Upload
neuza-teixeira
View
2
Download
0
Embed Size (px)
DESCRIPTION
poema
Citation preview
NO RIO
(A uma Criança)
Algumas há como as terras onde as flores
Aspiram uma seiva envenenada;
Onde à sombra de pérfidos verdores, Cai nas selvas a ave inanimada.
Têm elas um excesso de amargura
De que se nutre cada pensamento; Nas mais ridentes cenas de ventura, Fere-as um doloroso desalento.
Ontem ainda o senti. Bela era a cena,
Deslumbrante a paisagem; Nossa barca leva-nos serena
A vela solta, em plácida viagem.
Tu, criança inocente, debruçado
Nas cristalinas águas,
Sorrias de prazer, e eu, ao teu lado,
Sentia exacerbar as minhas mágoas.
Tu só vias na límpida corrente
Os verdores da margem,
E o sol, a repetir-se resplendente,
Nos mil reflexos que o fulgor lhe espargem,
As águas, aos teus olhos, retratavam
Ura segundo universo, Outro céu, que outras aves povoavam,
Outro mundo, outro sol, na onda imerso.
Eu também, como tu, me reclinara Do baixei sobre a borda;
Mas a vista das águas, que fitara,
Ideias mais amargas me recorda.
Talvez, pensei, que a linfa que, assim via
Tranquila e adormecida, Ocultasse no seio uma agonia,
A extrema convulsão de um suicida.
E em lugar desse júbilo expansivo
Que o olhar te animava,
Era um pungir cruel e aflitivo
O que o meu coração atormentava.
Ai, quantos como tu, pobre criança,
Sobre as vagas da vida
Veem debruçados, refletir-se a esperança, E se iludem com a cena refletida!
Quantos, sem o saber, sobre este abismo