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1 O caso da comunidade negra das Ilhas do Rosário * Em 23 de janeiro de 2006 ocorreu uma reunião bastante diferente no Clube de Pesca de Cartagena, Colômbia. Geralmente, nesta associação privada, os cartageneros de classe alta se reúnem para fazer negócios, mas, nesta ocasião, vários deles, junto com outros membros da elite do interior do país, foram à associação para iniciar uma discussão com os representantes dos nativos das Ilhas do Rosário, uma pequena comunidade negra formada por aproximadamente 600 pessoas, que é, sem dúvida, um dos grupos sociais mais pobres do país. A razão: os nativos foram informar-lhes de sua decisão de reclamar ao Estado, em sua condição de minoria ética afro-colombiana, a propriedade coletiva da terra das Ilhas do Rosário, cujos títulos de propriedade estão em nome dos membros da elite que ali se * Este caso foi produzido em 2006 por Mauricio García Villegas e Rodrigo Uprimny, profesores de directo da Universidad Nacional de Colombia, e por María Paula Saffon Sanín, professora de direito da Universidad de Los Andes, todos pesquisadores do Centro de Estudios de Derecho, Justicia y Sociedad (DJS), com a colaboração de Luciana Gross Cunha, professora da FGV/EDESP, e integra o conjunto de dez casos inaugurais da “Casoteca Latinoamericana de Derecho y Política Pública” (www.direitogv.com.br/casoteca ). O financiamento deste caso foi propiciado por acordo de cooperação técnica celebrado entre o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID e a Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas – FGV/EDESP. O projeto da Casoteca tem três objetivos: (i) fornecer um acervo de casos didáticos sobre direito e política pública na América Latina; (ii) estimular a produção contínua de novos casos por meio do financiamento de pesquisa empírica; (iii) provocar o debate sobre a aplicação do “método do caso” como uma proposta inovadora de ensino. Os casos consistem em relatos de situações-problema reais, produzidas a partir de investigação empírica e voltadas para o ensino. Evidentemente, não comportam uma única solução correta. A Casoteca permite uso aberto e gratuito de seu conteúdo, que é protegido por uma licença Creative Commons (Atribuição-Uso Não-Comercial-Compartilhamento pela mesma Licença 2.5 Brasil). A licença pode ser acessada através do link: http://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/2.5/br/

O caso da comunidade negra das Ilhas do Rosário · O projeto da Casoteca tem três objetivos: (i) fornecer um acervo de casos didáticos sobre direito e política ... Formalmente,

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O caso da comunidade negra das Ilhas do Rosário*

Em 23 de janeiro de 2006 ocorreu uma reunião bastante diferente no Clube de Pesca de

Cartagena, Colômbia. Geralmente, nesta associação privada, os cartageneros de classe alta

se reúnem para fazer negócios, mas, nesta ocasião, vários deles, junto com outros membros

da elite do interior do país, foram à associação para iniciar uma discussão com os

representantes dos nativos das Ilhas do Rosário, uma pequena comunidade negra formada

por aproximadamente 600 pessoas, que é, sem dúvida, um dos grupos sociais mais pobres

do país. A razão: os nativos foram informar-lhes de sua decisão de reclamar ao Estado, em

sua condição de minoria ética afro-colombiana, a propriedade coletiva da terra das Ilhas do

Rosário, cujos títulos de propriedade estão em nome dos membros da elite que ali se

* Este caso foi produzido em 2006 por Mauricio García Villegas e Rodrigo Uprimny, profesores de directo da Universidad Nacional de Colombia, e por María Paula Saffon Sanín, professora de direito da Universidad de Los Andes, todos pesquisadores do Centro de Estudios de Derecho, Justicia y Sociedad (DJS), com a colaboração de Luciana Gross Cunha, professora da FGV/EDESP, e integra o conjunto de dez casos inaugurais da “Casoteca Latinoamericana de Derecho y Política Pública” (www.direitogv.com.br/casoteca). O financiamento deste caso foi propiciado por acordo de cooperação técnica celebrado entre o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID e a Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas – FGV/EDESP. O projeto da Casoteca tem três objetivos: (i) fornecer um acervo de casos didáticos sobre direito e política pública na América Latina; (ii) estimular a produção contínua de novos casos por meio do financiamento de pesquisa empírica; (iii) provocar o debate sobre a aplicação do “método do caso” como uma proposta inovadora de ensino. Os casos consistem em relatos de situações-problema reais, produzidas a partir de investigação empírica e voltadas para o ensino. Evidentemente, não comportam uma única solução correta. A Casoteca permite uso aberto e gratuito de seu conteúdo, que é protegido por uma licença Creative

Commons (Atribuição-Uso Não-Comercial-Compartilhamento pela mesma Licença 2.5 Brasil). A licença pode ser acessada através do link: http://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/2.5/br/

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encontravam, para quem trabalham muitos dos nativos das ilhas1, e onde os membros da

elite haviam construído hotéis e casas de diversão.

O arquipélago das Ilhas do Rosário é, com efeito, um dos lugares mais paradisíacos do

Caribe. À uma hora de lancha de Cartagena, as 27 ilhas que o formam se localizam sobre

um recife de corais de tal magnitude e beleza que foi declarado Parque Nacional Natural

em 1977. O Parque é, em sua maioria, sub-aquático; somente fazem parte dele 2 das 27

ilhas do arquipélago das Ilhas do Rosário2. Por isto, a partir da década de cinqüenta até os

anos 90 quem comprou terras dos nativos das Ilhas pôde construir ali casas de diversão e

hotéis sem nenhuma restrição3.

Formalmente, os terrenos nos quais se encontram estes hotéis e casas de diversão são de

propriedade de quem fez as construções, pois os que construíram e seus antepassados

compraram os terrenos dos negros que ali habitavam, em conformidade com os requisitos e

formalidades previstos na lei. Assim contam os proprietários atuais dos prédios e seus

advogados4, o que é aceito também pelos próprios nativos e antropólogos que lhes apóiam

na reclamação do título de propriedade coletiva5. Em algumas oportunidades, os nativos

venderam seus imóveis duas ou mais vezes, quando o primeiro comprador não construía

imediatamente sobre eles6.

No entanto, há algumas décadas, o Estado colombiano declarou que as Ilhas do Rosário

pertenciam à nação, como conseqüência de um procedimento administrativo de

esclarecimento da propriedade7. De fato, a instituição estatal então competente (o Instituto

de Reforma Agrária INCORA) aplicou os códigos fiscais do século XIX e princípios do

1 Para o conteúdo completo da reunião, ver anexo 1 (principal). 2 Para os terrenos contidos no “Parque Nacional Natural dos Corais do Rosário e de São Bernardo”, ver anexo 1 (complemento). 3 A restrição somente veio em 1996, ano em que o então Ministro do Meio Ambiente ordenou a suspensão de toda construção em curso e futura das Ilhas (anexo 2 do complemento). 4 Ver as entrevistas contidas nos anexos 2 e 3 (principais). 5 Ver o texto escrito da apresentação que os negros fizeram aos donos de casas e hotéis no Clube de Pesca (anexo 4, p. 5, principal) e a entrevista da antropóloga Lavinia Fiori (anexo 5, principal). 6 Entrevista a Rafael Vieira (anexo 6, principal). 7 Para o objeto e as normas que regulam o procedimento de especificação de propriedade ver anexo 3 (complemento).

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século XX, segundo os quais todas as ilhas pertencentes ao território do Estado colombiano

são patrimônio da nação e constituem terrenos baldios reservados8, salvo as que haviam

sido ocupadas por populações instaladas antes de 1873, ou que recaia sobre elas um título

translativo de domínio anterior a 11 de outubro de 1821. Segundo o INCORA, ao longo do

procedimento administrativo não se comprovou nenhuma destas exceções e, portanto, ficou

determinado que as Ilhas do Rosário nunca haviam saído do patrimônio do Estado9.

Conseqüentemente, a instituição estatal ordenou a inscrição de sua decisão no registro de

matrícula imobiliária dos bens e declarou que seus presumidos donos eram, na realidade,

ocupantes indevidos de terras estatais e que, além disso, haviam utilizado inadequadamente

os recursos naturais das Ilhas e haviam causado uma evidente degradação do meio

ambiente. Esta decisão administrativa transitou em julgado, pois não se interpôs contra ela

nenhum recurso judicial10.

Em princípio, a decisão do INCORA traz o desalojamento dos ocupantes das Ilhas do

Rosário. No entanto, como manifesta o próprio advogado da maioria dos proprietários de

casas e hotéis nas Ilhas,

“as influências dos donos fizeram com que não fosse feito nada durante mais de uma

década”11

Assim, apesar de serem legalmente considerados ocupantes indevidos, estes permaneceram

atuando ali como donos e senhores das terras.

Não obstante, esta situação foi radicalmente modificada quando o departamento de assuntos

ambientais e agrários da Procuradoria Geral da Nação (Ministério Público colombiano)

impetrou em 1999 uma ação de cumprimento diante da jurisdição contenciosa-

8 Para a explicação normativa e doutrinária do terreno baldio, ver (anexo 4, complemento). 9 O INCORA tomou esta decisão mediante as Resoluções de 1984 e 1986. A segunda decisão foi proferida em face do recurso de reposición apresentado contra a primeira, tendo confirmado-a em quase sua totalidade (ver anexos 7 e 8, principal). 10 Ver a intervenção do advogado William Gil no anexo 1 e sua entrevista a este no anexo 3 (principal). 11 Anexo 3 (principal).

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administrativa contra o INCORA, pelo fato do procedimento de especificação, demarcação

e desalojamento das Ilhas do Rosário não ter alcançado seus objetivos. No ano 2001, esta

ação foi julgada procedente em primeira e segunda instância12. Nestas decisões se reiterou o

caráter de terreno baldio reservado da Nação das Ilhas do Rosário e a obrigação da

instituição estatal demandada de retirar os ocupantes indevidos.

Como resultado destas decisões judiciais, em meses recentes, o Instituto Colombiano de

Desenvolvimento Rural INCODER (instituto que substituiu o INCORA e outros

organismos do Estado a partir de 200313) foi obrigado a emitir múltiplas resoluções nas

quais ordenou aos donos de casas e hotéis das Ilhas do Rosário a retirada imediata dos

prédios, sob pena da Polícia Nacional os exigir na força, sem direito algum ao pagamento

do custo das edificações e demais melhorias ali realizadas14. Vários recursos de reposición

apresentados contra estas resoluções já foram julgados improcedentes pelo INCODER.

O risco iminente de despejo dos agora meros possuidores das Ilhas do Rosário causou uma

imensa agitação nos últimos meses, dado que foram afetados somente membros da elite

mais importante da sociedade colombiana. Entre eles se encontram ex-presidentes,

membros do governo, congressistas, políticos e regionales (regionais), grandes empresários,

diretores de periódicos, atores de teatro e desenhistas de moda, dentre outros. Estes

personagens contam com uma notoriedade pública tal que, ao ir às Ilhas do Rosário em

lanchas turísticas, parte da informação relevante que os guias de turismo oferecem consiste

em revelar aos seus atentos espectadores de quem é cada uma das casas das Ilhas que se

observam da lancha.

Por isto é que nos últimos meses a notícia ocupou a primeira página dos principais meios

de comunicação do país, tanto nacionais quanto regionais, onde foi veiculado, entre outras

12 As decisões foram proferidas pela terceira seção do Tribunal Contencioso Administrativo de Cundinamarca em primeira instância e pela quarta seção do Conselho de Estado em segunda instância. Para o texto desta última, ver o anexo 9 (principal). 13 Para o decreto de criação do INCODER, que especifica as funções que este herdou do INCORA e de outras autoridades administrativas, ver anexo 5 (complemento). 14 Ver as entrevistas ao Representante Jurídico do INCODER (anexo 10, principal) e do advogado William Gil (anexo 3, principal).

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coisas, que “jet-set criollo” está sendo submetido a uma expropriação sem indenização15. O

país inteiro se surpreendeu com o fato de o Estado estar prejudicando pessoas tão

importantes. Inclusive os próprios afetados estão surpresos, uma vez que utilizaram todo

tipo de conexões para aproximarem-se dos Ministros da Agricultura e do Interior y la

Justicia, e inclusive do Presidente da República, para manifestarem seu descontentamento

com os acontecimentos e para solicitar a ajuda deles para solucionar a situação16. Como

afirma a antropóloga Lavinia Fiori,

“até mesmo os proprietários de hotéis e casas de diversão estão desorientados pelo

empenho do Estado em retirar todos os que ocupam as Ilhas dali. Não entendem como

o Estado pode atentar contra privilégios de pessoas da elite mais importante do país,

como eles”17

.

Precisamente em meio a este desconcerto generalizado ante as transformações que se

avistavam, ocorreu a reunião do dia 23 de janeiro de 2006 entre os “possuidores brancos”18

e os representantes da comunidade negra das Ilhas do Rosário, que, embora ocupem um

mesmo espaço, enfrentam, no momento, situações muito distintas, e contam com

estratégias muito diferentes para superá-las.

A comunidade negra ainda não havia se visto afetada de maneira direta pelas decisões de

desalojamento da INCODER, tendo em vista que poucos nativos ainda são proprietários de

algum pedaço de terra sobre as Ilhas19, e que alguns organismos do Estado haviam

manifestado sua intenção de deixar que os nativos permanecessem nas Ilhas depois dos

15 Diário Nacional El Tiempo, 17 de janeiro de 2006 (anexo 11, principal). Ver também os anexos 12 e 13 (principais). 16 Ver a respeito a transcrição da reunião dos possuidores das Ilhas, contida no anexo 1 (principal) e a segunda entrevista da antropóloga Lavinia Fiori (anexo 14, principal). 17 Anexo 14 (principal). 18 Assim é que os nativos chamam os donos de casas e hotéis, embora a grande maioria da população colombiana seja mestiça. Os afro-colombianos costumam chamar de branco todo aquele que não é de raça negra. 19 Ver a entrevista da “negra Elisa” na reunião de possuidores (anexo 1, principal) e a entrevista de William Gil (anexo 3, principal).

6

desalojamentos, na qualidade de usufrutuários20. Por isto, um Procurador Delegado para

Assuntos Ambientais afirma:

“Eles – a população afro-descendente – são pessoas que a lei considera parte

integrante do ecossistema ... (e que) portanto o desalojamento não vai atingir de

nenhuma maneira. O que ficará “gritando”, por assim dizer, é o invasor das terras –

isto é, os brancos que tem casas de diversão lá”21

.

No entanto, os nativos sentem uma grande ameaça frente à possibilidade de que, dada a

precariedade de seus direitos sobre a terra e a postura negativa das autoridades ambientais

frente à sua permanência nas Ilhas, também eles sejam desalojados e se somem aos milhões

de deslocados que existem na Colômbia22. Por esta razão, aproveitaram a oportunidade que

inconscientemente lhes abriu a declaração oficial das Ilhas do Rosário, ao se referir a bens

baldios, para iniciarem o processo de reclamação da titulação coletiva da terra previsto na

lei 70 de 199323. Com efeito, como sustentam os representantes da comunidade,

“o Conselho Comunitário Afro-descendente das Ilhas do Rosário decidiu empreender

o processo de requerimento do título coletivo de seus antigos territórios (segundo o

estipulado pela Lei 70 de 1993) como mecanismo de defesa ante a ameaça de

deslocamento promovida pelo Estado colombiano através do INCODER”.24

A Lei 70 foi criada para regulamentar o artigo 55 transitorio (das disposições transitórias)

da Constituição Política de 1991, que reconheceu às comunidades colombianas negras com

práticas tradicionais de produção, a condição de minoria étnica e cultural digna de proteção

especial pelo Estado, e consagrou seu direito de propriedade coletiva sobre as terras baldias

20 Ver a entrevista conjunta da Representante Jurídica de INCODER e a do Procurador Agrario y Ambiental (anexo 10, principal), assim como o artigo 9 do acordo proferido por INCODER para propor uma solução a situação dos atuais ocupantes das Ilhas (anexo 15, principal). Observe também o artigo de imprensa contido no anexo 11 (principal). 21 Anexo 10 (principal). 22 Dito temor é revelado no documento escrito da apresentação que os nativos fizeram na reunião com os possuidores brancos (anexo 4, p. 9, principal). Para os dados do fenômeno de deslocamento interno na Colômbia em geral, e em Cartagena em particular, ver anexo 6 (complemento). 23 Anexo 16 (principal). 24 Anexo 4, p. 9 (principal).

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rurais e ribeirinhas que ocupam, assim como outros direitos destinados à proteção de sua

identidade cultural e à promoção de seu desenvolvimento sócio-econômico.25 Esta lei (que

já tem sido aplicada às comunidades negras do pacífico colombiano) busca então preservar

as diferenças culturais dos afro-colombianos e, ao mesmo tempo, garantir que seus

membros obtenham uma igualdade real de oportunidades em relação ao resto dos membros

da sociedade, igualdade que não tiveram durante cem anos de discriminação.

Não obstante, tanto a lei 70 como seu decreto regulamentar estabelecem um requisito

bastante rigoroso para que uma comunidade negra possa ser credora dos benefícios que ali

se estipulam. Em particular, além de seguir devidamente o complexo procedimento para a

solicitação do título previsto nas normas26, os afro-colombianos têm que demonstrar sua

condição de minoria étnica e cultural e devem solicitar o título de uma terra sobre a qual

possa se processar dita titulação. Por isto, embora a comunidade negra das Ilhas do Rosário

já tenha cumprido boa parte do procedimento ao apresentar formalmente a solicitação de

titulação coletiva da terra uns dias depois da reunião com os brancos27, seu êxito não está

de nenhuma maneira garantido.

Em primeiro lugar, os nativos das Ilhas devem provar sua condição de comunidade negra, o

que implica demonstrar que contam com uma cultura, uma história, uma tradição e um

costume próprios, que os distinguem de outros grupos étnicos. A diferença das

comunidades negras do Pacífico colombiano e do Arquipélago de San Andrés, Providencia

e Santa Catalina28, dos nativos das Ilhas do Rosário não é tão fácil de ser comprovada

porque eles estão muito mais assimilados com a cultura hegemônica. Com efeito, estes não

contam com uma língua nem com uma religião próprias, e não tem uma forma de

25 Constituição Política da Colômbia de 1991, artigo transitorio (ADCT?) 55 (anexo 17, principal). 26 Para uma descrição detalhada deste procedimento, ver o decreto contido no anexo 7 (complemento) e o resumo (anexo 8, complemento) do acápite do decreto relativo a este procedimento, contido no livro de Francisco Javier Ocampo Villegas, intitulado Derecho Territorial

de las comunidades Negras (Editorial Nueva América, Bogotá, 1996). 27 Esta solicitação foi apresentada ao INCODER no início do mês de fevereiro do ano em curso e, até o momento, não foi resolvida. O anexo 18 (principal) contêm um dos rascunhos finais da solicitação. 28 Para uma descrição superficial das particularidades destas comunidades, ver os anexos 9 e 10 (complementos).

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organização sócio-econômica radicalmente distinta daquela dos brancos. Mais ainda, os

nativos das Ilhas sofreram processos importantes de mestiçagem e participam das formas de

produção e consumo próprios da cultura majoritária, seja como empregados das casas e

hotéis dos brancos, seja oferecendo a estes bens e serviços.

Por isto, faz algum tempo que nem os próprios nativos se consideram uma minoria étnica e

cultural distinta. Além do mais, dificilmente se consideravam negros, pois a imagem

preponderante do negro colombiano é, nas palavras de Carlos Duran, aquela do “negro

azul” e do “negro puro” que se encontra em todo o Pacífico; não a do negro mestiço que

habita o Caribe29. Disto é que os próprios negros suelan chamar a si próprios “morenos”.

O auto-reconhecimento de sua diferença foi muito influenciado pelo trabalho de

recuperação da identidade e de fortalecimento da comunidade que nos últimos anos a

antropóloga branca Lavinia Fiori e sua equipe de trabalho30 realizou com eles. Este trabalho

combinou elementos de educação ambiental para o desenvolvimento sustentável com a

conscientização da comunidade negra acerca de suas particularidades culturais e de sua não

inferioridade com relação aos brancos. Como resultado, os nativos das Ilhas indagaram pelo

seu passado e começaram a construir uma história ancestral comum ao grupo que lhes

permite falar de si mesmos como uma comunidade negra com traços étnicos e culturais

particulares.

Esta história, que foi brevemente narrada pelos representantes da comunidade aos donos de

casas e hotéis das Ilhas na reunião de 23 de janeiro31, conta que a população afro-

colombiana que atualmente habita as Ilhas do Rosário e que conta com quase 600

indivíduos que se agrupam em 170 famílias32, provém originalmente da Ilha continental de

29 Entrevista a Carlos Duran (anexo 19, principal). Para uma análise teórica do problema da centralidade do negro no negro do pacífico, ver o anexo 11 (complemento) no resumo de Eduardo Restrepo. 2004. “Hacia los estudios de las Colombias Negras”, no Axel Alejandro Rojas Martínez (comp.), Estudios Afrocolombianos, Aportes para un estado del arte (Editorial Universidad del Cauca, Popayán). 30 Lavinia Fiori iniciou este processo na década nos anos noventa no âmbito da Unidade Especial de Parques Nacionais da área, e continua na atualidade desde a Fundação não governamental. 31 Ver os anexos 1 e 4 (principais). 32 Ver o censo da população nativa das Ilhas, contido no anexo 18 (principal).

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Barú e mantém ainda nexos familiares estreitos com seus habitantes. Segundo a versão dos

antropólogos, Barú sempre foi o centro populacional da comunidade afro-colombiana das

Ilhas, pelo que a distinção entre um lugar e outro, e uma população e outra, resulta

artificial; os nativos se transportam de um lugar a outro como se fosse o mesmo território.33

Na história narrada pelos nativos, os brancos são, sem dúvidas, um ator de importância

fundamental, pois sua identidade foi inventada em boa parte pelas relações que foram

estabelecidas com eles. Na década de 50, com as primeiras lanchas de motor (traídas)

levadas a Cartagena, chegaram também os primeiros brancos às Ilhas do Rosário34. Neste

momento, o cultivo de coco havia sido atacado pela praga da porroca e, portanto, os nativos

estavam em uma profunda crise econômica. Segundo eles, isto fez com que seus

antepassados consentissem, sem nenhuma objeção, em vender suas terras aos brancos,

aparentemente a preços muito baixos35. Duas décadas depois, chegaram também às Ilhas

brancos oriundos do interior do país, também interessados em comprar terras.36 Em um e

outro caso, os novos proprietários brancos construíram casas de diversão e alguns hotéis

(sete na Ilha Grande) nas bordas das Ilhas que dão ao mar.

Evidentemente, esta situação gerou uma mudança substancial nas dinâmicas sociais e nas

atividades econômicas dos nativos, pois a maioria deles era contratada como empregado

doméstico das casas e hotéis, e o restante se dedicava a atividades relacionadas com o

turismo informal (transporte de lanchas, venda de peixe e refeição a visitantes, etc.). Como

resultado disto, muitos nativos construíram suas casas na parte detrás dos prédios de seus

patrões e se tornaram em boa medida dependentes econômicos deles.37 A dependência

econômica dos nativos em relação aos brancos se aprofundou ainda mais nas últimas

33 Ver os anexos 5 e 19 (principais). Para alguma informação sobre a Ilha de Barú, seus povoadores iniciais e seus vínculos com as Ilhas do Rosário, ver o anexo 12 (complemento). 34 Segundo Pedro Luis Mogollón, os primeiros brancos que chegaram às Ilhas do Rosário foi um grupo de cartageneros que gostavam muito de pesca e que, como seus pais, iam buscar “bajos” para pescar, se apaixonavam pelo lugar, e decidiam comprar uma terra (anexo 2, principal). 35 Ver anexos 1, 4, 5 e 19 (principais). 36 Ver anexos 2, 4 e 5 (principais). 37 Ver anexos 4 e 5 (principais). Para uma análise teórica desta dependência econômica e da discriminação sócio-econômica e racial dos negros das Ilhas derivada dela, ver o artigo do antropólogo Carlos Duran, contido no anexo 13 (complemento), e o resumo do mesmo (anexo 14 complemento).

10

décadas, devido à legislação ambiental estrita que se aplica sobre a região, e que restringe

de maneira importante as atividades que permitiriam a auto-subsistência dos nativos, tais

como a pesca. Por isto, a manutenção dos afro-colombianos se baseia hoje em dia, em face

de tudo, em suas relações (de trabalho e de oferta de serviços de turismo) com os brancos.

Um exemplo bastante revelador desta dependência é oferecido pelo fato de que a grande

maioria de nativos somente pode ter acesso aos serviços de água potável e energia na

medida em que os brancos lhes permitam utilizar seus tanques de água (traída oriundas de

Cartagena, dada a grande escassez de água da chuva) e suas plantas elétricas.

A dependência econômica foi sempre acompanhada de importantes doses de racismo por

parte dos brancos. Este racismo é, entretanto, bastante distinto, segundo se trate de brancos

cartageneros e de brancos provenientes do interior do país. Como relatam os membros da

comunidade negra, muitos foram criados com os filhos dos proprietários cartageneros e

foram mantidos com eles nos arredores. O racismo consiste, neste caso, em um servilismo

extremo dos primeiros e em um paternalismo exacerbado de parte dos segundos38. As

relações com os brancos oriundos do interior são, entretanto, bastante distintas, pois estes

mostraram desconfiança frente aos nativos desde o início, e optaram por trazer seus

próprios trabalhadores do interior. Esta desconfiança se fundou, ao mesmo tempo, no fato

dos nativos terem causado uma série de incidentes de roubo a suas casas e hotéis, o que

criou uma visão negativa deles. Esta situação produziu uma relação de conflito latente entre

brancos e negros, alimentada pelo fato de que cada vez mais brancos se abstêm de contratar

negros para as atividades domésticas e de hotelaria39. Como ilustra o comentário de Ever de

la Rosa, líder da comunidade negra das Ilhas,

“… nas suas relações posteriores com os brancos houve muita discriminação. Eles

nunca têm um conceito positivo dos nativos, os consideram frouxos, irresponsáveis,

etc. Por isto, geralmente os brancos trocam os nativos por gente de fora. Eu sei

que não é toda gente que é boa, mas não entendo por que não nos trocam por gente

da Ilha. … Hoje em dia menos da metade dos que zelam pelas casas de diversão

38 Ver o anexo 19 (principal). 39 Ver anexos 5, 19 e 20 (principais).

11

são nativos. A maioria é de fora, e há alguns deles que a lei proibiu que se

relacionassem com os nativos, como os trabalhadores de Alberto Iglesias…

Em conclusão, é uma dificuldade. Os brancos não nos dão trabalho e parecem ter

uma aliança com o Estado para nos mandarem embora das Ilhas”.40

Isto tem produzido, por sua vez, sentimentos de ressentimento por parte dos negros, que se

traduzem em novos atos delitivos contra os bens daqueles, assim como em formas de

resistência sutis, tais como o uso do picó, un parlante gigante (auto-falante / caixa de som)

de dois pisos que os nativos utilizam em suas festas para ouvir sua música a volume

altíssimo, o que incomoda muito a tranqüilidade dos possuidores brancos. Segundo Ever de

la Rosa,

“Há muitos ressentimentos que dirigem as comunidades frente certos donos de

estabelecimentos porque nos insultam e discriminam. Más que haciéndoles vainas

malas, isto se reflete com o barullo. Quando um branco nos quer mal, pues le

ponemos un picó al lado de la casa, y aunque nos piden que le bajemos a la

música, nosotros decimos entre nosotros: ‘tú en tu casa haces lo que se te da la

gana’. Y ellos no pueden hacer nada porque acá no hay autoridades”.41

Apesar de com a chegada dos brancos terem se criado nas Ilhas novas dinâmicas sociais e

econômicas, que conduziram a importantes formas de hibridismo cultural, apoiados no

discurso dos antropólogos, os nativos alegam que até hoje mantém características culturais

que os distinguem como minoria étnica e cultural. Entre estas características estão suas

concepções particulares de tempo (o trabalho de madrugada para descansar o resto do dia;

viver a vida dia a dia, sem planejá-la, etc.) e de espaço (o mar como parte do território, o

uso coletivo das plantações), suas crenças sobre o diabo e sua relação com o dinheiro fácil e

mal empregado; seus conhecimentos medicinais e ambientais; suas estruturas familiares

matriarcais, com pais itinerantes e multiplicidade de filhos de pais distintos; seu extenso

conceito de família; suas prematuras idades de iniciação sexual (dos 13 aos 15 anos); suas

40 Anexo 20 (principal). 41 Ibídem.

12

formas familiares (não institucionalizadas) de resolução de conflitos; sua música (a

champeta, o bullerengue, etc.) y el alto volumen al que la escuchan en los picos; a

importância que dão ao azar, entre várias outras.42

Cada vez mais convencidos pelo discurso de sua identidade étnica e cultural, em 2001 os

líderes da comunidade negra das Ilhas do Rosário decidiram invadir um terreno localizado

na Ilha Grande, cuja propriedade extinguida a un narcotraficante (havia sido retirada de

um), para fundar ali o povo de Orika43. Apesar dos problemas penais que esta invasão

trouxe aos que a lideraram, Orika trouxe uma solução importante ante a explosão

demográfica das Ilhas. Ali vivem, atualmente, os descendentes das famílias que habitam

nos arredores das casas dos brancos; por isto a média da idade do povo é de 17 anos44. Mas,

sobretudo, a fundação de Orika construiu um momento chave da organização política da

comunidade, e uma etapa prévia de grande importância para a solicitação da titulação

coletiva da terra. Como nos disseram seus representantes,

“em 2001, a comunidade conheceu os direitos especiais que outorga a lei 70 de 1993 e

confirmou o Conselho Comunitário das Ilhas do Rosário. Com o Conselho

Comunitário, os nativos fundaram um povo ao qual chamaram ‘Orika’”45

.

O território onde se encontra este povo é, ademais, manuseado como propriedade coletiva

pelo Conselho Comunitário, o que, sem dúvida, é um bom precedente de aplicação da lei

70.

Entretanto, em geral, as características nas quais a comunidade negra se baseia para

reivindicar sua diferença são próprias de todos os membros do Caribe colombiano, ou pelo

menos daqueles que habitam a zona de Cartagena e seus arredores, Barú, Ilhas do Rosário, 42 Ver anexos 4 e 19 (principais). 43 Anexos 4, 5 e 19 (principais). “Orika” é o nome da filha de um herói afro-descendente, um dos primeiros a resistir à escravidão na América (anexo 4, p. 8., principal). Segundo o antropólogo Carlos Durán, esta “lenda negra ... apenas sabem dela os líderes políticos, se o senhor perguntas as pessoas comuns da comunidade sobre Orika, não sabem quem é” (anexo 19, principal). 44 Ver anexos 5 e 19 (principais). 45 Anexo 4 (principal).

13

Ilhas de San Bernardo del Viento, Ilha Fuerte, Tolú, etc. No entanto, se admitir-se que estas

características realmente permitem que uma comunidade negra seja considerada minoria

étnica e cultural, somente poderiam reclamar os direitos especiais previstos na lei 70

aquelas comunidades que conseguissem demonstrar ao Estado que as terras que habitam

são rurais e baldias. Isto excluiria de plano, por exemplo, os habitantes de Barú, Cartagena

e seus arredores.

Isto suscita dúvidas sobre a justiça de um eventual reconhecimento do direito à propriedade

coletiva da terra dos nativos da Ilha, tendo em vista que –como os próprios antropólogos

que têm assessorado a comunidade da Ilha afirmam para o caso de Barú46- se trata da

mesma população e da mesma cultura e, não obstante, somente alguns poderiam ter acesso

aos benefícios oferecidos pelo conceito de pertencerem a referida cultura. Estas questões se

acentuam pelo fato de que a população negra em geral, e a de Cartagena e seus arredores

em particular, é uma das mais pobres do país47, o que poderia conduzir a uma interpretação

segundo a qual o discurso da diferença étnica e cultural seria uma forma de conquista dos

benefícios estatais em um contexto em que os recursos são muito escassos, e, assim, como

uma nova forma de discriminação, agora contra os próprios negros48.

É que um dos problemas fundamentais que os afro-colombianos enfrentam para terem

acesso aos direitos especiais contidos na lei 70 é precisamente que, apesar da maioria deles

viver em zonas urbanas e de propriedade privada –como é o caso de quase todos os negros

do Caribe colombiano-, esta exige que habitem em terras rurais e baldias. Inclusive para a

comunidade negra das Ilhas do Rosário, este requisito torna-se problemático, tendo em

vista que, mesmo que a terra sobre a qual se habita seja um terreno baldio de caráter rural

46 Anexos 5 e 19 (principais). 47 Para os dados sobre a situação de pobreza dos afro-colombianos em geral e na costa Atlântica em particular, ver o anexo 15 (complemento). 48 É isto que Cunin chama de “neo-racismo cultural”, que se manifesta no momento em que a população afro-colombiana é duplamente discriminada: “uma primeira vez por sua exclusão da igualdade democrática, e uma segunda vez por sua exclusão do direito à diferença”, Elisabeth Cunin. 2004. “Formas de Construcción y Gestión de la Alteridad. Reflexiones sobre ‘Raza’ y ‘Etnicidad’”, en: Axel Alejandro Rojas Martínez (comp.), Estudios Afrocolombianos, Aportes para

un estado del arte (Editorial Universidad del Cauca, Popayán), pp. 68-69. Para um resumo deste texto, ver o anexo 11 (complemento).

14

se trata de um terreno baldio reservado, que, ao ter esta aparência, acaba excluído da

possibilidade de ser adjudicado em virtude da lei 7049. Por isto, para que sua solicitação de

titulação pudesse proceder, o Estado teria que tirar o caráter de reserva territorial das Ilhas

do Rosário. No entanto, este procedimento parece não estar previsto em nenhuma

regulamentação.

Mas este não é o único problema que a comunidade negra tem para ter acesso à propriedade

coletiva da terra. Também há o fato de que, nos últimos anos, as autoridades ambientais

começaram a ver sua permanência nas Ilhas como um elemento negativo na conservação e

recuperação do meio ambiente. Com efeito, com a nova administração da Unidade de

Parques Naturais a cargo de um membro do exército50, a política ambiental tem se

transformado de maneira substantiva nas Ilhas do Rosário. Por um lado, esta nova

administração tem descuidado muito do programa de educação ambiental “Parques com la

Gente”, através do qual na última década se alcançaram muitos avanços em matéria de

conscientização dos nativos sobre a importância de se cuidar do ambiente que o rodeia, tais

como a criação de um grupo de mulheres para a coleta de lixo, chamado “Ilha Limpa”, a

criação de um grupo de jovens ecoguias, a realização de cultivo de caracol pala, a

construção de “pallaos” em alto mar para a pesca de peces pelájicos e para substituir assim

a pesca com dinamite, entre muitos outros51.

De outra parte, em maio de 2005, as Ilhas do Rosário foram declaradas “área marinha

protegida”, o que implica a imposição de uma legislação ambiental muito restrita na zona52.

Desde 1977, estas Ilhas foram consideradas zona amortecedora do parque natural53 e, em

conseqüência, foram submetidas a importantes restrições ambientais, tendentes a minimizar

o impacto da ação humana no parque54. No entanto, como resultado desta nova

regulamentação, o grau de intervenção humana se limitará ao máximo nas Ilhas do Rosário.

49 Número 9 do artigo 19 do decreto regulamentar da lei 70 (anexo 7, complemento). 50 Ver anexo 16 (complemento). 51 Ver anexos 5, 6 e 14 (principais). 52 Para o texto da Resolução que contém dita declaração, ver o anexo 17 (complemento). 53 Sobre o conceito de zona amortecedora, ver o artigo 330 do Código Nacional de Recursos Naturais Renováveis e de Proteção ao Meio Ambiente (anexo 18, complemento). 54 Neste sentido, ver a entrevista contida no anexo 19 (complemento).

15

Ainda, o território destas foi dividido em várias zonas, nas quais, dependendo de sua

situação de deterioração e fragilidade ambientais, poderiam ser realizadas mais ou menos

atividades, mas em todas elas a proibição da intervenção humana será a regra e a permissão

será a exceção.

Assim, por exemplo, nos lugares declarados zonas de recuperação por haverem sofrido

danos ambientais importantes, como as lagoas internas e os manglares (manguezais),

somente poderão ser realizadas atividades de monitoramento, investigação, educação

ambiental e pesca de subsistência. Em outras áreas das Ilhas, são permitidos a pesca, a

agricultura, o ecoturismo e a recreação, entre outras, somente na medida em que se trate de

atividades sustentáveis e de baixo impacto55. O enrijecimento da legislação ambiental

aplicável às Ilhas do Rosário encontra justificação na grave deterioração ambiental que

sofreu a área nas últimas décadas e que tem haver, em especial, com o “branqueamento” e

com a morte dos corais do parque natural, com a contaminação das lagoas internas das

Ilhas, produto do mau uso de lixo e de resíduos de fezes humanas56, com a queima e corte

de manglar, e risco de extinção do bosque seco, etc.

Apesar disso, a antropóloga Lavinia Fiori –ex-funcionária da Unidade de Parques das Ilhas,

que renunciou ao seu cargo em boa medida por seu desacordo com a expedição da

regulamentação comentada- acredita que esta nova legislação impõe aos nativos uma carga

muito árdua para suportar, pois sua sobrevivência depende principalmente do uso dos

recursos naturais e da intervenção no meio ambiente, pelo que esta não pode ser limitada de

maneira tão desmedida. Segundo Fiori, é desproporcional que os nativos assumam esta

carga, dado que muitos dos fatores de deterioração ambiental das Ilhas, e em especial

aqueles relacionados ao branqueamento e morte dos corais, não foram causados pelo mau

uso dos recursos naturais pelos seus ocupantes, mas sim por fatores estranhos a eles, como

55 Ver anexo 17 (complemento). 56 Os nativos das Ilhas não tomam banho em suas casas, pois, tradicionalmente, vão “aos montes” nas proximidades das lagoas, fazer suas necessidades. Segundo Rafael Vieira, trata-se de um problema cultural que é necessário enfrentar através da educação (ver anexo 6, principal).

16

o aquecimento global e o depósito e nutrientes que envolvem o Canal do Dique (construído

pelo Estado ao lado de Barú) ao mar que rodeia as Ilhas57.

De outra parte, como sustenta um funcionário da Unidade de Parques do Ministério do

Meio Ambiente, muito da deterioração ambiental causada pelos nativos se apresenta como

conseqüência de sua subordinação de trabalho frente aos brancos, dado que os primeiros

levam a cabo atividades prejudiciais ao meio ambiente para satisfazer pedidos dos

segundos, tais como a pesca ilegal e construções em lugares ou com recursos naturais não

permitidos.58

Além do mais, segundo Lavinia Fiori, o mau uso dos recursos naturais por parte dos nativos

tem diminuído qualitativamente como resultado dos programas de educação ambiental,

pelo que se poderia pensar que a continuidade destes programas poderia resolver o

problema ambiental sem colocar em risco a sobrevivência da comunidade afro-colombiana.

Por isto, para muitos é estranho que o Estado queira proteger com tanta veemência o

ecossistema de terra firme das Ilhas do Rosário que, na realidade, fora os mangues, as

lagoas internas e o bosque seco, tem muito pouca riqueza em termos de biodiversidade. Nas

palavras de Vieira,

“aqui não há nada; a terra é infértil e o que valia a pena na realidade era o arrecife

de coral”59

.

Além disso, o desejo de intervir tão ativamente na proteção do meio ambiente contrasta

radicalmente com a presença quase nula que tradicionalmente tem tido o Estado nas Ilhas

do Rosário. Apesar da grande quantidade de autoridades estatais que em teoria têm

competência para exercer funções de várias naturezas nas Ilhas do Rosário60, na área

57 Ver, neste sentido, os comentários de Lavinia Fiori sobre o tema, na transcrição da reunião com os possuidores brancos (anexo 1 principal). Ver também os anexos 5 e 14 (principais). Rafael Vieira tem a mesma opinião de Lavinia Fiori, no sentido de que as causas da deterioração dos corais são alheias aos nativos (ver anexo 6 principal). 58 Ver anexo 19 (complemento). Neste mesmo sentido, ver anexo 20 (principal). 59 Anexo 6 (principal). 60 Para uma contagem de todas as autoridades que teoricamente têm competências sobre as Ilhas, ver o anexo 20 (complemento).

17

(corregimiento) do distrito turístico de Cartagena, a única autoridade que tem presença

permanente e efetiva é a Unidade de Parques Nacionais –localizada na Ilha Grande- e a

Armada Nacional –localizada na Ilha Naval, com competência exclusivamente marítima e

principalmente com funções de vigilância das embarcações-.

Nas Ilhas do Rosário não há nenhuma autoridade administrativa nem de polícia; tampouco

há juiz. Nem sequer há igreja. Esta unicamente se faz presente uma vez por ano, quando

para as festas da Virgem um pároco visita as Ilhas e batiza todas as crianças que nasceram

naquele ano. Só há uma professora para a escola primária (cuja infra-estrutura foi doada

pelas senhoras donas de casas e hotéis das Ilhas) e um médico que hace allí su año rural.

Ante esta situação, o líder afro-colombiano Juan de Dios Mosquera –Diretor de Cimarrón,

Movimento Nacional pelos Direitos Humanos das Comunidades Afro-colombianas-,

manifesta-se, se referindo aos nativos como “novos irmãos das Ilhas do Rosário”:

“Ali foi um lugar isolado durante muitas gerações, e nestas ilhas não havia

presença do Estado. De vez em quando apareciam os navios da Armada Nacional

fazendo exercícios militares, mas estas ilhas eram paraísos naturais habitados

pelos afro, onde eles faziam a nação colombiana: eles faziam a nação ...

construíam uma pátria e soberania nela (construíam uma pátria e soberania

nela)”.61

Vários suspeitam, como conseqüência disso, que por trás da expedição de normas

ambientais tão restritas está a intenção das autoridades ambientais de desalojar os afro-

colombianos da área, possivelmente para outorgar o parque natural e suas proximidades a

um concessionário privado que explore seu potencial eco-turístico e que lhe administre

eficientemente.62 Estas suspeitas encontram respaldo na importância que o governo atual

tem dado ao turismo, como parte fundamental do Plano Nacional de Desenvolvimento

(PND), e às imensas expectativas de desenvolvimento turístico que o Estado tem visto em

Cartagena de Indias e Barú. 61 Ver anexo 21 (principal). 62 Ver neste sentido as entrevistas à antropóloga Lavinia Fiori (anexo 5 e 14, principais) ao líder afro-colombiano do Movimento Cimarrón Juan de Dios Mosquera (anexo 21, principal) e ao dono de Oceanario das Ilhas Rafael Vieira (anexo 6, principal).

18

Com efeito, um dos eixos fundamentais do plano de governo é o impulso de uma política

agressiva de desenvolvimento turístico que permita que este se converta em um dos

principais setores da atividade econômica nacional, capaz de impulsionar sua

competitividade.63 Dentro desta política, a área de Cartagena e Baurú tem imensas

potencialidades de desenvolvimento de projetos turísticos, e o Plano de Ordenamento

Territorial (POT) da área64, tem como objetivo principal explorá-la. Em particular, o POT

expressa a importância de desenvolver projetos turísticos de grande envergadura nas praias

brancas nos arredores de Cartagena das quais é proprietário o Estado, entre as quais se

destacam as extensas praias de corregimiento de Barú. Este tipo de projeto é necessário

para aumentar a planta hoteleira de Cartagena que cada vez se torna mais (hace más)

insuficiente e, especialmente, para suprir a falência das praias que têm, que apresentam

sérios problemas de contaminação (pelas águas negras e pela sujeira da cidade) e são muito

estreitas para a grande abundância de turistas que a visitam. A idéia do Estado é, então,

equipar as praias de Barú de forma tal que elas ofereçam todo tipo de serviços turísticos

sofisticados como grandes hotéis, construções de cruzeiros, portos para yates, campos de

golf, empresas de transporte marítimo e terrestre, etc.65

Dentro destes planos estatais, as Ilhas do Rosário aparecem como um destino turístico que

os hóspedes dos hotéis de Barú poderiam visitar durante o dia, e que atrairia visitantes

interessados mais no eco-turismo do que no turismo de luxo. Com efeito, as Ilhas contam

com muito poucas praias, pelo que a construção nelas de grandes projetos hoteleiros é

bastante pouco provável.66 Por isso que o POT trata como uma prioridade a criação de uma

empresa de navegação que normalize, entre outras, a rota Barú-Islas del Rosário-Barú67.

De outra parte, os planos governamentais de desenvolvimento turístico também tem em

vista o eco-turismo, e a estratégia governamental para incentivar seu desenvolvimento

consiste na “promoção da participação privada na prestação de serviços de eco-turismo no 63 Ver anexo 21, p. 134 (complemento) e anexo 22, p. 1 (complemento). 64 Anexo 22 (principal). 65 Ibídem, pp. 90-93. 66 Anexo 14 (principal). 67 Anexo 22 (principal), p. 93.

19

Sistema De Parques Nacionais Naturais – SPNN”68. De fato, segundo o governo, o SPNN

enfrenta sérios problemas de sub-utilização da capacidade instalada e de mal estado de sua

infra-estrutura, de altos custos de manutenção e operação, e de um escasso e inadequado

desenvolvimento dos serviços de eco-turismo, que impedem que seu potencial possa ser

aproveitado. Como solução alternativa a estes problemas, o governo decidiu misturar

operadores privados e especialistas em serviços turísticos, com o objetivo de melhorar a

eficiência e a qualidade destes serviços e otimizar os recursos do SPNN69.

No contexto desta política, o governo já deu em concessão quatro parques naturais

colombianos, há uma licitação aberta para a concessão de outro e se está estudando a

viabilidade de abrir novas licitações. Segundo os cálculos do Estado, estas concessões

permitirão aumentar os ingressos da Unidade de Parques Nacionais Naturais em cerca de

20%, pois segundo o desenho da concessão, os parques poderiam gerar 3 milhões de

dólares anuais aproximadamente. Por isto, tudo parece indicar que o Estado tem a intenção

de dar em concessão todos os seus parques naturais, salvo nos casos concretos em que seja

impedido por estudos de viabilidade dos negócios70. Evidentemente, entre estes parques

poderia estar aquele sobre o qual se localizam as Ilhas do Rosário, assim como as próprias

ilhas, pois estas, em princípio, são propriedade do Estado.

Sendo assim, quem suspeita que por trás da restrição da legislação ambiental nas Ilhas do

Rosário há poderosos interesses econômicos, acredita que a estes interesses se relaciona

também o empenho do Estado em alegar o caráter público da propriedade da terra das Ilhas

do Rosário e em desalojar seus ocupantes. Segundo esta posição, somente isso poderia

explicar o fato das influências políticas de membros tão importantes da elite colombiana

como os donos de casas e hotéis nas Ilhas não terem surtido nenhum efeito, e o fato deles

68 Este é um trecho do título do documento 3296 do Conselho Nacional de Política Econômica e Social CONPES (anexo 23, complemento). 69 Anexo 23 (complemento), pp. 4-12. 70 Ver, a respeito, o artigo da revista Dinero, contido no anexo 24 (complemento). Para as implicações que a figura da concessão tem nestes casos e para os Parques Naturais colombianos que foram dados em concessão, ver o anexo 25 (complemento).

20

estarem também surpresos e desorientados com a persistência do Estado em retirar-lhes

dali71.

Havia, segundo argumenta Lavinia Fiori, um poder econômico mais forte e influente do

que o poder das elites, e este poder econômico pretenderia incluir as Ilhas do Rosário em

um projeto turístico de grande magnitude. Os detentores deste poder econômico seriam, de

um lado, dois dos maiores grupos econômicos do país (o Santo Domingo e o Echavarría),

que já são donos de terras em Barú e que sustentam na atualidade conversas com o governo

para combinar as condições nas quais se desenvolverão ali os grandes projetos turísticos; e

de outro lado, o dono da maior agência de turismo do país (Jean Claude Bessudo, dono da

Aviatur), que estaria interessado em ser um eventual concessionário do parque natural das

Ilhas do Rosário, como já é de todos os parques que até o momento o Estado deu em

concessão72.

De qualquer maneira, frente ao panorama descrito anteriormente, a situação dos ocupantes

brancos e negros não parece ser, no que se refere ao problema da terra, muito distinta: a

instabilidade das situações em que se encontram e a precariedade de seus direitos coloca,

ambos, em uma situação de incerteza frente ao futuro. Neste contexto que uns e outros

assistiram a reunião de 23 de janeiro, em boa medida com o objetivo de alcançarem pontos

de convergência. Daí também que, no entanto, por terem interesses e objetivos conflitantes,

não alcançaram o ajuste. É que, como deixou claro o advogado William Gil nesta reunião,

dirigindo-se aos brancos,

“há dois problemas diferentes … Mas há um ponto comum que é o objetivo de

conferir às Ilhas o caráter de reservado para poder conceder a posse dos terrenos

a uns e outros, os nativos desejam que se mantenha o status de baldios, o que faria

que o resto de senhores ficassem mamando”73

.

71 Ver anexo 14 (principal). 72 Ibídem. 73 Anexo 1 (principal).

21

Com feito, se a reclamação dos nativos consistente na titulação tiver êxito, a dos brancos,

consistente no reconhecimento do caráter privado de dita propriedade, necessariamente terá

que fracassar, e vice-versa.

Os possuidores brancos se deram conta disto pouco tempo depois de iniciada a reunião,

justamente quando os representantes da comunidade negra começaram a informar-lhes sua

decisão de solicitar a titulação coletiva e a mostrar-lhes o mapa das terras que incluiriam

em dita solicitação.74 A elaboração deste mapa não era necessária para apresentar a

solicitação da titulação coletiva da terra, e é possível que o mesmo não seja levado em

consideração pelo INCODER em sua decisão, pois no caso da solicitação proceder, seria

este Instituto que definiria quais terras adjudicar ou não à comunidade, e esta definição bem

poderia incluir mais terras do que as solicitadas, assim como excluir algumas destas. 75

Não obstante, os nativos decidiram fazer o mapa e exibi-lo na reunião com os possuidores

brancos, em parte como demonstração da simpatia e carinho que sentem a respeito de

alguns deles, mas especialmente pelos intensos sentimentos de deferência, respeito e temor

reverencial que tradicionalmente tinham para com eles. Para muitos resulta difícil reclamar

a seus “senhores” terras que, durante muitos anos, acreditavam que somente pertenciam a

estes. Por isto, preferiam não confrontar com eles abertamente, mas sim tentar convencê-los

de que a solicitação que iam apresentar apenas os afetava de maneira muito marginal.

Porém, foi em vão. As reações agressivas dos possuidores brancos não se fizeram esperar.

Chamando-lhes de expropriadores ilegítimos e pronunciando serem os nativos ingratos com

74 O anexo 23 (principal) contém o mapa elaborado pelos nativos para estes efeitos. As áreas sombreadas são aquelas que os nativos desejam que lhes sejam tituladas, todas localizadas em Ilha Grande e Isleta. Note que na maioria dos casos as áreas sombreadas ilustram os terrenos atrás dos hotéis e das casas de recreação dos brancos (que dão ao mar), com algumas exceções que incluem aquelas terras com acesso ao mar cujo domínio foi extinto e cuja posse foi abandonada há muito tempo. Para contrastar este mapa com aquele que oficialmente tem o Estado no que se refere à propriedade das Ilhas do Rosário, ver anexo 26 (complemento). Ver também o anexo 27 (complemento) que contém as folhas de matrícula dos lotes das Ilhas do Rosário e onde aparecem, portanto, os nomes de seus proprietários, assim como a inscrição da declaração de seu caráter de baldios reservados. 75 Ver Anexo 14 (principal).

22

eles, os brancos demonstraram sua oposição absoluta à possibilidade de que os nativos

reclamassem sequer um pedaço de suas terras. Um deles se aproximou do mapa e disse:

“Aí há uns terrenos nossos, que subiram muito de preço”.

Outro disse:

“Praticamente vocês pretendem uma expropriação em benefício de vocês, sem

reconhecer o título de propriedade nosso”.

Um mais afirmou:

“Vocês tem que ter em conta tudo que nós fizemos por vocês: nós conhecemos os

fundadores destas Ilhas, compramos terras deles e com esta prata eles construíram

suas casas. Ainda, os contratamos como trabalhadores, lhes demos afeto, água,

etc.”76

.

Embora as reações dos possuidores brancos não sejam, por si, um impedimento para que os

nativos reclamem a propriedade coletiva das terras que ocupam, representam um obstáculo

para o processo, pois além do fato de que muitos deles podem se sentir intimidados por

contrariar a vontade de seus patrões, estes podem utilizar suas influências e sua assessoria

jurídica de grande qualidade para interromper o processo movido pela comunidade negra,

processo que, em oposição, não conta com nenhuma vantagem em termos de conexões,

influências nem assessoria jurídica.

Este não foi, no entanto, um obstáculo para que os nativos apresentassem sua solicitação de

titulação coletiva da terra nos primeiros dias de fevereiro. Esta solicitação não incluiu

finalmente o mapa, já que foi feita sobre a totalidade da terra.77

76 Anexo 1 (principal). 77 Ver anexo 18 (principal).

23

Desta forma, no momento presente, cada um dos atores do conflito está arriscando uma

estratégia distinta. Enquanto os nativos esperam a resposta do INCODER sobre a

procedência ou improcedência da titulação coletiva, os brancos tramitam seus processos

administrativos com a esperança de que os argumentos de seus advogados sejam escutados

e de que, em conseqüência, o Estado aceite que as Ilhas do Rosário saíram da propriedade

pública antes de 1821 e se abstenham de desalojá-los.78

Dado o antagonismo entre as reivindicações feitas por brancos e negros, é evidente que o

Estado não poderá enfrentar o problema recorrendo a soluções extremas, isto é, a soluções

que somente levem em conta os interesses de um dos atores em questão. Com efeito, nesta

situação há uma série de tensões entre princípios jurídicos e políticos, e elas não podem ser

resultado de apenas um dos pólos em tensão porque não é devidamente ponderado. No

entanto, se estas tensões não são submetidas a uma análise cuidadosa e equilibrada dos

distintos pontos de vista em conflito, e se desta análise não se obtém uma solução que

procure levar em consideração todas as aristas do caso, ele poderia conduzir a ampliação

dos conflitos sociais existentes. Por isto, se trata de um caso frente ao qual o Estado

colombiano deve projetar uma política pública que leve em conta os fatores jurídicos,

econômicos, políticos e sociais que compõe o caso, e deve procurar oferecer uma solução

satisfatória, equilibrada e justa.

Consciente destas dificuldades, em novembro de 2005, o INCODER produziu um

documento que pretende ser utilizado como proposta de solução desta situação79, e que

atualmente está sendo debatido pelo governo e pelos representantes dos brancos donos de

casas e hotéis nas Ilhas. Neste documento se reafirma que as Ilhas do Rosário são de

propriedade da Nação e constituem bens baldios reservados e, portanto, se excluem de fato

como possíveis soluções tanto se conceder aos nativos a propriedade coletiva da terra,

como reconhecer a existência de direitos de propriedade privada sobre as terras das Ilhas.

Além disso, o documento propõe, como alternativa de solução, de um lado, que os atuais 78 O argumento central dos advogados dos possuidores brancos consiste em que o cenário real contém títulos de propriedade privada com datas anteriores a 1821 que recaem sobre as Ilhas. Como tal, as resoluções de 1984 e 1986 estão fundamentadas em motivações falsas e devem, portanto, serem revogadas (ver anexos 1 e 3 principal). 79 Anexo 15 (principal).

24

possuidores realizem um contrato de arrendamento com o Estado, que tenha uma duração

de cinco anos prorrogáveis e uma porcentagem (canon) de 1% do valor do cadastro do

imóvel; e de outro lado, que os ocupantes de escassos recursos realizem com o Estado um

contrato de usufruto, de acordo com o qual aqueles poderiam usufruir os terrenos que

ocupam para fins habitacionais, sem nenhum custo. Em ambos os casos, se requereria a

renúncia dos atuais possuidores a qualquer reclamação da propriedade sobre a terra, e o

compromisso de que ali se aplicariam as normas ambientais.80

Analise criticamente esta solução oferecida pelo Estado colombiano e explique se se trata

ou não de uma solução equilibrada, completa e justa. Para isto, é necessário que (i) se

identifique quais são as principais tensões que permeiam o caso; (ii) se analise se a solução

governamental consegue ou não ponderar os diferentes extremos em questão, presentes nas

distintas tensões; e (iii) em caso negativo, se proponha uma solução que consiga alcançar

da melhor maneira este propósito.

80 Ibídem.