Nuno Portas_De uma cidade a outra_ perspectivas periféricas

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DICEBIOGRAFIA 4

RESUMO

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PALAVRAS-CHAVE 9

DICOTOMIA PLA O/PROJECTO 10

I CERTEZA 15

PLA EAME TO ESTRATGICO 18

REGULAO VARIVEL 23

REFLEXO CRITICA 25

I TRODUO 26

ELEME TOS ESTRUTURA TES 27

ELEME TOS DEPE DE TES DE OPORTU IDADES 32

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COMPETITIVIDADE 33 Capacidade de inovao Centralidade e Cidades Carrefour Projectos Especiais Qualidade vs Quantidade Case Study Bilbao Concluso 33 35 36 37 38 39

EVE TOS Barcelona Jogos Olmpicos 1992 Barcelona Frum 2004

42 42 45

Concluso, Barcelona: duas intervenes distintas 46

ELEME TOS ESTRUTURAIS E DEPE DE TES DE OPORTU IDADES, 48 Exemplos concretizados A escala do lugar A escala da cidade A escala do territrio 48 50 52

A criao de novas oportunidades: a regenerao de reas industriais obsoletas. 53 A estruturao da paisagem Novas oportunidades para o territrio 55 54

CO CLUSO 56

BIBLIOGRAFIA

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BIOGRAFIA

Nuno Portas nasceu em 1934 em Vila Viosa, Portugal. Formou-se em arquitectura na ESBAL (Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa), concluindo os seus estudos na ESBAP (Escola Superior de Belas-Artes do Porto), no ano de 1960. O seu trabalho vasto e engloba prtica e a teoria da arquitectura, sendo no entanto, mais conhecido o seu trabalho como urbanista. A sua prtica terica em arquitectura iniciou-se ainda em estudante na revista Arquitectura, contribuindo posteriormente para a divulgao da arquitectura portuguesa no estrangeiro. Como arquitecto colaborou com Nuno Teotnio Pereira (Igreja do Sagrado Corao de Jesus) e com Camilo Corteso (Conjunto habitacional Somincor). Como urbanista, Nuno Portas assume um papel de grande relevo a nvel nacional e internacional; essencialmente no perodo ps revolucionrio, onde chegou a desempenhar o cargo de Secretrio de Estado da Habitao e Urbanismo, participando activamente na elaborao do programa SAAL (Servio Ambulatrio de Apoio Local), programa que procurou introduzir modalidades de participao directa, conjugando instituies com as populaes, municpios e privados, procurando-se uma autogesto assistida nos empreendimentos. Nuno Portas foi tambm vereador do urbanismo na Cmara Municipal de Vila Nova de Gaia, tendo contribudo para a elaborao de um plano estratgico e do PDM da autarquia. O urbanista contribuiu tambm para os planos de Bolonha e das OPAHs

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francesas, assim como em experincias pioneiras em Portugal como por exemplo: Barredo, vora e Guimares (entre 1974 e 1985). Nuno Portas conhecido internacionalmente atravs da sua carreira terica, sendo autor de vrias publicaes, como por exemplo A cidade como arquitectura de 1969, Os tempos das formas, vol.1: a cidade feita e refeita de 2005, colaborou com lvaro Domingues e Joo Cabral no estudo editado pela Gulbenkian em 2003 Polticas urbanas, Tendncias, estratgias e oportunidades. Escreveu tambm vrios artigos como por exemplo: Centros Velhos, Vida Nova, Os planos directores como instrumentos de regulao e Depoimento de Nuno Portas na revista Sociedade e Territrio, e Resposta a ltus, Projectos especiais, A planificao urbanstica entre planos e projectos na revista Lotus, entre outros. O texto De uma cidade a outra: perspectivas perifricas insere-se numa compilao denominada Lo urbano en 20 autores contemporneos publicada pelas Edicions UPC de Barcelona em 2004, sendo a reviso de um outro texto presente na revista Ciudades n3 intitulado de El planeamiento como proceso de Regulacin Variable. Este texto acompanha as problemticas e sugestes recorrentes na obra de Nuno Portas desde o 25 de Abril de 1974, como por exemplo a ciso entre Plano e Projecto, o Planeamento Estratgico, a presena da Incerteza no Planeamento e a Regulao Varivel, expondo tambm a experincia acumulada ao longo da sua carreira de poltico e de urbanista. Por outro lado, o texto tambm explicita as reflexes de Nuno Portas sobre os novos territrios, apoiando-se este em outros autores como Choay e Sol-Morales. Nuno Portas estudou extensivamente esta temtica no Vale do Ave acompanhado por outros como por exemplo lvaro Domingues. Nuno Portas participou tambm em nmeros colquios (por exemplo Viver na cidade, Lisboa 1990), seminrios e conferncias. Para alm do seu trabalho terico e prtico, Nuno Portas foi tambm docente nas faculdades de arquitectura ESBAL, FAUTL e FAUP.

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RESUMO

O texto analisado divide-se em duas partes distintas de acordo com o seu ttulo: De uma cidade a outra: perspectivas perifricas. O primeiro ponto, denominado A cidade, aborda as questes decorrentes da evoluo do planeamento desde a ptica da ciso entre Plano e Projecto a partir dos anos 60 do sculo XX e critica os modelos de planeamento propostos desde essa altura. O autor comea por criticar os planos em cascata descendente (top-down), demasiado normativos e que apesar das alteraes poltico econmicas e scias no se modificaram, no conseguindo ento assegurar formas coerentes no crescimento urbano. Nesta altura verificou-se uma crise dupla: do estado social e da cultura modernista, surgindo a crena em intervenes fragmentrias encarregues a arquitectos, sendo isto uma reaco ao monoplio dos urbanistas e cidade amorfa existente. Este urbanismo de hiatos falhou ao no conseguir criar uma malha estruturante, evitando assim o estabelecimento de uma continuidade espacial urbana, devido utilizao de um sistema (down-top) que partia das partes para o todo. No incio da dcada de 1980 procurou-se a reunio entre a estruturao do todo e o desenho das partes, reflectindo-se isto em planos de integrao extensiva, onde tudo era desenhado e previsto, o que se deveu estabilidade politica e social de cidades como Madrid. Nos anos 90, a instabilidade poltico econmica e o diferente crescimento demogrfico, aliado atitude mais agressiva em relao ao exterior por parte do poder local, procurando atrair grupos econmicos e promovendo o ambiente, a cultura e o

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lazer; tornaram este modelo de planeamento em algo de difcil manuteno. Criaram-se assim vantagens comparativas e oportunidades no previstas; surgindo assim uma incapacidade de predeterminao nos planos, o que constituiu um desafio para o planeamento tradicional. Segundo o autor, a maioria dos casos de sucesso (e insucesso) nas transformaes urbanas, decorreram margem dos planos vigentes, o que se justifica pela renitncia dos urbanistas em aceitar as oportunidades no previstas como matria de trabalho e a falta de compreenso da essncia do projecto urbano pelos arquitectos, condicionados ainda pela noo determinista tradicional do projecto. O plano acaba por adquirir assim caractersticas (selectivas) de projecto, e o projecto obtm caractersticas de plano, incorporando uma maior incerteza. Surgem ento os conceitos de regulao e geometria varivel em cidades de pequena dimenso e cujo crescimento demogrfico se aproximava do zero. Propunha-se o desenho concreto de reas consolidadas e uma abordagem mais flexvel e probabilstica em reas de difcil previso de crescimento, criando-se assim planos de terceira gerao (uma denominao de Campos-Venuti) a duas velocidades. Percebe-se, desta maneira, que j no est em causa a dicotomia plano/projecto mas sim a diferenciao entre elementos mais persistentes na estrutura urbana e outras componentes dependentes das oportunidades no previstas. O que aproxima, sem esbater as suas diferenas, o plano e o projecto o que agora se chama de Planeamento Estratgico, instrumento j presente no mundo empresarial. Este consiste na definio de estratgias realistas orientadoras de futuros planos, sendo, portanto, meramente indicativo e no normativo, expressando hipteses a testar, reabilitando tambm deste modo um instrumento de planeamento: o diagnstico, que permite a reformulao de hipteses e a criao de cenrios com vista atraco de empresas, sociedade civil ou o estado. H assim uma constante tomada de decises decorrente desta monitorizao, desencadeando uma srie de instrumentos de planeamento que abrangem o projecto, o programa e a regulao conforme o grau de incerteza presente. O Planeamento estratgico estava j presente nas conurbaes do Randstaadt e na associao do Rhur durante os anos 60 e 70 (o auge temporal da dicotomia plano/projecto). A incerteza condiciona a forma urbana, pois se existe um grau de certeza aceitvel assiste-se a um desenho que se aproxima do arquitectnico; mas, se por outro lado este grau de certeza no existe, o territrio deixado em aberto. Assim, regula-se aquilo que 7

no se desenha, atribuindo aos elementos mais persistentes no territrio a funo de coeso e suporte deste mesmo. Por outro lado, os projectos resultam de uma estratgia e promovem a interaco dos actores, contendo tambm um grau de indeterminao grande, advindo assim os concursos de ideias, os quais se desenvolvem no sentido da perda desta mesma indeterminao, funcionando como catalizadores estratgicos. O autor termina este primeiro ponto dizendo que o choque entre arquitectura e o urbanismo no consiste na escala, nem no objectivo; mas sim no objecto, no grau de certeza e no conceito de tempo. No segundo ponto o autor aborda A cidade-outra. Ao tempo em que mudam as formas do planeamento tambm esto a mudar as caractersticas da cidade de facto. Nuno Portas subscreve o termo de o urbano, da autoria da F. Choay, como descrio duma situao na que os limites da cidade tradicional no coincidem com os modos de vida. O autor recolhe uma srie de atributos do novo modelo de cidade. O primeiro ser a passagem da contiguidade, compactao e limite para descontinuidade, fragmentao e difuso. Tambm como Choay, Portas explica esta mudana pela importncia da mobilidade. Aqui aparece a necessidade do projecto de solo, que permita ler entre os fragmentos do conjunto uma coeso, j no no nvel local, mas no nvel geogrfico. O segundo atributo ser o policentrismo, uma rede de centralidades competitivas mas tambm complementarias, nascidas bem da centrifugao do modelo monocntrico, bem do tecido conformado por cidades de tamanho mdio. Finalmente, como factor de desenvolvimento prope-se o fomento de actividades polarizadoras. O texto tenta por em relao estes atributos da cidade contempornea com os termos relativos ao planeamento explicitados na primeira parte. Dos atributos referidos extraem-se trs camadas especficas (deslocaes, centralidades e ecologias) onde vo actuar os planos promovidos pelo planeamento estratgico. Este faz sentido quando possibilitar a interactividade entre os actores e os programas que fazem parte do planeamento, de forma de se usar para reduzir a incerteza. Assim, uma estratgia para o espao colectivo implicar o nfase nos eixos, nos ns de centralidade e na construo da paisagem (componente estrutural segundo CamposVenuti ou elementos persistentes segundo Mazza), para deixar uma crerta margem de liberdade componente interventiva do plano, de forma que possa responder ao tempo

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em que oportunidades e actores permitam reduzir a incerteza (o que a regulao varivel). A extenso dos elementos estruturantes dos fragmentos precisa de uma legitimao e uma deciso poltica aplicada na escala do urbano, e deveria ter uma prioridade que ainda no teve, frente a regenerao urbana na cidade histrica. Mas essa integrao das partes produzida por estes elementos no implica reduzir a diversidade da cidade contempornea. A cidade-outra no pode assumir a uniformidade da cidade histrica.

PALAVRAS-CHAVE

DICOTOMIA PLA O PROJECTO

I CERTEZA

PLA EAME TO ESTRATGICO

REGULA O VARIVEL Esquema 1 Hierarquia das Palavras-Chave

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A dicotomia Plano/Projecto explicita a diferena entre estes dois elementos. O Projecto, determinstico , segundo Nuno Portas, um instrumento de trabalho e apresentao da arquitectura. O Plano, envolve Incerteza. De maneira a aproveitar as oportunidades que a Incerteza concede ao planeamento e ao urbano existem dois mecanismos: o Planeamento Estratgico que define as prioridades, a estratgia, para o desenvolvimento das cidades ou regies urbanas. A Regulao Varivel adequa os elementos estruturantes na construo do urbano e aquelas reas j definidas; com as reas mais incertas e dependentes da incerteza, ou seja, o surgimento das oportunidades no previstas.

DICOTOMIA PLA O/PROJECTO

A dicotomia Plano/Projecto uma das referencias chave do texto de Nuno Portas De uma cidade a outra: perspectivas perifricas, ocupando o autor de uma forma continuada durante a primeira metade do texto, a saber: A cidade. De forma a comear a anlise da palavra-chave, ou expresso chave, procuraram-se os significados das palavras que compe a expresso. Como tal, temos:

Plano: (Lat. Planu), adj. liso; raso; cho; (fig.) fcil; claro; manifesto; s.m. superfcie plana; plancie; planta ou desenho que representa a projeco horizontal de um edifcio; projecto que inclui uma srie ordenada de operaes e meios destinados a atingir um fim; programa; inteno; intuito; desgnio; (Econ.) conjunto de disposies descritivas destinado a dar uma directiva aco e politica econmica; (Geom.) regio determinada por trs pontos no colineares, na qual pode assentar completamente uma recta, em todas as direces; (Fot., Cin.) imagem ou sucesso de imagens definidas pela distncia entre a objectiva e a cena a fotografar ou a filmar e pelo contedo (dimenso e posicionamento dos objectos) dessa imagem. (Dicionrio Universal da lngua portuguesa, Texto editora, lda, Lisboa, 1995)

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Projecto: (Lat. projectu), s.m. plano; intento; desgnio; redaco provisria de lei, de um contrato, de estatutos, etc.; plano geral de uma obra; iniciativa. (Dicionrio Universal da lngua portuguesa, Texto editora, lda, Lisboa, 1995)

Dualismo, ou dualidade foi uma doutrina estabelecida por Descartes, e Christian Von Wolff quem primeiro utilizou o conceito em sua concepo moderna, segundo o qual " o sistema filosfico ou doutrina que admite, como explicao primeira do mundo e da vida, a existncia de dois princpios, de duas substncias ou duas realidades irredutveis entre si, inconciliveis, incapazes de sntese final ou de recproca subordinao." (in www.Wikipdia.com)

Consideramos a palavra dualismo como um termo prximo capaz de substituir a palavra dicotomia.

A dicotomia Plano/Projecto uma temtica recorrente na obra de Nuno Portas; sendo uma consequncia das teorias urbanas do Movimento Moderno que, como Busquets diz no seu texto Villaggi e Metropoli, () instaurara com a planificao restritiva de sistemas e zonas.

Urbanismo

Arquitectura

PLA O

PROJECTO

Incerto Elemento regulador, com menos definio que o projecto.

Determinstico Instrumento de desenho, interveno rigorosa e bem definida, condicionada pela rigidez.

Esquema 2 Dicotomia Plano/Projecto Nuno Portas distingue Plano de Projecto, atravs das suas diferenas bsicas. 11

O projecto, como tema arquitectnico, determinstico, um instrumento de desenho, uma interveno rigorosa e bem definida, condicionada pela sua prpria rigidez. Deste modo, o projecto um instrumento da arquitectura, por si s uma rea em que as certezas na concepo so grandes, partindo desde a encomenda at sua construo. O projecto tende a minimizar a incerteza, desenhando exaustivamente desde uma escala que permita uma implantao at aos pormenores construtivos, no deixando, assim, espao para a improvisao, ou oportunidades no previstas. Por outro lado, o plano prev a incerteza, sendo um elemento regulador, com menos definio que o projecto. A incerteza cumpre, ento, um papel fundamental, na medida em que distingue claramente estes dois elementos. Assim:

Em teoria, o que distingue um plano de um projecto no a escala (ou dimenso) mas sim os graus de incerteza (ou a probabilidade dos seu programa). o campo do

urbanismo essa diferena na consistncia do que se pretende, do desgnio, repercute-se inevitavelmente no desenho e na regulao, ou seja, nas solues para o que se sabe e nas regras do jogo para o que ainda no se pode saber. ( uno Portas)

A crtica a este dualismo comeou a ganhar mpeto com as crises social e da cultura modernista, mas o processo de planeamento s muito mais tarde foi alvo de mudanas. Entretanto o consenso gerado pela Carta de Atenas e pelos CIAM e experimentado na reconstruo da Europa do ps-guerra, foi-se perdendo. Segundo Le Corbusier:

Fazer um plano pecisar, fixar ideias. ter tido ideias. ordenar essas ideias de forma a que sejam inteligveis, possveis, transmissveis. pois, manifestar uma inteno exacta. ( Le Corbusier, 1923)

Um plano assumia assim uma funo de desenho extensivo e de regulao tambm extensiva que pouco espao deixava para a incerteza. O Plano assumia um cariz muito mais de projecto de arquitectura do que propriamente de plano urbanstico. A vanguarda foi ultrapassada pelos tempos e no final dos anos 60, com o surgimento das teorias dos fragmentos e dos trs Res. O planeamento ficou encarregue das intervenes individuais de arquitectos que acabaram por resultar em cidades cheias de 12

hiatos; numa resposta monopolizao exercida pelos urbanistas, que obcecados pela viso sistmica do planeamento e pelo zoning, desvalorizaram a importncia da arquitectura urbana. Esta cidade manta de retalhos no conseguia resolver os problemas existentes da cidade, nem to pouco aqueles que agora comeavam a surgir como a falta de qualidade ambiental, a massificao do trnsito automvel, a desindustrializao e a concentrao monofuncional de actividades, assim como a construo ilegal e os problemas sociais de tudo isto inerentes. Passou-se de uma abordagem de top-down, para uma outra abordagem de down top, em que ao contrrio da primeira, os planos se fazem das partes para o todo. Faltava uma malha estruturante cidade que a unisse e a estruturasse. Foi, j nos anos oitenta que se comeou a observar, em algumas cidades, casos muito especficos em que a convergncia de opinies e vontades entre polticos, promotores e cidados, que se comeou a procurar a integrao destas partes separadas: a estruturao de um todo e o desenho das partes, envolvendo j uma noo de estratgia. Um claro exemplo Madrid. Estas tentativas, como o caso de Madrid, constituem uma tentativa de reaco ao dualismo entre arquitectura e urbanismo; no entanto a integrao extensiva de todos os nveis de informao e regulao, retiraram a capacidade de flexibilidade que um plano dever ter de forma a poder responder a acontecimentos inesperados; constituindo assim, mais uma vez, um intento frustrado, que se aproximava mais de um projecto, que para alm de desenhar, regula. Entretanto, comeou-se a pensar que planos como o de Madrid no seriam o melhor instrumento de planeamento dadas as novas condies de poder local, podendo ainda agravar-se as condies politicas, sociais e econmicas, como de resto se veio a verificar. Surgiram os Planos a duas velocidades, denominados de Terceira Gerao (planos de Secchi em Siena e Brgamo, Campos-Venuti em Bolonha, etc), em que a crescente incerteza comeou a ser contemplada no processo e nos instrumentos de planeamento. Estes planos de Terza Generazione distinguiram as modalidades de interveno, exemplificando o modo de proceder dependendo das situaes a observar, demonstrando de uma forma precisa a dicotomia plano/projecto. Assim: nas reas de mais difcil predio deixava-se em aberto a determinao de reas de expanso, devido

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dificuldade de atribuio de vocaes e de formas urbanas coerentes; e nas reas mais consolidadas procurava-se um desenho ou regulao mais extensivas. Distinguem-se, desta forma, tambm conceitos como elementos estruturantes e elementos dependentes de oportunidades na construo do urbano; e importa-se a estratgia do mundo empresarial de forma a tentar definir a direco do desenvolvimento das reas urbanas.

Fig. 1 e 2 Plano de Siena (esquerda), Plano de Bolonha (direita) Nuno Portas considera que a questo dos choques entre urbanismo e arquitectura no de zoom, no de objectivo, mas sim de objecto, e de oportunidade, ou seja de tempo; querendo com isto dizer, que a diferenciao entre a arquitectura e o urbanismo no a escala a que se fazem, nem do objectivo com que se fazem; mas o facto de o urbanismo ser um processo temporal, que decorre da incerteza que lhe endgena. Para o autor, eventualmente as diferenas entre os dois campos ir-se-o reduzir, partilhando caractersticas selectivas um do outro; mas nunca deixaro de existir enquanto disciplinas distintas, com os seus feitios inerentes, sendo que a viso sistmica e regulamentista dos planos continuar, apesar de apresentar formas de se expressar mltiplas, j no reduzidas ao top-down; e a necessidade de arquitectura urbana subsistir, embora aplicada de uma forma mais estratgica e mais selectiva.

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I CERTEZA

A palavra Incerteza diferencia o Projecto do Plano, sendo muito importante para a compreenso destes dois elementos enquanto instrumentos da arquitectura e do urbanismo respectivamente. De modo a perceber o mbito do conceito incerteza comeou-se por tentar entender o seu significado literal. Assim:

Incerteza:

1. Qualidade do que oferece dvidas, do que no se pode prever ou determinar com toda a certeza 2. Estado de esprito de quem tem dvidas, no est seguro da realidade de um facto, da veracidade de alguma coisa 3. Estado de pessoa que no sabe o que deve fazer, que no se sente segura; indeciso, hesitao, vacilao, acontecimento, situao imprevisvel; coisa incerta (Dicionrio da Lngua Portuguesa

Contempornea, Academia das Cincias de Lisboa)

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A incerteza um termo utilizado num vasto nmero de campos, incluindo a filosofia, a estatstica, a economia, os seguros, a psicologia, a engenharia e a cincia. Aplica-se predio de eventos futuros, a medidas fsicas j realizadas ou ao desconhecido.

De acordo com a viso da histria do Planeamento, reflectida no texto de Nuno Portas, h um momento especifico em que, finalmente, as regras do planeamento tradicional se alteram substancialmente. Este acontecimento deve-se a uma srie de factores e as consequncias desta mutao lanariam o desenvolvimento do que o Planeamento Urbano actual. At ao fim da dcada de 1960, as metodologias do planeamento eram claras e predefinidas: um processo top down, ou seja uma srie fortemente hierarquizada de propostas e de decises, que desde a macro escala faziam um zoom at ao pormenor construtivo. Havia ento uma pretenso de resolver exaustivamente, atravs de um plano todos os problemas da cidade. Entretanto, a viso disciplinar alarga-se e comea a entender a necessidade de insero de matrias novas no estudo do planeamento da cidade. O urbanista Campos-Venuti, primeiro, inseriu no plano urbano disciplinas externas como sociologia, higiene, psicologia de massas e outros elementos que partida no pareciam possuir uma ligao com o planeamento urbano. Desta forma, Campos-Venuti destri definitivamente o axioma antigo de pureza do plano. Neste ponto comeam a cair claramente uma srie de sistemas e instrumentos do Planeamento.

() a incerteza a menor capacidade de predeterminao ou prefigurao das solues concretas () ( uno Portas).

De facto, a criao de uma nova metodologia do Planeamento, induz compreenso de no ser possvel resolver exaustivamente priori, com solues pr fabricadas, as questes levantadas pelo urbano. Alm disso, com a introduo de um conjunto de disciplinas heterogneas, introduzem-se uma multiplicidade de actores que tem de interagir entre eles, e com diversos campos do conhecimento, o que acaba por gerar oportunidades inesperadas. Estas oportunidades produzem mutaes imprevistas na cidade. Esta uma viso muito mais dinmica do conceito da cidade. 16

Gandelsonas, define um mecanismo escritor de permanncia e de efemeridade, numa metfora textual para a cidade.

no espao onde esses dois nveis se reconciliam onde a arquitectura encontra o lugar da sua articulao com a cidade, o lugar em que a arquitectura pode produzir mudanas que gravem traos permanentes na esfera urbana. (M. Gandelsonas)

Este mecanismo de escrita um dos exemplos das novas leituras da cidade que foram inspirados pela destruio do Planeamento Tradicional.

Como vivemos numa poca de grandes incertezas, as nossas decises devem ser, de alguma forma, flexveis, passveis de aperfeioamento. no devemos tomar atitudes ultimas em todos os campos. ( uno Portas).

A poca da incerteza chega aps a falha da fsica clssica, com a Teoria da Relatividade. As ideias caminham numa via probabilstica desde o sculo passado.

O mundo no mais definvel, mas somente provvel, e mais quantificvel nos termos das estatsticas. (Arroyo de Eduardo in Pricipios de Incertidumbre, Croquis n118, 2003)

Ao introduzir-se na arquitectura e no planeamento a probabilidade e a estatstica, inserem-se alguns fundamentos do pensamento cientfico contemporneo. Os tpicos bsicos da indeterminao, da matria energia, da unidade, do espao tempo e da entropia entram na metodologia de projecto como efectivos operadores projectuais. O aproveitamento destas metodologias de base cientfica podem sofrer diferentes abordagens de acordo com as teorias que servem de base, sejam elas, por exemplo: as teorias da complexidade e do caos, da geometria de fractais, teoria das catstrofes, ou o principio da incerteza de Eisenberg.

Tudo aquilo que acontece na natureza fruto da sorte e da necessidade (Demcrito)

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PLA EAME TO ESTRATGICO

O Planeamento estratgico um tipo de planeamento que prev a utilizao de um plano prvio que define a estratgia a seguir. Para comear a entender a amplitude da expresso Planeamento Estratgico, comeamos por definir o significado de cada palavra que a compe. Deste modo: Planeamento estratgico empresarial:

O desenvolvimento de estratgias tem sido tradicionalmente abordado como um processo formal de planeamento, envolvendo, em geral, duas etapas. A primeira engloba a definio do negcio bem como a explicitao da misso da organizao e seus princpios. A segunda constituda das anlises dos ambientes interno e externo empresa, a determinao de objectivos com seus respectivos indicadores de acompanhamento e a formulao das estratgias correspondentes para alcan-los.

(www.Wikipdia.com)

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Planeamento:

s.m. aco ou efeito de planear ou de planificar; trabalho de preparao para qualquer empreendimento; no qual se estabelecem os objectivos, as etapas, os prazos e os meios para a sua concretizao; estabelecimento de um plano. (in Dicionrio Universal da lngua portuguesa, Texto editora, lda, Lisboa, 1995)

Estratgia:

(Lat. strategia < Gr. stratega, comando do exrcito), s.f. parte da arte militar que estuda as grandes operaes da guerra e lhes prepara o plano; estratgia; tctica; ardil. (in Dicionrio Universal da lngua portuguesa, Texto editora, lda, Lisboa, 1995)

O

planeamento

estratgico,

um

processo

criativo

de

identificao

e

acompanhamento das aces mais importantes, tendo em ateno as foras e fraquezas, bem como as ameaas e oportunidades. (Sorkin, 1985)

Cronologicamente podemos comear por analisar trs geraes do planeamento. A primeira destas geraes existiu no ps-guerra, consistindo num planeamento racional-compressivo baseado no pressuposto da unicidade do interesse publico e que prescreveu para alm da difuso/racionalizao do equipamento social, uma poltica de condicionamento da afectao do solo atravs de um zonamento rgido. Segundo Gibelli (1993): As principais crticas apontam-no como demasiado esttico, pouco flexvel e, muitas vezes acusado de ter constitudo um significativo obstculo burocratizante deciso. Este mega planeamento esbateu-se a partir dos anos 70, dando lugar a intervenes essencialmente correctoras de desequilbrios mais pontuais e locais devido a um cenrio de crises e incertezas. O principal objectivo destas intervenes era a coeso social e a melhoria global das condies de vida nas cidades, embora se continue ainda a efectuar uma clara distino entre a esfera do pblico e do privado.

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Posteriormente, uma nova gerao, terceira gerao, surgiu; sendo designada de planeamento estratgico. uma importao do mundo empresarial e constitui um processo interactivo de definio de objectivos a longo prazo. Acentua-se a operacionalidade do plano, a previso deixa de ser meramente extrapolativa, diferenciando-se cenrios alternativos e estabelecendo-se uma maior abertura permanente reviso. dada uma maior ateno esfera produtiva e no apenas vertente social. Identificam-se as reas mais competitivas e as mais dbeis, procurando sinergias (complementaridades) entre grupos de cidades.

Inicialmente, o planeamento estratgico foi um dos instrumentos utilizados com o fim de melhorar a eficincia das empresas, construindo um processo interactivo de definir os objectivos a longo prazo. Trata-se ento de identificar fileiras mais competitivas no contexto regional ou internacional, as respectivas virtualidades e debilidades, fomentando as relaes de complementaridade.

Certos elementos deveriam ser substitudos por outros elementos, que seriam ncoras para que o planeamento urbanstico existisse para alm do amanha. A estratgia tem que ser para depois de amanha. ( uno Portas, conferencia faculdade de engenharia, 2007)

Segundo o arquitecto Nuno Portas, o contexto e a gesto so caracterizados por um alto grau de incerteza e imprevisibilidade, no espao e no tempo ( uno Portas, conferencia faculdade de engenharia, 2007) . Da, a importncia da aplicao do planeamento estratgico que assegure um melhor crescimento urbano, capaz de acolher as oportunidades, ao contrrio do planeamento tradicional, rgido e dogmtico, tendo o planeamento urbanstico estratgico ter que ser concretizado sem prazo de validade. Assim, Nuno Portas recusa o PDM uma vez que este tem prazo e no flexvel. Nuno Portas defende tambm que nenhum plano pode ser concebido como um fato por medida, tendo de oferecer vrias frentes de desenvolvimento e capacidade para responder pela incerteza relativa ao aparecimento de novas necessidades no tecido urbano. O planeamento tem que ser pensado no seu contexto, e no como uma receita que serve a todo e qualquer territrio em questo.

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O planeamento estratgico surge de forma a acolher a lgica das oportunidades no previstas (). ( uno Portas in De uma cidade a outra perspectivas perifricas)

Ao contrario do planeamento tradicional, o planeamento estratgico deixa de ser determinante para passar a ser mais indicativo, adaptando-se imprevisibilidade do mundo actual e, consequentemente, evitando a descredibilizao do sistema.

O planeamento estratgico um processo para gerir a mudana e para descobrir os caminhos de futuro mais promissores para as cidades e colectividades locais. Este processo consiste em colocar no centro das atenes as fraquezas e oportunidades das cidades e colectividades locais. (Artur Andersen e Co, citado por Padioleu)

O plano pode pois incluir uma componente projectual mais ou menos determinante mas no pode transformar-se num projecto como por vezes pensam arquitectos, juristas ou polticos. O plano pode (e deve ser) construir um momento de reduo aprecivel da incerteza mas no pode elimin-la, fingindo ser um projectopara-cumprir ou tornando-se num processo continuo de revises tendencialmente interminvel e juridicamente inaceitvel. ( .Portas )

O Plano e projecto aproximaram-se sem que as suas distines bsicas tenham desaparecido. Assim, o planeamento estratgico, para alm de aproximar o plano e o projecto atravs do motor incerteza, serve exactamente para reduzir esta mesma incerteza.

A estratgia indicativa, expressa em hipteses a testar, desencadeando diversos instrumentos de interveno de acordo com os graus de incerteza. Surge como um momento privilegiado. O planeamento estratgico estava j presente nas conurbaes do Rhur e do Randstadt. Estas apresentavam estratgias realistas a longo prazo prevendo o desenvolvimento regional nas suas mais variadas dimenses.

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Fig. 3, 4 e 5 Conurbao Randstadt (esquerda) e conurbao do Rhur ao longo das dcadas (centro e direita) Por outro lado, temos o exemplo de Braslia, onde o planeamento estratgico no foi de todo aplicado. Assistiu-se ao crescimento rpido por prioridades politicas, onde o saudvel e gradual crescimento urbano adaptado as necessidades locais que vo surgindo ao longo do tempo foram renegadas para segundo plano. Foi o surgimento de uma cidade como se de um edifcio se tratasse, onde a interdicisplinidade no teve lugar. No havendo um planeamento estratgico funcional que prev-se o desenvolvimento futuro, o crescimento da cidade de Braslia surgiu sem regra e desconectado em relao ao projecto de scar Niemayer.

Fig. 6 Plano de Braslia (Lcio Costa)

Lcio Costa e

iemeyer, que pensavam saber como as pessoas do futuro viveriam,

projectaram Braslia sem enfrentar nenhum tipo de condicionamento. E quando

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acusados de que as coisas no estavam a dar certo, houve uma frase famosa, atribuda a Lcio Costa: " o fomos ns que no demos certo, foi a cidade brasileira que no evoluiu como pensvamos". ( uno Portas,)

Assim, podemos concluir que as sociedades modernas tornaram-se sociedades de incerteza, sendo que os sistemas de pensamento ou deciso mais determinados no resistem. Apenas os sistemas flexveis, abertos, com determinao mnima ou varivel, ou ainda com identidade regulvel, se adaptam e tm maior probabilidade de serem eficazes. ento necessrio categorias prticas e flexveis de raciocnio para se pensar o dominar situaes tornadas incertas o planeamento estratgico.

REGULAO VARIVELA Regulao Varivel prev diferentes modos de actuao conforme o grau de incerteza existente. De maneira a compreender o significado da expresso comeou-se por subdividir as palavras que a compe. Deste modo, temos:

Regulao:

(De regular +suf. Co) 1. estabelecimento de regras; acto ou efeito de regular. = regulamentao. 2.conjunto de normas, de p+receitos. = regulamentao, regulamento. 3. regularizao de um movimento, uma funo regulao de um relgio. 4. aco de manter o equilbrio, de assegurar um funcionamento correcto de um sistema complexo. 5. Jur. Repartio de danos e despesas, de forma equitativa. Regulao de acidentes martimos. (in Dicionrio Universal da Lngua Portuguesa, Texto Editora, 1995)

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Varivel:

(Do latim variabilis) 1. que varia. 2. que susceptvel de se modificar, de mudar. =inconstante, mutvel. Temperatura atmosfrica varivel. 3. que pode ter diferentes valores ou aspectos, segundo os casos particulares ou mediante as circunstancias =diferente, diverso. 4. mat. Que toma ou +pode tomar diversos valores distintos. Grandeza varivel. 5. gram. Que pode tomar formas diferentes conforme o gnero, grau, numero, modo, pessoa, tempo 6. astr. Que sofre variaes de luminosidade. Estrel varivel. Adv. Variavelmente (in Dicionrio Universal da Lngua Portuguesa, Texto Editora, 1995)

Segundo Nuno Portas, a regulao Varivel aquela em que o grau de determinao do planeamento depende do grau de incerteza do contexto para o qual o planeamento executado. Ou seja, quanto maior o grau de certeza, como nas reas patrimoniais ou nos elementos estruturantes na construo da cidade, mais fcil o desenho e a regulao do espao. Pelo contrrio, aquelas zonas menos consolidadas, devem ser deixadas, o mais possvel, em aberto, de forma a permitirem possveis intervenes, sem que o plano vigente caduque. Segundo Nuno Portas, podemos falar de planos a duas velocidades no seu contedo regulador. Estes planos forneceram uma resposta aos problemas do planeamento no momento em que se passou da expanso urbana para a transformao urbana. So os Planos de Terceira Gerao. As problemticas urbanas principais decorrentes desta mutao so vrias: um grande processo de exploso das industrias e das residncias populares das cidades maiores, ao que corresponde uma terciarizao mais activas das centralidades; o antagonismo entre servios elitistas e servios sociais massificados, ao qual corresponde um antagonismo anlogo da conservao ambiental nas zonas histricas e nas zonas de interesse natural; e a crescente demanda produtiva e social do transporte de massa. A enorme quantidade de patrimnio edificado fez emergir a necessidade de reduo de solo agrcola para urbanizar. Deste modo recupera-se a necessidade de recuperar as zonas intersticiais sem construo ou mal utilizadas. Outra problemtica emergente foi a necessidade de recuperao da forma urbana e a produtividade. 24

Assim, os planos necessitaram assumir mais do que uma velocidade. Mas reas de aco intensiva, os planos programam sempre instalaes privadas ou pblicas (novas implantaes do sector tercirio) com grande valor econmico para a cidade, de forma a serem multifuncionais. Colocam-se aqui os maiores investimentos. Assim, regula-se e desenha-se o que est consolidado e cujo uso de mais fcil previso. Nas reas envolventes a estes plos de transformao estratgica, os tecidos urbanos e as modestas expanses previstas pelos planos, constituem aquilo que Campos-Venuti definiu de aco extensiva. Nestas reas os planos programam um crescimento leve e gradual, atravs de um planeamento flexvel e elstico, de forma a integrar-se nos novos tecidos uma funo terciria com uma aplicao mais suave de forma a servir pessoas e empresas. Deste modo, nas reas em que existe uma menor definio de usos futuros, a regulao varivel permite um planeamento flexvel, deixando em aberto a possibilidade de oportunidades e aces no previstas. Estabelece-se ento um novo dualismo entre elementos persistentes e elementos dependentes de oportunidades, existindo uma mirade de possibilidades adequadas ao grau de incerteza presente. O plano deixa de ser um desenho adequado, mas sim um guio.

REFLEXO CRTICA

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I TRODUO

A problemtica escolhida desenvolve-se sobre o seguinte tema: Elementos Estruturantes e Elementos dependentes das oportunidades na construo as cidade. A escolha desta problemtica deveu-se ao facto da mesma ser um tema recorrente no texto em anlise para a disciplina de Teoria IV, De uma cidade a outra: perspectivas perifricas de Nuno Portas. O texto encontra-se dividido, como o seu ttulo indica, em duas partes: A Cidade e A Cidade-outra, abordando temas que so recorrentes na obra do autor, tais como: a

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dicotomia Plano/Projecto; a Incerteza, o Planeamento Estratgico, a Regulao Varivel e os novos territrios. A escolha da problemtica surgiu devido sua transversalidade em relao ao texto, abordando todas as temticas presentes neste.

Os elementos estruturantes, como o traado e a sua reflexo no espao colectivo das cidades, permitem a construo da cidade e a articulao de transformaes passadas com outras futuras. Os elementos dependentes de oportunidades so derivados da incerteza, no podendo ser previstos e como tal no permitem uma abordagem concreta e desenhada, sendo somente regulados, ou ento indicados como potencialidade pelo plano Estratgico das cidades, conurbaes ou reas metropolitanas. Para se perceber os mecanismos e instrumentos existentes preciso tambm compreender as palavras-chave previamente apresentadas e articul-las com as ideias de outros autores.

ELEME TOS ESTRUTURA TES

ELEME TOS ESTRUTURA TES

PROJECTO DE SOLOdesenha 27

ESPAO COLECTIVO

Esquema 3 Construo do Espao Colectivo

A definio fsica dos elementos estruturantes na construo do urbano geralmente ocorre com o Projecto de Solo. Este ltimo, desenha e conforma o espao colectivo, que pode ser de duas ndoles: publico ou privado. No entanto o facto de ser privado no significa que seja de uso privado, sendo este factor por demais importante na definio espacial. Assim, um espao privado pode ter um uso pblico e vice-versa. O Traado ou Projecto de Solo, constitui um instrumento de sntese, essencial na insero do factor tempo na construo da cidade, permitindo manter alguns elementos em aberto e outros claramente definidos. O espao colectivo define a identidade histrica das cidades e projecta-as em direco ao futuro, permitindo o constante dilogo entre diferentes reas construdas em diferentes tempos.

O pensamento de Nuno Portas parece articular-se em funo das dicotomias. O dualismo aparece como fio condutor atravs de todo o texto De uma cidade a outra: perspectivas perifricas, tanto no ttulo do texto como na estruturao deste em duas partes: A cidade e a cidade-outra. A primeira amostra deste dualismo a distino entre a cidade pensada, proposta pelo urbanismo e a cidade real, resultante as vezes deste pensamento mas tambm do confronto com a conjuntura, com a incerteza, por usar um dos termos fulcrais na teoria do professor Portas. Outro dos dualismos recorrentes nesta teoria o dualismo urbanismo/arquitectura, que tambm se pode ler como dualismo plano/projecto, e que para Nuno Portas se baseia no dualismo mais abrangente certeza/incerteza.

O dualismo plano/projecto usa-se como fio condutor numa reflexo sobre a histria recente das diferentes formas de aproximao cidade. Assim, numa estratgia de tesis/anti-tesis, passa-se do urbanismo do zoning s intervenes dos fragmentos,

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destas aos planos desenhados extensivamente, e destes para os Planos de terceira gerao e o planeamento estratgico.

nos planos de terceira gerao que Nuno Portas pega no conceito que se traduz no tema do trabalho em questo, isto , uma nova dicotomia, a dicotomia elementos estruturantes/elementos dependentes das oportunidades. O urbanismo do zoning tenta solucionar problemas de funcionamento, mas resulta indiferente perante o problema da forma urbana e do espao colectivo, reduzido simplesmente a um vazio entre edifcios. Alm disso, a segregao de funes acabou por gerar toda uma srie de problemas no interior da cidade. Como resposta, a teoria dos fragmentos pretendia solucionar estes problemas mediante intervenes arquitectnicas de qualidade. Mas estas actuaes, pela sua prpria natureza pontual no resolvem o problema da forma urbana global nem beneficiam o resto dos tecidos urbanos sem interveno. Tambm o plano extensivo no resulta operativo, mas por questes diferentes. Alm da extrema dificuldade contextual que ele implica, no tem em conta nem est preparado para afrontar as novas condies na construo da cidade contempornea. O plano extensivo pode, em condies totalmente favorveis, ter bom sucesso na cidade compacta, mas totalmente impraticvel no modelo difuso.

De facto, a insuficincia no estava tanto na fragmentao das intervenes concretas pblicas, mas sim na falta de suportes explcitos com capacidade estruturante para articular em rede os efeitos scio-culturais e econmicos dos fragmentos ( uno Portas, 1996).

Esses suportes so os elementos estruturantes que propem os planos de terceira gerao. A outra parte da dicotomia, os elementos dependentes das oportunidades, permite lidar com as novas condies da cidade contempornea, a maior incerteza, a descentralizao das competncias, o crescente peso dos movimentos sociais, a competitividade entre cidades e as novas tecnologias. Mas sobretudo, esta dicotomia introduz um elemento chave na construo da cidade, o tempo. Esta dicotomia resulta fulcral no texto estudado, mas tambm na teoria completa de Nuno Portas, porque introduz o conceito de regulao varivel. O planeamento de regulao varivel pode considerar os diferentes tempos na construo da cidade 29

desenhando de uma vez os elementos estruturantes, os elementos para cumprir e deixando abertos, apenas regulando, os elementos dependentes das oportunidades segundo o grau de incerteza que se tem no momento do planeamento. O termo de regulao varivel :

Muito prximo do gradiente da normativa que teorizou faz tempo Luigi Mazza, ou o passo da norma substantiva norma de procedimento de F. Ascher ( uno Portas, 2003).

Alm de Nuno Portas, podemos encontrar conceitos equivalentes, ou de alguma forma equiparveis, no pensamento de outros autores. Antonio Font reintroduz os conceitos de plano de estrutura e plano operativo:

o primeiro como projecto dos rasgos fundamentais da ordenao, e o segundo como atribuio dos direitos e obrigaes da propriedade do solo e o dos agentes urbanizadores no momento da urbanizao. (Antnio Font, 2003)

Estes dois elementos tm relaes diferentes com os tempos da cidade e com a incerteza: O plano (de estrutura) deve definir a meio e longo prazo os elementos estruturantes da cidade, como marco estvel de referncia. O plano operativo pode e deve-se adequar s conjunturas especficas. A distino, pois, destes elementos e determinaes essenciais no planeamento e os que no o so, a fim que permaneam aqueles e abra-se a possibilidade de modificao destes atravs de procedimentos regrados simples. (Antnio Font, 2003)

Philippe Panerai fala da permanncia do traado atravs do tempo, dando como exemplos os traados romanos, a retcula nova-iorquina e o traado agrcola do Cairo. O xito, visto a sua durabilidade, desses traados seria a sua resposta capacidade de substituir a edificao no seu interior, mantendo-se como referncia e imagem.

Se enquanto projectar novas reas necessrio definir os traados virios nos primeiros momentos... o estofo dessa malha fica, frequentemente, para etapas posteriores (Panerai, 2002) 30

Assim, desenham-se os elementos estruturantes, e os elementos dependentes da oportunidade ficam espera do momento certo para melhor se poder definir. Tambm os tempos da construo da cidade do Manuel de Sol-Morales podem-se ler em funo da dicotomia que ocupa a temtica a desenvolver, urbanizao como elemento estruturante, no apenas num nvel funcional, mas tambm como traado, como imagem permanente e memorvel da cidade (Sol-Morales, 1986) e parcelamento e edificao espera dos seus respectivos momentos.

Como j apontavam alguns dos autores citados anteriormente, os elementos estruturantes so os responsveis pela forma urbana, so os elementos permanentes e legveis, quer seja como elemento fsico, quer seja como imagem mental. No livro A imagem da cidade, Kevin Lynch fala de diversas categorias estruturantes, como eixos, ns, limites e fitas. Esses elementos so os que constroem a imagem mental da cidade, o que resulta perdurvel e no apenas contingente. So os mesmos elementos que Panerai recomenda usar como base para a construo dos traados. Tanto para Panerai, como para Sol-Morales, os elementos estruturantes so os traados:

que o que resumir e exprimir a organizao conjunta do solo, onde se situa a fora figurativa do projecto (...)no momento inicial e mais permanente.(SolMorales,1986)

Os elementos estruturantes so os responsveis pela definio do espao colectivo, identificado na cidade consolidada (e, portanto, tambm em grande parte do imaginrio colectivo), como uma sucesso de ruas e praas delimitadas pelo alinhamento da edificao. Esta identificao j no real na cidade contempornea, mas os elementos estruturantes devem-se usar, como na cidade compacta, para manter a coeso e assegurar a leitura da cidade contempornea como uma totalidade, ainda que formada por fragmentos diferenciados, separados por interstcios. A cidade contempornea assim:

um mosaico de cheios e vazios irregulares e desligados cuja coeso depende (...) da capacidade para seguir construindo paisagem e espao pblico. A cidade exterior, que 31

no teve, como devia, uma malha ordenadora do espao pblico (...) deve ter a sua oportunidade de reubanizao (...) com a sua dimenso eco-paisagista. ( uno Portas, 1996)

A cidade contempornea a cidade-territrio, uma nica grande cidade com algumas zonas de campo incorporadas nela (Indovina, 1990), portanto os elementos estruturantes devem funcionar numa escala supramunicipal, numa escala territorial. A ordenao do sistema de espaos livres como elemento estrutural tem de desenvolver um papel vertebrado e articulador dos diferentes tecidos existentes ou de uma nova planta.

Desde o jardim urbano ao parque metropolitano, desde o percurso pedonal at o corredor territorial, desde o espao agrcola at os espaos naturais protegidos, tem de se configurar um sistema de espaos livres que seja a pea fulcral da rede ambiental territorial. (Antonio Font, 2003)

A transversalidade de escalas aparece como um factor indissocivel dos elementos estruturantes, j que a sua funo a articulao dos distintos elementos que formam a cidade; articulao entre eles e articulao num tudo global coerente. Parmetro de referncia comum entre as distintas formas construdas das tramas urbanas e pauta espacial, subtil mas potentssima das suas transformaes temporrias. (Sol-Morales, 1986)

OPORTU IDADES O PREVISTAS

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INCERTEZA

ELEME TOS DEPE DE TES DE OPORTU IDADES

EVENTOS PLANEAMENTO ESTRATGICO COMPETITIVIDADE ENTRE CIDADESEsquema 4 Construo e tipos de Oportunidades no previstas As Oportunidades no previstas so um produto da incerteza decorrente do planeamento Urbano actual. Para ser mais especfico decorrem de uma incerteza de tipo UR. A definio de um plano estratgico, ou seja de uma estratgia para o desenvolvimento de uma cidade ou regio urbana, deixa uma margem de manobra relativamente grande para o surgimento de oportunidades que no podem ser previstas. Outro grande factor que interfere na criao de oportunidades a capacidade de uma cidade se tornar competitiva atravs da explorao dos seus recursos materiais e imateriais, sendo capaz de projectar a sua centralidade (ou capaz de criar uma centralidade), atraindo desta forma oportunidades de desenvolvimento em detrimento de outros centros urbanos. Por ltimo, a capacidade organizativa de eventos internacionais promove a transformao das cidades atravs da realizao destes mesmos na cidade, constituindo elementos catalticos de desenvolvimento, importantes na atraco de novas oportunidades da mais variada ordem.

COMPETITIVIDADE

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Desde os anos oitenta os municpios, com maior ou menor cumplicidade com os governos centrais e dos fundos europeus, adoptam implantaes mais agressivos em relao ao exterior competncia ou complementaridade com outras cidades, atraco de grupos econmicos com maior capacidade de inverso produtiva e imobiliria, oferta de melhoria ambiental, assim como de atractivos culturais, tursticos e de lazer, etc . Esta agressividade est dominada pelo aproveitamento ou criao oportunidades e vantagens comparativas. ( uno Portas )

A competitividade entre cidades ou regies um factor preponderante no planeamento e gesto urbana actuais, interferindo na procura de um desenvolvimento regional face a um contexto global muito mais abrangente. Com o advento dos planos de terceira gerao (uma denominao de Campos-Venuti), surge a noo de regulao e geometria variveis, de forma a responder de uma forma mais coerente aos desafios que o planeamento urbano tradicional no conseguia resolver. Para tal, propuseram-se planos a duas velocidades que desenhavam reas cuja definio j mais consolidada e propunham uma abordagem mais flexvel e probabilstica para outras reas cuja previso do seu desenvolvimento de maior dificuldade; diferenciando deste modo as estruturas urbanas persistentes e outras dependentes de oportunidades no previstas. A incerteza desempenha, ento, um papel de suma importncia na construo das cidades. A competitividade decorrente da incerteza na medida em que os agentes no conseguem prever o surgimento de oportunidades, podendo somente influenciar a escolha dos seus municpios ou regies atravs de uma poltica estratgica que defina as prioridades a tomar.

Capacidade de Inovao

As oportunidades no previstas, geradas ou potenciadas primeiramente pelas mudanas no sistema econmico, ocupam-se maioritariamente da capacidade de inovao das cidades, sendo que a difuso da inovao pode influir na difuso da desigualdade, pois os meios necessrios para esta mesma inovao so caros, e nem todos os municpios ou conurbaes os podem suportar.

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Um dos agentes mais importantes ao se falar nas cidades da actualidade a competitividade, baseada em estudos econmicos. A capacidade de competir est indelevelmente associada capacidade produtiva e inovao, sendo este segundo elemento um factor de suma importncia que exige um recurso raro e normalmente efmero: a criatividade. Peter Hall refere em Cities in Civilization a raridade e escassez deste recurso, apoiando-se nos estudos de John B. Goddard que demonstra que as tecnologias de ponta no diminuem a desigualdade entre distintos lugares, tendendo at a amplific-la. Jane Jacobs baseia a economia na cidade (por oposio s macroeconomias nacionais), devido histrica primazia destas na produo de riquezas.

Se quisesse definir o desenvolvimento econmico com uma palavra, esta seria improvisao, um processo de improvisao contnua num contexto que permite que as improvisaes injectadas nele sejam adequadas para a vida diria.(Jane Jacobs, 1986)

Jacobs menciona que a capacidade de inovao das empresas e a sua complementaridade, o uso flexvel das novas tecnologias, e as caractersticas das cidades; que permite s regies urbanas a capacidade de substituir as importaes, sendo esta a verdadeira fonte de riqueza efectiva das cidades, posteriormente estimulada pelo comrcio com reas de menor desenvolvimento. Existe, ento, uma criatividade aplicada tambm ao intercmbio, em que a centralidade definida pelas cidades continua imprescindvel. Actualmente existe uma grande presso para inovar. A gesto municipal ou metropolitana adoptou em muitos casos um tipo de gesto empresarial. Este tipo de gesto executado atravs da diversificao de servios e dos canais de prestao dos mesmos, atravs da inovao tecnolgica, associada a inovaes de carcter organizacional. Em Portugal temos como exemplos os projectos Cidades e Regies Digitais. No entanto, o insucesso deste modelo levou adopo de uma viso que preconiza mais o servio pblico e o envolvimento da comunidade. Para alm do desenvolvimento econmico, tambm o desenvolvimento social e cultural exige uma postura inovadora, de modo a que a sua gesto e as suas relaes com outros actores se possam processar de uma forma melhor.

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Desta forma os municpios devem desempenhar um papel duplo face inovao: por um lado devero ser parceiros de empresas locais, nacionais ou mesmo internacionais; e por outro lado demonstrar atravs das suas prticas, quer em termos de servios prestados, quer em termos de gesto de recursos, inovao.

Centralidade e Cidades Carrefour

Joan Busquets enumera, no seu texto Villaggi e Metropoli, algumas reas de transformao nas cidades durante as dcadas de 1980 e 1990, de forma a se consolidarem como espaos de centralidade: reorganizao de portos martimos centrais (por exemplo Roterdo); a recuperao mais ou menos generalizada das vias ferrovirias e suas estaes e a mudana na hierarquia destas ltimas, seguida pela opo da Alta Velocidade (por exemplo Lille, projecto de Rem Koolhas); a reformulao ou relocalizao de aeroportos (por exemplo Lisboa, Ota); e a implantao de reas industriais que deixam de ser monofuncionais. Estes novos espaos de centralidade, as cidades Carrefour (cidades encruzilhada) a que Jean Gottmann se referiu, so stios onde existe acesso a grandes infra estruturas de transporte, de energia e de informao; potenciando-se a mobilidade. A cidade , assim, uma ligao num complexo sistema de redes, em que as mais interactivas e logo mais criativas so as que mais transformaes sofrem. A grande mobilidade inerente encruzilhada de redes nas cidades potencia tambm o comrcio com outras regies menos desenvolvidas, o que lhes permite um desenvolvimento econmico comparativamente mais substancial. Pode-se afirmar que existe um efeito cidade, pois o desenvolvimento de actividades cria a concorrncia de outras que lhes so complementares, surgindo assim projectos especiais catalticos de desenvolvimento urbano estratgico nas regies urbanas. No entanto, o grande comrcio centralizado, as fbricas inteligentes, os espaos representativos e as reas residenciais bem dotadas de servios; rivalizam j com os projectos urbanos. A evoluo espacial da cidade encontra nesta transformao a sua prpria demonstrao.

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Projectos especiais

O processo de planeamento urbano no segue mais o modelo top-down, em que se propunha uma reduo de escala e um aumento de certezas; mas sim a articulao a partir de uma aco ou projecto que so catalticos e que possuem capacidade executiva. Com esta experincia a gesto e a planificao tradicionais devero tornar-se mais geis; passando-se de um planeamento por reas a um planeamento por problemas. Este facto deve-se ao ressurgimento do protagonismo da deciso de programas e agentes, formas de gesto e contrapartidas, concursos e autores; em oposio ao plano propriamente dito.

O projecto urbano, derivado do nvel estratgico de deciso pega numa parte da cidade (prevista ou no no plano) qual atribui um programa de execuo quase sempre resultante de uma negociao prvia com alguma, mas no todas as entidades promotoras, sejam pblicas, privadas ou mistas. ( uno Portas)

Estes agentes catalticos, os projectos urbanos que Nuno Portas refere no seu texto, tendem a implantar-se nas reas degradadas, transformando-as; e enfatizando de novo a forma urbana, atravs da composio e do desenho. Tambm a integrao de funes distintas, a dotao de infra-estruturas so intenes destes projectos especiais e permitem o desenho da forma da cidade, superando a dicotomia Plano/projecto instalada pelo movimento moderno com a sua planificao restritiva de zoning. A sucesso destes projectos especiais, pode, por outro lado, no ser benfica, pois a sua construo abusiva, no dependente de uma forma urbana pr-existente e estruturante transforma o tecido urbano numa manta de retalhos, no se devendo optar por uma ideia de contrapeso, mas sim por uma de equilbrio. A colocao dos projectos urbanos deve tambm procurar promover a maior rea de afectao para o efeito inovador ou renovador que preconiza.

As cidades devero convencer, mais do que os seus cidados, os promotores externos que apresentam excelentes oportunidades. (Joan Busquets, 1999).

Muito importante na realizao de projectos urbanos a conceito de marketing que lhes est inerente. Esta ideia funciona durante a fase de atraco da oportunidade, assim 37

como no tempo em que esta se concretiza, promovendo a imagem da cidade que a recebe, sendo um complemento eficaz na atraco de outras oportunidades, reforando assim o efeito cataltico do prprio projecto urbano na cidade e na regio que o recebe. No entanto este marketing no se deve transformar em propaganda, nem estes projectos urbanos, quando irrelevantes ou parciais, em geniais. Torna-se evidente o peso dos mass media no novo urbanismo, assim como na competitividade das cidades, que se digladiam pelo ttulo de cidade exemplar.

Qualidade vs Quantidade

Subsiste a ideia de que riqueza e qualidade de vida esto ligadas entre si, apesar de que quando se fala de questes ambientais haver a tendncia em separ-las. De forma a resolver esta aparente dicotomia deve-se apostar num desenvolvimento que seja qualitativo e no quantitativo, apostando-se num crescimento a longo prazo e no num enriquecimento a curto prazo. Este desenvolvimento deve apostar na procura de dotar as urbanizaes de infra estruturas bsicas, de melhorar a qualidade da gua para consumo, na gesto de recursos, e tambm promover o uso misto de reas urbanas (de forma a favorecer a coexistncia entre actividades mltiplas), proteger e valorizar a identidade das cidades, orientar o desenvolvimento das cidades, etc Todas estas medidas, constituem objectivos do planeamento urbano tradicional, na procura de uma melhoria de qualidade vida; havendo que conjugar esta mesma qualidade de vida com a criatividade preteritamente referida e com a competitividade inerente ao mundo empresarial. A cidade deve procurar assegurar a sua auto-suficincia atravs da utilizao de recursos reproduzveis, valorizando a sua forma urbana e ecolgica, assim como a sua capacidade produtiva e econmica e promovendo a sua sustentabilidade a longo prazo. uma situao que poder ser resolvida dependendo da forma como a quantidade regular a qualidade.

Caso de estudo - Bilbao

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O Case Study de Bilbao foi escolhido por apresentar um Plano Estratgico relativamente recente que pretende formar uma rea metropolitana, dotando assim Bilbao de uma centralidade at ento desconhecida ( excepo da histrica centralidade industrial), de forma a tornar a cidade mais competitiva, atraindo novas oportunidades; acabando, pelo contrario por olvidar o factor inovao, opondo a este a imagem de marca (que j sobejamente conhecida), criando at um certo efeito Bilbao. O que se pretende para o Bilbao futuro um projecto antes de mais scio-econmico, ou seja um futuro onde se estabeleam novas relaes de produo e sociais, alm de uma nova organizao territorial que passa assumir um mbito metropolitano. Estas novas relaes constituem, para Bilbao, uma resposta ao processo de desindustrializao actual. O Plano Estratgico de Bilbao preconiza uma relao explcita entre modelo social e modelo territorial, apostando na capacidade destes dois modelos em gerar qualidade de vida e recursos humanos qualificados; de forma a conseguir estimular o desenvolvimento de servios de produo avanados. A nova organizao social pretendida uma sociedade sem conflitos nem classes, podendo todos aceder de uma forma democrtica a todos as experincias e qualidade de vida a gerar. De forma a evitar a o aparecimento de elementos dissonantes, o plano estratgico estabelece deveres e atenes a ter, por todos (desde o cidado comum ao governo local e metropolitano); uma espcie de plano de aco social de forma a atenuar os efeitos negativos que podero decorrer da aplicao do mesmo Plano. O que se pretende uma qualidade de vida alta, atravs de um ambiente urbano atraente e competitivo, que no se reflicta em dfice de produtividade, e logo falta de capacidade de atraco de oportunidades novas. No entanto, o Plano Estratgico de Bilbao apresenta algumas contradies. De facto, o principal instrumento de aplicao do plano o Plano Territorial Parcial, que no consegue trazer nada de novo estratgia, dando-lhe somente forma. O Plano Territorial Parcial preocupa-se mais em definir os espaos em espera e sustentar futuras propostas arquitectnicas que concretizem projectos urbanos, do que propriamente a estruturar a globalidade da rea metropolitana; parecendo tambm mais preocupado com o favorecimento especulativo dos prprios terrenos do que a definio de pontos de interveno estratgica de maneira a maximizar o efeito cataltico e dinamizador dos ditos projectos urbanos.

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Fig. 7 e 8 Desenvolvimento da imagem de marca de Bilbao, projecto para Torre Iberdrola A inteno do Plano Estratgico, concretizado ento nos Planos Territoriais Parciais, parece ser mais de uma ndole mais de conformao de uma imagem urbana, que insira Bilbao num roteiro de cidades a visitar; funcionando assim como um elemento de marketing favorvel a prpria cidade, dando-lhe uma imagem de marca. Para isso aposta em arquitectos de renome como Ghery, Foster, Calatrava (etc), e no papel meditico, que na actualidade a arquitectura concentra; na renovao da ria, o local que mais actividade industrial concentrava. Esta concretizao parece relegar no entanto um factor essencial na elaborao do Plano Estratgico: a revitalizao scio econmica baseada nos factores produtivos e de inovao como resposta crise industrial que a cidade vive.

Fig. 9 e 10 Desenvolvimento da imagem de marca de Bilbao, Guggenheim (Gehry) e ponte sobre a ria de Bilbao (Calatrava)

Concluso

Devido s condicionantes de um municpio, este no pode funcionar como uma empresa. Os municpios so entidades publicas em que coexistem um nvel politico e outro administrativo, que necessitam de prestar satisfaes os cidados. Possuem tambm um enquadramento legal rigoroso que os obriga a articularem-se com outros nveis de 40

governao e com diversos actores locais, regionais, nacionais ou internacionais. Alm destas condicionantes, a prpria evoluo econmico-social e cultural tambm colocam entraves ao modelo de planeamento tradicional. De forma a se tornarem competitivas, as cidades e regies urbanas devem apostar no financiamento de projectos municipais inovadores (projectos especiais); a simplificao e flexibilizao da legislao que orienta os municpios (de forma a promover a gesto inovadora e original); o estimulo dos cidados para a inovao (atravs da formao, novas prticas de gesto de recursos, em suma o factor criatividade); a facilitao entre as autarquias e actores externos; e a necessidade da conscincia do potencial de inovao de que dispes (gesto de recursos imateriais). Algumas prticas inovadoras podem ser: o envolvimento dos cidados nas instituies locais; o aumento da transparncia dos processos de gesto e administrao municipal; a melhoria da imagem do municpio ou regio urbana; promover o desenvolvimento social, econmico e territorial sustentvel; lutar contra a excluso social atravs da formao dos cidados e apoio cultura; melhorar o funcionamento das organizaes municipais; incentivar e intensificar as relaes com actores externos de modo a atrair oportunidades no previstas e alargar a base de recursos disponveis.

Esquema 5 Oportunidades de inovao, fonte: Pblico A competitividade de uma regio urbana ou cidade no pode ser somente analisada de um ponto de vista econmico, mas sim tendo em conta todos os aspectos da vida

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humana, pois esto inter relacionados, influindo simbioticamente uns nos outros, de forma a criar ou no atractividade. O planeamento , assim, a forma disponvel de garantir os interesses colectivos em stios onde o mercado por si s no o consegue; deixando em aberto o que no pode ser previsto, mas estruturando-o numa lgica de oportunidades no previstas que reforam o coeficiente de atractividade das regies urbanas e a possibilidade de desenvolvimento.

EVE TOS

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As oportunidades no previstas podem surgir com a organizao de eventos internacionais. Estes eventos so sujeitos a candidatura e a sua realizao num determinado stio decidida por entidades externas, as mesmas que os promovem e os supervisionam, podendo ter um mbito desportivo, social ou cultural. So oportunidades condicionadas por prazos de actuao claramente definidos e firmes. Os eventos internacionais podem permitir um desenvolvimento e um crescimento exponencial e uma visibilidade nunca antes vivida nas cidades, o que no significa que, necessariamente, os eventos so sempre uma boa oportunidade para o desenvolvimento da cidade.

Barcelona Jogos Olmpicos 1992

Fig. 11 Parque olmpico de Montjuic, Barcelona (1992), fonte: GoogleEarth Em Barcelona recorreu-se a uma metodologia de planeamento que permitisse definir um conjunto de vectores essenciais de desenvolvimento da cidade, numa fase muito rica em que, por um lado, se consolidava o processo de recuperao da crise econmica e, por outro, se iniciava o processo de integrao na Europa, e as cidades despontavam para um novo papel na economia internacional. O aproveitamento destes factores como plataforma de lanamento da cidade, a par da dinmica induzida pela realizao do 43

Jogos Olmpicos em 1992, constitua motivo bastante para mobilizar os diversos actores sociais, econmicos, culturais e institucionais para a antecipao das estratgias mais ajustadas. A elaborao do Plano Estratgico de Barcelona assentou em mecanismos de cooperao entre agentes pblicos e privados, no pressuposto de que a participao alargada dos agentes da cidade uma condio chave no incio de forma a garantir uma maximizao da concertao de esforos na fase de concretizao.

Quando a cidade de Barcelona percebeu a possibilidade de se candidatar para os Jogos Olmpicos de 1992, a administrao local perspectivou a ocasio perfeita para acabar algumas transformaes na cidade. De forma a cumprir este objectivo foram decididos trs critrios fundamentais. Em primeiro lugar era necessrio colocar as quatro reas olmpicas principais no interior da cidade, em pontos estratgicos, ou seja, na fronteira entre a cidade consolidada e aquelas reas urbanas que ainda no se encontravam bem definidas, numa lgica de agentes catalticos que regenerassem o ambiente envolvente. Em segundo lugar, utilizar para estas reas critrios de projecto urbano feito por autores solventes e responsveis. Em ltimo lugar, criar edifcios passveis de utilizao aps o trmino dos Jogos olmpicos, que poderiam agir como elementos fundamentais na transformao da cidade. As quatro reas de interveno eram: a Vall dHebron, a extremidade da Diagonal, o monte de Montjuic e uma parte da antiga rea industrial de Poblenou. Estas quatro reas eram ligadas entre si por quatro itinerrios principais que conformavam um quadrado no mapa da cidade. Estes eram caracterizados pela sucesso de intervenes estratgicas que garantiam o sucesso da regenerao de tecidos proposta. Entre a Diagonal e Montjuic fica a estao de Sants, que cria um ponto comercial entre os dois pontos. Entre Montjuic e a Cidade Olmpica de Poblenou foi projectada toda a requalificao da frente martima de Barcelona. Entre a Cidade Olmpica e Vall dHebron comeava a ser potenciado um sector volta da Plaza de les Glories, que Cerda j tinha proposto como grande centro metropolitano. Estes quatro itinerrios renovaram importantes sectores da cidade, contribuindo para resolver alguns problemas pontuais.

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A construo de uma rede viria que ligava a cidade consolidada com as reas menos definidas da mesma e consequentemente com as reas de interveno; sendo uma tentativa de conseguir uma integrao ptima entre a malha urbana e as ruas. Esta rede, as Rondes, apresentam o mesmo conceito das boulevards. No entanto, a operao mais significativa e imponente ao nvel de traado foi a requalificao da frente martima.

Fig. 12 Frente martima de Barcelona ps Olimpadas, fonte: Google Earth

Este tipo de operao tpico da Urbanstica do sculo vinte. De facto, muitas cidades adoptaram esta metodologia de maneira a renovar a utilizao de uma zona que frequentemente se tornou degradada e sem actividade. A maioria dos usos desta parte da cidade derivam das funes da antiga cidade industrial, ou seja, linhas de comboios, implantaes industriais do sculo dezanove, reas antigas de portos mercantis, instalaes militares de defesa da costa, bairros residenciais ou bidon-villes abusivas. Os antigos usos foram perdendo vitalidade e na actualidade a demanda de actividades colectivas e espaos de lazer requereu um espao, que para alm de se situar junto ao mar, tambm fica inusitadamente perto do centro histrico. A ocupao deste solo tem um carcter de ampliao do centro histrico em si, permitindo tambm o completar de um programa de equilbrio social e econmico. O novo porto olmpico inclui muitos espaos e actividades integradas na vida da cidade, com um novo bairro, lojas, escritrios, hotis, igrejas, escolas e uma grande estrutura universitria situada numa antiga caserna universitria. As grandes barreiras foram destrudas, duas linhas ferrovirias foram eliminadas, os grandes esgotos foram desviados pelos novos depuradores. Antes dos Jogos Olmpicos

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havia um quilmetro de praia, hoje existem 4,2 km. Esta requalificao foi sucessivamente continuada com novos projectos para Noroeste.

Barcelona frum 2004

Fig. 13, 14 e15 rea de interveno do Frum 2004

Doze anos depois do sucesso das olimpadas de 1992, Barcelona teve de novo a oportunidade de realizar um evento internacional. Barcelona tentou a candidatura a capital europeia da cultura e realizao de uma Exposio Internacional. Tentava-se agora terminar o processo de renovao iniciado com os Jogos Olmpicos atravs da juno de recursos necessria organizao de um grande evento. Aps a falha nas candidaturas supracitadas, a cmara municipal de Barcelona conseguiu a nomeao para a organizao do Frum Universal das Culturas de 2004. Esta organizao constitua-se numa srie de ventos, conferencias, espectculos, exposies (com temticas como paz, diversidade cultural e sustentabilidade). A estimativa do nmero de visitantes rondava os 4milhes de pessoas. Para a realizao deste evento foi escolhido um local especfico, que fica na zona oeste da cidade, no fim da Diagonal. Era uma rea muito vasta, degradada social, fsica e ambientalmente. O projecto desenvolvido em 2004 consistiu no prolongamento da Diagonal at ao mar e o desenvolvimento da frente martima olmpica; desenhando uma rea estratgica dotada de grandes potencialidades de desenvolvimento. A cidade delegou ao grupo Hines a operao Diagonal Mar, que consistiu na realizao de um projecto de torres, de um centro comercial e na privatizao de um parque urbano. 46

Simultaneamente, na zona do Frum 2004, so elaborados planos com base na coexistncia heterognea de equipamentos pblicos e privados. Os contedos destes planos so definidos posteriori por projectos de arquitectura e a sua realizao oferecida a operadores privados, sem haver uma estratgia geral que defina as condies e os equilbrios da relao entre os mesmos e a envolvente. A conexo com o tecido urbano envolvente no foi aprofundada, e o desenho espacial desligado e incoerente com as suas prprias componentes devido sua dimenso de dezasseis hectares.

Concluso Barcelona: duas intervenes distintas

Parece claro que o projecto Olmpico de Barcelona resultado de uma situao particular, com um forte governo local, uma grande coeso social, uma interveno pblica que conseguiu definir um processo de planeamento a longo prazo, com a criao de novos servios e infra estruturas, integradas pelo tecido urbano e a transformao de espaos pblicos. O resultado deste processo foi uma profunda transformao do centro histrico, da cidade consolidada e de algumas reas dispersas.Este modelo desapareceu com o fim das Olimpadas. Actualmente a cidade est mais fragmentada, com uma maior presena de capital privado a servir de motor para as intervenes e transformaes urbanas. Actualmente a arquitectura prevalece sobre o urbanismo. O enfoque principal deixou de ser o aspecto social local, mas sim o turista. Barcelona, semelhana de Bilbao, tornou-se numa cidade de turismo internacional. Neste aspecto, o Frum 2004 constitui-se com a concluso natural de um processo. Os contedos conceptuais tornaram-se indefinidos e fragmentrios de um ponto de vista urbanstico. Este facto deve-se inexistncia de um plano global que aborde a questo da cidade metropolitana e, tambm, ao predominio dos investimentos privados. Os trabalhos urbanos feitos nos ltimos dez anos so elaborados a partir do pressuposto produto urbano, onde o negcio parece sair vencedor sobre um desenho unitrio da cidade. Tudo isto confirmado pela prevalncia de um parque temtico sobre a construo de uma cidade polivalente. 47

O grande projecto de 2004 surge como um paradigma destas ambiguidades.

ELEME TOS

ESTRUTURA TES

E

DEPE DE TES

DE

OPORTU IDADES Exemplos ConcretizadosA transversalidade de escalas aparece de forma recorrente como um factor necessrio no planeamento adaptado cidade contempornea.

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A interveno na cidade abrange desde a escala territorial at a escala do mobilirio urbano. Mas, no s em termos de interveno, mas tambm em termos de repercusso: uma interveno pontual, de lugar, numa parte da cidade pode ter consequncias escala de toda a cidade, e elementos estruturantes escala territorial podem ser fulcrais no planeamento de uma interveno pontual. A dicotomia em anlise, elementos estruturais/elementos dependentes das

oportunidades, tambm actuam em diferentes escalas do territrio. Para o exemplificar, demonstra-se a estruturao de escalas que prope Antonio Font, lugar, cidade e territrio (Font, 2003) e analisa-se a operatividade dos nossos conceitos como leitmotiv em trs projectos de actuao na cidade, nessas diferentes escalas. Isso no significa que a interveno s tenha em conta a tal escala. Verifica-se que a interaco nas diferentes escalas tem consequncias no projecto, seja qual for a sua escala.

A escala do lugar

Na escala do lugar, analisa-se o projecto para o parque do Poblenou, em Barcelona, de Manuel Ruisnchez e Xavier Vendrell, de 1989. O projecto surgiu no mbito das Olimpadas em Barcelona, como parte da estratgia da construo de equipamentos olmpicos e espaos colectivos. Como j se referiu, a oportunidade criada pelo grande evento foi usada para construir um conjunto de espaos pblicos, e regenerar parte da cidade numa estratgia global de reestruturao. Assim, no parque do Poblenou situam-se as instalaes para a competio de Badmington e para o treino do atletismo. Mas, a origem do parque do Poblenou est ligado a outra das situaes paradigmticas das oportunidades criadas na cidade contempornea, a reutilizao de reas industriais obsoletas e a sua transformao em espao colectivo. O parque do Poblenou desempenha uma funo importante a nvel urbano, a articulao entre os diferentes tecidos que se encontram nesse ponto: o bairro do sculo XIX do Poblenou, o novo traado da Vila Olmpico, arrancado desde Barceloneta, e o parque da Mar Bella, desde a foz do Bess. Alm disso, tambm concorre l um elemento estruturante importante escala territorial, a Ronda Litoral, umas das vias de cintura da rea metropolitana. Assim, comprova-se como elementos de escalas maiores tem repercusso na escala do lugar. 49

O projecto usa como ponto de partida da ordenao paisagista do parque os traos da antiga zona industrial, tal como recomenda Panerai para configurar o novo traado, ou no sentido do palimpsesto do Andr Corboz.

A transio entre o bairro do Poblenou e a praia, a continuidade entre o passeio martimo da Vila Olmpica e o passeio da Mar Bella, a paisagem prpria das zonas anlogas do litoral (praias, dunas, pinheiros), a vegetao e a recuperao da antiga extenso das vias do comboio, a lembrana industrial do comboio e do barco so os termos que esto na origem do projecto. (Ruisanchez e Vendrell, 1989)

Fig. 16 Projecto de Poblenou, Barcelona

O projecto tem em conta o momento da oportunidade desde a ideia do projecto. Os equipamentos olmpicos que se articulam no parque, o Pavilho desportivo de competio de Badmington e as pistas de treino de Atletismo, para se converter em equipamentos para o bairro depois das Olimpadas. O pavilho alberga na actualidade os equipamentos desportivos para o bairro, o arquivo histrico e a biblioteca pblica do Poblenou, tudo integrado no interior do parque para o bairro.

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Fig. 17 e 18 rea de Poblenou A escala da cidade

escala da cidade falar-se- do projecto de Rem Koolhas para a cidade nova de MelunSnart, no sul de Paris, em 1987. Lille uma interveno clssica que tenta de minimizar o caos, enquanto que em Melun-Snart o nosso objectivo foi usa-lo. (Rem Koolhas, 1996)

Fig. 19 Implantao de Melun-Snart Ainda que sejam actores muito diferentes, se se usar a palavra incerteza em vez de caos, pode-se reconhecer a teoria de Nuno Portas. O autor afirma que no se pode controlar ou prever o desenvolvimento urbano, o tecido construdo. Os actores e os tempos so desconhecidos no momento do concurso urbanstico portanto, o autor prefere no prefigurar ou condicionar este

desenvolvimento, mas pr a fora semntica do projecto, a forma urbana, nos espaos livres, onde ainda existe certeza para o desenhar.

A estratgia do projecto consiste na gerao dum sistema apto para ser desenvolvido, mais que na determinao de resultados formais. Os objectivos da proposta centraramse na acessibilidade de servios urbanos e na preservao de determinadas qualidades estticas do lugar. Uma primeira distino, entre projecto urbano e projecto de desenvolvimento, serve para definir as reas de controle e de indeterminao. A contestao explcita de qualquer ideologia urbana como determinante do plano, implica a aceitao da impossibilidade de exercer uma determinao absoluta sobre a materializao da cidade. (Rem Koolhas, 1996) 51

Fig. 21 e 22 As As Bandas explcito da dicotomia de elementos Fig. 19 e 20 Interbandas Melun-Snart O projecto para Melun-Snart faz um uso de melun-Snart estruturantes/elementos dependentes da oportunidade, caracterizados aqui como os vazios e as isolas. Os vazios articulam-se em bandas associadas a velocidades e usos estruturais diferentes que se sobrepem: a banda das ligaes, a banda dos percursos, a banda dos programas, a banda da paisagem, a banda dos vazios e a banda dos limites. Estas bandas, como os traados para Panerai, articulam o conjunto dos espaos livres e do a coeso necessria para uma leitura holstica do projecto, e ao mesmo tempo permitem um alto grau de liberdade para os espaos entre as bandas, as ilhas, que vo permitir programas diferentes dependendo do seu tamanho, forma, localizao e relao com a envolvente.

A escala do territrio 52

A interveno do IBA Emscher Park situa-se em Renania no Norte-Westfalia e compreende 17 cidades e uma rea de 800 km2. uma regio extraordinariamente densa, onde os agrupamentos urbanos tocam-se e confundem-se, formando um tecido urbano fragmentado e difuso, pouco ordenado e extenso. As reas no construdas ocupam uns 320 km2 dos 800 totais. Estes espaos abertos no so vazios, esto ocupados tanto por auto-estradas, estradas e linhas de comboio, como por canais de guas residuais, terrenos industriais e mineiros em desuso, caracterizados por um alto nvel de contaminao. Esta rea responde com bastante preciso ao modelo de cidade difusa proposto por Indovina. No uma rea metropolitana marcada por um centro, nem uma difuso originada pela centrifugao de populao e actividades para a periferia, mas uma malha formada por diferentes pontos nodais enlaados numa rede hierarquicamente horizontal. possvel acrescentar a estes factores uma tendncia crescente para a deslocao da populao desde as reas urbanas para as reas menos ocupadas, devido a vantagens comparativas economicamente.

A criao de novas oportunidades: a regenerao de reas industriais obsoletas.

Fig. 23 e 24 Reutilizao de espaos industriais no Emsher Park

A economia da regio do Ruhr baseava-se na indstria pesada e na mineira, nomeadamente na metalurgia (as conhecidas industrias Krupp) e na extraco de carvo. A zona era um dos motores da economia produtiva alem. Mas na dcada de 1970 as 53

mudanas econmicas a nvel global fizeram com que o sector descesse drasticamente de competitividade, provocando o encerramento de minas e fbricas metalrgicas, com as consequncias sociais de aumento do desemprego, dos conflitos sociais e o decrscimo da populao, alm do inevitvel declnio dos ambientes urbanos e o surgimento de numerosas e desoladoras reas em desuso. A esta nova e negativa situao social e econmica acrescentam-se os problemas ambientais, consequncia da actividade mineira do carvo a cu aberto, aumentando a poluio provocada pela indstria metalrgica e o uso do rio para evacuar as guas residuais da indstria e das reas urbanas.

Perante esta situao surge a oportunidade do IBA ( Internationalle Bauaustellung) Emscher Park a partir de 1989, com durao pr-estabelecida e encerramento fixo marcado em 1999. Os IBA so exposies da construo e a residncia j clssicos na Alemanha, dos quais formam parte mostras to conhecidas como Weissenhofsiedlung, Stuttgart 1927, Hansviertel, Berlim 1957, IBA Berlim, 1987). Mas IBA Emscher Park no se trata propriamente de uma Exposio no verdadeiro sentido do termo, mas sim, de uma programao de actividades, unindo diversos organismos (administraes locais, empresas industriais, ONGs, grupos de presso, e a populao em geral), cujo objectivo maior o de impulsionar novas ideias e projectos, adoptando nisto um papel instigador. Os seus objectivos especficos prendem-se s reas de desenvolvimento urbano, social, cultural e ecolgico, considerados como sectores bsicos para impulsionar e direccionar as mudanas numa antiga regio industrial em processo de transformao. O projecto existe para assistir a esse processo: ao empregar uma exposio da construo como instrumento prtico, o IBA transforma essa exposio numa central de discusses polticas e profissionais, voltada especificamente ao debate do

desenvolvimento da regio. A estruturao da paisagem

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Fig. 25 Amplitude territorial do Emsher Park Consequentemente, com a condio difusa da zona, a actuao do IBA Emscher Park prope uma reestruturao do territrio, baseada na organizao dos espaos livres, aproveitando a linha do rio Emscher. A estratgia do espao colectivo deveria implicar uma nfase nos ns de centralidade, nos eixos e na construo da paisagem ( uno Portas, 1996). E neste caso, marcadamente com a sua dimenso eco-paisagista. Assim, o elemento fulcral do projecto o Emscher Landschaftpark, isto , o parque paisagstico do rio Emscher. Trata-se de um parque que simboliza, ao mesmo tempo que envolve, a transformao urbanstica e a recuperao ecolgica do rio Emscher. Os espaos abertos entre as reas urbanas, no meio de indstrias e minas abandonadas, formam a base estruturante deste parque. O seu mbito de actuao compreende novos conjuntos de edifcios habitacionais ou de trabalho e reas de recreio. Alm da recuperao ambiental, cuidouse da conservao do patrimnio histrico e cultural desta envolvente industrial como parte integrante da paisagem. Os terrenos industriais abandonados proporcionavam a oportunidade de introduzir os corredores verdes a escala territorial at os centros urbanos. Um objectivo importante era, ligar os espaos abertos fragmentados e superar obstculos, para desta forma tecer a paisagem afectada e poder ler o territrio como um todo, ainda que formado por fragmentos diferenciados e separados. ovas oportunidades para o territrio.

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O sistema de parques interligados permite articular directa entre as estratgias escala territorial e as intervenes locais. O IBA Emscher Park formado por mais de 120 projectos a diversos nveis e escalas de actuao: desenvolvimento do sistema de parques entre as reas urbanas, ordenando o crescimento difuso (a escala do territrio); projectos urbansticos que promovem cidades compactas mas tambm periferias complexas (e escala urbana) e projectos modelo de novos centros tecnolgicos e empresariais a partir da criao de empresas relacionadas com a industria sustentvel e as tecnologias limpas, com o objectivo de servir de catalizador para a regenerao econmica da regio com base num novo tecido industrial (e escala do lugar). A reabilitao das antigas zonas realiza-se com a inteno tanto de manter o esprito do lugar, como para gerar um atractivo potencialmente catalizador. Criam-se rotas tursticas especialmente desenhadas e sinalizadas, que valorizam a esttica dos marcos regionais e ajudam a criar uma imagem de marca para o Ruhrgebiet, as rotas Industrie-natur e Industrie-kultur. Entretanto, os projectos so executados atravs de contratos autnomos, ou, realizados ainda, por pelas administraes locais, por de empresas iniciativas

independentes,

organismos

promotores

desenvolvimentistas.

CO CLUSOExistem inmeras formas de construir o urbano, no havendo, no entanto uma frmula exacta universal que permita o sucesso em todos os casos. O falhano do que conhecemos como cidades um falhano da intelectualidade por no ter sabido v-las como um sistema vivo. A dicotomia entre elementos estruturantes e elementos dependentes de oportunidades parece ser uma metodologia que ajuda a aumentar a probabilidade de xito na construo da cidade.

evidentemente necessrio ter cuidado com as formas mgicas necessrio confrontar as memrias de fazer cidade com o contecto actual das intervenes a desenhar. Porque uma coisa retomar a quadricula como malha formal numa interveno arquitectnica projectada de uma vez e a realizar de jacto (isto , anulado

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o factor tempo e no deixando margem a outros agentes para intervirem no processo que, practicamente, no existe) e outra ser tirar alio de uma forma de determinao da cidade predominantemente estratgica e aberta a mltiplas intervenes ao longo do tempo () ( uno Portas, 1980)

A importncia dos elementos estruturantes das cidades no se encontra na edificao que a compe, mas sim na qualidade do espao colectivo e urbanstico que a comporta, e a flexibilidade deste que lana o futuro do urbano atravs da articulao com eventos e espaos que ainda esto por acontecer ou utilizar. a sua persistncia que permite a definio do conceito de lugar, assim como da identidade do mesmo e a capacidade de criar afectividade com todos aqueles que o usam. esta capacidade de atraco e manuteno de atractividade que o espao colectivo prope numa cidade e que, posteriormente, cria factores de competitividade na mesma. A sua correcta estruturao permite, com o apoio poltico e social necessrio, desenvolver os aspectos econmico, social e cultural que potenciam a centralidade de uma cidade. Com a centralidade, e a capacidade de se projectar perante os seus pares, as cidades ganham presena no panorama regional, nacional e por vezes internacional. Desta forma, o seu raio de afectao passa a uma esfera completamente diferente, podendo assumir responsabilidades de organizao de eventos, exponenciando ainda mais a sua imagem. No entanto, assiste-se muitas vezes a uma desvirtuao deste processo, sendo que o nico factor de atractividade considerado a imagem de marca, relegando os factores de produtividade e consequentemente todo o sistema humano local para segundo plano.

Em suma, no h teoria geral que nos sossegue. A acupunctura urbana , pois, incontornvel mas s tem xito se no momento de pr as agulhas no territrio soubermos o que isso significa em probabilidades de sinergias e efeitos catalticos ou de metasteses, se nos enganarmos! ( uno Portas, 2001)

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BIBLIOGRAFIABUSQUETS, Joan (1999). Villaggi e metropoli . Lotu