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Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de Microeconomia Carlos Eugênio da Costa Fundação Getulio Vargas - EPGE/FGV Rio de Janeiro, Agosto-Dezembro de 2010

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Notas de Economia do Setor Público

Aula 01 - Revisão de Microeconomia

Carlos Eugênio da Costa

Fundação Getulio Vargas - EPGE/FGV

Rio de Janeiro, Agosto-Dezembro de 2010

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Conteúdo

1 Teoria da Escolha Individual 4

1.1 A Abordagem das Preferências . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

1.1.1 O Conjunto de Consumo . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

1.1.2 O Conjunto Orçamentário . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

1.1.2.1 Elasticidades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

1.1.3 Preferências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

1.1.4 Hipótese Comportamental . . . . . . . . . . . . . . . . 8

1.1.5 Preferências e Utilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

1.2 Resolvendo o Problema da Escolha do Consumidor . . . . . . 12

1.2.1 Utilidade Indireta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

1.2.2 Demanda Marshalliana . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

1.2.3 A Função Gasto (Despesa) . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

1.2.4 Demanda Hicksiana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

1.2.5 Problemas Duais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

1.2.6 A Equação de Slutsky . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

1.2.7 Bens Complementares e Substitutos . . . . . . . . . . . 17

1.3 A Demanda Excedente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

1.3.1 Aplicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

1.3.1.1 Oferta de Trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . 19

1.3.1.2 Escolha Intertemporal . . . . . . . . . . . . . . 19

1.3.2 Preços não-lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

1.4 Bem-Estar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

1.4.1 O Excedente do Consumidor . . . . . . . . . . . . . . . 21

1.4.2 Variação Compensatória . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

1.4.3 Variação Equivalente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

1

Page 3: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CONTEÚDO 2

1.5 Escolha no Tempo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

1.6 Incerteza . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

1.6.1 Formalização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

1.6.1.1 Definições e Conceitos . . . . . . . . . . . . . 29

1.7 Discussão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

2 Teoria da Produção 34

2.1 A firma neoclássica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

2.1.1 Tecnologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

2.1.2 Maximização de Lucro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

2.1.2.1 Propriedades da função lucro, π (p) . . . . . . 37

2.1.2.2 Propriedades da Função Oferta, y (p) . . . . . 37

2.2 Eficiência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

2.3 Sobre os objetivos da firma. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38

3 Equilíbrio Parcial 41

3.1 Definição e Conceitos Relevantes . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

3.1.1 Descrição do ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

3.1.2 Oferta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

3.1.2.1 Curto Prazo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

3.1.2.2 Longo Prazo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

3.1.2.3 Demanda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

3.2 Eficiência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

3.2.0.4 Elasticidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48

3.2.0.5 Relação entre Elasticidade e Receita . . . . . . 48

3.2.0.6 Relação entre Elasticidade e Receita Marginal 48

3.3 Monopólio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49

4 Equilíbrio Geral 50

4.1 Descrição do ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51

4.2 Definição de equilíbrio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51

4.2.1 Escolhas ótimas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52

4.2.2 Normalizações e Identidade de Walras . . . . . . . . . 52

4.2.3 Equilíbrio: definição formal . . . . . . . . . . . . . . . . 54

4.3 Existência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

Page 4: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CONTEÚDO 3

4.3.1 Economia de Trocas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56

4.3.2 Economia com Produção . . . . . . . . . . . . . . . . . 56

4.4 Eficiência: Teoremas de Bem-estar . . . . . . . . . . . . . . . . 57

4.4.1 1o Teorema do Bem-estar social . . . . . . . . . . . . . . 57

4.4.2 2o Teorema do Bem-estar social . . . . . . . . . . . . . . 58

4.5 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59

4.5.1 Economia de troca (modelo 2x2) . . . . . . . . . . . . . 59

4.5.1.1 Teoremas de Bem-Estar . . . . . . . . . . . . . 61

4.5.1.2 Alocações Eficientes de Pareto. . . . . . . . . . 62

4.5.1.3 Equilíbrio Competitivo . . . . . . . . . . . . . 63

4.5.1.4 Monopólio na caixa de Edgeworth: ineficiência. 64

4.5.2 Economia de Robson Crusoé . . . . . . . . . . . . . . . 64

5 Macroeconomia e Agregação 65

5.1 Equilíbrio Geral Dinâmico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66

5.2 Equilíbrio recursivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66

5.2.1 Um Exemplo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68

5.2.1.1 Problema do planejador: . . . . . . . . . . . . 68

5.2.1.2 Problema descentralizado: . . . . . . . . . . . 68

5.3 O Consumidor Representativo . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72

5.3.1 O Teorema de Sonnenschein-Mantel-Debreu . . . . . . 72

5.3.2 Demanda agregada como função dos preços e da renda

agregada. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73

5.3.3 Propriedades da Demanda Agregada . . . . . . . . . . 73

5.3.4 Agente Representativo e Análise de Bem-estar. . . . . . 77

5.4 A Firma Representativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78

Page 5: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

Capítulo 1

Teoria da Escolha Individual

Há duas abordagens principais distintas para a modelagem da escolha

individual. Em primeiro lugar existe uma teoria que define os gostos ou

relações de preferência como as características primitivas do indivíduo. Ax-

iomas de racionalidade são impostos e verifica-se as conseqüêncais para as

escolhas observáveis. Uma abordagem alternativa considera a escolha em

si como característica primitiva e impõe restrições diretamente sobre esse

comportamento. A hipótese central dessa abordagem é o axioma fraco da

preferência revelada, que impõe restrições ao tipo de comportamento que se

espera observar. Nosso foco será a primeira abordagem, simplesmente por

ser aquela com que todos estão mais familiarizados.

1.1 A Abordagem das Preferências

A abordagem tradicional é formada por quatro elementos básicos: i) o

conjunto de consumo; ii) o conjunto factível (ou conjunto orçamentário), iii)

a relação de preferência e iv) a hipótese comportamental.

1.1.1 O Conjunto de Consumo

O conjunto de todas as cestas que podem ser consumidas é chamado de

conjunto de consumo. Define a totalidade de possibilidades de consumo

que um agente pode conceber. Restrições físicas e/ou institucionais definem

o conjunto de consumo.

Formalmente, seja X o conjunto de consumo e x, um elemento desse

conjunto. Vamos sempre supor que: i) ∅ 6= X ⊆ Rn+; ii) X é fechado e

4

Page 6: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 5

convexo, e: iii) 0 ∈ X .

Na maioria dos casos trabalharemos com X = Rn+. Neste caso, x =

(x1, ..., xn) ∈ Rn+ é uma cesta de consumo (plano de consumo, cesta de bens).

Neste caso, xi ≥ 0 é a quantidade consumida do bem i (good, commodity).

1.1.2 O Conjunto Orçamentário

Também conhecido como conjunto de oportunidades, é um subconjunto

B ⊂ X que corresponde às alternativas factíveis para o agente.

Conjunto orçamentário competitivo

Considere o B definido por

B ≡{x ∈ X|px ≤ y}

onde p é o vetor de preços dos bens, x o vetor de quantidades e y a renda do

indivíduo. Ou seja, o conjunto de cestas tais que∑n

i=1 pixi ≤ y.Este é o conjunto orçamentário competitivo já que os preços não depen-

dem da quantidade demandada. É isto o que garante que a restrição orça-

mentária seja linear. Pressupõe implicitamente a existência de mercados efi-

cientes e sem custos de transação.

Restrições Não-lineares

Exemplos de restrições não-lineares.

i) Numa economia de escambo, preços de compra e venda podem ser difer-

entes, pois há custos em encontrar pessoas que queiram comprar os bens

que você quer vender, ou pessoas que queiram vender os bens que você quer

comprar. [existem custos de transação]

ii) Um motivo para a existência de restrições não-lineares em economias

monetizadas é a imposição de tarifas de duas partes. [mercados não são

competitivos e existem custos de transação]

iii) Problemas de escolha entre renda e lazer (i.e., oferta de trabalho) normal-

mente apresentam “quebras” na restrição orçamentária. [idem]

iv) Escolha intertemporal quando o mercado de capitais é imperfeito [exis-

tem custos de transação].

v) Escolha social quando redistribuição afeta a estrutura de incentivos. [mer-

cados não competitivos e custos de transação]

Page 7: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 6

Implicações da Restrição Linear

Suponha a existência de funções de demanda, i.e., uma regra fixa que es-

tabelece uma associação entre um conjunto de orçamentário B e uma cesta

escolhida pelo agente. Como um conjunto orçamentário competitivo é to-

talmente determinado definido por meio de (y,p) podemos representar essa

função (regra) por x (y,p), i.e., para cada bem i = 1, ..., n, (abusando um

pouco da notação),

xi = xi (y,p) ,

a função de demanda marshalliana (ou walrasiana, segundo Mas-Colell et al.

[1995])

Hipótese: indivíduos sempre escolhem uma cesta de consumo sobre a

reta orçamentária (bens são “bens”).

Não há necesidade de se impor nenhuma outra hipótese sobre o compor-

tamento do consumidor para que os resultados seguintes sejam válidos.

A primeira restrição sobre as demandas é conhecida como “adding-up”:∑kpkxk (y,p) = y

Se as demandas forem diferenciáveis, temos que o adding-up implica∑k∂yxk (y,p) pk = 1,

e ∑k∂ixk (y,p) pk + xi = 0

Essas duas condições também são conhecidas como agregação de Engel e

agregação de Cournot, respectivamente.

A segunda restrição é de que as funções de demanda são homogêneas

de grau zero em preços e renda, i.e., para todo escalar λ > 0, e todo bem, i,

temos que

xi (λy, λp) = xi (y,p) .

A propriedade é uma conseqüência imediata do fato de que (λy, λp) e (y,p)

definem o mesmo conjunto, B.

Se a função demanda for diferenciável, homogeneidade implica em

∂yxi (y,p) y +∑

k∂kxi (y,p) pk = 0

Todas as três propriedades podem ser escritas por meio de elasticidades.

Page 8: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 7

1.1.2.1 Elasticidades

No presente momento estaremos interessados em duas elasiticidades rel-

evantes da função demanda:1

Elasticidade-renda

ηi ≡ ∂yxi(p, y)y

xi

Elasticidade-Preço (quando i 6= j elasticidade cruzada, quando i = j elasti-

cidade própria)

εij ≡ ∂jxi(p, y)pjxi

Voltemos agora à agregação de Engel,∑k∂yxk (y,p)

y

xk︸ ︷︷ ︸ηk

pkxky︸ ︷︷ ︸wk

= 1.

Já a agregação de Cournot,∑k∂ixk (y,p)

pixk︸ ︷︷ ︸

εki

xkpky︸ ︷︷ ︸wk

+pixiy︸︷︷︸wi

= 0.

Como vimos ambas são conseqüências da propriedade de adding-up.

Finalmente, a equação de Euler associada à homogeneidade de grau zero

em preços e renda da demanda pode ser reescrita como

∂yxi (y,p)y

xi︸ ︷︷ ︸ηi

+∑

k∂kxi (y,p)

pkxi︸ ︷︷ ︸

εik

= 0.

Adding-up e homogeneidade são as duas únicas restrições sobre as funções

de demanda que resultam exclusivamente da hipótese de que o consumidor

escolhe uma cesta na fronteira de um conjunto orçamentário competitivo.

1Lembremos que, seja y = f (x) , então definimos a elasticidade de y com relação a x como

dy/y

dx/x= f ′ (x)

x

f (x).

Page 9: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 8

1.1.3 Preferências

As preferências são representadas por uma relação binária2, �, definida

em X tal que se x1 � x2, dizemos que x1 é preferível à cesta x2 (ou “pelo

menos tão boa quanto”).

Os axiomas principais são:

Axioma 1: Completeza. ∀x1,x2 temos que ou x1 � x2 ou x1 � x2 (ou

ambos)

Axioma 2: Transitividade. ∀x1,x2,x3, temos que se x1 � x2 e x2 � x3,

então x1 � x3

Definição A relação binária� definida no conjunto de consumoX é chamada uma

relação de preferência racional se satisfizer os axiomas 1 e 2.

A partir da relação � duas novas relações podem ser definidas:

• A relação binária � representa: x1 � x2 → x1 é estritamente preferível

à x2 (ou “é melhor do que”). É definida da seguinte maneira:

x1 � x2 ⇐⇒ x1 � x2 e x2 � x1.

• A relação binária ∼ representa: x1 ∼ x2 → x1 é indiferente à x2. É

definida da seguinte maneira:

x1 ∼ x2 ⇐⇒ x1 � x2 e x2 � x1.

1.1.4 Hipótese Comportamental

Agora acrescentamos o último elemento da nossa teoria da escolha: a

hipótese comportamental.

Hipótese comportamental: consumidores “racionais” escolhem a melhor

(de acordo com suas ordenações de preferências) cesta x∗ factível (i.e., dentro

do conjunto orçamentário B):

x∗ ∈ B tal que x∗ � x para todo x ∈ B2Uma relação binária definida em um conjunto X é uma regra que define subconjuntos

específicos de X ×X.

Page 10: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 9

Chamaremos o problema acima de ‘o problema do consumidor’. A primeira

pergunta relevante é: o problema do consumidor tem solução?

Para garantir existência de solução no problema do consumidor, pre-

cisamos impor um axioma adicional às preferências e um pouco mais de

estrutura ao conjunto orçamentário. Com relação ao cojunto orçamentário,

quando B ≡{x ∈ Rn+;px ≤ y

}, vamos supor que p � 0, ou seja, todos os

preços são estritamente positivos. Já para as preferências consideraremos o

seguinte axioma técnico.

Axioma 3: Continuidade. ∀x ∈ Rn+, o conjunto das cestas pelo menos tão

boas quanto x , � (x) , e o conjunto das cestas que não são melhores que x,

� (x) , são fechados em Rn+.

Ou seja, uma seqüência de cestas {xn}∞n=0 tais que xn � x0 ∀n e xn → x∗.

Então x∗ � x0.

Com preços positivos, temos que o conjunto orçamentário, B, é fechado

e limitado (i.e., compacto). Como veremos, preferências racionais e con-

tínuas admitem uma representação por uma função utilidade contínua. Uma

função utilidade contínua definida em um conjunto compacto tem sempre

pelo menos um máximo.

1.1.5 Preferências e Utilidade

Como dissemos, é possível representar preferências por meio de uma

função utilidade contínua. De fato, temos os seguintes resultados formais.

Definição Uma função u : Rn+ → R é uma função utilidade que representa a

relação de preferências � se ∀x0, x1 ∈ Rn+, u(x0)≥ u

(x1)⇔ x0 � x1.

Se as preferências são completas, transitivas e contínuas, existe pelo menos

uma função utilidade contínua que as representa.

Teorema 1 Se uma relação de preferências,�, pode ser representada por uma função

u : X −→ R, então � é racional (i.e., completa e transitiva).

Page 11: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 10

Teorema 2 Se� é completa, transitiva, e contínua, existe uma função real contínua

u : Rn+ → R que representa � .

Note que se existe pelo menos uma função utilidade que representa as prefer-

ências, existem infinitas, pois funções utilidade são invariantes em relação a

tranformações monotônicas. Se f : R→ R é estritamente crescente,

f[u(x0)]≥ f

[u(x1)]⇔ u

(x0)≥ u

(x1)

⇔ x0 � x1

Dada a hipótese comportamental de que consumidores “racionais” es-

colhem a melhor (de acordo com suas ordenações de preferências) cesta x∗

factível (i.e., dentro do conjunto orçamentário B), o problema do consumidor

pode ser escrito como

x∗ ∈ B tal que x∗ � x para todo x∗ ∈ B (1.1)

Essa escolha pode ser convenientemente representada por um problema

de “maximização de utilidade”,

maxx∈Rn

+

u (x) sujeito a y ≥ px (1.2)

Como o problema (1.2) é equivalente a (1.1) e como vimos que existe

solução para (1.1) então exite solução para (1.2).

Antes de avançarmos na caracterização de (1.2), será conveniente impor

axiomas adicionais às preferências. Cada um destes axiomas adicionais im-

plicará em propriedades específicas das funções utilidades capazes de rep-

resentar estas preferências.

Axioma 4′: Não-saciedade local. ∀x0 ∈ Rn+ e todo ε > 0, existe pelo menos um

x ∈ Bε(x0)∩ Rn+ tal que x � x0.

Axioma 4: Monotonicidade estrita.3 ∀x0,x1 ∈ Rn+, se x0 ≥ x1, então x0 � x1,

e se x0 � x1, então x0 � x1.3Notação: Para dois vetores x0 e x1, escrevemos:

Page 12: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 11

Note que a hipótese de monotonicidade estrita não é violada quando dois

bens são complementares perfeitos.

Axioma 5’: Convexidade. Se x1 � x0, então tx1 + (1− t)x0 � x0, para todo

t ∈ [0, 1]

Uma maneira de pensar em convexidade é imaginar que se uma cesta x1

é (fracamente) melhor do que uma outra cesta x0, a cesta criada pela mistura

das duas não pode ser pior do que x0.

Naturalmente podemos pensar em vários exemplos em que este axioma

é violado, mas o adotaremos com freqüência. Há pelo menos duas boas

razões para assim o fazermos. Primeiro, se o conjunto orçamentário rel-

evante for o conjunto Walrasiano, a não convexidade (assim como a não-

monotonicidade) não é empiricamente observável. Em segundo lugar a hipótese

de convexidade das preferências será particularmente útil quando formos

estudar equilíbrio.

Axioma 5: Convexidade estrita. Se x1 6= x0 e x1 � x0, então tx1 + (1− t)x0 �x0, para todo t ∈ (0, 1)

Convexidade estrita garante a unicidade da solução do problema do con-

sumidor. Em vez de trabalharmos com correspondências trabalharemos com

funções, o que é bastante conveninente.

No que se segue cosideraremos algumas propriedades das funções passíveis

de representar preferências que satisfazem os axiomas extras que impuse-

mos.

Definição: Uma função f : Rn −→ R é dita quase-côncava se ∀t ∈ (0, 1)

f(tx0 + (1− t)x1

)≥ min

{f(x0)

; f(x1)}

Definição: Uma função f : Rn −→ R é dita estritamente quase-côncava se

x0 ≥ x1 quando todos os elementos de x0 forem maiores ou iguais aos correspondentes

de x1

x0 > x1 quando todos os elementos de x0 forem maiores ou iguais aos correspondentes

de x1, com pelo menos um elemento estritamente maior

x1 � x0 quando todos os elementos de x0 forem estritamente maiores aos correspon-

dentes de x1.

Page 13: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 12

∀t ∈ (0, 1) , x0 6= x1

f(tx0 + (1− t)x1

)> min

{f(x0)

; f(x1)}

t ∈ (0, 1)

Usando estas definições temos que:

u (x) é estritamente crescente⇔� é estritamente monotônica.

u (x) é quase-côncava⇔� é convexa.

u (x) é estritamente quase-côncava⇔� é estritamente convexa.

Finalmente, vale notar que se uma função f : Rn −→ R é quase-côncava,

e continuamente diferenciável, então ∂xf (x) (x′ − x) ≥ 0 sempre que f (x′) ≥f (x) . De fato,

f(tx′ + (1− t)x

)=f(t(x′ − x

)+ x

)≥ f (x)

= min{f (x) ; f

(x′)}

=⇒

f(t(x′ − x

)+ x

)− f (x) ≥ 0

dividindo por t e tomando limite com t −→ 0, temos ∂xf (x) (x′ − x) ≥ 0.

A interpretação geométrica desse fato é que o gradiente em x de uma

função quase-côncava faz um ângulo agudo com todos os elementos do con-

junto

A ≡{x′ ∈ Rn; f

(x′)≥ f (x)

},

e sua pricipal consequência é que um ponto estacionário do Lagrangeano

associado ao problema do consumidor é um ponto de máximo global.

1.2 Resolvendo o Problema da Escolha do Consumidor

Suporemos que u (x) é diferenciável e estritamente quase-côncava (ax-

ioma 5) para podermos aplicar o método dos multiplicadores de Kuhn-Tucker:

1. Escreva o Lagrangeano,

L (x,λ, µ) = u (x) + λ [y − px] + µx.

2. Tire as condições de primeira ordem (para todo i = 1, ..., n),

∂xiL = ∂xiu (x∗)− λ∗pi + µ∗i = 0.

Page 14: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 13

3. Escreva as restrições de não-negatividade,

y − px∗ ≥ 0 e

x∗i ≥ 0 ∀i.

4. Escreva as condições de “complementary slackness”,

λ∗ [y − px∗] = 0 e

µ∗ix∗i = 0 ∀i.

5. Imponha a não-negatividade dos multiplicadores

λ∗ ≥ 0 e

µ∗i ≥ 0 ∀i.

Perceba que o método de Kuhn-Tucker tem vários disfarces (ver Mas-Colell

et al. [1995] ou Kreps [1990]). Em geral, essas são apenas condições necessárias.

Porém, dadas as nossas hipóteses de convexidade das preferências e do con-

junto orcamentário, elas são também suficientes.4

Durante a maior parte do curso lidaremos com o caso em que não pre-

cisamos nos preocupar com as restrições de não-negatividade. Além disso,

suporemos sempre monotonicidade, o que nos garante que a restrição y ≥px∗ será sempre ativa.

1.2.1 Utilidade Indireta

A função de utilidade indireta tem por argumentos o vetor de preços, p,

e a renda, y, do indivíduo.

v(p, y) ≡

maxx∈Rn+u (x)

s.t. y ≥ px.

Se o problema de maximização tem solução única, i.e., define-se a função

de demanda marshalliana, x(p, y), de acordo com

x(p, y) ≡

arg maxx∈Rn+u (x)

s.t. y ≥ px

4Seja x∗ um ponto satisfazendo as condições necessárias de 1 a 5 com x∗ � 0 e px∗ = y.

Seja, então, x′ uma cesta tal que u(x′) > u(x∗). Então, pela quase-concavidade de u(.) temos

que∇u(x∗)[x′ − x∗] > 0. Como∇u(x∗) = λp, então px′ > px∗ = y.

Page 15: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 14

Note que a utilidade indireta também pode ser escrita como

v(p, y) = u (x(p, y)) .

A seguir, apresentaremos as propriedades da função utilidade indireta e

da demanda marshalliana.

Propriedades de v(p, y):

Se u (x) é contínua e estritamente crescente em Rn+, temos que v(p, y) é

1. Contínua em Rn++ × R+

2. Homogênea de grau zero em (p, y)

3. Estritamente crescente em y

4. Decrescente em p

5. Quase-convexa em (p, y)

6. A Identidade de Roy: se v(p, y) é diferenciável no ponto (p0, y0) e ∂v(p0, y0)/∂y 6=0, então

xi(p0, y0

)= − ∂iv(p0, y0)

∂yv(p0, y0).

1.2.2 Demanda Marshalliana

Propriedades das Funções de Demanda

1. Homogeneidade e Equilíbrio Orçamentário (agregações de Engel e Cournot).

2. Simetria e negatividade semi-definida da matriz de Slutsky:

s(p, y) ≡ ∂1x1 + (∂yx1)x1 ... ∂nx1 + (∂yx1)xn

.... . .

...

∂1xn + (∂yxn)x1 ... ∂nxn + (∂yxn)xn

Adiaremos a demonstração até havermos discutido a equação de Slutsky.

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CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 15

1.2.3 A Função Gasto (Despesa)

Considere o seguinte problema. Pergunte ao consumidor quanto de din-

heiro (ou renda) ele precisa para atingir um determinado nível de utilidade.

Ou seja, qual é a despesa mínima,

minx∈Rn

+

px, (1.3)

necessária para que

u (x) ≥ u. (1.4)

A solução desse problema define a função despesa que tem por argumentos

o vetor de preços, p, e a utilidade, u, de acordo com

e(p, u) ≡

minx∈Rn+px

s.t. u (x) ≥ u.

Graficamente, fixa-se uma curva de indiferença e encontra-se a curva de

isogasto que a tangencia.

Se o problema de minimização tem solução única, então a função de de-

manda hicksiana (ou compensada) χ(p, u) existe, e a função gasto também

pode ser escrita como

e(p, u) = pχ(p, u).

Variando-se o vetor de preços a demanda hicksiana nos dá a forma como

a demanda varia com os preços ‘mantendo a utilidade constante’.

Propriedades da função despesa Defina U ≡{u (x) | x ∈ Rn+

}.Se u (x) é

contínua e estritamente crescente em Rn+, temos que e(p, u) é

1. Igual a zero quando u atinge o seu valor mínimo em U.

2. Contínua em Rn++ × U.

3. Para todo p� 0, estritamente crescente e sem limite superior em u.

4. Não-decrescente em p

5. Homogênea de grau 1 em p

6. Côncava em p

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CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 16

7. Lema de Shephard: se e(p, u) é diferenciável no ponto (p0, u0) e p0 � 0, então

∂ie(p0, u0) = χi(p

0, u0)

1.2.4 Demanda Hicksiana

Vejamos agora as propriedades da demanda Hicksiana,

1. A curva de demanda de Hicks é não-positivamente inclinada; i.e.,

0 ≥ ∂iχi(p, u)

2. A matriz de substituição (de Hicks)

Σ(p, u) ≡

∂1χ1(p, u) ... ∂nχ1(p, u)

.... . . ....

∂1χn(p, u) ... ∂nχn(p, u)

é negativa semi-definida.

3. Simetria: Σ(p, u) é simétrica, i.e.,

∂jχi(p, u) = ∂iχj(p, u)

4. Homogeneidade: Para todo (p, u) e todo t > 0,

χi(tp, u) = χi(p, u)

1.2.5 Problemas Duais

Considere os seguintes problemas de otimização

problema A

maxx∈Rn+u (x)

sujeito à y ≥ px

problema B

minx∈Rn+px

sujeito à u (x) ≥ u

Se u (x) é contínua e estritamente crescente em Rn+, p � 0, y > 0, u ∈ U,então

e(p, v(p, y)) = y, e

v(p, e(p, u)) = u.

Page 18: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 17

Além disso, se u (x) é contínua, estritamente crescente e estritamente

quase-côncava em Rn+, então para p� 0, y > 0, u ∈ U,

xi(p, y) = χi(p, v(p, y)) ∀i

χi(p, u) = xi(p, e(p, u)) ∀i.

Senão vejamos.

1.2.6 A Equação de Slutsky

A equação de Slutsky representa uma decomposição da demanda (ob-

servável) marshalliana em duas partes: efeito substituição e efeito renda.

∂jxi(p, y)︸ ︷︷ ︸efeito-preço

= ∂jχi(p, u∗)︸ ︷︷ ︸

efeito-substituição

− ∂yxi(p, y)xj(p, y)︸ ︷︷ ︸efeito-renda

Demonstração: Vimos que

χi(p, u) ≡ xi(p, e(p, u))

Como se trata de uma identidade, podemos diferenciá-la com relação a pjpara obter

∂jχi(p, u) = ∂jxi(p, e(p, u))

+ ∂yxi(p, e(p, u)) ∂je(p, u)︸ ︷︷ ︸xj(p,y)

,

onde a última igualdade é conseqüência do lema de Shephard.

Demonstração da última propriedade da demanda marshalliana: É sufi-

ciente notar que s(p, y) = σ(p, u), ou seja a matriz cujas entradas são dadas

por ∂xi/∂pj + xj (∂xi/∂y) é a matriz jacobiana das demandas compensadas

que é simétrica e negativa semi-definida por ser igual à matriz hessiana da

função despesa.

1.2.7 Bens Complementares e Substitutos

Dizemos que dois bens são complementares (substitutos) brutos se εij ≤ 0

(εij ≥ 0).

Page 19: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 18

Dizemos que dois bens são complementares (substitutos) Hicksianos se εij ≤0 (εij ≥ 0).

compelementares⇔ εij ≤ 0

substitutos ⇔ εij ≥ 0

Observação: O conceito de complementar ou substituto bruto pode não estar

bem definido. Isto porque o bem j pode ser complementar bruto do bem i,

mas o bem i ser substituto bruto do bem j.

1.3 A Demanda Excedente

Em muitos casos (vocês verão isso exaustivamente quanto estudarem

equilíbrio geral) é interessante considerar que a renda não cai simplesmente

do céu, mas é produto da venda da dotação inicial do agente (essa é que

agora cai do céu).

Como incorporar isso na teoria que estudamos?

Suponha que em vez de uma renda o agente possua uma dotação inicial

x de bens que possa vender no mercado para comprar as mercadorias que

são de seu interesse.

Neste caso, seu problema de maximização passa a ser

v (p; x) ≡

maxx∈Rn+u (x)

s.t. px ≥ px, (1.5)

ou seja, o total do que compra não pode custar mais do que o total do que

vende.

O que acontece com a demanda de um bem j quando aumenta o preço do

bem i? Primeiro, há o efeito tradicional medido pela demanda marshalliana

∂xj/∂pi. Mas a renda do agente também é afetada de modo independente

pelo aumento de pi.

De fato, seja y ≡ px. Podemos, então escrever o efeito total a partir da

demanda marshalliana:

dxj =

{∂ixj (p,y) + ∂yxj (p,y)

dy

dpi

}dpi

= {∂ixj (p,y) + ∂yxj (p,y) xi} dpi

Page 20: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 19

Subsitutindo na Equação de Slutsky:

dxj = {(∂iχj (p,u)− ∂yxj (p,y)xi) + ∂yxj (p,y) xi} dpi

= {∂iχj (p,u)− ∂yxj (p,y) (xi − xi)} dpi

Neste caso, saber que um bem é normal não garante que possamos determi-

nar o efeito de uma aumento no seu preço sobre a demanda. De fato, isso

dependerá de ser o indivíduo um demandante ou ofertante líquido do bem.

Consideremos, então duas aplicações importantes dessa discussão:

1.3.1 Aplicações

1.3.1.1 Oferta de Trabalho

Seja w o salário (i.e. o preço do lazer). Então, a pessoa tem uma dotação

inicial de L horas (e.g., 168 horas semanais). Ela vende L − l (e.g., 40 horas

semanais) no mercado de trabalho e consome l (168-40=128 horas) de lazer.

Com o salário recebido, o agente consome bens a um preço p. Podemos

escrever o problema do consumidor/trabalhador como

v(p,w; L

)max

l∈R+,x∈Rn−1+

u (x,l)

s.t. w(L− l

)≥ px

.

Ou seja, se escrevermos y = wL, estaremos com um problema idêntico a

(1.5), onde um dos bens é o lazer e a dotação inicial é L:max

l∈R,x∈Rn−1+

u (x,l)

s.t. wL ≥ px+wl

.

Logo, podemos escrever a equação de Slutsky

dl ={∂wl

h (p,w,u)− ∂ylh (p,w,y)(l − L

)}dw

O que acontece quando o lazer é normal? Qual a direção do efeito renda??

1.3.1.2 Escolha Intertemporal

v(1, R−1; x1, x2

) maxx

u (x1) + βu (x2)

s.t. x1 + x2R−1 ≥ x1 + x2R

−1.

Page 21: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 20

A restrição orçamentária do agente deve ser lida como ”o valor presente do

consumo não pode ser maior do que o valor presente da renda”. O vetor de

preços é p =(1, R−1

), onde R é a taxa de juros bruta: 1 + r.

Há suas coisas a serem compreendidas. 1) O aumento da taxa de juros é

uma ’redução’ em um preço: o preço do consumo futuro. 2) O efeito renda,

mais uma vez depende de o agente ser ofertante (devedor) ou demandante

líquido (poupador) de consumo futuro.

1.3.2 Preços não-lineares

Implícita na decomposição de Slutsky está a hipótese de que o preço da

unidade marginal de um bem é igual ao preço das unidades inframarginais.

Assim, a variação do preço atinge de forma igual todas as unidades com-

pradas. Com preços não lineares, isto deixa de ser o caso, e precisamos de

novas formas de lidar com o efeito renda.

Imposto de renda progressivo Imposto progressivo introduz não-linearidade

na restrição orçamentária dos agentes. Ainda assim, a restrição orçamen-

tária é convexa, o que (considerando as hipóteses que já estamos adotando)

preserva a continuidade da oferta de trabalho. A grande novidade aqui diz

respeito ao tratamento do efeito-renda, para o que faremos uso do conceito

de renda virtual. No entanto, postergaremos até o capítulo XXX esta dis-

cussão.

Descontos No caso de descontos o problema ganha um grau extra de com-

plexidade, já que o conjunto orçamentário deixa de ser convexo, e a con-

tinuidade das preferências deixa de ser suficiente para se garantir a con-

tinuidade das escolhas. Novas hipóteses sobre a estrutura das preferências

e da função de preço podem garantir uma análise local, mas estas tendem a

ser restirtivas. (Ver Wilson [1993])

1.4 Bem-Estar

O que queremos é saber como varia o bem-estar do agente quando variam

os preços. A própria questão já aponta uma dificuldade fundamental, rela-

cionada à mensuração do bem-estar. Ou seja, qual a métrica? Devmos atribuir

à utilidade um sentido cardinal? Não estaríamos regredindo teoricamente?

Page 22: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 21

Procuraremos responder a essas perguntas à medida em que apresenta-

mos as diferentes medidas de bem-estar (ou de sua variação): (i) Excendente

do Consumidor; (ii) Variação Compensatória, e; (iii) Variação Equivalente

1.4.1 O Excedente do Consumidor

Suponha que nós possamos ter uma representação ’legítima’ do bem-

estar por meio de uma função utilidade. A variação da utilidade quando

os preços passam de p0 para p1 é, então, dada por

v(p1, y

)− v

(p0, y

).

Começaremos por considerar o caso em que somente um preço variou; o

preço do bem i, pi.

Neste caso, podemos escrever

v(p1, y

)− v

(p0, y

)=

ˆ p1

p0

∂iv (p, y) dpi.

Pela Identidade de Roy, sabemos que

∂iv (p, y) ≡ −∂yv (p, y)xi (p, y)

O que nos permite escrever

v(p1, y

)− v

(p0, y

)= −

ˆ p1

p0

∂yv (p, y)xi (p, y) dpi

Suponhamos, então, que ∂v (p, y) /∂y seja constante. Neste caso,

− 1

∂yv (p, y)

ˆ p1

p0

∂iv (p, y) dpi =

ˆ p1

p0

xi (p, y) dpi

Ou seja, a variação no bem estar é proporcional à variação na área abaixo

da curva de demanda que chamamos de excedente do consumidor. Note que

ao dividirmos por vy estamos ’transformando em uma métrica que não de-

pende da função utilidade específica’. Um bônus adicional pela hipótese

restritiva de ∂yv (p, y) constante!!!

Limitações do Excedente do Consumidor Ainda que bastante intuitivo,

e fácil de computar na prática, o excedente do consumidor apresenta uma

série de limitações. Em primeiro lugar, depende da hipótese de constância

Page 23: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 22

da utilidade marginal da renda. Em segundo lugar, não está bem defindido

quando ocorre variação simultânea de vários preços. Isto porque a integral

de linha que definiria o excedente do consumidor é (geralmente) depende

do caminho, o que faz com que o excedente do consumidor não seja bem

definido.

Em virtude dessas dificuldade associadas à utilização do excedente to

consumidor é que se usa as medidas exatas de Bem-estar: Variação Com-

pensatória e Variação Equivalente.

1.4.2 Variação Compensatória

Considere um consumidor que tenha uma função utilidade indireta v (p, y) .

Seja y sua renda inicial e p0 o vetor de preços iniciais. Considere agora uma

variação nos preços para p1 6= p0. Quanto de renda deve ser dado para o

agente para compensá-lo pela variação no preço do bem?

A variação compensatória CV dessa mudança de preço é definida por

v(p1, y + CV

)= v

(p0, y

)Podemos expressar CV também através das funções gasto:

e(p1, v

(p0, y

))= e

(p1, v

(p1, y + CV

))=⇒

CV = e(p1, v

(p0, y

))− y

Também é verdade que y = e(p0, v

(p0, y

)), portanto temos que

CV = e(p1, v0

)− e

(p0, v0

)Pelo lema de Shephard, nós podemos expressar CV em função das de-

mandas hicksianas:

CV = e(p1, v0

)− e

(p0, v0

)=

ˆ p1

p0

∂pe(p, v0

) dpdtdt =

ˆ p1

p0

χ(p, v0

) dpdtdt

Perceba então que CV é igual à integral de linha debaixo da demanda

hicksiana entre p0 e p1.

Page 24: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 23

Quando a variação é no preço de um só bem i

CV = e(p1, v0

)− e

(p0, v0

)=

ˆ p1i

p0i

∂ie(p, v0

)dpi =

ˆ p1i

p0i

χi(p, v0

)dpi

1.4.3 Variação Equivalente

A pergunta agora é a seguinte: Quanto o agente estaria disposto a pagar

para evitar uma variação no preço?

Neste caso

v(p1, y

)= v

(p0, y − EV

)Ou seja,

e(p0, v

(p1, y

))= e

(p0, v

(p0, y − EV

))=⇒

EV = y − e(p0, v

(p1, y

)).

Analogamente à variação compensatória, sendo v1 ≡ v(p1, y

), temos

que

EV = e(p1, v1

)− e

(p0, v1

).

Pelo lema de Shephard, nós podemos expressar EV em função das de-

mandas hicksianas:

EV = e(p1, v1

)− e

(p0, v1

)=

ˆ p1

p0

∂pe(p, v1

) dpdtdt =

ˆ p1

p0

χ(p, v1

) dpdtdt

Perceba então que EV é igual à integral de linha debaixo da demanda

hicksiana entre p0 e p1.

Quando a variação é no preço de um só bem i

EV = e(p1, v1

)− e

(p0, v1

)=

ˆ p1i

p0i

∂ie(p, v1

)dpi =

ˆ p1i

p0i

χi(p, v1

)dpi

Page 25: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 24

1.5 Escolha no Tempo

Vamos supor um número finito de datas t = 0, 1, ...T. Sejam então os

objetos de escolha dos indivíduos fluxos de consumo, c ≡ (c0, ..., ct, ...cT ),

ct ∈ RL+, ct ≥ 0. Vamos supor que os indivíduos têm preferências bem

definidas racionais e contínuas sobre estes fluxos de consumo. Neste caso,

sabemos que podemos representar essas preferências com uma função utili-

dade U (c) .

Separabilidade Aditiva.

U (c) =∑T

t=0ut (ct) (1.6)

A idéia é de que em sua forma mais geral a utilidade marginal do con-

sumo nas várias datas é função de todos os consumos passados e futuros.

A separabilidade forte tem duas implicações importantes: i) o ordenamento

induzido dos fluxos de consumo que começam em T independem de tudo o

que aconteceu até T − 1; ii) o ordenamento dos fluxos até T − 1 independe

do que esperamos ter de T em diante,5 e iii) o ordenamento dos bens em

cada período independe do ordenamento (e, conseqüentemente) das escol-

has feitas nos outros períodos.

Quão restritiva é a hipótese?

A plausibilidade da hipótese de separabilidade pode depender do tamanho

do período que estamos considerando. Meu ordenamento entre uma salada

e um churrasco no jantar deve depender de eu ter comido uma feijoada ou

uma outra salada no almoço, o que sugere que separabilidade não é uma

hipótese razoável para um períodos tão curto. Já para prazos mais longos,

esta hipótese de independência parece não ser tão difícil de ser verificada.

Ainda assim, note que a hipótese elimina a possibilidade de vícios ou

outras formas de formação de hábito. Poderíamos, para remediar o prob-

lema pensar em uma preferência que acomode formação de hábito na forma

U (c) =∑T

t=0ut (ct−1, ct)

5Para aqueles que estão familiarizados com a axiomatização da utilidade de von-

Neumann Morgenstern, note como estas idéias assemelham-se ao axioma da independência

na teoria da escolha sob incerteza. De fato esta condição exerce papel análogo ao axioma da

independência para separabilidade nos estados da natureza.

Page 26: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 25

ou, mais geralmente,

U (c) =∑T

t=0ut (st, ct) ,

onde st = f (ct−1, ct−2, ...c−J) .

Vários modelos de formação de hábito têm-se provado tratáveis, o que

tem permitido sua maior utilização.

Vamos extender agora nosso problema para um número infinito de datas

t = 0, 1, ... Sejam então os objetos de escolha dos indivíduos sejam fluxos

de consumo, c =(c0, ..., ct, ...c

T), ct ∈ RL+, ct ≥ 0. Vamos nos limitar a

considerar fluxos de consumo tais que supt ‖ct‖ < ∞, ou seja, seqüências

definidas em l∞. Introduzamos agora a seguinte notação. Definamos cτ =

(cτ0 , ..., cτt , ...) relativamente a c = (c0, ..., ct, ...) de tal forma que cτt = ct+τ .

Vamos supor que os indivíduos têm preferências bem definidas racionais e

contínuas sobre o espaço de seqüências com as propriedades acima descritas.6

Estacionariedade. Tome dois fluxos c e c tais que cs = cs para todo s < τ .

Estacionariedade requer

U (c) ≥ U (c) se e só se U (cτ ) ≥ U (cτ ) .

As preferências sobre consumos futuros não mudam com a idade.

Será que a forma geral (1.6) tem essa propriedade? Note que U (c) =∑∞t=0 ut (ct) e U (cτ ) =

∑∞t=0 ut (cτt ) =

∑∞t=0 ut (ct+τ ) .Neste caso,

U (c)− U (c) =∑∞

t=0ut (ct)−

∑∞

t=0ut (ct)

=∑∞

t=τ[ut (ct)− ut (ct)] ≥ 0 (1.7)

não implica

U (cτ )− U (cτ ) =∑∞

t=0ut (cτt )−

∑∞

t=0ut (cτt )

=∑∞

t=τ[ut (ct+τ )− ut (ct+τ )] ≥ 0 (1.8)

6Note que estamos agora em um espaço de dimensão infinita. Em geral, o que precisamos

é que X seja um espaço topológico conexo e separável (ou, possua uma base contável de

abertos). Se � definida em X for racional e contínua estamos feitos.

Page 27: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 26

Precisamos, portanto que ut+τ (ct+τ )−ut+τ (ct+τ ) ≥ 0⇐⇒ ut (ct+τ )−ut (ct+τ ) ≥0 para todo t e todo τ . Consideremos, então ut (·) = βtu (·) . Neste caso,

ut+τ (ct+τ )− ut+τ (ct+τ ) =

βt+τu (ct+τ )− βt+τu (ct+τ )

= βτ[βtu (ct+τ )− βtu (ct+τ )

].

Este tipo de preferência exibe o chamado desconto exponencial.

Impaciência. Vamos supor β < 1. Se c = (c0, c1, ....) 6= 0 e c′ = (0, c0, c1, ....)

então c′ é estritamente pior do que c. Esta hipótese é útil para garantir que

um fluxo de consumo limitado tenha valor limitado. Uma implicação prática

é de que o consumo em um futuro distante tem pouca relvância hoje.

Recursividade. Queremos escrever as preferências dos indivíduos como

função do valor do consumo presente e a utilidade de todo o fluxo futuro

como em

U (c) = u (c0) + βU(c1)

para qualquer fluxo de consumo c = (c0, c1, ...) [notando que c1 = (c1, c2, ...)].

Note que a taxa marginal de substituição entre utilidade corrente e futura é β.

Vamos, portanto, considerar preferências sobre fluxos de consumo do

tipo

U (c) =∑∞

t=0βtu (ct) (1.9)

onde β < 1 e u é crescente e côncava.

Este modelo pode ser também interpretado como uma sucessão de ger-

ações ligadas por vínculos de altruismo na linha de Barro (1989).

Cabe finalmente falar de consistência intertemporal. Se você prefere c a c′

em t = 0, você vai continuar a preferir c a c′ sempre. Ou seja, o indivíduo

não muda suas preferências sobre fluxos de consumo. Um exemplo inter-

essante de violação consistência intertemporal ocorre no caso de desconto

hiperbólico. Neste caso,

Ut(ct)

= u (ct) + δ∑∞

s=t+1βs−tu (cs)

enquanto.

Ut−1

(ct)

=∑∞

s=tβs−tu (cs)

Page 28: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 27

Note que é possível construir dois fluxos c e c tais que, sob a perspectiva

de t o indivíduo prefira c e sob a perspectiva de t + 1 prefira c, violando,

desta forma, consistência intertemporal.

Escolha no tempo e nos estados da natureza: Notando que∑∞

t=0 βt = (1− β)−1,

reescrevamos (1.9) na forma

U (c) = (1− β)∑∞

t=0πtu (ct) ,

onde πt = βt (1− β)−1 .A estrutura de preferências sobre consumo no tempo

mais comuente utilizada é formalmente equivalente à estrutura de preferên-

cias sobre consumos nos estados da nautreza. Em particular, no que concerne

à estrutura separável, ambas a exibem na forma aditiva.

1.6 Incerteza

Muitas das situações em que as pessoas fazem escolhas envolvem algum

tipo de incerteza. Em vários casos, é razoável ignorar esse problema e tra-

balhar sob a hipótese de certeza. Em outros casos, porém, a incerteza está

na raiz do problema. Exemplos: seguros, investimentos financeiros, lote-

rias e jogos de azar. Agentes tomam decisões que afetam as conseqûencias

econômicas de sua incerteza. Queremos então uma teoria que nos permita

lidar com essas questões.

Ou seja, queremos de um lado uma forma de representar escolhas nesse

ambiente (i.e., determinar o que seja um conjunto de consumo, restrições

orçamentárias, preferências ou adotar uma outra abordagem) e determinar

a estrutura que esta teoria confere ao problema de escolha individual. É

necessária uma teoria do consumidor “especial” para tratamento da incerteza?

Não. Uma alternativa para que seja possível a utilização do instrumental de-

senvolvido até agora é a adoção do conceito de estado da natureza. Esta idéia,

presente nas formulações de Savage [1954] e Anscombe and Aumann [1963],

foi utilizada, a partir da genial percepção de Debreu [1959], para extender os

resultados de equilíbrio geral para um ambiente com incerteza.

Informalmente, podemos entender o conceito a partir do seguinte exem-

plo. A incerteza em relação ao mundo se resume a apenas dois estados da

natureza: s1 (chuva) e s2 (sol), e existe apenas um “bem”: guarda-chuva

(x = 1 se ele tem um guarda-chuva, x = 0 se ele não tem um guarda-chuva).

Page 29: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 28

Defino, porém, dois bens: x no estado s1 e x no estado s2 e uma cesta de

consumo passa a ser definida como x = (x1, x2), onde xi é a quantidade de

guarda-chuvas no estado si. Se as preferências definidas sobre o conjunto de

consumo são completas, transitivas e contínuas, existe uma função de utili-

dade contínua u (x1, x2) que representa essa estrutura de preferências. Logo,

a introdução de incerteza não altera em nada a natureza do problema do

consumidor (exceto a dimensionalidade do conjunto de consumo).

No entanto, a teoria da escolha sob incerteza acrescenta mais estrutura

às preferências de forma a responder perguntas de interesse específico da

área. Podemos, por exemplo estar interessados em saber o efeito sobre a

demanda de guarda-chuvas do aumento da probabilidade de chover. I.e.,

a probabilidade de chuva pode afetar a taxa marginal de substituição entre

guarda-chuva se chover e se não chover.

A função u (x1, x2) não tem por argumento a probabilidade de chuva. Na

verdade, uma mudança na probabilidade de chuva deve alterar a própria

função utilidade u (x1, x2) . Uma forma incorporar preferências sobre proba-

bilidades é inseri-la diretamente como parâmetro da função utilidade u (x1, x2, π),

onde π é a probabilidade de chuva.

Mais geralmente, suponha que existam S (inteiro e finito) estados da na-

tureza s = 1, 2, ...S. com respectivas probabilidades (objetivas) π1, π2, ..., πS .

Seja X ⊆ Rm+ o conjunto de consumo (por simplicidade, o mesmo em cada

estado da natureza).

Seja xs ∈ Rm+ a cesta que será consumida caso o estado da natureza real-

izado seja s. A função utilidade é então definida por

u(x1,x2, ...,xS , π1, π2, ..., πS

)(1.10)

A teoria tradicional do consumidor ainda é perfeitamente válida para se

estudar uma utilidade como (1.10). Alguns axiomas adicionais e plausíveis

sobre o comportamento do consumidor nos permitirão, porém, estabelecer

algumas propriedades importantes de (1.10). É aí que entra a teoria da utili-

dade esperada.

Page 30: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 29

1.6.1 Formalização

Há (basicamente) três alternativas de formalização que diferem com re-

lação ao caráter subjetivo ou objetivo das probabilidades (ou crenças) en-

volvidas. Em um extremo temos a teoria de Von Neumann and Morgen-

stern [1944] que toma as probabilidades como algo objetivo. Em um outro

extremo temos a teoria de Savage [1954], que supõe que as probabilidades

(crenças) são subjetivas. No meio do caminho temos a teoria da Anscombe

and Aumann [1963], que admite que algumas probabilidades, como por ex-

emplo a probabilidade de sair o número 1 em um lançamento de dados, são

objetivas, enquanto algumas são essencialmente subjetivas, como a probabil-

idade de o Brasil ganhar a próxima Copa do Mundo. Na maior parte do que

se segue estaremos estudando a formulação de Von Neumann and Morgen-

stern [1944], a primeira, cronologicamente, e a de formalização mais simples.

1.6.1.1 Definições e Conceitos

Seja C o conjunto de possíveis resultados (outcomes). Resultado é uma

lista de variáveis que podem afetar o bem-estar do agente. Por exemplo, se

os resultados são cestas em cada estado da natureza xi, então C = X. Vamos

supor, para evitar tecnicalidades, que C é um conjunto finito: C = {xs}Ss=1 .

Definção: Considere, então um vetor de probabilidades (π1, ..., πS) , onde

πs ≥ 0 ∀s e∑S

s=1 πs = 1. Uma loteria simples, L, é um vetor (x1, π1; ...;xs, πs) .

No entanto, durante a exposição que se segue, vamos fixar os resulta-

dos possíveis {xs}Ss=1 e definir uma loteria pelo seu vetor de probabilidades

associado a ela. Definamos então o conjunto £ de todas as loterias sobre o

conjunto de resultados {xs}Ss=1 ,

£ ≡{

(π1, ..., πS) ;∑S

s=1πs = 1

}.

Definção:Uma loteria composta é uma loteria cujos resultados são também

loterias. Por exemplo, considere duas loteriasL = (π1, ..., πS) eL′ = (π′1, ..., π′S) ,

podemos então definir a loteria composta Lα = αL+ (1− α)L′, α ∈ [0, 1] .

Note que a loteria L′′ = (απ1 + (1− α)π′1, ..., απS + (1− α)π′S) associa a

cada resultado a mesma probabilidade que a loteria composta Lα. É natural,

Page 31: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 30

então. associar a loteria composta Lα = αL + (1− α)L′ a essa nova loteria

reduzida L′′.

Suporemos, então que o agente tem uma relação de preferências % sobre

£, caracterizada pelos seguintes axiomas.

Axioma 1: (“consequencialismo” ou “axioma da redução”): Indivíduos pos-

suem uma ordenação de preferências definida apenas sobre loterias reduzi-

das, i.e., % é definida apenas sobre £.

Axioma 2: (racionalidade): A ordenação de preferências % em £ é racional;

i.e., % é completa e transitiva.

Ou seja, o axioma 2 pode ser decomposto em duas partes:

Axioma 2.a: A ordenação de preferências % em £ é completa, i.e., para

duas loterias quaisquer L e L′, temos L % L′, ou L′ % L, ou ambos.

Axioma 2.b: A ordenação de preferências % em £ é transitiva, i.e., para

quaisquer três loterias L, L′ e L′′, se L % L′ e L′ % L′′, então L % L′′.

Axioma 3: (continuidade): Para todo L,L′, L′′ ∈ £, os conjuntos

{α ∈ [0, 1] : αL+ (1− α)L′ % L′′

}{α ∈ [0, 1] : αL+ (1− α)L′ - L′′

}são fechados em [0, 1] .

Uma forma de entender o significado desta proposição é lembrar que

se estes conjuntos são fechados os conjuntos referentes a relações estritas,

�, são abertos em [0, 1] . Continuidade, portanto, quer dizer que pequenas

mudanças nas probabilidades não afetam o ordenamento entre duas loterias.

Assim se tivermos L � L′ � L′′, então para α < 1 suficientemente próximo

de 1, temos que αL+ (1− α)L′′ � L′ e para α > 0 suficientemente próximo

de 0, αL+ (1− α)L′′ ≺ L′.Algumas pessoas questionam esse axioma com base no seguinte exem-

plo. Suponha que os prêmios sejam z1 =‘ficar em casa vendo BBB’, z2 =‘jantar

no Cipriani’ e z3 =‘morrer em um assalto’. Para a maior parte das pessoas

z2 � z1 � z3 (para alguns z1 é a morte!). O axioma de continuidade diz que

existe um α tal que αz2 + (1− α) z3 � z1. Alguns reajem dizendo que não

há nada que pague a vida e portanto as preferências envolvendo a mortes

Page 32: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 31

são lexicográficas e não contínuas. No entanto, quase todas as pessoas que

conheço (estou excluindo aquelas que gostam muito de BBB, já que podemos

ver isso como uma patologia grave!) não pensariam duas vezes em sair de

casa, aumentando sua probabilidade de morrer em um assalto para jantar de

graça no Cipriani.

Vimos da teoria do consumidor que um ordenamento completo transi-

tivo e contínuo é representável por uma função utilidade, i.e., existe uma

função U : £→ R tal que L % L′ se e somente se U (L) ≥ U (L′) .

O que vai tornar a teoria da escolha sob incerteza especial é o próximo

axioma.

Axioma 4: (independência): Para todo L,L′, L′′ ∈ £ e α ∈ (0, 1) , temos que

L � L′ ⇐⇒ αL+ (1− α)L′′ � αL′ + (1− α)L′′

Note que não existe paralelo deste axioma na teoria da escolha do con-

sumidor em ambiente de certeza. De fato, considere o seguinte exemplo.

Suponha que uma pessoa prefira uma cesta com 1 bolo e uma garrafa de

vinho a uma cesta com 3 bolos e nenhuma garrafa de vinho. Se um ’axioma

da independência’ também valesse nesse contexto, a mesma pessoa teria que

prefirir uma cesta com 2 bolos e 2 vinhos a uma cesta com 3 bolos e uma gar-

rafa e meia de vinho simplesmente porque

(2, 2) = 0, 5× (1, 1) + 0, 5× (3, 3)

e (3, 3/2) = 0, 5× (3, 0) + 0, 5× (3, 3) .

Ora não há nenhuma violação da idéia de racionalidade ao se supor que

uma pessoa prefira (1, 1) % (3, 0) e (3, 3/2) % (2, 2) . O axioma da inde-

pendência é uma restrição adicional à estrutura de preferência que faz sen-

tido neste contexto porque ao contrário do contexto da teoria do consumidor

sob certeza, o consumidor não consome uma coisa e outra, mas uma coisa ou

outra.

Definição: Uma função utilidade U : £→ R é uma utilidade esperada se existe

um vetor (u1, u2, ..., uN ) tal que para toda loteria L = (π1, ..., πN ) ∈ £ , temos

Page 33: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 32

que

U (L) = u1π1 + u2π2 + ...+ uNπN

Teorema 3 Se a ordenação de preferências � em £ é “conseqüentista” (axioma 1),

racional (completa e transitiva, axioma 2), contínua (axioma 3) e independente (ax-

ioma 4), então nós podemos encontrar uma função utilidade esperada U : £ → R

que representa �. Isto é, existem números un para cada resultado n = 1, ..., N tais

que, para quaisquer loterias L = (π1, ..., πN ) e L′ = (π′1, ..., π′N ) ,

L � L′ ⇐⇒n∑n=1

πnun ≥n∑n=1

π′nun

1.7 Discussão

Vimos que por racionalidade entendemos simplesmente um processo

pelo qual os indivíduos escolhem elementos de um conjunto de alternativas,

A, de acordo com os quatro elementos a que nos referimos.

Na maior parte das aplicações de economia, porém, algum tipo de es-

pecialização da idéia de racionalidade é requerida. Consideremos alguns

exemplos.

Teoria da Utilidade Esperada: Define-se um conjunto X de prêmios e o

conjuntoA é o conjunto de distribuições de probabilidade sobreX.O axioma

da independência impõe a restrição de que as curvas de indiferença em A

sejam retas paralelas.

Utilidade Esperada Subjetiva: Nela, define-se um conjunto de ’estados

da natureza’, S, e um conjunto de resultados, X . Uma função que mapeia

’estados’ em resultados f : S −→ X é um ato. O conjunto A neste caso é

o conjunto de ’atos’. Uma relação de preferência no conjunto de atos A tem

uma representação de utilidade esperada subjetiva se houver uma função

payoff definida em X e uma distribuição de probabilidades p em S tal que

f � g ⇔ Ep [v (f (s))] ≥ Ep [v (g (s))] .

Apesar do compromisso dos economistas com o individualismo metodológico,

não é absolutamente verdade a idéia de que a descrição do indivíduo seja to-

talmente pré-social (usando a expressão de Blume and Easley [2008]): em

alguns casos não é verdade que os indivíduos vão ao mercado com crenças

Page 34: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 1. TEORIA DA ESCOLHA INDIVIDUAL 33

e preferências pré-definidas. Dois exemplos de situações em que a própria

definição de racionalidade do indivíduo depende do resultado de equilíbrio,

são em modelos de escolha sob incerteza em que as expectativas dois indiví-

duos são expectativas racionais e no caso de jogos não-cooperativos.

Estabilidade das Preferências Para que a teoria tenha conteúdo (seja testável)

é necessário supor estabilidade das preferências. A arte está em conferir sufi-

ciente flexibilidade às preferências para que alguns fenômenos óbvios sejam

captados (como a demanda de aquecedor varia quando uma pessoa se muda

de Novosibiski, na Sibéria, para Sobral, no Ceará), sem perder a refutabili-

dade (i.e., o conteúdo) da teoria.

Page 35: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

Capítulo 2

Teoria da Produção

Uma teoria da firma deveria ser capaz de responder pelo menos à seguinte

pergunta.

Por que certas atividades são coordenadas dentro das firmas e não via mercado?

Em outras palavras, por que a coordenação das atividades econômicas às vezes se dá

via autoridade e outras vezes via preços?

Esse, porém, não será o tema do nosso estudo. Vamos considerar a firma

como uma tecnologia capaz de transformar insumos em produtos e supore-

mos que seu objetivo será o de maximizar os lucros. Nosso objetivo é avançar

da forma mais rápida e parcimoniosamente possível a uma teoria sobre o

‘comportamento de mercado’ da firma. Em particular, estaremos interessa-

dos em verificar os efeitos das mudanças de preços em ofertas de produtos e

demandas de insumos, no caso de uma economia competitiva.

Portanto utilizaremos esse modelo simplista da firma como uma caixa

preta e veremos o quão distante esta forma de analisar a organização da pro-

dução poderá nos levá. No final dessa discussão, apresentaremos algumas

defesas (e críticas) para as hipóteses adotadas, além de alguma evidência

sobre a aderência do modelo aos dados.

2.1 A firma neoclássica

2.1.1 Tecnologia

Chamamos de produção ao processo de transformação de insumos em

produtos. A viabilidade tecnológica é o que determina quais planos de pro-

34

Page 36: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 2. TEORIA DA PRODUÇÃO 35

dução são possíveis.

Definição: Um plano de produção é um vetor y ≡ (y1, y2, ..., ym) ⊂ Rm tal que

yi > 0 se i é um produto e yj < 0 se j é um insumo (fator de produção).

De posse da definição de plano de produção, utilizamos o conjunto de

possibilidades de produção Y ⊂ Rm para caracterizar as tecnologias produtivas.

Dizemos que um plano de produção é factível, ou viável, quando y ∈ Y.Qualquer y ∈ Rm tal que y /∈ Y é dito inviável tecnologicamente. Ou seja,

por meio do conjunto Y particionamos o espaço de planos de produção, rep-

resentado pelo próprio Rm, em planos viáveis e inviáveis.

Uma tecnologia é descrita, em geral, por meio das propriedades deY.Apre-

sentaremos a seguir algumas hipóteses que poderemos utilizar na descrição

da tecnologia.

Y 6= ∅. Ou seja, existe alguma produção factível.

Y é fechado. O limite de uma seqüência de planos de produção factíveis é

também factível (yn → y e yn ∈ Y ∀n, então y ∈ Y).

Free disposal - y ∈ Y e y′ ≤ y ⇒ y′ ∈ Y. A interpretação para essa pro-

priedade é que quantidades adicionais de insumos (ou produto) podem ser

descartadas ou eliminadas sem custo.

No free lunch. Y ∩ RL+ ⊆ {0} . (Note que ∅ ⊂ {0}) Em outros termos, não se

pode produzir algo a partir de nada.

Possibilidade de inação, 0 ∈ Y.Note que a validade dessa hipótese depende fundamentalmente do mo-

mento do tempo a que nos referimos. Quando pensamos em uma firma (uma

tecnologia) que está decidindo se deve se organizar para passar a produzir, a

hipótese é bastante razoável. Mas se algumas decisões de produção já foram

tomadas ou se insumos já foram contratados, talvez a hipótese não seja tão

boa. Devemos pensar, então, em custos fixos e afundados. Podemos pensar em

um conjunto de produção restrito.

Irreversibilidade y ∈ Y⇒− y /∈ Y. Um bom exemplo de tecnologia que exibe

irreversibilidade é aquela que inclui o tempo de disponibilidade em sua de-

scrição, já que os insumos devem ser usados antes de os produtos existirem.

Page 37: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 2. TEORIA DA PRODUÇÃO 36

Retornos de Escala:

Não-crescentes y ∈ Y⇒ αy ∈ Y ∀α ∈ [0, 1] (a tecnologia é divisível)

Não-decrescentes y ∈ Y⇒ αy ∈ Y ∀α ≥ 1. (a tecnologia é replicável)

Constantes: é uma tecnologia replicável e divisível.

Aditividade (ou livre entrada): y ∈ Y, y′ ∈ Y ⇒ y + y′ ∈ Y. A idéia aqui

é de que se dois planos são factíveis, então é possível instalar duas plantas

que não interfiram uma na outra e executar os planos de produção y e y′

independentemente.

Convexidade: y ∈ Y,y′ ∈ Y⇒ λy + (1− λ)y′ ∈ Y ∀λ ∈ [0, 1].

É importante ressaltar que os conjuntos de possibilidade de produção

representam tecnologias e não limites de recursos. Pode-se, então defender

a idéia de que se todos os insumos puderem ser duplicados, então neces-

sariamente a produção o será. Naturalmente isto não quer dizer que essa

duplicação possa efetivamente ser possível. Alguns insumos (por exemplo,

a capacidade empresarial) podem existir em quantidade limitada, o que leva

algumas pessoas a associarem retornos decrescentes à escassez relativa de

algum insumo que deixamos de explicitar.

Uma maneira de representar o conjunto das alocações factíveis - que nos

será útil por permitir o uso do cálculo - é obtida por meio de uma função de

transformação F (·) com a propriedade

Y ≡ {y ∈ Rm;F (y) ≤ 0} (2.1)

e F (y) = 0 se y está na fronteira de transformação.

Note que o que a função de transformação faz é separar os planos tecno-

logicamente viáveis dos inviáveis. Assim como a função utilidade, a função

de transformação é uma representação da tecnologia que pode ser substi-

tuída por uma tansformação monotônica.

Supondo F (·) diferenciável, podemos definir a Taxa Marginal de Transfor-

mação do bem l pelo bem k como sendo igual a

MRTlk (y) ≡ ∂ylF (y)

∂ykF (y),

que mede em quanto a produção do bem k pode aumentar (ou, reduzir o

uso do insumo k) se for reduzida em uma unidade a produção do bem l

Page 38: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 2. TEORIA DA PRODUÇÃO 37

(ou, aumentada a quantidae do insumo l). Note que a MRT é a própria

essência do conceito de custo, como vimos de forma simplificada no exemplo

anterior.

2.1.2 Maximização de Lucro

O problema de maximização de lucros da firma é

maxy∈Y

py,

ou, usando a função de transformação F (·) ,

maxypy s.a. F (y) ≤ 0

Este problema nem sempre tem solução, mas supondo que a solução exista

e que o conjunto de possibilidades de produção possa ser descrito por uma

função de transformação côncava, i.e., F (.), teremos a escolha ótima, y∗,

caracterizada por p = ∂yF (y∗) .

Supondo que exista uma solução e que esta solução seja....então defini-

mos π (p) ≡ maxy∈Y py e y (p) ≡ arg maxy∈Y py.

2.1.2.1 Propriedades da função lucro, π (p)

1) Homogênea de grau 1 em p

2) Convexa em p

3) Lema de Hotelling: Se o conjunto y (p) é unitário, π (p) é diferenciável

e∇π (p) = y (p) .

2.1.2.2 Propriedades da Função Oferta, y (p)

Se y (p) é diferenciável em p, ∂py (p) = ∂2ppπ (p) é simétrica e positiva

semi-definida (semi, já que D2π (p) p = 0)

2.2 Eficiência

Uma das questões mais relevantes em análise de bem estar é a determinar

se uma alocação é eficiente. O conceito de eficiência usado pelos economis-

tas é o conceito de eficiência de Pareto. No entanto, como estamos enfati-

zando aqui somente o lado da produção, utilizaremos um conceito que não

faz referência direta ao bem-estar dos indivíduos. A relação entre este con-

ceito e a eficiência de Pareto, ficará mais clara com o estudo de equilíbrio

geral.

Page 39: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 2. TEORIA DA PRODUÇÃO 38

Definição: Dizemos que um vetor y ∈ Y é eficiente quando não existe nen-

hum outro y ∈ Y tal que y > y.

Teorema: Se y ∈ Y é um vetor que maximiza lucros para algum vetor de preços

p� 0, então y é eficiente.

Podemos, porém, fazer a pergunta inversa. Será que toda alocação efi-

ciente é um vetor de maximização de lucros? A resposta é: nem sempre, mas

sob algumas hipóteses sobre a tecnologia...

Teorema: Suponha que Y é convexo. Então, para todo y eficiente, y é a escolha

maximizadora de lucro para algum vetor de preços p > 0.

2.3 Sobre os objetivos da firma.

Durante toda a discussão da teoria da produção estivemos pressupondo

que o objetivo da firma é a maximização de lucro. Ocorre que, ainda que a

maximização da utilidade possa ser pressuposta como um conceito primário

da escolha individual, o mesmo não ocorre com a firma. Os objetivos da

firma têm que ser derivados a partir das escolhas dos indivíduos que a con-

trolam.

Neste caso, será que a maximização de lucro pode ser vista como um

objetivo razoável para a teoria da firma?

Cada firma j é dotada de uma teconologia representada por um conjunto

de possibilidades de produção Yj . As firmas são de propriedade de indiví-

duos que são eles próprios consumidores. Utilizaremos a seguinte notação,

cada indivíduo i possui uma participação acionária θij na firma j. Natural-

mente∑

i θij = 1 ∀j. A participação acionária corresponde também à por-

centagem do lucro da firma que cabe ao indivíduo.

A restrição orçamentária do indivíduo é, neste caso,

pxi ≤ pxi +∑

jpyj , (2.2)

onde xi é a dotação inicial do indivíduo i.

Note que para qualquer firma j, tomadora de preços, sua escolha, yj ,

somente afeta o indivíduo aumentando ou diminuindo o lado direito de

(2.2). Como pyj ≤ πj (p) ∀yj ∈ Yj , a estratégia que mais beneficia os seus

acionistas é escolher yj ∈ arg maxy∈Yj py.

Page 40: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 2. TEORIA DA PRODUÇÃO 39

Ou seja, com preços fixos, o único canal por meio do qual a firma afeta

o consumidor é a expansão ou contração do seu conjunto orçamentário por

meio dos lucros. Ora, é claro, neste caso, que a maximização do lucro maxi-

miza também o bem-estar do agente. Como isso é verdadeiro para qualquer

agente, então os acionistas escolhem por unanimidade a maximização de lu-

cro como objetivo a ser perseguido.

Há três hipóteses implícitas neste argumento: i) preços são fixos e não

dependem da ação da firma; ii) lucros são determinísticos, e; iii) os acionistas

administram a firma.

i) Note que se os preços forem passíveis de manipulação pela firma (não-

concorrencial), então um novo canal de influência do comportamento da

firma no comportamento dos agentes aparece. [Quem sabe a Petrobrás não

subsidia minha gasolina e sacrifica os lucros dos acionistas, i.e., dos pa-

gadores de impostos!?]

ii) A questão relevante aqui é se a produção é vendida antes ou depois de

resolvida a incerteza. Se for depois o argumento de unanimidade de escolha

de maximização de lucro deixa de valer. As atitudes de aversão ao risco do

agentes vão afetar as escolhas da firma. Se, porém a venda ocorre antes da

resolução da incerteza, então o argumento permanece válido.

Em um ambiente com incerteza cabe, de fato, falar em lucro esperado.

Será que a firma deve maximizar o lucro esperado? Qualquer um minima-

mente familiarizado com apreçamento de ativos sabe que os fluxos devem

ser ‘ajustados pelo risco.’ Porém, com mercados incompletos, (esses con-

ceitos ficarão mais claros ao estudarmos equilíbrio geral) não há unanimi-

dade sobre o ‘valor do lucro’, já que cada indivíduo pode atribuir um valor

diferente a lucros que ocorram em estados da natureza distintos. Natural-

mente, se os mercados forem completos, mais uma vez o objetivo de maxi-

mização de lucro esperado volta a ser unanimidade.

iii) Em muitos casos os administradores não são os donos das firmas.

Neste caso, pode haver conflito de interesses entre os objetivos dos admin-

istradores e os objetivos dos donos das firmas. Parte imporante dos estudos

de finanças corporativas estão relacionados aos contratos que permitem alin-

har os interesses de administradores e acionistas (o que por si só já constitui

Page 41: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 2. TEORIA DA PRODUÇÃO 40

evidência de que esses interesses não estão ’naturalmente alinhados’).

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Capítulo 3

Equilíbrio Parcial

Como dissemos no capítulo inicial destas notas, a ciência econômica mod-

erna está comprometida com o ’individualismo metodológioco’; a idéia de

que a análise social deve ter por base o indivíduo. Nos capítulos anteriores

procuramos evidenciar o primeiro dos aspectos que caracterizam a maneira

de pensar do economista, a idéia de que a escolha do indvíduo é munida de

propósito. O objetivo destes próximos capítulos é explorar as conseqüências

dos segundo e terceiro aspectos da forma de pensar do economista: as idéias

de equilíbrio e eficiência.

Ou seja, começamos nossa investigação sobre os fenômenos sociais a par-

tir da escolha dos indivíduos. Vimos como podemos tentar entender as es-

colhas individuais a partir da idéia de de que a decisão dos indivíduos é mu-

nida de propósito e, em particular, que as escolhas são racionais. A questão

que se coloca agora é de como dar coerência à interação entre as escolhas

individuais. Faremos isso por meio do conceito de equilíbrio.

Como procuramos deixar claro, há várias definições de equilíbrio, cada

uma compatível com as hipóteses sobre a forma como os agentes interagem.

Nestes capítulos estaremos concentrados na idéia de equilíbrio competitivo,

em que os agentes encaram os preços como parâmetros fora de seu controle.

A idéia de equilíbrio competitivo parte da hipótese de que o efeito sobre os

preços da ação individual de qualquer um dos pariticipantes (indivíduos ou

firmas) é desprezível. No jargão tradicional, dizemos que os indivíduos são

tomadores de preços.

41

Page 43: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 3. EQUILÍBRIO PARCIAL 42

Em princípio, sabemos que a demanda de cada bem depende dos preços

de todos os outros bens. Similarmente, a demanda de insumos e a oferta

de produtos também é função de todos os preços. Portanto, esta busca de

prover de consistência mútua as ações individuais nos leva a considerar a

interação de todos os mercados na economia. Fazemos isso em um ambiente

competitivo usando os modelos de equilíbrio geral.

No entanto, começaremos a apresentação da idéia de equilíbrio a par-

tir de uma simplificação (por vezes extremamente útil) do modelo em que

somente um mercado é analisado: o modelo de equilíbrio parcial.

3.1 Definição e Conceitos Relevantes

3.1.1 Descrição do ambiente

Consideraremos o comportamento competitivo: todos os agentes tomam

os preços como dados - i.e., consideram-se incapazes de afetar o preço de

equilíbrio.

A justificativa usual para esta hipótese é de que firmas e consumidores

são “pequenos” em relação ao mercado. A idéia de equilíbrio parcial é que

podemos estudar isoladamente um determinado mercado, sempre que ele

for pequeno para a economia como um todo, de tal forma que podemos

desprezar não somente os efeitos do que acontece nesse mercado sobre os

preços dos outros mercados mas também os efeitos-renda associados.

Finalmente, estaremos, neste capítulo, considerando o ambiente de fir-

mas de produto único.

3.1.2 Oferta

A função oferta de mercado é uma função que mapeia para cada vetor de

preços de insumos e preço dos produtos, um vetor de demanda de insumos e

de oferta do produto por todas as firma da economia. Concentraremo-nos na

representação gráfica da função oferta do produto. Os preços dos insumos

serão parâmetros determinantes das curvas de oferta, cujas mudanças ger-

arão mudanças nas curvas de oferta.

Assim focando na curva de oferta de um bem entendida como a função

que associa a cada preço do produto a quantidade ótima de produtos a ser

Page 44: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 3. EQUILÍBRIO PARCIAL 43

ofertada pela totalidade das firmas, temos que a oferta de mercado é simples-

mente a soma das ofertas das firmas. No entanto, cabe distinguir a oferta de

longo e de curto prazos.

3.1.2.1 Curto Prazo

No curto prazo, o número de firmas numa determinada indústria é fixo.

Seja J ≡ {1, ..., I} um conjunto de índices representando J firmas individu-

ais. Seja xj (p,w) a função oferta da firma j do bem x, onde p é o preço do

bem ew é o vetor de todos os preços dos insumos utilizados na produção do

bem.

A oferta de mercado do bem é

xs (p,w) ≡∑j∈J

xj (p,w) .

3.1.2.2 Longo Prazo

Há dois efeitos importantes no longo prazo. Primeiro, não há fatores

fixos. Segundo, o número de firmas que operam no longo prazo é variável.

Ou seja, há que se considerar entrada e saída de firmas na indústria.

[Saída] Se o preço é superior ao custo médio da firma, não compensa para

ela permanecer no mercado. Assim esperamos ver a saída de todas as firmas

para as quais o preço seja superior ao custo médio.

[Entrada] Livre entrada ou barreiras à entrada?

Em algumas indústrias há barreiras legais ou tecnológicas à entrada.

Em outras há livre entrada, então esperamos que se houver lucro a ser

realizado, novas empresas entrem nessa indústria.

No longo prazo, firmas podem entrar ou sair de uma indústria. Portanto,

o número de firmas em uma indústria é determinado endogenamente pelas

condições de equilíbrio.

3.1.2.3 Demanda

Assim como supusemos para as firmas, suporemos que consumidores

tomam preços como dados. Seja I ≡ {1, ..., I} um conjunto de índices repre-

sentando I consumidores individuais. Seja xi(p,p, yi

)a demanda marshal-

liana do indivíduo i pelo bem x, onde p é o preço do bem x, p é o vetor de

todos os preços dos outros bens e yi é a renda do consumidor i.

Page 45: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 3. EQUILÍBRIO PARCIAL 44

A demanda de mercado do bem x é, então

xd (p) ≡∑i∈I

xi(p,p, yi

)Nós sabemos que as funções de demandas individuais possuem as seguintes

propriedades: i) homogeneidade de grau zero, ii) equilíbrio orçamentário

(adding up) e iii) simetria e negatividade semi-definida da matriz de Slut-

sky.

Caso quase-linear No caso quase-linear, é fácil de ver que a demanda é

negativamente inclinada enquanto a oferta é positivamente inclinada. Com

um pouco mais de hipóteses (por exemplo, separabilidade) podemos ver que

a demanda depende somente do preço do bem.

Quais são as propriedades da demanda de mercado? Nós sabemos que as

funções de demandas individuais possuem as seguintes propriedades: ho-

mogeneidade de grau zero, equilíbrio orçamentário (adding up) e simetria e

negatividade semi-definida da matriz de Slutsky. Quais são as propriedades

da demanda de mercado? Como vimos no capítulo de agregação, a conse-

qüência do resultado de Sonenschein-Mantel-Debreu é de que a agregação

destrói toda a estrutura da demanda, deixando somente a homogeneidade

de grau zero em (p,p,y) , onde y =(y1, ..., yI

).

Definição 1 Um equilíbrio de mercado (de curto prazo) da indústria produtora de

x é um par (x∗, p∗) tal que

xd (p,p,y) = xs (p,w) .

No longo prazo, firmas podem entrar ou sair de uma indústria. Portanto,

o número de firmas em uma indústria é determinado endogenamente pelas

condições de equilíbrio.

Um equilíbrio de mercado da indústria produtora de x no longo prazo é um trio{p, x, J

}tal que

xd (p,p,y) p =J∑j=1

xj (p,w) = x

πj (p,w) = 0, ∀j = 1, ..., J

Page 46: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 3. EQUILÍBRIO PARCIAL 45

3.2 Eficiência

Como procuramos deixar claro desde o início, o único conceito de efi-

ciência amplamente aceito pela profissão é o conceito de eficiência de Pareto.

Uma alocação é dita eficiente de Pareto sempre que for impossível melhorar

um indivíduo sem piorar outrem.

Em alguns casos, porém, é possível usar algumas ’estatísticas suficientes’

de bem-estar, sem explicitar os indivíduos. No caso do equilíbrio parcial,

consideraremos duas medidas: o excedente do consumidor e o excedente do

produtor.

Vimos anteriormente, que sob condições bastante restritivas, as variações

do excedente do consumidor representam variações efetivas do bem-estar do

consumidor. Quanto ao excedente do produtor, comecemos por sua definição.

Definimos o excedente do produtor como a receita da firma acima do seu

custo variável.

Neste caso, o excedente total é dado pela soma do excedente do con-

sumidor e o excedento do produtor. Se a soma destes excedentes não for

o máximo factível há espaço para melhoras de Pareto, desde que haja uma

eventual compensação entre ganhadores e perdedores de uma variação nos

preços.

CS + PS =

{ˆ x

0p (x) dx− p (x) x

}+ {p (x) x− CV (x)}

=

ˆ x

0p (x) dx− CV (x)

Note, porém, que c (x) = cf + cv (x) , donde

c (x) = cf +

ˆ x

0c′ (x) dx.

Assim,

CS + PS =

ˆ x

0

[p (x)− c′ (x)

]dx.

O nível de produção que maximiza CS + PS é dado por

d

dx

(ˆ x

0

[p (s)− c′ (s)

]ds

)= p (x)− c′ (x) = 0.

Preferências quase-lineares

Page 47: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 3. EQUILÍBRIO PARCIAL 46

Podemos tornar precisa a análise de equilíbio parcial se adotarmos as

seguintes hipóteses:

Preferências: Para todo h, uh(mh, xh

)≡ mh + φh

(xh).

Tecnologia: Firmas usam m como insumo para produção de x de tal forma

que a tecnologia da firma f é

Y f ≡ {(−m,x) ;x ≥ 0 m ≥ cf (x)}

Note que a solução do problema de maximização de lucro de cada firma

f define

πf (p) ≡ maxx{px− cf (x)}

além de

xf (p) ≡ arg maxx{px− cf (x)}

O consumidor h por sua vez resolve

maxxh≥0mh + φh

(xh)

s.a. mh + pxh ≤ mh +∑f

θhfπf (p)

onde supusemos que a dotação inicial dos indivíduos é composta somente

de numerário, xh =(mh, 0

)’.

O problema do consumidor tem por condição de primeira ordem

φ′h

(xh)

= p,

o que nos permite achar xh (p) e

mh (p) ≡ mh +∑f

θhfπf (p)− xh (p)

como resíduo.

Ou seja, podemos olhar somente para o mercado do bem x enquanto

deixamos o numerário subjacente. Neste caso, um equilíbrio do mercado do

bem x é um preço p∗ e uma alocação({xh (p∗)

}Hh=1

,{xf (p∗)

}nf=1

)com

∑h

xh (p∗) =∑f

xf (p∗) .

Preferências quase-lineares são também muito úteis para a análise de

bem-estar. Primeiro, como já vimos, para cada consumidor, a variação do

Page 48: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 3. EQUILÍBRIO PARCIAL 47

excedente do consumidor passa a ser uma medida exata de mudança de

bem-estar. Em segundo lugar, não precisamos especificar uma função de

bem-estar social (ou pesos de Pareto) específica.

Uma alocação eficiente sempre resolverá

max∑h

φh

(xh)−∑f

cf

(xf)

s.t.∑h

xh ≤∑f

xf .

Ou seja, em uma alocação eficiente de Pareto, devemos ter.

φ′h

(xh)

= λ ∀h

c′f

(xf)

= λ ∀f∑h

xh =∑f

xf

Quanto ao equilíbrio, note que xh (p) é decrescente em p já que φ′′h (x) dx =

dp e φh é uma função côncava para todo h. Donde∑

hxh (p) é decrescente

em p. De forma similar, para todo f , xf (p) é uma função crescente em p já

que c′′f (x) dx = dp, onde cf é uma função convexa. Então temos uma curva

de oferta contínua e positivamente inclinada e uma curva de demanda con-

tínua e negativamente inclinada.

O equilíbrio ocorre em um ponto onde os indivíduos maximizam utili-

dade,

φ′h

(xh)

= p ∀h

as firmas maximizam lucro

c′f

(xf)

= p ∀f

e oferta igual a demanda

∑h

xh (p) =∑f

xf (p) .

Note que, as condições de equilíbrio são idênticas às de eficiência fazendo

λ = p.

Essa é uma manifestação do primeiro teorema de bem-estar.

Page 49: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 3. EQUILÍBRIO PARCIAL 48

3.2.0.4 Elasticidade

Assim como no caso da demanda individual, podemos considerar a elasticidade-

preço da demanda do bem.

ε ≡∣∣∣∣∂xd (p,p,y)

∂p

p

xd (p,p,y)

∣∣∣∣Elasticidades

ε > 1⇒ demanda elástica

ε = 1⇒demanda de elasticidade unitária

ε < 1⇒ demanda inelástica

3.2.0.5 Relação entre Elasticidade e Receita

Receita é dada por

R (p,p,y) ≡ xd (p,p,y) p

Logo,

∂R (p,p,y)

∂p=xd (p,p,y) p

∂p+ xd (p,p,y)

= xd (p,p,y) [1− ε]

Ou seja,∂R (p,p,y)

∂p> 0

se e somente se ε < 1 (a demanda é inelástica)

3.2.0.6 Relação entre Elasticidade e Receita Marginal

Nesse caso, a pergunta é: o que acontece com a receita quando a quanti-

dade aumenta? Para respondê-la, consideremos a demanda inversa:

p = pd (x)

A receita é então definida como

R∗ (x) ≡ pd (x)x

Page 50: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

c©Carlos E da Costa 49

A receita marginal será então:

∂R∗ (x)

∂x=∂pd (x)x

∂x+ pd (x)

= pd (x)

[∂pd (x)

∂x

x

pd (x)+ 1

]= pd (x)

[1− 1

ε

]Logo, a receita marginal é positiva se e somente se ε > 1 (a demanda é

elástica)

3.3 Monopólio

O que acontece com uma indústria em que somente uma firma opera e

em que a entrada de outras firmas seja proibida? Neste caso, a hipótese de

que a firma é tomadora de preços carece de sentido. A firma está consciente

de que ao expandir a quantidade ofertada do bem, o preço vai variar.

A primeira coisa importante a perceber, é que, neste caso, a curva de

oferta não está definida. Lembremos. Curva de oferta é uma função que

associa a cada preço a oferta ótima de produto da firma. O pressuposto uti-

lizado na definição de tal curva é de que a firma ao fazer a sua escolha não

afeta preço. Ou seja, preço é a variável exógena do problema da firma. No

caso do monopólio, isto não mais é verdade, a escolha da firma afeta o preço.

Ao analizar a escolha ótima da firma, podemos proceder de duas maneiras

alternativas: supor que a firma escolhe preços, ciente de que isto afeta a

quantidade demandada em equilíbrio, ou; supor que a firma escolhe a quan-

tidade ofertada sabendo que isto determina o preço de equilíbrio, dada a

curva de demanda pelo produto.1 É possível, então mostrar que, sob monopólio,

p (q∗) > c′ (q∗) . O nível de produção é sub-ótimo.

1Isto é em contraste com o caso do oligopólio, em que a escolha de preços (concorrência à

la Bertrand) ou quantidades (concorrência à la Cournot) na definição do espaço de estratégias

altera a natureza do equilíbrio.

Page 51: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

Capítulo 4

Equilíbrio Geral

Ao analisarmos um mercado isoladamente, supusemos que o mercado

era suficientemente pequeno para que as mudanças que implementamos não

tivessem impacto no resto da economia. Isto é uma boa aproximação para al-

guns mercados e não para outros. Neste capítulo relaxaremos essa hipótese

deixando explícita a interação entre os vários mercados: o modelo de equi-

líbrio geral.

Além de se aplicar a situações para as quais a aproximação do equilíbrio

parcial não é boa, a abordagem de equilíbrio geral, tem a vantagem de ser

auto-contida. A partir dos primitivos da economia todos os preços e rendas

individuais são determinados.

São questões fundamentais a serem estudadas: existência, unicidade e

eficiência.

Ou seja, uma vez definido o conceito de equilíbrio competitivo, a primeira

pergunta é sob que condições podemos garantir que um equilíbrio exista.

Uma segunda questão importante é se o equilíbrio é único. A questão

da unicidade torna-se importante para o poder preditivo da teoria. Tam-

bém importante, a unicidade, neste caso o conceito (muito) menos exigente

de unicidade local, torna-se imporante quando o interesse é a condução de

exercícios de estática comparativa.

Finalmente, o que podemos dizer das propriedades de bem-estar do equi-

líbrio? Equilíbrios são eficientes no sentido de Pareto? Alocações eficientes

no sentido de Pareto são equilíbrios competitivos?

50

Page 52: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 51

Nas próximas páginas vamos fazer uma breve revisão do modelo de

equilíbrio geral em um ambiente bastante simples. Começando pela de-

scrição do ambiente.

4.1 Descrição do ambiente

Firmas são indexadas por f = 1, ...,m. e caracterizadas por uma tec-

nologia representada por um conjunto de possibilidades de produção Yf .

Suporemos que as firmas são tomadoras de preços e maximizadoras de lu-

cro.

Consumidores (às vezes indevidamente chamados de domicílios) são

indexados por h (h = 1, ...H) e caracterizados por suas preferências <h

racionais e contínuas, portanto representáveis por função utilidade uh (·),

suas dotações iniciais xh ∈ Rn+ e suas participações acionárias nas firmas

θh ∈ [0, 1]F .

Ou seja, os consumidores, indexados por h = 1, ...,H , são caracterizados

por:

1. Um conjunto de consumo Xh;

2. Uma função utilidade uh : Xh → R que representa preferências definidas

sobre o conjunto Xh;

3. Uma dotação inicial xh; e

4. Um vetor de participações nos lucros das firmas θh ≡ (θh1 , θh2 , ..., θ

hm).

Pela definição de participação acionária que usamos, para todo f ,∑

h θhf =

1.

Ambiente de Transações Trata-se de uma economia competitiva. Agentes

tomam preços como dado, ou seja, não acreditam que suas ações possam afe-

tar os preços de mercado. Domicílios e firmas agem de forma independente

e somente se relacionam via sistema de preços. Inexistem externalidades e

bens públicos.

4.2 Definição de equilíbrio

Vamos agora introduzir o vocabulário desta linguagem de equilíbrio geral.

Page 53: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 52

Definição 2 Uma alocação é uma lista ({xh}Hh=1

,{yf}nf=1

) em que, para todo

h, xh ∈ Xh é um vetor de consumos para o agente h e para todo f, yf ∈ Yf é um

vetor de produções da firma f.

4.2.1 Escolhas ótimas

Por hipótese os consumidores e as firmas são tomadores de preços, assim,

podemos representar suas escolhas ótimas como:

1) Problema do Consumidor

maxx

uh (x)

s.a. px ≤ pxh + θhπ (p)

Onde π (p) tem por entradas os lucros das firmas, πf (p), que, por sua vez

são dados por:

2) Problema da Firma

maxy∈Yf

py.

A solução do problema da firma f é a função oferta yf (p) [naturalmente

πf (p) = pyf (p)]. Vale também notar que a solução do problema do con-

sumidor h nos dá a demanda marshalliana xh(p, pxh + θhπ (p)). Note que

a renda individual Ih é dada por pxh + θhπ (p) . Como x e θh são primi-

tivos do problema temos que a renda individual é uma função de p somente.

Podemos, então definir a demanda individual xh (p) ≡ x(p,pxh + θhπ (p)).

Demanda Agregada Como xh (p) é uma função de p, dados os primitivos da

economia, podemos escrever a demanda agregada comoX (p) =∑

h xh (p) .

Oferta Agregada A oferta total das firmas é dada por Y (p) =∑

f yf (p) .

À oferta das firmas adicionamos a dotação inicial de recursos da economia

X =∑

h xh para definir a oferta agregada da economia Y (p) + X .

Assim, temos que a demanda excedente é

Z (p) = X (p)− X − Y (p) .

4.2.2 Normalizações e Identidade de Walras

Antes de apresentarmos a definição formal de equilíbrio, porém algumas

considerações são necessárias. Primeiro, cabe notar que, somente preços rel-

Page 54: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 53

ativos são relevantes nesta economia, o que quer dizer que se tem direito a

uma normalização.

É natural definirmos equilíbrio como uma situação em que, para todo

bem i, Zi (p) ≤ 0, com Zi (p) = 0 para pi > 0. Ou seja, um equilíbrio é uma

situação em que; i) a demanda é igual à oferta; ou ii) a oferta é não inferior

à demanda e o preço do bem é 0. Concentremo-nos no caso em que pi > 0

para todo bem i.

Desconsiderando a segunda possibilidade para facilitar o argumento, bus-

camos um vetor de preços p∗ tal que Z (p∗) = 0. Note que temos n preços

(incógnitas) em n equações, o que parece nos deixar otimistas quanto à pos-

sibilidade de encontrarmos uma solução, p∗. No entanto, há algumas con-

siderações a serem feitas.

Porém, lembrando que Z (p) é homogênea de grau 0 em p, temos que

Z (p) = 0 implica emZ (αp) = 0 para todo α > 0.Ou seja, temos n equações

em n− 1 incógnitas. Parece que estamos em maus lençóis!

No entanto, a identidade de Walras, que apresentaremos a seguir, permite

ver que somente n− 1 equações são independentes. E nosso sistema volta a

ter tantas equações quanto incógnitas.

Para mostrar a identidade de Walras note que, para todo domicílio h, vale

o seguinte

pxh (p) ≤ pxh + θhπ (p) .

No caso em que nos concentraremos, em que os domicílios são não-

saciados localmente, teremos que as restrições orçamentárias individuais serão

respeitadas como igualdade. A desigualdade acima torna-se pxh (p) = pxh+

θhπ (p) ∀h. Logo, ∑h

pxh (p) =∑h

pxh +∑h

θhπ (p)

=∑h

pxh +∑f

pyf (p) .

Portanto,

p[X (p)− X − Y (p)

]= pZ (p) = 0.

Ou seja,∑n

i=1piZi (p) = 0. Note que o vetor de preços escolhido é um

vetor arbitrário. Como conseqüência, só precisamos considerar o equilíbrio

Page 55: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 54

em n− 1 mercados, já que

∑n−1i=1 piZi (p) = 0 =⇒ pnZn (p) = 0

=⇒ Zn (p) = 0.

Em palavras,

Comentário 1 Se n−1 mercados estiverem em equilíbrio o n-ésimo também estará.

4.2.3 Equilíbrio: definição formal

Vamos agora formalizar a definição de equilíbrio.

Definição 3 (Definição de Equilíbrio) Dada uma economia de propriedade privada

especificada por meio de({Xh,%h, x

h}Hh=1

,{Yf}mf=1

,{θh1 , .., θ

hm

}Hh=1

),

uma lista(p, {xh}Hh=1, {y

f}nf=1

)é um equilíbrio competitivo se

1. xh ∈ Xh ∀h.

2. yf ∈ Yf , ∀f ;

3.∑

ipixhi ≤

∑ipix

hi +

∑i

∑fθhf piy

fi ,∀h;

4. Para todo h temos que xh %h xh para todo xh ∈ Xh tal que px ≤ pxh +θh

π (p) ;

5. Para todo f temos que pyf ≥ py para todo y ∈ Yf ; e

6. X ≤ Y + X, onde X =∑h

xh, Y =∑f

yf e X =∑h

xh.

Traduzindo, consumidores maximizam a utilidade (supondo que as prefer-

ências %h são racionais e contínuas); firmas maximizam lucro; e não há ex-

cesso de demanda. No que se segue, serão de nosso interesse: i) mostrar

existência de equilíbrio e ii) apresentar os dois teoremas de bem estar.

Page 56: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 55

4.3 Existência

A formulação matemática do modelo de equilíbrio geral data de 1874

quando Leon Walras publicou seu ’Les Eléments d’économie politique pure’.

No entanto, foram necessários mais 80 anos até que a prova formal de ex-

istência fosse finalmente alcançada com Arrow and Debreu [1954] e McKen-

zie [1954]. A demonstração de existência faz uso do Teorema de Kakutani de

1941.

O teorema é o seguinte. Seja K um conjunto não-vazio, compacto e con-

vexo de dimensão finita. Associe a cada ponto, x, emK um sub-conjunto não

vazio e convexoϕ (x) deK, e suponha que o gráfico,G = {(x, y) ∈ K ×K; y ∈ ϕ (x)}da transformação seja fechado. Então, ϕ tem um ponto fixo, i.e., um ponto

x∗ que pertence a sua própria imagem ϕ (x∗) .

Definindo a economia de tal forma que: os conjuntos de consumo dos

agentes, os conjuntos de produção são fechados e convexos, as relações de

preferências são racionais convexas e contínuas, existe um ínfimo em cada

coordenada do conjunto de consumo, os agentes são não-saciáveis e a tec-

nologia é irreversível (y ∈ Y e −y ∈ Y =⇒ y = 0) e permite free-disposal é

possível aplicar o teorema de Kakutani às demandas excedentes e provar a

existência de equilíbrio.

Várias destas hipóteses podem ser relaxadas: irreversibilidade da pro-

dução, free disposal e mesmo racionalidade das preferências, no caso de

economias com um número finito de agentes. Convexidade das preferên-

cias também é passível de ser relaxada no caso de economias com contínuo

de agentes, mas não do conjunto de consumo agregado. Nós, porém, vamos

tomar o caminho inverso e impor mais estrutura nas preferências, dotações

e tecnologia de forma a tornar os argumentos mais simples.

Suponha que o vetor de demanda excedenteZ(p) tenha as sequintes pro-

priedades:

1. Z(p) é contínuo em Rn++

2. pZ(p) = 0 para todo p � 0.

3. Se {pm} é uma sequencia de vetores de preços em Rn++ convergindo

para p 6= 0, e pk = 0 para algum bem k então para algum bem k′ com

Page 57: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 56

pk′

= 0 a sequencia de demandas excedentes no mercado deste bem,

{zk′(pm)}, é ilimitada superiormente.

então existe um vetor de preços p∗ � 0 tal que Z(p∗) = 0.

4.3.1 Economia de Trocas

Em uma economia de trocas, as condições impostas sobre a demanda

excedente são satisfeitas, por exemplo, se:

1. [condição sobre as preferências] A função utilidade uhé contínua, forte-

mente crescente e estritamente quase-côncava em Rn+.

2. [condição sobre as dotações iniciais] A dotação agregada é tal que∑

i xh �

0.

4.3.2 Economia com Produção

Para extendermos o resultado para o caso de produção, temos que garan-

tir que para todo vetor de preços p � 0 a solução do problema da firma seja

único (denotado por yf (p)), que yf (p) seja contínuo em Rn++ e que a função

lucro πf (p) seja contínua e bem definida em Rn++ .

Para que estas propriedades sejam observadas vamos impor as seguintes

restrições nos conjuntos de possibilidade de produção:

1. 0 ∈ Yf

2. Yf ∩ Rn+ = {0}

3. Yf é fechado e limitado

4. Yf é fortemente convexo. I.e., dados y1 ∈ Yf e y2 ∈ Yf com y1 6= y2

então para todo t ∈ (0, 1) existe y ∈ Yf tal que y > ty1 + (1− t)y2.

Se uma economia é tal que as preferências dos consumidores satisfazem 1,

a tecnologia satisfaz as condições acima e y +∑

h xh � 0 para algum vetor

de produção agregado y ∈∑

f Yf então existe um vetor de preços p∗�0 tal

que z(p∗) = 0.

Page 58: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 57

4.4 Eficiência: Teoremas de Bem-estar

Para que aprensentemos os teoremas de bem-estar precisamos de algu-

mas definições.

Definição 4 Uma alocação ({xh}Hh=1, {yf}nf=1) é dita factível se∑h

xh ≤∑h

xh+∑f

yf .

Ou seja, alocações factíveis são aquelas tais que os indivíduos não con-

somem mais do que aquilo que existe após as decisões de produção das fir-

mas.

Primeiro, porém, a definição de eficiência.

Definição 5 Uma alocação factível é dita Pareto-eficiente se não existe nenhuma

outra alocação factível tal que xh %h xh para todo h e xh �h xh para pelo menos

um h.

Os dois teoremas de bem-estar vão relacionar alocações eficientes com as

resultantes de um equilíbrio competitivo.

4.4.1 1o Teorema do Bem-estar social

O primeiro teorem diz, essencialmente, que: se todo bem relevante é ne-

gociado em um mercado com preços conhecidos publicamente (ou seja, se

mercados são completos) e as firma e os domicílios são tomadores de preços

entrão o resultado de mercado é Pareto ótimo. Em poucas palavras, com

mercados completos todo equilíbrio competitivo é necessariamente Pareto

eficiente.

Formalmente, temos o teorema a seguir.

Teorema 4 Seja({xh}Hh=1, {y

f}nf=1, p)

um equilíbrio competitivo com nenhum

consumidor localmente saciado, então({xh}Hh=1, {y

f}nf=1

)é um ótimo de Pareto.

Prova. Suponha({xh}Hh=1, {y

f}nf=1, p)

seja um equilíbrio competitivo

de uma economia especificada por meio de({Xh,%h, x

h}Hh=1

,{Yf}mf=1

,{θh1 , .., θ

hm

}Hh=1

),

Page 59: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 58

e suponha que({xh}Hh=1, {y

f}nf=1

)não seja Pareto eficiente. Ou seja, existe

uma alocação factível({xh}Hh=1, {y

f}nf=1

)tal que xh %h x

h para todo h com

pelo menos um h tal que xh �h xh.Note que xh %h x

h implica em pxh ≥ pxh já que xh foi escolhida. De fato, se

as preferências forem não-saciadas, então pxh > pxh para aquele indivíduo

tal que xh �h xh.Somando as desigualdades temos que∑

h

pxh >∑h

pxh (4.1)

Ora, sabemos que ∑h

xh =∑h

xh +∑f

yf

e ∑h

xh =∑h

xh +∑f

yf

já que ambas as alocações são factíveis. Pre-multiplicando esta expressão por

p, e usando (4.1) tem-se ∑f

pyf >∑f

pyf ,

o que implica em pyf > pyf e yf ∈ Yf para pelo menos um f. O que viola a

hipótese de maximização de lucro subjacente ao conceito de equilíbrio. Uma

contradição.

4.4.2 2o Teorema do Bem-estar social

No caso do segundo teorema do bem-estar social, sua importância reside

no fato de que, se válido, qualquer alocação eficiente pode ser atingida com

uma simples redistribuição das dotações iniciais seguida do mecanismo de

mercado.

Teorema 5 Suponha que({xh}Hh=1, {y

f}nf=1

)é um ótimo de Pareto tal que pelo

menos um domicílio não esteja saciado. Então, com:

i) Preferências convexas;

ii) Conjuntos de produção convexos;

iii) Alocação xh ∈ Xh, para todo h, e;

Page 60: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 59

iv) Continuidade das preferências,

então existe p, tal que(p, {xh}Hh=1, {y

f}nf=1

)é um equilíbrio competitivo.

Em palavras, se as preferências individuais e os conjuntos de possibil-

idade de produção das firmas são convexos, existe um conjunto completo

de mercados com preços publicamente conhecidos e todos os agentes são

tomadores de preços, então toda alocação Pareto eficiente pode ser alcançada

como o equilíbrio competitivo para uma distribuição adequada das dotações

iniciais.

A demonstração do segundo teorema faz uso de teorema de hiperplano

separador (daí a importância da convexidade das preferências e dos conjun-

tos de possibilidade de produção.

Cabe notar que a grande dificuldade com o segundo teorema é garantir

a existência de equilíbrio, o que é um primitivo no primeiro teorema.

4.5 Exemplos

No que se segue, vamos mostrar alguns exemplos de economias simples

em que os resultados aparecem de forma mais evidente.

4.5.1 Economia de troca (modelo 2x2)

Por simplicidade, consideraremos uma economia que consiste de dois

agentes, e dois bens. A economia de troca é então completamente caracteri-

zada pelas preferências e pelas dotações iniciais dos dois agentes.

Cada agente possui uma dotação inicial de cada bem de xj ≡ (xj1, xj2).

Uma alocação é um vetor (x1, x2), onde xj = (xj1, xj2).

Os recursos totais de uma economia de trocas nada mais são do que a

soma das dotações iniciais de todos os agentes: x ≡∑

j=1,2xj .

Como essa é uma economia de trocas, i.e., sem produção, então uma alo-

cação somente é viável se ∑j=1,2x

j ≤∑

j=1,2xj . (4.2)

Admitiamos que o vetor de preços dessa economia seja p.O problema de

otimização do agente j é

maxx

uj (x) s.a. px ≤ pxj

Page 61: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 60

Isso define, de um lado, a demanda Marshalliana xj(p,pxj

)e de outro a

chamada demanda excedente (ou demanda líquida)

zj (p) ≡ xj(p,pxj)− xj .

Note que a viabilidade (4.2) corresponde a

∑j=1,2

(xj − xj

)≤ 0, ou∑

j=1,2zj (p) ≤ 0

A demanda excessiva agregada nada mais é do que

z (p) ≡∑

j=1,2zj (p)

portanto poderemos escrever a viabilidade como z (p) ≤ 0. Quais as pro-

priedades?

1. Continuidade: z (p) é contínua em p.

2. Homogeneidade: z (λp) = z (p) ∀λ > 0.

3. Lei de Walras: pz (p) = 0.

A lei de Walras diz que a demanda excedente agregada tem valor 0 para

qualquer vetor de preços positivos. Decorre do fato de que, quando as prefer-

ências são estritamente monotônicas, a restrição orçamentária de todos os

agentes pode ser escrita como uma igualdade.

Neste caso, para todos os agentes,

pzj (p) =∑

i=1,2pi

(xji (p,px

j)− xji)

= 0.

Logo, ∑j=1,2

∑i=1,2

pi

(xji (p,px

j)− xji)

= 0

Como a ordem da soma é irrelevante,∑i=1,2

∑j=1,2

pi

(xji (p,px

j)− xji)

= 0∑i=1,2

pi

[∑j=1,2

(xji (p,px

j)− xji)]

︸ ︷︷ ︸zi(p)

= 0

Page 62: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 61

Donde,

pz (p) = 0

Uma conseqüência importante da Lei de Walras é que

p1z1 (p) = −p2z2 (p)

ou seja, se um mercado está com excesso de demanda, zi (p) > 0, ou outro

está com excesso de oferta z−i (p) < 0.

A questão inicial a ser respondida é se existe equilíbrio nesta economia.

Existência Se as preferências são representadas por uma função utilidade ui, con-

tínua, estritamente crescente, e estritamente quase-côncava, e se a dotação

total da economia é estritamente positiva para todos os bens então existe equi-

líbrio walrasiano.

4.5.1.1 Teoremas de Bem-Estar

O critério de eficiência que utilizamos é eficiência no sentido de Pareto.

Uma alocação x é dita eficiente no sentido de Pareto se não existir uma

forma de melhorar uma pessoa sem piorar outra.

1o Teorema de Bem-Estar (Mão Invisível) Considere uma economia de trocas(ui, xi

)i=1,2

, onde ui é contínua e estritamente crescente para todo i. Então

todo equilíbrio walrasiano é Pareto eficiente.

Suponha que não é este o caso. Seja, então x∗ a alocação do equilíbrio com-

petitivo e x uma alocação tal que

x ≤ x, xi < xi (i = 1, 2),

com xi � x∗i para um dos dois.

Suponha, sem perda de generalidade, x1 � x∗1. Por se tratar de uma cesta

preferível a x1, para o agente 1, então, necessariamente, px1 > px1. Por

outro lado, minimização de custos implica em que px2 ≥ px∗2 = px2. Logo,

p(x2 + x1

)> p

(x2 + x1

), o que mostra que a alocação não é factível (viola

lei de Walras).

Pressupostos Implícitos: i) não há externalidades no consumo; ii) econo-

mia competitiva e iii) existe um equilíbrio.

Page 63: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 62

Implicações do 1TBE: os preços são estatística suficiente para todas as infor-

mações de que os agentes precisam para seu processo decisório.

2o Teorema de Bem-Estar Considere uma economia de trocas(ui, xi

)i=1,2

, onde

ui é constínua, estritamente crescente e estritamente côncava para todo i. En-

tão, se x∗ é uma alocação eficiente, x∗ é a alocação correspondente ao equilíbrio

Walrasiano da economia(ui,x∗i

)i=1,2

- i.e., a economia cuja dotação inicial é

x = x∗.

Implicações do 2TBE: Os problemas de distribuição e alocação podem ser

separados. Podemos redistribuir as dotações de bens para avaliar a riqueza

dos agentes e usar os preços para indicar a escassez relativa.

4.5.1.2 Alocações Eficientes de Pareto.

Considere o seguinte problema de Pareto,

maxx1,x2

u1

(x1)

s.a.

∣∣∣∣∣∣ u2

(x2)≥ u

x1 + x2 ≤ x1 + x2

Associado a ele temos o Lagrangeano,

L = u1

(x1)

+ µ[u2

(x2)− u]

+ γ[x1 + x2 −

(x1 + x2

)],

cujas condições de primeira ordem são

∂1u1

(x1)

= γ1, ∂2u1

(x1)

= γ2

µ∂1u2

(x2)

= γ1, µ∂2u2

(x2)

= γ2

u2

(x2)

= u x1 + x2 ≤ x1 + x2

Logo,∂1u1

(x1)

∂2u1 (x1)=γ1

γ2,

∂1u2

(x2)

∂2u2 (x2)=γ1

γ2

Donde,∂1u1

(x1)

∂2u1 (x1)=∂1u2

(x2)

∂2u2 (x2)

Page 64: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 4. EQUILÍBRIO GERAL 63

4.5.1.3 Equilíbrio Competitivo

Para a mesma economia vamos, agora examinar o equilíbrio competitivo.

Para, i = 1, 2, o problema de otimização individual, para preços p é

maxxi

ui(xi)

s.a. p(xi − xi

)≤ 0

cujas condições de primeira ordem são

∂1ui(xi)

= λip1,∂ui

(xi)

∂xi2= λip2,

além de p(xi − xi

)= 0, o que implica em

∂1ui(xi)

∂2ui (xi)=p1

p2i = 1, 2.

Donde,∂1u1

(x1)

∂2u1 (x1)=∂1u2

(x2)

∂2u2 (x2),

como no problema de Pareto.

Obviamente, para que isso seja um equilíbrio competitivo é necessário

que p seja tal que,

x (p)− x = 0,

isto é

x1 + x2 = x1 + x2.

Exemplo Suponha dois agentes idênticos com preferências representadas

por

U (x1, x2) ≡ log x1 + log x2

e dotações x1 = (2, 0) e x2 = (0, 2) .

Escolhamos o bem 1 como numerário, ou seja, p1 = 1 e p2 = p.

maxxi

{log xi1 + log xi2

}s.t. p

(xi − xi

)≤ 0

1

xi1= λi,

1

xi2= λip

Para o agente 1 :1

λ1+

1

λ1= 2

Page 65: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

c©Carlos E da Costa 64

Para o agente 2 :1

λ2+

1

λ2= 2p

Logo, λ1 = 1, λ2 = 1/p.

Assim,x1

1 = 1, x12 = 1/p

⇓z1

1 = −1, z12 = 1/p

e

x21 = 1/p x2

2 = 1

⇓z2

1 = 1/p z22 = −1

Em equilíbrio, z = 0, ou seja,

z11 + z2

1 = −1 + 1/p = 0

logo o preço de equilíbrio p∗ = 1. E o mercado do bem 2. Será que preciso

me preocupar com ele? Não. Lembrem da Lei de Walras, se n− 1 mercados

estão em equilíbrio, o n-ésimo mercado também estará.

4.5.1.4 Monopólio na caixa de Edgeworth: ineficiência.

É possível mostrar que mesmo em uma economia de dotação, a presença

de monopólio gera uma perda de peso morto.

4.5.2 Economia de Robson Crusoé

Consideremos agora uma economia dotada de um agente representativo

com preferências representadas por u (x) e dotação inicial x.Nesta economia

existe uma firma representativa cuja tecnologia é representada pelo conjunto

de possibilidade de produção Y.

O problema do consumidor é

maxx u (x)

s.a. px ≤ px+ π (p)

onde π (p) é o lucro da firma representativa.

Naturalmente

π (p) ≡ maxy∈Y

py.

A solução do problema do consumidor e do problema da firma são, respec-

tivamente, x (p) e y (p) .

Um equilíbrio para essa economia é um vetor (x, y, p) tal que x = x (p) ,

y = y (p) e x ≥ x+ y.

Page 66: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

Capítulo 5

Macroeconomia e Agregação

Seguiremos em toda a nossa análise a idéia de que a macroeconomia não

é distinta da microeconomia, a não ser pelo foco. A macroeconomia está

sempre buscando alguma forma de agregação e está sempre em um contexto

de equilíbrio geral (exceto, possivelmente, no caso de pequenas economias

abertas). Também importante é o fato de que os modelos são sempre dinâmi-

cos.

Para alguns, porém, falar em uma única macro-economia pode parecer

reducionista dado que existem diferentes abordagens, notadamente, a sepa-

ração entre Novos Keynesianos e economistas neoclássicos.

No entanto, há muito mais consenso entre estas linhas do que havia entre

os chamados novos clássicos e os keynesianos tradicionais.1 Há, primeira-

mente uma concordância metodológica: todos concordam que análises de

políticas públicas não podem precindir de modelos estruturais com parâmet-

ros invariantes a mudanças nas políticas. Além disso, todos concordam com

o uso de uma mesma linguagem: modelos de equilíbrio geral dinâmicos

estocásticos (DSGE). A possibilidade de inclusão de vários tipos de fricção

permite acomodar várias visões de mundo distintas.

A grande diferença entre os neoclássicos e os novos keyneisanos parece

residir na visão que eles têm sobre como julgar os modelos. Os economis-

tas neoclássicos preferem modelos simples com poucos parâmetros obtidos

a partir de microdados. Esta postura parte da crença no fato de que nenhum

1Ver Chari, Kehoe e McGrattan (2008).

65

Page 67: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 66

modelo pode, ou deve pretender, ’fitar’ todos os aspectos dos dados. Já os

economistas novos keynesianos preferem modelos mais completos que pos-

suam um alto grau de aderência aos dados. O trade-off aqui reside no fato

de que os economistas de tradição clássica mantêm uma clara disciplina na

escolha dos parâmetros (para cada novo parâmetro introduzido, a evidência

micro deve ser fornecida) enquanto nos modelos novos keynesianos vários

parâmetros livres são introduzidos a cada momento.

Nestas notas, concentraremo-nos na tradição neoclássica.

5.1 Equilíbrio Geral Dinâmico

Como dissemos, a linguagem a ser usada é de equilíbrio geral dinâmico

e estocástico. Já vimos o modelo de equilíbrio geral em um capítulo anterior,

vamos agora ver o que a dinâmica acrescenta ao modelo.

A grande novidade na introdução da dinâmica é de natureza técnica.

Como o tempo é infinito, o espaço de escolhas dos indivíduos tem dimen-

são infinita (normalmente o espaço de seqüências limitadas, `∞), violando

uma das condições da prova de existência a que nos referimos no capítulo

XX. O problema aqui é que nem os conjuntos de consumo nem os conjuntos

factíveis precisam ser compactos para uma dada topologia. A abrodagem

aqui é escolher uma topologia conveniente para a economia em questão.

Um outro problema está na aplicação de teoremas de separação, que

no caso de dimensão infinita dependem somente de hipóteses de convexi-

dade, mas que no caso de dimensão infinita depende de hipóteses adicionais

muitas vezes não satisfeitas em modelos interessantes.

5.2 Equilíbrio recursivo

Boa parte da Macroeconomia moderna é baseada na existência de um

agente representativo (nossa economia de Robson Crusoé). Além disso, es-

tas economias são modeladas de forma recursiva. Em geral, resolvemos o

problema de um planejador benevolente que maximiza a utilidade de um

agente representativo. Na próxima seção, discutiremos o problema de agre-

gação e da existência de tal agente representativo além da forma como a

questão da existência se relaciona com o problema do planejador.

No que se segue, vamos levar a sério o fato de que as economias que

Page 68: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 67

observamos na prática não têm suas alocações determinadas por um plane-

jador central, mas resultam das complexas relações entre agentes privados

em um ambiente de mercados. A pergunta que fazemos, então, é, será que

existem seqüências de preços tais que, os indivíduos tomando suas decisões

de forma descentralizada alcançam tais alocações como um equilíbrio com-

petitivo?

Uma alternativa para responder a esta pergunta é usar o arcabouço orig-

inal de Arrow e Debreu e pensar em agentes que escolhem em um momento

inicial, contatos contingentes que determinam todas as suas alocações fu-

turas. De posse destes contratos os indivíduos jamais têm necessidade de

rever seus planos iniciais.

Alternativamente podemos buscar regras invariantes de decisão. Estas

regras de decisão determinam que escolhas fazer como função de um con-

junto limitado de variávies de estado. Estas regras de decisão, junto como as

realizações de choques exógenos determinam então, o valor das variáveis

de estado um período à frente. Neste caso, dizemos que a nossa econo-

mia tem uma estrutura recursiva. É importante notar que desde que estas

regras de decisão sejam invariantes no tempo, o modelo nos oferece impli-

cações testáveis que nos permitem aplicar de maneira fundamentada méto-

dos tradicionais de série de tempo.

O que vamos formalizar aqui é a idéia de um equilíbrio recursivo de uma

economia com agentes homogêneos. A referência principal aqui é Mehra

and Prescott [1980]. Note que o procedimento pode acomodar heterogenei-

dade entre os indivíduos. No entanto, as variáveis de estado tendem a ser

obejtos mais complexos (distribuições de riqueza, promessas de utilidade,

etc.) e algum cuidado tem que ser tomado para que os modelos permaneçam

tratáveis. Em contraste com o modelo de valoração de Arrow e Debreu, em

que nenhuma troca ocorre depois do período zero (caso permitíssemos a re-

abertura dos mercados) na representação recursiva, trocas ocorrem período

a período.

Formalmente, um e quilíbrio recursivo é caracterizado por funções in-

variantes no tempo de um número limitado de variáveis de estado que re-

sumem os efeitos de decisões passadas e informação corrente. Estas funções

Page 69: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 68

incluem (a) uma função de apreçamento; (b) uma função valor; (c) uma

função política especificando a decisão dos indivíduos; (d) um função política

especificando a decisão de cada firma, e; (e) uma função especificando a lei

de movimento do estoque de capital.

5.2.1 Um Exemplo

Vamos considerar o problema mais simples de crescimento em ambiente

com incerteza. A economia é composta de um contínuo de indivíduos idênti-

cos com relação a preferências e dotações. Cada indústria é composta de fir-

mas idênticas produtoras de capital e bens de consumo. Ao longo do tempo

os setores são sujeitos a choques tecnológicos. Comecemos com o problema

do planejador.

5.2.1.1 Problema do planejador:

w (k0, A0) ≡ maxE

{ ∞∑t=0

βtu (ct)

}sujeito a

ct + kt+1 ≤ Atf (kt, lt) , ∀t

A0, k0 dados, e lt = 1, ∀t.Tomando um formato funcional específico, u (c) ≡ ln c e f (k, l) ≡ kαl1−α,

o problema do planejador tem fórmula fechada:

ct = (1− αβ) kαt At e kt+1 = it = αβkαt At.

O que vamos mostrar é que o problem descentralizado tem exatamente

estas alocações em equilíbrio. Ou seja, vamos mostrar que as funções políti-

cas de consumo e investimento que surgem como solução deste problema

podem ser vistas como as funções investimento e consumo agregados asso-

ciadas a uma economia descentralizada de consumidores homogêneos.

5.2.1.2 Problema descentralizado:

Seja, kt o estoque de capital de propriedade de um indivíduo qualquer

(lembremos que cada indivíduo tem medida nula nesta economia). Defi-

namos então a variável kt como sendo a distribuição de capital entre os de-

mais membros da economia. A hipótese que fazemos é de que os indivíduos

Page 70: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 69

tomam kt como um dado. Definamos, então, as variáveis de estado do ponto

de vista do indivíduo, st ≡(kt, kt, At

)e as variáveis de estado que caracteri-

zam a economia como um todo como st = (kt, At).

Usamos, então os símbolos (c, i, k, l) para denotar os pontos no espaço

de commodities dos indivíduos e das firmas. Por exemplo, o c no espaço de

commodities da firma é uma função co (st) especificando a oferta de bens de

consumo por parte da firma em função do estado st.De forma similar, cd (st)

é a quantidade de bem de consumo demandada pelo indivíduo no estado st.

Naturalmente, em equilíbrio, co = cd.

Então, o problema de um domicílio típico desta economia é

v (s0) ≡ maxE

{ ∞∑t=0

βt ln(cd (st)

)}

sujeito a restrição de fluxo

pc (st) cd (st) + pi (st) i

d (st) ≤

pk (st) ko (st) + pl (st) l

o (st) ,

e à lei de movimento do capital agregado:

kt+1 = ko (st+1) = id (st+1) , lo (st) ≤ 1,

e

kt+1 = ψ(kt, At

).

Quanto à firma, seu problema é estático.

Problema da firma:

max{pc (st) co (st) + pi (st) i

o (st)

− pk (st) kd (st)− pl (st) ld (st)}

sujeito a

cot + iot ≤ At(kdt

)α (ldt

)1−α

Podemos, então, usar o princípio de optimalidade de Bellman para esc-

crever o problema do indivíduo de forma recursiva.

Page 71: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 70

Representação recursiva do problema do consumidor:

v (st) =

max{cd,id,lo,kd}

{ln(cd (st)

)+

β

ˆv(id (st) , ψ (st) , At+1

)dF (At+1|At)

}sujeito a

pc (st) cd (st) + pi (st) i

d (st) ≤

pk (st) ko (st) + pl (st) l

o (st) ,

kt+1 = ko (st+1) = id (st+1) , lo (st) ≤ 1,

e

kt+1 = ψ(kt, At

).

As seguintes funções que são solução dos problemas do indivíduo e da

firma satisfazem a definição de um equilíbrio recursivo:

a) Uma função valor

v (s0) =

E

[ ∞∑t=0

βt ln((1− αβ)Atkt

{α(kt − kt

)+ kt

})]Pode-se mostrar que

v (s0) = a+ b ln k0 + c lnA0

para constantes a, b e c que dependem dos parâmetros de preferências e tec-

nologia.

b) Uma função contínua de apreçamento p (st) = (pc (st) , pi (st) , pk (st) , pl (st))

com a mesma dimensionalidade do espaço de commodities, com

pc (st) = pi (st) = 1, pk (st) = αAtkα−1t

e pl (st) = (1− α)Atkα−1t .

Note que usamos o bem de consumo como numerário.

Page 72: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 71

c) Funções consumo e investimento para o indivíduo que são função do

estado st,

cd (st) = (1− αβ)Atkα−1t

[α(kt − kt

)+ kt

]lo (st) = 1

id (st) = αβAtkα−1t

[α(kt − kt

)+ kt

]ko (st+1) = id (st)

d) Regras de decisão para a firma contingentes ao estado da economia,

st,

co (st) = (1− αβ)Atkα−1t

ld (st) = 1

io (st) = αβAtkα−1t

kd (st+1) = io (st)

e) A lei de movimento para o estoque de capital especificando o capital

amanhã como função do estado agregado hoje, st,

kt+1 = ψ (st) = αβAtkαt

f) As funções de decisão individuais maximizam a utilidade esperada do

indivíduo

v (st) = ln((1− αβ)Atk

α−1t

[α(kt − kt

)+ kt

])+ β

ˆv(αβAtk

α−1t

[α(kt − kt

)+ kt

],

αβAtkαt , At)dF (At+1|At)

g) As regras de decisão da firma, co (st) , ld (st) , i

d (st) , ko (st+1) , maxi-

mizam lucro

h) Oferta é igual a demanda cd (st) = co (st) , lo (st) = ld (st) , e id (st) =

io (st) .

i) A lei de movimento do capital é consistente com o comportamento

maximizador dos agentes, ψ (st) = id (st) .

Finalmente cabe notar que v(k0, k0, A0

)= w

(k0, A0

)o que mostra que a

alocação de equilíbrio é Pareto-eficiente. Note porém, que é possível formu-

lar modelos em que a alocação de equilíbrio não é Pareto-eficiente (se houver

Page 73: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 72

externalidades, por exemplo) e que, portanto, não resolvem o problema do

planejador.

5.3 O Consumidor Representativo

A pergunta sobre agregação deve ser interpretada em três níveis dis-

tintos. Primeiro (Econométrico). É possível escrever a demanda agregada

como função dos preços e da renda agregada? Segundo (Positivo). Se isso

for possível, essa demanda agregada tem as propriedades da demanda mar-

shalliana gerada por um agente racional? Terceiro (Normativo). Se isso for

verdade, será que posso usar a relação de preferência que racionaliza a de-

manda agregada para análise de bem-estar?

Um primeiro e trivial exemplo em que agregação é possível em todos

estes níveis é o caso em que os indivíduos são idênticos. Este foi o exemplo

que utilizamos na seção anterior. No entanto, trata-se de um caso pouco re-

alista e, certamente, desinteressante para a análise de questões distributivas.

5.3.1 O Teorema de Sonnenschein-Mantel-Debreu

Se não restringirmos as preferências ou o processo de distribuição de

renda, praticamente toda a estrutura da demanda desaparece com a agre-

gação. Tal resultado surge de forma radical no teorema de Sonnenschein-

Mantel-Debreu que, em sua essência, diz que qualquer função contínua que

respeite a identidade de Walras e que seja homogênea de grau zero é a de-

manda excedente de alguma economia.

Teorema 6 Seja ε > 0 um escalar eN <∞ um inteiro positivo. Considere um con-

junto de preços Pε ={p ∈ RN+ |pi/pj∀i, j

}e uma função contínua z : Pε −→ RN+

que satisfaz homogeneidade de grau zero e identidade de Walras’. Então existe uma

economia de trocas com N bens e H < ∞ indivíduos tal que a demanda excedente

da economia é dada por z (p) no conjunto Pε.

Fica claro, então, que se quisermos ter alguma esperança quanto a possi-

bilidade de agregação, devemos restringir as preferências ou o processo que

associa dados agregados a dados individuais. Comecemos com a primeira

possibilidade.

Page 74: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 73

5.3.2 Demanda agregada como função dos preços e da renda agre-

gada.

Sendo y =(y1, ..., yJ

), sempre podemos escrever

X (p,y) =∑J

j=1xj(p, yj

).

A questão é se posso escrever X (p,y) = X (p,y) , onde y =∑J

j=1 yj .

Note que, para que a representação acima seja possível, é necessário que

qualquer variação das rendas individuais que preserve a renda do grupo

deve ser irrelevante do ponto de vista da demanda agregada. Ou seja,

J∑j=1

∂yjxj(p, yj

)dyj = 0 sempre que

J∑j=1

dyj = 0.

O que se pode mostrar é que a condição necessária e suficiente para que

isso ocorra é que a função utilidade indireta tenha forma polar de Gorman

com coeficiente b (·) idêntico para todos os agentes,

vj(p, yj

)≡ aj (p) + b (p) yj ∀j.

A mensagem do resultado de Gorman é um pouco desoladora, no sen-

tido de que a restrição às preferências parece excessiva para ser de uso prático.

Assim, a idéia de representarmos a demanda agregada como função exclu-

sivamente de preços e renda agregada implica em aceitarmos uma restrição

muito grande nas preferências.

Talvez tenhamos sido muito ambiciosos ao tentar representar a demanda

agregada usando somente o primeiro momento da distribuição. Ou talvez

tenhamos deixado de considerar informações que nos permitam ligar a renda

agregada à renda individual. Uma alternativa mais promissora parece a

idéia de associar a renda agregada à renda individual por meio de alguma

relação funcional pré-definida.

5.3.3 Propriedades da Demanda Agregada

Em muitos casos, a renda individual deve ser vista como conseqüência

das relações do indivíduo com a economia onde atual, como função de al-

gum processo subjacente. Desta maneira, dados agregados podem ser im-

portantes na identificação da renda individual.

Page 75: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 74

Tomemos, por exemplo o caso em que a renda individual pode ser de-

scrita como função da renda agregada, por meio de uma ‘regra de distribuição

de riqueza’, yj = θj (p,y) . Neste caso,

X (p,y) =J∑j=1

xj(p, yj

)=

J∑j=1

xj(p, θj (p,y)

)= X (p,y) .

Fomos, portanto, capazes de escrever a demanda individual como função da

renda agregada de forma trivial.2

A questão interessante passa a ser: quais as propriedades dessa demanda

agregada? Em particular, será que X (p,y) possui todas as propriedades (ho-

mogeneidade, adding up, simetria e negatividade semi-definida da matriz

de Slutsky) que garantem que possam ser representadas como a escolha de

um agente racional (ver capítulo ??).

Desde que θj (p,y) seja homogênea de grau 1 em preços e renda, então

X (p,y) será homogênea de grau 0 em preços e renda. Além disso,

J∑j=1

∂iθj (p,y) = 0 ∀i e

J∑j=1

∂yθj (p,y) = 1.

A primeira propriedade que investigaremos é se a demanda agregada

satisfaz o axioma fraco da preferência revelada? Ou seja, será que a matriz

de Slutsky agregada,

∂pX (p,y) + ∂yX (p,y) X (p,y)′ ,

é negativa semi-definida?

2Um exemplo de situação econômica relevante em que tal regra é definida é em um mod-

elo de equilíbrio geral, em que cada agente h possui uma dotação inicial wh. Neste caso, a

renda agregada da economia é dada por y = p∑

h wh e a regra de distribuição é

θh (p, y) = αh (p) y

onde

αh (p) =pwh

p∑

h wh

Page 76: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 75

Considere o termo (i, k) da matriz acima,

∂kXi (p,y) + ∂yXi (p,y)Xk (p,y) ,

onde

Xk =J∑j=1

xjk(p, θj (p,y)

).

Primeiro, temos que

∂kXi (p,y) =J∑j=1

∂kxji

(p, θj (p,y)

)+ ∂yx

ji

(p, θj (p,y)

)∂kθ

j (p,y) .

Além disso,

∂yXi (p,y)Xk (p,y) =J∑j=1

∂yxji

(p, θj (p,y)

)∂yθ

j (p,y)Xk.

PortantoJ∑j=1

{∂kx

ji

(p, θj (p,y)

)+

∂yxji

(p, θj (p,y)

) [∂kθ

j (p,y) + ∂yθj (p,y)Xk

]},

onde Xk = dy/dpk.

Omitindo os argumentos das funções, por economia, temos

J∑j=1

(∂kx

ji + ∂yx

ji

(∂kθ

j + ∂yθjXk

))

=

J∑j=1

(∂kx

ji + ∂yx

jixjk

)︸ ︷︷ ︸dda compensada

do indivíduo j

+J∑j=1

∂yxji

(∂kθ

j + ∂yθjXk − xjk

)Sabemos que a matriz de Slutsky de cada indivíduo é negativa semi-

definida, mas não sabemos dizer muito sobre o último termo da expressão

J∑j=1

∂yxji

(∂kθ

j + ∂yθjXk − xjk

).

Page 77: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 76

Ela depende de várias coisas como a função de distribuição θj , a diferença

entre o consumo individual e o consumo médioXk−xjk e a própria derivada

da demanda com relação à renda ∂yxji .

Até agora refirimo-nos somente à negatividade semi-definida da ma-

triz de Slutsky (equivalentemente, axioma fraco das preferências reveladas).

Racionalidade requer também simetria (axioma forte), porém.3 Há algu-

mas razões por que devemos nos ater à negatividade semi-definida. Temos

alguma esperança de que a negatividade semi-definida continue valendo

porque essa é uma propriedade robusta a perturbações. Ou seja, se uma

matriz é negativa semi-definida, consigo arranjar uma matriz ’próxima’ dela

que também o seja. Já com a simetria, qualquer pequena perturbação das

preferências é suficiente para que a propriedade deixe de valer. Além disso

vários dos resultados de equilíbrio geral são válidos quando somente o ax-

ioma fraco é válido.

Que propriedades da demanda agregada garantem que valha o axioma

fraco no agregado? Suporemos que vale a Lei da Demanda Incondicional

(ULD) ou seja,

Hipótese (ULD): A função demanda de todos os indivíduos é tal que:(p1 − p0

) [xi(p1, y

)− xi

(p0, y

)]≤ 0 ∀ p1,p0, y.

com desigualdade estrita se xi(p1, y

)6= xi

(p0, y

).

Temos, então a seguinte proposição.

Proposição 1 ULD implica Axioma Fraco das Preferências Reveladas.

Finalmente temos que ULD é agregável.

Proposição 2 ULD é agregável.

As duas proposições anteriores garantem que, se valer ULD para cada

indivíduo, vale o axioma fraco para o indivíduo e no agregado. A questão3Na verdade, o axioma fraco implica a negatividade semi-definida. Porém, precisamos

de um pouco mais do que negatividade semi-definida para o axioma fraco. Precisamos de

negatividade definida para todas as direções não-proporcionais ao vetor de preços.

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CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 77

passa a ser se essa é uma restrição muito grande sobre preferências. Ante-

riormente argumentamos que a existência de bens de giffen é possível, mas

pouco provável. A condição acima é uma generalização da idéia de inex-

istência de bem de Giffen. A seguir mostramos o que isso implica em termos

de preferências.

Sob que condições nas preferências temos a ULD? Milleron [2008] e Mi-

tiushin and Polterovich [1978] mostraram de forma independente4 que se

uma relação de preferências é tal que pode ser representada por uma função

utilidade côncava e que satisfaça

ψu (x) ≡ −x′∂2

xxu (x)x

x∂xu (x)< 4 ∀x (5.1)

então,(p1 − p0

) [x(p1, y

)− x

(p0, y

)]< 0, sempre que p1 6= p0.5

5.3.4 Agente Representativo e Análise de Bem-estar.

Aqui devemos destacar duas visões distintas de agente (ou consumidor)

representativo: agente representativo positivo e normativo.

Definição: Dizemos que uma economia possui um agente representativo posi-

tivo se existir uma relação de preferências % que racionaliza a demanda agre-

gada marshalliana.

Definição: Função de Bem-Estar de Bergson-Samuelson, é uma funçãoU : RJ −→4O artigo de Milleron jamais foi publicado, enquanto o de Mitjuschin e Polterovich está

escrito em russo.5Quah (2003) mostra que, se definirmos

ψzu (x) ≡ −z′∂2

xxu (x)z

z∂xu (x),

então,

ψ% (x) = ψu (x)− infz∈Zu(x)

ψzu (x) ,

onde

Zu (x) ≡{z ∈ RL;z∂xu (x) = x∂xu (x)

}.

Consideram-se, neste caso, todas as direções para as quais a variação na utilidade é igual

(i.e, que têm o mesmo valor quando avaliadas nos preços que geraram aquela demanda x).

Ou seja, em vez de considerarmos a curvatura absoluta, consideramos a diferença entre a

curvatura na direção x e a menor curvatura em qualquer direção para a qual a variação de

utilidade seja igual à obtida pela variação na direção x. Cabe notar que, supondo que o

agente seja averso ao risco, ψzu (x) é o coeficiente de aversão ao risco em x na direção z.

Page 79: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 78

R que associa a cada vetor de utilidades individuais um valor para a utili-

dade social

U ≡ U (u1, ..., uJ)

onde, ∂U/∂ui > 0 para todo i.

A pergunta que gostaríamos de responder em seguida é a seguinte. Se

acharmos uma agente representativo positivo ele será necessariamente nor-

mativo?

Definição: Dizemos que o agente representativo positivo para a demanda

agregada∑J

j=1 xj(p, θj (p, y)

)= X (p, y) é um agente representativo norma-

tivo para a função de bem-estar social U (·) quando para todo (p, y), θ (p, y)

resolver o problema (??).

Para que seja positivo, precisamos que a demanda marshalliana possua

todas as propriedades: homogeneidade, equilíbrio orçamentário e simetria

e negatividade semi-definida da matriz de slutsky. Para que também tenha

caráter normativo é preciso que qualquer mudança que acarrete aumento

da utilidade de todos os agentes, aumente também a utilidade do agente

representativo.

Suponha, então que exista um agente representativo positivo que racional-

iza X (p, y) =∑J

j=1 xj(p, θj (p, y)

). Para que tenha conteúdo normativo

é necessário que necessário que S (p,y) −∑

jSj(p,yj

)seja negativa semi-

definida.

5.4 A Firma Representativa

Consideremos o caso de J firmas especificadas pelos conjuntos de pro-

dução Y1, ...,YJ . Cada um desses conjuntos é não-vazio, fechado e satisfaz

“free disposal“. Defina as funções lucro e as correspondências de “oferta“

individuais como πj (p) e yj (p) , onde, por oferta denotamos a oferta efetiva

e a demanda por insumo. A função oferta agregada é y (p) ≡∑

jyj (p) ≡{

y ∈ RL;y =∑

jyj para algum yj ∈ yj (p)}

Suponha que yj (p) são funções diferenciáveis aos preços p, então ∂pyj (p)

é positiva semi-definida e simétrica. Como essas duas propriedades são

Page 80: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

CAPÍTULO 5. MACROECONOMIA E AGREGAÇÃO 79

preservadas pela adição temos que ∂py (p) =∑

j ∂pyj (p) é também posi-

tiva semi-definida e simétrica.

Isso implica, de um lado que a lei da oferta funciona também no agre-

gado: se um preço de um bem aumenta sua oferta também aumenta e se um

preço de um insumo aumenta sua demanda cai.

Por outro lado a simetria sugere a existência de um produtor representa-

tivo. Para mostrar que é exatamente este o caso, defina Y ≡∑

jYj ≡{y ∈ RL;y =

∑jy

j para algum yj ∈ Yj , j = 1, ..., J}

como o cojunto de possibilidades de produção agregado. E sejam π∗ (p) e

y∗ (p), respectivamente, a função lucro e a correspondência de oferta associ-

adas a esse conjunto Y. Vamos então mostrar o seguinte resultado.

Teorema: Para todo p� 0, temos que:

i) π∗ (p) =∑

j πj (p) ;

ii) y∗ (p) =∑

j yj (p)

(={∑

jyj ;yj ∈ yj (p) ∀j})

Demonstração: (i) Considere qualquer conjunto de planos de produção in-

dividuais {yj}Jj=1

com yj ∈ Yj ∀j, (5.2)

então,∑

jyj ⊆ Y, donde

π∗ (p) ≥ p∑

jyj =∑

jpyj .

Como vale para todo yj , vale em particular para yj ∈ yj (p) ⇒ π∗ (p) ≥∑j π

j (p) . Considere agora um plano de produção qualquer y ∈ Y. Pela

definição de Y, há vetores yj ∈ Yj tais que∑

j yj = y. Então py = p∑

jyj =∑jpyj ≤

∑jπj (p) . Como vale para todo y, em particular vale para y ∈

y∗ (p) . Portanto, π∗ (p) ≤∑

jπj (p) .

(ii) Considere novamente um conjunto do tipo (5.2), e suponha yj ∈yj (p) ∀j. Então, p

∑jyj =

∑jpyj =

∑jπj (p) = π∗ (p) (como demonstrado

em (i)). Logo,∑

j yj (p) ⊆ y∗ (p) . Tome agora y ∈ y∗ (p) . Como y ∈ Y

temos que y =∑

j yj com yj ∈ Yj ∀j. Temos também que p∑

jyj = π∗ (p) =∑jπj (p) (novamente usando o resultado em (i)). Ora, para cada j, pyj ≤

πj (p) pela definição de πj (p) . Portanto, para que valha π∗ (p) =∑

jπj (p)

Page 81: Notas de Economia do Setor Público Aula 01 - Revisão de

REFERENCES 80

é preciso que pyj = πj (p) para todo j. Neste caso, y =∑

j yj ∈∑

j yj (p) ,

donde y∗ (p) ⊆∑

j yj (p) .

Ou seja, a principal conclusão a que se chega é que, ao contrário do que

ocorre com a teoria do conumidor, aqui, a agregação vem sem muito esforço.

A caracterísitca da teoria da produção que permite a agregação é a ausência

de restrições orçamentárias. Efeitos-renda simplesmente inexistem na teoria

da produção que apresentamos aqui. Já na teoria da firma propriamente.....

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