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ARTIGO MÃO-DE-OBRA DO BRASIL PARA O JAPÃO: A ASPECTOS ECONOMICOS E IMPACTOS NAS EMPRESAS DO FENÔMENO DEKASSEGUI * Heitor Takashi Kato Doutorando em Administração Mercadológica na EAESP/FGV. Silvio Voshiro Mizuguchi Miyazaki Professor do Departamento de Economia da PUC/SP e Mestre em Economia e Finanças Públicas pela EAESP/ FGV. Alberto Issao Sugo Professor e Doutorando do Departamento de Administração Geral e Recursos Humanos da EAESP/ FGV. . ~+:- RESUMO: A crise econômica no Brasil e principalmente o desalento quanto às perspectivas de melhoras têm levado muitos brasileiros a procurar trabalhos desqualificados no exterior. Um movimento de transferência de trabalhadares brasileiros é aquele para o Japão, que vem ocorrendo desde 1985. Estes trabalhadores, japoneses e descendentes, seriam mais de 100.000. Neste artigo, procura-se verificar as cau- sas e as conseqüências mais imediatas e perceptíveis deste processo, com ênfase nos impactos no mercado de trabalho e nas empresas. 20 Revista de Administração de Empresas ~+:- PALAVRAS-CHAVE: mão-de-obra, mercado de trabalho, empresas, Japão, migração, Brasil. ,lé ABSTRACT: Nowadays, Brazilian are looking for unskilled jobs in developed couniries. These workers are pressured by theirs deteriorated economic conditions and perspectioee. [apan has received since 1985 over 100,000 Brazilian- japanese and theirs reZatives. The aim of ihis papa was to describe and to analyse the immediate implications of this workers migration, mainLy in ihe labor market and in companies. The findings of this article was supported by two surveys realized in May-June 1991, in Brazil. ->!:- KEY WORDS: labor market, companies, [apan, migraiion, Brazil. * Agradecemos a Toyota Foundation pelo financiamento da Pes- quisa Trabalhadores Estrangeiros (nikkeis) no Japão da qual os autores participaram. Os dados primários que subeianciaram este artigo foram coleiados durante esta pesquisa. Agradecemos a Bene- ficência Nipo-Brasileira (enkyo), Câmara de Comércio e Indústria Japonesa no Brasil e as empresas e as pessoas que responderam os questionários. Colaboraram como assistentes de pesquisa: Elisa M. Sasaki, Erika Ouia, Junko Nakahara e George H. Hiraia e Gisela K. Ohashi aos quais os autores são gratos. São Paulo, 32(4): 20-31 Set./Out. 1992

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ARTIGO

MÃO-DE-OBRA DO BRASIL PARA O JAPÃO:A

ASPECTOS ECONOMICOS E IMPACTOS NASEMPRESAS DO FENÔMENO DEKASSEGUI *• Heitor Takashi Kato

Doutorando em Administração Mercadológica naEAESP/FGV.

• Silvio Voshiro Mizuguchi MiyazakiProfessor do Departamento de Economia da PUC/SP eMestre em Economia e Finanças Públicas pela EAESP/FGV.

• Alberto Issao SugoProfessor e Doutorando do Departamento deAdministração Geral e Recursos Humanos da EAESP/FGV. .

~+:- RESUMO: A crise econômica no Brasil e principalmente odesalento quanto às perspectivas de melhoras têm levadomuitos brasileiros a procurar trabalhos desqualificados noexterior. Um movimento de transferência de trabalhadaresbrasileiros é aquele para o Japão, que vem ocorrendo desde1985. Estes trabalhadores, japoneses e descendentes, seriammais de 100.000. Neste artigo, procura-se verificar as cau-sas e as conseqüências mais imediatas e perceptíveis desteprocesso, com ênfase nos impactos no mercado de trabalho enas empresas.

20 Revista de Administração de Empresas

~+:- PALAVRAS-CHAVE: mão-de-obra, mercado de trabalho,empresas, Japão, migração, Brasil.

,lé ABSTRACT: Nowadays, Brazilian are looking for unskilledjobs in developed couniries. These workers are pressured bytheirs deteriorated economic conditions and perspectioee.[apan has received since 1985 over 100,000 Brazilian-japanese and theirs reZatives. The aim of ihis papa was todescribe and to analyse the immediate implications of thisworkers migration, mainLy in ihe labor market and incompanies.

The findings of this article was supported by two surveysrealized in May-June 1991, in Brazil.

->!:- KEY WORDS: labor market, companies, [apan, migraiion,Brazil.

* Agradecemos a Toyota Foundation pelo financiamento da Pes-quisa Trabalhadores Estrangeiros (nikkeis) no Japão da qual osautores participaram. Os dados primários que subeianciaram esteartigo foram coleiados durante esta pesquisa. Agradecemos a Bene-ficência Nipo-Brasileira (enkyo), Câmara de Comércio e IndústriaJaponesa no Brasil e as empresas e as pessoas que responderam osquestionários. Colaboraram como assistentes de pesquisa: Elisa M.Sasaki, Erika Ouia, Junko Nakahara e George H. Hiraia e Gisela K.Ohashi aos quais os autores são gratos.

São Paulo, 32(4): 20-31 Set./Out. 1992

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MÃO·Df·OBRA DO BRASIL PARA O JAPÃO...

INTRODUÇÃO

As crescentes reduções salariais noBrasil, o desemprego e a falta de perspec-tivas paralelamente às melhores condiçõesde vida nos países industrializados fazemcomque a emigração venha a crescer.Parteda população economicamente ativa doBrasilestá se transferindo para essespaíses.Urna parcela da população brasileira, for-mada pelos japoneses e seus descencentes(nikkeis), está se dirigindo ao Japão paraempregar-se. Esse fenômeno vem ocor-rendo desde 1985.

O termo migração designa qualquerdeslocamento, suficientemente importante,de um grande número de pessoas. O termose aplica tanto ao movimento diário detrabalhadores dentro de uma grandeaglomeração quanto à partida definitivade um continente para outro. 1

O caso da saída de mão-de-obra brasi-leira para trabalhar no Japão (odekassegui)2não parece se encaixar em nenhum dosextremos. É um caso de migração volun-tária, não forçada.

Segundo Sauvy, para esclarecer as cau-sas das migrações, é preciso distinguir doispontos:

a) qual é a pessoa ou organismo, socialou político, que decide o movimento?

b) quais motivos levam esta pessoa ouorganização à tal decisão?

No caso do dekassegui, não parece terhavido nenhum organismo, social ou po-lítico, que tenha iniciado o movimento.Entretanto, quando o volume de pessoasque afluíam ao Japão se tornou maior,empresas intermediárias e empresasreceptoras de mão-de-obra começaram aparticipar do processo de migração dos

descendentes de japoneses. Pode-se dizerque se configurou, então, o que Sauvyclassificoucomo o estabelecimento de umacorrente regular: um início com saída in-dividual se transformando e se desenvol-vendo para uma saída organizada de in-divíduos.

•••••••••••••••••••••••Ser um dekassegui era mal vistodentro da comunidade japonesa noBrasil, tal como ocorria no Japão

quando este termo foi cunhado. Destaforma, os primeiros que seguiramrumo ao Japão iam escondidos, nãocomentando a viagem aos amigos e

nem mesmo aos parentes.

•••••••••••••••••••••••Quanto ao segundo aspecto, o que po-

deria ter motivado estes indivíduos a searriscarem nesta empreitada? As razõesbásicas que deram curso a este movimentoforam detectadas numa pesquisa que seráanalisada ao longo deste artigo.

Mas, além da análise do migrante, comoas instituições encarariam a questão? Qualseria o ponto de vista daqueles que ante-riormente contavam com esta força de tra-balho? Como as empresas veriam estemovimento que de maneira significativadrenou parcela da mão-de-obra brasileirade ascendência japonesa?

HISTÓRICO

A palavra dekassegui está sendo empre-gada para designar os trabalhadores bra-sileiros de origem japonesa e também ja-poneses radicados no Brasil, que estão

Entradas registradas 9.250 13.889 13.434

~<aíd,as{egtstrad~s:·~·:~~:J·981.~J~~43?f~;·13., ..Registro de permanênciatemporária 1.986 1.955 2.135

12.126 16.789 29.241 57.423J4;325~·16;931·:34J 05

.:, :1:;. i,.,-:' ~i~:;;;- '"",'" "': ·E

2.250 4.159 14.528 17.313

Fonte: Ministério de Assuntos Estrangeiros do Japão, 1991.

* Não registra o ingresso de pessoas com nacionalidade japonesa e clandestinos.* Até junho.

© 1992, Revistade Administraçãode Empresas/ EAESP/ FGV, São Paulo,Brasil.

1. SAUVY, Alfred. Théorie Genéralede la Populauon. 3ª ed. Paris, PressesUniversitaires de France, 1963, p.249.

2. A palavra japonesa dekassegui,utilizada para qualificar estas pesosoas, significa emigrante ou trabalhofora da residência. Era empregadano Japão para os trabalhadores doNorte e Nordeste, que iam à procurade trabalho nas regiões desenvolvi·das do Japão: Táquia e Osaka.

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l1~aARTIGO

3.KATO, HeitorT.;MIYAZAKI, SílvioY.M.; SUGO, Alberto I. "Dekassegui-migração de brasileiros ao Japão".Japão Informativo Econômico. RiodeJaneiro. Centro de Estudos Japone-ses da Escola de Pós-Graduaçãoem Economia (EPGE) da FGV.3(9):2-3, Outubro de 1991_

4. Nos últimos anos (1986-1989) onúmero de estrangeiros que ingres-saram no Japão com vistos de turistase que estavam se empregando ile-galmente estava aumentando rapi-damente, causando um problemasocial e econômico. Em dezembrode 1987 o Ministério do Trabalhocriou o Study Group Regarding lheForeign Worker Issue, que num re-latório de março de 1988, fez umplano de medidas para reforçar suapolítica para aceitação de estran-geiros com habilidades profissionaise técnicas e que não substituíssemos japoneses. Entretanto, acrescen-tou-se no relatório que se deveria serprudente na aceitação de trabalha-dores estrangeiros como mão-de-obra desqualificada, haja visto asexperiências por que passaram ou-tras nações desenvolvidas. JAPAN,Ministry of Labor. EmploymentSecurity Bureau. Foreign Workers'Affaires. 'Response to foreign workerissue". Japan Labor Bul/e/in.28(11):5-7, novo t989.

5. Em pesquisa sobre a populaçãonikkei residente no Brasil, realizadaentre 1987 e t 988, foi estimado umtotal de 1.168.000 pessoas (limitesde erro de mais ou menos 22.000)descendentes de japoneses no pais.CENTRO DE ESTUDOS NIPO-BRASILEIROS. Pesquisa da Popu-lação de Descendentes de Japone-ses Residentes no Brasil. São Paulo,junho de 1988, p. 9.

6. Burajirukarano Nikkei DekaseguiRodoshano Jittaito NihonshakBidenoTaíyou - Burajirugawa Hokokusho. [Asituação dos trabalhadores nikkeisemigrados do Brasil e a sua relaçãocom asociedade japonesa - RelatórioBrasileiro]. São Paulo. s.c.e, mimeo.1991.

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indo ao Japão realizar tarefas desqua-lificadas. Estes dekasseguis brasileiros co-meçaram a chegar ao Japão a partir de1985, com um grande aumento do seu flu-xo a partir de 1989.3

No começo, as condições para a emi-gração eram precárias: o trabalho no Japãoera ilegal, as agências de viagens não esta-vam preparadas para este tipo de tra-mitação, não existiam agências de empre-go intermediando os contatos entre em-presas no Japão e possíveis candidatos noBrasil.

A partir de 1989, no Brasil, a saída dedescendentes de japoneses se transformouem um fluxo significativo com mudançasno processo de emigração. Surgiramagências para a intermediação, cursos delíngua japonesa passaram a atender pes-soas interessadas em trabalhar no Japão, osvôos começaram a sair lotados e se forma-ram filas para a obtenção de vistos para oJapão.

Os primeiros que foram enfrentaramuma situação de trabalho ilegal. Com otempo, em virtude da própria dimensão dofenômeno, o governo japonês criou brechasna legislação", permitindo a aceitação doimigrante como trabalhador, desde quedescendente de japoneses( regulamentaçãoem vigor a partir de junho de 1990).

Serum dekassegui era mal visto dentro dacomunidade japonesa no Brasil, tal comoocorria no Japão quando este termo foicunhado. Desta forma, os primeiros queseguiram rumo ao Japão iam escondidos,não comentando a viagem aos amigos enem mesmo aos parentes. Razões econô-micas, situações de extrema dificuldade,eram os motores dessa saída do Brasil.

Com o crescimento do fluxo e o relato desucessos em ganhos em curto período detempo, ser dekassegui perdeu sua conotaçãopejorativa dentro da colônia, ocorrendomesmo uma certa inversão de valores, comos indivíduos remanescentes tendo que "seexplicar" por não terem ido ainda para oJapão- Esta pressão tornou-se mais um fa-tor impulsionador do fluxo ao Japão.

Portanto, se a pressão social anteriorfazia com que apenas algumas pessoas decada família viajassem para o Japão com opropósito de exercer um trabalho nãoqualificado, com a aceitaçãosocial,famíliasinteiras têm viajado, agora já não mais emsegredo.

Para se ter a dimensão do fenômeno,estima-se hoje em torno de 100.000 a150_000 o número de dekasseguis (japonesesradicados no Brasil, brasileiros descen-dentes de japoneses e outros ligados porlaços de parentesco). Esta população re-presenta cerca de 10% do total da comuni-dade japonesa no Brasil."

PERFIL

Os dados utilizados para análise doperfil do indivíduo dekassegui são primá-rios e foram coletados principalmente napesquisa realizada entre abril e julho de1991.6

Na pesquisa, tentou-se levantar dadossobre as características dos indivíduos re-ferentes aos fatores que levaram a ida aoJapão, condições de trabalho e razões deretorno ou não ao trabalho no Japão. Ametodologia de coleta de dados consistiuna aplicação de questionários semi-abertose de entrevistas extensas para os indiví-duos. Três tipos de questionários foramaplicados no Brasil: (I)para dekasseguis quenão pretendem repetir a experiência, (Ir)para dekasseguis que pretendem retornar aoJapão e (III) indivíduos que pretendemtornar-se dekassegui. Além da pesquisadireta com dekassegui, levantaram-se da-dos secundários agregados do perfil dosdekaseeguis.

Nesta análise, serão enfocados os que jápassaram pela experiência de trabalho noJapão, ou seja, os que responderam osquestionários de tipo (I) e (Il). A amostraconsistiu de 111 questionários, sendo 28dotipo (1),33 do tipo (lI) e 50 do tipo (III).

Verifica-sepela tabela acima que não háuma diferenciação significativa na distri-buição quanto aos sexos entre as categori-as (l) e (Il). Chama a atenção a proporçãorelativamente alta de indivíduos do sexofeminino, quase equivalente ao masculinodentre os dekasseguis. Dentro da linha deprodução de fábricas japonesas, em geral,

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MÃO-Df-OBRA DO BRASIL PARA O JAPÃO...

destinam-se aos homens os trabalhos queexigem maior força física (em virtude, porexemplo, das condições ambientais maisadversas ou pela periculosidade). Para asmulheres, há muitas tarefas que exigematenção, disciplina e perícia, tais como naconferência final de peças, montagem decomponentes ou no manuseio e controle deferramentas de alta precisão,

De 10 até 20,ne'2Q~té30?;". ~... };: ~;..' .

De 30 até 40

~~4ô:até 50"@De 50 até 60

·'Mais pe 6Ô~1~,Não responderam

6,7,'';:;~i1''lf&~xk3,2 1,8

Quanto à distribuição etária dos dekas-seguis, já se percebe uma pequena diferen-ça entre as categorias (I) e (Il). Os indiví-duos que pretendem retornar ao Japão sãoum pouco mais idosos, com uma maiorconcentração nas classes acima de 30 eabaixo de 60 anos. Embora ambas as clas-ses tenham a classe modal na categoriaentre 20 e 30 anos, a concentração é maisexpressiva para a classe dos que não pre-tendem retornar ao Japão(Ver tabela 3).

Bom 36,7 81,5

A tabela 4 é a primeira que exprime umadiferenciação nítida entre as categorias (I)e (Il). A categoria dos que pretendemretornar ao Japão, em sua maioria (81,5%),declararam saber japonês. De outro lado,apenas 36,7%dos que não pretendem vol-tar declararam o mesmo. Por estes dados,aparentemente o fator conhecimento dalíngua é fundamental para a adaptação epermanência do dekassegui.

2a3 9,1 3,6

A tabela 5 também oferece uma boavisualização da diferenciação do perfil dosdois grupos. Enquanto os que não preten-dem retornar, em sua maioria, não passa-ram de um ano no Japão, a classe (lI) emsua maioria teve um período maior de es-tada no Japão. O período de menos de umano parece ser suficiente para desestimulara permanência ou planos de retorno dodekassegui ao Japão. Este período de per-manência tanto pode ter sido antecipada-mente planejado quanto ter sido decididodurante o período de adaptação no Japão.De qualquer maneira, é bem provável queo conhecimento da língua (tabela 4) tenhasido determinante para esta configuração.

A tabela 6 apresenta uma boa visua-lização das diferentes motivações entre ascategorias (I) e (11).De certa forma, res-ponde a dúvida anterior sobre o período depermanência no Japão. Aparentemente, osindivíduos da categoria (lI)vão mais reso-lutos a permanecerem no Japão em virtu-de mesmo da própria base marcadamenteeconômica de sua motivação. Enquantoisto, os da categoria (1),aqueles que nãopretendem retornar ao Japão, declararammotivos de ordem social e cultural. Inte-ressante constatação é verificar que alémda motivação econômica, razões de ordem

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~~[j ARTIGO

cultural também motivaram os indivíduosa tentar a experiência de trabalho no Japão.

\

'.'.I

Mais de 20 15,0

Percebe-se aqui (tabela 7) uma forte ra-zão para os que pretendem retornar ao Ja-pão: o perfil de ganho desta classe no Bra-sil é claramente pior do que o da categoria(I). Embora haja alguns indivíduos queganhem menos do que um salário mínimona classe dos que não pretendem retornar,eles não são muito significativos.

Há uma proporção maior de indivídu-os com faixas etárias superiores na cate-goria (lI) do que na (I).Este perfil de idademais avançada da categoria (lI) leva a umaespeculação de que tenham um númeromaior de compromissos assumidos assimcomo responsabilidades (por exemplo, fa-mília e filhos), e por isso sintam mais fortea oportunidade de retomar ao Japão na suatentativa de obter ganhos maiores.

Todas as tabelas sem citação da fonte dizemrespeito a dados primários, coletados na pesquisa.

A classe que faz um número de horasextras maior (mais que 3horas) é a dos quenão pretendem retomarmo Uma possívelrazão para isto é a de que estes, planejan-

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do já um regresso ao Brasil, procuramamealhar omáximo possível no curto espa-ço de tempo de que dispõem. (Ver tabela 8)

A maior concentração dos que preten-dem voltar (Il) nas classes de menoreshoras extras não surpreende. Pode espe-lhar uma proporção de emigrantes jáadaptados à situação no Japão e que nãopretendam voltar ao Brasil tão cedo. Destaforma, ele procura não se sobrecarregarcom uma jornada de trabalho muito ex-tensa que dificilmente poderia manter porum longo período de tempo.

A tabela 9 mostra que mesmo aquelesque pretendem retornar ao Japão mantêmuma jornada extensa de trabalho. Deve-seressaltar uma concentração expressiva(30,3%)na jornada mais extensa na cate-goria (D.

Esta jornada de trabalho extensa se jus-tifica pois apenas com o zanguiô (horasextras) se consegue economizar algum di-nheiro. A tabela 14 apresenta o resultadode uma pesquisa a respeito de taxas depagamento por horas adicionais de traba-lho em empresas no Japão.

Há uma concentração maior dos indi-víduos da categoria (D na classe de ganhossuperiores no Japão (mais que US$ 2.000mensais), condizentes com a distribuiçãode horas-extras e de poupança mostradas.

Como o custo de vida no Japão é alto, secomparado a outro países, a renda mensalde US$1.000pode ser considerada como arenda mínima para cobrir os custos comalimentação, vestuário, transporte interno,moradia etc. acrescida da eventual devo-lução do pagamento antecipado da passa-gem ida e volta entre o Brasil e o Japão. Istotambém é coerente com os 16,1% da cate-

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MÃO-DE-OBRA DO BRASIL PARA O JAPÃO ..

goria (I) que recebem menos que aquelepatamar mínimo de renda (Ver tabela 10).

Os 16,1% da categoria (I) também po-dem estar ligados aos dekasseguis que fo-ram ao Japão motivados por fatores cultu-rais e para tão somente visitar o país e àexistência de algumas empresas cujas re-munerações são menores ou em que há aimpossibilidade de realização de horas-extras principalmente pelos trabalhadoresestrangeiros, resultando numa rendamensal menor que US$l.OOO.

34,4 37,0

~M~~~.~.!~~~i0~i_!1§~.~tmTotal 100,0 100,0

Como conseqüência direta do númerode horas-extras trabalhadas, aqui tambémse verifica uma concentração um poucomaior dos que não pretendem retornar naclasse de maior poupança (mais de 1.500).A ausência de pessoas da categoria (TI)naclasse de baixa taxa de poupança não sur-preende. Não obstante, a diferença norendimento entre as classes não é tãogrande assim. Isto poderia indicar que háduas estratégias de ganho diferentes entreas classes: a classe dos que não pretendemretornar seria a dos que não se adaptaramao meio social e não conheceriam outromeio senão procurar trabalhar muito noemprego em que já estivessem; e a dos quepretendem retornar seria a de procurarotimizar ao máximo o ganho do trabalho,

procurando ativamente por empregadoresque pagassem mais. Outra hipótese quepoderia ser colocada é que os indivíduosda categoria (D, como não pretendemretornar, consomem mais bens duráveis ede lazer. Desta forma, o volume poupadoseria relativamente equivalente entre asduas categorias (Ver tabela 11).

Mudança de emprego duranteo trabalho no Japão

Total 100,0 100,0

A tabela 12 sugere que há nítidas dife-renças de estratégia entre as categorias. Osque pretendem retornar ao Japão parecemmais interessados na procura de uma po-sição melhor dentro do mercado de traba-lho japonês. Ressalte-se que, ainda assim,a metade destes permaneceu no mesmoemprego durante o período de estada noJapão.

Total 100,0

Analisando a tabela 13referente apenasaos que pretendem retornar ao Japão, per-cebe-se uma pequena proporção de de-terminantes sociais para a mobilidade noemprego. São predominantes as causasrelacionadas às próprias condições de tra-balho. Esta maior iniciativa pode refletir aforte motivação econômica dos indivíduosda categoria (Il).

Vale observar que no Japão há diferen-ças quanto ao pagamento de horas adicio-nais de trabalho": horas-extras, trabalho

7. O artigo 36 do Labor StandardsLaw (do Japão) concede a permis-são para o trabalho em períodosalém da Jornada normal, não haven-do limítes nem para as horas traba-lhadas nem para o valor do paga-mento de horas- extras. OMI,Naoto.'Labor sets its sights on the 1,800-hour year'. Economic Eye.Spring1992. Tokyo. Keizai Koho Center, p.11.

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8. "Um estudo da Câmara de Comér-cio e Indústria de Tóquio realizadoem outubro de 1989, 90% das em-presas defrontam-se com este pro-blema. Ao lado do déficit há umadificuldade de se recrutar trabalha-dores não qualificados (japone-ses) ... '; ISHIKAWA, Akihiro."Formation et différenciation dumarché des travailleurs étrangers auJapon", Sociologie du TravailXXXIII,n! 1/1991. p.176.

9. Com a escassez de mão-de-obrarecrulam-se trabalhadores estran-geirosde países asiáticos em vias dedesenvolvimento, uma força de tra-balho atraída pelo mercado japonêsapesar de ogoverno japonês ter umasevera política de controle de mi-gração de trabalhadores estran-geiros.ISHIKAWA, Akihiro. Op. cit.,p.173.

10. JOHNSTON, William 8. 'O traba-lho não tem pátria'. Negócios emExame, 10 de julho de 1991, p. A-2.

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maiores remunerações nospaíses do primeiro mundo,levaram a um aumento daemigração.

Há uma demanda pormão-de-obra no mercado detrabalho japonês, principal-mente nas pequenas e mé-dias empresas e tambémpara a mão-de-obra nãoqualificada." Em virtude da Fonte: Somutyo adaptado de YANO, Itiro. Issen Kyuhaku Nanajuninenkan Nihondificuldade para o preen- Kokuzei Zue. Anuário Kokuzei do Japão: 1990. Tóquio. Kokuzei-Sha. 1991.

chimento destes postos portrabalhadores locais, trabalhadores nãoqualificados estavam sendo contratados depaíses em desenvolvimento do SudesteAsiático." Desde a segunda metade da dé-cada de 1980,trabalhadores nikkeis latino-americanos também estão se dirigindo aoJapão.

noturno e trabalho em dias de folga. Com-parando os dados da tabela 14 com o damédia de horas trabalhadas por dia pelosdekasseguis, pode-se observar que é grandea proporção daqueles que trabalhavammais que as oito horas de jornada normal,para justamente obter aqueles ganhosadicionais por horas-extras trabalhadas.

Fonte: Central Labor Relates Commission in: OMI, Naoto."Labor sets its sights on the 1.800-hour year". Economic Eye.Spring 1992, Tokio, Keizai Koho Center, p. 12.

CONTEXTO ECONÔMICO

As crescentes reduções salariais no Bra-sil, com a perda do poder aquisitivo, asso-ciadas a perspectivas de

Johnston afirmava, na análise das mi-grações: "...Países que possuem uma força detrabalho que cresce devagar mas cuja oferta deempregos nos setores de serviços se ampliaconstantemente, como Japão, Alemanha e Es-tados Unidos, servirão de ímã para imigrantes,mesmo que suas políticas busquem deses-timular tal fenômeno ... " 10

E este é o caso do Japão, que tem comopolítica não incentivar a imigração, mesmocom problemas com a falta de mão-de-obra.

Fonte: JOHNSTON, William B. "O trabalho lambém nãotem pátria". Negócios em Exame, 10 de julho de 1991, p.A-2.

Pode-se ver na tabela 15 que o Japãocontinuará a ter problemas com a falta demão-de-obra, ocasionada pela baixa taxade natalidade e o envelhecimento da po-pulação.

Os reflexos desta escassez aparecem emum maior período de trabalho diário noJapão, se comparada com a de outros paí-ses industrializados.

Participação da força de trabalhopor setores econômicos no Japão (%)

Outro fator determinante para o agra-vamento da escassez de mão-de-obra naindústria, setor da economia para onde sedirige uma grande parcela dos dekasseguis,é a própria tendência de a força de traba-lho se dirigir para o setor terciário da eco-nomia (Ver tabela 16).

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MÃO-DE-OBRA DO BRASIL PARA O JAPÃO..-

Fonte: Economic Eye, Spring 1992.

o crescimento econômico do Japãoagravou a escassez de mão-de-obra, con-forme os dados da tabela 17. Por exemplo,em 1990 ocorreram 1,4 ofertas de empregospara cada trabalhador à procura de em-prego. Esta relação entre a oferta e a de-manda de trabalho é geral e não constituitrabalhos específicos. Assim, para o caso detrabalhos desqualificados e em pequenas emédias empresas, a hipótese é que esta taxaseja maior ainda."

A VISÃO EMPRESARIAL

o investímento de capital japonês nomundo intensificou-se na década de 1950.Empresas transnacionais japonesas inves-tiram nesta década no Brasil, principal-mente nas áreas têxtil, de maquinários, si-derúrgicas e na construção naval; as áreasalimentícias, químicas e eletro-eletrônicastiveram aportes iniciais de capital japonêsna década de 1960; enquanto os investi-mentos em projetos de grande porte nasáreas de celulose, siderurgia e alumínioforam privilegiados na década de 1970.Além desses investimentos no setor in-d ustrial, foram realizadas inversões no se-tor terciário, com a instalação de bancos,seguradoras, hotéis, entre outros empre-endimentos."

Entre abril de 1951 e abril de 1990, US$5,946 bilhões foram investidos no Brasilpelo capital japonês, o que representa2,34% do total de investimento direto ja-ponês no mundo durante esse período, e éo equivalente a 50,1 % do total de investi-mentos japoneses na América Latina,desconsiderando os capitais invertidos nosparaísos fiscais (Panamá, Bahamas e IlhasCaymans)."

o Brasil corno país receptor do capitaldireto japonês encontra-se em 9º lugar pelomontante agregado desse período. De 1951até 1985, o Brasil sempre se encontravaentre os dez primeiros países para os quaismais se dirigia o capital japonês. De 1977 a1979 ocupava o 32 lugar. Entretanto, apartir do ano seguinte, houve urna quedanessa classificação, o que significa a dimi-nuição dos aportes de capital ao Brasil vis avis a outros países da Ásia ou industriali-zados."

Apesar de o desprivilegiamento doBrasil como país receptor de investimentodireto japonês na década de 1980, as in-versões de capitais japoneses para o Brasilno passado foram maciças, pois era consi-derado um importante país para a instala-ção de subsidiárias, filiais, joint-ventures, ede representação de empresas japonesas.

•••••••••••••••••••••••De 1951 até 1985, o Brasil sempre seencontrava entre os dez primeiros

países para os quais mais se dirigia ocapital japonês.

•••••••••••••••••••••••Diversas razões fizeram com que nestas

empresas japonesas instaladas no Brasilhouvesse o recrutamento e seleção de ja-poneses e seus descendentes. Algumas dasrazões foram a dificuldade de comunicaçãodos administradores japoneses e de adap-tação cultural das empresas e desses ad-ministradores.

As possíveis implicações administrati-vas e econômicas do fenômeno dekasseguinas empresas foram o objeto da pesquisarealizada junto àquelas associadas à Câ-mara de Comércio e Indústria Japonesa noBrasil". Levantaram-se a percepção e asatitudes dessas empresas em relação a estefenômeno."

Perfil das empresas

Enquanto tamanho das empresas, tem-se a distribuição que pode ser visualizadae verificada na tabela 18.

Das empresas constantes na amostra,51% são micro e pequenas, com menos de100 empregados. São grandes empresas(mais de 3.000 empregados) 4% da amos-tra. Constatou-se que as empresas da

11. 'O rápido crescimento econômico fezaumentar ...a demanda de máo-de-obra nãoespecializada no Japão que, na década de1950, o excedente de mão-de-obra transfor·mara·se em escassez ...mmo resultado, ossafános da mão-de-obra não especializada,empregada sobretudo na agricultura e emempresas de pequeno e médio porte, eleva·ram·se rapidamente. A formação de capftaltendia a ocorrer basicamente em grandesempresas, aspequenas emédiasintroduziramlentamente os equipamentos modemos· ...'Pode-se [dizer] ...sobre o fuluro crescimentopopulacional no Japão [que o...] crescimentosofrerá uma dramálica redução e, se nãochegar a zero, estará próximo desta marca noano 2015. Contudo, a taxa de aumenl9 dapopulação de faixa etária superior a 65 au-mentará ... '... 'A queda da taxa de crescimentopopulacional e o envelhecimento da popula-ção causarão uma redução no aumento defomecimento de mão-de-obra. Isto agudizaráo problema da escassez de mão-de-obra,sustando o crescimento econômico, pois sa-lários elevados acarretam uma queda no re-torno do capital e no invesâmento privado'.MINAMI, Ryoshin. O crescimento econômicodo Japão.' perspectiva a longo prazo. Rio deJaneiro, Centro de Economia Mundial da Es·cola de pós·Graduação em Economia da FGV,1992, p 9,18·19, mimeo,

12. HOLLERMAN, Leon (1988). Japan'sEconomic Strategy in Brazil: Challenge for rheUnfted States. Massachusetts. Le~ngton.1988.

13.SAAVEDRA·RIVANO,Neantro, 'JapaneseDirec1 InvestJnent in Brazil'. Ensaios Econó·mims, n2168. Rio de Janeiro. Escola de Pós-Graduação em Economia da FGV. 1999.

14. SAAVEDRA-RIVANO, Neantro. Op. cito

15. As empresas associadas na Câmara deComércio e Indústria Japonesa no Brasil, em1991, responderam a uma variada gama dequestóes, entre as de múltipla escolha e aber·tas. Oplou-se como método de coleta de da·dos o envio pelo correio de questionários paraas 327 empresas. Responderam ao questio-nário 48 empresas, 14,5% do universo dapesquisa, que se constituiu na amostra.

16. KATO, Heitor T.; MIYAZAKI, Silvio Y.M.;SUGO, Alberto I. "Êxodo de TrabalhadoresNikkeis e as Empresas no Brasil". Japão tn-formativo Econômico. Rio de Janeiro. Centrode Estudos Japoneses da Escola de Pós-Graduação em Economia da FGV.II~11):2·4,Abril de 1992.

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11~/JARTIGO

17. SUKAMOTO,T. & SCHWARTZ,G. Changes in the Industrial Structureand lhe Role of Small and Medium/ndustries in Developing Countries:lhe Case of Braz;l. Tokyo. Institute afDeveloping Economies. 1990.

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amostra, quanto ao número de funcioná-rios, são distribuídas ao longo de todo oespectro das classes. Entretanto, verificou-se que a amostra é mais concentrada nasclasses abaixo de 100 empregados. Umaoutra pesquisa sobre pequenas e médiasempresas" constatou uma proporção des-ta classe bem menor na sua amostra(25,5%). No outro extremo, a faixa de em-presas acima de 500 empregados tem umaproporção menor (25%) do que a verificadana amostra daquela outra pesquisa(44,2%).

Proporção de níkkeís no quadrodas empresas

Total 48 100,0%

Quanto à proporção de empregadosnikkeis, 60,4% das empresas empregam nomáximo 25%. Por outro lado, há empresas(8,3%) constituídas por mais de 90% denikkeis. Estes dados mostram a signi-ficância da amostra para se verificar amobilidade de empregados nikkeis emempresas face ao fenômeno dekassegui.

o grau de importância do nikkei nasoperações e atividades nessas empresasapresentou os seguintes percentuais: 39,6%das empresas assinalaram que eles sãoimportantes mas não insubstituíveis. E25,0% opinaram serem necessários para asatividades. O nikkei somente é essencialpara 10,4% das empresas. As justificativasmais freqüentes para a avaliação da im-portância do nikkei na empresa foram oconhecimento da língua japonesa e a ca-pacidade técnica para qualquer tipo detarefa.

Quanto à remuneração dos nikkeis quemais se demitiram e foram ao Japão tra-balhar, os maiores percentuais de faixassalariais foram a de um a cinco saláriosmínimos (32,82%) e a de seis a dez saláriosmínimos (39,33%), o que comprova seremeles os ocupantes de tarefas semiqua-lificadas, reforçando a hipótese de quecausas econômicas, no caso a remuneraçãorelativamente baixa, contribuem para adinâmica do fenômeno dekassegui.

Indicadores da saídaAproximadamente um terço das em-

presas (35,4%) tem uma saída de até 10%de nikkeis para o Japão. Os dois terços res-tantes apresentam percentuais altos desaída, sendo um terço (31,3%) de 11 a 50%e o terço final (31,3%), de mais de 50% desaídas para o Japão.

Esses dados mostram uma tendência deaumento das saídas para o Japão, princi-palmente em virtude do fenômenodeka.ssegui. A partir de 1989, o aumento sedestaca na coluna da classificação "De 16a 30%" conforme pode-se observar naapresentação consolidada das saídas dosnikkeis, de acordo com tabela 21.

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MÃO-DE-OBRA DO BRASIL PARA O JAPÃO ..

Percentagem de nikkeis que sairam da empresa e tum-over[~6i~:__'~Ât~5~,?j!~~,.. éd6~~;:.,P~;~oi:-;;~]1985 66,7 12,5

< ;/'

. 19B6' 64,61987 60,4 12,5

~1988 60',4 ,,,,ft14,6:1989 50,0 16,7

J:J990'fu~:..''',"'1.0: .".'-0/"

~8j32 ';jt~A;,Tum-over 45,8 27,1 22,9

Os dados de saída de nikkeis discrimi-nados por período de tempo apresentamvalores inferiores aos de saída rotineira daempresa, ou seja, do ium-ooer. O trabalha-dor nikkei aparenta ser mais estável, em-bora apareçam casos em que o índice desua saída é absurdamente alto (mais de50%).

•••••••••••••••••••••••Nas empresas, os principais efeitosdas saídas dos empregados nikkeis

foram a contratação e a ampliação donúmero de funcionários não nikkeis e

dificuldades em treinamento.

•••••••••••••••••••••••Os cargos que os ex-funcionários dessas

empresas ocupavam antes de ir trabalharno Japão, eram, em sua maioria, semiqua-lificados (60,4%acima de 25%dos empre-gados) e de especializados/técnicos (39,6%das empresas com mais de 25% dos em-pregados). Poucos estavam em cargos desupervisão (91,9%das empresas até 10%dos empregados), chefia (87,5%até 10%)ou gerência (95,8% até 10%). Por outrolado, dos que saíram da empresa poucoseram trabalhadores não qualificados. Al-gumas hipóteses podem ser levantadaspara o perfil dos cargos dos dekasseguis emsuas ex-empresas:

1)o reduzido número de não qualifica-dos pode ser devido a poucos nikkeis ocu-parem esses cargos;

2) a baixa proporção de dekasseguis emcargos de chefia, supervisão e gerência,

condiz com uma supo-sição de que é razoa-velmente alta a remu-neração salarial deles esua posição na socieda-de;

3) para os semiqua-lificados e os especia-lizados/técnicos o fatorsocial não foi decisivopara continuar no Bra-sil, preferindo a opçãode trabalhar no Japãopor uma remuneraçãomaior, ainda que emocupações não qualifi-

cadas ou diferentes da formação ou quali-ficação deles.

Dentre os principais motivos apontadospara a ida desses ex-funcionários ao Japão,estão as razões econômicas, sejam a insta-bilidade e insegurança que a atual situaçãoeconômica traz, seja o desequilibrio da si-tuação econômica familiar dadas essascondições econômicas. A "ambição de ga-nhar muito e rapidamente" foi uma dasalternativas que mais as empresas assina-laram.

A sugestão para ir ao Japão por parte deamigos, parentes e conhecidos indica quea rede de informações na comunidade ja-ponesa tem influência quanto ao fenôme-no dekassegui .

Efeitos e atitudes dasempresas quanto ao fenômeno

As empresas informaram que a melho-ria da qualidade dos trabalhadores e oacesso e transferência de tecnologia são ospossíveis benefícios que os dekasseguis po-derão trazer ao país com o seu retorno,Entretanto, em grande parte das empresas(75%), nenhum ex-empregado, dos queretornaram ao Brasil,voltaram às empresasde origem. Assim, uma hipótese é que asempresas não têm um plano de recolocaçãodos ex-dekasseguis, não aproveitando asnovas habilidades técnicas e conhecimen-tos adquiridos no Tapão.

O movimento de transferência de mão-de-obra é visto como um problema eco-nômico (64,6%),social (31,3%)e temporá-rio (29,2%)pelos adminstradores. Na opi-nião das empresas, esse movimento conti-nuará enquanto permanecerem as di-

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B~aARTIGO

ficuldades econômicas no Brasil e o Japãomantiver o seu crescimento econômico.

A principal atitude das empresas é "nãofaz nada" seguido de "aconselhamento".Essas atitudes, além de uma opção da em-presa, podem resultar da dificuldade coma falta de meios e instrumentos efetivospara manter os funcionários. Esse fatopode ser devido à situação econômicadesfavorável do Brasil e, portanto, à im-possibilidade de as empresas poderemmelhorar as condições de remuneração (a-través, por exemplo, de promoções, au-mento de salários e ampliação de benefíci-os) dos empregados. A importância relati-va destes na estrutura de trabalho é umaoutra razão, uma vez que os dekasseguis sãoem grande parte semiqualificados eespecializados/técnicos (Ver tabela 22).

Nas empresas, os principais efeitos dassaídas dos empregados nikkeis foram acontratação e a ampliação do número defuncionários não nikkeis e dificuldades de

Essencial'Importante.rúas .

..naÓ'insübstftufve't

Totalmente substituíveis.Outros

Total 100,0 2916

30

~·..·5i;~5il~SêrNiQbIl'W-O..",;m 'r~~? .!li

Maior necessidade detreinamento 9 18,8%

~FDit~urd~d~i~t~~rryam~litQt~.Ll~;~;'1Aumento da folhade pagamento

Em branco 3 6,3%

treinamento. O aumento das dificuldadesde treinamento pode ser associado tanto àmaior contratação de não descendentes,tendo como conseqüência problemas decomunicação e diferenças culturais, quan-to ao próprio volume de contratações. En-tretanto, dificuldades de comunicação fo-ram relatadas por apenas 14,6% das em-presas. Por outro lado, o acúmulo de tare-fas pode ser função de os nikkeis re-manescentes nas empresas terem assumi-do mais tarefas por causa do domínio dalíngua e experiência nas empresas. Valelembrar que os empresários justificaramque o nikkei é importante para a empresa,principalmente pelo conhecimento da lín-gua japonesa.

Verifica-se que não há grande impactoda variável percepção quanto ao nikkei("importância do nikkei nas suas opera-ções") sobre a atitude das empresas. Res-salte-se que, mesmo entre as duas atitudesdas empresas ("não faz nada" e "aconse-lhamento", que representaram 85,4% dasrespostas), não há diferença substancial.

CONCLUSÃOO fluxo de migração dos trabalhadores

para o Japão tem alterado significativa-mente a vida econômica, social e culturalda comunidade japonesa no Brasil. Embo-ra determinada parcialmente pela conjun-tura econômica no Brasil, a dinâmica domovimento não acompanhou diretamenteos movimentos na economia nacional.

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MÃO-DE·OBRA DO BRASIL PARA O JAPÃO. ..

Inicialmente, começando como umaatividade não aceita dentro da comunida-de, as dificuldades econômicas persistentesno Brasil e o relato de sucesso na acumu-lação de uma poupança através de traba-lhos não qualificados no Japão levaram umnúmero crescente de pessoas a integraremeste fluxo migratório. O aumento do volu-me de migrantes fez surgir a figura do in-termediário e das firmas intermediárias,que, por sua vez, deram um outro caráterao movimento com seus métodos de re-crutamento.

balho reabsorvida pelas empresas no Bra-sil.

Ao se inscrever num processo de seleçãonuma empresa, os descendentes de japone-ses estão tendo dificuldade em continuarno processo de seleção, pois há por partedas empresas o receio em selecionar, trei-nar e ver esse investimento ser perdido.Isto aconteceria, eventualmente, quando,surgindo melhores propostas de empregono Japão, eles se demitissem após o trei-namento recebido na empresa para viajarao Iapão". Assim, há algumas conseqüên-cias quanto ao emprego mesmo paraaqueles que não foram trabalhar no Japão,como está sendo percebido na imprensa noBrasiL

Com a recente queda do crescimentoeconômico do Japão, a oferta de trabalho eprincipalmente a necessidade de horas-extras têm caído, fazendo com que algunsdekasseguis tenham que, voluntariamenteou não, retornar ao Brasil, mesmo sem aesperada independência econômica."

Com o retomo ao Brasil dos dekasseguis,quais seriam as condições para sua reinte-gração no mercado de trabalho?

O conhecimento de língua japonesa,uma qualificação imediata dos nikkeis, nãoparece constituir uma vantagem ou umdiferencial para os ex-dekasseguis. Os quemelhor dominavam o japonês são exata-mente aqueles com maior chance de su-cesso e permanência no Japão. Há aquelesque foram bem-sucedidos em seus planosde poupar para abertura de pequenos ne-gócios e aqueles que pretendem fixar resi-dência no Japão. É provável que retomemprimeiro, em ordem, aqueles com menorconhecimento de língua japonesa, menoradaptação cultural e social no Japão, alémde outras razões financeiras.

Para um ex-dekassegui, a saída do mer-cado de trabalho no Brasil causa-lhe umônus em termos de perda de qualificaçãoprofissional, destreino pelo período au-sente de uma ocupação mais qualificada edesatualização. Além, disto, eles estão foradas redes de emprego, além das esperadasdificuldades de readaptação pessoal noBrasiL

Sem mecanismos sociais e econômicosde recolocação profissional, o cenário parao dekassegui indica dificuldades maiores doque apenas o problema individual dereadaptação, O

•••••••••••••••••••••••Com o retorno ao Brasil dos

dekasseguis, quais seriam ascondições para sua reintegração no

mercado de trabalho?

•••••••••••••••••••••••A partir de um certo momento, a apre-

ciação da comunidade nipo-brasileiraquanto ao movimento se modificou, pas-sando a aprová-lo. Associado ao surgi-mento dos intermediários, isto fez com quepessoas sem nenhuma noção do que iriamencontrar fossem trabalhar no Japão. Aanálise do perfil dos dekasseguis revela quehá uma boa diferenciação entre os perfisdaqueles que pretendem retomar ao Japãoe aqueles que não pretendem repetir a ex-periência. O domínio da língua parece serum fator determinante para esta diferen-ciação, mas pode ser também apenas umindicador dos verdadeiros determinantesque não foram levantados.

A investigação quanto ao impacto dofenômeno nas empresas pesquisadas per-mitiu verificar que o fluxo migratório aoJapão foi sentido pelas empresas. As prin-cipais conseqüências foram dificuldades derecrutamento, maior necessidade de trei-namento e acúmulo de tarefas. Salienta-sea falta de qualquer programa para a ma-nutenção desses trabalhadores nas em-presas, com a maioria das empresas nãofazendo nada ou apenas aconselhando epoucas empresas oferecendo salários mai-ores.

Para finalizar, será apresentado umpossível cenário das perspectivas dodekassegui, dentro da atual conjuntura eco-nômica do Brasil e Japão, relevando a con-dição do dekassegui enquanto força de tra-

18. O ESTADO de São Paulo. Ca-derno 2.p.3,31 de março de 1991.

19. KANAMORI, Hisao. "Year 01Adjustment'. Journal of JapaneseTrade & Industry. n2 1/1992.

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