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O DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS SOB O ASPECTO SUSTENTÁVEL: O CASO DO ROBÔ AMBIENTAL HÍBRIDO, PROJETADO PARA ATUAR EM ÁREAS DE VÁRZEA NA AMAZÔNIA BRASILEIRA Mara Telles Salles (UFF) [email protected] Jaqueline Colares Viegas (UFF) [email protected] Ney Robinson Salvi dos Reis (UFF) [email protected] A busca cada vez mais intensa por novas fontes de energia, bem como a disponibilização e uso eficiente daquelas já existentes exige estratégia. No Brasil, sociedade, governo, indústria e academia unem esforços para buscar novas soluções parra um país mais sustentável, numa visão de médio e longo prazo. O presente artigo tem como objetivo apresentar uma contribuição para uma metodologia de desenvolvimento de produtos sustentáveis. O trabalho se desenvolve tomando como base a metodologia para projeto de produtos industriais proposta por Eppinger e Ulrick, inserindo as diretrizes propostas por Manzini e Vezzoli para produtos sustentáveis, com isso, montando uma nova proposta de metodologia para projeto de produtos sustentáveis. Para validar a nova proposta é feito o acompanhamento do caso do Robô Ambiental Híbrido, criado para atuar em áreas de várzea na Amazônia brasileira sem causar impacto ambiental significativo, sob a ótica dos conceitos contidos na nova metodologia. E os resultados alcançados satisfazem, na medida em que se consegue fazer a correspondência do desenvolvimento do estudo de caso, nas suas várias fases, com as fases e ações propostas pela metodologia. Palavras-chaves: Desenvolvimento de Produtos Sustentáveis, Sustentabilidade, Amazônia XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

O DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS SOB O ASPECTO … · empresa baseados no tripé da sustentabilidade relacionando os fatores sociais, econômicos e ambientais. Assim uma organização

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O DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS

SOB O ASPECTO SUSTENTÁVEL: O

CASO DO ROBÔ AMBIENTAL HÍBRIDO,

PROJETADO PARA ATUAR EM ÁREAS

DE VÁRZEA NA AMAZÔNIA

BRASILEIRA

Mara Telles Salles (UFF)

[email protected]

Jaqueline Colares Viegas (UFF)

[email protected]

Ney Robinson Salvi dos Reis (UFF)

[email protected]

A busca cada vez mais intensa por novas fontes de energia, bem como

a disponibilização e uso eficiente daquelas já existentes exige

estratégia. No Brasil, sociedade, governo, indústria e academia unem

esforços para buscar novas soluções parra um país mais sustentável,

numa visão de médio e longo prazo. O presente artigo tem como

objetivo apresentar uma contribuição para uma metodologia de

desenvolvimento de produtos sustentáveis. O trabalho se desenvolve

tomando como base a metodologia para projeto de produtos

industriais proposta por Eppinger e Ulrick, inserindo as diretrizes

propostas por Manzini e Vezzoli para produtos sustentáveis, com isso,

montando uma nova proposta de metodologia para projeto de produtos

sustentáveis. Para validar a nova proposta é feito o acompanhamento

do caso do Robô Ambiental Híbrido, criado para atuar em áreas de

várzea na Amazônia brasileira sem causar impacto ambiental

significativo, sob a ótica dos conceitos contidos na nova metodologia.

E os resultados alcançados satisfazem, na medida em que se consegue

fazer a correspondência do desenvolvimento do estudo de caso, nas

suas várias fases, com as fases e ações propostas pela metodologia.

Palavras-chaves: Desenvolvimento de Produtos Sustentáveis,

Sustentabilidade, Amazônia

XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção

Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

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Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

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1 Introdução

O conceito de sustentabilidade tem se tornado cada vez mais relevante na sociedade, nas

políticas públicas, nos governos, na indústria, na economia e, sobretudo nas ONGs que

abordam as questões sociais, ambientais e econômicas e nas instituições de ensino e pesquisa.

A crescente preocupação com a preservação do Planeta e dos seus recursos naturais tem como

principais motivos as mudanças climáticas e a escassez de recursos. Segundo Manzini e

Vezzoli (2008), ao considerar as mudanças climáticas como um quadro problemático no qual

se encontra o planeta Terra, o conceito de sustentabilidade ambiental refere-se à não

interferência das atividades humanas nos ciclos naturais para proteger as gerações futuras e o

capital natural.

O termo Triple Bottom Line, criado nos anos 1990 por John Elkington, fundador da

SustainAbility (LAVILLE, 2009), apresenta uma abordagem aos modelos de gestão de uma

empresa baseados no tripé da sustentabilidade relacionando os fatores sociais, econômicos e

ambientais. Assim uma organização pode crescer de forma sustentável.

Quando se trata de preservação do meio ambiente em território brasileiro, logo se pensa em

uma fonte de riqueza natural que é a Amazônia brasileira. Considerando que a Região

Amazônica é definitivamente parte do cotidiano de todo o planeta, a Amazônia deve ser

tratada como um tema referente às questões ambientais bem como às questões estratégicas

(REIS, 2010). As tecnologias devem surgir para reduzir ao máximo o impacto ambiental das

atividades humanas na Amazônia brasileira, cada vez mais frequentes em territórios antes

desconhecidos.

Em função deste cenário e para reforçar a tendência de se agir de maneira mais sustentável, o

INPI irá iniciar um programa piloto de patentes verdes para tecnologias limpas e com o tempo

de concessão reduzido para menos de dois anos, segundo o site da Revista Sustentabilidade –

Inovação para uma economia verde. Essa iniciativa incentiva a pesquisa por tecnologias mais

limpas e também a proteção do conteúdo técnico para que estas tecnologias tenham valor no

mercado.

2 Revisão da Literatura

2.1 A Sustentabilidade no Projeto de Produto

A expressão “desenvolvimento sustentável” teve a sua formalização no Relatório Brundtland

– Nosso Futuro Comum em 1987 pela Comissão Mundial para o Meio Ambiente e

Desenvolvimento (ZYLBERSZTAJN E LINS, 2010). Para Pinto-Coelho (2009) um marco

para o crescimento da consciência ambiental é o documento Agenda 21 na Eco92,

Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável,

realizada no Rio de Janeiro. Segundo o site RIO+20 – Conferência das Nações Unidas sobre

Desenvolvimento Sustentável, o evento Rio+20 será realizado de 13 a 20 de junho de 2012,

na cidade do Rio de Janeiro, marcando os vinte anos de realização da Conferência das Nações

Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) e tem como objetivo a renovação

do compromisso político com o desenvolvimento sustentável.

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Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

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De acordo com Manzini e Vezzoli (2008) para propor novas soluções sustentáveis em

produtos e serviços, as novas combinações entre a demanda e a oferta de produtos e serviços

estão relacionadas com a dimensão técnica e a dimensão sociocultural da inovação. Para eles

a mudança cultural e a mudança tecnológica foram fatores significativos para deixar mais

clara a discussão sobre soluções sustentáveis (e não sustentáveis) em produtos inovadores e já

existentes no mercado.

Manzini e Vezzoli (2008) sugerem uma série de indicações no projeto de um produto

sustentável, dentre as quais:

facilitar reutilização

intensificar uso

usar materiais e processos de baixo impacto

usar fontes energéticas com baixo impacto

minimizar conteúdo de material

minimizar perdas e refugos

minimizar energia na produção do produto

minimizar embalagens

minimizar consumos do transporte

minimizar consumo de recursos durante o

uso

minimizar e facilitar movimentos e

operações de desmontagem e separação

usar sistemas de junções reversíveis

prever tecnologias específicas e formas

especiais para desmontagem destrutiva

adotar a reciclagem em efeito cascata

facilitar coleta e transporte após o uso

minimizar número de materiais

incompatíveis entre si

facilitar limpeza

2.2 O Desenvolvimento de Produtos e os Conceitos Atuais de Sustentabilidade

A metodologia de desenvolvimento de produtos proposta por Ulrich e Eppinger (2007) e

aplicada no MIT - (Massachusetts Institute of Technology) é composta por etapas que dão

suporte ao desenvolvimento de projeto de produtos industriais. Esta será a metodologia na

qual este trabalho propõe adaptações. Um breve resumo das etapas é apresentado na Tabela 1.

Os conceitos atuais de sustentabilidade, que podem ser relacionados ao desenvolvimento de

produtos têm como representantes créditos de carbono, indicadores de sustentabilidade, ciclo

de vida dos produtos, logística reversa, reciclagem, coleta seletiva, políticas ambientais e

certificações ambientais. Lombardi (2008) afirma que desde que os temas relacionados ao

aquecimento global e sustentabilidade tornaram-se relevantes e obrigatórios nos grandes

centros empresariais e financeiros, também é crescente a preocupação com o estado e o futuro

das empresas. Quanto aos créditos de carbono, refere-se a uma redução nas emissões de

carbono na atmosfera. Segundo Bellen (2006), o objetivo dos indicadores é agregar e

quantificar informações de forma mais simplificada para melhorar o processo de

comunicação. A Análise do Ciclo de Vida (ACV) é uma ferramenta que considera o impacto

ambiental associado ao ciclo de vida do produto, ou seja, desde a extração de matérias-primas

utilizadas na produção até o descarte do produto (CHEHEBE, 1997). Leite (2009) comenta

que os primeiros estudos sobre logística reversa se iniciaram nas décadas de 1970 e 1980

relacionando o retorno de bens a serem processados em reciclagem de materiais, denominados

e analisados como canais de distribuição reversos e que a partir da década de 1990, o tema

tornou-se mais visível no cenário empresarial. A reciclagem é uma forma de economizar

energia e poupar recursos, e também na geração de menos lixo (PINTO-COELHO, 2009). A

coleta seletiva é um sistema de recolhimento de materiais que podem ser reciclados como

papéis, plásticos, vidros, metais e orgânicos define Pinto-Coelho (2009) e que estes materiais

devem ser previamente separados na fonte geradora para que sejam vendidos às indústrias de

reciclagem e aos sucateiros. O relacionamento entre Governo, Indústria e Consumidores está

baseado no claro entendimento dos papéis de cada um e de suas responsabilidades afirma

Chehebe (2002) e que o governo deve ajudar a estabelecer limites e regular quando

necessário. Moreira (2006) comenta que a série de normas ISO 14000 refere-se à série de

normas ambientais e que, desde a sua origem, buscou afinidades com a série da Qualidade,

integrando os conceitos de Qualidade e Meio Ambiente.

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Etapas de

Desenvolvimento de

Produtos

Metodologia

Processos de

Desenvolvimento

e Organizações

Apresenta o processo de desenvolvimento de produtos de forma geral e mostra como as

variáveis deste processo são utilizadas em diferentes situações industriais. Discute a forma

como os indivíduos estão organizados em grupos, a fim de empreender projetos de

desenvolvimento de produtos

Planejamento

do Produto

Apresenta um método para decidir quais os produtos a desenvolver. Como resultado deste

método é o planejamento e a declaração de missão para um projeto particular

Identificação das

Necessidades do

Consumidor

A identificação das necessidades do cliente é uma parte integrante da fase do processo de

desenvolvimento do conceito do produto. As necessidades do cliente resultantes são utilizadas

para orientar a equipe a estabelecer as especificações do produto gerando conceitos de

produtos e selecionando um conceito de produto para o desenvolvimento

Gerenciamento de

Projeto de

Desenvolvimento

de Produto

Apresenta alguns conceitos fundamentais para a compreensão e representação das tarefas do

projeto de interação, juntamente com um método para planejamento e execução do

desenvolvimento de um projeto

Especificações

do Produto

As necessidades dos clientes são geralmente expressas na "língua do cliente". A fim de

fornecer orientações específicas sobre como design e engenharia de um produto, as equipes de

desenvolvimento estabelecem um conjunto de especificações para expor em detalhes precisos

e mensuráveis que o produto tem que fazer para ser bem sucedido comercialmente. As

especificações devem refletir as necessidades do cliente, diferenciar o produto a partir dos

produtos competitivos e ser tecnicamente e economicamente realizável

Geração de

Conceitos

O conceito do produto é uma descrição aproximada da tecnologia, os princípios de trabalho e

a forma do produto. O grau em que um produto satisfaz os clientes e pode ser comercializado

com sucesso depende em grande medida da qualidade do conceito

Seleção de

Conceitos

A seleção de conceitos é o processo de avaliação de conceitos com respeito às necessidades

dos clientes e outros critérios, comparando os pontos fortes e fracos dos conceitos e

selecionando um ou mais conceitos para posterior investigação ou desenvolvimento

Teste do

Conceito

O teste do conceito solicita uma resposta direta a uma descrição do conceito do produto de

clientes potenciais no mercado-alvo. O teste de conceito é distinto da seleção de conceitos em

que se baseia em dados recolhidos diretamente de potenciais clientes e se baseia em um grau

menor pela equipe de desenvolvimento

Arquitetura do

Produto

Discute as implicações da arquitetura do produto sobre a mudança do produto, variedade de

produtos, a padronização de componentes, o desempenho do produto, custo de fabricação e

gerenciamento de projetos que em seguida apresenta um método para estabelecer a arquitetura

de um produto

Desenho

Industrial

Discute o papel do designer industrial e como questões humanas de interação, incluindo

estética e ergonomia, são tratadas no desenvolvimento do produto

Projeto para

Manufatura

Discute técnicas usadas para reduzir custo de produção. Estas técnicas são principalmente

aplicadas durante as fases do processo do nível de sistema e do projeto detalhado

Prototipagem Apresenta um método para assegurar que os esforços de criação de protótipos são aplicados

de forma eficaz

Projeto

Robusto

Explica métodos para a escolha de valores das variáveis de projeto para assegurar

desempenho confiável e consistente

Economia para o

Desenvolvimento

de Produtos

Descreve um método para a compreensão da influência dos fatores internos e externos sobre o

valor econômico de um projeto

Projeto de

Patente

Apresenta uma abordagem para criar um pedido de patente e discute o papel da propriedade

intelectual no desenvolvimento de produtos

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Tabela 1: As etapas da metodologia de desenvolvimento de produtos

Fonte: Adaptada de Ulrich e Eppinger (2007)

2.3 As Áreas de Várzea na Amazônia Brasileira

Há algum tempo, a Região Amazônica passou, definitivamente, a fazer parte do cotidiano de

todo o planeta e tal tema nos leva, cada dia mais, às questões ambientais, bem como às

questões estratégicas. Além disso, é crucial que os brasileiros a conheçam em detalhe, a fim

de que seja possível traçar e aplicar estratégias eficientes, assim como propor políticas

públicas adequadas às suas especificidades. Sobre a questão do território regional da

Amazônia segundo Becker (2004), é apresentada na citação abaixo.

“No caso da Amazônia, perduram imagens obsoletas sobre sua realidade,

verdadeiros mitos que dificultam a tomada de decisão nas políticas públicas,

complicadas também por fortes conflitos de interesses quanto ao uso do

território regional.”

A problemática das áreas de várzea na Amazônia brasileira refere-se às dificuldades de

acesso, mobilidade e locomoção em grande parte das áreas alagadas e/ou alagáveis de

Florestas Úmidas Tropicais. Assim como os componentes naturais das áreas inundáveis, as

populações locais devem adotar estratégias de adaptação entre as fases aquáticas e terrestres.

A malha hídrica apresenta ciclos de cheia, vazante, seca e enchente, característicos da Região

Amazônica (REIS, 2010). Considerando não só os efeitos das mudanças climáticas, a

existência nas várzeas dos rios de extensos tapetes de vegetação flutuante (macrófitas

aquáticas), conforme Figura 1, podem interromper os barcos a remo ou a motor (CARRIL

apud REIS, 2010).

Figura 1: Tipo de vegetação flutuante que cobre a superfície da água dos rios

Fonte: Reis (2010)

2.4 A Robótica e o Meio Ambiente

Sempre que a sociedade se defronta com situações onde o ambiente pode ser classificado

como hostil à presença do ser humano, são desenvolvidos artefatos com o intuito de aumentar

a capacidade adaptativa do homem a este cenário.

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A robótica é um dos ramos da tecnologia que lida preferencialmente com sistemas compostos

por máquinas e partes mecânicas automáticas e controlados por dispositivos mecânicos e/ou

circuitos integrados (micro-processadores). Como produtos, são obtidos sistemas mecânicos

motorizados, controlados manual ou automaticamente por circuitos elétricos, por

computadores ou tele-operados.

Na prática, um robô é um dispositivo autônomo ou semi-autônomo que realiza trabalhos sob

comando humano. Além de ser usado como redutor de custos pela indústria, a grande vocação

dos robôs é para a realização de tarefas em locais inóspitos ou impróprios à presença do ser

humano. Locais mal iluminados, ruidosos, poluídos ou contaminados quimicamente,

ambientes radioativos, hiper ou hipobáricos, todos são candidatos ao uso de tais sistemas.

A Robótica tem um grande potencial como ferramenta multi e transdisciplinar, pois pode

religar fronteiras anteriormente estabelecidas entre várias disciplinas. Independente de suas

origens, a robótica está se tornando mais conhecida, mas ainda hoje, o termo é utilizado sem

que haja um consenso no âmbito mundial sobre o seu real significado. Essas tecnologias

podem e devem se somar aos estudos e conhecimentos já conseguidos no campo da

biomimética, que é a ciência que relaciona a robótica e a biologia com o objetivo de estudar

as estruturas biológicas e suas funções, para que, junto com a tecnologia possa desenvolver

protótipos com características e movimentos de elementos da natureza. A busca em emprestar

da natureza algumas características é um enorme passo. A junção da robótica com a

biomimética para propor algo que lide em cenários de várzea pode ser mais eficiente e

sustentável (REIS, 2010).

3 Metodologia de Pesquisa

O presente estudo tem um formato metodológico pois, segundo Vergara (2010) a pesquisa

metodológica caracteriza-se como um instrumento para avaliar a forma de atingir um

determinado objetivo. O trabalho se desenvolve a partir da análise da metodologia de

desenvolvimento de produtos proposta por Ulrich e Eppinger (2007) onde, através de análise,

são inseridas contribuições sustentáveis a cada etapa da metodologia com base nos conceitos

de Produtos Sustentáveis (MANZINI E VEZZOLI, 2008). Daí resulta uma nova proposta de

metodologia de projeto de produtos. A fim de verificar se essa análise é aplicável, é

apresentado um estudo de caso sobre o desenvolvimento de um produto que tem como

conceito a sustentabilidade. O estudo de caso refere-se ao desenvolvimento do Robô

Ambiental Híbrido, desenvolvido em uma empresa petrolífera para atuar em áreas de várzea

da Amazônia brasileira.

4 A Sustentabilidade e o Desenvolvimento de Produtos

De acordo com a metodologia, já apresentada, aplicada no MIT no desenvolvimento de

produtos, as quinze etapas que devem ser consideradas em projeto de produtos foram

divididas em macro etapas (Figura 2) de forma adaptada para inserir inicialmente os aspectos

sustentáveis (Figura 3) que podem ser atribuídos para cada macro etapa.

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Figura 2: As etapas da metodologia de desenvolvimento de produtos

Fonte: Adaptada de Ulrich e Eppinger (2007)

A macro etapa planejamento corresponde à fase inicial do projeto para o processo de criação

do produto. Em seguida, a macro etapa apresentada é o desenvolvimento do conceito que

considera a identificação das necessidades do consumidor e do mercado alvo, alinhando as

expectativas dos consumidores e da empresa.

A próxima macro etapa a ser considerada é o planejamento do sistema que avalia o sistema de

módulos do produto em subprodutos e componentes e, também, o design do produto. Esta

macro etapa representa o layout geométrico do produto e a especificação funcional. A macro

etapa projeto detalhado refere-se à análise da disposição dos recursos e o processo produtivo.

O teste e refinamento corresponde à construção de protótipos para testar e avaliar o

desempenho do produto.

A análise financeira e aspectos legais é a macro etapa que avalia a viabilidade econômica do

projeto (que agora já leva em conta a economia sustentável), o direito do consumidor e da

sociedade e, por último, o direito de propriedade industrial (das características técnicas do

produto).

Processos de

Desenvolvimento

e Organizações

Planejamento do

Produto

Identificação das

Necessidades do

Consumidor

Gerenciamento de

Projeto de

Desenvolvimento

de Produto

Especificações do

Produto

Geração de

Conceitos

Seleção de

Conceitos Teste do Conceito

Arquitetura do

Produto Desenho

Industrial

Projeto para

Manufatura

Prototipagem Projeto Robusto Economia para o

Desenvolvimento

de Produtos

Projeto de Patente

Planejamento

Desenvolvimento do Conceito

Planejamento do Sistema Projeto Detalhado

Teste e Refinamento Análise Financeira e Aspectos Legais

Legais

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Figura 3: As macro etapas da metodologia de desenvolvimento de produtos sob o aspecto sustentável

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Fonte: Adaptada de Viegas (2011)

5 Estudo de Caso: O Desenvolvimento do Robô Ambiental Híbrido em Áreas de

Várzea na Amazônia Brasileira

As jazidas de gás natural e óleo leve descobertas no interior da Floresta Amazônica nas

décadas de 70 e 80 trazem uma questão: como colocar tão nobre recurso natural à disposição

dos centros consumidores de modo eficiente, econômico e sustentável, garantindo, ao mesmo

tempo a confiabilidade e segurança das operações e instalações industriais necessariamente

situadas em áreas alagadas de vegetação densa?

Como resposta uma complexa malha de dutos foi indicada como solução para transportar o

gás natural produzido no município de Urucu-AM que apresenta inegáveis vantagens se

comparado ao diesel, atualmente usado como base da matriz energética da cidade de Manaus

e seu entorno. Diante disso, novas questões passam a ser consideradas para atender

operacional e ambientalmente as faixas de influências desta malha que atualmente conta com

800 km de dutos.

Tais questionamentos incitam oportunidades de desenvolvimento em várias áreas

tecnológicas, mormente no que se refere à mobilidade e acessibilidade em tal região. Se faz

necessário o exame e a proposta um novo conceito de locomoção (de pessoas, equipamentos e

mercadorias), em locais de dificílimo acesso e condições inóspitas. Um veículo com ênfase

ambiental que, desde as primeiras especificações, seja concebido para tais cenários e propicie

aos responsáveis mantenedores de tal empreendimento condições de mobilidade e

acessibilidade sustentáveis em regiões sensíveis da várzea amazônica.

O Robô Ambiental Híbrido surgiu a partir da visita de um integrante da equipe do Laboratório

de Robótica do CENPES na Amazônia, o Eng Ney Robinson dos Reis, para conhecer o

Projeto do Gasoduto Coari-Manaus da Petrobras. Os primeiros desenhos e esboços do Robô

Ambiental Híbrido tiveram grande importância na concepção do produto, pois se basearam na

propriedade da flutuação de um inseto típico local (imitação da natureza).

A proposta do Projeto de desenvolvimento do Robô Ambiental Híbrido tem como base um

novo conceito de veículo como alternativa de locomoção com condições de mobilidade e

acessibilidade sustentáveis em regiões da várzea amazônica. Por sua capacidade de

locomoção em lugares onde pesquisadores não conseguem chegar com embarcações simples,

o Robô Ambiental Híbrido pode agregar muitas funções como é o caso da coleta de

parâmetros da água em tempo real e a coleta de espécies e o recurso da visão com câmeras

acopladas proporcionando o conhecimento de uma Amazônia ainda desconhecida. A criação

do Robô Ambiental Híbrido contribuiu para o trabalho de conhecimento da região Amazônica

durante a construção do gasoduto (Figura 4).

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Figura 4: Robô Ambiental Híbrido em atuação

Fonte: Reis (2010)

A equipe de trabalho verificou também que os membros participantes do Projeto do gasoduto

deveriam aprender com a comunidade ribeirinha. A população, mesmo com condições

precárias de qualidade de vida, desenvolveu, ao longo do tempo, estratégias de locomoção e

moradia em áreas de várzea. O levantamento das informações junto à comunidade ribeirinha e

a experiência de conhecer algumas regiões da Amazônia brasileira por parte do Projeto do

gasoduto proporcionaram a vontade de desenvolver um veículo que pudesse ir até onde o

homem não conseguia chegar sem impactar o meio ambiente. O Robô Ambiental Híbrido é

um robô por ser tele-operado, ambiental por impactar o menos possível o meio ambiente e

híbrido por atuar em áreas de várzea com características de cheia e seca dos rios onde é

possível flutuar e andar em terra firme, a possibilidade de ser um veículo tele-operado ou

dirigido e pelos diversos tipos de energia que podem alimentá-lo.

6 Resultados

Com base na metodologia de desenvolvimento de produtos proposta por Ulrich e Eppinger

(2007), o estudo de conceitos atuais que abordam a sustentabilidade nos Produtos (MANZINI

E VEZZOLI, 2008), o resultado da análise referente ao projeto de produtos sustentáveis

apresenta alguns exemplos de atribuições sustentáveis às etapas da metodologia de

desenvolvimento de produtos como uma contribuição para a proposta de uma metodologia de

desenvolvimento de produtos sustentáveis (Figura 5).

O conceito da biomimética foi usado quando se estabeleceu que o mesmo deveria ter um

sistema de suspensão com capacidade de atingir ângulos diversos que fossem compatíveis

com os movimentos necessários para o deslocamento em áreas alagadas ou de terra firme sem

danificar a vegetação local, semelhante aos movimentos observados nos insetos patinadores.

Considerando que a Amazônia brasileira é conhecida por suas características naturais,

desenvolver um produto para atuar em áreas desconhecidas visando à preocupação da

preservação ambiental e o conceito da sustentabilidade proporciona como vantagem a redução

dos impactos ambientais e a possibilidade de deslocamento de difícil acesso para estudos da

biodiversidade natural. Porém, como desvantagem apresenta de forma contraditória o avanço

em áreas desconhecidas o que de fato pode causar impacto ambiental.

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O estudo de metodologias voltadas para o desenvolvimento de produtos sustentáveis contribui

para direcionar o projeto para a perspectiva da sustentabilidade. Os requisitos ambientais,

sociais e econômicos relacionados ao desenvolvimento de produtos contribuem para a geração

de conceito sustentável e proporcionando na fase projetual o nascedouro do conceito de

produto sustentável.

Como pode ser notado na figura 5, em todas as etapas propostas no modelo, o Robô

apresentou correspondência de aspectos sustentáveis compatíveis com os propostos na nova

metodologia.

Figura 5: Algumas atribuições sustentáveis às etapas da metodologia de desenvolvimento de produtos

Fonte: Viegas (2011)

7 Conclusão

O desenvolvimento de produtos sob o enfoque da sustentabilidade pode ser considerado uma

forma de repensar o conceito do produto e seus processos produtivos. Trata-se de uma

mudança cultural e tecnológica.

Processos de

Desenvolvimento

e Organizações

Planejamento do

Produto

Identificação das

Necessidades do

Consumidor

Gerenciamento de

Projeto de

Desenvolvimento

de Produto

Especificações do

Produto

Geração de

Conceitos

Seleção de

Conceitos Teste do Conceito

Arquitetura do

Produto Desenho Industrial

Projeto para

Manufatura Prototipagem

Projeto Robusto Economia para o

Desenvolvimento

de Produtos

Projeto de Patente

Sistema de Gestão

Ambiental Análise do Ciclo de

Vida do Produto Educação Ambiental

Aspectos e Impactos

Ambientais

Vida Útil dos

Materiais Conceito Sustentável

Análise de Risco

Ambiental

Indicadores de

Sustentabilidade

Montagem e

Desmontagem Ecodesign

Recursos e Processos

Sustentáveis Prototipagem Virtual

Desempenho

Ambiental Economia Verde Inovações

Sustentáveis

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A metodologia proposta se mostrou eficiente neste estágio de desenvolvimento. É, portanto

possível e desejável que se implemente melhorias a ela e investimento também no estudo de

outras, pois o mundo demanda contribuições urgentes nesta área.

O papel das empresas e das indústrias é produzir produtos que possam reduzir ao máximo os

impactos ambientais e sociais, com o pensamento de manter a economia atual, mas

protegendo as gerações futuras.

O grande desafio dos projetistas de produtos é proporcionar formas que possam contribuir

para a redução do impacto sócio-ambiental e a preservação do meio ambiente, e isso foi o que

se pode observar ao estudar o caso do Robô Ambiental Híbrido, cujo projetista, mesmo não

tendo tido contato com a metodologia, aplicou todos os princípios aqui preconizados.

8 Referências

BECKER, Berta K. Amazônia: Geopolítica na Virada do III Milênio. Rio de Janeiro: Garamond, 2004.

BELLEN, H. M. van. Indicadores de Sustentabilidade – Uma Análise Comparativa. 2ª Edição. Rio de Janeiro:

Editora FGV, 2006.

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Janeiro: Editora Qualitymark, CNI, 1997.

IRIGARAY, H. A.; VIANNA, A.; NASSER, J. E.; LIMA, L. P. M. Gestão e Desenvolvimento de Produtos e

Marcas – Série Marketing. 2ª Edição. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006.

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LOMBARDI, A. Créditos de Carbono e Sustentabilidade – Os caminhos do novo capitalismo. São Paulo:

Companhia Editora Nacional, 2008.

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