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O berço da filosofia. “Se o que tens a dizer não é mais belo que o silêncio, então cala-te.” (Pitágoras) I Jonas da Cruz Amaral Conforme o professor Danilo Marcondes, em seu livro Iniciação à História da filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein e nós compartilhamos dessa opinião , a forma mais sim- ples e menos polêmica de se caracterizar a filosofia é por meio de sua história. Onde a filoso- fia surgiu? Como a filosofia surgiu? Quem foram os primeiros filósofos? Quais eram os seus interesses? O que fez a filosofia nascer na Grécia e não em outro lugar? Qual a sua importân- cia? Segundo o filósofo espanhol José Ortega Y Gasset (1883-1955), que nasceu e morreu em Madrid, a filosofia é o conhecimento do universo e de tudo que há nele. Conforme podemos perceber, olhando para a tradição, a filosofia não é dogmática, ela coloca tudo em questão. Filosofar é olhar para o mundo com os olhos da dúvida, não aceitar respostas prontas. Filosofar é, como disse Aristóteles, ser movido pelo espanto. Só se faz filo- sofia problematizando e argumentando. Sem levantar problemas, sem refletir sobre esses pro- blemas levantados, é impossível filosofar. Foi Pitágoras de Samos, segundo a tradição, que inventou a palavra “filosofia”, que é a junção de duas outras palavras, a saber, philia, que significa “amor fraterno” e sophia, que significa “sabedoria”, “conhecimento”. Filosofia, portanto, significa amor e interesse pelo sa- ber. Pitágoras, ao afirmar que não era um sábio, mas sim um filósofo, estava querendo dizer que a sabedoria em sua plenitude pertence aos deuses, porém os homens podiam amá-la, tor- nando-se assim filósofos. Segundo Pitágoras, três tipos de pessoas compareciam a festa pública mais famosa da Grécia, os Jogos Olímpicos. Primeiro: aquelas que compareciam para comercializar seus pro- dutos durantes os jogos; segundo: os atletas e artistas, que haviam comparecido para competir e brilhar; terceiro: aquelas pessoas que compareceram para assistir aos jogos e para avaliar o

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O berço da filosofia.

“Se o que tens a dizer não é mais belo que o silêncio, então cala -te.”

(Pitágoras)

I Jonas da Cruz Amaral

Conforme o professor Danilo Marcondes, em seu livro Iniciação à História da filosofia:

dos pré-socráticos a Wittgenstein – e nós compartilhamos dessa opinião –, a forma mais sim-

ples e menos polêmica de se caracterizar a filosofia é por meio de sua história. Onde a filoso-

fia surgiu? Como a filosofia surgiu? Quem foram os primeiros filósofos? Quais eram os seus

interesses? O que fez a filosofia nascer na Grécia e não em outro lugar? Qual a sua importân-

cia?

Segundo o filósofo espanhol José Ortega Y Gasset (1883-1955), que nasceu e morreu

em Madrid, a filosofia é o conhecimento do universo e de tudo que há nele.

Conforme podemos perceber, olhando para a tradição, a filosofia não é dogmática, ela

coloca tudo em questão. Filosofar é olhar para o mundo com os olhos da dúvida, não aceitar

respostas prontas. Filosofar é, como disse Aristóteles, ser movido pelo espanto. Só se faz filo-

sofia problematizando e argumentando. Sem levantar problemas, sem refletir sobre esses pro-

blemas levantados, é impossível filosofar.

Foi Pitágoras de Samos, segundo a tradição, que inventou a palavra “filosofia”, que é a

junção de duas outras palavras, a saber, philia, que significa “amor fraterno” e sophia, que

significa “sabedoria”, “conhecimento”. Filosofia, portanto, significa amor e interesse pelo sa-

ber. Pitágoras, ao afirmar que não era um sábio, mas sim um filósofo, estava querendo dizer

que a sabedoria em sua plenitude pertence aos deuses, porém os homens podiam amá-la, tor-

nando-se assim filósofos.

Segundo Pitágoras, três tipos de pessoas compareciam a festa pública mais famosa da

Grécia, os Jogos Olímpicos. Primeiro: aquelas que compareciam para comercializar seus pro-

dutos durantes os jogos; segundo: os atletas e artistas, que haviam comparecido para competir

e brilhar; terceiro: aquelas pessoas que compareceram para assistir aos jogos e para avaliar o

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desempenho e o valor dos que ali apresentavam-se. Dizia Pitágoras, esse terceiro tipo de pes-

soa é como o filósofo.

Acredita-se que a filosofia, naquela época pensamento filosófico-científico, nasceu por

volta do século VI a.C, na Grécia antiga, precisamente em Mileto, na Ásia Menor, atual Tur-

quia. Ela nasceu quando alguns pensadores gregos – que ainda não eram chamados de filóso-

fos – perceberam que a verdade não é um arcano1, ela não carece de ser revelada a alguns es-

colhidos por divindades. A verdade pode ser conhecida por todos que, instrumentados pela ra-

zão, desejam conhecê-la. Por que na Grécia? Por que a filosofia surgiu na Grécia – e não en-

tre os babilônios, entre os chineses, entre os indianos... – se os diferentes povos da antiguida-

de tinham as suas próprias visões da natureza? Os povos da antiguidade, não estamos negando

isso, buscaram explicar os diversos processos e fenômenos naturais. Os gregos, por meio das

viagens marítimas que fizeram, descobriram a agrimensura (dos egípcios), descobriram a as-

trologia (dos babilônios e dos caldeus), descobriram a genealogia (dos persas). Das transfor-

mações que os gregos impuseram a esses conhecimentos – da agrimensura nasceu a aritmética

e a geometria; da astrologia nasceu a astronomia e a meteorologia; da genealogia nasceu a his-

tória – surgiu a filosofia. Afirmamos que a filosofia é grega – e só grega – porque, entre os

povos antigos, só os gregos fizeram ciência.

As viagens marítimas feitas pelos gregos foram de suma importância para a transição do

mito para o lógos. Elas contribuíram para a desmitificação do mundo. Nessas viagens os gre-

gos descobriram que não havia deuses nem monstros nos locais que os mitos diziam ter deu-

ses e monstros; esses locais eram habitados por outros seres humanos.

Um dos motivos para a filosofia ter sua origem grega é o fato de que não há um livro

sagrado grego. Sem livro sagrado, sem dogmas. A religião pública grega, então, nunca chegou

a formar uma classe de sacerdotes para preservar dogmas, pois eles não existiam. Outro fato

que foi de suma importância para o surgimento da filosofia é que entre os gregos havia, em

comparação com outros povos, uma enorme liberdade política. Justamente nos séculos VII e

VI a.C, período em que a filosofia dá o seu primeiro choro, a Grécia passa por um desenvol-

vimento econômico muito acentuado: a Grécia transforma-se em um país comercial e desen-

volve uma indústria artesanal; centros de distribuição comercial são fundados fora da Grécia.

O homem grego, no decorrer do século VII a.C, passa a compreender e dominar as técnicas.

Esse amplo espaço cultural grego permitiu, ao longo dos séculos, o desenvolvimento da filo-

sofia.

arcanus”

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Por volta de 2500-900 a.C, a civilização minoica, em Creta, e a póstuma civilização

micênica, na Grécia, recorriam à religião e aos mitos para explicar fenômenos físicos. Em ou-

tras palavras, o mundo, na imaginação do homem, era fruto da vontade dos deuses; deuses es-

ses, como nos lembrará mais tarde Xenófanes de Cólofon, muito parecidos com os seres hu-

manos em suas ações, animados por sentimentos e paixões humanas (antropomorfização). A

única diferença entre os homens e os deuses homéricos é: os homens são seres terrenos e os

deuses são seres celestes, que, ao contrário dos homens, escampam à velhice e à morte; no en-

tanto, os deuses não estão fora do tempo nem são eternos.

A mitologia dava conta de explicar toda a existência humana e todos os fenômenos na-

turais e os homens, até então, estavam satisfeitos com essas explicações. Porém, certo dia...

por causa de um homem... o mito não mais atendeu o desejo que os homens tinham de conhe-

cer o mundo e as suas origens. O mito foi tornando-se apenas uma estória regida por uma

imaginação fantasiosa e, por isso, contrária à razão.

Sabemos que, antigamente, antes de surgir a filosofia, a origem do mundo e dos homens

eram explicadas pelos mitos. Mas que é o mito? A palavra mito vem do grego mythos, que de-

riva de dois verbos: mytheyo e mytheo. Seus significados sãos diversos, mas todos levam para

a mesma vertente: “narrar”, “falar alguma coisa para alguém”, “conversar”, “contar”, “nome-

ar”, “designar”. Podemos dizer, então, que mito é a narrativa sobre a origem de algo.

Que vem a ser mito para os gregos? Como os gregos entendem o mito? Mito, para os

gregos, é uma revelação divina. E por ser divina é inquestionável. Como pode o homem ques-

tionar os deuses? Mito é um discurso proferido publicamente para ouvintes que tomam a his-

tória contada como verdadeira porque confiam e acreditam no narrador. O narrador dos mitos

são os poetas – Homero, Hesíodo... –, os escolhidos pelos deuses. Os deuses revelam a esses

nobres espíritos os acontecimentos passados, para que eles comuniquem para seus ouvintes.

Segundo a mitologia grega, Cronos (Saturno) e Réia (Ops) pertenciam à raça dos titãs,

filhos da Terra e do Céu. Do Caos, mero peso morto, no qual jazia a semente concentrada de

todas as coisas, surgiu toda a humanidade. A água do mar, a terra e o ar estavam todos emba-

ralhados nessa massa confusa. Eis que Deus e a Natureza interferiram nessa “zona” e coloca-

ram um fim em toda essa cizânia, separando-os, colocando cada elemento em seu lugar: como

a terra era a mais pesada, ficou embaixo; a água ocupou o ponto inferior fazendo com que a

terra flutuasse; o ar, por ser mais leve, foi espalhado pelo céu. Eram os titãs que habitaram a

Terra antes dos seres humanos. Dois desses titãs, os irmãos Prometeu e Epimeteu, foram en-

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carregados de criar o ser humano e garantir-lhe, juntamente com todos os animais, as faculda-

des necessárias para a sua conservação. O segundo ficou incumbido da obra e o primeiro de

avaliá-la depois de terminada. Epimeteu, então começou o trabalho: atribuiu a cada animal

seus dons – coragem, força, rapidez, astúcia... –, mas quando chegou à vez do homem, que

devia ser superior a todos os outros animais, Epimeteu esgotara todos os seus recursos. Então,

com a ajuda de Prometeu e de Minerva deu ao homem o fogo, que lhe forneceu meios para

construir armas para subjugar os demais animais e ferramentas para cultivar a terra e construir

estadia fixa. Essa era uma das inúmeras versões sobre a origem do mundo e dos homens con-

tadas pelos gregos.

II

Eis que surgiu uma nova linhagem de pensadores – Tales, Anaximandro, Heráclito, Xe-

nófanes... –, que para explicar os fenômenos do mundo ao seu redor, deixaram os deuses de

lado – Cronos, Réia, Zeus... – e recorreram puramente às explicações racionais e naturais, ou

seja, explicar o natural pelo natural, não mais aceitando as respostas que eram obtidas através

dos mitos e dos deuses presentes nesses mitos. Os irmãos Prometeu e Epimeteu, responsáveis

pela criação dos homens, não mais atendiam a mente desses pensadores. Essas explicações

mitológicas não mais satisfaziam a razão desses sábios. Pode-se dizer, então, que a filosofia

nasceu de uma insatisfação quanto às explicações fornecidas pelos poetas.

Em síntese, a filosofia dá o seu primeiro choro quando alguns pensadores gregos já não

mais se satisfaziam com as explicações “irracionais” – explicações embriagadas pela fantasia

– que a tradição mitológica fornecia-lhes. A verdade não é patrimônio de alguns escolhidos

dos deuses (no caso, os poetas). A verdade é um bem comum: pertence a todos àqueles que,

instrumentados pela razão, querem conhecê-la.

Aristóteles, preceptor de Alexandre (o Grande), chegou a definir no Livro I de sua Me-

tafísica, Tales de Mileto como sendo o primeiro filósofo: o primeiro homem com um pensa-

mento filosófico. Tales foi considerado por Aristóteles o fundador da ciência física, ou seja, o

primeiro grego a procurar a substância última de todas as coisas, a procurar a unidade escon-

dida atrás de toda a multiplicidade. Nietzsche, por sua vez, em sua A Filosofia na Idade Trá-

gica dos Gregos, entendeu Tales como o primeiro filósofo, pois esse sábio de Mileto captou

na pluralidade a unidade do Ser: reduziu tudo a água. Em outras palavras, Tales explicou a

realidade a partir dela mesma.

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A filosofia na época trágica dos gregos

A era pré-socrática se desenrolou em um período de quase dois séculos. Não é correto

afirmar que filósofos pré-socráticos são aqueles que vieram anteriormente a Sócrates (470 a.C

- 399 a.C) porque alguns pré-socráticos viveram na mesma época – e alguns até depois – de

Sócrates. Essa divisão, portanto, não é cronológica. Essa divisão se dá devido ao objeto da fi-

losofia dos pré-socráticos em relação à novidade introduzida por Platão (período socrático).

No período denominado socrático ou antropológico, os filósofos investigam as questões hu-

manas (ética, política...).

Os filósofos pré-socráticos se preocupavam quase que exclusivamente com os proble-

mas cosmológicos, de modo que, a filosofia, entendida em sua origem grega, nasceu como um

conhecimento da ordem do mundo através de elementos racionais, investigando a origem das

coisas e as mutações ocorridas na natureza.

Ao explicar a ordem e a transformação da natureza, a filosofia desse período também

explica a genealogia e as mutações sofridas pelos seres humanos, pois estes, como os animais,

como as plantas, como os rios, também fazem parte da natureza.

As obras desses filósofos que se dedicaram especialmente à natureza e ao universo se

afogaram nos oceanos da Antiguidade. Nós só as conhecemos por meio dos doxógrafos, ter-

mo este que significa, literalmente, “compiladores de opiniões”. Esses homens preservaram as

opiniões dos filósofos antigos, retirando-as direta ou indiretamente da obra de Teofrasto, dis-

cípulo e sucessor de Aristóteles na direção do Liceu.

Além da doxografia, para o estudo dos pré-socráticos, contamos também com os frag-

mentos. Esses últimos, que como a doxografia são encontrados em obras de autores posterio-

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res, nos dá as próprias palavras dos pensadores, por vezes – pela densidade –, obscuras e de

difícil entendimento.

Os gregos antigos escreveram, mas suas obras não foram conservadas em sua totalidade.

Por isso, a leitura da filosofia pré-socrática é para nós uma dificuldade quase intransponível,

apesar da dedicação de alguns historiadores da filosofia.

III

A Escola Jônica, que surgiu na cidade de Mileto, localizada na costa da Ásia Menor,

atual Turquia, diferencia-se das demais escolas filosóficas desse período especialmente por

seu interesse pela Natureza. A Escola Jônica foi fundada por Tales de Mileto, um dos Sete

Sábios da Grécia arcaica. Seus representantes são: Tales de Mileto, Anaximandro de Mileto,

Anaxímenes de Mileto e Heráclito de Éfeso.

A cidade de Mileto era um centro mercantil e, por isso, estava em constante contato

com as antigas civilizações orientais, fato que fortalece ainda mais a tese daqueles intelectuais

que pensam a filosofia como fruto de um berço filosófico oriental. Mas essa discussão não

nos interessa.

Os três filósofos de Mileto – Tales, Anaximandro e Anaxímenes – acreditavam em uma

substância primordial, a partir da qual absolutamente tudo se originava, dando origem não só

a filosofia, mas, também, às ciências da natureza. Esses filósofos estavam interessados em in-

vestigar a origem do mundo e das transformações da Physis (termo grego que, numa tradução

aproximada quer dizer Natureza), nascendo assim uma cosmologia; uma ciência da natureza.

Eles, como a maioria dos gregos da época, negam que o mundo surgiu do nada, isto é, eles en-

tendem que a Physis é eterna e que tudo se transforma em outras coisas, em um processo in-

terminável.

Tales de Mileto, como o próprio “sobrenome” indica, nasceu em Mileto. Os historiado-

res da filosofia situam seu nascimento por volta de 624 a.C e a sua morte próxima de 546 a.C,

com 78 anos de idade. Geômetra, astrônomo, matemático e político. Pouco conhecemos desse

pensador. Dos seus escritos nada sobreviveu, mas sabemos que ele detinha um excepcional

domínio da geometria e da astronomia. A ele atribuiu-se a presciência de um eclipse total do

Sol em 585 a.C. Conta-se, que por meio de estudos astronômicos Tales previu uma abundante

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colheita de azeitona. Então, visionário, empreendedor, com um pequeno capital arrendou por

baixíssimo preço as prensas de azeite em Mileto e em Quios. Quando chegou o momento da

colheita pôde alugá-las pelo preço que quis, assim, obtendo grande lucro. Outra lenda, esta

narrada por Platão no Teeteto, diz que Tales observava o céu e estudava as estrelas enquanto

caminhava, distraidamente, e, de repente, caiu em um poço. Foi socorrido por uma linda e es-

pirituosa mulher, uma serva trácia; esta mulher zombou de Tales, dizendo que foi por ele estar

tão ávido em conhecer o universo que não viu o que estava à sua frente. São muitas as lendas

que giram em torno da figura de Tales. Ele aparece ora como um empreendedor, ora como um

homem que não se preocupava com as coisas terrenas. Sem nenhuma referência ao sobrenatu-

ral elaborou a “doutrina da água”; esta dizia que a água era o elemento primordial de todas as

coisas. Interessante nesse pensador é que ele mesmo estimulava os seus discípulos a desen-

volverem outros pontos de vista e que abraçassem outros princípios originários. Segundo Ta-

les, a arché (princípio originário de todas as coisas), era a água e através dela ele explicou a

origem de todas as coisas. Tales, catalogado entre os Sete Sábios da Grécia, observou que o

calor carece de água. Observou, também, que a natureza é úmida; que os alimentos contêm

seiva e que todas as coisas que estão mortas ressecam. Com base nessas observações total-

mente intuitivas, sem nenhum equipamento que o auxiliasse, guiado apenas pela sua razão,

concluiu que o princípio de tudo só podia ser a água. Segundo Tales, “a água é vida e princí-

pio de vida, tudo provém dela e a ela retorna, de tal modo que tudo é vivo, em mudança e

transformação perpétuas. Tudo é animado e assim tem alma.”. Para Tales a água era o princí-

pio unificador de todos os seres.

Anaximandro de Mileto, como o seu mestre, também nasceu em Mileto, possivelmen-

te, no ano de 610 a.C e morreu próximo de 546 a.C. É conhecido por ter criado o primeiro

mapa geográfico da história e por ter sido o primeiro a escrever um texto filosófico no ociden-

te. Anaximandro aperfeiçoou o gnômon (segundo Heródoto, invenção dos babilônios), objeto

usado para marcar os solstícios e os equinócios. Segundo Anaximandro, a substância primeira

(ou o arché, como os gregos chamavam) é o ápeiron. Essa substância que compõe e organiza

o mundo é indefinida e não se assemelha em nada a qualquer espécie de matéria ou elemento:

o ápeiron é único, móvel, ilimitado, eterno e indissolúvel. O ápeiron está em perene movi-

mento e ao movimentar-se separa os opostos: quente e frio, úmido e seco... Para elucidar a

constituição do universo, afirma Anaximandro que o ápeiron seria dotado de Movimento

Eterno, análogo a um redemoinho de vento em turbilhão. Para Anaximandro o nosso mundo

é, devido ao perene movimento do ápeiron, apenas um entre em uma infinidade de outros

mundos. Anaximandro disse que não é nem a água nem qualquer outro dos chamados elemen-

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tos a fonte da geração das coisas que existem, mas algo de outra natureza, o ápeiron, o inde-

terminado, o infinito, o indestrutível. É dessa natureza indefinida e não limitada que provêm

todas as coisas, todos os céus e os mundos nesses céus contidos.

Anaxímenes de Mileto foi discípulo de Anaximandro na Escola Jônica. Os nossos his-

toriadores da filosofia apontam seu nascimento no ano de 585 a.C, em Mileto, e sua morte por

volta de 525 a.C. Abraçou o ar como o princípio originário de todas as coisas, uma vez que o

ar é incorpóreo e se encontra em toda parte. Para o nosso filósofo Anaxímenes, que com cer-

teza conhecia a teoria da água de Tales, a água nada mais era do que o ar condensado. Ana-

xímenes partilhava da opinião de Tales, segundo a qual uma substância basilar e primordial

subjazia a todas as transformações da natureza. Segundo Anaxímenes, o princípio originário

que governa o mundo é o ar, um elemento não tão abstrato como o ápeiron de Anaximandro

nem palpável demais como a água de Tales. O ar constitui-se de condensação e rarefação, de

modo que, Anaxímenes chegou a seguinte conclusão: o fogo é ar rarefeito, e pela condensa-

ção progressiva se origina a água, o vento, as nuvens, a terra... e todas as outras coisas.

O mobilista Heráclito de Éfeso nasceu na ilha de Éfeso, na região da Jônia, no ano 540

a.C e morreu por volta de 480 a.C, com 60 anos. Junto com Parmênides (pai da lógica), filó-

sofo da Escola Eleática, Heráclito é um dos nomes mais importantes do período pré-socrático.

Por ser misantropo não teve mestre nem pertenceu a nenhuma escola (apesar de ser, segundo

Danilo Marcondes, um dos representantes da Escola Jônica). Heráclito, pai da dialética, con-

cebe o absoluto como processo. Em outra palavra, dinâmico. Juntamente com os atomistas

Heráclito entende que a realidade natural é caracterizada pelo movimento, todas as coisas flu-

em; por isso, o filósofo denominado “o Obscuro”, devido à densidade de seus pensamentos,

disse “Panta rei” (“Tudo passa”). O fluxo, pensava Heráclito, era a característica mais incipi-

ente da natureza.

Para Heráclito a realidade manifesta-se como um fluxo eterno de todas as coisas que a

constituem. A única coisa que permanece inalterável é o movimento: as coisas estão sempre

mudando, ainda que aparentem o contrário. Para este filósofo cada coisa que existe, existe no

– e pelo – vir-a-ser, isto é, no – e pelo – processo; na passagem de um contrário para o outro.

O lógos heraclitiano, representado pelo fogo – o elemento primordial, energia que

queima e se autoconsume –, é o princípio unificador do real e também o elemento basilar da

racionalidade do cosmo. É segundo ele que tudo acontece.

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O conflito (pólemos), conforme diz Heráclito no fragmento 53, é o pai (a causa) de to-

das as coisas. Todas as coisas são e não são ao mesmo tempo: uma coisa que é agora precisou

deixar de ser o que era antes. O organismo doente, para estar acometido pela doença, precisou

deixar de estar saudável. Heráclito enxergava que a realidade é distinguida pelo pólemos entre

os opostos; conflitos estes que, segundo o filósofo, não possuem um caráter negativo, pois

eles são a garantia do equilíbrio. Se nunca ficássemos doentes, por exemplo, não saberíamos o

que significa a saúde. Só morre aquilo que um dia viveu. Em um mesmo indivíduo, por

exemplo, a vida e a morte estão presentes.

Para dizer que tudo muda e que nada permanece estável e imóvel, Heráclito diz que

“nós não podemos nos banhar duas vezes no mesmo rio, pois o rio já não é mais o mesmo.”.

Os filósofos posteriores acrescentaram: “... e eu também já não sou mais o mesmo.”. Perceba

que Heráclito usa a metáfora do rio – rio este que é símbolo do movimento encontrado nas

coisas – para compendiar a ideia do fluxo perpétuo.

Por volta de 570 a.C nasceu na cidade de Cólofon, ao norte de Éfeso, na Jônia, Xenófa-

nes, filho de Déxio. Sob a terrível ameaça da invasão persa a Cólofon, Xenófanes abandonou

a sua terra natal. Contava então 25 anos. A partir de então viveu como um nômade pelas colô-

nias ocidentais da Magna Grécia. Diferente dos seus conterrâneos milesianos – Tales, Anaxi-

mandro, Anaxímenes e Heráclito – e dos pitagóricos Xenófanes não se preocupou com a cos-

mologia. Interessou-se pela temática religiosa. Os gregos antigos, conforme já foi dito em ou-

tras partes do texto, tinha uma concepção dos deuses antropomórfica, em outras palavras, os

deuses possuíam características físicas e comportamentais e sentimentos essencialmente hu-

manos. Mas o pensamento de Xenófanes caminha contra essa concepção; contra a religião

tradicional grega. Para esse pensador de Cólofon não é sábio acreditar em uma sociedade de

deuses que assumem comportamentos comuns entre os humanos, ou seja, comportamentos

abomináveis e paixões e vícios desenfreados. Almejando tornar-se grandioso o ser humano

projeta-se em seres grandiosos. Sendo esses seres uma projeção humana logicamente eles irão

ter atributos humanos: serão corajosos como alguns, bonitos como outros, inteligentes como

outros... Diz Xenófanes, sabiamente, que se os bois, os cavalos e os leões pudessem pintar ou

fazer esculturas como os homens representariam seus deuses semelhantes a eles: o boi teria

deuses em forma de boi; o cavalo teria deuses em forma de cavalo; e o leão, por sua vez, teria

deuses em forma de leão. Para Xenófanes deus faz parte do cosmo, dizendo em outras pala-

vras, é universal, eterno e imutável: não nasce, pois se nascesse deveríamos entender que an-

tes não existia. Assim, como algo que não existe pode nascer? Impossível! Ao contrário de

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seus contemporâneos gregos Xenófanes defendeu – conforme indica o famoso fragmento 23 –

a ideia de um deus único, um deus que se identifica com a própria natureza, com a própria re-

alidade em sua totalidade.

Como isso Xenófanes indica que deus é superior ao ser humano, de modo que, deus e

homem não são semelhantes: deus é deus e homem é homem.

IV

A Escola Eleática (ou Eleata) nasceu em Eléia, cidade situada no sul da Itália. Os filóso-

fos eleatas são adversários dos mobilistas. Ao contrário dos mobilistas, que valorizavam a

contribuição da experiência para o conhecimento do real, que valorizavam a pluralidade do

real, os monistas buscavam a unidade que não aparece de imediato aos nossos sentidos.

Apesar de Platão e Aristóteles considerarem que Xenófanes de Cólofon foi seu inicia-

dor, tudo indica que a Escola Eleática foi fundada por Parmênides de Eléia. Xenófanes não

pode ter sido o fundador da Escola Eleática porque sua temática era teológica, enquanto a te-

mática dos eleatas era ontológica. Outro fato que impossibilita Xenófanes de ter fundado a

Escola Eleática é que ele, aos 92 anos, ainda era um andarilho, não tinha fixado morada em

nenhum lugar. Mas não nos preocupemos com isso. Entre os representantes da Escola Eleática

nós encontramos três importantíssimos filósofos: Parmênides, Zenão e Melisso de Samos.

Os filósofos dessa escola acreditavam que o único conhecimento válido é aquele que é

fornecido pela razão; defendiam a unicidade estática de tudo aquilo que existe. Contrariando

Heráclito, consideravam falsa a realidade que se apresentava aos nossos sentidos. E contrari-

ando os filósofos pré-socráticos que os precederam, os milesianos, que explicavam toda a rea-

lidade através de um elemento primário.

Parmênides de Eléia, filho de Pireto, nasceu na cidade de Eléia, na Magna Grécia, por

volta de 515\510 antes da era cristã. Morreu, provavelmente, no ano 480 a.C. Foi discípulo de

Xenófanes, porém, não o seguiu. Assim como fizeram vários outros filósofos pré-socráticos,

Parmênides dedicou-se à política, ao governo de sua polis.

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A doutrina filosófica de Parmênides nega com vigor a possibilidade do movimento e da

mudança: nega a multiplicidade. Como explicar a mudança que vemos nas coisas, se o ser é

único, uno e imutável? Parmênides assevera que só existe uma única realidade e essa realida-

de é o ser. Os filósofos de Eléia resolvem esse problema. Eles dizem que na realidade as mu-

danças não existem, elas tão somente são uma ilusão dos nossos sentidos. Apenas a Razão é o

instrumento válido do conhecimento verdadeiro, daquilo que é sempre o mesmo, não muda.

Os sentidos, para Parmênides, só dão conta das aparências e, por isso, somos enganados por

eles. O professor Mário José dos Santos, em seu livro – intitulado Os pré-socráticos – escre-

ve:

Os pré-socráticos,

Para Parmênides, o pensamento, o raciocínio, que são funções próprias da Razão, tem

por objeto, unicamente, o ser. O não-ser, o nada, é impensável.

Os eleatas, em oposição a Heráclito de Éfeso, que afirmou que tudo no mundo é o devir,

estabeleceram que tudo é o ser. O que existe, alega Parmênides, não pode ser transformado. E

o que não existe não pode surgir do nada.

Zenão de Eléia, que era cerca de quarenta anos mais novo que seu mestre, foi o discí-

pulo mais famoso de Parmênides. Com seus paradoxos, Zenão pretendeu reduzir ao absurdo

as teses defendidas pelos adversários do eleatismo, os mobilistas. Os argumentos de Zenão

são teóricos, isto é, de natureza não material.

Para os eleatas o movimento é uma ilusão! Os sentidos enganam, só a razão traduz a

verdade. É famosa a sua argumentação referente a corrida entre Aquiles, o mais veloz dos cor-

redores, e a tartaruga. Diz Zenão que se Aquiles der a dianteira da corrida a tartaruga ele será

incapaz de alcançá-la.

Os pré-socráticos,

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Outro paradoxo é o da flecha imóvel. Esse paradoxo defende que o movimento da fle-

cha em direção ao alvo é ilusório. Disparada em direção a um alvo colocado a uma certa dis-

tância, essa flecha permanecerá imóvel, nunca atingirá esse alvo.

V

O pensamento pré-socrático tem uma segunda fase, o pluralismo. Os pensadores dessa

fase admitiam, ao contrário dos monistas, a existência de vários princípios originários que,

misturando-se uns com os outros, formavam a multiplicidade de todas as coisas. Seus repre-

sentantes mais importantes são: Empédocles, Anaxágoras e Arquelau, este último apresenta-

do pela tradição como mestre de Sócrates. Os pensadores da Escola Atomista – Leucipo e

Demócrito – também fazem parte do pluralismo.

Empédocles de Agrigento é o fundador do pluralismo. Ele nasceu em Agrigento, Si-

cília Ocidental, por volta de 432 antes da era cristã. Empédocles rompe com a interdição

eleata, com a proibição de pensar o não-ser. Segundo Empédocles, é da união de quatro

elementos – água, terra, ar e fogo – que surge a vida. Da separação desses quatro elementos

surge a corrupção, a morte. A morte para Empédocles é simplesmente isso: a desagregação

dos elementos. Ele contrapõe a concepção eleata, que dizia que o ser é único e imóvel. Para

Empédocles o ser é móvel, pois é constituído por quatro elementos. Esses quatro elementos,

segundo Empédocles, eram as raízes (rizómata) do universo. Mas o que faz com que essas

raízes se unam? E o que acontece para que elas se separem? Segundo Empédocles, existem

duas forças. A primeira delas é o amor (phylia), responsável pela atração, promovedor de

misturas e de diversas combinações entre os quatro elementos. A segunda força é o ódio

(neikos), responsável pela repulsão. No início, com o predomínio do amor, as quatro raízes

estão misturadas, assim formando o uno. O ódio repele essas raízes, transformando o uno em

múltiplo. O amor entra em ação novamente e começa a misturar tudo com tudo. É por meio

dessa ação do amor que surgem os diversos seres e as diversas coisas da natureza. Esse pro-

cesso é eterno, o amor uni e o ódio separa, o amor uni e o ódio separa...

Para Empédocles os sentidos não oferecem apenas ilusões, como dizia Parmênides.

Empédocles não exclui a experiência sensível, ela exerce uma posição relevante no que diz

respeito à percepção do real. O conhecimento, posteriormente, refinado pela inteligência,

começa pelos sentidos. Mais tarde Aristóteles vai dizer isso.

Conforme Anaxágoras de Clazômenas (que viveu entre 500 a.C a 428 a.C), amigo

íntimo do famoso general ateniense Péricles, o universo é constituído, em sua totalidade, por

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inúmeras partículas. Essas inúmeras partículas, segundo sua doutrina cosmológica, são infi-

nitamente pequenas, invisíveis. Elas são divisíveis ao infinito. No início – lembrando aqui

que para o grego não existe noção de criação – essas sementes (homeomerias) estavam mis-

turadas. Os quatros elementos de Empédocles são substituídos por Anaxágoras pela infini-

dade de sementes. É pela mistura e pela separação dessas sementes que surgem todas as coi-

sas. Anaxágoras, obediente à interdição eleata, a proibição de pensar o não-ser, entende que

nada vem do Nada. O universo é formado a partir das homeomerias. Essas homeomerias

sempre existiram e sempre vão existir.

Para explicar o movimento Anaxágoras irá falar de uma entidade diferente das semen-

tes. Essa entidade é o Entendimento, a Inteligência. Essa entidade, separada das homeomeri-

as, é ilimitada e autônoma. A constituição do universo, afirma Anaxágoras, tem origem na

iniciativa dessa entidade. O movimento provocado por esse Entendimento (Espírito) produz

um mundo ordenado.

Bibliografia

BULFINCH, Thomas. O livro de ouro da mitologia: histórias de deuses e heróis. Tradu-

ção de David Jardim. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006.

CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2010

COLEÇÃO OS PENSADORES. Os pré-socráticos – Fragmentos, Doxografia e Comen-

tários, Seleção de textos, Abril Cultural, 1996.

MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia: dos pré-socráticos à Wittgens-

tein. 13a edição. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2010.

NIETZSCHE, Friedrich. A filosofia na época trágica dos gregos. Tradução de Antonio

Carlos Braga. São Paulo: Editora Escala, 2008.

SANTOS, Mário José dos. Os pré-socráticos. 1a reimpressão. Juiz de Fora: Editora UFJF,

2011.