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O Colapso de Tudo - VisionvoxEsse argumento é o fio condutor deste livro. O colapso de tudo é um livro de conceitos e ideias. Para que estas páginas fossem tão acessíveis quanto

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Copyright © John L. Casti, 2011Publicado mediante acordo com HarperCollins Publishers

TÍTULO ORIGINALX-Events

CAPARaphael Pacanowski

PREPARAÇÃOClara Diament

REVISÃOTaís MonteiroMilena Vargas

REVISÃO DE EPUBJuliana Pitanga

GERAÇÃO DE EPUBIntrínseca

E-ISBN978-85-8057-265-0

Edição digital: 2012

Todos os direitos reservados à

EDITORA INTRÍNSECA LTDA.Rua Marquês de São Vicente, 99, 3º andar22451-041 – GáveaRio de Janeiro – RJTel./Fax: (21) 3206-7400www.intrinseca.com.br

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Aos c onhec ed ores d o d esc onhec id o

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SUMÁRIO

NOTA DO AUTOR

PREÂMBULO: QUAL É O X DA QUESTÃO

PARTE I: POR QUE O NORMAL JÁ NÃO É MAIS TÃO “NORMAL”

PARTE II: OS CASOS

1 APAGÃO DIGITALUma interrupção generalizada e duradoura da internet

2 QUANDO VAMOS COMER?O esgotamento do sistema global de abastecimento de alimentos

3 O DIA EM QUE OS ELETRÔNICOS PARARAMUm pulso eletromagnético continental destrói todos os aparelhos eletrônicos

4 UMA NOVA DESORDEM MUNDIALO colapso da globalização

5 FÍSICA MORTÍFERADestruição da Terra pela criação de partículas exóticas

6 A GRANDE EXPLOSÃOA desestabilização do panorama nuclear

7 ESGOTAMENTOO fim do suprimento global de petróleo

8 É DE DOERUma pandemia global

9 NO ESCURO E COM SEDEFalta de energia elétrica e de água potável

10 TECNOLOGIA FORA DE CONTROLERobôs inteligentes sobrepujam a humanidade

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11 A GRANDE CRISEDeflação global e o colapso dos mercados financeiros mundiais

PARTE III: EVENTOS X REVISITADOS

NOTAS E REFERÊNCIAS

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NOTA DO AUTOR

AO OLHAR RAPIDAMENTE A c apa d este l ivro, ser ia fác il pensar que setrata d e mais uma narrativa profétic a d e d esgraç as e tragéd ias, umrel ato d e apoc al ipses prestes a assol ar a humanid ad e e a c ond uzirnosso esti l o d e vid a d e vol ta aos pad rões d a era pré-ind ustrial .Porém, c omo c ostuma ac ontec er na vid a, as primeiras impressõespod em ser enganad oras, ou até mesmo c ompl etamente errad as. Oobjetivo d este l ivro não é apavorar ninguém. Muito pel o c ontrário.Mas, se aqui não se enc ontra uma visão infernal d e um futuropróximo, o que há nestas páginas?

O l ivro em suas mãos re l ata possibil id ad es, possibil id ad esd ramátic as, raras, surpreend entes, c apazes d e exerc er um enormeimpac to na vid a humana, sobre as quais mantemos a i l usão d e quenão têm rel aç ão c om nossos atos. Tais possibil id ad es c ostumam serabarc ad as pel a expressão genéric a “eventos extremos” . Prefiroc hamá-l as d e eventos X. Este é um l ivro sobre esses ac ontec imentosfora d o c omum, aquel as surpresas que c ompl ementam tud o que sed esenrol a no que pod eríamos c hamar d e âmbito d a “normal id ad e” .Em c ontraposiç ão, a esfera d os eventos X foi muito pouc o expl orad apel a c iênc ia, simpl esmente porque seus e l ementos, se jam el es impac tosd e asteroid es, c r ises financ eiras ou ataques nuc l eares, são, pord efiniç ão, raros e inesperad os. A c iênc ia em geral se atém ao estud od e fenômenos rec orrentes. Os eventos X fogem a essa c ategoria, o queexpl ic a por que não existe , até o presente momento, nenhuma teoriad ec ente que esc l areç a quand o, c omo e por que e l es oc orrem. Estel ivro é , no mínimo, uma c onvoc aç ão para o d esenvol vimento d aquil oque pod eríamos batizar d e “teoria d a surpresa” . Pod emos resumirafirmand o que o princ ipal objetivo d este l ivro é propor uma respostapara a seguinte pergunta: c omo c arac terizamos o r isc o em situaç õesnas quais a teoria d a probabil id ad e e as estatístic as não pod em serempregad as?

Eventos extremos c ausad os pel o homem, não pel a natureza, sãoresul tad o d e c onhec imento d e menos em busc a d e c ompl exid ad e d emais em nossos sistemas humanos. Um evento X — uma revol uç ãopol ític a, a qued a d a internet ou o c ol apso d e uma c ivil izaç ão — é a

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forma que a natureza humana tem d e red uzir uma sobrec arga d ec ompl exid ad e que se tornou insustentável . Cad a parte d este l ivrod estina-se ao esc l arec imento d as seguintes questões:

• Por que oc orrem os eventos X?• Por que hoje em d ia ac ontec em mais eventos extremos d o que

em qual quer outra époc a?• Qual o impac to que um d eterminad o evento X pod erá ter sobre

o esti l o d e vid a d o séc ul o XXI?• Como pod emos saber que o r isc o d e um evento X al c anç ou um

nível perigoso?• Quand o pod emos fazer al guma c oisa para evitar um evento

extremo iminente e quand o a únic a saíd a é estar preparad opara sobreviver à sua oc orrênc ia?

A resposta a c ad a uma d essas perguntas está, d e c erta forma,atrel ad a aos níveis exponenc ial mente c resc entes d e c ompl exid ad enec essária para manter as infraestruturas básic as d a vid a mod erna.Esse argumento é o f io c ond utor d este l ivro.

O c ol apso d e tud o é um l ivro d e c onc eitos e id eias. Para que estaspáginas fossem tão ac essíveis quanto possível ao l eitor c omum, nãoutil izei fórmul as, quad ros, equaç ões, gráfic os ou jargões d a área.(Tud o bem, há um quad ro!) Em essênc ia, o l ivro é uma c ol etânea d ehistórias vinc ul ad as que, em c onjunto, servem para provar que ac ompl exid ad e pod e matar — e matará — se a d eixarmos fora d ec ontrol e .

Como ac ontec e c om frequênc ia, a visão c ompl eta d os fatos sóoc orre quand o se ol ha para trás. E a mesma c oisa se d á c om estel ivro. Depois d e c onc l uir o esboç o, oc orreu-me que o vol ume em suasmãos é , na real id ad e, o segund o tomo d e uma futura tr il ogia sobre oseventos soc iais humanos, suas c ausas e c onsequênc ias. O primeirol ivro foi Mood Matters [Questões d e humor] , d e 2010, que abord avaa psic ol ogia soc ial d os grupos e c omo o “c l ima soc ial ” c ontamina ostipos d e ac ontec imentos c ol etivos que pod emos esperar em tod as asesc al as d e tempo. O terc eiro vol ume d el ineará c omo os eventos Xpod em ser, ao mesmo tempo, um probl ema e uma oportunid ad e, aparte “c riativa” d aquil o que o ec onomista Joseph Sc humpeterc onsagrou c omo “ d estruiç ão c riativa” .

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Os l eitores que d esejarem enviar c omentários, id eias e /ourec l amaç ões pod em fazê-l o pel o e-mail john@ mood matters.net.

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A PARTE MAIS GRATIFICANTE d a c onc l usão d e qual quer l ivro é aoportunid ad e d e agrad ec er às pessoas que c ontribuíram para suac riaç ão. Nesse aspec to, sou mais abenç oad o que a maioria d as pessoaspor ter a al egria d e c ontar c om muitos l e itores para as versões“ beta” , pessoas que d e forma inc ansável e generosa d ed ic aram seutempo para tornar este l ivro al go muito mel hor d o que eu pod eriaesperar. É uma fe l ic id ad e, portanto, rec onhec er esses esforç os nestaspáginas e agrad ec er publ ic amente sua generosid ad e e seud isc ernimento. A ord em não importa: obrigad o a Ol av Ruud , BrianFath, Leena Il mol a, Jo-Ann Pol ise , Hel mut Kroiss, Rex Cumming,Ad am Dixon e Timo Hämäl äinen por suas observaç ões, sugestões ec ontribuiç ões em um ou mais c apítul os d o l ivro. Um agrad ec imentoespec ial aos meus parc eiros mais fiéis, Trud y Draper e ZacBharuc ha, que l eram tod as as l inhas d e tod os os c apítul os e fizeramtud o que era possível em nome d os interesses d os l e itores. Qual querponto obsc uro que permaneç a no texto está l á apesar d o esforç o d el espara me fazer c orrigi-l o. Por fim, meu ed itor, Peter Hubbard ,ed itor-c hefe d a Wil l iam Morrow/HarperCol l ins, que c om amor efirmeza me obrigou a esc rever e reesc rever d iversos trec hos atéac ertar. Sem seu entusiasmo e apoio c onstante, este l ivro jamais seriapubl ic ad o.

John CastiViena, Áustria

Novembro d e 2011

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PREÂMBULO

QUAL É O X DA QUESTÃO

A ARMADILHA DA COMPLEXIDADE

NO INÍCIO DE 2010, o arquiteto americ ano Br y an Berg terminou o queaind a é c onsid erad o o maior c aste l o d e c artas d o mund o. Com maisd e quatro mil baral hos, Berg c onstruiu uma imponente répl ic a d oVenetian Mac ao-Resort-Hotel , na China, c om três metros d e al tura enove d e l argura. Ao observar aquel a inc rível estrutura, vi al i umaespéc ie d e metáfora d o mund o al tamente c ompl exo e inter l igad o emque vivemos hoje . Um c amund ongo c orrend o ou o espirro inoportunod e um visitante pod eriam, em um segund o, botar abaixo o c aste l o queo americ ano l evou 44 d ias para erguer. O mesmo val e para asfragil íssimas infraestruturas d as quais d epend emos em nossa vid ad iária.

Tod o o mund o ind ustrial izad o está à merc ê d e uma injeç ãoc ontínua d e tec nol ogia c ad a vez mais avanç ad a. Al ém d isso, ossistemas que sustentam nosso esti l o d e vid a estão c ompl etamenteentrel aç ad os: a internet d epend e d a red e e l étr ic a, que por sua vezprec isa d o abastec imento d e energia d o petról eo, c arvão mineral efissão nuc l ear, que também d epend e d e tec nol ogias d e prod uç ão que,d a mesma forma, exigem el etr ic id ad e. E assim nos enc ontramos — umsistema apoiad o sobre outro que também se equil ibra sobre outro,tud o inter l igad o. A soc ied ad e mod erna é exatamente c omo o “c assinod e Berg” , em que c ad a nova c arta se al oja sobre as outras. Umc ontexto bastante propíc io para que aquel e ratinho em d isparad aesbarre numa c arta d e baixo e d errube a estrutura inteira.

Evid entemente, a fragil id ad e d a c onstruç ão é o que val oriza umc aste l o d e c artas. Isso é ótimo — c omo passatempo. Mas quem d esejabasear tod o o seu esti l o d e vid a num c aste l o d e c artas? Imagine NovaYork, Paris ou Mosc ou sem energia e l étr ic a por um períod o

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ind eterminad o. Ou, pensand o no l ongo prazo, o que ac ontec eria senão surgissem novas tec nol ogias d urante uma d éc ad a? O que seria d onosso pad rão d e vid a?

Boa pergunta. O que ac ontec e c om nosso pad rão d e vid a quand o ased utora músic a d a tec nol ogia si l enc ia? Uma pergunta aind a maisinstigante: o que pod eria interromper a músic a? Como tod as asperguntas fund amentais, essa também ad mite respostasmul tifac etad as, mas tod as se baseiam num motivo fund amental paraexpl ic ar c omo e por que a tec nol ogia pod e parar. Nas páginas d estel ivro, afirmo que a músic a para, na verd ad e, porque o agente d emud anç a, o evento X, puxa o c abo d a tomad a. E esses “eventosextremos” , surpreend entes e impac tantes, que d esestruturam sistemas,d ec orrem, e l es próprios, d a c ompl exid ad e c resc ente d asinfraestruturas tec nol ógic as e d e outras c r iaç ões humanas, as mesmasinfraestruturas que sustentam o que pod eria ser c hamad o, numeufemismo, d e vid a “normal ” . Parte d a questão aqui é d emonstrar d eforma ind isc utível que essa suposta normal id ad e foi c onquistad a aoel evad o c usto d e uma grand e vul nerabil id ad e e d a possibil id ad e d eum c ol apso nas mãos d e uma gama c ad a vez mais ampl a d e eventos X.Como se não bastasse , tod os esses possíveis agentes d e mud anç a têm amesma raiz : um c onhec imento l imitad íssimo d os assombrosos eil ógic os meand ros d os sistemas c ompl exos.

Passei a maior parte d a minha vid a profissional expl orand o ac ompl exid ad e em organizaç ões c omo a R AND Corporation, o SantaFe Institute e o International Institute for Appl ied Sy stems Anal y sis( IIAS A) . No ano d e 1970, époc a em que obtive meu Ph.D. emmatemátic a e c omec ei a pesquisar sistemas c ompl exos, o mund o eraum l ugar muito d iferente . Os te l e fones possuíam d isc os giratórios, osc omputad ores c ustavam mil hões d e d ól ares, metad e d o mund o estavafec had a para o l ivre-c omérc io e para viagens, e qual quer um, mesmosem um d ipl oma em engenharia e l étr ic a, c onseguia c onsertar seuvel ho Chevrol et ou Vol kswagen. Al iás, ninguém prec isa estud arteoria d e sistemas para ver que nossas vid as e nossas soc ied ad esnunc a foram tão d epend entes d e tec nol ogias c ad a vez mais obsc uras.Grand e parte d essa d epend ênc ia se d eve à c resc ente c ompl exid ad e d aprópria tec nol ogia. A c ad a ano que passa, a c ompl exid ad e d e nossosd ispositivos e infraestruturas, d esd e automóveis até as finanç as,red es e l étr ic as e c ad eias d e abastec imento al imentar, c resc e d emaneira exponenc ial . Uma parc el a d esse aumento tem c omo objetivo

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garantir um nível d e sol id ez e proteç ão c ontra fal has d e sistemas,que em geral func iona apenas para abal os re l ativamenteinexpressivos e previsíveis. Mas a maior parte não se justific a. Quemd e fato prec isa d e uma máquina d e c afé expresso c om ummic roproc essad or? Al guém prec isa esc ol her entre d ezessete varied ad esd e raç ão para c ac horro em promoç ão no supermerc ad o? Será que énec essário fabric ar c arros que d epend am d e grossos manuais d oproprietário para expl ic ar c omo func ionam os banc os e l étr ic os, osistema d e GPS e outras parafernál ias inc l uíd as?

Esses pequenos exempl os c otid ianos d e aumento d e c ompl exid ad ec ostumam ser vend id os c omo histórias d e suc esso tec nol ógic o. Masserão mesmo? Seria possível al egar, c om muita propried ad e, que oc aso aqui é d e frac asso tec nol ógic o, suc esso nenhum, sec ontabil izarmos o tempo que gastamos anal isand o os ingred ientes d asraç ões d e c ac horro d isponíveis antes d e fazermos uma esc ol ha que émais i l usória d o que real ou se l evarmos em c onsid eraç ão afrustraç ão que sentimos ao fol hear o manual d o proprietário embusc a d a página que expl ic a c omo ac ertar a hora no rel ógio d o nossoc arro novo. Mas ad ic ionais ind esejad os/d esnec essários num c arronovo ou d iferenç as quase imperc eptíveis no supermerc ad o sãoaborrec imentos pequenos, até mesmo rid íc ul os. ( In) fe l izmente, nãoprec isamos ir muito l onge para enc ontrar c asos d e exc esso d ec ompl exid ad e que real mente preoc upam. Basta l er a primeira páginad e qual quer jornal d iário. Enc ontraremos manc hetes sobre o maisrec ente c apítul o d a c ontínua saga d o instável sistema financ eirogl obal , o frac asso d os mec anismos d e seguranç a em usinas nuc l earese/ou a inviabil id ad e d as negoc iaç ões sobre tarifas e c omérc iod estinad as à reestruturaç ão d o proc esso d e gl obal izaç ão. Essashistórias já seriam sufic ientes para provoc ar arrepios em qual querser humano. Aind a mais assustad or, entretanto, é o fato d e queaquil o que se d ivul ga publ ic amente aind a é pouc o em c omparaç ão aoque d e fato oc orre, c omo as páginas d este l ivro c omprovarão.

A c iênc ia d a c ompl exid ad e c omo d isc ipl ina rec onhec id a existe hápel o menos d uas d éc ad as. Portanto, qual a urgênc ia d e se c hamar aatenç ão d o públ ic o para a mensagem sobre c ompl exid ad e e eventosextremos neste momento? A razão é muito simpl es: nunc a antes nahistória d a humanid ad e os seres humanos estiveram tão vul neráveis aum gigantesc o, quase inac red itável , d ownsiz ing em seu mod o d e viverquanto hoje em d ia. As infraestruturas nec essárias para manter um

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esti l o d e vid a pós-ind ustrial — energia, água, c omid a, c omunic aç ão,transporte , saúd e, seguranç a, finanç as — são tão inter l igad as que, seum sistema espirrar, os outros pegam pneumonia na mesma hora. Estel ivro d el ineia as d imensões d o( s) probl ema(s) que enfrentamos naatual id ad e, suas origens e o que pod emos fazer para red uzir o r isc od e uma pane total d o sistema, l evand o-se em c onsid eraç ão que, nestec aso, a própria c ivil izaç ão humana é “o sistema” .

O COMUM E O INUSITADO

COMO INTERVALO DE TEMPO entre nasc imento e morte , a vid a d e umind ivíd uo, d e um país ou até mesmo d e uma c ivil izaç ão se resume auma l onga c ad eia d e ac ontec imentos. Ou, c omo d izem por aí, umd esastre após o outro. A maioria é irrel evante. Voc ê ped e c arne norestaurante em vez d e l agosta; esse é um ac ontec imento que sóinteressa a voc ê e ao c ozinheiro d o estabel ec imento, enc arregad o d epreparar o prato. A c id ad e d e Viena d ec id e interromper o tráfego d eveíc ul os na rua Graben. É um evento c om c onsequênc ias d urad ouraspara quem vive no primeiro d istr ito d e Viena e para os turistas, masnão atinge quase ninguém mais. A d ec isão d o governo americ ano d einvad ir o Iraque afeta o mund o inteiro por d éc ad as, tal vez mais.Ac ontec imentos c omo esses, d e um mod o geral , a d espeito d o nível ed a magnitud e d e seu impac to, são raros, no sentid o d e que apossibil id ad e d e prevermos c om exatid ão o que ac ontec erá é ínfima,pratic amente nul a. Mas não pod em ser c l assific ad os c omo extremos.No c aso d os eventos X, o que importa é o grau d e imprevisibil id ad ed entro d o c ontexto em que e l e se manifesta, junto c om seu impac to nasoc ied ad e c omo um tod o.

Paremos um momento para d esc onstruir esses d ois aspec tos,c omeç and o pel o fato d e que se trata, fund amental mente, d e umevento atípic o.

EVENTOS X

QUANDO O METEOROLOGISTA DIZ que há 60% d e probabil id ad e d e c huva

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no d ia seguinte , e l e está querend o d izer que o mod el o d e previsãoutil izad o aponta que a temperatura esperad a, a vel oc id ad e d o ventoe outros fatores previstos para o d ia seguinte provoc aram, nopassad o, c huva em 60% d os c asos. Ou seja, o meteorol ogista estáproc essand o estatistic amente o históric o d e med id as meteorol ógic as,em busc a d o número d e vezes que a c huva real mente veio a c air .

A id eia d e proc essar estatistic amente d ad os históric os é a base nãosó d a previsão d o tempo, mas também d e um grand e número d emétod os e téc nic as para antec ipar outros fenômenos. Porém — e esteé um grand e “porém” —, os registros históric os d evem serabrangentes o sufic iente para inc l uir o ac ontec imento c ujaprobabil id ad e tentamos estimar. E se não forem? E se o históric o forl imitad o, referir-se a uma pequena parc el a d a popul aç ão ousimpl esmente não abarc ar nad a parec id o c om o que busc amos? E aí?Como saberemos as c hanc es d e oc orrênc ia d o nosso c aso espec ífic o?Esse é o d omínio em que o “raro” e o “ improvável ” se transformamno “surpreend ente” . E quanto mais surpreend ente, mais extremo éaquil o que real mente ac ontec e . Eis um exc el ente exempl o d e c omol id ar c om o fator surpresa quand o o banc o d e d ad os d epossibil id ad es é pequeno d emais e não abarc a o c omportamento emquestão.

• • •

T ODO ESPORTE PODE SER d efinid o por al gumas real izaç ões mític as, umd esempenho que, por c onsenso geral , permanec erá no l ivro d erec ord es até que as páginas virem pó. No c aso d o beisebol nos Estad osUnid os, um d esses marc os l end ários é a faç anha d e Joe DiMaggio,c om uma sequênc ia d e rebatid as em 56 jogos d urante a temporad a d e1941. A sabed oria popul ar c onsid era que uma sequênc ia d e 56 jogosc onsec utivos c om, no mínimo, uma rebatid a d e base por partid a éal go pratic amente impossível . O mesmo val eria para as c hanc es d eessa marc a ser superad a, já que e l a c ostuma figurar nas l istas d erec ord es “ inquebráveis” ou “ inal c anç áveis” . Mas a sequênc iaoc orreu. Qual era a verd ad eira probabil id ad e d e isso ac ontec er?Teria sid o um fe l iz ac aso, que ac ontec e uma vez na vid a e outra namorte , c omo ac red ita a maioria d os fãs d e beisebol ? Ou em outropl aneta d o outro l ad o d a gal áxia o mesmo pod eria ter ac ontec id o

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várias vezes ao l ongo d os ú l timos setenta anos?Um tempo atrás, Samuel Arbesman e S tephen S trogatz ,

pesquisad ores d a Universid ad e d e Cornel l , d ec id iram estud ar oassunto. Para isso, prefiguraram d ez mil pl anetas Terra paral el os,tod os c om os mesmos jogad ores, c ad a um c om o mesmo históric oestatístic o d e d esempenho — mas sujeitos a d iferentes c apric hos d oac aso d e c ad a Terra. Em essênc ia, o que e l es fizeram foi reprod uzirc ad a uma d as temporad as, d e 1871 a 2005, d ez mil vezes, em busc ad a maior sequênc ia d e rebatid as em c ad a uma. Em vez d e se ateremao ined itismo d a faç anha d e DiMaggio, os pesquisad ores d e Cornel lvol taram-se para uma questão muito mais abrangente e interessante:quão surpreend ente seria que al guém na história d o beisebol (até2005) c onseguisse a marc a d e pel o menos 56 jogos c om no mínimouma rebatid a d e base c ad a? R esposta: nad a surpreend ente !

Nas d ez mil temporad as paral el as, as maiores sequênc ias d erebatid as variaram entre 39 jogos, o que é pouc o, e 109 jogos, o que éinc rível ( e , c om c erteza, raríssimo) . Mais d e d ois terç os d as vezes, asequênc ia máxima fic ou entre 50 e 64 jogos. Em suma, não havianad a d e muito extremo numa sequênc ia d e 56 jogos. Numa estranhac oinc id ênc ia numéric a, DiMaggio oc upava apenas a 56ª posiç ão nal ista d os jogad ores c om maior probabil id ad e d e manter o rec ord e d emaior sequênc ia d e rebatid as na história d o beisebol . Quem são osprimeiros d a l ista? Os fãs d o esporte fol garão em saber que osvenc ed ores d essa d isputa são d ois jogad ores d a vel ha guard a, HughDuffy e Wee Wil l ie Keel er, que juntos estabel ec eram o rec ord e emmais d e mil temporad as simul ad as. No c aso d e jogad ores um pouc omais rec entes, o venc ed or foi Ty Cobb, c om a maior sequênc ia d erebatid as em quase trezentas d as d ez mil temporad as.

O que nos importa, neste l ivro, é que um ac ontec imentoaparentemente raro a ponto d e merec er o rótul o d e “ l end ário” pod eser, na verd ad e, al go bastante tr ivial — num universo d iferente d onosso! O probl ema é que nosso banc o d e d ad os terrestre tal vez sejapequeno d emais para d eterminar o que é real mente raro. Portanto, oque c onstitui e o que não c onstitui um evento X é uma c arac terístic arel ativa, não absol uta, e seu grau d e rarid ad e d epend e d o c ontexto.E não tem rel aç ão c om o que voc ê e seus c ompanheiros d e gol fec onsid eram raro.

Aind a assim, mesmo um al to grau d e improbabil id ad e e surpresanão é sufic iente para c atapul tar um evento à c ategoria X. Para isso,

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prec isamos d e um segund o ingred iente : o impac to!Não me parec e exagero afirmar que ac ontec imentos memoráveis, os

que real mente importam, são aquel es que, d e al guma forma, mud amo d estino d e uma pessoa — ou d e uma naç ão. Essa mud anç a pod e serpara mel hor ou para pior. Mas os eventos que mud am a história são,por d efiniç ão, aquel es que c ausam impac to. Val end o-me d e nossoexempl o sobre o c l ima, uma previsão d e c huva para amanhã tempouc o impac to e importânc ia, a não ser para quem pl anejou umc asamento ao ar l ivre ou para um agric ul tor preoc upad o c om airrigaç ão d e sua pl antaç ão. Mas, se houver um tornad o, e l e pod erámud ar sua vid a ao red uzir sua c asa a pó em questões d e minutos.Nesse c aso, o ac ontec imento inusitad o tem sérias c onsequênc ias… eel as não são positivas. É justo c hamar o tornad o d e evento X, pel omenos para suas vítimas. Em um nível mais ampl o, o furac ão Katrinafoi surpreend ente e provoc ou grand e impac to sobre uma área muitomaior d o que a afetad a por um tornad o — e, portanto, é um eventoaind a mais sér io. Não é d if íc i l e stend er essa fórmul a d e fator-surpresa + impac to ao d omínio d os ac ontec imentos gerad os pel ohomem. Os ataques d e 11 d e setembro, a c r ise d a hipotec a em 2007-2008 e o apagão d a Costa Leste d os EUA em 2003 pod em serc onsid erad os eventos X.

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POR QUE PENSAMOS LOGO em al go ameaç ad or ou d estrutivo quand o aexpressão “evento extremo” é menc ionad a? Para respond er a essapergunta, c onsid eremos mais a fund o suas três princ ipaisc arac terístic as.

El as são: um tempo d e d esenrol ar entre o iníc io e o fim, um tempod e impac to, d urante o qual seu c usto ou benefíc io é experimentad opor al guns ind ivíd uos ou grupos, e o impac to total , que é a med id ad a magnitud e geral d o ac ontec imento, geral mente expressa emd ól ares ou em vid as perd id as. (Para aquel es l e itores c om uma mentemais anal ític a, inc l uí na seç ão d e Notas e referênc ias d este l ivro umafórmul a simpl es para med ir o “ fator X” d e um evento numa esc al a d e0 [nad a extremo] a 1 [o mais extremo d e tod os os ac ontec imentospossíveis] . Proc urei restr ingir grand e parte d os d etal hes téc nic os àsnotas, mas rec omend o expl orá-l os se tiver c oragem.)

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Quand o ouvimos o termo “evento” , em geral pensamos em al goc om um tempo d e d esd obramento c urto, c omo um ac id ente d e c arroou ganhar na l oteria, por exempl o, provavel mente porque nossaprópria c apac id ad e d e c onc entraç ão é um tanto quanto c urtatambém — c arac terístic a exac erbad a d iariamente pel os avanç os natel ec omunic aç ão e na vel oc id ad e c om que se viajam l ongas d istânc iaspor meio d o mund o virtual . Um evento que se d esenvol ve c omrapid ez ( tempo d e d esenrol ar breve) e que c ausa um grand e impac toc om c onsequênc ias d urad ouras ( tempo d e impac to l ongo) é al gosurpreend ente e c ruel , d if íc i l d e antec ipar. O terremoto queac ontec eu no Japão em març o d e 2011, c om o d ec orrente tsunami e afusão d e reatores nuc l eares, i l ustra bem esse c aso. De ac ord o c om asegund a l ei d a termod inâmic a, que d iz que sistemas isol ad os tend ema um estad o d e d esord em máxima, é sempre muito mais fác il e rápid od estruir d o que c onstruir. Portanto, ac ontec imentos c om umd esenrol ar breve e grand e impac to, pel o menos no que d iz respeito anaç ões e soc ied ad es, são quase sempre nec essariamente d estrutivos.

Voc ê pod e estar se perguntand o se existir iam eventos X “bons” .Cl aro que sim! Mas atenç ão, d il etantes e gananc iosos: e l es quasesempre envol vem um tempo d e d esd obramento bastante l ongo.Consid ere, por exempl o, o Pl ano Marshal l , que ajud ou a Al emanhaOc id ental a se reerguer d as c inzas após a Segund a Guerra Mund ial ,ou, num interval o d e tempo aind a maior, o d esenvol vimento d aagric ul tura e a d omestic aç ão d e animais que possibil itaram aevol uç ão d as c ivil izaç ões mod ernas. Da mesma forma, ummed ic amento ou proc ed imento méd ic o inovad or c ostuma serresul tad o d e anos d e pesquisa, e real izaç ões c ul turais, c omo umromanc e ou trabal ho artístic o revol uc ionário, são igual menteprod utos d e l ongos períod os d e tentativa e erro. Esse tipo d e c ontextorequer anos, d éc ad as ou até mesmo séc ul os para se d esenc ad ear eenvol ve a c onstruç ão ou o d esenvol vimento d e infraestruturas c omoum empreend imento, uma naç ão ou uma inovaç ão tec nol ógic a. Porisso, se os exempl os d as páginas a seguir parec erem pessimistasd emais, o l e itor d eve ter em mente que os eventos X d e c aráterpositivo são uma real id ad e — não apenas neste l ivro! Surpresasagrad áveis são sempre bem-vind as. De um mod o geral , nãorepresentam ameaç as. E são as ameaç as ao nosso esti l o d e vid amod erno que queremos anal isar .

Agora temos uma id eia d o que c onstitui um evento X. Embora as

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d efiniç ões, mesmo as mais vagas, se jam úteis, o que queremos saber éc omo essas surpresas ac ontec em e o que pod emos fazer para evitá-l asou, pel o menos, para nos prevenir e mitigar suas c onsequênc iasnegativas.

SISTEMAS EM COLISÃO

NOS ÚLTIMOS ANOS, TEMOS visto regimes trad ic ionais na Tunísia, naLíbia e no Egito send o d errubad os quase d a noite para o d ia e paísesc omo Bahrein, Iêmen e S íria send o inc end iad os pel as mesmas c hamasrevol uc ionárias d e rebel d es que l utam c ontra governosprofund amente arraigad os, numa tentativa d e pôr fim a d éc ad as d eopressão. À primeira vista, esses tipos d e agitaç ão soc ial d ão aimpressão d e surgirem d a insatisfaç ão d as pessoas em rel aç ão aogoverno d iante d e al tos índ ic es d e d esemprego, aumento d o preç o d osal imentos, fal ta d e morad ia e outras nec essid ad es básic as. Taisexpl ic aç ões, porém, são superfic iais, pois não abord am o que está naraiz d o c ol apso. Os c onflitos c ivis não promovem, por si só, amud anç a; são apenas um al erta prec oc e d o evento extremo que estápor vir , a al teraç ão d o regime. A verd ad eira fonte c apaz d e abal ar osgovernos enc ontra-se nas profund ezas d o sistema soc ial : um “d esníveld e c ompl exid ad e” c ad a vez mais ampl o entre governo e c id ad ãos que,quand o não tem c omo ser transposto, ac aba d eflagrand o asrevol uç ões. Pense no c aso d e um governo autoritário que se c onfrontac om uma popul aç ão que d esc obriu a possibil id ad e d e novasl iberd ad es graç as ao c ontato c om o mund o exterior e que éc oord enad a por d iferentes pl ataformas d e red es soc iais. O d esnívelentre a c ompl exid ad e d o sistema d e c ontrol e (neste exempl o, ogoverno) e a c resc ente c ompl exid ad e d o sistema c ontrol ad o (apopul aç ão) prec isa ser sol uc ionad o. Um c aminho, para o governo, é arepressão — prend er l íd eres, enc arregar sol d ad os d e d ispersarmul tid ões d e manifestantes e apl ic ar outras med id as para c ontrol ara situaç ão. Outra possibil id ad e seria intensific ar a c ompl exid ad e d ogoverno d e mod o a ac el erar a real izaç ão d e e l eiç ões mais l ivres,e l iminar d epressa as restr iç ões a uma míd ia aberta e c r iarpossibil id ad es d e mobil id ad e asc end ente para a popul aç ão.

Essa noç ão d e que um ac ontec imento extremo é a maneira que os

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seres humanos têm d e c ruzar o abismo d e c ompl exid ad e que separad ois (ou mais) sistemas é o l e itmotiv d e tod os os eventos X c ausad ospel o homem que anal isaremos neste l ivro. Um evento extremo é oinstrumento usad o para red uzir a d isc repânc ia no nível d ec ompl exid ad e entre d ois (ou mais) sistemas c onc orrentes ou mesmoassoc iad os. É o que ac ontec e automatic amente quand o os sereshumanos não c onseguem, d e forma vol untária, red uzir um d esnívelc resc ente . Deixe-me d ar apenas uma id eia d e c omo esse princ ípio semanifesta, l embrand o rapid amente al guns eventos X rec entes em queessa d esarmonia está bastante evid ente.

A antiga ec onomia d o Egito, c ontrol ad a pel o Estad o, foiad ministrad a d e forma d esenfread a e inc ompetente por d éc ad as.Mesmo a visível mel horia d os ú l timos anos foi insufic iente e tard iad emais. Al ém d isso, o país era (e aind a é) para l á d e c orrupto,enquanto o c apital ismo d as “panel inhas” c orre sol to ao l ongo d e tod aa estrutura soc ial . Um sistema d e c orrupç ão c omo esse se baseia empropinas a autorid ad es para fec har c ontratos, obter empregos ouenc ontrar morad ia ad equad a. Pod e parec er engraç ad o (e revel ad or) ,mas c omenta-se que o Viagra, med ic amento c ontra a impotênc iamasc ul ina, ter ia fic ad o fora d o merc ad o no país porque seufabric ante, o l aboratório Pfizer, não pagou uma propina al ta obastante para que o ministro d a S aúd e egípc io l iberasse sua vend a.

Esse tipo d e gestão parasític a basead a na c orrupç ão serviu parapreservar um governo já pouc o c ompl exo, c om raros graus d el iberd ad e em sua estrutura ou nas maneiras d e l id ar c om osprobl emas soc iais emergentes. Enquanto a popul aç ão egípc iad ispunha d e meios aind a mais l imitad os para expressar suainsatisfaç ão em rel aç ão a fal ta d e morad ia, aumento d o preç o d osal imentos, sistema d e saúd e etc . , o governo não tinha motivaç ão parac riar a( s) estrutura( s) nec essária( s) para fornec er tais serviç os.Evid entemente, havia um ministério enc arregad o d a saúd e, porexempl o, mas a pasta não passava d e sinec ura para buroc ratas d ec arreira e c omparsas d e quem estava no pod er, oferec end o serviç os d esaúd e somente c omo uma espéc ie d e “extra opc ional ” , nas horasvagas. Quem esperaria que isso pud esse mud ar enquanto a gama d eaç ões d isponíveis aos c id ad ãos fosse mantid a num nível baixo (d ebaixa c ompl exid ad e) , muito mais baixo d o que o d o próprio governo?Mas os tempos mud am. Quand o a tec nol ogia mod erna — seja ac omunic aç ão gl obal imed iata, a d isseminaç ão d a ed uc aç ão superior

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ou o transporte rápid o — c omeç ou a ad entrar o mund o árabe, osc id ad ãos, d e uma hora para outra, ganharam pod er. Àquel a al tura,a mensagem já estava c l ara (mais prec isamente, veic ul ad a noFac ebook) para os regimes enraizad os em tod a a região.

A c omunic aç ão mod erna e as red es soc iais c omo Googl e , Twitter eFac ebook ajud am a aumentar d rastic amente a c ompl exid ad e soc ial— mas agora é a c ompl exid ad e d a popul aç ão c omo um tod o que seac entua, e não a d o governo. É por isso que esses serviç os sãol imitad os ou até mesmo c ortad os quand o os governos estão sobataque, c omo ac ontec eu quand o as autorid ad es egípc ias tiraram ainternet d o ar por al guns d ias para imped ir que mais pessoas seexpressassem e que novos grupos se organizassem por meio d as red essoc iais. Chega um ponto em que o d esnível entre a estagnaç ão d ac ompl exid ad e d o governo e o c resc imento d a c ompl exid ad e d apopul aç ão se torna grand e d emais para ser sustentad o. O resul tad o?Mud anç a d e regime na Tunísia, na Líbia e no Egito, junto c om aprovável qued a d a d inastia Assad na S íria e/ou d a monarquia d oBahrein.

Um teóric o d e sistemas c ompl exos l ogo rec onhec e que o princ ípioaqui presente é o que se d enomina l ei d a c ompl exid ad e nec essária.Segund o essa “ l ei” , para pod er regul ar/c ontrol ar total mente umsistema, a c ompl exid ad e d e quem c ontrol a d eve ser no mínimo d omesmo tamanho d a c ompl exid ad e d o sistema c ontrol ad o. Dito d emaneira mais simpl es, somente a c ompl exid ad e pod e d estruir ac ompl exid ad e. Uma c onc l usão óbvia d isso é que, se o d esnível entrec ompl exid ad es for grand e d emais, haverá probl ema e , no mund o d apol ític a, “probl ema” geral mente se sol etra c omo “r-e-v-o-l -u-ç -ã-o” .

Exempl os d esse d esc ompasso são abund antes. Consid ere o ImpérioRomano, em que as c l asses d ominantes se val iam d e pod er pol ític o emil itar para c ontrol ar as c l asses mais baixas e d ominar seus viz inhosa fim d e obter rec eitas d e impostos. Em úl tima instânc ia, tod os osrec ursos d a soc ied ad e eram c onsumid os apenas para manter aquel evasto e c resc ente império, que se tornara c ompl exo d emais para serviável . A antiga c ivil izaç ão maia é outro bom exempl o, assim c omo aantiga União Soviétic a. Al guns ac ad êmic os, entre e l es o historiad orPaul Kenned y , afirmam que o império americ ano, que gasta mais d e23 bil hões d e d ól ares por ano em ajud a externa e c onsome muito maisd o que exporta, está em proc esso d e d issol uç ão exatamente pel omesmo motivo.

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Esse tipo d e d esac erto não se restr inge apenas aos d esníveis d ec ompl exid ad e nos pl anos pol ític o e governamental , c omo evid enc iad opel a interrupç ão d a rotina no Japão resul tante d a rad iaç ão emitid apel os reatores d e Fukushima Daiic hi d epois d o terremoto d e març o d e2011. A verd ad eira c ausa d esse d esc ontentamento soc ial é um“d efeito d e projeto” , porque o tsunami c riad o pel o terremotod errubou os muros d e c ontenç ão projetad os para proteger os reatoresd a água d o mar. A inund aç ão d anific ou os gerad ores e l étr ic os d ereserva d estinad os a, em c asos d e emergênc ia, fornec er energia parabombear água a fim d e esfr iar as varetas d e c ombustível nuc l ear d osreatores. Existem d ois aspec tos no probl ema: primeiro, os projetistaspl anejaram a al tura d os muros para um tremor d e 8,3 graus d emagnitud e, o maior que o Japão já havia experimentad o, semc onsid erar a possibil id ad e d e um sismo mais intenso. Pior aind a, osgerad ores estavam l oc al izad os num nível baixo, em que qual querenc hente c ausaria c urto-c irc uito. E não só isso. De ac ord o c omal guns re l atos, o próprio tremor rebaixou o nível d o sol o em sessentac entímetros, agravand o o probl ema. Ou seja, tud o d epend ia d e osmuros d e c ontenç ão fazerem a sua parte , o que não ac ontec eu! Esse éum c aso d e c ompl exid ad e d e menos no sistema d e c ontrol e (ac ombinaç ão d a al tura d o muro c om a l oc al izaç ão d os gerad ores)send o l iteral mente avassal ad a pel o exc esso d e c ompl exid ad e nosistema a ser c ontrol ad o (a magnitud e d o terremoto e d o tsunami quese seguiu) .

Neste exato momento, um anal ista d e r isc o c omum d e umac ompanhia d e seguros ou um banc o tal vez esteja se perguntand o:Qual a novid ad e? Se quisermos aval iar o r isc o d e d eterminad oevento Y ac ontec er, c al c ul amos a probabil id ad e d e Y ac ontec er,aval iamos o d ano c ausad o se Y real mente ac ontec er e mul tipl ic amosesses d ois números. O resul tad o mostra o d ano esperad o c aso Yac onteç a. Esse é o r isc o. Sem c onfusões nem c ompl ic aç ões. Então oque estou apresentand o aqui d e d iferente? Para aquel es l e itores quepul aram as primeiras páginas d esta introd uç ão, vou resumir por queessa pergunta d o anal ista d e r isc o é a pergunta c erta a fazer no c asod e ac ontec imentos “normais” — e por que é menos ad equad a, atémesmo perigosa, no c aso d e eventos extremos. Veja a seguir .

Primeiro, a própria rarid ad e d e um evento extremo signific a quenão existe um banc o d e d ad os d e aç ões e c omportamentos passad osc om riqueza sufic iente para pod ermos c al c ul ar c om al guma prec isão

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a probabil id ad e d e Y real mente ac ontec er. Embora os teóric os d aprobabil id ad e e os estatístic os tenham d esenvol vid o uma série d eferramentas engenhosas — c omo a teoria d a probabil id ad e subjetiva,a anál ise bay esiana e estatístic as apl ic ad as a ac ontec imentosextremos — para tentar c ontornar esse obstác ul o, o fato é queprec isar a probabil id ad e d e um evento raro c ontinua send oimpossível . Caso c ontrário, os Estad os Unid os não prec isariamenfrentar a Grand e Rec essão d e 2007-2008, o apagão d a Costa Lested e 2003 e a d evastaç ão d e Nova Orl eans provoc ad a pel o furac ãoKatrina — e as pessoas não fic ariam imaginand o quand o o próximoc hoque rad ic al aparec eria, pegand o-as d esprevenid as. Portanto,quand o se trata d e eventos X, prec isamos inventar/d esc obrir formasd e med ir o r isc o que l evem em c onta o que queremos d izer quand ofal amos que a probabil id ad e d e esse c hoque ac ontec er atual mente émuito maior d o que antes. Minha intenç ão em rel aç ão a essa questãoé d emonstrar que o nível d e d esac erto d a c ompl exid ad e entresistemas d e infraestrutura humana serve c omo med id a para isso.

O segund o c omponente envol vid o numa anál ise d e r isc oc onvenc ional , apl ic ável a ac ontec imentos normais, é o d ano qued eterminad o evento pod e c ausar à soc ied ad e c aso se c onc retize . Aúnic a d ific ul d ad e é que, na oc orrênc ia d e um abal o inéd ito, seráextremamente probl emátic o aval iar os d anos reais. Para real izar talaval iaç ão, em geral prec isamos c omparar um c enário hipotétic o c omeventos c omparáveis d o passad o. Mas c omo apl ic ar esse proc esso senão houver nenhum registro históric o em que se basear? Conformed emonstrad o ao l ongo d e tod o este l ivro, quand o o mund o real nãonos fornec e os d ad os nec essários, prec isamos c onstruir no c omputad orum mund o substituto para obtê-l os, c omo Arbesman e S trogatzfizeram para estud ar o c aso d a “ insuperável ” sequênc ia d e rebatid asd e Joe DiMaggio no beisebol . Essa abord agem, repito, é muitod iferente d os métod os empregad os para estud ar ac ontec imentosnormais.

Em suma, há d ois tipos d iferentes d e regime em questão. Há oregime normal , formad o por eventos que ac ontec eram muitas vezes nopassad o e sobre os quais existe um bom c onjunto d e d ad os d isponíveispara c al c ul armos probabil id ad es e possíveis d anos, e o regime d eeventos X, para os quais nossas ferramentas d e c ál c ul o simpl esmentenão servem. Este l ivro oferec e uma perspec tiva para se c r iar umaestrutura que c ompl emente o que c ostuma ser usad o para c al c ul ar

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risc os no regime normal . Apresento essa l inha d e rac ioc ínio, c omprec eitos e exempl os, nas próximas d uzentas páginas, d eixand o osd etal hes téc nic os para um programa d e pesquisa a ser d esenvol vid oem anos vind ouros.

Depois d e tratar d os d esníveis d e c ompl exid ad e e d os eventos Xresul tantes, gostaria d e traç ar um breve panorama d as três partesque c onstituem este l ivro.

TRÊS PARTES SIMPLES

A FRASE DE ABERTURA d o texto De Bel l o Gal l ic o, d e Júl io César,proc l ama: “ Tod a a Gál ia é d ivid id a em três partes.” O mesmoac ontec e c om este l ivro. A Parte I abord a a re l aç ão entrec ompl exid ad e e eventos extremos, aprofund and o o que foid esenvol vid o nessas primeiras páginas. Al i , faç o uma d istinç ão entreas surpresas d esagrad áveis d a natureza e aquel as c ausad as pord esatenç ão, inaç ão, engano, estupid ez ou mera mal d ad e humana.

O prato princ ipal está na Parte II, d ivid id a em onze pequenosbl oc os, c ad a um c om a história d e um possível evento X e seu impac tona vid a d iária c aso e l e se c onc retize . Esc ol hi esses exempl os d e mod oa abranger a maior gama d e ativid ad es humanas possível , evitand oterritórios já expl orad os à exaustão nos ú l timos anos pel os “eventosextremos d o d ia” , c omo o c ol apso financ eiro gl obal d e 2007-2008 oua c rise d os reatores nuc l eares japoneses d e 2011. Portanto, a Parte IIinc l ui temas c omo um c ol apso no sistema d e abastec imento mund iald e al imentos, uma pane total d a internet, uma pand emia gl obal e atémesmo o fim d a gl obal izaç ão. De um mod o geral , essas históriaspod em ser l id as em qual quer ord em, d e ac ord o c om o gosto e ointeresse d o l eitor. Em c onjunto, porém, e l as retratam c omo asustentabil id ad e d o esti l o d e vid a a que estamos ac ostumad os éameaç ad a por uma gama variad a e grave d e eventos X.

O final , na Parte III, junta as questões e probl emas teóric os d aParte I c om os exempl os prátic os d a Parte II, para l id ar c om aquestão c entral d e c omo pod emos prever os eventos X e tal vez atéc ontrol á-l os — em al guns c asos. De forma mais espec ífic a, examinoaté que ponto pod emos intensific ar o foc o no tempo e no espaç o emque um d eterminad o e l emento transformad or c omeç a a apresentar o

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verd ad eiro perigo d e se c onc retizar. Anal iso também os tipos d eind íc io “ frac o” que servem c omo aviso para um abal o iminente, al émd e métod os para pinc el ar esses ind íc ios d a aval anc he d e besteiras quese fazem passar por informaç ão no d ia a d ia. O l ivro se enc erra c omal guns c onsel hos preventivos para d eixar as soc ied ad es maispreparad as para eventos extremos, inc l uind o a c r iaç ão d e sistemassoc iais mais f l exíveis e d e infraestruturas menos frágeis.

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PARTE I

POR QUE O NORMAL JÁ NÃOÉ MAIS TÃO “NORMAL

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DO NADA

E M AGOSTO DE 2011, a notíc ia d o momento era a ameaç a representad apel o furac ão Irene para a vid a d os nova-iorquinos. Se osac ontec imentos seguissem o roteiro previsto, Manhattan e outrasregiões baixas pod eriam ser total mente inund ad as, o queinterromperia o sistema d e transporte públ ic o, o func ionamento d abol sa d e val ores, as red es d e abastec imento d e água e al imentos eoutros requintes d a vid a urbana d a Grand e Maç ã. Por sorte , Ireneperd eu a forç a antes d e d ar esse gol pe d evastad or e o resul tad o foiapenas um pouc o pior d o que o c ausad o por uma forte tempestad e d everão. Ou seja, a popul aç ão d e Manhattan esc apou d e uma boa, e oal ard e d a míd ia l imitou-se a um exagero d e reaç ões d iante d aspossíveis ameaç as apresentad as pel o Irene. Mas um d ia a c onta terád e ser paga efetivamente, c omo ac ontec eu em Nova Orl eans c om ofurac ão Katrina em 2005, mostrand o que o exagero e a prud ênc iaquase paranoic a são os d ois l ad os d a mesma moed a.

Evid entemente, ac red itar que o c éu está c aind o é um mec anismod e d efesa bastante c onhec id o quand o nos d eparamos c om uma ameaç amuito al ém d e nossa zona d e c onforto e d e nossos c onhec imentos,situaç ão em que só c onseguimos c orrer d e um l ad o para outro c omobaratas tontas, esperand o que tud o d esapareç a. Em geral , a ameaç ad esaparec e, mas nem sempre, e são esses c asos d e “nem sempre” quenão apenas ganham as manc hetes d os jornais c omo também nosobrigam a enc arar os inc ômod os d as ameaç as existenc iais ao nossoesti l o d e vid a habitual . E isso não é brinc ad eira. Eventos extremosac ontec em — e pod em c ausar um estrago que somente um esc ritor d efic ç ão c ientífic a ou um prod utor d e fil mes d e Hol l y wood pod eriac onc eber. Mas não se trata d e um real ity -show. É a real id ad e. Eisal guns exempl os a títu l o d e introd uç ão às histórias c ontad as naspáginas d este l ivro.

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H Á CERCA DE 74 mil anos, no l ugar que hoje é a i l ha d e Sumatra, naInd onésia, o supervul c ão Toba entrou em erupç ão c om uma forç a quenão pod e ser c omparad a a nad a oc orrid o no pl aneta d esd e a époc a

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em que os seres humanos passaram a and ar eretos. Apenas para finsd e c omparaç ão, a erupç ão d o Krakatoa em 1883 teve uma forç aexpl osiva d e 150 megatons d e TNT, o equival ente a d ez mil vezes aforç a d a bomba atômic a que d evastou Hiroshima. A expl osão d oToba, segund o estimativas, teve uma forç a d e um gigaton, quase seisvezes superior à d o Krakatoa e três mil vezes maior d o que a energiagerad a pel a erupç ão d o monte S anta H el ena em 1980.

Na époc a d a erupç ão d o Toba, a Terra era habitad a pel o homemd e Neand ertal , ao l ad o d o Homo sapiens na Europa e d o H omoerec tus e d o Homo floresiensis na Ásia. A úl tima Era Gl ac ial estavano auge, c om mamutes pel ud os e tigres-d entes-d e-sabre c omo prato d od ia no c ard ápio humano. O vul c ão mud ou tud o — d e uma hora paraoutra.

Al ém d as gigantesc as ond as d o tsunami, os quase três milquil ômetros c úbic os d e poeira vul c ânic a e fragmentos d e roc hal anç ad os na atmosfera red uziram a rad iaç ão sol ar d e forma tãod rástic a que as pl antas não c onseguiram sobreviver. A temperaturaméd ia mund ial c aiu para (note-se : não em, mas para) –15°C,transformand o o verão em inverno e o inverno num frio c ongel ante.

Hoje, estima-se que no total sobraram apenas al guns mil hares d esobreviventes humanos, e a maioria vivia em pequenos grupos naÁfric a. Tal estimativa é resul tad o d o trabal ho minuc ioso d ed ed ic ad os ac ad êmic os que examinaram amostras d e DNA d aquel eperíod o. Os pesquisad ores verific aram que as amostras genétic as d omund o inteiro teriam sid o bem d iferentes se os seres humanostivessem c onseguid o se d esenvol ver sem as d ific ul d ad es c r iad as pel oToba em tod o o pl aneta. Os seres humanos d e hoje d esc end emd aquel es resistentes sobreviventes. A jornal ista espec ial izad a emc iênc ia Ann Gibbons sugeriu em 1993 que o vul c ão Toba foiresponsável pel a quase extinç ão d a humanid ad e, hipóteseprontamente enc ampad a por pesquisad ores c omo Stanl ey Ambrose, d aUniversid ad e d e Il l inois, que d esenvol veram teorias e pesquisaramd ad os para respal d ar a id eia d e Gibbons.

“ Quase” , porém, não é fato, e mesmo um pod eroso vul c ão c omo oToba não seria c apaz d e varrer total mente os seres humanos d a fac ed a Terra. Foi uma c atástrofe monumental , sem d úvid a, mas nãoenviou a humanid ad e para o c emitério d a história. O que pod erial evar ao seu real d esaparec imento?

Para se ter uma id eia d e que tipo d e ac ontec imento pod eria d ar

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fim à presenç a d o Homo sapiens no pl aneta, basta ir à al a maispopul ar d o museu d e história natural d e sua c id ad e. Cerc a d e 65mil hões d e anos atrás, uma bol a d e fogo d e nove quil ômetros d ed iâmetro c hoc ou-se c ontra o que hoje é a penínsul a d e Yuc atán, noMéxic o, a uma vel oc id ad e d e tr inta quil ômetros por segund o. EsseNEO ( sigl a d e near-earth objec t, isto é , objeto próximo d a Terra)c riou al gumas d as ameaç as à vid a que um supervul c ão gera — bol asd e fogo, maremotos, expl osões etc . —, mas numa esc al a que ofusc a atéo maior d e tod os. Para se ter uma noç ão d e c omo seria se um c ol ossod esses atingisse a Terra hoje , e is um c enário pl ausível .

Primeiro, a expl osão l oc al l iteral mente aniquil aria tud o nosarred ores d o impac to, gerand o uma ond a d e c hoque que se irrad iariapor c entenas d e quil ômetros e d estruiria tud o o que enc ontrasse pel afrente . O fogo se espal haria por aproximad amente oitoc entosquil ômetros em tod as as d ireç ões. E isso sem fal ar d o inc ênd io gl obalque resul taria d a grand e quantid ad e d e fragmentos d e roc hal anç ad os na atmosfera, que c hoveriam sobre tod o o pl aneta. Aenergia l iberad a pel o impac to provavel mente e l evaria astemperaturas d a superf íc ie d a Terra a níveis insuportáveis. Éimportante l embrar que os d etritos l anç ad os na atmosferabl oqueariam os raios d e sol , prod uzind o um c ongel amento mund iall ogo em seguid a, e que as mac iç as ond as d e c hoque, ao atravessartod o o pl aneta, pod eriam também d esenc ad ear ativid ad es vul c ânic asc omo efeito c ol ateral .

Esses e feitos são mais d o que sufic ientes para expl ic ar o fim d osd inossauros, que d ominaram tod as as formas d e vid a sobre a Terrapor 170 mil hões d e anos. Seu d esaparec imento abriu um nic hoec ol ógic o para al guns pequenos mamíferos pel ud os, d o tamanho d eratazanas, que c om o tempo evol uíram e se transformaram em… sereshumanos. Uma c oisa é c erta, porém: um objeto c omo aquel e , se c aísseem nosso pl aneta hoje , ac abaria c om a c ivil izaç ão. É mais d o quec onc ebível que qual quer animal terrestre maior d o que um gatomorreria. Mas quem sabe ao c erto? Afinal d e c ontas, os d inossaurosnão tinham c omo guard ar al imentos enl atad os, sac os d e mil ho ougarantir um suprimento d e água potável num abrigo subterrâneo nasprofund ezas d a terra. Al gumas pessoas, então, tal vez c onseguissemsobreviver a um evento d essa magnitud e, mas isso não parec e ser omais provável . Al ém d isso, quem iria querer viver num mund o emque os sobreviventes, c om quase tod a c erteza, invejariam os mortos?

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Em nossa forma atual , nós, seres humanos, existimos há al gumasc entenas d e mil hares d e anos. Evid entemente, um c aso c omo o d oasteroid e que c aiu na penínsul a d e Yuc atán ac ontec e apenas uma vezem c entenas d e mil hares d e anos. Mas o que são c entenas d e mil haresd e anos em c omparaç ão c om o períod o d e quase d uzentos mil hões d eanos d e existênc ia d os d inossauros antes d e saírem d e c ena?

Eis a real id ad e: d esastre , c atástrofe , extinç ão. Pod e esc ol her. Ol eitor atento d everá ter observad o que tod os os eventos X queapresentei até agora têm uma c ausa em c omum: a natureza.Terremotos, vul c ões, c hoques d e asteroid es e outros ac ontec imentos d ogênero estão fora d o âmbito d a aç ão humana, tanto c omo c ausaquanto em rel aç ão à sua intervenç ão. Somos bastante impotentespara influenc iar os d esígnios d a natureza. Se não tivermos sorte ,teremos d e fec har as portas, apagar as l uzes e d ec l arar que a festaac abou. Por isso, embora essa espéc ie d e intervenç ão d a naturezaseja útil c omo pano d e fund o para a história que c onto neste l ivro, aparte mais interessante e re l evante d essa história para a humanid ad eé o outro l ad o d a moed a: as c atástrofes c ausad as pel o homem, tal vezintensific ad as pel a natureza. Examinemos al guns exempl os c ausad ospel o homem, anál ogos àquel es provoc ad os pel a natureza aqui c itad os,apesar d e muito menores no quesito impac to. Começ o c om al gunsc asos hipotétic os, para i l ustrar a gama d e possibil id ad es existentes, ed epois passo para exempl os reais.

O FATOR HUMANO

CONSIDERE OS SEGUINTES EVENTOS:

• Uma virul enta c epa d a gripe aviária atinge os seres humanosem Hong Kong, espal ha-se por tod a a Ásia e ac aba matand omais d e c inquenta mil hões d e pessoas.

• Um terremoto d e magnitud e 8 em Ginza, Tóquio, mata d oismil hões d e pessoas e gera um prejuízo material d e tr il hões d ed ól ares.

• Abel has c omeç am a morrer em grand es quantid ad es,interferind o na pol inizaç ão d e pl antas d o mund o inteiro ed ef l agrand o uma esc assez gl obal d e al imentaç ão.

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• Terroristas d etonam uma arma nuc l ear na Times Square nahora d o rush, arrasand o grand e parte d e Manhattan, matand omeio mil hão d e pessoas e red uzind o Nova York a esc ombros d eforma permanente.

• Um c arro-tanque c heio d e c l oro tomba no Rio d e Janeiro,d erramand o seu c onteúd o e matand o mais d e c inc o mil hões d ec arioc as.

Essa l ista pod eria c ontinuar ind efinid amente. A questão é queac ontec imentos inesperad os c apazes d e matar mil hões d e pessoas, oumesmo c entenas d e mil hões, estão bem d entro d os d omínios d opossível . Al ém d isso, mesmo sem grand es perd as humanas, o estoqued e c apital é d estruíd o, atrasand o o d esenvol vimento d o mund o tod opor d éc ad as. Nenhum d os itens d a l ista ac ima é impossível . Al iás,al guns d el es, c omo o d erramamento d e um prod uto químic omortífero, já ac ontec eram várias vezes.

Os seres humanos nunc a foram tão vul neráveis aos eventos Xquanto hoje . As c ompl exas infraestruturas d as quais d epend emos noc otid iano — transporte , c omunic aç ão, abastec imento d e água ec omid a, energia e l étr ic a, sistema d e saúd e, entre outras — são maisfrágeis d o que imaginamos, c onforme se verific a quand o oc orre umapequena fal ha nos sistemas d e d istr ibuiç ão. Quais são as c ausas d essagrand e fragil id ad e e d e nossa c onsequente vul nerabil id ad e? Existeuma forma d e real mente entend er esses ac ontec imentos e , não send opossível c ontrol á-l os, ao menos prevê-l os? Para respond er a essasperguntas, prec isamos saber um pouc o a respeito d as c ausas básic asque d ão origem a tais eventos e d eterminar se e l as são al go inerenteao func ionamento d as infraestruturas em si ou se são al go quepod emos prever e , até c erto ponto, c ontrol ar .

Como d emonstro ao l ongo d e tod o o restante d o l ivro, a c ausasubjac ente d os eventos extremos está d iretamente re l ac ionad a àc resc ente c ompl exid ad e d e nossa soc ied ad e gl obal . Essa c ompl exid ad ese manifesta d e d iversas maneiras. Pod e resul tar d a grand evinc ul aç ão entre infraestruturas, que transmite o tremor d e umaparte a outra d o sistema, quase sempre na vel oc id ad e d a l uz .Literal mente. Às vezes a c ompl exid ad e se revel a c omo c amad assobrepostas d e buroc rac ia, até que o sistema não suporta mais o peso— o que d enominarei d e “sobrec arga d e c ompl exid ad e” nas páginasa seguir. Em outras oc asiões, não existe um probl ema numa

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infraestrutura espec ífic a. O que há é um “d esc ompasso” d e níveis d ec ompl exid ad e entre d ois ou mais sistemas interativos, c omo o governod e um país e seus c id ad ãos. De qual quer mod o, os sistemas c om osquais c ontamos no d ia a d ia não têm c omo func ionar se foremc ompl exos d emais. Portanto, quand o o nível d e c ompl exid ad e ou od esc ompasso se torna maior d o que aquil o que o sistema c onseguesuportar, é nec essário red uzir a c ompl exid ad e para c orrigir asituaç ão. Um evento X é simpl esmente a forma que o sistema tem d erestaurar seu equil íbrio sustentável .

Esse ato d e equil íbrio será nosso l e itmotiv. Nosso d estino estávinc ul ad o a isso. Se o proc esso fal har, a humanid ad e vai junto. Omais assustad or é que os sistemas que sustentam o esti l o d e vid a d oséc ul o XXI não são tão sól id os quanto gostaríamos d e imaginar.Sobre essa questão, apresento aqui um punhad o d e exempl os maisd etal had os d e c ol apsos d e sistemas humanos, o que sugere nossavul nerabil id ad e c aso uma sobrec arga d e c ompl exid ad e venha aatingi-l os.

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DE ACORDO COM UMA notíc ia publ ic ad a no Los Angel es Times em 2004,uma grand e pane no sistema d e c ontrol e d e tráfego aéreo no sul d aCal ifórnia oc orreu, em parte , d evid o a uma “ irregul arid ad e d eprojeto” no mod o c omo eram integrad os os servid ores Wind ows d aMic rosoft. O rád io fic ou sem func ionar por mais d e três horas,d eixand o oitoc entos aviões em pl eno voo sem c ontato c om a c entral d ec ontrol e d e tráfego aéreo, o que, segund o a Fed eral AviationAd ministration (FAA, Ad ministraç ão Fed eral d e Aviaç ão) , ac abouc ausand o pel o menos c inc o c asos d e aproximaç ão exc essiva entreaeronaves. Os c ontrol ad ores d e voo tiveram d e rec orrer a seuspróprios te l e fones c e l u l ares para transmitir al ertas a c ol egas d eoutras l oc al id ad es e assistiram a situaç ões que por um triz não setransformaram em ac id entes sem ter c ond iç ões d e al ertar os pil otos.

No final , a FAA c onc l uiu que a pane se d eveu a uma c ombinaç ãod e fal ha humana e probl ema d e projeto nos servid ores Wind owsintrod uzid os nos três anos anteriores para substituir os antigos Unix.Os servid ores são programad os para fec har após 49,7 d ias d e uso,para prevenir uma sobrec arga d e d ad os, segund o informaç ões d e um

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d irigente d o sind ic ato d os aeroviários ao Los Angel es Times . Paraevitar esse d esl igamento automátic o, os téc nic os d evem reinic iar osistema manual mente a c ad a tr inta d ias. Um func ionáriod estreinad o esquec eu-se d e reinic iar e d eu no que d eu, d isse osind ic al ista. O sistema parou d e func ionar “d e uma hora paraoutra” . Os sistemas d e bac kup também não ajud aram, por c ausa d eum d efeito no sof tware.

Três anos mais tard e, em junho d e 2007, um sistema d ec omputad ores em Atl anta que proc essa os pl anos d e voo d os pil otos eos envia aos c ontrol ad ores d e voo também pifou, d esenc ad eand o umasérie d e d efeitos semel hantes em tod o o país. Centenas d e voossofreram atrasos ou até c anc el amentos nos aeroportos d e Nova York.Um ano d epois, o mesmo c omputad or em Atl anta enguiç ou d e novo. Oprobl ema oc orreu d urante um trabal ho d e rotina d o sof tware,fazend o c om que o c omputad or transferisse os d ad os para outrosistema d e c ontrol e l oc al izad o em S al t Lake City . S ó que o sistema d eUtah fic ou sobrec arregad o c om a grand e quantid ad e d e informaç õese não teve c omo proc essar tod os os pl anos d e voo existentes.Resul tad o? Nenhum pl ano d e voo foi proc essad o, e os c ontrol ad oresfic aram sem saber as rotas d os aviões e os horários d e pouso ed ec ol agem. Àquel a al tura, tod as as d ec ol agens foram c anc el ad as e otráfego aéreo f ic ou paral isad o.

Mas a questão d e erros humanos nos c éus c ertamente não serestr inge a mal -entend id os e c omputad ores vel hos. Em setembro d e2010, um avião d a c ompanhia US Airway s, c om 95 pessoas a bord o,c hegou a quinze metros d e d istânc ia d e um pequeno avião d e c argaao d ec ol ar d o aeroporto d e Minneapol is, e pouc os meses d epois umvoo d a Americ an Air l ines c om 259 pessoas a bord o quase c ol id iu emNova York c om d ois aviões d e c arga d a Forç a Aérea. Mais tard e, umc ontrol ad or d e tráfego aéreo d o c entro d e rad ares d e Ronkonkoma,Nova York, que c uid ava d o avião d a Americ an, rec l amou d o c l imapouc o profissional e d esl eixad o d o l oc al . E ol ha que não estamosfal and o d e um c entro qual quer, mas d o segund o maior c entro d erad ares d e tráfego aéreo d os Estad os Unid os.

Eu pod eria c ontar muitas histórias c omo essas, assim c omo outrasaind a mais interessantes, d e c ontrol ad ores que pegaram no sono natorre e outras fraquezas puramente humanas, o que torna o c éu uml ugar c ad a vez menos seguro para os viajantes d e hoje . Os d ad osestatístic os c onfirmam esse quad ro aterrad or, c om quase o d obro d e

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rel atos d e erros d e c ontrol ad ores d e tráfego aéreo d e 2009 a 2010,sem que uma sol uç ão esteja à vista. Fel izmente, a maioria não seenquad rava na c ategoria d os erros mais graves, aquel es que requeremd os pil otos med id as d e emergênc ia. Mesmo assim, os erros notific ad osaumentaram d e 37 em 2009 para 44 em 2010. Ou seja, aind a existemboas razões para se preoc upar c om a possibil id ad e d e que umautêntic o evento X seja c apaz d e interromper por c ompl eto tod o ofunc ionamento d o sistema d e tráfego aéreo. El e é bastante frágil ,equil ibrad o à beira d e um d esnível d e c ompl exid ad e entre asc ompanhias aéreas, que querem aumentar a quantid ad e d e voos eagrupá-l os segund o horários d e viagem c onvenientes, e a nec essid ad ed os c ontrol ad ores d e zel arem pel a seguranç a d o espaç o aéreo. Comoas histórias d emonstram, esse d esnível parec e se ampl iar a umavel oc id ad e impressionante.

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NO DIA 24 DE f evereiro d e 2010, a pol íc ia grega l anç ou bombas d e gás eenfrentou manifestantes no c entro d e Atenas após uma passeataorganizad a por sind ic atos c ontrários ao programa governamental d ec ortes d o maior d éfic it orç amentário d a União Europeia. Opresid ente d e um grand e sind ic ato d ec l arou: “ O povo na ruatransmitirá uma forte mensagem ao governo, mas princ ipal mente àUnião Europeia, aos merc ad os e a nossos parc eiros na Europa, d e queas pessoas e suas nec essid ad es têm d e estar ac ima d as d emand as d emerc ad o. Não c riamos a c r ise .” Mais tard e, os c ontrol ad ores d e voo,c ol etores d e impostos, maquinistas, méd ic os d e hospitais públ ic os eprofessores d e esc ol a primária também saíram às ruas para protestarc ontra os c ortes d e gastos d o governo. Os jornal istas também sejuntaram ao movimento, agravand o em muito a situaç ão.

Esse bafafá na Gréc ia é um exempl o perfeito d e agitaç ão c ivil quese transforma em d istúrbio c ivil , exigind o a intervenç ão d asautorid ad es para a manutenç ão d a ord em públ ic a. Só a títu l o d eesc l arec imento, um d istúrbio c ivil pod e assumir muitas formas:d esc ontentamento d e trabal had ores, greves, tumul tos, manifestaç õesd e protesto, até verd ad eiras rebel iões que l evam a revol uç õespol ític as. Os c ontextos que d esenc ad eiam tais d istúrbios pod em ser :tensão rac ial , c onflitos re l igiosos, d esemprego, fal ta d e bens e

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serviç os c omo al imento, água e transporte , ou med id as pol ític asimpopul ares, c omo a guerra d o Vietnã e a invasão d o Iraque.

Numa rápid a aval iaç ão d e c omo um c l ima c ad a vez mais negativonuma popul aç ão pod e resul tar em agitaç ão soc ial , veremos que osd istúrbios c ivis surgem d e d iversas formas. A situaç ão d a Gréc iad esc rita ac ima é um ótimo exempl o d o que pod e ac ontec er emd ec orrênc ia d e um abal o re l ativamente menor no setor financ eiro. Seo inc id ente oc orrer num momento em que o país está à beira d e umc ol apso, c omo no c aso d a Gréc ia (e tal vez d a Espanha, d e Portugal ed a Itál ia) , um pequeno empurrão (aqui, d as autorid ad es financ eirasd a União Europeia) pod e fazer c om que e l e d espenque l ad eiraabaixo. Os ac ontec imentos d e janeiro d e 2011 na Tunísia, no Egito emais tard e na L íbia e na S íria não me d eixam mentir .

Pod eríamos nos perguntar quais as possíveis c onsequênc ias d e umverd ad eiro c hoque, em c ontraposiç ão a um c l ima soc ial d ed eterioraç ão grad ativa. Consid ere, por exempl o, o terremoto d ejaneiro d e 2010 que d estruiu Porto Prínc ipe, c apital d o Haiti , paísc om um d os menores índ ic es d e rend a per c apita d o mund o. Ouimagine a d esord em soc ial que se instal aria c aso a internet parassed e func ionar por vários d ias seguid os num grand e c entropopul ac ional d o mund o ind ustrial izad o, c omo Lond res, Tóquio ouNova York. Isso interromperia o fornec imento d e energia e l étr ic a, osistema d e transportes, o abastec imento d e c omid a e o serviç o d ec omunic aç ões, sem fal ar no d esastroso impac to sobre as ativid ad esbanc árias e as empresas basead as na web. A quase inevitável bad ernaque se seguiria, c om saques e outras formas d e tumul to, faria c omque as manifestaç ões d e Atenas parec essem c onversa d o c há d a tard eem um evento promovid o pel a rainha d a Ingl aterra. Ou suponha queuma pand emia semel hante à peste negra assol asse uma c id ad e d e al tad ensid ad e d emográfic a, c omo Hong Kong ou São Paul o. Imagine oc aos que se seguiria! Atual mente, o c and id ato c om maiorprobabil id ad e d e c r iar esse tipo d e c onfusão seria um novo tsunamifinanc eiro.

Num rel atório sobre as perspec tivas ec onômic as mund iais para2010, a Mood y’s, agênc ia d e aval iaç ão d e r isc o d e c réd ito, al ertavaque os países c om d ívid a públ ic a em rápid o c resc imento d everiam sepreparar para um ano em que “a c oesão pol ític a e soc ial serátestad a” . O d oc umento l evantava a questão d e que futuros aumentosfisc ais e c ortes d e gastos pod eriam d esenc ad ear agitaç ão soc ial numa

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série d e países, tanto entre os d esenvol vid os quanto entre aquel es emd esenvol vimento. Antec ipand o a possibil id ad e d e uma c risefinanc eira numa grand e ec onomia, o re l atório d iz ia que 2010 seriaum “ano tumul tuad o para os emissores d e d ívid a públ ic a” . Ao seol har para o que ac ontec eu em seguid a, tais d ec l araç ões parec emreal mente profétic as. Extrapol and o um pouquinho, o que pod eríamosesperar d os anos vind ouros?

Uma boa suposiç ão é que as pessoas perc am a c onfianç a nac apac id ad e d o governo em sol uc ionar c rises financ eiras e saiam àsruas, inic iand o protestos e /ou ataques c ontra aquel es que ju l gamresponsáveis por sua miséria. Esse grupo c ertamente abrangeráautorid ad es governamentais e banqueiros, mas pod e inc l uir tambémimigrantes, minorias étnic as e re l igiosas, senhorios e até gerentes ed iretores d e empresas. O movimento Oc upem Wal l S treet, que surgiuno final d e 2011, é um exc el ente exempl o d esse proc esso na prátic a.Se quiser se impressionar, c omec e a marc ar num mapa os l ugares emque esse tipo d e viol ênc ia já ec l od iu. Cid ad es c omo Atenas, Sófia(Bul gária) , Porto Prínc ipe, R iga (Letônia) e Vil nius (Lituânia)estarão l á, assim c omo Túnis, Cairo, Damasc o e Sana ( Iêmen) .Mesmo c id ad es muitos maiores, c omo Nova York ( c om asmanifestaç ões d e Oc upem Wal l S treet) , Mosc ou, Roma, Lond res,Paris e Dubl in, já testemunharam grand es protestos c ontra oaumento d o d esemprego e a d iminuiç ão d os sal ários, assim c omorevol tas em rel aç ão à esc anc arad a l ac una entre os r ic os e “os outros99%”. A seguranç a d essas c id ad es, porém, c onseguiu fazer c om que asmanifestaç ões não esc apassem ao c ontrol e , pod end o inc l usive serc onsid erad as pac íf ic as (por enquanto) .

Pod eríamos até c l assific ar esses ac ontec imentos c omo um “surto”gl obal d e viol ênc ia motivad o pel a ec onomia, uma espéc ie d e“pand emia” soc ial . Embora seja provável que esses d istúrbios fiquemrestr itos a l oc ais espec ífic os, não se pod e d esc onsid erar total mente apossibil id ad e d e que, c om o agravamento d a situaç ão ec onômic amund ial , al guns d esses inc id entes regionais c ruzem as fronteirasnac ionais e se transformem em eventos mais ampl os e d urad ouros.Rebel iões armad as, gol pes mil itares e mesmo guerras entre Estad ospel o ac esso a rec ursos não pod em ser d esc artad os.

No entanto, até mesmo c onflitos soc iais d e c aráter revol uc ionáriosão insignific antes em c omparaç ão ao que uma c ombinaç ão entrenatureza e aç ão d o homem pod e susc itar. Conc l uirei, portanto, este

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resumid íssimo c atál ogo d e eventos extremos c om mais d ois exempl os,c ad a um à guisa d e introd uç ão aos re l atos mais d etal had osapresentad os em d ois c apítul os d a Parte II.

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U M DOS LIVROS MAIS vend id os d e 1969 foi o romanc e O enigma d eAnd rômed a, d e Mic hael Cric hton, que c onta a história d e um grupod e c ientistas envol vid os no estud o d e um mic ro-organismoextraterrestre que faz o sangue humano c oagul ar rapid amente,provoc and o a morte . Foi a obra que revel ou Cric hton, c oroand o-oc omo o rei d os esc ritores d e suspense tec nol ógic o. Embora sejaobviamente um l ivro d e fic ç ão, O enigma d e And rômed a é um rel atoarrepiante d a ameaç a biol ógic a que d eterminad os organismos pod emrepresentar ao sistema imunol ógic o humano, que, por nunc a ter sid oexposto a e l es, não tem c omo c ombatê-l os. No l ivro, os organismos vêmd o espaç o sid eral . Na vid a real , e l es pod em vir d o pl aneta Terramesmo, por meio d e ativid ad es biotec nol ógic as humanas, propositaisou ac id entais.

Para il ustrar as possibil id ad es, al guns anos atrás um grupo d epesquisad ores austral ianos prod uziu uma c epa d e ec tromel iainfec c iosa, uma variante d o vírus d a varíol a, esperand o esteril izaros ratos. De mod o geral , a ec tromel ia infec c iosa não representaperigo para os c amund ongos que partic ipam na experiênc ia, e osc ientistas só queriam inc rementá-l a um pouc o para esteril izar osroed ores. Infe l izmente, prod uziram uma variaç ão d o vírus tão l etalque matou até os ratos vac inad os c ontra a mol éstia.

Esse é um ótimo exempl o d e c omo um erro d e c ál c ul o pod e c riaruma c epa d e um vírus semel hante à varíol a que, se sair d os l imitesd o l aboratório, é c apaz d e c ausar uma pand emia inc ontrol ável . Enão estamos fal and o d o tipo d e fic ç ão que esc reveu Mic haelCric hton, princ ipal mente quand o pesquisad ores c omo os austral ianospubl ic am a fórmul a d e seu vírus mortífero em revistas c ientífic asabertas para tod o mund o l er e , quem sabe, reprod uzir a experiênc iaem seu próprio l aboratório.

Evid entemente, ser ia possível argumentar que a varíol a já existiaantes e que não e l iminou a humanid ad e d a fac e d a Terra. Mas foramc asos isol ad os, não o resul tad o d e uma inic iativa organizad a para

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espal har a d oenç a.Um pequeno exempl o prátic o d o que pod eria ac ontec er numa

esc al a mais ampl a é a epid emia d e gripe espanhol a após a PrimeiraGuerra Mund ial . Em 1918, uma c epa d e gripe surgid a nos Estad osUnid os ac abou matand o d e tr inta a c inquenta mil hões d e pessoas nomund o inteiro no períod o d e um ano. Agora, imagine uma praga ouvírus c om o pod er d e viajar por tod o o mund o, c omo a epid emia d e1918, mas que se espal he c om maior vel oc id ad e, matand o osinfec tad os mais rapid amente. Não há vac ina ou antibiótic o c apaz d ec ombatê-l o. Val e a pena ressal tar que isso pod eria ac ontec er c omoresul tad o d e proc essos naturais, não somente via mutaç ão intenc ionald e pesquisad ores em l aboratórios. Portanto, a ameaç a d e umapand emia gl obal d eixa d e ser mero d esastre e passa à c ategoria d everd ad eira c atástrofe .

É muito provável , c ontud o, que, assim c omo em O enigma d eAnd rômed a, em que um bêbad o e um bebê c onseguem sobreviver aoorganismo al ienígena, al guns seres humanos em c omunid ad es isol ad asou c om uma inc rível imunid ad e natural c onsigam sobreviver aqual quer c oisa que o homem ou a natureza c ol oque em seu c aminho.Ou seja, a humanid ad e provavel mente sobreviverá à mais fatal d aspand emias. Para c hegar à verd ad eira extinç ão a partir d e uma fontehumana, prec isamos ir um pouc o mais l onge.

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IRVING L ANGMUIR FOI UM f ísic o venc ed or d o Prêmio Nobel quetrabal hou no l aboratório d e pesquisa d a General El ec tr ic por maisd e quarenta anos, aposentand o-se em 1950. Em 1953, Kurt Vonnegutpubl ic ou o l ivro Cama d e gato, hoje um c l ássic o d a fic ç ão c ientífic a,c ujo protagonista, Dr. Fel ix Hoenikker, era basead o em Langmuir,um homem que Vonnegut c onhec eu graç as ao seu trabal ho d erel aç ões-públ ic as na GE antes d e se vol tar integral mente àl iteratura. Vonnegut c erta vez d isse a um jornal ista: “ Langmuir eratotal mente ind iferente aos usos que pod eriam ser feitos d as verd ad esque e l e d esenc avava e entregava a quem estivesse por perto.”

E m Cama d e gato, Hoenikker c r ia uma substânc ia c hamad a “gel o9” , uma forma al ternativa d e água que é sól id a em temperaturaambiente. Quand o um c ristal d essa estranha substânc ia entra em

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c ontato c om água normal , em estad o l íquid o, age c omo umd esenc ad ead or d e c r istal izaç ão, fazend o c om que a água sesol id ifique. A história retrata Hoenikker c omo um sujeito amoral ,sem interesse em nad a al ém d e sua pesquisa, e para quem o gel o 9não passa d e um quebra-c abeç a mental . No final , um d itad orc aribenho obtém um ou d ois c r istais d esses e os util iza para c ometersuic íd io, c ongel and o instantaneamente seu c orpo, que se transformaem um bl oc o d e gel o na temperatura ambiente. Nesse momento, umavião se c hoc a c ontra o pal ác io d o d itad or e seu c orpo aind ac ongel ad o c ai no mar, provoc and o uma enorme reaç ão em c ad eia, naqual tod o l íquid o d a Terra ( inc l usive o sangue) se transforma emgel o 9, c ausand o a d estruiç ão d e tod os os seres vivos.

Uma c oisa real mente espantosa, esse ge l o 9. Mas o c enário d esc ritopor Vonnegut não é tão d iferente d aquil o que al guns c ientistas estãovend o surgir c omo uma possibil id ad e real — aind a que um tantoremota — em d ec orrênc ia d o trabal ho real izad o hoje em d ia na áread a rapid amente c resc ente nanotec nol ogia.

Não há motivo l ógic o ou f ísic o que impeç a nanorrobôsautorrepl ic áveis, não maiores d o que al guns pouc os átomos, d e setornarem um c ânc er para a biosfera d a Terra e d e l ogo substituíremtod as as formas d e vid a basead as no c arbono pel a versãonanotec nol ógic a. O princ ipal obstác ul o para um c ânc er tão invasivoquanto esse é a d isponibil id ad e d a energia, uma vez que existebastante matéria orgânic a no mund o para ser d evorad a pel os“nanorrobôs” . Em princ ípio, e l es prec isariam d a l uz d o sol ou,possivel mente, d e tec id o orgânic o para c ontinuarem suas travessuraspel a ec osfera, seguind o os mol d es d o gel o 9. Porém, c ál c ul osreal izad os por inúmeros pesquisad ores na área d e nanotec nol ogiamostram que o nanoc ânc er pod eria absorver pel o menos metad e d aenergia sol ar que inc id e sobre o pl aneta, c obrind o a Terra c om umaespéc ie d e “gosma c inzenta” . A únic a forma d e d eter esse proc essoseria interromper a l igaç ão c om a fonte d e energia e/ou intervir d eal guma maneira em seu mec anismo d e repl ic aç ão.

Não estou fal and o, pois, d e al gum tipo d e d esastre espec ífic o c omd ata e l oc al , c omo um terremoto ou até mesmo uma c atástrofe queel imine c entenas d e mil hões d e pessoas no mund o inteiro, tal qualuma pand emia gl obal . A gosma c inzenta, assim c omo o gel o 9 d eVonnegut, simpl esmente d estrói tod o o ec ossistema que hoje sustenta avid a na Terra. O nanoc ânc er, portanto, é uma ameaç a real a tod o

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tipo d e vid a que c onhec emos hoje em d ia, um evento c apaz d eprovoc ar a extinç ão general izad a.

Até agora, util izei as pal avras d esastre , c atástrofe e extinç ão d emod o um tanto vago para c arac terizar os d iversos exempl os aquimenc ionad os. Antes d e nos aprofund armos nessa seara, é bomexaminarmos d e novo a questão, abord ad a superfic ial mente nopreâmbul o d este l ivro, sobre o que d e fato c onstitui um eventoextremo, ou mel hor, um evento X.

POMBAS BRANCAS E CISNES NEGROS

S E EVENTOS ATÍPICOS, COMO d oenç as fatais, furac ões ou c risesfinanc eiras, aparentemente ac ontec em tod a semana, c omo pod emosc hamá-l os d e “atípic os” ou “extremos” ? E, se são tão frequentes, porque os c onsid eramos “raros” ? E por que não c onseguimos ter maissuc esso em prevê-l os ou antec ipá-l os? Veremos as respostas para essase muitas outras perguntas instigantes nas páginas a seguir. O resumo,no entanto, é que, se nos c onc entrarmos em qual quer d omínioespec íf ic o, c omo, por exempl o, fenômenos rad ic ais c omo furac ões, aoc orrênc ia d esse furac ão é d e fato uma rarid ad e d entro d o c ontextod os eventos c l imátic os. Mas ampl iemos nossos horizontes ec onsid eremos d iversos d omínios, tais c omo c l ima, terremotos, c r isesno merc ad o financ eiro, pand emias, vul c ões e outras áreas. Repita apergunta: Qual a probabil id ad e d e oc orrer amanhã um evento X queenvol va pel o menos um d esses aspec tos? Não será surpresa c onstatarque e l a, na verd ad e, é bem al ta. Portanto, al gum tipo ac ontec e quasetod os os d ias em al gum l ugar.

Evid entemente, essa l inha d e rac ioc ínio apenas d esl oc a ainc erteza em rel aç ão ao momento d e oc orrênc ia d e um ac ontec imentonum d eterminad o d omínio para a inc erteza quanto ao l ugar e aod omínio em que a próxima atipic id ad e ac ontec erá. Ou seja, não háesc apatória. De uma forma ou d e outra, teremos d e enfrentar o fatod e que al guns tipos d e eventos fazem parte d o regime normal , c ujaprobabil id ad e pod e ser c al c ul ad a c om base em d ad os d o passad o,enquanto outros fazem parte d o regime d e eventos X e são quaseimpossíveis d e se prever. O probl ema é que e l es são os agentes d etransformaç ão d a vid a humana, e isso nunc a foi tão verd ad eiro

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quanto nos d ias d e hoje , quand o nós, os seres humanos, temos pel aprimeira vez a c apac id ad e d e c r iar al go tão extremo que pod eriaprovoc ar nossa própria d estruiç ão. Como a natureza já não é mais oúnic o anjo d a morte nesse jogo, não temos outra opç ão al ém d eutil izar nossa tec nol ogia e nossas ferramentas para anal isar ossistemas d a vid a c otid iana e revel ar al guns segred os d a extremainc erteza, a fim d e pel o menos ad iar, e possivel mente evitar, o mesmod estino d os d inossauros e d e outras espéc ies extintas.

Mobil izad os por esse pensamento, ad entremos o terreno em quequase nad a é verd ad eiramente c onhec id o, mas ond e grand e parte d enossa vid a futura será d eterminad a.

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APÓS A DEVASTAÇÃO DE Nova Orl eans c ausad a pel o furac ão Katrina, em2005, que d estruiu os d iques que protegiam a c id ad e, o general CarlS troc k , d o Corpo d e Engenheiros d o Exérc ito d os Estad os Unid os,d ec l arou:

Quand o o projeto foi c onc ebid o (…) c al c ul amos que tínhamosum nível d e proteç ão para d uzentos ou trezentos anos, ou seja,o ac ontec imento d o qual estávamos nos protegend o pod eria seexc ed er a c ad a d uzentos ou trezentos anos. Isso representa umaprobabil id ad e d e 0,5%. Nossa seguranç a, portanto, era d e99,5%. Infel izmente, tivemos esse 0,5% aqui.

A postura d e S troc k baseia-se na premissa d e que furac ões d aintensid ad e d o Katrina oc orrem c om uma frequênc ia que pod e serd esc rita pel a c l ássic a c urva d e Gauss (ou c urva em forma d e sino) , ac hamad a d istr ibuiç ão normal d e probabil id ad e. Que me perd oe NovaOrl eans (e o general S troc k) , mas os hid rol ogistas e estatístic os jásabem há mais d e um séc ul o que os ac ontec imentos que oc orrem nasextremid ad es d e uma d istr ibuiç ão estatístic a geral mente não pod emser d esc ritos c omo extremos. Como tod os nós vimos c om d ol orosac l areza na c rise d o sistema financ eiro gl obal d e 2008, a d istr ibuiç ãonormal ignora d e forma d ramátic a a probabil id ad e d eac ontec imentos atípic os. A c urva d e Gauss func iona bem para prevero c omportamento d e sistemas c ujo resul tad o é a soma d e um grand e

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número d e ac ontec imentos d e pequena esc al a, c ad a um seminfluênc ia sobre os outros (ou seja, sistemas “ ind epend entes” ) . Parail ustrar esse ponto, c onsid ere tod os os ad ul tos d o sexo masc ul ino nosEstad os Unid os e respond a à seguinte pergunta: Qual é a al turaméd ia d esse grupo e quão d istante al guém c om 1,65 metro d e al turaestá d essa méd ia? De uma maneira aproximad a, a al tura d e c ad aind ivíd uo d o sexo masc ul ino não d epend e d a al tura d os outros, e onúmero d e ind ivíd uos é muito grand e — c ond iç ões perfeitas parautil izar a c urva d e Gauss.

No entanto, se pud éssemos d e fato d eterminar o tipo d e c urva d eprobabil id ad e c riad a por eventos extremos (o que é impossível ) , ac urva resul tante seria aquel a informal mente c hamad a d ed istr ibuiç ão d e “c aud a pesad a” . A d iferenç a é mostrad a na Figura 1.O regime normal , c om a d esc riç ão d e ac ontec imentos ind epend entes,está representad o pel a c urva d e Gauss trad ic ional , a l inha c inza,ignorand o seriamente a probabil id ad e d os “c hoques” atípic os d oregime d e eventos extremos, representad o pel a área l istrad a. Asgrand es atipic id ad es estão nessa c aud a. Util izand o essa “ l ei d ac aud a pesad a” para d esc rever a situaç ão d e Nova Orl eans, porexempl o, o 0,5% menc ionad o pel o general S troc k teria fic ad o emtorno d e 5%, e os trezentos anos seriam red uzid os a c erc a d e sessentaanos.

Ol hand o para o gráfic o (o únic o d este l ivro, prometo) , voc êpod erá ac har que a área l istrad a d a d istr ibuiç ão d e c aud a pesad ad os ac ontec imentos extremos não d ifere tanto d a área d a c urva d eGauss, mas não é o c aso, c omo vou expl ic ar .

Para il ustrar as impl ic aç ões d a figura, d e ac ord o c om a c urva d e

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Gauss, a probabil id ad e d e oc orrer um ac ontec imento c om um d esviomuito ac entuad o (uma grand e atipic id ad e) d entro d a área l istrad aparec e ser muito pequena, pratic amente nul a. No entanto, aprobabil id ad e d e esse mesmo ac ontec imento oc orrer é mil hares d evezes maior se vier d e um c onjunto d e eventos extremos que obed ec ema uma d istr ibuiç ão d e c aud a pesad a, em vez d a c urva d e Gauss. Issosignific a que, se uma c ompanhia d e seguros estivesse vend end oapól ic es c ontra ac ontec imentos improváveis e baseasse seu prêmio d erisc o numa c urva d e Gauss, e l a pod eria c obrar uma taxa d e mil hõesd e d ól ares. Mas, se o grupo d e ac ontec imentos seguisse a l e i d eprobabil id ad e d a c aud a pesad a, a verd ad eira sinistral id ad e d aempresa pod eria ser d e bil hões!

Antes d e c onc l uir esta breve d isc ussão sobre c urvas em forma d esino e c aud as pesad as, gostaria d e vol tar a enfatizar que, quand ousamos uma c urva c omo a d a Figura 1 para d esc rever aprobabil id ad e d e um evento X, estamos fal and o metaforic amente.Essa c urva pod e até existir em al gum reino id eal izad o ac ima d asinfluênc ias d e espaç o e tempo, mas não há c omo c al c ul á-l a. Paraaval iar os r isc os d a área d e ac ontec imentos extremos, d evemossubstituir a probabil id ad e e a estatístic a por um novo parad igma. Oargumento que apresento neste l ivro é que os d esc ompassos d ec ompl exid ad e servem c omo ponto d e partid a para essa mud anç a d eparad igma.

Os mod el os d e previsão (que c onstituem a base d os prêmios d eseguro, d os c ód igos d e ed ific aç ões, d as expec tativas ec onômic as etc .)normal mente se baseiam apenas em d ad os d o passad o, que, d e ummod o geral , c onstituem uma pequena amostra d o total d epossibil id ad es. O probl ema é que os “espec ial istas” qued esenvol veram esses mod el os c ostumam c hegar à c onc l usão d e quemapearam tod o o espec tro d e possíveis c omportamentos d os sistemas, oque não pod eria estar mais l onge d a verd ad e. Pior que isso, quand oeventos atípic os se manifestam, e l es são re l egad os à c ategoria d aquil oque oc orre “uma vez a c ad a séc ul o” e pratic amente ignorad os nopl anejamento para o futuro. Outro erro muito frequente é ac red itarque já “sol uc ionamos” o( s) probl ema(s) exposto( s) por umd eterminad o evento extremo (pense na grand e quantid ad e d e l eispromul gad as após um d esastre) e que, portanto, não é prec iso sepreoc upar c om a possibil id ad e d e outras anomal ias. As bases estãotod as c obertas, por assim d izer. Infe l izmente, d e ond e veio o

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primeiro ac ontec imento extremo há muito mais. A verd ad eira l iç ãoaqui, evid entemente, é que o mund o é muito mais imprevisível d o quegostaríamos d e ac red itar .

Qual a origem d essas c aud as pesad as? Para respond er a essapergunta, examinemos a área em que e l as foram estud ad as mais afund o, embora sem ser d evid amente val orizad as e util izad as: omerc ad o d e aç ões. (Cuid ad o para não c onfund ir “c aud a pesad a” c omo c onc eito d e “c aud a l onga” d o mund o d os negóc ios, apl ic ad o porgrand es l ojas c omo Amazon ou iTunes, que, graç as a um ampl oc atál ogo e fác il ac esso, estend em o tempo d e vid a d e seus prod utos.)

O princ ipal motivo d a existênc ia d as c aud as pesad as — os eventosX — no merc ad o financ eiro é que as d ec isões tomad as pel osinvestid ores não são total mente ind epend entes ( essa é a premissabásic a por trás d e uma d istr ibuiç ão em forma d e sino em rel aç ão amud anç as d e preç o d e merc ad o) . Nas grand es baixas, os investid oresfic am c om med o e se tornam mais avessos a r isc os, enquanto nasgrand es al tas e l es exibem uma “exuberânc ia irrac ional ” . Esse tipo d einterd epend ênc ia faz c om que os investid ores se arrebanhem, o quepor sua vez os l eva a c omprar em al tas absurd as e a vend er em baixasil ógic as. Esse c omportamento, somad o a eventuais c hoques d o mund oexterno (entre e l es, possíveis eventos X) , faz c om que as mud anç as d epreç o d e merc ad o c heguem a extremos c om muito mais frequênc ia d oque os mod el os basead os na d istr ibuiç ão normal nos l evariam a c rer .

Uma il ustraç ão gráfic a d esse ponto é que a c ausa c ausarumtéc nic a d a atual c r ise financ eira gl obal é o uso quase universal d ac hamad a fórmul a d e Bl ac k-Sc hol es para prec ific ar d erivativos eopç ões. Essa fórmul a, que rend eu a My ron Sc hol es e Robert Merton oPrêmio Nobel d e ec onomia em 1997 (Fisc her Bl ac k fal ec eu em 1995) ,simpl esmente está errad a. Por que errad a? De novo, um d osprinc ipais motivos é que e l a parte d a premissa d e que as d ec isões d osinvestid ores são ind epend entes, l evand o seus c r iad ores a basear osc ál c ul os na d istr ibuiç ão normal , ou seja, em uma c urva em forma d esino. A fórmul a, portanto, subestima imensamente a probabil id ad ed e ac ontec imentos d e al to r isc o, c omo aquel es que d e fato oc orreramem 2007, d esenc ad eand o uma reaç ão em c ad eia d e fal ênc ia d e banc ose c aos financ eiro que nos afeta até hoje . Como um amigo meu d iztod o ano, ao ser anunc iad o o Prêmio Nobel d e ec onomia: “ Mais ummotivo para não haver Prêmio Nobel d e ec onomia!” Se quiséssemosprec isar o momento exato em que tod a essa l inha d e pensamento em

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forma d e sino foi d esmistific ad a, c omo o imperad or e suas roupasnovas d a fábul a, nad a mel hor d o que ind ic ar o best-se l l er O c isnenegro, d e Nassim Nic hol as Tal eb, que afirma, d e maneirac onvinc ente e provoc ante, que tod a a estrutura d o mund o financ eiroteóric o está c onstruíd a sobre areia moved iç a.

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NO FINAL DE MARÇO d e 2007, d ei uma pal estra sobre previsões emZurique, num workshop em que Tal eb era um d os c onvid ad os. Seul ivro estava para ser l anç ad o e , por ac aso, e l e rec ebeu um par d eprovas d e seu ed itor d urante o enc ontro. Num gesto d e generosid ad e,presenteou-me c om um exempl ar autografad o c omo uma espéc ie d el embranç a d e nosso primeiro enc ontro pessoal . Nessa oc asião, tive aoportunid ad e d e fal ar c om el e sobre a questão que apenas al gunsmeses mais tard e estamparia as primeiras páginas d os jornais d omund o inteiro: o iminente c ol apso d o sistema financ eiro americ ano,prec ipitad o pel a d erroc ad a d o Lehman Brothers no final d e 2008,d esd e então exac erbad a pel as d esastrosas intervenç ões d o Fed eralReserve (o Banc o Central americ ano) e d e outros órgãos pol ític os ef inanc eiros d o governo no mund o tod o.

Tal eb foi, por muitos anos, investid or em instrumentos financ eirosexótic os antes d e assumir uma vid a mais c ontempl ativa, d eac ad êmic o, intel ec tual e provoc ad or. Suas visões penetrantes ec áustic as quanto aos grand es r isc os assumid os d iariamente nosc entros financ eiros gl obais eram, portanto, esc l arec ed oras e , d evoad mitir , um pouc o enervantes também. Veja por quê.

Em seu l ivro, Tal eb d esc reve “c isnes negros” c omo ac ontec imentosque “estão fora d o c ampo d as expec tativas c omuns, possuem umgrand e impac to e , por c onta d a natureza humana, nos fazem busc arexpl ic aç ões para sua oc orrênc ia após o fato” . Apesar d e nãod isc ord ar d a sua d efiniç ão d e c isne negro — em nossa terminol ogiaaqui, um ac ontec imento extremo —, parec e-me uma d efiniç ão umtanto inc ompl eta em al guns aspec tos signific ativos. Mel hord esc onstruí-l a para pod ermos empregá-l a d e uma forma mais útil emnossas d isc ussões.

Primeiro d e tud o, rarid ad e. Esse é c ertamente o aspec to menospol êmic o em rel aç ão ao que c onstitui ou não um evento extremo,

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c omo já c omentei no preâmbul o e repeti nas páginas anteriores. Pord efiniç ão, os eventos X se enc ontram fora d o c ampo d as expec tativasd iárias. Se são mesmo total mente inesperad os, c omo sugere ad efiniç ão d e Tal eb, já é outra história. Afinal , até ac ontec imentosraros, c omo o impac to d e um asteroid e ou um ataque terrorista c omoo d e 11 d e setembro, pod em ser esperad os. O únic o e l ementosurpreend ente é em que l ugar e momento e l es oc orrerão e quantoestrago c ausarão. Mas não há d úvid a d e que oc orrerão, a d espeito d enossos d esejos, esperanç as e med os d e seres humanos insignific antesquerend o mod ific ar o estad o d as c oisas. Como no c aso d os furac ões ed os terremotos, a únic a c oisa que pod emos fazer é tentar prever aapariç ão d esses agentes d e mud anç a e nos preparar para e l es, a fimd e mitigar seus d anos. Tod os c onc ord am então quanto ao fatorrarid ad e — mas rarid ad e no que tange à sensaç ão d e surpresa, c omofoi d isc utid o no preâmbul o. Não se trata d e rarid ad e no sentid o d e“ infrequente” . Trataremos d esse assunto mais ad iante.

O assunto fic a aind a mais interessante quand o abord amos oaspec to d o impac to extremo d a tr ind ad e d e Tal eb, uma vez querarid ad e e impac to são temas isol ad os. Um furac ão d e forç a 5 qued evasta Nova Orl eans é uma c oisa. O mesmo furac ão passand o pel oCaribe sem c ausar d ano al gum é outra. Para um espec ial ista emfurac ões, os d ois d espertam o mesmo interesse . Já para a CNN, asc ompanhias d e seguro e resseguro e , evid entemente, os habitantes d eNova Orl eans, os c asos são bem d iferentes, e a d iferenç a resid e noimpac to d o ac ontec imento, que pod e ser med id o em d ól ares, vid asperd id as e/ou abal o emoc ional . Desse mod o, tanto a rarid ad e quantoo impac to d evem ser c arac terizad os d e forma mais prec isa para quese estabel eç a quão negro é o c isne em questão.

O c omponente mais interessante d a tr íad e d e Tal eb é , sem d úvid a,o que se refere às histórias que tod os nós, seres humanos, c ontamosapós os fatos, para tentar expl ic ar e entend er os ac ontec imentosextremos. Obviamente, essa perna d o tr ipé é a parte que Tal eb maisaprec ia, pois a pred il eç ão d a humanid ad e por narrativas enganosasd á origem à i l usão d e que somos c apazes d e prever e até d e c ontrol arc isnes negros. Como Tal eb, não ac red ito que haja ind ivíd uo oumétod o, vivo, morto ou por nasc er, c apaz d e prever, d e maneirac onfiável e sistemátic a, eventos extremos espec íf ic os. Quand o d igo“prever” , refiro-me a “saber a hora e o l oc al ” c om prec isãosufic iente para prevenç ão, preparativos e med id as d e sobrevivênc ia.

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Uma previsão d essas seria al go d o tipo: “ Um terremoto d e 6,7 grausd e magnitud e em Chul a Vista, San Diego, atingirá o su l d aCal ifórnia no d ia 24 d e fevereiro d e 2017 às 19h47.” Ac red itar quetal previsão é possível , mesmo em teoria, é suc umbir a umaarrogânc ia perigosa e total mente absurd a. Previsões d esse tipofunc ionam por vezes na área d e c iênc ias naturais, sobretud oastronomia e engenharia, e envol vem, sem exc eç ão, ac ontec imentosinc l uíd os no regime regul ar d a Figura 1, que c ostumam oc orrerd entro d e um c urto períod o d e tempo, numa região geográfic al imitad a. Portanto, c onc ord o c om quem d iz que prever eventos X éuma missão impossível .

Por outro l ad o, c reio ser perfeitamente viável d esenvol verferramentas para antec ipar eventos extremos, transformand o umc isne negro em uma pomba branc a c omum (c aso c ontrário, não teriaesc rito este l ivro! ) . Para entend er o que isso signific a, l embre-se d eque e l es, princ ipal mente os c ausad os pel o homem, d ec orrem d e umac ombinaç ão d e fatores que o biól ogo franc ês Jac ques Monod c hamoud e “ac aso e nec essid ad e” . Não importa o momento, há sempre umc enário soc ial , uma espéc ie d e c ampo d e jogo, no qual as aç ões e osc omportamentos humanos se d esenvol vem. Esse terreno está emc onstante transformaç ão, d and o origem a um c ontextosoc iopsic ol ógic o, num c erto tempo e espaç o, que tend e a propic iar aoc orrênc ia d e al guns tipos d e ac ontec imentos e a d ific ul tar outros.Pod eríamos pensar metaforic amente nesse c enário c omo al go queinfluenc ia o “c urso” d os eventos. Às vezes o c urso se vol ta para umd eterminad o tipo d e ac ontec imento, às vezes e l e se al tera, fazend oc om que a oc orrênc ia d aquel e mesmo evento se torne muito menosprovável . É al go que não d epend e d e al guma aç ão espec ífic a, mas queapenas influenc ia a probabil id ad e d o que pod e ou não oc orrerd entro d o vasto c ampo d e possibil id ad es.

A outra metad e d a história é o c omponente “ac aso” . Numd eterminad o meio, muitas c oisas pod em ac ontec er. O que d e fatooc orre é d efinid o por fatores essenc ial mente al eatórios ( isto é , semnenhum pad rão d isc ernível ) num momento espec ífic o, fatores quefazem c om que um d os potenc iais ac ontec imentos real mente sec onc retize . Pense num c enário d e possibil id ad es semel hante a umagrand e montanha c erc ad a por val es. Voc ê está sentad o no pic o e semquerer c ai montanha abaixo em c erta d ireç ão, ind o parar em um d osmuitos val es existentes. De uma hora para outra, tod os os val es,

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exc eto aquel e em que voc ê está, d eixam d e ser um d estino possível .Mas, se pouc o antes d e voc ê ser empurrad o a paisagem tivessemud ad o d e tal forma que o pic o fosse apenas um pl anal to, voc ê teriaapenas saíd o d o l ugar, sem ac abar num val e . Em outras pal avras,nad a d e mais ter ia ac ontec id o. Ou, se o pic o se tornasse assimétric o,seria nec essário um empurrão mais forte para l evá-l o rumo a umd eterminad o val e em vez d e outros.

Quero d izer que o que observamos, na real id ad e, é sempre umac ombinaç ão d e c irc unstânc ias c ontextuais c om um el emento d ec asual id ad e, que não tem c omo ser previsto d e forma al guma.Ac red ito que existam muitas maneiras d iferentes d e saber o formatod o c ampo d e jogo e seus c ontínuos movimentos se quisermos obterinformaç ões úteis sobre que tipo d e evento tem maior ou menorprobabil id ad e d e oc orrer num d eterminad o momento. Portanto,qual quer d isc urso sobre “previsão” exata neste l ivro refere-se apenasao prognóstic o d e mud anç as no c ampo d e jogo, não ao prognóstic o d eac ontec imentos espec ífic os. Para isso, ser ia prec iso uma c artomanteou uma bol a d e c r istal , e não um c ientista espec ial izad o emc ompl exid ad e.

Devid o à d ific ul d ad e d e previsão d e eventos atípic os, e l esgeral mente não são inc l uíd os na c onc epç ão d os sistemas. Isso faz c omque esses sistemas sejam espec ial mente perigosos, porque, c omoveremos ad iante, o mund o está c ad a vez mais c ompl exo, e nossa vid a,por c onseguinte , passou a d epend er d e sistemas c ad a vez maisc ompl exos também — os mesmos, é bom l embrar, que são inc apazes d el evar em c onta eventos atípic os. Vejamos mais al guns exempl os paraenfatizar bem esse ponto.

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É MUITO PROVÁVEL QUE grand e parte d os l e itores d estas páginas tenha,em c asa ou no esc ritório, uma c afeteira d e ú l tima geraç ão, queprepara um maravil hoso expresso ao simpl es toque d e um botão.Primeiro, os grãos são moíd os, prensad os e pré-l avad os. Depois, aágua fervend o passa pel os grãos a al ta pressão, e o resul tad o é aquel ad ose d e c afeína d e que aparentemente prec isamos tanto para quenosso motor func ione pel a manhã. Em suma, essa máquina é um robôd e fazer c afé . Basta c ol oc ar os grãos, c onec tar a máquina a uma

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fonte d e água e apertar um botão. Mas tod a a automaç ão embutid ana c afeteira tem um preç o: um grand e aumento na c ompl exid ad e d oaparel ho que faz c afé , em c ontraposiç ão ao uso d a antiga c afeteiraital iana, que exigia que voc ê fosse o robô ao moer os grãos, c ol oc ar aágua e o pó no rec ipiente , l evá-l a ao fogo e por fim servir o c afé naxíc ara.

Uma grand e c onsequênc ia d o ad vento d a c afeteira“aperfeiç oad a” , d e al ta tec nol ogia ( l eia-se “d e al ta c ompl exid ad e” ) ,é que voc ê não é mais c apaz d e fazer a manutenç ão d a máquina. Sed er al gum probl ema no “c érebro” d o mic roproc essad or, nofornec imento d e água, na bomba d e al ta pressão ou sabe Deus no quemais, já era. O sistema sofre um c ol apso e voc ê não tem c omoc onsertá-l o sozinho. E boa sorte ao tentar fal ar c om al guém d oserviç o d e atend imento ao c l iente .

Evid entemente, uma sobrec arga d e c ompl exid ad e na c afeteira éapenas um aborrec imento. Uma sobrec arga d essas em seu c arro já éoutra história. E, quand o al go simil ar ac ontec e numa infraestruturad a qual se d epend e no d ia a d ia, as c oisas real mente c omeç am a fic arsérias.

Numa nota aos d esenvol ved ores d e sof tware d a Mic rosoft em 2005,Ray Ozzie , ex-responsável téc nic o d a empresa, esc reveu: “Ac ompl exid ad e mata. El a d rena a energia d os programad ores,d ific ul ta o pl anejamento, o d esenvol vimento e a testagem d eprod utos, oc asiona probl emas d e seguranç a e gera frustraç ão nosad ministrad ores e nos usuários finais.” A nota prosseguia c om id eiaspara manter a c ompl exid ad e sob c ontrol e .

Ozzie esc reveu essas pal avras numa époc a em que o Wind ows 2000c ontinha c erc a d e tr inta mil hões d e l inhas d e c ód igo. Seu suc essor, oWind ows XP, tinha 45 mil hões, e , embora a Mic rosoft tenhasabiamente se rec usad o a anunc iar o número d e l inhas d e c ód igo d oWind ows 7, tud o l eva a c rer que e l e possua bem mais d o quec inquenta mil hões. Mas e d aí? Mesmo que a Mic rosoft c onseguissec ontrol ar o tamanho ( l eia-se “c ompl exid ad e” ) d e seu sistemaoperac ional , c ompl ementos d e programas, pl ug-ins d e navegaç ão,wikis e apetrec hos d o gênero e l evam as l inhas d e c ód igo oc ul tasd entro d e seu c omputad or à c asa d as c entenas d e mil hões. O ponto éque os sistemas c omputac ionais não são projetad os. El es evol uem e,ao evol uírem, ac abam ul trapassand o nossa c apac id ad e d e c ontrol á-l os — ou mesmo d e c ompreend ê-l os — total mente. De c erta forma,

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assumem, l iteral mente, vid a própria. E aqui c hegamos a uma d asmaiores l iç ões d este l ivro: a vid a d esses sistemas c ompl exos nãopermanec e estátic a para sempre.

Qual quer pessoa c om um pl ano d e aposentad oria d eve teresbarrad o nessa questão em 2008. Numa époc a anterior, mais serena,os banc os entravam em fal ênc ia quand o os d eved ores não pagavam osempréstimos c onc ed id os. No mund o d e hoje , é a c ompl exid ad e d osativos d o banc o que pod e l evá-l os para o burac o, não sua c arteira d eempréstimos. A vergonhosa fal ênc ia d o Lehman Brothers em 2007 éum exempl o perfeito. O banc o entrou numa c rise d e l iquid ez queac abou send o fatal , pois não c onseguiu provar para o merc ad o queseus ativos eram sól id os. Em suma, seus d irigentes não possuíam umavisão sufic ientemente c l ara em rel aç ão à sol id ez d e seus ativosporque não tinham a mínima id eia d e c omo aval iar seu r isc o. Osativos não obed ec eram aos fund amentos básic os d a ec onomia eassumiram vid a própria.

A c ul pa é d a c ompl exid ad e. Quand o os ativos d e um banc o são tãoc ompl exos que ninguém d e d entro ou d e fora c onsegue entend ê-l os, osinvestid ores se rec usam a fornec er d inheiro para impul sionar sual iquid ez . Como resul tad o, os banc os agarram-se ao d inheiro que játêm e param d e c onc ed er empréstimos a seus c l ientes. O probl ema éque, quand o os merc ad os d e c réd ito c ongel am, uma ec onomiabasead a no c apital ismo também c ongel a, pois seu motor é a c onc essãosegura e c ontínua d e c réd ito.

Como veremos na próxima seç ão, a grand e questão aqui é que osistema financ eiro se tornou c ompl exo d emais para ser sustentad o.Pod eríamos afirmar que c hegamos a um estad o d e c ompl exid ad einstituc ional impossível d e simpl ific ar, à beira d e um c ol apso total .Os maiores banc os d o mund o prec isam fic ar mais simpl es — muitomais simpl es —, mas é quase impossível que empresas d e c apitalaberto c ompl exas e buroc rátic as, c omo o Citibank ou o UBS,promovam um d ownsiz ing vol untário. O que ac ontec e em d ec orrênc iad isso é , em grand e parte , o enigma c entral que proc uro d esvend ar aol ongo d o restante d o l ivro.

ESTAMOS CONDENADOS?

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JOSEPH TAINTER É UM arqueól ogo d a Universid ad e Estad ual d e Utahque passou a maior parte d e sua c arreira estud and o soc ied ad esantigas. Tainter d iz-se profund amente preoc upad o c om a c resc entec ompl exid ad e d o mund o mod erno, que, segund o e l e , pod e ac abarsend o nossa própria ruína. (Suas id eias a esse respeito estãoc ompil ad as em seu l ivro, já c l ássic o, e Col l apse of Compl exS oc ieties [O c ol apso d as soc ied ad es c ompl exas] , d e 1988.) El eargumenta que, quand o saímos d o estad o primitivo d e c aç a e pesc a ec omeç amos a estabel ec er c omunid ad es, tivemos d e sol uc ionar d iversosprobl emas para venc er os c apric hos d a natureza e possibil itar asobrevivênc ia d e um grand e ajuntamento d e pessoas. À med id a qued iferentes níveis d e organizaç ão são ac resc entad os — c omo aestrutura d e ad ministraç ão d e uma c id ad e, uma autorid ad e fisc alque arrec ad e rec ursos para sustentar tal estrutura, um organismo d ed efesa etc . —, é prec iso pagar um preç o por c ad a um d esses níveis.Tainter d emonstra, d e maneira bastante c onvinc ente, que a moed ac omum a tod os esses c ustos é a energia e que a c resc entec ompl exid ad e d o sistema gerad a pel o ac úmul o d os níveismenc ionad os c ond uz à l ei d os rend imentos d ec resc entes: quanto maisenergia se gasta, menos benefíc ios ad ic ionais são obtid os.

Por exempl o, c ad a d ól ar extra investid o em pesquisa hoje gerac ad a vez menos patentes. A c rise surge quand o rec onhec emos que assoc ied ad es d evem sol uc ionar probl emas c onstantemente se quiseremc ontinuar c resc end o, mas que a sol uç ão para esses probl emas requerestruturas aind a mais c ompl exas. Em úl tima instânc ia, c hega-se a umponto em que tod os os rec ursos são c onsumid os apenas para manter osistema em seu nível atual . A essa al tura, a soc ied ad e experimentauma sobrec arga d e c ompl exid ad e. Não existem mais graus d el iberd ad e para l id ar c om novos probl emas. Quand o um novoprobl ema aparec e, o sistema não tem c omo se ad aptar ac resc entand oc ompl exid ad e e , portanto, entra em c ol apso na hora, por meio d e umevento extremo que red uz rapid amente a sobrec arga. Às vezes e l eassume a forma d e uma c al amid ad e financ eira ou d e uma revol uç ãopol ític a, mas, ao l ongo d a história, d e mod o geral , é a guerra, grand eou pequena, c ivil ou mil itar, que d esfaz o ac úmul o d e c ompl exid ad e.Depois, a soc ied ad e se rec onstrói, partind o d e um patamar muitomais baixo. A bem d oc umentad a “asc ensão e qued a” d o ImpérioR omano é apenas um entre muitos exempl os d isso.

Evid entemente, pod eríamos al egar que a inovaç ão, os avanç os

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tec nol ógic os e futuras e inimagináveis d esc obertas c ientífic as nospermitirão c ontornar essa “ l ei d a c ompl exid ad e c resc ente” . Ninguémpod e garantir. Mas os fatos referentes à forma c omo os sistemasc ompl exos func ionam, sem fal ar nos registros históric os, d epõemc ontra essa id eia. Em úl tima instânc ia, a questão é : Por quantotempo?

Em estud os d etal had os sobre organizaç ões soc iais, os c ientistas d esistemas d esc obriram que, c onforme há um aumento na c ompl exid ad ed e uma organizaç ão, mais níveis d e ad ministraç ão são introd uzid os,obed ec end o a uma ord em hierárquic a. Porém, numa hierarquia éprec iso haver al gum “ l íd er” que supervisione/c ompreend a aestrutura geral e possa transmitir instruç ões para aquel es que seenc ontram em níveis mais baixos d a pirâmid e soc ial . Ac ompl exid ad e, c om o tempo, torna-se grand e d emais para esseproc esso func ionar, e nesse ponto a hierarquia d á l ugar a estruturasd esc entral izad as, c om as tomad as d e d ec isão d istr ibuíd as entremuitas pessoas. Esse parec e ser o sistema em que se baseiam, d e formaprec ária, as soc ied ad es atuais.

À primeira vista, pod eríamos imaginar que uma estruturad esc entral izad a é mais sól id a para enfrentar d istúrbios inesperad osd o que o pad rão hierárquic o. Mas c omo o c ientista pol ític o omasHomer-Dixon observa em seu l ivro e Upsid e of Down [O l ad opositivo d e estar mal ] : “ Inic ial mente, a c resc ente c onec tivid ad e e ad iversid ad e ajud am, mas, à med id a que as c onexões se tornam maisd ensas, o sistema fic a tão c oeso que um frac asso numa partereverbera em tod a a red e.” Homer-Dixon também observa: “Asintrinc ad as red es que nos c onec tam — e pel as quais as pessoas, osmateriais, as informaç ões, o d inheiro e a energia transitam —aumentam e transmitem qual quer c hoque.” Portanto, mesmo umd efeito aparentemente pequeno na mal ha d a soc ied ad e, c omo umataque terrorista, uma c rise financ eira ou o surto d e al guma d oenç a,pod e d esestabil izar a estrutura inteira.

O que fazer?A sol uç ão mais brutal para o probl ema d a c ompl exid ad e c resc ente

é red uzir a c ompl exid ad e d a soc ied ad e vol tand o a um esti l o d e vid aanterior ao d e hoje . Tainter d iz que c onhec e apenas uma soc ied ad ena história que d ec id iu d ar esse grand e passo e d esc ervol untariamente a esc ad a d a c ompl exid ad e. Foi o Império Bizantino,que resol veu se simpl ific ar após perd er a maior parte d e seus

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territórios para os árabes. Nesse c aso, as c id ad es d esaparec eram, aec onomia tornou-se bem menos “ bizantina” e o exérc ito ofic ial foisubstituíd o por mil íc ias l oc ais. Embora al guns anal istas d efend amaté hoje esse tipo d e retorno a uma existênc ia mais simpl es, a id eianão d eve se popul arizar. A vid a d as pessoas na soc ied ad e atual é tãoimbric ad a a d iversas infraestruturas — abastec imento d e al imento eágua, fornec imento d e energia, transporte , meios d e c omunic aç ão eoutras — que não d á para se afastar d a “d roga” d a mod ernid ad esem sofrer os d ol orosos e inac eitáveis sintomas d a sínd rome d eabstinênc ia. Quase ninguém quer pagar esse preç o.

A únic a al ternativa real ista d isponível é c omeç ar a afrouxar osapertad os nós d as interc onexões resul tantes d e fenômenos c omo agl obal izaç ão. As pessoas terão d e rec onhec er que a red und ânc ia nãoé nec essariamente uma c oisa ruim num sistema e que maximizar suaefic iênc ia só para extrair d el e o maior l uc ro possível é uma forma d epensar bastante bitol ad a. Afinal , d e que ad iantam os l uc ros quand oel es provoc am um c ol apso no próprio sistema?

Deixarei essa história para mais tard e. Meu objetivo no momentoé d efinir os fatores d e c ompl exid ad e que sustentam tod a a estruturasoc ial . A sustentabil id ad e é um ato d e equil íbrio d el ic ad o, e paramantê-l a prec isamos perc orrer o estreito c aminho entre a ord em e oc aos, a simpl ic id ad e e a c ompl exid ad e. Após passear por um mund od e possíveis d esastres, c atástrofes e extinç ão (Parte II) , vol tarei afal ar c om mais profund id ad e sobre essas questões d e sobrevivênc ia ec omo al c anç á-l a sem ter d e l anç ar mão d e um d ownsiz ing rad ic al(Parte III) .

Antes d e prosseguir, c ontud o, d evemos examinar c om mais atenç ãoas d iversas maneiras c omo a c ompl exid ad e pod e se manifestar nasestruturas soc iais em que tod os nós estamos inserid os. Veremos que otermo “c ompl exid ad e” não é monol ític o, mas mul tifac etad o. Éimportante ter uma id eia sobre que fac es são essas se quisermos saberc omo red uzir a c ompl exid ad e a um nível ad ministrável em termos d esustentabil id ad e soc ial sem pôr tud o a perd er .

AS SETE FACES DA COMPLEXIDADE

NA PRIMEIRA VEZ QUE fui ao Santa Fe Institute , há c erc a d e vinte anos,

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um d os pós-d outorand os d a equipe era o bril hante Seth L l oy d , hojeum respeitad o professor no MIT e um l uminar na c omunid ad e d ec omputaç ão quântic a. Na époc a, a c iênc ia d a c ompl exid ad e d avaseus primeiros passos no mund o intel ec tual , e muita gente , tanto d ed entro quanto d e fora d a ac ad emia, se perguntava o que signific avad izer que um sistema era “c ompl exo” (em vez d e simpl esmente“c ompl ic ad o” , por exempl o) . Como os ac ad êmic os gostam d e d efinirprec isamente os termos d e uma d isc ussão antes d e passar ao d ebate, aprimeira investid a foi no sentid o d e formul ar uma espéc ie d ed efiniç ão, junto c om um esquema para med ir o grau d e c ompl exid ad ed os sistemas. A esperanç a, evid entemente vã, era d ivid id a em d uas:(a) id eal izar uma unid ad e d e med id a que fosse universal menteac eita pel a c omunid ad e c ientífic a d e c ompl exid ad e e (b) c hegar a umnúmero que representasse a c ompl exid ad e d e um sistema, o que nospossibil itaria d izer, por exempl o, que a internet é 3,141592 vezes tãoc ompl exa quanto o c orreio americ ano. Pel o que se c onstatou arespeito d e sistemas c ompl exos d urante as d éc ad as seguintes, essatentativa é um tanto ingênua, para não d izer absurd a. Aind a hoje ,c omo na époc a, não sabemos ao c erto se um número mágic o feito essenos d iria al go d e fato útil sobre um sistema. Mas assim são os bec ossem saíd a d a etapa em que se c omeç a a tatear qual quer novoempreend imento intel ec tual .

Num esforç o para organizar as d iversas id eias que na époc apairavam no ar, L l oy d d ed ic ou-se ao estud o d as med id as d ec ompl exid ad e na bibl iografia existente e as agrupou por áreas,d eterminand o se as med id as se c onc entravam na estrutura d osistema, em seu c omportamento, na perc epç ão d os observad ores sobrea forma c omo o sistema func iona etc . No final , e l e c ompil ou tud o oque d esc obrira num l ivro, aind a não ed itad o, c reio eu , c hamad o 31Fl avors of Compl exity [31 sabores d a c ompl exid ad e] , em referênc iaao c onhec id o sl ogan d a red e d e sorveterias americ ana Baskin-R obbins.

Como eu d isse antes, a c ompl exid ad e possui muitas fac es. O que éou não c ompl exo d epend e, em grand e parte , não apenas d o sistema-al vo, mas também d os sistemas c om os quais e l e interage, al ém d oc ontexto geral em que os sistemas interativos se inserem. Portanto,c onc ord o que seria bom c hegar a um c onsenso, respal d ad o tal vez porum únic o número que representasse a c ompl exid ad e d e um sistemaespec ífic o, mas sinto informar que o l e itor não enc ontrará esse e l ixir

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mágic o aqui. O que quero mostrar agora pod eria ser c hamad o d e “assetes fac es d a c ompl exid ad e” . Cad a uma será a fac e d ominante d eal gumas d as d iversas situaç ões d esc ritas na Parte II d o l ivro. Então,para preparar o terreno, examinemos um pouc o mais d e perto asvariad as formas c om que a c ompl exid ad e se manifesta no mund oreal .

PRINCÍPIO DE COMPLEXIDADE I:EMERSÃO

Um c onjunto d e ind ivíd uos em interaç ão forma um “sistema” , e essesistema c omo um tod o geral mente possui suas próprias c arac terístic aspartic ul ares, que não existem no nível d os ind ivíd uos em si . Essasc arac ter í sti c as emergentes são d enominad as traç os “sistêmic os” , emc ontraposiç ão àquel as d os ind ivíd uos que c onstituem o sistema, poissão originad as pel as interaç ões. Bons exempl os d e c omportamentos outraç os emergentes são um engarrafamento numa autoestrad a, pontosmarc ad os num jogo d e futebol americ ano ou uma mud anç a d e preç ono merc ad o financ eiro. De fato, um únic o c arro que d eixa umaautoestrad a não c ausa nenhum engarrafamento, o que pod e serprovoc ad o quand o c entenas d e c arros tentam pegar a mesma saíd apara c hegar ao estád io antes d o c hute inic ial . Da mesma forma,nenhum jogad or d e futebol americ ano sozinho pod e d eterminar oresul tad o d e um jogo, ind epend entemente d e seu d esempenho. É ainteraç ão d o grupo que d efinirá se a partid a terminará ou não numtouc hd own. Portanto, os pontos marc ad os são um aspec to emergented o jogo. Igual mente, o c onjunto d as d ec isões d os investid ores nummerc ad o financ eiro d e c omprar, vend er ou segurar aç ões faz c om queseu preç o suba ou baixe. Essa mud anç a d e preç os também é umfenômeno emergente, d eterminad o tanto pel as d ec isões d osinvestid ores quanto por sua interaç ão.

Traç os e /ou c omportamentos emergentes são, c om frequênc ia,c onsid erad os al go “ inesperad o” ou “surpreend ente” . Isso ac ontec eporque, d e um mod o geral , sabemos al guma c oisa a respeito d asc arac terístic as d os objetos ind ivid uais, mas nad a sobre aspropried ad es sistêmic as gerais que emergem d as interaç ões.Conhec emos os pad rões d e c omportamento d e manifestantes nas ruasd e Lond res ou d o Cairo num nível ind ivid ual , por exempl o, mas não

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sabemos c omo em c onjunto e l es c onseguem c riar um d istúrbio c ivil ,sem fal ar num ac ontec imento extremo c omo a d errubad a d e umgoverno. Essa turbul ênc ia é uma propried ad e emergente,c arac terístic a d o sistema c omo um tod o, que não pod e ser enc ontrad ana c onstituiç ão ou nas aç ões d e nenhum manifestante em partic ul ar .

PRINCÍPIO DE COMPLEXIDADE II:A HIPÓTESE DA RAINHA DE COPAS

Na c l ássic a obra d e Lewis Carrol l Al ic e através d o espel ho, a Rainhad e Copas d iz para Al ic e : “ Neste l ugar, prec isamos c orrer o máximopossível para permanec er no mesmo l ugar.” Essa id eia foi l evad a aomund o d a c iênc ia em 1973 pel o ec ol ogista Leigh van Val en, queobservou que, em tod o sistema formad o por um c onjunto d eorganismos em evol uç ão, c ad a integrante prec isa se d esenvol ver àal tura d os outros para evitar a extinç ão. Em suma, é prec iso evol uiro mais rápid o possível só para permanec er no jogo. Umac onsequênc ia d esse princ ípio é que a “esteira” geral d o sistema tend ea girar c ad a vez mais rápid o quanto maior for a c ompl exid ad e — atéparar d e func ionar! Nesse momento, oc orre um c ol apso sistêmic o,normal mente pel a interferênc ia d e outro sistema que se sobrepõe aoprimeiro (o que nos faz l embrar as pal avras d e Joseph Tainter,menc ionad as anteriormente, em rel aç ão à extinç ão d a soc ied ad e emd ec orrênc ia d o aumento d a c ompl exid ad e soc ial ) .

Um exc el ente exempl o d esse princ ípio é um d os aspec tos maisvisíveis d o fenômeno d a gl obal izaç ão: a perd a d os empregos no setorind ustrial d os Estad os Unid os para a China e outras regiões d oSud este Asiátic o. Consid ere a situaç ão d a China. Aqui temos d oissistemas em interaç ão, os setores ind ustriais d e c ad a país envol vid o.Um d el es, aquel e d os Estad os Unid os, aumentou c ontinuamente suac ompl exid ad e, ac resc entand o c amad as à estrutura — c oisas c omo l eisque estabel ec em um sal ário-mínimo, pad rões d e saúd e e seguranç a,sind ic al izaç ão etc . O setor c onc orrente na China ac resc entou pouc aou nenhuma c ompl exid ad e d esse tipo, afora a mod ernizaç ão d e suasinstal aç ões e o aumento d a automaç ão. Com o tempo, o d esnível d ec ompl exid ad e tornou-se grand e d emais e o resul tad o foi o eventoextremo d e uma transferênc ia mac iç a d e empregos no setor ind ustriald e um país para o outro. Em outras pal avras, um sistema d e al ta

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c ompl exid ad e sofreu um d ownsiz ing provoc ad o por um evento X, poisnão agiu vol untariamente. Isso representou um verd ad eiro c hoquepara os d ois sistemas — mas d e formas bem d iferentes.

PRINCÍPIO DA COMPLEXIDADE III:TUDO TEM UM PREÇO

Se quisermos que um sistema — ec onômic o, soc ial , pol ític o etc . —func ione num al to nível d e efic iênc ia, prec isamos otimizar suaoperaç ão d e mod o que sua resil iênc ia seja d rastic amente red uzid a amud anç as e/ou c hoques d esc onhec id os — e tal vez inc ognosc íveis —em seu ambiente operac ional . Em outras pal avras, há um preç oinevitável a ser pago pel a efic iênc ia para usufruir d os benefíc ios d aad aptabil id ad e e d a c apac id ad e d e sobrevivênc ia num meio d egrand es inc ertezas. Não há esc apatória!

Um al pinista, por exempl o, pod eria d ec id ir esc al ar sozinho umd espenhad eiro. Tal vez até c onsiga repetir o feito várias vezes, masbasta um únic o inc id ente inesperad o — sua mão esc orrega, umaped ra se d esfaz sob seus pés, a c abeç a é atingid a por um ped aç o d egel o — para que e l e d espenque para a morte . É por isso que osal pinistas mais experientes trabal ham em equipe e se oc upam c omuma série d e med id as red und antes d e proteç ão para a esc al ad a. Aefic iênc ia pod e d iminuir em termos d e tempo d e subid a até o al to emc omparaç ão c om uma esc al ad a l ivre , mas, se o inesperad o ac ontec er,é possível rec uperar-se e c ontinuar a empreitad a até o topo.

No nível empresarial , é prec iso esc ol her entre uma l inha d eprod utos al tamente espec ial izad a ou um grand e estoque formad o pord iferentes prod utos. Por exempl o, c onsid ere o estoque d e l ivros d aAmazon em c omparaç ão ao d e uma empresa que vend e grand esquantid ad es d e um únic o prod uto, c omo o mol ho Tabasc o, d aMc Il henny . A esc ol ha c onflitiva aqui é entre func ionar num al tonível d e efic iênc ia c onc entrand o-se em inovaç ão d e proc esso, c omo éo c aso d a Mc Il henny & Co., que busc a aprimorar-se para aumentar aprod utivid ad e, ou investir na sol id ez em rel aç ão a c hoquesinesperad os por meio d a d iversific aç ão d e prod utos , que d istr ibui osr isc os e as rec ompensas por uma l inha d e ofertas muito mais ampl a,c omo é o c aso d a Amazon.

O esti l o d e operaç ão d a Amazon d istr ibui os r isc os entre d iversos

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prod utos, d e mod o a não c ol oc ar tod os os ovos num únic o c esto, c omoseria o c aso se e l a se c onc entrasse na vend a d e um l ivro espec ífic o d eal gum autor renomad o. Ao c ontrário, a empresa aposta na“d iversific aç ão d e portfól io” para oferec er pratic amente qual querl ivro publ ic ad o, o que c usta d inheiro. A Mc Il henny , por sua vez ,otimiza seu sistema operac ional para prod uzir um únic o prod uto eobtém sobre esse investimento um grand e retorno em efic iênc ia —d esd e que o Tabasc o não saia d e mod a. S e sair , a Mc Il henny quebra.

O sistema d e baixa c ompl exid ad e (neste exempl o, a Mc Il henny ) ,portanto, só c ontinuará send o viável se o sistema d e al tac ompl exid ad e (neste exempl o, a Amazon) não d ec id ir entrar nomerc ad o d e mol ho Tabasc o, pel o que c hamamos anteriormente d e“ inovaç ão d e prod uto” . Se e l e entrar, o d esc ompasso d ec ompl exid ad e entre os d ois sistemas pod e se tornar grand e d emaispara se sustentar e , nesse c aso, a Mc Il henny terá d e aumentar suac ompl exid ad e via d iversific aç ão d a l inha d e prod utos ou enfrentar oevento extremo d e fec har as portas.

O primeiro c aminho, aumentar a c ompl exid ad e via inovaç ão, emgeral enc ara l imites c omo o grau d e c ompl exid ad e que pod e serac resc entad o ou red uzid o num d eterminad o sistema. Isso porque, semud amos o nível d e c ompl exid ad e em um l ugar, oc orre uma mud anç ac ompensatória na d ireç ão oposta em outra parte . Esse é um d osprinc ipais motivos pel os quais é tão d if íc i l red uzir d el iberad amentea c ompl exid ad e em grand es organizaç ões buroc rátic as: a “praga d ac ompl exid ad e” já infestou tantas partes d o sistema que não d á parac onseguir muita c oisa c om mud anç as pontuais aqui e al i . É c omo umc arro vel ho que não tem mais c onserto. É prec iso jogá-l o fora,fabric ar ou c omprar um novo.

PRINCÍPIO DA COMPLEXIDADE IV:O PRINCÍPIO DE CACHINHOS DOURADOS

Os sistemas func ionam d a maneira mais aberta, d inâmic a e flexívelquand o os graus d e l iberd ad e d isponíveis para e l es parec em c om omingau d o c onto infantil Cac hinhos Dourad os: nem muito quentes,nem muito fr ios, mas na temperatura c erta. No jargão d os sistemas,isso geral mente é c hamad o d e o “ l imite d o c aos” , a tênue l inha qued ivid e o estad o em que o sistema está paral isad o d emais, c om

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pouquíssimos graus d e l iberd ad e para expl orar novos regimes d ec omportamento, e o estad o em que existe tanta l iberd ad e que osistema é essenc ial mente c aótic o e val e quase tud o. O c aminho d omeio é estar num l ugar em que se possa expl orar a estrutura presente ,mas ond e aind a haja c ampo d e aç ão sufic iente para mud ar emd ireç ão a novas estruturas quand o a oportunid ad e e asc irc unstânc ias d eterminarem.

Dirigentes d e ec onomias nac ionais, por exempl o, prec isam and arna c ord a bamba, permitind o, por um l ad o, a l iberd ad e nec essária àinovaç ão e ao empreend ed orismo e , ao mesmo tempo, estabel ec ernormatizaç ões sufic ientes para evitar aç ões noc ivas e od esc umprimento d a l ei . Pouc a supervisão resul ta em c aos,d esestabil izand o o sistema, mas um exc esso d e pl anejamento ec ontrol e por parte d o governo pod e inibir o c resc imento d a ec onomiac omo um tod o.

No rec ente l ivro Red Capital ism: e Fragil e Financ ialFound ation of China’s Extraord inar y Rise [Capital ismo vermel ho: ofrágil al ic erc e financ eiro d a extraord inária asc ensão d a China] ,Carl E. Wal ter e Fraser Howie observam que o governo c hinêsreformou e mol d ou seu sistema financ eiro d urante os ú l timos tr intaanos d e uma maneira muito espec ial . O resul tad o é que suaestabil id ad e só tem c omo se manter atrás d os muros d e uma moed anão c onversível , d e um grand e número d e ac ord os c om entid ad esestatais privad as não inc l uíd os no bal anç o patrimonial e d o forteapoio d e seus mel hores d eved ores — os “c ampeões nac ionais” , c omgrand e forç a pol ític a, os maiores benefic iários d a c onjunturafinanc eira atual no país. O sistema financ eiro d a China, portanto,não é um mod el o para o mund o oc id ental , c uja popul aç ão exige umnível muito maior d e transparênc ia, e , al iás, não é sequer umesquema sustentável para a própria China, uma vez que o país d esejac ad a vez mais reafirmar sua inf l uênc ia no c enário mund ial .

A esse respeito, a revista e Ec onomist ressal tou que, para aChina, “o maior probl ema é que o sistema transac iona quase apenasc onsigo mesmo. Informaç ões essenc iais sobre passivos e prec ific aç ãosão d el iberad amente sonegad as ou impossíveis d e d isc ernir. Não hánenhuma entid ad e externa estabel ec end o os preç os d e bens e serviç os,por meio d e l anc es no merc ad o. Isso impossibil ita a al oc aç ãoefic iente d e c apital e permite a prol iferaç ão d e exc essos” .

O que temos aqui, por c onseguinte , é uma situaç ão em que, para

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manter um proc esso viável d e al oc aç ão d e c apital e se c onec tar àec onomia mund ial c omo um país total mente partic ipativo, a Chinatem perc orrid o a estreita l inha entre possuir um sistema banc árioexc essivamente restr ito, quase fec had o, e um sistema tão aberto quevaza c omo a peneira, assim c omo muitos d os sistemas banc áriosoc id entais atuais, sobretud o o d os Estad os Unid os.

PRINCÍPIO DA COMPLEXIDADE V:INDECIDIBILIDADE / INCOMPLETUDE

A argumentaç ão rac ional por si só não é sufic iente para d eterminartod as as possibil id ad es em rel aç ão à oc orrênc ia ou não d e uma aç ãoou d e um c omportamento. Dito d e outra forma, sempre haveráac ontec imentos impossíveis d e se prever seguind o uma l inha l ógic a d erac ioc ínio. Previsões ac ertad as requerem o uso d a intuiç ão e/ouinformaç ões que não fazem parte d os d ad os originais d isponíveis.

Em 1931, Kurt Göd el , matemátic o austríac o espec ial ista eml ógic a, provou que existem afirmaç ões aparentemente inoc entes sobrea rel aç ão entre números c uja verd ad e ou fal sid ad e não pod e serd eterminad a apenas pel a d ed uç ão l ógic a. Göd el d emonstrou queproposiç ões ind ec id íveis c omo essas são, d e fato, verd ad eiras. Aquestão é que não há c omo provar tal verac id ad e c om base emsuposiç ões c onstruíd as a partir d as regras que c ostumamos util izarpara gerar provas. O sistema simpl esmente não é “sól id o o bastante” .Em outras pal avras, é inc ompl eto. E isso val e para qual querestrutura l ógic a que resol vermos usar. Esse c onjunto d e regras terásempre, pel o menos, uma proposiç ão ind ec id ível . Al iás, já sed emonstrou que quase tod a proposiç ão em rel aç ão a números seenquad ra nessa c ategoria. Portanto, as rarid ad es são proposiç ões quepod em ser resol vid as por d ed uç ão, e não aquel as que não têm c omoser formal mente provad as ou refutad as.

Desse mod o, se os sistemas l ógic os d e d ed uç ão não têm nem c omosol uc ionar questões re l ativas a números, imagine os d esafios d aprevisão d os ac ontec imentos humanos. Como sempre haverá um níveld e c ompl exid ad e em qual quer uma d essas proposiç ões, pod emosreformul ar l ivremente o teorema d a inc ompl etud e d e Göd el d aseguinte maneira: “Al gumas proposiç ões são c ompl exas d emais para amente humana c ompreend er.” Qual a l igaç ão entre este passeio pel a

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estratosfera d a matemátic a e d a l ógic a e as preoc upaç ões prátic as emrel aç ão a eventos X?

Em 2011, o governo d e Hosni Mubarak, no Egito, foi d errubad ona praç a Tahrir, no Cairo, impul sionad o pel a qued a, al gumassemanas antes, d o regime d e Ben-Al i, na Tunísia, que já d uravatrinta anos. Pouc as horas após a renúnc ia d e Mubarak, bl ogueiros játrombeteavam para o mund o suas sábias opiniões sobre o motivo d eaquil o tud o estar ac ontec end o, e al guns até afirmavam, c om al gumapresunç ão, que previram aquel as mud anç as meses ou até anos antes.

O que essas anál ises têm em c omum é que tod as se baseiam em umasequênc ia l ógic a que c omeç a c om um c onjunto d e c irc unstânc ias ( i .e . ,axiomas) e c ond uzem inexoravel mente (via argumentaç ão rac ional )aos ac ontec imentos que se d esenc ad earam no Cairo, em Túnis e emDamasc o. Vol tand o al gumas d éc ad as, vemos o mesmo pad rão d el ógic a pós-fato ser empregad o para expl ic ar o c ol apso d a UR S S, ofinal infe l iz d a guerra d o Vietnã e , evid entemente, um eternoc l ássic o, a qued a d o Império Romano — o que l embra o c omentáriod e Nassim Tal eb d e que a previsão d e eventos extremos está atrel ad aà tend ênc ia humana d e c ontar histórias que parec em fazer c om quesua oc orrênc ia seria al go óbvio. Sem d úvid a, os anal istas pol ític os ehistoriad ores ad oram a aparente inevitabil id ad e d a l ógic a pós-fatoc omo respal d o para suas supostas expl ic aç ões.

O probl ema é que essas expl ic aç ões não val em um tostão. O queval e mesmo é a l ógic a anterior aos fatos, não a posterior ; a previsão,não a expl ic aç ão, por meio d e uma sequênc ia d e argumentosrac ionais d e que tais d esd obramentos seriam muito prováveis,quand o não inevitáveis. No c aso d os eventos X, isso val e mais aind a,uma vez que e l es c onstituem os verd ad eiros agentes d e mud anç a d assoc ied ad es, virand o-as d e c abeç a para baixo. Se usarmos osargumentos d e Göd el no sentid o metafóric o, não matemátic o, asequênc ia d o ac aso é , no mínimo, tão importante quanto a l ógic apara id entific ar o que é e o que não é provável d e ac ontec er nessesd omínios soc iais. Em suma, não basta usar o pensamento rac ional . E,al iás, o que em geral não c onseguimos al c anç ar c om a l ógic a éjustamente o que mais queremos: uma visão nítid a, inequívoc a, d eum evento extremo iminente.

PRINCÍPIO DA COMPLEXIDADE VI:O EFEITO BORBOLETA

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Enquanto estud ava mod el os matemátic os d e proc essos atmosféric osnos id os d a d éc ad a d e 1970, Ed Lorenz, meteorol ogista d o MIT,d esc obriu uma d as princ ipais c arac terístic as d e um sistema c ompl exo:uma variaç ão ou d istúrbio aparentemente insignific ante em umaparte d el e pod e d isseminar-se por tod a a red e e prod uzir uma grand emud anç a em outra parte d esse sistema e/ou em outro momento.Lorenz c hamou tal fenômeno d e “efeito borbol eta” , expl ic and o queuma borbol eta, ao bater as asas numa floresta d o Brasil hoje , pod eprovoc ar um furac ão no Gol fo d o Méxic o na semana que vem. A id eiabásic a é que os sistemas c ompl exos são patol ogic amente sensíveis amud anç as minúsc ul as em seu estad o inic ial . Eis um exempl o c l arod essa propried ad e.

No iníc io d o ano 2000, eresa LePore projetava a c éd ul ael etrônic a que os e l eitores d e Pal m Beac h, Fl órid a, usariam nasel eiç ões presid enc iais americ anas d e novembro d aquel e ano. LePored ec id iu aumentar o tamanho d a fonte tipográfic a a fim d e fac il itar al eitura para os e l eitores oc togenários d a c id ad e. Por al gum motivo,e l a não se d eu c onta d e que essa mud anç a transformava a c éd ul anum d oc umento d e d uas páginas em vez d e uma só, o que pod eriagerar c onfusão nos e l eitores quanto ao botão que d everiam apertarna máquina d e votaç ão.

Quand o os votos foram c ontad os, verific ou-se que 19.120 el eitoreshaviam apertad o os botões para Pat Buc hanan e Al Gore ao mesmotempo, resul tand o na anul aç ão d e suas c éd ul as. Al ém d isso, mais d etrês mil pessoas votaram em Pat Buc hanan, que esperava rec eberapenas al gumas c entenas d e votos d os e l eitores d essa c omunid ad e. Aoque tud o ind ic a, a maior parte d os votos extras era, na verd ad e,para Gore, mas c om a c onfusão d a c éd ul a os votos ac abaram ind opara Buc hanan. O resul tad o final foi que 22 mil votos que d everiamter id o para Gore d eixaram d e ser c ontabil izad os. Se os votostivessem sid o c ontabil izad os para e l e , a Fl órid a teria sid o d e Gore, ee l e ter ia se tornad o o quad ragésimo terc eiro presid ente d os Estad osUnid os, em vez d e George W. Bush. Desd e então, muita gente d izque, se isso tivesse oc orrid o, o mund o seria hoje um l ugar bastanted iferente . Ou seja, o fato d e LePore não ter perc ebid o que amud anç a no formato d a c éd ul a d e votaç ão d e Pal m Beac h tal vezc onfund isse os e l eitores em vez d e ajud á-l os pod e ser visto c omo asbatid as d a asa d e uma borbol eta que mud ou tod o o c urso d a históriamod erna.

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PRINCÍPIO DA COMPLEXIDADE VII:A LEI DA VARIEDADE NECESSÁRIA

Chegamos ao mais importante d e tod os os princ ípios, pel o menos paraos propósitos d este l ivro. É aquel e que expl ic a por que um evento Xoc orre para fec har uma insustentável l ac una nos níveis d ec ompl exid ad e entre d ois ou mais sistemas em interaç ão.

Na d éc ad a d e 1950, W. Ross Ashby , espec ial ista em c ibernétic a,teve um grand e insight: a varied ad e em um sistema regul atório temd e ser, no mínimo, d o mesmo tamanho d a varied ad e d o sistemaregul ad o para ser e fetiva. “ Varied ad e” , na ac epç ão d e Ashby ,signific a o número d e graus d e l iberd ad e d e que c ad a sistema d ispõepara agir em qual quer momento. No c aso d as histórias que re l atoneste l ivro, os termos “varied ad e” e “c ompl exid ad e” pod em serusad os mais ou menos c omo sinônimos. Na terminol ogiac ontemporânea, a l e i d e Ashby previa que o sistema d e c ontrol e temd e ter, no mínimo, a mesma c ompl exid ad e d o sistema c ontrol ad o,senão o d esnível d e c ompl exid ad e entre os d ois pod e c ausar — o quegeral mente ac ontec e — d iversas surpresas d esagrad áveis.

O grego Al exand er Athanassoul as, c onsul tor d e negóc ios, apresentaum exempl o muito interessante d a l ei d e Ashby no c ontexto d asonegaç ão fisc al , assunto c ad a vez mais preoc upante nos paísesend ivid ad os d e tod o o mund o. A c ad a ano que passa, os países c r iaml eis e regul amentos para c onter e penal izar a evasão fisc al . Noentanto, a varied ad e d e aç ões d isponíveis aos c obrad ores d e impostosjamais estará à al tura d a enorme gama d e ferramentas util izad as porc ontad ores, ad vogad os e sonegad ores para não pagar sua parte d oônus financ eiro nac ional . Ou seja, a varied ad e d a popul aç ão gerald isposta a sonegar impostos jamais c orrespond erá à varied ad e d einstrumentos d isponíveis aos regul ad ores fisc ais ( inspetores) , que émuito menor. Isso signific a que é nec essário red uzir a varied ad e nol ad o d os sonegad ores, em vez d e tentar c ontrol ar a sonegaç ão d eimpostos após o fato. Athanassoul as sugere sol uç ões c omo a red uç ãod as al íquotas fisc ais, uma d istr ibuiç ão mais equil ibrad a d e impostosentre a popul aç ão e outros instrumentos d essa natureza.

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V IMOS SETE FACES DA c ompl exid ad e e c omo c ad a uma pod e provoc ar, d e

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maneiras d iferentes, eventos X d e tod os os tipos. A tabel a a seguirsintetiza essas manifestaç ões d e c ompl exid ad e c om uma frase que asc arac teriza. Val e ressal tar que essa l ista não é c ompl eta e que ositens não são mutuamente exc l ud entes. Qual quer evento extremopod e ser gerad o por uma c ombinaç ão d e d iversos princ ípios. De ummod o geral , c ontud o, há um princ ípio d ominante, e os outrosd esempenham o papel d e c oad juvantes no d rama. O que importamesmo é que o evento X, em úl tima instânc ia, é resul tad o d a fal ta d ec ontrol e d a c ompl exid ad e.

OS SETE PRINCÍPIOS DA COMPLEXIDADE

E SUAS PROPRIEDADES

A l inha d e argumentaç ão que sigo nas páginas a seguir é que oprinc ípio d a c ompl exid ad e VII, a l e i d a varied ad e nec essária, é umpouc o mais igual d o que os outros no que se refere à oc orrênc ia d eum evento X. Como no c aso d e sistemas naturais, os sistemas humanostambém parec em func ionar mel hor quand o tod os os subsistemas quec ompõem a soc ied ad e estão, d e c erta forma, equil ibrad os e emharmonia. Quand o as respec tivas c ompl exid ad es d esses subsistemasd ivergem muito, gerand o d esc ompassos ou “d esníveis” d ec ompl exid ad e, o sistema tentará se rec onfigurar para red uzir oupreenc her essas l ac unas. Como os pol ític os, os l íd eres empresariais eas pessoas em geral , pensand o em seus interesses d e c urto prazo, nãoc onsid eram a possibil id ad e d e uma perd a imed iata em troc a d e aç ões

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que c ol oquem o sistema soc ial em posiç ão mel hor para sobreviver nol ongo prazo; o que ac ontec e normal mente é que suas d inâmic asnaturais prec isam intervir para c orrigir um d esequil íbrio d ec ompl exid ad e. Tais aç ões sistêmic as auto-organizad as são, em geral ,rápid as e d estrutivas e c ostumam envol ver o surgimento d e um eventoX — ou d ois, ou três — para atrair a atenç ão d as pessoas e fec haruma l ac una em expansão o mais rápid o possível .

Passemos à Parte II, ond e abord o c om d etal hes onze c asosd iferentes d e eventos X, tod os c ausad os pel o homem. El es oc orreramem al gum momento d o passad o e pod em fac il mente mand ar a vid ahumana d e hoje para a époc a d as c arruagens c aso tornem aac ontec er .

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PARTE II

OS CASOS

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OS EVENTOS X APARECEM em d iferentes d imensões, formas e mod el os.Lembre-se d o ano d e 2004, em que d iversos episód ios d ramátic osoc uparam as primeiras páginas d os jornais. Entre as manc hetesestavam um grand e apagão na região nord este d os EUA, o surto d ovírus d a sínd rome respiratória agud a grave (S AR S) e um terremotod e magnitud e 9,1, c om um c onsequente tsunami na il ha d e Sumatra.Porém, o número d e pessoas d iretamente atingid as foi bastanted iferente em c ad a c aso. O apagão afetou 55 mil hões d e pessoas, maspouquíssimas vid as se perd eram, enquanto a S AR S foi responsávelpor 8.273 óbitos c onfirmad os. No c aso d o terremoto d a Ind onésia,foram registrad as 283.106 mortes, ofusc and o as c ifras atribuíd as aosoutros d ois episód ios. Assim, se med irmos a magnitud e d e um eventoX por sua l etal id ad e, o terremoto d a il ha d e Sumatra foi o pior d etod os, sem d úvid a al guma. Mas se tomarmos c omo med id a o estragoc ausad o, tanto material quanto financ eiro, a história pod e serd iferente . Aind a assim, existe um terc eiro aspec to, que é o d anopsic ol ógic o d ec orrente d a perd a d e morad ias e empregos, sem fal arna angústia e inc erteza d e não saber quand o aquil o tud o vaiterminar. O que quero enfatizar aqui é que o aspec to “extremo” pod evariar muito. Para c ompreend er esses eventos, não pod emosc ontinuar fal and o em termos gerais.

Para d eterminar que tipo d e evento extremo pod e ser previsto, emquais c asos a saíd a é aguentar firme e esperar uma rec uperaç ãoposterior e quand o nossa únic a esperanç a é rezar para que aquil onunc a oc orra, prec isamos examinar c om atenç ão a enorme gama d epossibil id ad es existentes. Esse é o princ ipal objetivo d esta parte d ol ivro.

Nas páginas a seguir, apresento onze minic apítul os, c ad a um c omuma história d e um evento X espec ífic o. Sel ec ionei os exempl os d emod o bem abrangente: os c asos vão d esd e ac ontec imentosrel ativamente famil iares (o auge d a c rise d o petról eo) até aquel esque parec em exc êntric os (uma impl osão terrestre provoc ad a pel ac riaç ão d e partíc ul as e l ementares exótic as) . Nesse c atál ogo d ec atástrofes, evitei d el iberad amente as “naturais” , c omo vul c ões,c ol isões d e asteroid es ou até mesmo aquec imento gl obal , não porserem menos c atac l ísmic as ou terem menor probabil id ad e d e mand ara humanid ad e d e vol ta a uma forma d e vid a mais primitiva, masporque já foram tão rel atad as que d ific il mente al guém asc onsid eraria “surpreend entes” nos d ias d e hoje . Portanto, em nome

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pel o menos d a novid ad e, preferi que minha l ista não inc l uísse essetipo espec íf ic o d e evento X tão “ c orriqueiro” .

A novid ad e em si , porém, é apenas o ponto d e partid a d ashistórias aqui c ontad as. A verd ad eira base d os re l atos d este l ivro é aforma c omo a “sobrec arga d e c ompl exid ad e” influenc ia naoc orrênc ia d os eventos narrad os nas páginas a seguir. Em c ad ac apítul o, o l e itor enc ontrará um ou mais d os princ ípios d ac ompl exid ad e d esc ritos na Parte I c omo razão princ ipal d o evento d oc apítul o em questão.

• • •

COMO FALAMOS ANTERIORMENTE, NEM tod os os eventos extremos são c riad osd a mesma maneira. Num artigo d e 2004, o engenheiro britânic o C.M.H empsel l apresentava três c ategorias:

1. Ac ontec imentos no nível d e extinç ão: Al go tãod evastad or que mais d e um quarto d e tod a a vid a naTerra d esaparec e, c om a extinç ão d e importantese spéc ie s. Exempl o: O fim d o períod o Cretác eo, quand oc erc a d e 80% d e tod as as espéc ies d esaparec eram.

2. Catástrofes gl obais: Um ac ontec imento que l eva mais d eum quarto d a popul aç ão humana à morte . Exempl o: APeste Negra d a Id ad e Méd ia.

3. Desastres gl obais: Eventos em que uma pequenaporc entagem d a popul aç ão morre. Exempl o: A epid emiad e gripe espanhol a d e 1918.

Vemos que os termos “extinç ão” , “c atástrofe” e “d esastre” sereferem à intensid ad e (a magnitud e d o impac to) , e não à passagemd e tempo (o tempo d e d esenrol ar) ou à d uraç ão d e seu impac to (otempo d e impac to) . Por fim, há a probabil id ad e d a oc orrênc ia,assunto não abord ad o na taxonomia d e H empsel l .

Tod os esses fatores são fund amentais na hora d e c onsid erarquanto se d eve l evar a sério a id eia d e estar preparad o para taisac ontec imentos. Prec iso, portanto, d izer mais al gumas pal avras sobred uraç ão, momento e probabil id ad e d e eventos X transformad ores.

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Primeiro, d uraç ão.Al guns tipos d e ac ontec imento l evam tempo para provoc ar c aos.

Uma praga mund ial , por exempl o, não infec ta tod o mund o d e umahora para outra. Até a mais c ontagiosa d as d oenç as prec isa d e umproc esso d e transmissão d e muitas semanas para tomar c onta d opl aneta — mesmo no mund o atual , d a vel oc id ad e a jato. Por outrol ad o, o impac to d e um asteroid e saíd o d o nad a pod e c ausar umestrago imed iato, ao menos no que se refere ao c hoque em si .

Quanto à questão d o timing em c ontraposiç ão à d uraç ão, nósqueremos saber quand o um d eterminad o ac ontec imento oc orrerá.Repare que isso é d iferente d e perguntar qual a probabil id ad e d e umac ontec imento espec ífic o se c onc retizar. O timing refere-se àexistênc ia ou não d e c ond iç ões prévias que re l egam o evento a al gummomento imprec iso em um futuro d istante — pod end o ou não oc orrer— ou se e l e pod e se manifestar a qual quer momento. As respostaspara essa pergunta variam d e “ imed iatamente” a “nunc a” .

Para il ustrar essa variaç ão, c onsid eremos d e novo a extinç ão pel ananopraga, o probl ema d a gosma c inzenta. Perguntamos: quand o esseac ontec imento extremo pod eria oc orrer? No momento, ananotec nol ogia aind a não al c anç ou a fase em que nanorrobôsautorrepl ic áveis são possíveis, mas quase tod os os profissionais d aárea c onc ord am que não existem imped imentos l ógic os ou f ísic os paraisso. A tec nol ogia simpl esmente não c hegou l á… aind a! Portanto, otiming d e um nanoc ânc er está vinc ul ad o à mera transposiç ão d essabarreira téc nic a. A resposta c onsensual é al guns anos, uma d éc ad a nomáximo.

Por outro l ad o, o momento d e uma invasão al ienígena hostil pod eser agora, nunc a ou em qual quer ponto entre esses d ois extremos. Nãoexiste a mínima evid ênc ia que nos c ond uza a al gum tipo d e resposta.

Um c aso re l ativamente mais interessante é o timing d e al go c omo aerupç ão d e um supervul c ão no Parque Nac ional d e Yel l owstone. Osgeofísic os e vul c anol ogistas sabem que o parque inteiro é a c al d eirad e um antigo vul c ão que entrou em erupç ão pel a ú l tima vez c erc a d e650 mil anos atrás. Há ind íc ios d e que isso ac ontec erá d e novo.Quand o? Ninguém sabe d izer. No entanto, é quase c erto que não sejanem agora nem nunc a. Mas estamos fal and o d e apenas uma c al d eiravul c ânic a. A Terra está c heia d e outras, parec id as, e bastaria queuma d el as expl od isse para extinguir a maior parte d a vid apl anetária. A questão d o timing, portanto, refere-se ao momento em

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que qual quer um d esses vul c ões entrará em erupç ão, não somente od e Yel l owstone. Consid erand o tod os os existentes, fic amos maispróximos d esse evento, mas é provável que aind a tenhamos muitosséc ul os, ou até mesmo mil ênios, pel a frente .

Por f im, c onsid eremos o grand e fator : a probabil id ad e.Qual a probabil id ad e d e sermos d estruíd os por uma invasão

al ienígena, um evento que nunc a ac ontec eu antes e que nãoapresenta nenhum ind íc io d e que vá ac ontec er al gum d ia? Ou d e ac al d eira que forma o Parque Nac ional d e Yel l owstone vol tar aentrar em ativid ad e? Estamos fal and o d e d ois tipos d e evento X, umsem qual quer tipo d e registro e outro c om evid ênc ias c onc retas d eoc orrênc ias anteriores. Os d ois i l ustram bem o probl ema d e tentarutil izar ferramentas estatístic as e probabil ístic as c omuns paraestimar a perspec tiva d e um ac ontec imento extremo. Em ambos osc asos, a humanid ad e pod e ser enviad a d e vol ta à Id ad e d a Ped ra, senão for total mente extinta. Porém, na primeira hipótese , estamosl imitad os à espec ul aç ão ( i .e . , “c hute” ) , enquanto no segund opod emos, pel o menos, tentar usar ferramentas d e anál ise d eac ontec imentos extremos para c al c ul ar, aind a que por al to, sua“probabil id ad e” .

Repare que, quand o fal o sobre probabil id ad e, não me refiro à“probabil id ad e d entro d e um d eterminad o períod o d e tempo” . Omomento espec ífic o d a oc orrênc ia já está inc l uíd o na anál ise quemenc ionei anteriormente. Quand o fal o em probabil id ad e, portanto,quero d izer “a qual quer momento” . Dito d e outra maneira, apergunta passa a ser : “ Qual a probabil id ad e d e esse ac ontec imentoo c o r r e r al gum d ia?” É uma pergunta c ontund ente, que exc l ui aresposta “nunc a” , pois al go que não foi exc l uíd o total mente pel al ógic a ou pel a f ísic a tem que ser c onsid erad o provável , aind a queminimamente, d e oc orrer em al gum momento. Mas nem tod os osac ontec imentos são c riad os d a mesma maneira, e al guns, c omo osterremotos d evastad ores, são bem mais prováveis d o que outros, c omoo pl aneta ser inc inerad o por raios gama oriund os d e uma gigantesc asupernova d o outro l ad o d a Via Lác tea.

Resumind o tud o o que fal amos, a títu l o d e c l assific aç ão, d ivid ireia probabil id ad e em c inc o c ategorias:

Pratic amente c erto: S ituaç ões que oc orrerão quase c omc erteza, c omo o impac to d e um asteroid e, um terremoto

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ou uma c rise financ eira. El as já ac ontec eram muitasvezes e há um bom número d e ind íc ios, nos registroshistóric os e geol ógic os, d e que tornarão a oc orrer .Bem possível : S ituaç ões que já oc orreramanteriormente ou d as quais existem ind íc ios d e quepossam estar em proc esso d e d esenvol vimento. Nestac ategoria inc l uem-se pand emias, hol oc austo nuc l eargl obal , uma nova e inesperad a era gl ac ial ou ad estruiç ão d a c amad a d e ozônio d a Terra.Improvável : S ituaç ões que não possuem registrohistóric o e que, embora possíveis, não oc orrerãonec essariamente. Exempl os c omo nanoc ânc er ou umd ec l ínio c ul tural mac iç o entram nessa c ategoria. Muito remoto: S ituaç ões tão improváveis que quase nãoapresentam risc o d e impac tar a humanid ad e em al gummomento. A probabil id ad e d e a Terra ser“rec onfigurad a” por al gum viajante d o tempo quevenha a pisar em al gum mamífero pré-históric o que porac aso seja o anc estral original d a raç a humana é umexempl o d essa c ategoria.Impossível d izer : Ac ontec imentos sobre c ujaprobabil id ad e d e ac ontec er não temos a mínima id eia.Uma invasão al ienígena hostil ou a d ominaç ão d ac ivil izaç ão humana por robôs intel igentes são bonsexempl os.

Divid i os eventos que ameaç am a humanid ad e em três d imensões:d uraç ão, ou seja, quanto tempo pod e l evar para que os d anosc ausad os por um ac ontec imento extremo sejam sentid os pl enamente;timing, ou seja, quand o o ac ontec imento extremo oc orrerá; eprobabil id ad e, ou seja, a possibil id ad e d e o ac ontec imento extremose c onc retizar al gum d ia.

Até agora fal ei pouc o sobre a( s) verd ad eira( s) c ausa( s) d os eventosX c riad os pel o homem. Val e a pena, portanto, d ar uma ol had arápid a no panorama geral e refletir se é real mente inevitável queal gum d os d esastres, c atástrofes ou extinç ões d isc utid os no l ivrotermine d ec retand o o fim d a humanid ad e. Meu foc o será quaseexc l usivamente os eventos X gerad os ou no mínimo impul sionad ospel o homem, uma vez que a c ausa d aquel es gerad os pel a natureza

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hoje é muito mais c l ara e não d epend e tanto d e nossas maquinaç ões.Com c erteza isso não signific a que tenhamos um grau tão e l evad o d ec ompreensão sobre os agentes d e mud anç a que a natureza c ol oc a emnosso c aminho, mas apenas que os entend emos um pouc o mel hor emc omparaç ão àquel es gerad os pel os seres humanos.

Antes d e entrar nos c apítul os propriamente d itos, gostaria d eenfatizar que os eventos X a seguir não são fic ç ão nem fic ç ãoc ientífic a. A maioria já oc orreu no passad o, e não prec isamos servid entes para ver que e l es pod em se repetir. Portanto, não se d eixesed uzir apenas pel as histórias, por mais interessantes que sejam.Lembre-se d e que a ativid ad e humana pod e ser a c ausa ou no mínimoc ontribuir para esses eventos. Não se esqueç a também d e que somosnossos piores inimigos não apenas em um nível ind ivid ual . O mesmoprinc ípio val e para o nível soc ial , c omo as histórias que se seguemil ustram vivid amente.

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I

APAGÃO DIGITAL

UMA INTERRUPÇÃOGENERALIZADA E DURADOURA

DA INTERNET

SINAIS NEGATIVOS

NO ANO DE 2005 Dan Kaminsky , c onsul tor d e seguranç a d ec omputad ores, repousava em c asa, rec uperand o-se d e um ac id ente, e ,na c onfusão mental provoc ad a pel os anal gésic os, c omeç ou a pensarem al gumas questões d e seguranç a rel ac ionad as à internet sobre asquais havia pond erad o antes, c onc entrand o suas d el iberaç ões emtorno d o c omponente DNS (Domain Name Servic e , S istema d eDomínio d e Nomes) d a red e, que func iona c omo um d ic ionário paratransformar nomes d e d omínio em l inguagem c otid iana, c omooec d .org ou amazon.c om, em end ereç os IP ( Internet Protoc ol ) d ed oze d ígitos, que o sistema entend e e util iza para d eterminar otráfego d e um servid or a outro. Havia al gum tempo que Kaminskypressentia al go d e errad o no sistema DNS; e l e imaginava que emal gum l ugar espreitava uma brec ha na seguranç a existente d esd e aintrod uç ão d o sistema, em 1983 — uma brec ha que pod eria serexpl orad a por um hac ker intel igente para ter ac esso a quase tod os osc omputad ores d a red e. Mas Kaminsky não c onseguia prec isarexatamente qual seria o probl ema.

Em janeiro d e 2008, e l e final mente enc ontrou a resposta. Ind uziuo servid or DNS d e seu proved or d e internet a pensar que e l e sabia al oc al izaç ão d e al gumas páginas inexistentes d e uma grand e empresa

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americ ana. Assim que o servid or ac eitou c omo l egítimas as páginasfal sas inventad as por Kaminsky , estava pronto para ac eitar qual querinformaç ão que o c onsul tor fornec esse sobre o d omínio d e internet d ac ompanhia. Na verd ad e, Kaminsky enc ontrara uma forma d e“ hipnotizar” o sistema DNS, fazend o-o ac red itar que e l e era umafonte c onfiável d e informaç ões gerais a respeito d e qual quer d omínioe m tod a a internet. O sistema estava pronto para ac eitar qual querinformaç ão que e l e d esejasse fornec er sobre a l oc al izaç ão d equal quer servid or na red e.

Kaminsky l ogo c onc l uiu que ac abara d e entrar no paraíso d oshac kers. O que e l e havia d esc oberto não era apenas uma brec ha naseguranç a no Wind ows ou um bug em al gum servid or espec ífic o, masum d efeito inerente à própria essênc ia d a internet. El e pod eriareatribuir qual quer end ereç o web, reenc aminhar os e-mail s d equal quer pessoa, entrar em c ontas d e banc o ou até mesmo embol artod a a red e. O que fazer? Val eria a pena tentar? Por que não l imparc ontas banc árias e fugir c om bil hões d e d ól ares para o Brasil ? Éd if íc i l imaginar-se d iante d esse tipo d e pod er em rel aç ão à vid a d ebil hões d e pessoas d o mund o tod o. Tal vez fosse mel hor simpl esmented esl igar o c omputad or e esquec er o assunto. Se aquel a d esc obertaaparec esse em apenas um bl og ou site , em uma questão d e segund oshac kers inesc rupul osos d o mund o inteiro avanç ariam naquel ainformaç ão e não hesitariam em atac ar e c ausar d anos irreparáveis àec onomia gl obal e à vid a d e tod os.

O que Kaminsky d ec id iu fazer foi c ontatar al guns d os maioresgurus d e seguranç a d e red e, que marc aram uma reunião sec reta d eemergênc ia no mel hor esti l o d e uma tropa d e e l ite versão nerd . Nessareunião, e l es c hegaram a uma sol uç ão temporária para o furoenc ontrad o por Kaminsky para invad ir o sistema DNS. Mas, c omo el emesmo c onc l uiu numa c onvenç ão d e hac kers real izad a em Las Vegasem 6 d e agosto d e 2008: “ Não há c omo sal var a internet. Há [apenas]c omo ad iar o inevitável por mais um tempo.”

Assim c ontinua até hoje . E não estamos fal and o d e um fantasiosoroteiro d e um fil me d e Hol l y wood , pois a probabil id ad e d e umind ivíd uo “brinc ar” em sua garagem e d errubar parte d a internet équase a mesma d e uma equipe d e espec ial istas em c omputaç ão numaagênc ia nac ional d e seguranç a. Nesse jogo, a inspiraç ão e aengenhosid ad e pod em agrac iar tanto um grupo d e pessoas quanto ohac ker sol itário.

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A d esc oberta d e uma fal ha oc ul ta na própria base d a internetfeita por Kaminsky traz à tona a questão d a ameaç a que uma panegeneral izad a na red e representa para nosso esti l o d e vid a no séc ul oXXI. Desd e e-banking, e-mail , e -books, iPad s e iPod s até ofornec imento d e energia e l étr ic a, c omid a, água, ar, transporte ec o m u n i c a ç ã o , tod os os e l ementos d a vid a mod erna no mund oind ustrial izad o d e hoje d epend em d as funç ões d e c omunic aç ãofornec id as pel a internet. Se e l a parar d e func ionar, o mesmoac ontec e c om nosso esti l o d e vid a. Portanto, quand o fal amos d e umapane general izad a na red e, os r isc os são os mais al tos possíveis. E,c omo Kaminsky d emonstrou c om c l areza, esse sistema não está nemum pouc o imune a uma paral isaç ão c atastróf ic a.

Uma vez que a d esc oberta d e Kaminsky afeta o próprio c erne d ainternet, tal vez seja um bom momento para c ontar um pouc o sobre ac riaç ão d a red e e l embrar o que as pessoas pensavam naquel a époc a,há mais d e meio séc ul o. Ironic amente, o sistema em questão foid esenvol vid o para ajud ar na sobrevivênc ia d e al guns na hipótese d eum evento extremo.

A origem d a internet remonta à d éc ad a d e 1960, quand o ogoverno americ ano c omeç ou a trabal har em parc eria c om a inic iativaprivad a para c riar uma red e d e c omputad ores robusta, à prova d efal has. O que o governo queria era uma red e que não d epend esse d euma l oc al izaç ão espac ial únic a e que, portanto, c ontinuassefunc ionand o mesmo que vários d e seus nós e /ou l inks fossemd estruíd os, parassem d e func ionar temporariamente ou fic assemind isponíveis. Não é d e espantar que a mental id ad e d a Guerra Friad a époc a tenha sid o a grand e motivaç ão para a c r iaç ão d o que veio aser a internet, pois a c úpul a d a d efesa americ ana prec isava d e umsistema d e c omand o e c ontrol e que permanec esse operac ional mesmod iante d e um evento X: um ataque nuc l ear em grand e esc al apromovid o pel a UR S S .

O sistema d e c omunic aç ão introd uzid o original mente foi c hamad od e AR PAnet, em menç ão à Ad vanc ed Researc h Projec ts Agenc y(AR PA, Agênc ia d e Projetos d e Pesquisa Avanç ad a) , uma d ivisãofuturista d o Departamento d e Defesa americ ano. A c omerc ial izaç ãoc omeç ou a ac ontec er na d éc ad a d e 1980, junto c om a substituiç ão d onome AR PAnet por “ internet” . Desd e então, o potenc ial d e nossossistemas d e c omunic aç ão passou a d efinir nossas estruturas d enegóc ios. Informaç ões que pod em ser rapid amente ac umul ad as e

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proc essad as servem d e suporte para a ec onomia, fac il itand o a tomad ad e d ec isões, aumentand o a prod utivid ad e e assim ac el erand o oc resc imento. A vel oc id ad e e o ac esso às informaç ões são os fatores qued efinem o rel ac ionamento c l iente-empresa hoje em d ia.

O c aráter d esc entral izad o d a internet reflete-se no fato d e nãohaver uma estrutura d e c ontrol e “d ona” d a red e, uma vez queapenas os d ois “espaç os d e nomes” para o sistema, o end ereç o IP e oDNS , são governad os por um c orpo c entral .

Em suma, ac abamos d ispond o d e um sistema d e c omunic aç ão,atual mente util izad o por c erc a d e um quarto d a popul aç ão gl obal ,que se baseia nas c onc epç ões d e red e e hard ware d a d éc ad a d e 1970.A internet está send o usad a hoje c omo base para serviç osinc onc ebíveis naquel a époc a à med id a que c onvergimos para umasituaç ão em que tod os os tipos d e d ad os — áud io, víd eo e informaç õesverbais — são armazenad os nel a. Com isso em mente, não c ausaespanto que as mud anç as tec nol ógic as e d e esti l o d e vid a d os ú l timosc inquenta anos estejam sobrec arregand o c ad a vez mais a c apac id ad ed o sistema d e atend er às nec essid ad es d e seus usuários. Al gunsexempl os ec l étic os servirão para enfatizar esse ponto.

Notíc ia: Em mead os d e outubro d e 2009, uma aparentemanutenç ão d e rotina d o princ ipal d omínio suec o, o .se ,d eu errad o, e tod os os nomes d e d omínio c omeç aram afal har. Não era possível entrar em nenhum site suec o, ose-mail s d avam erro, e vários d ias d epois o sistema aind anão havia se rec uperad o total mente. Ou seja, a internetd a Suéc ia inteira estava c omprometid a. Qual havia sid oo probl ema? Segund o investigaç ões, d urante o proc esso d emanutenç ão, um sc ript c onfigurad o d e forma inc orreta,c ujo propósito era atual izar a zona .se , introd uziu umerro em c ad a nome d aquel e d omínio. Mas era apenasuma teoria. Outra possibil id ad e aventad a foi a d e que osistema d e internet suec o pod e ter entrad o em c ol apsoporque mil hões d e homens japoneses e c hineses ter iamresol vid o proc urar por Chako Paul , uma l end ária al d eiad e l ésbic as em al gum l ugar d a Suéc ia, d esestabil izand oos proved ores d e serviç os d e red e d o país! Segund o essahipótese , a red e inteira teria sid o d errubad a porasiátic os que pesquisavam no Googl e uma “al d eia” suec a

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que aparentemente não existe .Notíc ia: Em novembro d e 2009, o programa jornal ístic oa m e r i c a n o 60 Minutes [60 Minutos] afirmou que oapagão d e d ois d ias no estad o brasil eiro d o EspíritoSanto, em 2007, teria sid o resul tad o d a aç ão d e hac kers.Sem c itar fontes, a reportagem al egava que o al vo era osistema d e c omputad ores d e uma empresa d e serviç ospúbl ic os. O apagão afetou três mil hões d e pessoas,prec ed end o um grand e bl ec aute em 2009 que d eixou àsesc uras as d uas maiores c id ad es d o Brasil , São Paul o eRio d e Janeiro, al ém d e grand e parte d o Paraguai. Comose c onstatou mais tard e, nenhum d esses inc id entes parec eter tid o rel aç ão c om invasão d e sistemas c omputac ionais.No c aso d e 2007, o probl ema foi um simpl es errohumano: uma fal ha na manutenç ão d e isol ad oresel étr ic os, que ac umul aram tanta fu l igem a ponto d eentrar em c urto-c irc uito. As expl ic aç ões para o apagãobem maior d o final d e 2009 são mais interessantes: e l asinc l uem d esd e uma grand e tempestad e que teriad estruíd o l inhas d e transmissão d a hid rel étr ic a d eItaipu, responsável por 20% d o abastec imento d e energiael étr ic a no Brasil ( segund o os registros meteorol ógic os,não houve nenhuma tempestad e na região naquel eperíod o) , até agentes renegad os d o Mossad , serviç osec reto israel ense , que teriam invad id o a red e nac ionald e energia e l étr ic a (expl ic aç ão preferid a d o presid enteLuís Inác io Lul a d a S il va) , passand o pel o “efeitoborbol eta” provoc ad o por uma interrupç ão nofunc ionamento d o Grand e Col isor d e H ád rons, no CentroEuropeu d e Pesquisa Nuc l ear (CER N), em Genebra, c ommais ou menos a mesma d uraç ão d o bl ec aute, e pel apartic ipaç ão d e OVNIs sob a forma d e uma nave mãeal ienígena que teria se abastec id o d e energia d a c entrale l étr ic a. Em resumo, ninguém sabia nad a!Notíc ia: No d ia 17 d e maio d e 2007, o Ministério d eDefesa d a Estônia ac usou o governo russo d e ser oprinc ipal suspeito pel os ataques d e hac kers a sites d opaís, afirmand o que mais d e um mil hão d e c omputad oresno mund o inteiro haviam sid o usad os nas semanas

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anteriores para real izar os ataques, após a remoç ão d euma pol êmic a estátua soviétic a d o c entro d e Tal l inn,c apital d a Estônia. Mad is Mikko, porta-voz d oMinistério d a Defesa, d ec l arou: “ Quand o um aeroporto,um banc o ou al guma entid ad e estatal são atac ad os porum míssil , ninguém d uvid a que é uma guerra. Mas se omesmo resul tad o for al c anç ad o por c omputad ores, quenome d evemos usar?” Notíc ia: A China Tel ec om informou que, segund o oInstituto d e Monitoramento d e Terremotos d a China, nod ia 26 d e d ezembro d e 2006, entre 20h26 e 20h34,horário d e Pequim, oc orreram terremotos d e magnitud es7,2 e 6,7 no mar d a China Merid ional . Os c abos d ec omunic aç ão submarina S ina-US, Asia-Pac ific Cabl e 1,Asia-Pac ific Cabl e 2, FL AG Cabl e , Asia-Euro Cabl e eFNAL foram d anific ad os. A ruptura d esses c abos, queac ontec eu c erc a d e quinze quil ômetros ao su l d e Taiwan,afetou severamente as te l ec omunic aç ões nac ionais einternac ionais nas regiões viz inhas por várias semanas,até que o estrago pud esse ser reparad o.

Outras fontes na époc a informaram que asc omunic aç ões d irec ionad as a China c ontinental , Taiwan,Estad os Unid os e Europa tinham sid o d rastic amenteinterrompid as e que as c onexões d e internet para países eregiões fora d a China c ontinental haviam se tornad obastante instáveis. Al ém d isso, serviç os d e mensagem d evoz e te l e fonia também foram afetad os.

Essas notíc ias não c ontavam nem a metad e d ahistória. A China e o Sud este Asiátic o viram seupotenc ial d e c omunic aç ão d espenc ar mais d e 90%, numproc esso que os c hineses c omeç aram a c hamar d e “ Worl dWid e Wait” (“espera mund ial ” , em vez d e Worl d Wid eWeb, “red e mund ial ” ) . O que essa pane revel ou foi oestad o l astimável d a tec nol ogia d e te l ec omunic aç ões naChina. Como a agênc ia internac ional d e notíc ias AFPc l assific ou: “A China está rec orrend o à tec nol ogia d oséc ul o XIX para resol ver um probl ema d o séc ul o XXI.”

Para final izar, mais um ou d ois parágrafos sobre al go que

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ninguém jul gava possível : o d esaparec imento total e c ompl eto d ainternet numa importante região d o mund o.

Notíc ia: Às 12h30 d e uma sexta-feira, d ia 28 d e janeirod e 2011, a internet saiu d o ar no Egito. Naquel emomento, tod os os l inks que c onec tavam o país ao restod o mund o d eixaram d e func ionar, não por c oinc id ênc ia,na mesma hora em que manifestantes se preparavam paraprotestar, c om passeatas e d isc ursos, c ontra o brutalregime d o presid ente Hosni Mubarak, que já d uravatrinta anos. Ao que tud o ind ic a, o Egito fez o que muitosespec ial istas d iriam ser inc onc ebível para um país c ujaec onomia se baseia fund amental mente na internet:d esl igou-se total mente d a red e, numa tentativa d ereprimir a oposiç ão. Afora a questão d e por que issoac ontec eu (o que não é d if íc i l d e respond er) , os aspec tostéc nic os d e c omo ac ontec eu val em uma ol had a rápid a.

Num país c omo os Estad os Unid os, existem inúmerosproved ores d e internet e uma infinid ad e d e formas d e sec onec tar à red e. No Egito, quase tod os os l inks d o sistemasão c ontrol ad os por apenas quatro proved ores, sob estr itasupervisão d o governo c entral . Ao c ontrário d os Estad osUnid os, ond e seria nec essário c ontatar c entenas ou atémil hares d e proved ores para tentar c oord enar umad esativaç ão integral e simul tânea d o serviç o d e red e, noEgito esse probl ema pod ia ser resol vid o c om al gunste l efonemas. Ou seja, o que ac ontec eu foi possível porqueo país é um d os pouc os em que as c onexões c entrais d einternet estão nas mãos d e muito pouc a gente , a ponto d epod erem ser c ortad as ao mesmo tempo. Aqui vemos umevid ente d esc ompasso d e c ompl exid ad e entre o sistema d ec ontrol e d a internet egípc ia e seus usuários.

Espec ial istas d izem que o que d iferenc ia a aç ão d oEgito d aquel as d e países c omo a China e o Irã, quetambém restr ingiram segmentos d a internet parac ontrol ar a oposiç ão, é que tod a a naç ão se d esc onec tounum esforç o c oord enad o, e tod os os aparel hos e l etrônic osforam afetad os, d esd e c e l u l ares até mainframes.Pod eríamos nos perguntar por que isso não ac ontec eu

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mais vezes em l ugares c omo o Irã ou até mesmo a Costad o Marfim, ond e a d issid ênc ia pol ític a é umaborrec imento c onstante para as autorid ad esgovernantes. O motivo é , em grand e parte , d e fund oec onômic o. No mund o d e hoje , a ec onomia e os merc ad osd os países d epend em d emais d a internet para d esl igá-l aem nome d e um assunto tão efêmero quanto uma possívelmud anç a d e regime. Os d itad ores vão e vêm, mas od inheiro nunc a d orme.

A fal ha (ou intenç ão) humana é , sem d úvid a, a princ ipal c ausa d eum possível c omprometimento d a internet. Mas, c omo sempre, ointeressante está nos d etal hes, e os pormenores pod em abranger umasérie d e métod os, que vão d e ataques ao sistema DNS no esti l oKaminsky àquel es d irec ionad os ao usuário final . Até ataquesvol tad os para a trama soc ial d a internet foram c ogitad os, d esd e oenvio d e spams c om ameaç as d e morte para c onvenc er os usuários d eque e l a não é um l ugar seguro até o inc entivo à sind ic al izaç ão d osad ministrad ores d e sites d a web, o que possibil itaria uma greve.Resumind o, há tantas maneiras d e d errubar o sistema, ou pel o menosuma imensa parte d el e , que o mais impressionante é que isso nãoac onteç a c om mais frequênc ia.

Histórias c omo essas pod eriam ter ac ontec id o muito mais vezes,mas nenhuma d el as representa o tipo d e ac ontec imento c apaz d el anç ar a soc ied ad e gl obal num abismo, mesmo send o d esastrosas sobmuitos aspec tos. O mais preoc upante é que tod os esses c asos pod eriamter se transformad o numa c atástrofe mund ial se os eventos tivessemoc orrid o d e maneira só um pouquinho d iferente . O fato maisrel evante, c ontud o, é que nenhum d os países envol vid os estavareal mente preparad o para l id ar c om aquel es ataques à suainfraestrutura. Como d iz um antigo d itad o vienense, as situaç õeseram d esesperad oras — mas não sérias. A l iç ão é c l ara: asinfraestruturas que mais util izamos em quase tod os os aspec tos d avid a mod erna d epend em total mente d e sistemas d e c omunic aç ãoc omputac ionais c uja imensa maioria se c onec ta via internet. Assim,quand o uma infraestrutura fal ha, se ja qual for o motivo, osprimeiros ac usad os geral mente são hac kers anônimos, qued errubariam o sistema por d iversão ou tal vez para ganhar al gumac oisa. Às vezes, é exatamente o que se passa. Mas “às vezes” ou até

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“oc asional mente” já se trata d e uma frequênc ia exc essiva parasistemas tão fund amentais para o func ionamento d a soc ied ad eind ustrial izad a mod erna. Send o assim, prec isamos saber c omo essesabal os c ibernétic os pod em ac ontec er e o que pod emos fazer paraminimizar os d anos que e l es c ausariam.

Como ponto d e partid a na “d esc onstruç ão” d o probl ema,prec isamos saber a verd ad eira magnitud e d a internet, para termosuma id eia d o que ac ontec eria se e l a saísse d o ar por c ompl eto.

QUANDO A MÚSICA PARA

A INTERNET É UM sistema quase inimaginavel mente grand e sobqual quer perspec tiva que se empregue. Eis al guns d ad os estatístic osque c orroboram esse ponto.

• Em mead os d e 2008, havia mais d e um tril hão d eend ereç os d e internet, número bem superior ao d apopul aç ão mund ial . (Observaç ão: esse número éc omposto d e end ereç os d e internet, não apenas aquel esna Worl d Wid e Web, que total izam c erc a d e d uzentosmil hões — os que c omeç am c om www). Levaria mais d etrinta mil anos só para que tod os fossem l id os.

• Existem mais ou menos 150 end ereç os web por pessoahoje em d ia.

• O c onteúd o d e informaç ões na internet perfaz um totald e aproximad amente c inc o mil hões d e teraby tes, ouc inc o bil hões d e gigaby tes. Armazenar tod a essaquantid ad e d e d ad os d emand aria uma c apac id ad eequival ente a c erc a d e um mil hão d e c érebroshumanos. Em outras pal avras, é informaç ão para maisd e um bil hão d e DVDs. Compl ementand o: em mais oumenos uma d éc ad a d e existênc ia, o Googl e c onseguiuind exar somente 0,5% d esses d ad os.

Diante d e números tão d esc omunais, vemos c l aramente a enormec ompl exid ad e d a internet c omo uma red e d e bil hões d e nós l igad os

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por mais muitos bil hões d e c onexões, tud o em movimento d inâmic o ac ad a momento tod os os d ias.

• • •

O COMEDIANTE L OUIS CK fal a em seu show d e uma viagem num aviãoequipad o c om sistema wi-f i d e al ta vel oc id ad e. De repente, o homemsentad o a seu l ad o fic a possesso c om a c ompanhia aérea porqueperd eu a c onexão. Louis CK c omenta: “ De uma hora para outra, omund o l he d eve al go que e l e só soube que existia d ez segund os antes.”Os seres humanos real mente se ac ostumam muito rápid o c om novasengenhoc as tec nol ógic as, inc orporand o-as a seu esti l o d e vid a quased a noite para o d ia, princ ipal mente quand o e l as fac il itam ac omunic aç ão. Seja por te l e fones, aviões a jato, e-mail , estamosprogramad os para nos c onec tar uns c om os outros — e quanto maisrápid o, mel hor .

Para aval iar o nível d e d epend ênc ia d a humanid ad e em rel aç ão àinternet, a Intel , fabric ante d e mic roproc essad ores, real izou umapesquisa sobre o assunto há al guns anos. A empresa perguntou a maisd e d ois mil homens e mul heres d e tod as as id ad es e tod os os esti l os d evid a o que e l es esc ol heriam: abrir mão d e sexo por d uas semanas oud o ac esso à internet pel o mesmo períod o d e tempo. O resul tad o foiimpressionante: 46% d as mul heres entrevistad as e 30% d os homensafirmaram preferir abrir mão d o sexo. Em termos gerais, entre tod osos gastos opc ionais — TV a c abo, refeiç ões em restaurantes, ginástic ae até c omprar roupas (o que é bem d if íc i l d e ac red itar) —, a internetfic ou em primeiro l ugar na l ista d e priorid ad es. No total , quase d oisterç os d os ad ul tos entrevistad os d ec l araram que simpl esmente nãoc onseguiriam viver sem internet.

Curiosamente, uma pesquisa semel hante real izad a pel a D y namicMarkets em 2003 junto a func ionários d e empresas e gerentes d e TIna Europa e na Améric a d o Norte sobre a tensão d iante d aimpossibil id ad e d e ac essar o e-mail c onstatou que a privaç ão d oc orreio e l etrônic o c ausa mais estresse d o que d ivórc io, c asamento oumud anç a para uma nova c asa! A pergunta seguinte era quanto tempoas pessoas l evariam para fic ar estressad as, e 20% d os entrevistad osd isseram que isso oc orreria “ imed iatamente” , enquanto 82%c onfessaram que fic ariam muito irritad os ao final d e uma hora. Em

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outubro d e 2010, a Avanti Communic ations informou, após umapesquisa c om empresas d o mund o inteiro, que c erc a d e 30% d el as nãopod eriam func ionar sem internet. Apenas 1% respond eu quec ontinuaria operand o normal mente sem c onexão c om a red e. O pontoprinc ipal é evid ente: al ém d e amarmos a internet, l iteral mente nãoc onseguimos viver sem el a. Isso é que é tec nol ogia transformad ora!

A navegaç ão na web e os e-mail s, entretanto, são c onveniênc ias,al go que geral mente não c onfigura uma questão d e vid a ou morte .Qual a importânc ia d a internet em rel aç ão a questões maisel ementares d e sobrevivênc ia, c omo c omer, beber, ganhar d inheiro epermanec er saud ável ? Resposta: muito maior d o que imaginamos.Al iás, sua importânc ia beira o c ruc ial . Para fr isar bem esse ponto,eis al gumas d as infraestruturas util izad as no d ia a d ia qued esaparec eriam d e nossas vid as c aso a internet parasse d e func ionar.

Transaç ões financ eiras pessoais e c omerc iais: Seja pormeio d e c artão d e c réd ito, c heque ou transferênc iabanc ária, seu d inheiro viaja pel a internet.Evid entemente, as instituiç ões financ eiras têm c ópias d eseus arquivos, mas o trabal ho real izad o por sereshumanos para proc essar tod a a papel ad a l eva tempo,muito tempo, em c omparaç ão c om a rapid ez d e umatransaç ão via c aixa e l etrônic o, banc o on-l ine ou c ompravirtual .

Quand o se fal a d e “grand es quantias” , a situaç ão émuito pior. Embora seja d if íc i l prec isar o vol ume totald e transaç ões financ eiras proc essad as d iariamente pel ainternet em tod o o pl aneta, pod emos ter uma id eia d e suamagnitud e ao examinar o vol ume d iário d e operaç õesc ambiais. Em 2007, a quantid ad e d e d inheiro quec irc ul ava pel o sistema era d e quase quatro tr il hões d ed ól ares por d ia. Atual mente, esse número d eve estarbeirand o os d ez tr il hões d e d ól ares d iários, ou mais. Eisso ac ontec e em tod o o d ia útil . O que ac ontec eria se ainternet d eixasse d e func ionar e essas transaç ões tivessemque ser feitas por fax, te l e fone ou até mesmo pel o c orreiotrad ic ional , c omo no passad o? Estremeç o só d e pensar.Uma c oisa é c erta: em tod o o mund o, a vid a viraria umabagunç a após uma c rise d essas, e a c onfusão d uraria

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semanas, meses e possivel mente anos, mesmo que as panesd urassem apenas al guns d ias. Empresas quebrariam,muitos governos pod eriam d esmoronar e o c aos reinaria,soberano. Comérc io varej ista: Quase tod as as l ojas e ossupermerc ad os d epend em d e um c ontrol e d e estoqueautomatizad o para manter as pratel eiras abastec id as,para a al egria d os c onsumid ores. Por exempl o, c ad a vezque voc ê c ompra um artigo numa red e c omo a H&M ounuma l ivraria c omo a Barnes & Nobl e , a c aixaregistrad ora imed iatamente notific a um c omputad orc entral sobre o item c omprad o e a l oc al izaç ão d a l oja,ind ic and o ao d epósito que um item d e reposiç ão d eve serenviad o para l á. Esse sistema — juntamente c om quasetod o o c omérc io varej ista — d esaparec eria emnanossegund os após o c ol apso d a internet. O mesmo val epara outros pontos d e vend a a varejo, c omo postos d egasol ina, farmác ias e merc earias, d os quais d epend e anossa vid a d iária.

Para sentir o tamanho d o probl ema, c erc a d e c atorzebil hões d e d ól ares são gastos d iariamente só nos Estad osUnid os em um bil hão d e transaç ões ind ivid uais —apenas em c omid a e prod utos d e varejo assoc iad os. Noentanto, somente uma fraç ão minúsc ul a d essas transaç õespod eria ser e fetuad a c aso o sistema d e c omunic aç ãoutil izad o para registrar a c ompra, atual izar estoquesetc . d eixasse d e func ionar.S istema d e saúd e: Quase tod os os prontuários hoje em d iaestão armazenad os on-l ine, d e mod o que méd ic os,hospitais e farmác ias teriam d ific ul d ad e em ac essar ohistóric o d o pac iente sem a internet, o que, por sua vez ,provoc aria uma grave d egrad aç ão na d isponibil id ad eimed iata d os serviç os d e saúd e. Embora voc ê possa obteratend imento sem seu prontuário méd ic o, ser ia possívelobtê-l o sem seu c artão/registro d o pl ano d e saúd e? Queméd ic o ou hospital o ac ol heria sem ter c omo verific ar sevoc ê pod e pagar? Não tem probl ema, voc ê d iz . Eu pagoem d inheiro. Tem c erteza? De ond e voc ê vai tirar asc éd ul as se os c aixas e l etrônic os e os banc os estiverem

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tod os ind isponíveis? E c onseguir, em d inheiro vivo, oexorbitante val or que os hospitais c obram não é paraqual quer um. Ou seja, fic ar d oente sem internet seriamuito pior d o que é hoje em d ia. Transporte : Companhias aéreas e ferroviárias d epend emd a internet para programar e monitorar seus serviç os.Pod emos afirmar que uma pane provoc aria o fec hamentod e d iversos aeroportos no mund o inteiro, assim c omosérios probl emas c om o transporte terrestre , inc l uind o osc aminhões e trens que entregam os bens básic os d o d ia ad ia aos supermerc ad os e ao varejo em geral .

Essa l ista pod eria se estend er c onsid eravel mente se abrangesse oc ol apso d e infraestruturas d e tod os os tipos — c omunic aç ão, energiael étr ic a, serviç os públ ic os, ativid ad es empresariais etc . Mas seriad esnec essário. Esse resumo já serve para provar que tod o e qual queraspec to d e nossa vid a que hoje ju l gamos garantid o estariad ramatic amente ameaç ad o d iante d e uma grand e pane d a internet.Com isso em mente, vejamos c omo isso pod eria ac ontec er .

AS RAÍZES DO PROBLEMA

AS POSSÍVEIS PANES DA internet pod em ser d ivid id as, grosso mod o, emd uas c ategorias: (1) panes sistêmic as, d evid o a l imitaç ões inerentes àestrutura em si e ao c resc imento exponenc ial d o vol ume d e tráfegoque o sistema prec isa atend er, e (2) ataques propositais por parte d ehac kers, terroristas ou grupos que visam transformar a internet emrefém d e seus objetivos. Tratarei d a segund a c ategoria na próximaseç ão. Na primeira c ategoria pod emos inc l uir fal has d e hard ware ed e sof tware. Eis al guns exempl os não tão c onhec id os para i l ustraral gumas possibil id ad es.

Burac os negros: Quand o não c onseguimos ac essar um siteespec ífic o num d eterminad o momento, geral mente é poraband ono, probl emas c om o servid or, questões d emanutenç ão ou al gum outro motivo fác il d e expl ic ar.Mas às vezes o site simpl esmente não c arrega.

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Oc asional mente, existe uma l igaç ão entre seuc omputad or e aquel e que hosped a o site que voc ê tentaac essar, mas a mensagem se perd e no meio d o c aminho ec ai para sempre num “ burac o negro” d e informaç ões.Pesquisad ores verific aram que mais d e 7% d osc omputad ores d o mund o inteiro experimentaram esse tipod e fal ha pel o menos uma vez d urante um teste d e trêssemanas real izad o em 2007. A estimativa é d e que, ac ad a d ia, surjam mais d e d ois mil hões d e burac os negrostemporários.

Uma d as razões para esses sumid ouros d e informaç ãosão d ific ul d ad es d e roteamento resul tantes d os bil hões d eusuários d e internet que enviam e rec ebem mensagensd iariamente. À med id a que esse tráfego aumenta, osrotead ores responsáveis por c onec tar a fonte d asmensagens ao d estino pretend id o sofrem uma gravesobrec arga d e c ompl exid ad e, c omo um c érebro humanoque prec isasse proc essar um grand e número d einformaç ões e reaç ões num espaç o d e tempo muito c urto.No c aso humano, um estresse c ontínuo d esse tipo pod egerar um esgotamento nervoso. O equival ente virtual éal go que preoc upa c ientistas d a c omputaç ão c omo DmitriKrioukov, d a Universid ad e d a Cal ifórnia, San Diego:um c ol apso que l evaria a internet inteira para umburac o negro.

Aproveito o ensejo para menc ionar outro bom exempl od e d esc ompasso d e c ompl exid ad e. Quand o a internet foic riad a, as pessoas ac red itavam que a red e (os l inks) ser ial erd a, mas que os pontos finais (os nós) ser iamintel igentes. Mas manter a seguranç a nos pontos finaistem sid o um d esafio e c omeç amos a ver sobrec argas d ec ompl exid ad e a c ad a novo tipo d e ataque. Um c ol apso d otipo previsto por Tainter pod e real mente ac ontec er se aspessoas c omeç arem a perd er a c onfianç a, d eixand o d efazer c ompras on-l ine, evitand o red es soc iais etc . Emessênc ia, a internet ruiria na irrel evânc ia. Consumo d e energia: A energia c onsumid a para sustentarmais d e d ois bil hões d e busc as d iárias d o Googl e é maiord o que a energia e l étr ic a c onsumid a pel as três mil c asas

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d e Mountain View, sed e d o Googl e , na Cal ifórnia.Agora, c onsid ere que o YouTube, um subsid iário d oGoogl e , respond e por mais d e 10% d o total d a l argura d eband a d e internet. Some a isso sites d e red es soc iais,c omo o Fac ebook e o Twitter, e sites d e streaming d evíd eos, c omo o Netflix, e se c omeç a a ter uma id eia d equem são os grand es c onsumid ores d e band a l arga d ainternet. Cad a um d esses serviç os prec isa d e grand esc entros d e proc essamento d e d ad os, ou “ fazend as d eservid ores” , para d ar c onta d a enxurrad a d e bits e by tesque têm d e c irc ul ar pel a red e ininterruptamente.

O c al or prod uzid o por esses c entros d e proc essamentod e d ad os d eve ser c ontrol ad o no l oc al que abriga osservid ores, para mantê-l os a uma temperatura ambientenormal d e c erc a d e 20°C. Em vez d e ser reaproveitad o,esse c al or, na maior parte d os c asos, é simpl esmentebombead o para fora, c ontribuind o para o aquec imentogl obal d o pl aneta. Al ém d isso, a energia c onsumid a paraa refr igeraç ão aproxima-se d o c onsumo d os própriosservid ores. O mais preoc upante é que a situaç ão avanç aaos sal tos, sem c essar. Portanto, se os avanç ostec nol ógic os não c onseguirem d ar um jeito nesse “c al ormortal ” , o mais provável é que os c entros d eproc essamento d e d ad os não tenham c omo ser resfr iad os eac abem l iteral mente fund ind o, quand o as CPUs ououtros hard wares d o servid or queimarem. O resul tad ofinal é nítid o: se os c entros d e proc essamento d e d ad osd esaparec erem, a internet d eixa d e existir .Fragil id ad e d e c abeamento: Os c abos d e fibra óptic a nofund o d o mar, que transmitem c hamad as te l e fônic as etráfego d e internet pel o mund o inteiro, têm menos d euma pol egad a d e espessura — uma l inha muito fina, nosentid o l iteral e figurad o, sobre a qual se apoia ummund o c onec tad o. Curiosamente, esses c abos se rompemc om regul arid ad e. De um mod o geral , no entanto, oserviç o não é interrompid o quand o isso ac ontec e , pois asc ompanhias d e te l ec omunic aç ão possuem sistemas d ebac kup e simpl esmente usam rotas al ternativas enquantoas l inhas princ ipais estão sob reparo. Mas nem sempre!

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Um bom exempl o d o que pod e ac ontec er oc orreu em2008, quand o d ois d os três c abos que atravessam o Canald e Suez se romperam no fund o d o oc eano, perto d eAl exand ria, no Egito, c ausand o a interrupç ão d osserviç os d e te l e fone e internet c om origem no OrienteMéd io e Índ ia c om d estino à Europa e obrigand o otráfego a d ar a vol ta ao mund o pel o c aminho c ontrário.

Devid o a ac id entes geográfic os e geopol ític os, existemd iversos pontos d e estrangul amento nas red es d ec omunic aç ão mund iais, e o Egito é um d el es. Como aforma mais barata d e c ond uzir o tráfego por l ongasd istânc ias é por meio d e c abos submarinos, um l ugarc omo o Egito, banhad o pel os mares Med iterrâneo eVermel ho (por sua vez , l igad o ao oc eano Índ ic o) , é umaopç ão atraente. Consequentemente, os c abos quetransportam informaç ões d a Europa para a Índ ia seguema rota d o Canal d e Suez — assim c omo os navios. Mas oEgito não é o únic o ponto d e estrangul amento. O fund od o oc eano ao l argo d a c osta d e Taiwan é outro probl ema,o que expl ic a por que o terremotod e d ezembro d e 2006, que d estruiu sete d os oito c abosd aquel a região, prejud ic ou a c omunic aç ão em HongKong e em tod a a Ásia por meses, até serem c onsertad os.O Havaí é um terc eiro ponto d e estrangul amento para otráfego que c onec ta os Estad os Unid os à Austrál ia e àNova Zel ând ia. Tod os esses pontos c onstituem ótimosal vos d e oportunid ad es d e d esac el eraç ão d a internet emgrand es áreas d o mund o.Esc al abil id ad e d e rotead ores: A c ad a minuto que passa,c entenas d e pontos d e c onexão d e internet fic am off-l ine.Nem perc ebemos, porque a red e simpl esmente isol a osl inks d e c onexão que estão fora d o ar e c r ia uma novarota, c ontornand o-os. Essa rec onfiguraç ão é possívelgraç as às sub-red es, que se c omunic am umas c om asoutras por meio d os c hamad os “rotead ores” . Quand o uml ink d e c omunic aç ão é mod ific ad o, rotead ores próximosinformam seus viz inhos, que em seguid a transmitem ainformaç ão à red e inteira.

Al guns anos atrás, pesquisad ores d os Estad os Unid os

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c riaram um métod o para interferir na c onexão entre d oisrotead ores, interrompend o o protoc ol o que e l es util izampara a c omunic aç ão, fazend o parec er que o l ink entreel es está off-l ine em vez d e ativo. Val e observar que essainterrupç ão é l oc al , afetand o somente o l ink d e c onexãoentre um rotead or e seus viz inhos d iretos. Mas há pouc otempo, Max Sc huc hard e seus c ol egas d a Universid ad e d eMinnesota d esc obriram c omo estend er a interrupç ão àinternet inteira.

A téc nic a d e Sc huc hard baseia-se num ataque d enegaç ão d e serviç o (DOS, d e d enial -of -servic e) , quesignific a bombard ear um d eterminad o site ou sites c omtanto tráfego d e entrad a que os servid ores d o site visad onão c onseguem l id ar c om o vol ume d e informaç ões eparam d e func ionar. A experiênc ia d e Sc huc hard tinhaum aspec to téc nic o que permitir ia d errubar tod a ainternet usand o uma red e d e c erc a d e 250 milc omputad ores “esc ravos” d ed ic ad os à tarefa. Os d etal hesnão vêm ao c aso neste l ivro, mas a id eia geral é c r iarc ad a vez mais burac os na red e d e rotead ores até que ac omunic aç ão se torne impossível . Sc huc hard c omenta:“ Uma vez inic iad o o ataque, a questão não teria c omoser resol vid a por meios téc nic os. Os operad ores d e red eteriam mesmo que fal ar uns c om os outros.” Pararestaurar o serviç o d e internet, c ad a subsistema teria queser d esl igad o e reinic iad o para l iberar o tráfego c r iad opel o ataque DOS , proc esso que l evaria vários d ias, tal vezmais. Seria esse proc ed imento uma forma viável d ed errubar a internet?

Um agressor que c omand a 250 mil c omputad ores“zumbis” em geral não está pensand o em d errubar ainternet, mas em empregá-l a em nome d e vis interessesc omerc iais. Essa regra, no entanto, não se apl ic a agovernos. Tal situaç ão serviria no c aso d e um país querersimpl esmente se d esl igar d a internet, c omo fez o Egitod urante o l evante c ontra o regime d e Mubarak, no iníc iod e 2011. Esse país pod eria, então, l anç ar um ataquec ontra um inimigo, ou mesmo c ontra o que sobrou d ainternet, mantend o sua própria red e interna intac ta.

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De qual quer maneira, o trabal ho d e Sc huc hardmostra que, ind epend entemente d e quem enc abeç a talataque, não há muito que possa ser feito no momentopara c ombatê-l o. Até agora, nad a parec id o c hegou pertod e ac ontec er. Mas é por isto que se estud am os eventos X:c oisas surpreend entes e prejud ic iais aind a vão ac ontec er .

A esc al abil id ad e d e rotead ores serve d e introd uç ão àsegund a grand e c ategoria d e panes d a internet: a fal hahumana e/ou intenç ões mal ic iosas.

NÃO FOI POR ACASO, MAS DE PROPÓSITO

NUMA BELA MANHÃ DE abril d e 2009, a popul aç ão d o Val e d oSil íc io ac ord ou sem te l efone, internet, c e l u l ar e te l evisão ac abo. Segund o informou a AT&T, os c abos d e fibra óptic a d ac ompanhia haviam sid o c ortad os em vários pontos, o que d eul ugar a espec ul aç ões d e que os c ortes foram real izad os portrabal had ores enc arregad os d e c uid ar d e sua manutenç ão, poisseu ac ord o sind ic al havia expirad o pouc os d ias antes d a fal hano serviç o. Al ém d isso, os c ortes prec isos ind ic avam que haviasid o util izad a uma serra d e metais, em pontos próximos uns d osoutros. Parad oxal mente, o que tornava tud o mais assustad or,esses c ortes eram fác eis d e c onsertar, o que nos l eva a imaginaro que pod eria ter ac ontec id o se os c r iminosos, quem quer quefossem, tivessem jogad o gasol ina e fund id o tud o, ou se umgrupo d e d esc ontentes tivesse se unid o para c oord enar umataque c om o objetivo d e d estruir c onexões d e fibra óptic a emáreas d e grand e d ensid ad e d e c abos.

De qual quer maneira, esse ataque mal -intenc ionad o a umhard ware responsável por tod a a infraestrutura d etel ec omunic aç ões, inc l uind o o c orte d os c abos d e internet, d euum novo signific ad o ao termo “ hac ker” . Como tod o mund osabe, o uso d essa pal avra geral mente está assoc iad o a umataque basead o na invasão d e um software, e não à d estruiç ãofísic a d e equipamentos subterrâneos ou submarinos. Vamos,então, d ar uma ol had a rápid a nas formas c omuns d e d errubara internet c om al teraç ões sutis na informaç ão d e programas,

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sem prec isar d estruir nad a material .O tipo d e ataque a sof twares mais c onhec id o emprega

al guma espéc ie d e vírus. Assim c omo seus equival entesbiol ógic os, os vírus d e c omputad or apod eram-se d o sistemaoperac ional d e seus anfitriões e fazem c om que real izem asinstruç ões c od ific ad as no próprio vírus, em vez d e obed ec er aosistema operac ional d a máquina. No final d e 2009, umd iabinho c ruel c hamad o S tuxnet infec tou 45 mil c omputad oresno mund o inteiro, d emonstrand o um gosto espec ial porequipamentos d e c ontrol e ind ustrial prod uzid os pel a S iemensAG al emã e util izad os princ ipal mente no Irã. Como eramempregad os pel os iranianos em seu programa nuc l ear (eprovavel mente também no d esenvol vimento d e armas) , amaioria d os espec ial istas ac hou que o ataque fora promovid opor ind ivíd uos que trabal havam para um país ou umaabastad a organizaç ão privad a c om o objetivo d e interromper apesquisa nuc l ear. (Para os afic ionad os pel o tema, o S tuxnetnão era exatamente um vírus, e sim um worm. Para o propósitod este l ivro, porém, isso não faz d iferenç a.)

O Stuxnet foi uma c riaç ão mal igna que anunc iou uma novaforma d e guerra: matar c om fal sas informaç ões em vez d emetral had oras e bombas. Por que enviar tropas para d estruirinfraestruturas essenc iais ( c omo usinas hid rel étr ic as e estaç õesd e tratamento d e água) quand o se pod e fazer isso a d istânc ia,d o outro l ad o d o mund o, util izand o bits e by tes? À med id a queum número c ad a vez maior d e operaç ões mil itares é c ond uzid obasic amente por veíc ul os te l eguiad os, c omo o avião americ anoPred ator, é possível que tais armas sejam c omprometid as eusad as c ontra os al iad os. Isso sem fal ar nas possibil id ad es d eviol aç ão d os sistemas nac ionais d e seguranç a e red es d eintel igênc ia. Ou mesmo no c omand o e c ontrol e d e armasnuc l eares, assunto que d isc utiremos mais ad iante.

Não pod emos d esc artar também a existênc ia d e outro d efeitoao esti l o Kaminsky à espreita em al gum l ugar nas profund ezasd a internet, al go d iferente d o probl ema c om o DNS que e l ed esc obriu, mas igual mente perigoso. Evid entemente, esse tipod e fal ha “ kaminsky ana” entra na c ategoria d e “ inc ógnitad esc onhec id a” , l evemente anál oga à ameaç a d e uma invasãoal ienígena. Como invasores tenebrosos vind os d o espaç o, uma

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fal ha d e projeto no c entro d a internet pod e existir ou não.Mesmo se existir, pod e ser que nunc a apareç a. Não há c omoaval iar essa possibil id ad e d e maneira l ógic a. Deixo-a,portanto, na c ategoria d e inc ógnitas d esc onhec id as e sigoad iante para uma segund a forma d e d esativar partes d ainternet: um ampl o ataque d e negaç ão d e serviç o (DOS ) .

• • •

NO DIA 4 DE ju l ho d e 2009, c omputad ores d e entid ad esgovernamentais americ anas foram bombard ead os por ataquesDOS d urante vários d ias. Entre os sistemas afetad os estavam osd o Tesouro, d o Serviç o Sec reto, d a Comissão Fed eral d eComérc io e d o Departamento d e Transportes. S egund o empresasprivad as d e monitoramento, o site d o Departamento d eTransportes fic ou c ompl etamente fora d o ar por d ois d iasseguid os, d e mod o que os usuários não tiveram c omo ac essá-l od urante um d os fins d e semana d e mais movimento d o ano. BenRushl o, d iretor d e tec nol ogias d e internet d a Key note Sy stems,empresa que monitora panes em sites, c omentou: “ Tud o isso meparec e muito estranho. É al go que não se vê . Fic ar total mentefora d o ar por um períod o superior a 24 horas é umac ontec imento muito grave. O fato d e a pane ter d urad o tantotempo e d e ter sid o tão efic az nos d iz al go a respeito d ac apac id ad e d o site d e se d efend er [d e um ataque] ou d agravid ad e d o ataque.”

Na verd ad e, os ataques DOS não são nad a raros, apesar d eser d if íc i l med ir quantos ataques d esse tipo ac ontec emnormal mente. Em 2005, Je l ena Mirkovic e seus c ol egasestimaram uma méd ia d e d oze mil por semana. Obviamente,esse número não d iminuiu d esd e então. Al ém d isso, os ataquesDOS são rel ativamente fác eis d e d esenvol ver, util izand oprogramas d isponíveis em grand e esc al a. Pod em ser aind a maisnoc ivos se mil hares d e c omputad ores estiverem c oord enad os,c ad a um enviand o mensagens para o al vo. Esse é exatamente otipo menc ionad o anteriormente, que d errubou os sistemas d ec omputad ores d a Estônia. Um ataque parec id o ac ontec eu naGeórgia nas semanas que antec ed eram à guerra c om a Rússia,

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quand o o governo georgiano e sites empresariais d esse paísenfrentaram panes, mais uma vez atribuíd as a ataquespromovid os pel o governo russo. O Kreml in, c l aro, negou tud o.Mas espec ial istas oc id entais ind epend entes rastrearam otráfego d e entrad a até d eterminad os nomes d e d omínio e d ad osd e registro na web, c onc l uind o que os órgãos mil itares e d eseguranç a d a R ússia foram real mente os responsáveis.

Para entend er c omo os ataques DOS pod em afetar a vid ad iária, é bom saber que a red e soc ial Twitter fic ou fora d o arpor várias horas em 2009 por c ausa d e um ataque promovid opor um bl ogueiro sol itário, que por c oinc id ênc ia também seenc ontrava na Repúbl ic a d a Geórgia. O ataque d irec ionava-sea outro bl ogueiro, id entific ad o c omo “ Cy xy mu” , versão emal fabeto c ir íl ic o d a c id ad e d e Sukhumi, c apital d a Abec ásia.De ac ord o c om Ray Dic kenson, gerente d e tec nol ogia d aAuthentium, uma empresa d e seguranç a d e c omputad ores, “éc omo se um tel espec tad or, por não gostar d e um d eterminad oprograma num c anal espec ífic o, d ec id isse d etonar tod o osistema d e te l evisão” .

Ataques d e vírus/worms e DOS c apturam as manc hetesprovavel mente porque ameaç am a internet no nível em que osusuários interagem c om o sistema — em seus própriosc omputad ores e /ou servid ores. Ataques nesse nível são bonspara atiç ar a míd ia e ajud am quase tod o mund o a entend er oprobl ema, pois é al go que afeta tod os d iretamente. No entanto,embora não seja impossível , é pouc o provável que a red e c omoum tod o seja ameaç ad a por ataques “superfic iais” d esse tipo.Para d errubar a internet, ou grand e parte d el a, há que seaprofund ar muito mais no sistema, c omo na história que c onteiantes sobre Dan Kaminsky e a brec ha d e seguranç a no sistemaDNS. Ou tal vez seja nec essário um time mund ial d e hac kersprofissionais, d aquel e c apaz d e invad ir as red es d o Citibank,d a Rec eita Fed eral americ ana, d o c anal d e te l evisão PBS e d eoutras grand es organizaç ões financ eiras ou mid iátic as, c omooc orreu após os ac ontec imentos d o WikiLeaks em 2011.

SINTETIZANDO

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EM 2006 , O ESPECIALISTA em seguranç a d e c omputad ores NoamEppel publ ic ou um artigo na internet intitu l ad o “ Sec urityAbsurd ity : e Compl ete , Unquestionabl e , and Total Fail ureof Information Sec urity” [O absurd o d a seguranç a: o frac assototal e inquestionável d a seguranç a d a informaç ão] . Como d ápara imaginar pel o títu l o, a matéria atraiu a atenç ão d emuitos profissionais e empresas d a área d e seguranç a virtual .(Uma observaç ão interessante que ratific a os probl emasid entific ad os por Eppel : enquanto esc revia este c apítul o,resol vi proc urar o artigo original para d ar uma ol had a emc omentários que pod eriam ter sid o postad os d esd e que fiz od ownl oad d o texto, no final d e 2007. Para meu total assombro,verifiquei que tod os os resul tad os d o Googl e referentes aoartigo em questão me d irec ionavam a um site c hamad owww.sec urity absurd ity .c om, que aparentemente se apod erou d osite original c om o artigo. Ou seja, o artigo d e Eppel“ d esaparec eu” .)

Eppel id entific ou d ezesseis c ategorias d iferentes d e fal hasd e seguranç a que infestam a internet. Entre os princ ipaistópic os estão spy ware, vírus/worms, spam e ataques DOS. Atéond e sei , muito pouc o ou quase nad a foi fe ito para resol verqual quer um d os probl emas d a l ista d e Eppel . Como el e mesmoobservou, a situaç ão é bastante parec id a c om a história d o sapoe a panel a d e água fervente. Se o sapo entra numa panel a c omágua fr ia que vai send o aquec id a aos pouc os até ferver, e l e c ainum estad o d e torpor à med id a que a água esquenta e ac abamorrend o c ozid o, sem reagir. De ac ord o c om Eppel , o sapod essa história serve d e anal ogia para o setor d e seguranç a d ec omputad ores. O sistema está morrend o, mas a morte é tol erad asimpl esmente porque estamos ac ostumad os c om o proc esso. Emsuma, a seguranç a está fal ind o em tod os os aspec tos pois estásend o superad a pel a inovaç ão. E quem está por trás d essainovaç ão? Resposta: uma grand e c omunid ad e d e fornec ed oresd e supostos sistemas d e seguranç a, c r iminosos d o mund ovirtual , d isseminad ores d e spam e outros d essa l aia, sem fal ard a c umpl ic id ad e vol untária d e usuários d e c omputad or quec aem na l ábia d os “ profissionais” .

Só para se ter uma id eia d a gravid ad e d o probl ema d eseguranç a na internet para o usuário c omum, real izaram-se

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estud os para d eterminar quanto tempo um c omputad or novinhoem fol ha l eva para ser infec tad o por al gum tipo d e spy ware,vírus, roubo d e id entid ad e ou qual quer outro mal ware d esd eque é l igad o e se c onec ta à internet. O tempo méd io d e infec ç ãoc onstatad o é d e aproximad amente quatro minutos! Em al gunsc asos, verific ou-se que o tempo que al guém d e fora l eva paraassumir o c ontrol e total d o c omputad or, transformand o-o num“zumbi” , é d e apenas tr inta segund os! Não restam d úvid as d eque o que estamos enfrentand o não é uma epid emia d eseguranç a, mas uma pand emia general izad a.

Mesmo d iante d esses resul tad os ( e voc ê pod e fazer aexperiênc ia por c onta própria se não estiver ac red itand o) , umarápid a ol had a nos sites que reportam viol aç ões à seguranç a nainternet em tempo real o c onvenc erá d e que não há nad aerrad o. Por exempl o, ac abei d e ol har al guns sites d emonitoramento d e ameaç as em tempo real d e empresas quevend em pac otes antivírus ( evitarei menc ionar nomes paraproteger o anonimato d os c ul pad os) . Anal isand o seus mapas d eameaç a e probl emas d e seguranç a no mund o, voc ê verá umponto l uminoso aqui e al i , mas em tod os os c asos o nível d eameaç a geral à internet está no máximo na zona amarel a,ind ic and o atenç ão. Na maioria d as regiões, segund o os sites,está na zona verd e, ou seja, sem risc os. No entanto,pesquisand o c asual mente o termo “ameaç a à seguranç a nainternet” , enc ontrei uma infinid ad e d e artigos afirmand o queo número d e ameaç as está aumentand o d rastic amente emrel aç ão ao ano anterior. O que é c urioso, para não d izerpreoc upante, é que al guns d esses artigos foram esc ritos pel asmesmas empresas c ujos mapas d e ameaç a nunc a mostram ainternet sob ataque. Se isso não for um exempl o nítid o d e umsapo d entro d e uma panel a c om água esquentand o, não sei oque mais pod eria ser .

Val e a pena ressal tar que as nec essid ad es e os d esejos d omerc ad o d e seguranç a d e c omputad ores não são os únic osel ementos a nos prend er à internet existente . As empresas d etec nol ogia também estão enc urral ad as. El as têm que vend er osprod utos atuais, e há um al to nível d e inc erteza para se fazerinvestimentos em nova tec nol ogia. Ad ministrad ores d einformaç ões d as c orporaç ões prec isam d efend er d ec isões d e

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c ompra anteriores. Então, c omo real izar uma “renovaç ão” ouintrod uzir uma internet inteiramente nova? A U.S . NationalSc ienc e Found ation (Fund aç ão Nac ional d e Ciênc ia d osEstad os Unid os) , por meio d o projeto GENI, c r iou uml aboratório virtual para expl orar futuras possibil id ad es emampl a esc al a e gerar oportunid ad es para c ompreend er, inovare transformar red es gl obais e suas interaç ões c om a soc ied ad e.Outros grupos privad os estão expl orand o o mesmo território,c om o intuito d e d esc obrir c omo transitar d e forma harmônic ad a internet existente para uma versão muito mais segura esimpl es d e usar sem pôr tud o a perd er .

O ponto princ ipal aqui é que não existe seguranç a d everd ad e na red e. De c erta maneira, no uso d iário, a internetfunc iona sem furos óbvios, mas isso não signific a que e l es nãoestejam al i e que não c ontinuem c resc end o. A questão é quand oesses furos aumentarão a ponto d e tragar pessoas, empresas egovernos, sem retorno. Nesse momento, os d ias d a internetestarão c ontad os, pel o menos para aquil o que c onhec emosagora. O sistema atual util iza uma arquitetura d a d éc ad a d e1970 para atend er a nec essid ad es d o séc ul o XXI não previstasnaquel e tempo fe l iz d e um mund o bipol ar. (Tente usar umc omputad or d os anos 1970 hoje para ac essar a internet! ) Osd ois sistemas em interaç ão c riaram um imenso d esnível d ec ompl exid ad e que está se ampl iand o d iariamente. Logo e l eprec isará ser red uzid o… por bem ou por mal .

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QUANDO VAMOS COMER?

O ESGOTAMENTO DO SISTEMA GLOBAL DEABASTECIMENTODE ALIMENTOS

OS FATOS

VOCÊ SABIA QUE:

• Mais d e quatro mil hões d e pessoas fic aram pobres d esd ejunho d e 2011 d evid o ao aumento d o preç o d osal imentos?

• Devid o à d iminuiç ão no suprimento d e água, a ArábiaSaud ita não pod erá mais prod uzir tr igo a partir d e2012?

• Como nossa forma d e prod uzir e transportar al imentoshoje em d ia d epend e muito d o petról eo, os preç osc ontinuarão atrel ad os, e , se subirem d emais, al gumasformas d e prod uç ão d e al imentos d eixarão d e serec onomic amente viáveis?

• De ac ord o c om estud os real izad os pel a Gl obalPhosphorus Researc h Initiative, nas próximas d uas outrês d éc ad as não haverá fósforo sufic iente para atend eràs nec essid ad es d e prod uç ão d e al imentos?

• O preç o mund ial d os al imentos subiu quase 40% d esd eo iníc io d e 2010?

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• Doenç as c omo a ferrugem d o tr igo, c ausad a pel o fungoUG99, estão d estruind o segmentos c ad a vez maiores d oestoque mund ial d e al imentos?

Bem, essa l ista pod eria c ontinuar por páginas e páginas. Não restad úvid a, porém, d e que a c ad eia mund ial d e fornec imento d eal imentos está ameaç ad a por uma massiva “c ompl exific aç ão” d osetor. Ind ustrial izaç ão d a agric ul tura, mod ific aç ões genétic as,pestic id as, monoc ul tura, instabil id ad e c l imátic a, c resc imento d apopul aç ão, apropriaç ão urbana d e terras rurais ( e d e sua água) etc .— tod os esses fatores, ind ivid ual mente e em c onjunto, estão c riand oa base para um c ol apso (via evento X) d a red e d e prod uç ão ed istr ibuiç ão mund ial . A ind ustrial izaç ão d a c omid a gerou umad epend ênc ia exc essiva em d eterminad os prod utos agríc ol as — mil ho,tr igo, soja —, d eixand o-nos c om uma d iversid ad e natural red uzid ad e forma d rástic a, d iversid ad e que sempre nos protegeu d e pragas,variaç ões c l imátic as e c oisas d o tipo. Al guns temem que os pestic id asestejam c ontribuind o para a evol uç ão d e “superpestes” (assim c omoos antibiótic os c ontribuíram para o surgimento d e supervírus)c apazes d e d evastar o gl obo, imunes a qual quer tentativa d e d etê-l os.

É muito mais provável que as c ompl exid ad es c onflitantes nasd iferentes partes d o sistema gl obal d e al imentos aumentem asobrec arga d e c ompl exid ad e em vez d e red uzi-l a, a não ser que hajamuito mais c ooperaç ão internac ional no sentid o d e d iminuir osd esequil íbrios. Caso c ontrário, o terc eiro c aval eiro d o apoc al ipse —a fome — assol ará o pl aneta, obrigand o o mund o a enfrentar oprobl ema em termos muito menos favoráveis d o que os d e hoje .

A maioria d e nós, habitantes d e um mund o ind ustrial izad o, estáac ostumad a a ver estantes d e supermerc ad os abarrotad as d e c omid abarata d os mais variad os tipos. É d if íc i l imaginar que a vid apod eria ser d iferente . Mas, c omo d iversas outras eras menc ionad asneste l ivro, a era d os al imentos baratos e d e fác il ac esso estác hegand o ao fim, à med id a que embarc amos numa jornad a para umtempo em que simpl esmente não haverá c omid a sufic iente para tod os.Se voc ê c omeç a a ac har que esta é apenas mais uma história d e terrormal thusiano esperand o para ser anul ad a por outra “revol uç ãoverd e” , c ontinue l end o.

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PESTE NEGRA 2.0

NO FINAL DO SÉCULO XIX, um fungo originário d o Himal aia migrou d asÍnd ias Orientais Hol and esas para a Europa e a Améric a d o Norte ,ond e atingiu as florestas d o l este d o Canad á, matand o a grand emaioria d os ol mos. O fungo rec ebeu o apel id o d e “d oenç a d o ol mohol and ês” , por ter sid o id entific ad o por c ientistas d a Hol and a em1917. Novas c epas surgiram no Reino Unid o na d éc ad a d e 1970,d izimand o mais d e três quartos d os ol mos d a região. Conheç a agoraseu irmão c aç ul a mais agressivo, o Phy tophthora ramorum (PR) ,outro fungo patógeno que também teria surgid o na Ásia e migrad opara a Europa e o Reino Unid o d entro d e c ontêineres, na d éc ad a d e1990. No entanto, em vez d e ol mos, que d esaparec eram quasetotal mente, o PR está atac and o os pinheiros-l aríc ios que c obrem asregiões rurais d e Devon, Cornwal l e S outh Wal es.

Como no c aso d e al gumas d oenç as humanas — um c ânc er noovário, por exempl o —, quand o se d esc obre a infec ç ão por PR já étard e d emais para sal var a árvore. Os primeiros sinais externos sãoquand o as fol has c omeç am a esc urec er, a parte interna d o tronc o fic amarrom em vez d e verd e e c omeç a a esc orrer um l íquid o negro d evárias rac had uras na c asc a. A essa al tura, a árvore não tem maisc omo ser sal va, d evend o ser c ortad a e retirad a d o l oc al para nãoc ontaminar o restante d a floresta. E não são só os pinheiros-l aríc iosque pod em ser infec tad os. O fungo PR também atac a faias,c astanheiras e uma grand e varied ad e d e pl antas, c omo rod od end ros,l i l ases e as espéc ies d o gênero viburnum.

A primeira apariç ão d o PR no Reino Unid o foi em 2002, numapl anta d o gênero viburnum, em East Sussex. O fungo, então, “pul ou”para os rod od end ros e d aí para outras espéc ies d e pl antas, por meiod os esporos d e rod od end ros que viajam pel a água, pel o ar e pel aumid ad e. Até 2009, três c ientistas haviam c ontabil izad o apenas c emárvores infec tad as, geral mente próximas a rod od end ros. Mas aí osesporos d e PR c omeç aram a germinar em tod o o País d e Gal es, naIr l and a d o Norte e na Repúbl ic a d a Ir l and a. Para piorar o quad ro,os esporos nas árvores se reprod uziam c inc o vezes mais d epressa d oque nos rod od end ros. Nesse momento, foi d ad a a l argad a na c orrid apara sal var as florestas d a região, c ontrapond o a habil id ad e d osc ientistas botânic os à virul ênc ia d os esporos d o PR .

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Se voc ê subir numa montanha e ol har para as florestas d e SouthWal es, verá uma paisagem que mais parec e um c ampo d e batal hareminisc ente d a Primeira Guerra Mund ial , não uma floresta, poishec tares d e toc os e gal hos d e árvores c ortad as c omprovam que aind anão se c onhec e a c ura para o fungo PR al ém d a antiga estratégia d ed esmatamento e queimad a. Em fevereiro d e 2011, quase 1,5 mil hãod e pinheiros-l aríc ios foram c ortad os nos quinze meses anteriores, c omprevisão d a d errubad a d e mais 1,2 mil hão nos três meses seguintes —a f im d e evitar uma c atástrofe aind a maior .

O mais preoc upante é que o patógeno PR permanec e no sol o porpel o menos c inc o anos. O futuro d os pinheiros-l aríc ios no ReinoUnid o, portanto, parec e d esol ad or, e o grand e med o é que, quand o jánão existirem mais pinheiros-l aríc ios, o PR passe para outrasespéc ies. Al guns anal istas experientes sugerem que o mirtil o e atémesmo a urze estão na l ista d e possibil id ad es. Atual mente, osbotânic os parec em ter aband onad o a id eia d e errad ic ar o PR,c onc entrand o seus esforç os em seu c ontrol e . Na verd ad e, o que estác omeç and o a ac ontec er nas florestas d a Grã-Bretanha é uma pragad e proporç ões bíbl ic as, mas que, ao c ontrário d a praga d a Id ad eMéd ia, provavel mente não d esaparec erá tão c ed o. Para ter uma id eiad o que ac ontec eria se um assassino d e pl antas c omo o PR c omeç asse ase espal har d esc ontrol ad amente por tod o o gl obo, c onsid ere aseguinte história.

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ALGUNS ANOS ANTES DE ser possível pesquisar qual quer l ivro, até mesmoaquel es fora d e c atál ogo, c om um simpl es c l ique em l ivrarias virtuaisc omo a Amazon, empreend i uma od isseia mund ial em sebos d e tod o opl aneta, d e Nova York a Christc hurc h, passand o pel o R io d e Janeiro,c om o objetivo d e enc ontrar os c em maiores l ivros d e fic ç ão c ientífic ad e tod os os tempos. A id eia quixotesc a foi d espertad a pel o l ivroSc ienc e Fic tion: e 100 Best Novel s [Fic ç ão c ientífic a: os 100mel hores romanc es] , d o c r ític o e ed itor d e fic ç ão c ientífic a DavidPringl e , publ ic ad o em 1986. Num gesto l ouvável , Pringl e não tentouranquear seus c em preferid os, l imitand o-se a l istá-l os por ord em d epubl ic aç ão, a partir d e 1984, d e George Orwel l (1949) , atéNeuromanc er , d e Wil l iam Gibson, que, por c oinc id ênc ia, foi l anç ad o

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em 1984. Num ponto intermed iário entre esses d ois c l ássic osmaravil hosos, ambos c om visões um tanto sombrias d o futuro,enc ontra-se outro c l ássic o — igual mente sombrio —, Chung-Li, aagonia d o verd e (1956) , d o esc ritor britânic o John Christopher .

O argumento d a história d e Christopher é um vírus botânic o forad e c ontrol e , o Chung-Li, que d estrói tod as as gramíneas d a China,provoc and o a fome d e c entenas d e mil hões d e c hineses. Tud o issoparec e muito remoto para os Custanc e, uma famíl ia d e c l asse méd iad a Grã-Bretanha, que vive d a terra no Distr ito d os Lagos. Outroramo d a famíl ia, enc abeç ad o pel o ad vogad o John Custanc e, mora emLond res. No d ec orrer d a história, John Custanc e d esc obre por meiod e Roger, um amigo que trabal ha para o governo britânic o, que ovírus Chung-Li se espal hou e c hegou à Grã-Bretanha. O trec ho aseguir resume bem a essênc ia d o l ivro:

— Que se d ane! — exc l amou John. — Não estamos naChina.— Não — retruc ou Roger. — Estamos num país d e 50mil hões d e pessoas que importa quase metad e d osal imentos que c onsome.— Tal vez tenhamos que c ortar gastos.— Os mortos — d isse R oger — não fazem ec onomias.

As tentativas c ientífic as d e d eter o vírus não d ão em nad a, ed epois d e um ano o mund o inteiro é afetad o. John ouve d e seu amigod o governo que o exérc ito está prestes a isol ar os grand es c entrosurbanos, pois apenas uma pequena parc el a d a popul aç ão c onseguesobreviver c om uma d ieta à base d e raízes e pesc ad os. Por isso, ogoverno d ec id iu que a únic a sol uç ão é red uzir a popul aç ão,e l iminand o os morad ores d as c id ad es. A maior parte d o l ivro tratad a saga d e John e sua famíl ia rumo à fazend a d e seu irmão. Noc aminho, e l es enc ontram um band o d e sal tead ores, c id ad ãos que,c omo el es, fugiram d as c id ad es e estão estuprand o, pil hand o ematand o para c onseguir sobreviver e al c anç ar o c ampo. No final ,John e sua famíl ia c hegam ao refúgio na fazend a d o irmão,l oc al izad a num val e isol ad o — e protegid o —, ond e e l es estarão emposiç ão mel hor para d efend er seu território c ontra invasores.

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COMO UM EXEMPLO VERDADEIRO d e uma situaç ão sem saíd a, apesar d enão tão apoc al íptic a quanto a d esc rita em Chung-Li, a agonia d overd e, o fungo PR menc ionad o anteriormente pod eria c ausar aextinç ão total d e pinheiros-l aríc ios, rod od end ros e espéc ies d ogênero. Embora a “agonia d os pinheiros-l aríc ios” não represente umaameaç a verd ad eira à vid a na Terra, um fungo semel hante pod eria setornar uma c atástrofe gl obal se sofresse uma mutaç ão e ameaç assetambém as pl antaç ões d e grãos. Diante d essa possibil id ad e d eextinç ão d e pl antas, em 2008, o governo d a Noruega c onstruiu umac âmara subterrânea “apoc al íptic a” no interior d e uma montanha noarquipél ago ártic o d e Sval bard , a c erc a d e mil quil ômetros d o Pol oNorte . Nas pal avras d o primeiro-ministro Jens S tol tenberg: “ É umaArc a d e Noé para assegurar a d iversid ad e biol ógic a às futurasgeraç ões.” Enterrad a no permafrost d e uma montanha, a c âmara foiprojetad a para resistir a terremotos, ataques nuc l eares e , tal vez , atéao impac to d e um asteroid e.

A motivaç ão por trás d e uma c âmara d essas resid e naind ustrial izaç ão d o abastec imento mund ial . As grand es empresasl íd eres na prod uç ão d e al imentos restr ingem severamente ad iversid ad e genétic a util izand o pouc as varied ad es d e sementes ou,em al guns c asos, apenas uma. Se um fungo atingir aquel a varied ad eespec ífic a, a prod uç ão pod e ser gravemente prejud ic ad a, provoc and oo c ol apso d e tod o o sistema d e abastec imento. Daí a c âmara d eS val bard .

Embora a região ártic a pareç a ser fr ia o sufic iente para preservaras sementes, as variaç ões d e temperatura exigem que a c âmaraempregue um sistema potente d e c ond ic ionamento d e ar para mantera temperatura abaixo d e –17°C. Congel ad as, as sementes pod emsobreviver por mil anos, embal ad as em rec ipientes metál ic os sobre aspratel eiras azuis e l aranja d as sal as d e armazenamento. Cerc a d e4,5 mil hões d e tipos d e sementes d e pl antas c omo a c enoura, o tr igo eo mil ho pod em ser preservad os. Só para c onstar, os primeirosexempl ares d epositad os d urante a c erimônia d e abertura foram d euma c ol eç ão d e sementes d e arroz d e 104 países.

Ac red ito que a maioria d e nós se surpreend erá em saber que jáexistem c erc a d e c atorze banc os d e sementes no mund o tod o. Muitosd el es, porém, estão l oc al izad os em áreas d e instabil id ad e pol ític a ou

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enfrentam probl emas ambientais. Por exempl o, os d o Iraque e d oAfeganistão foram arrasad os pel a guerra; outro d el es, nas Fil ipinas,foi d estruíd o por um tufão, em 2006. Assim, tornou-se premente anec essid ad e d e estabel ec er um banc o d e sementes d e “supremo” ,c apaz d e resistir a quase qual quer impac to d a natureza ou d ohomem. Geoff Hawtin, d o Gl obal Crop Diversity Trust, responsávelpel a real izaç ão e pel o financ iamento d a operaç ão, d ec l arou: “ O queentrará na c âmara é uma c ópia d e tod o o material que se enc ontra,no momento, em c ol eç ões no mund o inteiro.” Embora d o ponto d evista formal a Noruega seja sua proprietária, qual quer país pod ed epositar sementes na c âmara apoc al íptic a, gratuitamente, c om od ireito d e retirá-l as se nec essário.

Um vírus botânic o c omo o Chung-Li atinge bem no nível maisprofund o a c ad eia al imentar c omeç and o pel as gramíneas, d e mod o ad estruir esse primeiro e vital e l o. Mas os vírus não são a únic a formad e ac abar c om o mund o vegetal , pois existem outros e l os na c ad eiaal imentar entre as gramíneas e a c omid a que c hega a seu prato. Aseguir, veja por que um d esses e l os também é motivo d e grand espreoc upaç ões hoje em d ia.

A MORTE DAS ABELHAS

U M DOS DOCUMENTÁRIOS MAIS c onsagrad os d os ú l timos anos foi TheVanishing of the Bees [O sumiç o d as abel has] , que c onta a históriad o d esaparec imento misterioso d e mais d e um terç o d as abel has d aAméric a d o Norte e d a Europa, no períod o d e 2006 a 2008. Oepisód io em si , c hamad o d e “d istúrbio d o c ol apso d as c ol ônias”(DCC), é retratad o no fil me ac ompanhand o-se apic ul tores d everd ad e, observand o-os enquanto e l es abrem suas c ol meias pel amanhã e d esc obrem que tod as as abel has “se mand aram” , por assimd izer , l iteral mente d a noite para o d ia.

A id eia d e que as abel has estão d esaparec end o inseriu-se nac onsc iênc ia d o públ ic o e o fil me abord a esse med o d e muitasmaneiras. Ninguém há d e negar que a pol inizaç ão d as pl antas feitapel as abel has e outros animais c omo as borbol etas e os pássaros temum papel c ruc ial na prod uç ão d e frutos e sementes. Mais d e 80% d as250 mil pl antas em floraç ão d o pl aneta são pol inizad as por e l es.

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Outro fato inquestionável é que as abel has-d oméstic as, as princ ipaispol inizad oras d entre as d iversas espéc ies, c omeç aram a morrer numagrand e epid emia a partir d e 2006. A questão é que seud esaparec imento c onstitui uma imensa red uç ão na c ompl exid ad e d oproc esso d e prod uç ão d e al imentos, c r iand o um d esequil íbrio entre avaried ad e d e ferramentas nec essárias para a pol inizaç ão e aquel asd isponíveis, uma vez que sem as abel has-d oméstic as o proc esso teriaque ser real izad o por um grupo menor d e agentes.

Esses fatos l evantam d uas grand es questões em rel aç ão ao sistemad e abastec imento al imentar humano: (1) Por que as abel has-d oméstic as estão morrend o? (2) Qual a importânc ia d a pol inizaç ãod as abel has no âmbito geral d e prod uç ão d e al imentos? Vejamos.

As abel has-d oméstic as têm uma vid a muito d ura no mund o d ehoje . São transportad as d e c aminhão d e um l ad o para outro d osEstad os Unid os por seus c uid ad ores para pol inizar pl antaç ões d efrutas e nozes, a c omeç ar pel as amênd oas d a Cal ifórnia no iníc io d aprimavera e final izand o c om as peras e maç ãs d o Oregon no iníc iod o outono. Val e ressal tar que essas são as c hamad as “abel has-d oméstic as c omerc iais” , muito superiores em pol inizaç ão às abel has“sel vagens” . Para ter uma id eia d o estrago que seria c ausad o se e l asd esaparec essem total mente, l eve em c onta que a Cal ifórnia éresponsável pel o suprimento d e quase 80% d as amênd oas d o mund o,util izad as em uma grand e varied ad e d e prod utos, d esd e sorvetes atéc osmétic os. Não é d e se estranhar, portanto, que empresas c omo aHäagen-Dazs estejam financ iand o inic iativas para c onsc ientizar aspessoas sobre a importânc ia d as abel has na agric ul tura. Send o bemd ireto: se não tiver abel ha, ad eus pl antaç ão e ad eus prod utos.

Para se ter uma id eia d o impac to d o DCC na ec onomiaapic ul tora, os prod utores d e amênd oas pagaram uma taxa d e al ugueld e 175 d ól ares por c ol meia em 2009, quase o d obro d o preç o c obrad oapenas quatro anos antes. Então, se voc ê c ol oc ar uma c ol meia porac re (0,4 hec tare) d e pl antaç ão e sua pl antaç ão tiver d ois mil ac res(810 hec tares) , estamos fal and o d e um aumento no c usto d e prod uç ãod e d uzentos mil d ól ares ou mais, somente em gastos c om pol inizaç ão.Como d isse John Repl ogl e , ex-CEO d a Burt’s Bees, empresa d ec osmétic os que vend e c remes à base d e amênd oas: “ Se as abel has sevão, o mesmo ac ontec e c om as amênd oas.” Se c ontabil izarmos maç ãs,peras, mirtil os e z il hões d e outras frutas, nozes e pl antas que asabel has pol inizam, c omeç a-se a ter uma id eia mel hor d a magnitud e

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d o probl ema c riad o pel o seu d esaparec imento. O que os biól ogos d ac onservaç ão e espec ial istas em abel has d izem a respeito d as c ausas d oDCC?

Após o surto d e 2006, os pesquisad ores trabal haram d e formainc ansável para tentar id entific ar o que fazia as abel has fugirem. Noiníc io d e 2011, a expl ic aç ão mais pertinente apontava para os genes:as fábric as na c é l u l a responsáveis pel a c r iaç ão d as proteínas que asabel has usam para real izar suas ativid ad es parec em ter sid od estruíd as nas abel has assoc iad as ao DCC. Resumind o, a estruturac el ul ar d as abel has não gerava mais a energia nec essária para suasfunç ões. Mas quais foram os fatores que c ausaram esse probl emanessas fábric as gerad oras d e energia d e nível c e l u l ar?

A mel hor resposta refere-se à c ombinaç ão d e três fatoresd iferentes, prod uzind o uma espéc ie d e c atástrofe que afetou aoperaç ão genétic a d as abel has. Essa tr inc a infernal c onsiste nasseguintes etapas.

Pestic id as: Seu l ad o negativo já é bem c onhec id o d esd e1962, pel o menos, ano d a publ ic aç ão d e Primaverasil enc iosa, um l ivro revel ad or d e Rac hel Carson, quec hamava a atenç ão para os perigos d os pestic id asquímic os, tanto para os seres humanos quanto para omeio ambiente. Como tod as as ferramentas c egas, ospestic id as têm d uas fac es. Pod em matar mosquitosresponsáveis por transmitir d oenç as fatais, mas tambémmatam formigas e outros insetos úteis. El es previnemd oenç as nos seres humanos, d estruind o al imentosinfec tad os, mas também pod em ser c anc erígenos e estãoassoc iad os, entre outros mal es, ao c ânc er d e mama. Ouseja, seu uso é sempre uma fac a d e d ois gumes.

Nesse mesmo sentid o, a mod ific aç ão genétic a d as sementes parared uzir a nec essid ad e d e insetic id as d eu origem a uma c orrid aarmamentista evol utiva entre os agric ul tores e os insetos, c uja úl timamanifestaç ão é uma popul aç ão d e “superinsetos” resistentes aopestic id a impl antad o genetic amente nas c epas mais popul ares d emil ho. Esse é mais um exempl o d e sobrec arga d e c ompl exid ad e, emque o sistema imunol ógic o d os insetos evol uiu a um nível d e

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c ompl exid ad e muito maior d o que o baixo nível d e c ompl exid ad e d asd efesas genetic amente projetad as para o genoma d as pl antas.

As abel has viajantes, também, estão expostas a níveis c ad a vezmaiores d e pestic id as a c ad a ano que passa. Essa exposiç ão, somad aao mero estresse d e serem c aixeiros-viajantes d e pol inizaç ão, ac abaprejud ic and o sua saúd e, d iminuind o sua c apac id ad e d e resistir aoutros patógenos.

Vírus: Vários vírus são notoriamente prejud ic iais àsabel has. A l ista d aquel es que atac am sua estruturagenétic a é l onga, inc l uind o um c hamad o “vírus d aparal isia israel ense” e um fungo parasita d e nomeNosema c eranae, ambos presentes c om frequênc ia nac onstituiç ão genétic a d as abel has infec tad as. Aqui, d enovo, a c ompl exid ad e surge d e forma ameaç ad ora. Àmed id a que a varied ad e d e vírus ameaç ad ores aumenta,a c ompl exid ad e d o sistema imunol ógic o d as abel has ésuperad a pel a varied ad e d as ameaç as, abrind o umal ac una que, em al gum momento, terá que ser red uzid a.Ác aros parasitas: O fator d ec isivo que pod e terprec ipitad o o c ol apso d a c ol ônia d e abel has jáenfraquec id as pel os fatores expl ic ad os ac ima é o varroa,ác aro introd uzid o ac id ental mente nos Estad os Unid os em1986, quase c ertamente por meio d a importaç ão d eabel has infec tad as. Esse ác aro é portad or d aquel esmesmos tipos d e vírus aos quais os genes d as abel has sãosusc etíveis, e pod e ter sid o a gota d ’água para c ausar oDCC.

Fel izmente, as popul aç ões d e abel has parec em estar em asc ensãod e novo, mas novos probl emas d e pol inizaç ão d espontam no horizonted evid o ao d rástic o aumento d a prod uç ão agríc ol a nas ú l timas c inc od éc ad as. Nesse períod o, a popul aç ão humana d obrou, e a pequenaproporç ão d a agric ul tura que d epend e d a pol inizaç ão d e abel hasquad ripl ic ou. Essa ampl iaç ão na safra d e frutos c omo c aju, c ereja eamênd oa d eveu-se , em grand e parte , ao aumento d as terras parapl antio.

Infel izmente, transformar em terra c ul tivad a o habitat natural d e

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pol inizad ores se l vagens, somad o a uma maior d emand a, supera emmuito o aumento d a popul aç ão d e abel has-d oméstic as, o que ac abal imitand o signific ativamente a c apac id ad e geral d e pol inizaç ão.Assim, o aumento d a d emand a d e prod utos agríc ol as que d epend emd e pol inizad ores, juntamente c om esses fatores d e red uç ão d ac apac id ad e d e pol inizaç ão, c r iou c ond iç ões para que possa haver umprobl ema d e magnitud e inaud ita. A boa notíc ia é que as abel hasvol taram. A má é que os ac ontec imentos rec entes pod em ser um sinald e que teremos um verd ad eiro probl ema em breve.

O fungo PR e o d esaparec imento d as abel has i l ustram nitid amentea nec essid ad e d e uma reserva d e sementes d e pl antas d o mund o tod o,c omo a c âmara apoc al íptic a, para preservar a d iversid ad e d avegetaç ão. Mas as c r ises re l ac ionad as a al imentos não vêm somented os probl emas c om pl antas. El as pod em surgir por d iversos motivos eter d iferentes tempos d e d uraç ão. Diversid ad e red uzid a por c onta d ed oenç as e infec ç ões é uma d as ameaç as mais severas, c om um tempod e d esd obramento méd io d e al guns meses até um ano,aproximad amente. Pod eríamos argumentar, entretanto, que esses sãoos exempl os mais extremad os d e c r ises no abastec imento d e al imentosc riad as a partir d a aç ão d o homem. Examinemos c om mais d etal hes,então, a c r ise emergente, d e prazo mais c urto, e vejamos que tipos d ec atástrofes parec em assomar no horizonte.

FAMA/FOME E [FALTA DE] DINHEIRO

POUCO APÓS AS DEZ d a manhã d o d ia 24 d e abril d e 2008, Mar y AnnGal viso, c orretora d e imóveis d a c omunid ad e rural d e Orosi, naregião c entral d a Cal ifórnia, arrebatou d ois sac os d e arroz d ejasmim tail and ês, c ad a um c om 22 quil os, d a fil ial d e São Franc isc od o c l ube atac ad ista Costc o. Sua c ompra foi uma pequenac ontribuiç ão para que o estoque fosse l iquid ad o em apenas uma hora,apesar d e a l oja ter fixad o um l imite d e d ois sac os por c l iente . O quehá d e espec ial na história d a Srta. Gal viso é que e l a viajou mais d etrezentos quil ômetros para fazer a c ompra, pois na fil ial d e suac id ad e esgotara-se o arroz , al imento básic o para Mar y Ann e suafamíl ia.

Essa história revel a o d esespero d e c onsumo não só d os c l ientes

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l oc ais, mas também d os d onos d e restaurante asiátic os e ind ianos,c ujo pânic o obrigou a Costc o e o Sam’s Cl ub, uma d as d ivisões d oWal mart, a impor l imites no que d iz respeito à quantid ad e d e arrozque c ad a pessoa pod ia c omprar. “ Ouvimos fal ar d e c asos d eproprietários d e restaurantes armazenand o estoques o bastante paratrês semanas no porão” , c ontou um gerente d a Costc o.

O rac ionamento d e arroz nos Estad os Unid os em 2008 ac ontec eujunto c om o aumento d os preç os d e merc ad orias, que gerou viol ênc iaem rel aç ão ao fornec imento d e al imentos e aos c ustos. De fato, trêsanos d epois os preç os não c ed eram e c ontribuíram fortemente para aagitaç ão soc ial e a viol ênc ia que d errubaram os regimes pol ític os d aTunísia e d o Egito. Para se ter uma id eia d a magnitud e d o probl ema,em fevereiro d e 2011, a Organizaç ão d e Al imentos e Agric ul tura d asNaç ões Unid as (FAO) informou que o índ ic e d e preç os d e al imentosd a c esta básic a, c omo tr igo, l e ite , ól eo e aç úc ar, aumentara 2,2% emc omparaç ão a janeiro, c hegand o a seu nível máximo d esd e que aorganizaç ão c omeç ara a monitorar os preç os, mais d e d uas d éc ad asantes. Vamos d ar uma ol had a rápid a no c onjunto d e fatores quec ontribuem para essa esc al ad a c ontínua no preç o d os al imentos nomund o inteiro.

A grand e subid a no preç o d os al imentos nos ú l timos c inc o anospod e ser atribuíd a a forç as que atuam simul taneamente para red uzira oferta e aumentar bastante a d emand a. Como d itam as regras maisbásic as d a ec onomia, esses d ois fatores c onstituem a c ombinaç ãoperfeita para d esfal c ar o orç amento d oméstic o d e qual quer famíl ia.Al guns fatores d o l ad o d a oferta que l evam a um d ec l ínio d aprod uç ão d e al imentos são:

Esc assez d e água: A extraç ão exc essiva d e água d e l enç óisaquíferos em muitos países, entre e l es China, Índ ia eEstad os Unid os, inflou artific ial mente a prod uç ão d eal imentos nas ú l timas d éc ad as. Por exempl o, a ArábiaSaud ita foi autossufic iente no c ul tivo d e tr igo por maisd e vinte anos. Agora, as pl antaç ões estão em vias d ed esaparec er d evid o à fal ta d e água para irrigaç ão.Erosão d o sol o e perd a d e terras férteis: Espec ial istasestimam que um terç o d as terras férteis d o pl aneta estáperd end o sol o arável numa vel oc id ad e maior d o que a d esubstituiç ão por proc essos naturais. No noroeste d a

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China e no oeste d a Mongól ia, está se formand o umaregião sujeita a tempestad es d e areia tão grand e que fazc om que aquel as d os Estad os Unid os na époc a d a Grand eDepressão pareç am minúsc ul as em c omparaç ão. Al gosimil ar está em formaç ão na zona c entral d a Áfric a. Oresul tad o é uma red uç ão na prod uç ão d e grãos, e , c om otempo, os agric ul tores prec isarão aband onar o c ampo e semud ar para as grand es c id ad es. Cond iç ões extremas e fenômenos c l imátic os: Oaquec imento gl obal não é um mito, e as temperaturasasc end entes vieram para f ic ar . Estima-se que a c ad a grauCel sius d e aumento ac ima d o id eal na époc a d e c ul tivol eve a um d ec résc imo d e 10% na prod uç ão d e grãos.Fotos d e c ampos d e tr igo queimad os na Rússia d urante overão d e 2010 são uma prova c ontund ente d o impac tod as mud anç as c l imátic as na agric ul tura.Al ta no preç o d o petról eo: Há uma segund a “c rise d opetról eo” ac ontec end o paral el amente à que vemos noposto d e gasol ina quand o vamos enc her o tanque. É od rástic o aumento no preç o d os ól eos d e c ozinha, c omo od e pal ma, d e soja, d e mil ho e muitos outros feitos c omvegetais. E há também o forte impac to que um aumentod e preç o nos d erivad os d e petról eo exerc e sobre oabastec imento d e al imentos, uma vez que e l es partic ipamd e tod os os momentos. Como já se d isse : “O sol o é a formaque a natureza tem d e transformar petról eo em c omid a” .

Esses são apenas al guns d os fatores que c ontribuem para aumentaro d ec l ínio d o abastec imento gl obal d e al imentos. Infe l izmente, existe ,al ém d el es, uma l ista c ompl ementar muito “d eprimente” também nol ad o d a d emand a.

Cresc imento popul ac ional : A popul aç ão mund ial c resc e auma razão d e mais d e d uzentas mil pessoas por d ia. Nãoé prec iso ser um gênio para prever que a maioria proc urasua refeiç ão nas regiões mais pobres e subnutrid as d omund o. Assim, embora o número d e boc as a al imentarc ontinue c resc end o, não há c omid a sufic iente para

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tod os. Af l uênc ia c resc ente : Mais d e três bil hões d e pessoas estãomud and o seus hábitos al imentares e d eixand o uma d ietad e subsistênc ia para c onsumir mais c arne, ovo, l e ite eprod utos r ic os em grãos. Eis a expl ic aç ão. São nec essáriossete quil os d e grãos para prod uzir apenas meio quil o d ec arne. A prod uç ão d e uma c al oria d e proteína animalrequer onze vezes mais c ombustível fóssi l d o que aprod uç ão d e uma c al oria d e proteína vegetal . Em outraspal avras, em vez d e c omer os grãos d iretamente, metad ed a popul aç ão mund ial está c omend o grãos“transformad os” , sob a forma d e prod utos mais r ic os emproteínas e f ibras, c omo a c arne e o frango.

Amarty a Sen, ec onomista venc ed or d o Prêmio Nobel ,i l ustra a perversid ad e d esse fenômeno imaginand o umpaís c om muitos pobres que experimenta d e repente ummomento d e expansão ec onômic a. Em seguid a, e l epresume que apenas metad e d a popul aç ão d esfruta d essanova riqueza. A metad e r ic a gasta seu d inheiro emal imentos mais c aros, d e maior qual id ad e, o que forç auma subid a nos preç os. Diante d esse ac résc imo, a metad epobre, que não se benefic iou c om um aumentoproporc ional d a rend a, passa fome. E o pior é que nãoestamos fal and o d e um mund o imaginário. Sen c onta queesse proc esso ac ontec eu em Bengal a, em 1943.Grãos para c ombustível : Uma parte signific ativa d aprod uç ão d e grãos, princ ipal mente o mil ho, d eixou d e irpara a mesa para se transformar em etanol para osc arros. Nos Estad os Unid os, o uso d o mil ho parac ombustível c orrespond e a quase um terç o d e tod o oc ul tivo. O princ ipal motivo para essa mud anç a sãopol ític as equivoc ad as d e subsíd io governamental ,instituíd as em 2006, para agric ul tores.

Al ém d esses c omponentes d e aumento d e preç o d os al imentos,d evemos c onsid erar aind a a infusão mac iç a d e d ól ares americ anos nosistema financ eiro mund ial para c ombater a c r ise atual . Como ospreç os d as c ommod ities são quase sempre fixad os em d ól ares, umainund aç ão d essa moed a no sistema financ eiro mund ial c ontribui

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para um imenso ac résc imo no preç o d e prod utos primários em tod o opl aneta, d esd e o ól eo e o tr igo até o buc ho d e porc o c ongel ad o. Àmed id a que o d ól ar se val oriza, os d etentores d e outras moed asprec isam pagar mais pel as merc ad orias e , portanto, mais pel osal imentos d a c esta básic a. Em suma, o “abrand amento” quantitativoimposto pel o Banc o Central americ ano, o Fed eral Reserve, ac abou setornand o uma “ad versid ad e” quantitativa para a mesa d e boa parted a popul aç ão mund ial . Qual a sol uç ão? Existe sol uç ão?

A “sol uç ão” óbvia para uma c rise d e al imentos c omo essa seriaatac ar os d esequil íbrios entre oferta e d emand a na fonte . Talproc esso envol veria os seguintes tipos d e med id a:

Ad ministraç ão efic iente d e água e terras férteis: Aextraç ão exc essiva d e água d e l enç óis aquíferos e oesgotamento d as terras férteis têm d e ac abar. A expansãourbana e a pavimentaç ão d e terras d e c ul tivo para ac onstruç ão d e estrad as e estac ionamentos, espec ial mentena China e na Índ ia, têm que ser c ontid as. Al ém d isso, aágua d isponível prec isa ser util izad a d e maneira muitomais efic iente , o que d epend erá d e tec nol ogiasinovad oras, inexistentes hoje em d ia: por exempl o,rec ic l agem d e água ou d esenvol vimento d e c ul turas querequeiram menos água.Popul aç ão mund ial : Prec isamos estimul ar urgentementea formaç ão d e famíl ias menores. Entre outras c oisas, seránec essário fornec er ajud a e informaç ões d e pl anejamentofamil iar às popul aç ões mais pobres, responsáveis pel asmaiores taxas d e natal id ad e d o mund o. Cl ima: As emissões d e c arbono prec isam ser red uzid as em80% na próxima d éc ad a para evitar c atástrofesc l imátic as, sobretud o enc hentes, furac ões, sec as e eventossimil ares, d ec orrentes, em princ ípio, d o aquec imentogl obal . Esses eventos d estruiriam grand e parte d as terrasagríc ol as existentes.Mud anç a d a pol ític a governamental : Pol ític asgovernamentais equivoc ad as d e subsíd io à prod uç ão d eetanol a partir d e grãos d evem ser aband onad as o maisrápid o possível . Os grãos são muito mais val iosos paraenc her estômagos vazios d o que em tanques d e gasol ina.

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Um maior c ontrol e governamental sobre os prod utoresmul tinac ionais também seria uma d ád iva paraestabil izar a prod uç ão d e al imentos, inc entivand o menosefic iênc ia e mais resi l iênc ia no proc esso d e prod uç ão.Uma id eia, por exempl o, ser ia obrigar o uso d e umamaior varied ad e d e sementes no c ul tivo d e grãos.

SINTETIZANDO

O MUNDO ESTÁ ENFRENTANDO , neste momento, uma c onfluênc ia d eesc assez c resc ente em três e l ementos fund amentais para ac ontinuaç ão d a vid a humana neste pl aneta: água, energia eal imentos. A c ombinaç ão resul tante é maior d o que a soma d aspartes, pod end o ac abar em d esastre até 2030. Até l á, a d emand a d eágua c resc erá em 30%, enquanto a d e energia e al imentos d ispararáem 50%. Tud o isso será motivad o por um aumento d a popul aç ãogl obal , que c hegará a oito bil hões d e ind ivíd uos, exerc end o enormepressão sobre nosso sistema al tamente ind ustrial izad o d e prod uç ão d eal imentos.

É importante fr isar que a esc assez d e c omid a, uma d as três pernasd esse tr ipé, resul ta menos d a oferta d o que d a d emand a. Fel izmente,embora o c resc imento popul ac ional gl obal c ontribua d e maneirasignific ativa para estimul ar essa d emand a, as taxas parec em estard esac el erand o, e , se o pad rão atual d e autonomia femininac ontinuar, espera-se que essas taxas d esac el erem aind a mais.Evid entemente, sempre pod e haver surpresas, e por isso não hágarantias d e que essas tend ênc ias c ontinuarão. Al iás, é muitoprovável que e l as não c ontinuem se o mund o não enc arar d e frente oprobl ema mais d esafiad or: a d istânc ia c ad a vez maior entre os paísesr ic os e os pobres na ec onomia gl obal .

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3

O DIA EM QUE OS ELETRÔNICOS PARARAM

UM PULSO ELETROMAGNÉTICOCONTINENTAL DESTRÓI TODOS OS

APARELHOS ELETRÔNICOS

EM QUESTÃO DE MILISSEGUNDOS

O CINEASTA ALEMÃO WIM WENDERS é c onhec id o por “road movies” nosquais personagens perambul am por regiões d esertas d ebatend o-se c omvários tipos d e questões existenc iais. Até o fim d o mund o , fil me d e1991, se passa na virad a d o mil ênio e c onta a história d e um satél itenuc l ear fora d e c ontrol e que está prestes a vol tar à atmosfera em uml ugar inc erto e c ontaminar uma grand e região d o pl aneta. Pessoas d ed iferentes áreas d e r isc o entram em pânic o e c omeç am a fugir emband os, apavorad as. Em meio a muita c orreria pel o d eserto, aheroína d o fil me, uma mul her c hamad a Cl aire , d epara-se c omc ientistas mal uc os, ind ivíd uos misteriosos d e entid ad esgovernamentais sec retas, viajantes, c aç ad ores d e rec ompensas eoutras figuras suspeitas, tod os tentand o rec uperar o protótipo d e umaparel ho que registra e interpreta impul sos c erebrais. No d ec orrerd essa busc a frenétic a, o saté l ite nuc l ear é d estruíd o, c ausand o umgrand e surto d e energia, um pul so e l etromagnétic o (PEM), qued estrói tod os os equipamentos e l etrônic os d o mund o. Emc onsequênc ia, os personagens são transportad os d o final d o séc ul o XXpara um esti l o d e vid a pré-históric o, uma vez que tod os osd ispositivos que d epend em d e mic roc irc uitos, c omo c omputad ores,c arros, aparel hos d e rád io e afins, são d estruíd os em questão d e

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mil issegund os.Isso pod eria real mente ac ontec er? Será que tod os os aparel hos

el etrônic os que fazem parte d a vid a c otid iana pod eriam queimar d euma hora para outra? Ou será que um PEM, c omo o d esc rito no fil med e Wend ers, é apenas outro exagero d e Hol l y wood , al go possível emteoria, mas que na prátic a é extremamente improvável ? Um pouc o d ehistória ajud ará a esc l arec er a questão.

No d ia 16 d e ju l ho d e 1997, o d eputad o Curt Wel d on, presid ented a Subc omissão d e Pesquisa e Desenvol vimento Mil itar d os Estad osUnid os, c onvoc ou uma reunião para d isc utir “A ameaç a d o pul soel etromagnétic o (PEM) para os sistemas mil itares americ anos e paraa infraestrutura c ivil ” . Entre os espec ial istas c onvid ad os parapartic ipar d os d ebates estavam o Dr. Lowel l Wood , d o LivermoreNational Laborator y , d a Cal ifórnia; Gil bert Cl inger, subsec retárioem exerc íc io d e d efesa d o espaç o; e o Dr. Gar y Smith, d iretor d oLaboratório d e Físic a Apl ic ad a d a Universid ad e Johns Hopkins,al ém d e membros d a c omunid ad e americ ana d e intel igênc ia. Ac onc l usão d o enc ontro pod e ser resumid a pel as pal avras d o Dr. Woodquase no f inal d a sessão:

É uma projeç ão razoável a d e que quase tod os os c omputad oresmod ernos expostos ao PEM, senão tod os ( . . .) serão afetad os. Aoserem afetad os, no mínimo d eixarão d e func ionar. Em muitosc asos, queimarão. ( . . .) Não apenas os c omputad ores d asaeronaves, mas c omputad ores em tod a parte , exc eto os queestiverem protegid os por um invól uc ro metál ic o espec ial c omo oque o Dr. Ul l r ic h d esc reveu na pal estra d e abertura. Osc omputad ores em qual quer outro tipo d e invól uc ro serãoafetad os ou c ompl etamente d estruíd os.

Mais tard e, o Congresso ped iu para um c omitê d e al to nívelreal izar uma investigaç ão mais profund a sobre o fenômeno d o PEM,trabal ho que foi publ ic ad o em 2004 c om o títu l o Rel atório d ac omissão para aval iar a ameaç a d e um ataque d e PEM aos Estad osUnid os.

Diante d esses estud os d etal had os, pod emos c onc l uir que, al ém d eser uma ameaç a real ao esti l o d e vid a high-tec h d e hoje , o PEM setornará aind a mais perigoso à med id a que d epend ermos c ad a vez

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mais d e d el ic ad os aparel hos e l etrônic os em nosso d ia a d ia.

AFINAL, O QUE É O PEM?

E XPLICANDO DE UMA FORMA bem c onc isa, o PEM é uma ond ael etromagnétic a d e c hoque prod uzid a por uma expl osão d e al taenergia na atmosfera. Essa ond a c ria uma sobrec arga momentânea d ec orrente e l étr ic a nos c irc uitos d e aparel hos c omo te l efones c e l u l ares,c omputad ores, te l evisores e automóveis que estejam d esprotegid os.Esse pul so d e c orrente queima os aparel hos e l etrônic os d a mesmaforma c omo uma sobrec arga d a c orrente resid enc ial queima umfusível em vez d o forno ou d o aparel ho d e som. A d iferenç a é que oPEM atac a tod os os aparel hos e l etrônic os por meio d e uma ond a quese propaga na atmosfera, ao c ontrário d o pic o d e tensão d a red eel étr ic a, que c hega às resid ênc ias através d a fiaç ão. É fác il protegeras instal aç ões resid enc iais c ontra sobrec argas d a red e e l étr ic a: bastater um quad ro d e fusíveis ou d isjuntores. Entretanto, não é possívelproteger c om fusíveis ou d isjuntores um c irc uito que está send oatac ad o pel o ar ; é prec iso bl ind ar tod o o aparel ho a ser protegid o,c omo observou o Dr. Wood .

Certamente, o PEM mais bem d oc umentad o d a história resul toud e uma expl osão nuc l ear atmosféric a sobre o atol d e Johnston, noPac ífic o Sul , em 1962, c omo parte d a operaç ão S tarfish Prime. Essaexpl osão d e 1,4 megaton ac ontec eu a uma al titud e d e quatroc entosquil ômetros, em uma área remota, mas o pul so d e energiael etromagnétic a resul tante foi sentid o em Honol ul u, a mais d e 1.100quil ômetros d o epic entro. Mesmo tend o sid o atenuad o no perc ursoaté o Havaí, o pul so d e energia teve forç a sufic iente para queimarl âmpad as d e i l uminaç ão públ ic a, d isparar al armes c ontra l ad rões ed anif ic ar uma estaç ão retransmissora d e sinais d e rád io.

Devemos l evar em c onsid eraç ão que a operaç ão S tarfish Prime foic onc ebid a em 1962, há quase c inquenta anos, quand o grand e parted os equipamentos aind a util izava vál vul as. No mund o d e hoje , d eaparel hos mic roel etrônic os supersensíveis, tod os os c omputad ores ete l efones c e l u l ares, tod os os c arros, barc os, aviões e trens, tod as asinfraestruturas d e suprimento d e energia, al imentos, água ec omunic aç ão e tod os os sistemas e l etrônic os d e c ontrol e e seguranç a

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são vul neráveis. Neste c enário, portanto, uma “bomba d e PEM” é umprato c heio para um terrorista. Mas será que é fác il c r iar um pul sod esses e al c anç ar uma grand e região geográfic a?

Para respond er a essa pergunta, primeiro prec isamos entend erc omo o pul so é gerad o. Um PEM c omeç a c om uma c urta e forteexpl osão d e raios gama, c omo a prod uzid a por uma bomba nuc l ear.Na verd ad e, não é nec essária uma expl osão nuc l ear para gerar umPEM, mas, c omo a intensid ad e d o PEM é proporc ional à forç a d aexpl osão, o pul so resul tante d e uma expl osão nuc l ear é muito maiord o que o d e qual quer outro tipo d e expl osivo. Vol tarei a essa questãomais ad iante.

Os raios gama prod uzid os na expl osão interagem c om as mol éc ul asd e ar d a atmosfera e geram el étrons d e al ta energia, num proc essoc onhec id o c omo efeito Compton. Esses e l étrons ionizam a atmosfera,prod uzind o um c ampo el étr ic o muito intenso. A forç a d esse c ampod epend e d a intensid ad e d a expl osão e d a al titud e em que oc orreu. Osmaiores pul sos e l etromagnétic os são prod uzid os por expl osões emal titud es ac ima d e tr inta quil ômetros, mas expl osões ao nível d o sol oou em baixas al titud es também pod em gerar pul sos intensos. O efeitomais frac o oc orre quand o a expl osão se d á em uma al titud eintermed iária.

Vol tand o brevemente a uma questão já l evantad a, não énec essária uma expl osão nuc l ear para c riar um PEM. El e pod e sergerad o c om expl osivos c onvenc ionais e c onc eitos d e f ísic a d o séc ul oXIX, por meio d e um aparel ho c hamad o gerad or d e c ompressão d ef l uxo (FCG, d o ingl ês flux c ompression generator ) ou um d ispositivomagneto-hid rod inâmic o (MH D, d o ingl ês magneto-hy d rod y namicd evic e) . O FCG é apenas um jargão para d esc rever um d ispositivoque util iza um expl osivo d e ac ionamento rápid o para c omprimir umc ampo magnétic o, transferind o a maior parte d a energia d o expl osivopara o c ampo.

O FCG c onsiste num tubo c heio d e expl osivos d e aç ão rápid a. Otubo é c ol oc ad o no interior d e uma bobina d e c obre l igeiramentemaior. Um pouc o antes d a d etonaç ão, a bobina é energizad a por umbanc o d e c apac itores, a fim d e c riar um c ampo magnétic o. A expl osãoc omeç a na parte traseira d o tubo. Em d ec orrênc ia d a ond ael etromagnétic a que se expand e pel a forç a d a expl osão, o tuboenc osta na bobina, prod uzind o um c urto-c irc uito. O c urto-c irc uitoavanç a à med id a que um trec ho maior d o tubo se d il ata,

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c omprimind o o c ampo magnétic o. De ac ord o c om o austral iano Carl oKopp, espec ial ista em d efesa: “ O resul tad o é que o FCG prod uz umpul so d e c orrente em forma d e rampa, que é emitid o na forma d euma ond a el etromagnétic a antes que a expl osão d estrua o tubo e abobina.” Esse pul so tem a forç a d e um mil hão d e re l âmpagos e é oque d estrói tod os os aparel hos e l etrônic os que estiverem no c aminhod a ond a d e c hoque prod uzid a pel o FCG.

O MH D func iona c om base no princ ípio, um pouc o d iferente , d eum c ond utor que se move na presenç a d e um c ampo magnétic o, o qualprod uz uma c orrente e l étr ic a perpend ic ul ar à d ireç ão d o c ampo e àd ireç ão d o movimento d o c ond utor. O que é assustad or é que tanto oFCG quanto o MH D pod em ser montad os c om rel ativa fac il id ad e eserviriam c omo um gerad or d e PEM bastante c ompac to, barato eef ic az .

A d espeito d e c omo o PEM é gerad o, os e feitos são os mesmos d asobras d e fic ç ão que menc ionei anteriormente. Um momento d epois d ea bomba — nuc l ear, FCG ou MH D — ser d etonad a, c r ia-se umaond a invisível d e rad iofrequênc ia. Esse “pul so” é mais d e um mil hãod e vezes mais intenso que o maior sinal d e rád io prod uzid o porantenas d e rad ar, rád io ou te l evisão. A forç a d a ond a é tão grand eque e l a c hega a tod os os l ugares que estejam na l inha d e visad a d aexpl osão. Esse é um d os princ ipais motivos pel os quais uma expl osãoa grand e al titud e pod e c ausar tantos d anos. Assim, por exempl o, umaexpl osão a quinhentos quil ômetros d e al tura ac ima d o estad o d eKansas afetaria tod os os Estad os Unid os e partes d o Canad á e d oMéxic o!

Ao atingir a superf íc ie d a Terra, o pul so gera ond as d e c hoqueel etromagnétic as d e al ta vel oc id ad e que põem em risc o tod os ose l ementos d e nossa infraestrutura tec nol ógic a mod erna, c omo:

• Computad ores e outros aparel hos c om mic roc irc uitos.• Tod os os c ond utores e l inhas d e transmissão d e energia

el étr ic a.• Tod os os aparel hos que d epend em d e e l etr ic id ad e e d a

el etrônic a, d esd e sistemas d e seguranç a d e banc os atéequipamentos hospital ares e e l evad ores d e préd ios c omerc iais.

• Tod os os c arros, trens, aviões e barc os.

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Desse mod o, al ém d e tod os os aparel hos e l etrônic os pararem d efunc ionar, a energia e l étr ic a também d eixa d e ser fornec id a, tal vezd e forma permanente, pois as l inhas d e transmissão c ond uzem o pul soaté os transformad ores, que são d estruíd os por tensões maiores que asd e um rel âmpago típic o.

Como seria a infe l ic id ad e d e estar em uma área atingid a por umataque d e PEM? A primeira c oisa que perc eberíamos seria que asl uzes, os motores, os e l evad ores e tod os os outros d ispositivosal imentad os por e l etr ic id ad e d eixariam d e func ionar. Não fosse pel aparad a imed iata d e c arros, trens e aviões, a situaç ão não seria muitod iferente d o tipo d e apagão que muitas regiões d o mund o jávivenc iaram inúmeras vezes. Os sistemas d e transporte nãofunc ionariam, fal taria água (uma vez que são nec essárias bombasel étr ic as para l evá-l a até as torneiras) e as l uzes fluoresc entes eaparel hos d e te l evisão apresentariam um estranho bril ho mesmoquand o d esl igad os, d evid o à passagem d e e l étrons por seus gasesnobres ou fósforos. Os smartphones esquentariam, por c ausa d asbaterias, que atingiriam tensões muito maiores que aquel as para asquais foram projetad as. E, evid entemente, os c omputad oresd erreteriam.

No iníc io, d aria a impressão d e ser apenas mais um apagão — atévoc ê tentar ac essar os c anais d e c omunic aç ão d e emergênc ia parasaber o que está ac ontec end o. Esses c anais estariam tão inoperantesquanto o resto d os sistemas d e c omunic aç ão que fazem parte d e nossoc otid iano. Mesmo que não estivessem, seu rád io ou te l efone c e l u l armovid o a bateria teriam parad o d e func ionar. A únic a forma d ec omunic aç ão possível ser ia a c omunic aç ão verbal d ireta c om pessoaspróximas. A grand e maioria d as pessoas provavel mente ac end eriavel as e esperaria que as c oisas vol tassem ao “normal ” em al gumashoras, ou no máximo em um ou d ois d ias. Mas isso não ac ontec eria!No c aso d e um ataque d e PEM, o tempo d e rec uperaç ão é d e muitosmeses, ou mesmo anos. Ao final d a primeira semana, o pânic o seinstal aria. As ruas seriam tomad as por saquead ores, pol ic iais emil itares aband onariam seus postos para proteger suas famíl ias, nãohaveria ninguém para c ombater os inc ênd ios e , d e um mod o geral , asoc ied ad e l ogo vol taria a um esti l o d e vid a semel hante àquel eimaginad o após um c onflito nuc l ear, muito parec id o c om a situaç ãod esc rita no best-se l l er d e Cormac Mc Carthy A estrad a, que d epois foitransformad o em f il me.

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Ao c ontrário d e um ataque nuc l ear, porém, o PEM em si étotal mente inofensivo aos seres humanos. A menos que voc ê prec ise d eum equipamento méd ic o, c omo uma máquina d e hemod iál ise ou ummarc a-passo, sobreviverá ao ataque — pel o menos por al gum tempo.Tud o isso soa c omo o tipo d e arma que d eixaria um c ientista l ouc oou um terrorista igual mente insano c om água na boc a. E tal vez seja.Vamos examinar a questão mais d e perto para c onhec er mel hor osefeitos d e uma bomba d e PEM c omo arma d e d estruiç ão.

PEM: UM PESADELO OU APENAS UM SONHO RUIM?

U MA BOMBA DE PEM seria uma espéc ie d e arma nuc l ear d os pobres? Étentad or pensar que sim. Afinal , uma arma ind etec tável , que nãomata ninguém d iretamente mas que tem o pod er d e d evastar tod auma soc ied ad e em questão d e mil issegund os e pod e ser c onstruíd ac om tec nol ogia que remonta à d éc ad a d e 1940, pod e representar umgrand e nivel ad or para um estad o fora d a l ei ou um grupo terroristaque aposta na d errubad a d o pod erio nuc l ear d e um país c omo osEstad os Unid os. De fato, notíc ias não ofic iais sugerem que essasc arac terístic as d a “bomba P” não passaram d esperc ebid as d ac omunid ad e terrorista gl obal .

Para il ustrar o que estou d izend o, eis um possível c enárioterrorista, basead o em fatos reais, que resul taria em um ataque c oma bomba P:

• A al -Qaed a instal a em um d os seus navios c argueiros umequipamento d e l anç amento d e mísseis bal ístic os d e c urtoal c anc e.

• Um ou d ois mísseis S CUD anônimos são c omprad os d efornec ed ores c omo a Coreia d o Norte . Por quanto? Menos d ec em mil d ól ares.

• Uma arma nuc l ear d e d imensões mod estas é obtid a em um paísmarginal , c omo a Coreia d o Norte ou o Irã, ou no bemabastec id o merc ad o negro d e armas que “d esaparec eram” d oestoque nuc l ear d a antiga União Soviétic a. Outrapossibil id ad e seria usar expl osivos c onvenc ionais, nãonuc l eares, para c riar a bomba P.

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Uma vez que países c omo o Irã já d emonstraram a c apac id ad ed e l anç ar mísseis S CUD d e um navio no mar, bastam esses passospara entrar no negóc io d a bomba P. Esse c ontexto seria espec ial menteatraente para um grupo terrorista, pois d ific ul ta a id entific aç ão d oresponsável pel o ataque, d evid o à grand e quantid ad e d e mísseissemel hantes em tod o o mund o nos d ias d e hoje .

Se essa hipótese l he parec e a fantasia d e um esc ritor um tantoparanoic o, peç o que rec onsid ere. Essa foi exatamente a situaç ãod esc rita no rel atório publ ic ad o por uma c omissão d o Congressoameric ano, em 2004, que menc ionei no iníc io d este c apítul o. Ac omissão afirmou que os terroristas pod eriam paral isar por c ompl etoos Estad os Unid os c om um únic o gol pe, seguind o c om prec isão ospassos d esc ritos aqui. Bastaria l anç ar uma arma nuc l ear d e umnavio c argueiro.

Evid entemente, não é fác il c onseguir uma arma nuc l ear, emboramuitas estejam d esaparec id as e se ja provável que tenham id o pararem mãos pouc o c onfiáveis. Como vimos, no entanto, não é nec essáriod ispor d e uma arma nuc l ear para c riar um PEM. Um d ispositivoFCG ou MH D muito mais simpl es d aria c onta d o rec ad o. Mas qual éa probabil id ad e d e um ataque d e PEM, nuc l ear ou não, vir aac ontec er?

• • •

COMO FOI NOTÍCIA NO New York Times em 1983, naquel a époc a ospl anejad ores estratégic os d os Estad os Unid os e d a União Soviétic ac onsid eraram a possibil id ad e d e um ataque d e PEM c omo a sal va d eabertura d e uma guerra nuc l ear general izad a, mas isso nunc aac ontec eu, porque o princ ípio d a d efesa nuc l ear d aquel e períod o eraa c hamad a “d estruiç ão mútua assegurad a” (MAD, mutual l y assuredd estruc tion) , que servia c omo um imped imento muito efic az para umataque d e PEM. Essa d outrina d a Guerra Fria, porém, foi quasetotal mente e l iminad a d o pensamento estratégic o atual c om arec onfiguraç ão d o c enário geopol ític o.

Hoje a asc ensão d e protagonistas não estatais c omo a al -Qaed a,somad a à grand e d isponibil id ad e d e armas d e d estruiç ão em massa eà instabil id ad e d o equil íbrio d e forç as entre as grand es naç ões, fazc om que a possibil id ad e d e um ataque d e PEM seja muito mais

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d if íc il d e aval iar. O que parec e ser evid ente, c ontud o, é que essasmud anç as no c ontexto d o pod er mund ial tornam a ameaç a al go bemmais tangível .

O mund o agora possui mais Estad os c om tec nol ogia nuc l ear,al guns c ontrol ad os por regimes pol ític os instáveis, c om al ianç assuspeitas, mas sem c ond iç ões d e inic iar uma guerra nuc l ear em l argaesc al a. Por isso, o uso d e uma bomba d e PEM pod e parec er umaopç ão atraente, sobretud o se for exec utad o por al gum d osrepresentantes não ofic iais d esse tipo d e regime. Como o ataque nãoc ausará perd as humanas nem será seguid o por um bombard eionuc l ear, o país atingid o d ific il mente terá c ond iç ões d e retal iar eml arga esc al a. Na verd ad e, tal vez nem c onsiga saber quem é oagressor .

É muito d if íc i l preparar uma resposta “ad equad a” para umataque d e PEM. Como reagir a uma expl osão que oc orre a c entenasd e quil ômetros d e al tura, sem ser vista ou ouvid a, mas que d estrói,em questões d e segund os, tod a a infraestrutura nac ional ?S impl esmente não existem prec ed entes l egais que orientem aformul aç ão d e uma resposta apropriad a.

No c ômputo geral , o emprego d e uma bomba P teria uma rel aç ãoc usto-benefíc io muito atraente para o perpetrad or. Com uma ou d uasogivas seria possível d evastar um país inteiro c omo os Estad osUnid os, e haveria c hanc es mínimas d e retal iaç ão. Um ataque d ePEM também é uma opç ão atraente c omo primeiro passo d e umaguerra c onvenc ional , pois um estad o c om um pequeno número d eogivas, c omo a Coreia d o Norte ou o Irã, pod e querer primeirod iminuir a vantagem tec nol ógic a d e outras naç ões antes d e inic iar aguerra propriamente d ita.

Su Tzu-y un, um d os princ ipais anal istas mil itares d a China,fal ou a esse respeito d e maneira bastante suc inta em 2001: “ Quand oas red es d e c omputad ores d e um país são atac ad as e d estruíd as, anaç ão entra num estad o d e paral isia e a vid a d as pessoas para.”Aind a mais agourentas são as pal avras d o anal ista d e d efesairaniano Nashriy eh-e S iasi Nezami em 1999:

( . . .) Hoje em d ia, ao d esativar o al to-c omand o mil itar d e umpaís por meio d a interrupç ão d e seu sistema d e c omunic aç ão,na verd ad e estaremos c ausand o probl emas para tod os osnegóc ios d esse país. ( . . .) Se os países ind ustrial izad os não

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enc ontrarem formas d e se d efend er d e ataques e l etrônic os, e l esse d esintegrarão em pouc os anos. ( . . .) Os sol d ad os americ anosnão c onseguirão ac har c omid a, nem terão c omo d ar um tirosequer .

O que está esc rito aqui pod e parec er estranho para a maioria d aspessoas, pois l ogo surge a pergunta: “ Se um ataque d e PEM é umaameaç a tão real , por que nunc a ouvi fal ar no assunto?” No final d oano 2000, o Congresso americ ano tentou al ertar uma rel utante CasaBranc a sobre o perigo, ao formar uma Comissão d e Ameaç a d e PEMpara estud ar a verd ad eira importânc ia d o PEM c omo ameaç a àseguranç a nac ional . Tal med id a foi uma reaç ão a um informe d aComissão d e Infraestruturas Crític as ao Congresso em 1997 quec onsid erava um ataque PEM c omo um ac ontec imento tão improvávelque não merec ia atenç ão.

Bem, os tempos mud am, e sete anos mais tard e, em 2004, aComissão d e Ameaç a d e PEM d ivul gou um rel atório afirmand o queum ataque d evastad or d esse tipo não era nem improvável nem d if íc i ld e exec utar. Um membro d a c omissão era o Dr. Lowel l Wood , jámenc ionad o neste texto, que ratific ou o informe d ec l arand o que umataque d e PEM pod eria mand ar os Estad os Unid os d e vol ta a umaera pré-ind ustrial em termos d a c apac id ad e d a soc ied ad e d e proverinfraestrutura básic a à popul aç ão, c omo água e c omid a, sem fal ar d ete l efones c e l u l ares, máquinas d e l avar, futebol americ anoprofissional e te l evisão.

Antes d e enc errar a d isc ussão d os e feitos d as bombas d e PEM, val ea pena observar que al guns c ientistas d e renome afirmaram que osefeitos d e um ataque d esse tipo têm sid o superestimad os. O fenômenod o PEM nunc a foi testad o a sério porque o Tratad o d e Interd iç ãoCompl eta d e Ensaios Nuc l eares, que c omeç ou a vigorar l ogo após aoperaç ão S tarfish Prime, proíbe testes nuc l eares tanto na atmosferaquanto no espaç o sid eral . Como c onsequênc ia, os e feitos aquid esc ritos pod eriam ac abar send o mínimos.O pul so tal vez se d issipasse rapid amente por c onta d a d istânc ia oud e outros fatores d esc onhec id os, c omo a proteç ão natural d e umac ad eia d e montanhas, que red uziriam os e feitos a um pequeno abal o,em vez d e uma c atástrofe d e proporç ões c ontinentais. Esses são osmesmos tipos d e inc ógnitas que c erc avam as armas atômic as na époc ad o Projeto Manhattan. Havia teoria, mas fal tava prátic a. Depois d as

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expl osões que d estruíram Hiroshima e Nagasaki, o mistério ac abou.Esperamos que o mesmo não ac onteç a em rel aç ão ao PEM.

Tomand o c omo base o vel ho d itad o “é mel hor prevenir d o queremed iar” e c onsid erand o a bomba P uma arma d e guerra viável ,c om efeitos reais, c omo pod emos nos proteger d e sua d evastaç ão?

POR TRÁS DOS MUROS

U M PEM TEM UMA c omponente e l étr ic a e uma c omponente magnétic a,mas é a c omponente e l étr ic a que c ausa os estragos. Mesmo que o pul sod ure apenas um c entésimo d e segund o, a intensid ad e d o c ampoel étr ic o é tão grand e que tod os os equipamentos e l étr ic os expostos aopul so provavel mente serão d estruíd os. E o estrago não se l imita ael es. O efeito d o PEM também atinge a ionosfera, o que prejud ic a apropagaç ão d e ond as d e rád io em muitas faixas d e c omunic aç ões c oma d uraç ão d e até um d ia. Fel izmente, as faixas d e rád io amad or nãoseriam afetad as e pod eriam transmitir mensagens d e emergênc ia semprobl emas.

Os d anos c ontra os quais d evemos nos proteger pod em serd ivid id os em d uas c ategorias:

Danos d iretos: Destruiç ão d e c omponentes e l etrônic osexpostos d iretamente ao PEM. Nesse c aso, a proteç ão d eveser al go que impeç a o c ampo el étr ic o d e al c anç ar osc omponentes vul neráveis. Danos ind iretos: Pic os d e tensão em uma l inha d etransmissão d e e l etr ic id ad e, c ausad os pel o PEM porc ausa d e uma sobrec arga d e c orrente quand o o pul sopassa pel a red e. Nesse c aso, os fios usad os paratransmitir energia e l étr ic a e sinais te l e fônic os pod emfund ir .

Para a proteç ão c ontra d anos d o primeiro tipo, os equipamentospod em ser isol ad os em uma c aixa d e metal c onhec id a c omo “gaiol a d eFarad ay” . Um ponto vul nerável d essa estratégia é que o equipamentod eve ser total mente isol ad o d o pul so, mas, c omo a maior parte d osaparel hos possui fios para serem l igad os a uma tomad a ou a um

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mod em, não basta apenas isol á-l os; é nec essário instal ar protetoresc ontra sobrec argas, c entel had ores ou outras formas d e fil tragem nosfios que l igam o aparel ho ao mund o exterior, para imped ir que asobrec arga penetre na c aixa d e proteç ão.

Para proteç ão c ontra d anos d o segund o tipo nas l inhas d etransmissão, os equipamentos prec isam ser isol ad os e aterrad os, d emod o que o pul so e l étr ic o seja c ond uzid o para a terra e não para osaparel hos.

Infel izmente, esse proc esso d e proteger sistemas é c aro e c ompl exo.Al ém d e isol ar os equipamentos em gaiol as d e Farad ay , as janel asprec isam ser c obertas c om te l as metál ic as e as portas d evem served ad as. A boa notíc ia é que os c abos d e fibra óptic a não estãosujeitos aos e feitos d e um PEM. Assim, a substituiç ão d os fios d ec obre por c abos d e fibra óptic a c om tod a c erteza c ontribuirá para ared uç ão d a vul nerabil id ad e.

Evid entemente, também existem formas ind iretas d e proteç ãoc ontra um PEM, c omo instal ar unid ad es d e reserva em gaiol asbl ind ad as e manter os equipamentos fora d o al c anc e d e pul sos.

SINTETIZANDO

U MA VEZ QUE TODAS as evid ênc ias apontam para o PEM c omo umfenômeno f ísic o verossímil , pod emos supor, para c omeç ar, que operigo d e um ataque é real , c onforme foi d ito nas páginasprec ed entes. O que d izer a respeito d a probabil id ad e d e um PEM vira ac ontec er no futuro próximo?

Antes d e tud o, d evemos aband onar a id eia d e que um PEM possaac ontec er natural mente. Até ond e se sabe, a únic a forma d e c r iar umpul so e l etromagnétic o d e al ta intensid ad e é pel a “engenhosid ad e”humana. O pul so d eve ser pl anejad o. Ao c ontrário d e muitos eventosextremos d isc utid os neste l ivro, a natureza não tem nenhumapossibil id ad e d e nos brind ar c om um PEM ou d ois só para animar oambiente.

Dad a a fac il id ad e d e se c r iar pel o menos um d ispositivo d e PEMd e baixo nível e o fato d e que o c aos que e l e pod e gerar é bemc onhec id o, d evemos nos sentir afortunad os por não termospresenc iad o um ataque até o momento. Afinal , existem muitos grupos

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d e pessoas insatisfeitas espal had os pel o mund o, vários c om ac esso aotipo d e téc nic a e equipamentos nec essários para c onstruir no mínimoum FCG ou MH D, para não fal ar d e uma bomba nuc l ear. Tal vez omotivo seja semel hante aos argumentos c ontra o uso d e armasbiol ógic as: o e feito é general izad o. A arma d estrói ou c ontamina aprópria região que o perpetrad or d o ataque quer c ontrol ar. Umabomba d e PEM d e grand e esc al a pod e c omprometer a infraestruturad e uma soc ied ad e inteira, sem d úvid a. Mas a d estruiç ão d ainfraestrutura faz c om que os rec ursos d essa soc ied ad e se tornemind isponíveis também para o agressor .

Evid entemente, nem tod os os agressores são iguais. Há muitosind íc ios d a irrac ional id ad e d as ativid ad es terroristas para quepossamos afirmar que muitos agressores em potenc ial não têminteresse em d ominar uma soc ied ad e; querem apenas d estruí-l a. Paraesse tipo d e gente , uma bomba d e PEM seria uma exc el ente opç ão,c om c erteza muito mel hor d o que expl od ir al guns préd ios ou boates.Por ser fác il d e botar em prátic a, gerar c onsequênc ias d evastad oras,garantir o anonimato d o agressor e ter um c usto re l ativamente baixo,não é d if íc i l imaginar um ataque d e PEM no c l ima geopol ític oal tamente c arregad o e turbul ento d os d ias d e hoje .

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UMA NOVA DESORDEM MUNDIAL

O COLAPSO DA GLOBALIZAÇÃO

TORNANDO-SE GLOBAL

U M DOS LIVROS MAIS vend id os d e 2005 foi O Mund o é Pl ano, re l ato d oc ol unista pol ític o omas Fried man sobre o d esaparec imento d asfronteiras nac ionais para a c irc ul aç ão d e quase tud o — d inheiro,pessoas, mão d e obra, bens, id eias etc . No premiad o vol ume,Fried man faz uma d efesa fervorosa d o fenômeno d a gl obal izaç ão.Ironic amente, mais ou menos na mesma époc a em que o l ivro foil anç ad o, sua id eia c entral já parec ia saíd a d e uma publ ic aç ão d ac onservad ora Fl at Earth Soc iety (Soc ied ad e d a Terra Pl ana) , em vezd e ser um registro visionário d e c omo viveremos em 2020. Na d efesa(parc ial ) d e Fried man, porém, d evemos d izer que em 2005 até osfuturistas d e c arteir inha c ompraram a id eia d e uma “terra pl ana” .Como uma pequena il ustraç ão d o pensamento pred ominante naépoc a, d eparei-me c om um sil ênc io d esc onc ertante ac ompanhad o d eum bal anç ar d e c abeç as ind ic and o perpl exid ad e e tr isteza d iante d aminha aud ác ia d e d ar uma pal estra intitu l ad a “ O d ec l ínio e aqued a d a gl obal izaç ão” , em 2006, na Suíç a. Uma reaç ão bastanteestranha, pensei c om meus botões, num seminário d e futuristas! Masc hega d e anál ises d o que passou. Avanc emos al guns anos e vejamosc omo o futuro d a gl obal izaç ão é visto hoje .

As manc hetes d os jornais espec ial izad os c ontinuam a pintar umquad ro c ad a vez mais nítid o d e que o sistema financ eiro gl obal , d omod o c omo é c onstituíd o atual mente, é inc apaz d e l id ar c om osfluxos d e c apital entre fronteiras exigid os pel os mol d es Fried man d e

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gl obal izaç ão. A princ ípio, e l e parec ia se c onc entrar, sobretud o, nofluxo d e empregos d e regiões c omo os Estad os Unid os, c uja mão d eobra é c ara, para a China, o Vietnã e outros l ugares. Contud o,movimento d e empregos envol ve nec essariamente movimento d oc apital gerad o por esses empregos — d os importad ores d e vol ta aosexportad ores. Esses são os d ois pil ares d o c omérc io internac ional e d osistema financ eiro que o fluxo d e c apital d eve equil ibrar.Infel izmente, o sistema está d anif ic ad o d e maneira irremed iável .

Ind o mais fund o na forma c omo as pessoas, o d inheiro e tod o oresto c irc ul am pel o mund o, vemos o espec tro d a c ompl exid ad epairand o c omo uma mortal ha sobre c ad a passo d o proc esso. O sistemad e gl obal izaç ão d eu às empresas uma ampl a gama d e possibil id ad es(graus d e l iberd ad e) para d esenvol ver novos prod utos, fabric ar osprod utos existentes, c omerc ial izar suas merc ad orias etc . , permitind oque d ec id am ond e e quand o pratic ar essas funç ões. Assim, nummund o sem fronteiras nac ionais ou restr iç ões, as mul tinac ionaispossuem um nível d e c ompl exid ad e enorme. Por outro l ad o, o sistemac omposto pel a popul aç ão gl obal c omo um tod o, representad o pel osgovernos nac ionais, abriu mão d a l iberd ad e que tinha para regul ar oque pod eria e o que não pod eria atravessar suas fronteiras sem c usto.Em suma, as naç ões red uziram vol untariamente a um nível mínimosua c ompl exid ad e no pl ano c omerc ial . Como sempre, quand o essed esnível aumenta, aumenta também a tensão soc ial pel a taxa d ed esemprego c resc ente nos países oc id entais, d ec orrente d atransferênc ia d e quase tod os os empregos d e al ta c apac itaç ão para aÁsia. Estamos testemunhand o o resul tad o final d esse d esc ompasso d ec ompl exid ad e hoje mesmo: os Estad os Unid os tentamd esesperad amente sol uc ionar os probl emas d a fal ta d e emprego d esd ea c rise financ eira d e 2007, enquanto a Europa enfrenta uma c risefinanc eira muito mais grave, sem fal ar nos d istúrbios soc iaisresul tantes d os al tos níveis d e d esemprego, princ ipal mente nos paísesd o sul d a União Europeia, c omo Gréc ia, Itál ia, Espanha e Portugal .

Como a tensão atual entre os Estad os Unid os e a China mostrac om c l areza, os exportad ores, c omo a China, prec isam ac eitar aval orizaç ão d e sua moed a. Por outro l ad o, os importad ores, c omo osEstad os Unid os, têm d e ac eitar uma d esval orizaç ão. Evid entemente,os países exportad ores resistem c om tenac id ad e, uma vez que oproc esso d e reval orizaç ão d evol veria o equil íbrio ao fluxo d e bens ed inheiro — justamente o que e l es não querem. Num primeiro

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momento, esses fatos óbvios são tratad os pel os meios d ipl omátic os.Porém, se os d ipl omatas não resol verem a questão d entro d e umprazo ac eitável , os merc ad os financ eiros entrarão em c ena ec uid arão d o probl ema. O resul tad o não será nad a agrad ável . Al iás,este é outro bom exempl o d e um d esc ompasso d e c ompl exid ad e a sersol uc ionad o por um evento extremo, a saber, uma d esval orizaç ãogeneral izad a d o d ól ar americ ano, uma l egisl aç ão protec ionista euma série d e outras med id as que só ac el erarão o proc esso d e umaprofund a d epressão d ef l ac ionária d a ec onomia mund ial .

Numa c uriosa justaposiç ão d e visões d e mund o e oportunid ad e, noano d e 2005 foi publ ic ad o também e Col l apse of Gl obal ism [Oc ol apso d o gl obal ismo] , uma obra pol êmic a d o erud ito c anad enseJohn Ral ston Saul . Embora tenha rec ebid o bem menos atenç ão d o quea apol ogia d e Fried man aos gl obal istas, o l ivro é um guia muito maisprec iso em rel aç ão ao que estamos vend o hoje e que c ontinuaremos aver nas próximas d éc ad as. Em essênc ia, a obra d e Saul propõe apergunta id entific ad a por Mic hael Maiel l o, autor d e uma d e suasresenhas: “As d ec isões pol ític as d evem ser tomad as em d eferênc ia àec onomia e aos merc ad os, ou pod emos usar nossas instituiç õespol ític as para nos proteger d os e feitos mais pesad os que os merc ad ospod em apresentar?” Seguid ores d o ponto d e vista d e Fried manafirmam que o pod er d os governos será ofusc ad o pel o d os merc ad os.Saul d iz o c ontrário. De ac ord o c om a c artil ha d e gl obal istas c omoAl an Greenspan, ex-presid ente d o Banc o Central americ ano, osmerc ad os são autorregul ad ores. Mas ac ontec imentos c omo a c rise d e2007 mostram d efinitivamente que não é bem assim. Após mais d etrês d éc ad as d e gl obal izaç ão, a promessa d e d istr ibuiç ão d e r iqueza ered uç ão d a pobreza não foi c umprid a. Conforme observad o porPranab Bard han num artigo publ ic ad o na revista S c ientif icAmeric an em 2006: “ Como a era mod erna d e gl obal izaç ão c oinc id iuc om uma red uç ão c ontínua na proporç ão d e pessoas que vivem emestad o d e extrema pobreza, ser ia possível c onc l uir que e l a, d e ummod o geral , não está fazend o c om que as pessoas fiquem mais pobres.No entanto, não se pod e atribuir à gl obal izaç ão o c réd ito pel ad iminuiç ão d a pobreza, que em muitos c asos prec ed eu al iberal izaç ão d o c omérc io.” Por que d everíamos imaginar que essessupostos benefíc ios virão al gum d ia d a satisfaç ão d e nec essid ad es equestões l oc ais? No final d as c ontas, a mensagem mais importante d ointel igente argumento d e Saul é que a ec onomia gl obal é uma c riaç ão

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d o homem, c omo parte d a soc ied ad e humana. Não d everia e l a, então,servir a nossos interesses, em vez d e nos obrigar a servir aos seus?

O rec uo para a regional izaç ão tem muitas fac es, d epend end o d eond e se enc ontre no mund o. Vejamos, portanto, al guns exempl osc onc retos para retific ar o princ ípio básic o d e que uma overd ose d ec ompl exid ad e pod e ser ruim para nosso bem-estar ec onômic o eespiritual .

BORBOLETA OU LAGARTA?

A RENÚNCIA DE M IKHAIL GORBACHEV à presid ênc ia d a UR S S no Natal d e1991 foi um momento d e esperanç a para os l iberais russos, que viramna d issol uç ão d a União Soviétic a uma oportunid ad e para que o povorusso passasse a partic ipar d a vid a pol ític a, soc ial e ec onômic a d omund o ind ustrial izad o oc id ental . Uma popul aç ão que havia vivid o,amad o e trabal had o em um nível absurd amente baixo d ec ompl exid ad e, c om pouquíssima l iberd ad e para viajar ao exterior,esc ol her l íd eres ou até mesmo c omprar bens d e c onsumo que nãofossem os d e nec essid ad e básic a, agora tinha o pod er d e fazer tud oisso e mais. Infe l izmente, o d estino d ec retou que Gorbac hevtransferir ia o pod er ao primeiro-ministro Boris Yel tsin , um beberrãoinc urável que afund ou a Fed eraç ão Russa rec onstituíd a no c aospol ític o e ec onômic o d urante a maior parte d os oito anos d e seumand ato. Na époc a em que o próprio Yel tsin passou o bastão para oex-agente d a KGB Vl ad imir Putin, no final d e 1999, o inc ipientemovimento por uma soc ied ad e mais l ivre e mais c ompl exa já evol uírapara um val e-tud o. Os c omparsas d a panel inha d e Yel tsin tornaram-se os “ol igarc as” d e hoje , “ l impand o” os ativos d o Estad o d e formaefic iente e c ol oc and o-os nas mãos d e al guns pouc os ind ivíd uos ( e l esmesmos) .

Desd e que assumiu o pod er nas e l eiç ões d e 2000, Putin c oibiuqual quer id eia d e reforma pol ític a, e l eiç ões d iretas, d ebate públ ic oou c oisa parec id a. Tod o aumento d e c ompl exid ad e que os russoshaviam ad quirid o no c enário pol ític o regred iu para o nível d a UR S Se al i permanec e até hoje . Evid entemente, um aumento no nível d ec ompl exid ad e em outras áreas d a vid a, c omo viagens ao exterior,imprensa parc ial mente l ivre e c onsumismo, foi o preç o pago por

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Putin para red uzir os graus d e l iberd ad e públ ic a no âmbito pol ític o.Al guns novos ol igarc as, entre e l es Mikhail Khod orkovsky , o homemmais r ic o d a Rússia na époc a, não entend eram muito bem aestratégia, e Putin tomou med id as d uras para expl ic á-l a — mand ouKhod orkovsky para um c ampo d e prisioneiros em 2004, al egand osonegaç ão d e impostos (o que l embra a prisão d e Al Capone nosEstad os Unid os em c irc unstânc ias muitos parec id as, no ano d e 1931) .

Um grupo pequeno, mas influente, d e l iberais russos manteve aesperanç a d urante o interregno d e Dmitri Med ved ev, que assumiu opod er em 2008, quand o Putin se tornou inel egível para um terc eiromand ato. Em setembro d e 2011, uma mul her d esse grupo d e l iberaisobstinad os, Ly ubov Vol kova, d espertou na manhã seguinte após Putinter se “ ind ic ad o” a uma futura c and id atura à presid ênc ia e d issenuma entrevista ao New York Times que aquel a reviravol ta l embravauma história parec id a c om a que c ontei na Parte I sobre o e feitoborbol eta (uma borbol eta batend o as asas numa parte d o mund od esenc ad eia uma série d e eventos que mod ific am total mente o mund oem al gum outro l ugar) . Eis as pal avras d e Vol kova: “ Um d ia —tal vez não há vinte anos, mas há d ezessete anos — a borbol eta foiesmagad a, e a c onsc iênc ia d os c id ad ãos russos tomou um c aminhod iferente .” A vol ta d e Putin ao c argo d e presid ente c ertamenteel iminará qual quer ganho d e c ompl exid ad e no âmbito pol ític o quepossa ter ac ontec id o no mand ato d e Med ved ev, fazend o c om que onível d e c ompl exid ad e pol ític a d a popul aç ão russa permaneç a baixopor muitos anos. Parec e, então, que a l iberd ad e d e expressão naRússia nunc a foi uma borbol eta, ávid a por bater as asas e voar, masapenas uma humil d e l agarta. (Os protestos em massa na Rússia nofinal d e 2011 parec em c riar al guma esperanç a para a talborbol eta.)

Essa história d o tr iste d rama pol ític o d a Rússia i l ustra d oisimportantes princ ípios. O primeiro é que o nível d e c ompl exid ad e d euma soc ied ad e pod e variar em d iferentes áreas d a vid a. Aqui vemos ac ompl exid ad e pol ític a aumentand o temporariamente, para d epois serl ogo suprimid a, no momento em que o aumento se tornou perturbad ord emais para a ord em soc ial d urante o períod o Yel tsin . As tentativasd e mod ernizar o país baseavam-se numa c renç a quase c ega no pod erd o l ivre merc ad o. A l iberal izaç ão l evou à privatizaç ão d e muitossetores estatais, o que por sua vez provoc ou agitaç ão soc ial , fal ênc iad e empresas, uma taxa al tíssima d e d esemprego, sequestros,

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prostituiç ão e o surgimento d e grupos d e c r iminosos semel hantes aosd a máfia americ ana nos frenétic os anos 1920. Ao mesmo tempo,porém, o nível d e c ompl exid ad e em outros c ampos d a vid a, sobretud oo d e viagens ao exterior e bens d e c onsumo, aumentouc onsid eravel mente. Val e a pena guard ar esse exempl o, pois e l e mostraque os governos artic ul am esc ol has c onflitivas entre d iferentes tiposd e c ompl exid ad e para manter seu pod erio pol ític o. A situaç ão atuald a China é outro bom exempl o d esse tipo d e esc ol ha c onflitiva d ec ompl exid ad e.

A segund a grand e id eia, c l aro, é o e feito borbol eta c itad o porLy ubov Vol kova. Houve um momento em que d e fato parec ia que umaborbol eta pol ític a c omeç ava a sair d e seu c asul o, batend o as asaspara l evar a Rússia a um c aminho total mente novo d e l iberd ad epol ític a e ec onômic a. Mas não foi o c aso.

O DECLÍNIO E A QUEDA DA UNIÃO EUROPEIA

OUTRA RECONFIGURAÇÃO, MUITO DIFERENTE em seus d etal hes d aquel a queoc orreu c om a antiga União Soviétic a, mas assustad oramentesemel hante sob outros aspec tos, está ac ontec end o na Europa nesteexato momento. Tod a a estrutura d a União Europeia está à beira d eum c ol apso, não por c onta d e agitaç ões pol ític as e soc iais, mas pel oque se apresenta c omo c ausas puramente ec onômic as e financ eiras.Uma vez que o d inheiro tem importânc ia em tod as as áreas d a vid a,prec isamos entend er os possíveis d esd obramentos d essa c r ise europeiapara ter uma id eia d e c omo a estrutura geopol ític a d o mund o pod eráser d entro d e al guns anos.

Anal istas pol ític os, c ol unistas e espec ial istas em finanç as, al ém d emuitos outros sonhad ores, pl anejad ores e os c hamad os “homens d enegóc ios” , apontam uma série d e motivos para expl ic ar o atol eirofinanc eiro em que a União Europeia se enc ontra. El es variam d esd ea preguiç a d os gregos, a ganânc ia d os banqueiros, a vorac id ad e d asempreiteiras até a insensibil id ad e d os tec noc ratas bel gas e airresponsabil id ad e d os pol ític os d e tod os os matizes id eol ógic os. Masessas “expl ic aç ões” parec em c oisa d e méd ic os que tratam apenas d ossintomas, não d as c ausas d as d oenç as. No c aso d a c rise d a UE, e l assão muito mais profund as d o que meros c apric hos d e um grupo

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al eatório d e ind ivíd uos, bem-intenc ionad os até , mas essenc ial mented esorientad os. A verd ad eira c ausa c ausarum repousa no fato d e queum d esnível d e c ompl exid ad e c ad a vez maior entre sistemas humanosem interaç ão é quase inevitavel mente trazid o d e vol ta à real id ad epor meio d e uma “terapia d e c hoque” . Como enfatizei d iversas vezes,essa terapia d e c hoque c ostuma assumir a forma d e eventos extremos.Veja c omo aquel es princ ípios básic os se enquad ram no c ontexto d ac rise europeia atual .

A formaç ão d a União Europeia pod e ser vista c omo um tipo d eac ontec imento “agregad or” , “gl obal izante” . De fato, o Tratad o d eRoma d e 1957 oc orreu numa époc a em que os governos europeussentiam c ad a vez mais a premênc ia d e se unir num únic o c orpopol ític o. A d espeito d e al guns c ontratempos na aprovaç ão d ac onstituiç ão em 2005-2008, a história d a União Europeia sempre foid e avanç os e c resc imentos… até agora! Forç as d e “separaç ão” e“regional izaç ão” c omeç aram a se d estac ar, manifestand o-se narel utânc ia d as naç ões mais prósperas em sustentar as finanç as d osmembros mais frac os d o grupo e em d isc ursos a favor d a vol ta d osc ontrol es d e fronteira para c onter o fluxo d e refugiad os ec onômic osind esejad os vind os d os Bál c ãs, d a Turquia e d e outros países.

Como já d issemos, quand o as organizaç ões, sobretud o estad os ouimpérios, se d eparam c om probl emas, a forma c onsagrad a d e resol vê-l os é ad ic ionar mais uma c amad a d e c ompl exid ad e à organizaç ão.Ou seja, basic amente pel o famoso proc esso d e “ buroc ratizaç ão” .Quanto mais probl emas, maior é a buroc rac ia, até o ponto em quetod os os rec ursos d a organizaç ão são c onsumid os apenas para mantersua estrutura c orrente . Quand o surge um novo probl ema, aorganizaç ão d espenc a d o abismo d a c ompl exid ad e e simpl esmenteentra em c ol apso.

Muitas vezes essa armad il ha aparec e quand o d ois (ou mais)sistemas estão em interaç ão. O d esnível entre os d ois torna-se grand ed emais para se sustentar, e o evento X que se segue é a forma d eresol vê-l o. Vimos esse proc esso antes quand o fal amos d o c ol apso d osregimes autoritários d a Tunísia e d o Egito, ambos impul sionad os porum rápid o c resc imento d a c ompl exid ad e d o sistema d e menorc ompl exid ad e — o c onjunto d e c id ad ãos d e c ad a país — via red essoc iais e c anais d e c omunic aç ão mod ernos. Os governos não tiveramc omo suprimir nem ac ompanhar. O resul tad o final foi, c omo tod ossabem, o evento extremo d a mud anç a d e regime, d e forma rápid a e

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viol enta.Para il ustrar esse princ ípio no c ontexto d a UE, pense nos países

d a zona d o euro c omo um sistema em interaç ão c om o restante d aec onomia gl obal . Se não fizessem parte d esse grupo, e l es ter iam àd isposiç ão muitas opç ões para l id ar c om uma époc a d e mud anç asec onômic as. Pod eriam, por exempl o, c ontrol ar a oferta d e suaprópria moed a, aumentar ou d iminuir taxas d e juros, impor tarifasal fand egárias ou c oisas parec id as. Em suma, seu nível d ec ompl exid ad e seria al to, em d ec orrênc ia d os d iferentes tipos d emed id as que pod eriam ser tomad as.

No entanto, os membros d a zona d o euro são severamentel imitad os, pois nenhum país pod e agir d e mod o unil ateral . Tod aaç ão prec isa respeitar os d itames d o Banc o Central Europeu (BCE) .Dessa forma, surge um d esnível entre um sistema d e al tac ompl exid ad e (o mund o) e um sistema d e baixa c ompl exid ad e (osestad os d a zona d o euro) . Os empréstimos d os países mais r ic os aospaíses end ivid ad os e outras inic iativas d o BCE no sentid o d e fec haressa l ac una ac abarão fatal mente c aind o na c ategoria d o “apl ic ard inheiro bom no d inheiro ruim” . Em úl tima instânc ia, d everápreval ec er a sol uç ão-pad rão d a natureza humana d iante d e umprobl ema d esse tipo, que nesse c aso será o evento extremo d ad erroc ad a d o euro e possivel mente d a própria União Europeia.

Será que o d esnível d e c ompl exid ad e pod eria ser sol uc ionad o semum c ol apso d o euro? Tal vez , mas somente se a UE tivesse tomad o umamed id a impopul ar d o ponto d e vista pol ític o, mas nec essária, l ogo noiníc io d a c rise financ eira, em vez d e tentar resol ver c om d inheiro umprobl ema que o d inheiro não resol ve. Por exempl o, impl ementarproc ed imentos regul atórios muito mais r igorosos para aval iar asfinanç as d e c and id atos à UE ou até mesmo d esac el erar tod o oproc esso d e ad missão d e novos membros teria sid o d ol oroso numprimeiro momento, mas esse tipo d e aç ão c om c erteza teria ajud ad o aevitar a c r ise atual . A pol ític a d e “quanto mais rápid o mel hor” naad missão d e novos países foi c ol oc ad a em prátic a na tentativa d eampl iar a UE o mais rápid o possível , supostamente porque assim el aseria “grand e d emais para frac assar” . Que ironia!

Mesmo a pol ític a d e expansão ac el erad a teria d ad o c erto se osgovernos tivessem rec onhec id o que pol ític as financ eiras genéric as,apesar d e parec erem efic azes na teoria, quase sempre frac assam naprátic a. Diferentes c ul turas exigem d iferentes abord agens em rel aç ão

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a quase tud o. Imaginar que uma pol ític a financ eira que func ionanum país c omo a Al emanha pod eria/d everia func ionar igual mentebem na Gréc ia ou em Portugal é f l ertar c om o d esastre .

Evid entemente, agora é tard e d emais para aç ões d esse tipo. Ahistória está c heia d e exempl os d e id eol ogias que se c hoc aram c ontrao muro d a real id ad e. A grand e questão d o momento é se a própriaUE terminará nesse c emitério d e experiênc ias d e engenhariasoc ial — uma tentativa que prec isava ser feita, mas que agoraprovavel mente é c onsid erad a um frac asso total . Sejamos maisespec íf ic os em rel aç ão ao futuro c aso a zona d o euro se d esfaç a.

Em tempos c omo os atuais, muitos espec ial istas afirmam que ofuturo está nas mãos d os países mais fortes, c omo a Al emanha e , numgrau menor, a Franç a. A forma mais provável d e d esmantel amento d azona d o euro seria a Al emanha c hegar à c onc l usão d e que o c ol apso afavorec e . Ou seja, a questão fund amental é se a Al emanha ganhariamais permanec end o na zona d o euro e , em essênc ia, financ iand o-a ouse seria d e seu interesse sair d el a. Existem pel o menos três hipótesesprinc ipais para o c aso d e a Al emanha d ec id ir pel a saíd a, c ad a umac onstituind o um evento X espec íf ic o.

Col apso total : Nesse c aso, a zona d o euro vol taria a ser oque era antes d a introd uç ão d a moed a. Para isso, o BCEteria d e d evol ver ouro aos países membros na proporç ãod e sua c ontribuiç ão inic ial . As d iversas moed asnac ionais anteriores — o marc o al emão, a l ira, o franc o,o marc o finl and ês, entre outras — vol tariam a c irc ul ar,c om o val or d a époc a d a introd uç ão d o euro.

Nesse c enário, as reservas em d ól ares americ anossubstituiriam as reservas d e euro. As pessoas perd eriam ac onfianç a em quase tod as as moed as e proc urariamd esesperad amente ativos fortes, c omo o ouro. Pod emosafirmar que os merc ad os d e c âmbio se tornariamc aótic os, provavel mente c om um forte movimento inic ialem d ireç ão ao d ól ar americ ano — mas só até que apoeira baixasse e as empresas vol tassem a al gumanormal id ad e.Col apso parc ial : O mais provável é que a zona d o euronão entre em c ol apso total , pel o menos no iníc io, mas queenc ol ha, expul sand o seus integrantes mais frac os, d o su l

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d a Europa. Esses países — Espanha, Gréc ia, Portugal ,Itál ia — teriam d e vol tar a suas antigas moed as, o queac ontec eria junto c om uma imposiç ão d e c ontrol ec ambial para evitar fuga d e c apital para o euro. Osexc l uíd os sofreriam anos d e pobreza, mas tal vez nad apior d o que se permanec essem ond e estavam. O “novoeuro” , d e uma hora para outra, se tornaria a moed a d omomento, na med id a em que o end ivid amento d os paísesremanesc entes d iminuiria d rastic amente.Retirad a unil ateral : Esta é uma situaç ão extrema, emque o membro mais forte d a zona d o euro c hega àc onc l usão d e que não d á mais e que a mel hor opç ão éseguir sozinho. Se isso ac ontec esse , o euro sed esval orizaria, enquanto o d ól ar americ anopermanec eria c omo a moed a d e reserva gl obal — masaind a em l enta qued a em rel aç ão a outras moed asimportantes c omo o iene japonês e o y uan c hinês.

Os visionários ad oram prever situaç ões c omo essas abrind oc aminho para uma nova ord em mund ial . Devo ad mitir uma qued apor esse tipo d e “fil osofia d e gaveta” — nem tanto para prever o quereal mente ac ontec erá, mas para d el inear as possibil id ad es d o quetal vez oc orra, d esd e situaç ões pl ausíveis ( eventos não extremos) atéas mais espec ul ativas (muitos d os mais extremos d os eventos X) . Deum mod o geral , imaginar hipóteses é uma forma d e foc ar tanto nasl imitaç ões à mod ific aç ão d o mund o quanto nas oportunid ad es d etransformá-l o em al go mel hor, não apenas em al go que d evemossimpl esmente suportar. A propósito, quero c ontar a história d e umexerc íc io que fiz há mais d e uma d éc ad a, mas que aind a guard agrand es l iç ões se quisermos saber c omo o mund o será d aqui a uma oud uas d éc ad as.

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FUI CONVIDADO PARA IR a Washington, D.C., na virad a d o mil ênio, parapartic ipar d e uma inic iativa patroc inad a pel o governo americ anoc hamad a d e Projeto Proteus. O objetivo era expl orar d iversas evariad as hipóteses re l ativas ao mund o em 2020 e aval iar as ameaç as

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d e c ad a uma d essas possibil id ad es aos interesses americ anos,d efinind o formas d e mitigá-l as. O grupo Proteus c onsistia em c erc ad e sessenta espec ial istas d e um número atord oante d e d isc ipl inas,d esd e a f ísic a, a engenharia e a ec onomia até a l iteratura d e fic ç ãoc ientífic a e a poesia. O que nos interessa não é o exerc íc io em si , masal gumas situaç ões apresentad as. (Tom omas, d a Del oitteConsul ting, e Mic hael Loesc her, d o Copernic us Institute , foram osc riad ores d essas visões d o mund o d e 2020. Agrad eç o-l hes os c onsel hose a permissão para publ ic ar al gumas d el as aqui.)

Dos c inc o mund os d e 2020 apresentad os ao grupo, os três queparec em mais apropriad os para nosso propósito neste l ivro são:Xangril á d os mil itantes, O inimigo interno e A retirad a d os ianques.A situaç ão em c ad a uma d as hipóteses foi d etal had a, em páginas emais páginas d e d ad os e re l atos fic tíc ios. Aqui vai apenas um resumod e c ad a uma d el as.

Xangril á d os mil itantes: Este é um mund o d eac ontec imentos inesperad os e vil ões esquivos. O pl aneta,em geral , e os Estad os Unid os, em partic ul ar, estão naterc eira d éc ad a d e uma ec onomia próspera, movid a pel ainformaç ão, mas também c ontinuam no c aminho d ac ompl exid ad e, c om novas estruturas d e influênc ia nogl obo. Os c ál c ul os newtonianos d ipl omátic os e mil itaresd os ú l timos quatroc entos anos, d esd e o fim d a Id ad eMéd ia e o surgimento d os Estad os, parec em estar d and ol ugar a outra era. O c id ad ão c omum c onseguiusobreviver a um séc ul o c om d uzentos mil hões d e mortesem guerras, resistiu a estonteantes mud anç as tec nol ógic ase ouve c ompassivamente o gemid o d a Terra sob o pesopopul ac ional e uma ameaç a d e extinç ão. Quase tod os osanimais d a Áfric a, muitos peixes e grand e parte d asáreas naturais d o pl aneta d esaparec eram. Nesse mund oentra em c ena a nova e preoc upante Al ianç a d aConstel aç ão d o Sul : Áfric a d o Sul , Índ ia, Ind onésia,China e outros párias d a fil osofia soc ial oc id ental d el iberd ad e ind ivid ual e d e d ireitos humanos,func ionand o, l egitimamente, c omo um bl oc o d e Estad os-naç ões e , i l egitimamente, c omo c artéis c r iminosos. Suaprinc ipal estratégia é manter o mund o à beira d o c aos e ,

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a partir d esse c aos, c ol her l uc ros. A al ianç a está noespaç o, no mar, na míd ia e nas instituiç ões financ eiras,infil trand o-se no c oraç ão e na mente d as pessoas c om oobjetivo d e ac abar c om a noç ão d e l iberd ad e pessoal .Enquanto isso, os Estad os Unid os, seus quatro primos d el íngua ingl esa e seus al iad os d o Pac ífic o, c omo o Japão euma rec ém-unific ad a Coreia, se unem para resistir aoimpério d o mal .O inimigo interno: Este é um mund o em que os Estad osUnid os, d e forma l enta, inesperad a e bastanted ramátic a, perd eram o rumo. Como tantas naç ões noauge d e seu pod er, d esac ord os, tensões étnic as e pol ític asunid irec ionais esfarraparam a mal ha soc ial . A soc ied ad eestá fraturad a e fragmentad a — d o ponto d e vistapol ític o, soc ial e c ul tural . Conflitos entre geraç ões,somad os a uma taxa rec ord e d e d esemprego, d ivid iramigrejas, viz inhanç as e famíl ias inteiras. Tensões rac iaisestão a ponto d e expl od ir nos c entros urbanos e nossubúrbios, e o fantasma d a inc erteza paira sobre tod as asativid ad es d o d ia a d ia. Surtos d e viol ênc ia pod emestourar a qual quer momento, nos l ugares maisimprováveis. Não há para ond e fugir. Nessasc irc unstânc ias soc iais, o c apital e os negóc ios estãosaind o d o país. A ec onomia nac ional se estagna em níveisquase insustentáveis. A agric ul tura, os sistemas d e saúd ee farmac êutic o, as pequenas l ojas d e varejo, os serviç osd e seguranç a pessoal e o setor d e c onstruç ão são aspouc as áreas que se sal vam nesse abismo ec onômic o.Coal izões governamentais l utam para enc ontrar umaresposta ofic ial para essa c r ise aparentemente sem fim.Tod as as outras tarefas e obrigaç ões nac ionais fic am emsegund o pl ano. O país se vol ta para d entro e enfrenta omomento mais c r ític o d e seus 250 anos d e história.A retirad a d os ianques: Um mund o em que quase nad a éc l aro, exc eto que oc orreram mud anç as rad ic ais. Quemestá ad ministrand o as c oisas? Por que d eterminad asd ec isões estão send o tomad as? Que metas estão send operseguid as? Quem são os amigos e quem são os inimigos?Os Estad os Unid os se afastaram d o mund o, se retiraram

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após uma série d e terríveis tropeç os na pol ític a externa ed e uma l onga e profund a rec essão. O mund o é fortementeinfluenc iad o pel a l embranç a d o terrorismo, d as guerrasl oc ais e d a instabil id ad e geral que se seguiu aoisol ac ionismo americ ano. Em seu rastro, vemos ummund o c omposto pel os atores trad ic ionais (naç ões,organizaç ões internac ionais, organizaç ões nãogovernamentais) e por atores não trad ic ionais muitopod erosos (al ianç as c orporativas gl obais, gruposc riminosos, unid ad es merc enárias) . Esses atorestrabal ham em c onjunto em busc a d e pod er e influênc ia e ,ao mesmo tempo, c ompetem por posiç ão e c ontrol e , numc onstante red emoinho pol ític o e ec onômic o,d esc onc ertante para quase tod os os envol vid os. Nessemund o, c onc eitos históric os d e l eal d ad e são questionad ose as regras d o jogo são nebul osas. O c omportamentoprevisível torna-se uma exc epc ional id ad e, em vez d e sera regra.

Os c enários d o Proteus mostram c omo os Estad os Unid os pod emd ec air ou mesmo sair d e c ena enquanto potênc ia mund ial . Éinteressante ver c omo esses c aminhos rumo à ignomínia c orrespond emàs suposiç ões l evantad as por outro famoso visionário.

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PETER S CHWARTZ É PROVAVELMENTE o futurol ogista mais c onhec id o d omund o. Ex-d iretor d o d epartamento d e pl anejamento d a Shel lhol and esa, e l e fund ou a Gl obal Business Network (GBN) al guns anosatrás a fim d e expl orar d iversas hipóteses d e futuro para os maisvariad os c l ientes, d esd e o Departamento d e Defesa americ ano até od iretor d e c inema Steven Spiel berg, em sua prod uç ão MinorityR eport. Em agosto d e 2009, Sc hwartz foi proc urad o pel a revistaS l ate para c riar visões al ternativas d e c omo os Estad os Unid ospod eriam d eixar d e ser o c entro geopol ític o d o mund o nos próximosc em anos. Seu grupo apresentou quatro possibil id ad es. Eis umpequeno resumo d esse mapa para o c ol apso d esenvol vid o pel a GBN.

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Col apso: Após o frac asso d as reaç ões ofic iais a uma séried e c atástrofes c omo o furac ão Katrina, o estad o d e ânimod a popul aç ão americ ana é afetad o d e forma negativa. Aspessoas c omeç am a ver o governo c omo seu maior inimigo.Essa mud anç a na psic ol ogia c ol etiva gera umd esc ompasso d e c ompl exid ad e entre o governo e osc id ad ãos, situaç ão muito parec id a c om a que ac ontec eurec entemente nos países árabes d o norte d a Áfric a,resul tand o na impl osão d os Estad os Unid os d evid o ad ivisões internas insustentáveis.Separaç ão amigável : Esta hipótese envol ve umd ownsiz ing, em que os Estad os Unid os rac ham d evid oapenas à inc apac id ad e d e arc ar c om o c usto d e umgrand e império. Sc hwartz vê essa d issol uç ão c omo al goanál ogo ao que ac ontec eu c om a União Soviétic a. Umavariaç ão seria um grand e estad o, c omo a Cal ifórnia ou oTexas, ou uma região, c omo a Costa Oeste , d esenvol verrec ursos sufic ientes para sair ind ivid ual mente d a união.A GBN d iz que isso pod e ac ontec er c om a junç ão d osestad os d e esquerd a em uma “Al ianç a Democ rátic a” ,enquanto os estad os d o l ad o oposto formariam uma“ Naç ão R epubl ic ana” .Governanç a gl obal : Neste mund o, os Estad os Unid osperd em grad ual mente sua importânc ia geopol ític aenquanto são assimil ad os por uma c omunid ad e gl obalmaior. Em suma, o mund o se une para formar asverd ad eiras “ Naç ões Unid as” , e tod os os Estad os-naç ões,inc l usive os Estad os Unid os, c ed em grand e parte d e suaautorid ad e a esse governo gl obal .Conquista gl obal : Este é o c aminho mais pesad o, em quenão só os Estad os Unid os, mas também o resto d o mund o,são subjugad os a uma d itad ura gl obal . Uma espéc ie d e“superMao” , c omo Sc hwartz c hama o d itad or, assume opod er à forç a, provavel mente util izand o armas basead asno espaç o, e bl oqueia o resto d o mund o.

As três visões d o mund o d e 2020 c onc ebid as pel o Projeto Proteus,assim c omo as possibil id ad es d a GBN, mostram d e que maneira ashipóteses pod em servir para prever o futuro. Como vimos em

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ac ontec imentos rec entes, c ad a uma c ontém el ementos d o mund o reald e hoje em d ia e nos d á uma id eia d o provável impac to d e um eventoX d aqui a uma d éc ad a. Tanto os organizad ores d o Proteus quanto ogrupo d e Sc hwartz l embram que as hipóteses não d evem serc onsid erad as c omo previsões d o futuro, mas exerc íc ios d e rac ioc íniopara estimul ar o d ebate sobre os d iversos fatores que pod eriamc ul minar em ac ontec imentos c omo esses. Ou seja, temos d e pegar umpouc o d e c ad a situaç ão para c hegar a um mod el o que sugerir ia umamaneira d e apostar hoje no mund o mais provável d e amanhã.

Com esses exempl os d a Rússia, d a UE e d o Projeto Proteus,c onc l uirei esta parte fal and o rapid amente d os aspec tos estratégic osd os c ic l os históric os e d os d esníveis d e c ompl exid ad e, al ém d e c omo osind ivíd uos pod em superar as tempestad es ec onômic as, pol ític as esoc iais que estão se formand o no horizonte.

Tod as as situaç ões sugerid as pel o Projeto Proteus preveem umc ol apso soc ial ac ontec end o c omo um l ento d esc arril amento, umproc esso grad ual , quase imperc eptível , por meio d o qual um gruposoc ial ( soc ied ad e, império, c ivil izaç ão) passa tranquil amente obastão d e pod er e influênc ia gl obal a seu suc essor. Evid entemente,essa “passagem” não é tão tranquil a quanto d esc rito. O bastão d oantigo regime é arranc ad o à forç a pel o novo pod er. Não obstante, asteorias c íc l ic as d os proc essos históric os d efend id as por pensad ores d oséc ul o XX, c omo Oswal d Spengl er, Arnol d Toy nbee e Paul Kenned y ,c onsid eram que essa suc essão se d á d e forma pac ífic a. Basic amente, aopinião geral é a d e que a história tem um ritmo e que esse r itmoenvol ve mud anç as grad uais, sem grand es d esc ontinuid ad es. Há pouc otempo, Nial l Ferguson, historiad or d e Harvard e pensad or soc ial ,d efend eu um quad ro bem d iferente em rel aç ão a essa transiç ão. Umbreve re l ato d as id eias d e Ferguson é um bom ponto d e partid a paranossa c onc l usão.

AOS TRANCOS E BARRANCOS

ALGUNS ANOS ATRAS, OS biól ogos S tephen J. Goul d e Nil s El d red geapresentaram uma teoria d enominad a “equil íbrio pontuad o” .Segund o e l es, os proc essos evol utivos não ac ontec em d e forma grad uale l enta, mas aos sol avanc os. Durante l ongos períod os d e tempo

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evol uc ionário ( c entenas d e mil hares ou até mesmo mil hões d e anos) ,não ac ontec e quase nad a. Aí, c hega um momento c omo a expl osãoc ambriana, há 650 mil hões d e anos, quand o oc orrem inúmeras ed rástic as transformaç ões. Nesse c urto períod o d e 510 mil hões d eanos, surgiram os princ ipais grupos d e animais que c onhec emos hoje ,animais c om c arapaç as e esquel etos externos. Depois d isso, as c oisasse assentaram d e novo, numa espéc ie d e l onga “ hibernaç ão” .

As visões d e Nial l Ferguson rel ac ionad as às d inâmic as d osproc essos históric os l embram muito a teoria d e Goul d -El d red ge paraproc essos biol ógic os. E por que não? Afinal , a própria história é umproc esso soc ial que envol ve mud anç as evol utivas. Portanto, não é d ese estranhar que os mec anismos biol ógic os d e mud anç a e os históric os( sejam el es quais forem) apresentem grand es semel hanç as.

O que Ferguson c onsid era mud anç a históric a é um proc esso queal egrará o c oraç ão d e qual quer teóric o d e sistemas. Num artigo d aForeign Affairs em 2010, Ferguson expl ic ou sua visão bastantepec ul iar d e c omo a história se d esenvol ve:

As grand es potênc ias são sistemas c ompl exos, c ompostos por umgrand e número d e c omponentes interativos assimetric amenteorganizad os, (…) que func ionam entre a ord em e a d esord em— à “ beira d o c aos” . (…) Tais sistemas pod em operar c omestabil id ad e d urante al gum tempo, parec end o se enc ontrar emequil íbrio, mas na verd ad e estão em c onstante ad aptaç ão.Mesmo assim, c hega um momento em que os sistemas c ompl exosentram em estad o “c rític o” . Um pequeno ac ontec imento pod eativar uma “transiç ão d e fase” , e o que era equil íbrio benignovira c rise (…).

Pois é . A teoria d o equil íbrio pontuad o d e Goul d -El d red ge see l evou (ou se rebaixou!) ao d omínio d os proc essos soc iais.

Em seu argumento, Ferguson afirma que qual quer unid ad epol ític a d e grand e porte é um sistema c ompl exo, se ja uma d itad uraou uma d emoc rac ia. Os impérios, em partic ul ar, d emonstram atend ênc ia c arac terístic a d e um sistema c ompl exo c apaz d e migrard epressa d e um estad o d e estabil id ad e para a instabil id ad e. Asteorias c íc l ic as d a história não têm espaç o para taisd esc ontinuid ad es ac íc l ic as, o que tal vez não seja surpreend ente,

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visto que a teoria d os sistemas c ompl exos é al go re l ativamente novono panteão d os mod el os, tend o surgid o c om forç a total há apenaspouc as d éc ad as.

Ferguson respal d a seu argumento c om inúmeros exempl oshistóric os d e impérios que d esmoronaram quase d a noite para o d ia,e não d e forma grad ual e l enta. Val e a pena l embrar o c aso c l ássic od o Império Romano, que tombou em apenas d uas geraç ões, c om aprópria c id ad e d e Roma sofrend o uma d iminuiç ão d e 75% em suapopul aç ão d urante essa époc a. As evid ênc ias arqueol ógic as —morad ias d e pad rão inferior, menos moed as, gad o mais mirrad o —c omprovam o fenômeno d e d ownsiz ing que menc ionei d iversas vezesneste l ivro e refletem a d ramátic a red uç ão d a influênc ia d e Romasobre o resto d a Europa. Um exempl o mais rec ente é a qued a d aUnião Soviétic a, em 1989, d a qual fal amos no iníc io d este c apítul o.Em tod a a história, enc ontraremos muitos outros registros d e“c ol apsos” repentinos d e império.

O que tud o isso ind ic a em rel aç ão ao futuro d os Estad os Unid osno c urto prazo?

Como Ferguson observa, as transiç ões d e império ac ontec empratic amente d a noite para o d ia. Portanto, é perd a d e tempo fic arfal and o d e estágios d e d ec l ínio e querer saber em que ponto osEstad os Unid os se enc ontram hoje . Al ém d isso, a maioria d osimpérios ac aba c aind o, d evid o à má gestão financ eira e às c r isessubsequentes. Em essênc ia, o d esnível entre a entrad a e os gastosampl ia-se abruptamente, e o império torna-se inc apaz d e pagar essad ívid a (outro d esnível d e c ompl exid ad e) . O exempl o d a esc al ad a d ad ívid a públ ic a americ ana, d e 5,8 tr il hões d e d ól ares em 2008 para14,3 tr il hões, segund o estimativas, d aqui a mais ou menos umad éc ad a já d eve ser sufic iente para enc her os c ontribuintes c om opavor d os d euses f isc ais.

Como fal ei na Parte I, um d os fatores d eterminantes d o quereal mente ac ontec e no pl ano soc ial são as c renç as d as pessoas emrel aç ão ao futuro, o c hamad o “c l ima soc ial ” . Enquanto e l asac red itarem que os Estad os Unid os serão c apazes d e l id ar c om seusprobl emas, o país, junto c om o resto d o mund o, c onseguirá atravessarqual quer c r ise . Entretanto, no momento em que uma borbol etafinanc eira bate suas asas sob a forma d e um ac ontec imentoaparentemente inóc uo — tal vez a quebra d e um banc o ( c omo a d oLehman Brothers, em 2008) ou o rebaixamento d os títu l os d a d ívid a

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nac ional d e uma pequena ou grand e ec onomia ( c omo ac ontec eu aosEstad os Unid os em 2011) —, o c aste l o d e c artas inteiro vem abaixo esal ve-se quem pud er. Como d iz Ferguson, o sistema “está c om gravesprobl emas quand o seus c omponentes d eixam d e ac red itar em suaviabil id ad e” . A c onc l usão d essa afirmaç ão é que os impériosfunc ionam em aparente equil íbrio por um períod o imprevisível — eum d ia, d e repente, d esmoronam.

A pergunta agora é c omo tod as essas l ind as abstraç ões e essesprinc ípios gerais se apl ic am em rel aç ão ao tipo d e vid a que osameric anos provavel mente terão quand o uma d epressão d ef l ac ionáriaou uma hiperinflaç ão se instaurar d e verd ad e. Aqui temos umapequena amostra d os próximos d istúrbios. Qual a probabil id ad e d eal gum d os c enários apresentad os real mente se c onc retizar? Do pontod e vista atual , nenhum d el es parec e muito provável , sobretud o seseguirmos a tend ênc ia geral d os ac ontec imentos. Mas uma d éc ad a émuito tempo, e c ertamente haverá surpresas no d ec orrer d o c aminho.Basta c onsid erar e l ementos c omo armas nanotec nol ógic as, mud anç asc l imátic as c atastrófic as, uma nova Era Gl ac ial ou al gum d os eventosX que expus nesta seç ão d o l ivro. Qual quer um d esses e l ementos pod evirar o jogo nas próximas d éc ad as. E d igo mais: se Nial l Fergusonestiver c orreto, está na hora d e se preparar, uma vez que o c ol apso,se/quand o vier , ac ontec erá d e repente, e aí já será tard e d emais.

SINTETIZANDO

U MA MANCHETE DA B LOOMBERG c hamou minha atenç ão outro d ia:“ Temend o o apoc al ipse , magnatas russos ad quirem c asamatas para seprec aver c ontra ameaç as terroristas” . A matéria fal ava d e umaempresa que estava c onstruind o c asamatas privad as d e quatroc entosmil d ól ares para ol igarc as em l oc ais remotos d a Rússia, a fim d eprotegê-l os d o c atac l isma gl obal previsto pel o antigo c al end ário maiapara o final d e 2012. Para aquel es c om um sal d o banc ário menor,outra firma está c onstruind o c asamatas c ol etivas em l ugares sec retosd a Europa Central , ond e, por 25 mil d ól ares, o ind ivíd uo pod e seabrigar quand o a c oisa fic ar preta. Embora pareç a improvável queum evento X exija a ad oç ão d e uma mental id ad e d e bunker para sesobreviver a suas c onsequênc ias, não resta d úvid a d e que o esti l o d e

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vid a pós-ind ustrial d e hoje sofrerá um grave d ownsiz ing ( tal vez atépara os ol igarc as) se qual quer um d os eventos X aqui apresentad os d efato se c onc retizar .

Como opç ão mais simpl es em rel aç ão à mud anç a d o esti l o d e vid a,um site d e sobrevivênc ia, www.usac arr y .c om, apresenta um artigomuito interessante e possivel mente útil intitu l ad o “As d ez med id asd e sobrevivênc ia que prec isamos tomar antes d o total c ol apso d od ól ar americ ano” . Fiquei, obviamente, muito c urioso para ver c omoo autor, um c erto Jason Hanson, d esc revia a vid a sem o d ól arameric ano e d ec id i d ar uma ol had a no site . A c ena d esc rita era:“ Haverá tumul to nas ruas, e Marshal l Law * entrará em aç ão [ sic ] .”Quanto às d ez med id as para garantir um l ugar na nova Améric a, aprimeira c oisa a fazer, segund o o Sr. Hanson, é “ter, no mínimo, trêsarmas: uma pistol a, um fuzil e uma espingard a” . Depois d e expl ic arc omo armazenar c omid a para um ano e água para um mês, o artigofinal mente fal a d e d inheiro: ouro, prata e d inheiro vivo. É isso. Otexto termina c om o l embrete : “ E o mais importante: não se esqueç ad e arrumar aquel as armas!”

Tud o bem. Se voc ê está pronto para viver num mund o em que ossobreviventes invejarão os mortos, pod e ser que armas e c asamatassejam ótimas sol uç ões. Contud o, o mund o apoc al íptic o pós-guerranuc l ear e o mund o d eflac ionário pós-d ól ar americ ano que d everemosenfrentar são c oisas bem d iferentes. Para entend er o que estoud izend o, observe c omo a Grand e Rec essão atual já afetou a vid a d aspessoas e imagine isso num nível aind a maior .

De ac ord o c om uma pesquisa real izad a pel a Pew Found ation emmead os d e 2010, mais d a metad e d a forç a d e trabal ho ad ul ta d osEstad os Unid os já enfrentou al gum tipo d e “d ific ul d ad eprofissional ” , c omo um l ongo períod o d e d esemprego ou exped ientered uzid o, d esd e o iníc io d a rec essão d o final d e 2007. Outrapesquisa revel ou que mais d e 70% d os americ anos ac ima d osquarenta anos foram afetad os pel a c r ise ec onômic a e que opatrimônio l íquid o d e uma famíl ia c omum c aiu c erc a d e 20%. Ouseja, o impac to d e uma grand e rec essão já prejud ic oupermanentemente o esti l o d e vid a.

O outro l ad o d essa vil moed a ec onômic a está, segund o se ac red ita,nos benefíc ios soc iais d ec orrentes d a nec essid ad e d e se ad otar umestil o d e vid a menos perd ul ário. Dizem que a Grand e Depressão d ad éc ad a d e 1930 ac abou por ser uma sal vaç ão, pois obrigou a

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soc ied ad e a trabal har em c onjunto para d ar um sentid o d e unid ad eao país. Mas a real id ad e engana. Na verd ad e, foi a Segund a GuerraMund ial que c umpriu essa funç ão, não a Grand e Depressão. Nopresente , a Grand e Rec essão não d á sinais d e c r iar um esti l o d e vid amais simpl es, mais l ento e menos orientad o ao c onsumo. A maioriad as pessoas está fic and o mais pobre, enquanto os r ic os fic am maisric os, sem fal ar nas re l aç ões famil iares, c ad a vez mais tensas,quand o não são total mente d esfeitas. É d if íc i l imaginar que umc ol apso absol uto d a ec onomia gl obal se ja c apaz d e mel horar essequad ro.

Em vez d e uma Améric a mel hor e mais otimista, o que entend emosc omo “normal ” será red efinid o por um mund o pós-c ol apso. Eisal gumas d as novas “situaç ões normais” prováveis, d esc ritas pel arevista Fortune:

Al uguel em vez d e c asa própria: O pil ar c entral sobre oqual se sustenta o “sonho americ ano” é a c asa própria.Ter seu próprio terreno e seu l ar está tão enfronhad o noimaginário quanto a visão d a mãe d e famíl ia assand ouma torta d e maç ã. Mas no mund o americ ano pós-c ol apso isso ac abará. Só os r ic os terão imóveis. Orestante terá d e al ugá-l os.Desemprego permanente: A ec onomia americ anaprec isaria oferec er mais d e trezentos mil novos empregosnos próximos três anos para baixar o índ ic e d ed esemprego a menos d e 7% até 2014. Atual mente, umrel atório mensal c om um ac résc imo d e menos d e c em milempregos é c omemorad o c omo um grand e progresso.Portanto, uma vol ta aos níveis d e d esemprego d e 5% oumenos, d e antes d e 2007, é um sonho d istante — que setornará quase remoto quand o a ec onomia americ ana saird o c entro d a c ena.Ec onomia em vez d e gasto: Uma rend a menor e ainc erteza em torno d os empregos farão c om que as pessoasl iquid em suas d ívid as e c omec em a ec onomizar,preparand o-se para o momento d a d emissão. Supérfluosc omo os sapatos c aros e o jantar e l egante no restaurantefranc ês d everão f ic ar d e l ad o.Impostos maiores para “os r ic os” : De ac ord o c om o l éxic o

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atual , “ric o” signific a al guém que ganha no mínimo 250mil d ól ares por ano. De ond e vem esse número ninguémsabe, mas, d e al guma maneira, é um val or c onsagrad o nal inguagem d e Washington para d efinir o l imite entrequem d eve pagar mais imposto d e rend a e quem não d eve.Parec e perfeito. Afinal , menos d e 2% d os l aresameric anos têm uma rend a nesse patamar. A questão éque, se o d ól ar entrar em c ol apso e uma hiperinflaç ão seinstaurar, essa quantia já não val erá tanto. Há quemd iga que já não val e . Por outro l ad o, se o c enário d ed eflaç ão não d esc ambar para a hiperinflaç ão, essed inheiro aind a terá seu val or — d esd e que voc ê o enterreno quintal ou o guard e d ebaixo d o c ol c hão para pod erusá-l o quand o seu banc o fal ir .

O esti l o d e vid a d o mund o ind ustrial izad o, em suma, assumiráum tom mais l úgubre quand o o mund o se d ivid ir em bl oc os d e pod erisol ad os, não gl obal izad os. Mas não será o fim d os tempos (assimesperamos) !

N.T.: Marshall Law é um personagem da série de jogos de luta Tekken. É um personagem chinês

que mora nos Estados Unidos e luta Jeet Kune Do, esti lo de luta criado por Bruce Lee.

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FÍSICA MORTÍFERA

DESTRUIÇÃO DA TERRAPELA CRIAÇÃO DE

PARTÍCULAS EXÓTICAS

MATANDO O EXPERIMENTADOR

E M MINHAS AULAS DE químic a d o ensino méd io, os momentos maisempol gantes sempre vinham quand o o professor real izava umexperimento “expl osivo” para c hamar a atenç ão d a turma. Umd esses, que gosto d e l embrar, envol via c ortar um ped ac inho d e sód iod e uma barra imersa em ól eo e jogá-l a em um c opo c om água. Areaç ão separava d e imed iato as mol éc ul as d e água em seusc omponentes: hid rogênio e oxigênio. Também gerava muito c al or. Oque tornou inesquec ível o experimento foi o fato d e o professor terobviamente errad o na quantid ad e d e sód io, pois o c al or na reaç ão,junto c om o oxigênio, inf l amou o hid rogênio, provoc and o uma grand eexpl osão que quebrou o c opo em mil ped aç os e d eixou uma enormemanc ha d e fu l igem no teto d o l aboratório. Fel izmente, ninguém seferiu , mas foi o fim d aquel e tipo d e d emonstraç ão para o resto d osemestre e serviu bem para il ustrar a id eia d e um experimento quepod eria fac il mente ter matad o o experimentad or.

Aind a que não represente um grand e perigo para a humanid ad e,um experimento d esastrad o no l aboratório d e químic a d a esc ol a é umbom exempl o d e c omo a c ompl exid ad e pod e entrar em c ena c omc onsequênc ias potenc ial mente d esastrosas quand o não se estáol hand o. Nesse c aso, vemos o e feito borbol eta em aç ão, no qual um

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pequeno erro d e c ál c ul o d o professor em rel aç ão à quantid ad e d esód io l evou a uma reaç ão d esc ontrol ad a que não c hegou a expl od ir ol aboratório ou matar o mestre , mas assustou a tod os.

Portanto, assim c omo o experimento d o gel o 9 no l ivro Cama d egato, d e Vonnegut, que d esc revi na Parte I, brinc ar c om forç as d anatureza que fogem à nossa c ompreensão pod e ser perigoso não sópara nossa saúd e, mas para a d e tod os os seres d o pl aneta, se asc oisas saírem d os eixos.

Outro d esses experimentos, em uma esc al a bem maior, foi o tested a primeira bomba atômic a, real izad o em Trinity S ite , nasimed iaç ões d e Al amogord o, Novo Méxic o, em 16 d e ju l ho d e 1945. Noverão d e 1942, em Los Al amos, Ed ward Tel l er, um d os c ientistas queprojetavam a bomba, já expressava o temor d e que as temperaturasextremas gerad as pel a expl osão pud essem inc end iar a atmosfera d aTerra. A simpl es visão d e um c ogumel o gigante, c om d uzentos metrosd e l argura, pod ia muito bem c onvenc er uma pessoa a l evar a sério aid eia d e que a Terra inteira pod eria ser c onsumid a em umamonumental bol a d e fogo.

Apesar d e a expl osão pod er gerar temperaturas superiores às d oc entro d o Sol , a maioria d os c ol egas d e Tel l er ac hava muito remota apossibil id ad e d e que um inc ênd io autossustentável fosse provoc ad ona atmosfera. O d iretor d o Projeto Manhattan, J. RobertOppenheimer, enc omend ou um estud o a esse respeito. O rel atório,que veio a públ ic o somente em 1973, c onfirmou a id eia d os c étic os d eque uma bol a d e fogo nuc l ear esfr iava d epressa d emais parainc end iar a atmosfera. Porém havia outro perigo oc ul to naquel eteste .

Na d éc ad a d e 1940, pouc o se sabia d os perigos d a exposiç ão àrad iaç ão, e os morad ores d os arred ores d e Trinity S ite não foramal ertad os nem evac uad os, nem antes nem d epois d o teste . Comoresul tad o, a popul aç ão foi exposta à rad iaç ão ao respirar arc ontaminad o, c onsumir al imentos c ontaminad os e beber água e l e iteafetad os. Al guns ranc hos situavam-se a menos d e 25 quil ômetros d ol oc al d o teste e havia pl antaç ões c omerc iais nas proximid ad es. Emal guns d os ranc hos, as taxas d e exposiç ão, med id as pouc o d epois d aexpl osão, atingiram níveis d e c erc a d e quinze mil mil irems por hora,mais d e d ez mil vezes o nível hoje c onsid erad o seguro. Mesmoatual mente, uma hora d e visita a Trinity S ite resul ta em umaexposiç ão d e 0,5 a 1,0 mil irem, mais ou menos a quantid ad e d e

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rad iaç ão que um ad ul to c omum rec ebe em um d ia d e fontes naturaise artif ic iais, c omo raios X e e l ementos rad ioativos no sol o.

Os f ísic os manifestaram preoc upaç ões d e natureza semel hantequand o a primeira reaç ão nuc l ear sustentad a foi d emonstrad a, emd ezembro d e 1942, pel o grupo d e Enric o Fermi sob as arquibanc ad asaband onad as d a al a oeste d o estád io d e futebol d a Universid ad e d eChic ago. Fermi c onvenc era os c ientistas d e que a reaç ão nuc l ear nãofugiria ao c ontrol e e a c id ad e d e Chic ago estaria “segura” . Mesmoassim, historiad ores d a Comissão d e Energia Atômic a c omentaramque foi um grand e r isc o c ond uzir um experimento c om tec nol ogianunc a antes testad a no c oraç ão d e uma d as maiores c id ad es d o país.

Aind a que o teste nuc l ear no Novo Méxic o não c ol oc asse real menteem risc o a vid a na Terra, pel o menos não na forma d e um inc ênd iona atmosfera, foi a primeira vez na história que os c ientistasc onsid eraram seriamente a id eia d e que seu trabal ho pod eriad estruir o pl aneta. Com o avanç o c ad a vez mais ac el erad o d atec nol ogia, temores d esse tipo aparec em repetid amente. Amanifestaç ão mais rec ente é o med o d e que o pl aneta seja sugad o porum burac o negro artific ial ou d esapareç a em uma c huva d epartíc ul as aind a mais estranhas c r iad as nos ac el erad ores gigantesc osd o Laboratório Nac ional d e Brookhaven, nos Estad os Unid os, e d oCentro Europeu d e Pesquisa Nuc l ear (CER N, Conseil Européen pourl a Rec herc he Nuc l éaire) , na fronteira franc o-suíç a, na periferia d eGenebra. A pergunta básic a que surge sempre que uma máquina novaé c onstruíd a, c r iand o c ol isões c ad a vez mais viol entas entre aspartíc ul as e l ementares que c irc ul am d entro d e anéis, é se essasc ol isões pod eriam c riar al gum tipo d e partíc ul a ou evento c apaz d e“sugar” a Terra, ou mesmo o universo inteiro. Em partic ul ar, ostemores em torno d o grand e c ol isor d e hád rons ( c onhec id o pel a sigl aL H C, Large Had ron Col l id er) , que passou a func ionar no CER N nofinal d e 2009, eram d e que uma forma espec ífic a d e uma partíc ul areal mente estranha, apropriad amente d enominad a “ strangel et” ,aparec esse e um momento d epois a Terra simpl esmente sumisse .

Antes d e nos aprofund armos um pouc o mais nos motivos quel evavam al guns c ientistas a temer tal resul tad o, é interessanteexaminar por que c onstruímos esses “brinqued inhos” potenc ial menteperigosos e d efinitivamente d ispend iosos. Trata-se , sem sombra d ed úvid a, d os l aboratórios mais c aros já c r iad os, que representam avanguard a d a tec nol ogia. O que esperamos ganhar ao c onc entrar um

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vol ume gigantesc o d e rec ursos humanos, tec nol ógic os e financ eiros emum empreend imento d esse tipo?

ALGUMA COISA — OU NADA?

A DÉCADA DE 1960 foi espec ial mente ativa para os f ísic os teóric osc ujos mod el os se propunham a abranger tud o o que se sabia sobrematéria, energia e tud o mais. Os d esd obramentos d esses trabal hosl evaram ao que hoje se d enomina “teoria d e tud o” , que pretend eengl obar em uma únic a teoria matemátic a c ompac ta oc omportamento d e tod as as partíc ul as e forç as que regem o universo,expl ic and o c omo el e c omeç ou e c omo terminará. Entretanto, fal tavaum el o nesse c hamad o mod el o-pad rão, uma partíc ul a e l ementard e n omin a d a bóson d e Higgs, que expl ic a c omo a matéria ad quiremassa. (Em 4 d e ju l ho d e 2012, Rol f Heuer, d iretor d o CER N,anunc iou em uma entrevista c ol etiva em Genebra: “Ac ho que temosal go” , referind o-se a fortes ind íc ios d a presenç a d o bóson d e Higgsem d ad os c ol hid os nos experimentos d o LH C. Embora a c onfirmaç ãod efinitiva possa l evar al guns meses, tud o l eva a c rer que a l ongabusc a pel o bóson d e H iggs está enc errad a) .

Quand o o f ísic o britânic o Peter Higgs postul ou a existênc ia d essapartíc ul a, no iníc io d a d éc ad a d e 1960, a sugestão foi menosprezad apel a maioria d os c ol egas. Atual mente, aposta-se que um d osresul tad os vitoriosos d o LH C será a primeira observaç ão real d esseobjeto fugid io. Se os c ientistas d o CER N c onseguirem enc ontrar obóson d e Higgs, o mod el o-pad rão em que a grand e maioria d os f ísic osac red ita hoje será c onfirmad o, e o próprio Higgs, agora c om mais d eoitenta anos, terá seu grand e momento d e satisfaç ão pessoal eprofissional , após tantos anos d e c r ític as.

Higgs formul ou sua teoria para expl ic ar por que uma parte d amassa d esaparec e quand o a matéria é d ivid id a em partíc ul asmenores. De ac ord o c om el e , quand o o Big Bang ac ontec eu, a matérianão tinha massa al guma. Um momento d epois, a massa aparec eu emc ena. A questão é a seguinte : c omo esse proc esso ac ontec eu? Higgsafirma que a massa foi c ausad a por um c ampo d e energia que sead eriu às partíc ul as ao passarem pel o c ampo prod uzid o pel o que hojeé c onhec id o c omo partíc ul a d e Higgs. Essa entid ad e misteriosa às

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vezes é c hamad a d e “partíc ul a d e Deus” , um rótul o que o próprioHiggs rejeita, pois se c onsid era ateu. Sem el a, estre l as e pl anetasjamais ter iam se formad o, pois a matéria c r iad a no Big Bang teriasimpl esmente se espal had o pel o espaç o, jamais se reunind o pel agravitaç ão para formar objetos c ompac tos e , em espec ial , organismosc omo voc ê e eu .

Assim, a c onfirmaç ão d a existênc ia d o bóson d e Higgs éc onsid erad a a priorid ad e máxima d o LH C. Entretanto, os c ientistasal ertam que, mesmo que a partíc ul a d e Deus exista, tal vez não avejamos. O proc esso pel o qual e l a d á massa à matéria oc orre tãod epressa que pod e estar esc ond id o nos d ad os c ol etad os d o LH C etal vez d emore anos para que esses d ad os sejam “garimpad os” .

O bóson d e Higgs, porém, não é o únic o tesouro que pod e surgir d oLH C uma vez que esteja func ionand o a pl eno vapor. Outrapossibil id ad e é a d e que o c ol isor forneç a provas materiais para amais teóric a d as id eias d a f ísic a mod erna: a teoria d as c ord as. Existeuma c omunid ad e ruid osa no mund o d a f ísic a que afirma que ouniverso inteiro é formad o por “c ord as” ul tramic rosc ópic as d ematéria-energia. Nad a mais. São c ord as d e um tipo ou d e outro queformam o universo inteiro c omo o c onhec emos. O probl ema é queninguém jamais enc ontrou uma c omprovaç ão experimental paraapoiar essa teoria! A id eia é pura espec ul aç ão matemátic a.

Para que a teoria d as c ord as func ione, o universo prec isa possuird imensões invisíveis al ém d as três d imensões normais d o espaç o e ad imensão d o tempo c om as quais estamos famil iarizad os. A maioriad os teóric os d as c ord as ac red ita em um mund o d e d ez d imensões eespera que o LH C revel e as d imensões ad ic ionais. Como isso pod eriaac ontec er?

Uma forma pel a qual o LH C pod eria c omprovar a existênc ia d enovas d imensões ser ia a c r iaç ão d e mic roburac os negros. As taxas d ed ec aimento d as partíc ul as subatômic as c r iad as por esse burac o negropod eriam ser anal isad as para verific ar se as d imensões oc ul tasreal mente existem. Outra forma d e c omprovar a existênc ia d ed imensões “oc ul tas” seria a prod uç ão d e grávitons, partíc ul as quec arregam a forç a gravitac ional . Al go d essa espéc ie seria músic a paraos ouvid os d os teóric os d as c ord as, fornec end o provas experimentaisd os seus voos d e imaginaç ão matemátic a. Os resul tad os prel iminares,porém, parec em pouc o promissores.

Em um c ongresso d e f ísic a em Mumbai no final d o verão d e 2011,

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a Dra. Tara Spears, d o CER N, apresentou os resul tad os d e al gunsexperimentos e afirmou que os pesquisad ores não haviam enc ontrad oind íc ios d as c hamad as partíc ul as supersimétric as. Esse resul tad o põeem xeque uma d as teorias mais popul ares em f ísic a, a teoria d assuperc ord as. Se as c onc l usões apresentad as por Spears sec onfirmarem, os f ísic os terão d e enc ontrar uma nova “teoria d etud o” . O interessante é que resul tad os anteriores d o Tevatron, emChic ago, sugeriam exatamente o c ontrário, razão pel a qual ospesquisad ores ped iram ao CER N que o LH C fosse usad o paraexaminar o proc esso c om mais d etal hes. O professor Jord an Nash, d oImperial Col l ege d e Lond res, um d os pesquisad ores d o projeto d oCER N, c ol oc a a questão nestes termos: “ O fato d e que não vimosquaisquer ind íc ios [d e supersimetria] signific a que nossac ompreensão d o fenômeno é imperfeita, ou que e l e é um pouc od iferente d o que pensamos, ou que e l e simpl esmente não existe .”Antes d e d ec l arar a morte d a supersimetria, porém, temos d e l embrarque existem muitas outras versões d a teoria, mais c ompl ic ad as, quenão foram d esc artad as pel os resul tad os d o LH C. As superpartíc ul aspod em ser apenas mais d if íc eis d e enc ontrar d o que os f ísic osimaginavam.

Como um visl umbre interessante d a soc iol ogia d a c iênc ia, ad erroc ad a d a supersimetria seria uma visão c e l estial para umageraç ão d e f ísic os mais jovens, que enc ontrariam o c ampo abertopara inventarem teorias novas, em vez d e estarem atrel ad os a al goinventad o pel os mais vel hos. Como Max Pl anc k c erta vez c ol oc ou aquestão, teorias novas nunc a são ac eitas d e imed iato; prec isamaguard ar a morte d os oponentes. Neste c aso, o “oponente” seria asupersimetria. Os próximos c inc o anos pod erão d irimir a questão. Épossível , porém, que existam outros tesouros a ser c ol hid os c om oLH C al ém d a supersimetria.

É provável que o fato mais c urioso a respeito d o universoc onhec id o seja que simpl esmente não parec e existir um númerosufic iente d e objetos visíveis — estrel as, pl anetas, asteroid es etc . —para expl ic ar as forç as gravitac ionais responsáveis pel a estrutura d asgal áxias e d o próprio universo. Para d ar c onta d o serviç o, d eve haveruma quantid ad e muito maior d e matéria d o que a que observamosatual mente. É aí que entra em c ena a “matéria esc ura” , uma formad e matéria que não pod e ser vista, mas que c onstitui uma parc el abem maior d o universo d o que tod a a matéria visível .

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Se (e é um grand e se) a matéria esc ura existe e possui a forç a d einteraç ão apropriad a c om a matéria visível , al gumas teorias preveemque as partíc ul as prod uzid as em c ol isões no LH C d ec airão emmatéria esc ura que pod erá ser observad a. Mas não se sabe se épossível c r iar matéria esc ura c onc entrand o energia em um espaç osufic ientemente pequeno, d e mod o que e l a pod e não aparec er nem emum c ol isor mais pod eroso d o que o LH C. E, se aparec er, c onhec emostão pouc o sobre suas propried ad es que pod erá passar d esperc ebid a,por não sabermos c omo ol har. O únic o ponto em que os f ísic osparec em c onc ord ar é que, c aso exista, quase não interage c om aspartíc ul as c onhec id as. Isso signific a que seria d if íc i l separar matériaesc ura d o ruíd o d e fund o nos experimentos d o LH C. Este é , portanto,um tiro no esc uro. Entretanto, se o LH C c onseguir c r iar partíc ul asque pel o menos se revel em boas c and id atas a matéria esc ura, tod a aid eia ganhará um bom reforç o. Por úl timo, mas não menosimportantes, vêm os strangel ets.

• • •

E M 1993, DUAS EXPLOSÕES misteriosas sac ud iram a Terra c om ond as d ec hoque que se propagaram a c erc a d e 1,6 mil hão d e quil ômetros porhora. Fossem quais fossem os objetos, em 22 d e outubro e l esac ionaram d etec tores d e terremotos na Turquia e na Bol ívia, queregistraram uma expl osão na Antártic a c om uma energia d e mil haresd e tonel ad as d e TNT. Apenas 26 segund os d epois, o objeto d eixou ofund o d o oc eano Índ ic o, perto d e Sri Lanka. Um mês d epois, em 24d e novembro, um segund o evento foi d etec tad o. Sensores na Austrál iae na Bol ívia registraram uma expl osão ao l argo d as i l has Pitc airn,no Pac ífic o Sul , e a saíd a d o objeto na Antártid a, d ezenove segund osd epois.

De ac ord o c om os f ísic os, as d uas expl osões c ond izem c om umimpac to d e strangel ets, partíc ul as bizarras que, teoric amente, foramc riad as d urante o Big Bang e c ontinuam a ser c r iad as no interior d eestrel as muito d ensas. Ao c ontrário d a matéria c omum, os strangel etsc ontêm quarks “estranhos” , que c ostumam estar presentes apenas nac huva d e partíc ul as gerad a em imensos ac el erad ores. A equipe queinvestigou os eventos d e 1993 d iz que d ois strangel ets c om apenas umd éc imo d a l argura d e um fio d e c abel o humano seriam sufic ientes

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para expl ic ar os fenômenos observad os.As c ol isões d e prótons d e al ta energia no LH C pod em c riar novas

c ombinaç ões d e quarks, as partíc ul as d e que são feitos os prótons. Épossível que os quarks estranhos d e que são formad os os strangel etstambém sejam prod uzid os nessas c ol isões.

As c onsequênc ias d a c riaç ão d e um miniburac o negro gerad o emum ac el erad or d e partíc ul as c omo o LH C foram ampl amenteexpl orad as na l iteratura d e fic ç ão c ientífic a, pois é o únic o l ugarond e os f ísic os pod em exprimir seus temores em rel aç ão a um eventoque, ao que sabemos, jamais oc orreu. Infel izmente, esses c anaishol l y wood ianos para a d esc riç ão d os e feitos d e um miniburac o negroc onflitam c om a real id ad e d o que sabemos sobre esses objetos,supond o que e l es existam mesmo.

Objetivamente, e is a situaç ão d os miniburac os negros c omo osentend emos hoje :

1. Para que tal objeto seja prod uzid o, as d imensões extrasjá d isc utid as d evem existir ; al ém d isso,

2. se o miniburac o negro não evaporar d e imed iato, c omose espera (através d a c hamad a “evaporaç ão Hawking” ,uma previsão d o famoso f ísic o S tephen Hawking) ,então

3. a vel oc id ad e d a maioria d os miniburac os negros serátão grand e que esc aparão permanentemente d o c ampogravitac ional terrestre . No c aso muito raro em que umd esses objetos u l travel ozes se c hoque c om um próton ouum nêutron no interior d a Terra, o momento d o burac onegro quase não será al terad o.

A c onc l usão é que os miniburac os negros não representam nenhumtipo d e r isc o para a humanid ad e.

Vol tand o à questão d a matéria esc ura, o e feito a c urto prazo seriasimpl esmente estétic o. Nossas teorias d o universo c onhec id o requeremmuito mais matéria d o que a que pod e ser observad a. A d esc obertad essa matéria “que fal ta” tornaria nossas teorias mais satisfatórias epermitir ia prever o d estino f inal d o universo c om mais c onfianç a. Oua expansão atual c ontinuará ind efinid amente ou haverá, no futuroremoto, um Big Crunc h, ou seja, uma c ontraç ão d o universo até se

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tornar um únic o ponto. Uma terc eira possibil id ad e, c onsid erad aimprovável , é um estad o estac ionário em que o universo estáequil ibrad o d e tal forma que não existe uma osc il aç ão c ósmic a entreo Big Bang e o Big Crunc h, mas apenas um Big Boc ejo. A c onc l usão éque a matéria esc ura também não representa um risc o imed iato paraa sobrevivênc ia d a humanid ad e.

É este o menu: miniburac os negros, strangel ets, matéria esc ura,bóson d e Higgs, d imensões oc ul tas. E essas são exatamente as c oisasque os f ísic os sabem ou postul am que pod em aparec er nos restos d asc ol isões d o LH C. A d etec ç ão d e um ou outro d esses objetos val id ariaum mod el o espec ífic o d a f ísic a d as partíc ul as, em d etrimento d emod el os r ivais.

Não pod emos, porém, d esc artar a possibil id ad e d e que as c ol isõesd o LH C revel em al go total mente inesperad o — uma espéc ie d einc ógnita d esc onhec id a! Se isso ac ontec er, o mund o inteiro pod ed esaparec er, e c om el e o mund o d a f ísic a e tud o mais. Ou tal vez umevento extremo d esse porte vire o mund o d a f ísic a d e ponta-c abeç a,forç and o-nos a repensar tud o que ju l gamos saber sobre oc omportamento d o mund o material .

Na extremid ad e oposta d esse espec tro está a frustraç ão total : nãoenc ontrarmos nad a! Passarmos anos estud and o os c hoques entrepartíc ul as sem d esc obrirmos nad a que já não soubéssemos d eantemão. Se isso oc orrer, provavel mente d everemos repensar tambémnossas teorias d o universo. Assim, os d ois extremos, al go total mentenovo ou simpl esmente nad a, pod em ac abar send o a mais empol ganted e tod as as d esc obertas.

MEDO DA FÍSICA

NA EDIÇÃO DE MARÇO d e 1999, a revista d e c iênc ia Sc ientific Americ an ,vol tad a para o grand e públ ic o, publ ic ou um artigo intitu l ad o “ALittl e Big Bang” [Um pequeno Big Bang] , que marc ava o c omeç o d asegund a ond a d e temores d e que a f ísic a fosse/pud esse d estruir opl aneta ou tal vez o universo inteiro. Nesse artigo, o foc o d as atenç õesera o c ol isor re l ativístic o d e íons pesad os (R H IC, Rel ativistic HeavyIon Col l id er) , d o Brookhaven National Laborator y , situad o em LongIsl and , Nova York, que pod eria c riar partíc ul as estranhas d e matéria

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c apazes d e expl od ir o pl aneta ou, tal vez , sugar o universo inteiropara um burac o d o qual jamais retornaria.

O R H IC c onsiste em d ois tubos c irc ul ares d e quase quatroquil ômetros d e c omprimento. Os e l étrons d e átomos d e ouro sãoarranc ad os e os íons d e ouro assim c riad os são ac el erad os atéc hegarem a 99,9% d a vel oc id ad e d a l uz . Quand o esses íons c ol id em,é c r iad a uma matéria inc rivel mente d ensa, a uma temperatura d ezmil vezes maior que a d o c entro d o Sol . Essas são c ond iç ões que nãoexistem d esd e a c r iaç ão d o universo no Big Bang, o que ac ontec eu hád oze bil hões d e anos, quand o tod as as l e is d a f ísic a que c onhec emosaind a não eram respeitad as. Assim, é natural imaginar quaispod eriam ser os e feitos d esse experimento. Na verd ad e, essa perguntafoi a razão original d a c onstruç ão d o R H IC.

Após o artigo d a Sc ientific Americ an , c artas d e l e itorespreoc upad os inund aram a red aç ão d a revista expressand o o med o d eque o c ol isor viesse a d estruir o mund o. Uma c arta típic a tinha aassinatura d o Sr. Wal ter Wagner, um ex-engenheiro d e seguranç anuc l ear que se tornou botânic o no Havaí. Segund o e l e , o f ísic o ingl êsS tephen Hawking d efend ia a tese d e que o universo havia c omeç ad oa partir d e um miniburac o negro c riad o momentos após o Big Bang.O homem queria ter “c erteza” d e que isso não oc orreria quand o oR H IC fosse ac ionad o. A revista publ ic ou a c arta, juntamente c omuma resposta d o f ísic o Frank Wil c zek , ganhad or d o Prêmio Nobel ,que afirmou que os c ientistas re l utam em usar a pal avra impossível(ou seja, “c om c erteza”) , mas que a id eia d e que um burac o negrogerad o pel o R H IC pud esse engol ir o pl aneta era uma “situaç ãoinc rível ” . Wil c zek usou a pal avra “ inc rível ” no sentid o l iteral :inc rível = impossível d e ac red itar .

Sempre em busc a d e notíc ias sensac ional istas, os meios d ec omunic aç ão não d eixaram esc apar essa oportunid ad e. Um repórterc hamou o R H IC d e máquina d o apoc al ipse e d isse que um f ísic o l hec ontara que sua c onstruç ão tinha sid o “o evento mais perigoso d ahistória humana” . Segund o outro re l ato, uma al una d e ensinofund amental em Manhattan mand ou uma c arta d e protesto aosresponsáveis pel o l aboratório, d izend o que estava “ l iteral mentec horand o” enquanto esc revia. A máquina foi até ac usad a d e c r iarum burac o negro e assim c ausar o d esastre d e avião, em 1999, noqual morreram o pil oto, John F. Kenned y Jr . , a esposa e a c unhad a.

Essa preoc upaç ão d o públ ic o c om os e feitos c ol aterais d e um

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ac el erad or d e partíc ul as havia c omeç ad o al guns anos antes, quand oPaul Dixon, um psic ól ogo d a Universid ad e d o Havaí, fez um protestod iante d o Fermil ab, perto d e Chic ago, por temer que o c ol isorTevatron pud esse d esenc ad ear um c ol apso no vác uo quântic o c apazd e “expl od ir o universo inteiro, red uzind o-o a pó” . (Pergunto-me seDixon c onhec e Wal ter Wagner ou se há al go no ar d o Havaí que geraesses tipos d e protesto! )

O al voroç o em torno d o R H IC amainou quand o a máquinac omeç ou a func ionar, no verão d e 2000, sem qual quer probl ema ou,pel o menos, sem nenhum probl ema que resul tasse no d esaparec imentod e aviões ou que fizesse parte d a Terra ser sugad a por um aspirad ord e pó c ósmic o. Mas esse não foi o fim d o med o que o grand e públ ic otinha d os f ísic os.

Em 1994, o Centro d e Pesquisa Nuc l ear Europeu (CER N), pertod e Genebra, na Suíç a, c omeç ou a trabal har num ac el erad or d epartíc ul as aind a mais potente , o LH C, já menc ionad o. Após váriasfal has inic iais, a máquina entrou em ativid ad e no final d e 2009,embora só venha a func ionar c om a máxima c apac id ad e em 2014.Esse projeto foi a c onc retizaç ão d e uma id eia que vinha send od isc utid a no CER N d esd e o final d os anos 1980. Qual era essa id eia?Nad a menos d o que c onstruir uma máquina d o Big Bang, c apaz d erec riar aquel es momentos e fêmeros, há quase c atorze bil hões d e anos,em que os fund amentos d o universo foram assentad os.

Os engenheiros d o CER N sabiam que, para c riar as energiasnec essárias para obter informaç ões a respeito d a partíc ul a d e Higgs,d a matéria esc ura e d e outros enigmas d a f ísic a, ter iam d e c onstruiruma máquina mais c ompl exa que qual quer outra já c r iad a por sereshumanos. Naquel a máquina, d ois fe ixes d e prótons seriam ac el erad osaté 99,9999999% d a vel oc id ad e d a l uz , em um ambiente mais fr ioque o espaç o intereste l ar. Os feixes d e prótons seriam então l anç ad osum c ontra o outro, na esperanç a d e que as partíc ul as c r iad as nessasc ol isões fornec essem respostas às questões pend entes.

Uma parte d if íc i l d o projeto seria simpl esmente observar as“respostas” , pois as partíc ul as e l ementares c r iad as pel as c ol isõesd ec airiam e d esaparec eriam em menos d e um tril ionésimo d esegund o. Para d etec tar essas partíc ul as fugazes, ser ia nec essário uminstrumento maior que um préd io d e c inc o and ares, mas tão prec isoque fosse c apaz d e d eterminar a posiç ão d e uma partíc ul a c om umamargem d e erro d e um vigésimo d a l argura d e um c abel o humano!

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Para projetar e c onstruir uma máquina tão grand e e c ompl exa,foram nec essários mais d e d ez mil c ientistas e engenheiros, uminvestimento d e mais d e seis bil hões d e euros e mais d e c atorze anosd e trabal ho.

Pouc os meses antes d a d ata marc ad a para a entrad a em operaç ãod o LH C, o mesmo Wal ter Wagner que havia expressad o suapreoc upaç ão c om o R H IC entrou c om uma aç ão na Corte Distr ital d oHavaí exigind o que o Departamento d e Energia d os Estad os Unid os,a National Sc ienc e Found ation e o CER N postergassem ospreparativos d o LH C por vários meses para uma aval iaç ão d aseguranç a d o c ol isor. A aç ão sol ic itava uma l iminar que ad iasse aentrad a em operaç ão d o LH C até que o governo americ ano real izasseum estud o c ompl eto d a seguranç a d a máquina, inc l uind o uma novaanál ise d e possível d esfec ho apoc al íptic o.

Mais espec ific amente, a aç ão jud ic ial d e Wagner menc ionava asseguintes possibil id ad es:

Burac os negros d esc ontrol ad os: Mil hões d e burac osnegros mic rosc ópic os seriam c riad os, persistir iam e d eal gum mod o se agl utinariam em uma massa gravitac ionalque c onsumiria outras formas d e matéria e ac abaria porengol ir o pl aneta. A maioria d os f ísic os ac red ita queesses burac os negros, c aso venham a ser c r iad os, ter iamuma energia minúsc ul a e evaporariam rapid amente, semoferec er qual quer perigo.S trangel ets: Atual mente, ac red ita-se que os prótons sãofeitos d e partíc ul as menores, d enominad as “quarks” .Wagner e outros temem que as c ol isões d e prótons d e al taenergia possam c riar novas c ombinaç ões d e quarks, entreel as uma versão perigosa, um “ strangel et” estável , d ec arga negativa, c apaz d e transformar tod as as partíc ul asque toc a em strangel ets. Isso l embra o gel o 9 d o romanc eCama d e gato, d e Kurt Vonnegut, que d esc revisuc intamente na Parte I. Lembre-se d e que Vonnegutimaginou uma forma estranha d e matéria, o ge l o 9, queao c air nos oc eanos l ogo transformou tod a a água normalem uma forma c ristal ina sól id a.Monopol os magnétic os: Tod os os objetos magnétic os quec onhec emos possuem d ois pol os, um apontand o para o

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norte , o outro para o su l . Foi aventad a a hipótese d e quec ol isões d e al ta energia, c omo as que ac ontec em no LH C,pod eriam c riar partíc ul as c om um únic o pol o, norte ousul . O med o é que tal partíc ul a pud esse inic iar umareaç ão d esc ontrol ad a que c onverteria outras partíc ul aspara a forma d e monopol os.Col apso d o vác uo quântic o: A teoria quântic a postul aque o vác uo que existe entre as partíc ul as está repl eto d eenergia. Al guns ac red itam que a c onc entraç ão d e muitaenergia em uma pequena região pod e anul ar as forç asque estabil izam a energia d o vác uo quântic o, permitind oque essa energia seja l iberad a. Os c ál c ul os sugerem que,se isso vier a oc orrer, uma quantid ad e infinita d eenergia será l iberad a, c r iand o uma expl osão gigantesc aque varrerá o universo à vel oc id ad e d a l uz . Osespec ul ad ores mais c r iativos c hegam a aventar a hipótesed e que al gumas d as gigantesc as expl osões observad as emoutras partes d a gal áxia sejam o resul tad o d eexperimentos real izad os por extraterrestres em que ovác uo quântic o fugiu ao c ontrol e .

Quais são os argumentos apresentad os pel o mund o d a c iênc iac ontra essas teorias? Al gumas pod em ser pl ausíveis, aind a que pouc oprováveis? Existe al guma possibil id ad e d e que os seres humanos sejampunid os por sua c uriosid ad e inata a respeito d o universo? Vejamosal guns c ontra-argumentos d a c omunid ad e d os f ísic os a essasc onjec turas tão imaginosas, se bem que extravagantes.

FICÇÕES “CIENTÍFICAS”

DE ACORDO COM A famosa equaç ão d e Einstein E = mc 2, se voc êc onseguir c onc entrar massa sufic iente em um espaç o pequeno obastante, prod uzirá um burac o negro, uma região d o espaç o c om umc ampo gravitac ional muito intenso d a qual nad a, nem mesmo a l uz ,pod e esc apar. Como no LH C os prótons estarão sofrend o c ol isõesquase à vel oc id ad e d a l uz , e os prótons são feitos d e partíc ul asmenores, não é d e tod o absurd o c ogitar se al guns d esses fragmentos

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não pod eriam ser c omprimid os em um espaç o muito pequeno e gerarum burac o negro. Eis al gumas razões pel as quais isso é extremamenteimprovável .

Outras d imensões: Aquel es que se preoc upam c om ac riaç ão d e miniburac os negros pel o LH C supõem que aenergia nec essária é bem menor d o que a c al c ul ad a c ombase em estud os d o mund o c omo o c onhec emos. Assim, apossibil id ad e d e que o LH C prod uza burac os negros estápresente apenas em teorias que postul am a existênc ia d e“outras d imensões” . Somente assim existir ia “espaç o”sufic iente para interaç ões c apazes d e gerar burac osnegros a partir d as energias c om as quais os prótonsc ol id em no LH C.

Basic amente, o probl ema é que, para prod uzirburac os negros, é prec iso c omprimir a matéria até que aatraç ão gravitac ional se torne extremamente intensa.Ac ontec e que a gravid ad e é , d e l onge, a mais frac a d asquatro forç as c onhec id as. Para c ontornar essad ific ul d ad e, al gumas teorias postul am a existênc ia d eoutras d imensões espac iais ac essíveis ao portad or d aforç a gravitac ional , o gráviton, mas inac essíveis a outraspartíc ul as, c omo quarks, fótons e e l étrons. S e essas outrasd imensões d e fato existissem, a gravid ad e pod eria seruma forç a muito mais intensa d o que parec e , pois osgrávitons passariam boa parte d o tempo nessas d imensões,raramente visitand o nossa parte d o universo. Nomomento, porém, não existe nenhuma prova d a existênc iad e outras d imensões al ém d aquel as que já c onhec emos.Teoria e real id ad e: Estr itamente fal and o, ninguémjamais observou um burac o negro; trata-se d e um entepuramente teóric o. Certos objetos investigad os pel osastrônomos apresentam al gumas d as c arac terístic asatribuíd as aos burac os negros; entretanto, existem muitosprobl emas assoc iad os à própria id eia d e burac o negro, enão temos c erteza d e sua existênc ia.

Um aspec to espec ial mente perturbad or d a id eia d eburac o negro é que, d e ac ord o c om a teoria d arel ativid ad e geral , o tempo passa mais d evagar quand o

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um c orpo se aproxima d e um objeto d e grand e massa,c omo um burac o negro. Isso signific a que o c orpo l evariaum tempo infinito para d esaparec er no interior d e umburac o negro, pel o menos d o ponto d e vista d e umobservad or situad o d o l ad o d e fora d o c hamad ohorizonte d e eventos d o burac o negro. Esse observad orveria o c orpo, uma bol a d e futebol , por exempl o, seratraíd o em d ireç ão ao burac o negro até fic ar “preso” ,c omo uma mosc a em um papel mata-mosc as, no horizonted e eventos. Se voc ê fosse um quarterbac k d o futebolameric ano c orrend o c om a bol a, atravessaria o horizonted e eventos sem perc eber nad a d e estranho… até fazermeia-vol ta e tentar perc orrer o c aminho inverso. Aí voc êd esc obriria que a viagem não tem vol ta. Entretanto, umobservad or externo não enxergaria nad a d isso; apenasveria voc ê fic ar preso para sempre no horizonte d eeventos. Raios c ósmic os: Em 1983, S ir Martin Rees, d aUniversid ad e d e Cambrid ge, e Piet Hut, d o Instituto d eEstud os Avanç ad os em Princ eton, já haviam c omentad oque os raios c ósmic os vêm sofrend o c ol isões há mil haresd e anos, al gumas d el as c om energias mil hões d e vezesmaiores que as prod uzid as pel o LH C. Mesmo assim, nãofoi c r iad o nenhum burac o negro sugad or d e pl anetas e ouniverso c ontinua a existir. Nas pal avras d o maiorespec ial ista d o mund o em strangel ets, Robert Jaffe, d oMIT: “ Se um ac el erad or d e partíc ul as pud esse c r iar esseobjeto apoc al íptic o, um raio c ósmic o o teria c r iad o hámuito tempo.” E prossegue afirmand o: “Ac red itamos queexistem ‘experimentos’ d e raios c ósmic os re l evantes parac ad a perigo c onhec id o.”

Tud o ind ic a, portanto, que, enquanto não tivermosac el erad ores mais pod erosos que os raios c ósmic os d emaior energia, estaremos seguros.

SINTETIZANDO

OLHANDO PARA O MUNDO d a f ísic a d o ponto d e vista d e um f ísic o d e

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partíc ul as e l ementares, na c ol una d e ativos d os experimentos emand amento em Genebra, Chic ago e outros l ugares, vemos apossibil id ad e d e que um d os vários mod el os que foram propostos paraa estrutura d o universo seja c omprovad o ou d e que seja nec essáriorever por c ompl eto essa questão l iteral mente c ósmic a. Na c ol una d epassivos, que é a que rec ebe maior atenç ão por parte d o resto d omund o, está a possibil id ad e extremamente remota, mas mesmo assimd iferente d e zero, d e que a Terra seja d estruíd a.

Qual quer uma d essas possibil id ad es é um evento X. Tanto ac onfirmaç ão c omo a negaç ão d o mod el o-pad rão d a f ísic a seria umevento extremo para a c omunid ad e c ientífic a: al go raro, d e grand eimpac to para esse grupo e sem d úvid a surpreend ente ( sobretud o se oresul tad o final for a negaç ão) . A outra possibil id ad e, a d estruiç ãod a Terra por um strangel et, é um evento X c apaz d e afetar umac omunid ad e soc ial bem mais ampl a, ou seja, o pl aneta inteiro( inc l uind o os f ísic os! ) , e ser ia também uma surpresa. Cl aro que existeum tom d e ironia aqui; os d ois eventos X não pod em ser c omparad os,pois o segund o seria muito mais extremo que o primeiro. Mesmoassim, ac onteç a o que ac ontec er c om esses experimentos, o resul tad ofinal será c om c erteza um evento X no sentid o em que usamos aexpressão neste l ivro.

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6

A GRANDE EXPLOSÃO

A DESESTABILIZAÇÃO DOPANORAMA NUCLEAR

DE VOLTA À IDADE DA PEDRA

E M MEADOS DA DÉCADA d e 1960, eu trabal hava c omo programad or d ec omputad ores na R AND Corporation, em Santa Mônic a, Cal ifórnia,enquanto fazia o d outorad o em matemátic a na Universid ad e d o Suld a Cal ifórnia. Na époc a, o auge d a R AND c omo c atal isad ora d eid eias para as forç as armad as já havia passad o e a organizaç ãoestava no proc esso d e se reinventar c omo uma espéc ie d e pronto-soc orro para órgãos d o governo fed eral , estad ual e munic ipal embusc a d e reméd ios intel ec tuais para as enfermid ad es pol ític as esoc iais que afligiam seu públ ic o. Al guns grupos remanesc entes d os“bons tempos” , porém, permanec iam na organizaç ão, e um d ia meuc hefe me ped iu para ajud ar um d aquel es “d inossauros” em um estud od a prec isão d e ataques c om armas nuc l eares. No final , meu trabal hofoi c onc eber sol uç ões para a questão d e c omo bombard ear Mosc ou d amaneira mais efic az e l evar a c id ad e à Id ad e d a Ped ra.Ironic amente, pouc os anos d epois, fui morar em Mosc ou, ond e fiqueiquase um ano em um interc âmbio entre a Ac ad emia Nac ional d eCiênc ias d os Estad os Unid os e a Ac ad emia Soviétic a d e Ciênc ias.Assim, tive oportunid ad e d e visitar l ugares que só tinha visto nosmapas c omo al vos estratégic os d e al ta priorid ad e para inc ineraç ãoinstantânea.

Gostaria d e fazer um pequeno resumo d a mental id ad e d e GuerraFria que existia na R AND e no Departamento d e Defesa americ ano

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naquel a oc asião e d e c omo evol uiu para al go muito d iferente , d ec erta forma muito mais perigoso, no toc ante ao uso d e armasnuc l eares. Na d éc ad a d e 1960, vivíamos em um mund o bipol ar, pel omenos no que d iz ia respeito à possibil id ad e d e vaporizaç ãoinstantânea em um hol oc austo nuc l ear. Os EUA e a UR S S eram osúnic os atores em c ena, c om o Reino Unid o, a Franç a e a Chinaespiand o d e l onge, mas sem c ond iç ões d e tomar d ec isões unil ateraisem rel aç ão ao uso d e seus arsenais nuc l eares, bem menores. Hoje,porém, oito países já d etonaram artefatos nuc l eares, outros trêsc ond uziram testes, e estima-se que d e três a sete possuam bombasatômic as ou já as possuíram e parec em ter d esistid o d el as após ad issol uç ão d a União Soviétic a. Isso sem fal ar d os boatos a respeito d egrupos terroristas que c ompraram uma ou mais bombas d e fontesd esc onhec id as. Ou seja, a questão d e quem possui e quem não possuiarmas nuc l eares está se tornand o c ad a vez mais d if íc i l d e respond er.Do ponto d e vista d e um espec ial ista em teoria d os jogos, para nãofal ar d e um estrategista mil itar ou d e um c onsul tor d e seguranç anac ional , a situaç ão hoje em d ia é muito mais c ompl exa d o que nomund o c om o qual eu l id ava na R AND na d éc ad a d e 1960.

O panorama nuc l ear no mund o d e hoje é um c aso c l ássic o d esobrec arga d e c ompl exid ad e em aç ão. Al ém d e ser d if íc i l d efinir onúmero d e países partic ipantes, o c enário inc l ui d e tud o: bombas“perd id as” d a antiga União Soviétic a; c ientistas insatisfeitos quepassaram para o “ l ad o negro” ; tentativas c onstantes d os hac kers d einvad ir sistemas d e c ontrol e d e armas; princ ipiantes, c omo gruposterroristas e países fora d a l ei , interessad os em ad quirir bombasatômic as no merc ad o negro. Ac resc ente a isso ogivas antigas epossivel mente instáveis mesmo nos arsenais nuc l eares ofic iais e oresul tad o é uma mistura perigosa que pod e resul tar quase a qual quermomento na d etonaç ão d e armas nuc l eares c omo fogos d e artif íc io emvárias partes d o mund o. A verd ad e é que o c enário nuc l ear atual éum exempl o típic o d e c omo o exc esso d e c ompl exid ad e pod ed esestabil izar a estrutura gl obal d e pod er — d a noite para o d ia.

Um bom períod o para c omeç ar essa história é 1960, ano d epubl ic aç ão d o pol êmic o l ivro On ermonuc l ear War [Sobre aguerra termonuc l ear] , esc r ito por Herman Kahn, um f ísic o d a R AND.O l ivro apresentava uma visão objetiva e imparc ial d aspossibil id ad es e c onsequênc ias d e uma guerra nuc l ear entre osEstad os Unid os e a União Soviétic a. Na époc a, os d ois países

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c ontavam c om c erc a d e tr inta mil ogivas nuc l eares c ad a um, muitomais que o nec essário para se d estruírem mutuamente. A títu l o d ec omparaç ão, hoje c ad a país possui “somente” al guns mil hares d eogivas. Entretanto, a c ompl exid ad e d o “ jogo nuc l ear” mund ialc ompensou c om fol ga essa d iminuiç ão d o pod er d e fogo. Vol tand o aol ivro d e Kahn, e l e c ontém d esc riç ões d e vários tipos d e ataques, c omo número provável d e mortes d iretas ou ind iretas por efeito d arad iaç ão, os d anos materiais e c oisas d o gênero. Quaseimed iatamente após a publ ic aç ão, o l ivro foi c r itic ad o por membrosl iberais d o c ongresso americ ano pel a maneira fr ia e prosaic a d eabord ar um assunto c om uma c arga emoc ional tão grand e na époc a,ou seja, a morte instantânea d e d ezenas d e mil hões d e pessoas. Apubl ic id ad e em torno d o l ivro e d o autor l evou o c ineasta S tanl eyKubric k a se inspirar em Kahn para c riar o Dr. Fantástic o,personagem d o f i l me d e mesmo nome, l anç ad o em 1964.

Durante a primeira metad e d a d éc ad a d e 1960, as questõesl evantad as no l ivro d e Kahn sobre c omo obter uma vantagemestratégic a em um c onflito c om d ois partic ipantes serviram d e basepara um extenso trabal ho matemátic o na R AND no c ampo d a teoriad os jogos d e estratégia, área d e estud os c r iad a em 1947 pel omatemátic o John von Neumann e pel o ec onomista Oskar Morgensternno c ontexto d a c ompetiç ão ec onômic a. A tensão estratégic a entre osEstad os Unid os e a União Soviétic a era um terreno partic ul armenteférti l para o d esenvol vimento d a “teoria d os jogos” , pois envol viaapenas d ois partic ipantes que supostamente agiam d e maneirarac ional na esc ol ha d e suas aç ões em c ad a etapa. Al ém d isso, não eraabsurd o presumir que as interaç ões entre os jogad ores eram d e “somazero” , ou seja, que o ganho d e um era igual à perd a d o outro. Essesjogos d e soma zero entre d ois oponentes rac ionais são, na verd ad e, oúnic o tipo para o qual existe uma teoria matemátic a total mentesatisfatória, que permite c al c ul ar as mel hores estratégias para osenvol vid os. Assim, mesmo que as tensões d a Guerra Fria nãoc orrespond essem perfeitamente a esse mod el o, era possível util izar ateoria d os jogos para c hegar a uma série d e c onc l usões que ao menosparec iam razoáveis.

Após muitos anos d e estud os, d ebates, d isc ussões e negoc iaç õespol ític as e mil itares, a princ ipal estratégia que surgiu para os d oispaíses foi um c onc eito hoje bastante c onhec id o c hamad o MAD,ac rônimo d e mutual assured d estruc tion (d estruiç ão mútua

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assegurad a) . O MAD c omeç ou c om o rec onhec imento d e que c ad al ad o havia ac umul ad o um arsenal nuc l ear (e métod os para seuemprego) c apaz d e assegurar a d estruiç ão c ompl eta d o outro l ad o.Portanto, mesmo que eu seja atac ad o c om forç a total pel o meuad versário, serei c apaz d e d estruí-l o total mente em um c ontra-ataque. É c l aro que para que esse c ontra-ataque seja efetivo, umaparte aind a l etal d os meus armamentos d eve ser c apaz d e resistir àprimeira ond a d e bombard eios. Essa premissa l evou aos três pil aresd o sistema d e ataque nuc l ear d os Estad os Unid os — terra, c éu e mar—, formad o por si l os subterrâneos, submarinos nuc l eares e aviõesequipad os c om bombas atômic as mantid os no ar horas por d ia. Atéond e se sabe, essa estratégia é empregad a até hoje , embora ac onfiabil id ad e d o MAD esteja bastante c omprometid a, justamenteporque hoje existem jogad ores d emais em c ena (exc esso d ec ompl exid ad e) . Fal arei mais a respeito d as razões para que issotenha ac ontec id o no final d o c apítul o. Val e a pena ressal tar que,mesmo c om somente d ois jogad ores, a estratégia MAD é efetiva apenasc ontra um ataque d el iberad o d o ad versário.

Infel izmente, um ataque premed itad o é apenas uma d as razõespel as quais uma arma nuc l ear pod e vir a ser d etonad a. Existemmuitas outras. Fred Ik l e , d a R AND, afirmou em 1958 que era muitomais provável que o próximo c ogumel o nuc l ear fosse resul tad o d e umsimpl es ac id ente ou erro d e c ál c ul o d o que d e um ataque proposital .Existem muitos c asos d e ac id entes envol vend o armas nuc l eares quepod eriam fac il mente ter c onfirmad o essa possibil id ad e. Apenas atítu l o d e i l ustraç ão, aqui vão d ois exempl os c onc retos.

No d ia 17 d e janeiro d e 1966, oc orreu uma c ol isão entre umbombard eiro nuc l ear B-52 americ ano e um avião-tanque KC-135quand o o bombard eiro estava send o reabastec id o sobre o vil arejo d ePal omares, no su l d a Espanha. O avião-tanque expl od iu, fazend oc om que o B-52 se partisse e espal hasse d estroç os em uma área d emais d e 250 quil ômetros quad rad os. Uma d as quatro bombasnuc l eares que o B-52 transportava c hegou ao sol o mais ou menosintac ta, mas os ac ionad ores d e d uas outras bombas expl od iram c om aqued a, espal hand o d estroç os rad ioativos pel o povoad o e c erc anias. Aquarta bomba c aiu no mar e foi rec uperad a por mergul had ores trêsmeses após o ac id ente. Para não fal ar apenas d os americ anos, segueuma história parec id a d o l ad o russo.

Uma prátic a naval c omum na époc a d a Guerra Fria era que

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submarinos d e propul são (e armamento!) nuc l ear espreitassem asfrotas inimigas. Durante um d esses perigosos “enc ontros íntimos”mil itares, o porta-aviões americ ano Kitty Hawk se c hoc ou c om umsubmarino d e ataque soviétic o d a c l asse Vic tor no d ia 21 d e març od e 1984, no mar d o Japão. O Kitty Hawk supostamente estavaequipad o c om d ezenas d e armas nuc l eares, e ac red ita-se que osubmarino soviétic o possuísse d ois torped os nuc l eares. Fel izmente,nenhuma d essas armas foi d anif ic ad a nem perd id a na c ol isão.

Esses são apenas d ois exempl os ( entre muitos) para mostrar c omo éfác il que um simpl es ac id ente ou erro d e c ál c ul o d eflagre um sérioinc id ente nuc l ear. Casos c omo esses mostram que os regul ad oresnuc l eares d os EUA e d a UR S S (o governo e as forç as armad as) nãoestavam c onseguind o ac ompanhar a c resc ente c ompl exid ad e d ossistemas d e armas nuc l eares em terra, c éu e mar. A c ompl exid ad e d ossistemas c resc ia muito mais d epressa que as med id as d e seguranç a,c riand o l ac unas que fe l izmente resul taram apenas em ac id entesrel ativamente inóc uos c omo os que ac abamos d e d esc rever, em vez d eum grand e d esastre . Na verd ad e, entre 1950 e 1993, a Marinha d osEstad os Unid os teve pel o menos 380( ! ) ac id entes c om armamentos.Nesse períod o, ac id entes l evaram à perd a d e 51 ogivas nuc l eares (44soviétic as e sete americ anas) , al ém d e sete reatores nuc l eares d esubmarinos ( c inc o soviétic os e d ois americ anos) . Outros d ezenovereatores d e submarinos d esc omissionad os foram simpl esmente jogad osno mar (d ezoito soviétic os e um americ ano) .

Esses números representam apenas o que se sabe a respeito d eac id entes americ anos e soviétic os até o fim d a Guerra Fria. Devid o ànatureza d el ic ad a d o assunto, não é improvável que boa parte tenhasid o mantid a em sigil o por ambos os l ad os. Não é d if íc i l imaginar,tampouc o, que outras potênc ias nuc l eares tenham sofrid o ac id entessemel hantes, c om perd a d e armas e reatores. Evid entemente, há umagrand e d iferenç a entre um ac id ente, mesmo um ac id ente que espal herad ioativid ad e em uma grand e área, e uma expl osão d el iberad a. Asarmas nuc l eares possuem d iversos mec anismos d e seguranç a paraevitar d etonaç ões ac id entais. Até hoje , esses mec anismos têmfunc ionad o; entretanto, mesmo sem uma expl osão, os c ustosfinanc eiros, d e seguranç a, d e saúd e e ambientais d os arsenaisnuc l eares são enormes.

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INVERNO NUCLEAR

A AMBIO É UMA revista ambiental d e grand e prestígio publ ic ad a pel aReal Ac ad emia Suec a d e Ciênc ias. Por vol ta d e 1980, os ed itoresenc omend aram ao c ientista hol and ês Paul Crutzen e seu c ol egaameric ano John Birks um artigo sobre os e feitos atmosféric os d e umaguerra nuc l ear. Inic ial mente, Crutzen e Birks pretend iam investigarapenas o aumento d a rad iaç ão ul traviol eta na superf íc ie terrestre emc onsequênc ia d e uma guerra nuc l ear. No entanto, num d esses gol pesd e sorte inesperad os que c ostumam oc orrer inexpl ic avel mente nahistória d os grand es avanç os d a c iênc ia, e l es d ec id iram inc l uir noestud o a fumaç a prod uzid a por inc ênd ios. Com base em c ál c ul osprel iminares, Crutzen e Birks c hegaram à c onc l usão d e que umaguerra nuc l ear d e grand es proporç ões prod uziria uma quantid ad e d efumaç a sufic iente para bl oquear a l uz d o sol em metad e d o pl anetapor semanas a fio. A publ ic aç ão d o artigo no número d a Ambio d enovembro d e 1982 estimul ou muitos outros pesquisad ores a investigara rel aç ão entre o fogo e a fumaç a prod uzid os por expl osões nuc l earese o enfraquec imento d a l uz sol ar, l evand o a uma c onferênc ia arespeito d o assunto, no final d e 1983, que d espertou o interesse d opúbl ic o e d os c ientistas pel o probl ema d o “ inverno nuc l ear” .

Estud os subsequentes revel aram que as princ ipais c onsequênc iasambientais d e uma guerra nuc l ear provavel mente são: (1) fumaç a natroposfera, (2) poeira na estratosfera, (3) prec ipitaç ão rad ioativa e(4) d estruiç ão parc ial d a c amad a d e ozônio. Essa l ista, a propósito,mostra por que não foram observad os efeitos c l imátic os d urante operíod o d e testes atmosféric os d e armas nuc l eares que prec ed eu oTratad o d e Interd iç ão Parc ial d e Ensaios Nuc l eares d e 1963. Ostestes foram c ond uzid os em c errad os, atóis, tund ras e d esertos, ond enão havia fogo e , portanto, sem fumaç a.

Anal isemos os c omponentes d esse quad ro sombrio d e forma maisd etal had a.

1. As expl osões nuc l eares l anç am imed iatamente poeira,rad ioativid ad e e gases na atmosfera. Com a poeiraarranc ad a d a superf íc ie ser ia possível c onstruir umarepresa d e 450 metros d e al tura e 25 metros d e

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espessura no c anal d a Manc ha.

2. As expl osões inic iam inc ênd ios, queimand o c id ad es,florestas, c ombustíveis e pastagens d os países emc onfl ito.

3. Devid o aos inc ênd ios, nuvens d e fumaç a e gases sobempara o al to d a troposfera. Em questão d e semanas, osventos espal ham parte d a poeira, d a rad ioativid ad e ed a fumaç a por tod o o pl aneta.

4. Ao mesmo tempo, nuvens d e fumaç a envol vem a Terraem regiões d e l atitud e méd ia, d o Texas à Noruega. Apoeira l eva um tempo que pod e variar d e semanas aal guns meses para se prec ipitar .

5. Por c ausa d as nuvens d e fumaç a e poeira, a Terrapassa vários d ias na esc urid ão e várias semanas napenumbra.

6. As nuvens d e fumaç a e poeira fazem c air a temperaturana superf íc ie terrestre . Se a guerra nuc l ear ac ontec ena primavera ou no verão, a qued a d e temperatura éc omparável à d iferenç a entre verão e inverno (d aí onome “ inverno nuc l ear” ) . As temperaturas méd iasl evam mais d e um ano para vol tar ao normal e o c l imaé afetad o por um períod o muito mais l ongo.

7. Quand o a poeira e a fumaç a baixam, a superf íc ie d aTerra é exposta a uma forte rad iaç ão ul traviol eta,resul tante d a d estruiç ão parc ial d a c amad a d e ozônio.

E SSAS SÃO AS PRINCIPAIS e tapas no c aminho d o inverno nuc l ear. Seráque essa qued a ac entuad a d e temperatura por um tempo tão l ongopod e real mente ac ontec er? Ou será que essas histórias assustad orasforam c riad as apenas para c hamar a atenç ão d a míd ia para umaspec to até então ignorad o d os horrores d e uma guerra nuc l ear?

Após a publ ic aç ão d o estud o d e Crutzen e Birks, Carl Sagan ed ois d e seus ex-al unos, James B. Pol l ac k e O. Brian Toon, d o AmesResearc h Center d a NAS A, juntamente c om Ric hard Turc o e omasAc kerman, real izaram um extenso trabal ho d e c ál c ul o para verific arse as estimativas apresentad as no artigo d a Ambio estavam c orretas.O grupo d e Sagan já estava c iente d as possibil id ad es d e grand es

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d istúrbios c l imátic os c ausad os pel a presenç a d e poeira na atmosferapor haver trabal had o no projeto d a sond a espac ial Mariner 9,l anç ad a em 1971 em d ireç ão a Marte . Quand o a sond a c hegou aopl aneta, enc ontrou uma enorme tempestad e d e poeira. Enquantoesperava a tempestad e amainar, Sagan notou que os instrumentos nasond a registravam temperaturas na atmosfera bem maiores que onormal e temperaturas na superf íc ie muito menores que o normal .Mais tard e, Sagan e seu grupo c omeç aram a apl ic ar al gumas d astéc nic as que haviam usad o para anal isar os d ad os d a tempestad e d epoeira d e Marte a um fenômeno semel hante prod uzid o por erupç õesvul c ânic as na Terra. Assim, quand o o artigo d e Crutzen e Birks foipubl ic ad o, a equipe d a NAS A estava em c ond iç ões d e fazer umaanál ise quantitativa d etal had a d a situaç ão.

Usand o seu próprio mod el o, o grupo d e Sagan prod uziu umd oc umento sobre o inverno nuc l ear que se tornaria famoso… e não sópel o aspec to c ientífic o. O artigo, que ganhou o apel id o d e “ T TAPS”(as inic iais d os sobrenomes d os c inc o autores) , foi publ ic ad o nar e v i s ta S c ienc e, um d os mais prestigiad os periód ic os c ientífic os d omund o, pouc o antes d o Natal d e 1983. Antes que a revista c hegasse àsbibl iotec as, para aumentar a reperc ussão d as c onc l usões d e seutrabal ho, Sagan c onc ed eu uma entrevista c ol etiva em 31 d e outubro,o Dia d as Bruxas, na qual anunc iou as c onc l usões assustad oras a queseu grupo havia c hegad o. Houve rumores na c omunid ad ec l imatol ógic a d e que Sagan esc ol hera essa forma teatral d e c hamaratenç ão para o inverno nuc l ear c om o objetivo d e reforç ar suac and id atura ao Prêmio Nobel d a Paz. Ora, por que não? Afinal , od iál ogo entre os mund os oc id ental e oriental sobre questõesc ientífic as e pol ític as re l ac ionad as ao inverno nuc l ear, provoc ad opel as c onc l usões d o artigo, c ertamente merec e al gum tipo d erec onhec imento.

O grupo T TAPS c onc l uiu que uma guerra nuc l ear d e grand esproporç ões no hemisfério Norte provoc aria uma qued a imed iata d etemperatura d e mais d e 20°C e que as temperaturas l evariam mais d eum ano para vol tar ao normal . À guisa d e c omparaç ão, uma qued ana temperatura méd ia d e apenas 1°C, a l ongo prazo, ac abaria c omtod as as pl antaç ões d e tr igo d o Canad á, e uma qued a d e 10°Cprod uziria uma nova era gl ac ial . Entretanto, o mod el o T TAPS tinhasuas fal has. Uma d el as era supor que as partíc ul as d e poeira efumaç a se moviam vertic al mente, mas não se d ispersavam na

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horizontal . Era c omo se a atmosfera fic asse parad a o tempo tod o,apenas irrad iand o energia para c ima e para baixo. Em outraspal avras, o mod el o não l evava em c onta a transferênc ia d e energiad e um l ugar para outro d a superf íc ie terrestre ou d a atmosfera.

Nos anos que se seguiram ao estud o pioneiro d o grupo T TAPS,vários pesquisad ores aperfeiç oaram a anál ise d os e feitos d e expl osõesnuc l eares, util izand o mod el os tr id imensionais d e c irc ul aç ão gl obalc omo os que são usad os pel os meteorol ogistas nas previsões d e tempo.Um d os mais atuantes foi o fal ec id o c l imatol ogista S tephen H.Sc hneid er, d a Universid ad e d e S tanford . Quand o trabal hava noCentro Nac ional para Pesquisas Atmosféric as (NCAR, d e NationalCenter for Atmospheric Researc h) , em Boul d er, Col orad o, Sc hneid erpubl ic ou, em 1988, uma anál ise c r ític a d as previsões d os mod el os d einverno nuc l ear .

Sc hneid er e seus c ol aborad ores c onc l uíram que os e feitosc l imátic os ser iam bem menos graves que os anunc iad os no artigo d ogrupo T TAPS. Apresso-me a observar que isso não signific a que nãohaja um probl ema; muito pel o c ontrário. No entanto, a previsão d euma qued a d e temperatura no verão d e 3°C a 8°C seria mais c omo ad iferenç a entre verão e outono d o que entre verão e inverno. Ac onc l usão l evou Sc hneid er, um d os ganhad ores d o Prêmio Nobel d aPaz em 2007 pel a partic ipaç ão no Painel Intergovernamental sobreMud anç as Cl imátic as ( IPCC, Intergovernmental Panel on Cl imateChange) , a mud ar o nome para “outono nuc l ear” , c onc l uind o que “épouc o provável que os e feitos c l imátic os d e uma guerra nuc l ear sejammais d evastad ores para as naç ões c ombatentes que os e feitos d iretosd o uso d e mil hares d e armas nuc l eares” . O informe, c ontud o, ressal taque a aval iaç ão d epend e d e hipóteses antropol ógic as em rel aç ão aoque c onstitui um c enário pl ausível para ataques nuc l eares. Estud osmais rec entes, real izad os por al guns d os pesquisad ores originais d ogrupo T TAPS em 2007, c ontrad izem esse quad ro c or-d e-rosa,mostrand o que até um pequeno embate nuc l ear faria o pl anetamergul har em temperaturas mais baixas que as d a Pequena EraGl ac ial (1600-1850) , c om efeitos que perd urariam por mais d e umad éc ad a. Ou seja, a ameaç a parec e bastante real … e bem imed iata.

Antes d e entrar em d etal hes a respeito d os horrores d e uma guerranuc l ear regional ou gl obal , vou preparar o terreno anal isand oprimeiro um tipo d e c enário muito mais próximo d o que pod eríamosesperar d e um ataque terrorista c omo o d e 11 d e setembro,

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envol vend o apenas uma bomba “pequena” , d e 150 quil otons — c erc ad e d ez vezes maior que “ Littl e Boy” , que arrasou Hiroshima em1945. Esse é o tipo d e situaç ão que mais preoc upa os espec ial istas emterrorismo, pois muitas armas nuc l eares aproximad amente d essetamanho d esaparec eram d o arsenal d a ex-União Soviétic a após aqued a d o regime c omunista. Não se sabe quantas outras armas estãoc irc ul and o no submund o d o movimento terrorista gl obal ,provenientes d os arsenais d e potênc ias nuc l eares não d ec l arad as,c omo Israel e a Áfric a d o Sul , sem fal ar d e áreas instáveis c omo oPaquistão. Não é prec iso um grand e esforç o para imaginar queal gumas d el as pod em aparec er… ou expl od ir. Para tornar essequad ro o mais real ista possível , usarei o al vo preferid o d os ataquesterroristas, a i l ha d e Manhattan, c omo c enário para esta simul aç ãoenvol vend o uma expl osão d e 150 quil otons no nível d o mar, c ausad apor uma “pequena” arma nuc l ear , c omo c omentei anteriormente.

11 DE SETEMBRO REVISITADO

É UM DIA CLARO d e primavera em Manhattan, c om uma l eve brisasoprand o para l este . As pessoas estão na rua, aproveitand o o sol e otempo bom. Como sempre, um grupo d e turistas se reúne em frente aoel evad or d o Empire S tate Buil d ing, esperand o para subir à torre d eobservaç ão e ver o panorama d a c id ad e nesse d ia perfeito. Ninguémrepara no c aminhão d e entregas estac ionad o na rua 34, perto d a fil ad e turistas. Ao meio-d ia, uma l uz ofusc ante irrompe d o c aminhão;menos d e um segund o d epois, o c entro d e Manhattan simpl esmented esaparec e d o mapa. Até os ed if íc ios mais reforç ad os, fe itos d e aç o ec onc reto, em um raio d e um quil ômetro d e d istânc ia d o EmpireState , são total mente d estruíd os. Cartões postais d a c id ad e, c omo oMad ison Square Gard en, a Penn Station e a Bibl iotec a Públ ic a d eNova York, d esaparec em c omo por um passe d e magia negra.

A ond a d e c hoque prod uzid a pel a expl osão, al ém d e d estruir osed if íc ios, mata instantaneamente 75 mil pessoas que se enc ontravamno quarteirão d o Empire S tate . Quem estava no raio d o l oc al d aexpl osão foi total mente d esintegrad o; não sobrou nad a — nem c orpo,nem c inzas. Quem estava nos ed if íc ios morreu pouc o tempo d epois,soterrad o.

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Passad os quinze segund os, a área atingid a pel a expl osão estend e-se por seis quil ômetros c om uma sobrepressão d e um psi (uma l ibrapor pol egad a quad rad a) na periferia. Nos l imites d essa região, umaárea d el imitad a pel a Estátua d a Liberd ad e ao sul , o Queens a l este ,o Harl em ao norte e a outra margem d o r io Hud son, até Nova Jersey ,a oeste , os d anos são menores; c onstruç ões d e tijol os e mad eira fic amparc ial mente d estruíd as, enquanto os ed if íc ios d e aç o e c onc retosofrem pouc os d anos.

Fel izmente, boa parte d essa zona d e d estruiç ão está sobre a água,o que red uz o número d e vítimas. Na periferia d a zona atingid a,registram-se apenas al gumas mortes e c erc a d e tr inta mil pessoassofrem queimad uras graves. Entretanto, o c l arão provoc a c egueira emtod os os que estavam a menos d e tr inta quil ômetros d o l ugar ond e abomba expl od iu e que ol havam naquel a d ireç ão. Como a d etonaç ãoac ontec eu no sol o, o número d e c asos d e c egueira é bem menor d o quese a expl osão tivesse ac ontec id o a al gumas c entenas d e metros d eal tura.

Aind a não nos referimos à prec ipitaç ão rad ioativa. El a é muitomaior em uma expl osão no sol o d o que no c aso d e uma expl osão naatmosfera. Os d etritos rad ioativos retornam l entamente à Terra,formand o uma zona el íptic a d e c ontaminaç ão, c onc entrad a na partel este d e Manhattan e na parte oeste d o Queens e d o Brookl in , ond e,em um mês, 10% a 35% d a popul aç ão morre por exposiç ão àrad ioativid ad e.

Resumind o, a expl osão d e 150 quil otons d estruiria uma área d ec inquenta quil ômetros quad rad os, matand o mais d e oitoc entas milpessoas, fer ind o outras novec entas mil e c ausand o d anos resul tantesd os inc ênd ios provoc ad os pel a d estruiç ão d e tubul aç ões d e gás,d etritos em c hamas e gasol ina vazand o d os veíc ul os d estroç ad os(embora os d anos c ausad os pel o fogo em uma área urbana não sejamtão grand es quanto se a expl osão fosse em uma área rural ) . Pod emosc onc l uir que a c id ad e d e Nova York jamais rec uperaria a posiç ãoatual d e importante c entro financ eiro, c ul tural e c omerc ial d omund o.

Com essa história arrepiante c omo pano d e fund o, c abe apergunta: quais são as possíveis c onsequênc ias d e uma guerra nuc l earregional ou gl obal ? Vejamos al guns “mund os al ternativos” para teruma id eia d as possibil id ad es.

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ENQUANTO ISSO, DE VOLTA AO SÉCULO XXI

E NQUANTO ESCREVO ESTAS LINHAS , a imprensa internac ional notic ia quec omand antes mil itares israel enses ameaç am atac ar as instal aç ões d eproc essamento d e c ombustível nuc l ear d o Irã. Essa situaç ãoespec ífic a, no momento, parec e ser a forma mais provável d ed eflagrar uma guerra nuc l ear d e al c anc e l imitad o. Mas, c onformeveremos a seguir, a id eia d e “ l imites” , em se tratand o d e uma guerranuc l ear, beira o parad oxal . Na estrutura geopol ític a al tamentec onec tad a d e hoje , uma guerra l imitad a c om tod a a c erteza ac abariase transformand o em al go bem mais gl obal d o que os l íd eres pol ític osgostariam d e ad mitir. Eis um pequeno esboç o d e c omo essa esc al ad apod eria ac ontec er .

• Aumenta a bel igerânc ia d o Irã c ontra Israel . Os israel ensesl anç am um ataque aéreo às usinas d e enriquec imento d eurânio d o Irã c om armas c onvenc ionais.

• O Irã c ontra-atac a c om foguetes equipad os c om expl osivosc onvenc ionais, al ém d e ogivas químic as, biol ógic as erad iol ógic as.

• Israel respond e c om ataques nuc l eares c ontra o Irã e , a títu l od e prevenç ão, c ontra o Paquistão.

• Ind ignad o, o Paquistão retal ia c om um ataque nuc l ear a Israele , a títu l o d e prevenç ão, à Índ ia (al iad o d e Israel ) , querespond e na mesma moed a.

• Israel atac a as c apitais d e países árabes e muç ul manos e regiões“antissemitas” d a Europa e d a R ússia.

• Os c omand antes regionais d a Rússia l anç am um ataque nuc l earc ontra Israel , Estad os Unid os e os al iad os europeus d osameric anos. A Rússia também atac a a China, c omo med id apreventiva.

• Os Estad os Unid os atac am a Rússia e , a títu l o d e prevenç ão, asinstal aç ões nuc l eares c hinesas.

• A China usa as armas nuc l eares que restaram c ontra a Rússia,os Estad os Unid os e a Índ ia, que l anç am um c ontra-ataque emmassa.

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Este c enário, embora um tanto fantasioso, não é uma “ fic ç ãoapoc al íptic a” . Al iás, quem ac ha o roteiro ac ima “exagerad o” d eveexaminar a sequênc ia d e ac ontec imentos que c ul minou na PrimeiraGuerra Mund ial para mel horar sua fal ta d e visão e se c urar d e umaimaginaç ão preguiç osa. Isso não quer d izer que o que ac abei d ed esc rever seja provável . Na verd ad e, se ac ontec er al go d o gênero, osd etal hes c ertamente serão d iferentes. Mas apenas os d etal hes. Oresul tad o final provavel mente será o mesmo: um evento l oc altransformand o-se em uma guerra nuc l ear d e grand es proporç õesentre muitas ou tod as as potênc ias nuc l eares, c onhec id as ou não.

O c enário anterior mostra o efeito borbol eta em aç ão: um ataqueaparentemente l oc al izad o d e Israel às instal aç ões nuc l eares d o Irã,c om armas c onvenc ionais, rapid amente se transforma em uma guerranuc l ear gl obal . Em suma, uma pequena borbol eta batend o as asas emJerusal ém provoc a uma tempestad e d e fogo mund ial .

Na seç ão d e Notas e Referênc ias d este l ivro, o l e itor enc ontrarávários artigos e l ivros que se referem a situaç ões d esse tipo, queac abam gerand o guerras nuc l eares general izad as. Tod as c omeç amc om um c onflito l oc al ( Índ ia-Paquistão, China-Taiwan, Coreia d oNorte-Coreia d o Sul , Israel -Líbano/S íria, terroristas d esc onhec id osd e qual quer nac ional id ad e) que rapid amente foge ao c ontrol e , passaa envol ver muitas potênc ias nuc l eares e ac aba se tornand o umhol oc austo nuc l ear. Val e a pena c onsid erar essas situaç ões noc ontexto d as quatro formas princ ipais d e d ef l agraç ão.

Agressiva: Uma ou mais naç ões d ec id em usar armasnuc l eares c ontra naç ões não nuc l eares a fim d e atingiruma meta ec onômic a, pol ític a ou mil itar. Isso pod eoc orrer c omo parte d e uma guerra já em and amento ouc omo um ataque surpresa. (O país, natural mente, pod eal egar que o ataque foi uma med id a d e prevenç ão, umaretal iaç ão ou até mesmo um ac id ente.)Ac id ental : Como os Estad os Unid os e a Rússia d ispõem d eum “sistema d e retal iaç ão” c apaz d e l anç ar foguetesantes que um ataque nuc l ear seja c onc retizad o, qual quertensão entre as d uas potênc ias pod e l evar a uma guerranuc l ear d e grand es proporç ões menos d e meia hora apósum sinal d e al erta, mesmo que o sinal d e al erta sejafal so.

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Preventiva: Uma ou mais naç ões ac red itam (c om ou semrazão) ou d izem ac red itar que outra naç ão estád esenvol vend o armamentos nuc l eares, ou, no c aso d e umapotênc ia nuc l ear, que está pl anejand o util izar armasnuc l eares c ontra al vos mil itares, ind ustriais ou c ivis, ed ec id em exec utar um ataque preventivo. Essa posturapod e ser resul tad o d e uma d ec isão pol ític a ou mil itar d eforç ar uma guerra.R etal iatória: Uma naç ão ou grupo d e países usa armasnuc l eares em resposta a um ataque nuc l ear — ou mesmoc omo reaç ão a um ataque c onvenc ional c om armasexpl osivas, químic as ou biol ógic as por parte d e umanaç ão que não d ispõe d e armas atômic as.

Examinand o essa l ista d e possibil id ad es, fic o impressionad o aoc onstatar que é muito semel hante a uma l ista que eu pod eria ter feitona d éc ad a d e 1960, quand o trabal hava na R AND. Entretanto,existem também grand es d iferenç as entre os d ias mais tranquil osd aquel a époc a e os atuais. Apresento a seguir al gumas d as d iferenç asque tornam o mund o d e hoje muito mais c ompl exo e perigoso d o quenaquel es tempos fe l izes d e meio séc ul o atrás.

Ataques regionais: Muitas d as hipóteses pl ausíveis nosd ias d e hoje envol vem d isputas regionais que ac abamfazend o c om que as maiores potênc ias d o mund o entremem guerra. O c aso Israel -Irã d esc rito anteriormente é umexempl o perfeito, mas existem muitos outros, c omo Índ ia-Paquistão e Coreia d o Norte-Coreia d o Sul , paramenc ionar apenas d ois. É d if íc i l imaginar um c onflitoregional anál ogo na époc a d a Guerra Fria, c om exc eç ãod a c rise d os mísseis d e Cuba, c apaz d e c ul minar em umaguerra termonuc l ear mund ial .Ac id entes: Já observei que os ac id entes foramresponsáveis por grand e parte d os sustos re l ac ionad os aarmas nuc l eares d esd e seus primórd ios. Porém, c om oc ol apso d a União Soviétic a e c om um número c ad a vezmaior d e usinas nuc l eares sujeitas a d efeitos d e tod aord em, os ac id entes são, atual mente, um d os maiores

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perigos assoc iad os à rad ioativid ad e.Terrorismo: A simpl es menç ão d o termo “terrorista” nad éc ad a d e 1960 seria rec ebid a c om ol hares d eperpl exid ad e. Hoje, não é mais assim. As inúmerasfac ç ões terroristas em operaç ão no mund o inteiro, c ad auma c om seus próprios interesses, somad as às armasnuc l eares d esaparec id as d a ex-União Soviétic a e d eoutros l ugares, d eram l ugar a situaç ões d e perigototal mente novas, inexistentes na époc a d a Guerra Fria.Isso sem fal ar na id eia d e um “estad o fora d a l ei” , c omoa Coreia d o Norte , c om pod erio nuc l ear. Como jáexpl iquei, uma pequena d etonaç ão nuc l ear seriasufic iente para d eixar uma grand e c id ad e em ruínas — eprovavel mente d esenc ad ear uma guerra nuc l eargeneral izad a em resposta.Ataques “ III” : A superabund ânc ia d e materiaisrad ioativos prod uzid os em reatores nuc l eares aumentaem muito as possibil id ad es d e envenenar uma popul aç ãopel os c hamad os ataques d e Imersão, Ingestão e Inal aç ão.A morte d o ex-espião d a KGB Al exand er Litvinenko, quebebeu pol ônio 210 misturad o c om c há em um hotell ond rino em 2007, é um bom exempl o d esse tipo d eataque. De novo, muito pouc a atenç ão era d ad a a essetipo d e c atástrofe — ac id ental ou proposital — na époc ad a Guerra Fria.

À primeira vista, uma forma d e evitar um ataque nuc l ear seriatomar med id as para proteger a popul aç ão, mel horar a pontaria paraatingir os mísseis inimigos aind a no ar etc . Parad oxal mente, porém,a maioria d esses proc ed imentos, embora d estinad os a evitar umataque nuc l ear, faz c om que um ataque se torne mais provável .Inic iativas d esse tipo pod em ser vistas c omo aç ões que aumentam oprobl ema d a c ompl exid ad e em vez d e red uzi-l o. Antes d e enc errareste c apítul o, d isc utirei rapid amente al gumas id eias propostas e porque e l as ac abam enc orajand o um ataque, em vez d e preveni-l o.

Abrigos: Em minha ad ol esc ênc ia, na c osta oeste d osEstad os Unid os na d éc ad a d e 1950, l embro-me d e

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histórias d e pessoas que c onstruíram abrigos subterrâneosno quintal d e c asa para proteger a famíl ia no c aso d e umataque surpresa por parte d a União Soviétic a. Al gunsd esses abrigos privad os aind a existem hoje em d ia, masestão send o usad os, em geral , c omo ad egas ou d epósitos.Na époc a, porém, havia muita d isc ussão sobre apossibil id ad e d e o governo c onstruir grand es abrigosc apazes d e rec eber c entenas ou mil hares d e pessoas. Emprinc ípio, parec e uma boa id eia, mas se pensarmos bem,c hegaremos à c onc l usão d e que não é . Vejamos por quê.

Primeiro, a própria existênc ia d e abrigos d esse tipopod eria l evar os l íd eres d e um país a real izar um ataquesurpresa c ontra outro país, já que seus c id ad ãos estariamprotegid os c ontra a retal iaç ão. Al iás, os abrigos, por suaprópria natureza, ir iam c ontra o espírito d a “d estruiç ãomútua assegurad a” d a estratégia MAD. Da mesma forma,os l íd eres d e um país inimigo sem abrigos pod eriam se vertentad os a tomar a inic iativa d e um ataque, se ac hassemque estavam prestes a ser atac ad os. De qual quer forma, oc l ima psic ol ógic o mud a para pior se um l ad o c onstruirabrigos e o outro não. Argumentos semel hantes apl ic am-sea qual quer tipo d e sistema d e d efesa apoiad o emsatél ites, c omo a Inic iativa Estratégic a d e Defesaproposta pel o presid ente americ ano Ronal d Reagan nad éc ad a d e 1980. Evid entemente, se tod as as partesc onstruírem abrigos ou instal arem sistemas d e d efesa,ninguém ganhará nad a e tud o vol tará a ser c omo antes.Em termos d e c ompl exid ad e, entretanto, o que ac ontec e éque o l ad o que c onstrói abrigos está aumentand o ac ompl exid ad e, enquanto a c ompl exid ad e d o outro l ad opermanec e a mesma. Ou seja, a c onstruç ão d os abrigosaumenta a c ompl exid ad e total , fazend o c om que asituaç ão se torne mais perigosa que antes d a c onstruç ãod os abrigos. Guerra l imitad a: O c onc eito d e guerra l imitad a, d ed estruiç ão d entro d e uma área geográfic a espec ífic a, ébastante sed utor. A questão d o c hamad o ataque“c irúrgic o” c apaz d e d estruir o c entro d e c omand oad versário ou sua unid ad e d e prod uç ão d e armas,

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d eixand o tod o o resto intac to, é muito d isc utid a. Mas oc enário d esc rito al gumas páginas atrás envol viaexatamente um ataque d esses, d e Israel às instal aç õesnuc l eares d o Irã. Como vimos, esse tipo d e ataque pod e,d e uma hora para outra, virar uma guerra i l imitad a emvez d e “ l imitad a” . Estrategistas nuc l eares e pol ític osresponsáveis pel a d efesa foram c onsul tad os sobre o queseria nec essário para evitar que uma guerra l imitad a setransformasse em um c onflito general izad o. A respostafranc a que e l es d ão, já fora d o al c anc e d os mic rofones,c ostuma ser : “ Não faç o a menor id eia!” Portanto, é umgrand e r isc o fal ar d e uma guerra l imitad a supond o queel a pod e ser real mente c ontid a, sem se transformar emuma guerra nuc l ear gl obal .Mísseis prec isos: Muito próximo à id eia d e uma guerral imitad a está o c onc eito d e que, se tivéssemos mísseissufic ientemente prec isos para d estruir mísseis em seussil os subterrâneos em vez d e matar c ivis em suas c amas, aguerra l imitad a seria possível . O aperfeiç oamento d emísseis d esse tipo l eva à id eia d e l anç ar um ataquesurpresa em uma guerra nuc l ear “d e resul tad osgarantid os” . O argumento por trás d isso é que, aod ec apitar o inimigo c irurgic amente, sua c apac id ad e d eretal iaç ão fic aria tão prejud ic ad a que o c ontra-ataquec ausaria a morte d e “ apenas” al guns mil hões d e pessoas. Desarmamento parc ial : Al gumas pessoas ac red itam quel imitar o número d e armas ajud a a red uzir aprobabil id ad e d e um ataque, argumentand o que menosarmas signific am menos perigo. Afinal , c ad a ogivad esativad a representa um míssil a menos a ser l anç ad o.Na verd ad e, o argumento pod e ser usad o no sentid oinverso, já que l imitar o arsenal nuc l ear d e um país fazc om que outros países se vejam mais tentad os a d esfec harum ataque surpresa. A id eia é que, se um ataque surpresad estruir c erc a d e 90% d o arsenal ad versário, restarãopouc os armamentos para um c ontra-ataque. O jogo,portanto, favorec e quem agir primeiro. Se, por outrol ad o, a naç ão atac ad a d ispuser d e um arsenal muitogrand e, mesmo os 10% restantes serão sufic ientes para

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uma retal iaç ão efetiva.

SINTETIZANDO

GRAÇAS À COMBINAÇÃO DE fatores c omo a existênc ia d e um número c ad avez maior d e c onflitos regionais envol vend o potênc ias nuc l eares, agrand e possibil id ad e d e ac id entes c om muitos países possuind o ouinvestind o em armamentos e o c onstante perigo d e que um ou maisgrupos terroristas c onsigam pôr as mãos em artefatos“d esaparec id os” , a probabil id ad e d e um inc id ente nuc l ear no futuropróximo é bastante al ta. Na real id ad e, a verd ad eira surpresa é queisso não tenha ac ontec id o aind a, o que nos l eva à tr iste masinevitável c onc l usão d e que uma guerra nuc l ear d e grand esproporç ões c ontinua a ser um d os maiores perigos para ahumanid ad e.

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7

ESGOTAMENTO

O FIM DO SUPRIMENTO GLOBALDE PETRÓLEO

UM APERITIVO INTRAGÁVEL

E M INCIDENTE QUE A imprensa internac ional enc arou apenas c omo umpequeno abal o em sua inc essante busc a por manc hetessensac ional istas, motoristas d e c aminhão ital ianos bl oquearamestrad as e vias d e ac esso d as maiores c id ad es d a Itál ia em d ezembrod e 2007, em protesto c ontra os al tos preç os d a gasol ina e a c argahorária exc essiva. Embora os jornal istas enc arassem a greve c omomais um episód io d o sind ic al ismo à ital iana (ou seja, que nãomerec eria ser l evad o a sério) , uma ol had a nos bastid ores revel a fatospreoc upantes sobre a fragil id ad e d e uma d as estruturas que mais nosparec e garantid a no d ia a d ia.

No final d o segund o d ia d a greve, pl anejad a para d urar c inc od ias, sobravam apenas prod utos estragad os nos supermerc ad os d eMil ão a Nápol es. Carne, l e ite , frutas e vegetais haviam d esaparec id od as pratel eiras, l evad os por uma mul tid ão d e c onsumid ores quetambém se apod erou d e farinha, aç úc ar, manteiga e massas. Damesma forma, em muitos postos d e gasol ina viam-se c artazes c om oaviso “ sem c ombustível ” e l ongas f i l as d e l ambretas, c arros e vans nospostos que aind a estavam func ionand o. Os porta-vozes d a assoc iaç ãod e postos d e gasol ina informaram que 60% d os postos d o país seenc ontravam inativos e que até o d ia seguinte a maioria d os restantesseria fec had a.

“ Desd e ontem não temos nenhuma entrega” , c ontou Ruggero

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Giannini, gerente d e vend as d e um supermerc ad o d o c entro d e Roma.“ Estamos impotentes d iante d essa situaç ão.”

Em apenas d ois d ias, um país inteiro se viu paral isad o porquemotoristas d e c aminhão em greve d eixaram d e entregar os prod utosque tod o mund o jul ga que “estarão l á” . Outro ponto quase tãoinc rível foi a total fal ta d e interesse por parte d a imprensainternac ional em c obrir o oc orrid o. Imagine: um país d essaimportânc ia à beira d e uma paral isaç ão c ompl eta em apenas d oisd ias. E, ao mesmo tempo, as exc entric id ad es d e artistas e pol ític osempurram uma história d esse c al ibre para a página d e obituários. Oque está d e fato ac ontec end o?

Duas mensagens importantes d estac am-se nesse c aso d a greveital iana. A primeira é o aspec to just-in-time d e c ontrol e d e estoqued a c ad eia d e abastec imento d e merc ad orias c omo al imentos ec ombustível , d os quais a soc ied ad e d epend e no d ia a d ia. A segund a éaind a mais fatíd ic a: o papel fund amental d esempenhad o pel opetról eo para transportar esses prod utos d o l ugar ond e e l es sãoprod uzid os ao l ugar ond e são c onsumid os. A greve ital iana mostrac l aramente a fragil id ad e d essas infraestruturas e a funç ão c entral d opetról eo na d istr ibuiç ão d e prod utos à popul aç ão. O fato d e que anotíc ia foi quase ignorad a pel a míd ia revel a c omo a soc ied ad emod erna ind ustrial izad a já está ac ostumad a a c onsid erar ofunc ionamento d essas infraestruturas c omo al go natural . As pessoasparec em ac har que a c omid a para bebês, o tomate, o c igarro, o sabãoem pó, a c erveja e a gasol ina simpl esmente aparec em no posto d aesquina, c omo num passe d e mágic a. Basta ped ir. Mas e se essesprod utos não aparec erem? Essa é a questão d e vários tr il hões d ed ól ares.

Neste pequeno aperitivo sobre c aminhoneiros ital ianos, oingred iente princ ipal é o petról eo — a c ommod ity d as c ommod ities.Sem el e , nad a func iona na soc ied ad e mod erna d a maneira c omo el aestá estruturad a atual mente. Portanto, para entend er a magnitud ed a greve, prec isamos examinar mais d e perto a questão d e c omo osuprimento d e petról eo pod e ser interrompid o não só por umprobl ema temporário c om motoristas insatisfeitos, mau tempo oumanobras geopol ític as, mas d e mod o permanente.

LADEIRA ABAIXO

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E M 1996, O INSTITUTO AMERICANO d e Petról eo real izou sua reuniãoanual em San Antonio, Texas. Na pauta, havia uma pal estraintitul ad a “ Energia Nuc l ear e Combustíveis Fósseis” , a serapresentad a por M. King Hubbert, geof ísic o d o Centro d e Pesquisasd e Petról eo d a Shel l , em Houston. Embora os partic ipantes d ac onferênc ia não tivessem id eia d o que se esc ond ia por trás d aquel etítu l o tão vago, seus patrões sabiam muito bem. O d iretor geral d aShel l fic ou ao te l efone c om Hubbert pratic amente até o ú l timominuto antes d e e l e subir ao pód io, supl ic and o que e l e não fizesse aapresentaç ão e o ameaç and o. Mas Hubbert era um sujeito teimoso,que ac red itava em seu trabal ho, e assim, ignorand o as súpl ic as, d eua c onhec er o que hoje é c hamad o d e “ Teoria d o Pic o d o Petról eo” ,ou, mais informal mente, o “Pic o d e H ubbert” .

O que Hubbert afirmava era que a prod uç ão americ ana d epetról eo c hegaria a um pic o no iníc io d a d éc ad a d e 1970, al go queninguém d a ind ústria d o petról eo quis ouvir na époc a, nem querouvir agora. Seus estud os mostravam reservas finais d e d uzentosbil hões d e barris d e petról eo, uma c onstataç ão que c hamou a atenç ãod e tod os. Na verd ad e, a prod uç ão americ ana d e 1956 a 2000 foi umpouc o maior, d evid o à partic ipaç ão d o Al asc a e d os c ampospetrol íferos no Gol fo d o Méxic o. A d iferenç a, porém, é pequena, e oc urso geral d e prod uç ão aind a segue quase fiel mente a c urva d eHubbert. Hoje em d ia, a questão d o pic o d o petról eo foi l evad a aoutro patamar, c om muitos observad ores afirmand o que a prod uç ãomund ial atingiu seu pic o por vol ta d o ano 2000. Se essas previsões semostrarem tão prec isas quanto as d e Hubbert em rel aç ão à prod uç ãoameric ana, o mund o está prestes a sofrer um c ol apso em tod os osaspec tos d o que c hamamos vid a mod erna. Dessa forma, val e a penaentend er c omo Hubbert ac ertou nas previsões para os Estad os Unid ose qual a c onexão entre esse tipo d e previsão e a soc ied ad e gl obal .

A c urva d e prod uç ão d e grand es c ampos petrol íferos hoje em d ia ébastante c onhec id a. É uma c urva bem simétric a, c om el evaç ão d ec erc a d e 2% ao ano quand o o c ampo é novo e d ec l ínio simil ar após opic o d e prod uç ão. Assim, se a prod uç ão gl obal d e petról eo atingiu seupic o al guns anos atrás, o que pod emos esperar agora é um d ec l ínioanual na prod uç ão d e aproximad amente 2%.

No outro l ad o d a equaç ão está o c onsumo. Com o c resc imento d apopul aç ão mund ial e o apetite d os países em d esenvol vimento d o l estee d o su l d a Ásia por petról eo, estima-se que a d emand a gl obal suba

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também 2% ao ano nos próximos anos. Consid erand o os d ois l ad os d aequaç ão, temos uma d efasagem anual d e 4% que prec isa serresol vid a.

A forma rac ional d e sol uc ionar esse probl ema seria o merc ad od estinar o petról eo d isponível a quem prec isa, c om os países r ic ossubvenc ionand o os países pobres até se enc ontrarem al ternativas d ec ombustível . Mas os registros históric os não são a mel hor fonte ac onsid erar no que se refere a enc ontrar sol uç ões rac ionais paraprobl emas gl obais (ou, d e resto, qual quer outro probl ema) . Aoc ontrário, o mais provável parec e ser a oc orrênc ia d e al gum tipo d eevento X, al iviand o a tensão entre a oferta e a d emand a. Fal arei umpouc o a respeito d essas possibil id ad es d e bal anc eamento d ec ompl exid ad e mais à frente .

De um ponto d e vista puramente geof ísic o, Hubbert usouprinc ípios c onhec id os, referentes à formaç ão d o petról eo, ao tipo d eregião geol ógic a em que e l e d eve ser enc ontrad o e outraspropried ad es, juntamente c om estimativas (al guns d iriam “pal pites” )d e índ ic es d e c onsumo, reservas c onhec id as e c oisas semel hantes,c hegand o à c onc l usão d e que as reservas americ anas u l trapassariama metad e d o c aminho na d éc ad a d e 1970. Para efeitos prátic os, e l eestava c erto. Portanto, prognóstic os d e que as reservas gl obais d epetról eo atingiram seu pic o no ano 2000 têm profund as impl ic aç õesem c omo nossa vid a será na segund a metad e d este séc ul o.

S em nenhuma fonte al ternativa real mente viável d e suprimento d eenergia d iante d e um d ec l ínio na d isponibil id ad e d o petról eo,pod emos esperar um mund o muito d iferente . Uma grand e d iminuiç ãono número d e viagens d e l onga d istânc ia, a d eflagraç ão d e umaguerra internac ional para assegurar os rec ursos restantes, od esaparec imento d os subúrbios, o d efinhamento d a gl obal izaç ão e o(não menos importante) f im d a ec onomia d e c onsumo são al gumas d asc onsequênc ias prováveis d o esgotamento d e energia barata.Evid entemente, essas projeç ões se baseiam em hipóteses espec ífic asrel ativas à probabil id ad e d a d esc oberta d e novos grand es c ampospetrol íferos, ao d esenvol vimento d e tec nol ogias d e energiaatual mente d esc onhec id as e a c renç as sobre c omo as pessoas reagirãoa preç os d e energia astronômic os. Abord arei essas questões em breve.Por ora, examinemos a mel hor estimativa atual d e ond e nosenc ontramos hoje em termos d e reservas gl obais d e petról eo, c onsumoe a probabil id ad e iminente d e “esgotamento” .

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PODE ENCHER O TANQUE?!

NUM RECENTE JANTAR, MENCIONEI a questão d o pic o d o petról eo c om umamul her sentad a a meu l ad o. Devo d izer, l ogo d e c ara, que a talmul her era uma pessoa muito intel igente e tal entosa, c om muitasreal izaç ões profissionais em seu c urríc ul o. Por isso, fiquei um pouc osurpreso quand o, após ouvir meu “manifesto” sobre a iminentec atástrofe gl obal c ausad a pel o esvaziamento d as bombas nos postos,e l a d isse : “ Pensei que aind a tivéssemos quarenta anos pel a frente . Asfontes estão real mente sec and o?” Ora, mesmo se tivéssemos petról eopara mais quarenta, c inquenta ou até sessenta anos, o que importanão é o esgotamento d as fontes, mas sim se teremos petról eo sufic ientepara manter nossa ec onomia mod erna em func ionamento. E essemomento d e parad a ac ontec erá bem antes d e as bombas sec arem.

Col in Campbel l , geól ogo d a área d e petról eo e espec ial ista noassunto, util iza a seguinte anal ogia para expl ic ar a situaç ão: c erc ad e 70% d o c orpo d e um homem c omum, d e noventa quil os, é c ompostod e água. Isso signific a c erc a d e sessenta quil os d e água no c orpo. Seel e perd er nem que sejam apenas 10% ou 15% d essa água pord esid rataç ão, sofrerá um sério c ol apso orgânic o e se verá d iante d eoutras c onsequênc ias bem d esagrad áveis — provavel mente, até amorte . Ou seja, não é nec essário que o homem perc a tod a a água d eseu sistema para morrer. Uma pequena porc entagem já pod e l evar aoóbito. O mesmo val e para a soc ied ad e mod erna d o mod o c omo estác onfigurad a atual mente. A perd a d e uma pequena fraç ão nosuprimento d iário d e petról eo gl obal é mais d o que sufic iente parad eixar a soc ied ad e ind ustrial izad a d e hoje em sérios apuros. Comisso em mente, vejamos ond e o ponteiro d o med id or d o petról eo estános d ias d e hoje .

A primeira c oisa que prec isamos entend er é que ninguém sabe aoc erto a quantid ad e d e petról eo que aind a existe no sol o. Os paísesprod utores mentem c omo band id os a respeito d e suas reservas, poruma série d e motivos, bons e maus. Interesses c omerc iais e d osgovernos unem-se aos prod utores nessa farsa, pel as razões d e sempre:d inheiro e pod er . Mesmo c om essa l imitaç ão, há um c onsenso bastantegeneral izad o em rel aç ão ao ponto em que nos enc ontramos hoje emd ia.

De ac ord o c om um artigo d a Oil and Gas Journal , no final d e

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2005 as reservas mund iais d e petról eo eram d e 1,2 tr il hão d e barris,d os quais c erc a d e 60% se l oc al izavam em c inc o países: ArábiaSaud ita, Irã, Iraque, Kuwait e Emirad os Árabes Unid os. No outrol ad o d a bal anç a, o c onsumo total izava 84 mil hões d e barris por d ia,c om 47% nos seguintes países: Estad os Unid os, China, Japão, R ússia eAl emanha. No presente , o c onsumo está c resc end o a uma taxa d e 2%ao ano. Um bil hão d e barris, então, d ura aproximad amente d ozed ias. Fazend o os c ál c ul os, isso signific a tr inta bil hões d e barris porano. Portanto, mesmo que o c onsumo se estabil izasse na taxa d e hoje ,1,2 tr il hão d e barris na reserva ac abaria em quarenta anos —exatamente c omo minha c ompanheira d e jantar previra! Esse é ol imite máximo. Mas, d e ac ord o c om o argumento apresentad oanteriormente, o d a morte por d esid rataç ão, a soc ied ad e entraria emestad o terminal muito antes d e c hegar ao quad ragésimo ano, a menosque a razão entre oferta e d emand a mud asse d rastic amente.

No l ad o d a oferta, temos d uas possibil id ad es: a d esc oberta d e maispetról eo e/ou a util izaç ão d e al ternativas ao petról eo para ofornec imento d e energia. Evid entemente, a primeira opç ão não é umasol uç ão d e fato, pois só ad ia o momento d o ac erto d e c ontas. Namel hor d as hipóteses, ganhamos tempo para d esenvol ver a segund apossibil id ad e.

No l ad o d a d emand a, a únic a saíd a é red uzir o c onsumo. Emoutras pal avras, uma mud anç a rad ic al no esti l o d e vid a que asoc ied ad e oc id ental se ac ostumou a l evar nos ú l timos c em anos. Maisad iante, fal arei a respeito d as impl ic aç ões d essa mud anç a.

A questão d a oferta-d emand a oferec e um quad ro bastante c l aro d ec omo a c ompl exid ad e se re l ac iona c om o pic o d o petról eo. De uml ad o temos uma c resc ente c ompl exid ad e na soc ied ad e impul sionand oa d emand a, enquanto a c ompl exid ad e no l ad o d a prod uç ão semanteve fixa por d éc ad as. O resul tad o é um d esnível c ad a vez maisampl o. Como ac abamos d e fal ar, uma forma l ógic a d e d iminuir essed esequil íbrio é ambos os l ad os tomarem med id as nesse sentid o. Mas,repito, d epend er d e uma aç ão vol untária, sobretud o quand o envol ved iminuiç ão d e c ompl exid ad e d e um sistema muito c ompl exo, é c omoapostar na l oteria. A id eia d e red uç ão simpl esmente não faz parte d anatureza humana.

A questão d o pic o d o petról eo envol ve uma espéc ie d e eventoextremo em forma d e tortura c hinesa, ou seja, um enfraquec imentograd ual d a soc ied ad e, que se red uz a uma pál id a sombra d o passad o.

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Mas a morte rápid a também pod e ac ontec er se o suprimento d epetról eo for interrompid o d a noite para o d ia por um probl ema maisd ireto d o que o esvaziamento d o tanque — o mais provável é al gumtipo d e ac ontec imento geopol ític o ou um ataque terrorista no OrienteMéd io. Vimos anteriormente que mais d e 60% d e tod as as reservas d epetról eo se enc ontram sob as areias d e uns pouc os países bastanteinstáveis na região d o Gol fo Pérsic o. Não seria d e espantar, então,que uma pequena faísc a em al gum d esses l ugares d esenc ad easse umaterrível reaç ão em c ad eia no mund o inteiro. Vejamos al gumashipóteses possíveis.

RÁPIDO E NÃO TÃO RASTEIRO

U MA RÁPIDA CONSULTA NO Googl e revel a quase tantas situaç ões parauma c rise d o petról eo no c urto prazo quanto c omentários sobreenergia, pic o d e petról eo e opç ões d e energias al ternativas. Aqui,apresento quatro c enários bastante pl ausíveis, c om a gama d epossibil id ad es d ec orrentes d e uma c rise petrol ífera. Gostaria d efr isar que não estamos fal and o d e previsões. O que ac ontec erác ertamente será muito d iferente . Porém, c omo tod o bom c enário, assituaç ões d esc ritas a seguir apresentam forte semel hanç a c om o queprovavel mente oc orrerá nos próximos anos (ou d ias) .

Cenário I: Guerra c ivil na Arábia Saud ita: Os d oisl oc ais mais sagrad os d a rel igião isl âmic a sunita, asmesquitas d e Mec a e Med ina, são atingid as d e surpresapor bombas nas primeiras horas d a manhã. Emboraninguém assuma a responsabil id ad e pel os atentad os,autorid ad es sunitas e a popul aç ão wahabita na ArábiaSaud ita imed iatamente atribuem os ataques àc omunid ad e xiita e c ontra-atac am d estruind o grand esmesquitas ad versárias, o que d á iníc io a umasanguinol enta guerra c ivil que se preparava paraexpl od ir havia d éc ad as.

A famíl ia real saud ita foge d o país, após notíc ias d erebel iões por tod a a c apital , R iad . Nesse ínterim, o preç od as aç ões em Wal l S treet c ai mais d e 5% antes d e a bol sa

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ser temporariamente fec had a. Na bol sa d e merc ad oriasNYMEX, o preç o d o petról eo bruto d ispara para mais d evinte d ól ares o barril pouc os minutos após notíc ias sobrea interd iç ão d e tod o o c arregamento d e petról eoproveniente d a Arábia S aud ita.

Os tumul tos d e R iad espal ham-se por tod o o país,c hegand o também aos países viz inhos Kuwait, Omã eEmirad os Árabes Unid os. Mais tard e, um grupo xiitarad ic al assume responsabil id ad e pel o atentad o nomomento em que o Iraque entra no c onflito. A pol íc ia eas forç as armad as iraquianas c ontribuem para od erramamento d e sangue. Em pouc os d ias, o OrienteMéd io inteiro está em c hamas, e a prod uç ão d e petról eo éred uzid a a quase zero.Cenário II: Irã nuc l ear : Após unid ad es xiitas em Basrad ec l ararem sua ind epend ênc ia d e Bagd á, o Irã busc aproteç ão para seus irmãos re l igiosos formand o umac oal izão Irã/Iraque xiita, visand o ao c ontrol e d opetról eo d o Gol fo Pérsic o. A c oal izão invad e o Kuwait ea Arábia Saud ita, apod erand o-se d o porto d e Dhahrannos d ez primeiros d ias d e uma grand e c ampanha. Maisao sul , o Irã toma posse d o estreito d e Ormuz,interrompend o 40% d o envio marítimo d e petról eo d omund o, al ém d e bl oquear o Canal d e Suez c omembarc aç ões terroristas e c onquistar o Bab el -Mand eb(estreito que separa os c ontinentes d a Ásia e d a Áfric a) ,no extremo sul d o mar Vermel ho.

Depois d e c onc l uir c om suc esso seu programa nuc l eard e armamentos, o Irã ameaç a usar seu pod erio c aso osEstad os Unid os intervenham na d efesa d e seus al iad os d oGol fo. Quand o os americ anos util izam seus mísseisbal ístic os em ataques aéreos para d esativar os sistemas d el anç amento c onvenc ionais d o Irã, uma arma nuc l ear él anç ad a e o princ ipal terminal d e envio d e petról eo d eR as Tanura, na Arábia S aud ita, é d estruíd o.

Temend o que o Irã introd uza sec retamente umartefato nuc l ear em seu território, os Estad os Unid osempreend em um ataque preventivo “ l imitad o” , c om oobjetivo d e l iquid ar as armas iranianas d e d estruiç ão em

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massa que sobraram.Com o bl oqueio d o estreito d e Ormuz, a d estruiç ão d o

princ ipal porto d e envio d e petról eo d e Ras Tanura e ad etonaç ão d e armas nuc l eares c omo se fossem fogos d eartif íc io no Quatro d e Jul ho, a situaç ão fornec e muitosel ementos para c riar uma grand e interrupç ão nosuprimento d e petról eo bruto e um c onsequente aumentogigantesc o d os preç os.

Um aspec to interessante d esse c enário é que e l e já foiestud ad o à exaustão pel os estrategistas d o Pentágonod urante a ad ministraç ão Cl inton, nos id os d a d éc ad a d e1990. Naquel a époc a, os anal istas c onc l uíram que,mesmo se os iranianos tivessem d e vinte a tr inta armasnuc l eares e pud essem exec utar um ataque surpresa a seusviz inhos d o Gol fo, somente a “ irrac ional id ad e” d al id eranç a iraniana justific aria o uso d essas armas. Deac ord o c om os c ompênd ios d e estratégia, “os l íd eres d oIrã, d entro d esse c enário nuc l ear, ser iam fortementeinfluenc iad os por motivos re l igiosos e nac ional istasc apazes d e superar os c ál c ul os rac ionais” . Isso foi em1992. H oje em d ia, quem sabe?Cenário III: Furac ão Houston e al -Qaed a: Durante oauge d a temporad a d os furac ões no Gol fo d o Méxic o,uma grand e tempestad e atinge as refinarias d e petról eod o Texas e d a Louisiana, interrompend o por tempoind eterminad o a prod uç ão d e gasol ina, ól eo d iese l ,l ubrific antes e outros d erivad os d o petról eo. Ao mesmotempo, os terroristas d a al -Qaed a d estroem grand e parted a infraestrutura d e prod uç ão d e petról eo, c omo noCenário I. Em pouc os d ias, o preç o d o petról eo tr ipl ic a.

Aproveitand o a situaç ão, a Venezuel a e o Irãal imentam c rises já existentes em seu país, aumentand oaind a mais a pressão sobre os preç os d o petról eo. Um oud ois d ias d epois, pequenos c onflitos em d iversas partes d omund o ac abam se transformand o em guerrasgeneral izad as, numa tentativa d esesperad a d e obterpetról eo a qual quer c usto.

Os c onsumid ores nos Estad os Unid os entram em ummomento d e pânic o e ac umul aç ão, c om a paral isaç ão d o

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sistema d e transportes, quebra d o merc ad o d e aç ões erebel iões em Nova York e outras c id ad es importantes d osEstad os Unid os. A ec onomia d o país fic a d esped aç ad a.Quand o as l inhas d e abastec imento soc ial just-in-timeentram em c ol apso, instaura-se uma d epressão gl obal .Pol ític os, l íd eres ec l esiástic os e outros espec ial istas nãotêm a mínima id eia d o que real mente está ac ontec end o ese mostram impotentes d iante d os motins e os saques queoc orrem o d ia inteiro — o que só serve para agravar oc ontexto d e esc assez .

Esse c enário segue o roteiro d e uma situaç ãoapresentad a num espec ial d a CNN no primeiro semestred e 2006. E não estamos fal and o d e uma fantasia, frutod a imaginaç ão férti l d a míd ia. Os furac ões real menteac ontec em, e ac ontec em exatamente na região ond e quasetod os os prod utos d erivad os d o petról eo são refinad ospara o merc ad o americ ano. Outro fato inegável a serc ontabil izad o é o oportunismo d os grupos terroristas, e asinergia d e pegar c arona num “ataque” d a natureza éuma oportunid ad e boa d emais para d eixar passar .

Outro fato, aind a, é que a ec onomia mund ial c onsisteem uma d ensa red e d e infraestruturas fortementeinterc onec tad as — uma red e bastante frágil , sustentad apel o petról eo. Se o petról eo d eixar d e existir, o pânic opod e espal har-se pel o mund o mais rápid o que umasínd rome respiratória, a gripe aviária ou qual quer outrotipo d e epid emia biol ógic a. Seria c omo uma epid emia d einformaç ão, infec tand o bil hões d e pessoas no mund ointeiro em pouc os d ias. Cenário IV: Uma c oal izão no l ad o d o suprimento: Maiod e 2014: o preç o d o petról eo u l trapassou os c em d ól arespor barril , uma vez que o Irã e a Venezuel a c ortaram asexportaç ões d e mais d e setec entos mil barris para puniros países d esenvol vid os d o Oc id ente pel a imposiç ão d esanç ões. Nesse meio-tempo, as forç as armad as d os Estad osUnid os estão se preparand o para d esl oc ar tod a a suafrota d o Pac ífic o para a região d o Gol fo Pérsic o, a fimd e c ombater ameaç as aos c ampos petrol íferos d o OrienteMéd io.

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De repente c hegam d e Baku notíc ias d e que sabotagensno Azerbaijão bl oquearam os c ampos d e petról eo d e l á, oque signific a um mil hão d e barris por d ia a menos nal inha d e suprimento mund ial . O preç o d o petról eod ispara imed iatamente para mais d e 115 d ól ares obarril , os merc ad os d e aç ões entram em qued a l ivre e ac onfusão impera em Washington, enquanto os pol ític ostentam resol ver a situaç ão.

O sec retário d e Energia d os EUA sugere ao presid enteque util ize parte d a Reserva d e Energia Estratégic a parared uzir a pressão sobre o abastec imento d e gasol ina. Opresid ente c onsid era a possibil id ad e, junto c om aal ternativa d e c onservaç ão c ompul sória pel a red uç ão d osl imites d e vel oc id ad e e outras med id as para d iminuir otráfego d e veíc ul os. As forç as armad as argumentam que opetról eo d a reserva d eve ser guard ad o para uma possívelaç ão no Oriente Méd io, enquanto l íd eres d o Congressoafirmam que não ac eitarão a l imitaç ão d e c onsumoc ompul sória. Inc apazes d e d esl oc ar pod er mil itar para aÁsia Central , as forç as armad as americ anas sãoobrigad as a ad otar a pol ític a d e “espere para ver” .

Um avanç o rápid o d e três meses para agosto d e 2014.A situaç ão está muito pior. Uma usina sec reta d eenriquec imento d e urânio é d esc oberta no Irã,c onfirmand o sua intenç ão d e d esenvol ver armasnuc l eares. Os Estad os Unid os e Israel impõem sanç õesaind a mais estr itas. Em reaç ão, o Irã e seu país vassal o,a Venezuel a, ameaç am interromper a prod uç ão d epetról eo, fazend o os preç os d o prod uto d ispararem para150 d ól ares o barril .

O presid ente americ ano marc a uma reunião d e ú l timahora na sal a d e c omand o d e emergênc ia d a Casa Branc a,sem ver uma al ternativa viável à imposiç ão d e med id asd e c onservaç ão. El e sabe que não há c omo amenizar ogol pe ec onômic o e pol ític o d e um barril d e petról eo ad uzentos d ól ares. Consel heiros l embram que apl ic ar maissanç ões ao Irã surtirá pouc o efeito, uma vez que o al topreç o d o petról eo e a fal ta d e suprimento só estimul am asnaç ões prod utoras a d iminuir a prod uç ão. No l ad o

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mil itar , a únic a saíd a parec e ser d esl oc ar tod a a frota d oPac ífic o para o Oriente Méd io, c ed end o, d essa maneira,o c ontrol e d o Pac ífic o à China. No final d a reunião, opresid ente c onstata: “ Estamos enfrentand o uma ameaç amortal ao nosso esti l o d e vid a aqui.”

A situaç ão se baseia numa simul aç ão c riad a pel aSec uring Americ a’s Future Energ y e pel o BipartisanPol ic y Center em 2007, envol vend o d iversos ex-assessorespresid enc iais c om profund o c onhec imento a respeito d eassuntos d e seguranç a nac ional e experiênc ia em rel aç ãoàs maquinaç ões pol ític as d e Washington. O resul tad o d oexerc íc io d e um d ia d emonstrou a inc apac id ad e d asforç as armad as americ anas d e projetar seu pod er emd iversas regiões d o pl aneta simul taneamente, al ém d apossibil id ad e d e que países menores d esestabil izem oequil íbrio pol ític o e espec ial mente o ec onômic o d omund o.

SINTETIZANDO

VAMOS RESUMIR A SITUAÇÃO. Temos d ois pavios, um c urto e um l ongo,ambos c ond uzind o à mesma bomba: a c r ise d o petról eo e ac onsequente extinç ão d o “ Homem Petrol ífero” . O pavio l ongo é oc enário d o pic o d o petról eo, em que o petról eo barato e d e fác ilac esso se torna c ad a vez mais esc asso e c aro. Esse c enário envol veapenas motivos geol ógic os (o petról eo é um rec urso natural l imitad o)e a c obiç a humana (uma d emand a insustentável ) . Uma versão maisc urta, que nos l evaria d e vol ta a um esti l o d e vid a med ieval , tem oc omponente extra d e uma c atástrofe natural (um furac ão ou vul c ão)e/ou d a intervenç ão humana, c omo um ataque terrorista. Em ambosos c asos, não d urará mais d o que três d éc ad as para o “ HomemPetrol ífero” sair d e c ena — esperneand o, c l aro —, mas sem d eixard e existir .

Diante d esses c enários, a primeira c oisa que qual quer pessoa d ejuízo d everia perguntar (e pergunta) é : O que pod e ser feito? O queeu e /a soc ied ad e pod emos fazer para imped ir essa possibil id ad e d e“extinç ão” ? A resposta c urta é : nad a. O inexorável maquinário d eum evento extremo já foi ac ionad o, no iníc io d o séc ul o passad o,

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époc a em que o motor movid o a gasol ina substituiu seu c onc orrentemovid o a vapor. O gol pe d e miseric órd ia foi d ad o após a Segund aGuerra Mund ial na mal fad ad a experiênc ia d e viver o “sonhoameric ano” : subúrbios. S im, voc ê também pod e ter tud o — morar noc ampo e trabal har na c id ad e. O grand e d ispênd io d e rec ursos —energia e d inheiro — d estinad o ao d esenvol vimento d e estrad as,shopping c enters, c aminhões d isfarç ad os d e c arro (S UVs) e afins,nec essários para sustentar esse “sonho” , c ertamente c hegará ao fimc omo o maior d esperd íc io d e rec ursos d a história d a humanid ad e, oel emento que fal tava para se l ar o tr iste d estino que enfrentamos hojeem d ia.

Al guém me perguntou se eu ac hava que era um bom momento parac omprar uma c asa à base d e energia sol ar. Respond i que George W.Bush, Dic k Cheney e Al Gore, tod os possuem c asas c om equipamentosd e energia sol ar d e ú l tima geraç ão. A resid ênc ia d e Bush foi d esc ritac omo “a c asa d os sonhos d e um ambiental ista” , enquanto a d eCheney d ispõe d e mod erníssimos d ispositivos d e c onservaç ão d eenergia, instal ad os por… Al Gore! Será que e l es sabem al guma c oisaque voc ê não sabe?

Vol tand o à questão referente ao que fazer, há um monte d epequenas aç ões que c ad a ind ivíd uo pod e real izar que refleteminc rivel mente muitas d as med id as que os ambiental istas d efend em háanos, d esd e a simpl es autoed uc aç ão em rel aç ão a qual é a naturezad o probl ema até a red uç ão pessoal d o c onsumo d e c arne (que é umtipo d e al imento intensivo em energia) . Voc ê também pod e aprend era exec utar proc ed imentos méd ic os d e emergênc ia e c omeç ar a pensarem c omo sobreviverá em c aso d e apagões, fal ta d e c omid a e d e água,c rises ec onômic as e c ol apso d as infraestruturas soc iais em geral .

Examinemos mais d e perto os d ois tipos d e pavio — o l ongo, d opic o d e petról eo, e o c urto, d e um ataqueac id ental /natural / terrorista, para ter uma id eia d e oportunid ad ed as c oisas. Primeiro, o pavio l ongo.

De ac ord o c om estud os real izad os por pesquisad ores re l ativamenteimparc iais (ou seja, profissionais que não são empregad os, d iretos ouind iretos, d a ind ústria petrol ífera, d a Organizaç ão d os PaísesExportad ores d e Petról eo, d e agênc ias d e energia nac ionais ouinternac ionais, d e grupos d e aç ão pol ític a e outros grand esc ontratad ores) , há um c onsenso bastante c l aro d e que a prod uç ão d epaíses fora d a OPEP atingirá seu pic o até mead os d a d éc ad a,

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aproximad amente em 2015. O pic o mund ial d epend e total mente d asituaç ão d a OPEP.

Se as reservas d a OPEP forem maiores d o que a previsãoc onsensual d os prognostic ad ores objetivos, o pic o gl obal pod e serad iad o para 2020-2025. Se as reservas d o Oriente Méd io estiverempróximas d as hipóteses previstas usad as em mod el os, o pic o seráal guns anos antes. De qual quer maneira, isso não importa muito,porque estamos fal and o d e pouc os anos. Se as c oisas c ontinuaremc omo estão, ou seja, se o governo não d eixar d e c onversa-fiad a parapassar a tomar med id as efetivas, esses pouc os anos não farãod iferenç a. No c ômputo geral , portanto, a expl osão d a bomba d e paviol ongo ac ontec erá d aqui a d ez , vinte anos.

No c aso d o pavio c urto, a pergunta é : o que estamos c hamand o d ec urto? Curto pod e ser amanhã ou até mesmo hoje . Nem tod os osinterval os d e tempo, porém, são igual mente prováveis. O maispossível é que aind a tenhamos pavio para al guns anos, tal vez d ois outrês. Mas o pavio pod e queimar inteiro a qual quer momento.

Não d eixa d e ser irônic o que a gama d e c atástrofes d ec orrentes d ac rise d o petról eo possua uma inc rível semel hanç a c om as c atástrofesapresentad as pel o Cl ube d e Roma em seu estud o d e 1972, Limites d oc resc imento. Na époc a, l embro-me d e ter c omparec id o a muitassessões d o Instituto Internac ional d e Anál ise d e S istemas Apl ic ad os,na Áustria, ond e eminentes ec onomistas, mod el ad ores d e sistemas,d emógrafos e outros estud iosos rec haç aram tais previsões,c onsid erand o-as equivoc ad as. Em d efesa d o Cl ube d e Roma, o que foirejeitad o não foram as previsões em si , mas a base metod ol ógic autil izad a pel os pesquisad ores para c hegar a suas c onc l usões.

A princ ipal c onc l usão d o rel atório d o Cl ube d e Roma foi que oc resc imento exponenc ial d a popul aç ão e o c onstante c onsumo d eenergia prec ipitariam o c ol apso ec onômic o gl obal , ac ompanhad o d efome general izad a. A c rise tomaria a forma d e esc assez d e rec ursosc omo energia, al imento, água e/ou pol uiç ão d o meio ambiente, aponto d e tornar o pl aneta um l ugar inabitável . Val e a pena c itar umtrec ho d esse trabal ho:

Se as tend ênc ias atuais d e c resc imento d a popul aç ão mund ial ,ind ustrial izaç ão, pol uiç ão, prod uç ão d e al imentos eesgotamento d e rec ursos permanec erem inal terad as, os l imitesd emográfic os d este pl aneta serão atingid os nos próximos c em

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anos. O resul tad o mais provável d isso será um d ec l íniorepentino e inevitável d a popul aç ão e d e sua c apac id ad eind ustrial .

Ambos os pavios estão queimand o, refletind o a prec isão d oprognóstic o. É uma pena que a humanid ad e não tenha d ad o ouvid osao al erta em 1972, pois al go pod eria ter sid o feito para d esviar essetrem d esc ontrol ad o quand o e l e aind a estava l onge d e se c hoc arc ontra a estaç ão.

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8

É DE DOER

UMA PANDEMIA GLOBAL

MONSTROS À PORTA

EM A PESTE, ROMANCE existenc ial ista d e 1947, o esc ritor Al bert Camuspinta um quad ro emoc ionante d e profissionais d e saúd e que se unempara c ombater um surto d e peste bubônic a. A história transc orre nac id ad e portuária argel ina d e Oran, e os personagens abrangem umaampl a faixa d a vid a d iária, entre méd ic os, fugitivos e re l igiosos,tod os forç ad os a enfrentar a questão d a c ond iç ão humana e d osc apric hos d o d estino, tema bem ao gosto d o autor. A c onc l usão d essasd iferentes pond eraç ões parec e ser que os seres humanos têm, namel hor hipótese , uma il usão d e c ontrol ar seu d estino e que, emúl tima anál ise , a irrac ional id ad e governa os ac ontec imentos. A pesteé o re l ato d e um evento tão d istante d as expec tativas razoáveis d aexperiênc ia normal — d e c omo a vid a d everia ser — que oc onsid eramos simpl esmente… um absurd o, que era c omo Camusd esc revia o c onflito entre o que os seres humanos nostal gic amenteesperam d a existênc ia e as real id ad es d e nosso mund o quixotesc o,imprevisível , inc rível . Em outras pal avras, a peste d e Camus é umevento X.

A peste é um d entre numerosos re l atos fic tíc ios sobre umaepid emia e seus e feitos no c otid iano d e uma grand e popul aç ão. Atrama básic a d a história d e Camus é que mil hares d e ratos c omeç ama morrer sem que os morad ores d e uma c id ad e perc ebam. Logo umjornal l oc al re l ata esse fenômeno aparentemente estranho e umahisteria em massa se d esenvol ve na popul aç ão. Num esforç o bem-

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intenc ionad o mas trágic o para ac al mar a histeria, as autorid ad espúbl ic as rec ol hem tod os os ratos mortos e os queimam, c riand o assimum c atal isad or que, na verd ad e, ac aba promovend o a d isseminaç ãod a peste . Após uma série d e d isc ussões pol ític as sobre quais aç õestomar, a c id ad e entra em quarentena, o serviç o postal é suspenso eaté os serviç os te l e fônic os e te l egráfic os se restr ingem às mensagensessenc iais. Como essa ú l tima med id a c ontribui para c onter a d oenç apermanec e um mistério, mas c om c erteza ac entua a sensaç ão d eisol amento d a popul aç ão d a c id ad e.

À med id a que a mol éstia se espal ha, as pessoas ac abam abrind omão d e suas preoc upaç ões ind ivid uais mesquinhas e se ajud ammutuamente para sobreviver. Enfim a peste se extingue, e a vid avol ta ao normal . As pessoas retomam seus afazeres d iários e aospouc os a rotina se instal a, sobrepujand o a sensaç ão d e “absurd o”revel ad a pel a peste . E assim por d iante.

Na époc a d e Camus, era re l ativamente fác il c onfinar uma d oenç aa uma região geográfic a d eterminad a, pois as pessoas não voavampara passar um fim d e semana d o outro l ad o d o gl obo nas Il hasSey c hel l es, nem c ompravam no seu merc ad o l oc al c omid a quec omeç ou o d ia em outro c ontinente. Mas, no mund o atual , a pested el inead a por Camus c om c erteza não se c onfinaria aos l imites d eOran e rapid amente se espal haria para a Europa c ontinental e d al ià Ásia e/ou Améric a d o Norte e /ou Áfric a d o Sul e /ou… Pretend oneste c apítul o examinar a possibil id ad e d o aparec imento d e umad oenç a c omo essa e as c hanc es que e l a teria d e d iz imar c entenas d emil hões d e pessoas (ou mais) antes d e ser c ontid a.

Essa história d e c omo a peste se espal hou na Argél ia fornec e umal iç ão sobre c ompl exid ad e, pel a forma c omo os e l ementos ind ivid uaisd a história — as aç ões tomad as pel os d iferentes setores d aad ministraç ão d a c id ad e e d a popul aç ão — se c ombinam paraprod uzir e feitos “emergentes” , c omo queimar os ratos, o que naverd ad e c ontribui para a d isseminaç ão d a peste , em vez d e c ontê-l a.Portanto, o que real mente torna essa d oenç a um evento X gerad o pel ac ompl exid ad e não é sua irrupç ão em si , mas a forma c omo os sistemashumanos interagiram para exac erbar o número d e mortes, em vez d ered uzi-l o.

Antes d e zarparmos nessa viagem pel o mund o d os vírus, bac tériase outras c oisas nojentas, perigosas e infec c iosas, quero esc l arec er aterminol ogia que vou usar neste c apítul o.

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Inc id ênc ia: O número d e c asos novos d e uma d oenç a queaparec em em uma d ad a popul aç ão num períod o d e tempoespec if ic ad o.Epid emia: Uma inc id ênc ia exc essiva e re l ac ionad a d euma d oenç a espec ífic a ac ima d o que é normal para umad ad a popul aç ão. Por exempl o, a peste d e Camus foi umaepid emia.Pand emia: Uma epid emia que se espal ha al ém d e umd ad o c ontinente e se torna um probl ema general izad o. Aaid s atual mente é uma pand emia. End emia: Uma d oenç a c om uma taxa d e inc id ênc iabásic a re l ativamente baixa, mas não nec essariamentec onstante. A gripe c omum é a d oenç a end êmic a maistípic a em pratic amente qual quer popul aç ão.

Com essas d efiniç ões à mão, vemos que as epid emias, e até aspand emias, estão l onge d e ser um fenômeno novo. El as existem d esd eque a humanid ad e c omeç ou a c aminhar no pl aneta. E nãod esaparec erão tão c ed o. Para d ar uma id eia c onc reta, e is uma l istad e al guns d os surtos mais agressivos e mortais d essas d oenç as nosúl timos d ois mil ênios.

A Peste Antonina (165-180) : Um surto supostamente d evaríol a que d iz imou Roma por mais d e uma d éc ad a,matand o c inc o mil pessoas por d ia em seu apogeu.Número estimad o d e mortes: c inc o mil hões. A Peste d e Justiniano (541-750) : Provável pestebubônic a, na área oriental d o Med iterrâneo. A d oenç ac omeç ou no Egito e l ogo atingiu Constantinopl a, Europae Ásia. De ac ord o c om os c ronistas d a époc a, c hegou amatar d ez mil pessoas por d ia em Constantinopl a.Número estimad o d e mortes: entre um quarto e metad ed a popul aç ão humana nas áreas ond e esteve ativa.A Peste Negra ( séc ul os XIV, XV e d epois) : Uma pand emiad e peste bubônic a na Europa, no Oriente Méd io, naChina e na Índ ia. Número estimad o d e mortes: c emmil hões num períod o d e d uzentos anos. Gripe Espanhol a (1918-1919) : Quase c ertamente a

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pand emia mais mortal d a história. Dizem que c omeç ouem Haskel l County , Kansas, send o d epois transmitid apel o movimento d os sol d ad os no final d a PrimeiraGuerra Mund ial . Número estimad o d e mortes: c emmil hões. Ao c ontrário d a Peste Negra, que fez suasvítimas ao l ongo d e séc ul os, a Gripe Espanhol a d iz imouum número semel hante em apenas seis meses. Para pôressa c ifra em perspec tiva, já que a popul aç ão mund ialagora é c erc a d e quatro vezes maior d o que em 1918, amesma d oenç a c om o mesmo nível d e l etal id ad e atingiriaatual mente mais d e 350 mil hões d e pessoas no mund ointeiro. Aid s (1981-hoje) : Provavel mente um vírus que “sal tou”d e espéc ie , d os mac ac os para os humanos, na Áfric a,al gumas d éc ad as atrás. Número estimad o d e mortes: 25mil hões e c ontinua a aumentar.

Este re l ato pod eria ser muito ampl iad o, mas uma c oisa está c l ara:as epid emias e seus parentes mais perversos, as pand emias, merec emseu posto c omo um d os Quatro Caval eiros d o Apoc al ipse . Porém, al ista anterior é apenas um resumo.

Seria possível ind agar d e ond e vieram essas d oenç as assassinas ese e l as existem d esd e que os organismos vivos rastejaram para fora d oc al d o primord ial . De ac ord o c om trabal hos rec entes d e NathanWol fe , Cl aire Dunavan e Jared Diamond , as grand es d oenç ashumanas são d e origem rel ativamente rec ente . Na maioria, surgiramsomente após o iníc io d a agric ul tura. Esses trabal hos id entific amd iversos estágios pel os quais um patógeno que original mente infec taapenas animais c onsegue evol uir e infec tar exc l usivamente sereshumanos. O ponto princ ipal d essas pesquisas para nós é que d oenç asque l evam a epid emias pod em surgir d e fontes que original mente nãotêm nenhuma rel aç ão c om os humanos.

Para entend ermos as probabil id ad es d e outra peste assassina,prec isamos d e mais informaç ões não apenas sobre c omo essas infec ç õesc omeç am, mas também sobre c omo se espal ham por uma popul aç ão.Para isso, examinemos c omo uma peste mod erna, a febre Ebol a,evol uiu mais ou menos no d ec orrer d o úl timo quarto d e séc ul o.

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MESMA HISTÓRIA, NOVO ELENCO

EM 1976, M ABAKI L OKELA era um professor d e 44 anos d e uma esc ol ano Zaire. Ao vol tar d e uma viagem ao norte d o país no f inal d o verãod aquel e ano, ad oec eu c om febre al tíssima. Durante a semanaseguinte , pôs-se a vomitar e a sangrar pel o nariz , pel a boc a e pel oânus. Morreu menos d e uma semana d epois. Na époc a, ninguém soubed eterminar a c ausa d e sua morte , embora e l e se ja c onsid erad o hoje aprimeira vítima d o que agora d enominamos febre ebol a.

Logo após a morte d e Lokel a, mais d e trezentos outros pac ientesc omeç aram a manifestar os mesmos sintomas. A grand e maioriamorreu em pouc as semanas. Assim, a febre ebol a c hegou aos rad aresd a c omunid ad e méd ic a internac ional c omo tal vez a d oenç a maisvirul enta a infec tar seres humanos.

Trinta anos d epois d o primeiro surto, sua origem prec isa aind a éobsc ura, embora al guns ind íc ios apontem para morc egos frugívorosc omo transmissores. O que se sabe é que a d oenç a migrou d a se l vaafric ana para a periferia d e Washington, D.C., em 1989, e umaequipe mil itar sec reta d a S WAT d e sol d ad os e c ientistas foimobil izad a para imped ir que o vírus irrompesse na c apital d a naç ão.

O que é prec iso para um patógeno c omo o ebol a se espal har poruma popul aç ão? E quais são os sinais d e al erta que d evemos proc urarpara id entif ic ar uma epid emia a c aminho?

O primeiro ponto a observar é que, quand o se trata d e d oenç asinfec c iosas, nem tod as as pessoas são iguais. Al gumas estão genétic a esoc ial mente mais bem posic ionad as para transmitir a d oenç a d o queoutras, c om sistemas imunol ógic os c apazes d e tol erar a d oenç a em seuestágio infec c ioso por tempo sufic iente para transmiti-l a antes d esuc umbirem ou se rec uperarem d a infec ç ão. No c aso d a sínd romerespiratória agud a grave (S AR S) , um méd ic o c hinês espal hou ainfec ç ão, num hotel , para várias pessoas, que por sua vez l evaram aepid emia para outros países asiátic os. A d oenç a ac abou se espal hand opor mais d e tr inta países ao red or d o mund o, matand o mais d eoitoc entas pessoas.

As epid emias são uma funç ão d o próprio patógeno d a d oenç a (ovírus ou bac téria) , d as pessoas que real mente manifestam a d oenç a ed a estrutura c onec tiva d a popul aç ão em geral por ond e as pessoasinfec tad as c irc ul am (os pad rões d e interaç ão entre pessoas infec tad as

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e não infec tad as) . Esse proc esso guard a uma impressionantesemel hanç a c om a d isseminaç ão d e informaç ões através d apopul aç ão, em que uma id eia se espal ha d o c érebro d e uma pessoapara o d e outras, em vez d e ser um vírus ou bac téria passand o d e umc orpo para outro. Formal mente, os d ois proc essos são id êntic os,exc eto que num c aso o agente infec c ioso pod e ser al guns ac ord es d euma c anç ão popul ar ou um vírus d e c omputad or, enquanto no outroé um agente biol ógic o.

Mal c ol m Gl ad wel l , autor d e best-se l l ers, d esc reve o proc esso d airrupç ão d e uma epid emia d e informaç ões no seu l ivro O ponto d avirad a, no qual id entific a as três l e is d a epid emia: a Lei d os Pouc os,o Fator d e Ad erênc ia e o Pod er d o Contexto. El as se assemel ham aprinc ípios semel hantes usad os pel os epid emiol ogistas parac arac terizar e mod el ar a d isseminaç ão d e uma d oenç a pel apopul aç ão. Eis uma síntese d e c ad a uma d el as:

A Lei d os Pouc os: Existem pessoas “exc epc ionais” em umapopul aç ão que são, ao mesmo tempo, extremamente bemrel ac ionad as e virul entas. Como resul tad o, essas pouc aspessoas espec iais são c apazes d e expor um númerod esproporc ional mente grand e d a popul aç ão ao agenteinfec c ioso. No jargão d a c omunid ad e epid emiol ógic a, taispessoas são os c hamad os “superd isseminad ores” . Umsurto d e S AR S em Toronto, por exempl o, foi assoc iad o aum superd isseminad or. O Fator d e Ad erênc ia: Esta l ei d iz que muitos patógenospod em sofrer mud anç as bastante simpl es que permitemque e l es “persistam” numa popul aç ão, ano após ano. Agripe é um bom exempl o: a c ad a outono aparec em c epasnovas, l igeiramente mod ific ad as, d o vírus d o anoanterior. As mud anç as são sufic ientes para que o vírustransponha o sistema imunol ógic o d e muitas pessoas einfec te uma grand e fraç ão d a popul aç ão.O Pod er d o Contexto: Esta l ei assevera que os humanossão bem mais sensíveis ao ambiente d o que pod e parec erà primeira vista. Em outras pal avras, se as pessoas estãoprontas para mud ar seu c omportamento — por exempl o,entrarem em quarentena vol untária ou tomar med id aspreventivas básic as para evitar a infec ç ão, c omo usar

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másc ara ou mesmo l avar as mãos — vai d epend er d ospad rões c ul turais d a popul aç ão espec ífic a a quepertenc em. Numa c id ad e pequena, as pessoas reagirão d eforma d iferente d o que em uma grand e metrópol e . E essad iferenç a pod e ser c ruc ial para d eterminar se umaepid emia irromperá ou não. Vejamos agora,suc intamente, ond e nossas id eias d a c ompl exid ad e seenc aixam na história d as pand emias.

Em rel aç ão a um d esnível d e c ompl exid ad e c resc ente l evand o aum ac ontec imento extremo, o quad ro está bem c l aro, pel o menosquand o se refere a um ind ivíd uo. Temos d ois sistemas em interaç ão,o patógeno e o imunol ógic o humano. Cad a um possui seu próprionível d e c ompl exid ad e, d efinid o num c aso pel as ferramentas que opatógeno c onsegue empregar para transpor as d efesas d o sistemaimunol ógic o, em oposiç ão às ferramentas que o sistema imunol ógic oc onsegue mobil izar para resistir ao ataque. Enquanto esses d oisníveis d e c ompl exid ad e permanec em mais ou menos em equil íbrio,não oc orre nenhuma infec ç ão. Os probl emas c omeç am quand o asmutaç ões d o patógeno são mais rápid as d o que a reaç ão d o sistemaimunol ógic o. À med id a que essa l ac una entre os d ois sistemas seampl ia por uma grand e fraç ão d e uma popul aç ão, pod e oc orrer umnível expl osivo d e infec ç ões. No final , a l ac una é red uzid a quand o ossistemas imunol ógic os d a popul aç ão enfim se ad aptam ao patógeno.Porém as vel oc id ad es d os aumentos d a c ompl exid ad e nos d ois l ad osd essa “c orrid a armamentista” pod em ser bem d iferentes, expl ic and oos muitos anos que c ostumam d ec orrer até que uma pand emia c omo apeste se esgote . Essa l ac una d e c ompl exid ad e tipo c orrid aarmamentista está no nível d os ind ivíd uos. Mas existe também umahistória d e c ompl exid ad e no nível d a popul aç ão.

Os três princ ípios d el inead os ac ima pel os quais os infec tantesinteragem c om aquel es que não estão infec tad os e transmitem umvírus ou bac téria são uma questão d e c ompl exid ad e d e red e. Empartic ul ar, estud os d e anal istas c omo Dunc an Watts e Al bert-Lász l óBarabasi mostraram que existem níveis c r ític os d e c onec tivid ad e nasl igaç ões entre a popul aç ão em que uma infec ç ão pod e subitamente“d ec ol ar” c omo um inc ênd io florestal . O l imiar entre a c ontenç ãod essa d oenç a e seu d esc ontrol e é bem tênue, um exempl o d o princ ípiod a c ompl exid ad e d o efeito borbol eta que d isc uti na Parte I.

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Portanto, essas são as regras d o jogo pel as quais uma epid emia d ed oenç a ou boatos irrompe e se espal ha. Quais os estágios que d evemosobservar que d ão um sinal d e al erta antec ipad o d e uma epid emia emformaç ão?

De ac ord o c om a Organizaç ão Mund ial d e Saúd e (OMS), umapand emia d e gripe possui seis fases d istintas, que vão d oaparec imento d e um subtipo d e vírus d e gripe em animais c om baixorisc o d e infec ç ão humana na Fase 1 à transmissão sustentad a d ovírus à popul aç ão humana em geral na Fase 6. As d iferentes fasesc onstituem um c onjunto d e sinais, ou “ impressões d igitais” , c ad a vezmais c l aros d e que uma pand emia está se formand o. Eis um resumod as seis fases:

Fase 1: Nenhum subtipo d e vírus d e gripe novo foid etec tad o, mas um subtipo d e vírus d e gripe que c ausouinfec ç ões humanas pod e estar presente em animais. Seestiver presente apenas em animais, o r isc o d e infec ç ãoou d oenç a humana é c onsid erad o baixo.Fase 2: Nenhum subtipo d e vírus d e gripe novo foid etec tad o em humanos. Entretanto, um subtipo d e vírusd e gripe animal c irc ul ante representa um risc osubstanc ial d e d oenç a humana.Fase 3: Uma ou mais infec ç ões humanas c om um novosubtipo, mas nenhuma propagaç ão d e humano parahumano, ou no máximo c asos raros d e propagaç ão emc ontato próximo.Fase 4: Um ou mais pequenos agl omerad os c omtransmissão l imitad a d e humano para humano, mas apropagaç ão é al tamente l oc al izad a, sugerind o que ovírus não está bem ad aptad o aos humanos.Fase 5: Um ou mais agl omerad os maiores, mas apropagaç ão d e humano para humano aind a é l oc al izad a,sugerind o que o vírus está se ad aptand o c ad a vez mel horaos humanos, mas pod e aind a não ser pl enamentetransmissível ( r isc o substanc ial d e pand emia) .Fase 6: Transmissão maior e sustentad a na popul aç ão emgeral .

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Como um exempl o d o uso d essa l ista para c arac terizar o estágio d euma possível pand emia, a c hamad a gripe aviária, tec nic amenterotul ad a d e vírus H5N1, está atual mente na Fase 3. Uma asc ensão àFase 4 representaria um grand e aumento d o perigo aos humanos, porser a primeira fase em que a transmissão d e humano a humano seriac onfirmad a. Com isso, o estágio d e monitoramento c uid ad oso d o vírusseria superad o, tornand o-se extremamente importante pesquisar umavac ina e inic iar med id as preventivas d e saúd e públ ic a.

SAÚDE PÚBLICA, VIDAS PRIVADAS

COMO A LEGISLAÇÃO RECENTE mostra, a saúd e d eixou d e ser uma questãoprivad a. Por exempl o, d evid o aos r isc os re l ac ionad os à inal aç ão,aind a que passiva, d a fumaç a d o c igarro, muitas naç ões proibiram ofumo em l oc ais públ ic os, inc l usive em restaurantes, bares e c afés,para proteger a saúd e d as pessoas. Lembre-se d e que o perigo d o fumopassivo está bem l onge d e ser al go c omo a febre ebol a, a gripeespanhol a ou mesmo a tuberc ul ose . Portanto, ond e traç ar o l imiteentre o c erc eamento d as l iberd ad es pessoais e a saúd e públ ic a?

Um bom exempl o d esse d il ema oc orreu no iníc io d o séc ul o XX c oma c ozinheira Mar y Mal l on, que fic ou c onhec id a na história c omo“ Ty phoid Mar y” (Mar y Tifoid e) . Era uma imigrante ir l and esa quetrabal hou na área urbana d e Nova York entre 1900 e 1907. Nesseperíod o, infec tou mais d e d uas d ezenas d e pessoas c om febre tifoid e,embora e l a própria não apresentasse sinais d a d oenç a.

As pessoas c ontraem febre tifoid e após beberem água ou c omeremal imentos c ontaminad os pel o manuseio por um portad or d a d oenç a. Équase c erto que Mar y Mal l on tenha sofr id o d e febre tifoid e a c ertaal tura d a vid a, mas a bac téria sobreviveu em seu sistema sem c ausarnovos sintomas.

Quand o as autorid ad es d e saúd e públ ic a avisaram-na d e quepod eria ser uma portad ora d a d oenç a, e l a negou veementemented iversos ped id os d e amostras d e urina e fezes. Parte d e seuargumento foi que um farmac êutic o l oc al a havia examinad o ed esc obrira que e l a não tinha sinais d e bac térias c ausad oras d ed oenç as, pel o menos não na époc a d o teste . No final , o Departamentod e Saúd e d a c id ad e d e Nova York c ol oc ou-a em quarentena,

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isol and o-a por três anos num hospital na Il ha North Brother. El a foil iberad a sob a c ond iç ão d e que d eixaria d e trabal har preparand o eservind o al imentos.

Contud o, Mar y não estava nem aí para essa ord em. Ad otou opseud ônimo “ Mar y Brown” e vol tou a trabal har c omo c ozinheira.Em 1915, infec tou 25 pessoas no S l oan Hospital , em Nova York. Foientão novamente d etid a pel as autorid ad es d e saúd e e d evol vid a àquarentena, ond e passou o resto d a vid a. Mar y Tifoid e morreu em1938 — d e pneumonia, não d e febre tifoid e — e foi c remad a.

O c aso d e Mar y Tifoid e i l ustra perfeitamente o d il ema étic oenfrentad o pel as autorid ad es d e saúd e públ ic a: c omo equil ibrar“c orretamente” os d ireitos d e Mar y Mal l on à l iberd ad e d emovimento e emprego c om os d ireitos d o públ ic o d e ser protegid oc ontra aç ões e c omportamentos potenc ial mente l etais d e outraspessoas? Este é o d il ema intrassoc ial . Também existe uma versãoextrassoc ial : c omo um país equil ibra o d ireito d e movimentaç ão d aspessoas através d e suas fronteiras c om o d ireito d e proteger sua naç ãod e infec ç ões emergentes? Vamos aprofund ar um pouc o essas d uassituaç ões.

No final d e 2006, a OMS anunc iou um surto d e tuberc ul ose (TB)na região d e KwaZul u-Natal , na Áfric a d o Sul . De forma al armante,d os 544 pac ientes d o estud o d a OMS, perto d e 10% tinham uma novac epa d e TB resistente não apenas aos c hamad os med ic amentos d eprimeira l inha, mas também a pel o menos três d os seis tratamentos“d e reforç o” . O tempo méd io d e sobrevivênc ia d esses pac ientes d e TBmul ti-resistente a d rogas (XDR -TB, d e extensivel y d rug-resistant TB)era d e apenas d ezesseis d ias.

Al ém d a al ta inc id ênc ia d e H IV no país, a Áfric a d o Sul tambémsofre d e um nível enorme d e infec tantes que d eixam d e tomar osreméd ios presc ritos para c urar a TB. A OMS estima que 15% d ospac ientes não c ompl etam os tratamentos d e primeira l inha eestarrec ed ores 30% d eixam d e tomar os med ic amentos d e reforç o. Issol evou a um índ ic e d e c ura gerald e apenas metad e d os pac ientes, tornand o a XDR-TB, al ém d e umd esastre nac ional potenc ial na Áfric a d o Sul , uma ameaç a ao mund oem geral , através d a popul aç ão c resc ente d e turistas d a Áfric a d oS ul .

Para imped ir a propagaç ão d a XDR-TB, foi proposta uma série d emed id as soc iais r igorosas, variand o d esd e restaurar os benefíc ios d a

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previd ênc ia soc ial aos pac ientes hospital ares para enc orajá-l os apermanec er em internaç ão até med id as bem mais extremas, c omod eter à forç a pessoas c om XDR-TB. A OMS rec omend a hoje que taispac ientes d eixem vol untariamente d e se misturar c om a popul aç ãonão infec tad a. Mas não há med id as para impor essa separaç ão. Ogoverno sul -afric ano até agora tem rel utad o em empregar a d etenç ãoc omo uma med id a d e saúd e públ ic a. Tud o isso apesar d e serpermitid a pel o d ireito internac ional quand o tod as as d emaismed id as para imped ir a propagaç ão d e d oenç as fal haram.

Portanto, a situaç ão d a Áfric a d o Sul em rel aç ão a XDR-TB é umexempl o vivo d o c onflito entre o imped imento d a l iberd ad eind ivid ual d e ir e vir e as med id as vol tad as para proteger apopul aç ão em geral d e uma d oenç a assassina.

Eis outra ameaç a enorme assomand o no horizonte.Os hospitais c hineses obtêm uma fraç ão substanc ial d e sua rec eita

d a vend a d e med ic amentos aos pac ientes. Como resul tad o, os méd ic osc ostumam presc rever múl tipl as d oses d e antibiótic os para probl emasrotineiros c omo inflamaç ões na garganta. Isso l evou a um aumentosubstanc ial na evol uç ão d e c epas d e bac térias resistentes aantibiótic os.

Al ertas já vêm send o emitid os sobre a propagaç ão d essas c epasnovas através d e viagens aéreas internac ionais e d a d istr ibuiç ão d eal imentos, pois porc os c hineses importad os por H ong Kong em 2009 jámostraram sinais d e estar infec tad os c om essas “ superbac térias” .

À med id a que c epas d e bac térias super-resistentes c omeç am aaparec er ao red or d o mund o, as naç ões passam a enfrentar probl emasétic os quand o se trata d e fec har suas fronteiras para viajantes eimigrantes suspeitos d e portar uma d oenç a c ontagiosa. Existe al goque um país possa fazer para se proteger d esse tipo d e ameaç a?

Durante o surto d e S AR S, o governo d e Cingapura instal outermovisores em tod os os pontos d e ac esso ao país — por mar, terra ear. Antes d e passar pel a imigraç ão, quem entrasse no país tinha suatemperatura c orporal med id a para se d etec tar uma possível febre.Um proc ed imento d e tr iagem simpl es e não invasivo, não maisinc ômod o d o que os exames d e seguranç a normais d os aeroportos. Masnão pod emos d izer o mesmo d e outras med id as possíveis parac ontrol ar a importaç ão d e uma d oenç a em uma fronteira nac ional .

No Reino Unid o, tem-se d efend id o a tr iagem c ompul sória d e tod osos imigrantes para d etec tar TB e H IV. Embora sua efic ác ia seja

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d isc utível para prevenir que essas d oenç as c ruzem as fronteiras, nãoexiste nenhum d ebate sobre as questões prátic as e étic as que talproc ed imento susc ita. Por exempl o, quais imigrantes serão esc ol hid ospara a tr iagem? Tod os? Somente aquel es d e c ertos países? Apenas osc and id atos a asil o pol ític o?

Vemos que tais “fil tros” d ão origem à possibil id ad e d ed isc riminaç ão, perd a d e privac id ad e e c erto tipo d e estigma. Emtermos suc intos, d eter d oenç as na fronteira não é a mesma c oisa quec ontrol ar a imigraç ão.

Então, que med id as real istas pod em ser tomad as para imped iruma pand emia?

Existem pel o menos três meios d e d eter uma pand emia:

El iminar os animais infec tad os: Ao abater tod a apopul aç ão d e 1,5 mil hão d e aves, as autorid ad es d e HongKong c ontiveram o vírus H5N1 d epois d e registrad os osprimeiros c asos d e infec ç ão humana em 1997.Infel izmente, esse proc esso, al ém d e c aríssimo, não foi d etod o efic az , pois o vírus reaparec eu d esd e então. Mesmoassim, o proc ed imento tem um efeito mensurável , aomenos se o vírus pud er ser l oc al izad o. Um abate emmassa semel hante foi usad o no Reino Unid o para d eter afebre aftosa no gad o em 2001, quand o quatro mil hões d eanimais foram sac rific ad os. Mas essa abord agem l evantamuitas questões preoc upantes, entre e l as quemind enizará os fazend eiros pel a perd a d e seus animais e ,portanto, d e seu meio d e subsistênc ia.Vac inaç ão: Proteger os animais e seres humanos pel avac inaç ão também é al go c ompl ic ad o. Por exempl o,aind a que exista uma vac ina, pod e ser inviável ministrá-l a a grand es números d e pessoas ou animais. Al ém d isso,não é fác il d istinguir um animal ou ser humanovac inad o d e outro não vac inad o. Portanto, pod e serd if íc i l monitorar ou c ontrol ar a movimentaç ão d aquel esque não foram vac inad os.Med ic amentos: Ao c ontrário d as vac inas, que sãomed id as preventivas, os med ic amentos são um tratamentoa posteriori para imped ir a irrupç ão d e uma pand emia.Para infec ç ões bac terianas, existem agora muitos

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antibiótic os bem efic azes. Há também um númeroc resc ente d e c epas bac terianas resistentes a taismed ic amentos, c omo a já c itad a XDR -TB.

Quand o se trata d e vírus, a situaç ão é bem pior. O únic o agenteantiviral efic az para o vírus H5N1 d a gripe aviária parec e ser oTamiflu, que age c omo um tipo d e vac ina ao imped ir a infec ç ão ec omo um med ic amento que aumenta a taxa d e sobrevivênc ia d aquel esjá infec tad os. Mas em ambos os c asos e l e prec isa ser ministrad o l ogoapós a exposiç ão ao vírus ou a c ontraç ão d a infec ç ão. Al ém d isso, jáaparec eram variantes resistentes ao tratamento normal c om Tamiflu.Portanto, mais uma vez não existem sol uç ões mágic as para tod os osagentes infec c iosos c onhec id os.

De mod o singul ar, tal vez o proc ed imento geral mais efic az paraevitar que um surto se torne uma pand emia total se ja o simpl es bomsenso. O el emento-c have é ed uc ar a popul aç ão sobre os proc ed imentosel ementares d e c uid ad os d e saúd e e saneamento. Por exempl o, l avaras mãos ao manusear al imentos, manter l impas a sua c asa e as áreasexternas, tomar c orretamente os med ic amentos e outrosproc ed imentos semel hantes ajud am bastante a d eter as d oenç asinfec c iosas antes que se transformem em uma pand emia ou mesmo emuma epid emia.

Mas que tal d eter uma pand emia antes que e l a tenha a c hanc e d ed ec ol ar? Dispomos d e proc ed imentos para prever c om efic ác ia airrupç ão d e al go c omo a gripe aviária ou a S AR S? Isso nos traz aod omínio d e c omo mod el ar o d esenvol vimento d e uma epid emia oupand emia d epois que uma infec ç ão enc ontrou um ponto d e apoio emuma popul aç ão. Vejamos al guns rumos inesperad os que ospesquisad ores estão tomand o para entend er c omo as d oenç as seespal ham no espaç o e no tempo.

PADRÕES DAS PESTES

PLAYGROUNDS DIGITAIS, COMO OS popul aríssimos jogos on-l ine Worl d ofWarc raft ou Sec ond Life , c ontam c om c entenas d e mil hares d ead eptos. Os partic ipantes interagem em tempo real na internetusand o avatares c ontrol ad os pel o c omputad or para travar batal has,

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forjar al ianç as e c ontrol ar territórios.À primeira vista, Worl d of Warc raft não parec e um c ampo d e

testes para batal has d a vid a real c ontra gripe, S AR S, peste bubônic aou qual quer outro tipo d e d oenç a c ontagiosa. Mas as primeirasimpressões pod em ser enganosas. E, nos Estad os Unid os, os trabal hosd e Nina Fefferman, d a Universid ad e Rutgers, e seu c ol aborad or EricLofgren, d a Universid ad e Tufts, e stão mostrand o c omo esses mund osvirtuais pod em oferec er uma c ompreensão d e c omo as pand emias seformam na real id ad e que habitamos.

Há várias d éc ad as, epid emiol ogistas matemátic os vêm c riand omod el os matemátic os d a propagaç ão d as d oenç as, na tentativa d eentend er e prever o surto e a propagaç ão d as epid emias.Infel izmente, para tornar esses mod el os matematic amentemanejáveis, é prec iso introd uzir uma série d e pressupostossimpl ific ad ores que muitas vezes obsc urec em as próprias perguntas aque estão tentand o respond er. Assim, os jogos d e c omputad or, quepermitem a seus partic ipantes inc orporarem às suas aç ões umavaried ad e quase i l imitad a d e c omportamentos d etal had os, parec emum bom meio d e superar al gumas d as l imitaç ões d a matemátic a,segund o Fef ferman e Lofgren.

A c ol aboraç ão entre os d ois c ientistas e a prod utora d e jogosBl izzard c omeç ou quand o programad ores introd uziram uma d oenç aal tamente c ontagiosa em uma zona rec ém-c riad a d o ambientec ompl exíssimo d o jogo. De iníc io, aquel e ac résc imo (ou patc h, c omoc ostuma ser c hamad o) func ionou c omo pl anejad o: os jogad oresveteranos se rec uperaram d a d oenç a, enquanto os avatares d osnovatos f ic aram gravemente inc apac itad os.

Mas l ogo as c oisas c omeç aram a fugir ao c ontrol e . Como vemos nomund o real , al guns d os avatares infec tad os c onseguiram penetrar emc id ad es d ensamente povoad as d o mund o virtual e c ontaminar seushabitantes. A d oenç a também se propagou através d os animaisd omestic ad os infec tad os, que foram rapid amente aband onad os porseus d onos e fic aram perambul and o sem rumo, infec tand o outrosanimais e avatares. Em suma, foi uma pand emia virtual .

Os programad ores d a Bl izzard tentaram c riar zonas d equarentena. Mas no mund o virtual , assim c omo no real , asquarentenas foram ignorad as, pois os avatares tentaram fugir a fimd e l evar ad iante suas batal has. Por fim, os programad ores tiveram d ed esl igar os servid ores e reinic iar o sistema d e mod o a e l iminar a

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d oenç a e tornar o jogo novamente sad io. Reinic iar ! Não seria bompod er fazer isso na real id ad e?

Lofgren estava jogand o o Worl d of Warc raft quand o a pesteirrompeu. Imed iatamente e l e viu o potenc ial d o jogo c omo um c ampod e testes para estud ar a propagaç ão d e d oenç as. O que intrigou ospesquisad ores foi a oportunid ad e d e estud ar c omo as pessoasreal mente se c omportam nas c r ises públ ic as, em c ontraste c om ospressupostos c omportamentais anteriores d os mod el os matemátic os. Aspessoas são bem d iferentes d os agentes homogêneos que povoam osmund os d os epid emiol ogistas matemátic os. Nesses mod el os, tod os osind ivíd uos d e uma popul aç ão possuem as mesmas c arac terístic asrel ativas à virul ênc ia d e sua infec ç ão, à c apac id ad e d e infec tar osoutros e assim por d iante. A heterogeneid ad e que os mod el os d ec omputad or possibil itam pod e fazer uma enorme d iferenç a sobre se ad oenç a virará ou não uma epid emia, argumentam os pesquisad ores.Quantos tentarão esc apar d e uma quarentena? Quantos c omeç arão ac ooperar por estarem c om med o, c omo na história d e Camus? Comod iz Fef ferman: “ S impl esmente não sabemos.”

É aí que entram em c ena os mund os virtuais, ond e se pod ematribuir aos jogad ores c arac terístic as ind ivid uais d e virul ênc ia,resistênc ia às infec ç ões, c ooperaç ão, fuga e assim por d iante, e osistema pod e então ser “ativad o” para se ver o que ac ontec e . Osc étic os al egam que no mund o virtual os jogad ores pod em estard ispostos a c orrer mais r isc os d o que no mund o real . O c ontra-argumento é que os jogad ores investiram tempo e energiac onsid eráveis no fortal ec imento d e seus avatares e na formaç ão d eal ianç as. Como resul tad o, grand e parte d o ego d os jogad ores estáinvestid a em seu representante virtual , e e l es não querem ver seusegos esmagad os ao c orrerem risc os exagerad os.

Cl aro que no fr igir d os ovos a simul aç ão d o mund o virtual éapenas uma simul aç ão. Como qual quer mod el o, não é um espel hoperfeito d a real id ad e, pois também existem pressupostos embutid osnel e . Mesmo assim, parec e um passo promissor para a c ompreensão d ec omo pand emias potenc iais se espal ham e, mais importante, c omopod em ser d etid as antes d e terem uma c hanc e d e d ec ol ar .

SINTETIZANDO

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ANTES DE SINTETIZAR O que d esc obrimos sobre as pand emias, abord areibrevemente um tema rel ac ionad o que aparec e c om regul arid ad e naimprensa popul ar e em outras partes: a questão d o bioterrorismo.

Tod os pod em c onc ord ar que o bioterrorismo é um probl emapotenc ial . Não há d úvid a quanto a isso. Esse probl ema tal vez mereç aaind a mais atenç ão, ou ao menos mais rec ursos, d o que vemrec ebend o d os governos ao red or d o mund o. Mas, d o ponto d e vistad e meus objetivos neste c apítul o, não importa muito se umapand emia surge d e aç ões humanas ac id entais ou intenc ionais. Ad inâmic a d a propagaç ão d a d oenç a e o resul tad o final sãoind istinguíveis. Por essa razão, eu nad a d isse neste c apítul o sobre ad etec ç ão, prevenç ão e/ou atenuaç ão d e ataques terroristas c om armasbiol ógic as. Agora vol temos à nossa história.

Vimos que, mesmo sem a ajud a d e terroristas, a natureza éperfeitamente c apaz d e l anç ar uma grand e d iversid ad e d e ameaç as àexistênc ia humana. Epid emias e pand emias d e uma varied ad eestonteante têm surgid o regul armente ao l ongo d a história e d evemreaparec er sob várias formas. Isso é óbvio. A pergunta real é se ahumanid ad e estará preparad a para enfrentar uma grand e pand emiaquand o e l a oc orrer , c aso e l a oc orra.

Quanto a essa questão, um surto d e uma d oenç a potenc ial mentel etal , d isseminad a por tod o o gl obo, pod e se d ar a qual quermomento. Na verd ad e, é mais provável que ac onteç a antes d o que seespera d evid o à tend ênc ia mund ial d e migraç ão para as c id ad es, oque provoc a um aumento nas d ensid ad es d as popul aç ões urbanas,al iad a à pouc a c ooperaç ão internac ional no monitoramento e naprevenç ão d e d oenç as. As pessoas simpl esmente não querem l evar asério outra epid emia d e gripe espanhol a, S AR S, gripe aviária ou sejao que for. Mas as d oenç as estão “por aí ” . E vão pegá-l o — se voc ênão abrir o ol ho!

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NO ESCURO E COM SEDE

FALTA DE ENERGIA ELÉTRICAE DE ÁGUA POTÁVEL

I. NO ESCURO

FALTA DE ENERGIA

A NOITE DE 13 DE ju l ho d e 1977 foi quente e úmid a na c id ad e d e NovaYork. Por vol ta d as 20h30, as l uzes se apagaram d o nad a… ec ontinuaram apagad as por quase 24 horas. Lembro-me c om c l arezad esse apagão, pois na époc a eu era professor d a Universid ad e d eNova York e morava em Greenwic h Vil l age. Infe l izmente para mim epara minha mul her, morávamos no 17º and ar d e um préd io d auniversid ad e em Washington Square. Entretanto, fe l izmente paramim, quand o o apagão ac ontec eu eu estava fora, na Cal ifórnia,fazend o um trabal ho d e c onsul toria, d e mod o que foi somente minhamul her quem sofreu as c onsequênc ias. Enquanto d urou o apagão, e l ateve que subir d ezessete l anc es d e esc ad as c arregand o garrafasd ’água para pod er c ozinhar, beber e tomar banho, al ém d e al imentose outras nec essid ad es d a vid a d iária. De ac ord o c om o rel ato que e l ame fez , experimentar aquel a Manhattan sem el etr ic id ad e foi c omoviver em um mund o d e sonho: Greenwic h Vil l age se transformou emum pal c o improvisad o d e festas d e rua. As pessoas saíram d e c asapara experimentar e testemunhar a c id ad e sem energia. Tod osd isc utiam a situaç ão, embora somente aquel es c om rád ios d e pil ha

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tivessem ac esso às informaç ões ofic iais sobre a pane ou sobre quand oa energia seria restaurad a.

Fiquei sabend o mais tard e que outras partes d a c id ad e fic arambem menos tranquil as. Surtos d e viol ênc ia, saques e inc ênd iosc riminosos foram rel atad os no Harl em, no Brookl y n e no SouthBronx. Pessoas arrombaram vitr ines d e l ojas para se apod erar d eprod utos e l etrônic os, joias, roupas, móveis e outros bens d e c onsumo,sem fal ar d e al imentos. Oc orreram mais d e mil inc ênd ios, pel o menosseis vezes o número normal para essa époc a d o ano, e 1.700 al armesfal sos foram rel atad os. Embora esses aspec tos mais preoc upantes eameaç ad ores d a fal ta d e energia não fossem vistos em Greenwic hVil l age, parec e provável que mais um d ia d e apagão seria sufic ientepara que se estend essem também à parte su l d e Manhattan.

Cabe observar que esse c ol apso d a energia foi, na verd ad e, umprobl ema estr itamente d a c id ad e d e Nova York, ao c ontrário d eoutro apagão, oc orrid o d oze anos antes, que d eixou às esc uras tod o onord este d os EUA e al gumas regiões d o Canad á. Em 1977, tod os osc inc o d istr itos d e Nova York fic aram sem l uz , bem c omo partes d oc ond ad o d e Westc hester, ao norte d a c id ad e. Desc obriu-se d epois queo apagão tinha sid o c ausad o pel o que a c onc essionária ConEdc hamou d e um “ato d e Deus” . Um total d e quatro re l âmpagos atingiuas l inhas d e transmissão que al imentavam a c id ad e, o primeiro às20h37. A c ad a d esc arga, as c onc essionárias viz inhas d e Nova Jersey ,Nova Ingl aterra e Long Isl and d esl igavam suas c onexões c om ac id ad e d e Nova York, para que pud essem proteger seus sistemas eatend er a sua c l ientel a. É interessante c omparar essa panel oc al izad a e re l ativamente pequena c om o Grand e Apagão d oNord este d e 1965 e o bem mais rec ente c ol apso d a red e e l étr ic a d eNova York d e 2003, os d ois maiores apagões d a história.

O APAGÃO DE 1965

O DIA 9 DE NOVEMBRO d e 1965 não foi um d aquel es em que tod os osaparel hos d e ar-c ond ic ionad o estavam l igad os. Nem era uma époc ad e grand e c onsumo d e e l etr ic id ad e. Mesmo assim, foi quand oac ontec eu aquil o que veio a ser c hamad o d e Grand e Apagão d oNord este , a maior pane e l étr ic a que havia ac ontec id o até então, que

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se estend eu d a c id ad e d e Ontário, Canad á, ao norte , até Nova York,ao sul , e d e New Hampshire , a oeste , até Cape Cod , a l este . Foramafetad as tr inta mil hões d e pessoas em oito estad os americ anos e naprovínc ia d e Ontário por d iferentes períod os d e tempo. O queac ontec eu?

O apagão c omeç ou no Canad á, na usina e l étr ic a Bec k , d ac onc essionária Ontario Hy d ro, perto d as Cataratas d o Niágara. Às17h16, o re l é d e uma d as l inhas d e transmissão para Toronto sofreuuma pane, ativand o um d isjuntor que removeu a l inha d a red e.Quand o isso oc orreu, outra usina que abastec ia Toronto estavad esl igad a para reparos e , c omo o c onsumo d e e l etr ic id ad e and avael evad o na c id ad e por c onta d as d emand as d e i l uminaç ão e c al efaç ãod o inverno, as l inhas já vinham operand o quase a pl ena c apac id ad e.As d uas panes se c ombinaram para d esl igar outras quatro l inhas,transferind o assim a c arga para as l inhas que vinham d os Estad osUnid os.

A sobrec arga d errubou as l igaç ões c om a Power Authority of theState of New York (PAS NY), d esestabil izand o as princ ipais l inhas d etransmissão d o estad o. Em questão d e segund os, a red e c anad ense foid esac opl ad a d a red e d e Nova York. Logo d epois, os sistemasd esestabil izad os c ausaram uma c asc ata d e novas panes: a NovaIngl aterra, o su l d o estad o d e Nova York e outras áreas fic aram semenergia. Essa suc essão d e d esl igamentos red uziu a red e e l étr ic a ail has isol ad as segund os após a pane inic ial . Al gumas i l has fic aramc om fal ta d e energia, outras c om exc esso d e energia que não tinhamc omo transferir para outras l oc al id ad es. O d esequil íbrio l evou anovas panes, e em pouc os minutos mais d e tr inta mil hões d e pessoasestavam sem el etr ic id ad e. Por várias razões, a c id ad e d e Nova Yorkfoi a área que fic ou mais tempo sem energia. Entretanto, os nova-iorquinos se mostraram d estemid os e ad aptáveis, enfrentand o od esc onforto c om natural id ad e, sem grand es tumul tos, saques ououtros d esc ontrol es.

Após esse Grand e Apagão, c ontrol es c omputad orizad os muito maisefic azes foram instal ad os em tod a a red e e l étr ic a e se c r iou o NorthAmeric an El ec tr ic Rel iabil ity Counc il (NER C, Consel ho Norte-Americ ano d e Confiabil id ad e El étr ic a) para reunir as d iversasoperad oras ind epend entes que c ompõem a red e d e fornec imento d eenergia e estabel ec er pad rões operac ionais para a transmissão d eel etr ic id ad e entre regiões.

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Comparad o c om o apagão d e 1965, o que ac ontec eu na c id ad e d eNova York em 1977 foi c afé-pequeno. Como já observamos, a c ausaimed iata foram rel âmpagos e não fal has mec ânic as d o sistema, e aárea afetad a se restr ingiu à c id ad e d e Nova York e aos arred ores.Entretanto, o impac to soc ial foi bem d iferente . Nos d oze anos que sepassaram, o c l ima soc ial mud ou substanc ial mente… e não foi paramel hor. Assim, quand o as l uzes se apagaram em Nova York, em 1977,isso não foi apenas pretexto para brinc ad eiras e festas d e rua, masuma oportunid ad e para que saquead ores e arruac eiros d eixassemsuas toc as. A anarquia prejud ic ou a imagem d e Nova York por muitosanos. O c ontraste entre a reaç ão d a popul aç ão aos apagões d e 1965 e1977 il ustra mel hor d o que qual quer teoria ac ad êmic a quanto o“estad o d e espírito” pred ominante na époc a d e um probl ema c ol etivod etermina a c ond uta soc ial d urante a c r ise . Agora vamos passar paramais um episód io, o maior apagão d e tod os os tempos.

O APAGÃO DO LESTE E MEIO-OESTE DE 2003

POUCO DEPOIS DAS 16H d e 14 d e agosto d e 2003, um d efeito em umausina e l étr ic a d a FirstEnerg y no c entro-l este d e Ohio d esenc ad eouuma sequênc ia d e c ortes d e l uz que se espal hou c omo um inc ênd ioflorestal d esd e o Meio-Oeste americ ano até Ontário, ao norte ,seguind o pel o nord este d os Estad os Unid os e d eixand o mais d ec inquenta mil hões d e pessoas sem energia e l étr ic a. Tud o ac ontec euem menos d e oito minutos.

Uma c omissão que investigou a pane apontou uma série d e c ausase d enunc iou a FirstEnerg y por viol ar vários pad rões d o NER C:operar em níveis inad equad os d e tensão, não rec onhec er ouc ompreend er a d eterioraç ão d e seu sistema, não c ontrol ar oc resc imento d e árvores junto às l inhas d e transmissão e assim pord iante. Em suma, erros humanos básic os d e gerenc iamento por parted a FirstEnergy foram a c ausa imed iata d o apagão.

Depois d o inc id ente, muitos exigiram uma remod el aç ão c ompl etad a red e e l étr ic a. Tod os rec onhec eram que o sistema estava vel ho ec omeç ava a se d eteriorar em uma époc a em que as nec essid ad es d eenergia aumentavam rapid amente. A reestruturaç ão era urgente ehavia muito se nec essitava d e uma red e nova e c onfiável . Aqui vemos

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uma situaç ão c l ássic a d e sobrec arga d e c ompl exid ad e. De um l ad o,uma red e e l étr ic a obsol eta, em d eterioraç ão, d e baixa c ompl exid ad e,repl eta d e c omponentes u l trapassad os, que inc l uía d esd e usinastermel étr ic as a c arvão até l inhas d e transmissão d efic ientes e umsoftware antiquad o tentand o gerenc iar sistemas d e c ontrol eprojetad os em d éc ad as anteriores. Do outro, as nec essid ad es c ad a vezmais c ompl exas d e c onsumid ores d omic il iares que util izavam umavaried ad e d esc onc ertante d e equipamentos, sem fal ar nas empresas einstituiç ões que busc avam satisfazer suas próprias nec essid ad es d eenergia. Esse d esc ompasso c resc ente é um evento extremo esperand opara oc orrer… e e l e oc orre, d e forma inevitável , c omo mostram osexempl os rec ém-c itad os.

Até o momento em que este l ivro foi esc r ito, nenhuma aç ãosubstanc ial havia sid o tomad a para enfrentar esses probl emas. Não setrata d e uma questão exc l usivamente norte-americ ana. Para termosuma visão mais ampl a, vejamos situaç ões semel hantes oc orrid as nosúl timos anos em outras partes d o mund o.

• • •

O ano d e 2008 c omeç ou mal na Áfric a d o Sul , c om apagões suc essivosafetand o as maiores c id ad es, d uas ou três vezes por d ia, a partir d oiníc io d e janeiro. No c omeç o, essas fal tas d e l uz parec iam ser apenasum pequeno estorvo, e os l oc utores d e rád io brinc avam que, parapreparar as torrad as para o c afé d a manhã, os ouvintes d eviamesfregar vigorosamente as d uas fatias d e pão. Entretanto, quand o osc omputad ores inoperantes, os sinais d e trânsito apagad os e os fogõesfr ios c omeç aram a inc omod ar a popul aç ão, l ogo se perc ebeu queaquil o não era brinc ad eira. Isso sem fal ar em d anos bem mais sériosà ec onomia sul -afric ana pel o fec hamento d e minas por c ausa d osepisód ios, d a transformaç ão d e shopping c enters em c id ad esfantasmas e outros transtornos que, pel as estimativas d osespec ial istas, l imitariam o c resc imento anual a 4,5%, nível beminferior ao c onsid erad o nec essário pel o governo para red uzir a taxad e d esemprego d o país, que era d e 25%.

A c rise resul tou d e uma c ombinaç ão infe l iz d e fal ta d ec omunic aç ão entre governo e ind ústria e fal ta d e atenç ão a umrel atório téc nic o d e 1998, segund o o qual , à taxa em que a ec onomia

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vinha c resc end o, a Áfric a d o Sul enfrentaria uma grave esc assez d eel etr ic id ad e em 2007, a não ser que se tomassem aç ões para ampl iara oferta d e energia.

O governo Mbeki tomou posse no ano seguinte e frac assou natentativa d e c onseguir financ iamentos d e investid ores privad os paraa c onstruç ão d e novas c entrais e l étr ic as. Somente mais tard e ogoverno c onc ed eu à Eskom, a empresa estatal d e energia, umapermissão para c onstruir novas usinas. Mas era tard e d emais, pois asc entrais e l étr ic as não surgem magic amente d a noite para o d ia. Emgeral , são nec essários no mínimo c inc o anos para c onstruir umausina e c ol oc á-l a em operaç ão. Nas pal avras d o respeitad o anal istasul -afric ano Wil l iam Mervin Gumed e: “As ad vertênc ias eram bemc onhec id as, mas o governo foi al tivo e arrogante d emais para agir.Isso é d esastroso para a ec onomia.”

O d esc ompasso d e c ompl exid ad e apresenta um aspec to d iferentenessa situaç ão, já que o pred ec essor d o governo Mbeki rec onhec euque o sistema ec onômic o vinha c resc end o ( tornand o-se maisc ompl exo) a uma taxa bem superior à c ompl exid ad e d a red e e l étr ic ad o país. De tal d esnível c resc ente só pod eria resul tar uma enormefal ta d e energia. E, natural mente, foi isso que fez o governo Mbekifinal mente c ed er e permitir que a empresa estatal tomasse med id aspara aumentar a c apac id ad e d e geraç ão d e e l etr ic id ad e. Mas foiprec iso um evento extremo, na forma d e uma ond a d e apagões em2008, para sol uc ionar o d esnível d e c ompl exid ad e d e mod o que opaís pud esse vol tar a func ionar.

Nesse ínterim, os su l -afric anos se irr itavam e rec l amavam d osc ontratempos d iários em suas vid as, c om el evad ores parand o entreand ares, l ojas fec had as, postos d e gasol ina imped id os d e bombearc ombustível , sinais d e trânsito apagad os e restaurantes c om c omid asemic ozid a nos fogões. Qual seria a sol uç ão? Nas pal avras d e umc onsul tor d a área d e engenharia: “ Em uma situaç ão assim, aec onomia simpl esmente d eixa d e c resc er e o probl ema se resol ve.”

Embora a situaç ão d epl orável em que a Áfric a d o Sul seenc ontrou tenha sid o atípic a por c ausa d e uma c ombinaç ão d e umprobl ema sistêmic o c om fal has humanas primárias, a fal ta d e energiael étr ic a por períod os variáveis é al go c orriqueiro em muitos países d omund o. Eis um rel ato sumário d e outros inc id entes d o mesmo tipo nosúl timos anos:

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• Em fevereiro d e 2008, um quinto d a popul aç ão d a Fl órid afic ou sem energia em d iferentes oc asiões d epois que uma fal harel ativamente pequena na red e e l étr ic a ac arretou od esl igamento d e uma usina nuc l ear. Uma investigaç ãoposterior mostrou que a c ausa foi, mais uma vez , um “errohumano” , quand o um engenheiro, para examinar uma c havesuspeita em uma subestaç ão d e Miami, d esativou d ois níveis d eproteç ão d o sistema. Enquanto fazia uma med iç ão, oc orreu umc urto-c irc uito. Normal mente, o sistema d e seguranç a terial imitad o o probl ema. Mas, c omo os d ois níveis d e proteç ãoestavam d esativad os, o c urto-c irc uito gerou um efeito c asc ata.Mais tard e, as autorid ad es d isseram que o c erto seria oengenheiro d esativar um d os níveis — não os d ois — e que nãosabiam por que e l e tomara aquel a atitud e.

• Na noite d e 5 d e novembro d e 2006, um sábad o, c erc a d e d ezmil hões d e pessoas na Franç a, Itál ia e Al emanha fic arampresas em trens e e l evad ores quand o fal tou energia e l étr ic a pormeia hora. A empresa al emã d e energia E.ON d isse que oprobl ema c omeç ou no noroeste d a Al emanha, quand o od esl igamento temporário d e uma l inha d e transmissão d e al tatensão, l oc al izad a sobre um rio, para a passagem d e um naviosobrec arregou a red e. A empresa afirmou que real izarainterrupç ões semel hantes no passad o sem que oc orresse nenhumprobl ema e que não entend ia ond e e por que a fal ta d eel etr ic id ad e havia c omeç ad o. O governo al emão imed iatamenteexigiu uma expl ic aç ão d a E.ON — e quis saber o que a empresafaria para imped ir que o probl ema se repetisse . Nas pal avrasd o ministro d a ec onomia al emão Mic hael Gl os: “ Fal tas d eenergia d essa espéc ie , al ém d e c ausarem transtornos àpopul aç ão, representam um risc o c onsid erável para aec onomia.”

• Em janeiro d e 2008, um gato em Nampa, Id aho, esc ol heu ol ugar errad o para se abrigar d o fr io, d eixand o 1.200 c asas eempresas sem energia. Ao que parec e , o gato entrou em umasubestaç ão d a c ompanhia d e energia e l étr ic a, d eitou-se ao l ad od e um transformad or quentinho e enc ostou em um c irc uitoenergizad o, provoc and o um c urto-c irc uito que d errubou asl inhas. O c urto-c irc uito também c onsumiu a úl tima d as setevid as d o bic hano. (Os informes não menc ionam se o gato era

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preto.) O c orte d e energia d eixou os sinais d e trânsito d ac id ad e apagad os até que o sistema fosse re l igad o, horas d epois.

• Em setembro d e 2007, o Departamento d e Seguranç a Internad os EUA mostrou um víd eo sobre a d estruiç ão c ausad a porhac kers que c onseguiram c ontrol ar uma parte c ruc ial d a red eel étr ic a. Mais espec ific amente, os hac kers mod ific aram oc ód igo d e operaç ão d e uma turbina ind ustrial , fazend o c omque girasse c ad a vez mais d epressa até arrebentar e l anç assefragmentos d e metal inc and esc ente para tod os os l ad os d entrod a usina, o que c ausou um grand e inc ênd io. Fel izmente, oataque nunc a oc orreu, pois o víd eo era um exerc íc io d esimul aç ão mostrand o os d anos que pod iam ser c ausad os porterroristas ao atac ar um d os muitos c omponentes quasetotal mente d esprotegid os d a red e e l étr ic a.

• O d ia 8 d e setembro d e 2011 assistiu a outro grand e apagão nosEstad os Unid os, quand o mais d e c inc o mil hões d e pessoas d eSan Diego, Baixa Cal ifórnia e parte d o Arizona fic aram semel etr ic id ad e por vol ta d as 15h. Uma l inha d e transmissão d eal ta tensão d o Arizona à Cal ifórnia d eixou d e func ionar,d esenc ad eand o uma série d e avarias menores que ac abaram pord esl igar a usina nuc l ear d e San Onofre. Quand o issoac ontec eu, tod a a região fic ou sem energia. A fal ta d e l uzd urou apenas um d ia, o que não é muito tempo quand o se tratad e grand es apagões, mas isso não pod ia ter oc orrid o numaépoc a pior, pois c oinc id iu c om o úl timo d ia d e uma ond a d ec al or que viu as temperaturas subirem até quase 40°C nointerior e c hegarem a 46°C nos d esertos d o su l d a Cal ifórnia.Como c ontou a morad ora Kim Conway : “ É o pior d ia d o ano —estranho que tenha sid o tão próximo d o 11 d e setembro” . Seuc arrinho d e c ompras, a propósito, estava c heio d e c erveja eoutras bebid as, pois e l a e os viz inhos estavam aproveitand o afol ga forç ad a para improvisar uma festa.

E assim por d iante. O fato é que fal has na red e e l étr ic a oc orrem otempo tod o — em tod a parte . E c ontinuarão oc orrend o por grand es epequenos motivos. O importante é entend er c omo o sistema d e energiael étr ic a pod e se tornar mais c onfiável e menos vul nerável a fal hasque d eixam d ezenas d e mil hões d e pessoas sem el etr ic id ad e por d ias af io. Não existe nenhum sistema que seja à prova d a estupid ez humana

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ou d e gatos vad ios, mas pod emos e d evemos nos sair bem mel hor queno passad o. Com os exempl os anteriores em mente, vejamos o papelque a red e e l étr ic a d esempenha no nosso c otid iano.

Uma forma d e aval iar o que ac ontec e quand o as l uzes se apagam éexaminar os d etal hes d e c omo a fal ta d e energia afetou os morad oresd e S an Diego após o evento X que ac abamos d e d esc rever :

• A c riminal id ad e não aumentou, mas houve muitos ac id entes d etrânsito d evid o à inoperânc ia d os sinais, provoc and o tambémenormes engarrafamentos nas princ ipais vias públ ic as. Ospostos d e gasol ina e outros estabel ec imentos varej istas, c omosupermerc ad os, d eixaram se func ionar.

• Al guns morad ores tiveram d e arrombar suas garagens para terac esso aos c arros, pois os motores e l étr ic os que abriam as portasnão estavam func ionand o.

• Tod as as formas d e transporte públ ic o passaram a c irc ul ar d eforma irregul ar, d epend end o d a nec essid ad e ( trens e aviões) ounão (ônibus) d e energia e l étr ic a.

• Os hospitais e outros serviç os d e emergênc ia c ontinuaramoperand o, mas apenas por tempo l imitad o, pois os gerad orespróprios ac abaram parand o quand o as baterias d esc arregaramou o c ombustível ac abou.

• Houve fal ta d ’água porque muitas estaç ões d e bombeamentod eixaram d e func ionar.

Muitos d iriam que a l ista está l onge d e ser c atastrófic a. E têmrazão. A c atástrofe real ac ontec e quand o os serviç os menc ionad os sãointerrompid os d urante d ias, ou mesmo semanas, sem que ninguémsaiba d izer quand o a energia será restaurad a — ou mesmo se serárestaurad a. É aí que os d istúrbios, saques e outros c omportamentosprimitivos entram em aç ão. A história d e San Diego não passa d e umensaio para uma tragéd ia que pod erá ac ontec er em qual quer l ugarond e o c otid iano d a popul aç ão d epend e d a energia e l étr ic a. E issosignif ic a pratic amente qual quer l ugar d o mund o ind ustrial izad o.

A MATRIZ DA VIDA

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NO FILME MATRIX, TODO mund o está c onec tad o a um programa d ec omputad or onipresente que organiza suas vid as. Mas a “máquina”que c ontrol a essa real id ad e virtual entra em pane, ameaç and o aexistênc ia d a popul aç ão. É interessante c omparar esse mund oc inematográfic o e sua c rise ao nosso mund o real . Para nós, a“máquina” é “a red e” — a red e e l étr ic a —, pois nossas vid asd epend em d e seus c apric hos assim c omo as vid as d e Neo e seus amigosd epend em d a matriz .

Jason Makansi, d iretor-exec utivo d o Energ y S torage Counc il ,i l ustrou vivamente o papel fund amental d o sistema d e energiael étr ic a no l ivro Lights Out [Luzes apagad as] . Quand o fal tael etr ic id ad e, os sinais d e trânsito se apagam, os te l e fones c e l u l aresd eixam d e func ionar, os e l evad ores fic am parad os entre os and ares,as bombas param d e bombear água, gasol ina e outros l íquid os, osc omputad ores fic am inoperantes e os trens d eixam d e c irc ul ar. Emsuma, a soc ied ad e retorna a um nível pré-ind ustrial . Como c hegamosa um estad o tão prec ário? Afinal , no iníc io d o séc ul o XX, as ruasaind a eram il uminad as a gás e o transporte era feito em c arroç aspuxad as por c aval os. A e l etr ific aç ão d a soc ied ad e é um fenômenorel ativamente rec ente , al go que ac ontec eu nos ú l timos c em anos.Assim c omo a energia barata d o petról eo, a e l etr ic id ad e entrou emnossas vid as graç as à genial id ad e d e d ois (por que não d izer?)gênios, ambos exerc end o seus d otes em Nova York, há pouc o mais d eum séc ul o.

O primeiro inventor bril hante é um nome c onhec id o: omasEd ison, o homem que c riou o fonógrafo, a l âmpad a el étr ic a e muitosoutros aparel hos e d ispositivos que são usad os até hoje . No final d oséc ul o XIX, Ed ison projetou um sistema d e i l uminaç ão basead o eml âmpad as e l étr ic as al imentad as pel a c orrente c ontínua (CC)prod uzid a pel a usina d e Pearl S treet, no su l d e Manhattan. Ointeressante é que, embora o sistema d efend id o por Ed ison tenha sid osupl antad o pel o sistema d e um c ompetid or, até hoje existem c erc a d ed ois mil c onsumid ores em Manhattan que rec ebem c orrente c ontínuad a suc essora d aquel a antiga usina.

O probl ema d o sistema d e Ed ison estava na transmissão d e energiad a usina ao c onsumid or. A tensão nec essária para transmitir CC ad istânc ias aprec iáveis, d e forma efic iente , é grand e d emais para queo sistema seja seguro. Por outro l ad o, a tensão d a c orrente al ternad a(CA) pod e ser aumentad a ou d iminuíd a por transformad ores, o que

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torna a transmissão por l ongas d istânc ias efic iente , pois pod e serfeita c om al tas tensões, e o fornec imento aos c onsumid oresrel ativamente seguro, pois pod e ser feito c om baixas tensões. É aí queentra em c ena nosso segund o gênio, o al go l end ário inventor c roataNikol a Tesl a, provavel mente o únic o inventor que pod e serequiparad o a Ed ison em número e importânc ia d e invenç ões.

Tesl a, que fal ava d e suas id eias a respeito d os motores e l étr ic osc omo se se tratasse d e uma espéc ie d e visão místic a, c hegou atrabal har para Ed ison. Entretanto, quand o ped iu permissão parapesquisar a c orrente al ternad a e , mais espec ific amente, c onstruir ummotor d e CA, Ed ison rec usou. Em vista d isso, Tesl a se resignou apesquisar a CC. Disse a Ed ison que ac hava que pod eria mel horarsubstanc ial mente o gerad or e Ed ison l he oferec eu um bônus d ec inquenta mil d ól ares se a tarefa fosse bem-suc ed id a. Após muitoesforç o, Tesl a prod uziu um c onjunto d e 24 projetos d e c omponentesque mel horariam em muito o gerad or d e CC, c omo havia prometid o.Quand o c obrou a rec ompensa prometid a, Ed ison al egou que estavabrinc and o. “ Voc ê não entend e o humor americ ano” — foi a d esc ul paesfarrapad a d o grand e homem.

Terrivel mente d esapontad o, Tesl a d eixou d e trabal har paraEd ison e abriu uma empresa para pôr em prátic a suas id eias arespeito d a c orrente al ternad a. Em 1888, patenteou um motor d e CA,abrind o as portas para a transmissão barata e efic iente d ael etr ic id ad e a grand es d istânc ias. O empresário George Westinghouseimed iatamente c omprou suas patentes. Após al guns anos d e tentativasfrustrad as, d isputas c om Ed ison e outros perc al ç os, o sistema d e CAWestinghouse-Tesl a preval ec eu em rel aç ão ao sistema d e CC d eEd ison, abrind o c aminho para que a c orrente al ternad a se tornasse abase d o que é hoje a red e e l étr ic a norte-americ ana. O probl ema é queo fato d e a CA pod er ser transmitid a a grand es d istânc ias permitiuque a red e se tornasse c entral izad a e , por isso, vul nerável a d efeitosem c asc ata c omo os que foram d esc ritos nos exempl os prec ed entes.Vol tarei já a esse assunto. Por ora, examinemos mais d etid amenteuma série d e vul nerabil id ad es a que a opç ão por um sistema d e CAnos d eixou expostos.

ENERGIA EM RISCO

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H Á MUITO TEMPO, EM um país d istante (os Estad os Unid os d a d éc ad a d e1970) , uma red e e l étr ic a fornec ia serviç os u l trac onfiáveis a um preç orazoável , embora não fosse uma pec hinc ha. Mas os l uc ros não eramsufic ientes para operad oras gananc iosas e pol ític os mais gananc iososaind a, d e mod o que os d efensores d o l ivre merc ad o engend raram afantasia d e que a privatizaç ão e a d esregul amentaç ão d ofornec imento d e energia e l étr ic a pod eriam garantir uma el etr ic id ad eaind a mais barata e c onfiável para a popul aç ão. Entretanto, umac oisa estranha ac ontec eu no c aminho para a d esregul amentaç ão: atransmissão d e energia foi esquec id a! Makansi c ita as seguintesvul nerabil id ad es d a red e e l étr ic a que a l evaram ao tr iste estad oatual .

Vul nerabil id ad e 1: Uma red e d e transmissão obsol eta: Osinvestimentos em l inhas d e transmissão foram preterid osem favor d a mel horia d e partes mais visíveis e“gl amorosas” d o sistema. Deixou-se , assim, que ainfraestrutura básic a se d eteriorasse . A fal ta d einvestimentos em l inhas d e transmissão inviabil izoumuitos d os supostos benefíc ios d a d esregul amentaç ão, qued epend ia d e uma red e c apaz d e transportar c omseguranç a grand es quantid ad es d e e l etr ic id ad e d os l oc aisond e é barata para os l oc ais ond e é nec essária. Naspal avras d o ex-sec retário d e Energia Bil l R ic hard son, osEstad os Unid os se tornaram “uma superpotênc ia c omuma red e e l étr ic a d e Terc eiro Mund o” .Vul nerabil id ad e 2: Linhas d e suprimento l ongas d emaispara os c ombustíveis d as usinas: A maioria d as c entraise l étr ic as c onstruíd as na úl tima d éc ad a emprega o gásnatural l iquefeito (GNL). A próxima geraç ão tal vezutil ize c ombustível nuc l ear. Ac ontec e que as fontes d eGNL e urânio fic am muito l onge d as fronteiras d osEstad os Unid os. Grand e parte vem d e l ugares c omo o Irã,a Rússia e al guns países d a Áfric a, parc eiros pouc oc onfiáveis no quad ro geopol ític o atual . O c ombustívelnuc l ear enc ontra-se em situaç ão um pouc o mel hor, pois éfornec id o em grand e parte por naç ões mais amistosasc omo Canad á e Austrál ia. Entretanto, esses l ugares estãoa mil hares d e quil ômetros d e d istânc ia d os l oc ais ond e o

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c ombustível é c onsumid o. Assim, se a tend ênc ia atual d eutil izar c ombustíveis importad os c ontinuar, uma fraç ãosignific ativa d o suprimento americ ano d e e l etr ic id ad ed epend erá d e rec ursos externos, que se enc ontram a umagrand e d istânc ia.Vul nerabil id ad e 3: A e l etr ic id ad e não pod e serarmazenad a: Ao c ontrário d o que ac ontec e c om opetról eo, não é possível fazer um estoque d e e l etr ic id ad epara prevenir interrupç ões d e fornec imento e outrosc ontratempos. Cl aro que se pod e armazená-l a c omoenergia químic a em baterias, c omo energia mec ânic a emvol antes etc . Mas não c omo el etr ic id ad e. Isso só pod e serfeito c om c apac itores, o que pod e func ionar em pequenaesc al a, mas não c om o que seria nec essário paraabastec er uma c id ad e.Vul nerabil id ad e 4: Fal ta d e téc nic os espec ial izad os paraa manutenç ão e operaç ão d a red e e l étr ic a: No mund oatual d a MTV e d o Fac ebook, os jovens sonham c omprofissões gl amorosas, c omo c onsul tores d e míd ia,anal istas d e investimentos, psic oterapeutas, juristas etc .Com tod a a c erteza, a maioria não sonha c om aengenharia, e mesmo aquel es que esc ol hem essa profissãobusc am áreas c omo nanotec nol ogia, c omputad ores eoutras ind ústrias emergentes, o que não é o c aso d aenergia e l étr ic a. Como um sinal d essa tend ênc iad epl orável , um estud o rec ente d a OCDE (Organizaç ãopara a Cooperaç ão e o Desenvol vimento Ec onômic o)revel a que a porc entagem d e estud antes nos Estad osUnid os que se formam em engenharia ou c iênc ias exatas é15%, em c omparaç ão c om os 37% na Coreia e 29% naFinl ând ia. É assustad or saber que, para c ad a d oistrabal had ores que se aposentam no setor d a energiael étr ic a, existe menos d e um substituto. Al ém d isso, essasc ifras sugerem que os novos tal entos formad os pel asuniversid ad es só c onseguirão suprir uma pequenaporc entagem d as nec essid ad es futuras. Vul nerabil id ad e 5: A topol ogia d a red e e l étr ic a: A red eel étr ic a norte-americ ana é o que os teóric os d enominamd e red e “sem esc al a” . Isso signific a que possui uns pouc os

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nós importantes c om muitos pequenos raios. Assim, se umevento fortuito c ol oc ar fora d e aç ão um c omponente, émuito pouc o provável que a fal ha afete tod o o sistema.Caso, porém, o evento d errube um d os nós princ ipais d osistema, c omo ac ontec eu no Grand e Apagão d o Nord ested e 2003, o sistema el étr ic o d e metad e d os EUA estaráameaç ad o. Com a estrutura d e que d ispomos e o papelc rític o que a e l etr ic id ad e d esempenha na vid a d o país, éprec iso d ed ic ar muito mais atenç ão à proteç ão d os nósprinc ipais d a red e.Vul nerabil id ad e 6: O grand e impac to ambiental d a red e:Tanto o c arvão c omo o gás natural são notórios gerad oresd e gases d e efeito estufa: CO2 no c aso d o c arvão, metanono c aso d o gás natural . Essa é a boa notíc ia! A mánotíc ia é que os e feitos d o metano são vinte vezes maioresque os d o d ióxid o d e c arbono, e , c omo vimos, quase tod asas novas c entrais e l étr ic as são al imentad as c om GNL, enão c om c arvão. Como os gasod utos que c ond uzem GNLàs usinas às vezes se estend em por mil hares d equil ômetros, vazamentos l iberam mol éc ul as d e metano naatmosfera. Estima-se que d e 2 a 10% d o metano esc aped urante o transporte d os tanques d e armazenamento noporto até a c entral e l étr ic a ond e será usad o.

Tod as essas vul nerabil id ad es são graves, e a maioria (mas nãotod as) , se não for c orrigid a, pod e fac il mente l evar a um apagão d egrand es proporç ões. Atual mente, o governo e as própriasc onc essionárias d e energia e l étr ic a têm fal ad o muito a respeito d isso,mas pouc as med id as c onc retas foram d e fato tomad as. Não é exagerod izer que o sistema está em c rise ; voc ê pod e ter c erteza d isso quand oa PJM, uma d as maiores operad oras d os Estad os Unid os, c hama anec essid ad e d e uma nova red e d e l inhas d e transmissão d e “um c asod e emergênc ia” . Em suma, a red e “d e Terc eiro Mund o” d eRic hard son c orre um sério r isc o d e d egenerar em uma red e “d o outromund o” .

Se há al guma infraestrutura que se c ompare à d a energia e l étr ic aem termos d e importânc ia para o nosso d ia a d ia, é o sistema d eabastec imento d e água a resid ênc ias e empresas. Seja para beber,c ozinhar, l avar ou uma série d e outros usos, a água d oc e e l impa é

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uma nec essid ad e absol uta d a vid a mod erna. Pod emos viver semel etr ic id ad e. Já vivemos sem el etr ic id ad e por mil hares d e anos. Masnão pod emos viver mais que al guns d ias sem água. Com isso emmente, vejamos quão próximos estamos d e um evento X que irá sec arnossas torneiras.

II. COM SEDE

PIOR, MUITO PIOR

NO INÍCIO DE 2004, UM ac ord o inesperad o entre Turquia e Israel trouxeà bail a o que pod e se tornar para a humanid ad e um probl ema bemmais imed iato, grave e ameaç ad or que o aquec imento gl obal egrand es apagões. O ac ord o entre as d uas naç ões prevê a vend a d earmas israel enses à Turquia em troc a d o fornec imento d e águapotável por navios-tanques aos portos d e Israel no l este d oMed iterrâneo. Pratic amente sem que o mund o tome c onhec imento, aTurquia está nad and o em água potável , já fornec e o prod uto emnavios-tanques para o Chipre e pl aneja vend ê-l o para Mal ta, Creta eJord ânia.

O c onsumo d e água d oc e vem aumentand o rapid amente no mund ointeiro. Tod os os seres humanos prec isam d el a; quem não tem ac essomorre. É simpl es assim. S im ou não, preto ou branc o, vid a ou morte .Não há meio-termo. Ao c ontrário d o probl ema d o aquec imentogl obal , que é c ontestad o por al guns c étic os, o probl ema d oabastec imento d e água é uma unanimid ad e. E está ac ontec end oagora. Com a mel horia d o nível d e vid a e o c resc imento d a popul aç ãod os países em d esenvol vimento, aumenta o c onsumo. O OCDE estimaque c ad a americ ano c onsome seisc entos l itros por d ia para beber,tomar banho, l avar l ouç a e outras ativid ad es d oméstic as. No outroextremo d a esc al a, um moç ambic ano c onsome d oze l itros por d ia —c inquenta vezes menos. Sem água, as c oisas pod em d esand arrapid amente, c omo mostraram os ac ontec imentos no Reino Unid o em2007.

Jul ho c ostuma ser um mês c huvoso no Reino Unid o, e nunc a foi

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tão c huvoso quanto no verão d e 2007, quand o a pior enc hente emsessenta anos assol ou o sud oeste d a Ingl aterra e o val e d o Tâmisa.Estima-se que mais d e 325 mil l itros d ’água por segund o foramd espejad os no r io, a c aminho d e Oxford , Read ing e Wind sor na noited e 23 d e ju l ho. Na área mais afetad a pel as enc hentes d os r ios Avon eSevern, as c asas fic aram sem água c orrente , e as pessoas, em pânic o,c orreram aos supermerc ad os para c omprar água engarrafad a eal imentos. Uma mul her d e 26 anos, d e Gl ouc ester , mãe d e d ois f i l hos,c ontou que d irigiu quase 25 quil ômetros para c omprar água d epoisque a estaç ão d e tratamento l oc al foi fec had a por c ausa d a enc hente.“ Fomos a três supermerc ad os, mas a água havia ac abad o” , c ontou.“As fil as estão enormes. Tod os estão d esesperad os para c onseguirágua. Ouvimos fal ar d e homens ad ul tos que empurravam c rianç aspara pegar garrafas. É d eprimente.”

Na Ingl aterra, c omo em qual quer parte d o mund o, o exc esso d eágua pod e ser real mente um d esastre , ou mesmo uma c atástrofe , c omoac ontec eu em Nova Orl eans em 2005. E se fal tar água por al gumassemanas ou al guns meses, c omo na sec a d e 2011 no Texas, quand o osd ois princ ipais reservatórios que abastec em Austin e outras c id ad esd a região fic aram c om menos d e 40% d e sua c apac id ad e, situaç ãoc l assific ad a c omo “grave” e bem próxima d e uma “emergênc ia” ?Sec as semel hantes afetaram gravemente a agric ul tura na Rússia em2010 e 2011.

Se a fal ta d e água temporária em uma área rel ativamentepequena d e um país ind ustrial izad o pod e c ausar tanta perturbaç ão,o que pod emos esperar d e uma esc assez prol ongad a em uma grand eárea? Nenhuma resposta seria agrad ável . A sec a d a Somál ia, que atéagora matou pel o menos tr inta mil c r ianç as e afetou mais d e d ozemil hões d e pessoas, é um bom exempl o. Como d issemos, tod os prec isamd e água. Sem el a, morremos. Assim, em que pé estamos gl obal mente?Quão l imitad o é o suprimento d e água potável ? Qual a tend ênc iapara os próximos anos e d éc ad as?

QUANDO OS CANOS SECAM

O PROGRAMA AMBIENTAL DAS Naç ões Unid as fez uma projeç ão d aesc assez d e água no mund o em 2025, país por país. De ac ord o c om o

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estud o, 1,8 bil hão d e pessoas estarão vivend o em “zonas vermel has” ,aquel as c om esc assez d e água. Isso signific a que não vão d ispor d eágua sufic iente para manter o nível atual d e c onsumo per c apita d eal imentos usand o agric ul tura irrigad a e , ao mesmo tempo, satisfazersuas nec essid ad es para ativid ad es d oméstic as, ambientais eind ustriais. Para enfrentar o probl ema, essas áreas terão d e d esviarágua d a agric ul tura, o que, por sua vez , l evará à nec essid ad e d eimportar al imentos.

Igual mente assustad oras são as estatístic as que mostram amud anç a d a retirad a d a água c omo um perc entual d a águad isponível no períod o d e tr inta anos entre 1995 e 2025. Em 1995,apenas um punhad o d e países no Oriente Méd io, no Norte d a Áfric ae em torno d o Mar Cáspio retirava 20% ou mais d a água d isponível .Em 2025, não apenas essas regiões, mas também tod a a China, grand eparte d a Europa Oc id ental e os EUA e Méxic o, estarão na c ategoriad os 20% ou mais. A essa al tura, somente Améric a d o Sul , Rússia,Oeste d a Áfric a, Canad á, Austrál ia e Nova Zel ând ia estarão na“zona segura” , retirand o 10% ou menos d a água d isponível .

Esses números mostram mel hor d o que quaisquer pal avras agravid ad e d o probl ema em esc al a gl obal . Como um úl timo prego nessec aixão, projeta-se que o número d e pessoas afetad as pel a esc assezmund ial d e água aumentará d e quinhentos mil hões em 1995 paraquase sete bil hões em 2050.

Por isso, a d isponibil id ad e d e água potável nas próximas d éc ad asé motivo d e grand e preoc upaç ão se os pressupostos atuais d e c onsumo,popul aç ão e c resc imento ec onômic o forem vál id os. Se assim for ( e asituaç ão pod e piorar aind a mais) , estaremos em uma grand eenc renc a. Conseguiremos nos l ivrar d o probl ema? É provável quenão. Mas a probabil id ad e se transformará em c erteza se não tivermosuma c ompreensão mel hor, em nível ind ivid ual , d a quantid ad e d eágua nec essária para manter o esti l o d e vid a atual . Uma boamaneira d e esc l arec er a questão é examinar a c hamad a água virtualc ontid a em quase tod os os al imentos e ver c omo o uso d a água setrad uz na “pegad a híd ric a” d e um país.

O c onc eito d e água virtual foi proposto em 1993 pel o pesquisad orbritânic o Tony Al l an, para med ir o mod o c omo a água está embutid ana prod uç ão e no c omérc io d e al imentos e bens d e c onsumo. Al l anargumenta que pessoas c onsomem muito mais que a água que bebem eusam para tomar banho. Se fosse só isso, o mund o c om c erteza não

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teria um probl ema d e esc assez . Al l an mostrou, por exempl o, quec erc a d e 140 l itros d e água estão por trás d a xíc ara d e c afé quebebemos d e manhã, 2.400 l itros são c onsumid os c om o Big Mac d oal moç o e gigantesc os 22 mil l itros se esc ond em por trás d o quil o d erosbife d o al moç o d e d omingo. Para pôr essas c ifras em perspec tiva,os 140 l itros d e água naquel a xíc ara matinal d e c afé c orrespond emmais ou menos ao c onsumo méd io d iário d e uma pessoa na Ingl aterrapara beber e para outras nec essid ad es d iárias.

Pod e-se imaginar uma espéc ie d e “c omérc io” gl obal d e águavirtual , no qual países c om pouc os rec ursos híd ric os, c omo a ArábiaSaud ita, importam prod utos c om al to c onsumo d e água, enquantoexportam prod utos c om baixo c onsumo d e água (petról eo) , l iberand oa água para outros fins. Rotul ar os prod utos d e ac ord o c om o teor d eágua virtual pod eria ajud ar a c onsc ientizar as pessoas d o probl ema.Assim, por exempl o, uma tonel ad a d e tr igo c ontém 1.200 metrosc úbic os d e água virtual , enquanto uma tonel ad a d e arroz possui2.700 metros c úbic os, mais que o d obro. Assim, poupa-se muita águaao c onsumir pão em vez d e arroz . Quanto ao c onsumo d e c arne, ac arne bovina é a grand e c ampeã, c om um teor d e água virtual quasetrês vezes maior que o d a c arne d e porc o e mais d e c inc o vezes maiorque o d a c arne d e frango. Assim, a id eia d e importar água virtualatravés d os al imentos representa uma “ fonte” al ternativa para asáreas ond e há esc assez , red uzind o assim a pressão sobre os rec ursosnaturais.

Entretanto, a c onsc ientizaç ão d o públ ic o a respeito d o teor d eágua nos al imentos, por si só, não sol uc ionará o probl ema d a esc assezgl obal . Muito mais prec isa ser feito… e d epressa. Se não, d aqui avinte anos, nossas torneiras estarão tão vazias quanto os d isc ursos d emuitos pol ític os.

SINTETIZANDO

A ELETRICIDADE E A água são fluid os, metaforic amente no primeiroc aso, l iteral mente no segund o. Ambas são fund amentais parasustentar a vid a c omo a c onhec emos. Para isso, prec isam sertransportad as d e ond e são abund antes para ond e são esc assas. Outrasemel hanç a é que as c atástrofes assoc iad as a e l as são basic amente

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l oc ais, não gl obais. Então por que são abord ad as neste l ivro? Pararespond er, prec iso expl ic ar o que entend o por “ l oc al ” .

Uma pane l oc al d a red e e l étr ic a, por exempl o, é um probl emarestr ito a uma c erta região geográfic a. O apagão d e Nova York em1977 foi l oc al , pois afetou somente a c id ad e e al gumas áreaspróximas. O apagão d e 1965 afetou grand e parte d o nord este d osEstad os Unid os, uma área bem maior, mas aind a “ l oc al ” , sec omparad a c om uma fal ta d e energia mund ial ou que atingisse o paísinteiro. Assim, c omparad os c om uma pand emia gl obal , os apagões,por sua natureza, estão restr itos a uma d ad a área geográfic a ejamais serão real mente gl obais.

Existe também a l oc al id ad e temporal , um evento l oc al izad o notempo. É o que vemos no probl ema d a esc assez d e água. Em termos d eespaç o, é uma questão d ec id id amente gl obal . Afetará tod o mund o, emtod a parte . mas nem tod os serão afetad os ao mesmo tempo. Comoac abamos d e ver, mesmo hoje em d ia o probl ema c ausa transtornos amil hões d e pessoas. Assim, no sentid o temporal , pod e-se d izer que ac atástrofe já oc orreu. Só que a maioria d os habitantes d o mund od esenvol vid o não tem c onsc iênc ia d isso porque não foi afetad a…aind a.

Uma pane na red e e l étr ic a ou no suprimento d e água potável ser iac atastrófic a, c om um enorme impac to no mod o d e vid a d el iteral mente c entenas d e mil hões, se não bil hões, d e pessoas. Eis porque as inc l uí neste l ivro.

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10

TECNOLOGIA FORADE CONTROLE

ROBÔS INTELIGENTESSOBREPUJAM A HUMANIDADE

A LEI DE MOORE

NA EDIÇÃO DE 19 DE Abril d e 1965 d a revista El ec tronic s Magazine, oengenheiro Gord on Moore, que mais tard e seria um d os fund ad oresd a Intel Corporation, esc reveu as seguintes pal avras profétic as sobreos avanç os esperad os d a tec nol ogia d os semic ond utores:

A c ompl exid ad e d e c omponentes c om c ustos mínimos temaumentad o a uma taxa d e aproximad amente um fator d e d ois ac ad a ano. (…) Certamente, a c urto prazo, pod e-se esperar queessa taxa se mantenha, se não aumentar. (…) em 1975, onúmero d e c omponentes por c irc uito integrad o c om um c ustomínimo será d e 65 mil . Ac red ito que um c irc uito d esse tamanhopossa ser prod uzid o em uma só pastil ha.

Al guns anos d epois, Carver Mead , pioneiro d os semic ond utores eprofessor d o Cal tec h, c hamou essa afirmaç ão d e “ l ei d e Moore” ,termo que os tec nofuturistas e a míd ia c onsagraram c omo a d efiniç ãomais prec isa d o progresso tec nol ógic o na era d a informátic a.

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Mutaç ões, mod ific aç ões e reformul aç ões subsequentes l evaram àc renç a geral d e que Moore havia af irmad o que a red uç ão d e tamanhod os transistores/a c apac id ad e d a memória d os c omputad ores/od esempenho d os c omputad ores/… “d obrará a c ad a d ezoito meses” .Moore, na verd ad e, não d isse nad a d isso. O que e l e d isse foi que al goabsol utamente ind ispensável para o progresso d a tec nol ogia d igitalaumentaria exponenc ial mente… sem aumento d e c usto. Al ém d isso,previu que essa tend ênc ia se manteria por pel o menos al gumasd éc ad as.

Embora tenha rec ebid o o rótul o pomposo d e “ l ei” , não há nad a d eespec ial na previsão d e Moore. Na verd ad e, e l a apl ic a-se c om amesma propried ad e ao c ic l o d e vid a d e pratic amente qual quertec nol ogia nova. Quand o uma tec nol ogia está na infânc ia, l utand opara expul sar d o c entro d o pal c o a tec nol ogia em vigor, suapartic ipaç ão no merc ad o é muito pequena. Quand o a nova tec nol ogiaganha mais ad eptos e c onquista uma fatia signific ativa d o merc ad o,a taxa d e c resc imento aumenta exponenc ial mente. Mais tard e,c omeç a a c air até se tornar negativa, ao ser substituíd agrad ativamente pel a “ próxima grand e novid ad e” .

Muitos estud os mostraram que o c ic l o d e vid a representad o poruma taxa d e c resc imento ( c omo, por exempl o, o número d e unid ad esd o prod uto vend id as a mais por mês) obed ec e d e perto à c urva emforma d e sino d as probabil id ad es d isc utid a na Parte I. Se, por outrol ad o, med irmos o c resc imento c umul ativo d a tec nol ogia ( c omo, porexempl o, o número d e unid ad es d o prod uto vend id as por mês) ,obteremos a c urva em forma d e S exibid a por muitos proc essosbiol ógic os. A parte mais abrupta d a c urva em forma d e S apresentaprec isamente o c resc imento exponenc ial previsto por Moore para ossemic ond utores.

Embora não seja uma l ei nem represente al go d e fato novo arespeito d o c resc imento d e novas tec nol ogias, a l e i d e Moore tem umagrand e importânc ia históric a, pois serviu c omo uma espéc ie d e metapara a ind ústria d a tec nol ogia d igital . Isso ac ontec eu porque asd ivisões d e pesquisa e vend as d as grand es ind ústrias d o setorac red itaram nas previsões e passaram a d esenvol ver frenetic amentenovos prod utos, c onvenc id as d e que, se não o fizessem, seriamsupl antad as pel os c onc orrentes. Assim, d e c erta forma, pod emosc onsid erar a l ei d e Moore uma profec ia autorreal izável . Umapergunta óbvia é a seguinte : quais são os l imites d esse princ ípio?

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Um bom ponto d e partid a para respond er a essa pergunta c onsisteem ouvir o próprio Gord on Moore, que afirmou em uma entrevista,em 2005, que a l ei não pod e c ontinuar a val er ind efinid amente. Oque e l e d isse foi o seguinte : “ Não pod e c ontinuar para sempre. O queac ontec e c om as exponenc iais é que voc ê forç a a barra até ac ontec erum d esastre .” Na mesma entrevista, Moore também c omentou que a“ l ei d e Moore é uma viol aç ão d a l ei d e Murphy . As c oisas não paramd e mel horar” . Entretanto, “para sempre” e “por um l ongo tempo” sãoc oisas bem d iferentes. Assim, pesquisad ores c omo Seth L l oy d ,espec ial ista em c omputaç ão quântic a d o MIT, ac red itam que o l imiteserá atingid o d aqui a seisc entos anos!

Por outro l ad o, futuristas espec ul ativos c omo o inventor RayKurzweil e o matemátic o, c ientista d a c omputaç ão e esc ritor d efic ç ão c ientífic a Vernor Vinge c onjec turaram que a c ontinuaç ão d al ei d e Moore por apenas al gumas d éc ad as provoc ará umasingul arid ad e tec nol ógic a. Em seu l ivro e S ingul arity Is Near [Asingul arid ad e está próxima] , d e 2005, Kurzweil afirma que oproc esso d a evol uç ão pod e ser d ivid id o em seis eras, c omeç and o pel osurgimento d a informaç ão em estruturas atômic as e c hegand o até oestad o em que nos enc ontramos, na Era 4, em que a tec nol ogia éc apaz d e introd uzir proc essos d e informaç ão em projetos d ehard ware e sof tware. Para Kurzweil , e stamos no l imiar d a Era 5,que envol ve a fusão d a intel igênc ia humana c om a intel igênc iamec ânic a. Em outras pal avras, este é o ponto em que o hard ware e osoftware d os c omputad ores passam a usar métod os d a biol ogia, c omoautorreparo e reprod uç ão. Esses métod os são então integrad os àtec nol ogia humana. A “singul arid ad e” — Era 6 — oc orre quand o osc onhec imentos c ontid os em nossos c érebros são c ombinad os c om ac apac id ad e d e proc essamento d e informaç ão d as nossas máquinas.

Em um artigo d e 1993, Vinge c hamou a singul arid ad e d e “umponto no qual nossos vel hos mod el os prec isam ser d esc artad os e umanova real id ad e reina” . Por termos a c apac id ad e d e internal izar omund o e perguntar “e se?” em nossas c abeç as, nós, seres humanos,c onseguimos resol ver probl emas mil hares d e vezes mais d epressa quea evol uç ão, que sai atirand o em tod as as d ireç ões para d epoisseparar o que func iona d o que não func iona. Ao nos tornarmosc apazes d e c r iar nossas simul aç ões c om uma vel oc id ad e nunc a d antesal c anç ad a, entraremos em um regime tão d iferente que será o mesmoque d esc artar tod as as regras antigas d a noite para o d ia.

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É interessante observar que Vinge atribui ao grand e visionárioJohn von Neumann o visl umbre d essa possibil id ad e na d éc ad a d e1950. Em sua autobiografia, o matemátic o S tan Ul am, amigo íntimod e Von Neumann, rec ord a uma c onversa entre os d ois sobre oprogresso c ad a vez mais ac el erad o d a tec nol ogia e as mud anç as d avid a humana. Von Neumann argumentou que o r itmo d o progressotec nol ógic o faz c om que a história humana se aproxime d e uma“singul arid ad e” , al ém d a qual os assuntos humanos c omo osc onhec emos não pod em c ontinuar. Embora e l e não parec esse usar otermo “singul arid ad e” exatamente d a mesma forma que Vinge, que serefere a uma espéc ie d e intel igênc ia sobre-humana, o teor essenc iald a afirmaç ão é o mesmo que os futuristas atuais têm em mente: umamáquina ul traintel igente , imune a qual quer tipo d e c ontrol ehumano.

Os futuristas rad ic ais afirmam que essa fusão entre a mentehumana e as máquinas permitirá à humanid ad e superar muitosprobl emas: d oenç as, rec ursos materiais finitos, pobreza, fome.Entretanto, al ertam que essa c apac id ad e também abrirápossibil id ad es inéd itas d e os seres humanos manifestarem seusimpul sos d estrutivos. Para os l e itores c om id ad e sufic iente para sel embrar d a id ad e d e ouro d os fil mes d e fic ç ão c ientífic a, tud o issoevoc a o maravil hoso c l ássic o d e 1956 O pl aneta proibid o, em queintrépid os expl orad ores intergal ác tic os visitam um pl aneta que foihabitad o pel os krel l , uma antiga c ivil izaç ão c apaz d e c r iar matériaa partir d o pensamento. A c ivil izaç ão d os krel l se extinguiu d a noitepara o d ia quand o o pod er d estrutivo d o id d esses al ienígenas pôd ese manifestar d e forma pal pável . Se porventura voc ê perd eu o fil me,a l eitura d e A tempestad e, d e S hakespeare, d á o mesmo rec ad o.

É importante observar a esta al tura que, na opinião d e Kurzweil ,para que sua previsão se c onc retize , não é nec essário que a l ei d eMoore permaneç a em vigor ind efinid amente, pel o menos na formaoriginal , apl ic ável apenas aos semic ond utores. Pel o c ontrário; e l eac red ita que al gum novo tipo d e tec nol ogia substituirá os c irc uitosintegrad os e que o c resc imento exponenc ial impl íc ito rec omeç ará c omessa nova tec nol ogia. Para d istinguir essa versão general izad a d a l eid e Moore, Kurzweil c unhou a expressão “ l ei d os retornosac el erad os” .

O tipo d e evento extremo que enfoc o neste c apítul o envol ve osurgimento d e uma espéc ie tec nol ógic a “hostil ” c ujos interesses

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c onflitam c om os interesses humanos. Em uma batal ha pl anetáriad esse tipo, os humanos pod em sair venc ed ores, mas isso não é c erto.Send o assim, c onvém examinarmos os argumentos a favor e c ontraesse tipo d e c onf l ito e tentarmos entend er por que os futuristas ac hamque d evemos nos preoc upar c om essas questões.

O PROBLEMA DAS TRÊS TECNOLOGIAS

T RÊS TECNOLOGIAS EM RÁPIDA evol uç ão preoc upam a maioria d os“teóric os d a singul arid ad e” c omo Kurzweil , Vinge e outros: aengenharia genétic a, a nanotec nol ogia e a robótic a. Eis uma visãopanorâmic a d e c ad a uma.

Engenharia genétic a: Nos ú l timos d ez anos, amanipul aç ão d o DNA d e pl antas e animais tornoupossível prod uzir organismos c om c arac terístic asc onsid erad as d esejáveis pel os “c riad ores” . Essatec nol ogia pod e ter apl ic aç ões prosaic as, c omo aprod uç ão d e tomates resistentes a pragas ou frangosmaiores e mais gord os, mas, eventual mente, pod e serempregad a para c riar seres humanos mais bonitos oumais intel igentes. Seja c omo for, teme-se que esse tipo d emanipul aç ão genétic a avanç ad a esc ape ao c ontrol e e l evea um número tão grand e d e espéc ies que não restarial ugar para a humanid ad e em nosso pl aneta.Nanotec nol ogia: Os pesquisad ores têm feito grand esesforç os para c ontrol ar a matéria em nível mol ec ul ar oumesmo atômic o. O termo genéric o “nanotec nol ogia” éusad o para d esc rever esses esforç os, que inc l uem c oisasc omo o uso d e mol éc ul as sintétic as para d esobstruirartérias entupid as (nanomed ic ina) , o uso d e mol éc ul asc omo c omutad ores em d ispositivos e l etrônic os(nanoel etrônic a) e a c onstruç ão d e máquinas d ed imensões atômic as para montar prod utos c ompropried ad es inusitad as (nanofabric aç ão) . Os estud iososd a étic a e os futuristas temem a possibil id ad e d e queesses nano-objetos se tornem c apazes d e prod uzir c ópias

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d e si próprios e que o pl aneta seja tomad o por umaenxurrad a d e “nanorrobôs” .R obótic a: Os ú l timos d ez ou vinte anos assistiram àc riaç ão d e máquinas c apazes d e real izar tarefas tr iviais,embora c ompl exas, c omo sol d ar peç as d e automóvel ouaspirar o pó d e uma c asa. O que não é nad a tr ivial éuma máquina c apaz d e pensar c omo um ser humano. Al ei d e Moore sugere que o hard ware d os c omputad oresestá se aproximand o d o ponto no qual a intel igênc iaartif ic ial será possível .

Essas três áreas oferec em a mesma visão apoc al íptic a: umatec nol ogia que foge ao c ontrol e d os seres humanos. Sejam organismosobtid os por engenharia genétic a que tomam o l ugar d as c r iaç ões d anatureza, nano-objetos que aspiram a matéria e d eixam o pl anetac oberto por uma gosma c inzenta ou uma raç a d e robôs proc riand oc omo c oel hos hiperativos para expul sar os humanos d a c ompetiç ão, oque essas visões sombrias têm em c omum é a c apac id ad e até agora nãoreal izad a d e reprod uç ão d os frutos d a tec nol ogia. Pl antas assassinasgerand o c ópias d e si mesmas, nano-objetos absorvend o os rec ursosnec essários para prod uzir c ad a vez mais nano-objetos ou robôsc onstruind o mais robôs, tud o isso l eva a humanid ad e ao mesmo tr istefim: um pl aneta inc apaz d e c ontinuar sustentand o a vid a humana,ou pior, um pl aneta ond e nós, humanos, não c onseguimos maisc ontrol ar nosso d estino, d ominad os por objetos gerad os por nossaprópria tec nol ogia.

Até o momento, um prod uto tec nol ógic o potenc ial mente perigoso,c omo uma bomba nuc l ear, só pod e ser usad o uma vez . Segund o osfuturistas, os organismos gerad os por engenharia genétic a, os nano-objetos e os robôs estarão l ivres d essa restr iç ão. Serão c apazes d e sereprod uzir c om uma rapid ez nunc a vista. Quand o esse ponto foral c anç ad o, será o iníc io d o fim d a humanid ad e c omo espéc ied ominante d o pl aneta. Pel o menos, é esse o c enário pintad o portec nopessimistas c omo Bil l Joy , um d os fund ad ores d a SunMic rosy stems, que d efend eu em 2002 a imposiç ão d e severasrestr iç ões às pesquisas nessas áreas para evitar esse tipo d e“singul arid ad e” tec nol ógic a. Mais ad iante vol tarei a fal ar d oassunto.

Vamos d isc utir agora se um d os perigos mais interessantes entre os

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que foram apresentad os, uma praga d e robôs, é real mente umc and id ato viável para rel egar os seres humanos à l ata d e l ixo d ahistória.

MÁQUINAS INTELIGENTES

PRATICAMENTE DESDE O INÍCIO d a era d os c omputad ores mod ernos, nofinal d a d éc ad a d e 1940, a id eia d o c omputad or c omo um “c érebrogigante” tem sid o a metáfora d ominante. Na verd ad e, as primeirasd esc riç ões popul ares d os c omputad ores e d o que seriam c apazes d efazer se referiam a e l es c omo “c érebros e l etrônic os” . Essa metáfora sepopul arizou após uma c onferênc ia hoje l end ária no DartmouthCol l ege , em 1950, sobre o tema atual mente c onhec id o c omo“ intel igênc ia artific ial ” , o estud o d e c omo fazer um c omputad orpensar c omo um ser humano. Mais ou menos na mesma époc a, o ingl êsAl an Turing, um d os pioneiros d a c omputaç ão, publ ic ou um artigointitul ad o “ Máquinas d e c omputaç ão e intel igênc ia” , no quald efend ia a tese d e que seria possível c r iar um c omputad or c apaz d epensar c omo um ser humano. Nesse artigo, Turing c hegou a proporum teste , hoje c onhec id o c omo teste d e Turing , para d esc obrir se umc omputad or estava real mente pensand o. El e estabel ec e que oc omputad or está pensand o c omo um ser humano se um interrogad orhumano não é c apaz d e d eterminar c om c erteza se a máquina é umser humano ou uma máquina através d e uma série d e perguntas,formul ad as sem que o interrogad or possa ver o interrogad o. Oimportante aqui é que uma estirpe d e robôs, para c onquistar omund o, prec isa ter um meio d e proc essar as informaç ões sobre omund o material que são fornec id as por seus sensores. Em outraspal avras, nec essita d e um c érebro.

A questão é se a tec nol ogia c hegou ao ponto em que um c érebroc apaz d e d ar c onta d o rec ad o pod e ser c onstruíd o c om o tipo d eequipamento d isponível no momento ou no futuro próximo.(Observaç ão: o robô não prec isa ser c apaz d e resol ver os mesmosprobl emas que os seres humanos. Nem é nec essário que o robô pensed a mesma forma que um humano. Basta que um c érebro c onsigaproporc ionar ao robô uma vantagem na c ompetiç ão c om os humanos.)Vamos anal isar c om mais d etal hes a questão d e qual é o pod er d e

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c omputaç ão nec essário para igual ar ou exc ed er a c apac id ad e d oc érebro humano.

Para isso, examinemos primeiro o c érebro. Com base emestimativas d o grau d e proc essamento nec essário para simul arfunç ões c erebrais espec ífic as, c omo a perc epç ão visual , as funç õesaud itivas etc . , é possível extrapol ar os requisitos d e proc essamentopara o c érebro inteiro. Assim, por exempl o, as estimativas sugeremque o proc essamento visual d a retina requer c erc a d e d ez mil hões d einstruç ões por segund o (MIPS) ou c arac teres por segund o ( c ps) . Comoo c érebro humano possui uma massa c erc a d e 75 mil vezes maior queos neurônios d a parte d e proc essamento d a retina (mais ou menos umquinto d e tod a a retina, aproximad amente 0,2 grama) , c hegamos auma estimativa d e 1014 instruç ões por segund o para o c érebrointeiro. Outra estimativa d o mesmo tipo, obtid a a partir d o sistemaaud itivo, l eva a uma c ifra d e 1015 instruç ões por segund o para oc érebro inteiro. Outros c ál c ul os resul taram em estimativassemel hantes para o pod er d e proc essamento d o c érebro humano.

Como isso se c ompara c om um c omputad or? Os c omputad orespessoais d e hoje real izam c erc a d e 109 instruç ões por segund o.Apl ic and o a l ei d os retornos ac el erad os, c onc l uímos que osc omputad ores d everão apresentar um d esempenho semel hante ao d oc érebro humano d aqui a uns quinze anos. Isso em rel aç ão aoproc essamento. E quanto à memória?

Segund o as estimativas, um ser humano que d omina uma áreac omo a med ic ina, a matemátic a, o d ireito ou o xad rez c onsegue sel embrar d e c erc a d e d ez mil hões d e “bl oc os” d e informaç ão,formad os por c onhec imentos espec ífic os e c onexões c om outrosc onhec imentos. Os espec ial istas ac red itam que o armazenamento d ec ad a um d esses bl oc os requer c erc a d e um mil hão d e bits. Assim, ac apac id ad e d e armazenamento total d o c érebro é d a ord em d e 1013

bits. As estimativas d a c apac id ad e d e memória d o c érebro basead asnas c onexões entre neurônios resul tam em números maiores, d a ord emd e 1018.

De ac ord o c om as projeç ões d o aumento d a memória d osc omputad ores, d everá ser possível c omprar 1013 bits d e memória pormenos d e mil d ól ares d aqui a d ez anos. Assim, é razoável esperar queuma quantid ad e d e memória igual à d e um c érebro humano estejad isponível por vol ta d e 2020.

Combinand o as d uas estimativas, c hegamos à c onc l usão d e que, em

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menos d e vinte anos, d everá ser possível c omprar por c erc a d e mild ól ares um c omputad or c om uma c apac id ad e d e proc essamento e umamemória c omparáveis às d o c érebro humano.

O que d izer d o sof tware? Não basta que o hard ware d e umc omputad or tenha uma c apac id ad e igual à d e um c érebro humano.Só teremos uma “kil l er app” quand o a vel oc id ad e, a prec isão e amemória infal ível d o c omputad or forem ac ompanhad as d eintel igênc ia (ou seja, sof tware) em nível humano. Para isso,prec isamos fazer a “engenharia reversa” d o c érebro, c apturand o seusoftware no hard ware d o futuro.

Quand o se trata d e simul ar o c érebro, antes d e mais nad aprec isamos rec onhec er que existem muitas d iferenç as entre umc érebro e um c omputad or. Eis al gumas importantes:

Anal ógic o versus d igital : Um c omputad or mod erno éessenc ial mente uma máquina d igital , c apaz d e l igar ed esl igar c omutad ores a uma vel oc id ad e estonteante. Oc érebro, por outro l ad o, usa uma mistura d e proc essosd igitais e anal ógic os para c al c ul ar. Embora nosprimórd ios d a c omputaç ão as pessoas fizessem muitoal ard e d o aspec to aparentemente d igital d os neurôniosc erebrais, d esc obrimos mais tard e que o c érebro humanoé um d ispositivo pred ominantemente anal ógic o, que usagrad ientes químic os (neurotransmissores) para abrir efec har os c omutad ores neuronais. Assim, enc ontrar umasemel hanç a entre os c irc uitos d e c omutaç ão d oc omputad or e os d o c érebro é , no mínimo, forç ar a barra.Vel oc id ad e: O c érebro é l ento; o c omputad or é vel oz . Naverd ad e, o tempo d e c ic l o d os c omputad ores mais baratosé bil hões d e vezes menor que o tempo d e c ic l o d e umneurônio, que é d a ord em d e vinte mil issegund os. Assim,o c érebro só d ispõe d e umas pouc as c entenas d e c ic l ospara rec onhec er pad rões.Paral el o versus serial : O c érebro possui tr il hões d ec onexões entre seus neurônios. Esse al to grau d ec onec tivid ad e permite real izar um grand e número d ec omputaç ões em paral el o, d iferind o d e quase tod os osc omputad ores d igitais, que real izam uma operaç ão porvez d e forma serial .

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Essas são apenas al gumas d as c arac terístic as que d istinguem umc érebro humano d e um c omputad or. Entretanto, c om a c apac id ad e d ec omputaç ão d isponível no futuro próximo, será possível simul ar oc érebro sem real mente tentar imitá-l o. O que é nec essário para opróximo estágio d a evol uç ão é que os c omputad ores se jamfunc ional mente equival entes ao c érebro, e não que reprod uzam suaestrutura f ísic a.

Dito isso, simul ar as funç ões d e um c érebro humano usand o umc omputad or não é o mesmo que simul ar um ser humano. Ou é? Cl aroque um c érebro supra-humano d esenc arnad o pod eria fac il mentesubstituir seres humanos à base d e c arbono c omo a espéc ie d ominanted o pl aneta. Entretanto, mesmo um c érebro d esenc arnad o prec isa d eum meio f ísic o para existir. Atual mente, esse meio é a pl ac a-mãe, otec l ad o, o monitor, o d isc o r ígid o, os c hips d e memória R AM e outrosc omponentes. Amanhã, quem sabe? O que sabemos é que aintel igênc ia prec isará d e al gum tipo d e meio f ísic o. Isso signific ad ispor d e sensores para ter ac esso ao mund o exterior, al ém d e al gumtipo d e interfac e que separe a intel igênc ia d o que está “d o l ad o d efora” . Com isso, enc erramos a parte d os c omputad ores. E quanto aosrobôs?

CÉREBRO NO FRASCO VERSUS ROBBY, O ROBÔ

E NQUANTO ESCREVO ESTAS PALAVRAS no c ômod o d a minha c asa que served e esc ritório, na sal a d e estar um robô c hamad o “ Roomba” aspirad il igentemente o pó d o tapete e d o piso. Tiro o c hapéu para osprojetistas d a iRobot, Inc . , que c onstruíram essa engenhoc a, pois e l aé exímia em uma tarefa que od eio — exatamente o que a maioria d enós espera d e um robô. Basic amente, o que d esejamos é um autômatoque obed eç a às nossas ord ens sem questioná-l as, al iviand o-nos d eobrigaç ões nec essárias, mas c ansativas e enfad onhas, c omo os serviç osd e l impeza. O que c om c erteza não d esejamos é um grupo d e robôsintel igentes que resol vam virar a mesa e fazer c om que os humanospassem a fazer as tarefas d oméstic as para e l es. Quais são aspossibil id ad es d e que isso ac onteç a?

Pouc o antes d e Roomba c omeç ar o trabal ho na minha sal a d eestar, eu e um amigo assistimos a O pl aneta proibid o, o c l ássic o d a

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fic ç ão c ientífic a d e 1956 a que já me referi. Embora a tec nol ogiaimaginad a pel os prod utores d o fil me c inquenta anos atrás esteja umpouc o ul trapassad a, o enred o e a moral d a história estão tão fresc osc omo os c roissants d a pad aria d a esquina.

Os espec ial istas em efeitos espec iais d os anos 1950 estavam l onged os pad rões atuais, mas a d esc riç ão d e Robby , o Robô, uma máquinaque serve d e motorista, c ozinheiro, meio d e transporte e faz-tud opara os humanos, é sensac ional . Minha mente ad ol esc ente fic oufasc inad a c om as possibil id ad es quand o vi o fil me pel a primeira veze me maravil hei c om a c apac id ad e d e Robby d e aprend er tarefasnovas e entend er as instruç ões humanas. Al ém d isso, no final d ofil me, e l e permanec e l eal aos seus c r iad ores, ao entrar em c urto-c irc uito quand o rec ebe instruç ões para c ausar mal a um ser humano.

A questão que a história d e Robby l evanta é se um robô c om essasqual id ad es quase sobre-humanas obed ec eria a al go c omo as l e is d arobótic a d e Isaac Asimov. Por vol ta d e 1940, Asimov propôs asseguintes l e is a que um robô d everia estar sujeito para ser um servoperpétuo d os humanos, e não um rival .

Primeira l ei : Um robô não pod e fazer mal a um serhumano ou, por omissão, permitir que um ser humanosofra al gum tipo d e mal .Segund a l ei : Um robô d eve obed ec er às ord ens d os sereshumanos, a não ser que entrem em c onflito c om aprimeira l ei .Terc eira l ei : Um robô d eve proteger a própria existênc ia,a não ser que essa proteç ão entre em c onflito c om aprimeira ou a segund a l eis.

Uma d as l e is d a robótic a (a segund a l ei) estabel ec e que os robôssão esc ravos d os humanos. Entretanto, esse papel pod e ser anul ad opel a primeira l ei , que tem prec ed ênc ia e proíbe que os robôs faç ammal aos seres humanos, se ja por inic iativa própria, se ja obed ec end o aord ens d e um ser humano. Essa d iretr iz os imped e d e exec utarqual quer aç ão que possa c ausar mal aos seres humanos e imped etambém que os robôs sejam usad os c omo instrumentos d e agressão.

A terc eira l ei equival e a um instinto d e sobrevivênc ia. Graç as ael a, c aso não haja c onf l ito c om as d uas primeiras l e is, um robô

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• proc ura evitar sua d estruiç ão por c ausas naturais ou ac id ente,• se d efend e d e ataques d e outros robôs e• se d efend e d e ataques d e humanos.

Roger Cl arke e outros observaram que, d e ac ord o c om a segund al ei, um robô está obrigad o a c umprir uma ord em humana para (1)não resistir a ser d estruíd o ou d esmantel ad o, (2) c ausar a própriad estruiç ão ou (3) (até ond e isso não for um parad oxo) d estruir a sipróprio. Em d iferentes histórias, Asimov observa que a ord em d e seautod estruir não prec isa ser obed ec id a c aso e l a possa c ausar mal aum ser humano. Al ém d isso, um robô não está imped id o d e ped ir umajustif ic ativa para esse tipo d e ord em.

Uma fal ha d as três l e is d e Asimov muito importante para nossospropósitos é o fato d e que e l as se referem a seres humanos c omoind ivíd uos. Nad a é d ito a respeito d e aç ões d os robôs que possamprejud ic ar um grupo ou, no c aso extremo, a humanid ad e c omo umtod o. Isso nos l eva a propor uma l ei ad ic ional :

Lei zero: Um robô não pod e fazer mal à humanid ad e ou, poromissão, permitir que a humanid ad e sofra al gum tipo d e mal .

Essas “ l eis” d a boa c id ad ania robótic a impõem as sérias restr iç õesju l gad as nec essárias para manter um band o d e robôs intel igentes sobc ontrol e . Dad a a tend ênc ia d os seres intel igentes d e evol uir paraaumentar suas c hanc es d e sobrevivênc ia, parec e improvável que osrobôs d o tipo que imaginamos aqui se c ontentem em servir aos sereshumanos que tiverem c apac id ad e d e servir a si próprios. No fil me d e2004 Eu, robô, l ivremente basead o em um l ivro d e c ontos d e Asimovpubl ic ad o em 1950, os robôs reinterpretam as l e is e c hegam àc onc l usão l ógic a d e que a mel hor forma d e proteger os humanos égoverná-l os. O parad oxo aqui é que, para serem real mente úteis, osrobôs d evem ser c apazes d e tomar d ec isões. Assim que ad quirem essac apac id ad e, enc ontram meios tortuosos d e viol ar as l e is d a robótic a.

Está na hora d e vol tar à pergunta inc ômod a: os robôs vãod ominar o mund o? A resposta suc inta é… um d ec id id o tal vez !

Uma d e minhas objeç ões favoritas às previsões d e al guns futuristasd e que os robôs assumirão o pod er nas próximas d éc ad as é que osc orpos d os robôs serão feitos d e tec nol ogia mec ânic a, não e l etrônic a.

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Ac ontec e que a engenharia mec ânic a não está se d esenvol vend o nomesmo ritmo frenétic o que os c omputad ores. Não existe uma l ei d eMoore d a mec ânic a. A títu l o d e i l ustraç ão, se os automóveis tivessemsid o aperfeiç oad os c om a mesma rapid ez que os c omputad ores,teríamos hoje c arros menores d o que uma c aixa d e fósforos viajand oa vel oc id ad es supersônic as, transportand o tantos passageiros quantoum trem e c onsumind o uma c ol her d e c há d e gasol ina. Em suma, otamanho importa quand o se trata d e tec nol ogia mec ânic a, e a regra éque, quanto maior, mais pod eroso. No c aso d os c omputad ores,ac ontec e justamente o c ontrário.

Assim, mesmo que venhamos a c onstruir robôs c entenas d e vezesmais intel igentes que os humanos d aqui a al gumas d éc ad as, oshumanos c ontinuarão a d esfrutar d e uma grand e superiorid ad e d oponto d e vista mec ânic o. Os humanos serão c apazes d e d errubar umrobô sem prec isar fazer muita forç a, subirão esc ad as e árvores c ommuito mais fac il id ad e que qual quer robô sobre rod as e , d e formageral , superarão os robôs em quase tod as as tarefas que exijam ac apac id ad e d el ic ad a d e manipul aç ão d e nossas mãos e nossos d ed os.

Se eu gostasse d e apostas, não hesitaria em apostar nasuperiorid ad e humana no que d iz respeito à d estreza mec ânic a,mesmo sabend o que já d ispomos d e robôs c apazes d e real izaroperaç ões c irúrgic as por c ontrol e remoto e d e sol d ad os robótic os queexec utam missões em áreas infestad as d e minas terrestres, gasesvenenosos e outros perigos. O fato d e que c onseguem exec utar essastarefas é real mente impressionante. Entretanto, essas são máquinasd e uso espec íf ic o, c omo o aspirad or R oomba, projetad as para real izarum trabal ho bem d efinid o… e apenas esse trabal ho.

Os seres humanos, por outro l ad o, têm uma c apac id ad e muitomaior d e reformul ar os pl anos quand o d eparam c om imprevistos.Cl aro que se pod eria argumentar que, quand o o c érebro robótic oc omeç ar a superar o humano em sua c apac id ad e d e proc essarinformaç ões e d e se ad aptar a imprevistos, nossos d ias pod em estarc ontad os. Com essa possibil id ad e em mente, retornemos à questão d asingul arid ad e e examinemos quand o isso pod erá oc orrer .

A SINGULARIDADE

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NO ARTIGO DE VINGE d e 1993 que d esenc ad eou os d ebates a respeito d aSingul arid ad e, são esboç ad os d iversos c aminhos que pod eriam l evarà c riaç ão tec nol ógic a d e uma intel igênc ia trans-humana. Entre e l es,segund o o próprio Vinge, estão os seguintes:

• São c riad os c omputad ores “c onsc ientes” d otad os d eintel igênc ia sobre-humana.

• Grand es red es d e c omputad ores ( c omo a internet, por exempl o)e seus usuários se tornam uma entid ad e c om intel igênc ia sobre-humana.

• As interfac es homem/c omputad or se tornam tão sofistic ad as queos usuários humanos ad quirem uma intel igênc ia sobre-humana.

• Os biól ogos d esc obrem meios artific iais d e aumentar aintel igênc ia humana.

Os três primeiros e l ementos d a l ista envol vem avanç os na área d osc omputad ores, enquanto o ú l timo é basic amente genétic o. Tod ospod em ser fac il itad os por d esc obertas no c ampo d a nanotec nol ogia.Assim, as três tec nol ogias menc ionad as anteriormente c ontribuempara a c r iaç ão d a singul arid ad e. Al ém d isso, uma vez que essaintel igênc ia ganhe “vid a” , é provável que l eve a um surtoexponenc ial d e c r iaç ão d e intel igênc ias aind a maiores.

Do ponto d e vista humano, as c onsequênc ias d o surgimento d essasintel igênc ias sobre-humanas são inc al c ul áveis. Tod as as vel has regrasserão d esc artad as, tal vez em pouc as horas! Mud anç as que antesl evariam geraç ões ou mil ênios pod erão ac ontec er em pouc os anos…ou menos.

Na próxima d éc ad a, o movimento rumo à singul arid ad eprovavel mente mal será notad o. Quand o, porém, o hard ware d osc omputad ores atingir um nível bem ac ima d a c apac id ad e humana, ossintomas se tornarão evid entes. Veremos máquinas assumirem c argosd e responsabil id ad e, c omo os d e gerênc ia, antes c onsid erad os umaprerrogativa d os seres humanos. Outro sintoma será umad isseminaç ão mais rápid a d as id eias. Cl aro que já c ontamos c om osc omputad ores para uma série espantosa d e tarefas apenas no c ontextod as c omunic aç ões, c omo d esc revi no c apítul o d ed ic ad o à internet.Entretanto, mesmo em uma ativid ad e c orriqueira c omo esc rever estel ivro, estremeç o ao pensar c omo eram as c oisas três d éc ad as atrás,

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quand o esc revi minha primeira obra… l iteral mente à mão! Essepensamento é um sinal d e al erta para o que ac ontec erá ao nosaproximarmos d a singul arid ad e.

Como será quand o a singul arid ad e real mente c hegar? Segund oVinge, será c omo se nossos artefatos simpl esmente “ac ord assem” . Nomomento em que transpusermos seu l imiar, estaremos na era pós-humana.

O ponto mais c ruc ial aqui é se a singul arid ad e é real mentepossível . Se c onseguirmos nos c onvenc er d e que pod erá d e fatoac ontec er, somente a d estruiç ão total d a soc ied ad e humana pod eráevitá-l a. Aind a que tod os os governos d o mund o tentassem imped i-l a,os pesquisad ores enc ontrariam meios d e c ontinuar progred ind o até ameta. Em suma, se al go pod e oc orrer, oc orrerá — a d espeito d o queos governos, ou as soc ied ad es c omo um tod o, possam pensar d isso. Esseé o rumo natural d a c uriosid ad e e d a inventivid ad e humanas. Enenhum d isc urso pol ític o bombástic o ou moral ismo fanátic o irámud ar esse estad o d e c oisas.

Assim, supond o que a singul arid ad e possa oc orrer, quand oac ontec erá a “transiç ão”? Parec e haver um c onsenso razoável quantoà resposta: d entro d os próximos vinte a tr inta anos. O futurista d atec nol ogia Ray Kurzweil foi aind a mais espec ífic o. No l ivro TheSingul arity Is Near, que se tornou uma espéc ie d e bíbl ia d os profetasd a singul arid ad e, e l e af irma:

Fixei a d ata d a singul arid ad e — no sentid o d e umatransformaç ão profund a e d isruptiva d a c apac id ad e humana— em 2045. A intel igênc ia não biol ógic a c riad a nesse ano seráum bil hão d e vezes mais pod erosa que tod a a intel igênc iahumana atual .

Isso é que é previsão prec isa!De minha parte , embora ac red ite firmemente que haverá uma

singul arid ad e, enc aro c om c etic ismo o anúnc io d a d ata em que e l aac ontec erá. Os argumentos basead os na l ei d e Moore, na l ei d osretornos ac el erad os, na c uriosid ad e humana e tud o mais, l evand o aesse “grand e” evento d aqui a al gumas d éc ad as, me fazem l embrar ospronunc iamentos, no iníc io d a d éc ad a d e 1950, d os d efensores d aintel igênc ia artific ial sobre o que os c omputad ores fariam (ou não)

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nos anos vind ouros. Previa-se que e l es se tornariam c ampeõesmund iais d e xad rez em menos d e d ez anos, fariam trad uç ões c om amesma c ompetênc ia que um trad utor humano e em uma fraç ão d otempo, pod eriam ser usad os c omo mord omos e l etromec ânic os paraservir um d r y -martíni após um d ia exaustivo no esc ritório e assimpor d iante. Bem, al gumas d essas previsões foram c umprid as, c omoac ontec eu quand o um c omputad or (Deep Bl ue II) d errotou oc ampeão mund ial d e xad rez (em 1997, não na d éc ad a d e 1960, e c ommétod os total mente d iferentes d os d e um jogad or humano) , enquantooutras estão mais d istantes d o que nunc a (a trad uç ão porc omputad or aind a d eixa muito a d esejar) . Na verd ad e, o métod ousad o pel os profetas d a singul arid ad e é o mais c omum na área d afuturol ogia: extrapol ar as tend ênc ias atuais, ignorand o apossibil id ad e d e que ac onteç am surpresas no c aminho. Por outro, osperc al ç os pod em apenas protel ar o d ia d a prestaç ão d e c ontas, esuspeito fortemente que, antes d o final d o séc ul o, surgirá o tipo d eintel igênc ia sobre-humana nec essário para que a singul arid ad eoc orra.

SINTETIZANDO

O AUMENTO DA COMPLEXIDADE no mund o d as máquinas está rapid amenteul trapassand o o l ad o humano d a equaç ão. Ao c ontrário d e al gumassobrec argas d e c ompl exid ad e a que me referi anteriormente, c omo umataque d e PEM ou o c ol apso d a internet, a singul arid ad e é umevento X que l evará d éc ad as, não minutos ou segund os, paraac ontec er. Entretanto, seus e feitos serão d ramátic os e irreversíveis,expul sand o os humanos d o c entro d o pal c o d o grand e d ramaevol utivo d a vid a neste pl aneta.

Apresentei, portanto, os argumentos a favor e c ontra o fim d a erahumana. Em úl tima anál ise , parec e uma boa aposta que o probl emad as três tec nol ogias l evará ao tipo d e intel igênc ia transc end enteintrod uzid o pel a singul arid ad e.

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A GRANDE CRISE

DEFLAÇÃO GLOBAL E OCOLAPSO DOS MERCADOSFINANCEIROS MUNDIAIS

SEM GRANA EM WASHINGTON, D.C.

NO INTERESSANTE BEST-SELLER e Day After the Dol l ar Crashes [O d iad epois que o d ól ar c air] , o anal ista financ eiro e c omentarista DamonVic kers pinta um c enário d e uma semana que c omeç a c om osmerc ad os c ambiais func ionand o normal mente e c ul mina em umaampl a c ampanha popul ar pel a reforma d o sistema pol ític oameric ano. Aqui estão al guns marc os ao l ongo d a estrad a d e Vic kers,d a normal id ad e à l ouc ura, e vic e-versa.

Quarta-feira, 10h: O governo americ ano promove seul eil ão habitual d e títu l os d o Tesouro, sol ic itand o aomund o que financ ie o mod o d e vid a perd ul ário d o país.Os Estad os Unid os vêm ped ind o d inheiro emprestad o aum para pagar a outro há d éc ad as; portanto o Tesouroprevê outro l ei l ão d e rotina d e sua d ívid a parac ontinuar o esquema Ponzi (“pirâmid e”) em nívelgl obal . Mas, para o espanto d o governo e d os merc ad osfinanc eiros, o mund o enfim resol ve end urec er e d iz :“ Nad a d isso.”Domingo (à noite) a segund a-feira (d e manhã) , NovaYork e Ásia: Dad as as c ompl exas inter l igaç ões e al tas

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c orrel aç ões entre os merc ad os financ eiros gl obais ( red ed e al ta c ompl exid ad e) , quand o a d ívid a americ ana nãoc onsegue enc ontrar c omprad ores, os merc ad os d e c âmbioasiátic os d espenc am, provoc and o a qued a l ivre d osmerc ad os ao red or d o mund o. A Bol sa d e Val ores d eNova York (NYS E) abre às 9h30 e fec ha vinte minutosd epois, soterrad a por uma aval anc he d e ord ens d e vend a.Terç a-feira, 11h30: A Bol sa d e Nova York abre c om d uashoras d e atraso d epois que os merc ad os gl obaisafund aram quase 10% em rel aç ão ao fec hamento d esexta-feira.Sexta-feira, 14h: Após uma l igeira rec uperaç ão qued urou d e terç a-feira até a manhã d e sexta, as bol sas naEuropa e nos Estad os Unid os c ontinuam c air, mesmod iante d e um grand e aumento d a taxa d e jurosameric ana.

A história fic a aind a pior, já que tod os estão vend end o tud o:aç ões, títu l os, moed as, c ommod ities. A c onfusão reina, suprema,enquanto o pânic o d á a vol ta ao mund o. Na quarta-feira, o FMI eoutras instituiç ões financ eiras gl obais c r iam um novo sistema d ec âmbio mund ial , ord enand o que tod os os países parem d e imprimirsuas moed as nac ionais. E assim por d iante. Pergunta: trata-se apenasd e uma fantasia c r iad a para provoc ar a imaginaç ão? Ou existe umapossibil id ad e real d e tal pânic o vir a ac ontec er?

A pergunta interessa a tod os que possuem uma c onta banc ária, umemprego, que ad ministram uma empresa ou simpl esmente gastamd inheiro. A ec onomia gl obal é impressionante, c om o PIB gl obalbeirand o os c em tril hões d e d ól ares. O sistema financ eiro d e banc os,c orretoras, assoc iaç ões d e empréstimo e poupanç a etc . serve d eveíc ul o para que esse enorme mar d e d inheiro se transfira d e uml ugar para outro, c onforme nec essário. Assim, um c ongel amento (ouc ol apso, se voc ê preferir) d o sistema financ eiro seria c omo d espejarareia no sistema d e l ubrific aç ão d e seu c arro. O c arro não irá muitol onge sem l ubrific aç ão, nem a ec onomia mund ial sem o sistemafinanc eiro gl obal . Agora retornemos à questão d e se o c enárioanterior é um quad ro real ista d o que pod eria ac ontec er ou um merod el ír io fantasioso.

Para respond er a essa pergunta, tud o que prec isamos fazer é ol har

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as notíc ias d os primeiros d ias d e agosto d e 2011, mud and o al gunspequenos d etal hes d o c enário d e Vic kers para refletir aspreoc upaç ões gl obais c om a c rise d a d ívid a d a zona d o euro — naqual a Gréc ia estava (está?) ameaç and o d ar o c al ote d e sua d ívid a—, ac resc entar o rebaixamento d a d ívid a d o governo d os EUA poruma agênc ia d e c l assific aç ão d e r isc o, o que por sua vez espanta osinvestid ores que c omeç am a se preoc upar c om a sol vênc ia d o Tesouroameric ano, e por fim sal pic ar um pouc o d a preoc upaç ão l egítima c oma d isposiç ão d os l egisl ad ores d aquel e país em agir nos mel horesinteresses d a naç ão, e não no interesse próprio.

Para que tal pânic o tenha iníc io, muitas c ond iç ões ter iam d e sersatisfeitas mais ou menos ao mesmo tempo. El as inc l uem umafraqueza c ontínua d o sistema financ eiro americ ano provoc ad a, porexempl o, por uma c rise d a d ívid a ou um enfraquec imento d o perfilec onômic o nos Estad os Unid os, um evento que sirva para d eflagrar opânic o e , é c l aro, uma al ternativa viável aos investimentos em aç õese títu l os americ anos. A al ternativa-pad rão a que muitos c ostumamrec orrer é o ouro. Mas pod eria ser pratic amente qual quer repositóriod e val or rec onhec id o, c omo d iamantes, petról eo, med ic amentos,pl atina ou, o mais c omum, d inheiro vivo.

O interessante é que, embora a qual id ad e d e investimento d ad ívid a d o Tesouro americ ano em forma d e l etras d e l ongo prazo fosserebaixad a por uma d as princ ipais agênc ias, quand o tud o veioabaixo, no iníc io d e agosto d e 2011, o porto seguro preferid o pel osinvestid ores para d epositar o d inheiro retirad o d o merc ad o d e aç õesforam (voc ê ad ivinhou!) os títu l os d o Tesouro americ ano. Com isso, opreç o d esses instrumentos d isparou mais d e 20% em menos d e d oismeses! Mas será que al guém imaginou que ac ontec eria o inverso?Afinal , quand o os merc ad os entram em pânic o e os vend ed ores fic amc om um punhad o d e d inheiro na mão, esse d inheiro prec isa ir paraal gum l ugar. Ac abou send o apl ic ad o exatamente ond e o pensamentoc onvenc ional d iz ia que não d everia/pod eria: na d ívid a d o governoameric ano, sob a forma d e títu l os d e l ongo prazo d o Tesouro.Quand o em d úvid a, negoc ie c om o d iabo que voc ê c onhec e, neste c asoo governo americ ano.

Esse fato mostra, mel hor d o que qual quer estatístic a, que o queimporta no mund o d as finanç as é a c onfianç a. Em outra pal avra,c red ibil id ad e. A instituiç ão que d etém seu d inheiro estará emc ond iç ões d e d evol vê-l o quand o voc ê prec isar? Ou as portas estarão

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fec had as quand o voc ê e mil hares d e outros aparec erem para sac ar seud inheiro? O governo americ ano tem sid o o pad rão pl atina nesseaspec to d esd e o final d a Segund a Guerra Mund ial . Se vai c onservaressa posiç ão privil egiad a no futuro próximo, aind a não sabemos. Maspor ora o Tesouro americ ano, em Washington, D.C., parec e ser amel hor d entre um c onjunto pouc o atraente d e al ternativas.

Como a história d e um c ol apso d o setor financ eiro americ ano estáintimamente l igad a ao d estino d a ec onomia americ ana ou, naverd ad e, d e tod a a ec onomia gl obal , enfoc arei aqui c omo asobrec arga d e c ompl exid ad e c ul minou na atual c r ise financ eiramund ial . Essa história l evará à d esc riç ão d e uma tempestad ed eflac ionária se formand o em um horizonte não tão d istante assim,ameaç and o l anç ar tod a a ec onomia mund ial numa espiral d a quall evará d éc ad as para sair .

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DA PERSPECTIVA ATUAL, É impressionante a fé que a c omunid ad e gl obald eposita nos banc os c entrais e nos regul ad ores financ eiros paraafastar qual quer ameaç a à integrid ad e d o sistema financ eiromund ial . Como d isse Paul Seabright num artigo para a ForeignPol ic y , c onstruímos uma “ Linha Imaginot” , al usão às fortific aç õesd efensivas estátic as que não c onseguiram proteger a Franç a d ainvasão al emã na Segund a Guerra Mund ial . Seabright id entific atrês d efesas ec onômic as princ ipais c ontra a c r ise financ eira, c ad auma vul nerável isol ad amente, mas que tomad as em c onjuntoparec iam inabal áveis em 2008.

O primeiro nível d e d efesa foi o seguro d e d epósitos. Essa parte d a“ l inha” foi c r iad a para proteger c ontra a id eia d e que a c r isebanc ária d os anos 1930 foi c ausad a pel o pânic o e pel a c orrid a aosbanc os d os pequenos c orrentistas e empresas varej istas. Com umseguro d e d epósitos c omo o d a Fed eral Deposit Insuranc eCorporation, o probl ema d esaparec e — ao menos para os pequenosc orrentistas.

O c hamad o probl ema d o r isc o moral , em que os banc os c omc orrentistas segurad os não se sentem motivad os a investir c omc uid ad o o d inheiro d el es e os c orrentistas não têm motivaç ão paraesc ol her c om c uid ad o os banc os ond e apl ic am seus fund os, serve para

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d estac ar o segund o nível d e d efesa. A sol uç ão para o probl ema d orisc o moral foi a c r iaç ão d e uma c ompl ic ad a estrutura d eregul amentaç ões financ eiras, c om requisitos d e c apital para imped irque os banc os fossem imprud entes e perd essem o d inheiro d ospequenos c orrentistas. Mas essas regras não se apl ic aram aos grand esinvestid ores profissionais, supostamente d ispostos a arc ar c om seuspróprios r isc os. A red e d e seguranç a era c onsid erad a à prova d efal has, signific and o que, quaisquer que fossem os r isc os d o sistema,quem arc aria c om el es ser iam os outros, não os próprios investid ores.Aind a no final d e 2003, o Prêmio Nobel d e Ec onomia Robert Luc asassegurava à Assoc iaç ão Ec onômic a Americ ana que o “probl emac entral d a prevenç ão d a d epressão havia sid o resol vid o, para tod os osf ins prátic os” .

Final mente, a terc eira l inha d o tr iângul o d efensivo foram osbanc os c entrais. A partir d a d éc ad a d e 1930, e l es foram inc umbid osd e manter os preç os estáveis e , c omo tarefa sec und ária, promover aprod uç ão ec onômic a e manter sob c ontrol e o d esemprego. Nesseesquema protetor tr ipartite , o banc o c entral era visto c omo asuprema c orte d e apel aç ão, que absorveria quaisquer rac had uras noed if íc io emergind o d e uma d as d uas primeiras l inhas d e d efesa.Então o que d eu errad o?

Em termos suc intos, a fal ha fatal no sistema foi que qual querprobl ema que surgisse era visto por c ad a um d os três “xerifes” c omosend o d a jurisd iç ão d os outros d ois. Por exempl o, os regul ad oresviam os aspec tos espec ul ativos d os c ontratos hipotec ários c omo umprobl ema d o banc o c entral , enquanto o banc o c entral os via c omo umprobl ema d os regul ad ores. E ninguém os via c omo um probl ema d eseguro d e d epósitos. Isso soa famil iar? Qual quer probl ema queentrasse por uma d as três portas era imed iatamente c hutad o para umd os outros d ois d epartamentos. Em suma, ninguém era responsável .Essa “negl igênc ia benigna” fez c om que o próprio ato d e red uzirrisc os aparentes na verd ad e ampl iasse d rastic amente os r isc os reais.

O resul tad o final foi que a c renç a em sal vaguard as na verd ad einexistentes l evou as pessoas a ac har seguro c orrer r isc os que erammuito maiores d o que e l as imaginavam. A c renç a c ompartil had a d eque as autorid ad es tinham a situaç ão sob c ontrol e era total menteinapropriad a. O c ol apso metafóric o resul tante d o sistema financ eiroassemel ha-se ao c ol apso oc orrid o no reator nuc l ear japonês d a usinad e Fukushima Daiic hi em març o d e 2011, d esc rito na Parte I. Nesse

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c aso, a fal ta d e c ompl exid ad e d o sistema d e c ontrol e (a c ombinaç ãod a al tura d o muro e o l oc al d o gerad or) foi sobrepujad a pel o exc essod e c ompl exid ad e d o sistema a ser c ontrol ad o (a magnitud e d oterremoto e o tsunami subsequente) .

O c ol apso d o sistema financ eiro resul tou d o mesmo tipo d ed esc ompasso d e c ompl exid ad e. Os espec ul ad ores viram um períod oprol ongad o, d esd e a d éc ad a d e 1980, em que os merc ad os oferec eramsomente l uc ros, sem sequer o potenc ial d e prejuízos, para quemassumisse r isc os maiores. Assim, os pl anejad ores financ eiros c r iaramc onjuntos estonteantes d e instrumentos financ eiros c ad a vez maisc ompl ic ad os que no final sequer seus c r iad ores c onseguiam entend er.O s Cred it Defaul t Swaps (CDSs) são provavel mente os mais bemd oc umentad os d esses instrumentos exótic os, envol vend o o queequival e a c ontratos d e seguro que remuneram c aso uma obrigaç ão d ed ívid a espec ífic a, c omo o pagamento d e títu l os d a d ívid a d e um país,não seja sal d ad a. Os CDSs não são títu l os reais no sentid o c l ássic od a pal avra, por não serem transparentes, não serem negoc iad os embol sa, não estarem sujeitos às l e is atuais que regem os títu l os e nãoserem regul amentad os. Estão, porém, em risc o — ao c ustoc onsid erável d e 62 tr il hões d e d ól ares ( segund o estimativa d aInternational Swaps and Derivatives Assoc iation) . Como resul tad od esses “ instrumentos d e d estruiç ão financ eira em massa” , ac ompl exid ad e d o setor d e serviç os financ eiros d isparou àestratosfera.

Os CDSs não são os únic os responsáveis pel a c ompl exid ad ec resc ente d o setor d e serviç os financ eiros. As transaç õesc omputad orizad as em al ta vel oc id ad e, a Lei Gl ass-S teagal l , qued esregul amentava os banc os e permitia que se envol vessem emoperaç ões espec ul ativas, bem c omo os enormes l uc ros ac umul ad ospel os banc os d e investimentos e fund os d e hed ge nos ú l timos tr intaanos, c ad a um d esses fatores d eu sua própria c ontribuiç ão para umnível d e c ompl exid ad e que supera a c apac id ad e d e pl enac ompreensão e mesmo d e c ontrol e d os banqueiros e operad ores.

No entanto, c omo fic am os regul ad ores, as segurad oras e os banc osc entrais? A essa al tura, voc ê sabe a resposta. A c ompl exid ad e d essesistema d e c ontrol e foi real mente enfraquec id a por aç ões l egisl ativasc omo a já c itad a Lei Gl ass-S teagal l , numa époc a em que ac ompl exid ad e d o sistema financ eiro que d everiam supervisionarc resc ia exponenc ial mente c om c ad a novo prod uto oferec id o pel os

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magos d e Wal l S treet. Os banc os c entrais e seus órgãos regul ad oresd ispunham, em 2007, basic amente d as mesmas ferramentas d osúl timos c inquenta anos. O d esnível d e c ompl exid ad e emergente eraum d esastre esperand o para d esmoronar o sistema. A c rise d e queaind a estamos “d esfrutand o” é o meio d e o mund o real retific ar essed esequil íbrio, um proc esso que envol ve extrair penosamente o r isc o ea al avanc agem insustentáveis d o sistema f inanc eiro.

Caso voc ê tenha hibernad o nos ú l timos anos e não tenhaperc ebid o, o d esnível d e c ompl exid ad e entre o sistema financ eiro eseus regul ad ores c ontinua aumentand o. Para vermos c omoprovavel mente e l e será e l iminad o, prec isamos examinar mais d e pertoc omo a ec onomia americ ana se transformou nas ú l timas d éc ad as ec omo essa transformaç ão d eu origem ao estad o prec ário em que seenc ontra hoje em d ia.

EXCESSO DE REALIDADE

U M PERSONAGEM DE CRIME na c ated ral , peç a d e T. S . El iot, observa: “Ahumanid ad e não suporta muita real id ad e.” Embora essa afirmaç ãose refira ao c ontexto d o assassinato d e omas Bec ket na Cated ral d eCanterbur y em 1170, a natureza humana não mud ou muito d esd eque essas pal avras foram esc ritas e , na verd ad e, nem d esd e a époc ad o assassinato d e Bec ket. Uma d essas superd oses d e real id ad erepousa no núc l eo d a Grand e Rec essão pós-2008. Um ol har maisatento na c ausa d errad eira d esse c ol apso financ eiro l anç a uma l uzoportuna sobre as razões que l evam um c ol apso ec onômic o gl obal a setornar mais provável a c ad a d ia que passa.

A c ond enaç ão, em 2011, d o bil ionário gerente d e fund o d e hed geRaj Rajaratnam, ac usad o d e insid e trad ing ( transaç ões c om base eminformaç ões privil egiad as) , vol tou a atenç ão d a míd ia para aimpunid ad e d aquel es id entific ad os pel o grand e públ ic o c omo osverd ad eiros c ul pad os d o c ol apso d e 2007-2008. Segund o osespec ial istas, o públ ic o quer o sangue d as sanguessugas d e Wal lS treet que perpetraram a afronta financ eira, e o ju l gamento d eRajaratnam serviu para c hamar atenç ão para essa sensaç ão d eind ignaç ão. Nas pal avras d o c ol unista d e ec onomia RobertSamuel son: “A história foi tod a sobre c r ime e c astigo, quand o

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d everia ter sid o sobre al ta meteóric a e c ol apso.” Em sua anál ise d aGrand e Rec essão, Samuel son observa que a esquerd a e d ireitapol ític as possuem c ad a uma seu próprio c onjunto d e c ul pad os, masque nenhum l ad o é real mente c apaz d e c ontar uma históriac onvinc ente. Tal vez por isso tão pouc os “c riminosos” reais tenhamsid o l evad os ao banc o d os réus. Na verd ad e, a resposta c erta àpergunta d e quem real mente provoc ou o c ol apso é : tod os osameric anos c ontribuíram.

A pergunta que não quer c al ar é : Por que pratic amente tod osad eriram à euforia e não d eram ouvid os aos que previam umc ol apso? A resposta não é d if íc i l : pouquíssimos operad ores einvestid ores que atuavam no merc ad o nos anos antes d e 2008 haviamexperimentad o al go d iferente d a prosperid ad e e partiam d o princ ípioque sempre seria assim. A c onfianç a se c onjugou a uma c renç aimpl íc ita d e que os ec onomistas — c omo Al an Greenspan, d o Fed , ouaquel es d o Fund o Monetário Internac ional e d o Banc o CentralEuropeu — haviam d ominad o a c iênc ia d e c omo manter umaec onomia estável e d e que seus c onhec imentos evitariam outraGrand e Depressão no esti l o d a d os anos 1930. Em suma, tod osc onsid eravam que uma ec onomia estável e próspera era umareal id ad e imutável , um estad o d e graç a ec onômic a c e l estial quep e r s i s t i r i a ad aeternum. Samuel son argumentou: “ O l egad o maissignific ativo d a c rise é uma perd a d o c ontrol e ec onômic o.” Essespensamentos foram repetid os pel o Prêmio Nobel Paul Krugman, qued esc reveu a emergênc ia não c omo d e (má) gestão d o setor imobil iárioou mesmo d a ec onomia, mas c omo uma c rise d e fé d as pessoas em tod oo sistema ec onômic o. Os investid ores não ac red itam mais quemáquinas d e ganhar d inheiro al tamente c ompl exas e l ivres d e r isc o,c omo obrigaç ões d a d ívid a c ol ateral izad a, títu l os negoc iad os eml eil ões ou qual quer d os outros instrumentos financ eiros sofistic ad osc onc ebid os pel os “magos” d e Wal l S treet, func ionarão c omo d evem.Essa perd a d e c onfianç a num sistema l eva a uma espéc ie d e profec iaautorreal izável , c omo foi d esc rito. Uau. Então isso pod e ac ontec eraqui. E pod e ac ontec er d e novo.

Num artigo na revista Atl antic em 2010, Derek ompson eDaniel Ind ivigl io, ed itores seniores, d el inearam c inc o formas d e aec onomia mergul har num burac o rec essivo… ou em al go pior. L istei-as aqui partind o d a mais provável para a menos provável , d e ac ord oc om a aval iaç ão d os autores. Convid o os l e itores a al terarem essa

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ord em segund o suas próprias c renç as à l uz d os ac ontec imentos d omomento em que estiverem l end o este c apítul o.

O merc ad o imobil iário d esaba: Estreitamente al iad o aoenorme probl ema d e d esemprego nos Estad os Unid os estáo merc ad o imobil iário anêmic o. A d iminuiç ão na vend ad e c asas e as exec uç ões d e hipotec as c ontinuam, ou tal vezaté aumentem, forç and o aind a mais a qued a d os preç osd os imóveis. Isso, por sua vez , d ific ul ta que osproprietários se l ivrem d e hipotec as c om que e l es nãoc onseguem mais arc ar, c ontribuind o para um númeroaind a maior d e exec uç ões. O resul tad o final é que ospreç os menores d os imóveis enc orajam as pessoas apoupar mais e gastar menos, l evand o a uma qued aac entuad a nas aç ões e a um aperto maior d os merc ad osd e c réd ito. No final d as c ontas, o c resc imento se tornanegativo e a ec onomia c hega ao l imiar d e uma c ol ossalespiral d ef l ac ionária.Os gastos d os c onsumid ores c ontinuam em d ec l ínio: Ac renç a d as pessoas numa rec uperaç ão ec onômic ad iminui, e os gastos se red uzem a quase nad a. O merc ad od e aç ões é d ominad o pel o pessimismo, c onforme asrec eitas d as empresas se red uzem, o d esemprego c ontinuasubind o e o governo nad a faz al ém d e imprimir d inheiro.Os merc ad os c omeç am a c air um ponto perc entual oumais por vários d ias seguid os, e , à med id a que veem suasec onomias d esaparec end o ante seus ol hos, as pessoasred uzem aind a mais os gastos. De novo, o c resc imento setorna negativo e a d ef l aç ão avul ta.O retorno d os ativos tóxic os: Em suas saíd as financ eiras,o Departamento d o Tesouro pretend ia c omprar os ativosimobil iários tóxic os mantid os pel os banc os. Mas, c omonão c onseguiu d esc obrir c omo fazê-l o c om rapid ezsufic iente para ajud ar, o que ac ontec eu foi que os banc osapanharam o d inheiro — mas c onservaram os “ativos” . Àmed id a que os val ores d os imóveis resid enc iais ec omerc iais c ontinuam c aind o, o mesmo oc orre c om osval ores d esses ativos tóxic os que permanec em nos c ofres enos l ivros c ontábeis d e tod os os grand es banc os.

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Conforme esses ativos sofrem outra rod ad a d ed eprec iaç ão, os merc ad os vend em barato, o c réd itoenc ol he e o c resc imento f ic a negativo mais uma vez .A Europa entra em c ol apso: O c resc imento l ento nospaíses d o su l d a zona d o euro l eva os investid ores ad emand ar taxas maiores d e retorno pel os títu l os d essespaíses. Isso l eva a novas med id as d e austerid ad e,basic amente aumentos d e impostos e c ortes d e gastos, oque por sua vez sufoc a os mais importantes exportad oresd e bens, em espec ial d a China e até d os Estad os Unid os.Fugind o d o euro, o d ól ar se val oriza por um tempo,prejud ic and o aind a mais as exportaç ões d os EUA para aEuropa. De novo, o merc ad o d e aç ões ac aba d espenc and oà med id a que a ind ústria enc ol he e os d éfic its c omerc iaisatingem um nível insustentável . O c onsumid or americ anonovamente se retrai, sufoc and o o merc ad o d oméstic o, e(voc ê ad ivinhou) o c resc imento se torna negativo.Dívid as, d ívid as e mais d ívid as: A inc erteza quanto aoproc esso pol ític o americ ano l eva os c omprad ores d ostítu l os d o Tesouro americ ano a d emand ar taxas d e jurosmaiores para c ontrabal anç ar o r isc o d e um Congressoc ad a vez mais vol úvel . Isso red uz o val or d os fund os d epensão e fund os mútuos d etentores d e títu l os d a d ívid ad o governo americ ano, obrigand o as pessoas a pouparaind a mais e a gastar menos. Essa d inâmic a, então, d áorigem a uma esc ol ha d e Hobson: red uzir impostos parapromover os gastos d os c onsumid ores ou e l evar osimpostos para satisfazer os c omprad ores d e títu l os.Ambas as al ternativas l evam a um c ol apso ec onômic od ef l ac ionário.

Na verd ad e, tod os esses d iabinhos mostraram suas garras noúl timo ano, e a ord em d e priorid ad e d o que vai afund ar a ec onomiamud a d ia a d ia c omo uma gota d ’água numa c aç arol a quente. Nestemomento, o probl ema d a d ívid a d a zona d o euro parec e pred ominar.Mas quem sabe qual será o vil ão d e amanhã? Na verd ad e, nãoimporta, porque qual quer um d el es é sufic iente para nos l anç ar noc ol apso f inanc eiro e ec onômic o terminal .

Examinamos assim o passad o rec ente e o presente imed iato. Vimos

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governos na Europa e nos Estad os Unid os tentand o l anç ar d inheirono probl ema d a c ompl exid ad e c resc ente d o sistema financ eiro, semgrand e suc esso em red uzir o d esnível entre o sistema e seusregul ad ores. No mínimo, e l e está aumentand o. Portanto, d ed ic areial gumas páginas agora para d esc rever as c onsequênc ias prováveisd esse frac asso. O que pod emos esperar no c urto prazo quanto aoperfil ec onômic o e financ eiro d os Estad os Unid os e d o mund o? É aíque as c oisas c omeç am real mente a f ic ar interessantes.

A INCRÍVEL TORTA QUE ENCOLHEU

R ECENTEMENTE, ANDEI OUVINDO UM monte d e supostos experts financ eirose examinei um l amaç al d e bl ogs financ eiros, c ad a um oferec end o aogrand e públ ic o sua anál ise retrospec tiva id iossinc rátic a d e por queos merc ad os vinham c aind o, em vez d e d ispararem. Nessa busc aampl a d o nirvana financ eiro, d ec id i examinar al gumas d e minhasfontes regul ares que publ ic am o que ac red ito serem as anál ises maispond erad as d os ac ontec imentos financ eiros e soc iais. Nel as, enc ontreia seguinte afirmaç ão d e S teven Hoc hberg, d a El l iott Wave,International , d estac and o uma série d e aspec tos intrigantes sobre oque está oc orrend o neste momento. Eis o que e l e d isse , em seuinformativo d e 8 d e setembro d e 2011:

Os EUA foram rebaixad os pel a S&P e um d os maioresinvestid ores americ anos d a história, Warren Buffett, foi postoem observaç ão negativa pel a mesma agênc ia d e c l assific aç ão d erisc o (os títu l os d a Berkshire Hathaway ) . Os papéis d e c urtoprazo d o governo americ ano estão rend end o zero. As aç õesestão d espenc and o e o ouro c ontinua a ganhar forç a. De ac ord oc om a maioria d os prognostic ad ores d o d ól ar, a verd inhad everia estar send o esquec id a. Mas não está d espenc and o, pel omenos não agora. Ao c ontrário, o índ ic e d o d ól ar americ anopermanec e ac ima (…) d a grand e baixa atingid a em març o d e2008, mais d e três anos atrás. A únic a expl ic aç ão para talc omportamento é a d ef l aç ão.

El e d isse d eflaç ão? Quase tod as as pessoas já ouviram fal ar d e

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inf l aç ão, e muitos d e nós sabemos vagamente o que signif ic a: aumentod os preç os. Mas d ef l aç ão é uma pal avra quase e l iminad a d od ic ionário nas ú l timas d éc ad as. O que é , e por que é tão importante?

Ao pé d a l etra, d eflaç ão é simpl esmente o c ontrário d e inflaç ão:um d ec l ínio d os preç os, no l ugar d e um aumento, tal vezac ompanhad o d e uma c ontraç ão d o c réd ito e uma red uç ão d aquantid ad e d e d inheiro d isponível . Parec e bom… a princ ípio. Quemnão gostaria d e ver os preç os d a gasol ina, d os iPad s e d o c hurrasc od iminuírem? Porém, c omo c om um monte d e c oisas que parec ematraentes à primeira vista, um ol har mais atento revel a al gunsaspec tos nefastos d os quais gostaríamos d e manter d istânc ia. Eis porque os ec onomistas e formul ad ores d e pol ític as temem a d eflaç ãoc omo a própria peste .

O probl ema c entral é o que se c ostuma d enominar d e “espirald eflac ionária” , uma via quase d e mão únic a para o c resc imentoec onômic o zero, a fal ta d e empregos e pouquíssima esperanç a. Ospassos d esse d ec l ínio prec ipitad o c onstituem a espiral d ef l ac ionária:

1. Os preç os c aem, red uzind o as rec eitas d as empresas,bem c omo os l uc ros c om a vend a d e seus prod utos eserviç os.

2. As empresas d emitem trabal had ores para se ajustaremaos l uc ros menores, e esses rec ém-d esempregad os gastammenos d inheiro.

3. As empresas prec isam red uzir os preç os para atrair d evol ta à c aixa registrad ora os c onsumid ores preoc upad osc om os c ustos, o que l eva os preç os a c aírem maisaind a.

4. Vol te ao Passo 1 para c ompl etar o c ic l o… mas agorac om preç os aind a menores.

E assim por d iante: preç os menores para menos c onsumid ores epreç os aind a menores para aind a menos c omprad ores ad infinitumc onforme a ec onomia inteira vai perd end o ritmo e ac aba atingind oum piso ond e c ai morta. Sair d essa qued a l ivre é d ific íl imo, poisquem tem d inheiro passa a ad otar a atitud e: “ Por que c argas-d ’águac omprar hoje se os preç os estarão menores amanhã?”

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Existem d iversas sutil ezas ec onômic as envol vend o orel ac ionamento entre c ustos d e mão d e obra, matérias-primas,interval os d e tempo etc . que entram nos d etal hes d essa história,turvand o um pouc o as águas. Mas esses pormenores são irrel evantes àquestão que nos interessa aqui: os ac ontec imentos que d esenc ad eiama d eflaç ão. Em outras pal avras, agora que sabemos o que ac ontec equand o estamos sob o pod er d e uma espiral d ef l ac ionária, c omo é queo proc esso d e fato tem iníc io?

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E XISTEM TRÊS CAMINHOS PARA o fatíd ic o primeiro passo na estrad a paraa d ef l aç ão:

1. Uma bol ha espec ul ativa estoura, ac arretand o uma séried e fal ênc ias d e banc os.

2. Ind ivíd uos, instituiç ões e /ou governos nac ionais d ão oc al ote d e suas d ívid as.

3. O banc o c entral e l eva as taxas d e juros exc essivamentee rápid o d emais a f im d e c ombater a inf l aç ão.

O resul tad o d e qual quer um d esses c aminhos é menos d inheirod isponível para ser emprestad o aos c onsumid ores e para as pessoasinvestirem em seus negóc ios. Isso signific a que o c réd ito, a forç a vitald e qual quer ec onomia mod erna, enc ol he, d e mod o que menosd inheiro está send o gasto. Esse fator, por sua vez , inic ia a espirald eflac ionária. Al iás, essa é a princ ipal razão por que governos c omoo d os Estad os Unid os d ão c ambal hotas para imped ir a fal ênc ia d osbanc os, espec ial mente d os grand es.

A c rise ec onômic a americ ana atual é c l aramente uma c ombinaç ãod os c aminhos A e B , já que ninguém c onsegue l embrar a ú l tima vezque o Fed eral Reserve, o Banc o Central americ ano, e l evou as taxasd e juros ou a úl tima vez que al guém expressou uma preoc upaç ãogenuína c om a inf l aç ão.

Segund o o pensamento c onvenc ional , para romper a espirald eflac ionária é prec iso red uzir as taxas d e juros d e mod o a pôr maisd inheiro em c irc ul aç ão. Esse f l uxo d e d inheiro supostamente c ol oc ará

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em movimento a ec onomia, l evand o a mais empregos, mais c onsumo e ,por fim, a um aumento d os preç os. Mas o que ac ontec e quand o aespiral d eflac ionária c omeç a numa époc a em que as taxas d e juros jáestão nos níveis mínimos, que é a real id ad e americ ana d esd e o iníc iod e 2000? Ao c ontrário d os períod os inflac ionários, quand o o banc oc entral pod e aumentar as taxas à vontad e para c onter as al tas d ospreç os, as taxas não pod em c air abaixo d e zero para se c ombater ad eflaç ão. Muitas vezes esse fator é c hamad o d e “armad il ha d al iquid ez” . A únic a saíd a é o governo injetar enormes quantid ad es d ed inheiro na ec onomia através d e gastos. Foi assim que os governos aored or d o mund o enc erraram a Grand e Depressão d os anos 1930.

Atual mente, esse c aminho d e “gastar até não pod er mais” tambémestá fec had o, d evid o ao imenso end ivid amento d os Estad os Unid os ed os países d a Europa ( sem fal ar na influênc ia d os movimentos, c omoo Tea Party , nos EUA, c ontrários à interferênc ia exc essiva d ogoverno) . Para injetar o tão nec essário d inheiro na ec onomia, osgovernos prec isam ter esse d inheiro d isponível . El e pod e vir d ed iversas fontes, c ad a uma c om seu próprio c onjunto d e probl emasassoc iad os. A primeira fonte óbvia são os empréstimos vind os d aChina, d o Japão e d e outros países asiátic os, que há anos enviam suasenormes poupanç as no exterior para sustentar o esti l o d e vid ad esc ontrol ad o d os Estad os Unid os e d a Europa. Ou o d inheiro pod evir d as impressoras trabal hand o 24 horas por d ia para magic amentefazê-l o surgir d o papel . Quem empresta agora rel uta em troc ard inheiro bom por d inheiro ruim d o Tesouro americ ano. Al ém d isso,transformar papel em d inheiro abre a possibil id ad e bem real d ahiperinf l aç ão. É al go d if íc i l d e imaginar, mas é uma sol uç ão aind apior d o que suportar um períod o d e d eflaç ão c omo uma forma d epurgar o sistema financ eiro d os exc essos c r iad os pel a bol haespec ul ativa d a d éc ad a d e 1990. A hiperinflaç ão d estruirá o d ól ar,d estruirá o que resta d a c l asse méd ia americ ana e ac abarád estruind o a ec onomia inteira. Se não ac red ita, d ê uma ol had a naAl emanha d e Weimar, no iníc io d os anos 1920, ou, aind a, noZimbábue atual . Outra possível fonte d e financ iamento seria oaumento d os impostos sobre pessoas f ísic as e juríd ic as, um tabupol ític o em quase tod a parte . Al ém d isso, é d if íc i l imaginar c omoretirar d inheiro d o bol so d os c id ad ãos ou d as empresas pod eestimul ar os gastos d os c onsumid ores, que representam mais d e d oisterç os d e uma ec onomia c omo a d os Estad os Unid os. Final mente,

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existe a “sol uç ão PIGS” , que vem send o tentad a atual mente emPor tu ga l , Ir l a n d a , Gréc ia e Espanha [S pain] e prec oniza aumentosnos impostos e mais: red uç ões d rástic as nos serviç os governamentais,d esd e a assistênc ia méd ic a até as aposentad orias e a ed uc aç ão.

O que é importante manter em mente aqui é que d esfazer ad eflaç ão envol ve mais d o que apenas uma injeç ão d e d inheiro nosistema. A sol uç ão é ao menos tão psic ol ógic a quanto ec onômic a, jáque o efeito d e um d esnível c resc ente d e c ompl exid ad e muitas vezesse manifesta num arrefec imento d a c renç a d a soc ied ad e d e que ofuturo será pior d o que o presente ( estad o d e espírito pessimista) ,l evand o por fim a uma c renç a d e que o futuro será mel hor, bemmel hor d o que o presente ( estad o d e espírito otimista) . Uma vezoc orrid a essa mud anç a na pol arid ad e, as pessoas vol tam a gastard inheiro, por ac red itarem que c onseguirão um emprego ouc onservarão o que já têm. Mas não serão os inc entivos d o governo ouos l ivros d e autoajud a que operarão essa mud anç a. Na verd ad e, e l ac ostuma ac ontec er quand o al gum evento X d e grand e porte abal a aspessoas, sac ud ind o-as e as l evand o para uma nova órbita psic ol ógic a.Infel izmente, esse c hoque c ostuma ser uma guerra, uma grand eguerra — mais um motivo para usarmos tod os os meios possíveis a fimd e imped ir o mergul ho na d epressão ec onômic a, que é o ponto finald o c ic l o d ef l ac ionário.

Suponhamos agora que o mund o d os próximos d ez , vinte ou tr intaanos só nos ofereç a o segund o pior resul tad o, uma d eflaç ão gl obalac ompanhad a d e uma d epressão mund ial , e c onsiga evitar ahiperinflaç ão que d estroç aria a ec onomia mund ial . Como seria avid a?

Mais no iníc io d este c apítul o, observei que a pal avra d ef l aç ãoquase não é mais pronunc iad a nos c írc ul os soc iais e que um grand emotivo para isso é que — c omo menc ionad o antes em rel aç ão aoc resc imento aparentemente inc essante d os merc ad os — não existeninguém nos Estad os Unid os c apaz d e rec ord ar tal períod o. Noentanto, há uma naç ão inteira c om mais d e 130 mil hões d e pessoasvivas que pod e d ar um testemunho bem atual izad o d e c omo é viverem tal mund o. Cl aro que estou fal and o d o Japão, um país que passapor uma d epressão d eflac ionária há mais d e d uas d éc ad as, semnenhuma l uz no fim d o túnel . Em muitos aspec tos, a experiênc iajaponesa d esd e o final d a d éc ad a d e 1980 é uma espéc ie d e ensaiopara o que o resto d o mund o pod e esperar nos próximos anos.

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Portanto, val e a pena d ed ic ar al guns parágrafos para d etal har os“ d estaques” d essa experiênc ia.

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No final d e 1989, as d epend ênc ias d o Pal ác io d o Imperad or, noc entro d e Tóquio, eram c onsid erad as tão val iosas quanto tod o oestad o d a Cal ifórnia. Dá para imaginar? Al guns meses d epois, noiníc io d e 1990, o Japão sofreu um estouro d a bol ha imobil iária e d omerc ad o d e aç ões semel hante ao que os Estad os Unid os e a EuropaOc id ental experimentaram em 2007-2008. Por exempl o, em seu pic oem 29 d e d ezembro d e 1989, o Índ ic e Nikkei d a Bol sa d e Tóquio — oequival ente japonês à Méd ia Ind ustrial Dow Jones nos EUA —al c anç ou 38.876 pontos. Agora, vinte anos d epois, está em menos d eum quarto d aquel e nível . Portanto, merc ad os d eflac ionários embaixa, c omo no Japão agora (e d aqui a pouc o no resto d o mund o) ,pod em l evar um tempo enorme para se rec uperar (pense em d éc ad as) .Como um referenc ial c omparativo, a Méd ia Ind ustrial Dow Jonesl evou 23 anos e meio para rec uperar o nível vigente l ogo antes d aGrand e Qued a d e outubro d e 1929. Portanto, apesar d asquantid ad es mac iç as d e inflaç ão monetária c irc ul and o pel o mund oatual mente, sobretud o no próprio Japão, ninguém ac red ita que oNikkei retornará a seu pic o d e 1989 no futuro próximo. A ec onomiajaponesa mergul hou numa espiral d eflac ionária no iníc io d e 1990 eaind a não saiu d el a.

A situaç ão tampouc o é mel hor para os preç os d os imóveis noJapão. Atual mente, uma c asa c usta em méd ia o que c ustava em 1983,quase três d éc ad as atrás. E, embora os rec ém-c hegad os à “prisão d osd eved ores” , c omo Gréc ia, Itál ia, Franç a e Estad os Unid os, atraiamtod a a atenç ão d as primeiras páginas d os jornais, é o Japão o paísque mais d eve d inheiro a outras naç ões, c erc a d e 200% d o prod utointerno bruto. Esse ônus financ eiro vem ac ompanhad o por grand esprobl emas soc iais, c omo um aumento d a pobreza e taxas c resc entes d esuic íd io.

Em seu rec ente l ivro abord and o l iç ões que a d eflaç ão japonesaprol ongad a oferec e ao mund o, R ic hard Koo, ec onomista-c hefe d aNomura Sec urities, faz a seguinte afirmaç ão sobre o Japão d e hoje :“ Mil hões d e ind ivíd uos e empresas veem seus bal anç os afund and o,

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portanto estão usand o seu d inheiro para sal d ar suas d ívid as, em vezd e c ontrair empréstimos e gastar.” Esse d ec l ínio tem sid o umaexperiênc ia bem d esgastante para os japoneses. Na d éc ad a d e 1980, opovo japonês era c onfiante, esperanç oso no futuro e ávid o por c r iaruma nova ord em mund ial na Ásia. E hoje? Bem, é uma naç ão queperd eu a autoc onfianç a, temend o um futuro que sua popul aç ão c ad avez mais vel ha e menor não está em c ond iç ões d e enfrentar. Como umpequeno ind ic ad or d esse fato, num artigo publ ic ad o no New YorkTimes em 2010, Martin Fac kl er c ita um proprietário d e uma l oja d eroupas d e Tóquio: “ É c omo se os japoneses tivessem perd id o até od esejo d e parec er bonitos.”

Um ind ic ad or bem d ol oroso d os e feitos d e uma vid a d e d eflaç ão eestagnaç ão ec onômic a é a atitud e d os jovens em rel aç ão ao c onsumo.Em vez d e afluírem para Akihabara, o bairro high-tec h d e Tóquio,em busc a d as ú l timas novid ad es em aparel hos e l etrônic os, muitosjovens japoneses se rec usam a c omprar qual quer artigo c aro. ComoFac kl er também observou, uma geraç ão d e d eflaç ão foi al ém d etornar as pessoas pouc o propensas a gastar : d eu origem a umpessimismo profund o quanto ao futuro e a um med o d o r isc o. Osc onsumid ores agora ac ham insensato c omprar ou pegar d inheiroemprestad o, o que ac el era aind a mais a espiral d esc end ente.Hisakazu Matsud a, um c omentarista sagaz d esse fenômeno, c hama osjaponeses na faixa d os vinte anos d e “os inimigos d o c onsumo” . Dizel e : “ Esses sujeitos ac ham estúpid o gastar.” Outro observad or,Shumpei Takemori, ec onomista d a Universid ad e Keio, em Tóquio,d iz que a “d eflaç ão d estrói a tomad a d e r isc os nec essária para asec onomias c apital istas c resc erem. A d estruiç ão c riativa é substituíd apel o que não passa d e d estruiç ão d estrutiva” .

E c omo o governo japonês tentou esc apar d essa espiral ? Voc ê jád eve ter ad ivinhad o. Fez exatamente o que os governos oc id entaisestão fazend o agora. Red uziu as taxas d e juros para zero em 1999 eas d eixou nesse nível mínimo por sete anos. Também real izou umresgate financ eiro após o outro e oferec eu uma série d e pac otes d eestímul o. Mas nad a surtiu efeito. Al ém d isso, existe uma c ombinaç ãoaparentemente pod erosa, mas na verd ad e impotente , d e pol ític asmonetárias e fisc ais, al ém d e regul amentaç ões d e merc ad o eprotec ionistas. Até agora, porém, não func ionou. Mais d e d uasd éc ad as após o iníc io d a espiral d eflac ionária, o Japão c ontinua àbeira d o c ol apso ec onômic o total . Como um ind ic ad or d esse fato, no

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iníc io d e 2010 o Birô d e Estatístic as Japonês informou que os preç osno país vinham c aind o nos ú l timos d oze meses seguid os e que ospreç os d os terrenos eram metad e d e vinte anos atrás. Um ano d epois,a situaç ão quase não mel horou. Em agosto d e 2011, Junko Nishioka,ec onomista-c hefe d a R BS Sec urities Japan, observou que “os preç osd ific il mente subirão muito (…) já que as frac as vend as aosc onsumid ores tend erão a d esenc ad ear mais c onc orrênc ia d e preç os” .

Para ser justo c om as ec onomias oc id entais que agora enfrentam omesmo probl ema, existem grand es d iferenç as entre a situaç ãojaponesa e o que vemos nos Estad os Unid os e na Europa Oc id ental .Os Estad os Unid os pod em simpl esmente imprimir montes d e moed a d ereserva e exportá-l a para o resto d o mund o em troc a d e prod utosc omo c arros, c amisetas, c omputad ores e outras engenhoc as, d esviand oassim a atenç ão d os probl emas reais enfrentad os pel o país. Al émd isso, mesmo d urante o períod o d if íc i l no Japão, a poupanç a c resc eue o país c ontinuou prod uzind o merc ad orias reais para exportaç ão.Então o que fazer? A únic a c erteza é o que não fazer : não c ontinuarac umul and o d éfic it após d éfic it. Se na vid a real já existiu umexempl o d o princ ípio d e que não d á para sair d a d eflaç ão eressusc itar a ec onomia c ontraind o empréstimos, o Japão é esseexempl o. Empurrar o probl ema para as geraç ões vind ouras só pod e,em úl tima anál ise , l evar a um c ol apso soc ial aind a maior. Com basenesse c omentário d inâmic o, mas pouc o ed ific ante, tentemos sintetizaras d imensões d a d epressão gl obal emergente.

SINTETIZANDO

O ECONOMISTA AUSTRÍACO-AMERICANO Joseph Sc humpeter introd uziu aexpressão “d estruiç ão c riativa” para d esc rever o proc esso d ed estruiç ão d e c omponentes u l trapassad os e d esnec essários d e umsistema ec onômic o a fim d e abrir espaç o para novas e inovad orasformas d e prod uç ão e c onsumo ec onômic o. Estamos na fase d estrutivad o quad ro d e Sc humpeter agora, em que os sistemas financ eiros eec onômic os gl obais d o “ Vel ho Mund o” estão se transformand o d oc onjunto d e estruturas e regras para o d isc urso ec onômic o, pol ític o esoc ial pós-Segund a Guerra Mund ial no que se tornarão os pad rõesd a primeira metad e d o séc ul o XXI. O probl ema d o momento é que

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ninguém sabe real mente qual será essa estrutura gl obal nova. Tud oque se sabe ao c erto é que será al go bem d iferente d o antigo regime.

Como tod os os proc essos d inâmic os, a fase d e d estruiç ão d o c ic l osc humpeteriano prec isa d e um motor ac ionand o esse proc esso. Nestec apítul o, argumentei que o motor que está virand o d e ponta-c abeç aos mund os financ eiro e ec onômic o é a rápid a >aproximaç ão d e umperíod o d e d eflaç ão mac iç a (ou, tal vez aind a pior, hiperinflaç ão) .Assim, qual quer que seja o quad ro que emerja no l ongo prazo (d aquia d ez a vinte anos) , o horizonte imed iato não é nad a agrad ável .Somente quand o o sistema gl obal tiver ingressad o na fase c r iativa éque c ol heremos os benefíc ios d o que está por vir no bal anç o d o séc ul oatual .

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PARTE III

EVENTOS X REVISITADOS

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ANATOMIA DE UM EVENTO X

U M EVENTO X NÃO é al go em preto ou branc o. Existem graus d esurpresa, assim c omo existem graus d e impac to. A previsão d e taisac ontec imentos atípic os também é uma questão nebul osa. Al go quepassa na c hamad a região d a “normal id ad e” pod e natural menteresval ar para o d omínio d os eventos extremos, à med id a que osfatores surpresa e/ou impac to transpõem uma fronteira muito mald efinid a. Tentemos manter esse fato em mente ao perc orrermos estaparte c onc l usiva d o l ivro, num esforç o para d izer al go signific ativo eútil sobre c omo prever e se preparar para tais situaç ões.

A primeira c oisa que os professores d e jornal ismo esc revem noquad ro-negro são as seis grand es perguntas que qual quer matériad eve respond er: Quem? O quê? Por quê? Quand o? Ond e? Como? Omesmo se apl ic a aos eventos X. Nas partes anteriores d o l ivro, tenteil id ar c om tod as e l as, c om a notável exc eç ão d e “ Quand o?” , que épossivel mente a mais importante d as seis preoc upaç ões para quemqueira prever, prevenir ou l imitar sua exposiç ão a um ac ontec imentoextremo. Para respond er, prec iso d ivid ir o panorama d ec onhec imentos usand o al gum tipo d e taxonomia. Em rel aç ão a d atas,ol harei sob três perspec tivas: antes d o evento, d urante sua oc orrênc iae após o impac to ter sid o pl enamente experimentad o e assimil ad o.

Antes: Devemos, natural mente, nos c onc entrar naprevisão, d eterminand o c om a maior prec isão possívelquand o se d ará o evento. Essas são as d uas áreas em quea c iênc ia, c ombinad a à imaginaç ão e a um bom banc o d ed ad os d e oc orrênc ias passad as, pod e ser mais útil , c omod el inearei na próxima seç ão. Como enfatizeirepetid amente, porém, tal banc o d e d ad os é o ingred ienteque fal ta para a maioria esmagad ora d os eventos X. Doc ontrário, eu não prec isaria esc rever este l ivro.

Outra pergunta inc ômod a se enquad ra nessa c ategoriatambém. Suponhamos que voc ê rec eba um sinal c onfiáveld a iminênc ia d e um ac ontec imento extremo c omo, porexempl o, uma ativid ad e sísmic a inc omum em torno d e umvul c ão, ind ic and o a forte possibil id ad e d e uma erupç ão.

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A quem voc ê c onta? A resposta é mais uma questãosoc iopol ític a d o que al go que a c iênc ia possa ajud ar arespond er, pois existem tantos grupos d e interesseenvol vid os que é impossível esc apar d el es. A não ser emsituaç ões c omo um impac to d e asteroid e ou umapand emia mund ial , em que a ameaç a gl obal é c l ara eimed iata, os eventos extremos c ausad os por seres humanospod em ter nuanc es e grad aç ões atrás d as quais pod e seoc ul tar tod o tipo d e visão d e mund o e interesse vel ad o.Na verd ad e, quase sempre os interesses sãoessenc ial mente financ eiros. As pessoas — investid ores,grand es empresas, pol ític os, países — estão ganhand od inheiro d emais (ou rec ebend o-o por meio d ec ontribuiç ões d e c ampanha e impostos) , tal vez seaproveitand o d e uma bol ha d e aç ões ou imobil iária, epor isso prec isamos d e med id as para restaurar asustentabil id ad e d o sistema. Mas é c ompl ic ad o tomaruma aç ão efic az em fac e d e tal pensamento d e c urtoprazo por forç as pod erosas e interessad as em preservar ostatus quo. Como outro bom exempl o, observe os d ebatesac al orad os em torno d o aquec imento gl obal , id entific ad opel a c iênc ia c omo um fenômeno assustad or emergind o.Entretanto, não se material izou a vontad e pol ític a parareagir à al tura. Posso d izer, c om base em minhaexperiênc ia pessoal , que os mesmos interesses c onflitantesestão presentes em qual quer tipo d e al erta prec oc e d eterremotos, enc hentes, tornad os, furac ões ou erupç õesvul c ânic as, sem menc ionar os c asos provoc ad os porhumanos, em vez d aquel es c om que a natureza nosd esafia. Durante: Esta é a parte fác il … se voc ê c onsid erar quesobreviver a um evento extremo é al go fác il ! Quand o seestá em meio a uma c rise al imentar, um d esastrefinanc eiro, um terremoto ou al go d o gênero, não hámuito tempo a perd er c om fil osofias. Basic amente, a fased o d urante c onsiste em uma gestão d o d esastre em temporeal , não em espec ul aç ão c ientífic a ou preoc upaç ão eespanto c om o que saiu errad o.Após: Dec orrid o o evento, ad entramos a fase d e “arrumar

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a bagunç a” . Durante esse períod o, enfrentamospreoc upaç ões bem prátic as e imed iatas d e restaurar osserviç os e instal aç ões d estruíd os, c omo energia e l étr ic a,c omunic aç ões, morad ias, al imentaç ão e água. Esseperíod o também envol ve muito exame d e c onsc iênc ia,atribuiç ão d e c ul pa, anál ises retrospec tivas eprovid ênc ias para supostamente imped ir que o evento serepita. Cl aro que na prátic a grand e parte d essaativid ad e é mais c omo fazer o pl anejamento parac ombater a ú l tima guerra d o que se preparar para apróxima. De qual quer mod o, essa fase , d e novo, tempouc o a ver c om os c onc eitos e metod ol ogias d a c iênc ia,futurol ogia, entre outras c oisas, e quase tud o a ver c om ad issimul aç ão pol ític a, al iad a a uma série d esc onc ertanted e d isfarc es e obsc urec imentos engenhosos e egoístas.

A moral d a história, então, é que a únic a fase em que a anál isec ientífic a d esempenha um papel visível no estud o d os eventosextremos é a primeira, antes d e sua oc orrênc ia. Depois d isso, ac iênc ia e o pl anejamento são l iteral mente postos d e l ad o, e passamospara as esferas soc iopol ític a e psic ol ógic a, em que quase tud o pod eriaac ontec er — e c om frequênc ia ac ontec e . Com isso em mente,retornemos à questão d o tipo d e ferramentas d isponíveis ou queprec isamos d esenvol ver para obtermos c ontrol e sobre quand o e ond e asombra d o probl ema vai c air .

À FRENTE DA CURVA

PETER E PAUL SÃO pequenos l agos isol ad os, no norte d o estad o d eWisc onsin. Em 2007, serviram d e c enário para um d os maisimportantes experimentos ec ol ógic os d os ú l timos tempos. Uma equiped e pesquisad ores, enc abeç ad a por S teven Carpenter, d a Universid ad ed e Wisc onsin, usou-os para testar a possibil id ad e d e prevermud anç as rad ic ais num sistema, tal vez c om antec ed ênc ia sufic ientepara imped ir uma c atástrofe ambiental .

Segund o Carpenter : “ Por um l ongo tempo os ec ol ogistas pensaramque mud anç as rad ic ais não pud essem ser previstas. Mas agora vimos

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que pod em. O al erta prec oc e é c l aro. (…) O c onc eito foi agoraval id ad o num experimento d e c ampo, e o fato d e ter func ionad o nessel ago abre a porta para testá-l o em pastagens, florestas e ec ossistemasmarinhos.” O que exatamente fez a equipe d e Carpenter? E c omo fez?

Usand o o l ago Paul c omo c ontrol e , a equipe d e Carpenterexperimental mente manipul ou o l ago Peter, introd uzind o aos pouc osnel e a pred ad ora perc a negra. Antes d e esses invasores seremac resc entad os, o l ago era d ominad o por peixes menores que seal imentavam d as pul gas-d ’água, que por sua vez se al imentavam d ezoopl ânc ton. O que os c ientistas proc uravam fazer era romper ac ad eia al imentar a ponto d e mud ar para um sistema d ominad o pel aperc a pred ad ora, empurrand o os peixes menores mais para baixo nac ad eia al imentar. Nessa mud anç a, os pesquisad ores esperavam verum rápid o efeito c asc ata no ec ossistema d o l ago que impac tariafortemente tod as as pl antas e os animais.

Assim que a perc a negra foi ad ic ionad a, os peixes pequenosrec onhec eram a ameaç a e c omeç aram a se afastar d a água aberta,c onfinand o suas busc as d e al imento às áreas perto d a margem e emtorno d e barreiras protetoras, c omo tronc os afund ad os. De ac ord oc om Carpenter, o l ago tornou-se um “paraíso d as pul gas-d ’água” , e ac omid a preferid a d as pul gas-d ’água, os fitopl ânc tons d o l ago,c omeç ou a osc il ar l ouc amente. O ec ossistema inteiro d epois sofreuuma mud anç a rad ic al para um mod o d e c omportamento novo. O queo grupo observou foi que mod el os d e c omputad or espel haram areal id ad e d o ec ossistema, à med id a que os níveis d os fitopl ânc tonsmud aram d e forma d rástic a imed iatamente antes d a mud anç a d oregime d as pul gas-d ’água.

Observe o que está ac ontec end o aqui. Os peixinhos são agoraavessos ao r isc o e não se aventuram na água aberta para c omertantas pul gas-d ’água. Essa popul aç ão então d ispara e d evora suarefeiç ão preferid a, fitopl ânc tons d o l ago. El es morrem em massad iante d o aumento c ol ossal d a popul aç ão d e pul gas-d ’água. Com od esaparec imento d e sua fonte princ ipal d e al imento, a popul aç ão d epul gas-d ’água d espenc a, permitind o o ressurgimento d osfitopl ânc tons, ponto em que o c ic l o se repete . Mas a c erta al tura osfitopl ânc tons não c onseguem se rec uperar, e o l ago se transforma,c om uma c ad eia al imentar total mente rec onfigurad a.

Agora a pergunta d e um mil hão d e d ól ares: Essa reviravol tapod eria ser prevista c om base nos d ad os c ol etad os d as mud anç as

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químic as, biol ógic as e f ísic as oc orrend o no l ago? Em partic ul ar, essesabal os nos níveis d os fitopl ânc tons servem d e sinais d e al ertaprec oc es d e uma mud anç a d e mod o no ec ossistema? A resposta foifornec id a pel o trabal ho d e Wil l iam “ Buz” Broc k, espec ial ista emteoria financ eira d a universid ad e, que empregou ferramentas d e umaárea d a teoria d os sistemas d inâmic os c hamad a “teoria d abifurc aç ão” para mostrar que abal os estranhos são d e fatoprec ursores d a mud anç a c atastróf ic a.

Como sempre nessas questões, o experimento oferec eu boas e másnotíc ias. A notíc ia positiva é que e l e val id ou um sinal d e al ertaprec oc e teóric o d o c ol apso d a red e al imentar. As flutuaç ões rápid asnos níveis d os fitopl ânc tons são d e fato um aviso d e que “al goestranho” está ac ontec end o e c onvém prestar atenç ão. A má notíc ia,porém, é que empregar essa metod ol ogia para id entific ar o ind ic ad ord e al erta prec oc e requer um montão d e d ad os. Isso signific a que éprec iso monitorar c ontinuamente o l ago por um períod o d e tempoprol ongad o, c ol etand o o máximo possível d e informaç ões sobre suaspropried ad es biol ógic as, químic as e biótic as. Carpenter observa quepod e não ser possível usar esse proc ed imento para c ad a ec ossistema,mas que o preç o d a inaç ão pod e ser bem al to.

Portanto, temos aqui um exempl o vivo d e um proc ed imento d eal erta prec oc e efic az para id entific ar sinais d e mud anç a c atastrófic aiminente: proc ure flutuaç ões anormais no c omportamento d e al gumasvariáveis d o sistema. Esses abal os rápid os c onstituem al ertas d e queas quantid ad es med id as pod em estar entrand o na zona d e perigo.Ec ol ogistas c omo Carpenter estão na l inha d e frente na apl ic aç ãod essa metod ol ogia teóric a aos ec ossistemas d o mund o real .

FERRAMENTAS MATEMÁTICAS DE PREVISÃO

O EXPERIMENTO DE CARPENTER & C IA. anteriormente d el inead o mostra d eforma c l ara que uma rápid a flutuaç ão no nível d e fitopl ânc tons d ol ago Peter serviu d e sinal d e al erta c onfiável d e que o l ago estavaprestes a apresentar uma al teraç ão em seu c omportamento. Esse é oprimeiro d e c inc o princ ípios d e al erta prec oc e que os matemátic osextraíram d a teoria d os sistemas c ujo c omportamento mud a nod ec orrer d o tempo (geral mente d enominad os “sistemas d inâmic os” na

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l iteratura profissional ) . Eis a l ista c ompl eta.Fl utuaç ões c resc entes no val or d e uma ou mais d as propried ad es

fund amentais d o sistema que voc ê está examinand o — tais c omo osníveis d e fitopl ânc tons d o l ago Peter — c onstituem um sinal d e que osistema está passand o por uma grand e mud anç a estrutural . Essasflutuaç ões pod eriam ser vistas c omo uma vol atil id ad e maior novol ume d e negoc iaç ões em uma bol sa d e val ores, mud anç as rápid asnas posiç ões ad otad as na retóric a d e l íd eres pol ític os, movimentosnervosos d o sol o em torno d e uma região sísmic a ou mud anç asd esenfread as na prod uç ão d e um sistema agríc ol a. Mas, em tod os osc asos, osc il aç ões rápid as d e um extremo ao outro muitas vezesc onstituem um prenúnc io d o que vem à frente .

Fl utuaç ões d e al ta ampl itud e c onfiguram outro sinal importante.A d istânc ia que o sistema perc orre d o seu ponto al to para o baixo éum el emento-c have a ser observad o. Em outras pal avras, não sãoapenas mud anç as rápid as (osc il aç ões) no c omportamento que c ontam,mas também se o c omportamento está atingind o pic os mais al tos eafund and o até val es mais baixos. Uma vez que esses pic os e val es setornam grand es o sufic iente , o sistema está c om frequênc ia no pontod e ruptura em que um empurrão aparentemente pequeno basta paral anç á-l o num mod o d e ativid ad e total mente novo.

Desac el eraç ão c rític a é o próximo princ ípio d e al erta prec oc e.Imagine uma bol a c ol oc ad a no fund o d e um rec ipiente c om bord asbem íngremes. Se a bol a for afastad a um pouc o d o fund o, ainc l inaç ão d as bord as garantirá que e l a l ogo vol te a repousar nofund o. Mas, se voc ê c ol oc ar a mesma bol a no fund o d e um rec ipientec om bord as menos íngremes, e l a pod erá l evar al gum tempo até vol tarao fund o, pois z iguezagueará várias vezes antes d e entrar emrepouso. Essa úl tima situaç ão é o que os teóric os d os sistemasd inâmic os d enominariam d esac el eraç ão c rític a, em que oc omportamento observad o d o sistema parec e ter d ific ul d ad e em serec uperar d o efeito d e uma perturbaç ão mesmo pequena. Este é umsinal d e al erta prec oc e importantíssimo d e que o sistema está seaproximand o d e uma zona d e perigo em que as c hanc es d e umagrand e mud anç a súbita no c omportamento aumentamsubstanc ial mente.

Uma red e na iminênc ia d e uma grand e mud anç a c om frequênc iac omeç a mostrand o uma preferênc ia pronunc iad a por “visitar”apenas um pequeno subc onjunto d e seus estad os possíveis. Em outras

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pal avras, os estad os visitad os estão d istr ibuíd os d e forma bemd esigual , pois a trajetória tend e a permanec er num subc onjuntopequeno d e tod os os estad os possíveis. Um teóric o d e sistemas d iriaque existe uma assimetria pronunc iad a, ou agrupamento, d os estad osd e c omportamento real mente real izad os. A atual d istr ibuiç ão d erend a nos Estad os Unid os é um bom exempl o, pel a al ta assimetriapara os r ic os e pobres, c om os níveis méd ios d ec l inand o rapid amente.Essa é uma d istr ibuiç ão d esigual d as rend as (ou seja, d os estad os) .De novo, é um sinal d e al erta prec oc e importante d a iminênc ia d eum evento extremo, sugerind o que os r ic os não c onseguirão manterpor muito mais tempo essa d istânc ia pronunc iad a d o rebanho.

Cabe observar aqui que esse d esequil íbrio/assimetria d os estad osestá bem no espírito d o d esc ompasso d e c ompl exid ad e que d estaqueivárias vezes neste l ivro. Um sistema, os r ic os, possui um esti l o d evid a d e al ta c ompl exid ad e c om um número enorme d e aç õesal ternativas que pod em tomar a qual quer momento ( c asas parac omprar, l ugares para visitar, al imentos para c omer e assim pord iante) . Por outro l ad o, os pobres l evam uma vid a d e baixac ompl exid ad e, d ispond o d e pouc as opç ões. O d esnível se ampl ia e c omc erteza terá d e ser red uzid o no futuro, se ja pel a aç ão vol untária d osric os, pel a intervenç ão d o governo no proc esso ou, o mais provável emminha opinião, por um evento extremo nos mol d es que apresentei notexto sobre d ef l aç ão na Parte II.

Muitos sistemas mud am não apenas no tempo, mas também noespaç o. Por exempl o, a suprac itad a d isparid ad e d e rend a se al teranas c id ad es d e Nova York ou Berl im d e forma bem d iferente que emNebraska ou no interior d o Brasil . Os pad rões d emográfic os nasáreas urbanas ou a d ensid ad e d a vegetaç ão numa região árid a sãobons exempl os d e variáveis importantes c ujos val ores sãonotoriamente d iferentes não apenas através d o tempo, mas d e uml ugar para outro no mesmo tempo. Em sistemas naturais c omoec ossistemas ou popul aç ões animais, mud anç as rápid as nos pad rõesespac iais c ostumam ser sinais d e uma mud anç a iminente. Muitosartigos c ientífic os c itam exempl os em que o c l ima numa áreasemiárid a fic a mais sec o, fazend o a vegetaç ão c resc er numad istr ibuiç ão bem mais d ispersa e irregul ar d o que quand o tod as aspl antas obtêm água sufic iente . Esse pad rão d e d esigual d ad e sed esd obra grad ual mente até atingir um ponto c ruc ial no qual tod as aspl antas remanesc entes morrem e a região se torna um d eserto.

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Portanto, proc ure por al teraç ões nos pad rões c omuns c omo uma pistad e que o sistema está ad entrand o uma zona perigosa.

Tais ferramentas d e sistemas d inâmic os muitas vezes requeremgrand e número d e d ad os. Porém, por sua própria natureza, eventosX, c omo um d esastre ec onômic o, um furac ão ou uma revol uç ãopol ític a, não oc orrem c om grand e frequênc ia. Assim, quase sempre osd ad os não estão d isponíveis — ou ao menos não estão d isponíveis naquantid ad e e qual id ad e sufic ientes para o uso efic az d a estatístic aou d a teoria d os sistemas d inâmic os a fim d e prever o que vem aseguir e quand o. O que fazer então? Bem, quand o o mund o real nãofornec e os d ad os nec essários, c r ia-se um mund o substituto que osfornec e ! Essa é a id eia por trás d a simul aç ão basead a no agente,termo pseud oac ad êmic o para o que não passa d e um jogo d ec omputad or.

FERRAMENTAS COMPUTADORIZADAS PARASIMULAÇÃO DE PREVISÃO

M UITO TEMPO ATRÁS, ANTES d e me tornar ad ul to, eu ad orava apostar nosjogos d a l iga profissional d e futebol americ ano, a NFL. Por ser umsujeito razoavel mente anal ític o, eu também agia sob a mesma il usãoque c ontagia muitas pessoas d e espírito anal ític o sobre o merc ad o d eaç ões: d eve existir al guma fórmul a mágic a d e manipul ar os d ad osd isponíveis e transformá-l os em previsões c onfiáveis sobre o resul tad od os jogos. Se eu vivesse no paraíso d os apostad ores, essa fórmul a mepermitir ia sobrepujar as c hanc es oferec id as pel os agenc iad ores d eapostas em Las Vegas. Então examinei os programas d e c omputad oroferec id os na époc a em busc a d e uma bal a mágic a. Desnec essáriod izer, sou agora bem mais sensato — mas mais pobre — sobre asperspec tivas d e venc er a c asa d e apostas no futebol americ ano. Porémaprend i uma série d e fatos naquel a pesquisa (e em outras) que meforam úteis d al i para a frente . Vou expl ic ar um d el es, pois é d e l ongea l iç ão mais pertinente e c ontribuiu para eu permanec er bemempregad o nos ú l timos anos. A maioria d os programas que testei erad e natureza estatístic a. Em outras pal avras, primeiro c ol etavamtod os os d ad os d o passad o sobre o número d e pontos que um timehavia marc ad o e uma série d e d etal hes téc nic os d os jogos. O

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programa então proc essava esses d ad os, gerand o uma estimativaestatístic a d e quantos pontos o time marc aria no jogo seguinte . Osmod el ad ores matemátic os c ostumavam c hamar isso d e uma abord agem“d e c ima para baixo” d o probl ema, já que e l a ignora total mente osjogad ores ind ivid uais e seus d esempenhos, c onc entrand o-se emind ic ad ores agregad os d e c omo os jogad ores se saíram. Isso equival e aexaminar o bal anç o d e uma empresa, em vez d e d esc er às suasoperaç ões e examinar c omo seus empregad os real mente geram essesnúmeros agregad os, c omo rec eitas brutas, c ustos d a mão d e obra el uc ros. Tais ind ic ad ores pod em (ou não) ser úteis na anál ise d e umaempresa, mas eu os ac hava meio d efic ientes para anal isar qual seriao d esempenho d e um time d e futebol americ ano em um d ad o d omingo.

O que eu proc urava era um mod el o “d e baixo para c ima” , quevol tasse a atenç ão para os próprios jogad ores ind ivid uais, suasc arac terístic as d e jogo, c omo vel oc id ad e, forç a e agil id ad e,juntamente c om as regras empregad as por c ad a um d el es para jogarem sua posiç ão. Com essas informaç ões, ser ia possível c ol oc á-l os eminteraç ão e ver que tipo d e resul tad o (esc ore d e pontos) emergiria. Osl eitores rec onhec erão que essa abord agem enfatiza a id eia d osfenômenos emergentes, um d os sete pil ares d a c ompl exid ad ed el inead os na Parte I.

Ac abei d esc obrind o que tal programa existia e o empreguei poral gumas temporad as para fazer minhas apostas. Eu c onseguia atésimul ar os jogos d e c ad a d omingo no meu c omputad or, d isputar c ad aum d el es umas c em vezes e examinar quantas vezes um timepred ominava sobre o outro e por quantos pontos — justamente asinformaç ões d e que eu prec isava para fazer minhas apostas. Val e apena observar c omo essa abord agem d e baixo para c ima me permitiuabord ar perguntas d e simul aç ão d o tipo “e se?” sobre qual quer jogoespec ífic o: E se o Jogad or A se mac huc ar? E se o c ampo estivermol had o e enl amead o? E se…?

Esse mesmo princ ípio está em func ionamento no que passou a serd enominad o “simul aç ões basead as no agente” , em que isol amos umaparte d o mund o real e d epois c r iamos c enários sobre aquel a fatia d areal id ad e d entro d e nossos c omputad ores. Isso equival e a usar oc omputad or c omo um l aboratório para fazer os tipos d e experimentosc ontrol ad os e repetíveis exigid os pel o métod o c ientífic o, mas que areal id ad e geral mente não nos permite real izar. Por exempl o, voc êpod e ter uma hipótese que gostaria d e testar sobre c omo os merc ad os

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financ eiros func ionam. Infel izmente, não d á para ir a Wal l S treet eped ir que mud em as regras d e negoc iaç ão para testar sua teoria. Masé possível c onstruir uma reprod uç ão d e Wal l S treet no seuc omputad or, povoá-l a c om uma série d e negoc iad ores usand od iferentes regras e c ol oc á-l os em interaç ão d e ac ord o c om os prec eitosd e sua teoria. Se voc ê c onseguiu c aptar as regras d os negoc iad ores eaté as regras pel as quais e l es mud am suas regras d e negoc iaç ão, al émd e outros fatores que afetam d e forma mais ampl a as negoc iaç ões,pod e esperar obter al gum visl umbre útil d a viabil id ad e d e sua novateoria. Pod emos fazer a mesma c oisa para testar hipóteses sobre asprobabil id ad es e o possível impac to d e eventos extremos.

Antes d e d esc rever esse proc esso, d eixemos c l aros quais ose l ementos que c onstituem um mod el o/simul aç ão basead o no agente.

Um número méd io d e agentes: O termo-pad rão d o jargãoempregad o para d esc rever os objetos que c ompõem nossosistema d e interesse é agente , se ja e l e um investid or d omerc ad o financ eiro, um motorista num sistema d e tráfegorod oviário ou um país num sistema geopol ític o. Aoc ontrário d os sistemas simpl es, c omo c onflitos entresuperpotênc ias, que tend em a envol ver um númeropequeno d e agentes interativos, ou d os sistemas grand esc omo uma gal áxia (que possui uma popul aç ão d e agentes— estrel as, pl anetas, c ometas etc . — grand e o sufic ientepara, ao estud á-l os, pod ermos usar proc ed imentosestatístic os) , os sistemas c ompl exos envol vem o que sepod eria c hamar d e um número “méd io” d e agentes. Oque c onstitui “ méd io” pod e variar d e c aso para c aso, masgeral mente signific a um número grand e d emais para aintuiç ão e o c ál c ul o manual esc l arec erem oc omportamento d o sistema e pequeno d emais para quetéc nic as d e agregaç ão estatístic a forneç am respostas úteisàs nossas perguntas. Numa partid a d e futebol americ ano,esse número está em torno d e tr inta, c onsistind o nos 22jogad ores em c ampo, mais as equipes téc nic as d e ambos osl ad os. Assim, um sistema c ompl exo é formad o por umnúmero d e agentes nem pequeno d emais nem grand ed emais, mas d o tamanho c erto para c riar pad rõesinteressantes e signific ativos d e c omportamento

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emergente.Agentes intel igentes e ad aptativos: Al ém d e existir umnúmero méd io d e agentes, e l es são intel igentes e têm ac apac id ad e d e aprend er e mud ar seu c omportamento c omo d esenrol ar d os eventos (ad aptativos) . Isso signific a quetomam d ec isões c om base nas regras, c omo os princ ípiosque um quarterbac k ou um l inebac ker usa no futebolameric ano para jogar na sua posiç ão, d e ataque ou d ed efesa, respec tivamente. Al ém d isso, os agentes estãoprontos para mod ific ar suas regras c om base eminformaç ões novas c om que se d eparam. Em al guns c asos,pod em até gerar regras novas nunc a antes empregad as,em vez d e se restr ingirem a um c onjunto d e esc ol haspred efinid as para a aç ão. Por exempl o, o grand erec ebed or R . C. Owens, d o San Franc isc o 49er,introd uziu a jogad a al l ey -oop em seu repertório d eformas d e agarrar a bol a sobre os braç os estend id os d eum d efensor. Esse aspec to ad aptativo é o que tend e ad istinguir os grand es jogad ores d e futebol americ ano(c omo Pey ton Manning, que parec e mud ar seu jogoofensivo antes d e c ad a snap basead o no al inhamento d ad efesa) d os jogad ores normais. Essa c apac id ad e d e gerarregras novas faz surgir uma “ec ol ogia” , que c ontinuaevol uind o à med id a que o jogo, ou mesmo a temporad ainteira, se d esenrol a. Informaç ões l oc ais: Nenhum jogad or ind ivid ual temac esso ao que tod os os outros estão fazend o numd eterminad o estágio d o jogo. No máximo, c ad a um obtéminformaç ões sobre um subc onjunto re l ativamente pequenod e outros jogad ores e d epois proc essa essas informaç ões“ l oc ais” para c hegar a uma d ec isão d e c omo agirá. Namaioria d os sistemas c ompl exos, os agentes se assemel hammais a motoristas numa red e d e tráfego rod oviário ou ainvestid ores num merc ad o espec ul ativo, c ad a qualpossuind o informaç ões sobre o que ao menos al guns d osoutros motoristas ou investid ores estão fazend o… masnão tod as.

Voc ê pod eria argumentar que, apesar d e uma partid a d e futebol

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americ ano ser um pequeno e interessante quebra-c abeç a, não é d egrand e importânc ia no toc ante aos eventos extremos, mesmo no nívelbem restr ito d e torc ed ores e apostad ores c omo eu fui no passad o.Embora seja possível usar o “mund o d o futebol ” para fazer muitosexperimentos, e até expl orar d iferentes situaç ões que pod em d arorigem a surpresas, está fal tand o o fator impac to que transformariaqual quer uma d essas surpresas em um evento X. Mas é a id eia d ec riar um mund o no c omputad or para gerar d ad os sobre um sistemaem que eventos extremos genuínos possam emergir que é a mensagemaqui. Portanto, examinemos outro exempl o d e simul aç ão d ec omputad or em que eu mesmo me envol vi rec entemente e que possuitod as as c arac terístic as para o aparec imento d e um verd ad eiroac ontec imento extremo.

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E M MEU TRABALHO, LIDERO um projeto d e pesquisa d ed ic ad o a rastrearos impac tos potenc iais que d iferentes eventos extremos pod em exerc ersobre a ec onomia d os países. Uma simul aç ão basead a no agente d ared e d e c omérc io gl obal c r iad a d entro d as l inhas que ac abamos d ed isc utir c onstitui uma ferramenta-c have nessa anál ise . Darei apenasum breve resumo d e um c enário geopol ític o que estud amosrec entemente. O evento X em questão c omeç ou pel a pergunta: O queac ontec eria se a China passasse a d esafiar abertamente a hegemoniagl obal d os americ anos? Esse d esafio pod eria vir d e três formasd istintas, resul tand o nos seguintes c enários d iferentes ond e se pod eexpl orar o impac to sobre a saúd e ec onômic a d os países em nossomund o d o c omputad or:

Cenário I: A China é c ad a vez mais assertiva, ou mesmobel igerante, em tod as as áreas d e c onflito e d isputa.Pod emos c hamar esse c aminho d e “d if íc i l ” . Nessec enário, o pior d os prognóstic os é um c onfronto mil itaraberto entre China e Estad os Unid os.Cenário II: A China aind a é assertiva, mas exerc e suaagressivid ad e d e forma mais sutil , em geral via c anaisd ipl omátic os, negand o-se a exportar c ertos rec ursos ec oisas semel hantes (o c aminho “brand o”) .

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Cenário III: A China se enfraquec e d evid o a tensõesinternas d e natureza ec onômic a, pol ític a e soc ial ,enquanto os Estad os Unid os reemergem quasemil agrosamente c omo a potênc ia gl obal d ominante. Essasituaç ão envol ve um c resc imento c hinês progressivamentemenor, ao mesmo tempo que os Estad os Unid os rec uperama c onfianç a e a inf l uênc ia.

O mund o d os negóc ios gl obal em nossa simul aç ão c onsiste nosseguintes 22 países (agentes) :

Zona d o euro: Finl ând ia, Suéc ia, Dinamarc a, Bél gic a,H ol and a, Al emanha, Franç a, Espanha, Itál iaAméric as: EUA, Méxic o, Canad á, BrasilÁsia: China, Índ ia, Japão, Ind onésiaOutros: Reino Unid o, Noruega, Rússia, Turquia, Áfric ad o S ul

Cad a país d ispõe d e um c onjunto d e med id as que pod em sertomad as a qual quer momento, inc l uind o c erta c ombinaç ão d e taxasal fand egárias, oferec end o d esc ontos para “naç ões mais favorec id as” ,reaval iaç ão d e sua moed a e outras aç ões mac roec onômic as d e grand eesc al a. Cl aro que essas d ec isões são l imitad as por fatores geográfic ose pol ític os, c omo al ianç as c omerc iais, c ustos d e transporte e outrasquestões d esse tipo.

No primeiro c enário, em que a China toma o c aminho d if íc i l ec onfronta abertamente os Estad os Unid os, o grand e perd ed or em2030 é a própria China. O interessante é que os países que menossofrem são aquel es d o Benel ux. Mas fic am tod os os 22 em c ond iç õespiores d o que estavam inic ial mente em 2010.

Por outro l ad o, ao seguir o c aminho brand o d o segund o c enário,tod os os países estão em mel hor situaç ão em 2030 d o que hoje , c om aChina l id erand o o avanç o, c om um PIB 9% maior em rel aç ão a 2010.Os países que menos se benefic iam c om o c aminho brand o sãoexatamente aquel es que menos sofreram na al ternativa mais d ura.

Final mente, o c aso extremo. Aqui a China entra em c ol apsoresul tante d e tensões internas, enquanto os Estad os Unid osressurgem. Os venc ed ores estão no c ontingente norte-americ ano —

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mas é o Méxic o que sai na frente , não os Estad os Unid os. Nãosurpreend e que o maior perd ed or nesse mund o d e 2030 seja a China,seguid a d e Japão, Índ ia, Rússia e Brasil — em suma, os países quec ompõem o grupo d os BR ICs mais o Japão.

Ac ho que isso é sufic iente para d ar uma id eia geral d e c omo assimul aç ões basead as em agentes pod em ser empregad as para al ertassobre ac ontec imentos futuros. Esse exerc íc io mostra que a simul aç ãopod e ajud ar a prever um evento X aind a não oc orrid o. Pod e tambéml anç ar uma l uz sobre seu impac to enquanto o investigad or brinc a d eser Deus.

No d ec orrer d este l ivro, a c ompl exid ad e — e partic ul armente aid eia d e um d esc ompasso d e c ompl exid ad e c omo c ausa básic a d oseventos extremos — tem sid o o fio c ond utor d os vários exempl os eprinc ípios d isc utid os. Às vezes esse fio fic ou visível à superf íc ie , c omona d isc ussão d a primavera árabe no preâmbul o d o l ivro, outras vezese l e permanec eu impl íc ito, c omo em d iversos exempl os re l atad os naParte II. Mas em tod os os c asos a c ompl exid ad e d e um sistema sec ontrapõe à d e outro, gerand o tensões que ac abam send o al iviad aspor um evento X. É hora d e vol tar a esse tema e examiná-l o à l uz d enossas pond eraç ões nesta parte sobre os sinais d e al erta prec oc es. Empartic ul ar, quero examinar meios d e c arac terizar e med ir o d esníveld e c ompl exid ad e entre d ois (ou mais) sistemas e c omo usar essamed iç ão para prever, e tal vez imped ir, uma mud anç a iminente d eum tipo d e c omportamento para outro.

CUIDADO COM O VÃO

EM 2011 , OS INVESTIGADORES FRANCESES d e seguranç a aérea d ivul garamseu rel atório sobre os minutos finais d o Air Franc e 447 ao mergul harno mar ao l argo d a c osta brasil eira, na noite d e 1º d e junho d e 2009.Após uma busc a heroic a, as d uas c aixas-pretas d o avião foramenc ontrad as a quase quatro mil metros d e profund id ad e sob oAtl ântic o, quand o as autorid ad es se preparavam para aband onar abusc a. Um mil agre aind a maior foi que seus d ad os permanec iamintac tos, o que permitiu aos investigad ores d e seguranç a aérearec onstituir o que ac ontec eu c om o avião e atripul aç ão na c abined urante aquel es fatais minutos finais antes d e o avião mergul har na

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água. A história é tão instrutiva quanto assustad ora. Como d oc umentaram as c aixas-pretas, os sensores d e vel oc id ad e d o

avião fal haram, d and o aos pil otos med iç ões d a vel oc id ad e muitored uzid as após a entrad a d a aeronave em nuvens d e gel o d etempestad e quase onze mil metros ac ima d o mar. Com a qued a d evel oc id ad e, o avião entrou em proc esso d e estol , ou perd a d esustentaç ão, em que o ar que fluía sobre as asas era insufic iente el ento d emais para gerar a forç a nec essária para mantê-l o no ar. Osal armes d e al erta d e estol soaram três vezes, o que pod eria ter l evad oos pil otos a baixar o nariz d o avião, ac el erand o assim a aeronave egerand o a sustentaç ão para que vol tasse a subir. Mas, por razõesaind a d if íc eis d e expl ic ar, os pil otos e l evaram o nariz d a aeronave, eisso agravou aind a mais o estol . Àquel a al tura, o avião já não estavavoand o, mas c aind o — a uma vel oc id ad e d e 55 metros por segund o(quase d uzentos quil ômetros por hora) . Pouc o mais d e três minutosd epois o avião atingiu o mar, matand o tod as as 228 pessoas a bord o.O maior enigma parec e ser por que os pil otos e l evaram o nariz d oavião em vez d e abaixá-l o, exatamente o c ontrário d a aç ãonec essária para tirá-l o d o estol . Como/por que isso ac ontec eu?

Os d ad os d a c aixa-preta d a c abine sugerem que os pil otos pod emter pensad o que estavam tomand o a aç ão apropriad a, pois asmed iç ões d e vel oc id ad e estavam total mente irregul ares. Al ém d isso, oavião voava sobre o oc eano por uma região d e turbul ênc ia mod erad ae estava esc uro, o que imped ia os pil otos d e ver o horizonte ouqual quer outro ponto d e referênc ia que pud esse l hes d ar uma id eiad a vel oc id ad e, posiç ão ou d ireç ão d o avião. Como afirmou Ric hardHeal ing, um ex-integrante d o US National Transportation SafetyBoard (Consel ho Norte-Americ ano d e Seguranç a em Transportes) :“ Tud o que sabemos é que as informaç ões não eram c onfiáveis, queum monte d e ad vertênc ias estavam send o d isparad as e tud o eraprovavel mente muito, muito c onfuso.” Outro observad or versad o,Bil l Wal d c oc k , professor d a Universid ad e Aeronáutic a Emor y -Rid d l e , ac resc entou o seguinte : “A únic a c oisa que faria al gumsentid o é que e l es fic aram d esorientad os d o ponto d e vista espac ial ,não sabiam ond e era em c ima e não entend eram pl enamente o que aaeronave estava fazend o.” O c omentário mais estranho d e tod os vemd e Al ain Bouil l ard , c hefe d os investigad ores franc eses: “ El es [ospil otos] ouvem o al arme d e estol mas não mostram nenhum sinal d erec onhec imento. Em nenhum momento a pal avra ‘estol ’ c hega a ser

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menc ionad a.”De uma perspec tiva d e um evento X, o ac id ente d o AF447 é um

exempl o c l ássic o d e d esc ompasso d e c ompl exid ad e em aç ão. Temos ainstrumentaç ão e o sistema d e al erta d o avião emitind o vários sinaisvisuais e aud itivos, que são c aptad os e interpretad os por três pil otos,d os quais apenas um possui o c ontrol e real d a aeronave ( c omo se viud epois, o menos experiente) . Assim, a abund ânc ia d e sinais vind os d oavião, c ombinad os aos outros sinais (ou à fal ta d el es) d o ambiente,parec e ter sobrepujad o total mente a c apac id ad e d os pil otos d eexaminar tod os os d ad os e c hegar à l inha d e aç ão c orreta pararestaurar a sustentaç ão d o avião. Em suma, a c ompl exid ad e d osistema (o avião e seu ambiente) tornou-se grand e d emais para ac ompl exid ad e d o c ontrol ad or (os pil otos) , l evand o ao ac id ente (oevento extremo) e à morte d e tod as as 228 pessoas a bord o.

Esse exempl o tem el ementos d a teoria d a c ompl exid ad e sufic ientespara manter al guém oc upad o por d ias. Porém o objetivo c entral d eum pesquisad or d e eventos X é ind agar c omo o d esc ompasso d ec ompl exid ad e pod eria ter sid o evitad o. Ou, se não pud esse serevitad o, c omo o sistema pod eria ser projetad o para red uzir od esnível d e mod o rápid o e c onfiável , c aso e l e aparec esse . Está c l aroque há muito sobre o que refletir nos d ois l ad os d essa equaç ão. Osinstrumentos e o sistema d e al erta d o avião atrapal haram mais d oque ajud aram, exac erband o uma emergênc ia que já tinha uma janel ad e tempo muito estreita para a aç ão. Por outro l ad o, os pil otosparec iam estar num estad o d e sobrec arga d e informaç ões que osimped iu d e c hegar a um c onsenso sobre a aç ão a tomar e agirrapid amente. Em suma, uma c ombinaç ão d e informaç ões c onfusas ec onflitantes, proc essad as erroneamente, provavel mente al iad a a c ertograu d e pânic o, se l ou o d estino d o avião e d e seus passageiros.

Antes d e abord armos a questão d e c omo rec onhec er um d esnível d ec ompl exid ad e e estimar seu tamanho, val e a pena d ed ic ar al gumaspáginas à d isc ussão d e c omo pequenas l ac unas pod em ser ampl iad aspel as estruturas tec nol ógic as subjac entes aos sistemas soc iaismod ernos, auxil iad as e apoiad as pel a própria natureza humana.

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NO LIVRO M ERCADO FINANCEIRO: A c r ise anunc iad a, em minha opinião

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um d os re l atos mais esc l arec ed ores e ac essíveis d a c rise financ eira d e2007, R ic hard Bookstaber, veterano em finanç as que atua c omoc onsul tor d a Sec urities Exc hange Commission (S EC) e membro d oFinanc ial S tabil ity Oversight Board , faz a d istinç ão útil entre um“ac id ente normal ” e o que e l e d enomina “ac id entes esperand o paraac ontec er” , resul tad os d a c ompl exid ad e e d o ac opl amento estreito d emuitos sistemas. Na primeira c ategoria estão eventos esperad os, atémesmo inevitáveis, d ad a a inter l igaç ão d os d iferentes subsistemas quec ompõem a estrutura geral .

O ac id ente normal na usina nuc l ear d e ree Mil e Isl and , em1979, é um bom exempl o d esse tipo d e probl ema, quand o houve fal hana l uz d e ad vertênc ia d e uma vál vul a d e esc ape, l evand o ostrabal had ores a ignorar uma vál vul a d ’água bl oquead a que ac abouprovoc and o a pane. Embora os re l atos c hamem o ac id ente d e reeMil e Isl and d e um ac ontec imento “ inac red itável ” , a únic a c oisainac red itável era a l onga c ad eia d e proc essos que tod os tinham d es e g u i r c orretamente para que a usina func ionasse . Embora apossibil id ad e d e fal ha em qual quer um d esses proc essos fosseminúsc ul a, as c hanc es d e que houvesse ao menos uma não erambaixas. Um aspec to c ruc ial d os ac id entes normais é que e l es nãoresul tam apenas d o exc esso d e c ompl exid ad e, no sentid o d e haverpartes d e mais interagind o que prec isam func ionar c orretamentepara garantir o bom func ionamento geral . O ac résc imo d e revisões d eseguranç a para c ombater fal has muitas vezes c ontribui para ac ompl exid ad e, pod end o c onspirar c ontra a c onfiabil id ad e d o sistema,em vez d e aumentá-l a.

Por outro l ad o, existem sistemas c ujas muitas partes interagem d emod o a c riar c omportamentos que são anti-intuitivos, inesperad os ousimpl esmente d if íc eis d e entend er. Em suma, os c omportamentos sãosurpreend entes. Os merc ad os financ eiros gl obais são um bomexempl o. Anteriormente, argumentamos que a própria d iversid ad ed os instrumentos financ eiros c arac teriza a c ompl exid ad e d o sistema.Mas essa é apenas parte d a história. A forma c om que al guns d el essão estruturad os gera c omportamentos surpreend entes. Bookstaberc ita o exempl o d os instrumentos d e baixo c usto transac ionad os pel oBankers Trust para proteger seus c l ientes d e mud anç as nas taxas d ejuros. Entretanto, passou d esperc ebid o aos c omprad ores que o baixoc usto oc ul tava uma c l áusul a que faria os prejuízos d ispararem se astaxas d e juros subissem rápid o d emais. Al guns c omprad ores d esse

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c ontrato d e d erivativo só d esc obriram esse “aspec to” d e sua supostaproteç ão após arc arem c om prejuízos na c asa d as c entenas d e mil hõesd e d ól ares. Uma grand e fonte d e surpresa nesse tipo d e situaç ão éque geral mente não existe tempo sufic iente para se tomar uma aç ãoc orretiva antes que o sistema d egringol e e d ê origem ao eventoextremo.

No l ivro, Bookstaber rec orre ao sistema hub-and -spoke, usad opel as c ompanhias aéreas para d irec ionar os voos, c omo exempl o d eum sistema c omposto d e muitas partes que pod em interagir d e formasàs vezes misteriosas, mas c ujo ac opl amento não é firme. Assim,embora possa ser irr itante saber que seu voo d e Chic ago aAl buquerque foi c anc el ad o d evid o a um temporal em Minneapol is,voc ê d ispõe d e tempo sufic iente para investigar rotas al ternativaspara o Novo Méxic o enquanto aguard a em O’Hare. O sistema possuifol ga sufic iente embutid a para real izar sua funç ão d e l evá-l o d eond e está para ond e quer ir, embora c om c erto atraso e/ou ac résc imod e d espesa no perc urso. O fato é que o ac opl amento frouxo imped e osistema d e entrar em c ol apso total .

De um mod o geral , a mel hor sol uç ão para o d esc ompasso d ec ompl exid ad e c ostuma ser simpl ific ar o sistema que estáexc essivamente c ompl exo, em vez d e aumentar a c ompl exid ad e d osistema mais simpl es. Assim, por exempl o, no c aso d os merc ad osfinanc eiros seria preferível e l iminar, ou pel o menos red uzird rastic amente, a d isponibil id ad e d e instrumentos financ eirosexótic os que ninguém entend e d ireito, e não inc rementar aregul amentaç ão e os mec anismos d e c ontrol e . O ataque sempre tem avantagem, enquanto a d efesa prec isa c orrer atrás d o prejuízo.Mel hor restr ingir o ataque, ao menos na med id a em que o que estáem jogo é a sobrevivênc ia geral d o sistema f inanc eiro.

Subsistemas em interaç ão e ac opl amento firme resul tam numc asamento ard ente. Mas a união é aind a mais pressionad a pel aspersonal id ad es d as partes envol vid as. Espec ific amente, existe o fatorhumano em que pessoas e instituiç ões d eixam d e antever sinais c l arosd e probl emas. Quand o se trata d e eventos X c ausad os/ ind uzid os pel ohomem, é essenc ial examinar c omo as fraquezas d a natureza humananos l evam a ad ministrar c atastrofic amente a c ompl exid ad e. Umel emento c entral é o probl ema d e “não vermos o que não queremosver” , ou o que nos c írc ul os juríd ic os se c hama “ c egueira d el iberad a” .Rec entemente, Margaret Heffernan, premiad a mul her d e negóc ios,

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esc ritora e teatról oga, estud ou o fenômeno e publ ic ou suas c onc l usõesnum vol ume intitu l ad o justamente Wil l fu l Bl ind ness (Cegueirad el iberad a) . Aqui estão al guns exempl os d e c omo a natureza humanaé c ond ic ionad a a não ver o que d everia estar vend o.

A sobrec arga d e informaç ões é d e espec ial interesse para meuargumento d e que o “ inc haç o” d a c ompl exid ad e é a c ausa básic a d oseventos X. Heffernan fal a sobre c omo a mul tipl ic id ad e d e tarefas euma superd ose d e estímul os sensoriais, c ombinad as à exaustão f ísic a,pod em red uzir o foc o d o que vemos e não vemos. Compartil had o pormuitos estud iosos, entre e l es o esc ritor Nic hol as Carr, que c hama ofenômeno d e “c arga c ognitiva” , seu rac ioc ínio é simpl es: ac onc entraç ão é mais d if íc i l quand o estamos c ansad os, pois o c érebroc onsome tanta energia para permanec er al erta que nossas funç õesmais sofistic ad as são d esl igad as, a fim d e c onservar energia. Isso, porsua vez , d iminui o foc o d o que pod emos ou não “ver” . Como exempl o,Heffernan d esc reve uma expl osão numa refinaria d e petról eo d a BPem Texas City , Texas, em 2005. El a examinou esse ac id ente ed esc obriu que a refinaria havia sofr id o várias rod ad as d e d emissõespara red uç ão d e c ustos, forç and o os func ionários remanesc entes atrabal har por l ongos e c ansativos turnos, o que red uziu suac apac id ad e d e ver sinais d e ad vertênc ia d o d esastre que matouquinze pessoas.

Como outro exempl o d o mesmo proc esso, Heffernan c ita o c aso d osegund o-sargento Ivan Fred eric k II, c ond enad o à prisão em 2004 pormal tratar prisioneiros na d epl orável prisão d e Abu Ghraib, emBagd á. Por um l ongo períod o, Fred eric k vinha trabal hand o emturnos d e d oze horas, sete d ias por semana, c om pouquíssimas fol gas.Esse regime l evou à exaustão f ísic a, exac erbad a pel o fato d e estarc erc ad o d e c ol egas na mesma situaç ão. Na d esc riç ão d e Heffernan,“ninguém estava sufic ientemente d esperto para que restasse qual quersensibil id ad e moral ” .

A mental id ad e d e rebanho que menc ionei várias vezes em meurel ato também entra em aç ão no c ontexto d a c egueira d el iberad a,nesse c aso sob o rótul o d e “efeito d e Cassand ra” . De ac ord o c om amitol ogia grega, Cassand ra rec ebeu o d om d a profec ia c ombinad o àmal d iç ão d e que ninguém ac red itaria nel a. Tais vid entes c ostumamser punid os c om rigor no tr ibunal d a opinião públ ic a, l evand o osprofetas a preferir não d ivul gar as suas profec ias. De novo noc ontexto d a prisão d e Abu Ghraib, temos o c aso d e Joe Darby , que

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entregou aos seus superiores fotos d e maus-tratos aos prisioneiros.Como c ontou Darby : “ Eu tive d e optar entre o que sabia sermoral mente c erto e minha l eal d ad e aos outros sol d ad os. Não erapossível fazer as d uas c oisas.” O que ac abou ac ontec end o foi que e l ese viu obrigad o a mud ar d e c id ad e e assumir uma id entid ad e nova,porque al guns morad ores d e sua própria c id ad e natal o viam c omoum traid or. Um profeta, portanto, não c ostuma rec eberagrad ec imentos ou homenagens.

O l ivro d e Heffernan termina c om a mensagem: “ Tornamo-nosimpotentes quand o optamos pel a ignorânc ia.” No c ontexto d estel ivro, eu pod eria parafraseá-l a d izend o que abrimos as portas paraac ontec imentos potenc ial mente d evastad ores quand o optamos por nãover em vez d e enfrentar a real id ad e.

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NUM ATAQUE MORDAZ À d esigual d ad e d e rend a c resc ente nos Estad osUnid os publ ic ad o na revista Vanity Fair em 2011, Joseph S tigl itz ,ec onomista l auread o c om o Prêmio Nobel , fez a seguinte afirmaç ão:“ Uma el ite formad a por 1% d a popul aç ão possui as mel hores c asas, amel hor ed uc aç ão, os mel hores méd ic os e os mel hores esti l os d e vid a,mas existe uma c oisa que o d inheiro parec e não ter c omprad o: umac ompreensão d e que seu d estino está l igad o ao mod o c omo vivem osoutros 99%.” A partir d essa observaç ão, pod emos inferir que onúmero d e opç ões d e esti l o d e vid a d isponíveis, inc l uind o c asas,méd ic os, viagens e ed uc aç ão, serve c omo um ind ic ad or razoável d onível d e c ompl exid ad e d a existênc ia d e uma pessoa. Em termossuc intos, d e quanto mais opç ões voc ê d ispõe, mais c ompl exa é suavid a. Esse é um bom ind ic ad or inic ial . Se c onto c om a opç ão d etrabal har num emprego ou não, d e viajar nas fér ias para a CostaRic a ou para a Nova Zel ând ia ou aind a exc ursionar pel os And es, d etratar meu c ânc er no S l oan-Kettering Hospital , em Nova York, ou naCl ínic a May o, ou d e pagar os estud os d e meu fil ho numauniversid ad e d e e l ite , minha vid a é bem mais c ompl exa d o que se eunão d ispuser d essas esc ol has. Em outras pal avras, pod emos d izer queos r ic os possuem muitos graus d e l iberd ad e (ou seja, opç ões d e aç ão) .O que real mente esc ol ho fazer não afeta o nível d e c ompl exid ad e d eminha vid a. Para torná-l a c ompl exa, basta que eu tenha opç ões

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d isponíveis. E , em grand e parte , e l as são c omprad as c om d inheiro. Com esse c onc eito d e c ompl exid ad e em mente, não resta d úvid a d e

que os EUA estão experimentand o um d esequil íbrio d a c ompl exid ad esoc ial que c resc eu d e forma exponenc ial nas ú l timas d éc ad as. Od esnível c hegou a um ponto em que 1% d a popul aç ão d etém mais d e25% d a rend a e , o que é aind a pior, c onc entra inc ríveis 40% d oativo total . Esses d ois índ ic es eram d e 12% e 33%, respec tivamente,em 1985. Segund o os argumentos que d efend i no d ec orrer d este l ivro,espec ial mente nas histórias d e al guns eventos extremos na Parte II,estamos à beira d e uma vigorosa sac ud id el a que resul tará numrápid o e d ol oroso evento extremo para e l iminar esse d esnível .

Karl Marx proferiu esta famosa frase : “A história se repete ,primeiro c omo tragéd ia, d epois c omo farsa.” Pintei aqui um quad rosombrio d e c omo a c ompl exid ad e c riad a pel o homem se enc aixaperfeitamente na visão marxista d a história. Um fato espec ial mentetriste , pois ao mesmo tempo estamos vivend o na soc ied ad etec nol ogic amente mais avanç ad a que a humanid ad e já c onhec eu. Noentanto, c ontinuamos l anç and o as sementes d e nossa própriad estruiç ão, sementes que pel a primeira vez na história são c apazes d eevol uir para a d estruiç ão d e tod a a nossa espéc ie . Este é um bomponto para pensar seriamente se al c anç aremos a segund a fase d ahistória e c onseguiremos rec ord ar a nossa fase trágic a c om bomhumor e ad miraç ão. Gostaria d e d el inear nas ú l timas páginas d estel ivro al gumas id eias d o que pod eríamos fazer hoje , amanhã e d epoisd e amanhã para reparar ou minimizar os e feitos d os d esequil íbriosd e c ompl exid ad e. Sustento que aind a há bastante espaç o para ootimismo — mesmo em um mund o repl eto d e eventos X.

O DILEMA DA DIMINUIÇÃO DO RISCO

OS MAIS DRAMÁTICOS DOS eventos extremos são aquel es que c hegam àsmanc hetes. Ao l er sobre a enc hente d e Bangc oc em 2011 ou pensar nofurac ão Katrina e no rompimento d os d iques em Nova Orl eans em2005, é fác il se tornar fatal ista em rel aç ão a esse tipo d e d esastrenatural . E quem pod eria c ul pá-l o? Se seus pensamentos se d esviaremd esses eventos “menores” para al go c omo o impac to d o asteroid e ou aerupç ão d o supervul c ão d isc utid os brevemente na Parte I, é d if íc i l

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ser otimista quanto ao futuro após tais c atástrofes. El es ser iamsufic ientes para d eixar qual quer um d esesperad o. Contud o, talatitud e não prec isa nem d eve nos c egar para o fato d e que os eventosX c ausad os pel o homem, d esc ritos na Parte II, são na maior partepossíveis d e evitar. Ou, na pior d as hipóteses, seus d anos pod em serbem red uzid os pel a atenç ão humana e aç ão preventiva. As váriasanál ises d a c rise financ eira d e 2007 il ustram a possibil id ad e d eevitar os eventos extremos, c ontanto que estejamos d ispostos a mud arnossos pontos d e vista sobre a forma c omo um sistema pod e e d evefunc ionar. No entanto, mud ar as c renç as é um proc esso bem maisd ol oroso, d if íc i l e d emorad o d o que mud ar d e sentimentos.

Aquel es que vivem no mund o mod erno e ind ustrial izad o nãoparec em aind a preparad os para ac eitar o fato d e que a vid a não estál ivre d e r isc os. Temos sid o mimad os e protegid os a ponto d ereal mente esperar que nossos governos e outras instituiç ões públ ic asresol vam tod os os probl emas, real izem nossas esperanç as e satisfaç amnossas nec essid ad es sem que isso nos represente um c usto ou um risc o.Em suma, c aímos na c renç a equivoc ad a d e que tod os pod em estarac ima d a méd ia, d e que tod os têm o d ireito nato d e viver uma vid afel iz e l ivre d e r isc os e d e que qual quer sofr imento, d ec isão errad aou mesmo a má sorte d evem ser d eixad os na sol eira d a porta d e outrapessoa. Portanto, o primeiro passo na estrad a rumo à real id ad e éaband onar as i l usões d e utopia. Embora a máxima c itad a d e T. S .El iot sobre a inc apac id ad e humana d e suportar o exc esso d ereal id ad e pareç a pertinente, exc esso d e real id ad e e al guma real id ad esão c oisas bem d iferentes. Il ustrarei o val or d e preferir a real id ad eao mito c itand o o trabal ho d e Monic a Sc hoc h-Spana que d istingueambos.

Num seminário c hamad o Seguranç a Nac ional , Meio Ambiente e oPúbl ic o (Homel and Sec urity , the Environment and the Publ ic ) ,real izad o em 2005, Monic a Sc hoc h-Spana d el ineou c inc o mitos sobred esastres e as real id ad es assoc iad as, c om atenç ão espec ial aoprobl ema d o c omportamento soc ial após um evento extremo. Seusargumentos apontam para o fato d e que aquil o que as pessoas pensamque será a reaç ão públ ic a a um evento extremo — c om base emsimpl es pal pites, intuiç ão e c renç as — não resiste ao teste d areal id ad e. Eis um d os exempl os que e l a apresenta.

Mito: Quand o a vid a e a integrid ad e f ísic a são ameaç ad as emgrand e esc al a, as pessoas entram em pânic o. El as revertem à sua

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natureza se l vagem, e as normas soc iais l ogo se d issol vem.Fato: Repetid os estud os mostram que, em uma situaç ão d e

emergênc ia, as pessoas raramente revertem à mental id ad e d o barc osal va-vid as, d e c ad a um por si . O mais revel ad or é que, em pesquisassobre c omo ac ham que se c omportarão quand o o d esastre surgir, aspessoas geral mente respond em que reverterão à l ei d a se l va. Mas, naverd ad e, o pânic o c onstitui a exc eç ão, e o que preval ec e mesmo é aresol uç ão c riativa d e probl emas.

Como exempl o, o estud o c ita o terremoto d e Loma Prieta, em1989, na Cal ifórnia, ond e 49 d as c inquenta pessoas retirad as d osesc ombros não foram sal vas por profissionais d e resgate , e sim por umgrupo d e oito trabal had ores d e c onstruç ão mexic anos que por ac asose enc ontravam na viz inhanç a. Histórias semel hantes são c ontad assobre as reaç ões al truístas d as vítimas d iretas d os atentad osterroristas d e 11 d e setembro e no metrô l ond rino. Não posso resistira c ontar mais um d os mitos d e Sc hoc h-Spana, por estar d iretamenterel ac ionad o aos ac ontec imentos extremos d el inead os neste l ivro.

Mito: Os d esastres naturais são pred eterminad os. Não há nenhummeio real d e imped ir sua oc orrênc ia. O mesmo val e para asexigênc ias buroc rátic as, outra d as c hamad as forç as imutáveis.

Fato: Durante o períod o d e 1975 a 1994, os furac ões foram osegund o d esastre natural mais c aro em perd as d e propried ad es e oterc eiro em baixas humanas. Previsões mel hores e c ód igos d eed ific aç ões mais r igorosos re l egaram os furac ões à sétima maior c ausad e mortes por d esastres naturais.

A l iç ão mais importante a extrairmos d esse estud o revel ad or é queo resul tad o d e um evento extremo c ausad o pel o homem não é al goimutável ou inevitável . A aç ão humana pod e afetar fortemente onúmero d e vid as e /ou d e d inheiro perd id o. Al ém d isso, existe c omfrequênc ia um raio d e esperanç a até para a mais negra nuvem. Parail ustrar esse fato, retornemos rapid amente ao terremoto d e març o d e2011 e al guns d os potenc iais e feitos sec und ários sobre a soc ied ad ejaponesa.

• • •

L OGO APÓS O TERREMOTO no Japão, o c ol unista financ eiro Wil l iamPesek observou que os abal os d esempenham um papel re l evante na

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psique japonesa não apenas c omo gerad ores d e traumas f ísic os, mastambém d e mud anç a soc ial . El e c ita o terremoto d e 1855 que arrasouo que hoje é a Tóquio mod erna e enc errou o isol amento japonês d operíod o Tokugawa. A rec onstruç ão após o tremor d e 1923rapid amente l evou à asc ensão d o mil itarismo japonês, enquanto oterremoto d e Kobe, d e 1995, prenunc iou o fim d o boom ind ustrial d opós-guerra e a c onsequente d eflaç ão que vigora no país d esd e então.Assim send o, pergunta Pesek , a mud anç a históric a estará d e novo nohorizonte?

Aqui estão três possíveis mud anç as id entific ad as por Pesek paraque o terremoto sirva d e c atal isad or para resgatar o Japão d ed éc ad as d e torpor d ef l ac ionário:

Choque pol ític o: Apesar d e anos d e d eflaç ão e sal áriosestagnad os, as autorid ad es japonesas hesitam em tomaraç ões d ec isivas para atac ar seus probl emas ec onômic os,mesmo d epois que a China ul trapassou o país e se tornoua segund a maior ec onomia d o mund o em 2010. Oterremoto pod e servir para c hac oal har o governo japonês,tirand o-o d a c ompl ac ênc ia e paral isia. Não há outraesc ol ha senão rec onstruir o país sem grand eend ivid amento, c om o foc o no d esenvol vimento d eestruturas ec onômic as internas que enfatizem oempreend ed orismo.Mel hores re l aç ões c om a China: As c ond ol ênc ias d aChina e a oferta imed iata d e ajud a ao Japão após oterremoto pod em servir para red uzir as tensões entre asd uas naç ões. Vel hos l itígios sobre territórios, ativid ad esmil itares e c oisas semel hantes pod em d esaparec er em umanova era d e “rel aç ões amistosas” entre os d ois países,c omo resul tad o d a tragéd ia japonesa.Aumento d a c onfianç a japonesa: As pessoas ao red or d omund o se surpreend eram c om a rápid a reaç ão d o Japãoaos d anos d o terremoto e a d isc ipl ina d o povo em fac e d etamanha c atástrofe . A ausênc ia d e saques e d istúrbiossoc iais mostrou que o Japão é uma soc ied ad e estável ec ompassiva, al tamente c ivil izad a; em suma, um mod el od e c omo é possível reagir a um d esastre imenso.

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A moral d essa história é que um evento extremo pod e, al ém d e serum probl ema, servir c omo oportunid ad e.

Ol hand o a l ista d e possíveis eventos X examinad os na Parte II,vemos um mund o em que

• o petról eo está se esgotand o,• as red es e l étr ic as estão sobrec arregad as al ém d a c onta,• a internet está à beira d e uma pane e• os preç os d os al imentos aumentam al ém d a c apac id ad e

aquisitiva d a maioria d as pessoas.

Essa l ista é bem intimid ante e c om c erteza não inspira uma visãootimista d o futuro. Mas, em sua maioria, seus itens aind a são meraspossibil id ad es, não real id ad es. Embora al gumas sejam bem prováveis,a boa notíc ia é que a maior parte pod e ser prevista ( c omo fiz aqui) eaté evitad a. A má notíc ia, porém, é que é d if íc i l d ar atenç ão a meraspossibil id ad es, sobretud o quand o são raras e o períod o d e tempo éind efinid o. De ac ord o c om o que gosto d e d enominar Parad oxo d oCisne Feio, embora tod os c onc ord em que surpresas sempre oc orrem,nenhuma surpresa espec íf ic a jamais vem a oc orrer. Essa atitud eprec isa ser c ombatid a c onstantemente. Surpresas espec ífic as, mesmoaquel as d el inead as na Parte II, pod em ac ontec er. E ac ontec em mesmoquand o parec em tão d esagrad áveis que é preferível não pensar nel ase assim se enganar ac hand o que não pod em oc orrer. El as oc orrerãomesmo assim. Os d anos serão infinitamente maiores se voc ê enterrara c abeç a na areia e f ingir que nad a ac ontec erá.

A essênc ia d e minha mensagem neste l ivro é que a sobrec arga d ec ompl exid ad e é responsável por prec ipitar a oc orrênc ia d os eventosX. Essa sobrec arga pod e se manifestar c omo uma tensão ou pressãoinc ontrol ável em um só sistema, seja uma soc ied ad e, uma empresa oumesmo um ind ivíd uo. O ac ontec imento extremo que red uz a pressãovaria d e um abal o soc ial a uma fal ênc ia empresarial ou um c ol apsonervoso. Mas c om frequênc ia a sobrec arga assume a forma d e d ois oumais sistemas em interaç ão, em que a c ompl exid ad e d e um d ossistemas sobrepuja a d o( s) outro( s) , c aso em que aparec e um d esnível .À med id a que esse d esnível se expand e no d ec orrer d o tempo, o quepod eríamos d enominar “pressão interativa” aumenta. Se não forl iberad a pel a grad ual red uç ão d o d esnível , a pressão ac abará send o

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l iberad a por um fec hamento súbito sob a forma d e um eventoextremo. Assim, sem o equival ente soc ial à “vál vul a d e esc ape d apressão” para red uzir l entamente o d esnível d e c ompl exid ad e, umevento extremo assoma no futuro.

Visto d essa perspec tiva, o tamanho d a sobrec arga/d esnível d ec ompl exid ad e é um novo meio d e med ir o r isc o d e um evento X, o quepod eríamos c hamar d e “risc o X” . Quand o a magnitud e d a sobrec argaé muito al ta, o r isc o é grand e; quand o é baixa, o r isc o é menor. Nossoobjetivo c omo ind ivíd uos e membros d a soc ied ad e é agirmos parared uzir o r isc o X. Como fazê-l o?

Primeiro, observe que a red uç ão d o d esnível d e c ompl exid ad eapresenta d ois aspec tos bem d iferentes. De l onge, o mais importanteé, antes d e mais nad a, c omo evitar o aparec imento d e tal d esnível .Como d iz o d itad o, mais val e prevenir d o que remed iar. E e l e nunc afoi mais verd ad eiro d o que nessa situaç ão. Evitar essa l ac unasignific a projetar nossos sistemas para que func ionem c omo um tod ounific ad o, e não c omo uma c ol eç ão d e sistemas gerid os isol ad amente.A red e e l étr ic a está l igad a à internet, que por sua vez se enc ontral igad a ao sistema financ eiro e assim por d iante. Não pod emos maispermitir que al guns sistemas d esenvol vam um nível d e c ompl exid ad eem total d esarmonia c om os outros, d e que se al imentam e d os quaisd epend em.

Nas époc as em que as pessoas perc ebem o r isc o extremo c omobaixo, a emoç ão d a ganânc ia c ostuma preval ec er sobre a sensaç ão d emed o. Vimos isso em abund ânc ia d urante a c r ise financ eira rec ente ,quand o banqueiros, c orretores e investid ores c ompraram a id eia d ed inheiro “grátis” em ativos c omo títu l os garantid os por hipotec as,que parec iam bons d emais para ser verd ad e. E eram mesmo!Portanto, é nessas oc asiões que as autorid ad es regul ad oras d evemprestar atenç ão espec ial para c onter os exc essos d a “exuberânc iairrac ional ” , para usar uma expressão agora d esac red itad a.

Por outro l ad o, em époc as em que a perc epç ão d o r isc o extremo éal ta, o med o d omina a ganânc ia, e a red uç ão d a c ompl exid ad e entrana ord em d o d ia. De novo, no atual c l ima ec onômic o, essa red uç ãoassume a forma d o fec hamento d e subsid iárias, d emissão d efunc ionários e c oisas semel hantes. Tais aç ões também prec isam serc uid ad osamente monitorad as e até regul amentad as para que aemend a não saia pior que o soneto. Compl exid ad e pequena d emaisnuma parte d o sistema geral sem red uç ões c orrespond entes em outras

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partes d eixa o mesmo d esnível c apaz d e gerar um evento X. Nad a éd e graç a. É prec iso ad ic ionar e subtrair c r iteriosamente ac ompl exid ad e no sistema c omo um tod o para e l iminar osd esequil íbrios. Conc entrar-se em apenas um ou d ois subsistemas,c omo finanç as ou c omunic aç ões, enquanto se ignora os outros d aráapenas a i l usão d e progresso, uma il usão que um evento extremo l ogod estroç ará. Uma l inha d e argumentaç ão semel hante se apl ic a ared uzir , em vez d e evitar , um d esnível d e c ompl exid ad e existente . Eisal guns princ ípios gerais que se apl ic am aos d ois c asos.

Antes d e mais nad a, sistemas e ind ivíd uos d evem ser tãoad aptáveis quanto possível . O futuro é sempre um l oc al d esc onhec id oe assustad or. Hoje em d ia é aind a mais assustad or e d esc onhec id o d oque c ostumava ser. Assim, d esenvol ver a nós mesmos e a nossasinfraestruturas para que tenham mais graus d e l iberd ad e a fim d ec ombaterem ou expl orarem o que possa aparec er pel a frente é umaboa estratégia básic a.

Estreitamente al iad a à ad aptabil id ad e é a resi l iênc ia. El a pod ec ombater a sobrec arga d e c ompl exid ad e c riand o uma infraestruturageral que seja c apaz d e enfrentar as d ific ul d ad es. Na verd ad e, nãosó enfrentá-l as, mas se benefic iar d el as. Um bom exempl o vem d asil vic ul tura. As autorid ad es que ad ministram florestas regul armenteateiam inc ênd ios c ontrol ad os para queimar a mad eira exc essiva que,d e outra forma, serviria para al imentar inc ênd ios maiores einc ontrol áveis quand o raios, c ampistas perd id os, inc end iários ououtros ac ontec imentos imprevistos inevitavel mente ateassem fogo naf l oresta.

R ed und ânc ia, inc orporar c apac id ad e oc iosa, é um métod o testad oe c omprovad o d e manter um sistema func ionand o em fac e d e c hoquesd esc onhec id os e muitas vezes inc ompreensíveis. Tod o ad ministrad ord e c omputad or sabe d isso, bem c omo quase tod os os usuários d ec omputad ores. O segred o é d ispor d e peç as extras sufic ientes para pôrno ar quand o um ou outro c omponente d o sistema fal ha. Essaferramenta d e minimizaç ão d e r isc os extremos está fortementeassoc iad a ao princ ípio d a c ompl exid ad e “ Tud o Tem um Preç o”apresentad o na Parte I. Como c ompatibil izar o c usto d e manter umsistema robusto c om a perd a d e efic iênc ia ec onômic a que o bac kupimpl ic a? No nível pessoal , c usta d inheiro e tempo c omprar sof tware ehard ware para c riar e armazenar bac kups regul ares d os d ad os emseu c omputad or ou num d isc o r ígid o externo. Essas operaç ões também

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l evam tempo. Mas, se voc ê é o autor d e um l ivro c omo este , pagará d ebom grad o a quantia nec essária em troc a d a tranquil id ad e d e saberque um ano d e trabal ho não se perd erá por apertar uma tec l a errad aou oc orrer um pic o d e l uz .

Cl aro que ad aptaç ão, resi l iênc ia e red und ânc ia são apenasprinc ípios gerais, d iretr izes se voc ê preferir, não um pl ano d etal had opara se prevenir ou c ombater a sobrec arga d e c ompl exid ad esubjac ente a eventos extremos. Os princ ípios prec isam serinterpretad os d entro d e um d ad o c ontexto, quanto ao seu sentid oreal nesse c ontexto e a c omo esse sentid o pod e ser trad uzid o em aç õesque apl ic am o princ ípio d entro d o d ad o ambiente. E isso se apl ic aquer o ambiente seja sua vid a pessoal ou a vid a d e um país inteiro,ou mesmo d o mund o. A sobrec arga d e c ompl exid ad e não é inevitável .Mas é end êmic a. Como ac ontec e c om o preç o d a l iberd ad e, a eternavigil ânc ia também é o preç o para evitar os eventos extremos.

Minha pal avra final , então, é ac eitar que eventos X vão oc orrer.É uma real id ad e d a vid a. Portanto, prepare-se para e l es c omo voc ê seprepararia para qual quer outro ac ontec imento rad ic al , masessenc ial mente imprevisível . Isso signific a permanec er ad aptável eaberto a novas possibil id ad es, c r iar uma vid a c om muitos graus d el iberd ad e, ed uc and o-se para ser o mais autossufic iente possível e nãod eixar a esperanç a ser substituíd a pel o med o e pel o d esespero. Ahumanid ad e sobreviveu a eventos extremos bem piores que os quel istamos neste l ivro e vol tará a sobreviver. Pogo, personagem d oc artunista Wal t Kel l y , d ec l arou: “ Enc ontramos o inimigo, e somosnós.” Quanto mais pud ermos fazer para mud ar essa afirmaç ão, maisc apazes seremos d e enfrentar o que vier pel a frente .

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NOTAS E REFERÊNCIAS

Preâmbulo: Qual é o X da questão

Alguns livros esclarecedores sobre eventos extremos e os problemas sociais concomitantes, emdiversos níveis de sofisticação acadêmica e detalhes:

Warsh, D. The Idea of Economic Complexity (Nova York: Viking, 1984).Posner, R. Catastrophe: Risk and Response (Nova York: Oxford University Press, 2004).Clarke, L. Worst Cases: Terror and Catastrophe in the Popular Imagination (Chicago:

University of Chicago Press, 2006).Rees, M. Hora final (São Paulo: Companhia das Letras, 2005).Leslie, J . The End of the World (Londres: Routledge, 1996).Homer-Dixon, T. The Upside of Down (Washington, D.C.: Island Press, 2006).

Essa coleção é uma ótima introdução ao tema deste livro. O livro de Warsh é um desses raros

livros que, em minha opinião, serão vistos no futuro como os precursores de uma formatotalmente nova de enxergar os processos econômicos em particular e os processos sociais emgeral. Richard Posner, juiz de Chicago, apresenta uma longa lista de catástrofes com umjeito tranquilo, fundamentado, conciso, quase trivial. O livro de Lee Clarke trata tanto dosaspectos psicológicos das possíveis vítimas de ataques terroristas e calamidades naturaisquanto dos acontecimentos em si . É um bom contraponto à abordagem imparcial e analíticade Posner. Martin Rees é um dos mais i lustres cientistas britânicos, ex-presidente da RoyalSociety e astrônomo real. Seu livro, escrito para leigos, mostra de forma muito natural comoa natureza nos derruba. Filósofo de formação, Leslie traz essa visão para a pergunta: Ahumanidade está ameaçada de extinção? Provavelmente sim, conclui. Sua abordagem éabrangente do ponto de vista acadêmico e fácil de ler – uma combinação rara. Embora tratedo lado um pouco mais sombrio da questão, o livro de Homer-Dixon oferece uma luz no fimdo túnel. Ele nos mostra como fazer com que nossa sociedade seja suficientemente resi lientepara sobreviver no próximo século.

Se você estiver interessado em saber mais a respeito de Bryan Berg e seu enorme castelo decartas, visite: http:/ /newslite.tv/2010/03/11/man-builds-the-worlds-largest.html.

Para os detalhes da simulação de beisebol mostrando que a sequência de rebatidas de JoeDiMaggio não foi tão especial assim, ver Arbesman, S. e S. Strogatz. “A Journey toBaseball’s Alternate Universe.” The New York Times, 30 de março de 2008.

A fórmula analítica mencionada no texto para caracterizar quão extremo é um evento é X =MI(1 - TD/(TD + TI)), em que MI é a magnitude de impacto medida em unidadesfracionais, como dólares de estrago versus PIB total ou vidas perdidas versus total de mortesanuais, para que MI seja um número entre 0 e 1. Se você não se importar com essanormalização, pode utilizar o número absoluto de mortes ou de dólares. De qualquermaneira, o resultado final dará uma ideia do grau de extremismo relativo ao evento, mesmonão sendo um número entre 0 e 1. TD é o tempo de desdobramento, e TI é seu tempo de

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impacto. O valor final de X será, portanto, um número entre 0 e 1. Quanto maior esse valor,maior o “grau de extremismo”. Só para esclarecer, não utilizo essa fórmula para medir amagnitude. Ela é simplesmente uma diretriz para sua classificação.

Um post interessante sobre o problema de colapso de complexidade e sociedade moderna,escrito pelo ex-agente do Departamento de Inteligência das Forças Armadas americanasJames Wesley Rawles:http:/ /www.survivalblog.com/2010/06/is_modern_society_doomed_to_co.html. Ele publicourecentemente o romance Survivors, descrevendo como poderá ser a sociedade quando todas asinfraestruturas das quais dependemos no dia a dia desaparecerem de uma hora para outra.

A versão original da lei da complexidade necessária foi concebida, em 1956, pelo especialistaem cibernética W. Ross Ashby, que a denominou lei da variedade necessária. Talvez essenome seja melhor, pois dá a ideia que enfatizei neste livro da complexidade atrelada àdiversidade de ações (os graus de liberdade) de que um sistema dispõe para solucionarqualquer problema que surja. O trabalho de Ashby sobre o assunto encontra-se em seu livro,pioneiro no assunto, An Introduction to Cybernetics (Londres: Chapman and Hall, 1956).

Um relato recente sobre a ideia básica no contexto do mundo do comércio, escrito pelo consultorinternacional de negócios Alexander Athanassoulas, aparece em: Athanassoulas, A. “e Lawof Requisite Variety.” Business Partners, janeiro–fevereiro de 2011, 16.

Parte I: Por que o normal já não é mais tão “normal”

Um bom resumo da obra de Ambrose na definição do estrangulamento evolutivo criado pelovulcão Toba está disponível no site: www.bradshawfoundation.com/stanley_ambrose.php. Osdetalhes completos estão em: Ambrose, S. “Late Pleistocene Human Population Bottlenecks,Volcanic Winter, and Differentiation of Modern Humans”. Journal of Human Evolution, 34(1998), 623–651.

O conceito do que chamo de “sobrecarga de complexidade” já existe há alguns anos. Aqui vaiuma amostra eclética de algumas ideias que têm circulado na internet explorando esseconceito, numa tentativa de entender as crises financeiras, a internet, a Primavera Árabe ea simples vida cotidiana:

Helgesen, V. “e Butterfly and the Arab Spring”. Editorial em International IDEA(www.idea.int/news/butterfly-arab-spring.html).

Barratt, P. “Systemic Complexity, the Internet, and Foreign Policy”(http:/ /belshaw.blogspot.com/2010/12/).

Nickerson, N. “On Markets and Complexity”. Technology Review, 2 de abril de 2011(www.techologyreview.com).

Danielsson, J . “Complexity Kills” (www.voxeu.org).Norman, D. “e Complexity of Everyday Life”

(www.jnd.org/dn.mss/ the_complexity_of_everyday_life.html).

A crise causada pela ectromelia infecciosa aparece em “e Mousepox Experience”. EMBOReports (2010) 11, 18–24. (Publicação on-line: 11 de dezembro de 2009.)

A declaração do general Carl Strock citada no texto foi extraída da entrevista com MargaretWarner na PBS: http:/ /www.pbs.org/newshour/bb/weather/ july-dec05/strock_9-2.html.

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10 O best-seller de Nassim Taleb que chamou a atenção do público em geral para asdistribuições de cauda pesada é: Taleb, N. A lógica do cisne negro (Rio de Janeiro: EditoraBest Seller, 2008).

11 A declaração de Ray Ozzie sobre o efeito sufocante da complexidade foi citada no seguinteartigo: Lohr, S. and J . Markoff. “Windows Is So Slow, but Why?” The New York Times, 27 demarço de 2006.

12 A descrição popular de colapso social apresentada por Jared Diamond no livro citado aseguir é a versão que chamou a atenção nos últimos anos. Mas a obra de Joseph Tainter ,publicada antes, alegrará o coração de todo cientista da complexidade. Ambos são leiturasfantásticas:

Diamond, J . Colapso (Rio de Janeiro: Record, 2005).Tainter, J . e Collapse of Complex Societies (Cambridge: Cambridge University Press,

1988).

Uma estimulante descrição dos argumentos apresentados nesses dois livros pode ser encontrada noartigo: MacKenzie, D. “Are We Doomed?” New Scientist, 5 de abril de 2008, 33–35.

13 Nas duas décadas mais ou menos desde que o Instituto Santa Fé popularizou a ideia decomplexidade e sistemas complexos, muitos de seus alunos e de outras instituiçõespublicaram livros sobre esse paradigma de desenvolvimento (incluindo este que vos fala). Eisalguns exemplos para o leitor interessado em ter uma ideia do assunto:

Casti , J . Complexification (Nova York: HarperCollins, 1994).Cowan, G., Pines, D., and Meltzer, D. (eds.). Complexity: Metaphors, Models, and Reality

(Reading, MA: Addison-Wesley, 1994).Miller, J . and Page, S. Complex Adaptive Systems (Princeton, NJ: Princeton University

Press, 2007).Mitchell, M. Complexity: A Guided Tour (Nova York: Oxford University Press, 2011).

Parte II: Os casos

Para este segmento, utilizei material de um artigo escrito por mim como parte de um estudo daOrganização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre choques globais,em especial nos capítulos relacionados a internet, pandemias e deflação, que não chegou aser publicado. O artigo completo pode ser encontrado em:

Casti , J ., “Four Faces of Tomorrow”, Projeto internacional OCDE sobre futuros choquesglobais, OCDE, Paris, Janeiro de 2011 (www.oecd.org/dataoecd/57/ 60/46890038.pdf).

14 As ideias de Hempsell que apresentam as categorias descritas aqui estão em Hempsell, C. M.

“e Potential for Space Intervention in Global Catastrophes”. Journal of the BritishInterplanetary Society, 57 (2004), 14–21.

Um artigo relacionado que foca em eventos ligados à extinção é Bostrum, N. “Existential Risks”.Journal of Evolution and Technology, 9 (março de 2002).

Apagão digital: uma interrupção generalizada e duradoura da internet

Page 298: O Colapso de Tudo - VisionvoxEsse argumento é o fio condutor deste livro. O colapso de tudo é um livro de conceitos e ideias. Para que estas páginas fossem tão acessíveis quanto

Ao contrário de alguns outros tópicos tratados na Parte II, a quantidade de informaçõesdisponíveis sobre segurança na internet realmente é de confundir qualquer um. Além disso,no momento, a questão está passando por uma grande reavaliação. Seria, portanto, inútilapresentar uma longa lista de citações aqui, uma vez que a maioria delas cairia em desusomuito antes da publicação deste livro. Resolvi, então, listar apenas algumas indicações bemgerais, assim como artigos específicos que formam o pano de fundo das principais históriasapresentadas no capítulo. Para informações mais atualizadas, sugiro que o leitor busque nainternet termos como “segurança cibernética” ou “guerra cibernética”.

Dois trabalhos recentes muito interessantes e esclarecedores sobre internet e seu futuro são oslivros:

Zittrain, J . The Future of the Internet (New Haven, CT: Yale University Press, 2008).Morozov, E. The Net Delusion (Cambridge, MA: Public Affairs, 2011).

O primeiro é um relato bem equilibrado dos prós e contras da internet atual, destacando o fato

de que os crackers estão obtendo vantagem, com spywares, vírus e outros tipos de malwarecomeçando a desfazer os benefícios de comunicação e disponibilidade de informações. Oautor, então, apresenta um programa para preservar o lado bom e acabar com o lado ruim.Em seu livro, Morozov defende a tese muito mais radical de que toda a ideia de “liberdadena internet” é pura ilusão. A tecnologia não tornou o mundo um lugar mais democrático. Naverdade, fez com que regimes autoritários exercessem sobre seus cidadãos ainda maiscontrole do que antes. Morozov afirma que, na realidade, estamos todos sendo pacificadospela internet, em vez de utilizá-la como bem queremos. No cômputo geral, o livro defendeuma tese bastante polêmica, que todo usuário deveria conhecer.

15 A história da descoberta de Dan Kaminsky do defeito no sistema DNS é contada em: Davis,J . “Secret Geek A-Team Hacks Back, Defends Worldwide Web”. Wired,16, no. 12 (24 denovembro de 2008).

Como exemplo da grande quantidade de bibliografia sobre uma possível pane na internet, oseguinte artigo é bem representativo (e observe que ele foi escrito em 1997!): Garfinkel, S.“50 Ways to Crash the Internet”. Wired, 19 de agosto de 1997.

Eu poderia enumerar mais uma dezena de artigos, todos contando mais ou menos a mesmahistória, mas o artigo acima é o mais divertido, e pouquíssimos dos cinquenta métodosdiscutidos foram efetivamente neutralizados, mesmo hoje, mais de quinze anos após suapublicação.

16 O problema da escalabilidade de roteadores é abordado nos seguintes sites:http:/ /www.potaroo.net/ ispcol/2009-03/bgp2008.html.http:/ /blog.caida.org/best_available_data/2008/05/10/top-ten-things-lawyers-should-know-

about-internet-research-8/ .

17 A história da técnica de Schuchard para derrubar a internet via botnets está documentadaem: Aron, J . “e Cyberweapon at Could Take Down the Internet”(http:/ /www.newscientist.com/article/dn20113-the-cyberweapon-that-couldtake-down-the-internet.html).

18 O worm Stuxnet foi descoberto em 2010 pelo alemão Ralph Langner, especialista emsegurança de computadores. Seu profundo estudo a respeito das peculiaridades desse worm,

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juntamente com o fato de que o Stuxnet parecia visar, sobretudo, as unidades nuclearesiranianas, o levou à ousada afirmação de que o Stuxnet é, na verdade, um software maligno,criado por membros do serviço de inteligência americano, que acabou fugindo ao controle deseus criadores. Para ler essa história, ver: Gjelten, T. “Security Expert: U.S. ‘Leading Force’Behind Stuxnet”. PBS, 26 de setembro de 2011(http:/ /www.npr.org/2011/09/26/140789306/security-expert-us-leading-force-behind-stuxnet).

19 Um excelente panorama de todo o problema DOS encontra-se em: Mirkovic, J . et al.“Understanding Denial of Service.” InformIT, 12 de agosto de 2005(http:/ /www.informit.com/articles/article.aspx?p=386163).

20 Infelizmente, não tenho como dar mais informações a respeito do artigo de Noam Eppel sobreataques desenfreados à segurança na internet, uma vez que, conforme mencionado no texto, osite onde se encontrava o artigo saiu do ar, e o artigo parece ter se evaporado.

Finalmente, o leitor pode querer conhecer a visão de Dave Pollard sobre como a vida será após aspanes da internet. Não coloquei no texto, mas é interessante. Está em:

Pollard, D. “What Are You Going to Do When the Internet’s Gone?”(www.howtosavetheworld.ca/2010/05/04/what-are-you-going-to-do-when-the-Internets-gone).

Quando vamos comer? O esgotamento do sistema global de abastecimento de alimentos

21 Um relato acessível sobre a doença das árvores no Reino Unido pode ser encontrado noseguinte artigo: Middleton, C. “Red Alert in Britain’s Forests as Black Death Sweeps In”.Daily Telegraph, 3 de fevereiro de 2011.

Mais informações a respeito podem ser encontradas no site da UK Forestry Commission,www.forestry.gov.uk/pramorum.

22 O romance esclarecedor de John Christopher sobre os efeitos sociais do vírus Chung-Li, quedestrói plantações de comida no mundo inteiro, foi publicado originalmente em 1956. Umaedição recente: Christopher, J . The Death of Grass (Londres: Penguin, 2009).

23 A câmara subterrânea foi bastante noticiada na imprensa na época de sua inauguração, em2008. Ver, por exemplo: Mellgren, D. “‘Doomsday’ Seed Vault Opens in Arctic”, texto daAssociated Press, 2008 (www.seedvault.no).

24 A morte das abelhas é uma história contada no livro: Jacobsen, R. Fruitless Fall (Nova York:Bloomsbury, 2008).

Dois dos diversos relatos sobre os dois lados da história da destruição das abelhas de mel estãoretratados em:

Aizen, M. e Harder, L. “e Truth About the Disappearing Honeybees”. New Scientist, 26de outubro de 2009.

Armstrong, D. “Bee Killing Disease May Be Combination Attack”. Bloomberg News, 7 deoutubro de 2010.

25 A história da odisseia da Sra. Galviso para encontrar o arroz de jasmim para sua família

está em:

Page 300: O Colapso de Tudo - VisionvoxEsse argumento é o fio condutor deste livro. O colapso de tudo é um livro de conceitos e ideias. Para que estas páginas fossem tão acessíveis quanto

http:/ /www.businessweek.com/bwdaily/dnflash/content/apr2008/db20080424_496359.html.O grande aumento do preço dos alimentos no mundo inteiro foi comentado em diversos artigos e

livros. Alguns dos mais acessíveis aos leitores em geral são:

Brown, L. “The Great Food Crisis of 2011”. Foreign Policy, 10 de janeiro de 2011.Sircus, M. “Food/Financial Crisis of 2011” (http:/ /agriculture.imva.info/ food-

prices/ foodfinancial-crisis-of-2011).Wallop, H. “Global Food Prices Hit New Record High”. CommonDreams.org, 3 de fevereiro

de 2011 (www.commondreams.org/headline/2011/02/03-1).Sen, A. “e Rich Get Hungrier”. e New York Times, 28 de maio de 2008

(http:/ /www.nytimes.com/2008/05/28/opinion/28sen.html).

26 As ligações diretas entre o aumento do preço dos alimentos e agitações sociais e políticas éoutro tema bastante noticiado nos últimos anos. Duas das muitas fontes que contribuírampara a discussão no texto são:

Karon, T. “How Hunger Could Topple Regimes”. Time, 2008(www.time.com/time/world/article/0,8599,1730107,00.html).

Chang, G. “Global Food Wars”. New Asia, 21 de fevereiro de 2011(blogs.forbes.com/gordonchang/2011/02/21/global-food-wars.html).

27 Um panorama bastante esclarecedor sobre o efeito que o aquecimento global está exercendo

(e continuará a exercer) na produção de alimentos está disponível em: Gillis, J . “A WarmingPlanet Struggles to Feed Itself ”. e New York Times , 4 de junho de 2011(www.nytimes.com/2011/06/05/science/earth/05harvest.html)

O dia em que os eletrônicos pararam: um pulso eletromagnético continental destrói todos osaparelhos eletrônicos

Provavelmente a fonte de informações mais completas sobre o PEM como ameaça à sociedade é:Report of the Commission to Assess the reat to the United States from ElectromagneticPulse (EMP) Attack, Volume 1. Executive Report (Washington, D.C.: US GovernmentPrinting Office, 2004) (disponível na amazon.com).

Outra boa fonte é o livro: Gaffney, F. War Footing: 10 Steps America Must Take to Prevail in theWar for the Free World (Annapolis, MD: US Naval Institute Press, 2005).

Embora pareça não haver muitos livros (de não ficção) sobre PEM, há uma grande quantidade deartigos em revistas profissionais e acadêmicas, assim como posts na internet, sobre essaameaça. Aqui vai uma pequena lista que me pareceu útil na hora de escrever esse capítulo:

Kopp, C. “e Electromagnetic Bomb: A Weapon of Electrical Mass Destruction”. Information Warfare — Cyberterrorism: Protecting Your Personal Security in theElectronic Age, ed. W. Schwartau (Nova York: Thunder Mouth Press, 1996).

Spencer, J . “e Electromagnetic Pulse Commission Warns of an Old reat with a NewFace”. Backgrounder #1784, e Heritage Foundation ,Washington, DC, 3 de agosto de2004.

“Electromagnetic Pulse Risks and Terrorism”. United States Action Group(http:/ /www.unitedstatesaction.com/emp-terror.htm).

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Dunn, J . R. “e EMP reat: Electromagnetic Pulse Warfare”. 21 de abril de 2006(http:/ /www.americanthinker.com/2006/04/the_emp_threat_electromagnetic.html).

28 A história de como os Estados Unidos e a URSS pensavam em um ataque de PEM como salva

de abertura de um conflito nuclear durante a Guerra Fria é contada em: Burnham, D. “U.S.Fears One Bomb Could Cripple the Nation”. e New York Times, 28 de junho de 1983, p.1.

29 Como sempre, a literatura de ficção científica está bem à frente da realidade. Há diversoslivros bem interessantes e assustadores disponíveis sobre a vida após um ataque de PEM. Umlançamento recente nessa área é: Forstchen, W. One Second After (Nova York: TOR Books,2009).

30 A s citações do comandante militar chinês e do analista de defesa iraniano N. Nezami estãono livro escrito pelo analista de defesa americano Frank J. Gaffney: Gaffney, F. War Footing(Annapolis, MD: Naval Institute Press, 2005).

Uma nova desordem mundial: o colapso da globalizaçãoO fenômeno da globalização foi tão noticiado que sempre haverá um livro respaldando qualquer

posição sobre o tema. Assim, vou enumerar apenas algumas publicações que consultei empreparação para a discussão encontrada no texto:

James, H. e Creation and Destruction of Wealth (Cambridge, MA: Harvard UniversityPress, 2009).

Dumas, C. Globalisation Fractures (Londres: Profile Books, 2010).Walljasper, J . “Is is the End of Globalization?” Ode, julho de 2004

(www.odemagazine.com).

31 Finalmente, eis a citação à análise de Saul sobre o colapso de todo o processo: Saul, J . R.The Collapse of Globalism (Victoria, Austrália: Penguin, 2005).

32 A história do futuro da Rússia sob o comando de Vladimir Putin é caracterizada de formamuito parecida à descrita aqui nos seguintes artigos, que, por coincidência, forampublicados no mesmo dia, pelo mesmo jornal:

Freeland, C. “Failure Seen in Putin’s Latest Move”. The New York Times, 29 de setembro de2011.

Charap, S. “In Russia, Turning Back the Clock”. e New York Times, 29 de setembro de2011.

33 A história da Sra. Volkova e o triste destino dos liberais russos é contada em: Barry, E. “For

Russia’s Liberals, Flickers of Hope Vanish”. The New York Times, 25 de setembro de 2011.34 A história do colapso da União Europeia como resultado do desânimo social coletivo na

Europa está em: Casti , J . Mood Matters: From Rising Skirt Lengths to the Collapse of WorldPowers (Nova York: Copernicus, 2010).

35 As situações descritas no texto em relação a um colapso do euro encontram-se no seguinteartigo: Phillips, J . and P. Spina. “What Will Happen to Currencies If the Euro Collapses?”Gold Forecaster Bulletin, 30 de abril de 2010.

36 O Projeto Proteus é descrito de forma simples no livro: Loescher, M. S., Schroeder, C. e

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omas, C. W., organizado por Krause, P. Proteus: Insights from 2020 (Washington, D.C.:Copernicus Institute Press, 2000).

37 Os cenários da Global Business Network em relação ao fim dos Estados Unidos são fornecidosem: Levin, J . “How Is America Going to End?” Slate, 3 de agosto de 2009(www.slate.com/id/2223962/).

38 O polêmico aval de Niall Ferguson em relação à teoria dos sistemas complexos com base emanálises históricas está em: Ferguson, N. “Empires on the Edge of Chaos.” Foreign Affairs,março/abril de 2010 (www.informationclearinghouse.info/article24874.htm).

39 A notícia da Bloomberg sobre casamatas para oligarcas é: Pronina, L. “Apocalypse AngstAdds to Terrorist Threat as Rich Russians Acquire Bunkers.” Bloomberg News, 12 de maio de2011.

40 A lista da revista Fortune de “novas situações normais” está disponível na íntegra em: Tseng,N.-H. “Five ‘New Normals’ at Really Will Stick”. Money Magazine, 23 de agosto de 2010(http:/ /money.cnn.com/2010/08/20/news/economy/New_normal_economy.fortune/index.htm).

Física mortífera: destruição da Terra pela criação de partículas exóticasUma leitura imperdível sobre a possibilidade de desastres com aceleradores destruindo o mundo é

fornecida pelo físico Frank Wilczek, ganhador do Prêmio Nobel, em: Wilczek, F. “BigTroubles, Imagined and Real”. Em Global Catastrophic Risks, orgs. N. Bostrum e M.Cirkovic (Oxford: Oxford University Press, 2008), pp. 346–362.

Duas outras discussões estimulantes em torno do mesmo tema são dadas dentro do contexto de umconjunto maior de acontecimentos extremos nos volumes:

Rees, M. Our Final Century (Londres: Arrow Books, 2003).Posner, R. Catastrophe: Risk and Response (Oxford: Oxford University Press, 2004).

Uma discussão mais detalhada e acadêmica da história da física experimental ameaçando o

mundo e de formas de avaliar o risco desses acontecimentos é o artigo: Kent, A. “A CriticalLook at Risk Assessments for Global Catastrophes”. Risk Analysis, 24, no 1 (2004), pp. 157–168.

41 Um relato fascinante da origem das ideias de Higgs e dos enormes obstáculos científicos epolíticos que tiveram de ser superados para a construção do Grande Colisor de Hádrons embusca da “partícula de Deus” é encontrado no livro: Sample, I. Massive: e Hunt for theGod Particle (Londres: Virgin Books, 2011).

42 Um relato jornalístico interessante dos supostos strangelets que passaram pela Terra em1993 é encontrado no artigo: Matthews, R. “Earth Punctuated by Tiny Cosmic Missiles”.London Daily Telegraph, 5 de novembro de 2002.

43 Um estudo sociológico fascinante do choque entre ciência e interesse público no tocante aoalvoroço sobre o RHIC de Brookhaven se encontra no artigo: Crease, R. “Case of the DeadlyStrangelets”. Physics World, julho de 2000, pp. 19–20.

44 Uma história curta, mas completa, do desenvolvimento do Grande Colisor de Hádrons (LHC)se encontra no artigo da BBC: “Building the ‘Big Bang’ Machine”, BBC News, 9 de abril de2008 (http:/ /news.bbc.co.uk/go/pr/ fr/1/hi/ sci/ tech/7595855.stm).

É interessante ver o que os maiores físicos do mundo acham que advirá do LHC. Pouco antes quea máquina fosse oficialmente ligada, a revista Newsweek fez tal pesquisa, perguntando a

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pessoas como Stephen Hawking, Brian Greene e Steven Weinberg, entre outras, o queimaginavam que seria descoberto. Suas respostas se encontram em: “Forecasting the Fate ofMysteries”, Newsweek, 6 de setembro de 2008.

A grande explosão: a desestabilização do panorama nuclear45 Da década de 1950 até o final da década de 1960, a RAND Corporation era um ambiente

muito estimulante do ponto de vista intelectual. Além de pessoas como Herman Kahnpensando nas questões nucleares discutidas aqui, havia matemáticos desenvolvendo novasferramentas, como a teoria dos jogos, programação linear e dinâmica e análise de fluxo derede para solucionar os problemas de otimização decorrentes dessas próprias questõesmilitares práticas. Além disso, economistas e outros cientistas trabalhavam no que ficouconhecido como “análise de custo-benefício”, método de Delfos para prever o futuro e umasérie de outros assuntos inéditos na época, que agora todo mundo conhece. Um relatointeressante dessa época pode ser encontrado em: Smith, Bruce R. e RAND Corporation:Case Study of a Nonprofit Advisory Corporation (Cambridge, MA: Harvard University Press,1966).

O polêmico livro de Herman Kahn sobre uma guerra nuclear é: Kahn, H. On ermonuclear War(Princeton, NJ: Princeton University Press, 1960).

Uma biografia interessante e divertida sobre o trabalho de Kahn, incluindo a história completade seu último status de guru da futurologia, é: Ghamari-Tabrizi, S. e Worlds of HermanKahn (Cambridge, MA: Harvard University Press, 2005).

46 Um bom lugar para saber mais a respeito dos princípios básicos por trás da estratégia MADde dissuasão nuclear é o seguinte livro do ganhador do Prêmio Nobel omas C. Schelling:Schelling, T. Strategy of Conflict (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1960).

47 Além do artigo de Birks e Crutzen da Ambio citado no texto, o que desencadeou o acaloradodebate sobre inverno nuclear foi o livro: Ehrlich, P. et al. e Cold and the Dark: eWorld After Nuclear War (Nova York: Norton, 1984).

Outro livro da mesma época que vale a pena consultar é: Greene, O., Percival, I., and Ridge, I.Nuclear Winter (Cambridge, Reino Unido: Polity Press, 1985).

O artigo TTAPS de Carl Sagan e seus colegas, que estabeleceu a base científica do invernonuclear, é: Turco, R. et al. “Global Atmospheric Consequences of Nuclear War.” Science, 222(1983), 1283ff.

Muitas outras discussões sobre o fenômeno do inverno nuclear, novos cenários e previsões estãodisponíveis na internet. Basta fazer uma pesquisa. Não listei tudo aqui porque a conclusãogeral é a mesma do trabalho original realizado na década de 1980.

48 Mais detalhes sobre um hipotético ataque terrorista à cidade de Nova York podem serencontrados no site www.atomicarchive.com, enquanto o site www.carolmoore.net é umafonte valiosíssima de material sobre diversos cenários nucleares, inclusive o cenário Israel-Irã descrito aqui.

Para mais detalhes a respeito dos paradoxos da segurança nuclear, o seguinte livro épraticamente imbatível: Leslie, J . The End of the World (Londres: Routledge, 1996).

Esgotamento: o fim do suprimento global de petróleoExistem quase tantos livros, artigos, vídeos e outros tipos de material sobre o problema do pico do

petróleo e o iminente “fim do petróleo” quanto pessoas com uma opinião a respeito do

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assunto. Assim, a lista de fontes a seguir é apenas a pequena ponta de um gigantesco iceberg,mas é uma ponta que me pareceu útil para a compilação das histórias aqui apresentadas, ecada item contém diversas referências extras para o leitor interessado em se aprofundar naquestão.

Uma exposição excelente, embora um tanto exagerada, do que podemos esperar em relação ao fimdo petróleo é o livro: Kunstler, J . e Long Emergency (Nova York: Atlantic Monthly Press,2005). Esse livro baseado em pesquisas parte da questão do pico do petróleo para detalharos inúmeros colapsos de infraestruturas e mudanças no esti lo de vida que podem decorrerdessa crise. Recomendo-o veementemente para todo mundo que quiser um livro definitivosobre o fim da era do petróleo e como a humanidade sobreviverá a isso.

Aqui vão outras obras que exploram o mesmo assunto:

Goodstein, D. Out of Gas (Nova York: Norton, 2004).Middleton, P. The End of Oil (Londres: Constable and Robinson, 2007).Strahan, D. The Last Oil Shock (Londres: John Murray, 2007).

Um panorama geral do fim não só do petróleo mas de diversas outras commodities é fornecido em:

Heinberg, R. Peak Everything (Forest Row, Reino Unido: Clairview Books, 2007).Uma visão muito boa em relação a todo o contexto do pico do petróleo em formato de perguntas e

respostas é: “Life After the Oil Crash”, www.salagram.net/oil-in-crisis.htm.O seguinte livro conta a história da famosa previsão de Hubbert em 1956 sobre o momento do

pico do petróleo americano, além de abordar a situação global atual: Deffeyes, K. Hubbert’sPeak (Princeton, NJ: Princeton University Press, 2001).

É de doer: uma pandemia globalA peste foi um dos romances mais influentes de Camus e quase certamente contribuiu muito para

seu Prêmio Nobel de literatura, em 1957. Foi reeditado tantas vezes que não me darei otrabalho de listar o livro aqui. Mas dois relatos ficcionais mais recentes do que poderiaacontecer se patógenos desconhecidos ficarem à solta valem uma leitura. São eles:

Preston, R. O evento Cobra (Rio de Janeiro: Rocco, 2002).Ouellette, P. The Third Pandemic (Nova York: Pocket Books, 1997).

A internet está cheia de relatos de pandemias e pestes. Um que achei extremamente útil é de um

curso da Universidade de Hartford: History of Epidemics and Plagues(http:/ /uhavax.hartford.edu/bugl/histepi.htm).

Um “quadro geral” excepcional sobre epidemias está disponível no site do Wellcome Trust noReino Unido: www.wellcome.ac.uk/bigpicture/epidemics. Materiais desse documento serviramde base para diversas das histórias narradas nesse capítulo.

49 Nathan Wolfe e seus colegas argumentaram que as grandes doenças dos humanos produtoresde alimentos são de origem relativamente recente, tendo se originado somente nos últimos 11mil anos. Seu argumento é apresentado em: Wolfe, N., Dunavan, C. e Diamond, J . “Originsof Major Human Infectious Diseases”. Nature, 447 (17 de maio de 2007), pp. 279–283.

50 A história da febre Ebola é contada no best-seller: Preston, R. Zona quente (Rio de Janeiro:Rocco).

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51 Um relato completo das três leis das epidemias de Gladwell se encontra em seu livro popularagradabilíssimo: Gladwell, M. O ponto da virada (Rio de Janeiro: Sextante, 2009).

52 A triste história de Mary Tifoide está disponível em dezenas de sites. O verbete daWikipedia sob “Mary Mallon” é um bom ponto de partida.

53 Uma discussão detalhada da ameaça representada pela gripe aviária é fornecida por MikeDavis em seu livro: Davis, M. O monstro bate à nossa porta (Rio de Janeiro: Record, 2006).

54 O trabalho descrito no texto usando o World of Warcraft como mundo virtual para estudar apropagação de epidemias foi publicado como: Lofgren, E. e N. Fefferman. “e UntappedPotential of Virtual Game Worlds to Shed Light on Real World Epidemics”. e Lancet.Infectious Diseases, 7, no 9 (setembro de 2007), pp. 625–629.

Outro mundo da internet que vem sendo usado para o mesmo tipo de trabalho é o jogo “Where’sGeorge?”, em que os jogadores rastreiam o movimento de notas de dólar ao percorrerem omundo. Um relato desse trabalho é fornecido no Science Blog: “Web Game ProvidesBreakthrough in Predicting Spread of Epidemics”, www.scienceblog.com/cms.

No escuro e com sede: falta de energia elétrica e de água potávelDentre os vários volumes populares e semipopulares sobre a rede elétrica, dois que achei

especialmente esclarecedores e úteis são:

Makansi, J . Lights Out (Nova York: Wiley, 2007).Schewe, P. The Grid (Washington, D.C.: Joseph Henry Press, 2007).

Os dois livros fornecem um relato vívido da história do desenvolvimento da rede elétrica, o maior

investimento industrial da história, e possivelmente o maior feito de engenharia também.Ambos descrevem não apenas a história fascinante da rede, mas também suas muitasvulnerabilidades e as consequências para a vida diária de ignorá-las.

Uma boa discussão de como a rede elétrica precisa ser mudada para atender às necessidades dasociedade nas próximas décadas é fornecida em: Gellings, C. e Yeager, K. “ Transforming theElectric Infrastructure”. Physics Today, 57 (dezembro de 2004), p. 45.

Existem numerosos relatos detalhados na internet dos diferentes blecautes mencionados no texto,de modo que não os citarei aqui. Mas, por estar ainda acontecendo e ameaçar a economia deum país inteiro, vale a pena citar algumas referências à situação na África do Sul:Mnyanda, L. e eunissen, G. “Rand Sinks as South African Electricity Grid Fails”.Bloomberg.com, 11 de fevereiro de 2008.

O leitor também deve consultar os artigos no International Herald Tribune publicados em 30–31de janeiro de 2008.

Duas referências bem úteis à crise da escassez de água são os volumes: Pearce, F. When the RiversRun Dry (Londres: Eden Project Books, 2006); e Clarke, R. e King, J . e Atlas of Water(Londres: Earthscan Books, 2004).

Uma questão importante é ver a escassez de água iminente de forma racional, de modo a supriras necessidades futuras de água potável. Essa questão é abordada sem rodeios no artigo:Smil, V. “Water News: Bad, Good and Virtual”. American Scientist setembro-outubro de2008, pp. 399–407.

Para um conjunto de gráficos esclarecedores exibindo a situação da escassez de água, ver apostagem “Drought” (www.solcomehouse.com/drought.htm).

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55 A história da falta de água no Reino Unido causada, paradoxalmente, pela enorme enchentede 2007 é narrada em: Elliott, V. “Looting, Panic Buying — and a Water Shortage”. TimesOnline, 23 de julho de 2007 (http:/ /www.timesonline.co.uk/tol/news/uk/article2120922.ece).

56 O professor Tony Allan recebeu o Stockholm Water Prize em 2008, um prestigioso prêmio daStockholm Water Foundation, por atividades e pesquisas excepcionais ligadas à água. Umaexplicação do conceito de água virtual é dada no anúncio desse prêmio pelo StockholmInternational Water Institute em www.siwi.org/sa/node.asp? node=25.

Tecnologia fora de controle: robôs inteligentes sobrepujam a humanidade57 Para a citação de Gordon Moore que abre o capítulo, ver o verbete da Wikipedia sob

“Moore’s Law”: http:/ /en.wikipedia.org/wiki/Moore%27s_law.58 A obra definitiva delineando todos os aspectos do problema da singularidade é o volume:

Kurzweil, R. The Singularity Is Near (Nova York: Penguin, 2005).Um livro ligeiramente anterior do escritor de ficção científica Damien Broderick, que chama a

singularidade de “Spike” (“Ferrão”), explorando o mesmo território mas com umaperspectiva mais social, é: Broderick, D. The Spike (Nova York: TOR Books, 2001).

O ponto de partida de toda a ideia de singularidade tecnológica é o seguinte artigo de 1993 domatemático e escritor de ficção científica Vernor Vinge: Vinge, V. “e ComingTechnological Singularity: How to Survive in the Post-Human Era”. Artigo apresentado noVISION-21 Symposium, NASA Lewis Research Center, 30–31 de março de 1993. (Vertambém uma versão revisada do artigo na edição do inverno de 1993 de Whole EarthReview.)

59 O guru do movimento da nanotecnologia é o físico K. Eric Drexler, que apresentou sua visãodo futuro nas seguintes obras:

Drexler, K. E. Engines of Creation: e Coming Era of Nanotechnology (Nova York:Doubleday, 1986).

Drexler, K. E. Nanosystems: Molecular Machinery, Manufacturing and Computation (NovaYork: Wiley, 1992).

60 Um relato fascinante de por que o cenário da “gosma cinzenta” para o fim do mundo é

extremamente improvável é dado no artigo: Freitas, R. “Some Limits to Global Ecophagy byBiovorous Nanoreplicators, with Public Policy Recommendations”. e Foresight Institute,1991 (www.foresight.org/nano/Ecophagy.htm).

61 Um relato interessante de como a IA impacta a situação de risco global é apresentado nocapítulo: Yudkovsky, E. “Artificial Intelligence as a Positive and Negative Factor in GlobalRisk”. Em Global Catastrophic Risk, orgs. N. Bostrom e M. Cirkovic (Oxford: OxfordUniversity Press, 2008), pp. 308–346.

62 A s três leis da robótica de Asimov são apresentadas, junto com a quarta lei discutida notexto e uma discussão detalhada de toda a questão dos robôs inteligentes, no artigo:Branwyn, G. “Robot’s Rules of Order” ( http:/ /www.informit.com/articles/article.aspx?p=101738).

Outra discussão bem detalhada do tema é dada por Roger Clarke no sitehttp:/ /www.rogerclarke.com/SOS/Asimov.html.

63 O alerta de Bill Joy delineando os perigos do problema das três tecnologias encontra-se em:

Page 307: O Colapso de Tudo - VisionvoxEsse argumento é o fio condutor deste livro. O colapso de tudo é um livro de conceitos e ideias. Para que estas páginas fossem tão acessíveis quanto

Joy, W. “Why the Future Doesn’t Need Us”. Wired, abril de 2000.

A grande crise: deflação global e o colapso dos mercados financeiros mundiaisAs prateleiras das livrarias estão sobrecarregadas de vários tipos de volumes tentando descrever a

Grande Recessão de 2007-08 e como o destino econômico do mundo deverá se desenrolar nasdécadas vindouras. O estranho é que é difíci l encontrar um único desses livros eruditos e/oupopulares que chegue a mencionar a deflação como uma candidata ao perfil econômico dofuturo próximo. Os argumentos aqui apresentados parecem essencialmente ignorados pelosexperts em economia, o que, dado seu péssimo histórico em prever o que realmente acontece,se afigura uma boa razão para examinarmos de perto o cenário deflacionário. O únicovolume que tenho em mãos que chega a abordar essa possibilidade bem real é o de NourielRoubini e Stephen Mihm. Dado que Roubini alcançou uma posição quase mítica em algunsmeios por sua previsão da Grande Recessão, seu tratamento sério da deflação como umacandidata viável para a economia global iminente deve, na minha opinião, ser levadorealmente muito a sério. A referência completa é: Roubini, N. e S. Mihm. A economia dascrises (Rio de Janeiro: Intrínseca, 2010).

64 O cenário de Damon Vickers do grande colapso se encontra no seu interessante e assustadorlivro: Vickers, D. The Day After the Dollar Crashes (Nova York: Wiley, 2011).

65 O artigo de Seabright sobre as estruturas implementadas para supostamente proteger aeconomia de outra crise como a dos anos 1930 está disponível em: Seabright, P. “eImaginot Line”. Foreign Policy, janeiro–fevereiro de 2011.

66 A citação atribuída a Robert Lucas sobre os economistas tendo solucionado o problema daGrande Depressão está no artigo absolutamente fantástico de Paul Krugman abordando aquestão de como a economia acadêmica se desencaminhou tanto: Krugman, P. “How DidEconomists Get It So Wrong?” e New York Times Magazine , 2 de setembro de 2009(http:/ /www.nytimes.com/2009/09/06/magazine/06Economic-t.html?page-wanted=all).

O material mencionado na abertura do texto sobre o início da crise financeira inclui:

Samuelson, R. “Rethinking the Great Recession”. e Wilson Quarterly, inverno de 2011,pp. 16–24.

Krugman, P. “A Crisis of Faith”. The New York Times, 15 de fevereiro de 2008.ompson, D. e Indiviglio, D. “5 Doomsday Scenarios for the U.S. Economy”, e Atlantic ,

2 de setembro de 2010.

67 A citação de Steve Hochberg sobre deflação apareceu em Elliott Wave Short-Term FinancialForecast, Elliott Wave International, Gainesville, GA, 8 de setembro de 2011.

68 Duas excelentes explicações da deflação para os não iniciados são:

Hendrickson, M. “Demystifying Deflation”. American inker , 12 de outubro de 2010(www.american-thinker.com/archived-articles/2010/10/demystifying_deflation.html).

A Visual Guide to Deflation ( www.mint.com/blog/wp-content/uploads/2009/04/visualguidetodeflation).

69 O estado de espírito social de uma sociedade é um fator importante que condiciona os tipos

de eventos sociais esperáveis. Esse ponto é aprofundado em: Casti , J . Mood Matters: From

Page 308: O Colapso de Tudo - VisionvoxEsse argumento é o fio condutor deste livro. O colapso de tudo é um livro de conceitos e ideias. Para que estas páginas fossem tão acessíveis quanto

Rising Skirt Lengths to the Collapse of World Powers (Nova York: Copernicus, 2010).70 A triste experiência japonesa de viver num ambiente deflacionário é relatada nos seguintes

artigos:

Fackler, M. “Japan Goes from Dynamic to Disheartened”. e New York Times , 16 deoutubro de 2010.

Suess, F. “2010 And Beyond—Deflation, Japanese Style”. e Daily Bell , 16 de janeiro de2010 (www.thedailybell.com).

71 A citação de Richard Koo sobre a deflação japonesa é extraída de seu fantástico livro

descrevendo o processo inteiro: Koo, R. e Holy Grail of Macroeconomics: Lessons fromJapan’s Great Recession (Nova York: Wiley, 2009).

Parte III: Eventos X revisitados

72 O trabalho de Stephen Carpenter e seu grupo da Universidade de Wisconsin de identificaçãodos sinais de alerta precoces de colapso do ecossistema do lago é descrito em:

Keim, B. “Scientists Seek Warning Signals for Catastrophic Tipping Points”. e New YorkTimes, 2 de setembro de 2009.

Sterling, T. “Scientists Detect Early Warning of Ecosystem Collapse in Wisconsin”. TheCutting Edge, 2 de maio de 2011 (http:/ /www.thecuttingedgenews.com/index.php?article=51948&pageid=28&pagename=Sci-Tech).

A citação definitiva da história completa é: S. R. Carpenter et al. “Early Warnings of Regime

Shifts: A Whole-Ecosystem Experiment”. Science, 28 de abril de 2011. Outros trabalhos recentes cobrindo um escopo ainda maior de questões em torno dos sinais de

alerta precoces, incluindo a área da mudança climática, são:

Dakos, V. Expecting the Unexpected. Tese, Universidade de Wageningen, Wageningen,Holanda, 2011.

Dakos, V. et al. “Slowing Down as an Early Warning Signal for Abrupt Climate Change”.Proceedings of the National Academy of Sciences, 105 (23 de setembro de 2008), pp.14308–14312.

73 Um relato de leigo de algumas das abordagens baseadas em sistemas dinâmicos para a

previsão de eventos X é apresentado em: Fisher, L. Crashes, Crises, and Calamities (NovaYork: Basic Books, 2011).

74 Ferramentas computadorizadas para analisar perguntas de simulação do tipo“E se…?” embusca de sinais de alerta precoces de grandes eventos futuros são tratadas em:

Casti , J . Would-Be Worlds (Nova York: Wiley, 1997).Epstein, J . Generative Social Science (Princeton, NJ: Princeton University Press, 2006). Ehrentreich, N. Agent-Based Modeling (Heidelberg: Springer, 2008).Gilbert, N. Agent-Based Models (Los Angeles: Sage Publications, 2008).

Page 309: O Colapso de Tudo - VisionvoxEsse argumento é o fio condutor deste livro. O colapso de tudo é um livro de conceitos e ideias. Para que estas páginas fossem tão acessíveis quanto

75 O s cenários da China e respostas do modelo de simulação da rede de comércio global àsperguntas levantadas pelos cenários são discutidos no seguinte volume, que é o relatório finalpara o projeto Game Changers, realizado pelo autor e colegas para um consórcio de órgãosgovernamentais e empresas privadas finlandeses e escoceses em 2010-11. A citação é: Casti ,J . et al. Extreme Events (Helsinque: Taloustieto Oy, 2011).

76 O destino do Air France 447 citado no texto segue o relato apresentado em: Schlangenstein,M. e Credeur, M. “Air France Crew May Have Faced Baffling Data”. Bloomberg News, 28 demaio de 2011.

77 O relato de Bookstaber da lacuna de complexidade entre a SEC e os mercados financeiros seencontra no acessível e interessante livro: Bookstaber, R. A Demon of Our Own Design (NovaYork: Wiley, 2007).

78 A ideia de “cegueira deliberada” como um tema focal de por que os humanos têm tamanhapredileção por ações claramente contrárias aos seus melhores interesses é bem oportuna nosdias de hoje. O livro de Margeret Heffernan mostra esse fenômeno em cada aspecto da vida,variando do investimento em esquemas de Ponzi (“pirâmides”) à guerra no Iraque:Heffernan, M. Willful Blindness (Nova York: Doubleday, 2011).

79 O argumento de Stiglitz sobre a lacuna de complexidade crescente entre ricos e pobres navida americana se encontra em: Stiglitz, J . “Of the 1%, By the 1%, For the 1%,” VanityFair, maio de 2011.

80 Mitos de desastres como um condicionador de como o público em geral reagirá a eventos Xsão explorados no artigo: Schoch-Spana, M. “Public Responses to Extreme Events — Top 5Disaster Myths”. Resources for the Future, 5 de outubro de 2005(http:/ /www.rff.org/rff/Events/upload/20180_1.pdf).

81 A ideia de que é preciso um evento X para abalar um sistema e assim eliminar a lacuna decomplexidade é explorada implicitamente no seguinte artigo sobre o Japão e o terremoto demarço de 2011: Pesek, W. “Roubini Earthquake Gloom Meet ‘Shock Doctrine’”. BloombergNews, 13 de março de 2011 (http:/ /www.bloomberg.com/news/2011-03-13/roubini-earthquake-gloom-meets-shock-doctrine-william-pesek.html).

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Sobre o autor

© Juan Esteves

Nasc id o nos Estad os Unid os, o matemátic o JOH N CAS TI, ph.D.,espec ial izou-se nos estud os d as teorias d os sistemas e d ac ompl exid ad e. El e é um d os fund ad ores d o X-Center, uma instituiç ãod e pesquisa c om sed e em Viena que anal isa eventos extremos c ausad ospel o homem e c omo prever sua oc orrênc ia. Al ém d e ter trabal had opor muitos anos para o Santa Fe Institute e a Rand Corporation, fezparte d o c orpo d oc ente d as universid ad es d e Princ eton, d o Arizona ed e Nova York. Atual mente, Casti mora em Viena, na Áustria.