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ISSN 2447-2468 ANO 14 | OUTUBRO | Nº 49 | 2015 REVISTA DO SINDICATO NACIONAL DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO CENTRAL O DESAJUSTE DAS CONTAS PÚBLICAS ENTREVISTA COM A PRESIDENTE DO MAGAZINE LUIZA

O DESAJUSTE DAS CONTAS - sinal.org.br · OUTUBRO 2015 1 ˜ CARTA DO CONSELHO Dormia, a nossa Pátria mãe tão distraída, Sem perceber que era subtraída, em tenebrosas transações

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ISSN 2447-2468 ANO 14 | OUTUBRO | Nº 49 | 2015

REVISTA DO SINDICATO NACIONAL DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO CENTRAL

O DESAJUSTE DAS CONTAS PÚBLICAS

ENTREVISTA COM A PRESIDENTE DO MAGAZINE LUIZA

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OUTUBRO 2015 1

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CARTA DO CONSELHO

Dormia, a nossa Pátria mãe tão distraída,Sem perceber que era subtraída, em tenebrosas transações.Chico Buarque, em Vai Passar

O ano de 2015 anuncia com letras garrafais ser o segundo con-secutivo de encolhimento do PIB, acompanhado do aumento do desemprego e um índice de inflação dois a três pontos acima do teto da meta fixada pelas autoridades monetárias do governo.

Um cenário internacional adverso é condicionante? Talvez, mas os vizinhos e as economias centrais têm crescido a ritmo mais alentador e poderão repetir suas performances neste ano. Seguramente não é só por isso.

Nesta edição, a Por Sinal procura jogar mais luz sobre a questão do desenvolvimento da economia brasileira.

O desajuste das contas públicas, como não poderia deixar de ser, abre a edição. A preferência pelos cortes de despesas sociais e o aumento da tributação de forma indiscriminada sobre toda a economia afetam todos os setores da nacionalidade. Todos? Um, que o leitor não terá dificuldade de adivinhar qual, parece escapar da tesoura: em Os bancos vão bem, obrigado, um retrato de um segmento que ganha na riqueza e na pobreza. São Poucos, mas poderosos, seis gigantes financeiros concentram 80% dos recursos movimentados pelos brasileiros. Em Um exemplo de inclusão financeira você saberá mais sobre o que são e o papel que cumprem e podem cumprir as cooperativas de crédito, na construção de um sistema financeiro cidadão. Também é apresentado ao leitor o Registrato – Extrato do Registro de Informações no Banco Central, sistema que fornece para o cidadão informações disponíveis em cadastros administrados pelo Banco Central do Brasil.

Três importantes assuntos são abordados pelos arti-culistas desta edição: Aldomar Guimarães apresenta uma visão para não especialistas da Contabilidade e orçamento públicos; Iso Sendacz desenvolve ideias para conceituar o

Desenvolvimento equilibrado; e Luciane Moessa de Souza cor-relaciona Sustentabilidade socioambiental e sistema financeiro. Os dois primeiros são Especialistas e a terceira é Procuradora, todos das carreiras do Banco Central do Brasil.

A Por Sinal teve a honra de entrevistar Luiza Trajano, exemplo de mulher batalhadora e vitoriosa. Conhecida pela sua pujante atividade no comércio, a conversa revelou outros aspectos da sua contribuição ao país, como autoridade olímpica e liderança de vanguarda na modernização do varejo.

Constam como principal na peça orçamentária despesas destinadas ao serviço da dívida pública e à sustentação do câmbio, em uma economia com dependência de capitais externos e importação de insumos e produtos de consumo. A melhor estimativa é que se gastará, em 2015, cerca de três vezes mais com juros e derivativos cambiais do que com a folha de pagamento dos servidores da União, múltiplo que sobe até 12 vezes ou além quando o assunto é saúde ou educação.

Neste período de ajuste fiscal, servidores públicos federais, como aqueles que desempenham no Banco Central do Brasil a missão de resgatar o poder de compra da nossa moeda e asse-gurar a solidez e eficiência do sistema financeiro nacional, são chamados a pagar do bolso uma parte da conta do orçamento deficitário da União.

Ademais, a redução dos salários públicos, mediante a com-binação de congelamento nominal e subcorreção da inflação, como o governo anuncia fazer, longe de promover o ajuste fiscal, tende a agravá-lo com a redução do consumo e, por con-sequência, da atividade econômica e da arrecadação tributária, aumentando o buraco que parece estar sendo cavado sob os pés de todos os brasileiros. Que pode levar a um enfraquecimento ainda maior do Estado nacional, defesa última daqueles que têm como seu o título de cidadão brasileiro.

Com os bolsos vazios, mas o coração cheio de esperança e fé no nosso Brasil, vamos à leitura da Por Sinal, edição n° 49!

Na conta dos servidores federais

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Por Sinal

Revista do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central do Brasil

Conselho Editorial

Aldomar Guimarães dos Santos, Clovis de Lima Barbosa Junior,

Daro Marcos Piffer, Iso Sendacz, Mauro Cattabriga de Barros,

Nehemias Monteiro Junior, Ricardo Luis Piccoli, Rubens Gandelman

Secretária: Sandra de Sousa Leal

SCS Quadra 01 – Bloco G sala 401 – Térreo

Ed. Baracat – Asa Sul – Cep 70.309-900 – Brasília – DF

Telefone: (61) 3322-8208

[email protected]

www.sinal.org.br

Redação

Coordenação-geral e edição: Flavia Cavalcanti

(Letra Viva Comunicação)

Reportagem: Paulo Vasconcellos e Jefferson Guedes

Diagramação: Tabaruba Design

llustrações: Claudio Duarte

Impressão: Sol Gráfica

Tiragem: 7.500

Assessoria de Comunicação do Sinal Nacional: Rapport.

www.rapportcomunica.com

Permitida a reprodução das matérias, desde que citada a fonte.

O Conselho Editorial não se responsabiliza pelas opiniões expressas

nos artigos assinados.

SINDICATO NACIONAL DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO CENTRAL (SINAL)

EXPEDIENTE ANO 14 NÚMERO 49 OUTUBRO 2015

CONSELHO NACIONAL BIÊNIO 2015/2017

Presidente

Daro Marcos Piffer

Belém

José Flávio Silva Corrêa

Brasília

Rita Girão Guimarães

José Ricardo Costa e Silva

Gregório Alberto Saiz Lopes

Josina Maria de Oliveira

Belo Horizonte

Renato Fabiano Matheus

Curitiba

Enrikson Antonio Falabretti

Fortaleza

Francisco de Assis Tancredi Soares

Porto Alegre

Ricardo Luis Piccoli

Recife

José Milton Bezerra

Rio de Janeiro

Sergio da Luz Belsito

João Marcus Monteiro

Marcos Antonio da Silva Lopes

José Aloísio Guimarães Sanches

Salvador

Epitácio da Silva Ribeiro

São Paulo

Paulo Lino Gonçalves

Eduardo Stallin Silva

Aldomar Guimarães dos Santos

Daro Marcos Piffer

DIRETORIA EXECUTIVA NACIONAL BIÊNIO 2015/2017

Presidente

Daro Marcos Piffer

Secretário

Epitácio da Silva Ribeiro

Diretor Financeiro

Ivonil Guimarães Dias de Carvalho

Diretor Jurídico

Jordan Alisson Pereira

Diretor de Comunicação

Iso Sendacz

Diretor de Assuntos Previdenciários

José Vieira Leite

Diretor de Relações Externas

Luis Carlos Paes de Castro

Diretor de Estudos Técnicos

Mauro Cattabriga de Barros

Diretor de Qualidade de Vida

Márcio Silva de Araujo

Diretora de Ações Estratégicas

Rita Girão Guimarães

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NESTA EDIÇÃO

ENTREVISTA A GRANDE DAMA DO VAREJO

PÁGINA30

NOVO PACOTE FISCAL

O desajuste das contas públicasPÁGINA 4

A CARA DA CRISE

Os bancos vão bem, obrigado!PÁGINA 12

CONCENTRAÇÃO BANCÁRIA

Poucos, mas poderososPÁGINA 20

COOPERATIVAS DE CRÉDITO

A resposta dos pequenosPÁGINA 32

DIREITOS DO CONSUMIDOR

Cidadania na redePÁGINA 36

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PROPOSTA PRIORIZA CORTES QUE PREJUDICAM TRABALHADORES E SERVIDORES PÚBLICOS E DESCARTA AUMENTOS DA RECEITA COM IMPOSTOS SOBRE GRANDES FORTUNAS E GANHOS DE CAPITAL.

PAULO VASCONCELLOS

O desajuste das contas públicas

NOVO PACOTE FISCAL

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O pacote com que o gover-no Dilma tenta arrumar as contas públicas e ganhar alguma muscu-latura para recuperar a

governabilidade conseguiu desagradar quase todos os setores da sociedade. A proposta, alicerçada em um novo tri-buto e na penalização de trabalhadores e servidores públicos, com a posterga-ção de reajustes salariais e o corte de concursos que prejudicam ainda mais a prestação de serviços à população, aprofunda o ajuste fiscal. A boia de sal-vação não toca em questões essenciais, como os juros bancários, que engordam os cofres do sistema financeiro, nem apresenta novidades que revertam o processo recessivo da economia, mas tenta debelar o fogo político do impea-chment que já parecia superado quando o governo decidiu remeter ao Congresso Nacional a proposta do orçamento do ano que vem com previsão de rombo.

O resultado não podia ser pior. A troca da contabilidade criativa, que pôs uma corda no pescoço do segundo man-dato da presidente Dilma Rousseff, por um choque de transparência, que levou o país a perder o grau de investimento, tornou o cenário mais sombrio. Afinal, o que alimenta o cerco oposicionista pode ser a corrupção, mas o que isola o governo é a economia. A resposta, mar-cada por certa dose de improviso que exaspera até os últimos aliados, virá de novas fontes de receitas e de cortes na carne da máquina administrativa. Não há saída. Mas pode ser que os parlamen-tares pensem diferente.

Um erro de cálculo, e não as pedala-das fiscais, levou o ajuste fiscal a provocar o desajuste orçamentário. O buraco de R$ 30 bilhões previsto para o ano que vem e a estimativa de que a dívida pública, à beira do 70% do PIB, só vai cair já às vés-peras da eleição de 2018, são consequên-cias do impacto das medidas econômicas do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, so-bre a principal fonte de recursos públicos: o consumo. Para combater o problema, o governo reagiu com um leque tão variado de opções, que vão da racionalização de gastos ao aumento de impostos, passando por reformas institucionais que depen-dem de um Congresso pouco confiável, que corre o risco de se perder na falta de foco. A ideia é transformar o prejuízo em uma sobra de R$ 34 bilhões.

A bússola que norteou o pacote foi conservadora, mas preservou algumas joias da coroa petista. Representantes do setor produtivo reivindicavam que as medidas incluíssem o fim de programas sociais e o congelamento do salário mí-nimo, enquanto economistas seguidores de cartilhas menos ortodoxas, defendiam um cavalo-de-pau na direção de impostos progressivos e a preservação dos investi-mentos públicos para a retomada do cres-cimento. Por conta da inflação, ninguém sequer sugeriu uma redução da Selic, que indexa diretamente a quinta parte da dí-vida pública e acaba comprometendo qualquer esforço fiscal.

“Desde que foi implementada a Lei de Responsabilidade Fiscal não havía-mos tido um déficit fiscal no fechamento do ano”, afirma o economista Fernando Ferrari Filho, da Universidade Federal do

Rio Grande do Sul (UFRGS). “Não temos experiência de solução para o problema fiscal em ambiente de recessão”, diz o economista Márcio Pochmann, presi-dente da Fundação Perseu Abramo, do PT, que presidiu o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), vinculado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, de 2007 a 2012. “Desde a explosão da dívida pública que se seguiu à crise de 2008 em diversos países avançados, muitos economistas se concentraram em medir o efeito de um ajuste fiscal sobre o crescimento econô-mico. Vários desses trabalhos indicaram que os ajustes, por terem efeito negativo sobre o próprio crescimento (especial-mente se implementados durante uma recessão), podem levar a uma espiral em que a queda no nível de atividade preju-dica a arrecadação tributária, elevando ainda mais o déficit e a dívida pública em relação ao PIB”, revela a economista Laura Carvalho. “O déficit primário já é produto do desacerto do ajuste fiscal. A economia estava desacelerando e o governo, ao fa-zer o ajuste, dá também um choque de juros para colocar a inflação na meta. Foi um erro do conjunto da obra”, declarou o economista Luiz Gonzaga Beluzzo em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.

RADIOGRAFIA DA CRISEO conjunto da obra é resultado de uma política fiscal expansionista combinada à trajetória de crescimento da taxa de ju-ros em um ambiente inflacionário e de crise internacional para os produtos bra-sileiros. Entre 2011 e 2014, os resultados primários, em relação ao PIB, caíram ano

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após ano. No primeiro ano do primei-ro governo Dilma Rousseff fechou com superávit de 3,1%. No último, em 2014, foi de menos 0,6%. O déficit nominal (primário mais financeiro) atingiu 6,7% do PIB. As pedaladas fiscais, segundo es-pecialistas em finanças públicas, mas-cararam os resultados, enquanto não apareceram. Mas em julho o déficit no-minal bateu na marca de 8,0%. A dívida bruta do governo deverá alcançar este ano 65,5% do PIB. Somente com as ope-rações do Banco Central para controlar a liquidez da economia, os custos chega-rão a mais de R$ 120 bilhões em 2015. A Selic, em 14,25% ao ano, contribui para aumentar o rombo. As despesas com juros acumuladas em 12 meses, de junho de 2014 a junho de 2015, se aproximavam de R$ 420 bilhões. Deve fechar o ano acima dos R$ 490 bilhões. “Nada menos de 49% do orçamento da União é para a rolagem da dívida e o pagamento dos juros”, diz Paulo Kliass, doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental.

O governo demorou, mas reagiu. A meta para o resultado primário foi revis-ta para 0,15% do PIB, mas até isso pode dar errado. Para fechar as contas, propôs um novo aperto no ajuste fiscal. Houve contingenciamento de R$ 80 bilhões, completado por um pacote adicional de corte e um conjunto de medidas para expandir a arrecadação. A maior parte da redução de despesas concentrou-se em investimentos. A queda na exe-cução do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC do governo federal, menina dos olhos da presidente Dilma,

chegou a quase 40%. Decretos alteraram a tributação do PIS/Cofins e IOF sobre as operações de crédito às pessoas físi-cas, além do fim da desoneração do IPI e da folha de pagamentos, que só no ano passado atingiram R$ 100 bilhões em economia para o cofre das empresas sem que tivessem provocado os resultados esperados pelo governo no crescimento da produção e do emprego.

Junto com a proposta de Orçamento da União de 2016, entregue no fim de agosto, ao presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros, do PMDB, com a previsão de um déficit pri-mário equivalente a 0,5% do PIB, veio também o reconhecimento oficial de um cenário desalentador. A economia brasileira deve crescer 0,2% em 2016, com inflação de 5,4% (no acumulado do IPCA) e salário mínimo de R$ 865. Para 2015, projeta-se uma retração do PIB de 1,8%, com o índice IPCA em 9,25% e o atual valor do mínimo em R$ 788. A previsão foi anunciada pelo ministro do Planejamento, Nélson Barbosa. Para tampar o rombo, o governo cassou a isen-ção tributária de computadores, tablets e smartphones, aumentará em 30% a tri-butação de bebidas alcoólicas e vai cobrar 1,5% de IOF sobre operações de crédito do BNDES, principal banco de fomento do país. Essas mudanças reforçariam o caixa em R$ 11,2 bilhões. O Palácio do Planalto também propõe a venda de par-ticipações acionárias nas administrações direta e indireta, a alienação de imóveis da União e a ampliação do programa de concessões, o que permitiria arrecadar outros R$ 37,3 bilhões em 2016.

Economistas ligados ao governo apostam que há maiores possibilidade de fortalecer os cofres públicos com uma redistribuição da carga tributária do que com a criação de novos impostos. Por exemplo: taxando os lucros e dividendos de sócios e donos de empresas. A medida poderia engordar a receita com R$ 50 bilhões por ano — mais do que suficiente para tampar o rombo orçamentário do ano que vem.

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R$ 26 bilhões em cortes, incluindo o PAC e o Minha Casa, Minha Vida. Outros R$ 5,9 bilhões viriam da receita pela redução do gasto tributário, mais R$ 6 bilhões em rea-locação de fontes de receita e ainda R$ 28,4 bilhões em novas medidas arrecadatórias. A principal aposta tributária do governo para fechar o orçamento de 2016 é recriar a CPMF com uma alíquota de 0,20%, que renderia R$ 32 bilhões por ano.

“Há soluções para enfrentar esse dé-ficit e recuperar a capacidade do gover-no de produzir dados fiscais positivos. Mas, como cerca de 90% das despesas do governo são de caráter obrigatório ou semiobrigatório, a redução desses gastos envolve medidas legais que precisam ser discutidas no Congresso Nacional”, diz Nélson Barbosa. Doutor em economia pela New School for Social Research, em Nova Iorque, e um dos responsáveis pelo desenvolvimento dos pacotes para com-bater a crise financeira internacional com o PAC e o Minha Casa, Minha Vida, ele deixara o governo em maio de 2013, ao pedir demissão do cargo de secretário--executivo do Ministério da Fazenda, que ocupava desde 2006, por divergências com o ministro Guido Mantega, exata-mente sobre a condução da política fiscal. Nélson Barbosa, também analista do BC, foi substituído por Arno Augustin, res-ponsável pelas operações contábeis pos-tas sob suspeita pelo Tribunal de Contas da União. “Além do orçamento realista, temos a necessidade de políticas fiscais de longo prazo para controlar o crescimento dos principais gastos da União, entre eles Previdência, folha de pagamento, Saúde e Educação.”

O desajuste orçamentário reacen-deu o debate sobre a necessidade de uma reforma tributária, mas enquanto ela não vem, uma das apostas é o aperto na arrecadação. Uma portaria da Receita Federal instituiu um programa especial de cobrança para grandes devedores do Fisco, aqueles que tiverem dívidas ou au-tuações superiores a R$ 10 milhões. A ex-pectativa de arrecadação chega a R$ 20,6 bilhões — mais da metade do déficit pre-visto no Orçamento de 2016. Em outra ponta, um projeto de lei encaminhado ao Congresso Nacional estabelece as normas para a regularização de recursos depositados no exterior sem declaração à Receita Federal. Posta em prática, poderia recuperar outros R$ 100 bilhões a R$ 150 bilhões. Essas contas mal arranham o pro-blema da sonegação. Só no ano passado foram R$ 151 bilhões em autuações. Em julho deste ano, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional consolidou mais de R$ 1,162 trilhão em débitos tributários inscritos na Dívida Ativa da União — mais de 580 vezes o que foi revelado pela operação Lava-Jato. Entre os sócios do chamado Clube do Bilhão, destacam-se 12.547 empresas dos setores industrial, comercial, financeiro, do agronegócio e da construção. Elas representam menos de 1% das pessoas jurídicas do país, mas devem R$ 723,3 bilhões em tributos. A sonegação no país chegaria a 10% do PIB.

INJUSTIÇA TRIBUTÁRIAAlguns economistas mais ligados ao gover-no apostam que há maiores possibilidades de fortalecer os cofres públicos com uma re-distribuição da carga tributária do que com

ORÇAMENTO ENGESSADO Mesmo com esses recursos, a conta fe-charia com déficit em virtude do aumen-to das despesas obrigatórias da União. A previsão é que elas passem de R$ 871,8 bilhões, neste ano, para R$ 960,2 bilhões, em 2016. Apenas os gastos adicionais com benefícios previdenciários soma-riam R$ 73,9 bilhões. O blog do econo-mista Mansueto de Almeida, integrante da equipe de Aécio Neves na campanha eleitoral do ano passado, apresenta um resumo da distribuição das despesas de custeio da União, excluídas as transfe-rências constitucionais obrigatórias. Dos R$ 312 bilhões gastos de janeiro a maio deste ano, R$ 268,66 bilhões (88,88%) são despesas com assistência social (LOAS, Bolsa Família e Serviço Social de Proteção Básica), Previdência (públi-ca e INSS), Saúde, Trabalho (seguro de-semprego e abono salarial) e Educação. Somando-se subsídios à atividade eco-nômica, desoneração das folhas de pa-gamento (redução de impostos, portan-to) e pagamento de sentenças judiciais, chega-se a 94,3% dos gastos.

Por isso, as respostas do governo para enfrentar o desafio de redução da receita em um cenário sem previsão de recupe-ração imediata da atividade econômica prevêm a redução de gastos correntes e despesas com pessoal. Juntas, as duas ru-bricas consomem 8% do PIB, oito vezes mais do que governo federal gasta com investimento, incluindo o Programa de Aceleração do Crescimento. Para enxugar as despesas, dez ministérios entraram na mira de extinção. Novas medidas anuncia-das em meados de setembro previam mais

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IMPOSTOS PENALIZAM CONSUMOAo contrário dos países desenvolvidos, no Brasil a maior taxação incide sobre o comércio de bens e serviços — exatamente os setores que mais sofrem com a precariedade econômica. No primeiro semestre, porém, o varejo teve o pior resultado em 12 anos. O resultado foi o esperado, diante de um quadro recessivo e de alta inflacionária: o ajuste fiscal provocou 500 mil demissões de janeiro a julho e a renda média ficou estacionada em R$ 2,1 mil mensais.

O consumo sustenta impostos federais como o Cofins, o PIS e o IPI, ou o ISS municipal. Também é a base do maior imposto brasileiro, o ICMS, que em 2013 respondeu por 7,5 pontos percentuais da carga tributária total no país, de 35,9%. O Cofins, quarto maior tributo do país, gerou de janeiro a julho deste ano 3% a menos do que na comparação com os mesmos sete meses de 2014. Uma perda de R$ 5 bilhões.

Nada menos que 51,3% da carga tributária brasileira se concentrava, em 2013, no consumo. Nos países filiados à Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico a média é de 34%, segundo dados de 2010. Na OCDE prefere-se taxar mais a renda e o patrimônio (38% da carga total) do que no Brasil (22%). O recuo do PIB, graças à recessão que ganhou fôlego com o ajuste fiscal do governo, foi o tiro no pé também nas contas públicas. Desde dezembro de 1998, os gastos sempre estiveram um pouco abaixo da receita. Em dezembro do ano passado, a receita caiu tanto que pela primeira vez em 17 anos foi ultrapassada pela curva das despesas.

“A maior incidência dos tributos no Brasil se dá sobre a cesta de consu-mo, onerada tanto pelos impostos federais quanto estaduais e municipais. Essa incidência é muito maior do que na maioria dos países, inclusive desenvolvidos, e tem efeitos negativos sobre a distribuição de renda”, es-creveu o economista Joaquim Levy no artigo “Robustez Fiscal” no segundo semestre de 2014, antes de ser chamado para o Ministério da Fazenda.

a criação de novos impostos, como a nova versão remodelada da CPMF. Por exemplo: taxando os lucros e dividendos de sócios e donos de empresas. Hoje, eles são isentos de Imposto de Renda, privilégio que só existe no Brasil e na Estônia. A medida poderia engordar a receita com R$ 50 bilhões por ano — mais do que suficiente para tampar o rombo orçamentário do ano que vem. A taxação de heranças é no máximo de 8% no Brasil, contra 40% na Inglaterra, 35% no Chile, 55% no Japão e 60% na França. Resultado: recolheu apenas R$ 4 bilhões, em 2013, meros 0,09% da carga tri-butária total. Ainda assim foi mais do que o Imposto Territorial Rural (ITR). O IPTU dos fazendeiros rendeu apenas R$ 800 milhões em um país de 8 milhões de quilômetros quadrados. Na ponta do lápis, dá menos de R$ 100 por quilômetro quadrado — é como se um terreno do tamanho do Estádio do Maracanã pagasse apenas R$ 100 por ano de IPTU. O Imposto de Renda cobrado das pessoas físicas tem alíquota máxima de 27,5% no Brasil — a menor alíquota máxi-ma entre todos os 116 países que tiveram seus sistemas tributários pesquisados pela consultoria KPMG.

Além da volta da CPMF, o ministro do Planejamento, Nélson Barbosa, defendia dentro do governo duas medidas tribu-tárias progressivas para ajudar o ajuste fiscal: alíquotas maiores para o Imposto de Renda da Pessoa Física e o fim da isen-ção do tributo na distribuição de lucros e dividendos a donos e sócios de empresas, que na declaração de IR dos brasileiros em 2014 protegeu 71 mil contribuintes (integrantes da base de lucro das pessoas

NOVO PACOTE FISCAL

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investimentos e programas sociais, reco-lhe menos e paga mais com juros da dí-vida pública. Esta trajetória só vai piorar a questão fiscal”, diz Márcio Pochmann, da Fundação Perseu Abramo.

“Para minimizar, ou quem sabe até eliminar seu efeito recessivo, o ajuste deve ser daqueles que, pelo lado da recei-ta, aumentam a progressividade da estru-tura tributária. É nesse contexto que deve ser entendida a discussão por membros da equipe econômica sobre a criação de um imposto sobre grandes fortunas e sobre o aumento e a federalização do imposto sobre heranças. Além de ajudarem a rever-ter um processo de perpetuação das desi-gualdades de renda, esses impostos têm o potencial de gerar um efeito multipli-cador que permite uma redistribuição da renda dos que gastam pouco para os que gastam muito. Por fim, pelo lado dos gas-tos, além da manutenção dos programas de transferência de renda, já progressivos e com efeito multiplicador, a elevação dos tributos deveria abrir espaço para a expansão dos investimentos públicos. É quase consenso que os investimentos públicos em infraestrutura têm efeitos multiplicadores de curto e de longo prazo mais altos do que outros componentes do gasto público, já que, além de gerar mais empregos, elevam a produtividade e ajudam a puxar investimentos privados”, afirma a economista Laura Carvalho.

jurídicas) que receberam quase R$ 200 bilhões. Com um aumento de imposto na renda empresarial da ordem de 15%, como era até 1995, apontam pesquisa-dores do Ipea, a taxação renderia R$ 53 bilhões por ano. Barbosa contava com o apoio de ao menos dois ministros do chamado núcleo duro do governo: Miguel Rossetto, da Secretaria Geral, e Ricardo Berzoini, das Comunicações. Mas perdeu na queda de braço com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que preferiu não desafiar o andar de cima. Entre as medidas anunciadas, apenas duas atacam a injusti-ça tributária, concentrada na taxação do consumo. Uma cria tabela progressiva de Imposto de Renda sobre o lucro obtido na venda de imóveis. O governo hoje cobra alíquota de 15% no lucro nas transações, mas quer aumentar a mordida para 20%, 25% ou 30% em cima dos ganhos que, durante um ano, ficarem acima de R$ 1 milhão. A outra reduz as vantagens das empresas com os juros sobre capital pró-prio. O mecanismo, criado por uma lei de 1995 e existente só no Brasil, permite que as pessoas jurídicas criem despesas para pagar menos IR. Juntas, as duas medidas devem gerar R$ 2,9 bilhões por ano aos cofres públicos.

“É possível aumentar tributos dire-tos e não diretos, mas antes de aumentar imposto o Estado tem que ser eficiente para cobrar imposto. Primeiro, é preciso definir que a sonegação é crime. Depois, rever isenções, criar imposto de soli-dariedade para os ricos. Mas enquanto tiver recessão, não tem saída definitiva para o problema fiscal. O governo corta

É possível aumentar tributos diretos e não diretos, mas antes de aumentar imposto o Estado tem que ser eficiente para cobrar imposto. Primeiro, é preciso definir que sonegação é crime. Depois, rever isenções, criar imposto de solidariedade para os ricos. Mas enquanto tiver recessão, não tem saída definitiva para o problema fiscal.

MÁRCIO POCHMANN EX-PRESIDENTE DO IPEA

NOVO PACOTE FISCAL

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Começaremos nesta edição uma série de artigos bem simples e que servem para delimitar e posicionar o leitor sobre aspectos orçamentários, contábeis e de

gestão da administração pública, com caráter unicamente técnico informativo.

Antes de se falar sobre os pontos mais técnicos da conta-bilização e da parte mais operacional do orçamento, é neces-sário identificar quem são as entidades que têm a obrigação de praticar a Contabilidade Aplicada ao Setor Público (CASP), bem como entender minimamente como essas entidades são geridas e administradas. Primeiro, o ideal é entender o que é administração pública, e, aproveitando os ensinamentos de Diógenes Gasparini, podemos entender que a administração pública é o conjunto de funções que visam à boa gestão da coisa pública, de modo a alcançar os interesses da sociedade.

Na visão de Dalmo Mattos, a administração é uma ativi-dade funcional do Estado que visa satisfazer as necessidades coletivas de forma direta, contínua e permanente de acordo com regras jurídicas em vigor. E, finalmente nas palavras de Hely Meirelles, na administração pública não existe a liberdade pessoal do agente, ou seja, só é permitido fazer o que a lei estabelece.

A partir destas afirmativas e dentro da estrutura ad-ministrativa brasileira, podemos identificar uma divisão em dois níveis de administração pública: direta e indireta. A administração direta, formada pelos órgãos e unidades organizacionais que integram a estrutura administrativa dos três poderes, nas quatro esferas, e a administração indireta, formada por entidades públicas, com personalidade jurídica própria, vinculadas a uma unidade da administração direta, apresentando uma das seguintes formas jurídicas: autar-quias, agências reguladoras, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista.

Das entidades da administração indireta citadas vere-mos agora aquelas que por determinação da legislação estão enquadradas no âmbito da CASP. Primeiramente, temos as

autarquias, que são entidades autônomas criadas por lei específica, com personalidade jurídica de direito público interno, sujeitas à fiscalização do Estado, que possuem patri-mônio próprio e atribuições estatais específicas. Já as agências reguladoras são criadas para fiscalizar a prestação de serviços públicos delegados a particulares, portanto, cabe-lhes estabe-lecer regras e fiscalizar os setores que controlam. As fundações públicas englobam entes que objetivam, principalmente, a realização de atividades que podem ser realizadas tanto pelo setor público como pelo privado, mas que têm como principal característica o interesse coletivo, como, por exemplo: edu-cação, cultura, pesquisa, desenvolvimento tecnológico, etc..

Por fim, temos as entidades da administração indireta que não se enquadram no âmbito da CASP, também conhe-cidas genericamente por empresas estatais. As empresas estatais assumem, portanto, duas configurações básicas, sendo que as empresas públicas o grupo de organizações com personalidade jurídica de direito privado com participação exclusiva do Estado no seu capital e direção, tendo ainda como característica ser pessoa jurídica de direito privado, não gozando de privilégios estatais, salvo as prerrogativas previstas em lei. O outro grupo é formado pelas sociedades de economia mista que são entes dotados de personalidade jurídica de direito privado, criados por lei para o exercício de atividade econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas ações, que permitem direito a voto, pertencem em sua maioria ao Estado, também não possui privilégios fiscais.

Assim podemos concluir que administração pública é um conjunto de atividades coordenadas que visam à excelência na gestão da coisa pública, atendendo aos interesses e neces-sidades da coletividade de forma direta ou indireta, contínua e permanente, submetida ao ordenamento jurídico vigente.

(*) ALDOMAR GUIMARÃES DOS SANTOS, Professor de Ciências Contábeis da Fecap, é mestre em Contabilidade pela FEA

CONTABILIDADE E ORÇAMENTO PÚBLICOS

ARTIGO

UMA VISÃO PARA NÃO ESPECIALISTAS

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OUTUBRO 2015 13

CRISE ECONÔMICA SE AGRAVA E, AINDA ASSIM, PRINCIPAIS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS BATEM RECORDES DE LUCRATIVIDADE. SÓ NO PRIMEIRO SEMESTRE DE 2015, LUCROS DOS QUATRO MAIORES BANCOS CRESCERAM 40%

JEFFERSON GUEDES

Os bancos vão bem, obrigado!

A CARA DA CRISE

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Enquanto a indústria recuou mais de 6% no primeiro se-mestre e o comércio registrou a maior queda nas vendas des-de 2003, os ganhos dos quatro

maiores bancos cresceram mais de 40% no primeiro semestre, na comparação com o mesmo período de 2014.

Como explicar a rentabilidade dos bancos em um cenário tão adverso? Para o Dieese, que faz estudos sistemáticos sobre o desempenho dos bancos, um dos fatores responsáveis por este resultado excepcio-nal foi o crescimento das receitas com títulos e valores mobiliários, os TVMs, de-corrente das sucessivas elevações da Selic. Isso, em tese, colocaria a responsabilidade nas costas do governo. Mas é importante ressaltar que a denominação TVM englo-ba tanto títulos públicos quanto privados.

“As informações disponíveis nos ba-lanços não permitem quantificar o peso de cada item das receitas na formação do lucro do banco”, explica Catia Uehara, co-ordenadora da Rede Bancários do Dieese. Alguns bancos, porém, divulgam a parti-cipação de cada item no seu ativo total. O Bradesco, em seu “Resultado de Análise Econômico-Financeira”, de 31/12/2014, informa que a distribuição dos TVM co-loca os títulos públicos em primeiro lugar (51%), os privados em segundo (33,9%) e os vinculados aos planos de previdência privada em terceiro (19,3%).

Para Maria Lúcia Fattorelli, coordena-dora do Movimento Auditoria Cidadã da Dívida, “as receitas com títulos e valores mobiliários garantem enormes lucros aos bancos, não somente porque estes são os maiores detentores dos títulos da dívida pública, mas principalmente devido às

operações compromissadas realizadas pelo Banco Central que, na prática, sig-nificam a remuneração da sobra de caixa dos bancos privados com os juros mais elevados do mundo, incidentes sobre os títulos da dívida pública” (veja mais no boxe Os juros e a dívida).

O aumento das tarifas bancárias é outro fator que ajuda a entender os lu-cros líquidos dos bancos. A tabela abaixo mostra a relação entre ambos. Note que o Banco do Brasil registra a participação menos significativa das tarifas na compo-sição do lucro líquido.

RECEITA DE TARIFAS BANCÁRIASPesquisa recente do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) consta-tou que o aumento das tarifas chegou a 136% entre serviços avulsos e 75,2% nos pacotes de serviços oferecidos pelos seis maiores bancos brasileiros. O Bradesco, por exemplo, elevou de R$ 27,40 para R$ 48 o preço de um de seus pacotes de serviços, uma variação de 75,2% — quase dez vezes acima da inflação.

Segundo a economista e pesquisa-dora do Idec Ione Amorim, são várias as práticas adotadas pelos bancos no rela-cionamento com os consumidores que contribuem para os recordes nos lucros. Além dos reajustes abusivos de tarifas e pacotes de serviços, a estratégia dos

bancos inclui imposição de serviços em função da renda e oferta ostensiva de car-tões de crédito, em substituição a linhas de crédito com taxas de juros menores. Tais práticas, segundo Ione, evidenciam a ausência de fiscalização, liberdade para corrigir os preços e a baixa concorrência provocada pela concentração bancária.

AÇÃO DO BANCO CENTRAL Nesse ponto, “a pergunta que não quer calar” parece inevitável: afinal, o que faz o BC para coibir tais abusos? Em tese, os bancos não são livres para co-brar qualquer tarifa. A instituição faz tal afirmação com todas as letras na FAQ — Tarifas Bancárias (http://www.bcb.gov.br/?TARIFASFAQ), baseada na regulamentação em vigor, a Resolução CMN 3.919, de 25 de novembro de 2010, que definiu os serviços dos bancos em quatro categorias (essenciais, prioritá-rios, especiais e diferenciados). Só os primeiros não podem ser cobrados. Nos demais, cada instituição estabelece os reajustes de acordo com sua estratégia operacional e mercadológica.

O problema é que o leque de serviços essenciais segue parâmetros nem sempre justos com o consumidor. Um exemplo: o BC afirma que o fornecimento de segunda via do cartão é gratuito, “exceto nos casos decorrentes de perda, roubo, furto, dani-ficação e outros motivos não imputáveis

IF’S COM MAIOR LUCRO LÍQUIDO NO 1º TRIMESTRE DE 2015

Instituição Financeira Tarifas Bancárias(Bilhões)

Lucro Líquido (Bilhões) % Tb/Ll

Itaú 2.319 5.783 40%Banco do Brasil 1.655 5.761 29%Bradesco 1.709 4.254 40%CEF 954 1.174 81%Santander 683 722 95%Fonte: (IF Data do Banco Central)

A CARA DA CRISE

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A ausência de fiscalização e definição de regras abrangentes elevam os conflitos entre banco e consumidores e intensificam a judicialização dos processos, gerando mais custos para a sociedade. O BC precisa aprimorar suas normas e estabelecer índices oficiais de preços para a correção dos serviços.

IONE AMORIMECONOMISTA DO IDEC

à instituição emitente”. Ora, é mais do que óbvio que o cliente só vai solicitar a segunda via do cartão se perdê-lo ou for roubado. Assim, o correntista acaba pagando por um serviço que, a rigor, seria gratuito. Outra distorção: o limite de sa-ques gratuitos, no caixa ou nos terminais de autoatendimento, é de apenas quatro saques no mês. É pouco, levando-se em conta as filas nos bancos e os limites para saques nos caixas eletrônicos.

No entendimento de Cátia Uehara, o Banco Central deveria firmar uma par-ceria com os Procons, para controlar efetivamente as tarifas bancárias, hoje o quinto item mais reclamado pelo con-sumidor. “Não basta definir os valores de cada serviço ou pacote de serviços, pois as instituições modificam os nomes dos mesmos para alterar seus valores”, afir-ma a coordenadora da Rede Bancários do Dieese.

Ione Amorim concorda: “A ausência de fiscalização e definição de regras mais abrangentes elevam os conflitos entre bancos e consumidores e intensificam a judicialização dos processos, gerando mais custos para a sociedade.” Ela acredita que o BC precisa aprimorar suas normas e estabelecer índices oficiais de preços para correção dos serviços.

O FATOR INADIMPLÊNCIAAs instituições financeiras alegam que o custo do dinheiro é influenciado pelas perdas resultantes da inadimplência. Os números, neste particular, são expres-sivos. Segundo levantamento da Seresa Experian, de 30 de junho deste ano, o Brasil tem hoje 56,4 milhões de inadim-plentes — cerca de 40% da População Economicamente Ativa (PEA), o equi-valente à população da Itália! —, com dívidas que, somadas, totalizam R$ 243 bilhões. No acumulado do ano até julho, na comparação com o mesmo período do ano anterior, o índice subiu 16,8%. É

o maior patamar registrado pela empresa desde 2012.

Mas se cresce o número de inadim-plentes, as perdas dos bancos são su-avizadas pelo custo do dinheiro, que embute, logicamente, a probabilidade de atraso no pagamento. Além disso, há um paradoxo: a alta dos juros tende a aumentar a inadimplência. Parece um cachorro correndo atrás do próprio rabo, ou seja, aumenta-se o spread em função dos inadimplentes ao mesmo tempo em que o governo aumenta um dos fatores cruciais para elevação da inadimplência.

Além disso, a inadimplência não é o fator mais importante para a elevação do spread. De acordo com o último Relatório de Economia Bancária e Crédito, publi-cado em 2014 pelo BC, o spread bancário no ano anterior foi impactado por quatro itens. Pela ordem: margem líquida de lucro (38,8%), inadimplência (28,5%), impostos diretos (25,9%) e compulsório (6,8%).

Para o Dieese, a participação da mar-gem líquida de lucro é o item em que há mais margem para redução do spread. No que diz respeito à inadimplência, cumpre destacar o esforço dos bancos para aprimorar o gerenciamento de risco. “Todos os bancos têm melhorado o nível de inadimplência por meio da concessão de crédito para linhas de financiamen-to onde a inadimplência é mais baixa, como crédito consignado e imobiliário, evitando as linhas de maior risco, como crédito para aquisição de automóveis e CDC não consignado”, analisa Catia Uehara. Rubens Gandelman, membro do Conselho Editorial da Por Sinal, faz avaliação semelhante, mas ressalva que os benefícios dessa política de gerenciamen-to de risco não trouxeram benefícios aos bons pagadores, que continuam a arcar com elevados spreads. “Os bancos têm plenas condições de diferenciar o bom do mau pagador. Por isso, os spreads deve-riam ser diferenciados”, sugere.

TRIBUTAR OS LUCROS É SOLUÇÃO?Muita gente boa, como o festejado eco-nomista francês Thomas Piketty, entende que a política de juros altos faz com que a maioria da população pague impostos só para manter a lucratividade do siste-ma financeiro. Sendo assim, qual seria a alternativa para minimizar esta brutal transferência de renda? Aumentar a tribu-tação sobre os lucros dos bancos?

Não há uma posição oficial da equipe econômica sobre isso. Mas, na esteira das medidas do ajuste fiscal, o Planalto editou a MP 675, que eleva de 15% para 20% a alíquota da Contribuição Social sobre

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o Lucro Líquido (CSLL) de instituições financeiras. Com a medida, o governo espera arrecadar R$ 900 milhões este ano, R$ 3 bilhões em 2016 e R$ 4 bilhões em 2017. A MP foi aprovada pela Câmara em 3 de setembro. O Senado converteu a MP no PLV 11/2015 e também deu sinal verde para a iniciativa no último dia 15.

Originalmente, a proposta editada pelo governo não estipulou um pra-zo para a retomada da alíquota atual. Contudo, a comissão mista que ava-liou a MP entendeu que seria mais fácil

a carga tributária sobre as instituições financeiras:

“Já tivemos alíquota de CSLL bem mais elevada anteriormente, de 30%”, argumenta. Ela reconhece que existe a possibilidade de os bancos repassarem o ônus. “Isso não ocorreria se o BC exerces-se suas atribuições de controle e aplicas-se políticas monetárias saudáveis para o país”, afirma. Ainda assim, Fattorelli entende que o resultado tributário se-ria mais efetivo com o fim da dedução dos juros sobre o capital próprio. “Isso

A relação entre os lucros dos bancos e a dívida pública costuma ser ignorada pela maioria dos analistas ouvidos pela grande imprensa. Parece “natural” o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentar os juros, com o objetivo de segurar a inflação, e com isso elevar a própria dívida do governo, já que a Selic é referência para o cálculo da remuneração sobre os títulos públicos. Uma parcela, em torno de 21% dos títulos públicos, é indexada pela Selic. A maior parte é prefixada ou paga um percentual além da inflação medida pelo IPCA.

O estrago, porém, não tem nada de “natural”. Uma alta de 0,5% na Selic tem um impacto de R$ 10 bilhões a R$ 16 bilhões na dívida pública federal. Isso significa que, a cada dois meses, esta elevação gera um prejuízo para o Brasil equivalente ao da Lava-Jato, estimado em R$ 19 bilhões pela Polícia Federal. E não para por aí. O Relatório Mensal da Dívida Pública, divulgado em julho, dá contornos mais precisos à gastança: somente naquele mês, o montante de juros somou R$ 40 bilhões. Esse valor representou um crescimento de 91% em relação

aos R$ 22 bilhões pagos em julho de 2014. O acumulado no ano torna ainda mais dramáticos os

efeitos deste ciclo de altas da Selic, iniciado após a reelei-ção da presidente Dilma. No período de janeiro a julho, o governo alocou R$ 211 bilhões para o pagamento de juros, 62% a mais do que foi gasto no mesmo período no ano passado (R$ 131 bilhões).

Para a auditora da Receita Federal Maria Lúcia Fattorelli, o Copom decide o patamar da Selic “sem discutir se existem recursos orçamentários para pagar os elevados juros incidentes sobre os títulos da dívida pública ou sequer demonstrar preocupação de onde virão os recursos”. As limitações da Lei de Responsabilidade Fiscal, a seu ver, não se aplicam à política monetária. Se os recursos orçamentá-rios existentes no orçamento federal não são suficientes, o governo emite novos títulos para pagar grande parte dos juros nominais incidentes sobre a dívida pública. Esta prática, segundo Fattorelli, fere o art. 167 da Constituição, que proíbe a contratação de dívida para pagar despesas correntes. “Juros são despesas correntes, como salários, despesas de manutenção e demais despesas de custeio que se consomem durante o ano e não se caracterizam como investimentos”, explica.

Fattorelli também critica a atuação do Banco Central, em especial as operações compromissadas, ou de mercado aberto, realizadas para restringir a base monetária. Para tanto, o BC utiliza títulos da dívida pública emitidos pelo Tesouro Nacional e os entrega aos bancos, em troca do

aprová-la agora, com a ressalva de que a cobrança da nova alíquota será váli-da apenas até 31 de dezembro de 2018, retornando ao patamar de 15% a partir de 2019.

Seja como for, até que ponto a MP 675 é benéfica para o país? Corremos o risco de os bancos aumentarem o spread e, com isso, o cidadão acabar pagando a elevação da alíquota? As opiniões se dividem, mesmo no campo progressis-ta. Para Maria Lúcia Fattorelli, não resta dúvida de que é importante aumentar

JUROS X DÍVIDA PÚBLICA

UMA RELAÇÃO PERVERSA

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“excesso” de moeda. Segundo o balanço de demonstrações financeiras de 30 de junho, o BC já acumula mais de R$ 1,1 trilhão com esse tipo operação.

“Dá para imaginar o enorme ganho dos bancos com tais operações, ainda mais devido ao fato de que os ju-ros dessas operações têm de ser pagos às instituições financeiras em moeda corrente.” O mais grave, para ela, é que tais operações acabam gerando dívida pública, sem contrapartida alguma ao país.

De acordo com Fattorelli, “essa política monetária equivocada e onerosa tem outra consequência grave: in-fluencia o patamar de juros cobrados da sociedade pelas instituições financeiras”. À medida que o Banco Central absorve todo o excesso de moeda que os bancos têm em caixa, entregando-lhes, em troca, títulos da dívida interna que rendem os maiores juros do mundo, desestimula que os bancos reduzam as taxas cobradas do mercado. Por conta disso, acrescenta a auditora, os bancos não têm interesse em correr risco para emprestar ao mercado. Só o fazem a taxas elevadíssimas, que atingem 400% ao ano.

O que ocorreria se esse montante de R$ 1,1 trilhão reti-rado pelo BC estivesse no caixa dos bancos? Provavelmente os bancos destinariam esses recursos para empréstimos, aumentando a oferta, o que provocaria uma forte queda nas taxas de juros. A competição entre os bancos seria mais acirrada no sentido de oferecer taxas menores às pessoas e empresas, o que levaria a uma redução ainda maior nas taxas cobradas pelo setor financeiro no Brasil.

No entendimento de Fattorelli, a atuação do Banco Central tem impedido que isso aconteça, pois garante aos bancos a generosa remuneração dos títulos da dívida sem risco algum. A justificativa que tem sido dada para essa atuação é o “combate à inflação”. Tal argumento não se aplica, na sua visão, pois o tipo de inflação que temos no Brasil decorre do abusivo aumento do preço de tarifas de preços administrados (energia, telefonia, transporte, combustível, etc.) e de alguns alimentos.

Como se vê, a relação entre juros e dívida pública é bastante complexa. Mesmo assim, o assunto tem sido escamoteado das grandes discussões em torno da crise econômica. Há, no entanto, tímidos sinais de que pode haver uma mudança em certos segmentos. O jornal Folha de S.Paulo, em duas ocasiões recentes, propôs a fixação de um limite para o endividamento da União. A ideia, aliás, não é nova. Fattorelli lembra que a fixação de limite para a dívida pública mobiliária federal está prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal (conforme inciso II do art. 30 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000). Tal limite, contudo, nunca chegou a ser regulamentado pelo Congresso Nacional.

Falta, para usar o velho clichê, “vontade política”. Na ausência desta vontade, o governo segue enxugando gelo. Vai cortar gastos da saúde, da educação, congelar o salário do servidor, aumentar impostos. Mas não terá coragem de mexer uma vírgula na lucratividade do sistema financeiro.

aumentaria não só a base da CSLL, mas também do Imposto de Renda, que é compartilhado com estados e municí-pios”, sugere.

Cátia Uehara acha que o governo deveria ter outro foco: “O país precisa de uma reforma tributária sistêmica, e não apenas da elevação da carga sobre esse ou aquele setor, sob pena de ocorrer o repasse para preços e taxas.” A seu ver, seria bem mais interessante que o ajuste fiscal em vigor pudesse resolver as distorções do sistema tributário, onde quem arca com o

maior peso da carga são os mais pobres, já que a maioria dos impostos incide sobre o consumo final de bens e serviços.

Já Rubens Gandelman é totalmente contrário à MP: “O aumento de impostos de qualquer natureza neste momento, seja na CSLL dos bancos, seja na CPMF sobre o consumo, são medidas desesperadas de apagar incêndio.” A questão central, a seu ver, é a concentração bancária, que só será resolvida se o Brasil incentivar a criação de bancos cooperativos. O

assunto é discutido em profundidade na reportagem da página 26.

O fato é que, de um jeito ou de outro, a hegemonia do capital financeiro per-manece incólume. Toda a política eco-nômica, aliás, continua sendo desenhada conforme os interesses dos bancos.

A CARA DA CRISE

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ISO SENDACZ*

Seria preciso penetrar na inescrutável intenção do constituinte para entender precisamente a definição de desenvolvimento equilibrado do país, cuja promo-

ção foi por ele atribuída como uma das funções essenciais do sistema financeiro nacional.

Ainda que o equilíbrio das forças produtivas pareça incompatível com o modo de relacionamento econômico observável no capitalismo, é mandatório para o Estado brasileiro perseguir o objetivo social traçado ao sistema financeiro nacional no artigo 192 da Constituição federal, que determina estruturá-lo de forma a promover o “de-senvolvimento equilibrado do país”. O primeiro passo é estabelecer o conceito teórico, que bem pode embasar a regulamentação do comando magno em lei complementar.

O que é, então, o desenvolvimento equilibrado do país?Dicionaristas informam que desenvolvimento significa

a passagem gradual de um estágio inferior para outro mais aperfeiçoado. Desenvolver, portanto, significa adiantar, au-mentar, melhorar, aperfeiçoar e fazer progredir. No campo das relações humanas, a expressão pode ser associada à evolução das condições sociais, políticas e econômicas de uma comunidade, seja local, regional ou nacional.

Um grupamento humano será considerado desen-volvido quando dotado de moderna economia e meios de produção, que proporcionem elevadas condições de vida, distribuídas de modo homogêneo no conjunto da população. Assim, o desenvolvimento é mais que o simples crescimento econômico, trata-se de atingir novo estágio de bem-estar humano, estável e socialmente difuso.

Quando o processo de desenvolvimento não é

completado, ou seja, a disponibilidade aumentada de bens de uso e consumo não pode ser aproveitada pelo conjun-to da sociedade que a produziu, verifica-se o fenômeno do subdesenvolvimento. Longe de ser etapa primeira do desenvolvimento, é, ao contrário, produto deste. O desen-volvimento das economias capitalistas mais avançadas pres-supõe crescente dependência da expansão de seus mercados produtor e consumidor de bens, favorecendo o aumento da concentração de capital nessas economias, retirando das economias periféricas o alimento para sua continuada necessidade de recomposição da taxa de lucro, que tende constantemente a cair em uma economia concorrencial.

A ciência física define “equilíbrio” como o estado de um corpo material em que a resultante das forças que sobre ele agem é nula. No campo das humanidades, pensadores são quase unânimes em associar o equilíbrio à harmonia entre contrários.

Essas definições conduzem à verificação de existirem duas possibilidades, quando se conjugam os termos em “desenvolvimento equilibrado” do país: desenvolver em ritmo semelhante regiões e setores sociais e econômicos do país, mantendo a dianteira dos polos mais avançados, sem, no entanto, distanciá-los dos demais; ou perseguir um país equilibradamente desenvolvido, no qual todos os seto-res da sociedade tenham acesso pleno aos bens e serviços amplamente disponíveis, versão preferida por este autor.

Não basta, para tanto, redistribuir a renda existente entre os cidadãos brasileiros, por meio de programas sociais ou aumentos reais de salários. Embora o aumento do poder aquisitivo possa produzir um conforto imediato aos bene-ficiários, inclusive de forma razoavelmente homogênea no tecido social, no longo prazo não se sustenta o consumo

DESENVOLVIMENTO EQUILIBRADO, UM NOVO CONCEITO

ARTIGO

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sem uma base produtiva capaz de suprir as demandas nos patamares esperados.

A suficiência de bens e serviços não pode ser alcançada simplesmente com o aumento quantitativo do trabalho. É preciso incorporar a mais moderna técnica que a ciência e a indústria nacionais possam conceber, elevando expo-nencialmente a capacidade produtiva da sociedade como um todo. É exatamente na reprodução da indústria, na fabricação de meios de produção, que reside a chave do desenvolvimento econômico.

Não foi outra a prioridade dada pelas economias que mais cresceram no século passado. De economistas sovié-ticos, com seu Manual de Economia Política, ao presidente da China, passando pelos teóricos desenvolvimentistas da esfera capitalista, todos coincidem em orientar parte substancial do investimento ao domínio da tecnologia e à produção de máquinas. É pelo lado da oferta crescente que o consumo pode estavelmente generalizar-se entre a população.

Considerando o que já foi apresentado, nossa sugestão é que se adote a seguinte definição, vá-lida nos marcos das relações capitalistas vigentes no Brasil: o desenvolvimento equilibrado do país diz respeito à gene-ralização do bem-estar e do mais elevado padrão de consumo dos brasileiros em todo o território nacional, a ser alcan-çado com a prioridade da produção na-cional de meios de produção, dotados da mais moderna técnica que o país possa dispor, de maneira independente.

Na atual quadra da história bra-sileira, não é difícil observar o Brasil como subdesenvolvido e economica-mente dependente de outras nações mais adiantadas. Agrava o quadro a crescente posição dos capitais internacionais na nossa economia, bem como os óbices que os serviços da dívida pública causam ao investimento no país, especialmente o público.

Como, então, romper com o atraso, retomando o cami-nho ao desenvolvimento do país, que se quer equilibrado? E o Banco Central, como pode contribuir nesse mister, antes mesmo da regulamentação do dispositivo constitucional, relativo à ordem econômica e financeira brasileira?

Sabida a prioridade do domínio da técnica e da

produção de meios de produção, fica orientada a confec-ção da peça orçamentária de investimentos nacionais. Não obstante a criação de leis e políticas públicas protetoras do setor preferencial, há mais que o Estado pode fazer para superar o subdesenvolvimento e a dependência nacionais.

Sobre o Banco Central recai a responsabilidade de executar as políticas públicas emanadas pelo Conselho Monetário Nacional, no que tange à estruturação do sistema financeiro nacional, também por si integrado, para que este promova o desenvolvimento equilibrado do país.

Sem prejuízo sobre todo um elenco de possibilidades de atuação da autoridade monetária, podemos destacar a orientação da destinação dos recursos das instituições financeiras e a administração das reservas internacionais.

Dentre outras medidas que privilegiem o interesse público do desenvolvimento equilibrado do país sobre a atividade privada, parte dos lucros dos que se dedicam à intermediação financeira pode ser direcionada a fun-do de pesquisa científica, cuja gestão bem pode caber ao Ministério da Indústria e Comércio, de modo a assegurar o

direcionamento dos recursos arrecadados. A correlação entre o financiamento da indústria e a atividade especulativa nas instituições privadas também pode ser melhorada, aproximando-a daquela ob-servada nos bancos públicos, cujo retorno sobre o capital, em média, é mais atrativo aos olhos dos seus proprietários.

Na área das reservas internacionais, que se encontram em patamares estáveis há anos, também é possível destinar uma parte das disponibilidades a projetos de infraestrutura produtiva geradores de renda, dentro de limites prudenciais cui-dadosamente estabelecidos. As negocia-ções com os depositários das reservas no

exterior também podem conter o componente de contra-partidas no país, dentro de diretrizes desenvolvimentistas estabelecidas, sem que se abra mão dos quesitos da confia-bilidade nos bancos escolhidos.

São conceitos e caminhos para aproximar o Brasil da vontade do poder originário, expresso pelo legislador na sua Constituição que se ousou chamar de cidadã.

(*) ISO SENDACZ é engenheiro, Especialista do Banco Central e Diretor do Sinal.

É exatamente na reprodução da indústria, na fabricação de meios de produção, que reside a chave do desenvolvimento econômico.

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Poucos, mas poderosos

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CONCENTRAÇÃOBANCÁRIA

APENAS SEIS GRANDES BANCOS CONCENTRAM 80% DO TOTAL DE RECURSOS QUE OS BRASILEIROS MOVIMENTAM EM CONTAS BANCÁRIAS, INCLUINDO ATIVOS E PRODUTOS.

CARMEN NERY

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A estatística é contundente. Ao cabo do ano de 2014, mais de 80% do dinhei-ro em circulação no sis-tema financeiro do país

concentravam-se em apenas seis gran-des bancos (*). Em 1995, quase 20 anos antes, este patamar não ultrapassava os 60%, o que, convenhamos, já era muito: mais da metade do total de recursos que os brasileiros movimentam em contas bancárias, aí incluídos ativos e produtos. Traduzindo em números, esse montante cravou a marca dos R$ 5,32 trilhões em junho de 2015, quando este seleto clube de seis titãs (Bando do Brasil, Itaú, Caixa Econômica, Bradesco, Santander e HSBC) registrou um lucro líquido de R$ 36,12 bilhões, revelando um setor da economia que não para de crescer, mesmo em crise.

Números e estatísticas são do Banco Central. Eles evidenciam, na compara-ção do tempo, não só a marcha crescente e acelerada da concentração bancária, uma singularidade do nosso sistema fi-nanceiro, como a consolidação de um modelo, caracterizado por muito poder nas mãos de poucos e alavancado na dé-cada de 1990 pelo Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer), o inusitado socorro engendrado pelo então governo de Fernando Henrique Cardoso para compensar as perdas financeiras do SFN com o fim da hiperinflação.

A recente compra do HSBC pelo

Bradesco, por US$ 5,2 bilhões, ou R$ 17,6 bilhões, uniu o quarto e o sexto coloca-dos deste ranking de bancos comerciais. Como resultante da transação, nasceu um grupo financeiro com cerca de 31,4 milhões de correntistas, R$ 1,05 trilhão em ativos (segundo dados do BC de ju-nho) e uma carteira de crédito de R$ 522 bilhões. O negócio catapultou o Bradesco para o segundo lugar no pódio dos bancos comerciais privados, liderado pelo Itaú desde 2008, quando o banco da família Setúbal comprou o Unibanco e o Bank Boston. Quando juntamos no clube dos privados os bancos estatais, o jogo de forças pouco muda: Banco do Brasil em primeiro lugar, com R$ 1,4 trilhão em ativos; Itaú logo atrás, com R$ 1,14 trilhão; o novo Bradesco no encalço, com R$ 1,05 trilhão; e, por fim, a Caixa, que com a ven-da do HSBC caiu da terceira para a quarta posição. O espanhol Santander, que ex-pandiu sua presença no país comprando o Banco Geral do Comércio (1997), Banco Noroeste (1998), Meridional e Bozano Simonsen (2000), Banespa (2000), o ho-landês ABN AMRO (ex- Banco Real) em 2007, agora ocupa a quinta posição, com R$ 613 bilhões em ativos.

DANÇA DAS CADEIRASEsse movimento de aquisições, fusões e incorporações não é uma novidade no sistema financeiro. Se voltarmos o ca-lendário para o ano de 1943, vamos ver que o Bradesco realizou, de lá pra cá, nada menos que 48 aquisições. Analistas do mercado, entretanto, trabalham com a hipótese de que a compra do HSBC en-cerra um processo de grandes consoli-dações. Muitos acreditam que o banco inglês era o último biscoito do pacote, a última grande oportunidade de cresci-mento “não orgânico”. A menos que um Santander enfraquecido entre no radar de seus concorrentes de maior porte. Afinal, a incorporação do HSBC pelo Bradesco

também sugere uma supremacia dos ban-cos brasileiros sobre os estrangeiros. Não custa lembrar que, na virada do milênio, no clube dos 12 maiores em operação no país, cinco eram forasteiros: HSBC, ABN AMRO, Bank Boston, Santander e Citibank. Hoje, restam apenas três — ABN AMRO, com R$ 1,6 bilhão de ati-vos; Santander, com R$ 613,1 bilhões; e Citibank, com R$ 70,6 bilhões.

Em decorrência da dança das cadei-ras das últimas duas décadas, o negócio bancário brasileiro restou nas mãos de cinco poderosos bancos comerciais, com atividades diversificadas por toda a eco-nomia, que convivem com pequenas e médias instituições financeiras, muitas delas vulneráveis aos ventos fortes do mercado, enfrentando crises sistemáticas, com poucas chances de sobrevivência. É o caso do carioca BRJ, que, em 13 de agosto de 2015, teve decretada sua liqui-dação extrajudicial pelo Banco Central, por comprometimento patrimonial e descumprimento de normas aplicáveis ao sistema financeiro.

Reunidos na Associação Brasileira de Bancos (ABBC), os bancos de médio porte não querem saber de polarizar com os grandes, representados pela célebre Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Por meio de nota, a ABBC diz que a ten-dência de elevação do nível de concentra-ção é um fenômeno internacional, apro-fundado a partir da grave crise financeira de 2008/2009. No Brasil, fatores como a capilaridade, pela ampla rede de agências, e a grande diversificação de produtos e serviços bancários — que gera ganhos de escala e receitas adicionais — fortalecem a competitividade dos mais importantes.

A ABBC também considera que as medidas anticíclicas dos últimos go-vernos e o aumento da participação no mercado de intermediação financeira dos bancos públicos contribuíram para a concentração. A entidade reforça que

CONCENTRAÇÃOBANCÁRIA

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são inerentes ao próprio aumento da concentração os desafios impostos à sus-tentabilidade do segmento dos bancos de pequeno e médio portes. Para superá-los, são necessários esforços não só do setor privado, mas também da regulação ban-cária, no que se refere à melhoria da efi-ciência e à competitividade do sistema.

Aos bancos de menor porte caberia cumprir uma agenda: procurar novos nichos de atuação em que a especiali-zação exerça papel preponderante. Para atender um número maior de clientes, essas instituições devem buscar múltiplos canais de relacionamento, ampliar os in-vestimentos em tecnologias e melhorar processos e eficiência operacional não só nos canais diretos, mas também pela expansão de canais alternativos, como a utilização de correspondentes, internet e mobile banking.

CONCENTRAÇÃO SISTÊMICARicardo Piccoli, analista do Departamento de Supervisão de Cooperativas e de Instituições Não Bancárias (Desuc), ob-serva que a oligopolização da economia brasileira é um problema histórico já de-nunciado na década de 1950, no âmbito da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). A oligopoli-zação dos setores produtivos ocorre no setor agrícola desde o Brasil Colônia e é visivelmente forte na indústria, a partir da criação das primeiras empresas estatais, na Era Vargas. Os oligopólios também se fortaleceram no governo JK, com a aber-tura ao capital externo, nos governos mi-litares, com a concentração de renda e a concessão de privilégios aos industriais da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), e, também, na onda privatista da década de 1990, com FHC. Foi ainda no governo FHC que se acelerou a concentração no sistema financeiro, sob o beneplácito do Proer:

“Os bancos ganhavam no overnight e, com o fim do ciclo inflacionário, foram pegos de calça curta. O resultado foi a que-bradeira de mais de 50 bancos entre 1994 e 2004, que, ou foram liquidados pelo Banco Central ou incorporados pelos outros.”

Criado em novembro de 1995, o Proer injetou R$ 16 bilhões de recursos públi-cos em sete bancos privados que quebra-ram. Foram eles: Nacional, Econômico, Mercantil, Bamerindus, Banorte, Pontual e Crefisul. A justificativa do governo era de que se tratava da única alternativa para salvar o sistema financeiro nacional de um colapso provocado pelo fim da hipe-rinflação, que, ao mesmo tempo em que permitia ganhos exorbitantes às insti-tuições financeiras, mascarava grandes problemas nessas administrações.

Os bancos que não tinham salvação entraram em liquidação extrajudicial. Os que se consideraram elegíveis à recu-peração por terem ativos — como agên-cias e clientes — foram vendidos sem dívidas e cobranças judiciais. O maior deles, o Nacional, teve sua parte boa ven-dida ao Unibanco — por sua vez com-prado pelo Itaú, em 2008. O Bamerindus foi vendido ao HSBC, agora adquirido pelo Bradesco, e o Econômico ao Excel, posteriormente adquirido pelo Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (BBVA), de-pois incorporado ao Bradesco, que tam-bém arrematara o Pontual.

Gandelman recorre a dados do Federal Reserve, o banco central ame-ricano, para efeito de comparação: nos Estados Unidos, existem 1.784 bancos com ativos acima de US$ 300 milhões. No Brasil, até junho de 2015, havia ape-nas 135 bancos, sendo que 85 com ativos equivalentes, quando a cotação do dólar era da ordem de R$ 3,10.

“Não se abrem novos bancos, e os que chegam saem comprando bancos menores. Após o Plano Real, só se vê o sistema bancário minguando e isso não é

Com o fim da hiperinflação, os bancos ficaram em dificuldades, porque haviam desaprendido a atuar como bancos. O Proer foi criado com a justificativa de se evitar quebradeira. Mas, em vez de promover a concentração, o governo poderia ter adotado medidas para apoiar os pequenos.

RICARDO PICCOLI ANALISTA DO DESUC/BC

“Com o fim da hiperinflação, os ban-cos ficaram em dificuldades, porque ha-viam desaprendido a atuar como bancos. O Proer foi criado com a justificativa de se evitar quebradeira. Mas, em vez de pro-mover a concentração, o governo poderia ter adotado medidas para apoiar os peque-nos. O Proer foi uma medida perversa, que concentrou e salvou os grandes bancos com recursos públicos”, resume Piccoli.

Rubens Gandelman, analista do Departamento de Supervisão de Bancos do Banco Central (Desup), lembra e acrescenta:

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saudável para a economia. A regulamen-tação atual favorece a concentração. Seria necessária uma flexibilização das exigên-cias de capital mínimo e depósitos com-pulsórios, para incentivar o surgimento de novos bancos e cooperativas de crédito que contribuam para o desenvolvimento econômico das micro, pequenas e médias empresas no país”, defende Gandelman.

Piccoli reitera que, desde o Proer, a sociedade assiste a esse modelo de oligo-polização financeira se disseminar bru-talmente, sob o argumento de se evitar risco sistêmico, num processo em que os grandes bancos abocanham os pe-quenos — que não apresentam nenhum risco sistêmico. O modelo continuou nos anos 2000, com o governo facili-tando os grandes bancos a assumirem outros. “Assim, os grandes tornam-se cada vez mais ameaçadores quanto ao risco sistêmico e ao poder de pressionar o governo”, alerta Piccoli.

Segundo ele, hoje a sociedade paga, de juros, o equivalente a 10,7% do Produto Interno Bruto. O lucro dos ban-cos cresceu 20% em 2014 e, em 2015, segue mostrando vigor. “A perversidade desse modelo é que o governo facilita ao grande absorver o pequeno, em vez de au-xiliar o pequeno a superar a dificuldade. Ao final, o sistema financeiro oligopoliza-do não serve aos interesses da sociedade brasileira, ao contrário, aumenta seu po-der de avançar sobre o cidadão, cobrando por quaisquer serviços e spreads, que estão entre os mais altos do mundo”, analisa.

Essa concentração se reflete na eco-nomia e na vida dos consumidores ban-cários. À medida que o setor se concentra, a função original do banco, que é ofere-cer crédito para as pessoas e as empresas, passa a ser secundária, pois a primeira é investir em títulos públicos, desviando--se da área de crédito para a de tesoura-ria. “Quem necessita empréstimo não é bem tratado, pois o banco não precisa do

cidadão nem da empresa”, resume. O analista do Banco Central Clovis

Barbosa Junior chama a atenção para outro aspecto que, segundo ele, explica a origem das crises modernas: “As tesou-rarias dos bancos aplicam suas reservas e a de seus clientes em títulos, mas sua atividade vai mais além. Elas especulam no mercado futuro, tirando um adicional sobre o valor de mercado dos títulos que em geral rende mais que os juros pagos pelo papel, dado o volume ficticiamente negociado”, adverte.

Professor da Escola Brasileira de Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV/EPGE), Luis Braido observa que a economia brasileira é fechada, e isso gera

concentração em diversos setores produ-tivos, inclusive o bancário. Um sistema bancário mais seguro tende a se transfor-mar num mais concentrado. Mas a conse-quência para a economia brasileira é que o crédito se torna caro e escasso.

“A falta de crédito inviabiliza investi-mentos em instalações, máquinas e equi-pamentos e, assim, reduz a produtividade do trabalhador brasileiro, que, em geral, trabalha com menos instrumentos do que o ideal. Menor produtividade do trabalho resulta em menores salários, e esse é um aspecto pouco abordado em análises so-bre o setor bancário”, afirma.

O professor acredita que, para redu-zir a concentração bancária no Brasil e estimular a criação de novos bancos, o ca-minho seria possibilitar que instituições internacionais se estabeleçam no Brasil, simplificar a regulação bancária e facilitar a criação de financeiras, cooperativas de crédito e bancos. Para ele, um dos gran-des obstáculos à expansão de pequenos bancos é a infraestrutura de saques em terminais fora das agências.

“Ações visando democratizar o segmento de saque 24 horas seriam bem-vindas”, defende.

RISCOS CONTROLADOSUm dos pontos que dificultam a demo-cratização do sistema financeiro é que a regulamentação atual permite esse grau de concentração que o Banco Central não enxerga como um problema em si mesmo. Adalberto Gomes da Rocha, chefe de Departamento de Organização do Sistema Financeiro (Deorf), diz que o fato de o Banco do Brasil ser operador do crédito rural e a Caixa Econômica Federal a operadora do crédito à habi-tação distorce os números — ainda que bancos comerciais sem essas linhas de negócios cativos sejam do mesmo porte do BB e da Caixa.

“Essa concentração não significa

A regulamentação atual favorece a concentração. Seria necessária uma flexibilização das exigências de capital mínimo e depósitos compulsórios para incentivar o surgimento de novos bancos e cooperativas de crédito que contribuam para o desenvolvimento econômico das micro, pequenas e médias empresas.

RUBENS GANDELMAN ANALISTA DO DESUP/BC

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que não haja competição. Para o Banco Central, interessa saber se há concorrên-cia, e isso é avaliado em todos os segmen-tos do mercado, como crédito imobiliário, crédito rural, crédito consignado, finan-ciamento a veículos, crédito à importação e exportação. Cada segmento é testado por meio de ferramentas econométri-cas. No caso da compra do HSBC pelo Bradesco, vamos avaliar de que forma ela interfere na competição”, diz Rocha.

Mitchurim Borges Diniz, chefe do Departamento de Organização do Sistema Financeiro / Consultoria de Estudos e Pesquisas (Deorf/Conif), não acredita que o gigantismo dos maiores bancos aumen-te o risco sistêmico; ao contrário, para ele, quanto mais fortes os bancos, menor o risco de quebrar.

“Por isso, quando uma instituição não vai bem, ela é comprada. Isso gera competição, mas fortalece o banco que comprou. A concentração é apenas um dos parâmetros das análises que o BC faz para avaliar se o sistema é concorren-cial. Quando consideramos que em um mercado há concentração, realizamos testes de rivalidade. Em mercado em que há sinais de prejuízo à competição, criamos uma série de condicionantes, como, por exemplo, o não encerramen-to de agências, a regulação de tarifas, a venda de ativos e redução dos índices de reclamação. Quando há dois bancos se associando, avaliamos o campo de atuação de ambos em cada mercado. A concentração é um fenômeno natu-ral à economia capitalista, em que uma empresa ou instituição pode comprar a outra. Não há como impedir esse proces-so. Cabe às autoridades analisar como a operação vai impactar na competição”, conclui Borges.

João Sicsú, professor do Instituto de Economia da UFRJ, diz que, embora seja um movimento legal e legítimo de econo-mias de mercado, a concentração sempre

tem sentido negativo, pois é o oposto de concorrência. O banco que compra o con-corrente quer reduzir a competição.

“O que tem de ser feito é aumentar a regulação para que não se use o poder de mercado contra os clientes. Isso pode ser feito por regras mais rigorosas sobre tari-fas, taxas de administração e taxas de juros para se substituir de maneira artificial a concorrência que foi suprimida. O gover-no tem instrumentos, como a regulação,

BANCO CENTRAL - CADE

CABO DE GUERRA Se o Banco Central não vê problemas na concentração, é possível que o mesmo não ocorra com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), caso o órgão venha a assumir parte das atribuições que hoje são exclusivas do BC. Tramita no Congresso o Projeto de Lei Complementar nº 265/7, do Senado, que transfere para o Cade a competência de fiscali-zar e punir condutas do sistema financeiro lesivas à ordem econômica e à concorrência. Atualmente, esse controle é feito pelo Banco Central, que exerce o papel de regulador do sistema financeiro. No dia 12 de agosto, o projeto foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara.

Pela proposta, o Cade terá prazo de 60 dias para avaliar os atos de concentração bancária (fusões, aquisições e incorporações). Se não apreciados nesse prazo, os atos serão automaticamente considerados aprovados. O órgão também poderá investigar e punir práticas lesivas ao sistema financeiro ou anticoncorrenciais, como combinação de tarifas. O BC ficaria apenas com a avaliação das situações que envolvam riscos à confiabilidade e à segurança do sistema financeiro. O Banco prefere não comentar o projeto de lei.

Pode-se ler, nesse cabo-de-guerra, uma preocupação, por parte das instituições brasileiras, com o oligopólio financeiro. Ou seja, a atuação do BC, de promover o saneamento, via incorporações, está sendo reavaliado.

CONCENTRAÇÃOBANCÁRIA

(*) O percentual se refere à categoria dos bancos classificados pelo BC como: b1 — banco comercial, banco múltiplo

com carteira comercial ou caixa econômica; e b2 — banco múltiplo sem carteira comercial e banco de investimento.

Mas mesmo incluindo as demais categorias, o percentual ainda se mantém elevado: 70,6%.

a fiscalização e bancos públicos robustos, que podem ser usados para substituir os elementos de concorrência que foram negados”, ressalta Sicsú.

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Em tempos de crise, cresce o valor estratégico das co-operativas de crédito para a proteção da economia, a democratização do crédi-

to e a distribuição de renda. Embora ainda representem uma pequena fatia do Sistema Financeiro Nacional, essas empresas marcham na contramão da concentração bancária. Legalizadas e reguladas pelo Banco Central, elas vêm registrando expressivo crescimento, não apenas em quantidade, mas também em percentual de participação no mercado. Juntas, cooperativas organizadas em centrais e confederações de crédito ocu-pariam a sexta posição no ranking dos maiores bancos comerciais.

Nas contas do Banco Central, o Brasil reúne 1.076 sociedades cooperativas sin-gulares, também chamadas de coope-rativas de 1º grau, que ofertam crédito direto a seus associados. Cerca de 80% delas estão organizadas em 37 centrais ou federações, denominadas sociedades de 2º grau, que cuidam de integrar e orien-tar as atividades financeiras das filiadas. Estas centrais e federações, por sua vez,

A resposta dos pequenos

COOPERATIVAS DE CRÉDITO

encontram acolhida em duas confede-rações, ou sociedades de 3º grau, criadas para coordenar atividades e empreendi-mentos de maior porte. Dois bancos inte-gram o modelo cooperativista de crédito, o Bancoob e o Bansicredi, que embora não sejam cooperativas, auxiliam na execu-ção de transações e operações bancárias.

Entre alguns sistemas de crédito im-portantes, atualmente o Sicoob é o maior. Reúne 15 centrais, 498 cooperativas sin-gulares e o banco Bancoob, uma rede com 3 milhões de associados e 2.305 pontos de atendimento, que emprega 24.223 fun-cionários, em 1.419 municípios brasilei-ros. Em 227 deles, é a única instituição financeira.

Outro sistema também importan-te, o centenário Sicredi, criado em 1902 pela primeira cooperativa do país, em Nova Petrópolis, Rio Grande do Sul, tem 96 filiadas, 1.365 pontos de atendimento e 18 mil funcionários. A estrutura conta, ainda, com quatro centrais regionais, uma confederação, uma fundação, o banco Bansicredi, uma corretora de seguros e três administradoras — de cartões de cré-dito, de consórcio e de bens.

SISTEMA COMPETITIVODe acordo com dados do site Cooperativismo de Crédito, o Sistema Nacional de Crédito Cooperativo (SNCC) cresceu acima da média do Sistema Financeiro Nacional no primeiro semestre. O total de ativos do setor atingiu R$ 221 bilhões, em junho de 2015, marca 10% maior do que a registra-da em dezembro de 2014 e 20% superior à do mesmo mês daquele ano. Os depósitos chegaram a R$ 108 bilhões, com salto de 12% nos últimos seis meses e de 19% nos últimos 12. Em junho de 2015, as coope-rativas financeiras detinham 5,55% do mercado em depósitos.

Já as operações de crédito do SNCC, impactadas pelo cenário econômico do país, totalizaram R$ 92 bilhões, em junho de 2015, com crescimento nos últimos seis meses de apenas 3% e de 15% nos últimos 12 meses, períodos em que, res-pectivamente, o SFN cresceu 4% e 11%. Em termos patrimoniais, as cooperativas financeiras atingiram R$ 32 bilhões em patrimônio líquido, com crescimento de 8% nos últimos seis meses e de 20% em 12 meses. O SFN cresceu 6% e 7% na mesma época.

LEGALIZADAS PELO BC, EMPRESAS ESTÃO CRESCENDO, NÃO APENAS EM QUANTIDADE, MAS TAMBÉM EM PERCENTUAL DE PARTICIPAÇÃO NO MERCADO.

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Além da oferta de crédito, as coo-perativas prestam aos associados outros serviços financeiros, como captação de depósitos à vista e a prazo, emissão de cheques, cobranças, custódia, recebimen-tos e pagamentos por conta de terceiros, em convênio com instituições financeiras públicas e privadas e de corresponden-te no país. Reguladas pela Lei 4.595/64, a Lei 5.764/71 e a Lei Complementar 130/2009, também obedecem à Lei 7.492/86, que trata dos Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional, e são fisca-lizadas pelo Departamento de Supervisão de Cooperativas e de Instituições Não Bancárias (Desuc) do Banco Central.

Harold Paquete Espínola, chefe do Desuc, diz que, para fins de regulação e supervisão, as cooperativas de crédito são equiparadas às demais instituições financeiras, sujeitando-se às mesmas obri-gações básicas. Mas, devido ao conceito de proporcionalidade ao porte e à complexi-dade das instituições, há regras próprias para elas, que reconhecem suas peculiari-dades como um regime prudencial mais simplificado e menos oneroso, em termos operacionais.

“As cooperativas de crédito no Brasil apresentam-se em boa situação. Uma assimetria em relação ao sistema ban-cário que existia até recentemente era o fato de esse segmento não contar com fundo garantidor, o que foi resolvido com a criação do Fundo Garantidor de Crédito Cooperativo (FGCoop), instituído em 2012, nas mesmas bases e limites de cobertura, proporcionados pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Nos úl-timos seis anos, foram registrados oito casos de liquidações extrajudiciais de co-operativas. Desde a criação do FGCoop,

sobretudo no tocante à maior liberdade para constituição e funcionamento de cooperativas de livre admissão de associa-dos, vem contribuindo, de forma especial, para esse crescimento, já que esse tipo de organização admite a associação de qualquer pessoa física ou jurídica.

“Recentemente, com a edição da Resolução nº 4.434/15, mais um passo nesse sentido foi dado. As cooperativas passaram a ser separadas, pela complexi-dade de suas operações, em ‘plenas, clás-sicas e de capital e empréstimo’, ficando delegado a elas, por meio de seus estatu-tos, o estabelecimento das regras relativas às pessoas que poderão compor os seus quadros”, acrescenta o chefe do Desuc.

Ele ressalta, porém, que, por ainda se tratar de instituições de menor porte, as cooperativas apresentam, em relação aos grandes bancos, a desvantagem da escala, numa indústria em que esse fator mostra importância. Mas, à medida que elas vão se estruturando em sistemas e compartilhando estruturas operacionais, essa desvantagem vai sendo equacionada.

Outro aspecto no qual os associados devem estar atentos é o fato de que, como contrapartida à condição de donos e de-tentores do direito de participar da ges-tão e dos resultados da cooperativa, eles também precisarão arcar com o rateio de eventuais perdas que a organização venha a sofrer. “Nesse sentido, o aprimo-ramento da governança e dos elementos que permitam a máxima participação dos associados e a transparência da gestão constitui desafio permanente para o seg-mento, que muito vem se aprimorando quanto a esses aspectos”, conclui.

contudo, caso ocorra essa situação, os de-positantes contarão com seguro de depó-sito no limite de até R$ 250 mil, idêntico ao dos bancos”, diz Espínola.

Quanto ao risco sistêmico, ele diz que, mesmo consideradas as maiores instituições desse segmento, esse temor não se aplica às cooperativas de crédi-to. “Apesar disso, os processos de super-visão e monitoramento consideram as interligações sistêmicas eventualmente estabelecidas entre as cooperativas, para detectar possíveis situações que possam afetar de forma ampla as de um mesmo segmento”, ressalta.

TRANSPARÊNCIA DA GESTÃOEspínola destaca que as cooperativas de crédito exercem importante papel no processo de inclusão financeira e “ban-carização” da população. Na forma de sociedade de pessoas — que não visam ao lucro, e sim à adequada prestação de servi-ços —, com exigências prudenciais mais simplificadas, incluindo uma quantidade menor de capital mínimo requerido, elas apresentam maior facilidade para cons-tituição e funcionamento. Assim, priori-zam as necessidades dos usuários dos seus produtos e serviços, em especial, porque os clientes são também seus proprietá-rios, podendo participar da direção e do posicionamento estratégico da entidade — no mínimo, por meio das assembleias.

Espínola confirma que, nos últimos anos, as cooperativas de crédito têm cres-cido em ritmo mais acelerado do que o restante do sistema financeiro. E explica que à medida que os sistemas cooperati-vos se estruturam, amplia-se a oferta de serviços. A evolução da regulamentação,

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LUCIANE MOESSA DE SOUZA

No Brasil e no mundo, é cada vez maior a percepção do papel estratégico do Sistema Financeiro — como intermediador de recursos de poupadores/

investidores para aqueles que necessitam de crédito, seja para empreender, para adquirir bens de valor ou para aten-der necessidades emergenciais — no caminho rumo a uma economia verdadeiramente sustentável, ou seja, que propi-cie geração de riquezas e atendimento de necessidades de forma socialmente inclusiva e em respeito à natureza que nos acolhe, alimenta e da qual dependemos para sobreviver.

A forma como o Sistema Financeiro, em suas decisões de concessão de créditos e realização de investimentos, venha a evitar a geração de impactos socioambientais negativos, de um lado, e fomentar a geração de impactos socioambientais positivos, de outro, possivelmente terá um papel crucial nessa transição — ao lado de outros ele-mentos, como a tributação (que possui idêntico potencial) e, evidentemente, a própria evolução da legislação socio-ambiental e sua efetiva implementação.

O Banco Central do Brasil ocupa papel de desta-que no cenário internacional ao exigir que todas as ins-tituições financeiras elaborem e observem Políticas de Responsabilidade Socioambiental. A Resolução 4327, de 2014, trouxe inovações muito significativas ao reconhecer os impactos financeiros dos riscos socioambientais, exigin-do (na trilha do que já fizera uma resolução do Conselho Monetário Nacional de 2011) que estes sejam analisados não apenas em cada transação que apresenta risco relevante,

mas também na própria composição da carteira de créditos de cada instituição financeira. Inova ainda a norma ao exigir que sejam analisados os impactos socioambientais de novos produtos financeiros, bem como exige que o tema receba a devida atenção ao determinar que a avaliação de tais riscos seja feita pelos Departamentos de Risco.

A nova norma, contudo, traz diversos desafios para a sua aplicação, que deverá examinar por evidente, a adequa-ção das Políticas, sem que elementos mínimos, no que diz respeito ao conteúdo das Políticas, tenham sido predefini-dos. Por exemplo, estabelecendo quais transações e clientes devem ter seus riscos avaliados. Nesse momento que a norma já está plenamente em vigor (incluindo, desde 1º. de agosto, também as instituições financeiras de pequeno e médio porte), caberá ao Banco Central verificar não somente a existência das Políticas, mas sua adequação e a efetividade de seu cumprimento, sempre tendo em vista a mitigação de impactos socioambientais negativos, já que, a par de mitigar os riscos financeiros, é preciso contribuir também para a mitigação de riscos socioambientais.

São possíveis exemplos de elementos para uma ava-liação da adequação das Políticas e sua implementação o exame do percentual de transações que passam pela avaliação de riscos socioambientais (dentre aquelas que dependem de licenciamento ambiental), o percentual de casos em que a instituição faz exigências de adequação dessa natureza para o tomador de crédito, quais são os instrumentos que a instituição financeira utiliza para avaliar os riscos (que são extremamente diversificados conforme o setor, seja na atividade agrícola, na exploração

ARTIGO

SUSTENTABILIDADE SOCIOAMBIENTAL E SISTEMA FINANCEIRO

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de madeira, na mineração ou na atividade industrial pro-priamente dita, nos mais variados ramos), o percentual de casos (dentre as transações avaliadas) em que o crédito é efetivamente recusado por inadequação socioambiental da atividade. No que diz respeito aos instrumentos, é importante notar que cada setor tem seus próprios riscos, devendo as diligências realizadas pelas instituições se adaptar a tais especificidades. Se houver dificuldades na obtenção de informações junto aos entes públicos com-petentes, é preciso que elas sejam apresentadas e soluções sejam encontradas.

De outra parte, se quisermos realmente avançar na contribuição que o Sistema Financeiro pode dar para o sonhado Desenvolvimento Sustentável, mais do que mi-nimizar riscos, resta muito ainda a explorar do potencial que ele possui de incorporar a variável socioambiental ao custo do crédito e às decisões sobre investimentos: o mo-delo ideal será aquele em que as atividades que produzem impactos socioambientais negativos (o exemplo clássico é o das usinas termoelétricas) tenham cada vez menos acesso ao crédito, por ser esse mais caro, ao passo que as ativida-des que produzam impactos socioambientais positivos (a exemplo das usinas de energia eólica ou solar) tenham seu acesso facilitado, seja por condições de prazo, seja por taxas

de juros mais favoráveis. Ainda, dentro de um mesmo setor econômico, o ideal seria conceder condições mais favoráveis a empresas que sejam mais responsáveis, por exemplo, no que diz respeito à eficiência energética, à eficiência no uso da água, assim como na geração de resíduos. O mesmo vale — e nesse sentido muitos modelos já existem, sobre-tudo na Europa e nos EUA — para as decisões relativas a investimentos, nas quais investidores no mercado de ações e outros títulos optem cada vez mais pelas empresas mais responsáveis sob o ponto de vista socioambiental, deixando de investir naquelas que produzem impactos indesejáveis, ainda que a atividade seja legal.

O importante é que já começamos a trilhar esse ca-minho, que não é simples, mas é sem dúvida necessário e altamente compensador. O planeta e a humanidade que nele habita agradecem.

(*) LUCIANE MOESSA DE SOUZA, Mestre em Direito do Estado (UFPR), Doutora em Direito (UFSC), Pós-Doutoranda em Direito (USP), tendo sido pesquisadora visitante na Universidade Luigi Bocconi (Milão), com pesquisa sobre Regulação Financeira e Sustentabilidade Socioambiental. Procuradora do Banco Central do Brasil

O modelo ideal será aquele em que as atividades que produzem impactos socioambientais negativos tenham cada vez menos acesso ao credito, por ser esse mais caro, ao passo que as atividades que produzam impactos positivos tenham seu acesso facilitado, seja por condições de prazo, seja por taxas de juros mais favoráveis.

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A grande dama do varejo

ENTREVISTALUIZA TRAJANO

Em meio ao pessimismo que contamina o dia a dia dos brasileiros, conhecer a empresária Luiza Helena Trajano, presidente do Magazine Luiza, foi uma grata surpresa. Afável, determinada, e muito feliz com o que faz, Luiza recebeu a Por Sinal em sua ampla sala, com paredes de vidro e uma porta que nunca se fecha, no escritório da empresa, em São Paulo. Durante quase duas horas, conversou animadamente sobre seus negócios, sua trajetória de vida, seus projetos e o futuro do Brasil. Otimista até o último fio de cabelo, ela acredita e torce pelo país. “Eu torço pelo Brasil e acho que atualmente a única coisa que a gente tem de fazer é dar força, até porque admiro muito a democracia que conseguimos implantar.” Hoje, à frente de uma das mais bem-sucedidas redes de varejo, Luiza faz

questão de deixar claro: o que distingue uma boa empresa e um bom profissional é a importância que se dá ao atendimento e à inovação. No Magazine, todos os funcionários são vendedores, inclusive ela, que começou a trabalhar cedo, como balconista, na primeira loja que a tia Luiza comprou em Franca, sua cidade natal. Gostou tanto da experiência de lidar com gente, de estar na ponta, que nunca mais parou. Com uma intensa rotina de trabalho, é responsável pelo atendimento direto ao cliente, cuida das estratégias de negócios e da utilização de novas tecnologias, e ainda encontra tempo para responder a inúmeros e-mails que recebe semanalmente de seus clientes.

Flavia Cavalcanti

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� O Magazine Luiza é um caso de sucesso, com uma história muito particular. Fale um pouco dessa experiência.Minha tia, Luiza Trajano, era uma pessoa muito interessante que tinha o sonho de comprar uma loja para arrumar emprego para toda a família, já que o nível de desemprego nos anos 50 era grande. E ela fez isso. Comprou uma pequena loja, A Cristaleira, bem no centro de Franca, que vendia móveis e eletrodomésticos. Logo que assumiu, mesmo sem ter dinheiro, promoveu um concurso em uma rádio local para trocar o nome Cristaleira. Os ouvintes escolheram ‘Magazine Luiza’, não sei bem por que o nome ‘Magazine’, e o ‘Luiza’, porque minha tia era conhecida da cidade. Acho o nome até difícil, já tentamos mudar, porque magazine tem a ver mais com roupa, revista, mas não conse-guimos. É interessante ver no estudo sobre a marca como o nome é usado. Em algumas regiões se fala “Eu vou pra Luiza”, em outras, já se usa “Eu vou pro Magazine”. Magazine passou a ser sinônimo nosso.

� E quando você entra na história?Quando tinha 12 anos, gostava de dar presentes, e minha mãe me disse para eu ir trabalhar na loja da minha tia Luiza, como vendedora, e assim ganhar algum dinheiro. E eu topei. Foi uma experiência muito boa porque, além de poder dar os presentes que queria, também fiz minha marca. Todos me incentivavam e diziam que eu tinha jeito para aquilo. E foi dando certo. No

começo, ia para a loja só nas férias de dezembro, mas depois, com 18 anos, trabalhava de dia e fazia faculdade de noite. Trabalhei em vários setores, conheci de tudo, e isso foi muito útil para minha formação. Minha família era mais voltada para a área de operação, mas eu acabei me ligando à estratégia de tecnologia, me afirmando nessa área. Gosto muito do que faço, gosto de pensar na estratégia.

� Em termos de valores, que legado sua família deixou?Para minha família, honestidade e transparência são princí-pios que ela sempre carregou. No varejo, você lida com todo tipo de gente, então é preciso não esnobar, não sair contando vantagens, é preciso ter cuidado com seu consumidor. O rela-cionamento de igual pra igual com as pessoas é um valor muito importante na nossa história, até hoje. Posso afirmar que os valores não mudaram, eles continuam os mesmos. A empresa é firme na questão da ética, nossos princípios inegociáveis são muito sérios. Qualquer pessoa que toma uma atitude antiética é mandada embora por justa causa imediatamente, mesmo que tenha 15 anos de empresa, porque o funcionário assina um termo de compromisso quando entra.

� Cinquenta anos depois, quem são vocês?Somos uma ampla rede varejista, com 770 lojas espalhadas por 16 estados do Brasil (só não temos presença na Região Norte,

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no Espírito Santo e no Rio de Janeiro) e 24 mil funcionários. Oferecemos nossos produtos por meio de lojas físicas, lojas vir-tuais, televendas e e-commerce. No ano passado, o faturamento foi de cerca de R$ 12 bilhões. Nossa sede continua em Franca, que cuida de tudo que é operacional, como pagamentos, confe-rências, contabilidade, e criamos um escritório na cidade de São Paulo, que trabalha só com a estratégia de negócios.

� Desse faturamento, o que corresponde às lojas físicas e à loja virtual? É possível separar assim?Na internet, temos as lojas virtuais, onde os produtos não são expostos, o SAC, o setor de televendas. E o “MagazineVocê” – um produto novo que criamos em 2012, que permite a qualquer pessoa a criação de uma loja virtual na internet. Tudo isso repre-senta quase 20%. Os outros 80% são de vendas físicas nas lojas.

� Fale das lojas virtuais, uma experiência inovadora na rede de varejo, e que deu certo.Em 1992, quando ninguém falava nisso, a gente criou uma loja que acabou até virando um case permanente de estudo na Universidade de Harvard. Uma loja eletrônica, sem produtos expostos ou estocados. A venda era feita por computador. Foi difícil anunciar que o Magazine Luiza trazia para sua cidade a loja do ano 2000. O consumidor não entendia como era pos-sível chegar numa loja e não ver nenhum produto exposto, só no vídeo. E isso numa época em que não havia multimídia no Brasil! Ninguém achava que ia dar certo. Saímos totalmente da forma de venda tradicional e apostamos numa coisa nova. Hoje, temos 110 lojas virtuais, com terminais multimídia conectados a uma central de dados.

� Sobre a relação com o cliente, vocês têm um marketing bem estruturado que aposta na boa relação e no contato direto. Em primeiro lugar, eu venho de uma família na qual o cliente é tudo. Quem trabalha com cliente desde cedo aprende a entender que é ele que decide, por mais que você sofistique os processos da empresa. Segundo, e o mais importante, é que o atendimento e a inovação vão ser as únicas coisas que farão a diferença entre uma empresa e outra, um banco e outro, um profissional e outro. Como você atende e como você inova.

� Mesmo com a utilização de tecnologias modernas, como é o caso de vocês?Sim, por mais que você trabalhe com tecnologias avançadas. Uma pessoa, hoje, espera interação, seja em que lugar for. Se a gente sabe que essas duas coisas são importantes, por que não colocá-las na prática? O Magazine Luiza tem um serviço de atendimento ao cliente, não estou dizendo que é o melhor, mas sei que faz a nossa diferença. Nosso foco é no atendimento, na linha direta com o consumidor. Há uns anos contratei um CEO, Marcelo Silva, que entrou no meu lugar. Ele cuida de tudo que diz respeito à Operação, à exceção do SAC – Serviço de Atendimento ao Consumidor que continua sob minha responsabilidade, além da área estratégica, onde acompanho tudo. Se você entrar no nosso site, está lá o meu e-mail, para ser acessado, porque eu defendo esse contato direto com o cliente. Não acredito em serviço de atendimento com a intermediação de gestores operacionais que diante de reclamações estão sempre se justificando.

� Como funciona esse atendimento direto? Quantos e-mails você recebe? E o que dizem essas mensagens?Como o Magazine Luiza virou uma grande empresa, eu recebo toda semana, em média, oitenta a cem e-mails de reclamações de clientes, sendo que quando a pessoa me escreve ela já tentou outros canais dentro da empresa. Quando você se abre, as pessoas respeitam muito a tua atitude. Esse contato é uma forma de você escutar o que não quer ouvir. Apesar de a gente estar muito bem no Reclame Aqui, isso não me basta. Esse negócio de estatística sobre reclamação de clientes não funciona muito para mim. São apenas dez que estão mal servidos? Não importa, são dez que não mereciam estar mal servidos e tenho de atendê-los! Tenho o cuidado de responder a todos os e-mails, e, quando o caso é grave, eu até telefono, no caso de o cliente colocar seu telefone.É engraçado como os clientes se colocam. Eles começam, geral-mente, dizendo que sou uma empreendedora legal, que eu os convidei para serem felizes (referência ao slogan “Vem ser feliz”), mas que são muito infelizes com a empresa. E aí reclamam de tudo. O que eu mais aprendo com eles é que 99,99% dos clientes têm toda a razão. Se eu sei que estão certos, procuro atendê-los como merecem, pedindo perdão e acionando minha equipe para resolver os problemas.

� Com tantas frentes para supervisionar na empresa, como consegue tempo para mais esse trabalho? Hoje tenho uma equipe que resolve as demandas, mas leio a qualquer hora do dia todas as mensagens que recebo, acompa-nho e cobro providências. Eu sou muito focada no atendimento,

ENTREVISTA

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mas sei que não sou excelente, não resolvo tudo. Costumo dizer que o atendimento é igual a regime de emagrecer, você nunca acha que ele está bem equacionado. Se você larga, o problema fica maior. É uma tensão diária, não dá pra descuidar nunca.

� O que é o Instituto para Desenvolvimento do Varejo?Eu ajudei a montar esse instituto, ele fez dez anos no ano pas-sado. É muito bem conceituado, somos convidados para tudo que tem a ver com nossa atividade. No início, o varejo, um setor tão forte da economia, não tinha voz. Por isso resolvemos fazer uma coisa diferente, nos unindo. E olha que unir varejistas não é fácil. São cinco que vendem o mesmo produto para o mesmo público, às vezes no mesmo quarteirão. Mas a gente foi muito feliz, no primeiro ano aprendemos a trabalhar jun-tos. Descobrimos que somos o maior empregador, depois do governo, e com isso conseguimos separar a competição diária da causa maior, que é o varejo. Hoje, o instituto tem mais de 60 associados, que representam 8 mil lojas, ou quase 30% da economia. Uma questão para nós era importante quando o criamos: os associados tinham que ser for-malizados. E isso no varejo é complicado, são muitas associações formadas por gente que não paga impostos. No começo, para enfrentar isso, atraímos as grandes lojas. Hoje temos sócios de tudo quanto é tipo, uma representação muito expressiva. Nosso objetivo é unir a classe. Seja o varejo pequeno, médio ou grande. Nós é que lutamos pela formalização do pequeno. Fizemos uma pesquisa quando começamos, e agora, dez anos depois, registra-mos o quanto nosso trabalho ajudou o Brasil a ser mais formal.

� O Magazine Luiza tem alguma política de responsabilidade socioambiental em relação aos fornecedores?Sim, atua em várias frentes. Por exemplo, a empresa fornecedora não pode utilizar mão de obra escrava. Outra coisa, recomendamos um cuidado especial com embalagens e matérias-primas usadas. Agora estamos fazendo um trabalho junto ao IDV, estudando as melhores práticas de reciclagem. No caso dos nossos funcionários, investimos muito para eles serem protagonistas. Porque à medida que você assume que o Brasil é seu, você tem mais cuidado com o social e o ambiental. Nesse sentido, o Magazine Luiza é muito pre-ocupado com o processo educativo de seus funcionários. Há mais de 15 anos damos bolsas de estudo, para qualquer faculdade, que co-brem em 30% a 70% os valores dos cursos. Se você sair da empresa, perde a bolsa. Mas você pode se formar hoje em Matemática e sair amanhã, sem dever nada à empresa. Temos um bom orçamento para isso, quase todo mundo entra, desde que mostre interesse. É uma forma que a gente tem de ajudar a educação no país.

Se você entrar no nosso site, está lá o meu e-mail, para ser acessado, porque eu defendo esse contato direto com o cliente. Não acredito em serviço de atendimento com a intermediação de gestores operacionais que diante de reclamações estão sempre se justificando.

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� E com os fornecedores?Com os fornecedores, a gente faz a mesma coisa, embora no nos-so ramo dificilmente eles desrespeitem as normas ambientais. São empresas grandes, nacionais e multinacionais, que têm pre-ocupação em comprar produtos que consumam menos energia, por exemplo, produtos com selos de qualidade e de compromisso ambiental. Essa é uma prática hoje. Agora, quando lidamos com empresas de construção para reformar ou construir novas lojas, há mais exigências, como não empregar menor de idade e usar produtos que sejam sustentáveis.

� Como o comércio preocupa-se em incentivar e distribuir aquilo que é produzido no país? Estimular o desenvolvimento de tecnologias que atendam às demandas do consumidor final?Sabemos que, atualmente, se a própria indústria não investir em inovação tecnológica, não sobrevive. Hoje, os celulares procuram ter câmeras tão boas quanto às câmeras tradicionais que usávamos até bem pouco tempo. O que acontece é que se não se atualizar, você fica para trás. Há exemplos de empresas que tiveram de se reinventar inteirinhas.

� Qual é o perfil do público de vocês? Não temos um perfil definido de público. No site, por exemplo, nós atingimos pessoas de maior poder aquisitivo. Normalmente, e não é por preferência, nosso perfil na loja física é de mulheres entre 30 e 40 anos. Eu vim do Japão, na semana passada fui a um evento de mulheres, e o primeiro-ministro japonês participou dois dias. Ele lembrou que hoje a mulher está decidindo a com-pra até do carro da família. Por isso o enriquecimento do país está passando pelo empoderamento da mulher. O Japão está muito atrasado nessa questão.

� Pelas campanhas, a ideia que se tem é que vocês atingem mais as classes C e D, e para isso usam ferramentas de comunicação bem arrojadas. É isso mesmo?Sempre fomos fortes no público C e D, especialmente nas lojas físicas. E nunca quisemos largá-lo, até porque ele aumentou muito nos últimos dez anos. Hoje, são mais de 40 milhões de brasileiros que entraram para a economia. A Internet nos dá condições de chegar mais perto desses consumidores, através de seus filhos, jovens que manejam bem as novas tecnologias. Antigamente, você definia o público-alvo pelo estilo de vida, se se hospedava num hotel cinco estrelas, se andava de avião na primeira classe, se comprava roupas de grife.

Os estudos indicam que, com a Internet e a democratização

do acesso, o público tem de ser definido pelo desejo de comprar. Um televisor de tela plana com 57 ou 60 polegadas não é mais um produto de luxo. O mesmo para uma geladeira frost-free. A indústria não acreditava na geladeira frost-free. E eu falava: “Gente, o povo quer comprar.” E foi um sucesso, o produto mais procurado. A indústria foi obrigada a repensar sua produção de eletroeletrônicos.

� O mais importante no momento é a oportunidade de crédito. O valor da prestação e não do produto.Boa parte do que é vendido na nossa empresa é feita por meio de financiamento. Na maioria das vezes, são pessoas de baixa renda, que têm acesso ao crédito sempre que desejar, em suaves prestações. Temos a financeira Luizacred, uma parceria com o Banco Itaú, onde os clientes podem optar por empréstimos pessoais e outros serviços financeiros.

� E a crise econômica, como ela afeta vocês?São três coisas básicas que movem uma economia num país em desenvolvimento: renda, emprego e crédito. E tudo isso é movido pelo nível de confiança. Hoje, além de vivermos uma crise política e econômica – e não é a primeira, já tivemos várias –, o que mais estamos trabalhando é com o nível de confiança da população na economia. É um dos mais baixos que já vi. Eu acho até que o crédito não está tão apertado. O emprego caiu, mas o desemprego não é tão alto. Em 2002, chegamos a ter 10 milhões de desempregados. A gente terminou 2014 com 4,9 milhões. Quer dizer, é ruim, e você tem de ter cuidado para não continuar. Mas, atualmente, o medo de perder o emprego é muito maior que o desemprego. O nível de confiança é muito mais sério do que a crise em si. E parece que está sendo contaminado pela crise política. Esta situação não é interessante para ninguém, todo mundo sai perdendo.

� Com a crise, as pessoas estão deixando de comprar? Caíram muito as vendas na sua empresa?No ano passado, tivemos um crescimento enorme das vendas por conta da Copa do Mundo. Como patrocinadores, investimos muito. Acreditamos na Copa e acertamos, justo quando quase ninguém acreditava. Foi um ato de coragem patrocinar uma Copa quando todo mundo estava na rua pedindo para não ter Copa. Agora, de repente, você tem um ano difícil, com todas essas crises. Então estamos comparando com um ano que foi muito bom. Para a empresa, fica então mais difícil. E o que a gente fez? Todo mundo se tornou vendedor. Focamos na venda, em cam-panhas fortes, como, por exemplo, “as liquidações fantásticas”, transmitidas ao vivo pelo YouTube.

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� E a sua opinião sobre a taxa Selic? É muito alta.

� Você recebeu convite da presidente Dilma para substituir o Henrique Meirelles na presidência do Conselho Público Olímpico. Desde 2012, você é membro do Conselho Diretor do Comitê Organizador Rio-2016. Qual a sua relação com o esporte e por que foi convidada para esses dois conselhos?Há três anos, o presidente do Comitê Rio 2016, Carlos Arthur Nuzman, queria fortalecer a governança do Conselho e achou por bem convidar uma mulher. É bom deixar claro que o Rio 2016 é gestão, não tem nada a ver com esporte. Por isso ele queria alguém que entendesse de gestão. E eu comecei a ver o legado que uma Olimpíada deixa para o país, já disse que sou uma protagonista do Brasil, e resolvi entrar no Conselho. Não é brincadeira, muita responsabilidade. O Rio 2016 começou com cem funcionários e hoje tem mais de 5 mil voluntários! Onde você sabe o dia que começa e o dia que acaba.

O Brasil fez uma coisa totalmente diferente. O prefeito cedeu um terreno no Centro e a gente foi utilizando containers, que não parecem containers, com salas, auditório e tudo que formos precisando. Tudo num único lugar. Nas Olimpíadas de Londres, a cada hora se alugava uma sala em locais diversos. Começamos a trabalhar aí, o grupo é muito firme, tudo passa pela governança. Os R$ 7,8 bilhões que vão ser usados na organização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos não vêm de dinheiro público, vêm de patrocínios e de contribuição privada.

� Fale do convite para substituir o Meirelles. Partiu de quem?Ele era autoridade olímpica, só que não podia estar no dia a dia do Rio 2016. Como eu já participava, ele achou que era um bom nome, e me disse: “Você vai ser muito melhor porque já está convivendo há três anos com todas as propostas do Rio 2016.” É verdade, entrei de cabeça!

� E quais serão os principais legados que vão ficar para a cidade do Rio, para a população?É impressionante o legado que o Rio vai receber em relação ao transporte público, principalmente para a população mais sim-ples. Mas tem muito mais. Para a expansão do turismo, por exem-plo. É bom lembrar que o Brasil tem 6 milhões de turistas ao ano, enquanto o México tem 15 milhões, a Espanha, 25 milhões e a França, 60 milhões. Nós temos apenas 0,7% do turismo mun-dial que viaja. Eu sempre lutei, e continuo lutando muito, pelo emprego e pelo empreendedorismo. O turismo é uma atividade

ENTREVISTA

que oferece emprego para a população mais simples, que não pode estudar e não tem qualificação profissional. Sejam artesãos, donos de peruas, motoristas de táxi, comércio, indústria. Não estou defendendo o meu interesse, é qualquer tipo de comércio. É uma das atividades mais democráticas, um empregador que dá oportunidade a todos. Além disso, nós vamos ser vistos por 5 bilhões de pessoas na abertura. Vocês sabem o que é isso?

� É quase a população toda do planeta. A maioria da Terra vai ver a abertura das Olimpíadas. Agora, imagina esses 5 bilhões vendo a beleza que é o Rio de Janeiro! Voltando aos legados, vamos ter o primeiro centro olímpico da América Latina, uma iniciativa é muito importante. Vai desper-tar o esporte, que é uma opção boa para tirar os jovens da droga.

� Qual a sua relação com a presidenta Dilma? Eu admiro muito a Dilma. Ela é uma mulher honesta, bem-in-tencionada. Não sou íntima dela, mas tenho contato, nos vemos. Sei que é um momento delicado da sua vida, mas sei também que ela é forte para aguentar tudo isso que está passando. Eu torço pelo Brasil e acho que atualmente a única coisa que a gente tem de fazer é dar força, até porque admiro muito a democracia no Brasil. Nós conseguimos em pouco tempo implantar uma democracia forte, e a democracia deve ser respeitada. E como eu falo muito de protagonismo, o que mais posso fazer é estar junto, como estou também junto do governador Alckmin, aqui em São Paulo, e do prefeito da minha cidade, Franca, em quem não votei. No dia que ele passou a governar eu passei a ajudá-lo. Eu não tenho esse negócio de partido, meu partido é o Brasil.

A entrevista contou também com a presença dos conselheiros da Por Sinal Iso Sendacz e Rubens Gandelman

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O Registrato, ferramenta criada pelo Banco Central para facilitar o acesso do cidadão ao seu cadastro no sistema financeiro,

quintuplicou as consultas às operações de financiamento dos clientes do siste-ma bancário. Até sua implantação, eram realizadas 25 mil consultas por ano. Desde que a consulta passou a ser feita também pelo computador, a média men-sal chega a 12 mil. Antes, exigia-se que a pessoa fosse até o serviço de atendimento ao cidadão da sede ou das nove regionais ou encaminhasse o pedido por carta re-gistrada em cartório. A novidade só não é mais efetiva porque pouca gente sabe que o serviço existe. O Banco estuda facilitar a consulta das empresas e permitir o acesso a outros cadastros para ampliar o alcance do programa.

“Os canais convencionais eram um limitador ao acesso da população às suas informações financeiras. O Registrato

fortalece a cidadania do consumidor bancário”, diz Fernando Dutra, che-fe do Departamento de Atendimento Institucional (Deati). “Apesar de pouco co-nhecido, revelou-se em pouco tempo uma ferramenta importante para o usuário.”

INCLUSÃO FINANCEIRAO Registrato foi lançado em novembro de 2014, no Fórum de Inclusão Financeira de Florianópolis, promovido pelo Banco Central. O uso da ferramenta, porém, exige paciência para percorrer as várias etapas necessárias ao acesso. O processo todo parece um pouco complicado, mas é consequência também da necessida-de de garantir segurança na preservação de dados. O Registrato permite o acesso, pela internet, a dois cadastros. Um, é o Sistema de Informações de Crédito (SCR), que equivale à antiga Central de Risco de Crédito e põe à disposição todas as ope-rações de crédito do cliente bancário aci-ma de mil reais em todos as instituições

financeiras. Quem quer acompanhar seus gastos com cartão de crédito ou quanto deve de financiamento na praça pode bus-car o serviço para se atualizar. O segundo, banco de dados, é o Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro (CCS), que registra todos os bancos com os quais o cliente teve ou ainda tem algum relacionamento, tanto faz se por meio de conta corrente, poupança ou empréstimo.

O acesso ao Registrato pode ser feito por clientes bancários que fazem uso de internet banking, pelos que têm conta bancária mas não usam os serviços digi-tais pela rede e por quem tem certificado digital. No primeiro caso, é preciso ob-ter uma frase de segurança no portal do Banco Central, depois acessar o internet banking do seu banco, validar a chave de segurança e voltar ao portal do BC com a chave validada, para obter uma senha, e, por fim, acessar o Registrato. Clientes que não usam o internet banking só têm a op-ção de procurar o serviço de atendimento

Cidadania na redeCOM NOVA FERRAMENTA CRIADA PELO BC, CLIENTES BANCARIOS PODERAO ACESSAR MAIS RAPIDAMENTE SEUS CADASTROS NO SISTEMA FINANCEIRO.

DIREITOS DO CONSUMIDOR

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MATERIA TITULO TK

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Institucional do Banco Central tem proje-to também para desenvolver a ferramenta para pessoas jurídicas. “A complexidade é maior para as empresas. É preciso, por exemplo, determinar que funcionário terá acesso aos cadastros”, diz Fernando Dutra.

MAIOR DESTAQUE“A criação de um aplicativo que facilitasse o acesso por dispositivos móveis amplia-ria o alcance do Registrato”, aponta Mauro Cattabriga, do Sinal de Belo Horizonte

e integrante do Conselho Editorial da Por Sinal. “O sistema é importante para o cidadão. No início, houve divulgação, mas agora o tema está sumido. Mesmo no portal do Banco Central é pouco visível. É uma ferramenta para o cidadão que deveria ter destaque na primeira página do site do Banco.”

Nos portais dos bancos é um pou-co mais difícil localizar o Registrato. Ele está quase no fim da lista de serviços de conta corrente no site do Santander. No

1. Acesse o portal do Banco Central na internet pelo endereço www.bcb.gov.br.

2. Conduza o cursor do mouse à aba “Sistema Financeiro Nacional” que aparece na barra marrom no alto da página.

3. Logo abaixo vai apa-recer a guia “Registrato — Extrato do Registro de Informações do Banco Central”.

4. Desça o cursor do mou-se até lá e clique uma vez.5. Aparece um texto indicado à pessoa que ainda não tem acesso ao Registro e que pode

escolher um dos três caminhos: “Clientes bancários que fazem uso de internet banking”, “Cidadãos que não fazem uso de internet banking” e “Pessoas que têm certifi-cado digital”. Logo abaixo vêm explicações sobre os dois cadastros possíveis de serem acessados: o Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro (CCS) e o Sistema de Informações de Crédito (SCR). É bom ler antes de seguir adiante.

6. Se você é usuário de internet banking, clique na guia “Clientes bancários que fazem uso de internet banking”. Aparecem quatro passos.

7. Ao clicar em cima do primeiro passo, que é obter frase de segurança, aparece um cadastro que precisa ser preenchido. Informe nos espaços correspondentes o CPF do cliente, o nome da institui-ção financeira em que tem conta bancária, o primeiro nome da mãe e a data de nascimento (do cliente). Clique “Confirmar”.

8. Passe o cursor em cima da chave de segurança e aperte ao mesmo tempo as teclas “Ctrl” e “C” do seu teclado. Copie a chave de segurança em uma página do Word apertando ao mesmo tempo as teclas “Ctrl” e “V” ou digitando

os caracteres. Atenção: a validade da frase de segurança fornecida pelo Banco Central expira em 48 horas.

9. Para seguir adiante, o cliente deve acessar o internet banking do banco no qual tem con-ta. Em quase todas as instituições o caminho para o Registrato está na guia “Conta Corrente”. No Santander, ela aparece no fim da lista do item “Outras Opções”, em “BACEN — Auto Credenciamento Registrato — Validação da Frase de Segurança”. Na Caixa Econômica Federal, na aba “Minha Conta”.10. Ao clicar na guia

O CAMINHO DAS PEDRASA reportagem da Por Sinal resolveu testar o serviço e as dificuldades de acesso ao Registrato. Siga o passo a passo para se cadastrar:

da sede e das nove regionais do Banco Central. Quem tem certificado digital precisa apenas inserir o token no com-putador e fazer o cadastro para conseguir uma senha de entrada..

No futuro, o Registrato deverá incor-porar cadastros, como o de propriedade de título em mercado, de operação de câmbio e de emitente de cheque sem fun-do. O serviço, por enquanto, só está dispo-nível para os titulares de contas de pessoa física. O Departamento de Atendimento

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“BACEN — Auto Credenciamento Registrato — Validação da Frase de Segurança” aparece uma página com o nome do banco, o nome e o CPF do cliente e uma janela em branco. Copie no espaço em branco a chave de segurança que obteve no portal do Banco Central apertando ao mesmo tem-po as teclas “Ctrl” e “V” do seu teclado ou digitando cada um dos caracteres.

11. Clique na guia “Continuar”.

12. Digite a chave de segurança pedida pelo seu banco. Na Caixa, o cliente precisa digitar a assinatura eletrônica para confirmar a operação.

13. Com a chave de segu-rança validada pelo banco, é preciso voltar ao portal do Banco Central. O cliente

pode ir direto no endere-ço: http://www.bcb.gov.br\?REGISTRATO

14. Clique no ícone “Cadastrar”.

15. Na janela que aparece, informe o CPF, instituição financeira, frase de segu-rança e e-mail. Depois, di-gite o código que aparece em letras verdes. Atenção: não é preciso informar mais de um banco. Todas as suas informações bancárias, com todos os bancos, aparecerão for-necendo apenas um como referência.

16. Você receberá a infor-mação de usuário creden-ciado pelo Bacen e a senha provisória de acesso ao sistema.

17. O último passo é aces-sar o Registrato no portal do Banco Central com

um clique do cursor do mouse na guia “Acessar o Registrato”.

18. Ao abrir a janela, mar-que CPF.

19. Digite seu CPF e a senha provisória.

20. Clique na guia “Entrar”.

21. A partir daí, o cliente pode fazer a senha defini-tiva no sistema Registrato e acessar seus dados pela internet sempre que desejar.

22. Atenção: nem sempre o passo a passo dá cer-to. Em várias tentativas no Santander apareceu a mensagem “Prezado cliente, não obtivemos resposta do BACEN na validação da sua frase de segurança. Por gentileza dirija-se ao site do BACEN para confirmar se a frase

foi validada com sucesso. — 01351”. É melhor buscar contato com o serviço de atendimento ao cliente do banco.

23. Já na Caixa Econômica Federal pode aparecer a mensagem “Você não possui nenhuma conta que permita acesso ao serviço selecionado.” A informação do Banco Central é que a Caixa Econômica Federal só pôs o serviço à dispo-sição para conta corrente, mas está providenciando a adaptação do sistema à conta poupança.Quem tem certificado digital só precisa inserir o token de certificação no computador, fazer o cadas-tro sem frase de seguran-ça para obter uma senha e acessar o RegiBoxe.

internet banking da Caixa Econômica Federal aparece na guia “Minha Conta”. Uma procura na janela de pesquisa nas páginas das instituições financeiras ajuda a encontrar o sistema. “Um ponto crítico é a acessibilidade nos portais dos bancos, mas estamos monitorando isso”, garante Fernando Dutra.

O Registrato é considerado, no Banco Central, um conceito puramen-te de cidadania. Ele se soma ao Ranking de Informações, que disponibiliza as

estatísticas das reclamações sobre as instituições financeiras. O serviço não exige equipe com dedicação exclusiva e representa um ganho de eficiência para a instituição. Os canais tradicionais exi-gem pessoal dedicado ao atendimento das demandas dos usuários do sistema financeiro sobre seus cadastros. Os re-latórios do Sistema de Informações de Crédito (SCR) e do Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro (CCS) respondem por 70% dos pedidos feitos nas centrais de

atendimento da sede e das nove regionais. Para os moradores de cidades que não têm representação do BC, a única alternativa de obter a informação é por carta registra-da em cartório — o que também demanda pessoal exclusivo para consultar os regis-tros e elaborar os relatórios, sem contar a dificuldade imposta ao cidadão.

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