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NOTíCIAS - Universidade de Coimbra · Electra de Sófocles, em co-produção FESTEA/Thiasos - Dia 26 de Abril de 2005, em S. Martinho de Tibães (Braga), 15:30h Os Dois Meneemos

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'NOTíCIAS

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GRUPO DE ESTUDOS CLÁSSICOS

Actividades científicas, pedagógicas e culturais (Novembro de 2004 a Setembro de 2005)

25 de Outubro de 2004

Sessão de abertura do ano de actividades do Ramo de Formação Educacional - projecção comentada de um video sobre os "Estudos Clássicos, atractivos, impacto e. adesão", por Francisco de Oliveira

25 de Fevereiro de 2005

"Políticas de Aristóteles" - sessão internacional da Sociedad Ibérica de Filosofia Griega, com a colaboração das UI&D "Linguagem, Inves­tigação e Filosofia" e "Centro de Estudos clássicos e Humanísticos".

ROMANCE ANTIGO: ORIGENS DE UM GéNERO LITERáRIO

(3 e 4 de Março de 2005 - Coimbra)

Organização: Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos, Insti­tuto de Estudos Clássicos

Partindo de uma perspectiva diacrónica, as várias comunicações procuraram seguir o percurso que terá assistido à criação de um dos géneros mais bem. sucedidos da actualidade literária, mas cujas raízes se podem encontrar, de forma mais ou menos desenvolvida, na tradição clássica. Os trabalhos do congresso e respectivas actas integram-se no projecto relativo à "Génese e evolução da ideia de Europa", que constitui actualmente a linha transversal de investigação do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos.

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508 Notícias

Programa' '

3 de Março - Faculdade de Letras: Anf. IV 10.15 - Walter de Sousa Medeiros (Univ. de Coimbra): "Na aurora do

conhecimento: do tumulto à pacificação" 11.00- Marília Pulquério Futre (Univ. de Lisboa): "Origens gregas do

género" 11.30 - Intervalo para café 11.45- Maria do Céu Fialho (Univ. de Coimbra): "Novas tendências

narrativas nas Argonáuticas de Apolónio de Rodes" 12.15 - Maria de Fátima Silva (Univ. de Coimbra): "O motivo do sonho

no romance de Cáriton" 13.00 - Intervalo para almoço 14,30 - Cristina Pimentel (Univ. de Lisboa): "Enquadramento histórico do

romance em Roma" 15.00- Paulo Sérgio Ferreira (Univ. de Coimbra): "A paródia no

Satyricon" 15.30 - Delfim Leão (Univ. de Coimbra): "Eumolpo e os cultos de

mistério gregos" 16.00 - intervalo para café 16.15 - Paolo Fedeli (Univ. de Bari): "II labirinto nel Satyricon" 16.45 - Rosalba Dimundo (Univ. de Bari): "Le novelle petroniane: forme

di riscrittura dei modelli" 17.15- René Martin (Univ. de Paris III): "Petronius Arbitrer, inventem:

du roman" 17.30 - Apresentação de livros:

+ Totó notus in orbe Martialis (por Andrés Pocina) + Nomos. Direito e Sociedade na Antiguidade Clássica (por A.

López Eire) + 0 retrato literário e a biografia como estratégia de teorização

política (por E. Suárez de la Torre) + Leucipe e Clitofonte de Aquiles Tácio, em tradução de A.

Pena (por Maria de Fátima Silva) + Conto infantil de Hélia Correia: Mopsos. O pequeno grego,

O ouro de Delfos (por 1. Ribeiro Ferreira)

19.00 - Intervalo para jantar 21.30 - As mulheres no parlamento de Aristófanes, pelo Thíasos

Notícias 507

4 de Março - Faculdade de Letras: Anf. ÍV

09.45- Andrès Pocifía (Univ. de Granada): "Comparações impróprias para tentar compreender um género extravagante: o Satyricon e os primeiros romances espanhóis"

10.15- Eckard Lefèvre (Univ. de Freiburg): "O episódio das roupas -Petrónio, Saí. 12-15"

10.45 - Intervalo para café 11.00 - José Luís Brandão (Univ. de Coimbra): "O romance de Cárite" 11.30 - Cláudia Teixeira (Univ. de Évora): "As histórias no Asinus aureus

e a sua relação com o romance" 12.00 - Vítor Ruas (Univ. dos Açores): "Ethopoeia no romance bizantino

do séc. XII" 12.30 - Intervalo para almoço 14.30 - Paula Mota Carrajana (Univ. dos Açores): "Da Historia Apollonii

regis Tyri à Confessio Amantis: leituras de uma narrativa singular" 15.00 - João Domingues (Univ. de Coimbra): "Histórias mais que

verdadeiras, de Luciano ou de Voltaire" 15.30 - Steven Wilson. (Univ. de Coimbra): "Latín proses: the Translatio

imperii In the work of Rudyard Kiplíng" 16.00 - Ana Paula Arnaut (Univ. de Coimbra): "Em trânsito: do romance

ao romance?" 17.00 - Encerramento dos trabalhos

Comissão Científica

Maria do Céu Zambujo Fialho (Universidade de Coimbra) Paolo Fedeli (Universidade de Bari) Walter Sousa de Medeiros (Universidade de Coimbra) Francisco de Oliveira (Universidade de Coimbra) Delfim Ferreira Leão (Universidade de Coimbra)

Comissão Organizadora

Paolo Fedeli (Universidade de Bari) Maria de Fátima Silva (Universidade de" Coimbra) Francisco de Oliveira (Universidade de Coimbra) Delfim Ferreira Leão (Universidade de Coimbra)

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508 Notícias

Apoios

Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra Instituto de Estudos Clássicos Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos Fundação Calouste Gulbenkian Fundação para a Ciência e a Tecnologia

C O M E M O R A ç ã O DOS 60 ANOS DO INSTITUTO DE ESTUDOS CLáSSICOS

Colóquio "O mito clássico no Imaginário Ocidental" (Coimbra, 4 e 5 de Abril de 2005)

Organização: Instituto de Estudos Clássicos, Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos, Associação Portuguesa de Estudos Clássicos

O Grupo de Estudos Clássicos da Universidade de Coimbra promoveu o colóquio "O mito clássico no imaginário Ocidental", nos dias 4 e 5 de Abril, que visava constituir o ponto mais alto e simbólico da celebração dos 60 anos do Instituto de Estudos Clássicos. Procurou, ainda, facultar uma oportunidade de reencontro para antigos classicistas, num registo da memória do passado que visa preparar os novos desafios do futuro.

Programa.

Dia 4 (Anf. II)

10,30 -

11.00

13.00 •

Sessão de abertura Director do Instituto de Estudos Clássicos da FLUC: Delfim

Ferreira Leão (Univ. de Coimbra) Director do Departamento de Estudos Clássicos da FLUL;

Arnaldo Espírito Santo (Univ. de Lisboa) Encontro .com o escritor Mário Cláudio, com apresentação por Ana Paula Arnaut (Univ. de Coimbra) Intervalo para almoço

Notícias 509

15.00 - "60 anos de Estudos Clássicos em Portugal": Maria Helena da Rocha Pereira (Univ. de Coimbra) e Américo da Costa Ramalho (Univ. de Coimbra)

16.00 - Lançamento de livros: apresentação por Aires Augusto Nascimento (Univ. de Lisboa)

- IEC - Um passado com futuro. 60 anos de Actividade Científica, Pedagógica e Cultural

- Catálogo do Fundo bibliográfico Especial do IEC 18.30 - Espectáculo Musical (Palácio de S. Marcos), pelo Grupo "UC.

Ensemble" 20.00 - jantar alargado a todos os que passaram pelo IEC

Dia 5(Aní. II)

09.15 - Padrões de heroísmo e construção de identidades: apresentação de Fernando Catroga

Oradores:

-José Augusto Ramos (Univ. de Lisboa): "Judite: a heroína fictícia e a identidade nacional de Israel"

-Cármen Soares (Univ. de Coimbra): "Heróis gregos e bárbaros nas Histórias de Heródoto"

- Nuno Simões Rodrigues (Univ. de Lisboa): "A heroína romana como matriz de identidade feminina"

11.00 - Intervalo para café 11.30 - A face moderna, dos mitos clássicos

Manuela Delille (Univ. de Coimbra)

I: apresentação de Maria

Oradores:

"La fortuna deli' Orestea sulla -Anton Bierl (Univ. de Basel): scena moderna"

-Cristina Robalo Cordeiro (Univ. de Coimbra): "Modernidade ou juventude: Releitura de Teseu de André Gíde"

-Luísa Portocarrero (Univ. ""de Coimbra): "P. Ricoeur: a linguagem simbólica do mito e as metáforas cia praxis"

13.00 - Intervalo para almoço

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510 Notícias

15.00 • Ã face moderna dos mitos clássicos - II: apresentação de Rita Marnoto (Univ. de Coimbra)

Oradores:

- Abílio Hernandez Cardoso (Univ. de Coimbra): "O imaginário do mito no cinema"

-José Maria Pedrosa Cardoso (Univ. de Coimbra): "Prometeu que a Música eterniza"

- A n a Alexandra Alves de Sousa (Univ. de Lisboa): "Hofmannstahl e a antiguidade clássica"

16.30 - Intervalo para café 17,00 - Giorgio Ieranò (Univ. de Trento): "Édipo a Parigi"

-Armando Nascimento Rosa (Escola Superior de Teatro e Cinema - IP de Lisboa): "Um Édipo: a reescrita e produção cénica de um mito paradigmático"

17.30 - Encerramento dos trabalhos

Comissão Científica

Américo da Costa Ramalho Maria Helena da Rocha Pereira Walter Sousa de Medeiros José Geraldes Freire Sebastião Tavares de Pinho José Ribeiro Ferreira Francisco de Oliveira Nair de Nazaré Castro Soares Carlos Ascenso André

Comissão Organizadora

Delfim Ferreira Leão Maria do Céu Grácio Zambujo Fialho Maria de Fátima Silva Maria Margarida Lopes Miranda Luísa de Nazaré Ferreira Zélia Sampaio Ventura Carla Rosa

Notícias 511

Apoios

Reitoria da Universidade de Coimbra Conselho Directivo da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra Grupo de Estudos Clássicos Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos Associação Portuguesa de Estudos Clássicos Fundação Enge António de Almeida Imprensa cia Universidade de Coimbra

VI FESTIVAL ESCOLAR DE TEATRO DE TEMA CLáSSICO

Organização: Festea - Tema Clássico - Associação Promotora Com o apoio de Instituto de Estudos Clássicos, Grupo de Teatro Thiasos e Liga de Amigos de Conimbriga

Locais: Coimbra, Conimbriga, Viseu, Braga e Sintra Datas: entre 18/04 e 10/06 de 2005

- Dia 18 de Abril de 2005, em Conimbriga, 21h Recital de Poesia Grega, pelo Grupo Thiasos do IEC

- Dia 20 de Abril de 2005, em Conimbriga, l l h As Mulheres no Parlamento de Aristófanes, pelo grupo Thiasos do IEC

- Dia 21 de Abril de 2005, em Coimbra, no Convento de S. Francisco, 15:30h As Mulheres no Parlamento de Aristófanes, pelo grupo Thiasos do IEC

- Dia 26 de Abril de 2005, em S. Martinho de Tibães (Braga), l l h Electra de Sófocles, em co-produção FESTEA/Thiasos

- Dia 26 de Abril de 2005, em S. Martinho de Tibães (Braga), 15:30h Os Dois Meneemos de Flauto, pelo grupo Agôn das Caldas da Rainha

- Dia 28 de Abril de 2005, em Coimbra, l l h Teócrito e Virgílio, peio grupo Thiasos do IEC

- Dia 28 de Abril de 2005, em Coimbra, no Convento de S. Francisco, 15:30h Ulisses de Maria Alberta Meneres, pelos alunos do Colégio de S. Miguel (Fátima)

- Dia 29 de Abril de 2005, em Coimbra, no Convento de S. Francisco, l l h Filoctetes de Sófocles, pelo grupo Agôn das Caldas da Rainha

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512 Notícias

- Dia 30 de Abril de 2005, em Viseu, 2 % Teócrito e Virgílio, pelo grupo Thiasos cio IEC

- Dia 2 de Maio de 2005, em Coimbra, no Convento de S. Francisco, l l h Helena de Eurípides, pelo grupo Selene de Madrid

- Dia. 2 de Maio de 2005, segunda-feira, em Coimbra, no Convento de S, Francisco, 15:30h Pinto "A Riqueza" de Aristófanes, pelo grupo Selene de Madrid

- Dia 3 de Maio de 2005, no Museu Arqueológico S. Miguei de Odrinhas, l l h Troianas de Eurípides, pelo grupo Balbo do I.E.S. de Puerto de Santa Maria

- Dia 3 de Maio de 2005, no Museu Arqueológico de S. Miguel de Odrinhas, 15:30h A Comédia do Fantasma de Flauto, peio grupo Balbo do I.E.S. de Puerto de Santa Maria

- Dia. 5 de Maio de 2005, no Museu Arqueológico de S. Miguel, de Odrinhas, l l h Electra de Sófocles, em co-produção FESTEA/Thiasos

- Dia 5 de Maio de 2005, no Museu Arqueológico de S. Miguel de Odrinhas, 15:30h 'Teócrito e Virgílio, pelo grupo Thiasos do IEC da Faculdade de Letras cie Coimbra

- Dia 21 de Maio de 2005, em Conimbriga, 21h Espectáculo lírico peio grupo de canto e drama do Conservatório de Música de Coimbra

- Dia 1 de Junho de 2005, em Conimbriga, l l h Ulisses de Maria. Alberta Menéres pelos alunos do Colégio de S. Miguel (Fátima)

- Dia 10 de Junho de 2005, em Conimbriga, 18h A Mulher de Samos de Menandro, pelo grupo Theatro do Lyceu da Figueira da Foz (para assinalar o dia do Museu Monográfico de Conimbriga).

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Notícias 513

CONGRESSO INTERNACIONAL - " G é N E S E DA IDEIA DE EUROPA,

O MUNDO ROMANO"

Faculdade de Letras, 30 de Junho e 01 de Julho (Anf. IV)

Organização; Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos

Objectivos: com base na experiência romana de criação de um espaço onde se configuraram ou. veicularam algumas cias características que ainda hoje parecem conformar um conceito mais ou menos polémico de espaço (cultural) europeu, procuraremos pesquisar algumas manifesta­ções ligadas à própria criação desse espaço e sua integração, com as modalidades específicas da sua organização política, à dialéctica da. identidade e da diferença cultural, à problemática da. assimilação e da aculturação, à visão do outro e aos conceitos de civilização e barbárie, à percepção do valor e da dignidade da pessoa humana, a manifestações artísticas e culturais mais peculiares ou identítárias. O grande objectivo é preparar um volume a sair no final do ano, em ' que, para além dos conferencistas indicados no programa, participarão López Férez (Madrid), Therese Fuhrer (Freiburg i. B.), Harts-Joachim Gehrke (Freiburg i. B.), Vasco Sousa (Munique)

Programa

Dia 30 de Junho

10.00 li - António Alvar Ezquerra (Univ. de Alcalá), Europa en el imaginário de los poetas latinos

- Alberto Maffi (Univ. Milão), Legislazione e giurisprudenza nella storia dei diritto gr eco e romano

- Vasco Mantas (Univ. de Colimbra), As vias de comércio na Europa Romana

14.30 li - Marleine Paula M. F. de Toledo (Univ. São Paulo), O direito romano e a ideia de Europa

- Giulia Baratta (Univ. Macerata), Europa delie divinità. Interpre-tatio e sincretismo

- Alexandra Barnea (Univ. Bucareste), La Dacie romaine - Marc Mayer Olivè (Univ. Barcelona), Constantino el Grande:

deconstrucción y construccion de un Império

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514 Notícias

Dia 01 de Julho fA

10.00 h - Francisco Oliveira (Univ. de Coimbra), Geografia e Imperialismo

• em Plínio-o-Antigo

- José Luís Brandão (Univ. de Coimbra), Fascínio do Oriente em

Suetónio

- Luís Fernandes (Univ. Católica Portuguesa), Circulação e recepção

de modelos epigráfícos

- Cláudia Teixeira (Univ. de Évora) e Paulo Sérgio (Univ. de Coimbra), Escravatura em Roma

14.30 h - Nuno Simões Rodrigues (Univ. de Lisboa), Identidade e alteridade

judaica em Roma

- Jorge de Alarcão (Univ. de Coimbra), Globalização e regionalismos

na 'Europa Romana

Comissão Organizadora

Francisco de Oliveira (Universidade de Coimbra) Maria do Céu Fialho (Universidade de Coimbra) Carla Susana Vieira Gonçalves (Universidade de Coimbra)

Apoios

Reitoria da Universidade de Coimbra Fundação Eng° António de Almeida Fundação para a Ciência e a Tecnologia Fundação Calouste Gulbenkian Associação Portuguesa de Estudos Clássicos

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Notícias 515

VII FESTIVAL DE V E R ã O DE TEATRO DE TEMA CLáSSICO

Organização: Festea - Tema Clássico - Associação Promotora Com o apoio do Instituto de Estudos Clássicos, Grupo de Teatro Thiasos e Liga de Amigos de Conimbriga

Locais: Coimbra, Viseu e Braga

Datas: entre 30/06 e 10/07 de 2005

- Dia 30 de Junho de 2005, TAGV, Coimbra, 21h45 Hipólito de Eurípides, pela Escola Superior de Teatro e Cinema da Amadora

~~ Dia 02 de Julho de 2005, Pátio da Inquisição, Coimbra, 21h45 Teócrito e Virgílio, pelo Grupo Thiasos do IEC

- Dia 05 de Julho de 2005, Pátio da Inquisição, Coimbra, 21h45 As Mulheres no Parlamento de Aristófanes, pelo grupo Thiasos do IEC

- Dia 06 de Julho de 2005, em Viseu, 21h45 O Soldado Fanfarrão de Flauto, pelo grupo Arthistrion/Calataiifa de

Madrid - Dia 07 de Julho de 2005, no Pátio da Universidade de Coimbra, 21h45

Rei Édipo de Sófodes, pelo grupo Arthistrion/Calataiifa de Madrid - Dia 08 de Julho de 2005, Pátio da Inquisição, Coimbra, 21h45

Filoctetes de Sófocles pelo grupo Agôn das Caldas da Rainha - Dia 09 de Julho de 2005, Braga, 21h45

Rei Édipo de Sófocles, pelo grupo Arthistrion/Calataiifa de Madrid - Dia 10 de Julho de 2005, Braga, 21h45

As Mulheres no Parlamento de Aristófanes, pelo grupo Thiasos do IEC

Delfim F. Leão

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518 Notícias

DISCURSOS PROFERIDOS POR OCASIÃO DA COMEMORAÇÃO DOS 60 ANOS

DO INSTITUTO DE ESTUDOS CLÁSSICOS

A PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA

Ex.mo senhor Magnífico Reitor da Universidade de Coimbra, Prof. Doutor Fernando Jorge Rania Seabra Santos

Presidente do Conselho Directivo, Prof. Doutor Lúcio Sobral da Cunha

Presidente do Conselho Científico, Prof. Doutor José Maria Amado Mendes

Presidente do Departamento de Estudos Clássicos e Vice--Presidente do Conselho Directivo da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Prof. Doutor Arnaldo Espírito Santo

Presidente da Comissão Científica do Grupo de Clássicas e Presidente da Associação Portuguesa de Estudos Clássicos, Prof. Doutora Maria- de Fátima Silva

Coordenadora Científica do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos, Prof. Doutora Maria do Céu Fialho

Presidente da Fundação Enge António de Almeida, Prof. Doutor Fernando Aguiar-Branco

Vereador da Cultura da Câmara Municipal de Coimbra, Dr. Mário Nunes

Prezados colegas, funcionários e estudantes Minhas senhoras e meus senhores

No prefácio da sua obra, Heródoto, a quem Cícero haveria de chamar pater historiae, usa precisamente a palavra historia para caracterizar o relato que se preparava para iniciar. O termo - que tanta fortuna iria conhecer no futuro - designava naquele contexto a "exposição das informações" resultantes de um processo de indagação dos acontecimentos, onde a observação directa dos eventos narrados detinha ainda um papel importante. As razões que lhe justificavam a preocupação em registar feitos pretéritos vêm referidas logo a seguir: zelar pela preservação de acontecimentos passados; tributar a. devida homenagem a. quem se distinguiu pelas suas empresas; conhecer a causa

Notícias 517

dos acontecimentos referidos. E tudo isto permeado pela afirmação discreta da imparcialidade no juízo.

Numa altura em que o Instituto de Estudos Clássicos celebra os sessenta anos de existência, as palavras de Heródoto voltam a soar com toda a limpidez e sentido de oportunidade, pela forma como recordam o dever que cada geração tem de garantir a preservação da memória dos acontecimentos que mais a marcaram. No caso concreto do Instituto de Estudos Clássicos, essa memória próxima abarca já três gerações, mas continuamos a ter a fortuna de poder testar quase todas as informações junto de verdadeiros histores, na acepção de testemunhas directas dos acontecimentos narrados. E mesmo que a imparcialidade não seja total (pois todo o registo implica uma triagem da informação com alguma dose de subjectividade), continua a levar-se vantagem sobre a frígida indiferença do mármore partido.

Foi desta consciência que decorreu a ideia de elaborar o presente congresso, o qual gostaríamos que constituísse uma evocação das pessoas e dos eventos que ajudaram a dar ânimo a um sector específico da. vida universitária, mas também que foram construindo, com dedicação e empenho, a escola dos Estudos Clássicos em Coimbra. Para os mestres que trilharam todo este longo trajecto, o trabalho foi imenso - e o nosso reconhecimento só pode ser ainda maior, pelas condições que criaram para os que agora iniciam a sua. actividade. Mas a estes é lançado um desafio não menor: o de zelar pela manutenção e enriquecimento de um importante legado, numa altura em que o contexto se afigura pouco favorável às Humanidades.

Uma escola de estudos não é feita por edifícios de betão, mas peias pessoas que lhe dão vida e por laços que se vão firmando com outras pessoas e instituições. Assim, celebrar os sessenta anos do Instituto é também criar uma oportunidade para reflectir sobre a área dos Estudos Clássicos em Portugal e para prestar homenagem a todos os que, na Católica de Braga e no Minho, no Porto, em Aveiro, Viseu e Leiria, em Lisboa e Évora, no Algarve, nos Açores e na Madeira, têm facultado um contributo determinante para o enriquecimento deste sector de estudos em rjortugal e sua projecção no estrangeiro. Não seria possível, contudo, nos moldes em que esta comemoração foi pensada, solicitar uma intervenção a representantes de todas estas instituições e, por isso, optámos por convidar somente o Departamento de Estudos Clássicos de Lisboa - uma solução eventualmente imperfeita, mas também ela sim-

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bélica, pois Lisboa assume, neste caso concreto, juntamente com Coimbra, um papel de alguma forma fundacional. No entanto, são idênticos o respeito, a amizade e a gratidão que temos relativamente a todas as outras instituições já mencionadas.

Uma escola de estudos não se faz também apenas com professores universitários e investigadores, mas também com os seus funcionários e colaboradores vários e ainda com a imprescindível presença viva dos estudantes - actuais e antigos. Daí que tenhamos procurado insistir na necessidade de colaborar com todas estas forças e de pôr em contacto diferentes gerações de apaixonados pela cultura clássica. Nesse processo, tiveram um papel muito importante a Associação Portuguesa de Estudos Clássicos, a Associação de Professores de Latim e de Grego (em particular as Dras. ísaltina Martins e Teresa Freire), ou ainda esforços mais pessoais, como os da Dra. Zélia e do casal Barata (que continua a ser um dos fenómenos do Entroncamento!).

Na dezena e meia de anos que levo em Coimbra (como aluno e sempre como estudante), compreendi já que uma das explicações para os sucessos relativos do Instituto de Estudos Clássicos se pode encontrar também naquilo que se tem traduzido em algumas expressões felizes do ideal de Humanitas: certa apetência para aliar o estudo ao calor dos contactos pessoais. Isso contribuiu igualmente para a formação de uma escola e talvez possa ajudar, de novo, na altura em que evocamos o passado e reflectimos sobre as perspectivas de futuro.

A todos, o nosso muito obrigado.

O Director do Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra,

DELFIM FERREIRA L E ã O

Notícias 519

TEMPO DE PLENITUDE E MATURIDADE

As minhas primeiras palavras são de agradecimento, em meu próprio nome e dos meus colegas do Departamento de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras de Lisboa, por ter sido convidado a estar presente nesta celebração dos sessenta anos de vida do Instituo de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Os aniversários das instituições têm uma grande vantagem sobre os dos indivíduos, porque à medida que se projectam no tempo, cada geração que se segue pode renovar, em energia e iniciativa, a vitalidade e os ideais que deram origem ao seu nascimento.

Esses ideais são, hoje, tão claros, nobres, urgentes e actuais, como o eram, então, nos anos quarenta. O primeiro deles é «que a Grécia nos fez homens e que os seus monumentos literários encerram tesouros inesgotáveis, capazes, hoje como sempre, de formar homens para o futuro». Era convicção dos nossos fundadores que o humanismo greco--latino «está na base, não só da nossa cultura nacional europeia, mas também desta civilização racional, distinta das culturas mais ou menos nacionais, e que não é grega, nem bárbara, nem asiática, mas bem comum de toda a humanidade.» Em tempo de globalização, que é o nosso tempo, o espírito universal do humanismo clássico é chamado a ser o elemento aglutinador das diversidades ideológicas da humanidade num mundo sem fronteiras.

Foi para esse horizonte que apontámos a bússola de sucessivas gerações de estudantes que passaram pelo nosso magistério. Oxalá continue a ser essa a estrela que nos guie a todos.

As instituições não envelhecem quando desenvolvem dentro em. si imaginação criativa e capacidade de renovação. Olhando para o início da década de quarenta, vemos que o ambiente geral, decorrente das reformas do ensino secundário, com nítida displicência pelo ensino das línguas e das humanidades greco-latinas, não" foi fácil nem favorável à criação de institutos de estudos clássicos. Em 1947, foi publicado um artigo que tinha por título «O enterro oficial do latim (sob o signo de Bento Perninhas)», em que o articulista concluía em. tom patético: «Será, ao menos, um De profundis piedoso, à beira de um coval triste.» Na verdade, apesar de as circunstâncias serem adversas, muito se fez nestes sessenta anos. Não houve enterro, nem De profundis, nem. coval triste.

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520 Notícias

O que houve foi determinação e capacidade para fazer frente aos desafios que então se colocaram.

Hoje os desafios são outros. A aplicação dos princípios inerentes à Declaração de Bolonha pode desencadear alguma desorientação relativa-mente a objectivos e valores da educação em gerai e, em particular, à pertinência da formação humanística numa sociedade predominante­mente tecnológica. Um modelo de ensino voltado para a empregabili-dade pode vir a comprometer, no imediato, o equilíbrio do sistema educativo e a constituir, a longo prazo, uma ameaça de ruptura dos fundamentos da civilização do universal. Todos confiamos que tal não acontecerá. Parafraseando o Sonho de Cipião, nada os deuses prezaram com tanto empenho como a congregação dos homens em sociedades organizadas, assentes nos supremos valores da dignidade do Homem, da defesa do património comum, que são o pensamento, a arte, a justiça, o bom governo e o bem de todos. Mais do que nunca urge democratizar e levar às grandes massas a vivência dos valores do Humanismo: valores estéticos, culturais, literários, filosóficos, éticos, em suma, os valores do universal.

Já não basta contentarmo-nos com a acção que desenvolvemos junto dos nossos estudantes. É previsível que estes vão rareando nos nossos cursos, atraídos pela esperança ou pela miragem de empregos mais remunerados. É legítimo, temos que aceitá-lo. Mas, nem por isso, esses mesmos, que não nos procuram, necessitam menos da centelha de imortalidade que ilumina a vida e esforço dos homens. E isso está em Homero, está em Virgílio, está em Píndaro, está em. Horácio, está, em grande pujança, nas humanidades greco-latinas.

Ao longo da minha vida universitária, que já vai no quarto de século, tive o privilégio e a. oportunidade de fomentar e viver uma estreita colaboração entre o Instituto Clássico de Coimbra e a Instituição congénere de Lisboa. Recordo o nosso convívio a meio caminho na Nazaré. A esse propósito evoco o nome de Victor Jabouille que colaborou na sua organização. As relações institucionais, os júris, as conferências, os seminários, as participações conjuntas em actividades científicas, as lutas pelos mesmos ideais, os abaixo-assinados, os papéis divulgados em prol das mesmas causas, as jornadas de reflexão, os alertas, enfim, a partilha e defesa de ideias comuns, constituíram um suplemento de força, que tem dado os seus resultados. Somos mais fortes, quando unidos e porque unidos. É dessa força que necessitaremos, cada vez mais, para o futuro.

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Talvez o desafio que nos espera nos incite a planear acções ainda mais concertadas que transbordem das águas selectas e calmas da aca­demia para as margens indiferenciadas e turvas do dia a dia da sociedade contemporânea, onde se vai modelando a terra dos homens, segundo o plano da coesão universal de todos os elementos que a integram. Espe-ram-nos, talvez, acções concertadas no domínio da divulgação do saber­em projectos colectivos de grande alcance, na divulgação onAine dos tesouros do saber e do pensar. Espera-nos, sobretudo, um modelo de reforma e de programas em que prevaleça o formativo sobre o que é meramente informativo, em que o desenvolvimento das faculdades e a sedimentação dos valores do espírito fecundem todos os ramos do saber e da actividade humana, mesmo a mais imediata.

Sessenta anos são plenitude e maturidade. São também motivo de congratulações pelo caminho percorrido.

Presto a mais sentida homenagem aos fundadores deste Instituto e a todos aqueles que nos precederam e já vivem na luz da eternidade. Um não menos sentido agradecimento vai para os mestres da segunda hora da jornada de cuja riqueza intelectual e humana a minha geração tanto beneficiou. Menciono a Doutora Rocha Pereira, os Doutores Costa Ramalho, Walter Medeiros, Geraldes Freire, aqui presentes, como repre­sentantes dessa geração. Aos da terceira hora, companheiros de percurso nesta ascensão ao Olimpo, que a amizade que nos une, o espírito que nos guiou e a dedicação com que nos entregamos aos nobres ideais do magistério, da investigação e da gestão institucional, às vezes com sacrifí­cio da vida pessoal, se mantenha e frutifique, nas gerações futuras. Aos que estão a começar, obreiros de um futuro mais dilatado no tempo, os mais sinceros votos de êxito na salvaguarda e na renovação do legado que receberam. Com eles, os estudos clássicos hão-de singrar no futuro, porque a nova geração já deu provas de não desmerecer das qualidades e virtudes dos seus mestres.

Permitam-me que conclua com a evocação dos nomes de dois paladinos que já partiram do nosso convívio: Louro da Fonseca e Victor jabouille.

Muito obrigado a todos pela vossa paciência em me ouvirem.

O Director do Departamento de "'Estudos Clássicos da Universi­dade de Lisboa,

ARNALDO DO ESPíRITO SANTO

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OS SESSENTA ANOS DO INSTITUTO DE ESTUDOS CLÁSSICOS: PAUSA PARA REFLEXÃO

Quando foi criado o Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras de Coimbra, por iniciativa do Professor de Latim Doutor Rebelo Gonçalves, em 10 de Maio de 1944, já existiam outros institutos similares consagrados às Línguas e Literaturas Modernas que se profes­savam naquele edifício - Francês, Inglês e Alemão - esses, com a vanta­gem de receberem apoio bibliográfico dos países a que diziam respeito. Não era esse o caso da área de Grego e de Latim, que dispunha apenas dos livros herdados do Doutor Gonçalves Guimarães e de urn fundo reti­rado da Biblioteca Central, e esse mesmo adquirido graças à insistência do Professor de Grego e de obras doadas ou cedidas pelos outros insti­tutos. Eram estes dois catedráticos que, embora altamente qualificados, regiam as oito disciplinas especializadas do curso. Só a partir de 1947 é contratado um Professor italiano para as disciplinas de Hebraico, o Dr. Vincenzo Cocco, o qual passou a assegurar também as aulas práticas de Latim e Grego.

Deste modo, não obstante os bons augúrios que a colaboração de um distinto Professor como conferente na sessão inaugural, vindo do outro extremo da Romania, parecia oferecer, e não obstante uma tentativa de distribuição de trabalhos de investigação aos alunos de Latim - tenta­tiva essa que não teve condições para se realizar - só três anos depois apareceu o primeiro sinal positivo: a publicação do tomo I da revista Humcinitas.

Porém, uma revista desta natureza pressupõe a existência de uma equipa, bem como de uma condição ainda mais difícil de obter, que é o espírito de equipa. Tais condições não se verificavam, e os dois volumes duplos que ainda apareceram nesse circunstancialismo são disso teste­munho (o último já só tem um quinto de colaboração portuguesa).

Entretanto, em 1951, ocorreram alterações de diversa ordem: o Pro­fessor de Latim transfere-se para a Faculdade de Letras de Lisboa, de onde era originário, e o Professor de Grego, Doutor Carlos Simões Ven­tura, coadjuvado por dois novos elementos, entrados em anos sucessivos, com os quais constitui uma comissão redactora, inicia uma nova série de Humanitas em moldes diferentes.

Conforme se lê na advertência subscrita pelo Doutor Carlos Ven­tura, a revista quer ser uma publicação da escola a que pertence, sem

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excluir, evidentemente, a colaboração de grandes especialistas estrangei­ros. São disso prova os dois artigos de professores muito famosos da Universidade de Oxford, E. R. Dodds e M. Platnauer, conseguidos a pedido dos dois novos docentes que, em anos diferentes, haviam sido seus alunos.

E abro aqui um parêntesis para sublinhar que proporcionar aos seus antigos discípulos uma sólida e vasta preparação, que só em gran­des meios científicos podia obter-se, era uma das grandes preocupações do Doutor Carlos Ventura. Essa orientação mantivemo-la ao longo dos anos, à medida que entravam novos elementos para o grupo. Itália, Ale­manha, Holanda, França foram alguns dos países escolhidos, conforme a especialidade pretendida por cada um.. E perdoe-se-me o orgulho de lembrar que nas últimas décadas do século passado já foi possível que helenistas e latinistas do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte viessem pre­parar a tese de doutoramento sob a orientação dos que passaram a ser os dois professores mais antigos da nossa secção.

Mas voltemos à revista e à sua nova série. Logo nesse primeiro volume se nota a preocupação de alargar horizontes e proporcionar informação actualizada sobre as iniciativas desenvolvidas noutros países, através da criação de duas novas secções: Notícias e Comentários, e índice de Revistas. Facto não menos importante é que Humanitas se abre a campos de estudos afins, mediante a publicação de um artigo sobre Conímbríga. pelo que já então se distinguia como especialista de Arqueologia Romana, o Dr. J. M. Bairrão Oleiro. Essa abertura manter-se--á pelos anos fora e não é por acaso que será na nossa revista que o mesmo arqueólogo apresentará o primeiro estudo sobre as recentes esca­vações por ele encetadas no criptopórtico de Aeminíum. É no mesmo volume que se publica também o primeiro de uma série de estudos sobre Vasos Gregos em Portugal sob a orientação do mestre oxoniense Sir John Beazley. Mencione-se de passagem que dois desses vasos, que haviam sido encontrados em Alcácer do Sal, vieram anos depois a ser doados ao Instituto de Arqueologia pelo proprietário do terreno onde haviam apa­recido, o Professor da Faculdade de Medicina de Lisboa, Doutor Fran­cisco Gentil. Nesse mesmo volume de 1953-54, outra secção, neste caso a de Paleografia, vem dar um valioso contributo: a revelação de um manuscrito da Biblioteca Pública de Évora, do século XI, com fragmentos do livro III das Geórgicas de Virgílio, pelo Doutor Avelino de Jesus Costa.

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Todas estas novas orientações frutificaram ao longo dos anos. Em breve se lhes juntou a audição de música contemporânea inspirada, em temas clássicos, desde Stravinsky a Erik Satie, Cari Orfí, Darius Milhaud e outros, apresentados geralmente pelos Professores de História da Música.

A interdisciplinaridade alarga-se também a convites a especialistas de outras Faculdades: na ocasião em que a Física Atómica começava a ser conhecida em Portugal, um jovem Doutor da Faculdade de Ciências, J. Veiga Simão, vem fazer uma conferência sobre "A Física Atómica e os Gregos"; da Faculdade de Direito - e para citar só mais um exemplo -vem o Doutor Mário Júlio de Almeida e Costa falar de Direito Romano.

E fácil multiplicar os exemplos, como pode verificar-se percor­rendo as dezenas de páginas hoje apresentadas neste volume. E também, é bom notar que de vários países estrangeiros vêm fazer conferências alguns dos maiores nomes dos Estudos Clássicos. Cito apenas um pequeno número: da Holanda, Van Groningen e Christine Mohrmann; da Inglaterra Kenneth Dover e Oliver Taplin; da Alemanha. Dieter Lohmann, Elizabeth Welskopf, Helmut Flashar; da Suíça Walter Burkert; da Espa­nha Fernández Galiano. Todo este renovamenfo se deve, naturalmente, à vinda de novos elementos para o Instituto de Estudos Clássicos, consoli­dada muitos anos depois pelo alargamento dos quadros. E, não menos, à entrada em vigor de uma reforma que, não sendo isenta de defeitos (não há reformas perfeitas), trouxe uma visão inovadora dos Estudos de Letras: Disciplinas propedêuticas, Seminários conducentes à preparação das teses de licenciatura (precursores dos futuros seminários de mestrado criados em 1982), divisão das Línguas, Linguísticas e Literaturas por dis­ciplinas diferentes, criação de cadeiras de História da Cultura. Pelo que toca à nossa área, o ensino de História da Cultura Clássica, obrigatório para toda a Faculdade, excepto Geografia, não só veio alargar os limita­dos horizontes em que se moviam os alunos de Grego e Latim, como veio revelar aos de Línguas e Literaturas Modernas, de História e de Filosofia, os alicerces sobre os quais se edificaram esses ramos do saber. Dos arranjos subsequentes desta, reforma, que, de u m modo geral, não a melhoraram, não nos ocuparemos aqui. Em todo o caso, a semente estava lançada à terra.

Ora, precisamente nesse ano de 1957, apenas uns meses antes, fora criada, a Associação Portuguesa de Estudos Clássicos, aberta a professo­res e estudantes dos diversos graus de ensino, dispersos por todo o país,

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e destinada a fomentar o progresso e a difusão dos estudos greco-latinos. O êxito obtido com a realização de conferências, a uma média de cinco ou seis por ano, audições musicais, visitas de estudo, foi grande durante anos sucessivos e nele se deve incluir a. criação no âmbito do Instituto, em 1984, a pedido de antigos alunos, actuais professores do Ensino Secundá­rio, de uma revista destinada ao ensino e divulgação das línguas e cultu­ras antigas, que teve grande adesão: o Boletim de Estudos Clássicos. A pró­pria associação, ao fim de quarenta e oito anos, e já sob a presidência cio Doutor Francisco de Oliveira, renovou os seus estatutos e decidiu con-centrar-se na realização de congressos e colóquios bienais. E assim, a partir de 1998, tiveram, lugar, com grande êxito, e com actas já publica­das, os seguintes: Raízes Greco-Latinas da Cultura Portuguesa, O Espírito Olímpico no Novo Milénio, Penélope e Ulisses. No primeiro e no terceiro esteve já representada a Euroclassica (Federação Europeia da Associação de Professores de Línguas e Civilizações Clássicas). O segundo contou com a adesão do núcleo de Viseu da Universidade Católica e efectuou-se nesse edifício. Actualmente, a Associação-portuguesa é filiada na FIEC e

na Euroclassica. É altura de fazer referência à criação do Centro de Estudos Clássi­

cos e Humanísticos, em 1967, por proposta, dos Doutores Américo da Costa Ramalho e Maria Helena da Rocha Pereira. E justo é salientar que foi graças ao empenhamento de dois outros professores da Faculdade, os Doutores A. J. Costa Pimpão e A. Miranda Barbosa, conselheiros do Ins­tituto para a Alta Cultura, que se tornou, possível a entrada em funcio­namento na Faculdade de Letras dessa unidade de investigação, que a partir cie então não mais deixaria de se desenvolver, quer sob a égide daquela organização estatal, quer das que lhe sucederam na tutela (Ins­tituto Nacional de Investigação Científica e Fundação para. a Ciência e Tecnologia).

Não podemos deixar de dar um lugar à parte ao convite que, em. 1976, a Prof.â E. Ch. Welskopf, da Academia das Ciências de Berlim., endereçou, ao Centro para elaborar a parte portuguesa de uma publicação monumental, em seis volumes, por ela dirigida, sobre terminologia polí­tica grega e sua presença nos mais diversos países de todos os continen­tes. Logo se constituiu um grupo de trabalho, dirigido pela Doutora Maria Helena da Rocha Pereira, e composto pelos bolseiros do Centro que se encontravam em actividade, num total de dez (e que na sua maioria são hoje professores catedráticos). A obra viria a ser publicada em 1982

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pelo Akademie Verlag de "Berlim, com o título Soziole Typenbegríffe im ciíten Griechenlond.

De resto, muitos eram os trabalhos de investigação em curso, orientados por áreas. Para além dos de Línguas e Literaturas Latinas, ocupavam já um lugar de destaque os estudos sobre os humanistas por­tugueses, a que o Doutor Américo da Costa Ramalho dera grande impulso, quer através do Seminário sobre o Latim do Renascimento, diri­gido por aquele Professor, a partir de 1963-64, quer das numerosas publi­cações monográficas, colectâneas de trabalhos e edições, com tradução e notas, daqueles autores, que permitem colher dados muito importantes sobre a História e a Cultura Portuguesas. Entretanto, começaram também, a despontar os estudos sobre Latim Medieval, sob a orientação do Doutor José Geraldes Freire.

Para. além da investigação realizada pelos seus membros e respec­tiva publicação, o Centro promoveu, em 1973, juntamente com o Insti­tuto, um Colóquio sobre o Ensino do Latim, destinado à apresentação e discussão dos novos métodos de ensino (com destaque para o então recentíssimo Cambridge School Classics Project), bem como a fundamentar o estudo dessas disciplinas no ensino secundário. Ouviram-se, entre outros valiosos contributos, as palavras de conceituados especialistas, que sucessivamente versaram a relação do Latim com. o Português, com as outras línguas modernas, com a História, a Filosofia e o Direito. Outras realizações conjuntas foram o Segundo Curso de Actualização de Línguas e Literaturas Clássicas (em 1982), e diversos congressos, como o do "Humanismo Português na Época, do Renascimento", "Medeia no Drama Antigo e Moderno", "Plutarco Educador da Europa", " O Teatro Neola-tíno em Portugal e no Contexto da Europa - 450 Anos de Diogo de Teive", "Anchieta em Coimbra - 450 Anos do Colégio das Artes da Uni­versidade", "O Retrato Literário como Estratégia de Teorização Política".

Ainda relativamente ao Centro de Estudos Clássicos e Humanísti­cos, cumpre realçar que nos últimos anos, sob a direcção da Doutora Maria do Céu Fialho, as áreas de investigação se diversificaram por qua­tro linhas, uma dedicada, à Antiguidade Grega, outra à Romana, outra ainda ao Latim Medieval e Renascentista, além de uma quarta, mais recente, de Pragmática Teatral, destinada à divulgação do Teatro Antigo, assunto a que voltaremos adiante.

Além disso, e de acordo com a ordenação actual da FCT, o Centro tem fomentado a realização de reuniões científicas de carácter interdiscí-

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plinar e internacional. Nessas actividades se enquadram, por exemplo, o colóquio "Éticas: Diálogos com Aristóteles", organizado em 2004 em. conjunto com o Centro de Linguagem Interpretação e Filosofia, também da Faculdade de Letras. De uma parceria semelhante, desta vez situada no âmbito da acção integrada Valladolid-Coimbra, bem como dos mes­trados em Poética e Hermenêutica, e em Literaturas Clássicas, decorreu o colóquio "Sob o Signo de Medeia".

Dos projectos actualmente em curso, adquire especial relevo, pela sua amplitude, e pelo número de investigadores que envolve, o dedicado à Ideia de Europa, e às Raízes da Identidade Cultural. Europeia.

Por sua vez, ao longo dos últimos decénios, o Instituto de Estudos Clássicos tem levado a efeito, em conjunto com outros institutos da Facul­dade, congressos internacionais que atraíram muitas centenas de partici­pantes. Lembraremos em especial o II Congresso Peninsular de História Antiga, em parceria com o Instituto de Arqueologia, e presidido pelo Doutor José Ribeiro Ferreira (em. 1990), e o Congresso Comemorativo do Infante D. Pedro, com o Instituto de História Económica e Social (1992). Outras iniciativas congéneres decorreram com a colaboração de entida­des estrangeiras. E o caso do Congresso Internacional "As Humanidades Greco-Latinas e a Civilização do Universal", organizado de par com a associação parisiense Archives du XXème Siècle, que teve como presidente de honra o humanista e antigo Chefe de Estado do Senegal, Léopold S. Senghor (1988), e que reuniu especialistas de catorze países.

Foi ainda na sequência deste congresso que no colóquio "La lati-nité: 1'avenir d'un passe", organizado na Universidade de Clouj pela Fondatia Culturala Romana em 1999, se votou a criação de um Centro Internacional de Latinidade, a ser acolhido, na sua primeira fase, pelo Instituto de Estudos Clássicos de Coimbra.

Destina-se esse Centro a promover a aproximação entre países, instituições e pessoas interessadas na herança linguística e cultural da Latinidade; favorecer pela sua acção o diálogo de todas as culturas; introduzir nesse diálogo a voz da cultura greco-romana; levar a efeito actividades de extensão cultural, colóquios, conferências, exposições e representações de teatro antigo. Diversos países enviaram delegados à primeira reunião, efectuada em Coimbra. (Argentina, Brasil, Espanha, Suíça). Outros manifestaram a sua. adesão por escrito (Bélgica, Itália, França, Roménia).

Hi imantou 57 (2005)

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Entre as actividades' desenvolvidas por esse Centro, figuram a participação, juntamente com outras entidades, na celebração do Dia da Latinidade, o último dos quais, em 2004, consagrado em. especial a Horá­cio e à sua. permanência, com a colaboração, para além de classicistas de Coimbra, dos de Lisboa e de Buenos Aires e de professores de Literaturas Modernas de Coimbra e de Lisboa.

Outros colóquios foram organizados pelo Instituto de Estudos Clássicos, como os consagrados aos "Fragmentos de Plutarco e a Recep­ção da sua Obra", "A Ciência: Débitos ao Passado e Perspectivas de Futuro", e "Som e Imagem" (este, de carácter didáctico), além de sessões culturais, com a participação de diversos professores, como o que foi con­sagrado ao Mito e o que versou sobre Prometeu.

Outra actividade do Instituto de Estudos Clássicos, e também, sob a direcção do Doutor José Ribeiro Ferreira, foi a realização da série de ses­sões de "Encontros com Escritores", que, num total de dezassete, e ao longo de vários anos, trouxe a Coimbra poetas e prosadores contemporâ­neos que retomaram temas clássicos nas suas obras. A respectiva apre­sentação era sempre feita por conhecidos especialistas.

Um facto que especialmente agrada registar é a sucessiva aproxi­mação que tem vindo a efectuar-se entre o Instituto de Estudos Clássicos de Coimbra e o seu congénere de Lisboa, bem como dos respectivos Centros. Primeiro em convites pessoais, depois em organizações conjun­tas, esta colaboração entre as únicas instituições do país exclusivamente consagradas à Antiguidade Greco-Latina é um exemplo enriquecedor. Assim sucedeu já com, o congresso comemorativo do Bimilervário de Vir­gílio, em Lisboa, e se repetiu com a celebração de Marcial 1900 anos após a sua morte (Toio notus in orbe Martialis), este repartido pelas duas cidades.

Quatro anos antes deste último, ou seja, em 2000, a estes mesmos institutos e centros se associou o Centro de Investigação e Desenvolvi­mento em Ciências Humanas e Sociais, da Universidade de Évora, para. organizar o Congresso Internacional do Humanismo Português: "Cataldo Sículo e André de Resende - 500 anos". E assim, pelas três cidades que, no século XVI, foram de facto, e não por decreto, capitais nacionais da cultura, se desenrolou esta homenagem a duas grandes figuras do nosso humanismo.

Merece uma referência à parte um Congresso realizado, em 1992, por iniciativa de alunos do 4a ano do Curso de Línguas e Literaturas

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Clássica e Portuguesa sobre "O Amor deste a Antiguidade Clássica". Da qualidade excepcionai deste curso voltaremos a falar. Aqui notaremos só que um dos seus elementos, o Doutor Delfim Leão, é o actual Director do Instituto de Estudos Clássicos.

Uma vez que para tratar o tema fora escolhida uma perspectiva diacróníca, foram convidados a falar professores, não só de Estudos Clás­sicos, mas também de Línguas e Literaturas Românicas. Deste último grupo eram também os especialistas que tomaram parte na mesa--redonda subordinada ao tema "A Fortuna do Amor" (Doutores Ofélia Paiva. Monteiro, José Carlos Seabra Pereira e José Cardoso Bernardes, além de um estudioso de Psicologia, o Doutor Álvaro Miranda Santos). O debate foi moderado pelo Doutor Aníbal Pinto de Castro, que já fora um cios conferentes da véspera - um mestre que tanto tem colaborado com o grupo de Clássicas em diversas ocasiões, nomeadamente, tomando a seu cargo, desde o começo, dirigir um. dos seminários do mestrado, o cie Lite­ratura Portuguesa Clássica. Como não podia, deixar de ser, realizou-se ainda um debate sobre o futuro das Línguas Clássicas, em que participou também um dos estudantes do curso.

Um caso especial, de colaboração do Instituto de Estudos Clássicos com outros países europeus é o da participação, através da. Doutora Maria de Fátima Silva, no Centre for Study and Practícal Realization of the Ancient Greek Drama, coordenado pela actriz Aspasía Pappathanas-siou, de Atenas, e pelo Professor Oliver Taplin, da Universidade de Oxford. Após um primeiro congresso em Komotini, na Trácia, em 1992, sobre "O Coro no Teatro Grego", deíineou-se um programa de informa­ção e documentação sobre o drama grego antigo que se propõe recolher e organizar os dados disponíveis nesse âmbito. Assim se constituiu, sob a orientação daquela Professora, um grupo de trabalho formado por inves­tigadores do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos, que publicou já três volumes.

Outro campo de actuação que tem conhecido um. grande êxito é o da divulgação cio teatro grego e latino, através de representações feitas por grupos de jovens estudantes, quer nacionais, quer estrangeiros. Com gloriosos precedentes no tempo em que o Doutor Paulo Quintela ence­nava no TEUC um drama de cada. um dos grandes trágicos gregos, em versões expressamente feitas do original por helenistas que são hoje investigadores do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos e uma primeira amostra em. 1992, dada pela representação integral, em Latim,

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dos Meneemos de Flauto, pelo grupo de. teatro latino da Universidade de Trier, representação essa apoiada por um. engenhoso prólogo em portu­guês, composto pelo Dr. Louro da Fonseca, o qual tornou o espectáculo compreensível, ao numeroso público escolar presente, começou a tomar forma ria nova geração, ou, mais concretamente, no mais distinto curso de Línguas e Literaturas Clássicas e Portuguesa a que já aludimos, o projecto cie criar um. grupo de teatro antigo.

Partindo de algumas primeiras tentativas e com o apoio do Dr. Louro cia Fonseca, e tendo começado por cenas do Soldado Fanfarrão de Planto, o projecto é retomado, a partir de 1996/ com a rodagem, de uma versão video, feita em Conimbriga, de Mulheres no Parlamento de Aristófanes, e, dois anos depois, com uma representação do Epídico de Flauto. Mas é a partir de 1998 que o então director do Instituto de Estudos Clássicos, Doutor José Ribeiro Ferreira, juntamente com o grupo de Assistentes dedicado à pragmática teatral, Delfim F. Leão, José Luís Brandão, Luísa de Nazaré Ferreira, Paulo Sérgio Ferreira e Cláudia Cravo, cria a Associação Cultural Thíasos, logo oficializada como entidade jurídica. Nessa conformidade, se organiza um curso breve de Teoria e Prática do Teatro Grego, dirigido por José Luís Navarro (Universidade Compluten.se de Madrid) e Gemina López Martínez. Poucos meses depois, Helrnut Flashar, da Universidade de Munique, e Giiver Taplin, da de Oxford, fazem cada um duas conferências sobre o tema.

A partir do ano 2000, e sempre sob a orientação do Doutor José Ribeiro Ferreira, sucedem-se os festivais de teatro, ora em Conimbriga, ora em Coimbra, em Viseu, em Braga, em Tomar, e noutros locais, em que desempenham papel importante, além do Thíasos, outros grupos nacionais e espanhóis. Estas actividades concentram-se em Festivais Escolares, na Primavera, e Encontros de Verão. Representam-se tragédias de Esquilo, de Sófocles e de Eurípides e comédias de Aristófanes e de Menandro. Também outros textos clássicos são dramatizados com grande êxito, como "O Poeta, e o Maçador" (a partir da Sátira 1.9 de Horácio) e "Marcial em Traje de Cena." (com base em epigramas cio poeta hispâ­nico). De notar que o Thíasos tem participado em festivais internacionais em França, Itália e Espanha e que se associou às comemorações dos 2500 anos do nascimento de Sófocles, representando as Traquínias.

Finalmente, os vários organismos que asseguravam estas repre­sentações - Instituto de Estudos Clássicos, Liga de Amigos de Conim-

H i / m a n f c í C7 ÍOAnKI

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briga e Grupo Thíasos do IEC - acordaram, em 2002, em constituir uma só entidade, Festival de Teatro de Tema Clássico - Associação Promotora, que em 2003 adoptou a sigla FESTEA - Tema Clássico.

Por último, há que referir a quantidade de publicações que ao longo destes 60 anos se tem produzido e o trabalho assíduo e esforçado que está na sua base. Das revistas já falámos: uma, Humanitas, anual, já com 56 volumes; outra, o Boletim de Estudos Clássicos, com 42 tomos. Mas existem, além disso, diversas colecções que se iam organizando de acordo com os subsídios e patrocínios disponíveis. Assim, há uma série mais antiga, só do Instituto de Estudos Clássicos, com. 12 volumes; outra, só do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos, com. 9; outra ainda, com o título cie Estudos de Cultura Clássica, com 7. Duas outras séries são exclu­sivamente consagradas à publicação de traduções comentadas: unia diri­gida pelo Doutor Walter de Sousa Medeiros, chamada Textos Clássicos, já com 36 volumes, tem prestado inestimáveis serviços, oferecendo, em muitos casos pela primeira vez, traduções fidedignas, com prefácio e notas, de autores gregos e latinos; outra, orientada pelo Doutor Américo da Costa Ramalho, tem tido idêntico papel em. relação aos nossos huma­nistas, intitula-se Textos do Humanismo Renascentista em Portugal e conta já com 11 volumes.

Outras colecções foram publicadas por editores comerciais, embora dirigidas por professores nossos, nas quais destacamos, por ordem cro­nológica, a Biblioteca Integral Verbo, série Clássicos Gregos e Latinos, de que só chegaram a sair três volumes em 1973; a série Clássicos Gregos e Latinos, das Edições 70, dirigida pelo Doutor José Ribeiro Ferreira, ini­ciada em 1989, e com 35 volumes; a Colecção Humanitas: Autores Gregos e Latinos, da Relógio d'Água Editores, dirigida pelo mesmo Professor e com três volumes, todos saídos em 1999.

A tudo isto, e também sob a égide do Doutor José Ribeiro Ferreira, se vem. juntar a colecção FESTEA - Tema Clássico, que, com o formato de livro de bolso, o qual faz as vezes de bilhete por ocasião dos espectáculos, oferece traduções, com prefácio, dos grandes autores de teatro gregos e latinos, num total de mais de 20 peças, algumas das quais já em terceira tiragem..

Um grosso volume com as sete tragédias conservadas de Sófocles, com tradução e prefácio de três professores da secção, foi o contributo da organização "Coimbra Capital Nacional da Cultura", em 2003, para comemorar os 25 séculos do dramaturgo.

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Sem contar os numerosos tomos de actas de congressos, há que acrescentar ainda os volumes temáticos completados no decurso do ano de 2004: Fluir Perene. A Cultura Clássica em Escritores Portugueses Contem­porâneos, coordenado por José Ribeiro Ferreira e Paula Barata Dias; O Retrato e a Biografia como Estratégia de Teorização Política, organizado por Aurélio Pérez Jiménez, José Ribeiro Ferreira e Maria do Céu Fialho; e Nomos, Direito e Sociedade na Antiguidade Clássica, editado por Delfim F. 'Leão, Livio Rossetti e Maria do Céu Fialho.

Esta enumeração de actividades, que a alguns poderá ter parecido longa - e é bom sinal, porque significa que são numerosas - não é exaus­tiva e pode até dar-se o caso de eu ter omitido, involuntariamente, factos importantes. Mas o principal, e isso espero tê-lo conseguido, é transmitir a noção de que estamos perante um grupo que, a partir de um pequeno núcleo inicial, se expandiu e desdobrou em múltiplas actividades; que tem mesmo criado doutores para continuarem a sua escola, assegurando o ensino do Latim, não só na Universidade do Porto, mas em várias das chamadas universidades novas ' - Minho, Aveiro, Évora; que tem estado atento à necessidade de actualização e adaptação permanente, que é comum a todo o ensino, mas em especial ao das Línguas Clássicas; que se tem aberto à colaboração com outros países, e estabeleceu uma relação especial, com o Brasil que tem tornado acessível o conhecimento dos auto­res greco-latinos através de traduções directas, já numerosas. E que tem feito e certamente continuará a fazer os maiores esforços para tornar compreensível à sociedade portuguesa que nem só as técnicas são neces­sárias ao seu progresso, mas também uma formação cultural transmis­sora e impulsionadora dos valores em que eia assenta. Gostaria de termi­nar com uma advertência do meu mestre oxoníense, Prof. E. R. Dodcls, feita há algumas dezenas de anos, mas sempre actual, numa alocução à Classical Association, subordinada, ao significativo título de "Ensino cios Clássicos num Clima. Alterado". Ar frase, que traduzo, é esta: "seremos mais sensatos se dissermos francamente que o real valor dos bens que oferecemos deve aquilatar-se, não em termos de técnicas susceptíveis de serem transmitidas ou de informação de utilidade imediata, mas em ter­mos cie experiência humana". Julgo que não será preciso sublinhar que este afirmação é igualmente aplicável a todas as áreas das Ciências Humanas.

MARIA HELENA DA ROCHA PEREIRA

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O LATIM LÍNGUA INÚTIL? MEMÓRIAS DE UM APRENDIZ DE LATINISTA

Quando regressei de Oxford, em Novembro de 1949, depois de dois anos a frequentar aulas na Universidade e a trabalhar na minha tese de doutoramento, ao voltar a. Portugal, encontrei-me envolvido em mais urna disputa sobre os méritos do Latim.

Foi o caso que o Professor João Serras e Silva (1868-1956), já então com mais de oitenta anos, resolveu atacar o estudo do Latim, no currículo liceal.

Era eu então assistente da Faculdade de Letras de Lisboa, escola à qual sempre estarei grato, por me ter permitido passar dois anos lectivos, de 1947-1949, na Universidade de Oxford.'1, como bolseiro do Instituto de Alta Cultura.

Ao artigo do Doutor Serras e Silva, que fora outrora, professor de Higiene na Faculdade de Medicina e no Curso de Ciências Pedagógicas da Faculdade de Letras de Coimbra, resolvi dar uma resposta, rebatendo um por um os seus argumentos num artigo que publiquei no jornal Novi­dades, então um diário católico, editado em Lisboa, onde aliás, o Prof. Ser­ras e Silva dispunha de grande influência como jornalista católico.

O Doutor Serras e Silva resolveu responder-me. Em tom paterna­lista, como convinha à sua idade e ao seu prestígio pessoal e político, não escondeu o desagrado e ficou furioso. Do jornal Novidades ínforma-ram-me da sua surpresa em se ver contestado por um desconhecido, para mais jovem, segundo ele depreendia do entusiasmo com que o meu artigo fora escrito. E terminava a sua resposta, lamentando que a minha juventude não tivesse melhor ocupação do que estudar uma língua inútil. Aconselhava-me, por isso, a não perder mais tempo com tal velharia e a aprender, em substituição do Latim, a língua, inglesa que estava desti­nada, a grande futuro e era já então de utilidade indiscutível.

Confesso que o que mais me surpreendeu foi esta simpatia pelo inglês, língua que certamente o Prof. Serras e Silva não falava, pois era o francês a língua dominante na altura em pessoas da sua geração.

A minha resposta rebateu uma vez mais, a. sua argumentação e terminava em tom irónico, oferece i > me eu para discutir com ele, em inglês, idioma que ele tanto aprec c < questão do Latim.

1 Voltei a Oxford, por períodos menores, durante vários anos.

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O jornal Novidades, antes de publicar o artigo, deu-lho a conhecer. Pouco depois informou-me de que o artigo não seria, publicado, porque fora proibido pela. censura. Nunca cheguei a sabet de que censura se tra­tava, se a do Estado, se a interna do próprio jornal.

Preocupado com a redacção da tese de doutoramento que estava então na fase final, dei pouca importância ao episódio.

Vim roais tarde a saber coisas ocorridas neste caso, que não abona­vam em favor da honestidade intelectual de algumas pessoas envolvidas. Faleceram todas e por isso não as refiro aqui.

Também me explicaram., anos depois, que o Doutor Serras e Silva passou a detestar o Latim porque um neto, ou sobrinho-neto, não conse­guiu entrar em Direito, por ter reprovado a Latim. Ignoro se isto é ou não verdade.

Anos mais tarde, já professor catedrático, fui persuadido a concor­rer a uma eleição para a Assembleia Nacional. Aceitei, na esperança de poder fazer alguma coisa pelos Estudos Clássicos, pois o Latim conti­nuava a ser combatido publica e particularmente. E no entanto, por esta altura, a sua situação era bem mais favorável que hoje.

Fui deputado na legislatura de 1957-1961, mas só estive dois anos na Assembleia Nacional, como então se chamava.

Nesses dois anos, defendi o Latim. A defesa do Latim foi bem recebida pelo plenário dos deputados,

ouvindo-se exclamações de apoio, e usou da palavra, em concordância, o deputado José Hermano Saraiva. O meu discurso e o dele foram publica­dos na revista Humanitas2, onde podem ser lidos.

É claro que não foi só do Latim que me ocupei nos dois anos em que fui deputado. Entre outras intervenções, tratei da situação dos professores agregados do ensino secundário que, depois do estágio e do Exame de Estado, ainda não ganhavam nas férias grandes. O discurso que proferi, bastante critico, teve algum efeito, porque meses depois os agregados passaram a ser pagos nas férias de Verão.

Entretanto, fui convidado pelo Instituto de Alta Cultura para parti­cipar no corpo docente do doutoramento em Estudos Luso-Brasileiros que ia ser iniciado na New York University, a maior das universidades da grande metrópole americana, cuja população é superior à de Portugal.

2 Vol. IX-X (1957-1958) p. 182-189.

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Aceitei e estou grafo à Assembleia Nacional e à Faculdade de Letras cie Coimbra, por me terem deixado partir para Nova Iorque.

Com o título de "Visiting Professor of Portuguese", fui ensinar Literatura Portuguesa do século XVI e Português Arcaico.

A Literatura Portuguesa Quinhentista servia também de introdu­ção à cultura do Brasil, pois o doutoramento em Portuguese and Brazilian Studies, visto do lado dos interesses americanos, dizia respeito mais ao Brasil do que a Portugal, porque para. os Estados Unidos o Brasil, é a grande potência do futuro na América do Sul. Convém não esquecer que o Brasil sozinho é comparável a todas as repúblicas sul-americanas de língua espanhola em conjunto. Por outro lado, o curso de doutoramento em estudos portugueses e brasileiros era promovido pelo Brazilian Ins-titute da N.Y.U. e subsidiado por Nelson Rockfeller, um milionário ame­ricano com grandes plantações de café no Brasil. O outro curso da parte portuguesa foi dado pelo Prof. americano Ernesto Guerra Da. Cal, sobre Eça. de Queirós.

Antes de partir para Nova Iorque, fui informado de que o Profes­sor Joaquim de Carvalho, então internado na clínica de seu filho Manuel, na rua dos Combatentes, queria faiar comigo. Fui visitá-lo, levando já um cartão de despedida, por me terem dito que não recebia visitas, por ordem dos médicos. Mas quando soube quem o visitava, mandou que me deixassem entrar.

Depois de uma animada 'exposição do grande Mestre sobre a necessidade de estudar o Humanismo Português, a partir dos textos ori­ginais, em. latim, falou-me de Cataldo Parísio Sículo que muitos mencio­navam sem. nunca o terem lido, pois o seu latim não era fácil de ler nem de traduzir.

Alguém, meu amigo, com a melhor das intenções escreveu que, depois do meu regresso da América, em. 1962, dera. começo aos novos estudos sobre Humanismo em Portugal,

Mas não é bem assim. O meu. primeiro trabalho de Latim. Renas­centista data, na realidade, dos tempos em que frequentei, no segundo ano da Faculdade, a cadeira de História dos Descobrimentos Portugue­ses, regida peio Prof. Damião Peres.

Tratava-se cia legenda, em latim, dum mapa quatrocentista onde figuravam as navegações de Diogo Cão. O texto latino termina com duas palavras hic moritur que eram interpretadas como referidas à morte de Diogo Cão.

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No final da aula, quando todos tifíham saído, dirigi-me ao Doutor Damião Peres e comuniquei-lhe as minhas dúvidas de que o verbo (mori-tnr) tivesse por sujeito Diogo Cão, pois sintacticamente me parecia refe-rir-se a uma montanha mencionada no texto.

O professor pediu~me que pusesse por escrito tudo o que acabava de dizer. Assim fi.z e não se falou, mais do caso.

À aula foi no ano lectivo de 1940-1941. Já era assistente em Lisboa, quando me contaram que o Prof.

Damião Peres falava de mim nas aulas, a propósito das viagens de Diogo Cão. E só, por essa altura soube que o meu trabalho fora publicado em Coimbra na Revista Portuguesa de História, vol. II, ano de 1943.

Mais tarde, Luís de Albuquerque informou-me de que havia indí­cios claros de ter Diogo Cão sobrevivido a. essa viagem em que era cos­tume darem-lhe por finda a existência. Quando estudante de Clássicas, traduzi textos de humanistas para o meu antigo professor do liceu de D. João III, Dr. António Correia de Oliveira, para o Prof. Lopes de Almeida e revi traduções que tinham, sido feitas para o Prof. Joaquim de Carvalho.

Em 1945, no ano da minha licenciatura, publiquei o Catálogo dos Manuscritos da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, relativos à Anti­guidade Clássica - que é sobretudo um catálogo do Humanismo em Portugal. Saiu abusivamente como obra de dois autores, mas é exclusi­vamente trabalho meu.

António Tovar, eminente classicista e reitor da Universidade de Salamanca, na revista Emérita XV (Madrid, 1947, p. 272), considerou o Catálogo dos Manuscritos "como muestra dei despertar de los estúdios clá-sicos en el país hermano".

E muitos anos depois, em. 1989, o grande historiador do Huma­nismo Renascentista Europeu, o Prof. Paul Oskar Kristeller utilizou-o largamente, na parte relativa à Biblioteca da Universidade de Coimbra., no volume IV do seu Iter lialicum, publicado pelo Warburg Instítute de Londres.

É o momento de falar das dissertações de licenciatura. Quando me licenciei em Filologia Clássica, o curso terminava com

um exame de licenciatura que poucos faziam ao fim de quatro anos. A grande maioria gastava, um, ou mesmo dois anos, a preparar o temível exame final que compreendia uma prova escrita de Gramática Compa­rativa do Grego e do Latim, três provas orais, a saber, de Língua e Lite­ratura Grega, Língua e Literatura Latina e Filologia Portuguesa que hoje

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se chama, se não estou em erro, Linguística. Portuguesa, e então era uma cadeira, bienal para os alunos de Filologia Clássica.

O curso tinha forte componente linguística que hoje, segundo penso, desapareceu ou está muito reduzida. E é pena.

O exame de licenciatura era difícil, porque abrangia toda a matéria dada nas aulas, e havia professores que ampliavam ainda esse programa.

A. prova final, depois da escrita e três orais, era a defesa da disser­tação ou da tese, como então se dizia. Só eram admitidos à defesa da tese os alunos que tinham passado na escrita e nas três orais. Quando alguma destas provas corria mal, o aluno devia consultar o respectivo examina­dor para saber se podia defender a dissertação, porque, se fosse até o fim, e ficasse reprovado, tinha de apresentar nova tese no exame.

A Secção de Filologia Clássica estava então empenhada em elabo­rar um Lexicon Terentianum e a cada licenciando era distribuído um texto de uma comédia de Terêncio, para tratar o vocabulário nele contido, segundo um esquema, baseado no já existente Lexicon Plautinum cie Gon-zález-Lodge.

O licenciando não tinha qualquer orientação ou apoio e a varie­dade das soluções, sobretudo nos casos difíceis, era impressionante. Enfim, uma situação muito próxima do caos.

Quando me doutorei, em 1952, propus ao decano da Secção, o Prof. Carlos Simões Ventura, que me deixasse fazer uma avaliação do estado dos trabalhos. O Prof. Ventura, com. uma largueza de espírito e uma cor­dialidade que só os que lidavam de perto com ele, conheciam, disse-me: "O Ramalho é livre de escolher o caminho que preferir".

Falei-lhe do Humanismo Renascentista e dos.muitos textos em latim, que estavam por estudar. O Professor Ventura anuiu prontamente a que fosse esse o caminho a. seguir, de futuro, nas teses de latim.

Começaram., portanto, a ser feitas dissertações sobre textos do Humanismo Renascentista em. Portugal, a partir de 1952. Principiámos pelas orações de sapiência, entre elas a de Arnold Fabrice, ou aportugue­sado através do latim, Arnaldo Fabrício, pronunciada em 21 de Fevereiro de 1548. Fabrício estava convencido de que vinha expulsar, ele e os seus companheiros, a barbárie gótica da Lusitânia e proclamou a sua crença, em tom caloroso. O mesmo fizera Cataldo Parísio Sículo, mas sessenta anos antes. E tentou realizar este seu píojecto no território cios bárbaros lusitanos, ensinando laboriosamente, entre 1485 e cerca de 1517, ao passo que Arnaldo Fabrício não chegou a ficar em Portugal três anos.

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A fase inicial dos estudos sobre' Humanismo Renascentista em Portugal ocupou-se, como já disse, do começo do Colégio das Artes, a partir de 1548, e também da Universidade.

Mencionarei apenas títulos publicados e os seus autores. E deste período o livro de Jorge Alves Osório, Mestre João Fernandes, A Oração sobre a Fama da Universidade (1548), publicado em 1967.

Dois anos depois, em 1969, saía a Ia edição de Estudos sobre a Época do Renascimento, em que reuni trabalhos escritos de 1943 em diante, a começar pelo tal artigo de estudante intitulado "Sobre a data da morte de Diogo Cão".

De 1974, são Dwas Orações de Catado Sículo de Maria Margarida Brandão Gomes da Silva e o poema Martinho Verdadeiro Salomão, do mesmo Cataldo, por Duke da Cruz Vieira.

Houve neste período outras teses de licenciatura, dignas de impressão, mas faltaram os recursos materiais para as publicar. Ainda hoje podem ser impressas, depois de cuidada revisão e actualização.

Uma tese apresentada à Faculdade de Letras de Coimbra em 1967 por João Pedro Mendes, deu lugar a um livro impresso em São Paulo, em 1982, com o título de Cataldo Parísio Sículo, O poema De Diuina Censura et Verbo Humanato, livro primeiro. '

E a propósito do Brasil. De 1975 a 1977, dei na Universidade Fede­ral do Rio de Janeiro, onde introduzi os estudos sobre Latim Renascen­tista e Humanismo, cursos de pós-graduação aos assistentes, de que resultaram três teses de doutoramento, duas sobre Cataldo e uma sobre Manuel da Costa.

Merece também menção especial a utilíssima. Bibliografia do Huma­nismo em Portugal no século XVI de Isaltina Figueiredo Martins, publicada em 1985. E um livro que precisa de ser continuado com um novo volume sobre os trabalhos publicados nos últimos vinte anos, embora eles se encontrem, registados a nível internacional, na Bibliographié Internationale de VHumanisrne et de la Renaissance, editada na Suíça.

São desta altura as primeiras edições dos meus livros Estudos sobre o século XVI (1980) e Latim Renascentista em Portugal (1985). Outras publi­cações do grupo que em Coimbra investiga sobre Humanismo Renascen­tista são da autoria de:

Sebastião Tavares de Pinho que em 1981 publicou Carta à Rainha de Inglaterra de Jerónimo Osório; e viu impressa em 1987 a sua tese de dou­toramento, intitulada Lopo Serrão e o seu poema Da Velhice.

Nair de Castro Soares publicou em 1977 a primeira edição do seu livro Diogo de Teive, Tragédia do Príncipe João, baseado na sua tese de licen­ciatura, e em 1994 O Príncipe Ideal no Século XVI e a Obra de D. Jerónimo Osório, sua tese de doutoramento.

Carlos Ascenso André publicou em 1983, Diogo Pires, Antologia Poé­tica, e no ano de 1.992, mais dois livros: Um judeu no desterro. Diogo Pires e a memória de Portugal e Mal de Ausência. O Canto do Exílio na Lírica do Humanismo Português, este último baseado na sua tese de doutoramento.

Os mesmos professores orientaram teses doutorais em várias uni­versidades portuguesas, além de publicarem outros livros e numerosos artigos sobre Estudos Clássicos3.

Em Coimbra, depois do núcleo inicial de trabalhos, seguiu-se a fase de Cataldo, ao mesmo tempo que se está regressando ao Colégio das Artes na época pertencente à Companhia de Jesus, a partir de 1555.

Há desta época, abundante material em manuscritos, ainda por estudar, com. algumas consequências lamentáveis, como a de o professor universitário australiano4 John Martyn atribuir a André de Resende poe­mas latinos que são certamente obra de mestres e discípulos dos colégios dos jesuítas.

Na parte que conheço, há uma tese de doutoramento sobre a obra de Pedro Perpinhão, defendida no pólo de Viseu da Universidade Cató­lica, e duas teses de doutoramento em Coimbra. A primeira é de Marga-

3 Os livros publicados por classicistas de formação coimbrã, sobre Humanismo em. Portugal, atingem a soma. de quarenta volumes. Foram seus autores Aires Pereira do Couto; Albino de Almeida Matos; Américo da Costa Ramalho; António Guimarães Pinto; Augusta Fernanda Oliveira e Silva; Belmiro Fernandes Pereira; Carlos Ascenso André; Carlota Maria Lopes de Miranda Urbano; Dulce da Cruz Vieira; Isaltina Figueiredo Martins; João Pedro Mendes; Jorge Alves Osório; José Nuno Pereira Pinto; Maria Margarida Brandão Gomes da Silva; Maria Margarida Lopes de Miranda; Nair de Castro Soares; Sebastião Tavares de Pinho; Virgínia Soares Pereira.

No campo dos Estudos Medievais há oito volumes publicados pelos investigadores António Ribeiro Rebelo, José Geraldes Freire, José Maria Cruz Pontes, e Paula Cristina Barata Dias.

4 Ver A. Costa Ramalho, "O poema'De Agnetis Caede será uma fonte de Os Lusíadas?", Península, Porto, ne 1, 2004, p. 113-121; Idem, "Dois Epigramas atribuídos a André de Resende", Humanitas, vol. LVI, Coimbra, 2004, p. 254-267.

Humanitas 57 (2005)

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rida Miranda sobre a tragédia Achab de Miguel Venegas, em, curso de publicação; a segunda é sobre o poema Padecidos libri duodecim de Barto­lomeu Pereira.

A autora, Carlota Miranda Urbano, já antes publicara a sua dis­sertação de mestrado, intitulada A Oração de Sapiência do Pe. Francisco Machado, S.J., Coimbra 1624, editada no ano de 2000.

"Neste contexto se enquadra o Congresso Internacional Anchieta em Coimbra, Colégio das Artes da Universidade de Coimbra (1548-1998), para o qual vários dos professores conimbricenses escreveram comunicações que podem ler-se nas Actos do Congresso, oportunamente publicadas.

Aqui se enquadra também a tradução do livro cio Pe. Duarte de Sande, S.J., antigo professor do Colégio das Artes, com um longo título em latim de que as palavras essenciais são De Missione Legatorum Iaponen-sium aã Romanam Cirnam... Dialogas, sobre os quatro -japoneses, simpáti­cos jovens que os jesuítas trouxeram à Europa e estiveram em Coimbra em Dezembro de 1585.

A tradução que está esgotada, foi a primeira que se fez numa lín­gua europeia. A falsa informação de que existia uma tradução portu­guesa anterior à minha, foi refutada, há mais de cem anos, por Inocêncio Francisco da Silva no seu Diccionario Bibííographico5.

Em 1936, saiu uma tradução japonesa que não utilizei, porque é sempre preferível traduzir o original, e, também, porque não sei japonês. Além destas razões, há outras que seria longo expor aqui.

Congressos realizados em Coimbra, no domínio cio Humanismo Renascentista, foram um em 2002 sobre Damião de Góis, cujas Actos não estão publicadas.

Em 2004, realizou-se outro colóquio internacional sobre o teatro dos jesuítas, cujas actas espero venham a ser publicadas. Foi deveras estimulante, pelas novidades então surgidas.

Estes são encontros recentes. Mais.antigos foram, por exemplo, o Congresso Internacional Humanismo Português na Época dos Descobrimentos, em 1991, que abriu com grande solenidade.

5 Cf. os volumes II, VIII e IX. Ver ainda Duarte de Sande, S.J., Diálogo sobre a Missão dos Embaixadores Japoneses à Cúria Romana, Prefácio, tradução do latim e comentário de Américo cia Costa Ramalho, Macau, CTMCDP e Fundação Oriente, 1997, p. 15, n.ll.

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E no ano 2000 Catctldo Parísio e André de Resende. Congresso Interna­cional do Humanismo Português em que foram celebrados os quinhentos anos do primeiro volume das Epistolae et Orationes Cataldi Siculi, cujo cólofon. é datado de 21 de Fevereiro de 1500. E outra data menos segura, a do nascimento de André de Resende que pode ter ocorrido em 1500, mas não é impossível que se tenha verificado noutro ano próximo. Uma parti­cularidade interessante deste simpósio de Cultura Portuguesa foi o de ter decorrido em três universidades, seguidamente, Coimbra, Lisboa e Évora, terra natal de André de Resende.

Deixemos, porém, congressos, simpósios e colóquios. Mencionarei dois livros, publicados peia Imprensa Nacional - Casa da Moeda de Janeiro de 2005 e um saído em Dezembro cie 2004 na Suiça e chegado às minhas mãos no mês seguinte.

O primeiro é a tradução do tratado De Gloria de Jerónimo Osório, feita por António Guimarães Pinto, licenciado e mestre pela nossa Facul­dade e doutor pela Universidade cio Minho.

Na introdução do De Gloria, Guimarães Pinto que não é noviço nestas andanças, pois já traduziu quase toda a. tratadística de Osório, cri­tica as conclusões apriorísticas de certo investigador já falecido, sobre a. formação cultural do famoso humanista português. Mas não dá uma razão para a superficialidade dogmática do referido investigador. A ver­dade é que os tratados de D. Jerónimo Osório não estavam ainda tradu­zidos e o dito sábio não sabia latim.

O segundo livro da Imprensa Nacional - Casa. da Moeda, acabado de imprimir em Janeiro de 2005, são as Epístolas, II Parte de Cataldo Parísio Sículo, traduzidas por mim próprio e por Augusta Fernanda Oliveira e Silva. Começámos pela 'Segunda Parte', porque esta. é mais homogénea que a. primeira e contém quase exclusivamente cartas dirigidas a portugueses, entre 1495 e cerca de 1513, portanto no reinado de D. Manuel í. A 'Primeira Parte', além de cartas escritas por Cataldo em Itália, antes de vir para Portugal em 1485, guarda o epistolárío da época de D. João II. Estamos presentemente a traduzi-la e a comentá-la. Finalmente, o terceiro livro recente é a Bibliographie Internationale de 1'Hnmanisme et de la Renaissance, publicado em Genève, pela Librairie Droz. Contém a bibliografia relativa a 2000 onde Portugal está lar­gamente representado. Reuniu e organizou o material bibliográfico Isaías A. Hipólito, sob a minha orientação. Em volum.es anteriores, em que aparece a colaboração portuguesa, o mesmo trabalho foi feito por Isaltina

Humanitas 57 (2005)

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Figueiredo Martins. A ambos agradeçoóa tarefa, realizada, que muito prestigia internacionalmente o nome de Portugal.

Não quero esquecer a recém-fundada Associação Portuguesa de Estudos Neolatinos APNEL, da qual muito se espera para o futuro dos Estudos de Latim Medieval e Latim Renascentista.

O Latim, língua inútil, afinal é de primeira importância para a história da Cultura Europeia, mormente na época dos Descobrimentos Marítimos, o período mais glorioso da nossa história. E outro tanto se pode dizer do Latim Medieval para a época anterior.

Para terminar, gostaria de referir um episódio ocorrido a 10 de Maio de 2000 na Academia das Ciências em Lisboa. Trata-se de uma videoconferência sobre o presente e o futuro da língua, portuguesa em que tomaram parte sócios da nossa Academia e membros da Academia Brasileira de Letras situada no Rio de Janeiro.

Graças à televisão, puderam trocar opiniões como se todos estives­sem presentes na mesma sala. De Coimbra participaram Maria Helena da Rocha Pereira, Aníbal Pinto de Castro e eu próprio.

Na minha vez de falar, com argumentação que pode ser lida em. Humaniias LIII (2001), p. 423-424, propus o regresso ao latim no ensino secundário dos países lusófonos, por forma, a criar um núcleo de voca­bulário e sintaxe da língua culta, que sirva de base constante perante as criações livres de cada um dos sete países.

A proposta foi bem recebida pela comissão brasileira, a quem per­tencia a redacção das conclusões. Assim, como conclusão quinta das dez apresentadas, surgiu o texto: «5. reintroduzir o ensino do latim nos currí­culos escolares dos 7 países, por maneira a melhor embasar o estudo da língua portuguesa.»

Terminarei com. a pergunta inicial, incluída no título, agora seguida de resposta:

O latim, uma língua inútil? Sim., para aqueles que a não conhecem.

AMéRICO DA COSTA RAMALHO

Notícias 543

VOZES DE SAPIÊNCIA, VOZES DE IDENTIDADE

Há rituais que se impõem na cadência do tempo e é necessário que haja um ajudante de mordomo que suba à torre para que o martelo faça vibrar o bronze dos sinos. Por deferência, incumbe-me dessa tarefa quem, mais jovem e mais lesto, poderia emprestar uma toada mais festiva ao repicar que se quer nobre e solene quando se convoca o arco de tempo bem medido de bodas de diamante (que monta a 60s de um horizonte que tem ainda muito para alargar). Noutros tempos, o toque dos sinos tinha vibração especial em. momentos de festa, respeitados a preceito, sentidos no quebrar do silêncio recortado na frescura das encostas serra­nas. Não há os mesmos timbres por entre os rumores surdos das cidades poluídas em que vivemos. Mais difícil se torna atender às mensagens quando o vozeio se levanta ameaçador e a sensibilidade vai ficando sem vibração de retorno.

Por vezes é necessário reconquistar'o silêncio para ouvir a voz que vem dos que nos precederam e enunciaram rumos. Sobretudo quando lhes foi confiada a. missão de interpretarem o sentir colectivo (e não ape­nas de grupo) em momentos de maior solenidade. Importa ouvi-la no silêncio, não porque essa voz seja ténue, mas para que sejam percebidos os harmónicos que a informam, e as razões que enuncia. Necessário, por certo, se impõe ouvi-la com reverência, para medir as distâncias e atender às responsabilidades de prolongar a sua efectividade, sobretudo quando se alteraram as condições do meio, se modificaram os enquadramentos, se abriram horizontes indefinidos. A participação no ritual é obrigato­riamente de interpelação.

Ao corresponder a convite, amavelmente feito, para introduzir as vozes que interpretaram em momentos solenes o que é a nossa missão de cultores das línguas clássicas e contribuíram em grande parte para faze­rem aquilo que percorremos no seguimento dos seus passos, temo que, sem conseguir sintonia total, contribua para introduzir ruído importuno e disforme. Não acontecerá certamente que, por "efeito de irreal", dimi­nua a possibilidade de reconhecimento dessas mesmas personalidades que se pretendem homenagear, pois o seu perfil é bem conhecido de todos os que no Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras de Coimbra, em que nos encontamos, vêem projectados os seus traços.

Abro o registo das vozes que ecoaram na solenidade das orações de sapiência... Vão bastante adiante e nem às mais próximas tive ocasião

Híiman/fa.q 57 Í2005)

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de as ouvir na origem. Todavia, não me sinto menos interpelado por elas. Como último licenciado pelo mais antigo desses Mestres, já na Faculdade de Letras de Lisboa, no final do ano lectivo de 1970, sinto-me na obriga­ção de me vergar perante a memória de Francisco da Luz Rebelo Gonçal­ves que lançou a primeira voz de semeador - por vezes é imprescindível que a voz acompanhe o gesto no início da sementeira, para que o sulco se feche e o grão admita descer à terra; o meu respeito não vai menos para as figuras de Américo da Costa Ramalho, Maria Helena da Rocha Pereira, José Geraldes Freire, felizmente ainda connosco, para lhes testemunhar quanto as suas vozes nos servem de incentivo e nos obrigam a manter em atenção a sua obra e a sua palavra - lúcida, responsável, interveniente.

Embora com risco de distorção, ser-me-ia muito grato sintonizar com cada uma dessas vozes, para recolher o timbre de cada uma. À sin­fonia procurada obrigar-me-ia a um exercício poético e analítico que dei­xaria a larga distância a autenticidade do testemunho. É-me pedido ape­nas que seja pretexto para que outros, fazendo coro e alargando o eco dessas vozes ou contrapondo interpelações, amplifiquem a mensagem que elas introduziram.

E em forma de enunciado projectivo o título dado à colectânea que traça a actividade científica, pedagógica e cultural do Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras de Coimbra e recolhe as Orações de Sapiência pronunciadas por Membros do mesmo Instituto em momento solene de abertura, do ano escolar. "Um passado com futuro"! Há razões para convocar o passado e há motivos para irromper no futuro6.

Pouco seria que apenas nos olhássemos ao espelho e caíssemos de bruços perante uma imagem que, sendo nossa, não nos devolvesse a luminosidade de quem foi à frente a apontar caminhos numa cultura que vem de séculos e constitui legado a transmitir.

Quatro vozes, em momentos diversos na cadeia do tempo, com ternas diferentes e complementares, com ritmos próprios e mensagens diferenciadas, são intérpretes de celebração em dias solenes da comuni­dade universitária conimbricense. Fazem elas arco com outras que as precederam no tempo e nos levam ao séc. XVI (em linguagem tão tiro-

6 Delfim Leão (coord.), Instituto de Estudos Clássicos - Um passado com futuro: 60 anos de actividade científica, pedagógica e cultural, Coimbra, Imprensa da Universidade, 2005.

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brada que ainda hoje ecoa). Todas, cada uma a seu modo, no ritual uni­versitário, celebraram, as Humanidades Clássicas. Todas elas são repre­sentativas e justo é que a elas nos associemos pelo que significam e pelo que propugnaram, ainda que ritual de celebração não seja sacramental que garanta, estabilidade. Sabemos bem que, apesar das anuências do cerimonial, nem sempre a comunhão é conseguida, pois, muitas vezes, nos bastidores, a trama de interesses imediatos sobrepõe-se àquilo que o ritual montou em público e subordinou às conveniências do claustro.

As rupturas são nitidamente mais marcadas hoje que nos tempos em que a Academia acolheu jubilosamente vozes de sapiência que enun­ciaram os méritos das línguas clássicas perante doutores particularmente sensíveis ao prestígio das Humanidades. O elogio das Letras Clássicas corre riscos nos nossos dias: tanto o de perder lugar para os anunciadores como o de deixar de ter público que procure as razões do elogio. Entre "línguas de cultura" e "línguas de serviço", muitos intelectuais (que se prezam de eruditos e de mentores da nova sociedade) preferem a utili­dade imediata e não se importarão de ir de braço dado com os econo­mistas de serviço para. não faltar clientela de estatística e salvaguardar algum posto de emprego.

É quase uma ousadia falar hoje em. humanidades clássicas, na dimensão que a história da cultura europeia consagrou e reconheceu ao longo dos tempos. Ainda recentemente, Jaqueline de Romilly, se viu obrigada, uma vez mais, a gritar por socorro, em apelo público (o título era significativamente: "J'appelle à 1'aide")7 para uma. nova campanha em defesa das humanidades clássicas. Denunciava ela o "golpe terrível que acaba de ser dado às disciplinas literárias, de que o latim e o grego fazem parte, e que, de uma machadada, acabam de ser irradiadas do ensino secundário".

De facto, quando pensávamos que sucessivas campanhas de sensi­bilização e de resistência nos reservariam outra sorte, sentimos que nos está a ser retirado espaço de sobrevivência. Grave é que no olvido da tra­dição se cerre um ciclo que julgáramos mais amplo, apesar dos combates que havia sido necessário travar.

Parece chegado o tempo em que as razões são esquecidas e os argumentos não colhem, pois os "bárbaros" já não olham sequer para os

' Le Figuro, 29 de Janeiro de 2004.

Humanitas 57 (2005)

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tesouros acumulados, por muito que eles.sbrilhem. Talvez porque esses tesouros têm demasiado peso, apesar da beleza que encerram...; talvez porque custa preservar a herança - que foi conservada sem amor...; talvez porque, na fuga (-ao tempo e à identidade), apenas o instinto da sobrevi­vência conta. No naufrágio geral, poucos ousarão regressar a casa para escolher um único livro que mereça ser tido como memória dos tempos vividos; alguém que ouse olhar para trás corre o risco de se ver contado entre os cadáveres de alguma besta apocalíptica - pois a transformação em estátua de sal é episódio honroso demais, pois o sal ainda preserva.

Condições adversas ameaçam eliminar do ensino os últimos resis­tentes - que durante algum tempo, na esperança de melhores dias, con­descenderam em aceitar tratamentos discriminatórios ou, em atitude de revolta e de provocação, bateram com a porta e, em refúgios tolerantes, procuraram lugar para preservarem o que carregavam às costas como talismã para a fundação de Nova Cidade. Jacqueline de Romilly, com a autoridade que lhe assiste, apontava o dedo à escola, pública, que fechou portas àquilo que era factor de identidade e de coesão - as línguas clássi­cas. De resistência ao tempo e de contrapeso ao afundamento no ime­diato, também...

Factores de alteração no panorama cultural têm sido muitos. No meio escolar, também. Concorrência (em grande parte desleal) no capí­tulo de opções curriculares, subterfúgios centrados sobre economia de meios, supressão de professores por estratégias sem horizontes, redução de candidatos por falta de condições, estreitamento de motivações por ausência de convicções baseadas em argumentação sólida, falta de estí­mulos por ausência de dimensão cultural...: o horizonte é plúmbeo e nem a chuva nos alivia da estiagem porque o terreno está queimado e se tor­nou estéril.

Entretanto a UNESCO alerta para a extinção de línguas no mundo de hoje e apela para a defesa das línguas minoritárias como modo de pre­servar identidades ameaçadas. A mensagem difundida por esse orga­nismo internacional alerta para o facto de que "as línguas não são apenas instrumentos extremamente adequados de comunicação, mas que são também reflexo de concepções do mundo e de identidades: são veículo de sistemas de valores e de expressões culturais, constituindo factores de identidade de grupos e de individualidades; as línguas formam parte essencial da herança viva da humanidade". A mesma mensagem adverte

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para o facto de que o ensino da língua materna conjugada com uma lín­gua de 'maioria leva a bons resultados escolares.

Não foi essa mensagem pensada em favor das línguas clássicas, mas certamente não teremos receio de nos revermos nela e a ela nos asso­ciarmos para pormos "no centro do ensino a ideia de uma «língua de cultura», que pode tanto ser antiga como moderna, poética ou científica, mas que se distinga, em qualquer circunstância, da «língua de serviço» de finalidade puramente comunicativa", como postulava recentemente um articulista de um reputado periódico francês8.

Sobre outras línguas, as nossas, as línguas clássicas (grego e latim) levam a vantagem de terem servido para (na continuidade, mesmo quando em contraposição) se constituírem as línguas de cultura europeia. Vantagem têm. elas também de não serem apenas uma variante na plura­lidade de tantas outras. Vantagem levam igualmente elas por nos con­frontarem com ideais de humanidade que são perenes e induzirem atitu­des que recusam a admitir comunicabilidade com vazio de conteúdos. Provocando a recuperação do que é formulação do passado (em intensi­dade de procura pelo sentido do tempo), induzem elas à dinâmica da inovação; no estudo das diferentes expressões que delas dimanam, levam a reconhecer a riqueza, de uma identidade que é comum e a superar as divergências que não devem surpreender.

A língua materna aprofundada no confronto com as línguas de cultura ganha amplitude e sentido; confundida com uma de entre outras, banaliza-se e perde o afecto; posta em desafio com as línguas que servi­ram a cultura de outros tempos, a língua materna experimenta as suas próprias potencialidades e projecta-se também em língua cultural, em paridade com outras que das antigas dependem.

Perdeu-se essa noção de continuidade? A pergunta talvez deva ser transformada em constatação do que é óbvio: a inércia gerou o desafecto e a desafectação, que se seguiu, atirou para as prateleiras de arquivo o que foi formador. Algum curioso, um dia, por razões exógenas, irá aí buscar materiais de trabalho... Não é isso consolo que nos redima de qualquer "apagada e vil tristeza"!

Línguas ameaçadas não são apenas 50% das 6.000 línguas hoje registadas em estatísticas que a UNESCO se encarregou de recolher.

8 David Rabouin, "Quelles langues pour 1'Europe?", Le Magazine Littéraire, Janeiro, 2005 - nfi 438, p. 24.

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Ameaçadas estão as línguas de cultura que fizeram o Ocidente. Uma per­centagem bem menor do que 4% é a daqueles que hoje se preocupam com dar a possibilidade de manter acessível uma tradição que vivificou séculos de cultura. Teremos que mendigar um lugar nesse foro de línguas e fazer acreditar que "todos podem aprender uma. nova língua sem detrimento de outras", mesmo que essa língua seja uma língua de cul­tura, como as nossas?

As vozes que se ouviram no seio da comunidade universitária, em momento de abertura solene de anos escolares, pela sua autoridade e pelo seu prestígio, são avisos solenes de que a cultura tem os seus direi­tos e deixam-nos acreditar que a própria Universidade saberá honrar-se a si própria e, na defesa das línguas de cultura, assumir os seus compro­missos, em fidelidade à sua missão.

O Coordenador do Centro de Estudos Clássicos da Universidade de Lisboa,

AIRES A. NASCIMENTO

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MEDEA EN CAMARINAS

Releitura do mito em forma de monólogo dramático

Medea en Camarinas, em versão galega, representa um regresso ao mito da princesa da Colquida sob forma de um monólogo dramático. Da autoria de Andrés Pocifia, filólogo e académico do Departamento de Estudos Latinos da Universidade de Granada, esta releitura da saga. de Medeia é fruto de um conhecimento seguro das versões antigas, gregas e latinas, e de um cruzamento feliz de alguns dos seus principais motivos. Dela se projecta um gosto particular que este estudioso, de há largos anos, tem manifestado e comprovado pelo motivo de Medeia9. Mas, para além da marca académica, esta criação espelha a liberdade criativa de quem medita sobre a experiência humana e, para além da história para­digmática de Medeia, conhece também a vida.

O cerne desta, nova versão, no que respeita às fontes e ao momento dramático, é estabelecido desde logo por Pocifia nas considerações preli­minares de que o monólogo se acompanha10:

Ó fondo, a fachada do Teatro Romano, tal como é, sen iluminación, lem­brarias a Grécia de Eurípídes a través da Roma de Séneca. A nosa Medea é un trasunto das duas figuras dos dous tmxedíógrafos, chegada ãfin das suas penali­dades num pobo da costa galega, non se sabe de que maneira.11

E tudo o que se pretende com este texto é pôr uma Medeia, enve­lhecida e dobrada ao peso dos anos e do sofrimento, a recordar a história da sua vida. A beleza, de outrora é ainda perceptível sob os estragos do tempo, como um vestido gasto, mas a que não falta mesmo assim uma certa elegância, é o testemunho de um passado que fez de uma bela e exótica princesa um destroço, após o naufrágio de uma existência

9 Juntamente com a Professora Aurora López, A. Pocifia coordenou, colaborou e editou a obra Medeas. Versiones de un mito desde Grécia hasta hoy, I-II (Granada 2002), onde são retinidas sessenta colaborações, das mais variadas proveniências, sobre a perenidade literária e dramática deste mito. No vol. I, Aurora López dedica algumas "páginas (118-126) a um. comentário à Medea en Camarinas. Com este texto, Andrés Pocifia obteve o primeiro prémio Accesit no XXVII Prémio Modesto R. Figueirido, para narrativas breves, em 2001.

10 Na versão policopiada que apoiou a representação. 11 Para além de Eurípides e de Séneca, também Apolónío de Rodes, Ovídio

e Valério Flaco são contributos subjacentes às opções do autor.

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tumultuosa. A cena, situada numa vila pequena e desconhecida da costa galega12, reúne em volta de Medeia um grupo de mulheres humildes, uma espécie de coro silencioso a quem cabe exprimir, antes de mais, a rejeição da comunidade pela estranha. No lavadeiro público de Camari­nas persiste, em tomo de Medeia, o repúdio pela estrangeira que a heroína grega sempre sofreu, nas versões antigas, depois de abandonar o terreno pátrio. No entanto, apesar da sua animosidade latente, as mulhe­res de Camarinas, como as coríntias na versão euripidiana, são também confidentes de Medeia, somando ao repúdio intuitivo pela estrangeira a compreensão humana, que advém da condição feminina que com ela partilham.

Dentro desta moldura - um local perdido, povoado por anónimas mulheres do povo, em época indeterminada - Medeia é retirada do pedestal de princesa da Cólquida ou de heroína de tragédia, para se assumir simplesmente como uma mulher comum, fustigada por um des­tino parco em felicidade e menos generoso ainda em distinção e glória. Os traços com que o mito cobriu de romântica fantasia a sua vida, Medeia aplica-se em renegá-los, à procura de uma realidade que faça dela uma mulher vulgar, e próxima de tantas outras a sua experiência feminina. Assim a Medeia de Camarinas, sem deixar de ser a réplica do seu modelo clássico, ganha sobre ele um. distanciamento que é o contributo original do seu autor. Por isso lhe não assenta o traçado geral que, nas palavras de C. Alvarez e Rosa Iglesias13, se pode resumir a umas tantas linhas de suporte: 'A Medeia jovem, enamorada e audaz, é épica, a madura, terrí­vel e vingadora é a heroína da tragédia'. Em Camarinas, a personagem esclarece o seu estatuto, que é e não é - ao mesmo tempo - o retrato recolhido do passado.

Dos traços que em definitivo passaram., desde Eurípides, a delinear a figura, de Medeia, Pocína retoma, e valoriza antes de mais o da estran­geira, hostilizada pelo instinto xenófobo com que cada sociedade humana repudia o estranho, indiferente a todos os esforços que este possa fazer para se integrar e atenuar as diferenças. Os olhares reservados com que as mulheres de Camarinas brindam a estrangeira repetem, sem correcção,

12 Camarinas é uma povoação da costa galega, na região da Corunha, conhecida peias suas rendas.

13 'Cruce de géneros en. las Metamofosis: Medea entre la épica y la tragedia', op. cif., 417.

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o desprezo outrora experimentado em Corinto pela princesa da Cól­quida. Mesmo se casada com um grego e mãe dos seus dois filhos, o estatuto social de que gozava não logrou evitar uma reacção intuitiva, mas injusta, que a manteve arredada, qual erva daninha, de uma integra­ção plena no terreno de adopção. A personalidade forte e altiva de que naturalmente era dotada14 só pôde estimular uma reacção defensiva. Em sua. volta não faltaram comentários, suscitados pela curiosidade, mas sempre tendenciosos e inclinados à censura. Pelo que, antes de mirar o descalabro da sua vida pessoal e doméstica, Medeia en Camarinas valoriza a eterna dor do exílio, sobretudo em contra-luz com a segurança que rodeava, no palácio de seu pai, a princesa da Cólquida. Desse passado, uma sombra apenas se vislumbra ainda na. fidelidade de uma Ama, a quem Pociha alude sob o nome de Benita. Impiedoso, o tempo subverteu, em Camarinas, a relação ama / senhora; aquela dedicação, de que Benita cercou. Medeia nas piores horas vividas em Corinto, resiste aos anos, na retribuição com que Medeia, protege agora a dependência da sua única, mas muito velha., amiga.

É para responder à animosidade que cerca a estrangeira que Medeia se dispõe a contar a história da sua vida, a verdadeira, despida de fantasias, aquela que faz dela uma mulher infeliz, mas próxima, palpável e finalmente compreendida. O mito, responsável por uma ininterrupta cadeia de fantasias, é por Medeia repudiado sem restrições:

Porque nin que ofixesen pais, nin riais, nin avós, nin avoas, nin mestres, nin mestras, nin curas, nin monxas: canto vos dixeron era mentira, non atino a saber por que, pêro de feito todo era mentira trás mentira, pura calumnia.15

(p. 35) ' O passado na Cólquida constrói-se, na linha dos Argonautica de

Apolónio de Rodes, de quadros de infância e do despertar da adolescên­cia, até à chegada de um sonhado herói, que parecia poder tornar a vida de uma princesa bárbara num conto de fadas. Porque longínquo, em tempo e em espaço, envolto no exótico que naturalmente cerca o desco­nhecido, este é o lado da história que a ficção distinguiu com. a sua prefe-

14 Também Eurípides desde logo valoriza o lado altivo, determinado ou mesmo violento da personalidade de Medeia:,, cf. e. g., 38, 44-45, 92-94, 98-99, 102-104,109-110,171-172.

15 As citações são feitas pela edição Prémios Pedrón de Ouro, ao cuidado de Carme Varela e Xosé Ramón Fandino (A Corunha, Ed. Do Castro, 2004).

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rência. Este momento é marcado pela oposição de culturas, que faz recuar a estrangeira para o horizonte distante da Cólquida, rústico e grosseiro, intocado pela civilização, mas por muitos imaginado como paraíso promissor de tesouros e de gloriosas fantasias.

Para comezar, nunca soupen quen inventou toda esa parvada do pelexo do carneiro, eso do velam de ouro, que resulta moí bonita, non vos vou dícir que non, pêro é uri autêntico conto para nenos, (p. 36)

O tesouro aliciante da Cólquida configurou-se na criação de um 'velo de ouro', a povoar distantes territórios salpicados da lã dourada do seu gado. Estimulada por um conto das mil e uma noites, logo a imagina­ção popular forjou um conquistador e vestiu-o das galas de herói à altura das exigências da façanha. Mas sob o brilho da fantasia não havia mais do que uma casta rara de gado de qualidade, a justificar os interesses financeiros de um vulgar comerciante de ovelhas; nada se passou por acaso, de acordo com os ditames insuspeitados de uma fada madrinha; tratou-se tão somente de obedecer a um projecto deliberado e comezinho: um vago gosto pelo risco e pela aventura - são assim os verdadeiros homens de negócios -, mas sobretudo o objectivo do lucro, eis o que levou Jasão à Cólquida. Também o universo misterioso da aventura é despojado de qualquer golpe de magia. Porque, afinal, o que distingue o mundo longínquo e exótico dos confins da barbárie? Tão somente um clima frio e inóspito, a cobrir um. território isolado, de solo montanhoso e impenetrável, onde os costumes e a vida resistem ao tempo e ao pro­gresso. Vive-se simplesmente da terra e do gado, trabalhados por gente grosseira, tacanha, que nem mesmo suspeita do que se esconde por trás da crista dos montes que vê recortada no horizonte ou do mar inóspito que a banha. Com que futuro poderia sonhar aí uma mulher, mesmo se jovem, e princesa?

Foi então que o acaso colocou, diante dos olhos curiosos e da ima­ginação fértil de uma menina de dezassete anos, todo o encanto do des­conhecido, sob a figura atraente de Jasão. Era bonito, o grego, vigoroso e com aquele encanto que um homem mais maduro fatalmente exerce sobre a ingenuidade de uma adolescente. Em contra-luz com a rustici-dade monótona da Cólquida, o homem de negócios - quem inventou essa. do Argonauta? - que era Jasão brilhou com o fulgor da novidade, do desconhecido, da promessa de uma outra existência até então insuspei-tada. Até a língua estranha que falava soava a sedutora melodia, fina e elegante. Um breve encontro, protocolar, na sala de audiências onde o

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recém-chegado apresentou cumprimentos formais à autoridade local, tanto bastou para impressionar perigosamente Medeia. Tal como de ani­mais de raça se construiu a história do veio de ouro, deste encontro vul­gar, no seu recorte humano, se alimentou o relato de um fatal romance de amor. Este é um outro motivo de força na lenda e nas versões antigas, que Pocina se empenha em reler para repudiar:

De modo que non é certo toda esa serie de parvadas que logo inventou o cego de Rodas, vós non podedes conecelo, un como os que van aqui ás feiras; pêro o de Rodas é un zascandil que xa de maná anda bêbedo, inventando argalladas e sacándolle contos a todo becho vivente. De min deu en dicir que, cando vin a Xasón, caíaseme o corazón do peito, os ollos anubrabanseme, e as pernas non me rexían. Todo parvadas. £ mentira.16 (p. 39)

Erram os que fazem do episódio da Cólquida um romance de amor. Porque, em Medeia, não foi o coração que vibrou, mas a imagina­ção irrefreável de uma adolescente; enquanto Jasão reagia ao imprevisto que lhe proporcionava uma viagem de negócios, sob a forma de uma beleza exótica e virgem, de que esperava auferir horas de um prazer inconsequente. Sentimento foi coisa que faltou na história, diga-se o que se disser. Por isso Medeia pode recordar com precisão:

A min Xasón gustoume dende o primeiro momento, é certo, pêro corno vos pode gustar calquera home guapo, ou un vestido, ou a ria na hora en que se afoga o sol no horizonte, (p. 40)

Como da leviandade do grego e dos que o acompanhavam fala a gravidez das servas da princesa, ou mesmo o suicídio sempre inexpli-cado de uma delas. Por aventura, que não por paixão, assim começou o enlace dos destinos de Jasão e de Medeia.

Se o cumprimento estrito do princípio da hospitalidade permitiu aos visitantes uma permanência longa e confortável na Cólquida, não logrou silenciar suspeitas no rei bárbaro nem dobrar a sua resistência defensiva. Eetes recusou fechar o negócio das rezes e satisfazer o verda­deiro objectivo da viagem.. Daí o desencadear de uma nova etapa no romance entre o grego e a princesa, bem como de uma nova achega no relato de um episódio que se tornou lenda: a própria dificuldade con-

16 Cf. Àpolónio de Rodes, Argonautíca 3. 444 sqq. Sobre o tratamento de Medeia em Àpolónio de Rodes, vide G. Giangrande, 'Medea y la concepción dei Amor en Àpolónio Rodio', op. cit, 329-345.

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verteu unia banal compra de gado na ' conquista aventurosa de um tesouro. De simples entusiasmo passageiro ou passatempo deleitoso, o romance tornou-se uma artimanha que trouxesse a Jasão aliados no ter­reno, Valendo-se da sedução da palavra que sempre distinguiu os Gregos - os gregos sempre tiveron esa vantaxe sobre os demais pobos: son donos e seno-res da palabra, o mesmo para dicir verdades que mentiras, para eloxiar que para alcumar. Saben perfectamenie que poden burlarse de nós, das xentes que eles chaman bárbaras, sinxelamente porque non tivemos tanta escola, nin lecturas, nin poetas, e non sabemos empregar a língua como eles (p. 42) - , Jasão soube conquistar a colaboração de Medeia, não da bruxa detentora de artes de magia - de novo a imaginação a funcionar17 - , mas a de uma rapari­guinha que sonhava com um futuro, com uma família longe da Cólquida grosseira da sua infância e com um amor pleno e eterno18.

A uma conquista a que faltava o sentimento19, veio juntar-se, como arma de sedução, o sexo. Mas apesar dos atractivos do grego, nem mesmo a relação física conseguiu prender Medeia. A mesma frieza que lhe imobilizava o coração comprometeu o prazer dos encontros. Por isso o ciúme nunca pôde suceder~se a um amor que afinal também nunca existiu20.

17 À versão de Píndaro, Pítíca 4. 220-223, Eurípides, Medeia 384-385, Séneca, Medeia 269-270, a Medeia em Camarifias alude com aquele descrédito que usa sempre na desmontagem dos mitos e seus adynata: Hai un home que non lembro como se chama, un charlatân de feira pêro que seica conta as cousas con moita grada, escollendo moi ben palabras, todo o contrario de como ofago eu, e dixéronme que inventou de min unhas cousas moi paveras; seica me pon sempre correndo duri lado para outro a cabalo duns dragóns, xa vedes, e mesturando herbas e outras cousas para rexuvenecer vellos. (pp. 43-44)

1S O filólogo que é também. A. Pocifía aprofunda esta mesma perspectiva em 'El amor de Medea visto por Euripides y por Séneca', op. cit., 233-254.

19 A frieza pragmática e interesseira com que Jasão levou por diante a sedução de Medeia corresponde aos traços essenciais com que Eurípides retrata o argonauta.

20 Sobre o contributo senequiano para a história de uma Medeia profundamente apaixonada por Jasão, ao contrário do estipulado por Eurípides, vide Pocifía, 'El amor de Medea visto por Euripides y por Séneca', op. cit., 233-254. Este é um sentimento que, de acordo com Séneca, ditou a actuação criminosa de Medeia ainda na Cólquida (134-136), como impulsionará também as suas violências futuras, já em Corinto (272 sq., 416, 494-495, 862-869).

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A fuga da Cólquida vem pôr a nu o vazio de afecto que subjaz às aparências; mais do que Medeia, Jasão pretendia raptar um par de ovinos reprodutores; e juntamente com Medeia levava, também Apsirto, seu irmão, por cujas graças o seu instinto se deixara seduzir. Se o papel inerte de Jasão no rapto dos animais - de facto- levados por Medeia e Apsirto para uma embarcação onde o grego se limitou a esperá-los - arruina a heroicidade da aventura21, o 'caso' de Âpsirto golpeia de morte 'um romance de amor'. Da fuga, Pocifía arreda também, a fantasia do spurag-mos de Apsirto, que Medeia teria perpetrado para ocupar a atenção do rei seu pai empenhado em recolher os pedaços da vítima destroçada22. Apsirto acompanhou-os porque quis, rival insuspeitado da irmã nas atenções de Jasão; e se castigo sofreu - e merecido - não passou do aban­dono nas costas do Bósforo, depois de colhido em flagrante num encon­tro amoroso com o companheiro de uma Medeia que gerava já o seu pri­meiro filho. A violência da jovem, imaginada como mais um rasgo de excesso de uma alma apaixonada e dada a extremos, não passou, na nova versão, da reacção justa de uma alma sofrida, que encontrava no irmão, seu companheiro de folguedos infantis, um traidor.

Em Corinto, Medeia viveu a última etapa da sua vida de mulher, o casamento, a maternidade e o divórcio de Jasão. Foi decerto este o episó­dio que se lhe colou, como uma pele e deu ao seu nome um sentido imortal.

O que posou, despois de seguro que o sabedes mellor, porque é o que con-tan case sempre nas comidas das festas, nas ceas das matanzas, nas noites de esfollar ou degraelo o millo, nos magostos, mesmo, dá vergonza dicílo, ás veces nos velórios, (p. 48)

Mas o relato que, pela mão de Euripides, se definiu como o perfil permanente de Medeia, não passa, aos olhos da exilada em Camarifias, de um. desfiar de mentiras. Antes de mais a célebre história da morte de Creúsa, vítima dos venenos da estrangeira ocultos no fulgor dos presen­tes de boda (1136-1230). 'Todo pura mentira', queixa-se a pobre preterida na versão galega. A princesa de Corinto, que um sujeito 'moi cabrón'

21 O que non aturo é que dígan sempre que foi como non foi. Igual que o choio da fuxida da Cólquide, con Xasón e os seus companeíros, que sempre a ponen como se fose unha heroicidade: foi sittrplemente un roubo dunha ovella e un carneiro, de noite, ás agachadas, con moito coidado de que non principiasen a ornear os cans do pazo. (p. 46)

22 Cf. Apolodoro 1. 9. 23-24; Ovídio, Trísíía 3. 9. 27-32.

Page 28: NOTíCIAS - Universidade de Coimbra · Electra de Sófocles, em co-produção FESTEA/Thiasos - Dia 26 de Abril de 2005, em S. Martinho de Tibães (Braga), 15:30h Os Dois Meneemos

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pintou com as cores da pureza e da ingenuidade de uma pobre vítima, não passava de unia presumida, dada ao sexo e desmiolada; incapaz de criar ciúmes em Medeia, Creúsa inspirou-lhe tão somente pena, por a ver embarcar numa aventura junto de Jasão que repetia a sua própria ilusão e inevitável desencanto. Mas se a versão de Eurípides merece correcção, não a merece menos o retrato de Creúsa que por tnoi parva que fose, non podia ser tanto como para coller uri regalo que lie vinese de min, que polo menos publicamente era a súa enemiga, Xa se ve que sori inventos de homes, que lies encanta imaxinar mulleres completamente desprovistas de xuízo. (p. 50)

Todo o afecto de que a sua alma era capaz Medeia reservou-o para os filhos. Engendrou-os, criou-os, acariciou-os e sofreu ao ver a indife­rença ou mesmo ironia com que Jasão olhava os filhos da bárbara, sobretudo o mais novo a quem a mãe chamara Eetes, como ao seu pró­prio pai e que trazia no nome, como no tipo físico, o estigma do estran­geiro. O conflito de culturas, que tinha servido para aproximar e logo afastar Jasão de Medeia, projectava-se agora nos dois filhos que coloca­vam diante do pai o incómodo permanente de uma aventura de ocasião. Por isso a nova Medeia lhe não poupa todas as censuras: Nin como amante, nin como marido, nin corno pai, nin como home, valeu nunca nada, Xasón. (p. 51) Foi então que o grego procurou, não no amor mas no casa­mento com Creúsa, recuperar o estatuto que a união com a bárbara lhe subtraía. Para o novo lar reclamou os filhos, propondo-se desempenhar, com a nova mulher e com Creonte, a missão de os criar, quando até então os envolvera em. desatenção e desprezo. Não foram os ciúmes a erguerem a mão assassina de Medeia. Jasão nem mesmo o merecia. A princesa da Cólquida matou por amor, incapaz de entregar o seu tesouro, aqueles filhos a quem queria com. um. amor intenso e único, à indiferença e ao desamor. Por isso, numa só, mas profunda frase de remate do seu monó­logo23, Medeia confessa a realidade interior que ditou o filicídio: Mais eran meus, mulleres de Camarinas. Eu os enxendrara, os parira, os aleitara, os criara, e todo co mais intenso amor de nai. Se non ian ser para min, non serían para ninguén. E maternos, (p. 53)

Este texto foi dramatizado e encenado por Juli Leal e apresentado durante o colóquio organizado pelo Grupo de Pesquisa Teatral Sagunt,

1 Cf. Séneca, Medeia. 934-935.

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em Valência, a 4 de Maio de 2005. Medeia foi encarnada por Begona Sánchez, que deu à princesa da Cólquida o vigor e a credibilidade de uma mulher que recorda a experiência forte e dolorosa de toda uma vida. Pedro Acevedo, com instrumentos de percussão, e Pep Sanchis com efeitos cie luz, assinalaram cadências e pontos de ruptura. Deste trabalho conjunto surgiu uma nova Medeia, que, suspensa no tempo e afastada no espaço perdido de Camarinas, revia 2500 anos da sua história para tentar retirar-lhe a. fantasia e reduzi-la ao que constitui a sua verdadeira grandeza: uma tremenda humanidade.

MARIA DE FáTIMA SILVA

Foto de Juan Higueras