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neuza-teixeira
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poema
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O CARVALHO DA FLORESTA
Havia na floresta um roble cheio de anos,
Vestido de hera anciã, decano entre os decanos
Dos bosques do arredor. Raízes colossais
Prendiam-no à terra; ao ar descomunais Os braços elevava, e ao vê-lo assim dir-se-ia
Que aos outros vegetais as bênçãos estendia.
Velho, e ainda a Primavera o vinha requestar;
O Outono desfolhava-o em último lugar;
Opunha ao sol do Estio a fronde espessa e bela; Respeitava-o no Inverno o raio da procela.
Viu passar gerações após de gerações
Em risos e em choro, em festas e orações;
Viu crianças pedir-lhe a sombra grata e amena
Que, amantes ao depois, naquela mesma cena
Viu a falar d'amor, e no seu tronco abrir
Duas iniciais que liam a sorrir;
E mais tarde ainda os vira, velhos, encanecidos,
Pedir-lhe em vão alento aos lânguidos sentidos,
A repousar ali. A coma erguida ao céu,
De longe se mostrava envolta ainda no véu
De névoas da distância. Ao regressar à aldeia,
Ansiava o lavrador por avistá-lo, e a ideia
De tudo quanto amava o vinha comover:
Do lar, do velho pai, dos filhos, da mulher.
Que olhos de tanto amor, de penas e esperanças
Lhe enviavam também saudosas as crianças Ao deixarem a casa, a Pátria, irmãos e mãe.
Indo tentar porvir por esse mundo além!
Em que tempo nascera esta árvore gigante?
Que época viu crescer o arbusto vacilante,
Curvando-se por terra a cada viração,
Esse que já nem teme ameaças do vulcão?
Quem o pode dizer? Nas trevas se envolvia A infância do colosso. E quando acabaria? Que audaz raio do céu, que convulsão fatal Por terra lançará o enorme vegetal?
Mas, ai, o que a tormenta e o tempo não consomem
Muitas vezes destrói a ousada mão do homem; Em vão a tempestade incólume o deixou:
O golpe do machado um dia o derrubou,
E ao braço do homem cai, dos homens o amigo.
Ouvi a narração do caso, que eu prossigo.
É pela madrugada! hora que a amar induz;
Tudo é verdura o campo, o céu é todo luz.
O roble colossal no tronco encarquilhado
Sente a seiva girar. Das aves o trinado
Se ouve na espessa copa, e ao festival clamor Respondem num sorriso a borboleta e a flor.
Como um velho entretido a ouvir cantar os netos,
Que lhe passam nas cãs os dedos desinquietos,
Assim ele também, vulto austero e senil,
Se compraz a escutar a música d'Abril,
Os trinos e o bater das asas da folhagem, A turba jovial, da infância alada imagem.