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26 26 26 26 261 AGOSTO 2014 O Bandeirante Publicação mensal da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - Regional S.Paulo O matador de vaga-lumes “Uma aragem de um vulto rondando a casa? Insuspeitado soluço? A garrafinha no chão de lajotas da varanda, os vaga-lumes todos mortos, trocados por lágrimas, afogados em meio litro de cerveja derramada pelo gargalo e sacudida de propósito por um tio que morava ao lado, voltando de suas noitadas etílicas, transbordando de maldade, instilado de peçonha.” SÉRGIO PERAZZO p.3 “No dia seguinte, levantou com olheiras e um profundo mau humor. E agora? Iria procurar a moça ou esperaria que ela o fizesse? Que dúvida... Logo depois do café foi espiar a sacada. Estava vazia. Sentiu um “nó” na garganta. Entrou e foi direto para o seu quarto. Tentou ler, mas não conseguiu.” RODOLPHO CIVILE p.6 E o vento levou... Caminho para a Penha “No relógio da igreja são quase cinco horas, o ônibus está tão devagar que talvez eu perca a prova, tomara. Na escadaria dois mendigos nem se dão ao luxo de pedir esmolas, já devem ter jantado cedo, não têm que trabalhar, entregar o serviço, fazer provas, tomar banho. De novo bate aquela inveja, mas deitar no chão duro não deve ser agradável, prefiro contar vantagens naquele boteco lá de trás.” ROBERTO ANTONIO ANICHE p. 5 Visite nosso BLOG: http://sobramespaulista.blogspot.com.br DESCONSTRUÇÃO Hildette Rangel 4 CABANAGEM Carlos Galvão 6 PENSAMENTOS José Leopoldo 4 SUBLIME AMOR Ligia Pezzuto 4

"O Bandeirante" - nº 261 - agosto 2014

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Page 1: "O Bandeirante" - nº 261 - agosto 2014

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2014O Bandeirante

Publicação mensal da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - Regional S.Paulo

O matador de vaga-lumes“Uma aragem de um vulto rondando a casa? Insuspeitado

soluço? A garrafinha no chão de lajotas da varanda, osvaga-lumes todos mortos, trocados por lágrimas,

afogados em meio litro de cerveja derramada pelogargalo e sacudida de propósito por um tio que morava

ao lado, voltando de suas noitadas etílicas,transbordando de maldade, instilado de peçonha.”

SÉRGIO PERAZZO p.3

“No dia seguinte, levantou com olheiras e um profundomau humor. E agora? Iria procurar a moça ou esperaria

que ela o fizesse? Que dúvida... Logo depois do café foiespiar a sacada. Estava vazia. Sentiu um “nó” nagarganta. Entrou e foi direto para o seu quarto.

Tentou ler, mas não conseguiu.”

RODOLPHO CIVILE p.6

E o vento levou...

Caminho para a Penha“No relógio da igreja são quase cinco horas, o ônibus está tãodevagar que talvez eu perca a prova, tomara. Na escadaria doismendigos nem se dão ao luxo de pedir esmolas, já devem terjantado cedo, não têm que trabalhar, entregar o serviço, fazerprovas, tomar banho. De novo bate aquela inveja, mas deitarno chão duro não deve ser agradável, prefiro contar vantagensnaquele boteco lá de trás.”

ROBERTO ANTONIO ANICHE p. 5

Visite nosso BLOG: http://sobramespaulista.blogspot.com.br

DESCONSTRUÇÃOHildette Rangel

4

CABANAGEMCarlos Galvão

6

PENSAMENTOSJosé Leopoldo

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SUBLIME AMORLigia Pezzuto

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2 O Bandeirante - Agosto 2014

Jornal O BandeiranteANO XXIV - nº. 261Agosto 2014

Publicação mensal da SociedadeBrasileira de Médicos Escritores -Regional do Estado de São Paulo SOBRAMES-SP. Sede:Avenida Brigadeiro Luís Antônio, 278 - 7º. Andar - Sala 1 (Prédioda Associação Paulista de Medicin a) - São Paulo - SPEditores: Josyanne Rita de Arruda Franco e Marcos GimenesSalun (MTb 20.405-SP)Jornalista Responsável e Revisora: Ligia Terezinha Pezzuto(MTb 17.671-SP).Redação e Correspondência: Rua Francisco PereiraCoutinho, 290, ap. 121 A – V. Municipal – CEP 13201-100 –Jundiaí – SP E-mail: [email protected].: (11) 4521-6484 Celular (11) 99937-6342.

Colaboradores desta edição: (Textos literários): CarlosAugusto Ferreira Galvão, Hildette Rangel Enger, LigiaTerezinha Pezzuto, José Leopoldo Lopes de Oliveira Sobrinho,Roberto Antonio Aniche, Rodolpho Civile e Sérgio Perazzo.(Fatos & Olhares): Márcia Etelli Coelho.

Tiragem desta edição: 300 exemplares (papel) e mais de1.000 exemplares PDF enviados por e-mail.

Diretoria - Gestão 2013/2014 - Presidente: Josyanne Ritade Arruda Franco. Vice-Presidente: Carlos Augusto FerreiraGalvão. Primeiro-Secretário: Márcia Etelli Coelho. Segundo-Secretário: Maria do Céu Coutinho Louzã. Primeiro-Tesoureiro: José Alberto Vieira. Segundo-Tesoureiro: AidaLúcia Pullin Dal Sasso Begliomini. Conselho FiscalEfetivos:Hélio Begliomini, Luiz Jorge Ferreira e MarcosGimenes Salun. Conselho Fiscal Suplentes: José Jucovsky,Rodolpho Civile e José Rodrigues Louzã..Matérias assinadas são de responsabilidade de seusautores e não representam, necessariamente, a opiniãoda Sobrames-SP

Editores de O BandeiranteFlerts Nebó - novembro a dezembro de 1992Flerts Nebó e Walter Whitton Harris - 1993-1994Carlos Luis Campana e Hélio Celso Ferraz Najar - 1995-1996Flerts Nebó e Walter Whitton Harris - 1996-2000Flerts Nebó e Marcos Gimenes Salun - 2001 a abril de 2009Helio Begliomini - maio a dezembro de 2009Roberto A.Aniche e Carlos Augusto F. Galvão - 2010Josyanne R.A.Franco e Carlos Augusto F.Galvão - 2011-2012Josyanne R.A.Franco e Marcos Gimenes Salun - 2013-2014

Presidentes da Sobrames-SP1º. Flerts Nebó (1988-1990)2º. Flerts Nebó (1990-1992)3º. Helio Begliomini (1992-1994)4º. Carlos Luiz Campana (1994-1996)5º. Paulo Adolpho Leierer (1996-1998)6º. Walter Whitton Harris (1999-2000)7º. Carlos Augusto Ferreira Galvão (2001-2002)8º. Luiz Giovani (2003-2004)9º. Karin Schmidt Rodrigues Massaro (jan a out de 2005)10º. Flerts Nebó (out/2005 a dez/2006)11º. Helio Begliomini (2007-2008)12º. Helio Begliomini (2009-2010)13º. Josyanne Rita de Arruda Franco (2011-2012)14º. Josyanne Rita de Arruda Franco (2013-2014)

Editores: Josyanne R.A.Franco e Marcos Gimenes SalunRevisão: Ligia Terezinha PezzutoDiagramação: Marcos Gimenes Salun | Rumo EditorialProduções e Edições Ltda. E-mail: [email protected]

Impressão e Acabamento: Expressão e Arte GráficaEditora - São Paulo

Josyanne Rita de Arruda Franco

Médica Pediatra Presidente da Sobrames-SP

As Pizzas Literárias da SOBRAMES-SP acontecemna terceira quinta-feira de cada mês, a partir

das 19h00 na PIZZARIA BONDE PAULISTARua Oscar Freire, 1.597 - Pinheiros - S.Paulo

“A Pizza Literária - décima terceira fornada”

http://coletanea2014.blogspot.com.br/

A edição de 2014 da tradicional coletânea da Sobrames-SP terá 26autores que fazem, desta, mais uma primorosa edição.O lançamento está previsto para 7 de novembro de 2014

VEJA MAIS INFORMAÇÕES DE NOSSACOLETÂNEA 2014 NESTE BLOG

03/08 – Arary da Cruz Tiriba05/08 – Carlos José Benatti15/08 – Carlos Roberto Ferriani18/08 – Vera Lúcia Teixeira26/08 – Josef Tock28/08 – Guaracy Lourenço da Costa

Ficam todos os membros da Sociedade Brasileira de MédicosEscritores, regional do Estado de São Paulo - SOBRAMES-SPconvocados para a Assembleia Geral Ordinária que se realizará nodia 18 de setembro de 2014 na pizzaria “Bonde Paulista” situadana Rua Oscar Freire, 1.597, em São Paulo, às 20h00, em primeiraconvocação, com a presença de cinquenta por cento dos MembrosTitulares, Acadêmicos e Colaboradores quites com a tesourariada sociedade e dos Membros Eméritos, Honorários e Beneméritose, em segunda convocação às 20h30, com qualquer número demembros da SOBRAMES-SP, para deliberar sobre a seguinte pautado dia: 1.Leitura da Ata da última AGO; 2. Apresentação derelatório da Diretoria; 3.Apresentação de balanço e tomada decontas pela Tesouraria; 4. Análise e votação de assuntos geraisinscritos com a antecedência mínima de 5 (cinco) dias; 5. Eleiçãoda nova Diretoria para o Biênio 2015-2016.

Esta convocação obedece ao disposto no Capítulo IV - Assembleias, artigos 10.ºa 13.º, do Estatuto da Sociedade Brassileira de Médicos Escritores - Regionaldo Estado de São Paulo, aprovado em AGE de 13.04.2000 e registrada no 4.ºOficial de Registro de Títulos e Documentos e Civil da Pessoa Jurídica (SP)

sob n.º 405875/2000, averbado no registro primitivo n.º 223988/91

EDITAL DE CONVOCAÇÃO:Assembleia Geral Ordinária

Depois do agito da Copa do Mundo e do período de férias escola-res, a Sobrames-SP aguarda um semestre agitado em aconteci-mentos: eleição da  diretoria para o próximo biênio, preparo deuma delegação paulista robusta para o Congresso Nacional emRecife, Balada Literária com lançamento da Coletânea e posse danova diretoria fechando o agitado ano. Recheando os intervalosentre os eventos, as famosas e alegres Pizzas Literárias mensais,pulsantes e com novos associados colorindo o ambiente acolhedor.Um sucesso permanente que se renova com sua presença. Acom-panhe nosso calendário e participe da vida cultural da Sobrames--SP, uma vivência deveras inesquecível!

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O Bandeirante - Agosto 2014 3

Sérgio Perazzo

O matador de vaga-lumes

Foi-se a memória. Sobe da esquina, emcrescendo, ainda, o som da batucada, prenúnciode carnaval dissolvido na chuva de verão,fragmentada em granizos estilhaçados, cacos,mosaicos de cenas perdidas compondo uma únicafotografia manchada de tempo.

Pedaços de serpentinas enrolados nos pés dasmesas, confetes de véspera ainda entranhados noscabelos. Lantejoulas grudadas nas palmilhas dossapatos pelo suor gasto dos últimos bailes e desfiles.Vestígios de uma folia que passou e que insisteem voltar tardia num samba em tom menor,deslizando nos temporais de março para o bueirodo que foi alegria, do que foi crônica fugaz,conversa à toa ao pé do fogo, na penumbra dasluzes se apagando, dando lugar ao bocejoespreguiçado do amanhecer. O carnaval nem veioe já se foi.

Foi-se a história. Uma luz jobiniana láembaixo se acendeu sem queimar a fotografia,compondo o contraponto do colorido enxadrezadoda espuma do mar com as ondas furta-cor damais intensa paixão.

Eu começo no ponto em que você acaba,reafirmando que a vida é sempre. Para cadamomento existe um fundo musical, um fragmentode uma trilha sonora ainda por compor e gravar.Não acredita? Preste atenção. Escute agora. Dêlugar às pausas. Ao silêncio. Incorpore a clave docompasso binário. Eu e você.

Foi justo neste ponto de calma alvissareiraem que até podia desabar o céu sobre nossascabeças, que o mundo repentinamente escureceu.E lá foi você, não sei se mulher ou menina,destemida no seu temor, embrenhar-se na mataque em nossa imaginação nos rodeava e continha,com o único propósito de caçar vaga-lumes. Umpropósito simples como média e pão commanteiga. O propósito de iluminar com luzinterior, com luz da natureza, todas as lacunas dasinfonia do silêncio que estávamos ouvindo nointervalo da noite.

Sua mão cheia de luzes foi enchendo agarrafinha de plástico com o brilho e as asas dosvaga-lumes. Mesmo sabendo não ser abelhas,forrou o fundo da garrafa com uma película demel para que não morressem de fome. Furou milfurinhos nas paredes de plástico para querespirassem com um mínimo desafogo. Antes dedormir, depositou a lanterna de vaga-lumes, enfimpronta, no parapeito da janela abrindo para avaranda lá fora, dando ao quarto uma luminosidade

suave e faiscante. Feito isso, suavemente meabraçou. Um pisca-pisca que se alternava com asinfonia e as pausas de silêncio de uma cantigade ninar. Adormeceu sorrindo sem nenhuma rugana testa. Sou testemunha ocular.

Acordou de madrugada num sobressalto emtotal escuridão. Em total silêncio. Uma aragemde um vulto rondando a casa? Insuspeitado soluço?A garrafinha no chão de lajotas da varanda, osvaga-lumes todos mortos, trocados por lágrimas,afogados em meio litro de cerveja derramadapelo gargalo e sacudida de propósito por um tioque morava ao lado, voltando de suas noitadasetílicas, transbordando de maldade, instilado depeçonha. Um tio sem trilha sonora, há muitoperdido no escuro. Há muito acorrentado naquelecanto da vida de paredes de concreto, condenadoa uma solitária perpétua sem frestas, donde osvaga-lumes não se acercam nunca, sequer tendoforças para voar livres. Menos ainda, para iluminaro escuro ou, mesmo então, para povoar os sonhosmais fantásticos, mais improváveis e maisintransigentemente esperançados ou desesperadosque um ser humano pode sonhar e viver na luzefêmera e intermitente da cauda nebulosa depirilampos.

Foi-se a mata, derrubada sete vezes, setevezes renascida, sete vezes irrigada. Foram-seos vaga-lumes, migrando para sempre no sentidosudoeste. Nunca mais foram encontrados.Apagaram, no seu plano de voo, o interruptorque acendia a noite. Ficou o nosso amorabençoado, abraçados na escuridão, na fronteirado medo, protegendo-se da sombra do mal, docerefúgio em si mesmo construído, entre pausas dasinfonia do mais sonoro silêncio, das maisemudecidas colcheias no intervalo do compasso.

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4 O Bandeirante - Agosto 2014

Hildette Rangel Enger

Desconstrução

José Leopoldo Lopes Oliveira

Pensamentos de julho

Sublime amorLigia Terezinha Pezzuto

Na mansa manhã de moles ondas,cantos de mel encobrem o mar. Sussurar.

Qual dom na espuma infinitade pranto sem fim feito manto.

A suavizar.

Nuvens calmas no horizonte,fino caminho de alma e amor. A se entregar.

O ninho entranhacompreensão e encanto.

Sublimar.

Tiro os sapatosPara sentir nos pés

A terra que te recebeComo semente...

Depois dispo devagarmeu vestido de noiva

Pesado de poeira do tempoEm que andei contigo

Pelas estradas da vida...

Não mais espiaremos juntosO pôr do sol

Nas tardes de verão...Nem mais veremos

De mãos dadasestrelas nascerem ao anoitecer

Retiro solenementeO véu coloridoQue me cobria os olhosPara poder enxergarA vida sempre em azulComo teus olhos...

De todo um sonhoRestou apenas um vazio

E duas lágrimasEscorrendo pelo rosto...

Nosso noivado acabou

Foi fundamental para o sucesso da copa das copas a atuação firmedo Brasil no aumento do número de gols realizados. Pena que o sentimentode nacionalidade esteja nos pés. E não na cabeça.

Por ironia da história, o Brasil mudou muito de um Vargas a outro;o primeiro, Getúlio de pequeno físico deu a vida por honra, criou aPetrobras; o outro foge ao ouvir-lhe o nome, apesar do físico avantajado.

Desejo impossível: que as mulheres da Índia sejam respeitadas comoas vacas. Seria revolucionário. Basta ler os jornais para vermos a distânciaque estamos de um mínimo de convivência civilizada.

O melhor legado da copa foi alemão, em Santa Cruz Cabrália, ondeserão sempre lembrados com alegria e nem a isso o governo manifestouqualquer agradecimento.

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O Bandeirante - Agosto 2014 5

Caminho para a PenhaRoberto Antonio Aniche

Tarde qualquer de um desses dias úteispreguiçosos que nos fazem, de dentro do ônibusnos sentirmos o office-boy mais sonolento do ano.Avenida Celso Garcia, degradada, mas poderia serqualquer outra, tudo o que eu queria era que oônibus andasse devagar e chegasse na hora de euir embora de novo.

A porta abre e entra uma senhora gorda,guarda-chuvas (mas não chovia), duas criançasatrás, eu apenas olho com o olhar sonolento dequem não tem pressa. Nas mãos tenho um livrode geografia que não quero estudar, mas que teimaem ficar me olhando boquiaberto com letras quese embaralham tentando me convencer de queestou realmente do outro lado do mundo.

Barulho de primeira marcha, devagar ele saido ponto, alguém assovia uma música do RobertoCarlos, alguém cola o radinho de pilha no ouvido ea voz do Hélio Ribeiro escapa falando coisas deamor para minha primeira namorada que não seicom quem se casou. Olho pela janela, pessoasesticadas numa mesa de bar tomando cerveja,conversando qualquer coisa que não ouço. Às vezestenho inveja dessas pessoas que nunca conversamcomigo, que não dividem suas ideias, suas proezas,suas vantagens comigo.

Queria estar sentado lá, sem ter que fazerprova de geografia, falando qualquer coisa sobreamores indecentes e amores que perdi, enchendoa mesa de gols que marquei e gols que defendi.Mas o ônibus não me deixa e dá outro tranco epara, para entrar o carteiro trazendo notícias detodo lugar, cartas de cobrança, cartões deaniversário, mas ele nem me nota com meu livrode geografia. Claro que ninguém me escreveu,ninguém quer saber como ando, o que estoufazendo e se estudei para a prova de geografia.

No relógio da igreja são quase cinco horas,o ônibus está tão devagar que talvez eu perca aprova, tomara. Na escadaria dois mendigos nemse dão ao luxo de pedir esmolas, já devem terjantado cedo, não têm que trabalhar, entregar oserviço, fazer provas, tomar banho. De novo bateaquela inveja, mas deitar no chão duro não deveser agradável, prefiro contar vantagens naqueleboteco lá de trás.

O ônibus para no ponto e a mulher gordadesce com as duas crianças. É assim que a minhaprimeira namorada deve estar, gorda, cheia defilhos e varizes. Não tenho inveja, não fui eu quemdesapareceu naquela tarde que eu fiz questão deesquecer. O ônibus retoma a marcha e as pessoasandam nas calçadas, andam sem ter nomes,uniformes, livros nem horário. A tarde já estáacabando e elas estão indo preguiçosamente parasuas casas.

Que vontade de ser só mais um na multidãoque anda para qualquer lugar sem ter a pretensãode chegar a lugar algum, ser só mais um semnome, sem endereço, sem obrigações de chegarna hora. Não ter ninguém que me espere para eupoder sentar no banco do boteco e tomar acerveja lentamente, sentar na escadaria da igrejasem me preocupar com as horas que o relógiobate, ou com o chão duro; não ter uma mulhergorda com varizes me esperando, não ter quefazer prova de geografia.

Só isso, ter a pretensão de sequer ser umnome numa tarde preguiçosa dentro do ônibuspara a Penha...

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6 O Bandeirante - Agosto 2014

Rodolpho Civile

E o vento levou...

(...)

O drama passa-se na época da guerra de secessão.Abraão Lincoln, assumindo a Presidência, pretendiapromover a extinção da escravatura. A Carolina do Suldeclarou sua separação. Lincoln tentou evitar a guerra,mas não conseguiu. Outros estados sulistas uniram-se àCarolina formando os Estados confederados da América.Abril de 1861: os sulistas iniciam a guerra de secessão(separação) atacando o forte Sumter, comandados pelogeneral Lee. Depois de vários anos de guerra, osnortistas comandados pelos generais Grant e Shermanentram em Richmond, capital dos confederados. Ogeneral Lee rendeu-se a 9 de abril de 1865. Lincoln foiassassinado por um fanático sulista quando assistia auma peça no Teatro Ford, em Washington.

A guerra foi longa e o filme também: três horas emeia. Não houve tempo para diálogo. Glorinha chorouquando Scarlett O’Hara volta à sua fazenda “Tara” e sóencontra a destruição. Jura solenemente que de lá nãosairia mais... Muito comovida, Glorinha pegou a mão deRaimundo que a segurou até o final do filme.

Quando saíram do cinema, já era noite. Voltarampara casa. A despedida foi só: “boa noite”. Não houvepromessa de reencontro. Raimundo ficou amargurado.Saíram juntos só para assistir a um filme? Será que elanão gostou dele? Amor próprio ofendido tentou dormir,mas não conseguiu. Ficou “rolando” na cama.

No dia seguinte, levantou com olheiras e umprofundo mau humor. E agora? Iria procurar a moça ouesperaria que ela o fizesse? Que dúvida... Logo depoisdo café foi espiar a sacada. Estava vazia. Sentiu um “nó”na garganta. Entrou e foi direto para o seu quarto. Tentouler, mas não conseguiu. Abriu a porta do guarda-roupa.Na parte interna do espelho. Com admiração acariciou asnegras madeixas. Olhou o conjunto: altura média,moreno, cabelos ondulados, testa baixa, sobrancelhasbem delineadas. Olhos castanhos muito expressivos. Bocabem feita. Dentes alvos. Sorriso comunicativo irradiavasimpatia. Será que tudo isso não impressionara a moça?Depois dessa autoanálise, adquiriu uma nova força.Precisava conquistar a moça. Foi falta de habilidade? –pensou – Não! Foi o maldito “E o Vento Levou”! Que ideiafoi ter ido vê-lo!

Com determinação, saiu à rua. Por coincidênciaela estava batendo à porta. Olhou o moço e sorridentefez um aceno. Na sua mão, um véu preto, um missal eum rosário.

- Vamos à missa?- À missa? – surpreso Raimundo.- Por quê? Você não costuma ir?- Às vezes... – sorriu.- Não quero forçá-lo!- Não! Não! Está bem! Vou acompanhá-la.Inexplicavelmente o mau humor sumiu. O melhor

remédio é sempre o amor.(...) - (trecho do romance Esperando a Eternidade)

(...)

A revolução dos cabanos procurava uma identidadee havia interrogações inquietantes, como a escravidão,debate afogado em reticências pela Igreja e poucopensada por parte dos cabanos. Naturalmenteestabeleceu-se que os negros que quisessem sair docativeiro deveriam aderir ao exército cabano e conquistaresta liberdade por atos de bravura.

Carlos Augusto Ferreira Galvão

Identidade cabana

Terminar pura e simplesmente com a escravidão?!E fazer o que com os escravos? Muitos deles queriamcontinuar escravos, pois não sabiam ser outra coisa.Alegavam que tinham “sorte” de ser bem alimentados.Aparentemente a cidade não possuía condições culturaisde acabar imediatamente com a escravidão, e graças aDeus tive a sensibilidade de entender isso.

Já ia longe os primeiros dias em que reinou aanarquia, combatida com pulso firme por Angelim. A elite,que prudentemente havia se recolhido dentro das casas,começava a se aventurar pelas ruas em compras epasseios. Até a uma festa compareci com Lissa, e aquelagente se divertia como que meio temerosa. Era de senotar o desaparecimento da antiga ostentação, quandoas madames finas pareciam disputar a posse do maiorbrilhante ou da maior esmeralda. Todos apresentavam--se vestidos com simplicidade e quase não se viam joiasnas mulheres. A cidade estava em paz e começava a tocara vida para frente.

(...) - (trecho do romance A Terra de Tupã)

Page 7: "O Bandeirante" - nº 261 - agosto 2014

O Bandeirante - Agosto 2014 7Livros em destaque

HELIO BEGLIOMINI e MARCOSGIMENES SALUN“Sobrames Paulista - compêndiodos seus vinte anos de história(1998-2008)Rumo Editorial - SPOs autores compilam nessa obra oregistro documental de fatos einformações que marcaram osprimeiros 20 anos da tragetória daRegional Paulista da SOBRAMES.Tendo como base documentos doacervo da entidade, a obra éfartamente ilustrada, constituin-do-se em fonte de consulta einformação primorosa.Aquisições e informações pelo e-mail:

[email protected]

FLERTS NEBÓ“O homem que voltou do passado”Editoras Técnicas Reunidas - SPUm drama de amor e milagre deuma ressurreição, para que não seperca, para gáudio do leitor, otriunfo de Vênus sobre as sangrentastropelias de Marte, é o que o autoroferece em seu romance. Ambienta-do na França, durante a PrimeiraGuerra Mundial, narra a história deMichele e Philipe, dois jovens que seamam e se separam em decorrênciada vida cotidiana, sem, entretanto,deixarem de se amar, provando queo amor puro nunca morre.Aquisições e informações:[email protected]

O trecho abaixo é parte de uma poesia de um dos autores daSOBRAMES-SP, já publicada anteriormente numa de nossas

COLETÂNEAS. Você consegue identificar o autor?Resposta na próxima edição.

Esta agenda está sujeita aalterações em decorrência defatores não previstos quando

de sua elaboração

Endereços e horários

Pizzas Literárias:Pizzaria Bonde Paulista. Rua OscarFreire, 1.597 - a partir de 19h00.

Balada Literária:APM - Espaço Maracá - Av. Brigadei-ro Luís Antônio, 278 - 11.º andar -das 18h30 às 22h00

Reuniões de Diretoria:Sede da SOBRAMES-SP na APM -Av. Brigadeiro Luís Antônio, 278 -7º. andar - Sala 1 - às 19h00

PIZZAS LITERÁRIAS

JAN - 16FEV - 20MAR - 2OABR - 24MAI - 15JUN - 26

JUL - 17AGO - 21SET - 18OUT - 16NOV - 13*DEZ - 18

Realizadas na terceiraquinta-feira de cada mês

*ATENÇÃO Em virtude deferiados, as datas das reuniões

de Abril, Junho e Novembroforam modificadas

CONGRESSO NACIONAL

OUT - 08 a 12 Recife - PE

ELEIÇÕES

JUL - 17 Prazo final para a

inscrição de chapas concorrentes

SET - 18 Eleição

BALADA LITERÁRIA

MAI - 30 NOV - 07

COLETÂNEA 2014

FEV Divulgação das regras einício das adesões de autores

NOV - 07 Lançamento

REUNIÕES DE DIRETORIA

Primeira quinta-feira do mês

O trecho da edição anterior pertence à crônica

“Ponta de Lança”, de Walter WhittonHarris, que foi publicado na página 307 da“II Antologia Paulista” de 2000. Que tal reler essacrônica na íntegra, além de outros textos dostalentosos autores da SOBRAMES presentes naquela edição?

Relendo

REALIZADO

“Aquele domingo parecia que não iria

diferir de nenhum outro e lá se foi Julinho

para seu futebol. Seu pai lia o jornal

tranquilamente, tendo-o buscado no

jornaleiro de manhãzinha. Sua mãe varria o

quintal e sua irmã ainda dormia.”

CONFIRMADO

Mas é preciso despertar! A vida conti-

nua! / Não se pode permanecer inerte! /

Enquanto vivemos precisamos, e muito,

ficar acordados... / estar alerta para

enfrentarmos o futuro.../ meditando

sempre sobre o nosso porvir...

Page 8: "O Bandeirante" - nº 261 - agosto 2014

CONGRESSOS EM PERNAMBUCO: inscrições até 15 de agostoEstão abertas as inscrições para o XXV Congresso Brasileiro de Médicos Escritores que acontecerá de8 a 11 de outubro em Recife-PE, juntamente com o IX Congresso da UMEAL. Informações no site da

regional pernambucana da SOBRAMES: http://sobrames-pe.webnode.com

CHAPA “CAMINHANDO”CONCORRE À DIREÇÃO

DA SOBRAMES-SPEncerrado o prazo regulamentar

para a inscrição de chapasconcorrentes à direção da

SOBRAMES-SP para o biênio 2015/2016, apresentou-se apenas a

candidatura da CHAPA“CAMINHANDO”, assim composta:

Presidente: Carlos AugustoFerreira Galvão; Vice-presidente:

Márcia Etelli Coelho: Primeiro--Secretário: Marcos Gimenes

Salun; Segundo-Secretário: Mariado Céu Coutinho Louzã; Primeiro-

-Tesoureiro: HelioBegliomini;Segundo-Tesoureiro:

Aida Lúcia Pullin Dal SassoBegliomini Conselho Fiscal

(efetivos): Josyanne Rita de ArrudaFranco, José Alberto Vieira e

Roberto Antonio Aniche; ConselhoFiscal (suplentes): José Jucovsky,Alcione Alcântara Gonçalves e SoniaRegina Andruskevicius de Castro.Veja o edital de convocação para a

ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIAonde se realizarão as eleições na

página 2 desta edição.

CONCURSO ABRAMESA Academia Brasileira de Médicos

Escritores abriu inscrições até o dia30 de agosto para o seu

prestigiado Concurso Literário, nãoapenas para os membros

acadêmicos, mas para os escritoresem geral. Informações:www.abrames.com.br

JOSYANNE NA SALA DOS MÉDICOS

Cativante a entrevista que Josyanne Rita de Arruda Franco, presidente daregional paulista da SOBRAMES, concedeu para a revista virtual Sala dos

Médicos. Falando sobre aspectos de sua vida e sobre a literatura, elaapresenta um belo painel de sua formação profissional e cultural, além de

mostrar características preciosas de sua personalidade eproporcionar uma ampla divulgação da SOBRAMES.

A íntegra da entrevista poderá ser vista no BLOG da SOBRAMES-SPhttp://sobramespaulista.blogspot.com.br/ ou diretamente no site da

revista: http://www.saladosmedicos.com.br/entrevista/hobbies-pedia-tra-josyanne-franco-faz-da-literatura-uma-necessidade/

CONSAGRADOS E ECLÉTICOSTradicionalmente, a Pizza Literária de julho é dedicada aosautores consagrados, quando os sobramistas apresentam textosde seus escritores favoritos. Um desfile literário ecléticoincluindo Cecília Meireles, Clarice Lispector, Castro Alves, AnaJácomo, Manoel de Barros, Thiago de Mello, Chico Buarque deHolanda, dentre outros, foi o cardápio da noitede 17 de julho passado.Ecléticos também foram os visitantes que pela primeira vezprestigiaram o evento: a nutricionista Mércia Cristina Strong, aaposentada Maria Júlia de Mendonça, a veterinária Vera ReginaMonteiro de Barros e a designer de interiores Kelen Martins daSilva Costa acompanhada das filhas Beatriz e Gabriela. Essasduas estudantes declamaram poesias próprias, vencedoras emConcurso Literário, demostrando que a juventude também seinteressa pela arte de escrever.

RIR É O MELHOR REMÉDIOEm homenagem a Max Nunes e ao escritor homenageado naFLIP 2014, Millôr Fernandes, o tema da próxima Superpizzaserá “Rir é o Melhor Remédio”. Os textos em prosa ou verso

serão apresentados na Pizza Literária de 21.08.2014.

CREDENCIAIS ANTECIPADASpara ingresso grátis de escritores:http://www.bienaldolivrosp.com.br/

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