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NOVOS RUMOS DA GESTÃO PÚBLICA Antonio Célio de Aguiar 1 RESUMO O presente trabalho aborda a tendência mundial de se reformar o aparelho estatal. Essa tendência de reforma começou a manifestar-se nas últimas décadas do século XX. O que levou os governos a se preocuparem com o modelo de administração pública empregado nos seus Estados, foi basicamente a crise mundial que eclodiu nos anos 70. A maioria das nações ainda emprega o modelo burocrático de Max Weber, que, em virtude de mudanças na economia mundial, principalmente o processo de globalização que atingiu quase todos os regimes, não estava mais funcionado adequadamente. Esse modelo de administração pública já não supria mais as necessidades do Estado. Muitos foram os países que já demonstraram sucesso com a adoção do modelo gerencial de administração pública, tais como Inglaterra e Nova Zelândia. No Brasil, as primeiras idéias de mudança no sistema administrativo do setor público surgiram quando da instauração da chamada nova república. Entretanto a efetivação do processo de reforma se deu no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso quando foi criado o Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado – MARE, cujo titular foi Luis Carlos Bresser Pereira que coordenou o programa de elaboração do projeto de reforma. Bresser Pereira com o seu projeto assinalava um novo modelo para a administração pública brasileira fundamentado na administração gerencial. PALAVRAS-CHAVE: administração; reforma; política 1 Engenheiro Civil da Coordenadoria de Obras e Projetos da Universidade Federal do Ceará, graduado em Administração e Ciências Econômicas, especialista em gestão universitária, mestre em Políticas Públicas e Gestão da Educação Superior .

NOVOS RUMOS DA GESTÃO PÚBLICA

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NOVOS RUMOS DA GESTÃO PÚBLICA

Antonio Célio de Aguiar1

RESUMO

O presente trabalho aborda a tendência mundial de se reformar o aparelho estatal. Essa tendência de reforma começou a manifestar-se nas últimas décadas do século XX. O que levou os governos a se preocuparem com o modelo de administração pública empregado nos seus Estados, foi basicamente a crise mundial que eclodiu nos anos 70. A maioria das nações ainda emprega o modelo burocrático de Max Weber, que, em virtude de mudanças na economia mundial, principalmente o processo de globalização que atingiu quase todos os regimes, não estava mais funcionado adequadamente. Esse modelo de administração pública já não supria mais as necessidades do Estado. Muitos foram os países que já demonstraram sucesso com a adoção do modelo gerencial de administração pública, tais como Inglaterra e Nova Zelândia. No Brasil, as primeiras idéias de mudança no sistema administrativo do setor público surgiram quando da instauração da chamada nova república. Entretanto a efetivação do processo de reforma se deu no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso quando foi criado o Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado – MARE, cujo titular foi Luis Carlos Bresser Pereira que coordenou o programa de elaboração do projeto de reforma. Bresser Pereira com o seu projeto assinalava um novo modelo para a administração pública brasileira fundamentado na administração gerencial.

PALAVRAS-CHAVE: administração; reforma; política

INTRODUÇÃO

Nas duas últimas décadas os Estados vêm tentando resolver um entrave

que atrapalha a governabilidade, que é a administração pública. Surgiram

nesse período vários conceitos sobre qual seria o melhor modelo para se fazer

uma verdadeira mudança na gestão pública. Muitas foram as iniciativas

direcionadas para reforma do Estado moderno (Bresser Pereira & Spink.,

2001). No caso do Brasil as autoridades também demonstraram grande

preocupação com o modelo ora adotado e buscaram mudanças que viessem a

1 Engenheiro Civil da Coordenadoria de Obras e Projetos da Universidade Federal do Ceará, graduado em Administração e Ciências Econômicas, especialista em gestão universitária, mestre em Políticas Públicas e Gestão da Educação Superior .

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colaborar com a administração do país. O que todos procuram no mundo atual

é encontrar soluções que visem aumentar a eficiência do Estado, bem como,

reduzir seu tamanho. O Brasil não se absteve dessa procura e também

elaborou um projeto para a modernização da máquina estatal. Este projeto

iniciado no governo Fernando Henrique Cardoso tem como diretrizes básicas a

redefinição do papel do Estado (Ferlie, E. et al, 1999).

A primeira idéia de se reformar o aparelho do Estado já tinha aparecido

em meados da década de 70. O primeiro fato que levou a administração

pública a pensar numa redefinição do papel do Estado foi a crise do petróleo.

No Brasil a mudança foi pensada depois da redemocratização do país. As

mudanças no aparelho do Estado foram propostas pelo Ministério da

Administração Federal e da Reforma do Estado – MARE do governo Fernando

Henrique Cardoso (FHC), através de um Plano Diretor. O referido Plano tomou

como referência de análise a existência de quatro setores dentro do Estado:

1) a estratégia do Estado, onde são definidas as leis e políticas públicas;

2) as atividades exclusivas do Estado, onde é exercido o poder do

Estado, isto é de regular, legislar, tributar e transferir recursos;

3) os serviços não-exclusivos ou competitivos do Estado, que são

aqueles que o Estado realiza e/ou subsidia porque determinam o exercício da

cidadania e

4) os serviços prestados pelo Estado através de empresas públicas ou

de economia mista. (Przworski, 1996).

A REFORMA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Devido a alguns fatores que geraram crises nas nações do mundo

moderno iniciou-se uma corrente de pensamento que tinha como objetivo

acabar com o emprego da administração burocrática.

Para Abrúcio: “quatro fatores sócio-econômicos contribuíram fortemente

para detonar a crise do Estado montado no pós-guerra.” (Abrúcio, 2001, p.175).

O primeiro fator foi a crise econômica mundial que teve seu início na década de

70. O mesmo autor afirma que “o fato é que a economia mundial enfrentou um

grande período recessivo, mesmo que fracamente revertido nos últimos anos, e

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nunca mais retomou os níveis de crescimento atingidos nas décadas de 50 e

60” (Abrúcio, 2001, p.175).

A crise econômica mundial foi combatida e quase que totalmente

eliminada nos últimos quinze anos. (Abrúcio, 2001).

O segundo fator apontado por Fernando Luiz Abrúcio foi a crise fiscal

que desestabilizou o alicerce do modelo de Estado que ainda está sendo

praticado. O terceiro fator foi a condição de “ingovernabilidade” por que passam

as várias nações. Por fim o quarto fator que levou a um estudo sobre a

mudança nos paradigmas que regem a administração pública foi a

globalização.

No mundo atual torna-se muito difícil imaginar uma sociedade sem a

presença do Estado. Mesmo nas nações mais desenvolvidas onde o

neoliberalismo é mais acentuado e onde o Estado não funciona como nos

países da América Latina como o Brasil e a Argentina a presença estatal ainda

é marcante. Mesmo na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos o Estado sempre

funcionou cumprindo determinados interesses de grupos. Nas sociedades mais

liberais, o poder público garante aos seus membros instrumentos razoáveis à

criação de condições satisfatórias à implantação de políticas públicas

destinadas ao tratamento de diferenças diversas. Assim sendo, mesmo em

países como os Estados Unidos e a Grã-Bretanha, o poder público sempre

interveio nas situações de conflitos em que havia ameaças para a

governabilidade. (Przeworski, 1996). O que fica claro é que para superar

grandes crises o poder público sempre interveio, como no caso da crise de

1929 nos Estados Unidos.

Se o capitalismo como forma de produção é garantida pelo Estado,

quando esse lhe dá total legitimidade de atuação, entende-se então que a

ausência do Estado não garanta que os problemas econômicos atuais serão

resolvidos; o que se percebe é que, o Estado ainda apresenta a função de

organizar o debate quanto à sua própria reforma. A participação estatal não

pode ser isolada, faz-se necessário “pensar a reforma do Estado em estreita

conexão com o tema da consolidação democrática” (Diniz, 1996 p. 5). A

maioria dos autores acha ser impossível imaginar uma reforma do Estado

limitada pela burocracia. Segundo Diniz, o tema da democracia deve está

permanentemente presente para não se perder de vista que o Estado não é

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outra coisa senão um conjunto de disposições onde se deve levar em conta as

expectativas dos cidadãos. Qualquer reforma que vise alterar a configuração

das instituições públicas só terá validade se ampliar e incluir em seu interior a

cidadania. Por isso não se pode reformar uma instituição pública deixando de

lado o regime político em vigor, ou ignorando o conceito de poliarquia2 (Diniz,

1996). O Estado apesar de em algumas vezes está presente em conflitos

gerados por grupos minoritários, procurando uma inclusão nesses grupos, a

sua participação é mais destacada quando os conflitos são originados de

grupos maiores. Em outro caso o Estado busca uma inclusão para atender os

anseios dos participantes do grupo.

Os achados bibliográficos deixam transparecer que a reforma da

administração pública visa principalmente dar ao estado uma maior eficácia.

Segundo Kettl “embora a idéia de reforma do Estado tenha surgido em todo

mundo, muito pouco se sabe sobre suas causas” (Kettl, 2001, p.75). O mesmo

autor afirma ainda que: “o que chama a atenção é que o movimento favorável à

redução do Estado tornou-se virtualmente universal, por maiores que sejam

alguns deles”.

O CASO DO BRASIL

Os teóricos identificam que o estudo da administração pública brasileira

é bastante complexo devido a quantidade exagerada de regras jurídicas, que

limitam a sua clareza. A administração pública fica assim condicionada à

elaboração de leis e regulamentos para a sua aplicação que explicitem todos

os pormenores necessários para o seu cumprimento (Castor et al, 1987).

Segundo Levine:

o campo da Administração Pública já foi caracterizado como

um campo à ´deriva´ , enfrentando ´uma crise intelectual´,

necessitando de uma nova perspectiva, um campo que vinha

tornando-se `isolado` e em um período de `tensão e

mudança(Levine et al 1977).

A reforma da administração pública brasileira proposta inicialmente por

Bresser Pereira está fundamentada no princípio de fazer com que a

administração pública se torne mais eficiente e que seja dirigida para o

2 Poliarquia – governo exercido por muitos

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cidadão. Aliás, no Brasil, o assunto relacionado à reforma do Estado foi muito

discutido desde o fim dos governos militares, ou melhor, a partir de 1985,

sobretudo nos anos 90. O que se viu, entretanto é que não houve uma

verdadeira efetivação do projeto, ou melhor, não se conseguiu efetivar uma

verdadeira reforma que melhorasse as instituições públicas. A Reforma

originada no governo Fernando Henrique Cardoso tem três propostas básicas:

1) estabelecer limites para as ações do Estado; 2) conseguir um aumento na

capacidade administrativa do Estado e 3) remanejar obrigações do âmbito

federal para os estados e municípios descentralizando assim as ações de

caráter local.

As propostas para a reforma das leis que regem a máquina

administrativa brasileira foram desenvolvidas depois que se constatou que o

Estado brasileiro enraizou algumas características tais como: centralização das

decisões, adoção de estruturas piramidais de poder, rigidez e impessoalidade

das rotinas e dos controles dos processos administrativos. Dessa forma os

órgãos das administrações direta e indireta voltaram-se para dentro e não para

o atendimento aos cidadãos. Com essa visão voltada para o próprio interior

depreende-se claramente a necessidade de uma administração que busque

uma melhoria na qualidade dos serviços prestados ao cidadão, bem como,

procure uma maximização dos resultados e uma redução de custos.

Os idealizadores da reforma entendem que a administração deve ser do

tipo gerencial que seja voltada para o controle de resultados e não

simplesmente de controle de processos. De acordo com a literatura

especializada o que se observa no caso brasileiro é que o debate estrutural

parece sucumbir diante de questões de ordem conjuntural. Assim sendo, o que

é essencial deixa de ser discutido em favor de “programas de estabilização

econômica e o acirramento dos conflitos em torno da distribuição de recursos

escassos” (Diniz, 1996: 8). Essas observações levam a crer que a discussão

sobre a reforma do Estado brasileiro não se transformou em realidade, não se

sabe bem os motivos, mas o fato é que, o que se pretendia era simplesmente e

tão somente uma reforma administrativa que facilitasse a privatização de

estatais com grande potencial econômico-financeiro.

A reforma do Estado brasileiro ficou na dependência de acordos

partidários e de caprichos de grupos de burocratas, “deixando camadas

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expressivas da população à margem da área das instituições encarregadas de

resolver seus problemas primários de saneamento, saúde, segurança,

transporte e educação” (Diniz, 1996: p15).

Sobre a reforma do Estado temos a opinião de Glade:

o fato de a reestruturação e de a reforma administrativa terem

se originado no mesmo conjunto de circunstâncias e, sem

dúvida, a razão de o Banco Mundial, cujo interesse na reforma

administrativa diminuiu após os anos 60, estar hoje apoiando

programas de ´enxugamento´ do Estado e de melhoria do

gerenciamento público em mais de duas dezenas de países.

Isso deixa transparecer que a reforma do Estado brasileiro está

em consonância com as diretrizes do Banco Mundial (Glade,

2001, p.132).

Para Diniz a complexidade da burocracia brasileira que mostra uma

irracionalidade explícita claramente notada (Diniz,1996). Essa irracionalidade

também é apontada no estudo feito por Angelina Figueiredo e Fernando

Limongi no livro Executivo e Legislativo na nova ordem constitucional. Esses

autores afirmam “que o poder Executivo em virtude de seus poderes

legislativos, comanda o processo legislativo, minando assim o próprio

fortalecimento do Congresso como poder autônomo”. (Figueiredo-Limongi,

1999, p. 41).

A burocracia estatal que está atrelada principalmente ao Executivo, tem

em mãos poderes que a torna de certa forma autônoma. A burocracia do

aparato estatal muito distante da realidade, que a torna conflitante, exigindo

uma atuação forte do poder político para colocar a técnica em favor das

verdadeiras decisões de Estado, que são aquelas destinadas a atender o

público.

A literatura aponta que o sistema administrativo brasileiro apesar de

querer galgar um degrau mais alto ou uma posição mais relevante ainda

abrange no seu âmago resquícios de doutrinas vigentes no século XIX como o

patrimonialismo (Pinho,1998). O Brasil que ainda não conseguiu implantar a

burocracia weberiana tem em seus dirigentes a intenção de fazer uma reforma

administrativa baseada no modelo gerencial.

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O patrimonialismo ainda vigora em várias áreas da administração

pública brasileira. Entretanto o país teve sorte em não agravar seus problemas

por opções institucionais erradas, aderindo desde o começo do século XX à

democracia política e à economia de mercado, ainda que sem praticá-las

contínua e competentemente. O que se constata pela literatura é que se

passou do mercantilismo patrimonialista ao capitalismo de Estado. Essa

passagem não significa que o país tenha atingido a fase do capitalismo liberal-

competitivo. As políticas neoliberais que começaram a ser implantadas no

Brasil e que tanto são questionadas poderiam ser consideradas uma saída

desejável, cujo mal ainda não contaminou o país como um todo.

A cultura patrimonialista era caracterizada pela tênue linha divisória

entre a propriedade pública e a propriedade privada. Outra característica

marcante dessa prática é a intensa capacidade de se apropriar da coisa pública

que tem o poder dominante através de acordos e conchavos.

Pelo que foi exposto, a proposta para reformar o Aparelho do Estado

incorpora uma necessidade de valores de eficiência e de qualidade dos

serviços públicos prestados. A proposta também indica a adoção de uma

cultura gerencial nas organizações estatais para que se atinja o

desenvolvimento. A nova cultura gerencial tem como princípios: a

descentralização política; a descentralização administrativa; a adoção de

estruturas mais horizontais; a flexibilidade organizacional compatível com a

multiplicidade, a competição e o conflito; o controle de resultados e a

administração voltada para o atendimento ao cidadão.

Nota-se então que o atual projeto de Reforma do Estado busca

fortalecer a administração pública direta, e em conseqüência realizar uma

descentralização da administração indireta, com a implantação de Agências

Executivas Reguladoras e de Organizações Sociais sendo que estas seriam

controladas por contratos de gestão. As Agências Executivas são as entidades

executoras nos setores de atividades exclusivas do Estado e controladoras no

setor dos serviços não-exclusivos do Estado (Brasil, 1997).

No caso das atividades não exclusivas do Estado, ou seja, aquelas que

podem ser realizadas tanto pelo governo como pelo setor privado, têm dentro

do Projeto da Reforma da Administração Pública, um tipo de serviço público

não-estatal. Esse serviço não-estatal diferencia do setor estatal por não

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envolver o uso do poder do Estado. Ele também não pode ser considerado de

natureza privada porque precisará de transferências do Estado e

diferentemente de uma empresa privada não tem o lucro como um objetivo

principal.

AS REFORMAS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA

A primeira tentativa de ser reformar o aparelho do estado no Brasil

aconteceu na década de 30 no governo Getúlio Vargas, com a implantação de

uma reforma burocrática. Nesse período o que predomina é o conceito de

racionalização. O projeto é baseado na escola clássica da administração na

qual predominavam os pensadores: Taylor e Fayol. Nessa época precisamente

em 1938 foi criado o Departamento de Administração do Serviço Público -

DASP que seria o órgão gestor da administração do país.

O DASP logo no início do seu funcionamento procurou fazer com que os

servidores públicos passassem por um sistema de ingresso onde prevalecesse

a competitividade. Também se preocupou em estabelecer critérios para as

promoções por merecimento. No DASP estavam centralizadas todas as

questões ligadas às áreas de pessoal, material, orçamento, organização e

método. Deve- se ressaltar que o DASP apesar de ser um órgão público foi um

verdadeiro berço da produção e divulgação dos preceitos administrativos.

Para a crítica especializada o ponto que marcou uma disfuncionalidade

no DASP ficou acentuado no caráter fechado que tinha o órgão, que acabou

ocasionando uma hipertrofia desse Departamento em relação à administração

estatal (Martins, 2006). Na reforma burocrática de 1936 as principais áreas nas

quais o projeto de reforma procurou intervir foram: a administração de pessoal.

O orçamento e a administração orçamentária, a administração de material e a

revisão e racionalização de métodos (Bresser Pereira, 2001).

A segunda reforma por que passou a administração pública brasileira foi

na década de 60 no primeiro governo do regime militar. O que prevaleceu

nesse período foi o conceito de “desenvolvimentismo”. Essa idéia

desenvolvimentista partiu dos países ricos e expressava o desejo de criar nas

nações mais pobres condições para investimentos. O Decreto-Lei 200 de 1967

foi a legislação básica da reforma administrativa do governo militar, e

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estabeleceu uma verdadeira revolução na administração pública do Brasil. A

mudança proposta pelo DL 200 se baseava nos conceitos de planejamento,

organicidade, centralização decisória e normativa e descentralização funcional

(Martins, 2006).

Para Martins “as reformas iniciadas em 1967 visavam a

operacionalização do modelo de administração para o desenvolvimento

baseado na consolidação burocrática de um Estado forte, voltado para o

desenvolvimento econômico, cuja característica principal foi o predomínio da

racionalidade funcional...”(Martins,2006, p.178) . O modelo de reforma do DL

200 era caracterizado pela racionalidade funcional consubstanciada por uma

estrutura tecnológica que garantisse o regime autoritário (Martins,). O período

em que vigorou o Decreto-Lei 200 ficou marcado pela racionalização funcional

da administração pública. Devendo ser ressalvada que essa racionalização

ficou concentrada na administração indireta.

Na opinião de Bresser Pereira.:

A reforma burocrática não se completara no Brasil, mas, desde

o início dos anos 60, estava claro que a utilização dos

princípios rígidos da administração pública burocrática

constituíam-se em um empecilho ao desenvolvimento

econômico do país. A reforma de 1967, realizada por meio do

Decreto-Lei nº 200 reconheceu esse fato e procurou substituir a

administração pública burocrática por uma ´ administração para

o desenvolvimento ´: distinguiu com clareza a administração

direta com a administração indireta, e garantiu às autarquias e

fundações desse segundo setor, e também às empresas

estatais, uma autonomia de gestão muito maior do que

possuíam anteriormente.(Bresser Pereira, 1998, p.167).

O que se percebe é que a reforma de 1967 com característica

desenvolvimentista foi na realidade um atalho para driblar a rigidez da

administração burocrática que vigorava na época.

O atual projeto de reforma do Aparelho do Estado de 1995 foi planejado

no governo Fernando Henrique Cardoso. Foi denominada como Reforma

Gerencial e era constituída por dois documentos: o primeiro era a proposta de

emenda constitucional do capítulo da administração pública e o segundo era o

Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (Bresser Pereira, 2001).

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A administração proposta no projeto de reforma será de tipo gerencial e

será controlada pelo mercado e pelo Estado. A reforma prevê a mudança no

rumo das atividades e serviços não exclusivos do Estado para um tipo de

propriedade pública não-estatal. Essa mudança seria feita através da

transformação dos organismos hoje responsáveis por estas atividades, em

Organizações Sociais. Estas organizações terão caráter público e direito

privado o que lhes possibilita uma autonomia administrativa e financeira e

ainda a possibilidade de contratação de novos empregados regidos pela

Consolidação das Leis Trabalhistas-(CLT).

As Organizações Sociais terão um contrato de gestão com o órgão

regulador e o controle das atividades e serviços por elas prestados. Vale

salientar que na reforma fica claro que essas organizações têm por objetivos

dar firmeza ao setor público não-estatal e dentro dessa premissa reduzir o

número de servidores públicos nas áreas prestadoras de serviços não-

exclusivos do Estado. Assim, pensam os idealizadores do projeto, será

fortalecido o controle social com relação à qualidade dos serviços.

A Reforma do Aparelho do Estado está fundamentada em dois critérios,

que são: a forma de propriedade e a forma de administração das atividades e

dos serviços prestados pelo Estado.

O projeto de reforma de 1995 prevê que as atividades exclusivas do

Estado serão organizadas como Agências Executivas. Essas agências são de

propriedade do Estado e com uma administração de tipo gerencial. Elas

negociam com o núcleo administrativo o contrato de gestão, através de seu

dirigente, nomeado pelo ministro com a qual a Agência Executiva3 tem o

contrato de gestão. Esse contrato torna autônoma a Agência Executiva e assim

ela terá inteira liberdade de controlar o orçamento, pois antes são

estabelecidos os objetivos e os indicadores de desempenho.

Sobre os fundamentos da reforma da administração pública brasileira

vale destacar a opinião de Bresser Pereira & Pacheco:

um dos princípios fundamentais da reforma de 1995-1998 é o

de que o Estado só deve executar diretamente as tarefas que

são exclusivas do Estado, ou que apliquem os recursos do

Estado. Entre as tarefas exclusivas do Estado, porém, deve-se

3 As agências executivas são formadas por autarquias ou fundações públicas que celebram contrato de gestão com o respectivo Ministério supervisor, visando conceder-lhes maior autonomia e agilidade.

Page 11: NOVOS RUMOS DA GESTÃO PÚBLICA

distinguir as tarefas centralizadas de formulação e controle das

políticas públicas e da lei, a serem executadas por secretarias

ou departamentos do Estado, das tarefas de execução, que

devem ser descentralizadas para agências executivas e

agências reguladoras autônomas (Bresser Pereira & Pacheco,

2005, p.8).

Para Teixeira, a criação de órgãos responsáveis por desempenhar

atividades e serviços não exclusivos do Estado será através da transformação

dos organismos que atualmente são responsáveis por estas atividades, em

Organizações Sociais. Essas organizações serão públicas, porém de direito

privado. Isso conferirá a elas uma autonomia administrativa e financeira.

Sobre o assunto Bresser Pereira manifesta a seguinte opinião:

Na reforma gerencial em curso no Estado brasileiro, a

instituição que provavelmente terá a maior repercussão é a das

organizações sociais. A proposta da reforma é a transformação

dos serviços sociais e científicos, que o Estado hoje presta

diretamente, em entidades públicas não-estatais, entidades

sem fins lucrativos, do terceiro setor. Ao serem qualificadas

como organizações sociais, as novas entidades públicas, mas

de direito privado, poderão celebrar um contrato de gestão com

o respectivo ministério supervisor e terão de participar do

orçamento do Estado (Bresser Pereira, 2001, p.).

Isso quer dizer que as Organizações Sociais manterão um contrato de

gestão com o órgão do núcleo estratégico responsável pela regulação e

controle das atividades e serviços por elas prestados.

O que salta aos olhos é que o projeto as Organizações Sociais poderão

substituir os órgãos de prestam serviços não exclusivos do Estado, tais como

universidades, institutos de pesquisa, hospitais, museus e a previdência social.

O projeto sinaliza que a mudança da atual estrutura dos órgãos existentes

atualmente será feita através de “programa de publicização

”. Isso significa que poderá haver a extinção das atuais entidades que

serão substituídas por fundações públicas, de direito privado.

CONCLUSÃO

Page 12: NOVOS RUMOS DA GESTÃO PÚBLICA

A administração pública vem passando por mudanças nas últimas

décadas para tentar combater a crise por que atravessam os países. As várias

nações do mundo experimentaram situações de crise no final do século XX.

Essa crise detonada por fatores sócio-econômicos vem contribuindo para

dificultar o gerenciamento da máquina estatal.

Os países que partiram na frente para solucionar o problema apostaram

na substituição do modelo burocrático de Max Weber por outro que permitisse

uma maior flexibilidade na condução da máquina administrativa e que ao

mesmo tempo levasse uma maior eficiência à administração pública. O novo

modelo, que permitiria redefinir o papel do Estado, enfrentar e vencer a crise,

foi denominado de modelo gerencial.

O modelo gerencial surgiu na época em que alguns governos forma

substituídos por outros de corrente diferente. Para Abrúcio

foi nesse contexto de escassez de recursos públicos,

enfraquecimento do poder estatal e de avanço de uma

ideologia privatizante que o modelo burocrático entrou em uma

profunda crise. Não obstante, é importante lembrar que esse

processo não ocorreu nem no mesmo momento histórico nem

da mesma forma nos diversos países. Mais do que isso,

deram-se respostas diferenciadas para problemas muito

parecidos. Contaram para isso a tradição administrativa, as

regras do sistema político, o grau de centralização existente e a

força do consenso pró-Welfare State presente em cada nação

(Abrúcio, 2001, p.178).

A aplicação do modelo gerencial variou de país para país. A sua

implementação estava vinculada à situação político-administrativa de cada

nação. Dependia também do grua de centralização da administração pública e

ainda da divisão geopolítica de cada nação.

O próprio modelo que se propôs substituir o modelo burocrático no caso

o do tipo gerencial já apresenta algumas alternativas quanto à sua aplicação.

Além do chamado “gerenciamento puro” existem novos caminhos como o

“consumerism” e “public service orientation”.

No Brasil a proposta para a reforma do Estado foi encaminhada ao

congresso em 1995 no governo Fernando Henrique Cardoso. O projeto de

reforma administrativa foi coordenado pelo então titular do Ministério de

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Administração de Reforma do Estado Luis Carlos Bresser Pereira. Quando do

lançamento desse projeto aconteceram muitas discussões em torno da nova

abordagem que salientavam principalmente os argumentos utilizados para o

seu desenvolvimento que partiam de uma visão intra-estatal.

Nas discussões em torno do projeto de reforma do Estado brasileiro

deve se ressaltar que o debate ficou concentrado em um ponto crucial que é

tornar efetiva a presença do Estado. O que deve ser destaco aqui é que a

restrição do tema discutido impediu uma analise mais aprofundada que fizesse

um estudo sobre o regime capitalista e o seu modo de produção que levassem

para a mudança a intenção de especificar as verdadeiras pelas quais os

indivíduos objetivam. Imaginar em uma reforma de Estado sem se preocupar

com a natureza intrínseca dele talvez não resolva as questões ligadas à

legitimidade ou a eficiência da máquina estatal.

O que deixa transparecer nesse estudo é que a reforma do Estado

brasileiro deve significar uma reforma que mude as condições objetivas dos

homens, e, portanto deve ser imaginada ou implementada no sentido de

transformar os indivíduos em cidadãos.

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