso

demonstrou ser mais capacitado para responder em tempo real às soluções

demandadas. No plano da gestão empresarial da competitividade e dos processos

de aprendizagem e inovação tecnológica, o novo padrão de organização industrial,

fundado na integração, flexibilidade e na gestão de redes de empresa, demonstrou-

se um padrão superior quando comparado ao modelo anterior adotado pela Embraer

quando empresa estatal (Ibidem).

Todavia, o modelo de gestão empresarial e tecnológico da Embraer ainda

precisa avançar muito nos padrões de integração informacional interempresarial

para que possamos denominá-lo uma arquitetura plena de networking ou compará-lo

a ela. Mas tudo indica que a estratégia competitiva instituída pela empresa caminha

nessa direção, iniciando os seus primeiros passos na formalização de um modelo de

gestão baseado em conhecimento, organizado em rede e on-line com suas

parceiras. Das atuais empresas que participam dos programas ERJ-145 e ERJ-135

da Embraer, são poucas as que dispõem de capacitação tecnológica na operação

de softwares poderosos, que permitam a conexão direta e harmonizada no envio

dos desenhos industriais de peças e partes da aeronave, no mesmo padrão de

linguagem informática, sem que a Embraer tenha de retrabalhar e reconverter tais

imagens ao padrão de uso da empresa, caracterizadas pelos sistemas Intergraph e

Catia. Conforme Bernardes (2000, p. 274) atualmente a empresa investe pesado na

modernização e integração informática com os seus parceiros, pois, quanto maior a

integração, maior será a flexibilidade, a agilidade de respostas ao mercado e o

incremento da produtividade. Esse processo busca atingir o seguinte patamar:

-“Clientes e parceiros são envolvidos ao longo do ciclo desse processo”.

-“A organização é predominante formada por times multidisciplinares,

divididos por segmentos da aeronave”.

- “Os custos passam a ser permanentemente monitorados”.

-“Todos os planos de execução são agora interligados pelo sistema

corporativo”.

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-“A organização das informações é reunida em uma base única, garantindo

informações atualizadas e assegurando a sua disponibilização para toda a

empresa”.

Os processos são definidos, documentados, conhecidos, controlados e

atualizados. A Figura 7 apresenta as diversas fases do macroprocesso de Gestão de

Desenvolvimento do Produto.

FIGURA 7 – Fases do Desenvolvimento do Produto

Fonte: Embraer (2000).

3.3.1 – PROJETO DE TRANSFORMAÇÃO

A Embraer, durante sua existência como empresa estatal, ligada diretamente

ao governo federal, conviveu com uma estrutura organizacional de nível funcional

bastante verticalizada e rígida. Quando à organização e gestão das atividades e

processos dos trabalhos, a estrutura era compatível com a realidade da empresa

como uma estatal. No plano da diretoria, a Embraer basicamente conviveu com a

seguinte composição: uma superintendência e sete diretorias (industrial, técnica,

produção, comercial, programas militares, financeira e administrativa). Essa

composição decorria de sua condição de empresa Estatal, uma vez que havia a

proibição legal de se adotar uma estrutura mais flexível e compatível com suas

necessidades. Em contrapartida, chegou-se a ter dez posições funcionais (diretoria,

assessor de diretoria, gerente de divisão, assistente de gerente, assessor de

gerente, chefe de seção, subchefe de seção, supervisor, encarregado e líder)

(MEDONÇA, 1997). Essa estrutura era considerada, segundo a visão da nova

diretoria, além de rígida e conservadora, bastante centralizadora, não permitindo

liberdade de iniciativa a seus funcionários, provocando demora nas ações e/ou

respostas exigidas pelo mercado e mesmo internamente em atividades que

Estudos Preliminare Concepção Desenvolvimento Seriação Phase-Out

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demandavam urgência, culminando com uma comunicação deficiente e distante

entre as lideranças (chefias) e seus colaboradores (funcionários). Segundo

Bernardes (2000, p. 279) “a gerência, os recursos humanos eram caracterizados por

uma gestão voltada para os aspectos legais, em que a valorização das pessoas

como fator estratégico na obtenção dos resultados empresariais era frágil; o

desenvolvimento dos trabalhadores não tinha foco estratégico; o processo de

comunicação era deficiente e destacava-se uma baixa relação nas interfaces entre

as áreas de recursos humanos, impossibilitando uma gestão integrada e que de fato

interagisse com o ambiente de negócio”. O novo modelo organizacional a ser

instituído partia de uma concepção de configuração mista, matricial e funcional. Esse

modelo introduziu uma nova lógica de trabalho, migrando de uma organização

hierarquicamente orientada para uma modalidade de operação em times ou equipes

multifuncionais. Essa abordagem conceitual exigia na prática a formação de

comportamentos empreendedores de novos gestores, na acepção da gerência de

RH da Embraer. A grande âncora do programa de gerenciamento da mudança

esteve atrelada à formação de gestores de transformação na Embraer50 .

Em 1996, teve início um processo de transformação organizacional, com o

PROJETO TRANSFORMAÇÃO (TOR) que tinha como meta a melhoria do

relacionamento entre os funcionários, da imagem da empresa e da comunicação

entre os empregados e a focalização em atingir os objetivos e metas da empresa. O

projeto TOR teve como eixo principal a instalação do software SAP, e gradualmente

passou a integrar todos os processos produtivos e controle da empresa: compras,

vendas, produção, engenharia e desenvolvimento, etc. A gerência de recursos

humanos tornou-se o setor responsável pelos times de transformação e pela

implementação dos projetos que efetivamente poderiam impactar o processo de

transformação. Segundo Bernardes (2000, p. 280), “foram criados grupos

multidisciplinares com a missão de desenvolver projetos visando a trabalhar esses

pontos, alinhados com o conceito de times de trabalho”. Foram instituídos os

seguintes times:

50 Nesse programa foram investidos R$ 186.000,00 em 1997 e R$ 154.000,00 em 1998.

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Nome do Projeto Missão do projeto

É Time

Disseminar e incentivar a cultura de times multifuncionais voltados para os resultados da Embraer

Rádio Avião

Melhorar a comunicação entre liderança e liderado, empresa e empregados.

Gente é Comigo

Promoção da descentralização da gestão de RH na empresa, mediante a formação de lideranças gestoras de seus recursos humanos.

Saúde

Prevenir acidentes de trabalho e melhorar o bem-estar dos empregados.

Boa Idéia Implementar o programa de participação em nível corporativo. Foco no Alvo Implementar o sistema de gestão baseado em plano de ação. Empresa Modelo

Construir uma imagem positiva da Embraer entre clientes, fornecedores, parceiros, instituições financeiras, governo, mercado, imprensa, comunidade e funcionários.

Olho Vivo Assegurar o acesso e manuseio das informações sensíveis e tecnologias de empresa somente a pessoas autorizadas.

A implementação desses projetos buscou alcançar níveis mais elevados de

flexibilidade, interação e autonomia das ações empresariais. As metas e estratégias

têm sido elaboradas em conjunto com seus integrantes, o que vem proporcionando

redução significativa do tempo de trabalho para a conquista dos resultados

estabelecidos. Tal esforço consistiu na formação de uma cultura organizacional mais

voltada para a criatividade e inovação, favorecendo a aprendizagem organizacional,

uma vez que a troca de informações e o estabelecimento de compromissos para a

cooperação entre as pessoas consiste no eixo estratégico desse projeto.

Um primeiro resultado dessa nova forma de atuação, que procura a adesão

do funcionário à missão da empresa, foi o Projeto Boa Idéia, parte integrante do

programa de qualidade da Embraer, que num primeiro momento foi restrito somente

ao pessoal da produção, e que pretendia acolher sugestões para a redução de

custos e melhoria na produção. Entre 1995, e fevereiro de 1997, a Embraer investiu

nesse projeto RS$185 mil e já havia conseguido economizar cerca de US$1 milhão

com projetos idealizados pelos funcionários. Nos dois primeiros anos de

funcionamento do programa, foram enviadas 3.823 sugestões e delas, 1.264 foram

adotadas. O sistema de sugestões chamado Projeto Boa Idéia (chamado

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anteriormente de Programa Participação) tem como base a filosofia kaizen

(melhoramento, através da solução de problemas, em dois pontos de vista nas

empresas / organizações). São aceitas sugestões de todas as áreas, voltadas para

qualidade do produto ou qualidade de vida. Um exemplo interessante foi o processo

de limpeza das chapas das aeronaves (MEDONÇA, 1997). O antigo sistema

utilizava metil (produto altamente tóxico e inflamável) na remoção da camada de AZ

(que protege as chapas). A operação era realizada por até dez pessoas e consumia

de quatro a cinco horas de trabalho. Por sugestão de funcionários, a área de

produção passou a utilizar o produto ridoline, aplicado com jato de água quente.

Com esse sistema, são necessários apenas dois homens e duas horas de trabalho.

O ridoline não é inflamável nem tóxico51 (Ibidem).

Até sua privatização a Embraer jamais havia promovido uma pesquisa

completa de medição de seu Clima Organizacional, com o objetivo de diagnosticar e

implementar as ações cujos resultados viessem a apoiar o projeto de mudança

organizacional e cultural sob foco de um novo modelo de administração da empresa.

Tendo diagnosticado o clima motivacional interno da empresa, a nova direção, com

base na elaboração de uma nova estratégia e sem as restrições impostas pelo

governo federal, criou uma estrutura organizacional voltada para os princípios e

missão empresarial estabelecidos pela nova administração, com definição clara dos

resultados a serem atingidos pelo corpo de funcionários. Para agilizar as ações e a

comunicação aos seus clientes, parceiros, fornecedores, funcionários e público em

geral, sua estrutura organizacional foi reduzida a apenas quatro posições funcionais

(diretoria, gerente de divisão, gerente de seção e supervisor). Essa estrutura

comporta um grau de flexibilidade que respeita as características de cada área

(MENDONÇA, 1997).

Existem áreas, por exemplo, com apenas duas posições (diretoria e gerência

de divisão); outras com três posições (diretoria, gerência de divisão e supervisão).

Além disso, foi adotado na empresa um modelo de liderança matricial, no qual o

ocupante não possui uma denominação de cargo atrelada à estrutura organizacional

e nem mesmo tem posição identificada na estrutura, pois normalmente lidera a

execução de um trabalho, com prazo previsto para seu resultado, contando com

funcionários das diversas áreas formalmente constituídas. Sua atuação é como

51 Os participantes do programa não recebem gratificações pelas sugestões. Apenas participam de um sorteio de prêmios (videocassetes, bicicletas, microondas).

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consultor e facilitador em todo o processo de trabalho. Para cada missão, seja o

desenvolvimento de um novo produto, seja o aperfeiçoamento de produtos

existentes, seja a melhoria de um processo ou de um sistema, as equipes são

formadas com a participação de profissionais de todas as áreas funcionais

envolvidas: técnica, produção, suporte ao cliente, suprimento, etc. (Ibidem).

3.3.2 – PLANO DE CARGOS, SALÁRIOS E CARREIRA

Os recursos humanos sempre foram considerados fatores críticos de

competitividade para a Embraer. Entretanto, por ser empresa de economia mista,

subordinada ao governo federal, sempre teve dificuldade de adotar e pôr em prática,

seguidamente, as políticas e práticas definidas, não pela vontade de seu corpo

diretivo, mas, sim, por obediência às leis, decretos-leis, medidas provisórias. Como

empresa estatal, não podia conceder aumento aos funcionários, então se

promoviam as pessoas, e toda a massa de empregados viu-se acumulada nas faixas

de salários mais elevados. Com isso, acabaram-se as promoções, as carreiras, os

estímulos de baixo para cima.

Terminando o ciclo de privatização da empresa, quando ocorreram dispensas

de funcionários em massa, de acordo com Bernardes (2000, p. 283) “o clima na

empresa era de desmotivação, o retrato organizacional encontrava-se

desorganizado e o sentimento do quadro funcional era de descrédito e insegurança

quanto ao futuro da empresa, sentimento que ficou conhecido para os trabalhadores

que permaneceram na Embraer como síndrome dos sobreviventes às demissões”. A

percepção da nova gerência de RH entendia que o quadro funcional era muito

apegado aos modelos tradicionais de atuação e encontrava dificuldades em romper

com os antigos paradigmas de gestão empresarial. A maioria dos empregados, por

ter construído suas carreiras na empresa, valorizava muito o status e o salário,

deixando para um segundo plano o “’valor” do know-how adquirido (Ibidem).

Apesar de as singularidades tecnológicas de trabalho requererem nível de

especialização acima da média, a estrutura organizacional era essencialmente

funcional, favorecendo o aprofundamento da especialização, e dificultando a

formação de profissionais polivalentes, multifuncionais. Como conseqüência,

formavam-se profissionais com pouca mobilidade e com certa acomodação interna.

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Nessa nova fase a área de Recursos Humanos foi revitalizada e reorganizou sua

estratégia na busca de resultados que revertessem esse quadro.

Para alcançar as metas desejadas, centrou-se a atenção em dois pontos

fundamentais: o desenvolvimento de um Plano de Cargos, Remuneração e

Carreiras; e a mudança do perfil de recrutamento dos novos funcionários. Esses dois

enfoques acabaram por impactar diretamente a formação de uma nova cultura

organizacional e os valores da empresa. Em relação ao perfil de recrutamento,

passaram a ser selecionados novos funcionários egressos de outros centros e

universidades, sem necessariamente privilegiar os profissionais oriundos do ITA.

Essa medida causou e vem proporcionando grande modificação na cultura e nos

valores da organização (Ibidem).

De forma positiva, criou-se uma cultura propensa à diversidade, criativa e

inovativa.

Segundo Bernardes (2000, pp. 284-285) “o novo plano de cargos, salários e

carreiras, denominado de avaliação e capacitação graduada, foi desenvolvido pela

área de recursos humanos. O sistema adotado privilegia um novo sistema de

remuneração para estimular o aperfeiçoamento do funcionário e a competitividade”.

Esse sistema adotado pela Embraer é baseado nas habilidades dos empregados.

Nos termos de Zarifian (2001, p.58), poderíamos denominá-lo de modelo de gestão

baseado nas competências dos empregados. Os princípios centrais aplicados foram:

- “criação de um modelo de gestão integrado que enfatizasse a evolução e a

potencialização do desenvolvimento das qualificações, competências e

habilidades diversificadas dos funcionários, voltados para os resultados

empresariais”;

- “obtenção de um instrumento de gestão de carreiras, sucessão,

recrutamento, seleção, treinamento e desenvolvimento profissional”;

- “estabelecimento claro do controle de carreiras – horizontal e vertical na

empresa”;

- “remuneração fixa baseada no crescimento das qualificações,

competências e habilidades, demonstradas por aplicações de avaliações”;

- “favorecimento da melhoria da comunicação entre as lideranças e seus

liderados”;

- “promoção da conscientização de que o funcionário é o principal

responsável pelo seu crescimento profissional”.

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Com o auxílio de uma consultoria e extensa pesquisa de mercado, a Embraer

iniciou a implementação deste plano em duas fases. Na primeira, que compreende o

período de 1995 a julho de 1996, foi desenvolvida a definição/estruturação do Plano

de Cargos, cujas medidas mais importantes consistiram em:

- “elaboração dos perfis de cargos e funções, em uma metodologia de maior

abrangência de atividades, com redução de 1.298 para 277 cargos”;

- “estruturação do Plano de Cargos em seis grupos ocupacionais:

operacionais, administrativos, técnicos de nível médio, profissionais,

engenheiros e lideranças”;

- “montagem da estrutura salarial”.

A definição da Composição da Remuneração foi dividida em dois níveis:

- “remuneração fixa, tendo por base o valor relativo interno dos cargos que

compõem o plano; estrutura salarial compatível com o mercado; e,

finalmente, a capacitação demonstrada pelos empregados no crescimento

de suas qualificações, competências e habilidades”;

- “remuneração variável, associada aos resultados alcançados pela

empresa, equipes e indivíduos e alinhada aos Programas de Ação e

Planos de Metas Setoriais negociadas e avaliados”.

Na Figura 8 – Remuneração Global – a seguir, vê-se como a definição de

estrutura das trajetórias de carreiras foi repartida em dois planos:

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FIGURA 8 – Remuneração Global

Fonte: Embraer (2000).

- “carreira horizontal: indicação de agregação de novas qualificações,

competências e habilidades para a evolução profissional/salarial no

mesmo cargo”;

- “carreira vertical: indicação de agregação de novas qualificações, novas

competências e novas habilidades para o acesso a outros cargos,

podendo ser na própria área de atuação ou em outras áreas da empresa”.

A segunda etapa foi iniciada em agosto de 1996 e concluída em julho de

1997. Nessa fase foram desenvolvidos:

- “definição do plano de carreiras”;

- “definição do modelo de um instrumento que agregasse os indicadores de

qualificações, competências e habilidades requeridos pelos cargos e

funções”;

- “treinamento das lideranças para o levantamento dos indicadores de

qualificações, competências e habilidades”;

REMUNERAÇÃO GLOBAL

REMUNERAÇÃO FIXA

COMPARAÇÃO COM O MERCADO

VALOR RELATIVO INTERNO DOS CARGOS

QUALIFICAÇÕES, COMPETÊNCIAS E

HABILIDADES

REMUNERAÇÃO VARIÁVEL

ASSOCIADA A RESULTADOS

ALINHADA COM OS “PROGRAMAS DE AÇÃO” E

OS “PLANOS DE METAS SETORIAIS”

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- “elaboração das especificações dos indicadores de qualificações,

competências e habilidades dos módulos de cada cargo e função”;

- “montagem das carreiras dos cargos e funções”.

Conforme Bernardes (2000, pp.286-288) “considera-se que os levantamentos

dos indicadores de qualificações, competências e habilidades trouxeram maior

conhecimento da complexidade do conteúdo das atividades e dos requisitos exigidos

pelos cargos/funções e a necessidade de dotar a empresa de uma estrutura salarial

mais competitiva, notadamente para os cargos voltados para a tecnologia

aeronáutica, compatibilizando-a a sua realidade interna e aos parâmetros do

mercado, também internacionalmente”. Vejamos o Mapa de Movimentação de

Carreiras apresentado a seguir:

IMPLANTAÇÃO DO PLANO:

- “Aprovação pela Diretoria Executiva e Conselho de Administração”.

- “Promoção dos Enquadramentos Funcionais”.

- “Promoção dos Enquadramentos Salariais no mínimo das novas faixas

salariais estabelecidas, abrangendo 189 funcionários, com impacto de

2,6% sobre a folha nominal de salários”.

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ETAPAS DA PRIMEIRA FASE

- “Treinamento das Lideranças para o levantamento dos Indicadores de

Qualificações, Competências e Habilidades”.

- “Elaboração das especificações dos Indicadores de Qualificação,

Competências e Habilidades dos Módulos de cada cargo/ função”.

- “Montagem das carreiras dos cargos/função com impacto de 6,5% sobre a

folha nominal de salários”.

LEVANTAMENTO POSTOS DE TRABALHO

PERFIL DOS CARGOS

ENQUADRAMENTO PESSOAL ABAIXO MÍNIMO CARGO

PLANO DE CARGOS E REMUNERAÇÃO

AVALIAÇÃO DOS CARGOS

PESQUISA SALARIAL

TABELA SALARIAL

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ETAPAS DA SEGUNDA FASE

Período realizado: de agosto de 1996 a julho de 1997.

Etapas de trabalho desenvolvidas:

1. “Definição/Estruturação do Plano de Carreiras:

- Estudos/Definição do modelo de um Instrumento que agregasse os

Indicadores de Qualificações, Competências e Habilidades requeridos

pelos cargos e funções”.

2. Definição do Instrumento de Avaliação e Aplicação aos funcionários:

- “Estudos/Definição do Instrumento de Avaliação/Certificação de

Capacitação dos funcionários”.

- “Treinamento das Lideranças/Avaliadores na aplicação do Instrumento de

Avaliação”.

- “Avaliação dos funcionários e indicação do grau de maturidade no

cargo/módulo de Qualificações, Competências e Habilidades e das

necessidades de desenvolvimento pessoal e profissional”.

Treinamento para levantamento indicadores qual., compet. e

habilidades

Elaboração dos indicadores qual., compet. e habilidades

Definição do instrumento de avaliação e treinamento dos

avaliadores

Avaliação dos funcionários

Feed-Back Avaliador / funcionários

Indicadores de

Desenvolvimento

Plano de Treinamento & Desenvolvimento

Carreira

Atualização da Pesquisa Salarial

Indicação do grau de Q., C. e H. dos funcionários

Avaliação dos Cargos

Estrutura de Cargos e Remuneração

Enquadramento Funcional e Salarial

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3.Revisão do Plano de Cargos e Remuneração implementado na primeira fase:

- “Tendo em vista que os levantamentos dos Indicadores de Qualificações,

Competências e Habilidades trouxeram um maior conhecimento da

complexidade do conteúdo das atividades e dos requisitos exigidos pelos

cargos/funções e a necessidade de dotar a empresa de uma estrutura

salarial mais competitiva, notadamente para os cargos voltados para

tecnologia aeronáutica, a Embraer promoveu uma revisão da estrutura do

Plano de Cargos e Remuneração, compatibilizando-o à sua realidade

interna e aos parâmetros do mercado, também internacionalmente”.

Implementação do Plano:

- “Levantamento/Análise dos custos de enquadramento salariais”.

Promoção dos enquadramentos funcionais e salariais dos funcionários nos

módulos e níveis salariais, abrangendo 53% do efetivo elegível (ver figura 9).

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FIGURA 9 – Perfil/ Indicadores – Instrumento de Gestão

Fonte: Embraer (2000).

3.3.3 - DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL E EDUCAÇÃO Desde 1988, a Embraer já dispunha de um programa de alfabetização.

Contudo, com a introdução do Programa de Qualidade Total em 1989, verificou-se a

necessidade de se atrelar um programa de educação básica para assegurar o

sucesso do programa de qualidade. Com base em uma pesquisa de escolaridade na

empresa, constatou-se que 20% dos empregados da área produtiva eram carentes

de educação básica. Com intuito de criar as condições para o desenvolvimento da

competência de gestão, no início dos anos noventa instituiu-se o programa de

suplência de primeiro e segundo grau. O programa de educação básica, tido como

fundamento para o programa da qualidade total, prosseguiu com parcerias nas

escolas particulares para fornecimento de cursos técnicos voltados para as

atividades da empresa. As aulas eram ministradas em salas no centro de

treinamento da Embraer (BERNARDES, 2000, p. 289).

Em 12 de dezembro de 1997, a empresa conseguiu um feito memorável.

Cerca de 150 empregados de diversas áreas receberam o diploma de segundo grau

completo. Essa foi a última turma do supletivo e, a partir de então, todos os

PERFIL

DO

CARGO

E

INDICADORES

DE

Q, C, e H

AVALIAÇÃO DOS CARGOS

PESQUISA SALARIAL

RECRUTAMENTO E SELEÇÃO

MEDICINA, HIGIENE E SEGURANÇA

AUTO-ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL

PLANO TREINAMENTO E

DESENVOLVIMENTO

ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

PLANO DE CARGOS E

REMUNERAÇÃO

ADMINISTRAÇÃO DE CARREIRAS

MAPEAMENTO DE CARREIRAS

EVOLUÇÃO SALARIAL

PROMOÇÃO

PLANEJ. DE SUCESSO

RODÍZIO

APROVEITAMENTO INTERNO / TRANSFERÊNCIA

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empregados da empresa passaram a ter nível de escolaridade mínima do segundo

grau. Desde sua implementação o curso de suplência no segundo grau formou cerca

de setecentos alunos. O curso foi ministrado em conjunto com o Centro Educacional

São Paulo e com a prefeitura de São José dos Campos. O supletivo também foi

oferecido aos empregados de empresas prestadoras de serviços da Embraer

(Ibidem).

O setor de treinamento, embora considerado estratégico para a empresa,

passou por um processo radical de ajuste do quadro de funcionários, nos anos que

antecederam a privatização e prosseguiu após ela. Em 1996, restavam apenas três

analistas dos 107 funcionários da área de treinamento existentes em 1990.

Atualmente, essa atividade foi terceirizada e, segundo técnicos, com tal

procedimento ganhou-se muito em qualidade e economia de custos, uma vez que

para a realização de qualquer curso é feita uma pesquisa que obedece a alguns

critérios que avaliam a oferta, a qualidade e o preço dos cursos disponíveis no

mercado. Em 1996, foi operada uma mudança na área de treinamento, que implicou

melhora significativa na comunicação com os empregados da fábrica. O setor de

treinamento, que ficava a oitocentos metros da fábrica, hoje se situa bem em frente a

ela (Ibidem).

Em 1998, por exemplo, foram destinadas 63 horas de treinamento ao ano por

funcionário na Embraer. Evidentemente, esse indicador é uma proximidade do

esforço da empresa nas atividades de treinamento e, portanto, deve ser relativizado

pois, certamente, há funcionários que concentram muito mais horas de treinamento

por ano, que variará de acordo com o grau de importância de sua função ou das

atividades que exerce. Segundo Bernardes (2000, p. 290) pela análise da Tabela 19,

é possível notar a partir de 2001 a tendência decrescente da média global de horas

destinadas ao treinamento por empregado, sobretudo após o período de

privatização. A explicação para esse comportamento está em dois aspectos:

1. “a redução dos gastos ou verbas com o treinamento, que hoje se situam

na faixa de um por cento do faturamento da empresa”;

2. “a melhor equalização e focalização dos cursos que agreguem valor e

estejam sintonizados com a atual estratégia da empresa”.

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TABELA 19 – Média de Horas de Treinamento por Empregado

Ano Número de horas de treinamento

Média de horas de treinamento por empregado

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

420.000 300.000 300.000 204.000 204.000 132.000 92.600 48.953 393.854 346.854 398.521 560.000 402.000 265.584 377.769 454.437

33 33 33 34 34 38 29 20 63 47 46 61 40 25 32 36

Fonte: Embraer (2006).

Tendo em vista o atual ambiente de competição global caracterizado pelas

rápidas mudanças na fronteira tecnológica e o quadro interno da Embraer descrito

acima, a empresa tem investido em programas de treinamento e qualificação

profissional com o objetivo de transformação de valores. A qualificação das

lideranças, com visão estratégica, de mercado, de negócio e desenvolvimento

humano passou a ser considerado fator-chave para o processo de transformação e

competitividade da empresa. Essas novas diretrizes são mais nítidas nos programas

de formação de lideranças e gestores da empresa. Para isso, foi feito um convênio

com uma escola de pós-graduação (Instituto Nacional de Pós-Graduação – INPG), e

os funcionários interessados assistem aos cursos nas instalações da empresa, com

bolsa parcial (Ibidem).

Conforme Mendonça (1997, p.34) “os aperfeiçoamentos disponíveis são para

as áreas de gerenciamento industrial, administração de recursos humanos,

marketing e comércio exterior e administração. Foi elaborado, na Fundação Dom

Cabral, tendo em vista as singularidades da Embraer, um curso para o

desenvolvimento e transformação dos valores dos gestores da empresa”. Além

disso, vem sendo enfatizado o treinamento de vendedores, para torná-los aptos a

atender os clientes e, ao mesmo tempo, conhecerem detalhadamente a empresa.

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A empresa mantém convênio com o RHAE (Programa de Capacitação de

Recursos Humanos para Atividades Estratégicas). As bolsas são concedidas para

áreas prioritárias em tecnologia, quais sejam: engenharia industrial, de precisão e de

materiais; normalização; ensaios e certificação; gestão tecnológica e da qualidade e

produtividade; e modernização industrial. Para a preparação de técnicos

aeronáuticos, a empresa tem enviado engenheiros para o exterior financiados pelo

programa RHAE. Nos últimos anos, com a queda do orçamento federal, diminuiu o

número de engenheiros que usufruem deste programa na empresa. Como descrito

anteriormente, os produtos são de alta tecnologia, necessitando de treinamentos

específicos voltados para alto desempenho. O alto desempenho é traduzido em

desempenho do produto, desempenho de processos, desempenho dos serviços dos

clientes. A Embraer possui cadastrados aproximadamente novecentos cursos que

abrangem as mais diversas áreas: técnico-operacional, de gestão executiva, de

informática, de idiomas, entre outras (MENDONÇA 1997, p.34).

Os treinamentos podem ser realizados internamente ou por intermédio de

empresas contratadas e são ministrados em salas, oficinas e laboratórios da

empresa. Após o treinamento teórico nos processos especiais de fabricação (por

exemplo, tratamento térmico, tratamento de superfície) existe o acompanhamento de

um funcionário mais experiente, denominado “padrinho”, que acompanha o recém-

treinado por um período predeterminado, avalia o seu trabalho, e, ao seu término, a

Auditoria da Qualidade e Chefia imediata formalizam a sua qualificação. O

treinamento para os novos empregados inicia-se na integração. Para os engenheiros

novos são realizados cursos específicos sobre engenharia aeronáutica. Para

operacionais, os cursos são voltados às atividades de produção, atendimento aos

requisitos do sistema da qualidade, educação básica, atendimento a alguns

requisitos aeronáuticos dos órgãos homologadores. (Ibidem).

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160

3.4 - PLANO DE REESTRUTURAÇÃO (1994 - 1998) Após a privatização da empresa, a nova direção encontrou uma série de

dificuldades para levar a cabo o plano de reestruturação. Uma decisão do

Congresso Nacional impossibilitou qualquer corte no quadro funcional por seis

meses. A empresa tinha na época cerca de 5.600 funcionários e uma folha de

pagamento de US$10 milhões. A nova administração optou pelo caminho da

demissão de pessoal para tornar mais ágil a organização e reduzir os custos de

demissão dos trabalhadores e do processo de reestruturação administrativa, que na

sua fase mais dramática, no período que antecedeu a privatização da Embraer, foi

assumido pelo Estado brasileiro, entregando para a iniciativa privada uma empresa

já relativamente preparada para a nova fase que estaria por vir (BERNARDES, 2000,

p. 292).

Com o objetivo de incrementar a produtividade e a rentabilidade da empresa,

iniciou-se, em junho de 1995, profunda reestruturação administrativa e operacional

em suas unidades, reduzindo o efetivo e compactando atividades. Em junho de

1995, a empresa demitiu 1.700 funcionários, sendo 1.200 do setor administrativo

(chefias, compras, contabilidade, etc.) – entre eles 212 cargos de Chefia, entre

gerentes, chefes de seção, supervisores e encarregados – e quinhentos na área de

atividades produtivas (engenharia, engenharia de produção e ferramental). A

empresa reduziu em 17% o número de engenheiros, de um total de setecentos que

trabalhavam na empresa. Nas subsidiárias, Neiva e EDE, foram demitidos 250 de

um total de seiscentos funcionários. Entre 1995 e 1996, foram dispensados mais de

1.900 empregados, eliminando-se 275 cargos de chefias, totalizando 9.254

demissões do início do processo até depois da privatização. Os demitidos sofreram

um grande impacto sócio-econômico, que será analisado no Capítulo 4, tomando

como indicador a mobilidade espacial ocorrida com os ex-funcionários na cidade de

São José dos Campos.

Em abril de 1996, os dirigentes da Embraer reuniram-se com cerca de dez

representantes sindicais e propuseram reduzir uma nova rodada de demissões pela

metade em troca de uma diminuição de 10% na jornada de trabalho e nos salários e

a formação de um banco de horas. Em votação direta os funcionários aceitaram o

acordo, com a condição de que os executivos também reduzissem seus salários na

mesma medida. Já em 1997, com o impulso das vendas do ERJ-145, foram gerados

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161

624 novos postos de trabalho. Com isso, houve alteração na relação entre emprego

indireto e direto na produção.

Em 1994, 50% dos funcionários eram considerados mão-de-obra direta e 50%

de mão-de-obra indireta. Após a privatização essa proporção passou a ser de 67%

de mão-de-obra direta e 33% de mão-de-obra indireta, além de ter ocorrido uma

redução do nível do salário médio global da empresa da ordem de 25% (ver Gráfico

9)

GRAFICO 9 – Evolução do Nível de Emprego da Embraer, 1990-1998

Números Absolutos

0

2000

4000

6000

8000

10000

90 91 92 93 94 95 96 97 98

Emprego TotalNúmero de pessoas ligadas à produçãoNúmero de pessoas não ligadas à produção

Fonte: Embraer (2000).

A distribuição dos funcionários segundo a alocação nas atividades produtivas,

em 1997, encontrava-se assim: a linha de produção do Tucano empregava

cinqüenta pessoas; a do Brasília, oitocentos trabalhadores, e a linha do ERJ-145 já

empregava em torno de duzentos funcionários. Do quadro total de funcionários, que

somavam 4.494 pessoas em 1997, cerca de seiscentos postos de trabalho são

ocupados por engenheiros. Recorreu-se também a expedientes de demissão para o

rebaixamento dos salários da mão-de-obra. Foi o caso, por exemplo, dos 378

operários da linha de produção do EMB-120 Brasília e do EMB-312-Tucano, que

foram demitidos em 1997, em razão da queda de vendas dessa aeronave e,

conseqüentemente, pela ociosidade da capacidade instalada. Em 1998, com o

sucesso das vendas para o mercado externo dos jatos ERJ-145 e 135, foram

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contratados cerca de 2.243 funcionários. Isso gerou um grande número de

mudanças na empresa, processo que será analisado no Capítulo 4.

Segundo Bernardes (2000, p. 294) “estudos internos da Embraer sugeriam

que os salários médios dos operários de produção encontravam-se em níveis mais

elevados proporcionalmente aos de sua categoria. Aproveitando o período de

arrefecimento da demanda dessas aeronaves, a empresa demitiu esse contingente

para posteriormente contratar novos funcionários”. Por seu turno, os novos

funcionários apresentavam perfil etário mais jovem, eram menos resistentes às

políticas de produção e organização do trabalho e conseqüentemente tinham pouca

tradição e cultura sindical. O fato de essa mão-de-obra dispensada apresentar perfil

elevado de qualificação não se constituiu em constrangimento para o expediente de

demissão, pois o estoque de desempregados que dispõe dos mesmos atributos é

elevado em São José dos Campos. Segundo técnicos da empresa, quando há a

retomada da produção pelo aumento das encomendas, um mês de treinamento do

tipo em serviço já é o suficiente para que o operário esteja apto a desempenhar tais

funções. Ressalte-se que os procedimentos deliberados de rebaixamento do custo

da força de trabalho por demissão não é uma estratégia exclusiva da Embraer, mas

prática predatória de gestão da mão-de-obra, historicamente comum no setor

empresarial brasileiro (Ibidem).

Em relação às estratégias de exteriorização da mão-de-obra, foram

terceirizados os serviços de limpeza, segurança, uma parte de informática, de

alimentação, o centro de treinamento de pilotos, o treinamento de funcionários, os

transportes e alguns serviços associados a design. Segundo Bernardes (2000,

p.295) “os procedimentos de terceirização das atividades indiretas proporcionam

economia de aproximadamente US$80 milhões. Um fato interessante e que ilustra

bem o espírito de administração da empresa, quando estatal, é que a Embraer

dispunha de quatro restaurantes internos, cada um destinado a um tipo de status da

hierarquia funcional da empresa”. Diziam até mesmo que o melhor e mais requintado

restaurante de São José dos Campos era o que servia aos seus diretores e oficiais

militares. Estima-se que com o uso dos expedientes de terceirização a empresa

economizou cerca de US$5 milhões. Atualmente, existem dois restaurantes que

atendem a todos os funcionários sem discriminação de patente ou nível funcional da

empresa. Estimativas fornecidas por técnicos da empresa calculam que cerca de

1.100 pessoas trabalham na empresa mediante regime de subcontratação de

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terceiros. Evidentemente, técnicos e engenheiros que foram demitidos e,

posteriormente, foram recontratados como autônomos, encontram-se em situação

mais instável e precária, pois uma parte dos contratos é por tempo determinado.

Esse tipo de flexibilização numérica ou quantitativa do trabalho permite transformar

os custos fixos em variáveis, acabando por criar um segmento de trabalhadores de

“segunda classe” no espaço fabril, excluídos do acesso aos direitos sociais

(MENDONÇA, 1997, p.34).

Do ponto de vista da organização do trabalho, a Embraer ascendeu a

modalidades de flexibilidade funcional do trabalho mediante grandes inovações na

gestão operacional dos processos de produção com adoção de técnicas como o

“trade studies”, que consiste em grupos interdisciplinares de melhora contínua de

produtividade e qualidade (kaizen). Outra técnica que mudou radicalmente os

processos de trabalho e de produção foi a adoção do sistema “liason engineering”,

um sistema de interligação entre as diversas áreas da empresa, que auxilia as

tomadas de decisões e eventuais resoluções de problemas de um time de trabalho,

alocado full time para essa atividade, e que presta suporte ao produto na fase de

sua montagem ou fabricação. Com a adoção do “liason engineering” houve redução

de 50% do ciclo de trabalho na fase de produção das aeronaves EMB-120 e ERJ-

145 (BERNARDES, 2000, p. 295).

Com o aumento das vendas do jato ERJ-145, o ritmo de trabalho na linha de

produção, desde a etapa de corte das primeiras peças até a fase de montagem final

dos aviões, foi intensificado, alterando os planos de produção da empresa. Com

isso, a empresa está sendo obrigada a realizar uma ampla revisão dos métodos e

processos de trabalho, não só da Embraer, mas de todos os parceiros e

fornecedores envolvidos na fabricação do ERJ-145. A mudança de cultura no modo

de administrar a Embraer, a partir de sua privatização, também modificou a

mentalidade proeminentemente masculina da empresa. Desde 1997, a empresa

passou a introduzir a figura feminina em operações industriais até então só

exercidas por homens. Nesse período, cinqüenta novas funcionárias passaram a

trabalhar na empresa, nas instalações fabris. Com idade entre 18 e 27 anos, essas

mulheres desenvolvem atividades diferenciadas nas áreas de materiais compostos,

elétrica e de montagem final dos aviões. Seu trabalho está restrito aos processos

menos agressivos e que envolvam peças de menor porte. O nível dos salários das

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164

funcionárias é o mesmo dos postos masculinos. Um dos fatores que contam para a

contratação das mulheres na produção é sua formação em boas escolas

profissionalizantes (Ibidem).

Para Bernardes (2000, p.296) “o processo de reestruturação organizacional

dos processos produtivos também acabou por atingir os quadros de recursos

humanos mais qualificados. Embora o DTE, considerado o núcleo estratégico da

empresa, tenha sido preservado, muitos engenheiros e técnicos de alta qualificação

foram demitidos, e, com eles, o conhecimento armazenado durante anos foi perdido.

Em razão do alto custo e do tempo de reciclagem profissional de um engenheiro

aeronáutico, para que possa atuar em outros segmentos, o reemprego imediato não

é tão simples, é necessário algum tempo de adaptação para realocação

profissional”. Tendo em vista toda a crise que afetou a economia brasileira nos anos

noventa e as baixas atividades destinadas a P&D na indústria brasileira, muitos

engenheiros tiveram grande dificuldade em conseguir o reemprego, sobretudo nas

ocupações em que estavam habituados a trabalhar. Com efeito, muitos as

abandonaram ou mudaram de ocupação, passando a atuar como vendedores,

donos de bancas de jornais, alguns conseguiram a realocação para outros setores

da indústria ou dos serviços produtivos, outros foram recrutados por empresas

estrangeiras do ramo aeronáutico, sediadas em outros países. Conforme lócus da

pesquisa realizada com os ex-funcionários da Embraer, que será demonstrada no

capítulo 4, os engenheiros da Embraer ainda desfrutam de prestígio no mercado de

trabalho nacional e internacional. Com a recente recuperação do setor, alguns

engenheiros e técnicos têm retornado à Embraer. É importante mencionar que a

empresa tem um plano de realocação profissional e assistência social aos

funcionários demitidos, que tem sido aplicado com relativo êxito.

Os resultados do processo de reestruturação da empresa podem ser

apreciados pelos ganhos de produtividade que passaram de US$75 mil por

funcionário em 1995 para US$101 mil em 1996. Em 1997, a produtividade alcançou

a marca de US$172 mil de receita por funcionário, em 1998, US$242 mil da receita

por empregado e em 2005 a receita por funcionário é de US$ 243 mil. (ver Gráfico

10).

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GRÁFICO 10 – Receita por Empregado em Milhões de Dólares

75101

172

242 247

307

254227

172

243

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Fonte: Embraer (2005).

Com relação às entregas de aeronaves, em 1996 foram um total de 60

aeronaves e em 1999 um total de 123, e 163 aeronaves entregues em 2001,

conforme mostra a Tabela 20 abaixo:

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166

TABELA 20 – Total de jatos Entregues (1996 – 2001)

1996 1997 1998 1999 2000 2001

Aviação Comercial 18 10 13 103 157 155

Aviação Executiva 0 0 0 0 3 8

Defesa 18 5 17 3 2 0

Aviação Leve 24 24 26 17 17 0

TOTAL DE JATOS 60 39 56 123 179 163

Fonte: Embraer (2002).

No âmbito de remuneração, observa-se na Embraer uma queda dos salários

para os níveis operacionais. O piso da categoria estipulado em acordo coletivo em

1998 era de R$ 952 e em 2003 de R$564, conforme Tabela 21.

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TABELA 21 – Salário Médio do Total de Trabalhadores, dos Trabalhadores Mensalistas e dos Trabalhadores

Mensalistas em reais

Fonte: Pesquisa de Emprego e Salário Médio – Embraer (2005). Obs.: somente trabalhadores da Embraer (exclusive EDE, Neiva e Escritórios Internacionais)

1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

Horistas 665 687 778 863 757 630 740 952 1374 1460 1285 981 578 635 560 529 564

Mensalistas 1305 1348 1527 1694 1486 1237 1265 1341 1978 2271 2458 2235 1390 1577 1381 1262 1358

Total 1024 1057 1198 328 1165 980 1037 1191 1703 1872 1892 1601 976 1118 1039 992 1082

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168

Conforme Mendonça (1997, p.37), com relação à remuneração dos

profissionais de produção e de nível de gerência e executivos, foram feitas correções

para equiparar seus salários51 aos da sua categoria equivalente no mercado

nacional, mas ainda muito abaixo do valor pago nas grandes empresas mundiais

concorrentes no setor (ver Tabela 25).

Um estudo produzido pela subseção do Dieese, no Sindicato dos Metalúrgicos

de São José dos Campos, demonstrou que a massa salarial média no faturamento

da empresa, após a privatização, teve tendência decrescente. Segundo esse estudo,

a partir de meados de 1992, identifica-se uma tendência de recuperação dos salários

reais, que persiste até novembro de 1997. A reversão na linha de tendência passa a

ocorrer a partir dessa data, primeiro ano de privatização da Embraer, perdurando até

2003, conforme tabela 24. O processo de erosão do salário real foi verificado tanto

para os trabalhadores mensalistas como para os horistas. A identificação da queda

dos salários coincidiu com o movimento de contratação de novos trabalhadores,

motivada pela reativação da produção das aeronaves ERJ-145. Se tomado como

base o mês de abril de 1987, o salário dos horistas, em 1998, situa-se em um

patamar inferior ao nível salarial praticado em 1995. O estudo conclui que a queda

salário real, nos dois casos, foi provocada mais por uma política deliberada de

rebaixamento salarial do que pelo fator inflação. Como já descrevemos, de uma das

estratégias do plano de ação constava a redução global dos salários médios da

empresa.

Para Bernardes (2000, pp. 300-301) “quando analisamos o custo salarial da

mão-de-obra convertido em dólares, que na prática constitui um indicador de

competitividade internacional, observamos que o Brasil, se por um lado desfruta de

grande vantagem competitiva em ralação às nações fabricantes de aeronaves, por

outro tem o custo salarial francamente inferior a essas, motivado pelos baixos

salários pagos aos seus funcionários, havendo ampla margem para negociação dos

ganhos de produtividade com os trabalhadores”. Conforme Tabela 22.

51 A correção dos valores salariais para a média e alta gerência provocou a reação indignada pelo sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos, que já reivindicava reposição de perdas salariais, proporcionais aos ganhos consideráveis de produtividade auferidos com o processo de racionalização obtido com a privatização e pagamento de dívidas trabalhistas acumuladas desde o período estatal.

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TABELA 22 – Salário Médio da Indústria Aeronáutica por Hora/Pessoal/Produção por país (em US$)

Alemanha Austrália Bélgica Canadá E.U.A. Espanha França Inglaterra Otália Japão Suécia Romênia Índia Brasil*

23,44 12,41 14,81 18,33 17,79 10,84 12,75 12,48 12,56 12,96 13,54 1,20 0,77 4,15

Fonte: Dieese, Seção São José dos Campos * Dados de setembro de 2004.

3.4.1 - DA SÍNDROME DOS SOBREVIVENTES À SÍNDROME DA INSEGURANÇA NO EMPREGO

Na ótica dos funcionários da empresa, a privatização foi considerada

favorável, tendo em vista a quebra de determinados feudos – o exemplo dos grupos

de poder formado pelos egressos do ITA ou militares exemplifica bem a situação –

com gestação de uma cultura organizacional mais profissional, aberta, criativa e

baseada na competência dos funcionários.

Os valores e a dimensão ética do trabalho ou a própria identificação dos

funcionários com a empresa têm-se fortalecido muito com a recuperação da

Embraer. Os trabalhadores, sempre que têm oportunidade, exprimem um sentimento

de orgulho por trabalharem em uma empresa de alta tecnologia nacional. A adoção

de métodos de gestão mais participativos e com participação nos lucros tem sido

considerada benéfica na visão dos trabalhadores, embora todos admitam que

atualmente trabalhem muito mais do que na fase em que a empresa era uma estatal,

incluindo nesse contingente tanto os funcionários administrativos como os

relacionados às áreas de projeto e produção. Segundo Bernardes (2000, p. 302) “é

importante mencionar que a empresa remunera as horas extras trabalhadas apenas

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ao pessoal envolvido diretamente na linha de produção, sendo prática comum dos

funcionários ligados às tarefas executivas administrativo-financeiras, de

planejamento e desenvolvimento técnico ultrapassarem o limite da jornada de

trabalho legal, mas por vontade própria”.

Embora o padrão de condições de trabalho e de relações industriais possa

ser considerado bem acima da média observada na indústria brasileira e o fato de

que a nova direção venha procurando desenvolver relações mais democráticas com

o sindicato local, os dirigentes sindicais queixam-se de que a implementação desses

novos programas organizacionais e sistemas de gestão da força de trabalho tenha

implicado o engajamento individual dos funcionários, rompendo com os laços de

solidariedade e sociabilidade da categoria, tanto dos engenheiros como dos

metalúrgicos, diminuindo o poder de pressão do sindicato na condução das

negociações trabalhistas, fato que vinha ocorrendo antes e após a privatização da

Embraer. Para Rodrigues (1999, p. 290), os sindicatos perderam o poder de

negociação, pois “com a realidade industrial, social, política e cultural dos tempos de

globalização [...] as empresas estão numa posição confortável para enfrentar as

organizações sindicais, o que significa dizer que uma estratégia sindical não vem

apenas da vontade dos sindicatos, mas depende também do tipo de política adotada

pelas empresas, as quais, nessas últimas décadas, têm tido a iniciativa das

mudanças”. Outro motivo da perda do poder sindical local são os conflitos internos

entre seus dirigentes, que culminaram na criação do Sindicato dos Trabalhadores do

setor aeroespacial em 2006 (SindiAeroespacial). As categorias ocupacionais que

mais perderam com tal processo foram os funcionários menos qualificados –

faxineiros, segurança, copeiros, entre outros – que tinham o piso salarial nivelado

pela faixa salarial dos metalúrgicos. Essas ocupações foram completamente

terceirizadas. Algumas ocupações de engenharia, como manutenção, assistência

técnica e projetos passaram a ser terceirizadas e algumas a ser realizadas pela

contratação eventual de consultores, recrutados entre antigos funcionários

demitidos.

Desse modo, a análise sobre o processo de privatização e adoção de novas

políticas de gestão do trabalho nos conduz a algumas questões que merecem ser

mais bem problematizadas à luz crítica de uma perspectiva da sociologia do

trabalho. Na ótica do padrão de relações industriais da Embraer, não notamos que

tais novidades institucionais adotadas pela empresa possam ser consideradas como

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171

componentes de uma nova democracia industrial ou um modelo de co-participação

entre sindicatos e empresa. Ao contrário, segundo a visão dos dirigentes sindicais, o

processo de mudança foi implementado a partir de um re-projeto organizacional

presidido por uma lógica orientada para os resultados financeiros da organização e

prestação de contas aos acionistas, e nesse aspecto não se verificou um processo

de “reestruturação negociada” ou uma participação ativa dos sindicatos locais52.

Conforme relato: AN, 44 anos, casada, Assistente Social e ex-diretora de

Sindicato “o programa de participação de lucros e resultados da Embraer foi imposto de cima

para baixo, sem a devida negociação e transparências quanto às informações e ao

desempenho financeiro da empresa. As inovações tecnológicas também não têm

sido objeto de processos de negociação ou discussão com o sindicato local”. Um fato importante que não pode ser negligenciado é que, no caso da

Embraer, em contraste latente com as outras experiências de privatização na

década de noventa, 10% das ações da empresa foram reservadas aos seus

funcionários. Além disso, ao contrário de muitas empresas nacionais, a Embraer tem

gerado novos empregos, sobretudo de alta qualificação profissional.

As práticas de gestão da produção e de trabalho parecem ter plasmado um

regime fabril de consentimento e engajamento da mão-de-obra a partir da aplicação

pela empresa de uma política de “cooperação estimulada ou incitada53, para o

alcance da flexibilidade interna e a aquiescência dos trabalhadores em relação aos

novos métodos de organização e gestão dos processos produtivos, “buscando uma

52 Conforme demonstram os estudos de Maria Hermínia Tavares de Almeida (1999), no “caso das privatizações os sindicatos não tiveram participação alguma na elaboração da Lei nº8.031/90, que fixou o marco institucional do processo, definindo seus procedimentos e normas básicas, as agências responsáveis, as empresas a serem privatizadas e as formas e moedas de pagamento...quando se iniciaram as privatizações, os sindicatos, que a elas se opunham, tentaram bloqueá-las mediante recursos ao Supremo Tribunal Federal, e sobretudo, com mobilizações de massas de demonstrações públicas...A fim de romper a mobilização sindical, o governo concedeu os 10% das ações aos trabalhadores e estimulou a organização de clubes de acionistas dentro das empresas”. 53 Para Coriat (1991, p. 109) a expressão “engajamento incitado ou estimulado” traduz um regime de regulação social do trabalho em que os novos critérios de produtividade, quantidade e inovação são almejados mediante práticas de flexibilização interna do trabalho, obtidas por meio de contratualização, compromissados a partir de determinadas regras essenciais de condicionalidades e contrapartidas, ampliando as dimensões geralmente pouco cobertas (mercados internos...) das relações profissionais. A ambivalência neste tipo de relação é caracterizada, por um lado, por ela se apresentar como um modelo “moderno” de organização valorizando de modo sistemático o saber-fazer individual por meio de padrões de organização do trabalho inovadores, que asseguram uma gestão internalizada da qualidade e das estratégias fundadas na determinação do produto. Por outro lado, em relação ao grau e ao nível da contratualização das relações de trabalho, revelam-se como especialmente arcaicas e conservadoras. Em contraste com os exemplos de engajamento obtidos mediante compromissos explicitamente negociados, em que a flexibilidade interna é buscada entre as partes por formas contratualizadas de negociação entre capital e trabalho.

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nova postura profissional mais colaborativa ou, em termos de formação técnica,

possibilitando a construção de “novos mapas da versatilidade” dos recursos

humanos” (BRESCIANI, 1997, p. 89). E, nesse sentido, a herança, ainda viva, na

memória dos trabalhadores, de um ambiente fabril estigmatizado por um desgaste

profundo experimentado na fase pré e pós-privatização e, conseqüentemente, uma

situação de desemprego, deve ter contribuído para esse tipo de engajamento dos

trabalhadores no projeto empresarial da Embraer. Nesse contexto, o sentimento de

“síndrome dos sobreviventes às demissões” expresso pelos funcionários, ou seja, os

que não se adaptassem ou se submetessem às novas regras seriam naturalmente

excluídos e substituídos, poderia explicar em parte a rápida adaptação e introjeção

dos novos valores e compromissos difundidos pela nova direção. Recorde-se que as

taxas de desemprego aberto e oculto pelo trabalho precário e a oferta de

metalúrgicos na região são elevadas em virtude do fechamento, da desmobilização

e/ou da migração de empresas de São José dos Campos para outras regiões do

país ou do interior do estado de São Paulo. Nesse contexto, haveria prevalecido a

esperança de que, com a recuperação da empresa, haveria a concretização de um

horizonte no qual o bom desempenho dela resultaria na preservação e melhoria da

qualidade dos postos de trabalho.

Do ponto de vista das relações de trabalho, refletindo à luz da experiência de

transição organizacional e institucional da Embraer, seria plausível identificar a

emergência de novas esferas de regulação, como assinalaram Castro; Comim

(1998), expressas nos contornos de um “novo regime fabril ou de um novo padrão

de microrregulação que estariam acompanhados por novas formas institucionais de

canalização de interesses, produção de consenso e regulação de conflitos”.

Segundo Castro; Comim, “essas novas práticas de formação de consenso sobre o

processo técnico, introjetadas nos discursos empresariais de legitimação para o

esforço coletivo pela qualidade, produtividade e competitividade, fundados nos

princípio de “equidade cognitiva”, valorizando os conhecimentos formais e tácitos no

processo produtivo e inovativo, tendem a contaminar progressivamente as demais

negociações das relações sociais no trabalho, abrindo canais de representação de

interesses e identidade coletiva, que contornam e competem com os sindicatos

(CASTRO; COMIM, 1998, pp. 50-51 apud BERNARDES, 2000, p. 305).

A Tabela 23 apresenta os resultados da pesquisa de clima organizacional

realizada em 1995 e 1996 pela Embraer. Pelos resultados, podemos verificar que os

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níveis de satisfação dos funcionários em relação ao ambiente organizacional, apesar

de apresentar melhora em relação ao ano de 1995, não acompanharam o mesmo

ritmo dos esforços de crescimento da produtividade global obtida pela empresa. A

pontuação mais baixa entre os funcionários continuava sendo a das questões

relacionadas ao plano de cargos, remuneração e carreira da empresa. Como

demonstramos, o novo plano de cargos, remuneração e carreira, que entrou em

vigor no final de 1997, tenta reverter à situação, ocupando um lugar central na

estratégia concorrencial da nova administração da Embraer até hoje.

TABELA 23 – Pesquisa do Ambiente Organizacional da Embraer

Médias Assuntos 1995 1996

1. Planejamento, organização e controle 2. Liderança 3. Clima/ motivação 4. Perspectiva profissional 5. Relacionamento/ comunicação 6. Plano de cargos, remuneração e carreira 7. Benefícios 8. Administração de recursos humanos

52 45 46 66 44 43 45 54

65 56 66 66 55 50 62 68

Fonte: Embraer (1997).

No levantamento de campo realizado com os novos contratados e os que

permaneceram na Embraer que será mostrado no capítulo 4, 85% dos trabalhadores

apontava como principais virtudes ou vantagens da empresa a política de salários e

benefícios, a oportunidade de carreira e o orgulho de trabalhar na empresa. A

principal fragilidade apontada era a insegurança dos trabalhadores devido às

reestruturações feitas após a privatização, que geraram desconfiança em relação à

gestão da Embraer até hoje. Se refletíssemos a experiência da Embraer adotando a

tipologia proposta por Standing (2000, p. 77 apud BERNARDES, 2000, p. 306), para

o qual o processo de expansão da insegurança do trabalho se desenvolve em várias

instâncias, poderíamos identificar pelo menos cinco dimensões da insegurança em

relação ao trabalho:

Insegurança no emprego. Embora predominantemente a forma de

contratação seja o assalariamento formal, observa-se que a maior fragmentação e

dispersão da mão-de-obra se dão pela subcontratação de trabalhadores temporários

eventuais, em tempo parcial, trainees, aprendizes, estagiários, etc., contratados em

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condições precárias, sem seguridade social, assistência médica, aposentadoria, etc.

Enquanto aumenta a precarização de parcela da força de trabalho, ampliam-se e

consolidam-se mercados de trabalhos “internos” e “externos” das firmas. Dada a

crescente sobreposição de formas produtivas heterogêneas, as grandes e modernas

empresas tendem a reforçar a “precarização”, quando optam pela subcontratação de

partes de sua força de trabalho de pequenas empresas que, na maioria, participam

de uma economia informal.

Insegurança de renda. Devido à contratação em condições de eventualidade

de uma parcela dos trabalhadores e à deterioração do mercado de trabalho, os

rendimentos tornam-se variáveis, instáveis ou sem garantia. Nota-se distanciamento

entre o poder aquisitivo dos assalariados e o avanço da produtividade, com o efetivo

rompimento da relação salário/produtividade até recentemente vigente. Mesmo entre

os trabalhadores estáveis, essa relação é alterada. Seu rendimento é maior que o

dos demais – para assegurar sua responsabilidade, integração e identificação com a

empresa – mas não guarda relação com a produtividade.

Insegurança no posto de trabalho: por causa do movimento tendencial da

negociação e da regulação do trabalho em direção a formas individualistas e

promocionais, em contraposição às anteriores de proteção coletiva. O salário, por

exemplo, tende a reduzir sua participação, ao passo que crescem os ganhos ou os

prêmios relativos à qualidade, à participação, gerando formas de contratação cada

vez mais individualistas (STANDING, 2000, p.78 apud BERNARDES, 2000, p. 307).

Esse movimento manifesta-se diferentemente segundo os contextos sociais e

econômicos, o nível de participação dos trabalhadores, a sindicalização e a

capacidade das organizações sindicais de enfrentarem os desafios da flexibilização.

No entanto, sinaliza um problema crescente: a negociação coletiva defronta-se com

o desafio da expansão dos trabalhadores precários e subcontratados e,

conseqüentemente, existe risco de exposição jurídica do contrato coletivo de

trabalho.

Insegurança na organização sindical. Essas tendências anteriores acentuam

a fragmentação dos trabalhadores, pondo suas organizações na defensiva,

enfraquecendo suas práticas reivindicatórias de conflito e negociação e reduzindo

seus níveis de sindicalização. Esses fatores terminam por diminuir a importância dos

sindicatos na vida dos trabalhadores.

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3.5 - A EMBRAER NA ATUALIDADE A Embraer, desde o início, destacou-se como um exemplo de excelência de

capacitação e inovação tecnológica no cenário produtivo nacional. Conquistou o

mercado de transporte aéreo regional internacional com a linha do EMB-110

Bandeirante, para dezenove passageiros e o EMB-129 Brasília, de trinta assentos;

os dois aviões garantiam à empresa, no passado, a liderança de vendas na

categoria turboélices para os Estados Unidos, o maior mercado de aviões e clientes

da companhia no mundo.

A Embraer possui um parque industrial de 1,5 milhões de metros quadrados,

com 233.500 metros quadrados de área construída com modernas instalações e

equipamentos, como um avançado parque de usinagem e instalações para a

fabricação de peças em material composto. Suas instalações estão interligadas a um

aeroporto, que serve como pista de teste, vôos e preparação dos aviões para

entrega. A empresa possui uma Divisão de projetos, Fabricação e Assistência Pós-

Venda para trem de pouso e componentes eletrônicos de precisão para toda a linha

de aeronaves, fundada em 1969, com uma área construída de 11.100 m², como já

descrito no capítulo 1.

Os principais produtos da Embraer são:

1- AVIÕES COMERCIAIS:

• EMB110- Bandeirantes: Primeiro avião produzido pela Embraer. Avião

turboélice de passageiros para 19 lugares com aproximadamente 500

unidades vendidas.

• EMB121 – Xingu: Avião turboélice executivo de passageiros com

aproximadamente 100 unidades vendidas.

• EMB120 – Brasília: Avião turboélice de 30 lugares com mais de 400

unidades vendidas. Seu principal mercado são os Estados Unidos. Líder de

vendas na categoria por muitos anos é utilizado por 26 empresas em 14

países, tendo atingido mais de 3 milhões de horas de vôo.

• ERJ 135: jato regional para 37 passageiros.

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• ERJ 140: novo jato regional para 44 passageiros, seguindo o conceito de

“famílias de jatos” iniciado com o ERJ-145, oferecendo alto grau de

comunalidade como benefícios operacionais e de manutenção, incluindo a

mesma certificação para os pilotos. O desenvolvimento desta aeronave

exigirá investimentos da ordem de US$ 45 milhões.

• ERJ 145: Avião a jato de 50 lugares. Destinado ao mercado regional, possui

119 unidades com vendas confirmadas. Produto recente da empresa, objetiva

alcançar custos de aquisição e operação semelhantes ao dos turboélice.

• ERJ 170: Avião a jato de 70 lugares. Nova plataforma que servirá de base

para o ERJ 190.

• ERJ 190-100/200: Avião a jato. Versão alongada de ERJ-170, pela adição de

secções de fuselagem, motores mais potentes, asas de maior envergadura e

trem de pouso reforçado. Os investimentos previstos para os dois novos

projetos são da ordem de US$ 750 milhões. Está sendo projetado em duas

versões de 98 (ERJ-192-100) e 108 (ERJ-200) assentos.

• Legacy 600/ Shuttle/ Phenom 100/300 e Lineage 1000: jatos destinados ao

mercado executivo.

• Aviões Leves fabricados pela Neiva: EMB201 Ipanema, EMB400 Urupema,

EMB710 Minuano, EMB721 Sertanejo, EMB810 Seneca.

2 - AVIÕES MILITARES:

• Tucano: Avião de treinamento militar e líder de mercado, destaca-se pela sua

facilidade de pilotagem, baixo custo de manutenção e grande capacidade de

execução de manobras. Foram vendidas mais de 640 unidades em diversas

versões: Versão Básica; Versão Tucano França; Super Tucano.

• ALX – Super Tucano: Avião militar turboélice de nova geração, desenvolvido

a partir da experiência adquirida com o Tucano, em duas versões –

Operacional e de Treinamento. Esta aeronave possui um cockpit semelhante

ao de um caça, com avançada aviônica fornecida pela Elbit, de Israel.

• AMX: Avião tático militar foi concebido e está sendo fabricado por um

consórcio: Aeritália, Aermacchi e Embraer. Foram fabricadas 35 unidades.

• SIVAM – (Sistema Integrado de Vigilância da Amazônia): desenvolvimento

do ERJ-145 RS, versão de sensoriamento remoto baseado no jato regional

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ERJ-145SA AEW%C, aeronave de alerta aéreo antecipado. O programa de

Cooperação Internacional para o Governo Brasileiro com a participação da

Embraer visa a proteção e o desenvolvimento sustentável da Região

Amazônica, pretende garantir o controle ambiental, monitoramento da

ocupação territorial, a vigilância da região e o controle do tráfego aéreo. Esta

aeronave está equipada com um grande radar Ericsson Erieye e sistema de

comando e controle.

3 - FORNECIMENTOS DE SEGMENTOS E SUBCONTRATADOS AERONÁUTICOS

• Flap do MD11 – McDonell Douglas: Certificada pelo sistema de Qualidade

Douglas, a empresa fabrica os flaps para o avião MD11. • Segmentos para o Boeing 777: Certificados pela D1900 – Advanced Quality

System for Supplier, a empresa fabrica o Dorsal Fin e o Wing Tip para os

aviões 777 da Boeing.

• Parceria com a Sikorsky: Certificados pelo sistema de Qualidade de

Sikorsky – S2000, a empresa possui um acordo de parceria com a empresa

Sikorsky para a fabricação do helicóptero S92.

Atualmente, a Empresa Brasileira de Aeronáutica S/A (Embraer) é uma

sociedade anônima de capital aberto, com 16.953 empregados em 2005, mas que já

sofreu várias alterações desde sua privatização, como já foi visto (ver Gráficos 11 e

12):

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GRÁFICO 11 – Evolução do Número de Empregados (1995 a 1999)

4.319 3.849

6.737

8.302

4.494*

1995 1996 1997 1998 1999

* Em abril/97 o número de empregados atingiu 3.200, o menor

desde a privatização Fonte: Embraer (2000).

GRÁFICO 12 – Evolução do Número de Empregados (2000 a 2005)

10.334 11.04812.227 12.941

1465816.953

2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Embraer (2005).

Nos dias atuais, a Embraer é a 4ª maior indústria aeronáutica do Ocidente,

atrás somente da Boeing, do consórcio Airbus e do Grupo Bombardier (seu

concorrente direto) e líder em todo o Hemisfério Sul. No final de 1998, com o

sucesso de vendas do programa ERJ-145 (50 lugares) e ERJ-135 (35 lugares), a

Embraer se tornou líder mundial de jatos regionais.

O grupo Embraer mantém suas atividades de engenharia, desenvolvimento e

fabricação no Brasil, com quatro unidades industriais, localizadas em São José dos

Campos, Eugênio de Melo, Botucatu e Gavião Peixoto, todas no Estado de São

Paulo. Possui também um fábrica em Harbin, China, em associação com a empresa

chinesa AVICII. Para dar suporte às operações de pós-venda, conta com centros de

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serviços e vendas de peças de reposição próprias em São José dos Campos, em

Fort Lauderdale – Flórida e Nashville – Tennesse, EUA, e em Villepinte – França,

além de redes autorizadas especializadas no mundo.

O suporte às atividades de comercialização, marketing e promoção é

realizado pelos escritórios localizados em São José dos Campos – SP, em Fort

Lauderdale – Flórida, EUA, em Villepinte – França, bem com os escritórios de

Beyjing – China e de Cingapura.

Além destas unidades, estrategicamente distribuídas pelo mundo, a Embraer

mantém uma joint venture com a empresa suíça Liebherr, denominada ELEB –

Embraer Liebherr Equipamentos do Brasil, da qual detém 60% do capital, localizada

em São José dos Campos – SP. Esta unidade é responsável pelo desenvolvimento

e manufatura dos trens de pouso das aeronaves da Embraer e de outros fabricantes,

além de fabricação de peças mecânicas e conjuntos hidrelétricos. Outra expansão

na rede de serviços está situada na Europa através da aquisição da OGMA –

Indústria Aeronáutica de Portugal, uma empresa portuguesa de manutenção e

produção aeronáutica, da qual a Embraer, em composição com European

Aerospace and Defense Group (EADG), adquiriu 65% do capital.

Durante os últimos anos, após a privatização da Embraer, foram

desenvolvidas estratégias financeiras destinadas a prover a empresa de uma

estrutura de capitalização compatível com suas operações, através do alongamento

do perfil de endividamento e com a redução das despesas financeiras. A estratégia

delineada para a Embraer previa um plano de recuperação da empresa, que se deu

através do lançamento, certificado e das vendas do projeto ERJ-145.

Conforme já mencionados no item 3.2.1, p.151, até a sua privatização a

Embraer nunca dispôs de um planejamento estratégico ou plano de ação de longo

prazo onde se previam as metas a serem atingidas, um sistema de indicadores de

análise de desempenho e, sobretudo, uma cobrança efetiva quanto ao cumprimento

dos resultados da empresa. A inexistência de um sistema formal e de

institucionalização de análise do desempenho constituía-se em um componente

desagregador de uma estratégia empresarial e competitiva dinâmica e consistente.

Um sistema de planejamento com as projeções de metas de curto e longo prazo,

elaborada por todas as áreas da empresa, é realizado pela primeira vez em 1996.

Conforme os técnicos da empresa, tal procedimento do planejamento e

sobretudo, a formalização de indicadores de análise crítica de desempenho

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(produtivo-industrial, financeiro, recursos humanos e de suporte aos clientes) nunca

havia sido realizada antes, e dentro do novo plano de ação passa a ser considerada

o dínamo vital para a sobrevivência da empresa. Este plano de ação (PA) constitui-

se um instrumento central do novo modelo de planejamento, em que estão

impressos os compromissos da empresa com os seus clientes, empregados e

acionistas.

A partir da cristalização desse novo enfoque para a empresa, iniciou-se nesta

fase um amplo processo de reorganização da empresa, segundo uma visão

integrada. A nova diretoria promoveu uma radical alteração na organização interna

da empresa.

O processo de reestruturação e modernização da Embraer, sem dúvida, foi

crucial para a etapa de recuperação e implementação da nova estratégia de

competição da empresa no sentido de assegurar sua posição no mercado mundial e,

ao mesmo tempo, possibilitou uma organização mais integrada e flexível para

responder aos desafios da nova realidade concorrencial. Por outro lado, a política de

celebração de alianças ou parcerias de riscos tem se revelado uma estratégica

realista e crucial para a viabilização de projetos futuros, com aprendizados

tecnológicos importantes, especialmente, na redução dos custos de produção.

Na verdade, a estratégia de reestruturação e modernização, aliada à

estratégia de formação de alianças, acaba interagindo de forma positiva e recíproca

com a arquitetura empresarial dinâmica de competição atual.

O modelo de organização industrial presenciado no arranjo produtivo

aeronáutico pode ser melhor compreendido pela concepção de uma configuração

arquitetural de redes centralizada: um conjunto formado por cerca de 46 empresas

de médio e pequeno porte está organizado em torno da economia gerada por uma

empresa, a Embraer, que desenvolve a engenharia de projetos das aeronaves,

realizando a integração e montagem dos sistemas, estruturas, fuselagem e

componentes, desempenhando a função de coordenadora da rede global de

parceiras de riscos, fornecedoras mundiais e subcontratos locais, compra das firmas

satélites desta região insumos industrializados, serviços de usinagem, tratamento

térmico, aviônicos, serviços de engenharia de projetos, de softwares, entre outros.

As relações interfirmas desenvolvidas na região apresentam níveis diferenciados de

integração de propriedade, fluxos de transação comercial e tecnológico, mas com

um alto grau de integração de coordenação. Trata-se de uma organização industrial

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interempresas hierarquizador na sua essência; um tipo de “sistema solar”: “empresa-

mãe” e suas satélites subcontratadas fundadas em um intercâmbio particular entre

fornecedores e prestadores de serviços de engenharia, administrativos e produtivos,

formados por pequenas e médias empresas.

Conforme Bernardes (1999, p.35), várias dessas empresas nasceram de

empreendimentos de ex-funcionários e de iniciativas da própria Embraer (de 20 a 40

funcionários) criando diretamente 1.850 postos de serviços, e com um faturamento

mensal que oscila entre R$ 15 mil e R$ 350 mil. Situando-se num raio de 180 km da

empresa, estas pequenas e médias empresas, que se localizam na região, estão

distribuídas espacialmente da seguinte forma: 46% das empresas na região do Vale

do Paraíba, e 54%, em outras regiões de São Paulo, particularmente na região

metropolitana de São Paulo e de Campinas. O restante, em outros Estados da

federação, é dependente dos centros tecnológicos e institutos de pesquisa locais,

participando da cadeia aeronáutica através de um regime de subcontratação direto

com a Embraer, como a Cenic Akros, Digicom, Elebra, Eleb, ETA, Mectron, Neuron

– eletrônica, Fibra Forte, Aeroserv, Qualitas, N&N, Tectelcom, Altec, entre outras.

Entretanto, existem algumas empresas que integram a cadeia produtiva, fornecendo

peças, componentes e serviços técnicos, que estão localizadas em outras regiões

como a GE/Celma (Petrópolis/RJ), Aeromot e Aeroeletrônica (Porto Alegre – Rio

Grande do Sul), a Rolls Royce (São Bernardo do Campo – SP) e a NEIVA,

pertencente a Embraer (Botucatu – SP), (ver Tabela 24).

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TABELA 24 - Número de Empresas Subcontratadas, suas localizações regionais e distância da Embraer medida em kilômetros – 1999

Número de empresas subcontratadas, suas localizações regionais e

distância da Embraer medida em kilômetros – 1999 Nº de Empresas

Cidade / Região Distância Física da Sede em São José dos Campos

22 São José dos Campos 10km 11 Grande São Paulo 130km 1 Mogi das Cruzes 70km 5 Campinas 180km 1 Petrópolis – Rio de

Janeiro 390km

2 Piracicaba 230km 3 Taubaté/Caçapava 40km 1 Joinville – Santa Catarina 650km

Fonte: Embraer (1999).

Destes fornecedores, nenhum deles domina tecnologia de ponta. Nesse

segmento, a área mais promissora é a de usinagem convencional e ferramental,

uma vez que a Embraer não tem interesse em realizar investimentos vultosos na

aquisição de novos equipamentos. Os subcontratos são classificados em três

classes: simples, que realizam os trabalhos em tornos convencionais, com um

grande número de empresas; complexas, que utilizam tornos com controle numérico,

com poucas empresas; e muito complexas, centro de usinagem com controle

numérico com três eixos e, às vezes, um opcional, com poucas empresas. A

localização da ampla maioria dos fornecedores é no exterior (95%), principalmente

nos programas ERJ- 145/140/135 e ERJ-170/190. Os países da cadeia de

suprimentos da Embraer estão: 53% nos EUA, 27% na Europa, 8% no Japão e 8%

em outros países (ver Tabela 25 e 26):

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TABELA 25 - Fornecedores de 1º Nível do Programa ERJ -145/140/135

Fornecedores de 1º Nível do Programa ERJ -145/140/135 Classe e Fornecedoras (Distribuição %)

Componente Fornecido País

Hardware (4%) Elétricos

E.G. &G. Rotron Compartimento Eletrônico e Ventilador de Refrigeração

EUA

Matrix Conectores EUA Mechanical Products Disjuntores EUA Raychen Fios e Cabos EUA Vickers Bombas Hidráulicas EUA Eaton-MSC Botões EUA ECE Contactores e fusíveis EUA ABG Semca Pressurização França Allied Signal GPWS/ Detector de Tesoura de Vento,

Partida Pneumática e CVR/FDR EUA

Mecânicos B.F.Goodrich Rodas e Freios EUA Goodyear Pneus EUA EDE Trem de Pouso Principal Brasil Liebherr Trem de Pouso Auxiliar e Controle dos Flapes Aleman

ha Mason Manete de Freio Aerodinâmico EUA Aviac “Stick Pusher”. Atuador do Ajuste de Pedais e

Válvula Corte de Fogo França

Crane-hydro Aire Controles dos freios EUA Matéria-Prima (2%) Alcoa Alumínio Aeronáutico EUA Equipamentos (60%)

EUA

Allinson Motor AE 3007 EUA Lord Montante do motor EUA Eros Oxigênio para Tripulação França Rosemount Detector de Gelo e Proteção contra Estol EUA Sextant Altímetro e Indicador de Velocidade França Sicma Assentos para Pilotos França Sierracin Pára-brisa e Janela de Mau Tempo Eua Struthers Dunn Relê EUA Systron Donner Detector de Fogo Eua Technofan Ventilador França Vibro-Meter Computador Central de Manutenção e

Monitoração de Vibração do Motor Suíça

Parker Hannifin Sistemas Hidráulico e de Combustível e Comando de Voô

EUA

Eldec Sensor de Proximidade EUA

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(continuação)Grimes Unidades de Advertência e Alarme e

Iluminação EUA

Hamilton Standard Sistema de Ar Condicionado e Sistema Pneumático

EUA

Honeywell Aviônicos EUA Jet Electronic Indicador de Altitude e Bateria de Emergência EUA Lucas Aerospace Geração Elétrica EUA Marathon Power Technologies

Baterias EUA

Pacific Scientific Extintor de incêndio EUA Avtech Comunicação de Passageiros EUA Estruturas Metálicas (34%)

Gamesa Asas, naceles do motor, carenagens da junção portas do trem de pouso principal

Espanha

Enaer Empenagem horizontal/profundor e a empenagem vertical

Chile

Sonaca Portas de bagagem, serviço e principal, seção dianteira e pilones

Bélgica

Sundstrand/Labinal APU, APIC EUA/França

Norton Radome EUA Fonte: Embraer (1999).

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TABELA 26 - Fornecedores de 1º Nível do Programa ERJ – 170/190 Fornecedores de 1º Nível do Programa ERJ – 170/190 Classe e Fornecedoras (Distribuição %)

Componente Fornecido

País

Hardware (4%) Elétricos

BFGoodrich Smart Probe EUA BFGoodrich Stick Shaker EUA BFGoodrich TAT EUA BFGoodrich Windshield wiper EUA Hamilton Sundstrand Electric System EUA Raychem Wires & Cables EUA Eaton Push Buttons EUA Mecânicos Liebherr Landing Gear Alemanha Barber Colman Windshield Heater EUA Parker Flight Controls EUA Pacific Scientific Fire Protection System EUA GEAE – GE Aerospace Powerplant (Engine &

Nacelles) EUA

Air Industries Mechanical Hardware EUA AHG Mechanicaç Hardware França Fairchild Mechanical Hardware EUA Pentacon Mechanical Hardeware EUA Textron Mechanical Hardeware EUA Equipamentos (60%)

Parker Fuel System EUA Hamilton Sundstrand Air Management System EUA Chelton Static Discharger Inglaterra AVTECH Passenger Address França Haneywell Avionics EUA Chelton Antenas VHF Inglaterra Sensor Antenas VOR/ILS EUA Allied Signal EGPWS EUA Allied Signal SSCVR/FDR EUA Air Precision Clock Frnaça Parker Hydraulics Hydraulic System EUA Vibrometer EVM Suíça Hexcel Composite Material EUA Pilkington Aerospace Pax Window

Transparencies EUA

PPG Industries, Inc. Windshield Transparencies

EUA

Honeywll (Grimes) Exterior and Cockpit Lighting

EUA

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186

(continuação)IDD Lighted Acrylic Panel EUA Matéria-Prima (2%)

Alcoa Mill Products Aluminum Plates & Sheets

EUA

Corus Aluminum Plates & CTS Alemanha VSMPO Titanium Plates &

Sheets Rússia

Alexco Aluminum Extruded Shapes

EUA

Pechiney Aviatube Aluminum Extruded Sahpes

França

Alcoa Forged Products Aluminum Forged Parts EUA Otto Fuchs Aluminum Forged Parts Alemanha Neuvant Aluminum Forged Parts EUA Estruturas (34%) Kawasaki Wing Stub Japão Kawasaki Fixed Leading Edge Japão Kawasaki Fixed Trailing Edge Japão Kawasaki Pylon Japão Kawasaki Control Surfaces Japão Latecoere Center Fuselage I França Latecoere Center Fuselage III França Latecoere Doors França C & D Interior EUA Sicma Pilot/Co-pilot Seats França Gamesa Rear Fuselage Espanha Gamesa Horizontal Empennage Espanha Gamesa Vertical Empenage Espanha Akaer CFII / Wing Fus Fairing

Project Brasil

Kaiser Throttle / Authrottle EUA Sonaca Center Fuselage II Bélgica Sonaca Slats Bélgica NMF Wing Skins EUA

Saint Gobain Radome EUA Hamilton Sundstrand APU /Tail Cone EUA Serviços de Projetos e Fabricação de Ferramentais Dynamic Solutions Projeto de Ferramenta Brasil Matrinor S.L. Ferramentais de

Carenagens Espanha

(Several Companies) Fabricação de Ferramental

Brasil

Fonte: Embraer (1999).

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187

A despeito das dificuldades vivenciadas pelo mercado de transporte aéreo em

todo o mundo, ainda incapaz de se reerguer como um todo e com muitas empresas

aéreas enfrentando condições adversas e lutando diariamente pela sua

sobrevivência, dentre as quais importantes clientes da Embraer, o ano de 2004, em

que a empresa comemorou 35 anos de existência, foi positivo para a Embraer.

Houve um crescimento superior a 47% na quantidade de aeronaves entregues, num

total de 231 aviões comerciais e executivos em 2004 e 197 aviões em 2005, com

reflexos significativos em suas receitas e lucros, em 2004 o mercado civil respondia

por 70% do faturamento da empresa, e a área militar por 30% das vendas, em 2005

o mercado civil respondia por 88% do faturamento, e a área militar por 12% (ver

Gráficos 13, 14 e 15 e Tabela 27):

GRÁFICO 13 – Receita Líquida (R$ Milhares)

5.099

6.8917.748

6.571

10.2319.133

2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Embraer (2006).

GRÁFICO 14 – EBITDA (R$ Milhares)

1.096

2.0972.359

1.403

1.962

1.071

2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Embraer (2006).

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188

GRÁFICO 15 – Evolução do Volume de Jatos Entregues pela Embraer

6039

56

123

179163

130

100

231

197

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Embraer (2006).

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189

TABELA 27 – Entregas de Aeronaves (1996-2005)

Fonte: Embraer (2006).

Desta forma o ano de 2004 representa um marco nos 35 anos de vida da

Embraer, atingindo recordes históricos de faturamento e lucro. Com maior

quantidade de aeronaves entregues, associada à boa performance dos segmentos

de Defesa, Aviação Corporativa e Serviços ao Cliente, a receita líquida da Empresa

atingiu R$ 10,231 bilhões, 55,7% superior ao exercício anterior e em 2005 – R$

9.133 bilhões. O lucro líquido mais que dobrou em relação ao ano de 2003, atingindo

R$ 1.256 bilhão em 2004 e R$ 709 milhões em 2005. (ver Gráfico 16 e Tabela 28):

ENTREGAS DE AERONAVES2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992

AVIAÇÃO COMERCIAL 120 134 87 121 155 157 103 13 10 18 0 0 0 0EMB 110 - - - - - - - - - 1 - - - -EMB 120 - - 2 - 7 13 10 17 - - - -ERJ 135 2 1 14 3 27 45 16 - - - - - - -ERJ 140 - - 16 36 22 - - - - - - - - -ERJ 145 46 87 57 82 104 112 80 - - - - - - -EMBRAER 170 46 46 - - - - - - - - - - - -EMBRAER 175 14 - - - - - - - - - - - - -EMBRAER 190 12 - - - - - - - - - - - - -AVIAÇÃO EXECUTIVA 14 13 13 9 8 3 0 0 0 0 0 0 0 0Legacy Executivo/Shuttle 14 13 13 9 8 3Legacy Shuttle -DEFESA 32 14 0 0 0 2 3 17 5 18 0 0 0 0EMB 120 - - 1Legacy India/ Nigéria 6 - 1EMB 145 1 1EMBRAER 170 - -EMB 145 ACS - -EMB 145 MP - -EMB 145 AEW&C Outros - -EMB 145 AEW&C/MP MEX - 3EMB 145 AEW&C GRECIA 1 3EMB 145 SIVAM (SJC) - -AL-X 24 7Tucano - - 6 - 15 - - - -Super Tucano - -AM-X - - 1 3 10 5 3P-X - -MARINHA (A04) - -F5 BR - -AVIAÇÃO LEVE 31 70 17 17 26 24 24TOTAL 197 231 100 130 163 179 123 56 39 60 0 0 0 0

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GRÁFICO 16 – Lucro Líquido (R$ Milhares)

645

1.1011.178

587

1.256

709

2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Embraer (2005).

TABELA 28 – Balança Comercial Brasileira em 2005

2002 2003 2004 2005 Receita Bruta Deduções Receita Líquida Custo dos Produtos Vendidos Lucro Bruto Margem Bruta Despesas Operacionais e PLR Lucro Antes dos Juros e Impostos – EBIT Margem EBIT Depreciação e Amortização EBITIDA Margem EBITIDA Lucro Líquido Margem Líquida Lucro por Ação Quantidade de Ações

7.836,9 88,7 7.748,2 4.293,7 3.454,5 46,6% 1.287,1 2.167,4 28,0% 191,3 2.358,7 30,4% 1.179,2 15,2% 1,65 712.974.355

6.599,1 28,5 6.570,6 4.219,8 2.350,8 35,8% 1.108,0 1.242,8 18,9% 160,5 1.403,3 21,4% 587,7 8,9% 0,82 716.045.583

10.252,7 21,5 10.231,2 6.822,8 3.408,4 33,3% 1.668,1 1.740,3 17,0% 221,6 1.961,9 19,2% 1.255,8 12,3% 1,75 718.341.868

9.140,5 7,2 9.133,3 6.966,8 2.166,5 23,7% 1.379,3 787,2 8,6% 284,1 1.071,3 11,7% 708,9 7,8% 0,98 721.832.057

Fonte: Embraer (2006).

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191

Da mesma forma, é muito relevante destacar que, a par do significativo

crescimento das receitas, foi mantido o excelente nível de contratos em carteira,

cerca de US$ 10,1 bilhões de ordens firmes que, juntadas às opções, totalizam US$

27,6 bilhões em 2004. Em 2005, foram cerca de US$ 10,4 bilhões de ordens firmes

que, somadas às opções, totalizam US$ 24 bilhões, importante indicador potencial

de crescimento da empresa (ver Gráfico 17):

GRÁFICO 17 – Pedidos em Carteira (US$ Bilhões)

12,7 12,713,2

17,5 17,513,6

10,410,110,6910,711,4

2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Embraer (2005).

O grande fator responsável por esta inflexão positiva e vigorosa foi a entrada

em serviço do EMBRAER 170, o primeiro membro da nova família de aeronaves

EMBRAER 170/190, que desde o mês de março de 2004 opera com sucesso nos

EUA e na Europa. E aqui vale ressaltar a eficácia industrial demonstrada pela

Empresa ao atender ao ousado plano de entrega desta nova aeronave.

A Embraer continua alinhada com a política econômica brasileira de promover

um saldo expressivo da balança comercial do país. Desta forma, as exportações da

Embraer em 2004 totalizaram US$ 3,348 bilhões, e mais uma vez se constituem

recordes e marcam a posição da Empresa como a segunda maior exportadora

brasileira, com uma contribuição líquida na balança comercial de 4% do saldo. Em

2005 o volume de exportações foi de US$ 3.267 bilhões. Nos 11 anos após sua

privatização, a Embraer exportou mais de US$ 20 bilhões, contribuindo para o saldo

da balança comercial do país em mais de US$ 8 bilhões. (ver Gráfico 18):

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GRÁFICO 18 – Geração de Dividas

2.8972.396

2.007

3.348 3.267

1.7371.992

1.3021.2201.843

1.5291.356705

1.1761.054

2001 2002 2003 2004 2005

Exportações Importações Geração de Divisas

Fonte: Embraer (2006).

A Embraer não tem medido esforços para atrair empresas internacionais para

investirem no Brasil. O empenho em trazer para o Brasil volumes maiores de

atividades realizadas por parceiros e fornecedores, bem como subcontratação no

país de serviços até então realizados no exterior tem como objetivo o crescimento

consistente do conteúdo nacional, além da geração de novos postos de trabalho no

país.

No mês de fevereiro de 2004, foi efetivado o rollout do EMBRAER 190,

terceiro membro da família EMBRAER 170/190.

No mês de dezembro de 2004, foi realizado o primeiro vôo do EMBRAER

195, quarto e último membro da família EMBRAER 170/190, e a certificação do

EMBRAER 175.

Ao mesmo tempo a Embraer vem estimulando o auto-desenvolvimento dos

empregados e investindo no seu treinamento, com resultados mais que satisfatórios

na qualidade e na produtividade. Foram investidos 60 milhões em treinamento em

2004, e em 2005 foram investidos 62 milhões, conforme o Gráfico 19. Em 2004, a

Embraer graduou 462 Mestres no seu PEE – Programa de Especialização de

Engenharia, a “Universidade Embraer”. Em 2005 a Embraer abriu inscrição para

novas turmas na área de mecânica, eletrônica, mecatrônica, civil, materiais e

computação.

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193

GRÁFICO 19 – Qualificação e Treinamento (R$ milhões investidos)

5853

42

60 62

2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Embraer (2006).

Consciente de sua responsabilidade social, direcionadas ao desenvolvimento

sustentado, diversas ações vêm sendo tomadas no sentido da preservação do

ambiente, da saúde e segurança no trabalho, além da contribuição e integração à

sociedade. Essas medidas compreendem ações no trato dos efluentes e resíduos

industriais, nos cuidados com o ambiente de trabalho, nas políticas de qualidade de

vida voltadas para seus empregados e seus dependentes. Assim o quadro de

empregados tem crescido de forma ininterrupta desde 1997, conforme o Gráfico 11 e

12 mostrado anteriormente, ignorando crises seguidas vividas pelo segmento

aeronáutico.

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194

3.5.1 - NOVA ESTRUTURA DA EMBRAER Para continuar suas atividades operacionais, a Embraer realizou uma

reestruturação que propiciará a criação de bases para a sustentação, crescimento e

perpetuidade dos negócios e atividades da empresa, uma vez que sua implantação

lhe assegurará o acesso adequado ao mercado de capitais e a ampliação de sua

capacidade de financiamento e desenvolvimento de seus programas de expansão.

Com a aprovação da incorporação, a Nova Embraer passa a adotar a

denominação de EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. Na qualidade

de sucessora universal da Embraer, a Nova Embraer requererá seu registro de

companhia aberta perante a Comissão de Valores Mobiliários – CVM, a listagem de

suas ações no Novo Mercado da Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA e a

listagem de seu American Depositary Shares – ADS na New York stock Exchange –

NYSE - 194.

A mudança de capital vai atrair investimentos para os próximos projetos;

desse modo a Nova Embraer garante emprego e sobrevivência no mercado. Em 31

de março de 2006, os acionistas detentores de ações ordinárias e preferenciais da

Embraer, reunidos em Assembléia Geral Extraordinária, aprovaram a transformação

da Embraer na primeira companhia brasileira de porte com capital totalmente

pulverizado. Esta é a mudança mais importante para a Embraer desde a sua

privatização, pois permite a criação das bases para o crescimento sustentado e a

perpetuidade da empresa, ao capacitá-la para o livre acesso aos mercados de

capitais mundiais, ampliando sua capacidade de obtenção de recursos para que

possa suportar o desenvolvimento de programas de expansão. Ao mesmo tempo,

foram mantidos e preservados os direitos estratégicos da União inerentes à Ação de

Classe Especial (Golden Shares), além de adotar mecanismos especiais de

proteção, visando à manutenção da pulverização das ações, o comando da empresa

em mãos brasileiras e a proteção em relações a “take overs” hostis ou consecutivos.

Assim a Embraer espera melhores condições de financiamento, ou seja, a

obtenção da classificação de risco “Investment Grade” de duas maiores e mais

conceituadas agências de classificação de risco do mundo, a Moody’s Investor

Service (Baa3), em dezembro de 2005, e a Standard & Poor’s (BBB), em janeiro de

2006. Essa classificação de risco contribuirá para a redução dos custos de

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financiamento e, portanto, a criação de valor para o acionista a longo prazo é o que

espera a empresa54.

Consolidando presença e conquistando novos mercados, a certificação do

Embraer 190 e a realização de importantes vendas da família Embraer 170/190

foram decisivas para a sua consolidação nas Américas e na Europa, e para a

abertura dos mercados do Oriente Médio, Índia e da China.

Atualmente são mais de 120 aviões desta nova família voando pelo mundo,

para 11 companhias aéreas. Foi ultrapassada a marca de 900 aeronaves da família

ERJ 145 entregues no mercado. Em 2005 a Aviação Executiva foi confirmada como

área estratégica de crescimento da empresa; foram lançados os novos jatos

executivos Phenom 100 e Phenom 300 e ocorreu a entrega das primeiras unidades

do F-5BR e de 24 aviões Super Tucano à Força Aérea Brasileira; a Embraer ampliou

os investimentos na área de serviços com a aquisição da empresa OGMA (Indústria

Aeronáutica de Portugal) e houve a expansão das operações de manutenção da

unidade de Nashville, nos Estados Unidos.

Assim as ações empreendidas e os resultados obtidos em 2005 pela Embraer

permitem a ela afirmar que a empresa caminha a passos firmes rumo ao futuro.

Tecnologia e conhecimento são preocupações constantes da empresa e o objeto de

um investimento permanente.

Nas mãos de profissionais competentes, esses aportes viabilizam a criação

de produtos voltados à satisfação de seus clientes. O que leva a empresa a se

comprometer com o crescimento sustentado, implantando ações relevantes voltadas

para a preservação do meio ambiente, saída e qualidade de vida para os

empregados e suas famílias, e o desenvolvimento das comunidades inseridas nas

suas instalações em São José dos Campos – SP.

Segundo MB em entrevista, “a reestruturação societária da Embraer (Empresa

Brasileira de Aeronáutica), em São José dos Campos, irá garantir a sobrevivência da

empresa, investimentos superiores a US$ 2,3 bilhões e a geração de empregos”.

Conforme MB, “a Embraer enfrenta dificuldades para garantir os investimentos

necessários aos novos projetos, entre eles o desenvolvimento das versões executivas dos

jatos comerciais Embraer 170 e Embraer 190.

54 Estes dados foram levantados em entrevista feita na própria Embraer com, MB, no dia

08/06/2006.

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“Para os empregados não muda nada, o plano vai possibilitar a manutenção e

a geração de empregos”.

Desde 1995, foram investidos US$ 2,3 bilhões na empresa, dos quais 70% no

desenvolvimento de produtos e 30% em capacitação industrial. Os acionistas

contribuíram com uma parte e o restante foi captado no mercado de capitais.

Segundo MB,“Os próximos projetos demandam investimentos ainda maiores e hoje não há

nenhuma operação em desenvolvimento para esse fim, não temos a expectativa de

lançamentos de ações, mas no futuro isso será possível com a nova estrutura”. Os fundos de pensão Previ e Sistel têm limitações previstas na legislação

para fazer investimentos e ambos já esgotaram tal capacidade, segundo MB “Não há

no Brasil uma política de apoio à indústria aeronáutica como ocorre no Canadá com a

Canadair Bombardier”.

MB lembrou,“que cerca de 20 fábricas de aviões estão atualmente consolidadas em

quatro grupos, disputando um mercado estimado em US$ 140 bilhões em dez anos”. Ainda segundo MB,” no novo modelo societário, as ações da empresa servirão

como moeda de troca em possíveis aquisições no exterior.

Um novo conselho de administração será formado e terá 11 representantes, dos

quais 8 serão membros independentes, além de 2 representantes dos empregados

(acionistas e não-acionistas) e um representante da União.

O conselho atual reúne 13 membros – 1 representante da União, 2 representantes

dos empregados, 6 dos controladores, 2 representantes do grupo de empresas francesas, 1

escolhido pelos controladores por indicação da União e o diretor-residente da empresa”.

Para MB,”a pulverização do controle societário torna mais rigoroso o mecanismo

para garantir que o controle da empresa não irá para empresas estrangeiras. “Quem vier

será bem-vindo, mas terá as limitações do novo estatuto”.

No estatuto atual, o acordo de acionistas foi o que garantiu essa situação,

uma vez que na privatização o limite de participação estrangeira foi fixado em 40%

do capital ordinário, com direito a voto.

Assim para MB, “a pulverização do controle societário da Embraer (Empresa

Brasileira de Aeronáutica), que elimina a “figura do dono” da empresa e dilui o poder entre a

totalidade dos acionistas, será bem recebida pelo mercado, na avaliação de MB”.

Podemos concluir que o processo de privatização implicou uma

transformação radical nas formas de gestão, organização industrial e institucional,

cultura empresarial e, sobretudo, na visão negocial da Embraer. A elaboração e a

formalização de um planejamento estratégico e a realização de análises de mercado

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mais precisas, baseadas em indicadores de monitoramento interno e externo por

intermédio de uma nova área recém-criada denominada “Inteligência de Mercado”,

são uma etapa fundamental dessa nova fase da Embraer. As estratégias de

reestruturação produtiva e financeira possibilitaram o crescimento do faturamento e

uma valorização do patrimônio e do prestígio da Embraer.

Ressalve-se que a estratégia e a excelência na abordagem na tecnologia

sempre foram o ponto forte da Embraer. O programa ERJ-145, por exemplo, que

permitiu a recuperação da empresa e sustentará as vendas futuras, havia sido

projetado em 1989, quando a empresa era ainda uma estatal. Contudo, só foi

possível a sua viabilização pela solução criativa das parcerias de risco e pela

agilidade e flexibilidade empresariais conquistadas após a privatização da empresa.

É importante deixar claro que a Embraer conseguiu atrair parceiros no mercado

mundial que apostassem e investissem no projeto ERJ-145, porque a empresa

detinha o design e a tecnologia que outras empresas não possuíam. Certamente, se

a empresa não desfrutasse de uma posição estratégica no mercado, como geradora

de tecnologia, as possibilidades de celebrar alianças não seriam tão promissoras. No

futuro, para manter sua posição competitiva, a empresa deverá celebrar novas

parcerias e alianças que agreguem valor, tecnologia e mercados dinâmicos.

Em relação à política governamental, provavelmente os processos de

privatização e de recuperação da empresa teriam sido menos dolorosos, lentos e

arriscados, caso houvesse sido estabelecida uma política de investimentos,

reestruturação e competitividade para a empresa ou mesmo um projeto de longo

prazo que a inserisse na estratégia de desenvolvimento tecnológico nacional. A

inexistência de agências ou instituições regulamentadoras e financiadoras permitiu a

perda de concorrências importantes, assim como o desperdício de considerável

estoque de recursos humanos extremamente qualificados. Portanto, uma política de

competitividade mais ampla continua sendo uma grande lacuna para o setor.

Apesar disso a Embraer superou a crise e conseguiu aumentar seus lucros,

se reestruturou e criou uma Nova Embraer para ampliar sua capacidade

financiamento e desenvolvimento, absorvendo uma pequena parte da mão-de-obra

que foi demitida antes e após sua privatização, e contratando novos profissionais.

Devido às constantes reestruturações econômicas internas e externas e às crises

políticas, mesmo ela tendo o monopólio do setor aeronáutico regional atual, é

impossível prever os rumos da nova Embraer que, a partir de 2007, deixará de

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198

produzir o jato ERJ-145, considerado um dos pilares da recuperação da empresa.

No final do ano de 2005, a Canadair Bombardier55 suspendeu a produção do CRJ

200, o modelo concorrente do ERJ-145, pelo motivo de falta de mercado para a

aeronave, que já está no final do seu ciclo de vida56. Segundo MB, “os funcionários

da linha de montagem do ERJ-145 serão remanejados para outros setores, devido à

necessidade crescente de pessoas nas outras linhas, assim a empresa não pensa

em demissões”. No Capítulo 4 veremos o impacto que a privatização da Embraer causou na

vida dos ex-funcionários, dos que permaneceram e dos novos funcionários.

55 O grupo Bombardier, fundado em 1942, atua em diversas áreas: faz trens, carros elétricos, veículos para neve, serviços financeiros e imobiliários, além de aviões. Na área de aviões adquiriu as empresas Canadair, Learjet, da De Havilland e da Shorts Brothers. Após essa fase de aquisições tornou-se a terceira maior fabricante de aviões do mundo, depois da Boeing e da airbus, apresentando faturamento médio anual de US$ 9 bilhões. Em 1996, a Canadair Bombardier operou um processo de reestruturação interna, sendo organizada em cinco grupos: o Grupo Aeronáutico, o Grupo de Transporte, o Grupo de Produtos de Consumo Motorizados, o Grupo Bombardier Capital e o Grupo de Serviços, empregando cerca de 51.000 funcionários espalhados por onze países. 56Essa disputa entre a Embraer e a Canadair Bombardier não se restringiu às pistas de aeroportos. Em 1997 Canadair Bombardier acusou o governo brasileiro de subsidiar a fabricação de aviões e apresentou queixa à Organização Mundial do Comércio (OMC) a respeito da modalidade de equalização de taxas de juros dos financiamentos concedidos pelo Proex (Programa de Financiamento a Exportação) do Banco do Brasil. Por sua vez, o Itamaraty devolveu as acusações alegando que a Canadair Bombardier e o governo canadense são sócios em uma empresa que foi criada especialmente para conceder financiamentos para a própria empresa. Diante de tais argumentos, a OMC acabou por não interferir, entendendo que as duas empresas teriam de resolver entre si suas questões. A concorrência chegou a ponto de a Canadair Bombardier tentar recrutar funcionários da Embraer mediante anúncios em jornais e diretamente aos engenheiros, dentro da própria empresa em São José dos Campos. Na Embraer, um engenheiro em início de carreira ganha cerca de R$1.500 por mês, um engenheiro com dez anos de experiência, pós-graduado e com estágio no exterior recebe uma média de R$4.000 por mês. A Canadair Bombardier chegou a oferecer salários de US$6.000 por mês, além de vários benefícios. Dos seiscentos engenheiros da empresa, oito foram recrutados pela Canadair Bombardier, em contrapartida, a Embraer trouxe três profissionais da Canadair Bombardier e mais três da falida Fokker. Para atender ao novo contrato da American Eagle, a Embraer teve de reprogramar sua escala de produção e, possivelmente, ampliar seu quadro de pessoal, contratando mais 1.400 funcionários. A Canadair Bombardier fabrica seis aviões por mês. Para enfrentar a concorrência, a Embraer, que fabricam quatro aviões por mês, pretendiam passar a produzir seis a partir de 1998 e atualmente produz seis por mês,devido a entrada da nova família 170/175/190, Legacy 600, Phenom 100, phenom 300 e Linege 100.

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199

CAPÍTULO 4 - PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS – LÓCUS DA PESQUISA: “O IMPACTO OCORRIDO NA VIDA DOS FUNCIONÁRIOS DA EMBRAER ANTES E DEPOIS DE SUA PRIVATIZAÇÃO” A problematização inicial de uma investigação social passa por um

conjunto de perguntas que devem orientar a produção do conhecimento social –

algumas de caráter genérico e outras que levam à especificação de situações

determinadas. O máximo que podemos é, segundo Pais (2000, pp.185-201),

“auscultar realidades longínquas, enigmáticas, que muitas vezes exprimem o

contrário do que aparentemente significam: a ambivalência da realidade social leva à

interrogação, à surpresa e à desconfiança”.

Esta investigação pretende captar a configuração social da realidade

estudada, de forma a possibilitar a compreensão e a explicação dos mecanismos

vitais de funcionamento e reprodução dos grupos e segmentos sociais envolvidos

(ex-funcionários, os que permaneceram e os novos funcionários da Embraer). Se, de

um lado, os dados estatísticos fornecem uma primeira aproximação à investigação,

de outro, têm sua capacidade analítica ampliada, quando complementados com o

conhecimento empírico.

O levantamento de dados secundários, apresentado nos capítulos anteriores,

consistiu em um inventário atualizado dos dados, através de revisão da literatura

específica, de publicações em revistas, jornais e outros meios de comunicação de

domínio público, tendo em vista uma primeira aproximação do universo em estudo.

A aplicação de um questionário com perguntas fechadas e abertas (em

anexo) aos ex-funcionários e novos funcionários da Embraer possibilitou a

caracterização dos entrevistados.

Para realização das entrevistas, foi preparado um roteiro visando facilitar e

aprofundar a comunicação, sem perder de vista os objetivos da pesquisa e os nexos

entre as dimensões do vivido, do percebido e do imaginado. Conscientes de que o

roteiro constituía-se mais num guia de orientação da “conversa dirigida”, por não

poder prever todas as situações, ficamos sempre abertos às necessárias

adaptações.

A descrição, classificação e análise dos dados coletados serviram para

orientar o delineamento dos tipos de informantes, conforme especificidade e

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200

qualificação das características sócio-econômicas e políticas, em articulação com as

visões e representações das mudanças ocorridas.

A observação assistemática foi útil para estabelecimento dos contatos iniciais,

para apresentação dos propósitos da pesquisa e obtenção de autorização, mesmo

que de caráter informal, para a coleta sistemática dos dados e a realização das

entrevistas. Além disso, as visitas à empresa permitiram uma avaliação informal do

contexto e das possíveis dificuldades a serem enfrentadas.

A partir da atitude de abertura, flexibilidade, capacidade de observação e de

interação com os informantes envolvidos, a investigação qualitativa veio a requerer,

ao longo do processo, correção e readaptação do instrumento utilizado.

Através da postura dos indivíduos estudados, inteiramo-nos do mundo

simbólico daqueles ex-funcionários e novos funcionários da Embraer, procurando

interpretar a vida social conforme as significações apresentadas pelos informantes,

com suas ambigüidades, contradições e paradoxos.

Assim a presente pesquisa foi realizada mediante um levantamento de campo

que incluiu:

1) um questionário contendo quarenta e oito perguntas aplicadas a oitenta e

uma pessoas demitidas e entrevistas qualitativas com sete pessoas, também

demitidas da Embraer nos períodos anterior e posterior à sua privatização;

2) um questionário contendo trinta e duas perguntas aplicadas a cento e oito

pessoas admitidas e entrevistas qualitativas com seis pessoas, também admitidas

logo após a privatização da Embraer;

3) entrevistas em profundidade realizadas com duas pessoas que trabalham

na Embraer desde a sua formação;

4) Foi realizada ainda, uma entrevista em profundidade com AN, 44 anos,

casada, Assistente Social e ex-diretora de Sindicato.

O objetivo é mostrar o impacto sócio-econômico das demissões sobre a vida

dessas pessoas e o impacto das mudanças sobre novos contratados durante e logo

após o processo de privatização da Embraer.

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201

4.1. O IMPACTO SOBRE OS DEMITIDOS A análise das respostas dadas às perguntas do questionário e às perguntas

abertas nos permitiu caracterizar os funcionários demitidos e verificar as mudanças

ocorridas em suas vidas após a demissão.

4.1.1. CARACTERIZAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS DEMITIDOS

• Origem Em relação aos demitidos da Embraer entre 1990 e 2000, 48% são da cidade

de São José dos Campos; 22% da cidade de Jacareí-SP; 8% da capital São Paulo;

8% de Santa Branca – SP; 4% de Taubaté-SP; 4% de Sorocaba-SP; 1% de São

Sebastião-SP; 4% do Estado de Minas Gerais e 1% da cidade do Rio de Janeiro

(vide Tabela 29). Esses dados coincidem com a distribuição da população do

município por local de nascimento, onde aproximadamente a metade da população,

ou seja, 49,83% nasceram no próprio município.

TABELA 29 – Cidade de origem dos ex-funcionários demitidos da Embraer

CIDADE DE ORIGEM

QUANTIDADE %

São José dos Campos

39 48

São Paulo 7 08 Jacareí 18 22 Santa Branca 6 08 Taubaté 3 04 Sorocaba 3 04 Minas Gerais 3 04 Rio de Janeiro 1 01 São Sebastião 1 01 TOTAL 81 100

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários -

2004/2005.

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202

Em relação à população residente em São José dos Campos, nascida em

outros estados brasileiros, a região Sudeste é predominante, representada por

58,65%, conforme Tabela 30. Deste total, 28,17% é de outros Estados.

TABELA 30 – Distribuição da população residente no Município de São José dos Campos, por local de nascimento, 2000.

Local de nascimento População % Município de São José dos Campos 256.924 49,83 Outro município do Vale do Paraíba 42.405 8,23 Outro município do Estado de São Paulo

66.396 12,88

Outro Estado 145.229 28,17 Outro País 3.794 0,74 Não Informa 805 0,16 TOTAL 515.553 100,00

Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos Campos,

2000.

• Escolaridade

Podemos observar na Tabela 31 que 4% dos ex-funcionários entrevistados

possuem o primeiro grau completo, 55% o 2º grau completo, incluindo cursos

técnicos, 15% o superior incompleto, 7% o superior completo e apenas 4% possuem

pós-graduação.

TABELA 31 – Escolaridade dos ex-funcionários da Embraer

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários

2004/2005.

ESCOLARIDADE QUANTIDADE % 1º Grau incompleto 0 0 1º Grau completo 3 04 2º Grau incompleto 12 15 2º Grau completo 45 55 Superior incompleto 12 15 Superior completo 6 07 Pós-Graduação 3 04

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203

4.1.2. AS MUDANÇAS OCORRIDAS NA VIDA DOS FUNCIONÁRIOS DEMITIDOS

• O trabalho

Em relação aos demitidos da Embraer no período estudado, 96% estão

trabalhando atualmente e apenas 4% estão desempregados. Dos que estão

trabalhando, 55% tem rendimento menor e qualificação inferior do que quando

trabalhavam na Embraer, 30% têm renda maior e 15% continuam com o mesmo

rendimento e qualificação.

Das pessoas demitidas que foram entrevistadas, 11% encontraram emprego

de imediato, 22% só encontraram emprego no período de 6 meses a 1 ano, outros

22% demoraram de 1 a 2 anos e 11% demoraram de 3 a 5 anos, ou seja, 56% dos

demitidos demoraram de 6 meses a 1 ano para retornarem ao mercado de trabalho

conforme Tabelas 32,33 e 34 e relato :

TABELA 32 – Ex-funcionários que trabalham atualmente

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,

2004/2005.

TABELA 33 – Renda atual dos ex-funcionários

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,

2004/2005.

TRABALHAM ATUALMENTE

QUANTIDADE %

Sim 78 96 Não 3 4

RENDA MENSAL ATUAL

QUANTIDADE %

Menor 45 55 Maior 24 30 Igual 12 15

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204

TABELA 34–Tempo de retorno dos ex-funcionários ao mercado de trabalho

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,

2004/2005.

Segundo PG, 45 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Aeronáutico, ex-

supervisor de projetos, foi demitido logo após privatização. “Para mim, foi muito difícil aceitar minha demissão, pois sou Engenheiro

Aeronáutico formado no ITA e sempre trabalhei na Embraer desde minha

graduação. Na época, fiquei sem rumo, passei muitas dificuldades,

principalmente para arrumar outro emprego na minha área de atuação. Foram 2

anos procurando emprego em minha área, durante esse período, passei a dar

aulas particulares de Matemática em casa. Logo depois, fui trabalhar como

gerente de uma loja de material de construção, fiz de tudo um pouco. Hoje tenho

uma franquia de café no shopping da cidade, que esta em crescimento. Mas na

verdade ainda espero trabalhar novamente na Embraer, pois gostaria de voltar

na minha atividade de formação”.

A maioria dos demitidos, 63%, está empregada no mercado com carteira

assinada, 33% estão no mercado sem carteira assinada, alguns são profissionais

liberais e outros trabalham por conta própria conforme relato:

RETORNO AO TRABALHO

QUANTIDADE %

Imediato 9 11 De 1 a 3 meses 9 11 De 4 a 6 meses 10 12 De 6 meses a 1 ano 18 22 De 1 a 2 anos 18 22 De 3 a 5 anos 9 11 Mais de 5 anos 3 04 Não retornou 3 04 Não respondeu 2 03 TOTAL 81 100

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205

RTR, 55 anos, casado, três filhos, cujo antigo cargo na Embraer era de

Supervisor Administrativo, demitido em 1994 quando iria completar 23 anos de

empresa, relata: “Com minha demissão tive que fazer várias mudanças, pois minha renda baixou

muito; uma delas foi vender um dos carros que tinha, diminuí as despesas com

viagens, mudei para uma residência de menor valor da Zona Leste para Zona Sul.

Para ajudar nas despesas meus filhos começaram a trabalhar e minha filha mais

nova mudou para uma escola pública. Após 1 ano desempregado, retornei ao

mercado de trabalho em uma empresa de segurança e depois de 4 anos, mudei para

uma empresa que presta serviços para a Embraer, que é uma empresa que ministra

cursos de treinamento e palestras para funcionários da Embraer. A Embraer sempre

foi uma empresa que oferece muitos benefícios e bom salário, ainda sonho em voltar

a trabalhar na Embraer”.

De acordo com as informações obtidas no levantamento de campo, logo após

a demissão, os integrantes de cada família tiveram um papel fundamental no

orçamento familiar, auxiliando nas despesas. Em 54% das famílias, 1 pessoa ajudou

nas despesas; em 13% das famílias, 2 pessoas ajudaram; em 25% das famílias, 3

pessoas ajudaram e em 8% das famílias; 4 pessoas ajudaram nas despesas

conforme relato:

AFM, 47 anos, casado, três filhos, que trabalhou na Embraer como

Chapeador e foi demitido na crise de 1994, relata sua experiência.

“Só retornei ao mercado de trabalho após 2 anos, trabalhando como

motorista, entregando compras de supermercado. Devido a isso passei por

muitas dificuldades, pois minha renda diminuiu, tive que vender minha casa

própria na Zona Norte e comprei uma de menor valor na Zona Sul, minha

esposa e meus filhos começaram a trabalhar para ajudar nas despesas, mas

mesmo assim os meus filhos tiveram que mudar para uma escola pública à

noite. Eu ainda sonho com uma recontratação na Embraer, esperança que

está no coração de muitos ex-funcionários”.

Conforme as entrevistas, podemos identificar e caracterizar a mobilidade

espacial ocorrida durante o período em que ocorreram as demissões e contratações

de novos funcionários pela Embraer. Comparando essas informações com as

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fornecidas pela pesquisa realizada no Relatório Final Sócio-Econômico do Município

de São José dos Campos entre 1990 e 2000, logo após o período de privatização da

Embraer, podemos analisar a mobilidade espacial no município de São José dos

Campos – SP sob o motivo principal da última mudança das famílias por bairros.

As Tabelas: 35 e 36 apresentam os dados da mobilidade espacial no

município:

TABELA 35 – Motivo principal da mudança da família por bairro, considerando o total de famílias do Município que mudaram de residência

REGIÕES Zona Norte

Zona Leste

Zona Sul

Zona Oeste

Centro /Sudeste

Nº de famílias * 8.536 19.363 20.890 9.574 8.165 Motivos das Mundanças

% % % % %

Profissionais

30,46 28,53 26,90 34,97 27,47

Familiares

12,71 15,73 9,30 13,67 17,45

Acesso à Infra-estrut. e serv.

6,18 6,50 6,90 13,69 14,48

Preço mais baixo do imóvel

35,40 44,03 54,70 32,24 29,18

Segurança e Qualidade de vida

4,43 2,61 1,60 5,43 8,28

Não informa

10,82 2,60 0,60 - 3,14

* Mudança de um bairro/região para outro bairro/região de São José dos Campos

Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos Campos, 2000.

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TABELA 36 – Motivo principal da mudança da família de bairro, considerando todas as regiões de São José dos Campos

TODAS REGIÕES Número de famílias / 66.528

MOTIVOS DA MUDANÇA %

Profissionais 29,66

Familiares 13,18

Acesso à infra-estrut. e serv. 9,55

Preço mais baixo do imóvel 39,11

Segurança e Qualid. de vida 4,47

Não informa 3,43

TOTAL 100,00

Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos Campos,

2000.

Conforme os resultados do relatório, 29,66% das famílias que mudaram para

outros bairros foram motivadas por razões profissionais. Destacam-se a Zona

Oeste 34,97%, Zona Norte 30,46%, que apresentam percentagens iguais aos ex-

funcionários da Embraer conforme Tabela 38.

Relação familiar foi o terceiro motivo para a mudança das famílias para

outros bairros, representando uma média de 14%. Destaca-se a Zona Sul com

9,30%, apresentam percentagens iguais aos ex-funcionários e novos funcionários

conforme tabelas 38 e 47.

Acesso à infra-estrutura e serviços foi o quarto fator mais importante de

atração da mobilidade espacial para o Município de São José dos Campos,

representando uma média de 9,55%. Destacam-se as Zonas Oeste, Norte, Leste,

Sul e Centro/Sudeste, que apresentam percentagens iguais às tabelas 38 e 47.

Segurança e qualidade de vida foi apontado pelas famílias joseenses como o

quinto fator de atração de mudança de bairro no Município, representando em média

3,43%. Esse motivo de mudança das famílias para outros bairros teve destaque na

Zona Leste, com 2,61 %, onde estão bairros mais distantes do centro do Município,

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cuja proporção é bem menor do que a média. Zona Oeste e Zona Norte, que ficam

mais próximas do centro do Município.

O fator de maior importância para mudança da população para os bairros do

Município, em relação aos demais apontados acima, foi preço mais baixo do imóvel, que contribui com 39,11%. Destacam-se, entretanto a Zona Sul 54,70%, considerada a região mais populosa e heterogênea, onde reúne os contrastes de

uma cidade grande, boa parte dos seus bairros usufrui de boa infra-estrutura, outra

ainda sofre com a falta de infra-estrutura, tornando o preço do aluguel e do imóvel

mais acessível. De acordo com o Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José

dos Campos e o levantamento de campo realizado com os ex-funcionários, os que

permaneceram e os novos funcionários, podemos concluir que no primeiro momento

a crise econômica da década de 90 e a privatização da Embraer geraram

desemprego e queda no padrão de vida dos ex-funcionários. No segundo momento,

logo após a privatização, houve um aumento de emprego e na qualidade de vida dos

novos contratados, o que ocasionou diretamente uma grande mobilidade espacial

dentro do Município.

• A moradia Com relação ao impacto nas condições de moradia dos demitidos, concluiu-

se que 56% das famílias dos ex-funcionários da Embraer que vieram de outras

cidades e residem no município de São José dos Campos a princípio vieram para cá

por razões profissionais e mesmo após as demissões, tais famílias continuaram

morando na cidade, porém mudaram de bairro em busca de um imóvel com o preço

mais acessível.

Podemos identificar e caracterizar a mobilidade espacial e as

mudanças ocorridas com as famílias dos ex-funcionários da Embraer no município:

77% das famílias mudaram de residência logo após a demissão, 23% mudaram para

Zona Sul, 19% para Zona Leste, 7% para Zona Norte, 4% para Oeste, ocasionando

um deslocamento da Zona Oeste para Zona Sul considerada a região mais populosa

e heterogênea, que reúne todos os contrastes de uma grande cidade, Enquanto

parte do bairro usufrui de uma boa infra-estrutura, outra ainda sofre com a falta de

infra-estrutura, em relação ao endereço anterior pode notar que 7% moravam na

Zona Sul, 13% na Zona Leste, 9% na Zona Norte, 5% no Centro, 25% na Zona

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Oeste onde se concentram bairros com alta qualidade de vida e infra-estrutura

conforme Tabela 37 e como podemos ver no depoimento a seguir.

TABELA 37 – Mudou de residência depois da demissão

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários.

2004/2005.

MJF, 53 anos, casado, ex-Controlador de Qualidade, que trabalhou 15 anos

na Embraer, foi um dos demitidos na crise de 1994 e atualmente tem seu próprio

comércio, revela em seu depoimento: “Passei durante 3 anos muitas dificuldades para retornar ao mercado de trabalho, em

conseqüência disso, minha qualidade de vida diminuiu, a renda não é a mesma de

quando trabalhava na Embraer. Meu objetivo era de voltar a trabalhar na Embraer,

pois me especializei profissionalmente para atender à Embraer. Assim ao longo dos

anos precisei mudar de endereço várias vezes, vendi meu apartamento na Zona

Oeste e comprei outro de menor valor na Zona Sul; no período em que fiquei

desempregado, o meu filho teve que mudar de uma escola particular para uma

escola de ensino público, isso me levou a pensar em mudar de cidade, mas ainda

tenho esperança de algum dia voltar a trabalhar na Embraer”.

Conforme foi dito, 77% dos ex-funcionários da Embraer mudaram de

residência após a demissão; desses, 44% mudaram de bairro devido ao preço mais

baixo do imóvel, 30% devido a problemas profissionais, 10% por melhor acesso à

infra-estrutura e serviço e 6% por segurança e qualidade de vida, conforme podemos

ver na Tabela 38 e relato:

Mudou de residência depois

da demissão

QUANTIDADE %

Sim 63 77 Não 18 23

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TABELA 38 – Motivo principal da mudança da família de bairro dos ex-funcionários

TODAS AS REGIÕES Número de pessoas / 81

MOTIVOS DA MUDANÇA %

Profissionais 30

Familiares 10

Acesso à infra-estrut. e serv. 10

Preço mais baixo do imóvel 44

Segurança e Qualidade de vida

06

Não informa -

TOTAL 100 Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários -

2004/2005.

Conforme PRA, 53 anos, casado, dois filhos, cuja antiga função na Embraer

era de Supervisor de Assistência Técnica relata: “Logo após a minha demissão não consegui voltar a trabalhar na mesma atividade,

atualmente sou corretor de imóveis. Em minha vida, houve várias tentativas

fracassadas profissionalmente na busca de novos empregos, o que acarretou na

queda das minhas condições de vida, o que afetou financeiramente e

emocionalmente a mim e minha família. Quando trabalhava na Embraer era um

tempo mágico. A crise da Embraer ocorreu, é claro, fortemente influenciada pela

grave crise externa e interna do Brasil e foi impulsionada pela má administração

militar daquele período, quando a empresa estava com excesso de empregados.

Mesmo assim, decidi continuar em São José dos Campos na esperança de

conseguir um bom emprego, sem mudanças drásticas, amenizando assim a

frustração da demissão e também evitando a desestabilização familiar que vinha

ocorrendo. Assim algumas medidas eu tomei, me mudei da Zona Oeste em que era

locatário e passei a locar outro imóvel na Zona Sul, mais barato. Com relação aos

filhos, todos tiveram que sair da escola particular para uma pública, um drama

psicológico muito grande para toda a família”.

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211

Observa-se que a maioria dos ex-funcionários, 62%, ainda moram na cidade;

38% moram em cidades vizinhas. Com respeito às regiões de São José dos

Campos, a maioria mora na Zona Sul 23%,na Zona Leste 19%, com 7% na Zona

Norte, 4% na Zona Oeste e 7%no Centro, conforme Tabela 39.

TABELA 39 – Endereço atual dos ex-funcionários da Embraer

ENDEREÇO ATUAL QUANTIDADE %

São José dos Campos

Zona Sul 19 23

Zona Leste 15 19

Zona Norte 06 07

Zona Oeste 03 04

Centro 05 07

Sudeste 2 02

CIDADE DE JACAREÍ 13 16

Caçapava 9 11

Taubaté 9 11

TOTAL 81 100

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários -

2004/2005.

Dentro dessa amostra, no que diz respeito às condição da moradia, 82% dos

demitidos têm residência própria, 11% alugada e 7% cedida por parentes.

Passaremos a seguir a analisar as mudanças ocorridas dentro da própria

cidade de São José dos Campos, caracterizando cada Zona da cidade para poder

melhor demonstrar o impacto dessas mudanças na vida dos ex-funcionários. Como já mencionado no Capítulo 1, a população de São José dos Campos

está distribuída em dois distritos (São Francisco Xavier e Eugênio de Melo), dois

subdistritos (Santana e o Centro) em 6 regiões urbanas, Zona Norte, Zona Sul, Zona

Leste, Zona Oeste, Sudeste, Centro, 318 bairros urbanos, 77 bairros rurais, 94

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212

loteamentos clandestinos e 22 favelas (em anexo). As Figuras e Tabelas a seguir

dão uma visão geral da cidade.

FIGURA 10 – Distritos de São José dos Campos

Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano de São José dos Campos, 2003.

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213

FIGURA 11 – Mapa das regiões de São José dos Campos

Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano de São José dos Campos, 2003.

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214

FIGURA 12 – Mapa dos Bairros de São José dos Campos

Fonte: Secretária de Planejamento e Meio Ambiente, São José dos Campos, 2004.

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215

FIGURA 13 – Limites de Zonas e Número de Habitantes por Zona de São José dos Campos

Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano de São José dos Campos, 2000.

ZONA NORTE 61.504

ZONA LESTE 136.118

ZONA SUL 199.913

SUDESTE 38.761

ZONA OESTE 25.182h

CENTRO 70 863

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TABELA 40 – Número de Habitantes por Região de São José dos Campos

Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos Campos,

2000.

Do total dos demitidos que mudaram de residência, temos a seguinte

distribuição:

• 38% mudaram para a Zona Sul. Considerada a região mais populosa e

heterogênea de São José dos Campos, a Zona Sul reúne todos os contrastes de

uma cidade grande e, apesar de ter um núcleo mais antigo, constituído nos anos 70

(o Jardim Satélite) teve sua grande expansão nos anos 1990.

Enquanto parte dos seus 199.913 habitantes em 2000 usufrui de uma boa

infra-estrutura, outra ainda sofre com a falta de infra-estrutura.

A área nobre da região Sul atrai investimentos no setor imobiliário e

comercial, onde se encontram os bairros Jardim Satélite, Bosque dos Eucaliptos e

Floradas de São José, que têm seu metro quadrado cada vez mais valorizado na

região. Mas, apesar do considerável crescimento, bairros como o Morumbi, Jardim

Imperial e Dom Pedro estão longe de se tornarem pólos comerciais. E bairro como

Rio Comprido, na divisa com a cidade de Jacareí, não conta nem com saneamento

básico. Podemos também encontrar loteamentos clandestinos, em contraponto há

localidades onde quase não existe infra-estrutura, como os bairros Martins

Guimarães e outros com sérios problemas como os bairros Bosque dos Eucaliptos e

REGIÃO 2000

Zona Norte 61.504

Zona Sul 199.913

Zona Leste 136.180

Zona Oeste 25.182

Centro 70.863

Sudeste 38.761

Total de Habitantes* 530.403*

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Torrão de Ouro, que cresceram sem um Plano Diretor adequado. Atualmente estes

bairros se encontram muito próximos do aterro sanitário da cidade, gerando

reclamações e queixas dos moradores devido ao mau cheiro e proliferação de

insetos e bichos.

• 8% para a Zona Oeste, onde se concentram bairros com alta

qualidade de vida e infra-estrutura, como Urbanova, Jardim Aquarius, Colinas,

Esplanda II e Jd. Apolo. A região tem cerca 25.183 habitantes. Conforme censo de

2000, a Zona Oeste possui o metro quadrado residencial mais caro da cidade.

Segundo Relatório da Associação das Construtoras do Vale do Paraíba (Aconvap)

de 2000. O crescimento se concentra nos novos bairros de alto padrão, como

Aquarius e Sunset Park.

• 30% para a Zona Leste, onde estão localizados os bairros Vila

Industrial, Jardim Maracanã, Jardim Olímpia, Jardim Valparaíba. A Zona Leste é a

que mais cresce em São José dos Campos. Segundo o Departamento de

Planejamento Urbano e Regional da Univap, a região cresceu cerca de 70% entre

1997 e 2000. A região têm 136.118 habitantes.

• 4% para Sudeste. Na região sudeste de São José dos Campos está

concentrada a maioria dos centros e institutos de pesquisa e tecnologia da cidade,

um dos principais pólos tecnológicos do país. Nesta área que estão localizados CTA,

o INPE, o ITA e a Embraer.

Criada legalmente em 1993, a região Sudeste abrigava 38.761 pessoas em

2000. Entre os bairros localizados nesta área estão o Jardim da Granja, Vila São

Benedito, São Judas Tadeu, Jardim Santa Fé e Jardim Souto. Antes de 1993, esses

bairros “pertenciam” às regiões Sul e Leste.

Segundo o Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos

Campos da Univap entre 1990 e 2000, a região Sudeste se desenvolveu para dar

suporte às empresas locais.

O Jardim da Granja é um exemplo. O bairro se desenvolveu por causa do

grande impulso da economia. Muitos trabalhadores se mudaram para perto de seu

emprego neste período a região teve uma valorização imobiliária.

• 12% para a Zona Norte. Sendo o bairro de Santana o mais antigo da

cidade, podemos também destacar os bairros rurais São Francisco Xavier, Miranda-

Chácaras, Florindo-Chácara, Buquirinha I e II, Vila Paiva, Vila Cândida, Vila Dirce,

Freitas e loteamentos cladestinos onde predomina uma população de renda baixa. A

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Zona Norte é a região onde se localizam imóveis de baixo valor de mercado e uma

população de 61.504 habitantes.

• 12% para o Centro, que abriga uma população de 70.863 mil

habitantes, que estão espalhados entre o “centro velho”, onde estão concentrados

os bairros Vila Maria e Jardim Bela Vista e ruas mais antigas da cidade, como

Humaitá, 15 de Novembro e Coronel José Monteiro e o“ centro expandido” que

abrange parte do comércio da cidade como os bairros Jardim Maringá, Vila Ema,

Jardim Apolo e Esplanada, onde os imóveis tem alto valor agregado.

Em relação à mudança de imóvel, 92% das pessoas entrevistadas não

mudaram de cidade após a demissão, na expectativa de retornarem ao emprego ou

encontrar um emprego melhor. A maioria dessas pessoas teve uma grande queda

na qualidade de vida, cerca de 50%, enquanto que 27% mantiveram as condições

inalteradas após a demissão e 27% dos entrevistados conseguiram melhorar as

condições financeiras e a qualidade de vida.

Muitos desses ex-funcionários ainda sonham voltar a trabalhar na Embraer,

na expectativa de conseguir voltar ao antigo padrão de vida: 69% dos demitidos

gostariam de ser recontratados, mas somente 11% estão na expectativa e na

esperança de ser recontratado novamente e 20% não gostariam de voltar a trabalhar

na Embraer. Um dos principais motivos para voltar a trabalhar na empresa são os

benefícios que ela oferece. Assim 80% das pessoas demitidas não pensam em

mudar de cidade na expectativa de retornarem ao emprego ou na esperança de um

emprego melhor.

Essas mudanças e conseqüentes perdas refletem na vida dos ex-funcionários

de um modo drástico e são reveladas nas entrevistas. Podemos destacar o

depoimento de LF, ex-Ilustrador Técnico, 44 anos, casado, que trabalhou por 18

anos na Embraer:

“Hoje, mesmo tendo o meu negócio próprio, ainda sonho em voltar a trabalhar na

Embraer. Quando trabalhava na empresa me sentia feliz, pois sabia que a empresa

me oferecia grandes possibilidades de crescimento dentro da empresa além de todos

os benefícios e assistências”.

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Outro relato importante é de PRB, Engenheiro, 51 anos, casado, dois filhos,

trabalhou 25 anos na Embraer:

“A minha demissão foi muito dolorosa, fui demitido por carta, sinceramente eu não

esperava depois de 25 anos de dedicação e amor pela Embraer, mas mesmo assim

ainda sonho em voltar para minha antiga profissão, sei que a Embraer está dentro de

mim”.

4.2 – O IMPACTO OCORRIDO NA VIDA DOS NOVOS FUNCIONÁRIOS CONTRATADOS PELA EMBRAER LOGO APÓS SUA PRIVATIZAÇÃO Esta pesquisa foi realizada mediante um levantamento de campo quantitativo

contendo trinta e duas perguntas aplicadas a cento e oito pessoas. Foram realizadas

entrevistas em profundidade com seis pessoas selecionadas entre as admitidas pela

Embraer logo após a privatização.

A partir dos dados coletados podemos observar que os novos contratados

têm entre 18 e 29 anos, 63% entre 30 e 39 anos e apenas 26%, 11% acima de 40

anos. Em relação à pesquisa feita com os funcionários demitidos na crise, a faixa

etária é bem menor atualmente. A maioria é do sexo masculino 69% contra 31% do

sexo feminino, sendo que muitos desses funcionários foram contratados para a área

de produção. (Vide Tabelas 41, 42, 43 e 44.)

TABELA 41 – Faixa etária dos ex-funcionários

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,

2004/2005.

FAIXA ETÁRIA

QUANTIDADE %

20 a 29 anos 19 24 30 a 39 anos 25 30 40 a 49 anos 33 41

50 anos acima 04 05

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TABELA 42 – Faixa etária dos novos contratados

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

TABELA 43 – Número de ex-funcionários demitidos por sexo

SEXO QUANTIDADE % Feminino 20 25 Masculino 61 75

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,

2004/2005.

TABELA 44 – Número de funcionários contratados por sexo

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

Com relação à escolaridade dos novos funcionários, comparada à dos

funcionários demitidos, melhorou muito, pois atualmente 48% têm o 2º grau

completo, 26% têm o curso superior incompleto, 20% têm curso superior completo e

6% tem pós-graduação. Pode-se notar que não houve contratação de pessoas com

escolaridade inferior ao 2º grau, isso mostra que houve maior exigência na

qualificação dos novos contratados, tanto os novos como os que se mantiveram têm

possibilidade de “fazer carreira” na empresa, conforme relatos:

CC, 32anos, Solteira, Técnica em Gestão Empresarial, contratada em 2000,

relata que: “Quando passei pelo processo seletivo, para ingressar na empresa, tinha como

requisito básico para ocupar a vaga a qual eu estava concorrendo, a fluência na

língua inglesa e também que eu tivesse cursando uma Faculdade na região.

Requisito esse que não era necessário no meu emprego anteiror”.

FAIXA ETÁRIA QUANTIDADE % 18 a 29 anos 68 63 30 a 39 anos 28 26

40 anos acima 12 11

SEXO QUANTIDADE % Feminino 34 31 Masculino 74 69

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CJP, 42 anos, casado, um filho, Técnico Eletrônico, há 6 anos na empresa,

relata que:

“Quando fui contratado em 1999, iniciei meu trabalho na linha de montagem do ERJ-

145, logo após 2 anos a empresa me possibilitou um curso de aperfeiçoamento na

área de sistemas. Em 2004 iniciei a Faculdade de Engenharia Eletrônica, onde a

empresa me ajuda com uma bolsa de estudo. Hoje me sinto feliz e posso dizer que

estou cursando uma Faculdade e tenho uma casa na Zona Sul graças a Embraer,

onde tenho orgulho de fazer parte dessa empresa”.

A Tabela 45 apresenta os resultados do levantamento de campo em relação

à satisfação dos novos funcionários. Pelos resultados, podemos verificar que

os níveis de satisfação dos novos funcionários em relação ao ambiente

organizacional é bom, 85% dos trabalhadores aponta como principais virtudes

ou vantagens da empresa a política de salários e benefícios, a oportunidade

de carreira e o orgulho de trabalhar na empresa conforme tabela e relato:

TABELA 45– Está satisfeito com a empresa

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

DL, 54 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Mecânico, conta com muita

emoção sua trajetória:

Nascido na cidade de Pedreira, interior de São Paulo, conta que recebeu o

convite para trabalhar na Embraer. “Quando cheguei em São José dos Campos,

fui morar em uma pensão próxima ao Parque Santos Dumont, bairro Maringá, e logo

após cursei Engenharia. Hoje ocupo um cargo de chefia. A minha vida passou por

Está satisfeito com a empresa

QUANTIDADE %

Sim 92 85

Não 16 15

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alterações. Concluí a Faculdade, fiz pós-graduações com a ajuda da Embraer e

viajei a trabalho para os Estados Unidos, Europa e China. Também troquei de casa

na Vista Verde, Zona Leste, por um apartamento na Zona Sul, Hoje tenho um filho

formado em Engenharia Eletrônica e uma filha formada em Terapia Ocupacional.

Atualmente vivo um novo momento, me sinto feliz e grato por tudo que a Embraer

proporciona em minha vida.”

Quanto ao local de origem desses novos contratados, 39% São de São José

dos Campos, o restante veio de outras cidades: 9% de São Paulo – capital, 11% de

Jacareí, 15% de outras cidades do Vale do Paraíba, 7% do restante do interior de

São Paulo, 2% do litoral Sul de São Paulo e 17% de outros Estados do país,

conforme Tabela 46.

TABELA 46 – Cidade de origem dos novos contratados

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

Assim o número de pessoas que trabalham atualmente na Embraer e que

vieram de outras cidades e Estados aumentou 17% em relação aos ex-funcionários

CIDADE DE ORIGEM

QUANTIDADE %

São José dos

Campos

42 39

São Paulo 10 09

Jacareí 12 11

Vale do Paraíba 16 15

Interior de São

Paulo

08 07

Litoral Sul de SP 02 02

Outros Estados 18 17

TOTAL 108 100

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demitidos naquele período. 12% foi a diminuição de contratação de pessoas que

moram na cidade de São José dos Campos.

Outro aspecto importante é quanto ao estado civil, pois a maioria dos

entrevistados é solteira, aproximadamente 54% dos novos contratados, já entre os

ex-funcionários, 70% são casados, sendo que 68% não têm filhos.

A maioria dos novos contratados, que mora em São José dos Campos,

aproximadamente 23% na Zona Sul, 20% na Zona Leste, 4% na Zona Norte, 21%

na Zona Oeste, 6% no Centro; 26% moram em outras cidades. Com relação à

mobilidade social, houve um aumento significativo de moradores na Zona Oeste, de

15%, comparando com o os ex-funcionários que moravam na Zona Oeste, que

totalizavam 4%. A Zona Oeste é a região em que se concentram os grupos sociais

de maior renda e os imóveis mais valorizados de São José dos Campos.

Conforme identificado pelo levantamento de campo, 39% dos novos

contratados que já moravam em São José dos Campos e 61% dos que vieram de

outras regiões mudaram de bairro depois que foram contratados 42% por razões

profissionais, 21% em busca de segurança e qualidade de vida, 20% devido ao

preço mais baixo do imóvel, 9% pelo acesso à infra-estrutura e serviços e 8% por

motivos familiares, conforme Tabela 47 e relato:

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TABELA 47 – Motivo principal da mudança da família de bairro dos novos funcionários

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

ERF, 27 anos, separada, dois filhos, Técnica de Informática ,contratada em

2003, diz em entrevista que: “Eu me sinto muito privilegiada pelos benefícios que tenho dentro da empresa, gosto

muito de trabalhar na Embraer. Em relação aos incentivos que a empresa oferece,

são muito bons, tem a bolsa estudo que eu tenho de 30%, mas que só é válida se for

bem na Faculdade, pois é por nota que você recebe o desconto, e também tem

cursos e palestras e o aproveitamento interno dentro da empresa. A Embraer oferece

uma perspectiva muito grande em relação ao crescimento profissional do funcionário,

por isso estou fazendo faculdade para que eu possa ter mais oportunidades. Hoje eu

posso dizer que minha vida mudou para melhor depois que comecei a trabalhar na

Embraer: consegui comprar meu apartamento na Zona Oeste da cidade e dois

carros”.

Conforme tabela 48, 75% dos novos contratados moram em casas próprias,

17% alugadas e apenas 6% financiadas. Mesmo depois da contratação dos novos

funcionários, somente 35% mudaram para outra residência, sendo que deste total

TODAS AS REGIÕES

Número de pessoas / 108

MOTIVOS DA MUDANÇA %

Profissionais 42

Familiares 08

Acesso à infra-estrut. e serv. 09

Preço mais baixo do imóvel 20

Segurança e Qualidade de vida

21

Não informa -

TOTAL 100

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20% mudaram para a Zona Leste e 23% para a Zona Sul, 21% para Zona Oeste, 6%

para o Centro, com relação ao endereço anterior, 30% moravam na Zona Leste,

30% na região Sudeste, 21%, na Zona Sul, 11% na Zona Norte, 4% no Centro e 4%

na Zona Oeste. Essa mobilidade espacial ocorreu devido ao aumento do poder de

renda dos novos contratados que migraram da Zona Leste, Norte e Sul para a Zona

Oeste conforme Tabelas 49, 50, 51 e relato:

TABELA 48 – Situação atual (MORADIA)

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

TABELA 49 – Mudou de endereço logo após a sua contratação

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

SITUAÇÃO DA CASA ATUAL

QUANTIDADE %

Própria 82 75

Alugada 18 17

Cedida 02 02

Financiada 06 06

Mudou de endereço após a contratação na Embraer

QUANTIDADE %

Sim 38 35

Não 70 65

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TABELA 50 – Endereço anterior dos novos contratados que moram na cidade de São José dos Campos

ENDEREÇO ANTERIOR

QUANTIDADE %

São José dos Campos

Zona Sul 09 21

Zona Leste 12 30

Zona Norte 05 11

Zona Oeste 02 04

Centro 02 04

Sudeste 12 30

TOTAL 42 100

Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

TABELA 51 – Endereço atual de todos os novos contratados na cidade de São

José dos Campos Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,

2004/2005.

MPM, 31 anos, solteira, Técnico em Eletrônica, há 6 anos trabalhando na

Embraer, contratada no período em que a Embraer estava retomando o seu

crescimento, relata:

São José dos Campos

Zona Sul 28 23

Zona Leste 26 20

Zona Norte 04 04

Zona Oeste 16 21

Centro 06 06

Outras Cidades 28 26

TOTAL 108 100

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“Desde o início recebi todo o suporte dentro da empresa e todo treinamento de

qualificação para área de logística que eu atuo. É uma empresa que motiva muito o

funcionário e eu me sinto muito feliz de estar trabalhando na Embraer. Hoje eu

recebo a bolsa estudo de 30% para pagar minha Faculdade e também a empresa dá

todo incentivo para as pessoas estudarem, além dos convênios com as Faculdades,

a Embraer tem também convênio com escolas de inglês e francês, eu hoje possuo

um apartamento na Zona Oeste graças a estar trabalhando na Embraer, que vem

investindo no meu crescimento profissional”.

Dos novos contratados, 89% dizem que a renda aumentou após a

contratação, ao contrário do que ocorreu com os demitidos, 55% dos quais tiveram a

renda diminuída. Para os novos contratados cuja renda aumentou,

conseqüentemente a qualidade de vida melhorou, ou seja, 85% desses novos

contratados estão satisfeitos em trabalhar na Embraer e com o plano de

aperfeiçoamento contínuo oferecido pela empresa; apenas 15% dos novos

contratados não estão satisfeitos com a empresa, mas mesmo assim não gostariam

de sair, devido à insegurança do mercado.

CEEL, 26 anos, solteiro, Técnico em Eletrônica, cursando o nível superior em

Administração de Empresas, desde 1999 contratado pela Embraer, argumenta: “A Embraer é uma empresa que me dá segurança, me estimula a continuar

estudando para que eu possa crescer e sempre estimula o funcionário a se

desenvolver profissionalmente. A empresa dá apoio para a especialização dos

funcionários e promove o aproveitamento interno em outras áreas, adequando o

funcionário para uma melhor função que ele possa exercer. Em relação ao

crescimento profissional dos funcionários na empresa, existem oportunidades temos

que estar sempre alerta para os momentos que surgirão. Com relação as minhas

conquistas materiais consegui comprar meu apartamento na Zona Leste, um terreno

e um carro. Devo isso a estar empregado na Embraer, por isso me sinto feliz em

fazer parte dessa empresa”.

Dos 85% que se dizem satisfeitos, 38% dos novos contratados estão

totalmente satisfeitos e até mesmo gostariam de sair de São José dos Campos para

trabalhar no exterior em outras sedes da Embraer.

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4.3. A VISÃO DOS FUNCIONÁRIOS QUE PERMANECERAM A RESPEITO DAS MUDANÇAS NA EMPRESA

O processo de privatização implicou uma transformação radical nas formas de

gestão, organização industrial e institucional, cultural, empresarial e na visão de

negócios da Embraer, como podemos ver no depoimento:

HAF, 54 anos, separado, Engenheiro Eletrônico, há 28 anos trabalha na

Embraer: “A Embraer, desde seu início, em 1969, até sua crise em 1994 e sua privatização,

tinha como visão implantar uma infra-estrutura industrial no setor aeronáutico do

país, essa era a primeira visão e dentro dessa visão a Embraer se comportou

perfeitamente bem, ela foi criada em 1969 e em 2 ou 3 anos já estava entregando

produtos seriados, e a partir de 1975 ela se tornou uma empresa exportadora e seus

produtos foram muito bem aceitos; seja no país, seja no exterior, como empresa

estatal. A Embraer foi privatizada em dezembro de 1994, um período de prolongada

crise que começou em 1990, essa crise não terminou com a privatização da

Embraer, na verdade a privatização foi o começo da reviravolta, da ‘virada de mesa’.

As principais diferenças entre a empresa estatal e a empresa privatizada é que a

empresa privatizada podia ter a flexibilidade, a agilidade e agressividade que uma

empresa estatal, por ser amarrada a muitas obrigações de caráter legal, está

impedida, essa é a principal diferença. A empresa estatal se notabilizou pela sua

excelência tecnológica e industrial e a empresa privada agregou essa excelência,

essa competência tecnológica e industrial, novas competências no setor

administrativo, financeiro e empresarial que foram muito importantes para que a

Embraer iniciasse sua reviravolta, a partir de dezembro de 1996, quase dois anos,

portanto, após ter sido privatizada. A Embraer dos ‘sonhos’ continua presente em

cada funcionário, porque esse é um dos motivos que move o principal pilar que é a

Embraer. Isso torna a empresa muito competitiva, ou seja, são as pessoas

dedicadas, motivadas, competentes e que fazem com que a empresa exista, este é

um elo emocional muito forte, porque qualquer visitante vindo do exterior,

principalmente, nota esse envolvimento emocional ao visitar a empresa, que sempre

existiu desde sua criação em 1969 e continua presente nos dias de hoje. A Embraer

em 1969 foi fruto das pessoas que com grande visão e determinação, a criaram.

Em 2005, a Embraer é a 4ª maior empresa aérea comercial, fabricante de aeronaves

comerciais do mundo, fruto da vontade, da competência, do talento de pessoas e do

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sonho que elas acalentam A Embraer começou a sua prolongada crise em 1990,

nessa época tinha 12.600 empregados e de uma tacada só em novembro de 1990,

foram demitidos 4.000, então ela caiu de 12.600 para 8.600 empregados.

Posteriormente, em 1994, um pouco antes de ser privatizada, ela demitiu mais 2.000

empregados e foi perdendo mais alguns. De fato, quando a Embraer foi privatizada,

tinha um pouco mais de 4.300 empregados. No período que foi de 1995, já uma

empresa privatizada até seu início de recuperação, início de 1996, a Embraer ainda

demitiu cerca de mais 1.500 empregados, e em abril de 1997 a empresa estava com

o menor número de empregados da sua história, com 3.200 empregados. Fechou o

ano de 1997 com 4.494 empregados e em 2005 temos 16.953 empregados no

primeiro trimestre. Desse contingente que foi demitido sucessivamente entre 1994 e

1996, uma parte se perdeu na medida em que mudou de cidade e passou a se

dedicar a outras atividades, no entanto uma parte deles foi reaproveitada, inclusive

quando a empresa ainda estava se reestruturando. Alguns desses empregados

foram reaproveitados pela Embraer e outros pela GAMESA, uma empresa

espanhola. A partir de seu crescimento até sua reviravolta em 1996/1997, alguns

foram reincorporados à empresa, outros passaram a se dedicar a empresas de

transporte aéreo, como Varig, Vasp, Transbrasil, e alguns passaram a se dedicar a

empresas no exterior, alguns se tornaram empregados da Boeing e da Canadair

Bomdardier e de outras empresas na Europa. Não tenho uma estatística correta de

quantos foram reaproveitados pela Embraer, acredito que dos 6.000 empregados

que saíram talvez 1.500 retornaram à empresa mas já com outro pensamento;

desses funcionários mais de 90% deixaram de ser sindicalizados. O CTA e o ITA

estão perdendo grandes professores, que estão indo para o exterior ou entrando em

empresas privadas, devido aos baixos salários, e isto afetará em alguma parte a

Embraer no futuro, de não ter uma mão-de-obra tão qualificada como antes, mas em

primeiro lugar é importante dizer que da mesma forma que a Embraer era como uma

empresa estatal, dificilmente teria o desempenho que ela pode ter como empresa

privada pelas questões que já abordei, como agressividade, flexibilidade, capacidade

de agir rápido, agressividade comercial. O fato é que a Embraer jamais teria existido

se não houvesse por trás dela o CTA e o ITA, e por trás do CTA e do ITA, a decisão

do governo brasileiro no final da década de 40, de desenvolver esta estratégia, que é

de longo prazo, que é fundamentada na educação de alto nível (o ITA), mas que

demonstrou ser afetada. Hoje são pouquíssimos os países que tenham uma indústria

de aeronáutica completa, como existe no Brasil e certamente nenhum país abaixo da

linha do Equador, que tenha essa competência, mesmo a Austrália que é um país de

1º mundo, não tem uma indústria de aeronáutica completa. Indústria de aeronáutica

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completa significa a capacidade de conceber, projetar, desenvolver, testar, certificar,

fabricar industrialmente e apoiar os produtos aeronáuticos que são muito

sofisticados. A manutenção do CTA e do ITA é de uma importância estratégica, o ITA

gera profissionais de altíssima qualificação que são utilizados não só pela Embraer,

como fabricante de aeronaves, mas também pelo próprio CTA, nas suas pesquisas.

Não se pode nunca esquecer o papel do CTA como entidade homologadora, o CTA

que através de um trabalho muito sofisticado, certifica os aviões, certificações que

são aceitas pelas entidades homologadoras dos EUA e Europa, de modo que essa

competência do CTA e do ITA, se for perdida e hoje ela está ameaçada pela falta de

renovação, pelas dificuldades em contratar professores, profissionais que o CTA não

consegue deter, porque vão procurar melhores condições de remuneração fora, o

Brasil vai ser muito penalizado e não só a Embraer. Hoje a Embraer emprega

engenheiros egressos do ITA e também de outras escolas de engenharia, algumas

com curso aeronáutico ou de especialização aeronáutica, como a Universidade de

Engenharia de São Carlos - SP, a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade

Federal de Minas Gerais (UFMG). A Embraer também criou um curso de

especialização em engenharia aeronáutica em nível de mestrado num convênio com

o próprio ITA. Hoje a Embraer tem outras fontes de suprimento de mão-de-obra

qualificada em face do crescimento da demanda, mas o ITA sempre foi e sempre

será de uma importância fundamental para a Embraer.”

Em relação à Embraer até 1994 e a atual que se tornou uma montadora, isso pode

prejudicar o futuro da Embraer ou abrir novas concorrências no futuro? “A Embraer

desenvolveu de início o programa ERJ-145 e depois aprofundou o programa da

família Embraer 170/190, uma arquitetura industrial que chamamos de parceria a

risco, que é a Embraer somar-se a grandes fabricantes do mundo inteiro, ou seja,

empresas renomadas do setor aeroespacial e fazer com que essas empresas

invistam e participem do programa de risco. Isso significa que a Embraer não corre o

risco sozinha, essas empresas parceiras investem no programa e se o programa for

bem sucedido, como os estudos indicam, essas empresas serão muito beneficiadas

por ocasião da produção, caso o programa não seja tão sucedido, elas irão dividir as

perdas com a Embraer. Esse processo de parcerias com outras empresas

(fornecedoras de peças) foi na realidade fundamental no caso do ERJ-145, porque a

Embraer não tinha condições de investir na produção total de peças, era uma

empresa estatal com uma dívida de US$ 1 bilhão e que não dispunha de US$ 100

milhões, por exemplo, para investir no projeto e na serialização da nova asa

adquirida pelo avião; foi um processo tão bem sucedido que no caso do programa

Embraer 170/190 foi ainda mais aprofundado. Hoje é um processo que encontra

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algumas similaridades com as grandes montadoras do setor automotivo, podemos

dizer que a Embraer se transformou numa grande montadora do setor aeronáutico.

O que significa então ser uma montadora? O que está por trás desse termo,

‘montadora’? Caracterizaria da seguinte maneira, a Embraer, em primeiro lugar,

antes de tudo, detém o projeto (design); a família Embraer 170/190 tem aquelas

características que refletem um estilo de projeto e um entendimento de como deva

ser o avião da Embraer. A Bombardier (concorrente direta da Embraer) faz de uma

maneira diferente da Embraer, que se conceitua a mais adequada no mercado.

Então a empresa detém o projeto, a arquitetura industrial, que faz com que parceiros

se somem nessa direção e detém a base de clientes, e isso é uma coisa que está

sob o domínio da Embraer. Ao se ‘parceirizar’ com grandes empresas e portanto ter

um sistema mais horizontalizado, há ganhos e perdas. Os ganhos são facilmente

identificados: em primeiro lugar o investimento necessário para desenvolver a nova

família de aviões é dividido, não é todo da Embraer, no caso da família 170/190, de

US$ 1bilhão necessários para desenvolver a nova família, cerca de US$ 300 milhões

vieram de investimentos de parceiros no desenvolvimento da asa, um segmento da

fuselagem, um motor adequado para o avião, cerca de US$ 240 milhões vieram de

contribuições de nossos parceiros, dinheiro que eles tiraram do bolso e colocaram

em cima da mesa para poder participar do programa e o restante foi levantado pela

Embraer através da geração de caixa e soluções de mercado, ou seja, a Embraer

não precisou depender de investimentos governamentais e de apoio governamental,

bancou o desenvolvimento funcional da família de aviões com soluções de mercado;

então isso é uma vantagem significativa que no passado não existia. Em segundo

lugar, ao se apoiar em parceiros no mundo todo, a Embraer também tem em cada

um desses parceiros, parceiros interessados em que os aviões sejam vendidos em

seus países de origem, porque vendendo avião no Japão, Europa, etc., também a

Embraer estará gerando empregos nesses países, então existe um interesse

redobrado por parte dessas empresas no sucesso do programa.”

O que a empresa perde com isso?

“Pode-se imaginar que ao subdividir o avião em vários segmentos e compartilhá-los

com parceiros que são em sua maioria de outros países, a empresa perca um pouco

de flexibilidade, porque não é apenas ela para tomar decisões, a Embraer precisa

negociar em alguns casos e se apoiar nesses parceiros. Então se perde,

evidentemente, toda vez que você se associa a sócios, perde-se um pouco de

flexibilidade, embora aumente sua força. Poderia dizer que também a Embraer gera

menos empregos, essa é uma ponderação válida na teoria, na prática o fato é que a

Embraer, ao desenvolver dessa forma seus aviões, desenvolveu produtos de

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sucesso e dos 3.849 empregados que a empresa tinha em abril de 1996, hoje a

Embraer tem 16.953 empregados, ou seja, geramos uma quantidade de empregos

significativa, multiplicamos praticamente por cinco, no prazo de 10 anos, o número

de empregados da Embraer. Com isso, na prática, o sucesso e a riqueza

proporcionada pela empresa com um empreendimento vencedor são fatores

consecutivos reais e não teóricos.”

Se houver outra crise de reestruturação, global, regional, nacional ou outro atentado

como o 11 de setembro, a Embraer está preparada para essa nova crise?

“A crise dos anos 90 teve vários contribuintes, ela resultou de um movimento de

transformação da indústria aeroespacial em todo mundo. Até 1987, o mundo vivia a

Guerra Fria e conseqüentemente se investia muito em programas de defesa, o Brasil

não participava diretamente da Guerra Fria, mas era um país alinhado com uma das

potências e conseqüentemente seguia o mesmo modelo e a Embraer sentiu a

ausência de programas governamentais. Um outro componente é o fato de que o

governo brasileiro, que viveu aquele período de 20 anos de autoritarismo apoiado

num modelo econômico de substituição das importações, também era um governo

que demonstrava exaustão, não tinha mais como apoiar essas empresas estatais.

Um outro componente é a própria Embraer, que depois de muitos anos de empresa

estatal, já tinha adquirido alguns vícios administrativos, já havia ‘inchado’ muito o seu

quadro de empregados sem a correspondente eficiência produtiva de projeto, que

são fatores que contribuíram para a crise da Embraer. Outro fator significativo foi que

no início dos anos 90, deu-se a 1ª Guerra do Golfo e logo após, ou como

conseqüência da guerra, houve uma retratação no transporte aéreo e

conseqüentemente os fabricantes de aeronaves sentiam muito isso, e a Embraer

também, a piora das condições de mercado no início dos anos 90. Essa foi uma crise

que quase derrubou a Embraer. O atentado de 11 setembro de 2001 foi uma crise

que encontrou a empresa forte, a empresa tinha muito dinheiro em caixa, uma

situação econômica muito forte, de grande solidez, empresa completamente

saneada, estabelecida no mercado com produtos de sucesso. Essa foi uma crise,

porém muito mais intensa, mais prolongada e de conseqüências muito mais

dramáticas para a indústria de transporte aéreo, que a crise vivida no início dos anos

90, tanto é que essa crise ainda não foi completamente superada e nos EUA,

principalmente, com grandes empresas aéreas como a American, a Delta, a

Continental, ainda continuam todas com o futuro incerto, provavelmente algumas

empresas ainda irão falir ou se fundir a outras para poder sobreviver. A despeito

disso, a Embraer soube enfrentar essa crise, soube ultrapassar essa crise e

continuou em 2002, 2003, em 2004 gerando lucro, crescendo o número de

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empregados, a despeito de o mercado estar passando por uma das suas piores

crises na história. Nesse período uma empresa concorrente da Embraer, porém não

tão sólida, não tão bem estabelecida, acabou desaparecendo, que foi a Fairchild

Dornier, empresa americano-alemã, fabricante do avião Dornier 328, jato regional

para 30 passageiros, e que se encontrava em avançado estágio de desenvolvimento

dos jatos Dornier 728 (70 passageiros) e Dornier 928 (90 passageiros), uma família

de aviões parecidos com os da família Embraer 170/190, mas não tiveram condições

econômicas de suportar os efeitos da crise e acabaram falindo e saindo de mercado

em julho de 2002. Eu diria que a Embraer já demonstrou estar preparada para

enfrentar outro momento de crise, na verdade a Embraer está atravessando por uma

crise que ainda não está completamente terminada, sendo a pior crise do transporte

aéreo em todo mundo.”

Já para ACMS, 45 anos, Engenheiro Mecânico Aeronáutico, há 22 anos

trabalha na Embraer, relata que o processo de mudanças foi essencial para

empresa: “Do início de 1969 até a crise e sua privatização, a Embraer era uma empresa com

foco muito grande em tecnologia, com produtos desenvolvidos em função das

prioridades do Ministério da Aeronáutica, trabalhando em projetos onde ela pudesse

adquirir tecnologia e promover produtos e serviços para o Ministério da Aeronáutica,

desenvolvendo-se nesta fase o Tucano, o AMX em conjunto com a Itália, fazendo

peças para o projeto F5, e o Bandeirante que foi uma iniciativa dentro do Ministério

da Aeronáutica e logo veio o Xingu que foi o precursor do Brasília, mas sempre

voltado a desenvolver tecnologia. Assim a Embraer sempre buscou entrar em

programas internacionais onde ela pudesse adquirir tecnologia e exportar produtos

de alto conteúdo tecnológico, ‘focada em alta tecnologia’.”

No livro de Ozires Silva, ele diz que a Embraer era uma “fábrica de sonhos”, de

pessoas idealistas do setor militar.

“Na época que iniciei, o “sonho” já estava materializado, nós estávamos na fase de

produzir mesmo, o sonho já era realidade, as pessoas que estavam lá tinham uma

experiência para transformar sonho em produtos, de 1983 em diante, já era um

sonho concretizado em produtos. Com relação à privatização em 1994, a mudança

essencial que houve na Embraer até a data de hoje, foi um redirecionamento do

foco; o foco não era mais só desenvolvimento de tecnologias, mas aplicar essa

tecnologia de uma forma otimizada para obter retorno, concentrar o conhecimento

tecnológico, a capacidade instalada nas atividades que iam dar retorno efetivo em

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função do mercado, era olhar o que a Embraer tinha de capacidade tecnológica, e o

que o mercado tinha de potencial e juntar essas duas coisas, ou seja, aplicar toda

aquela tecnologia adquirida na forma que o mercado estava desejando. A entrada do

grupo Bozano Simonsen na estrutura da Embraer, em termos de crescimento de

mercado, com os departamentos de vendas lá fora e a integração com um bom

produto aqui, trouxe uma nova administração, o que uma empresa aeronáutica não

tinha, que era área financeira, área econômica. A agilidade de encontrar soluções

econômicas para viabilizar negócios uniu a tecnologia da Embraer de produzir aviões

com uma nova tecnologia, que é a tecnologia econômica de criar soluções para

viabilizar negócios (marketing). Hoje a Embraer está presente na América do Norte,

Ásia, Europa e na América do sul, com unidades independentes para vendas e

contratos e uma área de inteligência de mercado em São José dos Campos. A

Embraer hoje na verdade é uma empresa reestruturada, preparada para o mercado

externo, ainda com pessoas da época da sua fundação, com uma experiência e

conhecimento técnico muito grande, e com novas pessoas de ampla visão de

mercado (marketing), o que torna a empresa extremamente competitiva.”

O governo Lula vem anunciando em algumas entrevistas, que gostaria que muitas

peças que são trazidas de fora, fossem fabricadas aqui no Brasil, gerando mais

empregos.

“Isso na verdade está acontecendo, os principais parceiros da Embraer estão

montando suas unidades aqui no Brasil. Não estão fazendo isso só porque o

governo quer, estão fazendo isso porque vão ganhar dinheiro com isso, porque

conseguem produzir aqui o mesmo produto que produzem lá fora, com ganho de

economia de escala, ficando mais barato produzir aqui. Os exemplos são as micro,

pequenas, médias empresas (MPMEs) da indústria aeronáutica. As perspectivas da

Embraer para o futuro são grandes, por ela ter passado por crises como,

recentemente o 11 de Setembro, ela está preparada para enfrentar uma crise. Por

ter produtos de alta tecnologia, a Embraer vem buscando novos mercados , mas a

Embraer está num setor que é sujeito à crise.

Do total de novos contratados, apenas 10% é sindicalizado, devido à

instabilidade do mercado e a perda da força sindical nos últimos anos conforme

relata:

AN, 44 anos, casada, Assistente Social e ex-diretora de Sindicato, no seu

depoimento, têm uma visão crítica:

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“O impacto da crise de 1994, vivida pela Embraer, gerou em São José dos

Campos uma fase muito difícil. Dos muitos funcionários que foram demitidos na

época, alguns voltaram para sua cidade de origem e outros ficaram, temos como

exemplo FF que era o número quatro da Embraer, o quarto trabalhador registrado, e

que ocupava o cargo de chefe em um setor importante, recebeu o comunicado de

sua demissão através de uma carta. O rompimento com a Embraer foi muito drástico

e inesperado e abalou totalmente a estrutura dessas pessoas, pois a paixão pela

mesma era muito grande. Hoje, os sentimentos mudaram até porque ela se

modernizou, aumentou e tem outra relação com o trabalhador e a cidade. A

construção e o crescimento da Embraer até 1994 era de sonho e paixão e por isso, a

forma da demissão foi muito traumática. Algumas medidas foram adotadas pela

câmara e a prefeitura para amenizar as demissões da Embraer como: o ‘Levanta

Vôo São José’, que teve como base a discussão da privatização: foi criado um

Comitê formado por vereadores, sindicatos e prefeitura para discutir com a cidade de

São José dos Campos e o Estado de São Paulo a importância da Embraer e sua

privatização ou não, com várias ações na Assembléia Legislativa e no Congresso

Nacional. Hoje a Embraer é um sucesso como era antes, mas a relação depois do

processo de privatização e demissões não tem mais aquele vínculo afetivo com a

cidade, isso mudou, a Embraer hoje é uma das maiores exportadoras do país, tem

trabalhos sociais, mas não tem mais aquela paixão, o vínculo e a relação que tinha

com as pessoas foi cortado depois do processo de privatização. Em função da crise

gerada com as demissões, a saída que a prefeitura e a câmara encontraram para

amenizar este impacto na sociedade foi investir na área de serviços. Houve incentivo

para a abertura do Shopping Vale Sul, que na época foi um investimento grande,

neste período tivemos a inauguração do Carrefour e assim São José dos Campos

começou se afirmar no setor de serviços, que é um setor forte. O setor aeronáutico

teve um crescimento significativo em São José dos Campos devido aos conflitos e

guerras que torneiam o mundo. A definição da Embraer para essa nova família de

aviões cresceu e continua crescendo, principalmente as indústrias voltadas para o

setor aeroespacial as micro, pequenas, médias empresas (MPMEs). Várias pessoas

que saíram da Embraer montaram microempresas com as experiências acumuladas,

porém tiveram altos e baixos, pois com a retomada do crescimento novos

prestadores de serviços surgiram. Esse período da demissão até a retomada, que foi

de 3 a 4 anos, foi muito duro, foi um processo doloroso para as pessoas da cidade. A

Embraer retomou seu crescimento com uma nova visão empresarial. A relação é

mais fria com a cidade, as pessoas ainda se orgulham de trabalhar na Embraer, mas

a empresa deixou de ser o símbolo da cidade. Algumas leis foram modificadas após

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esses fatos para a reestruturação ou melhoria das pessoas demitidas, a câmara

aprovou uma lei de investimento, a ‘Lei de Incentivos Fiscais’, que foi feita até para

as empresas entrarem e produzirem. A privatização desenvolveu um outro tipo de

relação com a cidade, uma relação industrial, de produção, com alguns trabalhos

sociais, mas tudo vinculado às perspectivas empresariais, sem ter vínculos como

tinham antes da privatização. A privatização mudou a relação com a cidade, ficou

mais formal e outro aspecto é o salário que abaixou muito após a privatização, hoje a

maioria dos novos contratados não é filiada ao sindicato local. Os trabalhadores que

estavam empregados antes de 1994, eram funcionários sindicalizados com 10, 15,

20 anos de casa, as demissões foram de pessoas que a construíram. Com o

crescimento da Embraer, a maioria das novas tecnologias é comprada, o material

composto na época vinha da Espanha, então muitas máquinas, investimentos foram

construídos por esses trabalhadores. Hoje a Embraer é uma montadora. Com essa

forma de produção da Embraer, o ramo das terceirizadas é bastante grande e a

Embraer tem um gerenciamento de controle bastante diferente de como era antes;

por exemplo, se houver crises, os investimentos de grande porte estão garantidos

pelo BNDES. Não é o que ocorre com as empresas que prestam serviços, pois

acabam fechando. Portanto é sempre traumático o processo que ela acaba gerando.

O governo brasileiro está mudando, forçando a Embraer a nacionalizar uma parte

das peças utilizadas na construção dos aviões”.

Como mostra o levantamento de campo, os novos funcionários estão

satisfeitos com o apoio que a Embraer dá para seu crescimento profissional, por

exemplo, auxiliando com cursos, palestras, bolsas de estudos, entre outros

benefícios. Um dos fatores primordiais para o sucesso da Embraer no futuro é a

parceria que têm com o ITA que fornece aos funcionários da empresa o curso de

Mestrado na área aeronáutica dentro da empresa, pois à precarização das

condições de funcionamento do CTA e do ITA, que no passado eram à base do

corpo técnico da Embraer, atualmente não recebem investimentos suficientes do

governo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

• O PRESENTE E O FUTURO DA EMBRAER E DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS Os processos de privatização e estruturação simplicaram uma

transformação radical nas formas de gestão, organização industrial e institucional,

cultura empresarial e, sobretudo, na visão de negócios da Embraer. A elaboração e

a formalização de um planejamento estratégico e a realização de análises de

mercado mais precisas, baseadas em indicadores de monitoramento interno e

externo por intermédio de uma nova área recém criada denominada “Inteligência de

Mercado”, representaram uma etapa fundamental dessa nova fase da empresa. As

estratégias de reestruturação produtiva e financeira possibilitaram o crescimento do

faturamento e uma valorização do patrimônio e prestígio da Embraer. Ressalve-se

que a estratégia e a excelência na abordagem da tecnologia sempre foram os

pontos fortes da Embraer. O programa ERJ-145, por exemplo, que permitiu a

recuperação da empresa e sustentará as vendas futuras, havia sido projetado em

1989, enquanto a empresa era ainda uma estatal. Contudo, só foi possível a sua

viabilização pela solução criativa das parcerias de risco e pela agilidade e

flexibilidade empresarial conquistadas após a privatização da empresa.

Para Bernardes (2000, p. 369) “é importante deixar claro que a Embraer

conseguiu atrair parceiros no mercado mundial que apostassem e investissem no

projeto ERJ-145, ERJ-170 e ERJ-190, porque a empresa detinha o design e a

tecnologia que as outras empresas não possuíam”. Certamente, se a empresa não

desfrutasse de uma posição estratégica no mercado, enquanto geradora de

tecnologia, as possibilidades de celebrar alianças não seriam tão promissoras. No

futuro, para manter sua posição competitiva, a empresa deverá celebrar parcerias e

alianças que agreguem valor, tecnologia e mercados dinâmicos.

Esta fase de transição do modelo organizacional e institucional de

Estatal para privado é marcada também por um conflito entre uma visão financista

dos novos controladores e enfoque tecnológico dos antigos diretores da empresa.

Apesar disso, os novos controladores souberam preservar a liderança e a identidade

de excelência tecnológica da empresa, preservando o departamento de engenharia

e, portanto, a sua capacidade de design, dando continuidade à tradição da Embraer,

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adaptando e transformando esses valores de acordo com a nova filosofia desenhada

para uma moderna organização empresarial (Ibidem).

Na visão dos militares o processo de privatização não foi a melhor

solução para a empresa, muitos se manifestaram contra. Conforme relato de Silva

Segundo Bernardes (2000), “até hoje ele recebe declarações inconformadas de

setores militares quanto ao processo de venda da Embraer para a iniciativa privada.

Recorde-se que o próprio Ozires, desde a fundação da empresa, insistiu com o

Ministério da Aeronáutica que o empreendimento deveria ser viabilizado pelo setor

privado. Mas, todo o esforço de sensibilização e mobilização para atrair a iniciativa

privada foi em vão, restando ao Estado brasileiro levar a cabo tal empreendimento”.

O processo de privatização da empresa também implicou um

movimento de reestruturação organizacional e redução dos processos produtivos

que acabou por atingir os quadros de recursos humanos mais qualificados. Embora

o Departamento Tecnológico de Engenharia (DTE), considerando o núcleo

estratégico da empresa, tenha sido preservado, muitos engenheiros e técnicos de

alta qualificação foram demitidos e com eles o conhecimento armazenado durante

anos foi perdido. Por causa do alto custo e do tempo de reciclagem profissional de

um engenheiro aeronáutico, para que este possa atuar em outros segmentos, o

reemprego imediato não é tão simples, sendo necessário algum tempo de

adaptação para a realocação profissional. Tendo em vista a crise que afetou toda a

economia brasileira nos anos 90 e as baixas atividades destinadas a P&D, muitos

engenheiros tiveram grande dificuldade em conseguir o reemprego, sobretudo nas

ocupações em que estavam habituados a trabalhar. Com efeito, muitos

abandonaram ou mudaram de ocupação, conforme levantamento de campo

realizado, passando a atuar como vendedores, donos de bancas de jornal; alguns

conseguiram a realocação para outros setores da indústria ou dos serviços

produtivos e outros foram recrutados por empresas estrangeiras do ramo

aeronáutico, sediados em outros países. Na ótica dos funcionários que

permaneceram e dos novos funcionários da empresa, por um lado, a privatização foi

favorável, tendo em vista a quebra de determinados feudos, com a formação de

cultura organizacional mais profissional e baseada na competência dos funcionários;

de outro, a adoção de novos programas organizacionais e sistemas de gestão da

força de trabalho tem implicado o engajamento individual dos funcionários,

rompendo com os laços de categoria, tanto dos engenheiros como dos metalúrgicos,

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diminuindo o poder de pressão do sindicato nas negociações trabalhistas. Esta é,

aliás, uma tendência internacional verificada em muitas empresas e setores da

atividade econômica, mas, com a recente recuperação do setor, alguns engenheiros

e técnicos têm retornado à Embraer. É importante mencionar que a empresa tem um

plano de realocação profissional e assistência social aos funcionários demitidos, que

tem sido aplicado com algum êxito (BERNARDES, 2000, p. 370).

Ressalva-se que a estratégia e a excelência na abordagem da tecnologia

sempre foi o ponto forte da Embraer. Com a celebração das parcerias de risco do

Programa ERJ-145, ERJ 170, ERJ 190 e Legacy Executivo/Shuttle, a Embraer

transferiu tecnologia e possivelmente sofrerá concorrência dessas empresas no

futuro, em determinadas áreas em que as parceiras já adquiriram tecnologia. Na

verdade, o grande aprendizado no projeto para a Embraer foi na gestão dos

contratos interempresariais, e não propriamente ganhos relacionados a tecnologias.

Outro grande aprendizado foi na redução de custos dos processos produtivos

subcontratados. Com o processo de desverticalização da produção, a Embraer criou

condições para a redução do preço do produto final, ou seja, a estratégia que

norteou o programa de parcerias tem claramente enfoque de custos e engenharia

financeira. Segundo relata HAF:

“Este tipo de arranjo interempresarial traz consigo muitas vantagens para o atual

quadro de concorrência e transferência tecnológica. O argumento, no entanto, é que se

a Embraer mantiver sua capacidade de dar prosseguimento a uma política de

investimentos em P&D e desenvolvimento tecnológico vigorosa, sedimentada em

estrutura financeira adequada, provavelmente conseguirá manter-se competitiva no

mercado ou celebrar novas parcerias estratégicas dessa natureza. O novo Programa

ERJ-170, ERJ-190 e Legacy Executivo/Shuttle., já esta concebido com um enfoque

diferenciado em relação ao Programa ERJ-145; trata-se de uma nova plataforma. O

novo programa será desenvolvido em uma concepção de parcerias estratégicas mais

integradas e complexas; o projeto das aeronaves, por exemplo, será feito em co-design

com as empresas parceiras. A Embraer tem 45% de participação nos projetos e é

responsável pela integração de todos os sistemas, estrutura e parte técnica final da

montagem. Outro aspecto importante é que os requisitos técnicos de seleção dos

novos parceiros estratégicos foram estabelecidos antes do início do projeto da

aeronave desse programa. As novas alianças estratégicas estão sendo articuladas com

grandes empresas multinacionais visando à agregação de mercados, aquisição de

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conhecimento negocial, infra-estrutura comercial e logística, tecnologias críticas nas

áreas civil e militar, aumento da capacidade instalada e escalas técnicas. Na ótica

tecnológica, acredita-se que o grande salto para a Embraer será a aquisição da

tecnologia supersônica.

A estratégia de identificação e captura de nichos de mercado, apesar de

bem-sucedida, não assegura uma trajetória tranqüila ao horizonte da empresa. As

alianças estratégicas são condições necessárias para a Embraer enfrentar a

concorrência internacional, dominada por estruturas de mercado caracterizada por

haver um número pequeno de compradores com grande capacidade de investimento

e poder de mercado. Todavia, as alianças que porventura venham a ser efetuadas

devem considerar como pontos críticos capacidade de aporte de capital,

transferência e desenvolvimento de novas tecnologias, participação e agregação de

mercado, conhecimento negocial, logística, entre outros. O grande desafio em

relação ao futuro da Embraer será a gestão institucional e a celebração das alianças

com as grandes fabricantes mundiais, com grande capacidade financeira e

tecnológica, sem incorrer no risco de ser absorvida por elas”.

Os programas de cooperação continuam sendo uma das principais

características da indústria aeronáutica, e nesse plano as políticas tecnológicas têm

desempenhado uma função vital para o sucesso dos empreendimentos. Na ótica

dos trabalhadores, os aspectos mais positivos dos programas de cooperação são a

manutenção dos níveis de emprego na indústria e as possibilidades de

enriquecimento das qualificações dos trabalhadores em face da adoção de novas

tecnologias e intercâmbio entre as empresas localizadas em outros países. No

entanto, a participação dos sindicatos locais no processo de negociação tem sido

bastante limitada.

Segundo Bernardes (2000, p. 372) “a ausência de um projeto de longo prazo

para as empresas nacionais privatizadas, somada à ausência de políticas industriais

e tecnológicas para o setor dificultou o restabelecimento competitivo da empresa. A

Embraer, por ser empresa estatal, não dispunha de acesso a fontes tradicionais de

financiamento, como o BNDES. A ausência de linhas de crédito à exportação a partir

de outubro de 1990, quando foram suspensas as linhas de financiamento do Finep,

somente retomadas em 1991, com a criação do Programa de Financiamento à

Exportação (Proex), prejudicou muito a competitividade da empresa. Nesse sentido,

o auxílio do BNDES, por meio do Proex e do Finamex, foi fundamental para a

realização das vendas das aeronaves ERJ-145 no setor externo. Os recursos

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dirigidos pela Finep para o desenvolvimento tecnológico da Embraer também foram

e serão fundamentais”.

O BNDES demonstrou ser um instrumento-chave para a política de

competitividade, atuando como um Exibank. As linhas de financiamento ao

comprador praticadas pelo BNDES (“buyer credit”), equalizando a taxa de juros em

bases internacionais e oferecendo-a a clientes da indústria aeronáutica brasileira,

são um exemplo de eficiência e inteligência na ação governamental. Uma das muitas

lições que podemos aprender de tal processo resume-se no seguinte argumento:

não basta ter o melhor produto, a melhor tecnologia e, em determinados casos, até o

melhor preço, se a empresa não dispõe de mecanismos de financiamento para seus

produtos, especialmente para vendê-los no mercado externo. Mas – é necessário

dizer – somente esses instrumentos de financiamentos também não são suficientes

para assegurar o futuro da empresa e não substituem a necessidade de formação

de visões e aplicação de políticas mais amplos e duradouros para essa indústria

(Ibidem).

Outro aspecto-chave refere-se ao modelo institucional do CTA. Essa

instituição foi se deteriorando cada vez mais com a crise do Estado na década de

oitenta e noventa e, atualmente, carece de uma reestruturação profunda para

responder aos desafios contemporâneos. A precarização das condições de

funcionamento do CTA e do ITA acabou por desestimular o corpo técnico dos

institutos, que têm sofrido perdas irreparáveis com a saída e demissão de vários

técnicos qualificados e professores, muitos com doutoramento no exterior, em

virtude dos baixos salários e das condições precárias de trabalho. Vários

pesquisadores brasileiros têm migrado para países que vêm valorizando e

considerando estratégico o desenvolvimento das atividades aeroespaciais,

notadamente Canadá, Alemanha, Espanha, Portugal, Indonésia e Estados Unidos,

entre outros. O parque tecnológico encontra-se desatualizado e as pesquisas

sofreram cortes com o processo de contenção de gastos governamentais. Esse é,

aliás, um fator preocupante quanto ao futuro do setor aeronáutico nacional, uma vez

que as pesquisas e a formação da mão-de-obra no CTA foram e continuam sendo

fundamentais para a consolidação do setor no Brasil e para a manutenção da sua

competitividade no mercado mundial. Segundo relato HAF:

“a alternativa que a Embraer encontrou foi criar um Programa de

Especialização em Engenharia (PEE) com mestrado em Engenharia Aeronáutica em

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parceria com o ITA para 462 engenheiros. O programa tem duração de 18 meses em

tempo integral, a carga horária do curso é de 2.600 horas, buscando assegurar seu

quadro técnico e sua competitividade no mercado aeronáutico”

É importante sublinhar que atualmente, com o processo de privatização da

Embraer, houve o ingresso de novos controladores no jogo político. O que significa

dizer que a tomada de decisão quanto aos rumos das empresas passa agora,

sobretudo, pelos novos controladores e acionistas da Embraer, e para esses

dirigentes os reais interesses são o resultado econômico e financeiro e não os ideais

almejados pelos antigos dirigentes da Embraer, que eram o desenvolvimento e a

capacitação da tecnologia nacional. Segundo relato MB: “a reestruturação societária da Embraer, irá garantir a sobrevivência da empresa,

investimentos superiores a US$ 2,3 bilhões e a geração de empregos”.

Desde 1995, foram investidos US$ 2,3 bilhões na empresa, dos quais 70% no

desenvolvimento de produtos e 30% em capacitação industrial. Os acionistas

contribuíram com uma parte e o restante foi captado no mercado de capitais.

Os fundos de pensão Previ e Sistel têm limitações previstas na legislação para fazer

investimentos e ambos já esgotaram tal capacidade, segundo relato MB: “Não há no Brasil uma política de apoio à indústria aeronáutica como ocorre no

Canadá com a Canadair Bombardier. No futuro, para manter sua posição

competitiva, a empresa deverá celebrar novas parcerias e alianças que agreguem

valor, tecnologia e mercados dinâmicos”.

Com relação à política governamental, provavelmente os processos de

privatização e de recuperação da empresa teriam sido menos dolorosos, lentos e

arriscados, caso houvesse sido estabelecida uma política de investimentos,

reestruturação e competitividade para a empresa ou mesmo um projeto de longo

prazo que a inserisse na estratégia de desenvolvimento tecnológico nacional.

Conforme relato MB:

“a inexistência de agências ou instituições regulamentadoras e financiadoras permitiu a

perda de concorrências importantes, assim como o desperdício de considerável estoque de

recursos humanos extremamente qualificados. Portanto, uma política de competitividade

mais ampla continua sendo uma grande lacuna para o setor. Apesar disso a Embraer

superou a crise e conseguiu aumentar seus lucros, se reestruturou e criou uma Nova

Embraer para ampliar sua capacidade financiamento e desenvolvimento, absorvendo uma

pequena parte da mão-de-obra que foi demitida antes e após sua privatização, e

contratando novos profissionais”. Devido às constantes reestruturações econômicas

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internas e externas e às crises políticas, mesmo ela tendo o monopólio do setor

aeronáutico regional atual, é impossível prever os rumos da nova Embraer que, a

partir de 2007, deixará de produzir o jato ERJ-145, considerado um dos pilares da

recuperação da empresa.

Outro aspecto do processo de privatização da empresa foram os

impactos que as demissões e as novas contratações tiveram diretamente

sobre a mobilidade espacial no Município devido a razões profissionais, preço

dos imóveis, acesso a infra-estrutura e serviços e segurança e qualidade de

vida. Foram demitidos 9.254 funcionários e contratados 7.134 funcionários

totalizando 16.388 pessoas envolvidas nesse processo diretamente e

indiretamente 65.555 pessoas entre 1990 a 2000. De acordo com o Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José

dos Campos no período antes e logo após a privatização da Embraer, concluir-se

que houve uma mobilidade espacial devido à procura por imóveis de menor preço

(39,11%), razões profissionais (29,66%), acesso a infra-estrutura e serviços (9,55%)

e segurança e qualidade de vida (4,43%).

Considerando o levantamento de campo realizado, quase metade das

famílias dos ex-funcionários da Embraer, (44%) mudaram de bairro devido ao preço

mais baixo do imóvel, (30%) mudaram devido aos problemas profissionais, (10%)

por melhor acesso à infra-estrutura e serviço e 6% por segurança e qualidade de

vida. Com relação aos novos funcionários da Embraer , (39%) residem no Município

de São José dos Campos e (61%) dos que vieram de outras regiões, (42%)

mudaram de bairros por razões profissionais, (21%) por segurança e qualidade de

vida, (20%) em relação ao preço mais baixo do imóvel, (9%) acesso à infra-estrutura

e serviços e (8%) por razões familiares e preço mais baixo do imóvel. Podemos

concluir que no primeiro momento a crise econômica da década de 90 e a

privatização da Embraer geraram desemprego e queda no padrão de vida dos ex-

funcionários. No segundo momento, logo após a privatização, houve um aumento de

empregos e da qualidade de vida dos novos contratados, isso ocasionou

diretamente uma grande mobilidade espacial dentro do Município.

A tese principal de Lefèbvre, aceita por Harvey, é de que a “ revolução

urbana” é fase decisiva do mundo contemporâneo, impondo-se à discussão em

ampla escala mundial. No entanto, a realidade urbana modifica as relações de

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produção sem ser suficiente para transforma-las: “ O urbanismo torna-se força na

produção, do mesmo modo que a ciência. O espaço e a organização política do

espaço expressam as relações sociais, mas também reagem de volta sobre elas”.

(Lefèbvre, apud HARVEY, 1980) Lefèbvre diz, então, que a cidade industrial apenas

prepara o caminho para o urbanismo.

O urbanismo se torna, pois, cada vez menos homogêneo; crescem e se

modificam estruturas, pois a ocupação do espaço se torna cada vez mais

diferenciada (heterogeneidade cultural, segregação). O espaço criado substitui o

espaço efetivo como princípio dominante de organização geográfica. A

industrialização alterou as diferenciações ecológicas, antes plasmadas na simbiose

de atividades sociais com a natureza. A força do mercado mundial e a divisão

internacional do trabalho eliminam estilos de vida regionais e objetos produzidos

deixam de ter uso local. Os recursos urbanos envolvem estruturação e diferenciação

do espaço por meio da distribuição de investimentos fixos de capital, e, quanto mais

estes são importantes para a vida, mais a estruturação do espaço também se torna

vital. Em termos marxistas, “o espaço criado passa a dominar o espaço efetivo como

conseqüência da mudança de composição orgânica do capital” (HARVEY, 1980, p.

267).

Harvey separa-se da tese de Lefèbvre quando este concebe o urbanismo

dominado a sociedade industrial, pois acredita que a estrutura urbana é dotada de

uma dinâmica própria, embora medida pela interação e contradição com outras

estruturas. Além disso, em aspectos vitais, a sociedade industrial continua a dominar

a vida urbana, porque:

- o espaço criado é moldado pelo desenvolvimento do capital fixo; a mudança

da composição orgânica do capital e o volume crescente de investimentos de capital

constante ainda comandam o processo;

- a urbanização oferece oportunidades para o capital industrial dispor dos

produtos que cria e por isso é impulsionada por ele, pois a criação de necessidades

e a manutenção da demanda efetiva são produzidas pelo capitalismo industrial;

- produção, apropriação e circulação da mais-valia não se tornaram

subordinadas à dinâmica interna do urbanismo, este sim é que se adequou às

exigências do capital industrial; os circuitos de circulação da mais-valia e

especulação da propriedade predominam (HARVEY, 1980, pp. 270-271).

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O Município de São José dos Campos conforme já demonstrado no Capítulo

1 apresenta aspectos diferentes em relação a outros centros urbanos do país. Na

década de 90, onde a maior concentração de pessoas ocupadas desse Município

estáva na indústria e não no comércio, principalmente no período que antecede e

logo após a privatização da Embraer. Em 1990 o número de pessoas ocupadas na

indústria era de 62.532 pessoas e no comércio 13.720 pessoas. Logo após a crise e

privatização da empresa. Em 2000 este número caiu para 47.504 na indústria,

crescendo no comércio para 27.440, conforme Tabelas 2 e 7, o que vem

demonstrar o grande impacto da privatização na estrutura de empregos, no

Município de São José dos Campos.

Com relação ao Município de São José dos Campos, caso ocorra outra crise

na Embraer, São José dos Campos ficará à deriva com a constante mudança nos

ciclos econômicos, pois cria-se um hiato de crescimento, tornando impossível

equacionar os problemas gerados com a expansão urbana.

Dos finais da década de 80 até os dias de hoje, novos desafios são postos

pelo contexto da internacinalização da economia. Nos países de capitalismo

avançado, a “desindustrialização”, o desemprego em massa e a alta do preço da

terra provocaram fenômenos de degradação de áreas e a mobilidade espacial

urbana, além do aumento da miséria e dos desabrigados, fenômenos então já bem

conhecidos nos países das chamadas economias em desenvolvimento.

Acredita-se que, através da leitura de um bairro, pode-se identificar e

reconstruir a própria história da cidade, como parte de um todo, pois a cidade

compreende os seus “pedaços” que, conforme Véras (1991, p.146) apresentam-se

da seguinte forma:

"O bairro é um pedaço da cidade, um momento, um setor da forma e a

sua natureza, constituída por parte e a sua imagem: uma unidade morfológica.

Os bairros situam-se na metrópole com alguma autonomia e alguma

dependência do todo e essa dupla realidade é sua característica fundamental,

o jogo dialético da parte e do todo, da unidade na diversidade”.

Esse caso vem ocorrendo no Município de São José dos Campos devido

ao deslocamento populacional ocorrido pela crise e privatização da Embraer na

década de 90, principalmente na Zona Sul, considerada a região mais populosa e

heterogênea, que reúne todos os contrastes de uma cidade grande.

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Enquanto parte dos seus 199.913 habitantes, usufrui de uma boa infra-

estrutura, outra ainda sofre com a falta de infra-estrutura. A área nobre da região Sul

atrai investimentos no setor imobiliário e comercial, onde se encontram os bairros

Jardim Satélite, Bosque dos Eucaliptos e Floradas de São José, que têm seu metro

quadrado cada vez mais valorizado na cidade.

Mas, apesar do considerável crescimento, bairros como o Morumbi, Jardim

Imperial e Dom Pedro estão longe de tornarem se pólos comerciais. E bairro como

Rio Comprido, na divisa com a cidade de Jacareí, não conta nem com saneamento

básico.

Podemos também encontrar loteamentos clandestinos como os bairros

Jardim Juliana e Torrão de Ouro, que cresceram sem um Plano Diretor adequado.

Hoje estes bairros se encontram muito próximos do aterro sanitário da cidade,

gerando reclamações e queixas dos moradores devido ao mau cheiro e proliferação

de insetos e bichos. “A cidade contemporânea é algo enigmático, que ainda está

para ser decifrado do ponto de vista material e subjetivo. A cidade, no mundo

moderno, constitui-se de muitos significados, que produzem e reproduzem a

realidade econômica, a vida social, a cultura, as subjetividades, a comunicação da

era do computador e das relações virtuais, a questão do território e da alteridade”

(VÉRAS, 2000, p. 9).

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256

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ANEXO 1

QUESTIONÁRIOS/ ENTREVISTAS

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1. QUESTIONÁRIOS APLICADO A FUNCIONÁRIOS DA EMBRAER DEMITIDOS ANTES E LOGO APÓS A PRIVATIZAÇÂO

1. Nome completo:

2. Idade:

3. Sexo: ( ) Feminino () Masculino

4. Endereço atual (rua, número, bairro, zona e cidade):

5. Endereço anterior (rua, número, bairro, zona e cidade):

6. Cidade de origem:

7. Estado Civil: ( ) solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) divorciado ( ) viúvo

8. Nome do Cônjuge:

9. Idade: Profissão:

10. Qual sua profissão atual?

11. Em relação à sua profissão atual ela é : Com registro em carteira ( ) Sem registro em carteira ( )

12. E sua profissão quando trabalhava na Embraer?

13. Qual o setor em que você atuava na Embraer?

14. Você foi demitido ou fez acordo para sair do seu emprego na Embraer?

15. Quanto tempo você demorou para retornar ao mercado de trabalho?

16. Atualmente você atua no mesmo setor em que trabalhava na época da sua demissão?

( ) Sim ( ) Não

17. Qual o setor de atuação no momento:

( ) primário ( ) secundário ( ) terciário

(agricultura) (indústria) (comércio/ serviços)

18. Qual é a sua atividade?

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260

19. Sua renda mensal atual é: ( ) maior ( ) igual ou ( ) menor

20. Você tem filhos? ( ) Sim ( ) Não Quantos?

21. Qual a idade de cada filho?

22. Seus filhos estudam? ( ) Sim ( ) Não

23. Eles freqüentam ou freqüentaram escola: ( ) pública ( ) particular ( ) ambas

24. Qual é o grau de instrução de seus filhos (coloque a quantidade de filhos em cada grau de instrução): ( ) 1º grau completo ( ) 1º grau incompleto ( ) 2º grau completo

( ) 2º grau incompleto ( ) 3º grau completo ( ) 3º grau incompleto

Pós-Graduação: ( ) cursando ( ) completo

25. Qual o estado civil de cada filho (coloque a quantidade de filho em cada situação):

( )solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) outros

26. Quantos moram com você?

27. Algum dos filhos trabalha? ( ) Sim ( ) Não Quantos

28. Se trabalha, atua em qual mercado? ( ) formal ( ) informal

29. O que faz cada um?

30. Quantas pessoas residem em seu endereço atual?

31. Quantas ajudam nas despesas da casa?

32. Sua imóvel atual é: ( ) própria ( ) alugada ( ) cedida ( ) financiada

33. A imóvel que você reside hoje é a mesma imóvel de quando estava trabalhando na Embraer?

( ) Sim ( ) Não

34. Qual o motivo principal de sua mudança de bairro?

( ) profissional ( ) familiar ( ) acesso à infra-estrutura ( ) custo mais baixo do imóvel (

) segurança e qualidade de vida ( ) não informa

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261

35. Você pensou em mudar de cidade após a demissão? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não sabe

36. Caso sim, qual o motivo que o levou a não mudar de cidade logo após a sua demissão?

37. Se mudou, qual o motivo de mudar de cidade?

38. E que motivo o fez a retornar à cidade?

39. Sua qualidade de vida mudou depois de sua demissão? ( ) Sim ( ) Não

40. Por que?

41. Você gostaria de voltar a trabalhar na Embraer novamente? ( ) Sim ( ) Não

42. Por que?

43. Hoje, pela sua condição de vida na cidade de São José dos Campos, você ficaria ou se mudaria para outra cidade? ( ) Sim ( ) Não

44. Por que?

45. Para onde?

46. O que ainda te motiva a continuar na cidade de São José dos Campos?

47. Você pretende continuar morando no mesmo bairro? ( ) Sim ( ) Não

48. Por que?

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2 . QUESTIONÁRIO APLICADO A FUNCIONÁRIOS QUE FORAM ADMITIDOS LOGO APÓS A PRIVATIZAÇÃO

1. Idade

2. Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino

3. Cidade de origem

4. Estado Civil: ( ) solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) divorciado ( ) viúvo

5.Onde mora atualmente? (rua, número, bairro, zona e cidade):

6. Você tem filhos? ( ) Sim ( ) Não Quantos?

7. Qual a idade de cada filho

8. Seus filhos estudam? ( ) Sim ( ) Não

9. Eles freqüentam ou freqüentaram escola: ( ) pública ( ) particular ( ) ambas

10. Qual é o grau de instrução de seus filhos (coloque a quantidade de filhos em

cada grau de instrução): ( ) 1º grau completo ( ) 1º grau incompleto ( ) 2º grau

incompleto ( ) 2º grau completo ( ) 3º grau incompleto ( ) 3º grau completo

Pós-Graduação: ( ) cursando ( ) completo

11. Qual o estado civil de cada filho (coloque a quantidade de filho em cada

situação): ( )solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) outros

12. Quantos moram com você?

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263

13. Algum dos filhos trabalha? ( ) Sim ( ) Não Quantos?

14. Se trabalha, atua em qual mercado? Com registro em carteira ( ) Sem registro em carteira ( )

15. Você mudou de endereço após a sua contratação na Embraer? ( ) Sim ( ) Não

16. Se sim, qual era (rua, número, bairro, zona e cidade) do antigo endereço?

17. Qual o motivo principal de sua mudança de bairro?

( ) profissional ( ) familiar ( ) acesso à infra-estrutura ( ) custo mais baixo do imóvel (

) segurança e qualidade de vida ( ) não informa

18. Quantas pessoas residem em seu endereço atual?

19. Quantas ajudam nas despesas da casa?

20. Sua imóvel atual é: ( ) própria ( ) alugada ( ) cedida ( ) financiada

21. Em que ano você foi contratado pela Embraer?

22. Qual sua profissão atual na Embraer?

23. Qual o setor em que você atua na Embraer?

24. Se você foi contratado antes de 1994, quais as mudanças que ocorreram na

empresa após a privatização?

25. Se não, como você se sente trabalhando na Embraer após a privatização?

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26. Sua renda mensal aumentou após ter sido contratado pela Embraer? ( ) Sim ( )

Não

27. Houve melhorias em sua qualidade de vida após a contratação? ( ) Sim ( ) Não

28. Qual a sua expectativa profissional dentro da Embraer?

29. A Embraer oferece incentivos de aperfeiçoamento profissional, como cursos,

treinamentos e outros, para sua especialização? ( ) Sim ( )Não

30. Você está satisfeito com a empresa? ( ) Sim ( ) Não

31. Por que?

32. Mesmo satisfeito você gostaria de mudar de emprego? ( ) Sim ( ) Não, Por

que?

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265

3 . ENTREVISTA ABERTA REALIZADA COM FUNCIONÁRIOS DEMITIDOS, NOVOS CONTRATADOS E OS QUE PERMANECERAM NA EMBRAER

1. Nome:

2. Idade:

3. Estado Civil: ( ) solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) divorciado ( )

viúvo

4. Profissão:

5. Em que ano você foi contratado pela Embraer?

6. Qual o setor em que você atua na Embraer?

7. RELATO:

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ANEXO 2

FOTOS DAS AERONAVES

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267

Os principais produtos da EMBRAER são: 1. AVIÕES COMERCIAIS:

• EMB110- Bandeirantes: Primeiro avião produzido pela Embraer. Avião

turbélice de passageiros para 19 lugares com aproximadamente 500 unidades

vendidas.

Fonte: Embraer (2005).

• EMB121 – Xingu: Avião turboélice executivo de passageiros com

aproximadamente 100 unidades vendidas.

Fonte: Embraer (2005).

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268

• EMB120 – Brasília: Avião turboélice de 30 lugares com mais de 400

unidades vendidas. Seu principal mercado são os Estados Unidos. Líder de

vendas na categoria por muitos anos, é utilizado por 26 empresas em 14

países, tendo atingido mais de 3 milhões de horas de vôo.

Fonte: Embraer (2005).

• ERJ145: Avião a jato de 50 lugares. Destinado ao mercado regional, possui

119 unidades com vendas confirmadas. Produto recente da empresa, objetiva

alcançar custos de aquisição e operação semelhantes ao dos turboélice.

Fonte: Embraer (2005).

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269

• ERJ 135: jato regional para 37 passageiros.

Fonte: Embraer (2005).

• ERJ 140: novo jato regional para 44 passageiros, seguindo o conceito de

“famílias de jatos” iniciado com o ERJ-145, oferecendo alto grau de

comunalidade como benefícios operacionais e de manutenção, incluindo a

mesma certificação para os pilotos. O desenvolvimento desta aeronave

exigirá investimentos da ordem de US$ 45 milhões.

Fonte: Embraer (2005).

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270

• ERJ190-100/200: Avião a jato. Versão alongada de ERJ-170, pela adição de

secções de fuselagem, motores mais potentes, asas de maior envergadura e

trem de pouso reforçado. Os investimentos previstos para os dois novos

projetos são da ordem de US$ 750 milhões. Está sendo projetado em duas

versões, de 98 (ERJ-192-100) e 108 (ERJ-200) assentos.

Fonte: Embraer (2005).

• ERJ170: Avião a jato de 70 lugares. Nova plataforma que servirá de base

para o ERJ-190.

Fonte: Embraer (2005).

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271

• Aviões Leves fabricados pela Neiva: EMB201 Ipanema, EMB400 Urupema, EMB710 Minuano, EMB721 Sertanejo, EMB810 Seneca.

Fonte: Embraer (2005).

2. AVIÕES MILITARES:

• Tucano: Avião de treinamento militar e líder de mercado, destaca-se pela sua

facilidade de pilotagem, baixo custo de manutenção e grande capacidade de

execução de manobras. Foram vendidas mais de 640 unidades em diversas

versões: Versão Básica; Versão Tucano França; Super Tucano

Fonte: Embraer (2005).

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272

• ALX – Super Tucano: Avião militar turboélice de nova geração, desenvolvido

a partir da experiência adquirida com o Tucano, em duas versões –

Operacional e de Treinamento. Esta aeronave possui um cockpit semelhante

ao de uma caça, com avançada aviônica fornecida pela Elbit, de Israel

Fonte: Embraer (2005).

• AMX: Avião tático militar foi concebido e sendo fabricado por um consórcio

Aeritália, Aermacchi e Embraer. Foram fabricadas 35 unidades.

Fonte: Embraer (2005).

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273

• SIVAM – (Sistema Integrado de Vigilância da Amazônia): desenvolvimento do ERJ-145 RS, versão de sensoriamento remoto baseado no jato regional ERJ-145SA AEW%C, aeronave de alerta aéreo antecipado. O programa de Cooperação Internacional para o Governo Brasileiro com a participação da Embraer visa à proteção e ao desenvolvimento sustentável da Região Amazônica, pretende garantir o controle ambiental, monitoramento da ocupação territorial, a vigilância da região e o controle do tráfego aéreo. Esta aeronave está equipada com um grande radar Ericsson Erieye e sistema de comando e controle.

ERJ 145 AEW&C

Fonte: Embraer (2005).

ERJ 145 RS

Fonte: Embraer (2005).

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274

ANEXO 3

FOTO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP.

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275

CIDADE DE SÂO JOSÉ DOS CAMPOS

Fonte: http://www.sjc.sp.gov.br.

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276

ANEXO 4

BAIRROS E FAVELAS DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP.

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277

TABELA – A População por bairros S.J.Campos -SP Região Pessoas residentes Bairros/Loteamentos

123 Vila São Paulo, Vila Abel 2.633 Jardim Bela Vista, Vila Mascarenhas

Ferraz, Vila Santa Helena, Vila Viaduto 7.700 Vila Santos, Vila Maria, Vila Nova São

José, Vila Tupi, Vila Guarani, Vila Terezinha, Vila Nova Guarani; Favela Vl. Guarani

6.322 Centro, Vila Paganini; Vila Santa Cruz II 1.009 Jardim Matarazzo, Vila Santa Luzia 1.124 Jardim Santos Dumont, Jardim Vale

Paraíso (parte) 718 Vila Santa Cruz I 0 Banhado

610 Vila Abel 719 Vila Nova Esperança 777 Conj. Res. Monte Castelo, Vila Lúcia

7.297 Monte Castelo, Jardim Frei Leopoldo, Vila Progresso; Vila Santa Cruz III

3.733 Vila Guarani; Vila Kennedy; Jardim Jussara; Residencial Martins Pereira; Jardim Corinthians

1.902 Vila São Pedro 2.088 Jardim São José - centro 1.562 Jardim Augusta 556 Jardim Oswaldo Cruz

3.763 Jardim Vale Paraíso (parte), Vila Piratininga, Jardim Topázio, Jardim Bandeirantes, Vila Cardoso, Vila Ipiranga

1.324 Jardim Paulista 1.956 Vila Nove de Julho, Vila Igualdade, Vila

Higienópolis, Vila Paulo Setubal 1.810 Vila Ady’Ana 3.532 Jardim São Dimas, Jardim Aparecida 761 Vila Sanches, Vila Rubi, Jardim Azevedo

1.795 Vila Betânia, Vila Zelfa 2.910 Jardim Maringá, Jardim Nossa Sª

Fátima, Jardim Margareth, Jardim Renata, Jardim Santa Madalena, Vila Luzia, Vila Guaianazes

4.075 Vila Icaraí, Vila Jaci

Centro

1.823 Chácara dos Eucaliptos, Serimbura - Bairro, Bairro dos Pinheiros, Residencial Esplanada do Sol

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4.772 Jardim Esplanada, Jardim Esplanada II, Jardim Nova América, Jardim Nova Europa, Jardim Nova Anchieta, Vila Santa Rita, Conj. Hab. Vale dos Pinheiros

641 Jardim Apolo 2.361 Vila Ema 467 Jardim Apolo II 350 Residencial Vista Linda

5.111 Vila Industrial 8.938 Jardim Ismênia, Jardim Maracanã,

Jardim Olímpia; Rua Caparaó 8.514 Jardim Copacabana, Jardim Brasília,

Jardim Universo, Vila São Jorge, Vila Ester, Vila Tesouro, Chácara dos Eucaliptos

2.951 Jardim Valparaíba 4.252 Vila Tatetuba 1.515 Conj. Res. Parque das Américas 1.435 Conj. Hab. Intervale 972 Conj. Hab. Vila Tatetuba 719 Conj. Res. Planalto

2.460 Conj. Integração 905 Vila Nova Tatetuba 489 Martins Guimarães - Bairro, Fazenda

Pilão Arcado; Sol Nascente - Chácaras; Favela Renascer I; Favela Renascer II

2.147 Conj. Res. Jardim das Flores, Fazenda Taira (parte), Fazenda Honda (parte), Fazenda Takanashi (parte)

2.382 Eugênio de Melo, Jardim Ipê, Fazenda Nossa Sra. da Conceição (parte), Fazenda Vila Franca (parte), Fazenda Toninho Ferreira (parte)

1.214 Jardim Itapuã 10.659 Residencial Galo Branco

172 Fazenda Taira (parte), Fazenda Honda (parte), Fazenda Takanashi (parte), Fazenda Nossa Sra. da Conceição (parte), Fazenda Vila Franca (parte), Fazenda Toninho Ferreira (parte)

3.054 Jardim São Vicente 3.016 Jardim Nova Detroit

Leste

3.964 Jardim Pararangaba

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3.413 Jardim Santa Inês II 3.169 Jardim Americano, Jardim Rodolfo,

Jardim Três José, Jardim Nova Florida; Águas da Prata - Chácaras

5.459 Campos de São José 715 Cajurú - Bairrom (parte), Jardim Mariana,

Jardim do Allah 1.327 Pousada do Vale - Chácara 661 Nova Detroit

1.135 Jardim Diamante 3.223 Jardim Motorama 9.403 Cidade Vista Verde, Condomínio

Floresta 779 Conj. Res. JK, Pq. Res. Villaggio

D'Antonini 5.577 Jardim Santa Inês I; S/ denominação,

Estrada do Capão Grosso (SJC 449), 1.921 Jardim São José - Leste, Jardim Santa

Inês III, Jardim São José - Oliveira Germano; S/ denominação, quadra do Jardim Coqueiro; Coqueiros - Condomínio dos

7.255 Jardim Castanheiras, Jardim Paraíso do Sol, Jardim Nova Michigan; Chácara Araújo

366 Cajurú - Bairro (parte), Residencial Dom Bosco; Chácaras Santa Helena

547 Mato Dentro - Bairro (parte); S/ denominação, Av. Tancredo Neves, lado do Jd. Cerejeiras; S/ denominação, Estr. do Mato Dentro, lado do Jd. Cerejeiras

12.130 Parque Novo Horizonte, Jardim Cerejeiras

1.926 Parque Nova Esperança 1.727 Capão Grosso - Bairro; S/ denominação,

Estrada do Capão Grosso (SJC 449); S/ denominação, Estrada da Piedade (SJC 250) n. 3.500; Morada do Fenix - Chácara; Bica d' Água - Chácaras; Castanheira II - Chácaras; Santa Maria - Chácaras; Capão Grosso I

3.533 Bom Retiro - Bairro (parte); Jardim Ebenezer - Condomínio; Benedito David; Portal do Céu - Chácara; Primavera II - Chácaras; Santa Lucia - Chácara;

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Cambucá/Sitio Bom Retiro; Capão Grosso II; Sítio Bom Retiro; Majestic - Chácara; Santa Rita - Condomínio

5.076 Mato Dentro - Bairro, Bairrinho - Bairro, Nossa Sra do Bom Retiro - Bairro, Bom Retiro - Bairro (parte); Sítio Encantado / Mato Dentro; Vila Matilde; Santa Hermínia; Boa Esperança - Chácara; Primavera I - Chácaras; Fazenda Bom Retiro

1.220 Ressaca - Bairro; Santa Cecília I; Santa Cecília II (São José); S/ denominação, Estr. do Cajurú (SJC 120)

400 Serrote - Bairro; Recanto do Vale 1.177 Buquirinha - Bairro (parte); Condomínio

Walter Ferling 4.004 Vila Paiva, Jd. Boa Vista; Rua José

Bonifácio de Arantes, desmembramento Urbavale; S/ denominação, SP 50, em frente a Vila Paiva

1.455 Jardim Santa Matilde, Vila Cândida 2.287 Vila São Geraldo, Recanto Caetê 3.590 Jardim Maritéia, Vila Leonídia, Vila

Nossa Sª das Graças, Vila Veneziani, Alto da Ponte - Bairro; São Sebastião

4.611 Vila Santarém, Vila Sinhá, Jardim Guimarães, Vila Leila, Vila Monte Alegre; Vila Leila II; Favela Vl. Sinhá

1.122 Vila Unidos; Jd. Guimarães (remanescente); Chácaras das Oliveiras, Estr. do Bonsucesso

1.251 Vila Dirce 15.006 Jardim Altos de Santana, Jardim

Telespark 934 Vila Machado; Favela Vl. Machado

4.202 Vila Alexandrina (parte), Vila do Carmo, Vila Dona, Vila Esmeralda, Vila Simone; Vila do Pena

1.728 Santana - Bairro, Jardim Anchieta, Jardim Nova Paulicéia

Norte

3.782 Vila Cristina, Conj. Res. Nova Cristina, Jardim Jaci, Vila Rangel, Vila Chiquinha, Jardim Ouro Preto

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793 Vila Pasto Alto 1.968 Vila Alexandrina (parte), Vila César 2.881 Vila Rossi, Vila Zizinha 653 Travessa Miguel Eras; Miguel Eras II 523 Vila Rhodia

1.037 São Francisco Xavier; Bairro dos Ferreiras; Rio do Peixe-Estrada p/ Joanópolis

127 Costinha - Bairro; Costinha - Chácaras do

1.366 Freitas - Bairro (parte); Recreio Boa Vista; José B. de Oliveira - Zeca Pinto; Vilage Alpino; S/ denominação, Estrada dos Freitas (SJC 335), Quarta Travessa; Bairro dos Freitas - Joaquim O. Silva

879 Buquirinha - Bairro (parte); Mirantes do Buquirinha

1.343 Freitas - Bairro (parte); Fazendão; Santa Luzia / Bairro dos Freitas; Cachoeirinha - Chácaras

275 Caete - Bairro, Vila Raquel, Jaguari - Bairro (parte); Altos do Caetê; Miranda - Chácaras; S/ denominação, Estr. Córrego Novo Destino (SJC 446)

1.340 Vargem Grande - Bairro (parte), Florindo - Bairro; Pedra D'água - Chácaras; Buquirinha I; Buquirinha II; Florindo - Chácara; Recanto do Buquirinha; Cachoeirinha - Chácaras

2.481 Vargem Grande - Bairro (parte), Fazenda Pingo D'Água, Fazenda Santa Rita; Águas do Canindú; Hawaí - Chácaras; Estr. do Sertãozinho, próximo a Pedra d’Agua 2 (SJC 149); S/ denominação, SP 050, ao lado da Vila Cândida

597 Vargem Grande - Bairro (parte), Fazenda Jataí; S/ denominação, Estrada Vargem Grande (SJC 020)

92 Jaguariuna - Bairro (parte) 11.798 Jardim das Indústrias; Favela Jd. das

Indústrias 1.971 Jardim Alvorada

Oeste

2.700 Jardim Por do Sol, Limoeiro - Bairro; S/ denominação, Rua da Palha (parte)

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102 Limoeiro - Bairro (abaixo curva de nível 555); S/ denominação, Rua da Palha (parte)

2.413 Jardim Colinas 1.478 Jardim Aquarius, Bosque Imperial

47 Residencial Sunset Park 1.957 Parque Residencial Aquarius, Jardim

Altos do Esplanada, Jardim Cassiano Ricardo

2.715 Urbanova, Jaguariuna - Bairro (parte); Beira Rio

3.147 Vila São Benedito, Jardim Souto, Residencial Cambuí

8.675 Jardim da Granja, Parque Santa Rita, Chácaras São José

2.442 Jardim Uirá 2.877 Jardim Colorado, Parque Martim Cererê,

Residencial Flamboyant; Sítio Bom Jesus; Sitio Bom Jesus, ao lado do Jd. Uirá

834 Residencial São Francisco; Condomínio Augusto Magalhães

4.001 C.T.A. 544 Jardim Santa Luzia; Recanto dos

Eucaliptos - Chácara 561 Pernambucana de Cima - Bairro (parte),

Parque Santos Dumont 1.909 Jardim do Lago, Bairro do Putim 1.466 Jardim São Leopoldo 3.867 Jardim Santa Fé, Jardim Santo Onofre,

Vila Iracema, Vila Rica 3.976 Jardim São Judas Tadeu 1.222 Conj. Hab. Polícia Militar 1.146 Residencial Jatobá, Residencial Juritis 878 Conj. Res. Nosso Teto; Condomínio

Campo Floresta

Sudeste

1.216 Pernambucana de Cima - Bairro (parte), Parque Santos Dumont; Recanto dos Nobres - Chácara

Sul 7.141 Granja Itambi, Parque Interlagos, Pernambucana de Baixo - Bairro, Veraneio Torrão de Ouro; Jardim Mesquita; Condomínio Terrinha; Torrão de Ouro - Chácara; R. Pinheirinho; Continuação da R. Pinheirinho); Caramujo

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16.425 Campo dos Alemães, Parque dos Ipês 7.333 Conj. Hab. Dom Pedro II 8.225 Conj. Hab. Dom Pedro I 4.135 Conj. Hab. Elmano F. Veloso 8.514 Jardim Colonial, Jardim Imperial 1.366 Capitingal - Bairro, Jardim República,

Jardim Nova República, Vila das Flôres 2.016 Jardim Cruzeiro do Sul

26.952 Bosque dos Eucaliptos 418 Quinta das Flores

1.231 Jardim Estoril, Jardim Madureira 2.442 Jardim Del Rey, Jardim Portugal 2.075 Residencial Primavera - Cj. Res. 602 Salinas

22.973 Jardim Satélite, Residencial Jardins; Rua Aleixo da Silva

635 Floradas de São José 2.117 Conj. Res. Cidade Jardim 833 Jardim Anhembi

3.067 Jardim América 2.283 Jardim Paraíso 1.392 Jardim Oriental 1.675 Jardim do Céu, Jardim Rosário 3.473 Jardim Oriente, Conj. Res. Sol Nascente 2.335 Jardim Terras do Sul, Jardim Sul,

Bosque dos Ipês, Residencial Gazzo 22.441 Cidade Morumbi, Conj. Res. Morumbi 5.268 Parque Residencial União, Jardim

Juliana 22.004 Parque Industrial, Conj. Res. Morada do

Sol, Conj. Res. Recanto Eucaliptos, Conj. Res. 31 de Março, Jardim das Azaléias, Jardim Petrópolis, Jardim Veneza, Parque Independência, Conj. Res. Recanto Pinheiros

3.167 Palmeiras de São José 3.952 Jardim Vale do Sol 2.787 Chácaras Reunidas 2.047 Rio Comprido 728 Praça Basiléia

4.511 Vila Nova Conceição, Jardim Aeroporto, Vila das Acácias, Vila Letônia, Vila Nair

3.035 Vila São Bento, Vila Luchetti; Jesus de Nazaré

316 Projeto Torrão de Ouro Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano – (2003).

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TABELA B – Quadro de 2000 e 2004Localização das Favelas de São José dos Campos – SP

Fonte: Secretária Municipal de Habitação e Obras (2000/2004).

Nº de Moradias Nº de Moradores º Favelas Região Endereço 2000 2004 2000 2004

1. Vila Santa Cruz I Centro I Av. Teotônio Vilela 254 279 1080 1188 2. Vila Santa Cruz II Centro I Av. Teotônio Vilela 78 85 322 354 3. Vila Santa Cruz III Centro I Av. Teotônio Vilela 84 92 341 375 4. Jd. Nova Esperança Centro I Av. São José (Banhado) 283 311 1302 1432 5. Jd. Das Indústrias Centro I Av. Corifeu de Azevedo Marques 56 61 235 258 6. Vila Abel Centro I Travessa Ozamã 29 31 128 140 7. Vila Guarani Centro II Ao lado da Vila Guarani 26 28 140 154 8. Caramujo Centro II Prox. Rod. Tamoios 11 12 68 74 9. Chácaras Reunidas Sul Rua Miracema 127 139 702 772 10. Recanto Verde Sul Av. Salinas 69 76 281 309 11. Rio Comprido Sul Avenida I 371 408 1661 1827 12. Antônio Aleixo Sul R. Antonio Aleixo da Silva 24 26 104 114 13. Praça Natal Sul Praça Natal 17 19 61 67 14. Vila Rhodia Norte Av. Pedro Rachid-Santana 117 129 541 595 15. Vila Sinhá Norte Av. Conde Francisco Matarazzo 48 53 220 242 16. Vila São Geraldo Norte Estrada Vargem Grande 50 55 250 275 17. Vila Machado Norte Av. Rui Barbosa (ao lado da ponte 17 19 75 82 18. Vila do Pena Norte Final da Av. Rui Barbosa 59 65 277 305 19. Jd. Nova Detroit Leste R. 15 Av. Marginal 123 135 503 553 20. Vila Nova Tatetuba Leste Av. Juscelino Kubsticheck 170 187 686 754 21. Jd. Olímpia Leste Rua Caparão 24 26 87 96 22. Vila Nova Renascer Leste Estr. Martins Guimarães 40 44 166 183

TOTAL 2077 2284 9230 10153