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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
RODRIGO DOUGLAS FRANCÊZ CORRÊA
O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL E A ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO
FUNDAMENTAL
Tijucas
2009
RODRIGO DOUGLAS FRANCÊZ CORRÊA
O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL E A ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO
FUNDAMENTAL
Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas. Orientadora: Prof.ª MSc. Thaís Vandresen
Tijucas
2009
1
RODRIGO DOUGLAS FRANCÊZ CORRÊA
O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL E A ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO
FUNDAMENTAL
Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e
aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.
Área de Concentração/Linha de Pesquisa: Direito Público/Direito Constitucional
Tijucas, 23 de outubro de 2009.
Prof.ª MSc. Thaís Vandresen Orientadora
Prof. MSc. Marcos Alberto Carvalho de Freitas Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica
2
À Vó Nina (in memoriam), com seu infinito amor, símbolo do
conceito de ser um pilar em uma família, desde sempre grande
incentivadora dos meus estudos, veraz entusiasta do meu sucesso
profissional e pessoal, e cuja ausência reverbera dolorida em meu
coração. A você, vovó, dedico este trabalho.
3
A Deus, fonte suprema de todo saber e alicerce íntimo nessa jornada acadêmica.
A toda minha família, pela confiança que depositaram em mim.
Aos meus pais, Alcenir Lemos Corrêa e Cléia Francêz Corrêa, que além de toda ajuda, apoio
e compreensão, foram expectadores orgulhosos nessa etapa que se conclui, sendo os braços
que me sustentaram quando eu não conseguia percorrer minha jornada sozinho.
Ao meu irmão, Diogo Phillipe Francêz Corrêa, um amigo eterno, que me entende e me ama.
À minha avó, Maria “Nina” Espíndola Francêz (in memoriam), que me amou, apoiou,
aconselhou e incentivou desde os primeiros passos na vida pessoal e profissional.
À Professora Orientadora, Thaís Vandresen, norte seguro na orientação deste trabalho e
profissional merecedora da minha grande admiração.
A todos os Professores do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, campus
Tijucas, na pessoa do Professor Celso Leal da Veiga Júnior, que muito contribuíram para a
minha formação jurídica.
À Rafaella Cibele Coninck, que se mostrou, mais que uma amiga, uma irmã nessa jornada, e
cuja amizade ultrapassa os limites da vida acadêmica.
À Débora Cristini Silva, detentora da minha sincera amizade e grande admiração por seu
maravilhoso caráter e destacada inteligência.
À Georgia Paulina Motter Leal da Veiga, a primeira amizade verdadeira que fiz na
universidade e uma daquelas que continuará após a graduação.
À Ana Maria Spessato, pela amizade sólida, conselhos valiosos e broncas necessárias.
À Janaína Bez Lopes Borba, representando meus colegas de trabalho junto ao Fórum de Porto
Belo, que torce pelo meu sucesso profissional e é a melhor companhia diária que alguém
poderia ter.
Aos meus amigos extraclasse, Rafael Medeiros, Lucas Teixeira Leal Negrão e André Felipe
da Silva Gambeta, que traduzem o conceito de amizade e que sempre me apoiaram em tudo.
Ao William Domiciano dos Santos, pelo que me fez aprender e desaprender.
Aos colegas de classe, pelos momentos que passamos juntos e pelas experiências trocadas.
Aos que colaboraram com suas críticas e sugestões para a realização deste trabalho.
A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização desta pesquisa.
4
Teu dever é lutar pelo Direito, mas se um dia encontrares o Direito em conflito com a Justiça, luta pela Justiça.
Eduardo Juan Couture
5
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –
UNIVALI, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca
do mesmo.
Tijucas, 23 de outubro de 2009.
Rodrigo Douglas Francêz Corrêa Graduando
6
RESUMO Considerando que a Constituição de um Estado seja a lei máxima e que as demais normas legiferadas sob sua vigência lhe devam adequação, o controle de constitucionalidade surge para erradicar do ordenamento jurídico vigente, as normas que afrontem a Constituição, desde seu processo de nascimento no berço legislativo ou ainda, depois de adquirirem eficácia integrando o conjunto de leis do país. Nesta esteira, o objetivo primordial deste trabalho monográfico é, em um primeiro momento, investigar a origem e evolução história do controle de constitucionalidade no Brasil, desde a época da Constituição Imperial até o atual Texto Constitucional de 1988, acompanhando-se o processo de aprimoramento de referido controle em nosso país. Num segundo momento, analisa-se o controle de constitucionalidade de maneira concreta, suas formas e critérios de funcionamento, abordando-se as ações específicas pelas quais se guerreia a norma ou ato normativo dado como inconstitucional. Derradeiro, entra-se no cerne da presente pesquisa, expondo-se, especificamente a ação nominada Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, que se trata um expediente pouco utilizado, pelo qual se combate a inconstitucionalidade, adentrando-se na parte conceitual, particularidades, passando pela fase procedimental e efeitos da decisão proferida na mesma. Palavras-Chave: Constituição. Controle. Constitucionalidade. Arguição de Descumprimento
de Preceito Fundamental.
7
RESUMEN Considerando que la Constitución de un Estado sea la ley máxima y que las demás normas legiferadas bajo su vigencia le deban adecuación, el control de constitucionalidad surge para erradicar del ordenamiento jurídico vigente, las normas que afronten la Constitución, desde su proceso de nacimiento en la cuna legislativa o, aun, después de que adquieran eficacia integrando el conjunto de leyes del País. En esta estera, el objetivo primordial de este trabajo monográfico es, en un primer momento, investigar el origen y evolución histórica del control de constitucionalidad en el Brasil, desde la época de la Constitución Imperial hasta el actual Texto Constitucional de 1988, acompañándose el proceso de mejoramiento del referido control en nuestro País. En un segundo momento, se analiza el control de constitucionalidad de manera concreta, sus formas y criterios de funcionamiento, abordándose las acciones específicas por las cuales se guerrea la norma o acto normativo entendido como inconstitucional. Por fin, se entra en el íntimo de la presente pesquisa, exponiéndose, específicamente la acción llamada de Argumentación de Incumplimiento de Precepto Fundamental, que se trata de una herramienta poco utilizada, a través de la cual se combate la inconstitucionalidad, ingresando en el aspecto conceptual, particularidades, pasando por la fase de procedimientos y efectos de la decisión proferida en la misma. Palabras-Llave: Constitución. Control. Constitucionalidad. Argumentación de
Incumplimiento de Precepto Fundamental.
8
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Abaixo uma lista das abreviaturas e siglas (à esquerda) utilizadas pelo Autor em seu
trabalho com o respectivo significado (à direita), visando uma pronta identificação quando do
manuseio do mesmo.
ADC Ação Declaratória de Constitucionalidade
ADECON Ação Declaratória de Constitucionalidade ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade ADIn Ação Direta de Inconstitucionalidade ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental Art. Artigo CF Constituição Federal
CRFB Constituição da República Federativa do Brasil EC Emenda Constitucional Ed. Edição DF Distrito Federal L.A. Lei de Arguição nº. Número n. Número p. Página RTJ Revista Trimestral de Jurisprudência STF Supremo Tribunal Federal
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí v. Versus
9
LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS
Lista de categorias1 que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho,
com seus respectivos conceitos operacionais2.
Constituição
A lei fundamental de um Estado, sendo a organização de seus elementos essenciais: um
sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma
de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus
órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias,
sendo, em suma, o conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado3.
Supremacia Constitucional
É característica que confere superioridade da Constituição perante às demais normas em um
sistema jurídico, decorrendo, por conseguinte, da própria origem da Constituição, pois
provém de um poder constituinte originário, de natureza absoluta, bem como do seu caráter de
rigidez, sobrepondo-se as normas constitucionais em relação a todas as demais normas
jurídicas4.
1 Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8ª ed. Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31. 2 Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do trabalho. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito, p. 43. 3 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 29. ed. São Paulo: Malhares Editores, 2007. p. 37. 4 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 16.
10
Inconstitucionalidade por Ação
É o tipo de inconstitucionalidade que se verifica quando da produção de atos legislativo ou
normativos que contrariem dispositivos constitucionais, podendo este vício ser uma
inconstitucionalidade formal ou uma inconstitucionalidade material.5
Inconstitucionalidade formal
Trata-se da inconstitucionalidade individualizada pelo vício no procedimento ou no órgão
competente da norma infraconstitucional, uma vez que foi produzida por procedimento ou
órgão diverso do prescrito na norma constitucional na qual deveria ter encontrado o seu
fundamento de validade6.
Inconstitucionalidade material
É a inconstitucionalidade flagrada quando o conteúdo do ato infraconstitucional estiver em
contrariedade com alguma norma substantiva prevista na Constituição, seja uma regra ou um
princípio7.
Inconstitucionalidade por Omissão
Diz-se da ausência de elaboração de atos legislativos ou normativos que impossibilitem o
cumprimento de preceitos constitucionais, ou, em outras palavras, é a inconstitucionalidade
verificada quando não se puder cumprir um preceito constitucional em decorrência de inércia
legislativa ou administrativa dos poderes constituídos, que deixam de legislar paralelamente a
fim de regulamentar o efetivo alcance do referido preceito8.
Controle de Constitucionalidade Repressivo
Repressivo, sucessivo ou a posteriori são termos distintos para se referir ao controle de
constitucionalidade realizado após a elaboração da lei ou do ato normativo, tendo como
finalidade retirar uma lei ou ato normativo inconstitucional da esfera jurídica, sendo que, no
Brasil, via de regra, é exercido pelo Poder Judiciário, e, excepcionalmente, pelo Poder
Legislativo9.
5 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 33. 6 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2007. p. 140. 7 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 2. ed. Saraiva: São Paulo, 2006. p. 26. 8 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 33. 9 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 34.
11
Controle de Constitucionalidade Preventivo
Tem-se como definição do controle preventivo, também denominado controle prévio, o
controle realizado anteriormente à conversão de um projeto de lei, em lei propriamente dita,
visando impedir a integração de norma dotada de inconstitucionalidade ao ordenamento
jurídico10.
Controle de Constitucionalidade Concentrado
É o controle exercido exclusivamente por um Tribunal Superior de cada país ou, ainda, por
uma Corte Constitucional, como no caso do controle concentrado na Alemanha11.
Controle de Constitucionalidade Difuso
Trata-se do controle de constitucionalidade exercido pelos integrantes do Judiciário, lendo,
em integrantes, qualquer juiz ou tribunal, que podem declarar a inconstitucionalidade da lei
em um caso concreto, em exame12.
Controle Judiciário
É a definição do controle judicial da constitucionalidade, ou seja, o controle exercido pelo
Poder Judicial, quando se verifica a adequação vertical, da correspondência entre atos
legislativos e a Carta Maior da nação. É exercido por juízes e tribunais13.
Controle Político
O controle político da constitucionalidade de normas e atos normativos é aquele realizado por
órgão não pertencente ao Judiciário14. Exemplo no Brasil é a Comissão de Constituição e
Justiça presente no Senado Federal e na Câmara dos Deputados.
Preceito Fundamental
Por preceito fundamental, entende-se cada princípio constitucional (inclusive os princípios
constitucionais sensíveis constantes no inciso VII do art. 34, da Constituição), os objetivos,
direitos e garantias fundamentais previstas nos artigos 1º e 5º, bem como as cláusulas pétreas,
10 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência, p. 45. 11 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 35. 12 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 35. 13 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 35. 14 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 35.
12
os princípios da Administração Pública e demais disposições constantes no Texto Magno que
se revelam fundamentais para a preservação dos valores mais relevantes sob a guarida
constitucional15.
Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
Trata-se de garantia de origem constitucional, de natureza processual, que tem como objetivo
a preservação da obediência geral devida às regras e princípios constitucionais que,
considerados fundamentais, estavam, há muito, dentro de um quadro evolutivo, a demandar
mecanismo próprio para tanto, destacando-se que só caberá arguição quando houver expresso
descumprimento de um preceito fundamental16.
15 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et al.]. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 394. 16 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 276.
13
SUMÁRIO
RESUMO ................................................................................................................................. 05 RESUMEN .............................................................................................................................. 06 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ............................................................................ 07 LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS ............................ 08 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 15 2 O HISTÓRICO DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE FRENTE À EVOLUÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES NO BRASIL ......................................................... 19 2.1 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME IMPERIAL DA CARTA DE 1824 ...................................................................................................................... 22 2.2 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME REPUBLICANO DA CARTA DE 1891 ...................................................................................................................... 24 2.3 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CONSTITUIÇÃO DE 1934 ...................................................................................................... 26 2.4 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CARTA POLÍTICA DE 1937 ................................................................................................................. 28 2.5 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CARTA MAGNA DE 1946 .................................................................................................................... 30 2.6 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CARTA DE 1967 E EMENDA CONSTITUCIONAL 1/69 ......................................................................... 34 2.7 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CARTA DE 1988 (COM A EC 3/93) ............................................................................................................ 37
3 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E SUAS AÇÕES ESPECÍFICAS ...................................................................................................................... 41 3.1 CONCEITO DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ..................................... 43 3.2 O CONTROLE PREVENTIVO DE CONSTITUCIONALIDADE .................................. 44 3.3 O CONTROLE REPRESSIVO DE CONSTITUCIONALIDADE .................................... 45 3.3.1 Controle Repressivo de Constitucionalidade Exercido pelo Legislativo ......................... 48 3.3.2 Controle Repressivo de Constitucionalidade Exercido pelo Judiciário ........................... 50 3.3.2.1 O Controle Difuso de Constitucionalidade ................................................................... 51 3.3.2.2 O Controle Concentrado de Constitucionalidade ......................................................... 54 4 A AÇÃO DE ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL COMO INSTRUMENTO DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ................................................................................................. 62 4.1 CONCEITO ........................................................................................................................ 62 4.2 MODALIDADES DA ADPF ............................................................................................. 65 4.3 LEGITIMAÇÃO PARA A PROPOSITURA DE ADPF ................................................... 69 4.4 PROCEDIMENTO DA ADPF ........................................................................................... 73 4.4.1 A Petição Inicial ............................................................................................................... 73 4.4.2 O despacho liminar exarado na ADPF ............................................................................ 75 4.4.3 O Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União na ADPF .................. 78 4.4.4 O julgamento e efeitos da decisão proferida na ADPF .................................................... 81
14
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 85 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................. 90
15
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objeto17 o estudo do controle de constitucionalidade no
Brasil, desde sua evolução histórica, como ponto inicial a Constituição Imperial de 1824 até a
atual Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, bem como a revisão das ações
específicas para o combate à inconstitucionalidade, e, por fim, uma análise mais detalhada da
Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.
A importância deste tema reside em um maior conhecimento acerca do funcionamento
do controle de constitucionalidade no Brasil, a forma como é exercida, meios de se controlar a
constitucionalidade, competência para apreciar uma ação que verse sobre a
constitucionalidade, bem como, especificamente esclarecer o procedimento da Ação de
Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.
Ressalte-se que, além de ser requisito imprescindível à conclusão do curso de Direito
na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, o presente relatório monográfico também vem
colaborar para o conhecimento de um tema que, apesar de não poder ser tratado como
novidade no campo jurídico, na dimensão social-prática ainda pode ser tratado como elemento
novo e repleto de nuances a serem destacadas pelos intérpretes jurídicos.
A escolha do tema é fruto do interesse pessoal do pesquisador em conhecer mais
intimamente o controle de constitucionalidade das leis elaboradas sob a vigência de uma Carta
Máxima, compreender os aspectos da Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental como peça inserta no controle de constitucionalidade vigente no Brasil.
Em vista do parâmetro delineado, constitui-se como objetivo geral deste trabalho
pesquisar a evolução do controle de constitucionalidade no Brasil bem como realizar um
estudo específico sobre a Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.
17 Nesta Introdução cumpre-se o previsto em PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 170-181.
16
O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel
em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas,
campus de Tijucas.
Como objetivos específicos, pretende-se atingir 3 metas: 1ª) analisar as etapas
históricas do controle de constitucionalidade no Brasil desde a Constituição Imperial de 1824
até a atual CRFB/88; 2ª) abordar de forma sucinta as ações específicas do controle de
constitucionalidade possíveis no Brasil; e, 3ª) elaborar uma análise mais detida acerca da
Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, como um instrumento
possível para o controle de constitucionalidade no Brasil.
Não é o propósito deste trabalho exaurir o tema escolhido em todos os seus termos.
Por certo não se estabelecerá um ponto final em referida discussão. Pretende-se, tão-somente,
aclarar o pensamento existente sobre o tema, abordando-se de forma simples os aspectos
considerados pertinentes pelo autor para um razoável processo cognitivo acerca dos
apontamentos aduzidos.
Para o desenvolvimento da presente pesquisa, e levando em consideração os objetivos
expostos, foram formulados os seguintes problemas e respectivas hipóteses que serão
analisados na sequência.
1º problema: Como ocorreu a evolução do controle de constitucionalidade no Brasil,
desde sua Constituição Imperial até o regime de vigência da atual Carta Política de 1988?
Hipótese: O controle de constitucionalidade no Brasil evoluiu de forma paulatina, não
necessariamente melhorando a cada Constituição promulgada, eis que, tendo em vista a
ocorrência de regimes autoritários, o controle de constitucionalidade sofreu mudanças radicais
na evolução histórica das Constituições que vigeram no Brasil.
2º problema: Quais as medidas eficazes e garantidas legalmente para o combate à
inconstitucionalidade no Brasil? Hipótese: Há no Brasil uma série de instrumentos capazes de
garantir a inviolabilidade do Texto Constitucional, sendo cada uma, conforme o tipo de
inconstitucionalidade a ser combatida, competente para se lograr a proteção da Constituição.
3º problema: A Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental é um
instrumento eficiente a ser utilizados por cada cidadão num contexto de controle de
constitucionalidade? Hipótese: Embora a Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF) seja um eficaz meio de combate a inconstitucionalidade de leis ou atos
17
normativos, sua interposição é dificultosa, eis que isto só será possível quando não houver
outro meio capaz de garantir a integridade de um preceito fundamental, e, conforme o caso, é
restrita a certos sujeitos de direito, que detêm a competência de propositura da mesma.
O relatório final da pesquisa foi estruturado em três capítulos, podendo-se, inclusive,
delineá-los como três molduras distintas, mas conexas, conforme declinadas a seguir.
O primeiro capítulo destina-se a visualizar a evolução histórica do controle de
constitucionalidade no Brasil face às Constituições que aqui vigoraram, desde a Constituição
Imperial, passando pela autoritária Constituição vigente na época da Ditadura Militar até a
atual Constituição promulgada em 1988.
No segundo capítulo destacam-se as ações específicas asseguradas pelo atual
ordenamento jurídico no Brasil, que visam controlar a inconstitucionalidade das leis ou atos
normativos do Poder Público. Abordar-se-á de forma sucinta cada uma delas, explicando-se
seu cabimento e procedimento.
Já o terceiro capítulo será voltado exclusivamente para a Ação de Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental, visualizando-se a parte conceitual, suas
características e particularidades até a parte procedimental e os efeitos da decisão proferida na
mesma.
Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado
o método dedutivo, e, o relatório dos resultados expresso na presente monografia é composto
na base lógica dedutiva18, já que se parte de uma formulação geral do problema, buscando-se
posições científicas que os sustentem, para que, ao final, seja apontada a prevalência, ou não,
das hipóteses elencadas.
As categorias julgadas estratégicas pelo autor e seus respectivos conceitos
operacionais serão abordados no decorrer da pesquisa, sem detalhes.
Os acordos semânticos que procuram resguardar a linha lógica do relatório da pesquisa
e respectivas categorias, por opção metodológica, estão apresentados na Lista de Categorias e
seus Conceitos Operacionais, muito embora algumas delas tenham seus conceitos mais
aprofundados no corpo da pesquisa.
18 Sobre os “Métodos” e “Técnicas” nas diversas fases da pesquisa científica, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 99-125.
18
A presente monografia se encerra com as Considerações Finais, nas quais são
apresentados pontos conclusivos destacados, bem como a análise aos problemas ora
apontados com a possível confirmação das hipóteses elencadas.
19
2 O HISTÓRICO DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE FRENTE À EVOLUÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES NO BRASIL
O controle concentrado de constitucionalidade surgiu no Brasil com a Emenda
Constitucional n. 16/65, contudo, é de se esclarecer que de maneira genérica, o controle de
constitucionalidade já vem sendo exercido desde as Constituições da República anteriores à
vigente. Neste caso, faz-se necessário a menção do processo evolutivo do controle de
constitucionalidade em cada constituição, a fim de que se compreendam os meios e formas
anteriores do controle desde a Constituição Imperial de 1824 até a atual CRFB/1988.
Antes de se pormenorizar o controle de constitucionalidade frente cada Constituição
que vigeu no Brasil, é necessária a menção da origem do “Controle de Constitucionalidade”,
que, obviamente não surgiu no Brasil, mas que foi adotado frente a funcionalidade e eficácia
comprovada nos países que já possuíam uma Constituição e, por consequência, modos de
evitar ou remediar afrontas à Carta Maior de cada nação.
O doutrinador Rodrigo César Rebello Pinho discorrendo acerca das origens do
controle de constitucionalidade explica:
O mecanismo de verificação da constitucionalidade das normas infraconstitucionais pelo Poder Judiciário é uma construção do constitucionalismo norte-americano. Diversos precedentes judiciais levaram ao mecanismo de verificação judicial da adequação vertical das leis com Texto Constitucional, até a eclosão do famoso case Marbury v. Madison, relatado pelo Presidente da Suprema Corte norte-americana John Marshall em 1803. Essa doutrina do controle da constitucionalidade das leis pelo Poder Judiciário como uma decorrência inevitável da superioridade da Constituição escrita em relação às demais normas consolidou-se na jurisprudência americana. O Brasil, influenciado por esse modelo, passou a admitir o controle judicial da constitucionalidade a partir da primeira Constituição Republicana, em 189119.
Pode-se perceber que, embora já existisse um relativo e peculiar controle de
constitucionalidade desde a Constituição Imperial de 1824 como se verá a seguir, a efetiva
proteção da Constituição como lei suprema e inviolável frente normas que a contrariassem se
daria somente na primeira Constituição Republicana de 1981.
19 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 31.
20
Antes disso, porém, após o caso Marbury v. Madison dos Estados Unidos, e desta vez
na Europa, a partir do século XX e fundamentada nas idéias de Kelsen, se desenvolveu um
modelo distinto para assegurar a supremacia constitucional. Isso porque foi instituído o
controle de constitucionalidade em abstrato, exercido por um órgão fora do Poder Judiciário,
examinando a lei em tese e com efeitos erga omnes. No Brasil, este tipo de controle de
constitucionalidade das normas foi definitivamente introduzido em 1965, com a Emenda
Constitucional nº. 16 à Constituição Federal de 1946, sendo que a Constituição de 1934 já
continha a possibilidade de representação interventiva por iniciativa do Procurador-Geral da
República perante o Supremo Tribunal Federal20.
Quando versa acerca do controle de constitucionalidade no Brasil, Rebello Pinho
inicia expondo que “no Brasil o controle da constitucionalidade é exercido por todos os
poderes constituídos, que têm o dever de zelar pelo respeito à Constituição”21.
Levando em consideração que a forma do controle de constitucionalidade pode ser
preventiva ou repressiva, versando em seguida sobre o controle preventivo no Brasil, Rebello
Pinho continua:
O controle preventivo é exercido pelos Poderes Legislativo e Executivo, que impedem que um projeto de ato legislativo inconstitucional venha a ser aprovado. O Poder Legislativo realiza o controle pela Comissão de Constituição e Justiça existente em toda Casa Legislativa, que examina o projeto de ato legislativo sob esse aspecto antes da votação em Plenário (CF, art. 58). O Poder Executivo exerce essa forma de controle pelo poder de veto jurídico do Presidente da República ao projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional (CF, art. 55, § 1º)22.
Curial ressaltar que de forma extraordinária, o STF tem admitido, somente por parte
dos parlamentares, o exercício de um controle jurisdicional preventivo da constitucionalidade,
quando da permissão aos membros do Legislativo o direito à correta formação de espécies
normativas, impedindo, prematuramente, a tramitação de emendas constitucionais e leis que
incidam em vícios constitucionais. Por exemplo: num caso de admissão de trâmite de
proposta de emenda constitucional que pretenda supressão de cláusula pétrea, é possível, por
um parlamentar, impetrar mandado de segurança contra o ato do Presidente da Casa
Legislativa, vedando-se, contudo, que outras pessoas ingressem em juízo para se questionar a
20 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 31. 21 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 36. 22 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 36.
21
constitucionalidade de projeto de ato legislativo antes da aprovação e promulgação, em
respeito ao princípio constitucional da separação de poderes23.
Isto posto, Rebello Pinho versa acerca do controle repressivo, expondo:
O controle repressivo é feito pelo Poder Judiciário. Caso o projeto de lei que contenha alguma inconstitucionalidade venha a ser aprovado pelo Legislativo e sancionado pelo Executivo, a lei poderá ter seu vício declarado pelo Poder Judiciário. O controle repressivo é exercido por duas vias, tanto de forma abstrata, pela via principal ou de ação, como de forma concreta, pela via de exceção ou incidental24.
A atual Carta Magna de 1988, excepcionalmente, admite que o controle repressivo da
constitucionalidade seja exercido pelo Poder Legislativo, com finalidade de retirar do
ordenamento jurídico normas já editadas, com plena vigência e eficácia. Uma hipótese é o
decreto legislativo do Congresso Nacional com intuito de sustar atos normativos do Poder
Executivo que exorbitem do poder regulamentar; a outra hipótese é o caso de medidas
provisórias rejeitadas pelo Congresso Nacional por apresentarem vício de constitucionalidade,
por não atenderem aos pressupostos constitucionais necessários da relevância e da urgência25.
Conforme elucidado, no Brasil vige o controle de constitucionalidade preventivo e
repressivo, sendo estas, formas de controle. O controle preventivo se dá pelo Poder
Legislativo e pelo Poder Executivo que, durante a fase ainda embrionária da lei ou ato
normativo, percebem pontos de inconstitucionalidade e impedem a aprovação ou sanção da
norma com tal vício. Já o controle repressivo, conforme dito, se dá, via de regra, pelo Poder
Judiciário, após a aquisição de vigência e eficácia das normas, quando então, se incute à
norma irregular, por meio de declaração, a inconstitucionalidade da mesma.
Vencida essa parte preambular, passa-se ao escopo deste capítulo, caracterizando-se as
constituições que já vigeram no Brasil até a atual Carta da Primavera de 1988, demonstrando-
se, de forma sucinta, como funcionava o controle de constitucionalidade em cada constituição,
seus aspectos e mecanismos de funcionamento.
23 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 37. 24 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 37. 25 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 37.
22
2.1 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME IMPERIAL DA
CARTA DE 1824
Em um primeiro momento, esclarece-se que, com a volta da família real e a simultânea
regência de D. Pedro I, urgia a necessidade de conferir uma Constituição ao Brasil, sendo que
a convocação para uma Assembléia Constituinte deu-se antes mesmo da Proclamação da
República26.
A Constituição de 1824 não podia ser compreendida senão à luz das ideias liberais que
a tudo afetavam à época, vez que o liberalismo era, e ainda o é, uma corrente de pensamento
que marcou profundamente a história, atravessando o tempo aos dias atuais, ainda que
envolvido com problemáticas desconhecidas por seus criadores27.
O liberalismo tão acirrado à época da Constituição em referência, em muito
influenciava esta, sendo prestadio o escólio de Celso Ribeiro de Bastos, que explica:
A constituição outorgada de 1824, embora sem deixar de trazer consigo características que hoje não seriam aceitáveis como democráticas, era marcada, sem dúvida, por um grande liberalismo que se retratava, sobretudo, no rol dos direitos individuais que era praticamente o que havia de mais moderno na época, como também na adoção da separação dos poderes que, além dos três clássicos, acrescentava um quarto: o Poder Moderador28.
Nota-se que, embora as ideias liberais tidas como democráticas à época de sua
promulgação não seriam aceitas nos dias contemporâneos, a Carta Magna de 1824 trazia
grandes avanços no sentido da expansão democrática no Brasil Imperial dando enfoque aos
direitos individuais, considerados tópicos futurísticos no momento histórico em que entrou em
vigor.
Oportuno que se demonstre a novidade trazida pela Constituição de 1824 bem como
uma de suas principais características: a semi-rigidez.
Uma inovação trazida pela Lei Maior de 1824 era um quarto e novo poder: o Poder
Moderador. Este Poder em voga à época consistia na faculdade do soberano de arbitragem
entre os poderes, sendo que os atos praticados pelo monarca eram negados aos Ministros,
negando-se, por consequência, o controle político do legislativo. Em análise, pode-se 26 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 97. 27 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 98. 28 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 98.
23
constatar que se utilizado por um monarca com tendências tirânicas, levar-se-ia a um poder
quase absoluto, o que não foi o caso do Brasil, então governado por um imperador culto,
moderado, cônscio do seu poder e responsabilidades, o que resultou num sistema político com
alto nível de organização constitucional29.
O Poder Moderador que assegurava ao Chefe de Estado a elevada missão de velar para
manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes, era visto como uma
faculdade de fazer com que cada um deles, Executivo, Legislativo e Judiciário, se
conservassem em sua órbita, concorrendo harmoniosamente para o fim social, o bem estar
nacional, mantendo o equilíbrio, impedindo os abusos e mantendo-os na direção da alta
missão de cada um30.
Levando-se em consideração que as Constituições, conforme a maneira de sua
alteração podem ser definidas como rígidas ou flexíveis, a Constituição de 1824 era tida como
pertencente à uma terceira categoria: a das semi-rígidas. E assim era em virtude do seguinte
motivo: as matérias relacionadas ao cerne ou à substância do Estado era modificáveis apenas
por maioria, de uma maneira mais solene, enquanto que os assuntos apenas formalmente
constitucionais, ou seja, só eram constitucionais por estarem na Constituição, para estes
dispensava-se qualquer exigência específica31.
Por fim, no regime da Constituição Imperial de 1824, considerava-se que somente o
poder que editou a lei que teria o condão de declarar o preceito dela. Única e exclusivamente
o poder que a promulgou é que tinha o direito de interpretar o seu próprio ato, sua vontade e
seus fins. Assim, nenhum outro poder tinha o direito de interpretar por igual modo, pois
nenhuma lei lhe dava esta faculdade, sendo que a ideia de isto acontecer seria absurda. Desta
maneira, cabia tão-somente ao Poder Legislativo fazer, interpretar, suspender e revogar as
leis, e, ademais, velar pela guarda da Constituição. A influência francesa, flagrantemente
manifesta na Constituição de 1824, estava presente desde a similitude dos artigos da Carta
Maior na época. Não havia, destarte, o controle constitucional das leis, salientando-se,
contudo, que se versava que seria constitucional somente o que diz respeito aos limites, e
atribuições dos poderes públicos, e aos direitos políticos, e individuais dos cidadãos. Tudo
29 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 99. 30 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 190. 31 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 101.
24
que não era constitucional seria alterado sem as formalidades referidas, pelas legislaturas
ordinárias32.
Neste sentido, o insigne jurista Gilmar Mendes ratifica:
A Constituição de 1824 não contemplava qualquer sistema assemelhado aos modelos hodiernos de controle de constitucionalidade. A influência francesa ensejou que se outorgasse ao Poder Legislativo a atribuição de “fazer leis, interpretá-las, suspendê-las ou revogá-las”, bem como “velar na guarda da Constituição” (art. 15, n. 8º e 9º)33.
Observa-se, desde logo, que na Constituição Imperial de 1824 embora estribada numa
ideia liberal e espelhando-se num modelo excelente para a época em que vigeu, tinha, vista
com olhos contemporâneos, a grande lacuna da ausência de um eficaz controle de
constitucionalidade bem como a temerária característica da semi-rigidez que permitia uma
alteração do texto constitucional sem formalidades e de maneira meramente por leis
ordinárias.
2.2 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME REPUBLICANO DA
CARTA DE 1891
O primeiro ato jurídico do movimento armado que terminou no golpe de Estado de 15
de novembro de 1889, quando se destituiu o Imperador, proclamando-se uma República
Federativa, consistiu na edição do Decreto nº. 1, redigido por Rui Barbosa. Este texto
decretava, de forma provisória, a forma de governo da nação brasileira como sendo República
Federativa, sendo as províncias elevadas ao nível de Estados gozando da faculdade de
autonomia segundo a característica própria dos Estados-Membros de uma Federação34.
Bastos, nesta esteira, confirma:
Com a Constituição Federal de 1891, o Brasil implanta, de forma definitiva, tanto a Federação quanto a República. Por esta última, obviam-se as desigualdades oriundas da hereditariedade, as distinções jurídicas quanto ao
32 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 414. 33 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 189. 34 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 107.
25
status das pessoas, as autoridades tornam-se representativas do povo e investidas de mandato por prazo certo35.
E, continua:
A Federação implicou a outorga de Poderes Políticos às antigas Províncias, que assim passaram a governar os seus assuntos com autonomia e finanças próprias36.
Desta maneira, pode-se verificar que o Decreto nº. 1, ao passo que é o apogeu da
destituição da monarquia e da Proclamação da República, também vem com acentuada
distinções quanto às classes da população, nada obstante seu cunho mais democrático do que
a sua precedente.
Quanto à divisão dos poderes, assume-se o tripé do Executivo, comandado por um
Presidente, o Legislativo composto pelas casas do Senado e da Câmara dos Deputados, e o
Judiciário, que, fortalecido, ressurge com poderes de controlar os atos legislativos e
administrativos observando-se aos seus servidores as prerrogativas de vitaliciedade e
irredutibilidade de vencimentos. Bane-se, por conseguinte, o Poder Moderador37.
Na Constituição de 1891, o controle de constitucionalidade na forma difusa tem como
modelo o utilizado nos Estados Unidos, cabendo aos juízes e tribunais federais processar e
julgar causas em que alguma das partes fundar a ação, ou a defesa, em disposição da
Constituição Federal, causas propostas contra o governo da União, ou Fazenda Nacional,
fundadas em disposições da Constituição, leis e regulamentos do Poder Executivo, ou em
contratos celebrados com o mesmo governo. Nestes casos, o Tribunal não anulava a lei
inconstitucional, apenas deixava de aplicá-la38.
Assim, tendo sido vedada a atribuição de qualquer jurisdição federal às justiças dos
Estados, cabia ao STF julgar em grau de recurso as questões resolvidas pelos juízes e
tribunais federais e as sentenças de última instância dos Estados, quando se contestasse a
validade de leis ou de atos frente à Constituição, ou, ainda, quando se questionasse acerca da
validade de tratados e leis federais e a decisão fosse contra ela39.
35 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 108. 36 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 108. 37 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 108. 38 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 415. 39 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 415.
26
Detalhadamente, a Constituição de 1981 incorporou a via de exceção para controle de
constitucionalidade e o julgamento incidental de inconstitucionalidade, mediante provocação
das partes, reconhecendo a competência do STF para rever as sentenças da Justiça Estadual
em última instância, quando se questionasse a validade ou aplicação de tratados e leis federais
e a decisão do Tribunal atacada fosse contra ela, quando se contestasse a validade de leis e
atos federais em face da Constituição ou, ainda, de leis federais e a decisão recorrida
considerasse válidos os atos ou leis impugnadas40.
Nessa esteira, Mendes enfatiza que “não havia mais dúvida quanto ao poder outorgado
aos órgãos jurisdicionais para exercer o controle de constitucionalidade”41.
Pode-se notar que, neste regime, o controle de constitucionalidade, embora exercido
pelo STF, só era utilizado quando, em sentenças recorríveis, julgadas em última instância nos
Tribunais Estaduais e em decisões dos juízes e tribunais federais, contestasse-se a validade de
leis ou atos perante a Carta Magna e, ainda, nos casos que a validade das leis e atos federais
face a constituição fossem colocadas à prova quanto sua constitucionalidade, considerando-se
válidas os atos ou leis vistas como inconstitucionais.
2.3 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA
CONSTITUIÇÃO DE 1934
Explica-se de maneira tão sucinta quanto sua duração, visto que seria logo substituída
pela Constituição de 1937, que as principais mudanças trazidas pela Carta Política de 1934
eram: a introdução do nome de Deus no preâmbulo, incorporação de preceitos de direito civil,
social e administrativo, multiplicação dos títulos e capítulos, ficando a Constituição com mais
do dobro de capítulos que tinha a de 1891, o reforço aos vínculos federais, poderes
independentes e coordenados entre si, sufrágio feminino e voto secreto, o Senado com
funções de prover a coordenação dos poderes, manter a continuidade administrativa e velar
pela Constituição, responsabilidade solidária dos Ministros de Estados com o Presidente da
República, a Justiça Militar e Eleitoral como sendo órgãos do Poder Judiciário, o Ministério
Público, o Tribunal de Contas e os Conselhos Técnicos coordenados em Conselhos Gerais, e,
40 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 190. 41 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 192.
27
ainda, a presença de normas reguladoras da ordem econômica e social, da família, educação,
cultura, dos funcionários públicos e segurança nacional42.
Quanto ao controle de constitucionalidade propriamente dito, na vigência da CF/34,
admitia-se recurso extraordinário quando se questionasse vigência ou validade de lei federal
em face da Carta Maior e a decisão do tribunal local que negasse aplicação à lei impugnada; e
quando se contestasse a validade de lei ou ato dos governos locais face à Constituição.
Salientam-se, basicamente, três inovações frente à constituição anterior: I – a atuação do
Senado para suspender a execução das leis declaradas inconstitucionais pelo Judiciário; II – a
necessidade de maioria absoluta de juízes no âmbito dos colegiados quando da decisão acerca
de inconstitucionalidade; e, III – a atribuição ao Procurador para a ação perante a Suprema
Corte visando o exame da constitucionalidade da lei interventiva43.
Gilmar Mendes, explicando o controle de constitucionalidade quando da Constituição
de 1934, enfatiza:
A Constituição de 1934 introduziu profundas e significativas alterações no nosso sistema de controle de constitucionalidade. A par de manter, no art. 76, III, b e c, as disposições contidas na Constituição de 1891, o constituinte determinou que a declaração de inconstitucionalidade somente poderia ser realizada pela maioria da totalidade de membros dos tribunais. Evitava-se a segurança jurídica decorrente das contínuas flutuações de entendimento dos tribunais (art. 179)44.
E continua:
Por outro lado, a Constituição consagrava a competência do Senado Federal para suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo Poder Judiciário, emprestando efeito erga omnes à decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (arts. 91, IV, e 96)45.
Desta forma, em linhas gerais, extrai-se que as inovações trazidas pela Constituinte de
1934 são presentes na Constituição vigente atualmente, qual seja a suspensão pelo Senado
Federal de lei declarada inconstitucional pelo Judiciário, bem como a necessidade de maioria
absoluta de juízes no âmbito do órgão que representam quando se faz necessária a decisão
42 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p.113. 43 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 416. 44 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 192. 45 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 193.
28
sobre inconstitucionalidade, sob pena de nulidade desta decisão se realizada de forma
fracionária.
2.4 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CARTA
POLÍTICA DE 1937
A Constituição de 1934, estribada num modelo liberalista ante os problemas existentes
à época, sucumbiu ao vitorioso golpe de 1937, dando lugar a uma Constituição que primava
pelo cunho extremista e autoritário dos fatos que assomavam o Brasil. Sendo assim, o modelo
democrático e social de 1934 foi substituído por uma Carta Maior inspirada no modelo
fascista, eminentemente autoritário, que dava ao Presidente da República amplos poderes de
intervenção não só no Executivo, mas também no Legislativo e no Judiciário46.
Não sendo de outra maneira, Bastos elucida:
Trata-se, portanto, de documento destinado exclusivamente a institucionalizar um regime autoritário. Não havia a divisão de poderes, embora existissem o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, visto que estes últimos sofriam nítidos amesquinhamentos47.
Isto porque no Legislativo desapareceu o Senado, substituído por um Conselho
Federal, e, o Presidente da República podia sempre que assim lhe aprouvesse, colocar recesso
no Legislativo, quando então a ele incumbia as funções legiferantes. Já quanto ao Poder
Judiciário, este sofreu substancial perda no que diz respeito ao controle de constitucionalidade
das leis já introduzidas, vez que uma vez declarada a inconstitucionalidade de uma lei pelo
Supremo Tribunal Federal, esta era submetida novamente ao legislativo, que poderia rejeitar a
decisão judicial, resultando em consequente alteração da Constituição48.
Quando versa acerca do duvidoso controle de constitucionalidade na vigência do
Texto Magno de 1937, Mendes explica:
A Carta de 1937 traduz um inequívoco retrocesso no sistema de controle de constitucionalidade. Embora não tenha introduzido qualquer modificação no modelo difuso de controle (art. 101, III, b e c), preservando-se, inclusive, a
46 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 118. 47 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 119. 48 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 120.
29
exigência de quorum especial para a declaração de inconstitucionalidade (art. 96), o constituinte rompeu com a tradição jurídica brasileira, consagrando, no art. 96, parágrafo único, princípio segundo o qual, no caso de ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei que, a juízo do Presidente da República, seja necessária ao bem-estar do povo, à promoção ou defesa de interesse nacional de alta monta, poderia o Chefe do Executivo submetê-la novamente ao Parlamento. Confirmada a validade da lei por 2/3 de votos em cada uma das Câmaras tornava-se insubsistente a decisão do Tribunal49.
Ou seja, o controle de constitucionalidade de fato existia no corpo da Constituição de
1937, contudo, tal controle era falho, eis que declarava a inconstitucionalidade de uma lei, o
Presidente da República, alicerçado na premissa de que a lei dada como inconstitucional era
necessária no ordenamento jurídico, tinha a opção de submetê-la novamente ao Poder
Legislativo que, com 2/3 de votos em cada casa legislativa, conferia validade a referida lei, ao
arrepio da Constituição e sobrepujando a decisão do Tribunal que a julgou dotada do vício da
inconstitucionalidade.
Observa-se, neste caso, que ante esta peculiar modalidade de revisão constitucional, a
lei confirmada pelo Legislativo passava a ter força de uma emenda à Constituição50.
É de se lembrar que quando o Presidente Getúlio Vargas editou o Decreto-Lei nº.
1.564, em 1939, confirmando textos de leis declarados inconstitucionais pelo STF, a reação
no Judiciário foi intensa. Assim mesmo, havia doutrinadores à época que defendiam que tais
críticas ao ato presidencial não procediam, pois nada obstante o cunho arbitrário de tal ato, o
Presidente nada mais fizera do que cumprir, como era de seu dever, o prescrito no art. 96 da
Carta Constitucional. Diziam tais doutrinadores que o problema visto pelo Judiciário quando
da desautorização dos atos judiciais, mostrava o quanto o pensamento jurídico era arraigado
no sentido de conferir a declaração judicial um caráter incontrastável, em relação ao caso
concreto51.
De outro norte, quando se fala em particularidades da Constituição de 1937, vigorava
a vedação expressa ao Judiciário, de conhecer das questões exclusivamente políticas, bem
como o mandado de segurança perdeu a qualidade de garantia constitucional, passando a ser
regulamentado por legislação ordinária. Já o Código de Processo Civil de 1939 excluiu a
49 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 195. 50 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 195. 51 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 196.
30
apreciação judicial, na via mandamental, os atos do Presidente da República, dos ministros de
Estado, dos governadores e interventores dos Estados52.
Desta maneira, levando-se em consideração que a Carta Maior de 1937 atendia aos
interesses da ditadura que se estabelecia no Brasil à época, a mesma era dotada de preceitos
vazios, cujo conteúdo efetivo dependia da lei e dos atos governamentais, ou, em outras
palavras, da mentalidade dos dirigentes. Embora não tenha retirado a competência do
Judiciário de pronunciar-se sobre a constitucionalidade de forma difusa, estabeleceram-se
sérias restrições, características do regime governamental em vigor53.
Num caso concreto, exemplificando-se, quando o Supremo Tribunal Federal julgou
inconstitucional um dispositivo do regulamento de imposto de renda, o chefe do governo,
usurpando atribuições que caberia ao Parlamento por dois terços de seus membros, editou um
decreto-lei considerando a decisão do tribunal como alheia ao interesse nacional, e dando
vigência ao dispositivo considerado judicialmente inconstitucional. Desta maneira era o
controle de constitucionalidade nos regimes ditatoriais54.
Destarte, pode-se notar que gerida sob a sombra do autoritarismo, a Constituição de
1937, mesmo prevendo um controle de constitucionalidade das normas e atos normativos,
abria a possibilidade ao Chefe de Estado de, justificando num interesse nacional ou
imprescindibilidade para o bem estar social, a norma declarada inconstitucional pelo
Judiciário, usar de meios previstos na própria Constituição de, tornando válida a lei, anular a
decisão judicial que a declarou inconstitucional, conferindo, desta feita, um caráter de emenda
constitucional à lei, modificando, de forma leviana, o Texto Magno em sua essência.
2.5 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CARTA
MAGNA DE 1946
No que pese seus principais aspectos, a Carta Política de 1946 era uma Constituição
Republicana, Federativa e Democrática, que reconhecia a origem popular de todo poder que é
exercido por mandatários do povo em seu nome e por período certo, dando forças à forma
52 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 197. 53 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 418. 54 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 418.
31
federativa com garantia às autonomias dos Estados, prestigiando-se, como característica
peculiar, o municipalismo como nenhuma outra Constituição até hoje o fez55.
Quanto ao Poder Judiciário, este assume funções importantes, bem como vê as suas
competências majoradas. Assume papel de destaque, e seus membros passam então a gozarem
da vitaliciedade, da irredutibilidade de vencimentos e da inamovibilidade. Sua competência é
engrandecida à medida que se passa a utilizar dois instrumentos importantes: o mandado de
segurança, já agora como garantia constitucional, assim como o papel de julgador da
constitucionalidade das leis56.
Em breves apontamentos, a Carta Maior de 1946 trazia as seguintes características
destacadas: o ressurgimento do bicameralismo no Legislativo composto pela Câmara dos
Deputados e Senado Federal, volta do modelo de tripartição dos poderes, retomada da
normalidade democrática no Executivo dado a obrigatoriedade de o Presidente da República
ser eleito de forma direta para mandato de 5 anos, a titularidade do Vice-Presidente da
República para ocupar a função concomitante de Presidente do Senado Federal, retomada da
normalidade no Judiciário após o período autoritário e reintrodução do mandado de segurança
e ação popular no texto constitucional57.
Com a Constituição de 1946, estabeleceu-se, entre outras considerações, que o ato
arguido de inconstitucionalidade deveria ser submetido ao exame do STF mediante
manifestação do Procurador-Geral da República, e tal ato com possível vício inconstitucional,
assim seria definido quando não assegurasse a observância dos seguintes princípios: a) forma
republicana representativa; b) independência e harmonia dos poderes; c) temporariedade das
funções eletivas, limitada a duração destas à das funções federais correspondentes; d)
proibição da reeleição de governadores e prefeitos para o período imediato; e) autonomia
municipal; f) prestação de contas da administração; e, g) garantias do Poder Judiciário58.
Assim, Mendes quando ensina como funcionava o controle de constitucionalidade na
Carta Maior de 1946, detalha:
O Texto Magno de 1946 restaura a tradição do controle judicial no Direito brasileiro. A par da competência de julgar os recursos ordinários (art. 101, II,
55 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 127. 56 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 128. 57 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11. ed. São Paulo: Método, 2007, p. 91. 58 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 418.
32
a, b e c), disciplinou-se a apreciação dos recursos extraordinários: “a) quando a decisão for contrária a dispositivo desta Constituição ou à letra de tratado ou lei federal; b) quando se questionar sobre a validade de lei federal em face desta Constituição, e a decisão recorrida negar aplicação à lei impugnada; e c) quando se contestar a validade de lei ou ato de governo local em face desta Constituição ou de lei federal, e a decisão recorrida julgar válida a lei ou o ato”. Preservou-se a exigência da maioria absoluta dos membros do Tribunal para a eficácia da decisão declaratória de inconstitucionalidade (art. 200). Manteve-se, também, a atribuição do Senado Federal para suspender a execução da lei declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal (art. 64)59.
Nota-se que a Constituição de 1946 veio restaurando o modelo do controle de
constitucionalidade pelo Judiciário nas hipóteses elencadas, bem como inovou no sentido da
representação interventiva de inconstitucionalidade pelo Procurador-Geral da República, no
caso de violação de determinados princípios.
Neste sentido, é do escólio de Gilmar Ferreira Mendes:
A Constituição de 1946 emprestou nova conformação à ação direta de inconstitucionalidade, introduzida, inicialmente, no Texto Magno de 1934. Atribuiu-se ao Procurador-Geral da República a titularidade da representação de inconstitucionalidade, para os efeitos de intervenção federal, nos casos de violação dos seguintes princípios: a) forma republicana representativa; b) independência e harmonia entre os Poderes; c) temporariedade das funções eletivas, limitada a duração destas à das funções federais correspondentes; d) proibição da reeleição de governadores para o período imediato; e) autonomia municipal; f) prestação de contas da Administração; g) garantias do Poder Judiciário60.
É de se asseverar que embora o constituinte tenha dado a titularidade da ação direta ao
Procurador-Geral da República, o modelo da chamada representação interventiva, desde a
Constituição de 1934 já constituía uma modalidade peculiar de composição de um conflito
entre a União e o Estado. Velava-se a coibição da violação de deveres constitucionalmente
impostos ao ente federado. Tem-se, então, que o poder atribuído ao Procurador-Geral da
República, que na Carta Política de 1946 exercia a função de chefe do Ministério Público
Federal, era de simples representação processual61.
Destaca-se, igualmente, que a arguição de inconstitucionalidade direta teve ampla
utilização no regime da Constituição de 1946. A denominação de “representação” dada ao
novo instituto devia-se a uma escolha entre a reclamação e a representação, que já eram 59 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 197. 60 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 197. 61 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 198.
33
processos conhecidos pelo STF. Dada a análise disto, conduziu-se a escolha do termo
representação feita ao Procurador-Geral, isto porque a função deste era o seu
encaminhamento ao Tribunal, já com o devido parecer62.
Logo, o Supremo Tribunal Federal, exercia, nas palavras de Gilmar Mendes, “a função
de árbitro final do contencioso da inconstitucionalidade. Não se tratava, porém, de afastar,
simplesmente, a aplicação da lei inconstitucional”63.
A Emenda Constitucional nº. 16, de 26/11/1965 introduziu na Constituição de 1946 a
competência originária do STF para conhecer e julgar a representação contra
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, encaminhada pelo
Procurador-Geral da República. Acrescentou ainda, que a lei poderá estabelecer processo, de
competência originária do Tribunal de Justiça, a fim de que se declarasse inconstitucional lei
ou ato do Município em detrimento à Constituição Estadual. Desta maneira, ao final, a
Constituição de 1946, com as alterações da indigitada emenda, admitia o controle direto
concreto e abstrato da constitucionalidade, o controle indireto através de recurso ao STF ou
suscitação incidental nas turmas, o alargamento do objeto de controle, abrangendo leis
federais e estaduais, e a necessidade de maioria absoluta, em qualquer hipótese, para a
declaração de inconstitucionalidade64.
Quando versa sobre a Emenda Constitucional nº. 16/65, Gilmar Mendes delineia:
A implantação do sistema de controle de constitucionalidade, com o objetivo precípuo de preservar o ordenamento jurídico da intromissão de leis com ele inconviventes, veio a somar, aos mecanimos já existentes, um instrumento destinado a defender diretamente o sistema jurídico objetivo65.
E finaliza:
Finalmente, não se deve olvidar que, no tocante ao controle de constitucionalidade da lei municipal, a Emenda n. 16 consagrou, no art. 12, XIII, regra que outorgava ao legislador a faculdade para estabelecer processo de competência originária do Tribunal de Justiça, para declaração de
62 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 198. 63 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 201. 64 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 420. 65 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 206.
34
inconstitucionalidade de lei ou ato do Município em conflito com a Constituição do Estado66.
Não sendo de outra maneira, pode-se chegar ao resultado de que, não obstante a Carta
Magna de 1946 restaurasse os padrões de controle de constitucionalidade, reavivando o
Judiciário quando das suas competências, a Emenda Constitucional de 1965 veio a fomentá-lo
no Brasil, introduzindo e solidificando o controle direto concreto e abstrato da
constitucionalidade bem como o controle indireto quando da remessa de expediente recursal
ao Supremo Tribunal Federal, aumentando, por conseguinte, um eficaz controle das normas
aspirantes a integração ao ordenamento jurídico que nasçam com o vício de afronta a Carta
Maior.
2.6 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CARTA DE
1967 E EMENDA CONSTITUCIONAL 1/69
A Constituição de 1967 foi considerada como centralizadora, tendo em vista que
trouxe para o âmbito federal as competências que antes pertenciam a Estados e Municípios,
reforçando, por conseguinte, os poderes do Presidente da República. Pode-se dizer que, nada
obstante a existência de três Poderes, na prática só existia o Executivo, eis que as
competências do Legislativo e do Judiciário foram diminuídas. Alguns doutrinadores,
acertadamente consideram que nenhuma Constituição em toda história republicana deu tantos
poderes ao Chefe do Executivo quanto a de 1967, seguida pela Emenda Constitucional nº. 1
de 1969, que lhe reforçou o cerne centralizador67.
À medida que o Poder Executivo ganhava forças em matéria legislativa, os poderes
Legislativo e Judiciário sucumbiam, tendo como apogeu de uma nova ordem política
instaurada, o Ato Institucional nº. 5, que dava poderes ao Presidente de, entre outros, decretar
o fechamento do Congresso e Assembleias Estaduais e Câmaras de Vereadores,
oportunidades que ao Executivo eram incumbidas as competências dos mencionados órgãos.
Quanto ao Judiciário, após o Ato Institucional nº. 5, a magistratura vê suspensas as garantias
como vitaliciedade e inamovibilidade, e, tamanho era o autoritarismo do referido ato que o
66 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 206. 67 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 134.
35
art. 11 deste diploma subtraía da apreciação do Judiciário qualquer ato praticado com
fundamento nele, o que gerou muitas demasias excluídas do conhecimento do Judiciário68.
Ratificando o exposto, prestadio é o escólio de José Afonso da Silva, que, versando
sobre a Constituição de 1967, explica:
Essa Constituição [...] entrou em vigor em 15.3.67 [...]. Sofreu ela poderosa influência da Carta Política de 1937, cujas características básicas assimilou. Preocupou-se fundamentalmente com a segurança nacional. Deu mais poderes à União e ao Presidente da República. [...] Reduziu a autonomia individual, permitindo suspensão de direitos e de garantias constitucionais, no que se revela mais autoritária do que as anteriores, salvo a de 193769.
Percebe-se que ante a acentuada centralização na esfera federal, o Executivo vem a
ganhar forças em detrimento do Legislativo e do Judiciário. Características marcantes da
Carta de 1967 eram, além da mencionada brusca concentração do poder no âmbito federal, a
acentuada preocupação com a segurança nacional, o Executivo passando a ser eleito para
mandato de 4 anos, de maneira indireta por sufrágio público e nominal do Colégio Eleitoral
composto pelos membros do Congresso Nacional e de Delegados indicados pelas
Assembléias Legislativas dos Estados, diminuição das competências do Poder Judiciário,
possibilidade exagerada de suspensão de direitos políticos por 10 anos, suspensão da garantia
de habeas corpus em determinados casos, poder de decreto de confisco pelo Presidente da
República, após investigação, de todos quantos tivessem enriquecido ilicitamente no exercício
do cargo ou função70.
Aufere-se em derradeiro na parte histórica, que a Constituição de 1967, embora não
alterasse o controle de constitucionalidade, também representava um retrocesso à democracia,
pois tinha um cerne autoritário e centralizador, eis que, conforme exposto, espelhava-se em
muito na precedente Carta Magna de 1937.
Já quanto ao controle de constitucionalidade, consoante a Carta de 1967 com a
Emenda 1/69, competia originariamente, ao STF, julgar a representação do Procurador-Geral
da República, por inconstitucionalidade ou para interpretação de ato normativo federal ou
estadual. Ainda, era de competência do STF, julgar em sede de recurso extraordinário,
decisões finais que contrariassem à Constituição ou negassem vigência de tratado ou lei
68 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 136. 69 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 86 70 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 93.
36
federal, bem como as que declarassem inconstitucionais tratados ou leis federais, e, ainda, que
julgassem válida lei ou ato de governo local contestado ao arrepio da Constituição ou de lei
federal. Todavia, somente por maioria absoluta de seus membros, poderia o tribunal declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo. Desta forma, admitia-se, na Constituição da
República de 1967, o controle difuso, o controle direto concreto e abstrato, a maioria absoluta
para declaração de inconstitucionalidade, a abrangência de lei federal e estadual, a
possibilidade de que a Constituição Estadual regulasse a intervenção no município, com
observância ao disposto em seu texto, e a medida liminar nas ações relativas à
inconstitucionalidade71.
Explanando acerca do controle de constitucionalidade a Constituição de 1967, Mendes
preconiza:
A Constituição de 1967 não trouxe grandes inovações no sistema de controle de constitucionalidade. Manteve-se incólume o controle difuso. A ação direta de inconstitucionalidade subsistiu, tal como prevista na Constituição de 1946, com a Emenda n. 16, de 196572.
Cumpre-se mencionar que o Texto de 1967 não incorporou o disposto na Emenda nº.
16 da Constituição precedente, no que diz respeito à permissão da criação do processo de
competência originária dos Tribunais de Justiça dos Estados, para a declaração de lei ou ato
dos municípios, editados à margem das Constituições dos Estados. Neste viés, a Emenda
Constitucional nº. 1, de 1969, previu, expressamente, o controle de constitucionalidade de lei
municipal, em face da Constituição Estadual, para fins de intervenção no município editor da
lei dada como inconstitucional73.
Deste modo, nota-se que embora dotada de um caráter negativo decorrente do
autoritarismo e centralização de poder, o controle de constitucionalidade no regime
constitucional da Carta Política de 1967 não sofreu grandes intervenções, mantendo-se, por
exemplo, o controle difuso de constitucionalidade e a ação direta de inconstitucionalidade.
71 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 420. 72 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 206. 73 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 206.
37
2.7 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE SOB O REGIME DA CARTA DE
1988 (COM A EC 3/93)
A atual Constituição começou seu processo de nascimento no dia 27 de janeiro de
1988, quando o plenário, então, se reuniu para dar início às votações, e, já no dia posterior, 28
de janeiro de 1988, teve aprovada as primeiras matérias: o preâmbulo e o Título I. Após um
longo período de deliberações com tomadas de decisões de grande impacto nacional, no final
de julho de 1988 inicia-se o 2º turno de votação. Não obstante ao persistente absenteísmo de
uma parcela dos constituintes, o clima de cansaço que a partir de certo ponto se abateu sobre
os mesmos e a Nação, somado à aproximação dos pleitos municipais, fez com que a
Constituinte se voltasse para um trabalho denominado “concentrado”, que não deixou de
trazer consigo uma grande dose de precipitação e inconsciência, surgindo ao final um clima
festivo, frente ao trabalho exaustivo que se concluía74.
Já entrando no assunto do controle de constitucionalidade, na atual Carta da
Primavera, se finda o monopólio da ação por parte do Procurador-Geral da República. Isto
porque, embora a existência de grande discussão a respeito deste particular, a jurisprudência
era consolidada sobre o assunto. Contudo, tal discussão veio a ser acolhida pela constituinte
de 1988, que, embora mantivesse o Procurador-Geral da República como legítimo para propor
ação de inconstitucionalidade, alargou a legitimidade para diversos órgãos e entes para
referida propositura75.
Neste diapasão, oportuna a manifestação doutrinária do jurista Gilmar Mendes:
Nos termos do art. 103 da Constituição de 1988 dispõem de legitimidade para propor a ação de inconstitucionalidade o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa de uma Assembléia Legislativa, o Governador do Estado, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso Nacional, as confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional76.
É flagrante, deste modo, que, ante a insatisfação geral da permissão exclusiva do
Procurador-Geral da República e a inércia da jurisprudência visando modificar tal premissa,
que a Constituição Federal de 1988 vem ao encontro do clamor, no sentido de, embora
74 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, p. 149. 75 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 207. 76 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 207.
38
mantendo o Procurador-Geral como um órgão legítimo para propor ação de
inconstitucionalidade, aumenta a lista de órgãos e entes legitimados para interpor ação
buscando tutela judicial à Carta Magna quando do confronto de leis e atos normativos paridos
em lesão à mesma.
Assim, notório que a Carta Política de 1988, ao ampliar de forma marcante, a
legitimação para propositura de ação direta de inconstitucionalidade, reduziu,
significativamente, o controle de constitucionalidade incidental ou difuso. Isso porque
permitiu que, praticamente, todas as controvérsias constitucionais dotadas de relevância,
sejam submetidas diretamente ao STF, fazendo jus ao processo de controle abstrato de
normas77.
Ainda apenas pincelando acerca da jurisdição constitucional do STF no atual regime
da Carta Política de 1988, Nogueira da Silva completa:
A Constituição atual ampliou a jurisdição constitucional do Supremo, na medida em que criou o mandado de injunção e o habeas data, mas, principalmente, ao encerrar a antiga controvérsia doutrinária, agasalhando a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Além disso, para não deixar qualquer dúvida quanto à natureza que atribuiu ao tribunal, declara desde logo que a ele “compete”, precipuamente, a guarda da Constituição78.
Voltando ao mencionado alargamento da legitimidade para propositura da ação direta
de inconstitucionalidade perante o Supremo, Mendes destaca:
Ao lado desta ampla legitimação para a provocação do controle abstrato de normas, cuidou o constituinte de instituir mecanismo (art. 5º, LXXI) para a tutela de direitos subjetivos lesados em decorrência da omissão normativa. No mesmo passo, instituiu-se ainda processo de controle abstrato da omissão normativa constitucional (art. 103, § 2º), instituto – a exemplo do anterior – ainda carente de conformação definitiva79.
Quanto ao controle de constitucionalidade propriamente dito em vigência atualmente,
a atual Constituição apresenta os seguintes aspectos: amplo controle difuso, com recurso
extraordinário ao STF; ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, federal ou
estadual; ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, com
eficácia vinculante; ação de inconstitucionalidade por omissão; o fato de que a 77 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 208. 78 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. A evolução do controle de constitucionalidade e a competência do Senado Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992. p. 104. 79 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 210.
39
inconstitucionalidade pode ser apreciada em tese ou em caso concreto; o fato de que o
Procurador-Geral da República tem legitimidade vinculada à sua função institucional; a
possibilidade de medida cautelar nas demandas citadas; a arguição de descumprimento de
preceito fundamental veio a ter o seu processo regulado pela Lei n. 9.882/9980.
Curial esmiuçar, ainda, a evolução do controle de constitucionalidade no Brasil,
mesmo após a última e atual Constituição Federal de 1988, como por exemplo, a edição da
Emenda Constitucional nº. 3 de 1993 que introduz a ação declaratória de constitucionalidade,
da Lei nº. 9.868/99 que regulamenta a ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória
de constitucionalidade, e, da Lei nº. 9.882/99 que regulamenta a ação de argüição de
descumprimento de preceito fundamental.
Discorrendo acerca da Emenda Constitucional nº. 3 de 1993, que institui a ação
declaratória de constitucionalidade, Gilmar Mendes leciona:
A Emenda Constitucional n. 3, de 17 de março de 1993, disciplinou o instituto firmando a competência do Supremo Tribunal Federal para conhecer e julgar a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, processo cuja decisão definitiva de mérito possuirá eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Executivo e do Judiciário. Conferiu-se legitimidade ativa ao Presidente da República, à Mesa do Senado Federal, à Mesa da Câmara dos Deputados e ao Procurador-Geral da República. Considerando a súbita repercussão da introdução do instituto, cumpra agora cogitar-se se represente ele um novum no modelo brasileiro de controle de constitucionalidade81.
Logo, é nítido que o legislador quando da inserção da referida Emenda Constitucional,
procurou inovar e aprimorar o controle de constitucionalidade no Brasil, embora conferindo a
legitimidade para propositura da ação a pequena parcela de órgãos.
No tocante às Leis nº. 9.868 de 10/11/1999 e nº. 9.882 de 03/12/1999, encontra-se um
passo mais recente da evolução do controle de constitucionalidade das normas no Brasil, eis
que se tratam de dois textos normativos que surgiram para disciplinar instrumentos
processuais destinados ao controle de constitucionalidade, quais sejam, a arguição de
descumprimento de preceito fundamental (pela Lei nº. 9.882/99), que pode conferir nova
conformação ao controle de constitucionalidade entre nós, e, a ação direta de
80 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 422. 81 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, p. 210.
40
inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade (ambas pela Lei nº.
9.868/99), que ganham regulamentação quanto ao seu processamento e julgamento.
Ante o exposto, pode-se auferir que não obstante as Constituições, com exceção à
Constituição de 1937, tinham princípios e disposições conhecidas atualmente, o processo
evolutivo do controle de constitucionalidade só foi aprimorado com o decorrer do processo
constituinte legiferante, isto por que, o legislador buscou, de forma paulatina e gradativa, com
o avanço social e econômico, a assegurar o diploma constitucional, garantindo, cada vez mais,
meios para que se busque reparar ou evitar afrontas ao texto constitucional, tido como norma
máxima em nosso ordenamento jurídico vigente.
41
3 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E SUAS AÇÕES ESPECÍFICAS
Neste momento, faz-se oportuno expor os conceitos e as noções acerca do tema em
debate. Assim, é de bom alvitre que se traga à baila, noções de direito constitucional e do
controle concentrado de constitucionalidade de forma ampla, antes de, propriamente, adentrar
no cerne da pesquisa, qual seja, a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental.
Para fins de ilustração, necessária uma classificação geral do controle de
constitucionalidade da seguinte forma: I – Inconstitucionalidade pode ser por ação (formal ou
material) ou por omissão; II – Formas do controle de constitucionalidade pode ser preventivo
ou repressivo; III – Órgãos de controle podem ser político ou judiciário; IV – Critérios de
controle podem ser difuso ou concentrado; V – Meios de controle podem ser incidental ou
principal; VI – Efeitos da decisão que declara inconstitucionalidade pode ser inter partes ou
erga omnes; e, VII – Retroatividade da decisão acerca da constitucionalidade pode ser ex tunc
ou ex nunc82.
Nesse sentido, imprescindível que se desmembre a classificação acima consignada, a
fim de maior esclarecimento quanto ao esquema do controle de constitucionalidade adotado,
hodiernamente, em nosso País.
Seguindo a classificação acima, temos em primeiro lugar a diferença entre a
inconstitucionalidade formal por ação, que é a produção de atos legislativos e/ou normativos
sem a devida observância do processo legislativo disposto na Constituição, a
inconstitucionalidade material por ação, que constitui a produção de atos legislativos e/ou
normativos editados ao arrepio da Carta Magna e, a inconstitucionalidade por omissão que é a
ausência de atos legislativos e/ou normativos que, por não existirem, impossibilitam o
cumprimento de preceitos presentes na Constituição83.
A seguir, curial a explicação acerca da distinção entre a forma de controle de
constitucionalidade, que pode ser preventivo, antes de a norma adquirir eficácia e validade,
82 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 32. 83 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 33.
42
integrando o ordenamento jurídico, e, repressivo, que visa retirar do ordenamento jurídico
uma lei ou ato normativo promulgado com vício de inconstitucionalidade84.
Vencida esta etapa, fala-se dos órgãos de controle: político ou judiciário. Tem-se o
controle político quando referida verificação de constitucionalidade é exercido por órgão não
pertencente ao Judiciário, como no caso de um Conselho ou Comissão Constitucional
presentes no Legislativo ou da possibilidade do Chefe do Executivo vetar o projeto de lei que
considerar inconstitucional85.
Na sequência, temos os critérios do controle de constitucionalidade, quais sejam, o
difuso e o concentrado. No difuso, o controle da constitucionalidade é exercido por todos os
que integram o Judiciário, podendo qualquer juiz ou tribunal declarar a inconstitucionalidade
da lei no caso em que examinar. Já no concentrado, o controle é exercido somente por um
Tribunal Superior no país, que no Brasil é o Supremo Tribunal Federal86.
Quanto aos meios utilizados para controle do contido no Texto Constitucional, temos
o meio incidental, também nominado como via de defesa, oportunidade em que o objeto da
ação é a satisfação de um direito individual ou coletivo, alegando-se, por conseguinte, de
forma incidental, a ofensa do ato legislativo ou normativo à Carta Maior. Já no meio
principal, também referido como via de ação, o objeto é, exatamente, a declaração da
inconstitucionalidade do ato legislativo ou normativo87.
Derradeiro, quanto aos efeitos da decisão, estes podem ser inter partes (produz efeito
somente entre os litigantes, os integrantes da relação processual) ou erga omnes (produz
eficácia contra todos, sendo um efeito da constitucionalidade exercido por meio da via de
ação). E, a natureza da decisão pode ser classificada como sendo ex tunc (retroage, atingindo
a lei e todas as suas consequências jurídicas, desde sua origem) ou ex nunc (não retroage,
produzindo efeitos somente a partir de sua publicação, sem atingir consequências pretéritas)88.
84 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 34. 85 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 35. 86 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 35. 87 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 35. 88 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 36.
43
3.1 CONCEITO DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
Para que se compreenda o controle de constitucionalidade se faz necessária a
compreensão de que a Constituição é a norma ou o conjunto normativo de maior relevância
em nosso ordenamento jurídico, e, sendo assim, todas as demais só terão validade se forem
recepcionadas pela mesma, sob pena de serem declaradas inconstitucionais e ineficazes.
Neste sentido, Moraes assevera que a idéia de controle de constitucionalidade está
ligada à Supremacia da Constituição e à rigidez constitucional. Desta forma, a existência de
um escalonamento normativo é pressuposto necessário para a supremacia constitucional, e,
pode-se observar que nas constituições rígidas se verifica a superioridade da norma magna em
relação àquelas produzidas pelo Legislativo89.
Chimenti, quando versa acerca da Supremacia da Constituição, ratifica:
O controle de constitucionalidade tem por pressuposto que a Constituição é a norma mais importante de um país e por isso deve ter protegidos sua supremacia e os direitos e garantias dela decorrentes. Dessa supremacia, oriunda não só do conteúdo da norma constitucional mas também do processo especial que cerca a sua elaboração, decorre o princípio da compatibilidade vertical, segundo o qual a validade da norma inferior depende de sua compatibilidade com a Constituição da República90.
Ainda, Lenza, quando discorre acerca da rigidez e da supremacia da Constituição
perante as outras normas, conceitua que, quanto à rigidez, verifica-se tal peculiaridade quando
a Constituição possui um processo de alteração mais dificultoso, árduo e solene do que o
processo de alteração das demais normas. Em decorrência desta rigidez, nota-se a supremacia
da constituição, isto por que a ideia de controle emanada da rigidez, ou seja, pressupõe um
escalonamento normativo em que a Constituinte ocupa o grau máximo na relação hierárquica,
sendo considerada norma de validade para os demais atos normativos do sistema91.
Assim, pode-se concluir que o controle de constitucionalidade está intimamente ligado
à ideia de rigidez constitucional, isto porque sem a rigidez constitucional a legislação inferior
subsequente à Constituição revogaria a norma constitucional e não haveria o que controlar.
89 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 598. 90 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 394 91 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 149.
44
Logo, segundo Capez, “controle de constitucionalidade é a verificação da
compatibilidade vertical que, necessariamente, deve haver entre a norma constitucional e as
regras a ela subordinadas”92.
Destarte, em suma, podemos destacar que, “controlar a constitucionalidade do ato
normativo, significa impedir a subsistência da eficácia de norma contrária à Constituição”93.
Ou, nas palavras de Moraes, “controlar a constitucionalidade significa verificar a
adequação (compatibilidade) de uma lei ou de um ato normativo com a constituição,
verificando seus requisitos formais e materiais”94.
Com efeito, é flagrante que num Estado como o brasileiro, onde a Constituição da
República é rígida e qualquer alteração em seu texto se dá de forma árdua e solene, todas as
normas a serem promulgadas devem ir ao encontro do texto constitucional, isto por que, em
caso de afronta à Carta Magna, a eficácia e validade de determinada norma editada em
desacordo com a Constituinte, serão cassadas e consequentemente, tal norma será revogada.
3.2 O CONTROLE PREVENTIVO DE CONSTITUCIONALIDADE
O controle ou fiscalização preventiva da constitucionalidade é aquele que se dá antes
do ingresso da norma, cuja constitucionalidade está sendo averiguada, no ordenamento
jurídico brasileiro. Assim, tem-se que o controle de constitucionalidade preventivo visa
impedir, através de prévia análise, a vigência de normas ou atos normativos que estejam em
desacordo com a Constituição da República.
Na esteira do conceito de controle preventivo de constitucionalidade, Peña de Moraes
explica que este controle difere do controle repressivo, conforme o momento do exercício,
sendo o primeiro “realizado sobre a proposta de emenda ou projeto de lei, não tendo a norma
adquirido vigência”95.
Em outras palavras, e ainda buscando-se esclarecer o conceito de controle preventivo
de constitucionalidade, pode-se afirmar que é o controle feito antes da elaboração da lei,
92 CAPEZ, Fernando. Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Damásio de Jesus, 2003, p. 74. 93 CAPEZ. Fernando. Direito Constitucional, p. 74. 94 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 600. 95 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 144.
45
impedindo que um projeto de lei inconstitucional venha a ser promulgado. Considerando que
o controle preventivo se dá antes da aquisição de vigência e eficácia da lei, observa-se que, na
verdade, ele acontece quando da apreciação do projeto de lei ainda no berçário legiferante.
Isto se levando em consideração que toda Casa Legislativa tem uma Comissão de
Constituição e Justiça, ou órgão equiparado, cuja função primordial é justamente verificar a
constitucionalidade do projeto de lei apresentado para aprovação. Pontua-se que na esfera
Executiva, o controle preventivo de constitucionalidade se dá pelo veto do Presidente da
República ao projeto de lei aprovado no âmbito Legislativo96.
Já Chimenti, quando fala dos órgãos que controlam a constitucionalidade de forma
preventiva no Brasil, exemplifica:
São órgãos controladores preventivos a Comissão de Constituição e Justiça e Redação da Câmara e a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, cujos pareceres negativos em regra são conclusivos, salvo se o plenário os invalidar dando provimento a recurso apresentado por, no mínimo, 1/10 dos parlamentares da Casa Legislativa a que pertence a comissão. Ademais, o próprio plenário da Casa pode rejeitar proposta inconstitucional97.
E continua Chimenti, asseverando que “por meio de veto jurídico o Presidente da
República e demais chefes do Poder Executivo, cada um deles na sua esfera de competência,
realizam o controle preventivo”98.
Quanto à hipótese do controle preventivo pelas Comissões de Constituição e Justiça,
Moraes explica que se tratam das comissões permanentes cuja existência está prevista no
regimento interno de cada casa legislativa e com função precípua de analisar a
compatibilidade do projeto de lei ou proposta de emenda constitucional apresentados com o
texto da Constituição Federal. Este tipo de controle de constitucionalidade poderá ser
realizado, também pelo plenário da casa legislativa, na hipótese de rejeição do projeto de lei
por inconstitucionalidade99.
Acerca da segunda hipótese, qual seja o veto jurídico, Moraes preceitua que esta reside
na possibilidade da participação do chefe do Poder Executivo no controle de
constitucionalidade preventivo. Neste caso, o Presidente da República poderá vetar o projeto
96 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais, p. 34. 97 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et. al.]. Curso de Direito Constitucional, p 398. 98 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et. al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 398. 99 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 605.
46
de lei aprovado pelo Congresso Nacional por entendê-lo inconstitucional. É o chamado veto
jurídico100.
Lenza quando conceitua o controle preventivo define como sendo:
O controle realizado durante o processo legislativo de formação do ato normativo. Logo no momento de apresentação de um projeto de lei, o iniciador, a “pessoa”que deflagrar o processo legislativo, em tese, já deve verificar a regularidade material do aludido projeto de lei101.
Ainda, classificando o controle preventivo, Lenza enumera, além dos já citados, o
controle preventivo realizado pelo Poder Judiciário:
[...] a única hipótese de controle preventivo a ser realizado pelo Judiciário sobre projeto de lei em trâmite na Casa Legislativa é para garantir ao parlamentar o devido processo legislativo, vedando a sua participação em procedimento desconforme com as regras da Constituição. Trata-se, como visto, de controle exercido, no caso concreto, pelos parlamentares, pela via de exceção ou defesa, ou seja, o controle difuso de Constitucionalidade102.
Capez afirma que o controle preventivo, também nominado controle lato de
constitucionalidade, se destina a impedir o ingresso no sistema de normas que, em seu
projeto, já revelam desconformidade com a Constituição, atuando, desta feita, antes da própria
existência da lei103.
Podemos extrair, desta forma, que o controle preventivo é a fiscalização, o controle
prévio exercido na maioria dos casos pelo Poder Legislativo, de uma norma na fase de edição
da mesma, a fim de garantir que o disposto em seu texto e também os seus efeitos na prática
não firam a Constituição. Este controle visa garantir o bloqueio da introdução de leis ou atos
normativos que afrontem à Constituição da República, ao ordenamento jurídico vigente.
3.3 O CONTROLE REPRESSIVO DE CONSTITUCIONALIDADE
No Brasil, via de regra, adota-se o controle repressivo de constitucionalidade, onde o
próprio Poder Judiciário é quem realiza o controle da lei ou do ato normativo, já editados, 100 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 606. 101 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 161. 102 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 163. 103 CAPEZ, Fernando. Direito Constitucional, p. 75.
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perante a Constituição, visando retirá-los do ordenamento jurídico uma vez que contrários à
Carta Magna. O Judiciário utiliza-se de dois sistemas de controle de constitucionalidade
repressivo: o concentrado (via de ação) e o difuso (via de exceção), e, excepcionalmente, o
poder Legislativo poderá exercer o controle repressivo de constitucionalidade, podendo retirar
normas editadas, com plena vigência e eficácia, do ordenamento jurídico, deixando estas de
produzir seus efeitos, por apresentarem um vício de inconstitucionalidade104.
O controle repressivo será realizado sobre a lei e não mais sobre o projeto de lei, como
ocorre no controle preventivo. Neste caso, os órgãos incumbidos do controle verificarão se a
lei, ato normativo ou qualquer ato com caráter normativo, possuem um vício formal
(originário do seu processo de formação) ou um vício material (em seu conteúdo)105.
Peña de Moraes esclarece que o controle repressivo vem agir “sobre Emenda ou Lei,
tendo a norma adquirido vigência, com o desiderato de elidir a presunção relativa de validade
ou confirmá-la em presunção absoluta de validade”106.
Segundo Chimenti, a finalidade do controle repressivo é afastar a incidência de uma
norma inconstitucional. Logo, o controle repressivo é efetivado de forma ampla pelo
Judiciário e, excepcionalmente, pelo Executivo ou Legislativo107.
Assim, no entendimento de Chimenti, o Poder Legislativo tem poderes para editar
decreto legislativo sustando atos normativos do Presidente da República que exorbitem o
poder regulamentar bem como pode rejeitar medida provisória inconstitucional; os Tribunais
de Contas, por sua vez, considerados órgãos normalmente auxiliares do Legislativo, podem,
em casos concretos, também, deixar de aplicar leis e atos normativos que considerarem
inconstitucionais108.
Chimenti, quando destaca a possibilidade de o controle de constitucionalidade
repressivo ser exercido pelo Poder Executivo, esclarece:
Quanto ao Poder Executivo, prevalece o entendimento, fundado no inciso I do art. 23 da CF (pelo qual é da competência comum da União, dos Estados, do DF e dos Municípios zelar pela guarda da Constituição), segundo o qual, por ato administrativo expresso e formal, o Presidente da República, os
104 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 606. 105 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 165. 106 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 144 107 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et. al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 399. 108 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et. al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 399.
48
governadores e os prefeitos (mas não os seus subalternos), nos limites da sua competência (prefeito não pode deixar de cumprir lei estadual ou federal), podem negar cumprimento a uma lei ou ato normativo que entendam flagrantemente inconstitucional, até que a questão seja apreciada pelo Poder Judiciário (STF, RTJ, 151/331). As posições contrárias a esse entendimento majoritário sustentam que o controle pelo Poder Executivo fere a presunção de constitucionalidade das leis e gera insegurança jurídica109.
Logo, nota-se que o controle repressivo de constitucionalidade, primordialmente, é
exercido pelo Poder Judiciário (de forma difusa ou concentrada), contudo, admite-se que,
excepcionalmente, o controle de constitucionalidade seja exercido, também, pelo Poder
Legislativo quando da edição de atos que sustem decretos normativos do Executivo e rejeitam
medidas provisórias, bem como, pelo Poder Executivo quando, no limite de suas
competências, negam cumprimento à lei considerada inconstitucional até o deslinde judicial.
3.3.1 Controle Repressivo de Constitucionalidade Exercido pelo Legislativo
Como visto, o Poder Legislativo, excepcionalmente, poderá exercer o controle
repressivo de constitucionalidade quando editam decretos que suspendem atos normativos do
Chefe do Executivo que ultrapassem o poder regulamentar ou os limites da delegação
legislativa, bem como quando rejeitam medidas provisórias editadas pelo Executivo e
consideradas inconstitucionais.
Desta maneira, a primeira hipótese de controle repressivo realizado pelo Poder
Legislativo reside no artigo 49, inciso V, da Constituição Federal, que garante competência do
Congresso Nacional sustar os atos do Poder Executivo que ultrapassem, exorbitem do poder
regulamentar ou dos limites de delegação legislativa. Quando uma das situações elencadas
ocorrer, poderá o Congresso Nacional editar um decreto legislativo sustando o decreto
presidencial ou a lei delegada, por desrespeito à forma constitucional prevista para sua
edição110.
Já a segunda hipótese de controle de constitucionalidade repressivo exercido pelo
Poder Legislativo faz referência ao artigo 62 da Constituição Federal, e, trata-se do processo
em que, uma vez editada uma medida provisória pelo Presidente da República, esta terá
vigência e eficácia imediata, e força de lei, pelo prazo de sessenta dias, devendo ser submetida
109 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et. al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 399. 110 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 606.
49
de imediato ao Congresso Nacional, que poderá tanto aprová-la convertendo-a em lei, quanto
rejeitá-la, por várias causas, inclusive, inconstitucionalidade111.
Nesta esteira, Moraes ensina:
Na hipótese de o Congresso Nacional rejeitar a medida provisória, com base em inconstitucionalidade apontada no parecer da comissão temporária mista, estará exercendo controle de constitucionalidade repressivo, pois retirará do ordenamento jurídico a medida provisória flagrantemente inconstitucional112.
E continua o Professor Moraes em seu escólio:
Nota-se que, enquanto espécie normativa, a medida provisória, uma vez editada, está perfeita e acabada, já tendo ingressado no ordenamento jurídico com força de lei independentemente de sua natureza temporária. Assim, o fato de o Congresso Nacional rejeitá-la, impedindo que converta-se em lei, ou mesmo que fosse reeditada por ausência de deliberação, em face da flagrante inconstitucionalidade, consubstancia-se em controle repressivo113.
E, ainda, Moraes, discorrendo acerca do controle de constitucionalidade das medidas
provisórias, conclui:
Consagrando a idéia de existência de controle de constitucionalidade repressivo exercido em relação às medidas provisórias, por tratarem-se de atos normativos perfeitos e acabados, apesar do caráter temporário, o Supremo Tribunal Federal admite serem as mesmas objeto de ação direta de inconstitucionalidade, ressaltando que a edição de medida provisória, pelo Presidente da República, reveste-se de dois momentos significativos e inconfundíveis: o primeiro diz respeito a um ato normativo, com eficácia imediata de lei; o segundo é a sujeição desse ato ao Congresso Nacional, para que este não apenas ratifique seus efeitos, mas a converta em lei, com eficácia, definitiva. Dessa maneira, esse ato normativo poderá ser objeto de controle repressivo de constitucionalidade, seja por via de ação direta de inconstitucionalidade, seja por parte do Poder Legislativo114.
Extrai-se, por conseguinte, que o Poder Legislativo também será, dentro de suas
atribuições, competente para exercer o controle de constitucionalidade repressivo, uma vez
que os atos normativos presidenciais e as medidas provisórias estarão sujeitas à ratificação
pelo Congresso Nacional. Deste modo, a consequente rejeição é uma forma de controle
repressivo de constitucionalidade, uma vez que a medida provisória exaurida ou o ato
111 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 607. 112 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 607. 113 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 607. 114 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 607.
50
normativo sustado já tinha adquirido plena eficácia com força de lei antes que fosse
submetida a analise do Poder Legislativo.
3.3.2 O Controle Repressivo de Constitucionalidade Exercido pelo Judiciário
No Brasil o controle de constitucionalidade repressivo é exercido de duas formas: o
controle repressivo difuso e o controle repressivo concentrado. Levando-se em consideração
que o Supremo Tribunal Federal, a quem cabe, primordialmente, a guarda da Constituição,
exerce, através de julgamentos a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo
federal e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, a este
cabe o controle concentrado de constitucionalidade, enquanto que, os demais tribunais,
quando, ao afirmar por maioria absoluta de seus membros, a inconstitucionalidade de lei ou
ato normativo do Poder Público, exercem o controle difuso de constitucionalidade115.
Na esteira de elucidar o controle repressivo de constitucionalidade, Peña de Moraes
leciona:
O controle repressivo, implementado por órgão de natureza judicial, propicia a declaração de inconstitucionalidade de emenda à Constituição ou lei pelo Poder Judiciário [...]. A propósito, excepcionalmente, há a possibilidade de exercício de controle repressivo-político, na hipótese de sustação de atos normativos do Poder Executivo que exorbitem dos limites de delegação legislativa, com fulcro no art. 49, inc. V[...]116.
Logo, resta claro que o controle repressivo exercido pelo judiciário divide-se entre um
controle difuso, que é aquele exercido quando da prolação de decisões por juízes ou tribunais
que declarem inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e, um controle chamado
concentrado que é o oriundo da competência do STF para conhecer e julgar, por exemplo, a
ação direta de inconstitucionalidade de determinada lei ou ato normativo.
Vencida esta etapa conceitual, mister que se verse acerca do controle difuso e do
controle concentrado de constitucionalidade que vigoram no Brasil. Assim, é imprescindível o
estudo de cada um com suas particularidades e ações específicas, voltadas, em seu âmago,
para a proteção ao Texto Magno.
115 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 607. 116 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 147.
51
3.3.2.1 O Controle Difuso de Constitucionalidade
Historicamente, pode-se afirmar que o controle difuso de constitucionalidade teve
como berço o célebre caso, já citado neste trabalho, de Marbury v. Madison, em 1803. Tem-se
que o juiz estadunidense John Marshall, da Suprema Corte norte-americana, apreciando o
mencionado case, decidiu que, havendo conflito entre a aplicação de uma lei em um caso
concreto e a Constituição, deve prevalecer a Constituição por ser hierarquicamente
superior117.
O controle difuso, também conhecido como controle por via de exceção ou defesa,
nada mais é do que a permissão a qualquer juiz ou tribunal averiguar no caso concreto a
análise acerca da compatibilidade do ordenamento jurídico com a Carta Maior118.
Nesta linha, Moraes discorre:
Na via de exceção, a pronúncia do Judiciário, sobre a inconstitucionalidade, não é feita enquanto manifestação sobre o objeto principal da lide, mas sim sobre questão prévia, indispensável ao julgamento do mérito. Nesta via, o que é outorgado ao interessado é obter a declaração de inconstitucionalidade somente para o efeito de isentá-lo, no caso concreto, do cumprimento da lei ou ato, produzidos em desacordo com a Lei Maior. Entretanto, este ao ou lei permanecem válidos no que se refere à sua força obrigatória com relação a terceiros119.
E continua:
O controle difuso caracteriza-se, principalmente, pelo fato de ser exercitável somente perante um caso concreto a ser decidido pelo Poder Judiciário. Assim, posto um litígio em juízo, o Poder Judiciário deverá solucioná-lo e para tanto, incidentalmente, deverá analisar a constitucionalidade ou não da lei ou do ato normativo. A declaração de inconstitucionalidade é necessária para o deslinde do caso concreto, não sendo pois objeto principal da ação120.
Quanto a questão do artigo 97121 da Constituição Federal, Moraes ainda explica que a
inconstitucionalidade de ato normativo estatal só poderá ser declarada pelo voto de maioria
absoluta da totalidade dos membros do tribunal ou, onde houver, dos integrantes do órgão
117 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 174. 118 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 608. 119 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 608. 120 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 610. 121 Constituição Federal de 1988 – “Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.”
52
especial competente, sob pena de atribuir-se nulidade absoluta da decisão emanada do órgão
fracionário, em respeito ao disposto no referido artigo constitucional. Desta forma, esta
chamada “cláusula de reserva de plenário” vem como uma condição de eficácia jurídica da
declaração jurisdicional de inconstitucionalidade dos atos do Poder Público, aplicando-se para
todos os tribunais, via difusa122.
Ainda, salutar que se faça menção à súmula vinculante nº 10123 do Pretório Excelso,
que ratifica o mencionado, explicitando que o tribunal que de maneira fracionária, mesmo não
declarando expressamente a constitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público,
mas tão somente afasta sua incidência no todo ou em parte, viola a cláusula de reserva de
plenário prevista no art. 97 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
O controle difuso de constitucionalidade também poderá surtir efeitos através do
Senado Federal. Assim, quando o Supremo Tribunal Federal, declarar por maioria absoluta de
seus membros, a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo do Poder Público, deverá
oficiar o Senado Federal para que este, através de resolução, suspenda a execução, no todo ou
em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal
Federal. O Regimento Interno do Senado Federal prevê que, proferida em decisão definitiva
pelo Supremo Tribunal Federal, de inconstitucionalidade, conhecerá da declaração mediante
comunicação do Presidente do Tribunal, representação do Procurador-Geral da República, ou,
por meio de projeto de iniciativa da comissão de constituição, justiça e cidadania124.
Neste entendimento, Moraes ressalta:
A declaração de inconstitucionalidade é do Supremo, mas a suspensão é função do Senado. Sem a declaração, o Senado não se movimenta, pois não lhe é dado suspender a execução de lei ou decreto não declarado inconstitucional, porém a tarefa constitucional de aplicação destes efeitos é sua, no exercício de sua atividade legiferante125.
Desta maneira, pode-se observar que também o Senado Federal, no limite de sua
competência poderá exercer o controle difuso de constitucionalidade. Isto por que, na hipótese
do Supremo Tribunal Federal declarar, em decisão definitiva, por maioria absoluta de seus
122 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 611. 123 BRASIL. Súmula vinculante número 10 do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/Sumulas_Vinculantes_1_a_16.pdf> Acessado em 21/06/2009. 124 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 612. 125 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 613.
53
membros, a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, esta declaração servirá de
espeque jurídico para que o Senado atue na suspensão de referido diploma legal considerado
afronta à Carta Magna.
Conforme visto, o controle de constitucionalidade difuso caracteriza-se,
principalmente, pelo fato de ser aplicado exatamente em um caso concreto a ser apreciado
pelo Judiciário. Logo, quando colocado em litígio, o Judiciário, no afã de solucionar a
demanda judicial, analisará a constitucionalidade ou não de lei ou ato normativo (municipal,
estadual, distrital ou federal).
De outro lado, ainda em se tratando de controle repressivo de constitucionalidade
exercido de forma difusa, podemos apontar o controle que se dá durante o processo
legiferante, quando as normas, editadas ao arrepio do devido processo legislativo, são dotadas
de inconstitucionalidade formal.
Assim explica Moraes quando discorre acerca do controle difuso de
constitucionalidade durante o processo legislativo:
[...] o controle jurisdicional sobre a elaboração legiferante, inclusive sobre propostas de emendas constitucionais, sempre se dará de forma difusa, por meio do ajuizamento de mandado de segurança por parte de parlamentares que se sentirem prejudicados durante o processo legislativo. Reitere-se que os únicos legitimados à propositura de mandado de segurança para defesa do direito líquido e certo de somente participarem de um processo legislativo conforme as normas constitucionais e legais são os próprios parlamentares126.
Ainda Moraes, continua:
Os parlamentares, portanto, poderão propiciar ao Poder Judiciário a análise difusa de eventuais inconstitucionalidades ou ilegalidades que estiverem ocorrendo durante o trâmite de projetos ou proposições por meio de ajuizamento de mandados de segurança contra atos concretos da autoridade coatora (Presidente ou Mesa da Casa Legislativa, por exemplo), de maneira a impedir o flagrante desrespeito às normas regimentais ao ordenamento jurídico e coação aos próprios parlamentares, consistente na obrigatoriedade de participação e votação em um procedimento inconstitucional ou ilegal127.
E, conclui:
126 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 617. 127 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 618.
54
Não raro o Poder Judiciário deverá analisar a constitucionalidade, ou não, de determinada seqüência de atos durante o certo processo legislativo tendente à elaboração de uma das espécies normativas primárias, uma vez que é a própria Constituição Federal que, com riqueza de detalhes, prevê as normas básicas e obrigatórias do devido processo legislativo (CF, arts. 59 a 69). Quando assim atuar, o Judiciário estará realizando controle difuso de constitucionalidade, para poder – no mérito – garantir aos parlamentares o exercício de seu direito líquido e certo a somente participarem da atividade legiferante realizada em acordo com as normas constitucionais128.
Destarte, pode-se observar que, quando do desrespeito ao devido processo legiferante,
os parlamentares que se sentirem coagidos no âmbito de seu ofício de legislar, poderão
impetrar mandado de segurança para que tenham garantido o seu direito de exercer a
atividade legislativa em concordância com as normas constitucionais. Tal mandado de
segurança, que visa à concessão do referido mandamus tem cunho de controlador difuso de
constitucionalidade, pois a decisão do Tribunal que declarar a inconstitucionalidade do
processo legislativo garantirá o exercício do direito líquido e certo dos parlamentares de
exercerem seu ofício de maneira legal e constitucional.
Derradeiro, pode-se perceber que no controle difuso de constitucionalidade, o
reconhecimento da inconstitucionalidade não é o objeto principal do processo, contudo, a
apreciação do incidente se mostra imprescindível para o deslinde de determinada lide. Desta
maneira, no controle difuso o reconhecimento da inconstitucionalidade é apreciado como
incidente da ação principal e, após sua resolução, o juiz aprecia o pedido principal. Com
efeito, a declaração no controle difuso atinge somente as partes do litígio em exame, só
valendo para o caso concreto e sua eficácia é retroativa, atingindo a lei ou ato normativo
inconstitucional desde o seu nascimento129.
3.3.2.2 O Controle Concentrado de Constitucionalidade
Nos dizeres de Lenza, o controle concentrado de constitucionalidade de lei ou ato
normativo é assim nominado pelo fato de “concentrar-se” em um único tribunal, podendo ser
verificado em cinco situações: I – ADI (ação direta de inconstitucionalidade) genérica,
prevista no artigo 102, I, a, da Constituição Federal; II – ADPF (arguição de descumprimento
de preceito fundamental), prevista no art. 102, §1º, da Constituição Federal; III – ADI por
128 MOARES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 618. 129 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et. al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 400.
55
omissão, prevista no art. 103, §2º, da Constituição Federal; IV – ADI interventiva, prevista no
art. 36, III, da Constituição Federal, com modificações introduzidas pela EC 45/2004; V –
ADC (ação declaratória de constitucionalidade), prevista no art. 102, I, a, e as alterações
introduzidas pela EC n. 3/93 e 45/2004130.
Hans Kelsen, quando versa a respeito de um único órgão ser executor do controle
concentrado de constitucionalidade explica que:
[...] se a Constituição conferisse a toda e qualquer pessoa competência para decidir esta questão, dificilmente poderia surgir uma lei que vinculasse os súditos do Direito e os órgãos jurídicos. Devendo evitar-se uma tal situação, a Constituição apenas pode conferir competência para tal a um determinado órgão jurídico131.
E conclui que:
[...] se o controle da constitucionalidade das leis é reservado a um único tribunal, este pode deter competência para anular a validade da lei reconhecida como inconstitucional não só em relação a um caso concreto mas em relação a todos os casos a que a lei se refira – quer dizer, para anular a lei como tal. Até esse momento, porém, a lei é válida e deve ser aplicada por todos os órgãos aplicadores do Direito132.
Originariamente, o controle concentrado de constitucionalidade, surgiu no Brasil por
meio da Emenda Constitucional n. 16, de 06/12/1965, que atribuiu ao Supremo Tribunal
Federal a competência para julgar originariamente a representação de inconstitucionalidade de
lei, ato normativo federal ou estadual, apresentada pelo Procurador-Geral da República,
apesar de já existir a representação interventiva desde a Constituição de 1934133.
Moraes explica que por meio deste controle, busca-se a obtenção da declaração de
inconstitucionalidade da lei ou ato normativo em tese, independentemente da existência de um
caso concreto, visando-se à obtenção da invalidação da lei, para assegurarem-se as relações
jurídicas, que não podem ser baseadas em normas inconstitucionais134.
E completa:
130 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 187. 131 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1985. p. 288 132 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito, p. 288. 133 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 626. 134 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 627.
56
A declaração da inconstitucionalidade, portanto, é o objeto principal da ação, da mesma forma que ocorre nas Cortes Constitucionais Européias, diferentemente do ocorrido no controle difuso, característica básica do judicial review do sistema norte-americano135.
Exemplificando as espécies de controle concentrado contempladas pela Constituição
Federal, Moraes enumera: a) ação direta de inconstitucionalidade genérica; b) ação direta de
inconstitucionalidade interventiva; c) ação direta de inconstitucionalidade por omissão; d)
ação declaratória de constitucionalidade; e e) arguição de descumprimento de preceito
fundamental136.
Nota-se, ao contrário da via difusa, onde o controle se verifica em casos concretos e
incidentalmente à ação principal, no controle concentrado de constitucionalidade, a
representação de inconstitucionalidade, em razão de ser em relação a um ato normativo em
tese, tem por objeto principal a declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo
impugnado. Logo, o que se busca é saber se a lei é inconstitucional ou não, por meio da
manifestação do Judiciário. Via de regra, através do controle concentrado, busca-se expurgar
do ordenamento jurídico lei ou ato normativo viciado (material ou formalmente), com a
consequente invalidação do diploma legal atacado137.
Explicando de forma sucinta cada uma das formas de exercício de controle
concentrado de constitucionalidade pode-se destacar, inicialmente, a ADI genérica (Lei nº.
9.868/99) como o instrumento para busca do controle de constitucionalidade de ato normativo
em tese, abstrato, marcado pela generalidade, impessoalidade e abstração. A ADI genérica
tem como objeto a lei ou ato normativo que se mostrarem incompatíveis com o sistema, sendo
que a competência para processá-las e julgá-las é definida conforme a natureza do objeto da
ação, qual seja, lei ou ato normativo. Em sede de decisão na ADI, a decisão produzirá efeitos
contra todos, e será dotada de efeito retroativo, retirando do ordenamento jurídico o ato
normativo ou lei incompatível com a Constituição138.
Historicamente falando, a ADI genérica foi introduzida no ordenamento jurídico
brasileiro no ano de 1965, por meio da Emenda Constitucional nº. 16. Logo, tem-se que até
referida data, o Brasil seguia exclusivamente o método difuso do controle de
constitucionalidade dos atos normativos, e, apenas indiretamente, o controle concentrado, 135 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 627. 136 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 627. 137 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 188. 138 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 188.
57
quando da apreciação pelo STF, de recurso extraordinário. Já no regime da atual Constituição
Federal, a ADI genérica tem previsão legal e constitucional no art. 102, I, a, que versa sobre o
cabimento de ADI contra leis ou atos normativos, estaduais ou federais139.
Na ADI genérica, o pedido será a declaração de inconstitucionalidade, buscando como
efeito mediato, a preservação da ordem jurídico-constitucional com a restituição ao estado de
coisas anterior e a consequente desconstituição do ato impugnado. Ainda, é de se apontar que
a competência para julgamento da ADI genérica é originária e exclusiva do STF140.
Quanto à ADPF, esta será cabível seja na modalidade de ação autônoma ou por
equivalência. No primeiro caso, é nítido o caráter preventivo, qual seja, evitar a lesão a
preceito fundamental, enquanto que no segundo caso, por equivalência, prevê-se a
possibilidade de arguição quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional
sobre lei ou ato normativo (federal, estadual, municipal), incluídos os anteriores à
Constituição. A competência originária para julgamento da arguição de descumprimento de
preceito fundamental é do Supremo Tribunal Federal e a decisão terá eficácia contra todos e
efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Público, além de efeitos
retroativos141.
Quanto ao cabimento de uma ADPF, Rebello Pinho norteia:
Poderá ser proposta quando não for cabível ação direta de inconstitucionalidade, ação declaratória de inconstitucionalidade, mandado de segurança, ação popular, agravo regimental, recurso extraordinário, reclamação ou qualquer outra medida judicial apta a sanar, de maneira eficaz, a situação de lesividade, conforme reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal142.
Para cabimento da ADP é necessária a comprovação de violação de preceito
fundamental constante na Constituição, não podendo ser arguida a violação de um preceito
constitucional qualquer. Ou seja, não basta para o cabimento da ADPF, comprovar-se
violação de uma norma constitucional aleatória, eis que a violação de ser de norma
139 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 287. 140 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 288. 141 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 237. 142 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral das Constituições e Direitos Fundamentais, p. 43.
58
considerada relevante, tendo isso caráter de fundamentalidade como elemento de bloqueio ao
cabimento da ADPF143.
Assim, observa-se que a ADPF é um instrumento de não tão fácil manuseio, dada a
imprescindibilidade de, primeiro, esgotar-se outras medidas judiciais para sanar a
inconstitucionalidade, e, após, ainda, que o ato ou diploma impugnado tenha violado,
comprovadamente, um preceito considerado fundamental, relevante, constante na
Constituição Federal.
Ao seu tempo, com relação a ADI por omissão, Lenza a conceitua da seguinte forma:
Trata-se de inovação da CF/88, inspirada no art. 283 da Constituição Portuguesa. O que se busca através da ADIn por omissão é combater uma “doença”, chamada pela doutrina de “síndrome de inefetividade das normas constitucionais”144.
E Chimenti, complementa:
[...] A inconstitucionalidade por omissão é constatada quando o responsável pela iniciativa da norma de complementação não toma as medidas necessárias para a sua edição, ou as toma de forma meramente parcial. Em síntese, a ação visa afastar, com eficácia erga omnes, omissão quanto à medida normativa necessária para tornar efetiva norma constitucional que não é de eficácia plena (e não para que sejam tomadas atitudes administrativas concretas, a exemplo da construção de uma escola ou de um posto de saúde)145.
Deste modo, a questão da inconstitucionalidade por omissão trata do vício revelado
pela inexistência de um ato legislativo em sentido próprio. Neste caso, o legislador deixou de
praticar o ato de produzir uma norma legal para tornar viável o exercício de direitos ou
garantias constitucionalmente asseguradas. Assim, a violação a preceito constitucional não é
expressa, é tácita ou implícita, quando o Poder Público impede o exercício de um direito
subjetivo, sem negá-lo abartamente146.
143 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 285. 144 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 245. 145 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et. al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 428. 146 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. A evolução do controle de constitucionalidade e a competência do Senado Federal, p. 113.
59
Via de regra, a decisão proferida pelo STF se limita a dar ciência ao Poder omisso para
que este providencie a supressão da omissão. Assim, o Legislativo ou o Executivo matem
autonomia quanto ao momento em que sanarão a omissão147.
Vê-se, desde logo, que a ADI por omissão é cabível quando se faz necessário provocar
o Poder Judiciário para manifestar-se quando da ausência de norma que regulamente ou
garanta o acesso a direitos ou garantias previstas constitucionalmente.
A ADI interventiva, por sua vez, dotada de finalidade jurídica e, diferentemente da
genérica, também, política, tem como objeto lei ou ato normativo estadual contrário aos
princípios sensíveis da Constituição Federal. Neste sentido, a ADI interventiva fundamenta-se
na defesa destes princípios que se dividem em: a) forma republicana, sistema representativo e
regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de
contas da administração publica, direta e indireta; e, e) aplicação do mínimo exigido da
receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de receitas de
transferência, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de
saúde148.
Moraes ainda explica:
São denominados princípios sensíveis constitucionais, pois sua inobservância pelos Estados-membros ou Distrito Federal no exercício de suas competências legislativas, administrativas ou tributárias, pode acarretar a sanção politicamente mais grave existente em um Estado Federal, a intervenção na autonomia política149.
E continua:
Assim, qualquer lei ou ato normativo do Poder Público, no exercício de sua competência constitucionalmente deferida que venha a violar um dos princípios sensíveis constitucionais, será passível de controle concentrado de constitucionalidade, pela via de ação interventiva150.
Sendo assim, conclui-se que a ação direta interventiva, além de buscar a declaração de
inconstitucionalidade formal ou material da lei ou ato normativo estadual (finalidade jurídica),
147 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et. al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 428. 148 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 652. 149 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 653. 150 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 653.
60
busca, também, a decretação de intervenção federal no Estado-membro ou Distrito Federal
(finalidade política), compreendendo, assim, um controle direto, para fins concretos151.
Por fim, como último exemplo de instrumento de controle repressivo de
constitucionalidade exercido de forma concentrada, destaca-se a Ação Declaratória de
Constitucionalidade.
A ADC ou ADECON tem como objetivo transformar uma presunção relativa de
constitucionalidade em absoluta, não mais admitindo prova em contrário. Ou seja, a decisão
que julga procedente a ADC vinculará os órgãos do Poder Judiciário e a Administração
Pública que não poderão mais declarar a inconstitucionalidade da aludida lei, ou agir em
desconformidade com a decisão do STF. Isto por que não se estaria mais frente a uma
presunção relativa de constitucionalidade, mas sim, absoluta152.
Quanto ao objeto, como visto, na ADC é lei ou ato normativo federal (somente
federal), e, a competência originária para apreciação da ADC é do STF. Quanto aos efeitos da
decisão, esta produzirá eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais
órgãos do Poder Judiciário e ao Poder Executivo, podendo assim, sistematizarem-se os efeitos
da decisão na ADC como sendo: erga omnes, ex tunc e vinculante em relação aos órgãos do
Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual, municipal e distrital153.
De forma a, ainda, conceituar a ADC, diz-se que se trata de, nada mais do que uma
ação direta de inconstitucionalidade com o sinal trocado, eis que o exercício delas resulta na
instauração de processo de natureza ambivalente ou dúplice, de modo que na ADC a
pretensão é a declaração de inconstitucionalidade da norma impugnada, para fins de elidir e
presunção relativa de constitucionalidade, ao passo que na ação direta de
inconstitucionalidade busca-se a declaração de constitucionalidade da norma questionada,
para converter a presunção relativa em absoluta de constitucionalidade154.
151 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 653. 152 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 252. 153 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 252. 154 MENDES, Gilmar Ferreira. Controle Concentrado de Constitucionalidade: Comentários à Lei nº 9.868/99. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 239.
61
Por fim, Peña de Moraes esclarece que o objeto do controle de constitucionalidade
quando da interposição da ADC é “lei ou ato normativo federal, [...], suscetíveis de
impugnação por via de ação direta de inconstitucionalidade, excluídos os estaduais”155.
Destarte, quanto à ADC, nota-se que se trata de uma ação que visa a declaração de
constitucionalidade de norma ou ato normativo que até então teria uma constitucionalidade
relativa. Do julgamento do mérito da ADC, a decisão é dotada de eficácia contra todos e, após
o trânsito em julgado, não há mais que se falar em constitucionalidade relativa da norma ou
ato impugnado, mas sim constitucionalidade absoluta.
Cumpre-se esclarecer, ainda, que os legitimados para propositura das ações
constitucionais mencionadas (ADI, ADC e, por equiparação, ADPF), são os previstos no art.
103 da CRFB/88, in verbis:
Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I – o Presidente da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V – O Governador de Estado ou do Distrito Federal; VI – o Procurador-Geral da República; VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII – partido político com representação no Congresso Nacional; IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; [...]156
Deste modo, e de forma conclusiva, nota-se que o controle concentrado de
constitucionalidade se dá ante propositura de litígio no Judiciário visando exatamente a
declaração de inconstitucionalidade, a garantia de proteção de preceitos fundamentais
constitucionais ou anteriores à constituição, bem como zelar pela integridade dos chamados
princípios sensíveis, que são aqueles arrolados no artigo 34, inciso VII da CRFB/88, ou, até
mesmo, declarar de forma absoluta, a constitucionalidade antes relativa de determinada lei ou
ato normativo.
155 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 234. 156 Vade Mecum. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 40.
62
4 A AÇÃO DE ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL COMO INSTRUMENTO DE CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE
4.1. CONCEITO
Conforme conceito adotado quando do apontamento das categorias e conceitos
operacionais, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental trata-se de garantia de
origem constitucional, de natureza processual, que tem como objetivo a preservação da
obediência geral devida às regras e princípios constitucionais que, considerados fundamentais,
estavam, há muito, dentro de um quadro evolutivo, a demandar mecanismo próprio para tanto,
destacando-se que só caberá arguição quando ocorrer expresso descumprimento de um
preceito fundamental157.
Corroborando este entendimento, e, em outras palavras, Peña de Moraes explica que a
ADPF é “instituto bivalente ou dúplice, dado que comporta a arguição direta ou autônoma,
com fulcro no art. 1º, caput, e a arguição indireta ou incidental, com fundamento no art. 1º.,
parágrafo único, inciso I, ambos da Lei nº 9.882/99”158.
E continua o doutrinar apontando a ADPF como sendo um instrumento com a seguinte
função:
Evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do Poder Público, bem como solucionar controvérsia constitucional a respeito de lei ou ato normativo federal, estadual ou Municipal, incluídos os anteriores à Constituição da República159.
E, por sua vez, Hélio Márcio Campo conceitua a ADPF como sendo:
[...] um remédio constitucional destinado ao controle de constitucionalidade das leis e dos atos normativos. De fato, representa mais que isso, pois constitui um plus em relação ao modelo tradicional de fiscalização adotado no Brasil, já que também permite o domínio de atos administrativos e,
157 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 276. 158 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 264. 159 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 261.
63
inclusive, o exame, pelo Supremo Tribunal Federal, de controvérsias judiciais em que é debatida relevante questão constitucional.160
E finaliza Campo, afirmando que a ADPF “insere-se no rol daquelas demandas que
visam a garantir a supremacia da Constituição Federal”161, concluindo que a ADPF “visa
corrigir uma desobediência, um desrespeito, um não-seguimento a uma determinação
essencial consubstanciada na Constituição Federal”162.
Já Slaibi Filho, conceitua a ADPF como sendo “um novo remédio jurídico processual,
cujo objeto é a garantia ou defesa de preceito fundamental decorrente desta Constituição,
competindo, funcionalmente o STF para processar e julgar a arguição”163.
E, finalmente, Tavares define:
A arguição é ação (ou incidente judicial), de competência originária do Supremo Tribunal Federal, que desencadeia o denominado processo objetivo, cujo fundamento é o descumprimento constitucional que consagra valores basilares para o Direito pátrio, descumprimento este perpetrado por ato de natureza estatal, quando direta a modalidade, ou por atos normativos, quando se tratar de arguição na modalidade incidental, aplicando-se, por força de lei, no âmbito do controle abstrato, o princípio da subsidiariedade em relação às demais ações diretas existentes164.
Desta feita, nota-se que a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
consubstancia-se na defesa ao preceito fundamental constante na Carta Magna do país, sendo
uma modalidade de ação pouco utilizada tendo em vista seu caráter de subsidiariedade em
relação às outras ações para controle da constitucionalidade existentes. Ou seja, só será
cabível a ADPF quando, na situação, não houver possibilidade de interposição de outra ação
direta que vise o combate à inconstitucionalidade.
Quanto à noção do que seja descumprimento de preceito fundamental constante no
Texto Magno, este não deve ser confundido com a inconstitucionalidade propriamente dita. O
termo inconstitucionalidade é de rigor bastante acentuado no Direito pátrio, só devendo ser
160 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. p. 22. 161 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 22. 162 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 23. 163 SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 273. 164 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 282.
64
aplicável nas situações especificamente delimitadas pela Constituição e pelo Supremo
Tribunal Federal165.
De outro norte, na esteira de conceituar-se a função da ADPF, curial que se analise o
conceito de preceito fundamental.
Fazendo-se menção ao adotado quando do item de categorias e conceitos operacionais
da presente pesquisa, Preceito Fundamental será visto como sendo cada princípio
constitucional, os objetivos, direitos e garantias fundamentais previstas nos artigos 1º a 5º,
bem como as cláusulas pétreas, os princípios da Administração Pública e demais disposições
constantes no Texto Magno que se revelam fundamentais para a preservação dos valores mais
relevantes sob a guarida constitucional166.
De outra vertente, Slaibi Filho pondera:
A expressão preceito fundamental conduz a um grau de grande densidade na afronta aos valores constitucionais, o que somente pode ser percebido em cada caso, mesmo porque, também, e principalmente, ao Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, aplica-se a velha parêmia de minime NE curiat praetor, a introduzir o princípio da bagatela ou da insignificância167.
Na esteira do mencionado, são considerados fundamentais os preceitos previstos no
art. 1º como basilares do Estado brasileiro, a saber: a soberania, a cidadania, a dignidade da
pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da iniciativa e o pluralismo político,
ressaltando-se que mencionados valores também são protegidos pelos demais dispositivos
constitucionais, em desdobramento que a Hermenêutica Constitucional considera na
apreensão do significado das normas da Lei Máxima168.
E, por fim, imprescindível que, novamente, atente-se ao delineado pelo mestre Nagib
Slaibi Filho:
[...] a ADPF tem por razão de existir e objeto a proteção dos valores constitucionais, os quais devem ser apreendidos em processo hermenêutico que leve em consideração o momento histórico. Assim, o preceito
165 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 276. 166 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 394 167 SLAIB FILHO, Nagib. Direito Constitucional, p. 273. 168 SLAIB FILHO, Nagib. Direito Constitucional, p. 274.
65
fundamental tem caráter de mutabilidade, que deve ser considerado a cada momento de modo tópico169.
Destarte, nada obstante o conceito adotado no processo cognitivo do presente trabalho,
salutar se fazer menção da existência de correntes doutrinárias, como a acima consignada,
representada pelo doutrinador Nagib Slaibi Filho, que considera como preceito fundamental
uma reduzida parcela de valores constitucionais que, da interpretação conforme o momento
histórico do controle de constitucionalidade exercido, adquire um caráter de fundamental.
4.2 MODALIDADES DA ADPF
Levando-se em consideração que o instituto da Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental é bivalente, necessária uma exposição das duas modalidades de
interposição, quais sejam, a ADPF direta (também chamada de autônoma) e a ADPF
incidental (conhecida, também, pelo termo “por derivação”).
A modalidade chamada de ADPF direta ou autônoma é aquela que possui espeque no
artigo 1º, caput, da Lei de Arguição (Lei nº. 9.882/99), nos seguintes termos: “A arguição
prevista no § 1º do art. 102 da Constituição será proposta perante o Supremo Tribunal
Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do
Poder Público”. Assim, esta é a regra-matriz da arguição autônoma, que leva essa
nomenclatura por não depender da existência de qualquer outro processo no qual se
controverta sobre a aplicação de preceito fundamental, que é o que ocorre na ADPF
incidental170.
Neste sentido, manifesta-se Peña de Moraes:
[...] a arguição autônoma é suscitada diretamente perante o Supremo Tribunal Federal, para evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público. Destarte, a natureza jurídica da arguição direta é a de ação constitucional, porquanto veicula pretensão dirigida à tutela de preceito fundamental decorrente da Constituição, ameaçado ou lesado por ato do Poder Público171.
169 SLAIB FILHO, Nagib. Direito Constitucional, p. 274. 170 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 277. 171 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 264.
66
A ADPF autônoma realiza o típico e tradicional controle concentrado, via direta, da
constitucionalidade das leis, atos normativos e demais atos de natureza estatal, podendo-se
afirmar que a arguição por descumprimento se posta ao lado da ação direta de
inconstitucionalidade, cada um delas com campo próprio e específico de incidência
possível172.
A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental autônoma pode ter caráter
preventivo ou repressivo, visto da seguinte forma: quando visa evitar a lesão a preceito
fundamental terá efeito preventivo; já quando o que se busca é reparar a violação do preceito
fundamental, seu caráter será repressivo. Salienta-se que, em ambos os casos, deve haver
nexo de causalidade entre a lesão ao preceito fundamental e o ato do Poder Público, sendo da
esfera que for, não se restringindo a atos normativos, mas alcançando a lesão resultante de ato
administrativo, incluindo-se decretos regulamentares173.
Assim, é de se reafirmar que a arguição direta ou autônoma consiste em forma própria
de ação, pelo que se deflagra a jurisdição constitucional orgânica, condicionada ao
descumprimento de um preceito fundamental174.
Importante esclarecer que a ADPF autônoma pode ser revestida de caráter preventivo
ou repressivo, conforme o seu objeto (evitar o reparar lesão a preceito fundamental)175.
Por derradeiro, quanto à ADPF autônoma, nota-se que, de um conceito breve, é uma
ação constitucional cujo objeto é, exatamente, tutelar um preceito fundamental constante na
Carta Maior, e sua interposição funda-se nessa somente nesta premissa. Já quanto ao caráter,
pode ser preventiva quando se busca “evitar” a lesão ao preceito fundamental, ou, repressiva,
quando o deslinde se dará com a “reparação” da lesão ao preceito objeto da lide.
Por sua vez, a ADPF incidental é suscitada durante o trâmite de um processo em
qualquer juízo ou tribunal, inclusive o STF, desde que seja relevante o fundamento da
controvérsia sobre a constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, estadual ou, até
mesmo, municipal, incluídos os anteriores à vigência da Constituição. Destarte, a natureza
jurídica da ADPF indireta é a de incidente de constitucionalidade, eis que viabiliza a
172 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 277. 173 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 238. 174 TAVARES, André Ramos. Tratado da Arguição de Descumprimento de Preceito Constitucional Fundamental. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 249. 175 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 264.
67
suspensão do processo em curso perante qualquer juízo ou tribunal, para que, antes, seja
proferida decisão exclusivamente sobre a questão constitucional levantada, a fim de antecipar
a solução da demanda constitucional que percorreria a via de exceção até o pronunciamento
do Supremo Tribunal Federal por recurso extraordinário176.
Neste raciocínio, salutar ao comento, consoante se extrai do parágrafo único, inciso I
do artigo 1º, da Lei de Arguição que versa acerca do cabimento de Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental dada a relevância do fundamento da controvérsia
constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, inclusive aqueles
geridos antes da Constituição, é possível a ADPF como um incidente em um processo já em
curso, tratando-se-, neste caso, da ora analisada, Arguição por Descumprimento de Preceito
Fundamental indireta177.
Nesta senda, é do escólio do ilustre André Ramos Tavares:
[...] há uma arguição incidental, ao lado daquela exercida por ação, porque a controvérsia com “relevante fundamento” à qual faz menção o inciso I do parágrafo único do artigo 1º só pode ser aquela que se apresenta em juízo, e não qualquer controvérsia que se instale entre particulares, não levada necessariamente ao conhecimento da Justiça, ou ainda uma controvérsia doutrinária178.
E continua:
Confirma esse entendimento o disposto no art. 3º, quando exige que a petição inicial contenha, “V – se for o caso, a comprovação da existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação do preceito fundamental que se considera violado”. Ora, será o caso de exigir mencionada comprovação se se tratar da arguição incidental. Este o alcance exato do dispositivo179.
Oportuno se notar que ao contrário da ADPF por via autônoma, a arguição incidental
tem campo mais restrito, eis que, além de exigir o descumprimento de preceito fundamental,
como não poderia deixar de ser, acresce outra condição: a relevância da questão e que o
descumprimento origine-se de ato normativo (e não de qualquer ato do Poder Público, como
ocorre na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental autônoma)180.
176 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 264. 177 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 277. 178 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 278. 179 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 278. 180 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 279
68
Quanto ao requisito imprescindível para que se instaure uma ADPF incidental, Lenza
explica, ao encontro do consignado no parágrafo anterior, que é necessária a demonstração de
“divergência jurisdicional (comprovação da controvérsia judicial) relevante na aplicação do
ato normativo, violador do preceito fundamental”181.
É importante mencionar que a arguição incidental produz uma cisão funcional de
competência em plano vertical, entre a questão constitucional e o próprio mérito, que são
dirimidos por órgãos judiciais de instâncias distintas. Assim, o acolhimento da arguição
indireta ou incidental implica na cisão funcional de competência em plano vertical, na medida
em que a controvérsia sobe a constitucionalidade da lei ou ato normativo arguido de
inconstitucionalidade, deve ser resolvida pelo STF, em consonância aos termos do art. 1º,
parágrafo único, I, da Lei de Arguição; assim, ao passo que o acolhimento da arguição de
inconstitucionalidade importa na cisão funcional de competência em plano horizontal, uma
vez que a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo impugnado pode ser declarada pelo
plenário ou até mesmo pelo órgão especial do mesmo tribunal182.
É de se advertir, contudo, que a ADPF incidental não se confunde com a extinta
avocatória, que consiste na requisição de processo em curso perante qualquer Juízo ou
Tribunal, com devolução da causa ou recurso ao Pretório Excelso e suspensão dos efeitos das
decisões proferidas, pelo Procurador-Geral da República, em decorrência de perigo à ordem,
segurança, saúde e finanças públicas. Explica-se que neste caso, a arguição indireta ou
incidental não implica em violação do princípio do juiz natural, eis que o STF somente decide
a questão constitucional suscitada, com esteio em fundamento jurídico, de forma que se
conserve a competência do Juízo ou Tribunal, perante o qual estava em curso a causa ou
recurso, para o julgamento do mérito do processo; já a avocatória, importa em violação do
princípio do juiz natural, já que o Supremo Tribunal Federal também decide as outras
questões suscitadas, com espeque em um fundamento político, de modo que se desloca a
competência do juiz ou tribunal, perante o qual estava tramitando a causa ou recurso, para o
julgamento do mérito do litígio183.
Ressalta-se que a ADPF indireta ou incidental enseja um controle de
constitucionalidade misto, tendo em vista que enseja a instauração de processo objetivo
lastreado em questão constitucional arguida em processo subjetivo, por intermédio do trânsito 181 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 238. 182 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 264. 183 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 265.
69
do controle de constitucionalidade difuso para o controle de constitucionalidade
concentrado184.
Sobre o assunto da transmutação de controle difuso para concentrado, ensejando um
controle misto de constitucionalidade, oportuno o que leciona Gomes Canotilho:
[...] trata-se de processo de declaração de inconstitucionalidade com base no controle concreto de normas. Este processo conjuga duas dimensões: I) uma dimensão abstrata, dado que se trata de declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, tal como sucede nos processos principais de inconstitucionalidade; II) outra dimensão concreta, pois a declaração de inconstitucionalidade tem como base a fiscalização concreta da inconstitucionalidade de normas jurídicas, de sorte que permite-se o trânsito do controle difuso para o controle concentrado, mediante o processo de generalização dos efeitos jurídicos da decisão de inconstitucionalidade, a partir de uma fiscalização abstrata sucessiva185.
Derradeiro quanto à ADPF incidental ou indireta, pode-se perceber que é possível
arguir inconstitucionalidade sem interpor especificamente um expediente diretamente perante
o STF, quando, durante o trâmite de um processo, se fazer necessária o julgamento de
inconstitucionalidade de ato normativo do Poder Público para o escorreito julgamento do
mérito a que se está litigando. É o caso de, suspendendo os autos principais, devolver a
matéria constitucional ao Supremo Tribunal Federal que julgará a Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental interposta de forma incidental no curso dos autos
principais, sem, contudo, resolver o mérito do litígio, eis que isto seria competência do juízo
ou tribunal que estava tramitando os autos principais.
4.3 LEGITIMAÇÃO PARA A PROPOSITURA DE ADPF
Quanto aos legitimados ativos para propor a ADPF direta ou autônoma (já que a
incidental se dá no curso de um processo entre particulares), estes são enumerados de forma
taxativa no art. 2º, I, da Lei de Arguição, de forma concorrente e disjuntiva, de maneira que a
pretensão pode ser deduzida pelo Presidente da República, pela Mesa do Senado Federal,
Câmara dos Deputados, Assembléia Legislativa ou Câmara Distrital, por Governador de
Estado ou Distrito Federal, pelo Procurador-Geral da República, pelo Conselho Federal da 184 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 265. 185 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3. ed. Coimbra: Almedina, 1999. p. 919.
70
Ordem dos Advogados do Brasil, por partido político com representação no Congresso
Nacional, por confederação sindical ou, ainda, por entidade de classe de âmbito nacional.
Ainda, não obstante o veto ao inciso II do art. 2º do Projeto nº 2.872/99, que possibilitava o
manejo da ADPF por qualquer pessoa lesada ou ameaçada em decorrência de ato do Poder
Público, curial que se mencione a possibilidade de os interessados, consoante se extrai do § 1º
do art. 2º da Lei de Arguição, representarem o Procurador-Geral da República, no exercício
do direito de petição, a fim de solicitar a promoção da Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental autônoma, cumprindo-lhe decidir sobre o cabimento do seu ingresso
em juízo186.
Neste sentido, a jurisprudência do STF estabelece diferenciação de tratamento, no que
concerne à propositura da ação direta de inconstitucionalidade (que devem refletir na ADPF),
entre os legitimados universais (Presidente da República, Procurador-Geral da República,
Mesas do Senado e da Câmara dos Deputados, partidos políticos com representação no
Congresso Nacional e o Conselho Federal da OAB) e os chamados legitimados especiais
(Governador de Estado, Mesa de Assembléia Legislativa e confederação sindical ou entidade
de classe de âmbito nacional): ao passo que os primeiros não precisam demonstrar interesse
(relação de pertinência entre o ato impugnado e as funções exercitadas pelo órgão ou a
entidade), em decorrência de suas atribuições constitucionais características, os segundos têm
este ônus para interposição da ADPF187.
Assim, de forma minuciosa, ao passo que o Presidente da República, em princípio,
poderá propor a arguição sem ter que demonstrar relação de pertinência entre o ato
impugnado e as funções exercitadas pelo órgão, os Governadores de Estado, por sua vez,
terão, por equiparação à ação direta de inconstitucionalidade, de demonstrar tal relação
quando promoverem a arguição contra lei ou ato normativo de outro governador, sendo tal
demonstração, imprescindível ante a relevância do fundamento da questão constitucional188.
No tocante aos partidos políticos, em unissonância ao consolidado pela jurisprudência
do Pretório Excelso, só terão legitimidade para propor a arguição os diretórios nacionais,
excluídos, em consequência, os diretórios regionais. E, da mesma forma, na área sindical, são
186 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 268. 187 CLÈVE, Clèmerson Merlin. A Fiscalização Abstrata da Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 41. 188 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 42.
71
legítimas somente as confederações sindicais, eliminando-se as federações, mesmo que de
âmbito sindical, mediante a interpretação literal do art. 103 da CRFB/88189.
Já quanto às entidades de classe, que são doutrinariamente difíceis de definir e
identificar, o Supremo Tribunal Federal tem-se pronunciado no sentido de serem legítimas
para ingressar com a ADIn só as entidades de classe de âmbito nacional que possuam
associados ou membros em pelo menos nove Estados da Federação, além de exigir que os
associados e os membros sejam pessoas físicas e estejam ligados entre si em decorrência da
mesma atividade econômica ou profissional, o que, por comparação, aplica-se às entidades de
classe de âmbito nacional quando da propositura de ADPF190.
Por fim, comentando o veto presidencial ao inciso II, do art. 2º da Lei de Arguição,
que facultava a qualquer pessoa lesada ou ameaçada por ato do Poder Público propor o novel
instrumento, justifica-se tal vedação que, se assim não fosse, haveria uma sobrecarga do
número de processos no STF e, possivelmente, muitos deles não teriam a correlata relevância
jurídica e consistência nas arguições propostas191.
Neste caso, a solução a ser buscada por um individual que se sinta lesado, ou mesmo
que tenha receio de se sentir lesado por lei ou ato do Poder Público que contraria, ou venha a
contrariar preceito fundamental, é a representação ao Procurador-Geral da República, que,
examinando os fundamentos jurídicos do pedido, decidirá acerca do cabimento de propositura
na esfera judicial192.
Consequentemente, ao Procurador-Geral da República, sendo o representante do
interesse público, caberá averiguar a importância da propositura da ADPF pretendida por
qualquer pessoa, sendo irrecorrível a decisão por ele tomada, embora possa, em um momento
posterior, retratar-se a respeito da decisão, ingressando junto ao STF, podendo, até mesmo,
aditar novas considerações na causa de pedir193.
Já no caso da arguição incidental, qualquer pessoa interessada, leia-se, envolvida em
processo judicial, pode submeter a questão constitucional fundamental diretamente ao
Supremo Tribunal Federal, a partir de seu processo originário, mesmo após o mencionado
189 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 42. 190 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 42. 191 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 43. 192 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 45. 193 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 46.
72
veto presidencial, o que representa, ante referido veto para propositura de ADPF autônoma,
um significativo alargamento democrático da legitimidade para provocação do STF194.
André Ramos Tavares, explicando o motivo do referido alargamento da legitimidade
para se arguir inconstitucionalidade por descumprimento de preceito fundamental, versa:
Isso é assim porque a legitimidade para a propositura da arguição incidental, por óbvio, não poderia ser idêntica àquela prevista para a modalidade direta, sob pena de ineficácia absoluta da primeira. Tal interpretação seria absurda e totalmente descabida. Se se está de acordo acerca da existência de uma segunda modalidade, é evidente que não poderá ela ser eclipsada peã arguição direta, reduzida que estaria a um “sem-sentido” normativo195.
Não sendo de outra maneira, observa-se que a existência do alargamento da
legitimidade para se propor ADPF (incidental, frise-se), decorre do fato que como na ADPF
autônoma os legitimados são os chamados universais e especiais, na ADPF incidental, caso se
adotasse o mesmo procedimento, a primeira perderia sentido, pois seriam, com nomes
diferentes, o mesmo expediente petitório.
Nesta senda, nota-se que para a apreciação da ADPF autônoma a parte legítima deve
estar incluída no rol já consignado, devendo ou não demonstrar interesse de propositura,
conforme o caso, podendo qualquer cidadão, apresentar representação ao Procurador-Geral da
República que decidirá se demanda ou não uma ADPF autônoma. E, na ADPF incidental,
qualquer parte integrante de um litígio judicial, pode arguir o descumprimento de preceito
fundamental por via incidental, oportunidade em que os autos ascenderão ao STF para
julgamento da questão constitucional.
De maneira breve, como diferente não se podia ser, explicita-se que os legitimados
passivos na ADPF são as autoridades ou órgãos responsáveis pelo ato questionado, que terão
o prazo de dez dias para prestarem as informações que julgarem convenientes para o deslinde
da celeuma constitucional196.
Derradeiro, extrai-se que para fins de integrar uma Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental, aponta-se como pólo passivo do litígio, as autoridades ou órgãos
responsáveis pelo ato arguido de descumprir um preceito fundamental constante na Carta
Magna.
194 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 283. 195 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 283. 196 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 47.
73
4.4 PROCEDIMENTO DA ADPF
Conforme já exposto, a parte procedimental da Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental encontra-se regulada, basicamente, pela Lei 9.882/99.
Contudo, relevante que se faça uma averiguação de cada um dos passos importantes na
tramitação da ADPF, desde os requisitos para admissibilidade da petição inicial até a decisão
proferida na arguição, com seus respectivos efeitos no ordenamento jurídico.
4.4.1 A Petição Inicial
A petição inicial, que deverá ser protocolizada diretamente no Supremo Tribunal
Federal em duas vias e acompanhada do instrumento de mandato, se for o caso, deverá ser
elaborada consoante a prescrição determinada no art. 3º da Lei de Arguição. Ressalte-se que
com exceção ao Procurador-Geral da República, todos os legitimados, sejam ativos,
universais e singulares, deverão estar representados por advogado197.
Uma curiosidade quanto a esta imprescindibilidade de advogado para se propor a
ADPF, é que no Tribunal Constitucional Alemão, de forma distinta do que ocorre no nosso
Supremo Tribunal Federal, não há essa exigência de a parte estar representada por advogado,
salvo nas audiências198.
A fim de esclarecer quanto à mencionada prescrição constante no art. 3º da Lei de
Arguição, José da Silva Pacheco elucida:
O art. 3.º da Lei 9.882/99 é expresso no sentido de exigir que da petição inicial, na hipótese de arguição de descumprimento, constem: a) a indicação do preceito fundamental que se considera violado; b) a indicação do ato questionado; c) a prova da violação do preceito fundamental; d) o pedido, com suas especificações; e) a comprovação, se for o caso, da existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação do preceito fundamental que se considera violado199.
197 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 51. 198 MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 16 199 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 465.
74
Ainda, menciona-se que o petitório inicial deve ser instruído com prova da violação do
preceito fundamental, do ato questionado e dos documentos necessários para que se comprove
a procedência do pedido, bem como pelo instrumento de procuração, quando subscrita por
advogado200.
Curial que se traga à ribalta que a arguição proposta na hipótese de controvérsia
constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, inclusive os
anteriores à Constituição, deverá, obrigatoriamente, vir acompanhada de comprovação desta
controvérsia judicial201.
Por fim, menciona-se que a petição inicial será indeferida liminarmente, pelo relator,
quando não for o caso de ADPF, faltar algum requisito legal ou for inepta. Analisado o pedido
de liminar, se for o caso, o relator solicitará as informações às autoridades responsáveis pela
prática do ato questionado, no prazo de dez dias e, entendendo necessário, poderá ouvir as
partes nos processos que ensejaram a arguição, requisitar informações adicionais, designar
perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão, ou, ainda, fixar data
para declarações, em audiência pública, de pessoas com experiência e autoridade na matéria.
Conforme preceituado em lei, poderá ser autorizada, a critério do relator, sustentação oral e
juntada de memoriais, por requerimento dos interessados no processo. Finalmente, decorrido
o prazo das informações, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os Ministros, e pedirá
dia para julgamento.
Lenza explica que, do caso em que o relator indeferir a petição inicial, será “cabível o
recurso de agravo, no prazo de 5 dias, para atacar tal decisão”202.
Fundamental se advertir, acerca da cautela na interposição de petição de ADPF que,
consoante o art. 4º, § 1º da Lei de Arguição, não será admitida quando houver qualquer outro
meio eficaz capaz de sanar a lesão. Trata-se do princípio da subsidiariedade, que confere um
caráter residual à arguição, e, condiciona o ajuizamento da ação à ausência de qualquer outro
meio processual apto a sanar, de modo eficaz, a lesividade indicada pelo autor203.
Necessária, por fim, a ciência de que o STF não vem admitindo aditamento à petição
inicial após a requisição das informações do órgão que emanou o ato, sendo, portanto, de
200 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 270. 201 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 734. 202 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 241. 203 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 241.
75
primeira importância, que as provas, que são visceralmente documentais, sejam todas juntadas
quando do protocolo da ação, não se esperando possibilidade de emenda à inicial204.
4.4.2. O despacho liminar exarado na ADPF
É de se apontar que o relator na Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental tem o poder de proferir um despacho liminar de forma positiva ou negativa
quando da apreciação inaugural da petição inicial.
Na hipótese do despacho inicial apontar um conteúdo positivo, é de competência do
relator, no caso de inexistência de pedido de medida liminar, requerer informações às
autoridades responsáveis pelo ato questionado, no prazo de dez dias; ao passo que, quando
existir pedido de medida liminar, requerer informações às autoridades tidas como
responsáveis pela produção do ato questionado, como também o Advogado-Geral da União
ou Procurador-Geral da República, no prazo comum de cinco dias, unicamente sobre os
pressupostos do pronunciamento liminar, ressalvado o caso de excepcional urgência205.
Logo, quando o relator visualizar inexistência de pedido de medida liminar, e o
despacho ser de cunho positivo, aquele, diretamente, deve requerer informações às
autoridades que cometeram o ato arguido de inconstitucionalidade; já, quando na inicial da
ADPF conter um pedido de liminar, além das informações das autoridades supostamente
violadoras do preceito fundamental, também o relator as requererá ao Advogado-Geral da
União ou Procurador-Geral da República, que terão o prazo simultâneo de cinco dias para se
manifestarem acerca dos pressupostos da medida liminar.
Na ocorrência de o despacho liminar exarar um conteúdo negativo, também, conforme
já consignado anteriormente, é de competência do relator indeferir liminarmente a petição
inicial, quando a demanda for inepta ou não seja o caso de Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental, como, exemplificando-se, na hipótese de desatendimento ao versado
princípio da subsidiariedade, na medida em que a ADPF é ação de natureza constitucional
cuja admissão é vinculada à inexistência de qualquer outra maneira de se buscar a reparação
da lesão ocorrida em decorrência de ato do Poder Público, de modo que a ausência deste
204 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 52. 205 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 270.
76
requisito importa no indeferimento liminar da petição inicial, com a consequente
determinação de arquivamento do feito206.
Destarte, o relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, quando
flagrar situações que ensejam o indeferimento da inicial, como por exemplo, a possibilidade
de interposição de outro modo de busca ao remédio para a lesão ao preceito fundamental, o
fará sumariamente, o que acarreta, por vias óbvias, no arquivamento da demanda.
Quanto à possibilidade de deferimento de medida liminar, Alexandre de Moraes
ensina:
Concessão de medida liminar: por decisão da maioria absoluta de seus membros, o STF poderá deferir pedido de medida liminar, salvo em caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave, ou, ainda, no recesso, quando a liminar poderá ser deferida pelo Ministro relator, ad referendum do Plenário. A liminar poderá consistir na determinação de que juízes e tribunais suspendam o andamento de processo ou os efeitos de decisões judiciais, ou de qualquer outra medida que apresente relação com a matéria objeto da arguição de descumprimento de preceito fundamental, salvo se decorrentes de coisa julgada207.
E na esteira do aludido por Moraes, Pacheco ratifica que “Ad referendum do tribunal
pleno, poderá o relator conceder a medida liminar quando houver: a) extrema urgência; b)
perigo de lesão grave; c) período de recesso”208.
Nesta seara, a medida liminar poderá consistir em determinação de que os juízes e
tribunais suspendam o andamento de processo ou os efeitos de decisões judiciais ou qualquer
outra determinação pertinente que apresente relação com a matéria objeto da ADPF,
ressalvada, sempre, a coisa julgada209.
Assim, nota-se que, no caso de ADPF incidental, nada obstante o conteúdo da liminar,
na maioria dos casos seja uma determinação com relação à matéria sobre a qual se propõe a
Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, esta pode tão-somente, quando do
deferimento, determinar que os juízes ou tribunais suspendam o andamento processual ou,
ainda, os efeitos de decisões judiciais já proferidas nos autos originários.
206 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 270. 207 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 734. 208 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 465. 209 PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, p. 465.
77
Nos passos da precaução quando da coisa julgada, considera-se que o legislador agiu
acertadamente ao dispor que não serão afetados pela liminar os processos em que já tenha
ocorrido a coisa julgada. É que esta é uma garantia da eficácia das decisões judiciais. Encara-
se, com propriedade, como sendo a forma pela qual se exterioriza a segurança que a sociedade
terá ao socorrer-se ao Poder Judiciário e a efetiva demonstração de que este realiza um ato
supremo e culminante na prestação jurisdicional210.
Adverte-se que a concessão de medida liminar trata-se de uma providência de caráter
excepcional, tendo em vista que os atos normativos gozam da presunção de
constitucionalidade211.
Para fins de uma melhor compreensão, explica-se que, comparativamente à ação direta
de inconstitucionalidade, a medida liminar será deferida quando houver plausibilidade jurídica
da tese proposta, a possibilidade de prejuízo decorrente do retardamento da decisão postulada,
a possibilidade de se tornar irreparáveis os danos emergentes dos próprios atos impugnados e
houver necessidade de se garantir a ulterior eficácia da decisão212.
Não sendo de outra maneira, nota-se que o pressuposto implícito para a concessão da
liminar, será, portanto, a ocorrência de lesão irreparável a pessoas, à sociedade, à ordem, à
segurança e à economia pública213.
Ressalta-se que a liminar suspenderá o ato impugnado do Poder Público, contudo, seu
efeito, em princípio, não retroage, ou seja, a partir de sua publicação no Diário da Justiça da
União, a liminar deferida não sustará o que se aperfeiçoou durante a vigência do ato
impugnado pela ADPF, não voltando no tempo os efeitos concedidos quando do acolhimento
da liminar arguida214.
Portanto, pode-se perceber que, por cautela, quando deferido o pedido de medida
liminar, esta poderá suspender o ato impugnado do Poder Público, sem, contudo, retroagir às
consequências decorrentes de sua vigência.
Vencido exposto, é prudente que se exponha que a liminar concedida para se garantir a
eficácia ulterior do juízo de procedência da ADPF, não se confunde com antecipação de
210 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 54. 211 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 52. 212 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 52. 213 TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989. p. 49. 214 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 53.
78
tutela. Esta afirmação se reforça ainda mais quando se vê que um dos efeitos da liminar
poderá consistir na suspensão de processos, tal qual funcionasse a cautela como o efeito
suspensivo que poderá ser agregado ao agravo de instrumento em relação ao ato impugnado
no feito principal. Não existe, frise-se, um efeito que retroaja do juízo de procedência da
arguição com a concessão da liminar. Isto procede sobremaneira, eis o processo de onde se
originou a arguição pode ter como assunto a ser decidido, outra causa além da controvérsia
constitucional. De outro norte, a cautela liminarmente concedida vigorará até a decisão
definitiva da arguição215.
Desta feita, o despacho que defere a liminar, constitui um poderoso meio para se evitar
abuso do Poder Público; todavia, deve ser lembrado que há um certo receio na medida em que
o instrumento poderá ser usado pelo próprio Poder Público diante de decisões judiciais que
lhes sejam desfavoráveis e que envolvam interpretação de direitos fundamentais com o único
fim de protelar o andamento das ações216.
Cabalmente, pode-se assimilar que o despacho liminar que aprecia, entre outras
causas, ao pedido de medida liminar na Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental poderá ser positivo, oportunidade em que será concedida a liminar, sem,
contudo, retroagir ao alcance dos efeitos do ato impugnado durante sua vigência, ou, ainda,
poderá ser negativo, quando, negar o pedido liminar, ou mesmo indeferir a inicial, que
acarretará no arquivamento do processo.
4.4.3 O Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União na ADPF
Conforme já exposto anteriormente, há a possibilidade de manifestação no processo
instaurado em decorrência da ADPF, prestadas ou não as informações pelas autoridades
responsáveis pela prática do ato questionado, do Advogado-Geral da União, na qualidade de
curador da presunção de constitucionalidade do ato normativo arguido de
inconstitucionalidade, sob o papel de defensor do mesmo, e do Procurador-Geral da União, na
qualidade de órgão interveniente, sob o papel de custus legis, ou seja, fiscal da lei, no prazo de
5 (cinco) dias217.
215 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 54. 216 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 55. 217 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 271.
79
Deste modo, verifica-se que, interposta a ADPF, serão chamados à lide o Advogado-
Geral da União, como curador/defensor do ato guerreado, e o Procurador-Geral da República,
com a função de fiscalizar a lei, em decorrência de sua primordial função, qual seja, defender
os interesses da sociedade.
Convém salientar que o Advogado-Geral da União não é parte no processo objetivo,
sendo comum a ideia de que se trata mais de um curador para a norma acusada de desrespeitar
a Constituição, quando se tratar de controle concentrado218.
A Lei de Arguição apenas explicita a manifestação do Advogado-Geral da União
quando se tratar da concessão de medida liminar, a fim de facultar ao relator da ADPF sua
oitiva previamente à outorga da medida, no prazo de cinco dias. Contudo, dada a não
obrigatoriedade desta manifestação, caberá ao relator a avaliação da necessidade ao deslinde
do feito, da manifestação do Advogado-Geral da União219.
Destarte, parece claro que é prescindível a manifestação do Advogado-Geral da União,
se manifestar quando do deferimento de liminar, cabendo ao relator do processo decidir a
relevância de referida manifestação. Contudo, há de se ter cautela, tendo em vista o declinado
constitucionalmente.
Não obstante o disposto na Lei 9.882/99, a Constituição prevê de forma expressa, a
presença do Advogado-Geral da União sempre que se tratar de impugnação de ato normativo,
devendo funcionar como curador do ato, à inteligência do art. 103, § 3º da CRFB/88, sendo
uma missão atribuída ao mesmo, e da qual não poderá declinar220.
Desta maneira, logra-se o entendimento de que, em consonância à determinação
constitucional, sempre que se alegar descumprimento de preceito fundamental levado a efeito
via ato normativo do Poder Público, de qualquer nível ou espécie, terá de ser “citado” o
Curador, durante o processo, para fins de atuar na defesa do indigitado ato atacado221.
Portanto, é notória a importância da manifestação do Advogado-Geral da União
quando o Supremo Tribunal Federal verificar a inconstitucionalidade de norma legal ou ato
normativo, eis que incumbe, necessariamente, ao primeiro, defender o ato ou texto
impugnado. 218 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 284. 219 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 284. 220 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 284. 221 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 284.
80
De outra banda, não bastasse o § 1º, do art. 103, da Carta Política de 1988, que
determina que o Procurador-Geral da República deverá ser previamente ouvido em todos os
processos de competência do STF, a Lei de Arguição veio à reforçar a ideia, quando
determina que nas arguições que não houver formulado, terá o Ministério Público, vista do
processo, por cinco dias, após o decurso do prazo para informações222.
Na esteira de ratificar o consignado no parágrafo anterior, é o escólio de André Ramos
Tavares:
A disciplina constitucional do processo objetivo determina que em todas as ações de competência do Supremo Tribunal Federal se manifeste o Procurador-Geral da República (art. 103, § 1º). Só à luz dessa norma se pode compreender a L.A., no momento em que é flagrada preceituando, em seu ar. 7º: “Parágrafo único. O Ministério Público, nas arguições que não houver formulado, terá vista do processo, por cinco dias, após o decurso do prazo para informações”223.
Completando este raciocínio quanto ao Procurador-Geral da República, vê-se que,
indiferentemente, de ocupar a posição de autor da ação ou não, sempre há de oferecer seu
parecer, enquanto ocupar a posição constitucional de fiscal da lei. Logo, numa interpretação
lógica dada pelo Texto Magno, será regra compreendida no sentido de que, além de
pronunciar-se, necessariamente, naqueles processos em que já funciona, o termo “membro do
Ministério Público” terá acolhimento também nos demais processos de Arguição de
Descumprimento, seja na principal, seja na de caráter incidental, independendo, pois, da
verificação de quem seja o requerente da demanda judicial224.
E, por fim, nota-se que não obstante uma eventual redundância ao texto constitucional,
a Lei de Arguição previu que o Ministério Público, nas arguições em que não houver
formulado, terá vista do processo, pelo prazo de 5 dias, sendo, somente obrigatória, após as
informações, nas arguições que não forem propostas por ele225.
Derradeiro, chega-se à premissa de que o Procurador-Geral da República, exercendo
seu primeiro e nobre papel de defensor da sociedade e fiscal da lei, deve ser prestigiado não
só em toda ação de inconstitucionalidade, bem como em todo e qualquer processo de
222 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 734. 223 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 284. 224 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 284. 225 PAGANELLA, Marco Aurélio. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental no Contexto do Controle da Constitucionalidade. São Paulo: LTR, 2004. p. 104.
81
competência originária do STF, sendo sua manifestação, imprescindível para o juízo final das
questões versadas em expedientes acerca da constitucionalidade.
4.4.4 O julgamento e efeitos da decisão proferida na ADPF
Quando da ocasião de julgamento da ADPF, em obediência ao estabelecido pelo artigo
8º, da Lei de Arguição, a decisão sobre a ação somente será tomada se presentes na sessão
pelo menos dois terços dos Ministros. Sublinhe-se que a lei não estabelece quorum
qualificado para a votação, contudo, se houver necessidade de declaração de
inconstitucionalidade do ato do Poder Público que tenha descumprido preceito fundamental,
nos termos do art. 97 do Texto Máximo, haverá a necessidade de maioria absoluta226.
Nota-se, por oportuno, que o quorum de instalação da sessão de julgamento obedece
ao padrão geral da ação direta de inconstitucionalidade, iniciando-se o julgamento desde que
presentes oito Ministros, e, para a decisão, exige-se o voto de pelo menos seis dos
Ministros227.
De forma mais detalhada, observa-se que, decorrido o prazo das informações, o
Ministério Público terá vista dos autos por cinco dias, não havendo previsão de vista dos autos
caso o Ministério Público seja o proponente da ação. Ato contínuo, o relator lançará seu
relatório, com cópias para todos os ministros, pedindo dia para o julgamento228.
Exposto isto, salienta-se que, a critério do relator, poderão ser autorizadas a
sustentação oral ou a juntada de memoriais, sendo a decisão do pleno tomada somente se
presentes na sessão pelo menos 2/3 dos ministros (8 dos 11 ministros é o quorum de
instalação). Tendo em vista a falta de previsão expressa, entende-se que a decisão declaratória
de uma inconstitucionalidade na ADPF depende do voto de seis Ministros, sendo esta uma
regra geral prevista no artigo 97 da CRFB/88 e no artigo 173 do Regimento Interno do
STF229.
Por último, julgada a ação, o Pretório Excelso comunicará às autoridades ou órgãos
responsáveis as condições e o modo de interpretação e aplicação do preceito fundamental, 226 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 735. 227 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 284. 228 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 424. 229 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 424.
82
agora já tido como de fato violado. O presidente do tribunal determinará o cumprimento
imediato da decisão, lavrando-se, em momento posterior, o acórdão. No prazo de 10 dias, a
contar do trânsito em julgado da decisão, a parte dispositiva da mesma será publicada via
Diário da Justiça e Diário Oficial da União230.
Nesta senda, quanto ao procedimento para julgamento da ADPF, pode-se perceber
que, num primeiro ângulo, para instalação da sessão de julgamento da arguição, faz necessária
a presença de pelo menos 2/3 dos Ministros, o que soma a quantia de 8. Contudo, para a
declaração da inconstitucionalidade na Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental dependerá do voto de 6 Ministros, que é uma regra adotada em virtude do art. 97
da CF/88 e art. 173 do Regimento Interno do Supremo. Já, num âmbito de que a sessão seja
instalada e o processo julgado, o presidente do STF determinará que a decisão seja cumprida
imediatamente, nada obstante a não lavratura do acórdão, que poderá se dar em momento
posterior.
Já em sede de se versar acerca dos efeitos da decisão proferida na ADPF, explica-se
que a decisão definitiva de mérito, provida de eficácia contra todos e caráter vinculante
relativamente aos demais órgãos do Poder Público, opera efeitos retroativos até o momento da
produção do ato questionado, que podem ser modulados ponderadamente ao controle de
constitucionalidade231.
Abrilhantando este raciocínio, expõe-se que a decisão proferida terá eficácia contra
todos e efeitos vinculantes (art. 10, § 3º, da Lei de Arguição), alcançando, na dicção da lei,
“os demais órgãos do Poder Público”, o que tornaria, nesta particularidade, a decisão em
ADPF, mais ampla do que a proferida em ADIn ou ADC, quando a vinculação opera
relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e
indireta, nas esferas federal, estadual e municipal232.
Ainda, Pedro Lenza quando se manifesta acerca da eficácia e efeito vinculante da
decisão proferida em ADPF, adverte:
Da mesma forma como acontece na ADIn, como exceção à regra geral do princípio da nulidade, ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, no processo de arguição de descumprimento de preceito fundamental, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de
230 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 424. 231 MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional: Teoria da Constituição, p. 272. 232 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 286.
83
excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria qualificada de 2/3 de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado (ex nunc) ou de outro momento que venha a ser fixado233.
Ou seja, que, presentes determinadas situações que restrinjam a possibilidade de se
atribuir um efeito retroativo à decisão proferida em sede de ADPF, o STF, respeitando a
maioria de 2/3 de seus membros, tem a discricionariedade de delimitar que os efeitos oriundos
da referida decisão tenham eficácia a partir do trânsito em julgado, ou, até mesmo, de
momento distinto que venha a ser escolhido.
Em outras palavras, versa-se que referida disposição da possibilidade de restrição dos
efeitos retroativos, permite adequar os efeitos da declaração de inconstitucionalidade à
complexidade da sociedade moderna e à coexistência de múltiplos valores que também devem
ser tutelados pela ordem jurídica; nisso, ao reconhecer a segurança jurídica e excepcional
interesse social, a Corte poderá avaliar com prudência a presença de ambos, bem como a
conveniência de não se atribuir eficácia retroativa à decisão234.
Falando-se no efeito vinculante da decisão final proferida na ADPF, salutar que se
esclareça que os juízes e tribunais deverão proferir decisão compatível com o entendimento
do STF sobre a matéria objeto da arguição, e, a não observância da regra, enseja reclamação
do autor da ação abstrata ao STF, que apreciará a questão sem a participação dos tribunais
existentes entre o órgão que inobservou o efeito vinculante e o próprio STF235.
Completando, cumpre-se observar que a decisão que julgar procedente ou
improcedente o pedido em ADPF é irrecorrível, não podendo a mesma, ser objeto de ação
rescisória236.
Por fim, revisando os pontos principais dos efeitos da decisão em Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental, constata-se que, embora a eficácia seja contra
todos e vincule os demais órgãos do Poder Público, como por exemplo, os demais juízos e
tribunais devem julgar questões semelhantes em unissonância à posição do STF, os efeitos,
quando se tratar de retroatividade, poderão ser restritos ao trânsito em julgado ou outro
233 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, p. 242. 234 CAMPO, Hélio Márcio. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, p. 65. 235 CHIMENTI, Ricardo Cunha... [et al.]. Curso de Direito Constitucional, p. 425. 236 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 735.
84
momento definido pela maioria de 2/3 dos Ministros, decisão está que será estribada num
contexto social de interesse e segurança jurídica.
85
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com efeito, constata-se que o presente trabalho monográfico logrou êxito em seu
objetivo geral, qual seja, “pesquisar o controle de constitucionalidade no Brasil bem como
realizar um estudo específico sobre a Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental”.
Quanto aos objetivos específicos, os problemas e respectivas hipóteses, diz-se que
foram alcançados (os objetivos) e confirmados (as hipóteses), conforme se extrai de cada
capítulo elaborado com base na proposição dos objetivos e problemas constantes na parte
introdutória da presente pesquisa.
O primeiro capítulo, elaborado no intuito de atender ao primeiro objetivo específico e
responder ao primeiro problema, quais sejam, o primeiro objetivo específico: “analisar as
etapas históricas do controle de constitucionalidade no Brasil desde a Constituição Imperial
de 1824 até a atual CRFB/88” e, o primeiro problema: “como ocorreu a evolução do controle
de constitucionalidade no Brasil, desde sua Constituição Imperial até o regime de vigência da
atual Carta Política de 1988?”, não só atingiu o objetivo como também confirmou a hipótese
proposta preambularmente, que expunha que “o controle de constitucionalidade no Brasil
evoluiu de forma paulatina, não necessariamente melhorando a cada Constituição
promulgada, eis que, tendo em vista a ocorrência de regimes autoritários, o controle de
constitucionalidade sofreu aclives e declives na evolução histórica das Constituições que
vigeram no Brasil”.
Senão vejamos.
Observou-se que a Constituição Imperial de 1824, mesmo investida num modelo
considerado liberalista para a época, o que lhe era um ponto dado como positivo, não
amparava um válido e eficaz controle de constitucionalidade, tendo em vista que, por ser
semi-rígida, seria informalmente alterada por uma norma que viesse ao seu arrepio.
Passando à Constituição de 1891, percebeu-se que esta deu um grande passo no
controle de constitucionalidade, já que previa o controle de constitucionalidade na forma
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difusa e elencava como competência do Supremo Tribunal Federal a apreciação de questões
concernentes à constitucionalidade de leis ou atos do Poder Público.
Por sua vez, embora sucinta, a Constituição de 1934, trouxe uma inovação no controle
de constitucionalidade não existente até então, qual seja, a suspensão primária pelo Senado
Federal de lei declarada inconstitucional pelo Poder Judiciário.
Representando um retrocesso no controle de constitucionalidade, a Carta Política de
1937 veio estribada num modelo autoritário que endeusava a figura do Presidente da
República e permitia ao mesmo, quando o Judiciário declarava inconstitucionalidade de lei ou
ato normativo, submeter novamente o diploma invalidado ao Legislativo, que, aprovando-o,
anulava a decisão do Judiciário, num duvidoso espeque de interesse nacional da norma
derribada no âmbito judicial.
Já a Carta Máxima de 1946 veio a restaurar o sistema de controle de
constitucionalidade, e, a posterior Emenda à Constituição de 1965 avivou o controle, ao passo
que introduziu e fortaleceu o controle direto concreto e abstrato da constitucionalidade e o
controle indireto quando se fala em recorrer ao Pretório Excelso para se buscar a guarida ao
Texto Magno.
Passando rapidamente pela Constituição de 1967, expõe-se que esta, embora
centralizadora do poder na esfera federal, não trouxe mudanças significativas ao controle de
constitucionalidade.
Por fim, no que diz respeito ao 1º capítulo, chega-se à vigência da atual Carta Política
de 1988, que ampliou o controle difuso da constitucionalidade pelo STF quando da remessa
de recursos extraordinários para sua apreciação, bem como inovou nas ações específicas de
controle de constitucionalidade, introduzindo a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade e,
sob o atual contexto constitucional, editou-se as Leis 9.868/99 (regulamenta a ação direta de
inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade), e 9.882/99 (regulamenta a
ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental).
Na esteira de confirmar a hipótese dada ao segundo problema e atender ao segundo
objetivo específico, elabora-se o Capítulo 2, apontando-se as ações específicas para o controle
de constitucionalidade no Brasil.
Desta maneira, dá-se um conceito ao controle de constitucionalidade, elaborando-se
um esquema para melhor assimilação do mesmo.
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No referido esquema, verifica-se que as formas de inconstitucionalidade, do controle
de inconstitucionalidade, os órgãos de controle, os critérios, os meios, e os efeitos da decisão
exarada nos autos de uma ação que vise a tutelar o Texto Magno.
Momento subsequente, aborda-se o controle preventivo de constitucionalidade, o
controle repressivo de constitucionalidade, adentrando-se finalmente ao cerne do segundo
capítulo, quando, do subitem 3.3.2.2, se menciona o objeto e características gerais das
seguintes ações que visam à guarida constitucional: Ação Direta de Inconstitucionalidade
Genérica, cujo objeto é a lei ou ato normativo que se mostrarem incompatíveis com o sistema;
Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva, cujo objeto é tutelar os princípios
constitucionais considerados sensíveis de lei ou ato normativo estadual contrário àqueles;
Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, cujo objeto é sanar a ausência de lei que
torne executável direito previsto constitucionalmente; Ação Declaratória de
Inconstitucionalidade, cujo objeto é tornar uma presunção relativa de constitucionalidade de
determinada norma ou ato normativo, em presunção absoluta, dirimindo-se controvérsias
acerca do tema declarado constitucional; e, Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito
fundamental, cujos maiores detalhes foram objeto do capítulo seguinte.
Assim, confirma-se a hipótese dada ao segundo problema, tendo em vista que se
ratifica o afirmado, mencionando-se que, sem dúvida, “há no Brasil uma série de instrumentos
capazes de garantir a inviolabilidade do Texto Magno, sendo cada uma, conforme o tipo de
inconstitucionalidade a ser combatido, competente para se lograr a proteção da Constituição”.
Finalmente, no terceiro capítulo foi tratado, exclusiva e especificamente, acerca da
Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), visualizando-se a
parte conceitual, as modalidades da ADPF, os legitimados para sua propositura e o
procedimento da mesma.
Ratificando o conceito exposto nas categorias estratégicas da presente pesquisa,
ratificou-se a ADPF como de fato, sendo um instrumento previsto na CRFB/88 cuja função é
velar pelos preceitos fundamentais constantes no Texto Magno, que não puderem ser
protegidos por expediente diverso.
Constatou-se que a ADPF pode ter duas modalidades, quais sejam, a ADPF autônoma
e a ADPF incidental.
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A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental via autônoma, trata-se de
ação pela qual os chamados legitimados universais ou especiais argúem de
inconstitucionalidade leis ou atos normativos, diretamente perante o Pretório Excelso.
Já a ADPF incidental é uma modalidade de arguição que pode ser proposta por
qualquer um em demanda judicial. Assim, compreendeu-se que se uma parte em litígio flagra
uma lesão à preceito fundamental, decorrente de norma ou ato normativo do Poder Público,
poder-se-á instaurar um incidente de arguição que será, também, apreciado pelo STF, na
medida em que o mérito dos autos principais continuam de competência do juízo de instância
inferior onde tramitava ação dita abstrata.
Na etapa posterior, notou-se que os legitimados para a propositura para a ADPF
dividem-se em dois casos.
Para se propor uma ADPF autônoma são legitimados os seguintes órgãos/sujeitos:
Presidente da República, pela Mesa do Senado Federal, Câmara dos Deputados, Assembléia
Legislativa ou Câmara de Vereadores, por Governador de Estado ou Distrito Federal, pelo
Procurador-Geral da República, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil,
por partido político com representação no Congresso Nacional, por confederação sindical ou,
ainda, por entidade de classe de âmbito nacional.
De outro norte, para que se proponha uma ADPF incidental, conforme já consignado,
basta qualquer uma das partes em litígio, verificar descumprimento de preceito fundamental
por norma ou ato normativo, que estará apta para arguir em sede de ADPF incidental, a
inconstitucionalidade a ser apreciada pelo Supremo Tribunal Federal.
Por fim, adentrou-se na parte procedimental da ADPF, onde se analisou a forma da
petição inicial bem como seus requisitos, o despacho liminar exarado na ADPF e suas
consequências, os papéis do Procurador-Geral da República e do Advogado-Geral da União
no âmbito da arguição, e, o julgamento e efeitos da decisão final proferida na Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental.
Não sendo de outra maneira, responde-se ao terceiro problema proposto, qual seja, “a
Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental é um instrumento eficiente a
ser utilizados por cada cidadão num contexto de controle de constitucionalidade?” de forma a
confirmar a hipótese proposta de que “embora a ADPF seja um eficaz meio de combate a
inconstitucionalidade de leis ou atos normativos, sua interposição é dificultosa, eis que isto só
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será possível quando não houver outro meio capaz de garantir a integridade de um preceito
fundamental, e, conforme o caso, é restrito a certos sujeitos de direito, que detêm a
competência de propositura da mesma”. Contudo, é de se ressaltar que sem embargo da
confirmação da hipótese, ampliou-se o conteúdo programado, eis que, conforme dito, além de
responder implicitamente ao terceiro problema, verificou-se demais aspectos das ADPF como
um todo.
Por derradeiro e finalmente, é de grande importância que se consigne que, nada
obstante ao êxito no objetivo geral, nos objetivos específicos e na confirmação das hipóteses
propostas na fase inaugural da presente pesquisa, não se tem a pretensão de exaurir as
questões relacionadas ao tema investigado, sendo o presente trabalho um enfoque aos
aspectos e particularidades do tema julgados pertinentes pelo autor quando da feitura do
mesmo.
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