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O comportamento coletivo da matéria e suas propriedades emergentes Eduardo Miranda Seminários sobre a profissão 10 de março de 2015

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O comportamento coletivo da matéria e suas

propriedades emergentes

Eduardo Miranda Seminários sobre a profissão

10 de março de 2015

Todos sabemos que a matéria pode ser encontrada em fases: gasosa, líquida e sólida

Cada uma dessas fases é caracterizada por um comportamento bem definido:

Mas qual é a fase de uma molécula individual de água?

•  gás: toma a forma do recipiente, não é “rígido”, não oferece resistência ao “cisalhamento”. •  líquido: parecido com um gás, mas também “molha” as superfícies, tem capilaridade (sobe as paredes de tubos estreitos) •  sólido: tem rigidez, resiste ao cisalhamento, mantém sua forma.

Claro que a pergunta não faz sentido.

As propriedades bem conhecidas das fases gasosa, líquida e sólida são manifestações do comportamento coletivo da matéria: só quantidades grandes (macroscópicas) podem fluir, molhar, ser rígidas, oferecer resistência à compressão e ao cisalhamento, etc. Mas existem vários outros fenômenos que são reflexo da presença de um número muito grande de átomos ou moléculas. Nas palavras do físico Philip W. Anderson:

“Mais é diferente”, Science 177, 393 (1972) (Philip W. Anderson, prêmio Nobel de Física de 1977)

Propriedades emergentes

Regrais/leis muito simples determinam como uma partícula interage com a outra: p. ex., duas moléculas de água. ⇒ num conjunto muito grande de partículas, isso gera comportamentos inusitados (sólido, líquido, gás).

Um exemplo simples: jogos

Jogo de damas: resolvido! Jonathan Schaeffer et al., Science 317, 1518 (2007)

Um programa de computador que sabe todas as possibilidades: ele não perde. No máximo, ele empata (se o outro jogador for tão bom quanto ele....).

número de possibilidades: 5 X 1020

Jogos não resolvidos: Jogo de xadrez: 1046 possibilidades. Go: 10100 possibilidades! Ainda muito fora do alcance de qualquer programa/máquina e pode ser não computável....

(http://webdocs.cs.ualberta.ca/~chinook/) Go

A natureza é cheia de exemplos.

Uma lista de outros “estados da matéria”: •  Ferromagnetos (ímãs, discos rígidos) • Cristais líquidos (usados nas telas de monitores LCD: Liquid Crystal Display) •  Ferroelétricos (capacitores, sensores, memória FRAM) •  Supercondutores (conduzem eletricidade sem resistência elétrica) •  Superfluidos (Hélio líquido, flui sem viscosidade através de tubos, abaixo de Tc=2,17 K) •  Condensados de Bose-Einstein (descobertos em 1995 em armadilhas atômicas, veremos mais adiante) .........................

•  e o mais complexo de todos.....

DNA

... a vida!

Superfluidez O 4He, quando resfriado abaixo de 2,17K, é um líquido com propriedades extraordinárias (descobertas por Kapitsa, Allen e Misener em 1937): 1. Ele se comporta como uma mistura de um fluido normal e um superfluido com:

a)  viscosidade nula b)  entropia nula c)  condutividade térmica infinita

2. Ele flui por tubos capilares sem atrito 3. Ele pode subir pelas paredes do recipiente e esvaziá-lo 4. Se esquentado, ele jorra espontaneamente de um recipiente.

Kapitsa

Mecânica Quântica de uma partícula

•  Partículas comportam-se como ondas: quando confinadas, oscilam apenas com determinadas frequências.

Níveis discretos de

energia

Ondas estacionárias

22

1,2,3,....

LL nn

n

λλ= ⇒ =

=

2c ncf f

Lλ= ⇒ =

E hf=

2 2

28h nEmL

=

Partícula quântica numa caixa 1D

-34 26.63×10 m kg / sh =

Ausência de trajetórias na Mecânica Quântica

•  Uma das mais importantes conseqüências da descrição quântica é o princípio da incerteza: ΔpΔx>ħ •  Como não podemos determinar x (posição) e v (velocidade) ao mesmo tempo com precisão ilimitada, não podemos definir trajetórias ⇒ descrição probabilísitica apenas.

Ausência de trajetórias na Mecânica Quântica

•  Uma das mais importantes conseqüências da descrição quântica é o princípio da incerteza: ΔpΔx>ħ •  Como não podemos determinar x (posição) e v (velocidade) ao mesmo tempo com precisão ilimitada, não podemos definir trajetórias ⇒ descrição probabilísitica apenas.

we convincingly validate the long time predictions ofDemkov et al. [8,9].

An atomic hydrogen beam was formed by collimatinghydrogen atoms resulting from the photodissociation ofH2S gas in a first vacuum chamber (see Fig. 2 and theSupplemental Material [20]). The hydrogen atoms wereionized in the active region of a velocity map imaging(VMI) spectrometer [21], where an 808 V=cm static elec-tric field was applied. The atoms were resonantly excitedto a mixture of n ¼ 2 s and p states by a two-photontransition (!laser ¼ 243 nm) and were ionized usingnarrowband, tunable laser pulses (!laser ¼ 365–367 nm,"laser ¼ 8 ns) from a Fourier-limited, home-built pulseddye amplifier [22]. The polarization of the 365–367 nmlaser was along the static electric field (i.e., perpendicularto the detector). A dual microchannel plate (MCP) detectorfollowed by a phosphor screen and a CCD camera wasused to record the photoelectrons. An electrostatic zoomlens magnified the images by about 1 order of magnitudecompared to the size that would have been measuredwithout this lens [23].

The main results of the experiments are shown in Fig. 3.In this figure calculated and experimental results are shownfor four experiments, where the hydrogen atoms were ex-cited to the ðn1; n2; mÞ ¼ ð0; 29; 0Þ, (1, 28, 0), (2, 27, 0) and(3, 26, 0) quasibound Stark states. As indicated in Fig. 3, thestates lie at energies of $172:82 cm$1, $169:67 cm$1,$166:45 cm$1, and $163:30 cm$1 with respect to thefield-free ionization limit, i.e., just above the saddle point

in the Coulombþ dc field potential, which lies at$174:00 cm$1. According to Eq. (6) of Ref. [24], thevalidity of which was checked experimentally [25],the ionization rate of these states covered a range from! ¼ 2:2& 1010 s$1 to ! ¼ 7:25& 109 s$1, which[using #Eðcm$1Þ ¼ 5:3& 10$12 !ðs$1Þ] implies linewidths comparable to the 0:005 cm$1 bandwidth of ourexcitation laser. These states could readily be identifiedin wavelength scans, since the ionization is completebefore the hydrogen atoms leave the interaction region ofthe VMI [26]. By contrast, in the same energy range Starkstates in the n ¼ 31 manifold (!> 1012 s$1) lead to verybroad resonances, while states in the n ¼ 29 manifold(!< 106 s$1) undergo insufficient ionization before theatoms fly out of the interaction region. Total ionizationspectra as a function of excitation energy in the given staticelectric field were successfully reproduced by means of thesemiclassical Stark theory of Harmin [27,28]. The parabolicquantum number n1 was identified by comparing the experi-mental spectrawith separate theoretical excitation curves for

FIG. 2 (color online). Schematic overview of the experiment.An atomic hydrogen beam was formed by photodissociating H2Sand placing a 3 mm aperture (a) 65 mm downstream. In theactive region of a velocity map imaging (VMI) spectrometer, theground state hydrogen atoms were first excited to a mixture ofn ¼ 2 s and p states by a two-photon transition using a pulsed243 nm laser. Next, they were ionized by a Fourier-limited,tunable (365–367 nm), UV laser. By applying a voltage differ-ence across the repeller (b) and extractor (c) electrodes, thephotoelectrons were accelerated towards a two-dimensionaldetector (d), consisting of a set of microchannel plates(MCPs), a phosphor screen and a CCD camera. En route tothe MCP detector, the photoelectrons passed through a three-element Einzel lens (e), allowing an increase of the diameter ofthe recorded image by about one order of magnitude.

FIG. 3 (color online). Experimental observation of thetransverse nodal structure of four atomic hydrogen Starkstates. The images in the middle show experimental measure-ments for ðn1; n2; mÞ ¼ ð0; 29; 0Þ, (1, 28, 0), (2, 27, 0), and(3, 26, 0). Interference patterns are clearly observed where thenumber of nodes corresponds to the value of n1. The results maybe compared to TDSE calculations shown to the left (for detailssee text), revealing that the experimentally observed nodal struc-tures originate from the transverse nodal structure of the initialstate that is formed upon laser excitation. A comparison of theexperimentally measured (solid lines) and calculated radial(dashed lines) probability distributions PðRÞ is shown to the rightof the experimental results. In order to make this comparison, thecomputational results were scaled to the macroscopic dimensionsof the experiment. Please note that, since PðRÞ ¼ R

PðR;$ÞRd$,the radial probability distributions PðRÞ have a zero at R ¼ 0,even if the two-dimensional images PðR;$Þ do not.

PRL 110, 213001 (2013) P HY S I CA L R EV I EW LE T T E R Sweek ending24 MAY 2013

213001-3

A. S. Stodolna et al., Phys. Rev. Lett. 110, 213001 (2013).

Partículas distingüíveis: mecânica clássica

Partículas indistingüíveis: mecânica quântica

Não há como distingüir as duas possibilidades

2 tipos de partículas indistingüíveis •  Na natureza, existem 2 tipos de partículas:

Exemplos: Fótons, mésons, grávitons, glúons, W±, Z0 (mediadores das forças fundamentais), átomos de 4He.

Exemplos: Elétrons, prótons, nêutrons, neutrinos (quarks e léptons).

Ø  FÉRMIONS (homenagem a Enrico Fermi)

Ø  BÓSONS (homenagem a Satyendranath Bose)

•  Um número ímpar de férmions forma um férmion (um próton ou um nêutron é formado por 3 quarks, que são férmions) •  Um número par de férmions forma um bóson (um méson é formado por um quark e um anti-quark) •  Um número qualquer de bósons forma um bóson.

Mecânica Quântica de várias partículas

A diferença mais importante é que podemos colocar quantos bósons quisermos num nível de energia, mas no máximo 1 férmion em cada nível

Férmions Bósons

Estatística de partículas clássicas •  Considere um sistema com 3 estados possíveis: 1, 2 e 3 •  Vamos pôr 2 partículas nesse sistema

1 2 3 AB - - - AB - - - AB A B - B A - A - B B - A - A B - B A

2 partículas distingüíveis A e B: caso clássico

9 arranjos diferentes, 3 deles com 2 partículas num mesmo

estado

Se todos os arranjos são igualmente prováveis, a

probabilidade de termos todas as partículas num mesmo nível é:

p=3/9=1/3

Estatística de bósons

1 2 3 AA - - - AA - - - AA A A - A - A - A A

2 partículas indistingüíveis: bósons (A e A)

6 arranjos diferentes, 3 deles com 2 partículas num mesmo estado

Se todos os arranjos são igualmente prováveis, a

probabilidade de termos todas as partículas num mesmo nível é:

p=3/6=1/2 > 1/3

Os bósons têm uma maior tendência que partículas clássicas a ocuparem o mesmo nível.

Estado Quântico Macroscópico

A baixas temperaturas (abaixo de uma temperatura crítica Tc), é muito difícil destruir esse estado: a agitação térmica não é suficiente para arrancar as partículas desse “condensado”, daí a viscosidade nula.

Essa é a condensação de Bose-Einstein (1924).

Existe uma enorme tendência de todos os bósons ocuparem um único estado quântico ⇒ Estado Quântico Macroscópico

Condensado de Bose-Einstein

Condensação de BE do 87Rb

Eric Cornell and Carl Wieman (1995), Nobel de 2001

Exemplos: Superfluidez do He, gases rarefeitos super-resfriados (87Rb)

Antes Depois

Supercondutividade Se os elétrons formarem pares, esses serão bósons e poderão condensar. Mas como formar pares de elétrons se eles se repelem eletricamente? Através da rede de íons positivos.

SC como condensação de pares

A supercondutividade é uma condensação de pares de Cooper.

A “rigidez” do condensado de pares é responsável por duas propriedades importantes do supercondutor:

•  Sua resistência nula: uma vez estabelecida uma corrente, é muito difícil destruí-la. Análoga à viscosidade nula do superfluido. •  Efeito Meissner: o condensado expulsa o campo magnético.

Fenômenos coletivos O que há de diferente nesse(s) fenômeno(s)? Ele(s) é(são) coletivo(s): • Superfluidez/Supercondutividade: todos os bósons/pares de Cooper têm que se condensar no estado de mais baixa energia. • Eles não ocorrem com poucas partículas. É preciso um número muito grande!

COMPLEXIDADE

Duas visões da ciência: Reducionismo extremo

As leis físicas fundamentais necessárias para a teoria matemática de uma grande parte da física e toda a química são, portanto, completamente conhecidas e a dificuldade reside apenas no fato de que a aplicação exata dessas leis leva a equações complicadas demais para serem resolvidas. Paul A. M. Dirac (1929)

“... o resto é química”, Carl David Anderson, descobridor do neutrino

Duas visões da ciência: Propriedades emergentes ou Ciência da complexidade

A capacidade de reduzir tudo a leis fundamentais simples não garante a capacidade de começar a partir dessas leis e reconstruir o universo. (...) Ao contrário, a cada nível de complexidade surgem propriedades inteiramente novas e a compreensão dos novos comportamentos requer pesquisa cuja natureza é, eu creio, tão fundamental quanto qualquer outra. (...) Em cada estágio da estrutura hierárquica da realidade, leis, conceitos e generalizações completamente novos são necessários, exigindo inspiração e criatividade tão grandes quanto no estágio anterior. Psicologia não é biologia aplicada, nem biologia é química aplicada. Philip W. Anderson, "More Is Different" Science (1972)

Essa é a abordagem reducionista

Essa é a abordagem do “emergentismo”

Obrigado!